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FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA BRASILERIA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA MESTRADO EXECUTIVO EM GESTÃO EMPRESARIAL
A COMPOSIÇÃO DA DÍVIDA PÚBLICA MOBILIÁRIA FEDERAL INTERNA E OS FUNDOS DE INVESTIMENTO NO BRASIL:
ANÁLISE DOS FATORES DE INFLUÊNCIA
DISSERTAÇÃO APRESENTADA À ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS PARA OBTENÇÃO DO GRAU DE MESTRE
Manoel Aparecido Rodrigues
Rio de Janeiro, 2005
II
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS ESCOLA BRASILERIA DE ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E DE EMPRESAS CFAP – CENTRO DE FORMAÇÃO ACADÊMICA E PESQUISA MESTRADO EXECUTIVO EM GESTÃO EMPRESARIAL
A COMPOSIÇÃO DA DÍVIDA PÚBLICA MOBILIÁRIA FEDERAL INTERNA E OS FUNDOS DE INVESTIMENTO NO BRASIL:
ANÁLISE DOS FATORES DE INFLUÊNCIA
DISSERTAÇÃO DE MESTRADO APRESENTADA POR
Manoel Aparecido Rodrigues
E
APROVADA EM 22 DE DEZEMBRO DE 2005
PELA COMISSÃO EXAMINADORA
______________________________________
ROGÉRIO SOBREIRA BEZERRA
DOUTOR EM ECONOMIA
______________________________________
DEBORAH MORAES ZOUAIN
DOUTORA EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO
______________________________________
RODRIGO MARIATH ZEIDAN
DOUTOR EM ECONOMIA
III
AGRADECIMENTOS
Ao Professor Rogério Sobreira, pela orientação precisa, objetiva e segura, durante todas as fases deste estudo.
Aos colegas da turma de Mestrado Executivo, em especial a Marta e ao Saulo, pelo apoio proporcionado, mesmo nos momentos mais difíceis, e, principalmente, pelo constante incentivo. Aos professores do curso de Mestrado Executivo em Gestão Empresarial da Fundação Getulio Vargas, pelos ensinamentos transmitidos.
Ao Banco do Brasil, pelo patrocínio do curso e à oportunidade de crescimento pessoal e profissional.
Aos meus pais Manoel e Therezinha, pela formação e educação propiciadas, apesar do enorme sacrifício, mas principalmente pelo exemplo de vida.
À minha irmã Maria Terezinha, que sempre soube me compreender e ajudar desde os primeiros momentos de minha vida.
Ao casal Antonio José Arosa Ferreira e Maria Alice Bettocchi Dittz Ferreira, pelo apoio recebido durante o curso e colaboração na obtenção dos dados utilizados neste trabalho.
DEDICATÓRIA
À minha querida esposa Julia Mie, por seu inestimável apoio, compreensão e amor incondicional em topos os momentos, sendo parte fundamental para a realização deste trabalho.
À minha filha Beatriz Suemi, que nasceu durante a realização deste curso, para encher nossas vidas com o valioso significado da felicidade, sendo fruto e objeto do bem mais precioso que compartilhamos, o amor.
IV
RESUMO
Esta dissertação tem por objetivo estudar a relação entre a composição da Dívida
Pública Mobiliária Federal interna - DPMFi e os Fundos de Investimento, que se
caracterizam como os principais demandantes de títulos públicos. Discutem-se, no
referencial teórico, abordagens teóricas à preferência pela liquidez - que levam a
postular o investidor como avesso ao risco – assim como a composição de portfólio,
particularmente, a fronteira eficiente de Markowitz. Foram analisados dados históricos
da composição da DPMFi do patrimônio de Fundos de Investimento no período de
novembro de 1999 a dezembro de 2004. Os objetivos do governo acerca do mix de
títulos da dívida pública e os resultados alcançados são delineados, assim como as
preferências dos fundos em relação a tais títulos. As séries do montante de três papéis
(LFT, LTN e NTN-C) na DPMFi e em poder dos Fundos de Investimento são
comparados e comportamentos semelhantes são identificados. Discutem-se fatos
relevantes do contexto macroeconômico no período em termos de sua influência sobre o
mix da Dívida Pública e dos Fundos de Investimento. Encontram-se indícios de uma
possível influência dos Fundos de Investimento sobre o perfil da DPMFi e propõe-se
hipóteses para estudos futuros.
Palavras-chave: dívida pública, fundos de investimento, preferência pela liquidez
V
ABSTRACT
This work intends to study the relationship between Brazilian Internal Public Debt mix
and Mutual Funds. In the theoretical framework, the discussion about liquidity
preference theories implies considering risk averse investors. Portfolio selection is also
discussed, particularly Markowitz efficient frontier. Historical data from November of
1999 to December of 2004 of Brazilian Internal Public Debt mix and Mutual Funds
portfolio are analyzed. Official goals concerning Public Debt´s mix and its actual
composition are presented, as well as Mutual Fund preferences as buyers of public debt
securities. Time series of three securities (LFT, LTN and NTN-C) in Public Debt mix
and Mutual Funds portfolio are compared and a similar behavior is identified. Relevant
facts of the macroeconomic context which may have affected Public Debt or Mutual
Funds are discussed. Some indications of a possible influence of Mutual Funds upon
Public Debt Mix are obtained and hypothesis to be tested in future studies are proposed.
Key-words: public debt, mutual funds, liquidity preference.
VI
SUMÁRIO INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 10
1 REFERENCIAL TEÓRICO..................................................................................... 12
1.1 Preferência pela liquidez ....................................................................................... 12
1.1.1 Risco e liquidez ...................................................................................... 16
1.1.2 Teoria de portfólio em Keynes................................................................ 19
1.1.3 Escolha de portfólio em Tobin ................................................................ 22
1.2 Fronteira eficiente ................................................................................................. 29
2 FUNDOS DE INVESTIMENTO NO BRASIL........................................................ 38
2.1 Histórico ............................................................................................................... 38
2.2 Definição e classificação....................................................................................... 40
2.3 Evolução patrimonial ............................................................................................ 41
2.4 Composição de portfólio de fundos de investimento.............................................. 50
2.5 Evolução da composição das carteiras e atuação dos fundos no mercado de dívida
pública e privada................................................................................................... 54
2.6 Atuação dos fundos no mercado primário de títulos da DPMFi ............................. 57
2.7 Atuação dos fundos no mercado secundário de títulos da DPMFi.......................... 57
2.8 Conclusão ............................................................................................................. 58
3 ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE FUNDOS DE INVESTIMENTO E
COMPOSIÇÃO DA DPMFi....................................................................................... 60
3.1 Dívida Pública Mobiliária Federal interna ............................................................. 60
3.1.1 Caracterização dos principais títulos da DPMFi...................................... 60
3.1.1.1 Liquidez do mercado de Títulos da DPMFi................................. 63
3.1.2 Planos Anuais de Financiamento ............................................................ 65
3.1.2.1 Plano Anual de Financiamento de 2001.......................................66
VII
3.1.2.2 Plano Anual de Financiamento de 2002......................................67 3.1.2.3 Plano Anual de Financiamento de 2003..................................... 69 3.1.2.4 Plano Anual de Financiamento de 2004..................................... 70
3.1.3 Evolução recente da composição da DPMFi ........................................... 71
3.2 Detentores de títulos da DPMFi ............................................................................ 75
3.2.1 Títulos prefixados................................................................................... 79
3.2.2 Títulos atrelados à taxa SELIC ............................................................... 80
3.2.3 Títulos atrelados a índices de preços....................................................... 81
3.3 DPMFi e Fundos de Investimento ......................................................................... 82
3.3.1 Títulos pós-fixados atrelados à taxa Selic................................................ 84
3.3.2 Títulos prefixados................................................................................... 89
3.3.3 Títulos atrelados a índices de preços....................................................... 94
3.4 Conclusões............................................................................................................ 97
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................... 100
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 104
ANEXO A – Caracterização dos principais títulos da DPMFi ................................... 111
VIII
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Seleção de portfólio a diversas taxas de juros............................................. 25
Figura 2 – Curvas de indiferença de propensos ao risco e diversificadores: Portfólio
ótimo com risco e retorno esperado máximos ............................................ 28
Figura 3 –Fronteira Eficiente ...................................................................................... 32
Figura 4 – Fronteira eficiente geral ............................................................................. 34
Figura 5 – Número de fundos de investimento no Brasil ............................................. 43
Figura 6 – Patrimônio líquido dos fundos de investimento no Brasil ........................... 44
Figura 7 – Participação de Fundos Referenciados DI no mercado de fundos ............... 45
Figura 8 – Participação de Fundos de Renda Fixa no mercado de fundos .................... 46
Figura 9 – Participação de Fundos Multimercado no mercado de fundos..................... 47
Figura 10 – Participação de Fundos Cambiais no mercado de fundos.......................... 48
Figura 11 – Participação de Fundos de Ações no mercado de fundos .......................... 49
Figura 12 – Participação de Fundos de Previdência no mercado de fundos.................. 50
Figura 13 – Composição dos fundos de investimento .................................................. 55
Figura 14 - Evolução da Dívida Pública versus Participação dos FI´s (Bilhões de Reais
nominais) .................................................................................................. 56
Figura 15 - Prazo Médio da DPMFi em Poder do Público ........................................... 72
Figura 16 - Prazo Médio da DPMFi em Poder do Público por Tipo de Rentabilidade.. 73
Figura 17 - Estrutura de Vencimentos da DPMFi em Poder do Público....................... 74
Figura 18 - Composição percentual da DPMFi em Poder do Público por Tipo de
Rentabilidade ............................................................................................ 75
Figura 19 – Principais títulos da DPMFi em Poder do Público .................................... 77
Figura 20 – Principais títulos da DPMFi em Poder dos FIs.......................................... 77
Figura 21 – Detentores de Títulos da DPMFi .............................................................. 78
IX
Figura 22 – Detentores de LTNs ................................................................................. 79
Figura 23 – Detentores de LFTs.................................................................................. 80
Figura 24 – Detentores de NTN-Cs............................................................................. 81
Figura 25 – Montante da DPMFI em poder do público e em poder dos FIs ................. 82
Figura 26 – Fração do montante da DPMFi em poder dos FI’s .................................... 83
Figura 27 – Montante de LFTs em poder do público e em poder dos FIs..................... 84
Figura 28 – Fração do montante de LFT’s em poder dos FI’s ...................................... 85
Figura 29 – Fração de LFTs nos títulos da DPMFi em poder dos fundos..................... 88
Figura 30 – Montante de LTN’s em poder do público e montante de LTN’s em poder
dos FI’s .................................................................................................. 90
Figura 31 – Fração do montante de LTN’s em poder dos FI’s ..................................... 91
Figura 32 – Fração de LTNs nos títulos da DPMFi em poder dos fundos .................... 94
Figura 33 – Montante de NTN-Cs em poder do público e montante de NTN-Cs em
poder dos FIs............................................................................................. 95
Figura 34 – Fração do montante de NTN-C’s em poder dos FI’s ................................. 95
Figura 35 – Fração de NTN-Cs nos títulos da DPMFi em poder dos fundos ................ 96
10
INTRODUÇÃO
Os Fundos de Investimento – FI’s mostram-se os principais demandantes de
Títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal interna – DPMFi, detendo mais de 40% do
volume dos seus papéis em 2004. Neste contexto, o presente trabalho tem por objetivo
analisar a relação entre a composição da DPMFi e os fundos de investimento.
No capítulo um, “Referencial Teórico”, discute-se a preferência pela liquidez,
particularmente nas perspectivas de Keynes e Tobin. A composição de Portfólio é
analisada sob a visão destes autores, o que leva a uma definição quanto à postura do
investidor típico frente ao risco a ser considerada neste trabalho. Delineia-se, também, o
conceito de fronteira eficiente, tal como proposto por Markowitz, como conjunto de
alternativas de investimento em termos de trade-off entre risco e retorno. O ponto
escolhido na fronteira pelo investidor é apresentado como dependente de sua aversão ao
risco. Os títulos livres de risco, particularmente os papéis da Dívida Pública mostram-se
como alternativas relevantes para a composição de portfólios.
O capítulo dois “Fundos de Investimento no Brasil” delineia um panorama da
evolução histórica dos fundos de investimento no Brasil assim como de sua
composição. Os títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal interna são destacados
como os seus principais ativos. Expõem-se os objetivos destes fundos em termos do mix
ótimo de títulos, particularmente no que se refere à forma de remuneração. Destaca-se
as classes de fundos existentes e suas características. Indícios da influência destes
Fundos sobre a composição da DPMFi são apresentados.
No capítulo três, “Análise da Relação entre Fundos de Investimento e a
Composição da DPMFi” discute-se, inicialmente, a gestão da DPMFi e a composição
buscada pelos gestores da Dívida, particularmente com base nos planos anuais de
financiamento. Os resultados atingidos frente aos objetivos pretendidos em tais planos
11
são comparados, assim como delineados alguns fatos que influenciaram tais resultados.
Os principais detentores dos títulos da DPMFi são discutidos, assim como a evolução da
participação destes títulos no portfólio dos fundos de investimento.
Finalmente, nas conclusões, indícios da influência dos FI’s sobre a composição
da DPMFi são brevemente delineados e sugestões para estudos futuros que poderiam
testar tal hipótese são expostas.
12
1 REFERENCIAL TEÓRICO
O presente capítulo propõe-se a delinear as razões da preferência pela liquidez e
postura em relação ao risco, a partir de Keynes, Hicks, Kahn e Tobin. Discutem-se a
teoria de precificação de ativos em Keynes, particularmente no que se refere ao prêmio
de liquidez, e a teoria de portfólio em Tobin, com ênfase em risco e retorno. Busca-se,
aqui, primordialmente identificar a postura do investidor típico em relação ao risco. A
seguir, discute-se a composição de portfólio no contexto do modelo média-variância de
Markowitz, notadamente, a determinação da fronteira eficiente.
1.1 Preferência pela liquidez
De acordo com Simonsen e Cysne (1995, p. 332), Keynes estabeleceu três
motivos para a procura por moeda, ou para a preferência pela liquidez: as transações, a
precaução e a especulação. A preferência pela liquidez é definida por Keynes (1935,
p.122) como “uma escala do volume dos recursos [de um indivíduo], medidos em
termos monetários ou em unidades de salário, que deseja conservar em moeda em
diferentes circunstâncias”. O primeiro motivo era identificado pelos economistas
neoclássicos como sendo o estoque necessário para compensar as defasagens entre
recebimentos e pagamentos. O segundo representava os saldos de caixa mantidos para
enfrentar possíveis despesas imprevistas, bem como aproveitar oportunidades de
negócios. Mas a grande novidade apresentada por Keynes era a procura especulativa, ou
seja, era identificada uma possível razão para guardar moeda como aplicação
patrimonial duradoura. Neste caso, o que se pretendia era guardar moeda à espera de
uma melhor possibilidade futura para realizar o investimento.
A quantidade de dinheiro necessária para satisfazer o motivo transação está
fortemente relacionada com o volume de rendimento e emprego, ou seja, com o nível
13
geral da atividade econômica. À medida que se elevam o total da produção e o
emprego e aumentam os preços e os salários, incrementa-se também a procura por
dinheiro para transações. Um saldo de caixa é requerido para cobrir o intervalo entre
receitas e gastos. Se todos recebessem seus rendimentos em dinheiro e pagassem seus
gastos à vista, a necessidade de manutenção de saldos para fins de transação seria
minimizada.
O motivo transação, na forma original da Teoria Geral de Keynes (1935)
dividiu-se em motivo-renda e giro de negócios. No que se refere à renda, trata-se da
necessidade de conservar recursos líquidos para garantir a transição entre recebimentos
e desembolsos. A força deste motivo para induzir os agentes econômicos à decisão de
reter ativos monetários depende, de acordo com Keynes, principalmente do montante da
renda regularmente recebida e da duração normal do intervalo entre o seu recebimento e
os gastos. Quanto ao giro de negócios, consiste em necessidade análoga à primeira, mas
especificamente localizada na esfera das atividades empresariais. Inclui-se neste motivo
a moeda retida pelas empresas para garantir os pagamentos que se efetuam no intervalo
entre as compras de insumos e remunerações de fatores e as entradas de caixa
resultantes da realização de vendas. A falta de sincronia entre pagamentos e
recebimentos é, em termos gerais, a razão da retenção de moeda para os fins
transacionais (LOPES; ROSSETTI, 1996).
Enquanto o motivo transação relaciona-se ao atendimento de despesas ordinárias
e repetidas, o motivo precaução deriva da necessidade de fazer frente a despesas
extraordinárias e incertas. A impossibilidade de determinar quando ocorrerão certos
tipos inevitáveis de gastos leva os agentes econômicos, indivíduos assim como
empresas, a reter saldos monetários líquidos para corresponder aos imprevistos. Há,
assim, motivos que levam os agentes a se precaverem quanto às contingências
14
inesperadas. A força deste segundo motivo depende, em grande parte, do custo e da
segurança dos métodos para obter moeda em caso de necessidades imprevistas, por
meio de alguma forma de empréstimo temporário. Se tal segurança fosse total e os
custos correspondentes fossem baixos, não haveria necessidade de conservar ativos
monetários ociosos por motivos precaucionais.
Apesar de algumas diferenças importantes entre a procura por moeda pelos
motivos transação e precaução, Keynes (1935) coloca-as lado a lado ao expor a relação
do dinheiro com a taxa de juros. Enquanto os valores para transações se mantenham em
um mínimo, há um ponto em que a conveniência de reter moeda para pagar gastos
regulares não será muito influenciada pela taxa de juros. Assim, tem-se que a
preferência pela liquidez que é relevante em relação à taxa de juros é a originada pelo
motivo especulação, já que as reservas para especulação são particularmente sensíveis
às variações nas taxas de juros (DILLARD, 1986).
A partir da preferência pela liquidez pelo motivo especulação, ou a demanda por
moeda como reserva de valor, é que surgem problemas básicos da teoria monetária. Por
que algum agente preferiria acumular riqueza em forma de moeda sacrificando o
rendimento de juros que poderia obter com títulos? De acordo com Keynes (1935), a
única condição fundamental, sem a qual não poderia manter-se o motivo especulação, é
a incerteza quanto ao futuro da taxa de juros. Um proprietário de riqueza que
desconhece os termos em que poderá converter em moeda seus créditos no futuro tem
razões para acreditar que uma aquisição protelada pode ser preferível a uma aquisição
presente.
As taxas correntes de juros por títulos com distintos vencimentos são sempre
conhecidas, enquanto as que vigorarão no futuro não o são. As taxas correntes de juros
levam em conta, porém, estimativas ou expectativas acerca das taxas futuras de juros.
15
Um agente que acredita saber mais do que a opinião geral estará em condições de
lucrar se suas expectativas provarem ser mais acertadas do que a opinião predominante.
Se não houvesse incerteza, haveria uma clara vantagem em possuir títulos que rendem
juros frente a reter moeda e inexistiria a base para o motivo especulação. É neste ponto
que a teoria de Keynes distingue-se fundamentalmente da teoria clássica dos juros.
Keynes (1935) define o motivo especulação como o meio pelo qual os detentores de
riqueza acalmam sua incerteza acerca do futuro acumulando riqueza em forma de
dinheiro porque o mundo real é dinâmico e o futuro é incerto (DILLARD, 1986).
Os motivos transação e precaução são comuns aos clássicos, já o motivo-
especulação é original de Keynes, que procura mostrar que não é irracional manter
ativos monetários para satisfazer a oportunidades especulativas, desde que os agentes
tenham razões para acreditar em mudanças a seu favor no preço dos títulos e, portanto,
na taxa de juros. A expectativa sobre mudanças futuras na taxa de juros situa-se, assim,
atrás do motivo-especulação. Sob uma expectativa generalizada de alta na taxa de juros
ou de uma queda equivalente no preço dos títulos no futuro, a retenção de saldos
monetários para fins especulativos tende a se elevar; caso contrário, a retenção de
moeda devida a esse motivo tende a diminuir (LOPES; ROSSETTI, 1996).
Uma posição de “baixista” induz a reter moeda na previsão de uma baixa no
preço dos títulos (alta na taxa de juros) e uma posição de “altista” leva à aquisição de
títulos com base na expectativa de uma alta nos seus preços (baixa da taxa de juros). O
preço de mercado se fixará no nível em que a venda dos “baixistas” se equilibrar com as
compras dos “altistas” (KEYNES, 1935).
A inexistência de aversão ao risco implica que a renda total líquida determina a
compra de títulos, se esta for positiva, o agente adquire títulos, sendo denominado touro,
em caso contrário (em que há expectativa que o preço do título caia mais que a taxa de
16
juros), haverá uma decisão pela retenção de moeda e o agente será caracterizado como
urso. A composição do portfólio seria então, unicamente de títulos ou moeda, mas não
ambos simultaneamente. Outra perspectiva considera a possibilidade de composição de
portfólios com títulos e moeda, modificando-se a neutralidade frente ao risco e
considerando a aversão ao mesmo, como em Kahn (1972).
1.1.1 Risco e liquidez
O risco associado à posse de um ativo, segundo Kahn (1972) pode ser de duas
espécies, a saber: risco de renda, referente a variações não-previstas no retorno dos
ativos e risco de capital, ou o risco referente à possibilidade de reduções inesperadas nos
preços dos ativos. Em termos gerais, cada indivíduo apresenta suas preferências em
termos destes tipos de risco. Porém, mantidas constantes as demais condições, quanto
maior o risco de um ativo, maior deve ser sua taxa de retorno para que haja estímulo à
manutenção do ativo no portfólio do investidor.
A distinção fundamental da perspectiva de Kahn (1972) quando comparada às
que consideram o agente como neutro frente ao risco reside no grau de confiança que o
agente possui em relação à sua melhor aposta quanto ao comportamento da taxa de juros
– quanto maior a confiança maior a influência do motivo especulação na composição da
carteira e o resultado se aproxima mais daquele em que o indivíduo é neutro quanto ao
risco.
Mostra-se relevante, também, o papel do motivo precaução, que é afetado pelo
peso do risco de renda e de capital. Se o risco de renda (relacionado ao retorno) for mais
incisivo que o de capital e se a melhor aposta refere-se a uma taxa de juros caindo ou
subindo menos que ela mesma, o motivo precaução levará o agente a optar por um
portfólio composto apenas por títulos. Por outro lado, se o risco de capital for maior que
17
o de renda, com a mesma aposta, o motivo precaução agirá no sentido oposto ao do
motivo especulação. Assim, a indiferença entre títulos e moeda ocorrerá apenas se os
riscos de renda e de capital tiverem a mesma intensidade (SOBREIRA, 2002, p.20).
No que se refere à formação das taxas de juros de curto e longo prazo, destaca-se
a teoria das expectativas, desenvolvida por Hicks (1987). Considerando-se um
empréstimo de longo prazo como uma combinação de renovações de empréstimos de
curto prazo, a taxa de juros de longo prazo seria a média das taxas correntes a curto
prazo e as taxas a curto prazo relevantes a termo, de outra forma, haveria possibilidade
de ganhos de arbitragem que levariam novamente ao equilíbrio entre as taxas.
Partindo-se de uma situação em que os retornos dos títulos de curto e longo
sejam equivalentes, se os investidores entendem, por exemplo, que a taxa de juros
corrente de curto prazo está muito elevada e deve reduzir-se no futuro, então os títulos
de longo prazo parecerão mais atraentes. E isso porque, aos preços atuais, os títulos
longos permitiriam que seus detentores obtivessem, por um período relevante, um
retorno mais alto que o oferecido pelos títulos de curto prazo no futuro. Essa maior
atratividade dos títulos longos levaria ao aumento de sua demanda e preços,
diminuindo, consequentemente, seu retorno. Desta maneira, por um processo de
arbitragem, o mercado faria com que as taxas longas igualem-se às expectativas para o
futuro das taxas curtas.
Por outro lado, como o risco de emprestar a termo é maior que o de emprestar a
curto prazo, já que a taxa futura não é conhecida, deveria haver uma diferença positiva
entre as taxas a termo e de curto prazo. Tal diferença é denominada por Hicks (1987)
de prêmio de risco e igualaria a diferença entre a taxa corrente a curto prazo e a taxa a
termo quando não há expectativa de variação da taxa de curto prazo.
18
Em termos gerais, na teoria das expectativas, a taxa de juros de longo prazo é
constituída como uma média das taxas de juros de curto prazo esperadas para o futuro
mais um prêmio pelo risco. Assim, a inclinação da curva de juros refletiria as
expectativas do mercado sobre mudanças futuras nas taxas de juros, ou seja, um
aumento na diferença entre a taxa longa e a taxa curta refletiria a expectativa de futuros
aumentos nas taxas de curto prazo, provocando então uma correlação positiva entre as
variações nas taxas de juros curtas e a referida diferença. Da mesma forma, um aumento
na taxa longa em relação à taxa curta, no período corrente, deveria levar a um aumento
da taxa longa no período seguinte.
A teoria da preferência pela liquidez indica que a yield curve (curva de
rendimento) é influenciada por algo mais que as expectativas quanto ao futuro das taxas
curtas. Como teoria que explica a estrutura de termo das taxas de juros, ela enfatiza que,
num ambiente em que existe incerteza, ativos de curto prazo são preferíveis aos de
longo, porque aqueles são mais líquidos. Ser mais líquido significa que títulos de curto
prazo podem ser rapidamente convertidos em moeda sem que se incorra em perda
apreciável no valor do principal, mesmo que as taxas variem inesperadamente.
A liquidez dos diversos ativos, de acordo com Davidson (1978), é determinada
pelo seu tempo de conversibilidade em moeda e sua capacidade esperada de retenção do
valor do ativo. Está relacionada à possibilidade de um ativo transformar-se em moeda
sem que haja perda considerável de seu valor. Quanto menor o tempo esperado de
negociação e maior a capacidade esperada de um ativo de reter valor, maior será sua
liquidez. Assumindo, por esse motivo, que a maioria dos agentes prefira reter títulos de
curto prazo, é necessário que um prêmio lhes seja oferecido para que adquiram títulos
mais longos. Caso contrário, seria provável que a maioria dos agentes prefira reter
19
títulos de menor prazo, para minimizar a variação no valor de seus portfólios (COSTA;
DEOS, 1999).
Na “Teoria Geral”, Keynes (1935) formulou sua teoria da preferência pela
liquidez, em que a taxa de juros é “a recompensa por abrir-se mão da liquidez, uma
medida do desejo daqueles que possuem moeda de abrir mão do seu controle sobre ela”
(KEYNES, 1935). Neste modelo, havia apenas dois tipos de ativos - moeda e títulos – e
a taxa de juros paga aos títulos consiste em uma contrapartida por seu menor grau de
liquidez em relação à moeda.
No capítulo 17 da “Teoria Geral”, Keynes generalizou sua teoria da preferência
pela liquidez para uma teoria de precificação de ativos que não mais se baseia na
dicotomia entre ativos líquidos e ilíquidos, mas que toma por base o princípio geral de
que os diferentes graus de liquidez devem ser compensados por uma taxa de retorno
obtida pela posse dos diferentes ativos. Assim, cada classe de ativos possui sua taxa de
juros própria, definida em termos de preços correntes de mercado (PAULA; ALVES
JUNIOR; MARQUES, 2001).
1.1.2 Teoria de portfólio em Keynes
Na teoria da escolha de portfólio, apresentada por Keynes (1935), todos os
ativos existentes em uma economia possuiriam os seguintes atributos em maior ou
menor grau:
• Quase rendas (q): receitas monetárias advindas da utilização de um ativo no
processo de produção (lucros) ou da posse do mesmo (juros e dividendos).
• Custo de manutenção (c): rendimentos negativos associados à manutenção do
ativo em consideração no portfólio dos agentes. Trata-se do custo de estocagem
do ativo, não tendo nenhuma relação com os custos resultantes da utilização do
20
ativo no processo produtivo, ou seja, o que Keynes denominou de custo de uso
do capital.
• Prêmio de liquidez (l): refere-se à conveniência e segurança potenciais
associados à presença de um ativo no portfólio dos agentes
Chamaremos de prêmio de liquidez de certo bem ao montante (medido em termos de si mesmo) que as pessoas estão dispostas a pagar pela conveniência ou segurança potenciais proporcionadas pelo poder de dispor dele (excluindo o rendimento ou os custos de manutenção que lhe são próprios) (KEYNES, 1985, p.159).
• Ganhos ou perdas esperados de capital (a): são os retornos que o investidor
espera obter no momento em que ele decide vender os ativos que possui em
portfólio. No momento da realização desses ativos, podem ocorrer perdas ou
ganhos de capital relativamente ao preço que o investidor pagou pelo referido
ativo. As expectativas a respeito da obtenção de ganhos ou perdas esperados de
capital sobre a revenda de um ativo podem ser muito relevantes no momento em
que o investidor está decidindo pela compra de um determinado ativo.
Nesta abordagem, a preferência pela liquidez se reflete no trade off entre
retornos monetários (a + q – c) e o prêmio pela liquidez da moeda (l), causando assim
substituições na estrutura de demanda por ativos.
O prêmio de liquidez é o atributo mais característico da teoria da escolha de
portfólio de Keynes quando comparada às teorias convencionais, que admitem que
certos ativos devem pagar um prêmio pelo risco para os investidores, de maneira a
compensar o maior risco associado à posse de tais ativos. Ou seja, em equilíbrio, ativos
de maior risco devem oferecer taxa de retorno maior que ativos menos arriscados.
O prêmio de liquidez distingue-se do prêmio pelo risco. A liquidez de um ativo
não é medida pelo risco de perda de capital associado a determinado ativo, mas pela
facilidade com que tais ativos podem substituir a moeda como meio de pagamento, isto
21
é, pela capacidade de conversão de um ativo em dinheiro. Por um lado, um ativo será
tão mais líquido quanto mais rapidamente esse ativo puder ser convertido em meio de
pagamento. Qualquer ativo pode ser convertido em pouco tempo em meio de
pagamento se o preço de venda for suficientemente baixo. Um ativo será, então, mais
líquido quanto maior for o seu preço de realização relativamente ao preço que poderia
ser obtido caso se desse um prazo maior para a realização do mesmo. Quanto maior for
a quantidade de ativos altamente líquidos que os indivíduos possuírem em seus
respectivos portfólios, mais facilmente poderão mudar a composição dos mesmos
quando desejarem (HICKS, 1974).
Num contexto de incerteza, os agentes desejarão manter algum nível de
flexibilidade em seu portfólio, para tanto, desejarão manter parte de sua riqueza como
ativos líquidos, ou seja, aceitarão, até determinado ponto, o sacrifício de maior retorno
monetário em troca de liquidez. Assim, os ativos menos líquidos deverão proporcionar
uma rentabilidade maior como compensação por sua menor liquidez. O prêmio de
liquidez pode, então, ser definido como o retorno implícito que os indivíduos atribuem à
posse de ativos líquidos.
Keynes afirma que reter moeda para fins especulativos, ou seja, adquirir ou não
títulos, é uma decisão que depende fundamentalmente das expectativas dos agentes em
relação às mudanças futuras dos preços dos títulos e o seu conseqüente impacto na
renda total oferecida por eles. Considera-se a renda total líquida esperada de um título
como a soma do ganho de juros, de capital e do valor inicial do principal. Assim, se a
renda líquida total esperada for positiva, o agente adquirirá títulos hoje, sendo
denominado touro. Por outro lado, uma expectativa de renda total líquida negativa
implica a preferência da moeda a títulos, caso em que se tem um agente dito urso. Neste
contexto, o preço ajusta-se às expectativas de ursos e touros de maneira que a
22
quantidade de títulos demandada pelos touros seja igual à quantidade de títulos que os
ursos desejam vender. A decisão de reter moeda baseada na renda esperada exige que o
agente seja totalmente urso ou touro ao decidir a compra de títulos. No que se refere à
aplicação de excedentes monetários em relação aos saldos que devem ser mantidos para
fins transacionais, porém, o comportamento dos agentes econômicos, em termos gerais,
não se assemelha ao previsto por Keynes quanto à retenção de moeda ou aquisição de
títulos. As decisões não são mutuamente excludentes, a maioria dos agentes talvez
prefira combinar moeda e títulos, questão esta abordada por Tobin (1958).
1.1.3 Escolha de portfólio em Tobin
Tobin (1958) desenvolveu, a partir da teoria da demanda especulativa por moeda
de Keynes, uma teoria de seleção de portfólio em que os agentes econômicos não
mantém, necessariamente, toda sua riqueza ou na forma de moeda ou e títulos, mas
consideram a possibilidade de diversificação.
O modelo de Tobin considera que os agentes econômicos levam em conta não
apenas o rendimento dos ativos, mas também seu nível de risco. Os indivíduos
apresentam diferentes níveis de aversão ao risco e, assim, é provável que decidam
manter um portfólio diversificado de moedas e títulos.
Com base em uma comparação de retornos e riscos de títulos alternativos e
moeda, Tobin desenvolveu um modelo de estrutura de portfólio ótimo. Um importante
componente deste modelo consiste na diversificação de tipos de ativos, para o investidor
avesso ao risco. Tobin (1958) apresenta importantes contribuições em relação à teoria
de Keynes, particularmente no que se refere à possibilidade de diversificação.
O retorno total dos títulos resulta, como em Keynes, da soma da taxa de juros
mais os ganhos de capital. Os últimos, porém, não são um valor esperado único, mas
23
uma distribuição de probabilidades cuja média (g) é assumida como o ganho mais
provável. Os retornos observados ao longo do tempo diferem da sua média, para mais
ou para menos, de maneira que os desvios positivos compensam os negativos. O
investidor, porém, não sabe se o desvio da rentabilidade de seu título será positivo
(retorno acima da média) ou negativo (retorno abaixo da média). Conhece, porém, com
base em dados históricos, como estes retornos têm se comportado. O risco é associado
por Tobin à variabilidade da taxa de retorno, ou seja, quanto mais dispersa a taxa de
retorno em torno da média, maior o risco do título em questão. Tobin identificou o
desvio padrão da distribuição dos ganhos prováveis de capital como o risco inerente à
aquisição de títulos. Desta maneira, quanto menos concentrada a distribuição, menor
será a probabilidade de ocorrerem valores muito próximos ao valor médio esperado dos
ganhos de capital e, portanto, maior o risco inerente à carteira de títulos.
Considere-se que um investidor não conhece a taxa de juros futura dos títulos,
assim, o investimento em tais títulos implica um risco de ganho ou perda de capital.
Quanto maior a proporção de seu investimento mantida em títulos, maior o risco que o
investidor assume, aumentando também, o seu retorno esperado. As linhas semelhantes
a OC1 indicam que o investidor pode esperar um maior retorno ao assumir um risco
mais elevado. Já na parte inferior da figura, o eixo vertical à esquerda indica a
proporção investida em títulos. A linha OB, por exemplo, mostra o risco como
proporcional à participação dos títulos (TOBIN, 1958).
Na parte superior da figura 1, o eixo vertical representa o retorno esperado e, o
eixo horizontal, o risco. A carteira é composta por um montante A1 de moeda (parte
inferior da figura 1 à direita) e A2 de títulos (parte inferior da figura 1 à esquerda), em
que A1 + A2 = 1. A proporção que o investidor possui em títulos (A2), determina seu
retorno esperado µr e seu risco σr. O investidor pode obter um maior retorno esperado
24
às custas de um maior risco. A linha de restrição (OC1), para r=r1 tem como tangente
r1/σg. Para uma taxa de juros mais elevada r2, a linha de restrição seria OC2 . A relação
entre risco e investimento em títulos é indicada pela linha OB na parte inferior da figura
1.
Os agentes econômicos, segundo Tobin (1958), expressam suas preferências por
meio de um conjunto de curvas de indiferença entre retorno total e risco assumido. A
seqüência dos pontos que compõe estas curvas de indiferença correspondem às
diferentes combinações de retornos e riscos que proporcionam aos agentes econômicos
um mesmo grau de satisfação. A escala de preferência do investidor é representada pela
denominada curva de indiferença. Essa curva é compreendida como um reflexo da
atitude que um investidor assume diante do risco de uma aplicação e do retorno
produzido pela decisão, envolvendo diversas combinações também desejáveis.
Assume-se, em Tobin (1958) que o investidor tem preferências entre retorno µr e
risco σr que podem ser representadas por um campo de curvas de indiferença. O
investidor é indiferente a todos os pares (µr; σr) que se encontram em tal curva, tal
como na Figura 1. Os pontos em I2 são preferidos a aqueles em I1; para um dado risco,
um investidor sempre prefere um retorno maior a um menor.
25
Figura 1 – Seleção de portfólio a diversas taxas de juros
Fonte: adaptado de Tobin (1958)
Os agentes econômicos só estão dispostos a aceitar maiores riscos se receberem,
em troca, um retorno total maior. Para investir em títulos que apresentem maior risco –
maior dispersão, mensurada pela variância da distribuição de rentabilidade – os agentes
exigem um maior retorno. Assim, pode haver opções de taxas de retorno e risco que são
equivalentes da perspectiva do investidor (oferecem igual grau de satisfação), por
exemplo, um título de elevado risco e elevado retorno e outro de baixo risco e baixo
retorno. As combinações de taxas de retorno e risco percebidas como equivalentes
I1
I2
I3
µr
σr
C3
C2
C1
T1
T2
T3
A2
O
B B1 B
A2 (r2)
A2 (r1)
A2 (r3)
A1 (r1)
A1 (r2)
A1 (r3) A1
26
constituem a curva de indiferença, em cujos pontos a utilidade esperada é constante.
Na escala de preferências, coexistem inúmeras possibilidades de investimentos
igualmente atraentes ao investidor, que concebem semelhantes graus de utilidade
(satisfação) em relação ao risco retorno esperados.
Para alguns investidores, os amantes do risco (risk-lovers), as curvas de
indiferença são negativamente inclinadas. Estes agentes estão dispostos a aceitar
retornos esperados menores de maneira a ter a possibilidade de alcançar ganhos de
capital muito elevados permitidos por altos valores de σr. Os avessos ao risco (risk-
averters), por outro lado, não aceitarão maiores riscos a menos que a eles estejam
associados a maiores retornos esperados. Suas curvas de indiferença serão
positivamente inclinadas.
Os ganhos são proporcionais ao montante de títulos e estes aos riscos assumidos.
No ponto inicial desta linha (OB) não há riscos, com a totalidade dos ativos financeiros
para especulação sob forma monetária. No outro extremo, atinge-se o ponto máximo do
risco, quando a totalidade dos ativos está na forma de títulos. Esta linha também pode
ser vista como equivalente a uma restrição orçamentária, indicando o montante de
recursos livres para fins especulativos.
Dado que os agentes possuem uma quantidade limitada de recursos a alocar em
seu portfólio, a quantidade máxima de títulos que pode ser adquirida é restrita por este
limite, assim como o montante de moeda. Em quaisquer alocações que combinem
títulos e moeda, sua soma deve equivaler à quantidade total de recursos.
A maximização da satisfação dos agentes econômicos, quanto à combinação de
retornos e riscos se dá no ponto em que uma de suas dadas curvas de indiferença é
tangenciada pela linha equivalente de restrição orçamentária.
27
O melhor portfólio possível para o agente econômico é aquele cuja combinação
de risco e retorno oferece o maior grau de satisfação, dentre as opções permitidas pela
sua restrição de recursos.
O investidor decide a quantidade a investir em títulos de maneira a atingir a
curva de indiferença mais alta permitida pela sua curva de restrição. Esta maximização
pode se dar de três maneiras:
• Tangência entre uma curva de indiferença e linha de restrição, tal como ilustrado
pelos pontos T1, T2 e T3 na figura 1. Um máximo regular deste tipo pode
ocorrer apenas para um investidor avesso ao risco e levará à diversificação.
Ambos A1, moeda e A2, títulos, serão positivos. Estes são também indicados na
figura 1, na metade inferior em que, por exemplo, A1(r1) e A2(r2) indicam o
montante de moeda e títulos correspondente ao ponto T1.
• Um máximo no ponto µr = r, σr=σg, como ilustrado na figura 2. Na figura 2, a
curva de restrição é o raio OC e o ponto C representa o retorno esperado e risco
mais elevados alcançáveis pelo investidor, por exemplo, ao manter apenas
títulos. O máximo de utilidade em C pode ocorrer tanto para o avesso ao risco
quanto para o propenso ao risco. I1 e I2 representam curvas de indiferença de
um diversificador. I´1 e I´2 representam as curvas de indiferença de um agente
propenso ao risco, para quem é claro que C é sempre a posição ótima (TOBIN,
1958).
• Uma solução na origem, em que se mantém apenas moeda.
28
Figura 2 – Curvas de indiferença de propensos ao risco e diversificadores: Portfólio
ótimo com risco e retorno esperado máximos
Fonte: Tobin (1958)
Na análise de Tobin, verifica-se que o comportamento racional do avesso ao
risco implica uma carteira composta tanto de moeda como de títulos. Para isso, Tobin
baseia-se na hipótese de que o investidor não tem certeza sobre a futura taxa de juros, o
que lhe proporciona a mesma probabilidade de subestimar como de superestimar essa
taxa (TORRES, 1979).
Tobin (1987) demonstrou que, para uma determinada incerteza que se tem em
relação à taxa de juros futura, o investidor assumirá maiores riscos quanto maior a
proporção dos títulos no total de sua carteira. Assim, se mantém sua carteira
inteiramente formada por títulos, maximizará os rendimentos e conseqüentemente
assumirá o maior risco possível de perda ou ganho de capital. Por outro lado, se todos
os recursos forem mantidos em moeda, a carteira exibirá risco zero, no entanto, o
rendimento também será zero.
Entretanto, a manutenção simultânea dos recursos em títulos e moeda não se
baseia, apenas, na crença de que a taxa de juros move-se apenas em um único sentindo.
µr
σr
I1
I2
I´2
I´1
r
σg o
c
29
Mas na hipótese de que os investidores não têm certeza para que lado à taxa de juros se
moverá. Além disso, segundo Torres (1979, p.149), a teoria da preferência pela liquidez
determinada pelo comportamento em relação ao risco pode ser estendida para o
problema de escolha de ativos quando existem mais de duas alternativas. Ou seja, não
somente moeda e títulos, mas para um número maior de ativos disponíveis no mercado
financeiro.
Para um mesmo nível de risco, um investidor avesso ao risco prefere o ativo com
maior retorno esperado. Enquanto, para dois ou mais ativos que apresentam o mesmo
retorno esperado, o investidor avesso ao risco escolhe aquele de menor risco. Este
critério racional de decisão induz a concluir que os investidores, de uma maneira geral,
procuram o retorno em suas decisões, demonstrando certo grau de aversão ao risco.
O comportamento padrão dos investidores tem sido considerado como o de
aceitar maiores níveis de risco apenas quando a estes estiverem associados retornos
esperados mais altos, ou seja, os investidores são considerados avessos ao risco
(SIMONSEN, 1983). Assim, postula-se, aqui, o investidor típico como avesso ao risco.
Analisa-se, a seguir, a construção da fronteira eficiente em termos de risco e
retorno, tal como proposto por Markowitz.
1.2 Fronteira eficiente
Markowitz (1952) afirma que um bom portfólio de ativos é mais que uma grande
lista de ações e títulos. É um conjunto balanceado, que fornece ao investidor proteções e
oportunidades em um conjunto amplo de situações. Foi a partir de seu artigo inicial
(1952) que se desenvolveram e incrementaram todos estudos sobre a construção de
carteiras de ativos de risco.
30
Segundo Markowitz (1952), o objetivo da análise de portfólios é encontrar as
carteiras que melhor se adaptem aos objetivos do investidor. Markowitz rejeita a
hipótese de que o investidor busca maximizar a taxa de retorno de seu investimento,
mostrando que esta não é suficiente para explicar as razões da diversificação de
carteiras por parte dos investidores. A seguir mostra que, se o investidor levar em
consideração tanto o retorno esperado quanto a variância desse retorno, então é possível
construir um modelo que não apenas é capaz de explicar as razões da diversificação
como também de propor um processo decisório para a seleção de carteiras ótimas
segundo as preferências de cada investidor.
O modelo média-variância desenvolvido por Markowitz (1952) é um trabalho
pioneiro na área de otimização de portfólio. No modelo proposto por este autor, as duas
únicas variáveis que interessam à satisfação do investidor são o retorno esperado e o
risco, expresso pela variância desses retornos. Além disso, ele assume que os
investidores são avessos ao risco, o que resulta no conhecido princípio da Dominância,
ou seja: Um investidor irá escolher seu portfólio ótimo do conjunto de portfólios que
oferecer o máximo retorno esperado para diferentes níveis de risco, e oferecer o mínimo
risco para diferentes níveis de retorno esperado.
Tal proposição parte do princípio que, para o investidor, o retorno esperado e a
volatilidade dos prováveis retornos são aspectos cruciais na definição do portfólio
ótimo. Markowitz lança mão de medidas estatísticas de valor esperado e variância da
distribuição dos retornos para descrever, respectivamente, o retorno e o risco do
investimento.
O problema é formulado de modo a se minimizar o risco do portfólio para um
dado nível de retorno requerido pelo investidor, ou maximizar o nível de retorno
esperado do portfólio associado a um dado nível de risco.
31
O risco de uma carteira, porém, depende não somente do risco de cada ativo
que a compõe e de sua participação no investimento total, mas também da forma como
seus componentes se relacionam (covariam) entre si. Assim, relacionando-se ativos com
baixa correlação (ou covariância inversa), é possível reduzir-se o risco total de uma
carteira (ROSS et al., 1995).
A diversificação científica proposta por Markowitz consiste em compor uma
carteira de investimento com diferentes tipos de ativos, ativos estes que sejam afetados
por distintos fatores. Os comportamentos dos retornos dos ativos devem ser diferentes
entre si. Assim, flutuações adversas no retorno de um ativo não seriam acompanhadas
da mesma forma pelos demais, compensando o efeito do primeiro. A relação entre os
comportamentos dos ativos pode ser quantificada por meio do coeficiente de correlação,
que varia de +1 a -1. Os valores positivos indicam que os retornos dos ativos movem-se
na mesma direção, enquanto valores negativos mostram movimentos em sentidos
opostos.
A Teoria de Portfólio em Markowitz trata da seleção de investimentos que
maximizem a utilidade esperada do investidor, em termos de retorno esperado e risco.
Por meio de métodos quantitativos e dados históricos, esta teoria estima valores para o
retorno esperado e risco de diferentes investimentos e, com base em tais informações,
indica como construir uma carteira adequada à combinação risco-retorno mais
apropriada para cada perfil de investidor.
32
Figura 3 –Fronteira Eficiente
Fonte: adaptado de Markowitz
Relacionando-se diferentes riscos a seus níveis de retorno máximo, obtém-se a
curva com a relação risco e retorno, denominada fronteira eficiente (Figura 3).
Com base nos valores esperados e riscos calculados para as diversas
combinações possíveis da carteira, deverá o investidor, considerando sua curva de
indiferença, isto é, seu grau de aversão ao risco, eleger a melhor combinação possível de
ativos.
A seleção da carteira de investimento mais atraente para um investidor racional,
que avalia a relação risco/retorno em suas decisões, fica restrita às combinações
disponíveis no trecho MW (Fronteira Eficiente), pois insere todas as carteiras possíveis
de serem construídas. Em outras palavras, na fronteira eficiente é possível selecionar
uma carteira que apresenta, para determinado retorno, o menor risco possível.
O ponto M representa uma carteira de ativos que oferece o menor risco possível.
É geralmente conhecida por carteira de variância mínima. Investidores com nível mais
alto de aversão ao risco escolherão, evidentemente, carteiras mais próximas do ponto M,
ocorrendo o inverso com aqueles que apresentam maior indiferença ao risco.
M
Desvio padrão
Retorno esperado
Fronteira eficiente
A
W
33
A carteira M, por envolver o risco mínimo, é preferencial a todas as demais
carteiras que oferecem um retorno esperado menor. Diz-se que M domina todas as
demais carteiras que se encontram abaixo dela.
O investidor racional deverá escolher, portanto, a combinação que maximiza o
retorno esperado para um menor nível possível de risco. As alternativas de investimento
que atendam a essa orientação são aquelas dispostas ao longo do segmento MW, e são
denominadas por Markowitz de eficientes. Qualquer carteira situada à direita da linha
MW (conjunto eficiente) produz maior risco para o mesmo retorno esperado, ou o
mesmo nível de risco para um menor retorno esperado (ROSS et al, 1995).
Tobin (1958) propôs uma solução para o problema de encontrar a carteira ótima
que independe do formato das curvas de utilidade de cada investidor. Acrescentando à
carteira um ativo livre de risco, ou seja, um ativo cuja rentabilidade esperada é
conhecida com 100% de probabilidade, Tobin demostrou que qualquer investidor que
aceite o Princípio de Dominância irá possuir a carteira de ativos de risco com a maior
relação (prêmio pelo risco / risco), utilizando o ativo livre de risco para ajustar suas
preferências por risco ou retorno.
Nesse caso, para obtermos as carteiras possíveis a partir da escolha de um
portfólio específico sobre a fronteira eficiente, basta unirmos o portfólio selecionado ao
ativo livre de risco. A reta obtida representa todas as combinações possíveis entre o
ativo livre de risco e o ponto selecionado sobre a fronteira.
Fixando-se o retorno do ativo livre de risco, nota-se que infinitos pontos sobre a
fronteira eficiente podem ser utilizados para formar a carteira (ativos de risco e ativo
livre de risco). No entanto, dentre essas infinitas composições, há uma em especial que
permite a criação de carteiras que dominam todas as outras possibilidades em termos de
menor risco e maior retorno. Essa carteira corresponde ao ponto em que a reta risco-
34
retorno do portfólio (ativos de risco e ativo livre de risco) é uma tangente à Fronteira
Eficiente de Ativos de Risco.
Figura 4 – Fronteira eficiente geral
Fonte: adaptado de Markowitz
Esta reta corresponde ao portfólio de ativos de risco para o qual cada unidade de
risco acrescida permite o maior aumento de rentabilidade. É portanto o portfólio de
máxima razão entre prêmio pelo risco por unidade de risco acrescida, e isso pode ser
verificado facilmente do ponto de vista geométrico, pois a reta tangente é a de maior
coeficiente angular dentre as possíveis retas.
Quando se assume a existência de um ativo livre de risco e a medida de risco
utilizada é o desvio-padrão, a relação (prêmio pelo risco / risco) consiste no índice de
Sharpe (1995), expresso por: i
fi rRIS
σ
−= em que rf é o retorno do ativo livre de risco.
De acordo com Markowitz (1959), o processo de construção de portfólios ou
carteiras de ativos é caracterizado por três elementos fundamentais:
• A informação referente aos ativos sobre os quais se baseia;
Desvio padrão
Retorno esperado
rf
Fronteira eficiente geral
35
• Os critérios para classificação dos melhores e piores portfólios, que definem os
objetivos da análise;
• Os procedimentos computacionais, através dos quais os portfólios que atendem
aos critérios são obtidos a partir dos inputs .
Markowitz ressalta que os resultados da análise de portfólios não são mais que
as conseqüências lógicas das informações sobre os ativos, evidenciando assim a
importância da utilização de informações adequadas no processo de construção de
carteiras.
A otimização da construção da fronteira eficiente é desenvolvida por diferentes
investidores que utilizam dados distintos para obter fronteiras eficientes diferentes, o
que levará a carteiras ótimas diferentes. Assim, a competição entre os investidores se
dará na análise dos ativos que determinam as suas escolhas.
James Tobin (1958) introduziu a propriedade de separação, segundo a qual a
escolha da carteira pode ser separada em duas tarefas. A primeira determina a carteira
de risco ótima (O), portanto, puramente técnica. A segunda depende da preferência
pessoal de cada cliente, pois é este quem toma a decisão.
A partir de Tobin (1958), diversas análises de mercados financeiros têm
mostrado que as decisões de alocação em portfólio podem ser reduzidas a um processo
em dois estágios, a decisão da alocação relativa de ativos entre ativos com risco e a
divisão da riqueza total entre ativos com risco e ativos livres de risco. Esta é
denominada a separação monetária (JUDD; KUBLER; SCHMEDERS, 2005). O
resultado da separação monetária em dois fundos e sua generalização para n fundos
dependem de premissas especiais sobre retornos e preferências. Particularmente, Cass e
Stiglitz (1970) mostraram que a separação monetária em dois fundos mantém-se se um
investidor apresenta utilidade HARA (hyperbolic absolute risk aversion - aversão
36
hiperbólica absoluta ao risco). De acordo com a teoria de separação de fundos com um
ativo sem risco, a proporção de diferentes ativos com risco na parcela de ativos de risco
no portfólio não depende da aversão ao risco do investidor. Segundo a teoria da
separação, os investidores racionais deveriam alocar seus ativos entre um ativo sem
risco e um fundo mútuo com risco, cuja composição é a mesma para todos os
investidores. A aversão ao risco afetaria apenas a alocação entre o ativo sem risco e o
fundo. No entanto, dadas certas premissas, o grau de aversão ao risco afetaria a
composição do portfólio1.
Discutiram-se, neste capítulo, razões para a preferência pela liquidez, tanto na
perspectiva de Keynes, quanto no que se refere a Tobin ao tratar a preferência pela
liquidez como comportamento em relação ao risco. Tal análise conduz a postular o
investidor típico como avesso ao risco e disposto a incorrer em riscos mais elevados
apenas em troca de um maior retorno esperado. Dada esta premissa, pode-se
desenvolver, tal como proposto por Markowitz, uma fronteira eficiente, combinações de
risco e retorno, tal que, para um dado risco, tem-se o maior retorno esperado. As
escolhas eficientes são aquelas que se encontram em tal fronteira. O ponto da fronteira
pelo qual dar-se-á a escolha do investidor depende de sua função utilidade.
Os fundos de investimento consistem em portfólios de ativos gerenciados por
profissionais e divididos entre seus proprietários, ou cotistas, em parcelas denominadas
cotas. Assim, a gestão de um fundo de investimento, ou a composição de seu portfólio
toma por base a fronteira eficiente e se localiza nesta em função do perfil dos
1 Consultorias financeiras e o conselho “popular” recomendam diferentes composições de portfólio em função do grau de aversão ao risco do investidor. Neste sentido, Bajeux-Besnainou, Jordan e Portait (2001) buscam apoio teórico para tal recomendação. Seu argumento central baseia-se em dois pontos, que o horizonte do investidor pode exceder a maturidade do ativo livre de risco e que o investidor reformula seu portfólio ao longo do tempo. Se o horizonte do investidor ultrapassa a maturidade do ativo livre de risco, então tal ativo não é o ativo sem risco considerado normalmente na teoria básica. Em uma teoria que permita a reformulação do portfólio, contrariamente a um arcabouço de comprar-e-manter, seria razoável considerar que o investidor pode sintetizar um ativo livre de risco, utilizando um fundo de títulos e um ativo líquido. Nesse caso, Bajeux-Besnainou, Jordan e Portait (2001) mostram que a taxa teórica de títulos livres de risco/com risco varia diretamente com a aversão ao risco para qualquer investidor HARA.
37
investidores em termos de sua função utilidade. Uma administradora de ativos pode
servir uma gama de clientes com reduzido aumento de custos, visto que a carteira ótima
é mesma para todos os clientes, sendo que o gerenciamento profissional custa menos e é
mais eficiente.
O próximo capítulo propõe-se a discutir a composição do portfólio dos fundos
de investimento, particularmente no que se refere a um tipo de ativo em especial, os
títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal interna.
38
2 FUNDOS DE INVESTIMENTO NO BRASIL
O presente capítulo tem por objetivo descrever a indústria de fundos de
investimento no Brasil e, principalmente, mostrar sua evolução e atuação no mercado da
Dívida Pública Mobiliária Federal interna, basicamente fundamentada na liquidez dos
títulos públicos federais. Buscar-se-á ainda abordar a origem dos fundos de
investimento, bem como contextualizar a indústria brasileira de fundos no ranking
mundial.
2.1 Histórico
Os fundos de investimento têm sua origem em meados do século XIX na
Europa, constituídos por banqueiros e corretores que visualizaram a possibilidade de
oferecer administração financeira profissional aos pequenos investidores (HISTORY...,
2003). Esta é uma das principais vantagens dos fundos de investimento – permitir a
pequenos investidores o acesso a ativos que não poderiam adquirir individualmente,
assim como a possibilidade de contar com uma administração qualificada de seu
portfólio.
O primeiro fundo mútuo moderno foi o Massachusetts Investor Trust, fundado
em 1924 e, diferentemente dos anteriores, foi formado como condomínio aberto,
permitindo uma oferta contínua de novas cotas e a renegociação de cotas já existentes
que poderiam ser vendidas a qualquer momento com base no valor corrente dos ativos
do fundo. Após um recuo importante na grande depressão pós 1929, os fundos foram
regulamentados na década de 30 nos EUA. No final da década de 1960, já havia
aproximadamente 270 fundos mútuos com US$ 48 bilhões em ativos (ROCHA, 2003).
39
Os ativos líquidos totais em fundos de investimento, que se aproximavam de
US$ 9.350 trilhões em 1998, atingiam o montante de US$ 14.000 trilhões em 2003 tal
como detalhado na Tabela 1.
Tabela 1 - Ativos líquidos totais em Fundos mútuos (US$ milhões, fim do ano) 1998 1999 2000 2001 2002 2003 Total Mundial
$9.343.272 $11.391.138 $11.871.061 $11.654.904 $11.324.131 $13.957.564
Américas 5.867.187 7.264.471 7.424.146 7.433.144 6.776.291 7.969.224 Argentina 6.930 6.990 7.425 3.751 1.021 1.916 Brasil 118.687 117.758 148.538 148.189 96.729 171.596 Canadá 213.451 269.825 279.511 267.863 248.979 338.369 Chile 2.910 4.091 4.597 5.090 6.705 8.552 México N/A 19.468 18.488 31.723 30.759 31.953 EUA 5.525.209 6.846.339 6.964.667 6.974.951 6.390.360 7.414.084 Europa 2.743.228 3.203.401 3.296.015 3.167.963 3.463.000 4.592.582 Áustria 57.447 56.254 56.549 55.211 66.877 87.982 Bélgica 56.339 65.461 70.313 68.661 74.983 98.724 Finlândia 5.695 10.318 12.698 12.933 16.516 29.967 França 626.154 656.132 721.973 713.378 845.147 1.148.446 Alemanha 190.520 237.312 238.029 213.662 209.168 276.319 Grécia 32.122 36.397 29.154 23.888 26.621 38.394 Hungria 1.476 1.725 1.953 2.260 3.992 3.936 Irlanda 50.337 95.174 137.024 191.840 250.116 360.425 Itália 439.701 475.661 424.014 359.879 378.259 478.734 Holanda 80.120 94.539 93.580 79.165 84.211 N/A Noruega 11.148 15.107 16.228 14.752 15.471 21.994 Polônia 506 762 1.546 2.970 5.468 8.576 Portugal 22.574 19.704 16.588 16.618 19.969 26.985 Rússia 29 177 177 297 372 851 Espanha 238.917 207.603 172.438 159.899 179.133 255.344 Suécia 54.923 83.250 78.085 65.538 57.992 87.746 Suíça 69.151 82.512 83.059 75.973 82.622 90.772 Reino Unido 277.551 375.199 361.008 316.702 288.887 396.523 Ásia e Pacífico
720.697 905.031 1.133.979 1.039.236 1.063.857 1.361.298
Austrália 44.124 N/A 341.955 334.016 356.304 518.411 Hong Kong 98.767 182.265 195.924 170.073 164.322 255.811 Índia 8.685 13.065 13.507 15.284 20.364 29.800 Japão 376.533 502.752 431.996 343.907 303.191 349.148 República da Coréia
165.028 167.177 110.613 119.439 149.544 121.488
Nova Zelândia
7.250 8.502 7.802 6.564 7.505 9.641
Taiwan 20.310 31.153 32.074 49.742 62.153 76.205 Africa 12.160 18.235 16.921 14.561 20.983 34.460 África do Sul 12.160 18.235 16.921 14.561 20.983 34.460 Fundos de fundos não estão incluídos. N/D=não disponível Fonte: European Federation of Investment Funds and Companies, Investment Company Institute.Disponível em http://www.ici.org/stats/mf/04fb_datasec5.pdf
A indústria brasileira de fundos mostra um significativo crescimento no período
de 1998 a 2003, da ordem de 45%, apesar da forte queda em 2002. A indústria
40
doméstica de fundos, bem como sua definição e características peculiares serão
abordadas a seguir.
2.2 Definição e classificação
Um fundo de investimento consiste em uma comunhão de recursos, constituída
sob a forma de condomínio, destinada à aplicação em títulos e valores mobiliários, bem
como em quaisquer outros ativos disponíveis no mercado financeiro e de capitais. Os
fundos podem ser classificados, de acordo com a CVM, tal como expresso no Quadro 1.
Quadro 1 - Classificação dos Fundos de Investimento Classes Ativos Riscos
Curto Prazo
Títulos públicos federais, títulos privados, prefixados ou pós-fixados, com prazo máximo a decorrer de 375 dias, e prazo médio da carteira do fundo inferior a 60 dias.
Prefixados ou indexados à taxa Selic, ou a outra taxa de juros, bem como indexados a índices de preços. Os títulos privados deverão ser classificados como baixo risco de crédito.
Referenciados Devem manter no mínimo 80% de seu patrimônio representado por títulos públicos federais ou títulos privados. Limite mínimo de 95% da carteira composta por ativos financeiros indexados ao indicador de desempenho do fundo
Indexador de referência. Admite-se somente títulos privados classificados como de baixo risco de crédito.
Renda Fixa Possuir no mínimo 80% da carteira em ativos associados diretamente, ou sintetizados via derivativos, ao fator de risco que dá nome a classe
Variação da taxa de juros doméstica ou índice de preços, ou ambas
Fundo de Ações
Fundo Cambial
Fundo de Dívida Externa
Multimercado
Possuir no mínimo 67% da carteira em ações admitidas à negociação no mercado à vista de bolsa de valores ou mercado de balcão organizado
Possuir no mínimo 80% da carteira em ativos associados diretamente, ou sintetizados via derivativos, ao fator de risco que dá nome a classe
Deverão aplicar no mínimo 80% de seu patrimônio em títulos da dívida externa da União, sendo permitido até 20% em outros títulos de crédito transacionais no Mercado internacional
Políticas de investimento que envolvam ativos de vários fatores de risco, sem o compromisso de concentração em nenhum fator em especial
Variação de preços de ações
Variação de preço de moeda estrangeira, ou a variação do cupom cambial
Variação dos títulos da dívida externa e cambial
Diversas classes de ativos
Fonte: Instrução CVM no 409 de 18/08/2004
41
A instrução CVM no 409, de 18/08/2004, estabelece critérios de composição
das carteiras dos fundos de investimento, em função da classe a que cada um pertence.
Mas, apesar de existirem sete classes de fundos com composições distintas, observa-se a
possibilidade principal de escolha entre ativos da dívida pública e/ou privada. Assim
sendo, fica afastada a obrigatoriedade de aquisição de títulos públicos em detrimento
dos títulos privados, pelo menos nos termos da legislação vigente.
2.3 Evolução patrimonial
Os primeiros fundos de investimento do Brasil surgiram na década de 1950,
entre os quais os fundos Crescinco e Deltec e posteriormente, os fundos 157, de
incentivos fiscais. Estes se limitavam a aplicações no mercado de ações. Foi na década
de 1990, porém, com o controle da inflação no plano real que a indústria brasileira de
fundos inicia seu desenvolvimento de maneira mais significativa (ROCHA, 2003).
Recentemente, o mercado financeiro e de capitais têm crescido de maneira
significativa no Brasil, não só em diversidade de produtos e de serviços, mas também
em volume. A estabilização econômica do país fez com que as pessoas buscassem um
melhor planejamento financeiro, nesse sentido, a demanda por ferramentas de
investimento tem aumentado, visto que os investidores esperam garantir um futuro mais
tranqüilo.
Há praticamente um consenso entre os profissionais da área financeira de que é
muito melhor para um investidor diversificar sua carteira a apostar em um só
investimento, o que tem fundamento em Markowitz. A diversificação permite que
perdas em uma aplicação possam ser compensadas por ganhos em outras. Contudo,
montar uma carteira individual torna-se muitas vezes caro para um pequeno investidor e
o conhecimento para comprar ou vender no momento certo demanda tempo e
42
experiência. É aqui que os administradores/Gestores de fundos buscam facilitar essa
tarefa.
Os fundos de investimento, exceção quando se trata de fundos exclusivos, são
compostos por vários aplicadores, denominados cotistas, que juntos detêm maior poder
de compra, o que possibilita investir em vários ativos financeiros, diversificando o
portfólio.
Os cotistas dos fundos de investimentos, em especial as pessoas físicas,
normalmente não possuem conhecimento profundo sobre o mercado de valores
mobiliários, seus riscos e características dos diferentes ativos. Tomam, como base de
decisão informações fornecidas pelo administrador/gestor dos fundos. O indício mais
evidente utilizado pelo potencial cotista é, possivelmente, o da rentabilidade histórica,
aliado ao da liquidez do investimento.
Nos últimos anos, os fundos de investimento, particularmente os mais
conservadores (referenciados DI e renda fixa), têm se mostrado como uma das
alternativas mais interessantes para o poupador quando comparados às outras
possibilidades de investimento de baixo risco. Entre as vantagens dos fundos de
investimento, incluem-se a diversificação da carteira e conseqüente redução de risco,
administração profissional contínua de profissionais experientes e preparados para
identificar alternativas com mais propriedade do que os cotistas, e liquidez diária,
permitindo a rápida conversão das cotas (ROCHA, 2003).
No que se refere a risco, retorno e liquidez, os fundos de investimento,
particularmente os conservadores, tem se mostrado muito atrativos quando comparados
às outras alternativas de investimento disponíveis - em termos de combinação de risco,
retorno e liquidez - particularmente para o investidor avesso ao risco.
43
A poupança tem mostrado rentabilidade inferior ao dos FI’s, inclusive, em
determinados momentos, com juro real negativo, quando balizada por indicadores de
preços tais como o IGPM.
O CDB, ou Certificado de Depósito Bancário, consiste em um título de captação
de recursos utilizado por bancos comerciais, bancos de investimento, bancos de
desenvolvimento e bancos múltiplos. Ao contrário dos fundos de investimento, há nos
CDBs a concentração do risco de crédito em apenas uma instituição, a que emite o
papel. Por outro lado, podem ocorrer oscilações de rendimento quando o investidor
retira os recursos antes da data de vencimento da aplicação, caso em que é necessário
renegociar os rendimentos com a instituição financeira. Como alternativa, alguns bancos
oferecem CDBs com liquidez diária, mas isso significa redução de rentabilidade dos
mesmos.
Estes benefícios comparativos dos fundos de investimento sugerem razões para
seu forte crescimento nos últimos anos. De acordo com dados da ANBID, em dezembro
de 1993, havia apenas 91 fundos de investimento no país. Este número cresce
incisivamente a partir do plano real, atingindo 2920 fundos em dezembro de 2004.
Figura 5 – Número de fundos de investimento no Brasil
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
dez
-93
dez
-94
dez
-95
dez
-96
dez
-97
dez
-98
dez
-99
dez
-00
dez
-01
dez
-02
dez
-03
dez
-04
Fonte: ANBID
44
Em 1991, o saldo de aplicações em Caderneta de Poupança era quase 120 vezes
maior que o patrimônio líquido total dos fundos. Tal situação modifica-se radicalmente
na segunda metade dos anos 90. Os investidores que antes consideravam a poupança
como o investimento mais seguro passaram a perceber os fundos de investimento como
uma alternativa mais atraente, apesar da tributação (ROCHA, 2003).
O patrimônio líquido dos fundos de investimento incrementou-se em termos
reais, quase 500% entre dezembro de 1993 e o mesmo mês de 2004, como ilustrado na
Figura 6.
Este crescimento da indústria de fundos de investimento pode ser explicado pela
sua atratividade para os investidores qualificados e não qualificados2 frente a outras
opções de investimento.
Figura 6 – Patrimônio líquido dos fundos de investimento no Brasil
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
600.000
700.000
dez
-93
dez
-94
dez
-95
dez
-96
dez
-97
dez
-98
dez
-99
dez
-00
dez
-01
dez
-02
dez
-03
dez
-04
R$
milh
ões
Fonte: ANBID Valor real - base dez 2004, deflacionado pelo IGP-M
2 A CVM – Comissão de Valores Mobiliários editou legislação específica que dispõe sobre a constituição, administração, funcionamento e a divulgação de informações dos fundos de investimento. Tal medida visou aumentar a transparência deste mercado e a proteger o pequeno investidor, designado investidor não qualificado.
45
No que se refere à distribuição deste patrimônio entre os diferentes segmentos
de fundos, destacam-se, em conjunto, os referenciados DI e de renda fixa, que vêm
respondendo por mais da metade do montante da indústria de fundo de investimentos.
Figura 7 – Participação de Fundos Referenciados DI no mercado de fundos
0
10
20
30
40
1999 2000 2001 2002 2003 2004
%
Fonte: ANBID Os fundos referenciados DI, segundo a ANBID, objetivam investir, no mínimo,
95% do valor de sua carteira em títulos ou operações que busquem acompanhar as
variações do CDI ou SELIC, estando também sujeitos às oscilações decorrentes do
ágio/deságio dos títulos em relação a estes parâmetros de referência. O montante não
aplicado em operações que busquem acompanhar as variações destes parâmetros de
referência devem ser aplicados somente em operações permitidas para os fundos de
curto prazo. Estes fundos seguem as disposições do artigo 94 da Instrução CVM 409.
Conforme pode ser observado na figura 7, no período analisado neste estudo,
nota-se uma redução da participação deste segmento que detinha aproximadamente 30%
do total da indústria em 1999, para em torno de 20% no final de 2004. Este fato pode
ser atribuído à migração para fundos de outras classes, mais precisamente multimercado
como será demonstrado mais à frente.
46
Figura 8 – Participação de Fundos de Renda Fixa no mercado de fundos
0
10
20
30
40
50
60
1999 2000 2001 2002 2003 2004
%
Fonte: ANBID Os fundos de renda fixa, segundo a ANBID, buscam retorno por meio de
investimentos em ativos de renda fixa (sendo aceitos títulos sintetizados através do uso
de derivativos). Incluem-se estratégias que impliquem risco de índices de preço.
Excluem-se, porém, investimentos que acarretem risco de oscilações de moeda
estrangeira e de renda variável (ações, etc.). Devem manter, no mínimo, 80% de sua
carteira em títulos públicos federais ou ativos com baixo risco de crédito. Dependendo
da política de investimento implementada podem ou não admitir alavancagem3.
A exemplo do que ocorreu com os fundos refenciados DI, os fundos
classificados como renda fixa também sofreram redução na participação percentual do
total da indústria. Ou seja, de praticamente 50% em 1999 para 30% no final de 2004,
conforme demonstra a figura 8.
3 Um fundo é considerado alavancado sempre que existir possibilidade (diferente de zero) de perda superior ao patrimônio do fundo, desconsiderando-se casos de default nos ativos do fundo.
47
Figura 9 – Participação de Fundos Multimercado no mercado de fundos
05
101520253035
1999 2000 2001 2002 2003 2004
%
Fonte: ANBID
Classificam-se como multimercado os fundos que buscam retorno no longo
prazo através de investimento em diversas classes de ativos (renda fixa, câmbio, etc)
incluindo renda variável (ações, etc.). Estes fundos não têm explicitado o mix de ativos
com o qual devem ser comparados (asset allocation benchmark) e podem, inclusive, ser
comparados a parâmetro de desempenho que reflita apenas uma classe de ativos (por
exemplo: 100% CDI). Podem ou não admitir alavancagem3, dependendo da política de
investimento adotada (ANBID, 2005).
Os fundos multimercado apresentaram um forte crescimento a partir de 2001,
como pode ser observado na figura 9. Este comportamento pode ser explicado pela
flexibilização de sua política de investimento que permite atuar em diversos mercados
simultaneamente, visando agregar maior rentabilidade. Neste sentido, o que se verificou
foi a migração de investimentos dos fundos classificados como referenciados DI e renda
fixa para os multimercados. Entretanto, na prática observa-se que existem fundos com
essa classificação atuando como renda fixa ou referenciados DI, postura justificada pela
aversão ao risco do investidor já discutida no capítulo 1.
48
Figura 10 – Participação de Fundos Cambiais no mercado de fundos
0
0,5
1
1,5
2
2,5
1999 2000 2001 2002 2003 2004
%
Fonte: ANBID Os fundos cambiais aplicam pelo menos 80% de sua carteira em ativos de
qualquer espectro de risco de crédito - relacionados diretamente, ou sintetizados via
derivativos, a uma ou mais moedas estrangeiras. O montante não aplicado em ativos
relacionados direta ou indiretamente a uma ou mais moedas estrangeiras deve ser
aplicado somente em títulos e operações de renda fixa (pré ou pós-fixadas a
CDI/SELIC). Podem ou não admitir alavancagem, dependendo da política de
investimento definida em seu regulamento (ANBID, 2005).
Conforme demonstra a figura 10, a partir 2001 a participação deste segmento no
total da indústria de fundos sofre uma significativa redução, caindo de 2% para menos
de 1% no final de 2004. Estes fundos são utilizados como hedge pelas empresas que
possuem passivos em moeda estrangeira, mas com a desvalorização do dólar no
mercado doméstico e pelas perspectivas que se apresentavam no período analisado, este
segmento foi pouco demandado pelos investidores.
49
Figura 11 – Participação de Fundos de Ações no mercado de fundos
0
2
4
6
8
10
1999 2000 2001 2002 2003 2004
%
Fonte: ANBID Os fundos de ações devem possuir, no mínimo, 67% da carteira em ações à vista.
São fundos cujo objetivo de investimento é acompanhar ou superar o comportamento do
Ibovespa/IBX/IBX-50 ou ações setoriais. Dependendo da política de investimento
determinada em seu regulamento poderão ou não admitir alavancagem. Em tais fundos
vale ressaltar, além do risco de renda, um significativo risco de capital (ANBID, 2005).
A figura 11 demonstra um comportamento praticamente estável na participação
deste segmento, situada entre 9% no final de 1999 e 7% no mesmo período de 2004.
Este comportamento é justificado pela postura conservadora dos investidores brasileiros
em relação a ativos de riscos ofertados no mercado de ações, o que evidencia mais uma
vez a aversão ao risco dos aplicadores em fundos de investimento.
50
Figura 12 – Participação de Fundos de Previdência no mercado de fundos
01234567
1999 2000 2001 2002 2003 2004
%
Fonte: ANBID
Na categoria fundos de previdência incluem-se os FAPI's – Fundo de
Aposentadoria Programada Individual e fundos exclusivos para PGBL's – Planos Gerais
de Benefícios Livres. Esse segmento pode atuar em qualquer uma das classes definidas
anteriormente (ANBID, 2005).
Conforme demonstra a figura 12 ocorreu um expressivo crescimento desta
categoria de fundos, que parte de menos de 0,5% em 1999 para 6% do total da indústria
de fundos no final de 2004. Este comportamento é justificado pela recente
regulamentação do setor e incentivos a previdência privada.
Ao compor os seus portfólios em cada segmento de fundos, os seus gestores
possuem uma série de opções em sua fronteira eficiente. A atratividade relativa de tais
opções é discutida a seguir, particularmente no que se refere à sua liquidez.
2.4 Composição de portfólio de fundos de investimento
A composição desejada pelos gestores para os seus fundos leva em conta os
objetivos de cada segmento de fundos. Neste sentido, faz-se necessário considerar a
segmentação da indústria de fundos de investimento. Segundo a classificação da CVM,
os fundos de investimento podem ser classificados em sete categorias, conforme
51
apresentado na seção 2.2, a saber: renda fixa, referenciados, multimercado, fundo de
ações, fundo cambial, dívida externa e curto prazo.
Dentro destas classificações de fundos de investimento, verificam-se objetivos
de benchmark diferentes para cada segmento apresentado, ou seja, para os fundos de
renda fixa e curto prazo busca-se atingir um percentual do CDI – Certificado do
Depósito Interbancário. Por outro lado, para os fundos referenciados, o indicador de
desempenho poderá ser, dentre outros, o CDI como o câmbio. Já os fundos
multimercado buscam retorno através de investimento em diversas classes de ativos
(renda fixa, câmbio, etc) exceto renda variável (ações, etc.), desta forma não têm
explicitado o mix de ativos com o qual devem ser comparados. Para os fundos de renda
variável, o objetivo de investimento é acompanhar ou superar o comportamento do
Ibovespa. Já os fundos cambiais e de dívida externa buscam acompanhar,
respectivamente, variação de preço de moeda estrangeira e variação dos títulos da
dívida externa.
Neste contexto, os gestores de fundos de investimento definem a composição
“ideal” para cada carteira de fundo de investimento, sempre levando em consideração
qual o desempenho esperado para cada segmento de fundos. Portanto, o que determina
quais os ativos que deverão compor as carteiras dos fundos de investimento são os
indicadores de desempenho com os quais os fundos estão sendo comparados.
A partir deste pressuposto é possível analisar a composição de carteira
necessária para alcançar os objetivos de cada segmento de fundos de investimento. Por
exemplo, nos segmentos de fundos de renda fixa, curto prazo e referenciados DI, a
função dos gestores consiste em encontrar ativos que repliquem o índice desejado pelo
fundo, de forma a atender às expectativas dos cotistas. Para isso, ativos pós-fixados
indexados ao CDI ou à taxa Selic são alternativas que poderão contribuir para se
52
alcançar o Benchmark estabelecido. Ativos prefixados são boas opções para os fundos
de renda fixa, visto que estes fundos, tradicionalmente, são mais agressivos que os
fundos referenciados DI.
Atualmente, o mercado financeiro dispõe de títulos públicos e privados
indexados à taxa Selic, CDI, índices de preços ou prefixados. Como alternativa de
investimento os gestores podem escolher entre papéis privados, como por exemplo:
Debêntures, Notas Promissórias, CCB – Certificados de Crédito Bancário, entre outros,
ou ainda, títulos da DPMFi – Dívida Pública Mobiliária Federal interna - que como
opção, oferecem aos gestores de fundos de investimento (vide Anexo A): LFT – Letras
Financeiras do Tesouro, indexadas à taxa Selic, LTN – Letras do Tesouro Nacional,
NTN-F – Notas do Tesouro Nacional série F, papéis prefixados. Além de ativos
indexados a índice de preços como: NTN-C – Notas do Tesouro Nacional série C,
indexadas ao IGP-M e as NTN-B – Notas do Tesouro Nacional série B, indexadas ao
IPC-A.
A escolha entre títulos públicos federais ou títulos privados parece bastante
clara, se considerada a relação risco e retorno. Principalmente porque os papéis do
governo são considerados pelo mercado como de risco soberano, enquanto que os
títulos emitidos por bancos ou empresas privadas carregam consigo o chamado risco de
crédito, inerente a cada atividade desempenhada por seus emissores. Acrescenta-se
ainda o papel da liquidez dos títulos públicos federais como fator indutor das
preferências dos fundos de investimento. Em sua fronteira eficiente, tal como discutido
no item 1.2 deste trabalho, os fundos de investimento têm, com uma maior participação
de títulos públicos, a composição de um portfólio mais seguro, adequado à aversão ao
risco de seus investidores.
53
O risco de liquidez caracteriza-se, primordialmente, mas não se limita, à baixa
ou mesmo eventual inexistência de demanda pelos títulos e valores mobiliários
integrantes da carteira do fundo de investimento. Desta maneira, o gestor da carteira
pode encontrar dificuldades para liquidar posições ou negociar tais títulos e valores
mobiliários no momento desejado. Durante o período de falta de liquidez, o fundo de
investimento permanece exposto aos riscos associados aos títulos e valores mobiliários
de sua carteira. Para contornar a situação, o gestor da carteira pode aceitar descontos nos
preços para conseguir negociá-los (ROCHA, 2003).
Os títulos públicos, principalmente os da Dívida Pública Mobiliária Federal
interna (DPMFi) apresentam uma importante vantagem em termos de liquidez quando
comparados aos papéis privados, derivada do tamanho da demanda do Estado por
recursos, que implica o desenvolvimento de um amplo mercado, alcançando uma forte
dinâmica de negociação para seus papéis, o que diminui significativamente a
probabilidade de que um investidor não consiga vender seus títulos. Mais além, quanto
maior a liquidez dos títulos públicos mais atrativos se tornam aos olhos dos investidores
(ANDIMA, 2003).
Já o risco de crédito considera a possibilidade de o emissor de um título não
honrar o resgate ocasionando prejuízos aos fundos de investimento. Os títulos públicos
federais, considerando-se o seu emissor, são considerados os papéis mais seguros do
mercado, de risco soberano. Se o governo não honrar suas obrigações, todas as outras
instituições do país estarão em situação ainda mais séria.
Por outro lado, os papéis públicos não são invulneráveis a outros riscos, dentre
os quais se destaca o de mercado, que considera a possibilidade de oscilação adversa
nos preços do papel entre a data de compra e uma data futura qualquer, em função de
54
fatores tais como a política monetária, variação na confiança dos mercados ou choques
externos (ANDIMA, 2003, p.20).
No Brasil, porém, nos últimos anos, ao lado do risco de crédito inexistente
(exceto nas ocasiões em que há razões para esperar-se iniciativas políticas de default), o
risco de mercado foi eliminado pela indexação pela taxa de juros de curto prazo
(SELIC4) e o risco de liquidez é mantido baixo pela disposição das instituições
participantes, especialmente o Banco Central, em servir de comprador de última
instância destes títulos (CARVALHO, 2003).
Na prática, geralmente, os gestores que atuam no mercado de títulos procuram
concentrar seus recursos na posse de valores líquidos. Para isso, os agentes econômicos
realizam operações de compra/venda de títulos públicos por meio de leilões de mercado
aberto diretamente com o Tesouro Nacional/Banco Central, ou através do mercado
secundário de títulos, isto é, quando as operações são realizadas entre instituições e não
há a participação da autoridade monetária ou do Tesouro Nacional na execução das
operações de venda definitiva, público em geral, de títulos da DPMFi.
2.5 Evolução da composição das carteiras e atuação dos fundos no mercado de
dívida pública e privada
O aumento do número de cotistas em fundos de investimento traz diversas
implicações no funcionamento do sistema financeiro, no que tange a estratégia de
alocação dos portfólios desses investimentos. Neste contexto, as administradoras de
recursos de terceiros utilizam-se de diversos instrumentos existentes no mercado
financeiro para realizar a administração dos riscos e retornos destes portfólios por meio
4 A taxa Selic é obtida mediante o cálculo da taxa média ponderada e ajustada das operações de financiamento por um dia, lastreadas em títulos públicos federais e cursadas no referido sistema ou em câmaras de compensação e liquidação de ativos, na forma de operações compromissadas. A divulgação da taxa Selic é responsabilidade do Departamento de Operações do Mercado Aberto, Divisão de Administração do Selic (Demab/Dicel).
55
da diversificação de ativos e derivativos, atuando em diversos mercados
simultaneamente. Dentre estes mercados destaca-se o de títulos públicos federais,
particularmente atrativos – tal como discutido no item anterior - e que, tal como
indicado na Figura 13, têm representado mais de 70% do patrimônio dos fundos de
investimento nos últimos cinco anos. A participação de ações mantém-se, ainda, tímida,
próxima ao patamar de 10%.
Figura 13 – Composição dos fundos de investimento
0%
10%20%
30%40%
50%
60%70%
80%90%
100%
dez/00 dez/01 dez/02 dez/03 dez/04
Titulos Públicos Federais CDB/RDB Debêntures Ações
Fonte: ANBID Nota: Títulos Públicos Federais inclui Operações Compromissadas
Embora, em dezembro de 2004 carregassem cerca de 47% da dívida pública,
conforme demonstra a Figura 14, os Fundos de Investimento não estão obrigados a
adquirir títulos públicos, ou seja, não há demanda cativa atribuída a esses agentes. De
acordo com a regulamentação em vigor, as carteiras dos fundos têm de ser constituídas
por ativos e/ou modalidades operacionais disponíveis no mercado financeiro, com
exceção de TDE – Títulos de Desenvolvimento Econômico e quotas de FDS – Fundo de
Desenvolvimento Social (ANDIMA, 2003).
56
Segundo a instrução CVM no 409, de 18/08/2004, os fundos de renda fixa
devem manter no mínimo 80% da carteira em ativos associados diretamente, ou
sintetizados via derivativos, ao fator de risco que dá nome à classe. Por outro lado, os
fundos referenciados precisam investir este mesmo percentual de seu patrimônio em
títulos públicos federais ou títulos privados classificados como de baixo risco de crédito,
bem como manter um mínimo de 95% da carteira composta por ativos financeiros
indexados ao indicador de desempenho do fundo.
Figura 14 - Evolução da Dívida Pública versus Participação dos FI´s (Bilhões de Reais nominais)
Fonte: Banco Central do Brasil
Os fundos de investimento, tal como ilustrado na figura 14, mostram-se como
grandes compradores de títulos da dívida pública e sua participação vêm crescendo de
maneira significativa nos últimos cinco anos, atuando nos mercados primário e
secundário da DPMFi.
389,8
145,5
468,3
190,4
584,3
199,6
580,6
186,4
691,4
294,9
765,1
358,7
-
100,0
200,0
300,0
400,0
500,0
600,0
700,0
Dez 99 Dez 00 Dez 01 Dez 02 Dez 03 Dez 04 DPMFi FI`s
37% 40%
34% 32%
42% 47%
57
2.6 Atuação dos fundos no mercado primário de títulos da DPMFi
A influência direta dos fundos de investimento, como principais compradores de
títulos da DPMFi, sobre a sua composição é fortemente sugerida pelo fato das principais
mesas de operações das administradoras de fundos de investimento, normalmente,
serem consultadas pela Secretaria do Tesouro Nacional a respeito da realização de
leilões de colocação de títulos públicos federais, de forma que informem as respectivas
demandas para os possíveis títulos que serão ofertados.
Com base em cronograma mensal já estabelecido, a Secretaria do Tesouro
procede da seguinte forma para obter as informações sobre demanda de títulos públicos.
Primeiro envia e-mails aos principais agentes econômicos, o que inclui as principais
Assets, de forma a informar que consultará às mesas de operações em horário específico
com o objetivo de realizar a prospecção de demanda para o leilão tradicional de títulos
públicos federais. Segundo, realiza as consultas telefônicas a respeito do assunto, no
horário pré-estabelecido, para conhecer as previsões de atuação de cada agente
econômico no referido evento.
Quando da realização das consultas, são informados os prováveis títulos a serem
ofertados a mercado, bem como os respectivos vencimentos e, normalmente, o leilão
ocorre no dia seguinte ao da consulta. Em função dos resultados obtidos na pesquisa
com as mesas de operações dos agentes econômicos, o Tesouro Nacional define os
títulos que serão ofertados, bem como as respectivas quantidades.
2.7 Atuação dos fundos no mercado secundário de títulos da DPMFi
O Open Market é o mercado secundário, ou seja, um mercado que se negociam
títulos já emitidos anteriormente. Assim, os bancos utilizam este mercado para
regularizar o seu caixa, de acordo com a falta ou sobra de reservas bancárias, através da
58
compra e venda de títulos federais entre si. Outros agentes financeiros como as
administradoras de fundos de investimento também podem utilizar-se deste mercado
para negociar títulos públicos federais. Desta forma, os títulos comprados por meio
destas transações compõem tanto as carteiras próprias das instituições financeiras, como
também os fundos de investimento, além de balizarem as taxas de rentabilidade dos
títulos federais (FORTUNA, 2002, p.94).
O incremento da liquidez dos papéis públicos depende fundamentalmente da
densidade e abrangência de seus mercados, particularmente os secundários, em que os
proprietários de títulos vendem-nos a terceiros. Quanto mais homogêneos, ou
substituíveis entre si sejam dois títulos, mais suas demandas se aproximam e tendem à
formação de um único mercado, mais ativo do que cada um separadamente. Neste
contexto, a elevação da fungibilidade (capacidade de substituição na perspectiva do
investidor) dos títulos tem-se mostrado uma estratégia relevante para o aumento da
liquidez do mercado (ANDIMA, 2003).
A atuação dos fundos de investimento no mercado secundário de títulos
públicos vem se consolidando cada vez mais, o que aumenta a oferta e procura dos
ativos e, conseqüentemente, torna esse mercado mais expressivo. O que é bastante
importante, visto que o mercado secundário serve de balizador dos preços dos títulos em
poder da indústria de fundos.
2.8 Conclusão
Foram apresentadas neste capítulo a evolução da composição das carteiras dos
fundos de investimento e delineada a atuação dos fundos no mercado da dívida pública
e privada. Dada a posição dos FI’s de importantes demandantes de títulos da DPMFi e
da consulta da Secretaria do Tesouro às Assets antes dos leilões, há indícios que
59
sugerem uma possível relação entre a indústria de fundos de investimento e a
composição da DPMFi. O próximo capítulo dedica-se a analisar qualitativamente a
existência de relação entre os fundos de investimento e a composição da DPMFi e os
fatores de influência de suas dinâmicas.
60
3 ANÁLISE DA RELAÇÃO ENTRE FUNDOS DE INVESTIMENTO E COMPOSIÇÃO DA DPMFi
O presente capítulo propõe-se a analisar a relação entre os fundos de
investimento e a composição da Dívida Pública Mobiliária Federal interna, assim como
alguns fatores influenciadores de suas dinâmicas. Discute-se a composição buscada
pelos gestores da DPMFi - particularmente com base nos planos anuais de
financiamento, a distribuição dos diferentes títulos da Dívida – em especial LFT’s,
LTN’s e NTN-C’s – entre os seus detentores, assim como fatos que influenciaram sua
dinâmica no período de análise, a saber, a partir de novembro de 1999 (momento em
que se tornam disponíveis os dados de montante mensal de títulos da DPMFi em poder
de fundos de investimento) a dezembro de 2004.
3.1 Dívida Pública Mobiliária Federal interna
A dívida pública líquida corresponde ao saldo líquido do endividamento do setor
público não-financeiro e do Banco Central com o sistema financeiro (público e
privado), o setor privado não financeiro e os demais agentes econômicos estrangeiros.
Tal dívida abrange o Governo Central, Banco Central, Estados, Municípios e Estatais.
Aproximadamente 80% da dívida pública é interna, formada principalmente pela Dívida
Pública Mobiliária Federal interna – DPMFi, cuja composição e características dos
principais títulos são discutidas a seguir (BRASIL, 2005a).
3.1.1 Caracterização dos principais títulos da DPMFi
61
A DPMFi apresenta diversas modalidades de remuneração de seus títulos, entre
as quais a prefixada, a pós-fixada - atrelada a índices de preços ou à taxa Selic - e títulos
remunerados pela variação cambial (vide Anexo A):
• Títulos prefixados
o LTN – Letras do Tesouro Nacional
o NTN-F – Notas do Tesouro Nacional, série F
• Títulos remunerados por índices de preços
o NTN-C - Notas do Tesouro Nacional, série C
o NTN-B - Notas do Tesouro Nacional, série B
• Títulos remunerados pela taxa Selic
o LFT - Letras Financeiras do Tesouro
o LFT-A - Letras Financeiras do Tesouro, série A
o LFT-B - Letras Financeiras do Tesouro, série B
• Títulos remunerados pela variação cambial
o NTN-D - Notas do Tesouro Nacional, série D
o NBC-E - Notas do Banco Central do Brasil, série Especial
Dada a elevada parcela da dívida líquida do setor público representada pela
DPMFi e as implicações de sua composição entre os diferentes papéis e vencimentos, a
sua gestão tem sido uma das principais preocupações no que se refere ao equilíbrio das
contas públicas. Neste sentido, a gestão da dívida pública tem por objetivos “minimizar
os custos do financiamento no longo prazo, assegurando a manutenção de níveis
prudentes de risco e contribuindo para o bom funcionamento do mercado de títulos
públicos” (BRASIL, 2005).
Algumas vantagens e desvantagens das diferentes remunerações dos títulos da
dívida pública são discutidas por Lopes e Domingos (2004).
62
Quadro 2 - Vantagens e Desvantagens dos principais títulos emitidos pelo Tesouro Nacional
Vantagens Desvantagens
Prefixados
Reduzem flutuações no serviço da dívida (reduz risco orçamentário e volatilidade tributária), importante instrumento para construção da yield curve e potencializa os efeitos da política monetária (elevando-se os juros, ocorre diminuição da riqueza e conseqüentemente, do consumo) .
Eleva o custo de financiamento da dívida e o risco de refinanciamento (dada a redução do prazo médio da dívida).
Índices de preços Reduzem o risco de refinanciamento – por indexar o passivo (títulos) a taxas próximas da correção do ativo (receitas).
Mercado limitado (basicamente investidores institucionais)
Taxa de juros Reduzem risco de refinanciamento e tem grande aceitação pelos investidores (principalmente fundos de investimento e tesourarias das instituições financeiras)
Aumentam risco financeiro e reduzem a eficiência da política monetária
Variação cambial Reduzem risco de refinanciamento, tem grande aceitação pelos investidores internacionais ou domésticos que queiram imunizar seus balanços (instituições financeiras e empresas)
Sua elevada volatilidade aumenta muito o risco financeiro
Fonte: adaptado de Lopes, Domingos (2004)
A idéia de determinar a composição ótima da dívida pública a partir de uma
análise macro-estrutural está amparada na elevada correlação entre estabilidade
econômica e perfil da dívida, em termos de composição e prazo (GOLDFAJN;
PAULA,1999). Os títulos prefixados, por exemplo, definem o horizonte de confiança
plena dos investidores na política econômica. Os títulos pós-fixados, por sua vez,
apresentam proteção para os investidores. Dessa forma, os títulos indexados a índices de
preços oferecem proteção contra inflação, os títulos indexados a taxas de juros oferecem
proteção contra variação nas taxas de juros e os títulos indexados à taxa de câmbio
oferecem proteção contra volatilidade na cotação cambial (LOPES, DOMINGOS,
2004). É possível perceber aqui, que a gestão do mix da DPMFi em termos de formas
de remuneração de seus títulos consiste em questão primordial. Por outro lado, o
incremento da liquidez dos títulos mostra-se como um elemento central da gestão da
DPMFi, tal como discutido a seguir.
63
3.1.1.1 Liquidez do mercado de títulos da DPMFi
Os títulos da DPMFi apresentam uma importante vantagem em termos de
liquidez quando comparados aos papéis privados, derivada do tamanho da demanda do
Estado por recursos, que implica o desenvolvimento de um amplo mercado, alcançando
uma forte dinâmica de negociação para seus papéis, o que diminui significativamente a
probabilidade de que um investidor não consiga vender seus títulos. Mais além, quanto
maior a liquidez dos títulos públicos mais atrativos se tornam aos olhos dos investidores
(ANDIMA, 2003).
O aumento da liquidez dos papéis públicos depende basicamente da densidade e
abrangência de seus mercados, em especial os secundários, em que os proprietários de
títulos vendem-nos a terceiros. Quanto mais substituíveis entre si sejam dois títulos,
mais suas demandas se aproximam e tendem à formação de um único mercado, mais
ativo do que cada um por separado. Assim, a elevação da capacidade de substituição dos
títulos na perspectiva do investidor tem-se mostrado uma estratégia fundamental para o
aumento da liquidez do mercado (ANDIMA, 2003).
Em 04/11/99, o Banco Central e o Tesouro Nacional desenvolveram
conjuntamente 21 medidas objetivando aumentar o volume de negócios no mercado
secundário de títulos públicos, acrescer a eficiência dos dealers (instituições
informalmente credenciadas para atuar como elo entre o BC e as demais instituições do
SFN – Sistema Financeiro Nacional, quando da realização dos leilões primários)
buscando incremento da liquidez deste mercado e, conseqüentemente, aumento do prazo
de emissão dos títulos da dívida pública, bem como redução da sua taxa de juros
(FORTUNA, 2002, p.96).
64
Algumas destas medidas estão citadas a seguir:
• Redução do número de vencimentos dos títulos públicos em circulação;
• Maior concentração em títulos com rentabilidade prefixada e redução da
freqüência de ofertas públicas;
• Divulgação prévia de cronograma de emissões de títulos;
• Lançamento de títulos no Selic – Sistema Especial de Liquidação e Custódia
de Títulos Públicos, com liquidação em D+1, visando a estimular a
participação de pessoas físicas e de pessoas jurídicas não financeiras no
mercado de títulos federais;
• Estímulo ao aumento da transparência na negociação de títulos públicos no
mercado secundário, mediante a utilização de sistema eletrônico (a partir de
Agosto de 2000, os títulos passaram a ter uma alternativa ao tradicional
“mercado de balcão organizado” representado pelas negociações telefônicas
das mesas de operações do open market, ou seja, passaram a ser negociados
eletronicamente por meio de ofertas de compra e venda disponibilizadas em
tela de terminais de computador seja através do sistema Sisbex da bolsa de
valores do Rio de Janeiro ou através do Sistema Integrado de Mercado –
SIM da Cetip);
• Divulgação diária, pela Andima - Associação Nacional das Instituições do
Mercado Financeiro, de preços dos títulos públicos em circulação;
• Incentivo para as Bolsas criarem mercado derivativo das opções de venda
lançadas, objetivando aumentar a oferta de hedge para os detentores de
títulos públicos federais.
Por outro lado, a partir de 2001, a Secretaria do Tesouro Nacional passou a
editar o Plano Anual de Financiamento da Dívida Pública (PAF), relatório que apresenta
65
as diretrizes gerais que norteiam a gestão da Dívida Pública Federal (DPF), observadas
as condições de mercado. A seguir, analisam-se os PAFs desde 2001, comparando-se
as metas estabelecidas - em termos de participação de títulos no mix da dívida no que se
refere à forma de remuneração – aos valores efetivamente observados nos referidos
períodos.
3.1.2 Planos Anuais de Financiamento
Segundo os planos anuais de financiamento da dívida, as diretrizes gerais que
norteiam a gestão da Dívida Pública Federal (DPF), observadas as condições de
mercado, são (BRASIL, 2005a):
• alongamento do prazo médio da DPF, principalmente por meio do
aumento do prazo médio dos títulos emitidos em oferta pública;
• redução do percentual da DPF vincendo em 12 meses;
• substituição gradual dos títulos remunerados pela taxa Selic bem como
aqueles denominados e referenciados à variação cambial, por títulos com
rentabilidade prefixada e vinculada a índices de preços; e
• incentivo ao desenvolvimento das estruturas a termo de taxas de juros
para títulos públicos federais.
Vale ressaltar, em termos de forma de remuneração dos títulos, o objetivo de
redução dos papéis atrelados à Selic em prol de títulos prefixados e vinculados a índices
de preços. Neste sentido, segue análise das estratégias traçadas para a gestão da Dívida
Pública Mobiliaria Federal interna – DPMFi, vis a vis os resultados alcançados
anualmente no período de 2001 a 2004.
66
3.1.2.1 Plano Anual de Financiamento de 2001
O Plano Anual de Financiamento, editado em fevereiro de 2001, definia as
seguintes estratégias para o financiamento da DPMFi no ano de 2001 (BRASIL, 2001):
• O Tesouro Nacional resgatará integralmente as NTN-D vincendas em 2001.
Portanto, a oferta líquida total de títulos cambiais ao mercado será de
responsabilidade exclusiva do Banco Central do Brasil;
• No período compreendido entre janeiro e dezembro de 2001, projetam-se
emissões líquidas de LTN da ordem de R$ 29 bilhões e resgates líquidos de
LFT no montante de R$ 52 bilhões.
• Em termos de prazo de emissão foram planejadas colocações em mercado
com 36 meses (LTN e NTN-F), enquanto as emissões de títulos remunerados
à taxa Selic sofreriam novos alongamentos em relação aos 60 meses daquele
momento;
• No que diz respeito às NTN-C’s os lotes considerados regulares
contemplarão prazos de no máximo 10 anos, emissões de títulos com
maturação mais longa (20 e 30 anos) deverão ser realizadas ao longo do ano ,
podendo ser aceitos, a título de troca, LFT’s em poder do mercado. Ainda no
contexto de títulos corrigidos por índices de preços, ofertas de títulos
vinculados ao IPCA poderão ocorrer, com prazos mínimos de emissão
superiores a 5 anos;
• O estoque da DPMFi em poder do público deverá sofrer acréscimo de 7,4%,
com seu prazo médio possivelmente alongando-se de 29,8 meses para até
42,9 meses. Neste ponto, ressalta-se que o alongamento de perfil da dívida só
não se faz mais robusto em função da diretriz, igualmente importante, de
desindexação da dívida, que, ao produzir aumento da participação de
67
prefixados na estratégia de financiamento, substitui títulos de maior prazo
médio de
emissão (LFT) por outros com maturação mais curta (LTN).
Segue abaixo tabela comparativa entre os resultados esperados pela estratégia
básica e os resultados alcançados no período, em termos de formas de remuneração dos
títulos:
Tabela 2 - Composição planejada no PAF e alcançada em 2001 Indexador dez/00 PAF dez/01 Resultados dez/01 Prefixada 15% 22% 7,8% Selic 52% 42% 52,8% Índice de Preços 6% 8% 7,0% Câmbio 22% 22% 28,6% TR e Outros 5% 6% 3,8%
Fonte: PAF (2002)
No ano de 2001, a administração da dívida pública foi fortemente influenciada
por fatores internos como a crise gerada pelo racionamento de energia elétrica, além de
fatores externos como choques adversos que marcaram a economia mundial. Dentre os
fatores externos, cabe destacar, a desaceleração da economia americana e seu potencial
impacto sobre os paises emergentes mais o agravamento da situação da Argentina
causaram repercussão direta no mercado financeiro nacional. Vale ressaltar, com base
na Tabela 2, que o volume de títulos prefixados no mix da dívida pública em dezembro
de 2001 (7,8%) foi muito inferior ao planejado no PAF para aquele ano, de 22%,
inferior até mesmo à fração em dezembro de 2000 (15%).
3.1.2.2 Plano Anual de Financiamento de 2002
O Plano Anual de Financiamento, editado em janeiro de 2002, definia as
seguintes estratégias para o financiamento da DPMFi no ano de 2002 (BRASIL, 2002):
68
• alongamento dos prazos médios dos títulos emitidos em oferta pública
(Letras do Tesouro Nacional – LTN, Letras Financeiras do Tesouro – LFT e
Notas do Tesouro Nacional, série C – NTN-C);
• manutenção do percentual da dívida vincenda em 12 meses em níveis
prudentes;
• substituição gradual dos títulos remunerados à taxa SELIC por títulos com
rentabilidade prefixada;
• desenvolvimento adicional da estrutura a termo de taxa de juros (prefixada e
de índice de preços); e
• busca de perfil mais homogêneo de maturação da dívida pública.
Destaca-se, uma vez mais, a busca pela substituição de papéis vinculados à Selic
por títulos prefixados. Abaixo segue tabela comparativa entre o que se estimava para o
perfil da dívida e o que de fato se configurou:
Tabela 3 - Composição planejada no PAF e alcançada em 2002
dez/01
PAF dez/02 Resultados dez/02 Mínimo Máximo Prefixada 7,8% 7% 10% 2,2% Selic 52,8% 51% 56% 60,8% Índice de Preços 7,0% 6% 8% 12,5% Câmbio 28,6% 25% 30% 22,4% TR e Outros 3,8% 3% 4% 2,1% Fonte: PAF (2003)
A dificuldade em atingir as metas estabelecidas para o ano de 2002 foi, em parte,
foi conseqüência do rumo incerto da economia norte-americana, o aprofundamento das
tensões no Oriente Médio e o contínuo agravamento da crise da Argentina, que
contribuíram negativamente para a estabilidade econômica.
Internamente, a marcação a mercado, bem como a crescente incerteza em
relação ao processo eleitoral e os rumos da política econômica a ser adotada em 2003
69
aumentaram a volatilidade do mercado de títulos. Neste contexto, a contínua
depreciação do real frente ao dólar - que atingiu ao final de 2002, cerca de 52,3% do
valor ao final do ano anterior - e o aumento de inflação levaram o Banco Central a
adotar medidas mais restritivas de política monetária. Ou seja, sucessivas elevações dos
juros básicos internos, que passaram de 18% ao ano em setembro, para 25% ao ano em
dezembro. Acrescenta-se ainda, a forte elevação do nível de risco-país (medido de
acordo com o EMBI+, calculado pelo Banco J.P. Morgan), que iniciou o ano em 824
pontos base, atingiu 2.443 pontos base às vésperas das eleições presidenciais e finalizou
o ano em 1.439 pontos base.
Neste contexto de elevada incerteza, uma vez mais a meta de participação de
títulos prefixados não foi atingida, enquanto a fração de papéis atrelados à Selic esteve
acima do patamar máximo planejado.
3.1.2.3 Plano Anual de Financiamento de 2003
O Plano Anual de Financiamento, editado em janeiro de 2003, definia as
seguintes estratégias para o financiamento da DPMFi no ano de 2003 (BRASIL, 2003):
• alongamento dos prazos médios dos títulos emitidos em oferta pública;
• manutenção do percentual da dívida vincenda em 12 meses em níveis
prudentes;
• substituição gradual dos títulos remunerados à variação cambial e à taxa
Selic por títulos com rentabilidade prefixada e/ou indexados a índices de
preços; e
• desenvolvimento adicional da estrutura a termo de taxa de juros (prefixada e
de índice de preços).
70
Em 2003 mantém-se a busca pelo aumento da participação de títulos prefixados
e vinculados a índices de preços no mix da DPMFi. Abaixo segue tabela comparativa
entre as metas traçadas para o ano de 2003 e os resultados efetivamente alcançados:
Tabela 4 - Composição planejada no PAF e alcançada em 2003
dez/02
PAF dez/03 Resultados dez/03 Mínimo Máximo Prefixada 2,2% 5% 15% 12,5% Selic 60,8% 52% 60% 61,3% Índice de Preços 12,5% 12% 18% 10,8% Câmbio 22,4% 13% 22% 13,6% TR e Outros 2,1% 2% 4% 1,8% Fonte: PAF (2003)
Os resultados obtidos, muito próximos aos estipulados no planejamento anual de
financiamento da dívida de 2003 sinalizaram a confiança dos investidores internos e
externos na economia brasileira. Contribuiu para o bom resultado a posse do novo
presidente, que pôs fim às incertezas quanto à política econômica a ser implementada.
Um significativo aumento da fração prefixada da dívida pode ser percebido,
passando de 2% em dezembro de 2002 para 12,5% em dezembro de 2003. Por outro
lado, os títulos atrelados à Selic continuam consistindo na maior parte do montante
(61,3%).
3.1.2.4 Plano Anual de Financiamento de 2004
O Plano Anual de Financiamento, editado em fevereiro de 2004, definia as
seguintes estratégias para o financiamento da DPMFi no ano de 2004 (BRASIL, 2004a):
• alongamento dos prazos médios dos títulos emitidos em oferta pública;
• redução do percentual da dívida vincenda em 12 meses;
71
• substituição de parte dos títulos remunerados à variação cambial e pela taxa
Selic por títulos com rentabilidade prefixada ou vinculadas a índices de
preços; e
• contribuição para o desenvolvimento da estrutura a termo de taxa de juros
(prefixada e de índice de preços).
Tabela 5 - Composição planejada no PAF e alcançada em 2004
dez/03
PAF dez/04 Resultados dez/04 Mínimo Máximo Prefixada 12,5% 13% 23% 20,1% Selic 61,3% 50% 61% 57,1% Índice de Preços 10,8% 5% 7% 5,2% Câmbio 13,6% 15% 21% 14,9% TR e Outros 1,8% 1% 3% 2,7% Fonte: PAF (2005a)
Observa-se pela tabela acima o cumprimento de todas as diretrizes traçadas no
Plano Anual de Financiamento da dívida pública em 2004, no que tange a composição
percentual da DPMFi. Destaca-se o incremento da participação dos papéis prefixados,
que atingiram 20,1% do montante total da DPMFi e uma leve redução dos títulos
atrelados à Selic com 57,1% da DPMFi.
A evolução da DPMFi em termos de sua composição tem sido o resultado da sua
gestão, do contexto macroeconômico e das expectativas do mercado. O próximo item
busca delinear a evolução de suas características em termos de forma de remuneração,
prazo médio e estrutura de vencimentos entre novembro de 1999 e dezembro de 2004.
3.1.3 Evolução recente da composição da DPMFi
As crises financeiras internacionais a partir da segunda metade de 1997
implicaram um importante incremento das taxas de juros internas, assim como de sua
volatilidade. Tal cenário fortaleceu a aversão a papéis prefixados, com significativas
72
mudanças para títulos cambiais e pós-fixados. De dezembro de 1997 a dezembro de
1998, a dívida prefixada passou de 40% para menos de 4% do total, enquanto a atrelada
a juros fez o caminho inverso, de 35% para 69%. A mudança do regime cambial em
1999 aumentou a procura por títulos cambiais como forma de hedge. A emissão de tais
títulos, apesar do elevado risco que carregam, mostrava-se como alternativa para evitar
uma pressão maior sobre o mercado de câmbio (ANDIMA, 2003).
Após a flutuação do câmbio e a adoção de um rígido programa de estabilização
fiscal, iniciou-se a partir de meados de 1999 a tentativa de alongamento do prazo médio
da dívida interna, por meio da rolagem dos vencimentos com o uso de papéis
prefixados, mas também recorrendo à emissão de títulos pós-fixados de longo prazo (até
cinco anos). A estratégia do Tesouro visava à redução do risco de refinanciamento da
dívida interna, por meio de uma menor concentração de vencimentos (FERREIRA;
ROBOTTON; DUPITA, 2004). Tal estratégia garantiu uma paulatina elevação no prazo
médio da dívida interna, que alcançou seu ponto máximo em agosto de 2001, com 36
meses, tal como ilustrado na figura 15.
Figura 15 - Prazo Médio da DPMFi em Poder do Público
05
10152025303540
dez/
99
jun/
00
dez/
00
jun/
01
dez/
01
jun/
02
dez/
02
jun/
03
dez/
03
jun/
04
dez/
04
Mes
es
Fonte: BACEN
No entanto, em 2002, a implementação efetiva da marcação a mercado
explicitou a possibilidade de perda nos investimentos de renda fixa, particularmente nos
73
fundos de investimento, o que reduziu o preço das LFT’s e obrigou a recompra de
títulos de maior maturidade, bem como emissão de outros com prazos mais curtos. Tal
mudança teve como conseqüência a diminuição do prazo médio da dívida em LFT de 31
meses em julho de 2002 para 22 meses em dezembro do mesmo ano, conforme figura
16 (ANDIMA, 2003).
Figura 16 - Prazo Médio da DPMFi em Poder do Público por Tipo de Rentabilidade
0
20
40
60
80
100
120
140
dez/
99
abr/
00
ago/
00
dez/
00
abr/
01
ago/
01
dez/
01
abr/
02
ago/
02
dez/
02
abr/
03
ago/
03
dez/
03
abr/
04
ago/
04
dez/
04
mes
es
Taxa SELIC Prefixados Índice de preços
Câmbio TR
Fonte: BACEN
Após este ajuste, o prazo médio da dívida pública manteve-se no patamar de 32
meses (figura 15), com significativas variações entre os diferentes títulos.
As LTNs, prefixadas, contrariamente às LFTs, tiveram aumento do prazo médio,
de 1,55 para 7 meses. Tal inversão relaciona-se a uma expectativa de queda nos juros
por parte dos agentes econômicos (ANDIMA, 2003).
A maior parte da DPMFi, porém, segue com prazo de vencimento inferior a um
ano, tal como ilustrado na figura 17.
74
Figura 17 - Estrutura de Vencimentos da DPMFi em Poder do Público
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%de
z/99
mar
/00
jun/
00
set/0
0
dez/
00
mar
/01
jun/
01
set/0
1
dez/
01
mar
/02
jun/
02
set/0
2
dez/
02
mar
/03
jun/
03
set/0
3
dez/
03
mar
/04
jun/
04
set/0
4
Até 1 ano De 1 a 2 anos De 2 a 3 anos De 3 a 4 anos De 4 a 5 anos Acima de 5 anos
Fonte: BACEN
No período 2003/2004 novamente foi empreendida política voltada para o
alongamento da dívida interna – já discutida no item anterior, relativo aos PAFs - com a
tentativa de aumentar a parcela de papéis prefixados e com esforço para redução da
parcela da dívida interna atrelada à taxa de câmbio. Vale observar que até maio de 2004,
esta política contabilizou progressos notáveis (figura 18), com o aumento da parcela da
dívida interna relativa a títulos prefixados (com prazos de emissão de até quatro anos),
além da continuidade da elevação dos títulos indexados à inflação.
75
Figura 18 - Composição percentual da DPMFi em Poder do Público por Tipo de Rentabilidade
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
dez/
99
abr/
00
ago/
00
dez/
00
abr/
01
ago/
01
dez/
01
abr/
02
ago/
02
dez/
02
abr/
03
ago/
03
dez/
03
abr/
04
ago/
04
dez/
04
Taxa SELIC Prefixados Índice de preços Câmbio TR
Fonte: BACEN
Do lado negativo, registra-se a política do Tesouro Nacional de voltar a emitir
títulos pós-fixados de longo prazo, apesar dos riscos apontados pela experiência de 2002
quanto a este tipo de estratégia (FERREIRA; ROBOTTON; DUPITA, 2004).
Por outro lado, as mudanças no perfil da dívida pública no período de análise se
associaram a alterações nos detentores dos diferentes títulos. Neste contexto, discute-se
a seguir a dinâmica dos principais detentores de títulos da DPMFi no período de
novembro de 1999 a dezembro de 2004.
3.2 Detentores de títulos da DPMFi
Os dados dos detentores dos títulos federais em poder do público, analisados a
seguir, foram obtidos no site do Banco Central do Brasil, e em seguida deflacionados
pelo IGP-M, com base em dezembro de 2004. As informações disponibilizadas estão
dividas em contas da seguinte forma:
• Carteira Própria: composta por papéis adquiridos em nome de instituições
financeiras;
76
• FI: refere-se à conta cliente especial FI – fundos de investimento, inclui os
fundos de investimento, inclusive fundos exclusivos de fundo de pensão e
seguradoras;
• Pessoas Físicas: títulos de diversos clientes pessoas físicas;
• Pessoas Jurídicas: instituições sem conta individualizada no Selic;
• Pessoa Jurídica não financeira: títulos de empresas;
• Outros fundos: fundos de investimento regidos por regulamentação própria,
como por exemplo, fundos de investimento em direitos creditórios – FIDC entre
outros;
• Títulos Vinculados: depósito compulsório sobre poupança, aumento de capital,
recursos externos, empréstimos de liquidez, caução e depósitos judiciais, papéis
dados em garantia em clearing. Neste caso poderão conter ativos de outras
classificações, como as citadas anteriormente.
Estes dados indicam o resultado mensal dos fluxos de emissões e vencimentos,
ou seja, as variações do montante da dívida de cada um dos títulos entre o final de cada
um dos meses do período de análise, que se inicia em novembro de 1999 e termina em
dezembro de 2004. Dados relativos ao volume de negociação em leilões primários e
quais os compradores dos títulos em tais leilões, embora fossem mais apropriados para
este estudo, não se encontram disponíveis. A análise será realizada com base no
montante total em poder do público e em poder de cada um de seus principais
detentores – com especial atenção para os fundos de investimento - para as LFT’s,
LTN’s e NTN-C’s, dado que compõe a maior parte da DPMFi (figura 19) e a quase
totalidade do volume de papéis de tal dívida em poder dos FI’s (figura 20). É importante
destacar que foram tratados em conjunto os títulos atrelados à Selic – LFT, LFT-A e
LFT-B, dado que suas características são essencialmente semelhantes.
77
Figura 19 – Principais títulos da DPMFi em Poder do Público
0%
20%
40%
60%
80%
100%
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
LTN NTN-C LFT Outros
Fonte: BACEN
Como ilustrado na figura acima, as LTN’s, LFT’s e NTN-C’s representam, em
conjunto, mais de 60% do montante da DPMFi em poder do público durante o período
de 1999 a 2002, enquanto a partir de 2003, este valor ultrapassa os 80%. Por esta razão,
as análises seguintes concentrar-se-ão nestes títulos, que representam as principais
modalidades de remuneração (Selic, prefixada e índices de preço). Mais além, são -
como ilustrado na figura 20 - também os principais títulos demandados pelos fundos de
investimento, respondendo por mais de 99% do montante de títulos da DPMFi em poder
dos FI’s.
Figura 20 – Principais títulos da DPMFi em Poder dos FIs
0%20%40%60%80%
100%
nov/
99
mar
/00
jul/0
0
nov/
00
mar
/01
jul/0
1
nov/
01
mar
/02
jul/0
2
nov/
02
mar
/03
jul/0
3
nov/
03
mar
/04
jul/0
4
nov/
04
LTN LFT NTN-C Outros
Fonte: BACEN
As séries disponíveis, por outro lado, diferenciam apenas os títulos em termos de
forma de remuneração (LFT, LTN, NTN-C, etc) e não apresenta informações quanto ao
seu vencimento. Esta abordagem apresenta diversas limitações, entre as quais:
78
• Apenas o tipo de remuneração dos títulos os diferencia para análise, já
que os dados disponíveis não indicam o seu vencimento;
• Dados de aquisição de títulos por período não são utilizados, já que estão
indisponíveis para acesso público, o que não permite identificar
distintamente os fluxos de vencimentos e emissões, mas apenas a
variação deles derivada entre períodos;
• O montante de títulos vinculados não permite a discriminação entre
contas específicas.
Desta maneira, os indícios aqui obtidos devem ser considerados como restritos
pelas limitações dos dados utilizados acima citadas.
Para fins de estudo dividiu-se os detentores de títulos em três grupos, a saber: FI
– Fundos de Investimento, Instituições Financeiras e outros detentores, o que contempla
as demais contas citadas anteriormente.
Figura 21 – Detentores de Títulos da DPMFi
0%
20%
40%
60%
80%
100%
nov/
99
mar
/00
jul/0
0
nov/
00
mar
/01
jul/0
1
nov/
01
mar
/02
jul/0
2
nov/
02
mar
/03
jul/0
3
nov/
03
mar
/04
jul/0
4
nov/
04
FI Inst. Fin. Outros
Fonte: BACEN
Percebe-se, na figura 21, uma redução na participação dos fundos de
investimento na DPMFi no segundo semestre de 2001 e durante 2002 com crescimento
constante a partir de 2003 e durante 2004. Neste sentido, uma das medidas mais
importantes tomadas ao longo de 2004 foi a criação da conta investimento. O objetivo
79
central desta medida foi a isenção da Contribuição Provisória sobre Movimentações
Financeiras – CPMF sobre o giro de aplicações financeiras. Assim, a partir de primeiro
de outubro do mesmo ano, o trânsito de recursos entre aplicações financeiras de
qualquer natureza ficou isento do pagamento de CPMF. A conta investimento permite
ao investidor uma alocação mais eficiente de seus recursos, aumenta a competitividade
na indústria de fundos e o giro do mercado secundário (BRASIL, 2004b). A seguir,
analisa-se a dinâmica da distribuição de LTNs, LFTs e NTN-Cs entre os diferentes
detentores (particularmente FIs e Instituições Financeiras) entre novembro de 1999 e
dezembro de 2004.
3.2.1 Títulos prefixados
Em relação aos detentores de LTN, figura 22, pode-se observar a participação
expressiva dos fundos de investimento nesta modalidade de ativo, chegando a níveis
superiores a 50% do total em poder do público.
Figura 22 – Detentores de LTNs
0%
20%
40%
60%
80%
100%
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
FI Inst. Fin. Outros
Fonte: BACEN
Nota-se ainda significativa redução percentual destes títulos no período que vai
de novembro de 2002 a abril de 2003, tanto nos FI’s quanto nas Instituições
Financeiras. Embora graficamente a participação de outros detentores sofra aumento,
80
isso é decorrência da conta “Títulos Vinculados” que distorce a amostra, uma vez que,
enquanto as demais contas sofrem reduções, esta se mantêm constante.
Os fatores responsáveis pela redução brusca deste ativo prefixado nas carteiras
dos FI’s e de outros agentes econômicos foram ocasionadas, basicamente, pela
crescente incerteza do mercado em relação aos rumos da política econômica a ser
adotada em 2003, considerando que o país acabava de eleger novo presidente de partido
oposicionista. E também pelas sucessivas elevações dos juros básicos internos, que
passaram de 18% ao ano, em setembro/02, para 25% ao ano, em dezembro/02, o que
impacta diretamente a performance dos ativos prefixados.
3.2.2 Títulos atrelados à taxa SELIC
No que tange os títulos LFT’s, a figura 23 demonstra a participação constante
nas carteiras dos FI’s neste ativo pós-fixado, situando-se sempre acima de 40% do total
em poder do público.
Figura 23 – Detentores de LFTs
0%
20%
40%
60%
80%
100%
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
FI Inst. Fin. Outros
Fonte: BACEN
Importante ressaltar a redução na participação dos FI’s durante o processo de
marcação a mercado, que teve início em maio de 2002, mas que volta a regularizar-se
em novembro do mesmo ano.
81
3.2.3 Títulos atrelados a índices de preços
A figura 24 demonstra a participação dos agentes econômicos no total de NTN-
C’s emitidas pelo Tesouro Nacional. Vale ressaltar que este papel começou a ser
emitido em dezembro de 1999. Em linhas gerais, observa-se o crescimento praticamente
constante dos FI’s como detentores deste ativo indexado ao IGP-M. Este título é
demandado, principalmente, pelos fundos de previdência, que buscam investimento de
longo prazo para passivos atuariais.
Figura 24 – Detentores de NTN-C’s
0%
20%
40%
60%
80%
100%
dez/
99
jun/
00
dez/
00
jun/
01
dez/
01
jun/
02
dez/
02
jun/
03
dez/
03
jun/
04
dez/
04
FI Inst. Fin. Outros
Fonte: BACEN
Por outro lado, observa-se pequena redução na participação das Instituições
Financeiras na posse deste título ao longo do período, mas apresentando forte demanda
no final de 1999 e início de 2000, bem como dezembro de 2000, influenciada pelo
comportamento dos índices de preços.
Por fim, a participação significativa de outros detentores a níveis próximos de
40% do total de NTN-C em poder do público é representada pelas pessoas jurídicas não
financeiras e títulos vinculados não passíveis de identificação.
82
3.3 DPMFi e Fundos de Investimento
A figura 25 coloca lado a lado a evolução da DPMFi e o montante de títulos da
dívida em poder dos FI’s. A observação dos comportamentos de ambas as curvas
permite inferir que são bastante semelhantes entre si. Cabe, aqui, analisar os eventos
significativos que possam ter influenciado suas dinâmicas.
Figura 25 – Montante da DPMFI em poder do público e em poder dos FIs
0
200.000
400.000
600.000
800.000
1.000.000
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
R$
mil
DPMFI FI
Fonte: BACEN
O aumento do montante da DPMFi a partir do início de 2001 pode ter sido
originado em razão da política monetária restritiva adotada pelo Banco Central do
Brasil, visando evitar o comprometimento das metas de inflação para o referido ano.
Assim, os juros básicos internos anuais subiram gradualmente de 15,25% no início do
ano para 19% a partir de julho de 2001. Desta forma, os títulos do governo tornam-se
mais atrativos em função da relação risco retorno. Aliados a isso, em setembro do
mesmo ano, atentados terroristas nos Estados Unidos aumentaram o ambiente de
incertezas. A dificuldade em dimensionar os efeitos e a intensidade da tragédia
americana sobre a economia mundial já em desaceleração, principalmente para os países
emergentes, propiciou a procura por ativos mais líquidos e de menor risco.
83
O ano de 2002 foi marcado pela retração da demanda por LFT, decorrente da
crise que afetou os fundos de investimento. Tal movimento teve origem na adoção da
marcação a mercado pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM, gerando forte
volatilidade dos preços das LFT’s. O que se viu a partir de maio de 2002 foram resgates
em massa na Indústria de fundos, facilmente identificados pelo declínio das duas curvas
de montantes de títulos apresentadas da figura 25.
Figura 26 – Fração do montante da DPMFi em poder dos FI’s
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
Fonte: BACEN
A Figura 26 indica uma acentuada queda no volume de títulos em poder dos FI’s
(particularmente no que se refere às LFT’s, como analisado no próximo item) a partir de
maio de 2002. Tal queda deve-se, primordialmente, à crise da marcação a mercado.
84
3.3.1 Títulos pós-fixados atrelados à taxa Selic
Os planos anuais de financiamento da dívida pública editados a partir de
fevereiro de 2001 tinham como diretriz a redução do montante da DPMFi indexada a
taxas flutuantes.
Figura 27 – Montante de LFTs em poder do público e em poder dos FIs
0
100.000
200.000
300.000
400.000
500.000
600.000no
v/99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
R$
mil
DPMFI FI
Fonte: BACEN
Neste sentido, buscou-se substituir os títulos pós-fixados (LFT’s), por títulos
prefixados (LTN’s). Entretanto, os resultados não foram imediatos, principalmente, em
função da crise gerada pelo racionamento de energia elétrica, bem como de influências
advindas do mercado externo, como por exemplo, a desaceleração da economia
americana e o agravamento da situação da Argentina, ambas em 2001, e que causaram
repercussão direta no mercado financeiro nacional.
A dificuldade em atingir as metas estabelecidas para o ano de 2002 foi
conseqüência do aprofundamento das tensões no Oriente Médio, conjugada a
continuada crise da Argentina e do rumo incerto da economia norte-americana, fatores
que contribuíram negativamente para a estabilidade econômica.
Também em 2002, a marcação a mercado, bem como a crescente incerteza do
mercado em relação ao processo eleitoral e os rumos da política econômica a ser
85
adotada em 2003 causaram um forte declínio na curva de participação das LFT’s nos
FI´s (Figura 28).
Figura 28 – Fração do montante de LFT’s em poder dos FI’s
0,0%10,0%20,0%30,0%40,0%50,0%60,0%
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
Fonte: BACEN
A estratégia de rolagem dos vencimentos com o uso de papéis prefixados, mas
também recorrendo à emissão de títulos pós-fixados de longo prazo mostrou sua face
perversa na “crise da marcação a mercado” a partir de maio de 2002. Nos meses
anteriores, a alta concentração de títulos pós-fixados de longo prazo na carteira dos
fundos de investimento acabou por determinar uma elevação no prêmio de risco
(deságio) de negociação das LFT’s no mercado secundário. Com este movimento de
preços desfavorável e frente a perdas acumuladas expressivas em alguns fundos, quando
da determinação do Banco Central para o início da marcação a mercado, houve saques
maciços dos investidores de fundos mútuos, com a grande parte dos recursos migrando
para passivos bancários (poupança e CDB) (FERREIRA; ROBOTTON; DUPITA,
2004).
Até o final de março de 2002, o governo tinha a capacidade de colocação de
títulos em geral, particularmente de LFT’s com reduzidos deságios e praticamente ao
par em mercados extremamente líquidos. Os deságios de LFT’s começaram
gradualmente a se elevar a partir de abril. Em maio de 2002, as LFT’s representavam
aproximadamente 52% da dívida pública mobiliária e 60% dos ativos da indústria de
86
fundos. Os fundos DI e de renda fixa concentravam 2/3 da indústria, fortemente
baseados em LFT´s (BRITO; TACIRO Jr, 2002, p.22).
Como as LFT’s foram negociadas ao par por muitos anos, os gestores e fundos
DI e de renda fixa não diferenciavam as maturidades na composição de suas carteiras.
Alguns até mesmo buscavam maturidades mais longas para oferecer um pequeno
prêmio, associado a um reduzido deságio, aos cotistas. Alguns gestores precificavam
suas carteira ao par, enquanto outros, pressionados por suas áreas de compliance,
reconheciam o impacto do deságio de mercado na precificação de suas carteiras. Com o
gradual aumento dos deságios a partir do final de março, as discrepâncias de
rentabilidade entre as opções de precificação tornaram-se significativas (BRITO;
TACIRO Jr, 2002, p.23).
No complexo contexto do final de maio, a Comissão de Valores Mobiliários
baixou a Instrução n. 365 de 29/05/02, exigindo a marcação plena a mercado das
carteiras e dos ativos de fundos de investimento. Grande parcela dos fundos DI assim
como de renda fixa é distribuída pelos grupos de varejo para pequenos poupadores
como alternativa à caderneta de poupança. Tais poupadores não estavam acostumados
com a volatilidade e possíveis retornos negativos com a marcação a mercado em um
ambiente de risco (BRITO; TACIRO Jr, 2002, p.23).
Nos quatro meses seguintes à Instrução 365, a indústria de fundos perdeu R$ 58
bilhões em resgates líquidos, quase 15% de seus ativos totais. O processo de resgates
líquidos manteve-se até novembro de 2002. A exigência do cumprimento das regras de
marcação a mercado expôs a possibilidade de perda por parte dos investidores de renda
fixa, especialmente nos fundos de investimento, ocasionando uma corrida em busca de
liquidez que reduziu o preço das LFT’s. Este fato obrigou o Banco Central a recomprar
títulos de prazos mais longos e substituí-los por outros de menor maturidade. O
87
resultado foi uma redução do prazo médio da dívida em LFT, entre julho e dezembro
de 2002, de 31 para 22 meses (ANDIMA, 2003).
Com a marcação a mercado, muitos fundos DI e de renda fixa tiveram
rentabilidade negativa e seus clientes começaram a resgatar suas cotas. Os gestores, por
sua vez, venderam LFT’s para atender aos resgates e ajustar suas carteiras, reduzindo a
quantidade de LFT’s longas de 2005 e 2006, sujeitas a deságios elevados e crescentes.
As pressões de venda de LFT’s reduziram drasticamente a liquidez de seu mercado.
Após um período de dificuldades no mercado, entre junho e agosto de 2002, a CVM
baixa a instrução n. 375 de 14/08/2002, flexibilizando a instrução n. 365. As carteiras de
fundos poderiam precificar pela curva do papel os títulos com maturidade de até um ano
e os quais pretendiam carregar até o vencimento (BRITO; TACIRO Jr, 2002, p.24).
O impacto nas carteiras dos fundos da marcação a mercado gerou uma mudança
nas preferências, ou seja, alguns gestores começaram a questionar as vantagens e os
riscos de se manter em carteira os papéis LFT’s, principalmente, os mais longos e que,
portanto, apresentam maior dispersão da rentabilidade, ora apresentando um bom
retorno ora apresentando um retorno abaixo do esperado. A indústria de fundos
deparou-se então com um problema, se por um lado os títulos LFT’s apresentam boa
rentabilidade, por outro embutem um alto risco de perda de valor em momentos de
stress do mercado. Isso ocorre em função destes papéis serem negociados com
ágios/deságios e as oscilações destas taxas afetarem o rendimento de fundos investidos
em LFT’s. Assim, os gestores adotaram uma postura cautelosa, em que parte
significativa dos recursos dos fundos de investimento são aplicados na compra de LFT’s
com vencimento de curto prazo, visando evitar a alta volatilidade de cotas nos fundos de
investimento.
88
A crise da indústria de fundos originada pela marcação a mercado em 2002 foi
agravada pelas desconfianças geradas pela transição eleitoral, que praticamente
paralisou a colocação de títulos públicos federais entre junho e setembro. Passada a
incerteza quanto ao compromisso do novo governo com políticas econômicas
responsáveis, o mercado de dívida pública normalizou-se, mas deixando um
ensinamento: buscar o alongamento de prazos da dívida pública com base em uma
parcela considerável de títulos pós-fixados mostrou-se também uma estratégia sujeita a
riscos, frente a uma indústria de fundos de investimento com liquidez diária
(FERREIRA; ROBOTTON; DUPITA, 2004).
Entretanto, após a crise, a curva registra recuperação a partir do início de 2003,
voltando a se estabilizar no final do mesmo ano.
Figura 29 – Fração de LFTs nos títulos da DPMFi em poder dos fundos
0,0%
20,0%
40,0%
60,0%
80,0%
100,0%
mar
/00
set/0
0
mar
/01
set/0
1
mar
/02
set/0
2
mar
/03
set/0
3
mar
/04
set/0
4
Fonte: BACEN
A demanda majoritária por papéis pós-fixados, demonstrada pelos fundos de
investimento, figura 29, decorre do fato de possuirmos um indexador na economia
brasileira – a taxa interbancária, ou CDI – que baliza a grande parte dos ativos e
passivos de investidores, empresas e bancos. Assim, a indústria de fundos no Brasil
possui grande parcela de seus ativos referenciados ao CDI. O uso do CDI como
indexador diário é reflexo de dois fatores básicos: os momentos de inflação elevada e
89
instável, que encurtava os horizontes dos aplicadores, elevando o risco de perda
associado a aplicações prefixadas e os sucessivos calotes da dívida pública a partir dos
anos 80, atrelados à manipulação da correção monetária e planos econômicos, até a
edição do plano real. Vale lembrar que mesmo em 2002 a rolagem da dívida
pública foi problematizada pelo temor de que o novo governo lançasse mão de algum
expediente de renegociação da dívida pública. Contudo, os títulos pós-fixados tendem a
ser preferidos mesmo em um contexto em que os riscos citados acima sejam baixos,
como no período 2003/2004. Esta preferência ocorre em função do alto custo de
oportunidade, para o investidor, de assumir riscos em aplicações referidas a títulos
prefixados, em função da elevada taxa de juros real básica over-Selic ou CDI
(FERREIRA; ROBOTTON; DUPITA, 2004).
Em se tratando de títulos públicos federais, a indústria de fundos de investimento
parece ter demonstrado sua opção por títulos pós-fixados, mais precisamente à taxa
Selic (LFT’s), principalmente no período analisado neste estudo, de novembro de 1999
a dezembro de 2004. Esta escolha se deve as vantagens de possuir nas carteiras dos
fundos um título que acompanha a variação da taxa básica de juros do país.
Os gestores dos fundos de investimento historicamente mantiveram grande
interesse na aquisição de LFT’s. O que parece ficar claro no comportamento destes
profissionais é a busca pela liquidez e excelente relação risco/retorno, principalmente
porque estes ativos acompanham a variação da taxa de juros do país.
3.3.2 Títulos prefixados
As diretrizes apresentadas – a partir de fevereiro de 2001 - pelos PAFs para os
títulos prefixados sempre visavam a elevação da sua participação no montante total da
90
dívida. Entretanto, em alguns momentos este objetivo não foi atingido em função de
diversos fatores, alguns dos quais serão apresentados a seguir.
Figura 30 – Montante de LTN’s em poder do público e montante de LTN’s em poder dos FI’s
0
50.000
100.000
150.000
200.000
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
R$
mil
DPMFI FI
Fonte: BACEN
Em dezembro de 2000, os títulos prefixados representavam 15% do total da
DPMFi, sendo que no final de dezembro de 2001, essa participação caiu para 7,8% e em
dezembro de 2002, para 2,2% do montante total da dívida. Os resultados de 2001 foram
impactados pelo grau de incerteza presente no ambiente econômico influenciado,
principalmente, pela desaceleração da economia americana e o agravamento da situação
da Argentina. Da mesma forma, em 2002, o rumo incerto da economia norte-
americana, bem como o aprofundamento das tensões no Oriente Médio e o contínuo
agravamento da crise da Argentina, contribuíram negativamente para a estabilidade
econômica. No mercado doméstico o processo eleitoral e os rumos da política
econômica a ser adotada em 2003 aumentaram a volatilidade do mercado de títulos,
levando a uma significativa queda do volume de LTN’s em 2002.
Contudo, a partir de 2003, inicia-se um processo de recuperação da confiança
dos investidores na economia brasileira. As LTN’s passaram a ser emitidas em datas de
91
vencimentos coincidentes com as datas de vencimento de contratos no mercado futuro,
aumentando sua liquidez e demanda por ser melhor combinadas com outros
instrumentos financeiros. Desta forma, em dezembro de 2003, o montante de LTN’s no
total da DPMFi atinge 12,5%, dentro da meta estabelecida no plano anual de
financiamento da dívida.
Em 2004, as expectativas favoráveis quanto a economia brasileira são mantidas,
resultando no aumento da participação relativa dos títulos prefixados que atingem
20,1% do total da DPMFi no final de dezembro, ficando muito próxima do teto da meta
estabelecida para o ano.
Figura 31 – Fração do montante de LTN’s em poder dos FI’s
0,0%10,0%20,0%30,0%
40,0%50,0%60,0%70,0%
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
Fonte: BACEN
A figura 31 guarda semelhança com os dados do montante de LTN’s em poder
do público e o montante de LTN’s em poder dos FI’s (figura 30), e demonstra o
comportamento do montante de títulos LTN em poder da indústria de fundos que oscila,
basicamente, em função dos mesmos fatores apresentados anteriormente. Ou seja, queda
a partir de 2001, devido à desaceleração da economia americana e o agravamento da
situação da Argentina. Pequena recuperação durante a crise de marcação a mercado que
atingiu mais as LFT’s em maio de 2002, e, posteriormente apresentando queda em
função do processo eleitoral em novembro do mesmo ano. A partir do início de 2003, o
92
que se observa é um forte crescimento atribuído às expectativas favoráveis que
permaneceram até 2004.
Os títulos prefixados definem o horizonte de confiança plena dos investidores na
política econômica. A demanda por parte destes investidores se dá especialmente em
contextos de expectativa de corte da taxa de juros, o que leva investidores alavancados a
demandarem títulos prefixados em busca de ganhos de capital.
Neste sentido, o que se verifica na composição da indústria de fundos é uma
conduta bastante conservadora, por parte dos gestores, no que diz respeito à exposição
aos riscos prefixados, tendo em vista a possibilidade de perdas em momentos
turbulentos que afetem a economia doméstica. Essa atitude pode ser compreendida pela
dificuldade de recuperação de eventuais perdas sofridas pelos fundos com reflexo direto
na rentabilidade dos mesmos, principalmente, num mercado extremamente competitivo,
em que os gestores procuram preservar o patrimônio dos cotistas. Assim, qualquer
perda que não esteja condizente com o restante da indústria pode significar, para o
gestor que a comete, perda de recursos para outros administradores, mesmo
considerando que os investidores que aplicam em cotas de fundos tendem a ser menores
e, portanto, menos sofisticados, ou seja, teriam uma noção muito limitada do mercado
em que estão investindo.
Para um investidor final, o ganho de investir em uma aplicação prefixada é o
custo de oportunidade de aplicar em outras alternativas de renda fixa ou renda variável.
Para um fundo agressivo, que não é tomador final, o ganho é dado pela diferença entre o
rendimento do ativo e o seu custo de oportunidade, representado no Brasil pela taxa
CDI. O ganho se materializa quando há queda na taxa de longo prazo (elevando o preço
do ativo), desde que se gere um ganho de capital frente ao custo do financiamento.
Inversamente, há sempre perda se há uma elevação na taxa de longo prazo (fazendo cair
93
o preço do ativo), à qual se soma o custo do financiamento (FERREIRA;
ROBOTTON; DUPITA, 2004).
Em um mercado bull (otimista), em que há expectativa de alta de preço de ativos
(ou seja, de queda dos juros), tal como discutido no capítulo um deste trabalho, os
fundos de investimento alavancados tendem a elevar a posse de ativos prefixados. Se
partirem de um ponto inicial em que a posse de ativos prefixados é pequena (como, por
exemplo, era o caso no início de 2003), há espaço para um aumento da demanda “pré”.
Na medida em que esta demanda cresce, a curva da taxa de juros vai ficando menos
vertical, já que as taxas de prazos gradualmente mais longos declinam. Isso aumenta o
apetite de fundos de investimento destinados a investidores alavancados por
instrumentos de prazos mais longos, por terem taxas maiores, ampliando as
possibilidades de ganho. Assim, o processo de alongamento de prazo da dívida
prefixada vai avançando. Mas este processo acaba tendo um limite na ausência de
tomadores finais. Quando a exposição ao risco pré do mercado se aproxima dos limites
ditados pelos modelos de gestão de risco, a demanda por estes papéis tende a diminuir,
sem que os títulos prefixados tenham alcançado participação expressiva na dívida frente
aos papéis pós-fixados. E com o risco “pré” do mercado já elevado, qualquer motivo de
stress sobre os preços, elevando a volatilidade, dita a necessidade de fortes ajustes nas
carteiras (FERREIRA; ROBOTTON; DUPITA, 2004).
Por fim, pode-se inferir que a preferência por títulos prefixados em detrimento
dos papéis pós-fixados ocorre apenas em momentos em que o mercado se apresenta
favorável à redução gradual da taxa de juros. Mas, isso não significa que os fundos não
possuam em sua composição papéis prefixados, contudo, a BM&F – Bolsa de
Mercadorias e Futuros disponibiliza instrumento derivativo denominado contrato futuro
de Depósito Interbancário - DI, no qual os gestores podem fazer hedge das posições
94
compradas em prefixados, transformando-as na sua totalidade ou parcialmente em
operações pós-fixadas, nos momentos em que achar conveniente. Desta forma, muitas
vezes a demanda de títulos prefixados por parte de fundos mútuos tradicionais (renda
fixa) não é uma demanda “pré” legítima, pois em geral são convertidos em taxas
flutuantes via derivativos (FERREIRA; ROBOTTON; DUPITA, 2004).
Figura 32 – Fração de LTNs nos títulos da DPMFi em poder dos fundos
0,0%
5,0%
10,0%
15,0%
20,0%
25,0%
mar
/00
set/0
0
mar
/01
set/0
1
mar
/02
set/0
2
mar
/03
set/0
3
mar
/04
set/0
4
Fonte: BACEN
Neste sentido, mesmo a indústria de fundos de investimento detendo 20,9% de
papéis prefixados em dezembro de 2004, conforme figura 32, vale destacar que grande
parte deste montante possui hedge em contratos futuros de DI. Tal fato está fortemente
associado a que o investidor de fundos é bastante avesso à volatilidade dos papéis
prefixados, que podem apresentar significativas perdas em períodos de instabilidade
econômica, o que já foi demonstrado no passado com elevações abruptas da taxa básica
de juros do país.
3.3.3 Títulos atrelados a índices de preços
A figura 33 demonstra o crescimento conjunto das curvas do montante de NTN-
C’s em poder do público e do montante de NTN-C’s em poder dos FI’s.
95
Figura 33 – Montante de NTN-Cs em poder do público e montante de NTN-Cs em poder dos FIs
0100002000030000400005000060000700008000090000
nov/
99
mai
/00
nov/
00
mai
/01
nov/
01
mai
/02
nov/
02
mai
/03
nov/
03
mai
/04
nov/
04
R$
mil
DPMFi FI
Fonte: BACEN
Este forte crescimento do volume de NTN-C’s na DPMFi pode ser atribuído ao
sucesso na implementação dos planos anuais de financiamento, que estabeleceram, para
os anos de 2001 e 2002, metas de ampliação de prazos de vencimentos, bem como
emissões que contemplavam a possibilidade de troca por títulos LFT’s em poder do
mercado.
Em 2003 e 2004, o que se verificou foi à substituição gradual dos títulos
remunerados à variação cambial e à taxa Selic por títulos indexados a índices de preços.
Figura 34 – Fração do montante de NTN-C’s em poder dos FI’s
0,0%
10,0%
20,0%
30,0%
40,0%
50,0%
60,0%
dez/
99
jun/
00
dez/
00
jun/
01
dez/
01
jun/
02
dez/
02
jun/
03
dez/
03
jun/
04
dez/
04
Fonte: BACEN
96
A indústria de fundos também é demandante de títulos indexados a índice de
preços. Principalmente para os fundos de previdência (atuariais) e de empresas
seguradoras, que possuem passivos indexados a índices de inflação, necessitando,
portanto, hedgear suas posições. Os fundos de investimento desenvolvidos para estes
clientes específicos possuem em sua carteira a grande parte dos títulos NTN-C’s,
indexados ao IGP-M.
Apesar de sua restrita participação no portfólio dos fundos, vale ressaltar o
crescimento destes agentes na posse das NTN-C’s, passando de 20% no início de 2000 a
50% em dezembro de 2004, conforme figura 34.
Figura 35 – Fração de NTN-Cs nos títulos da DPMFi em poder dos fundos
0,0%2,0%4,0%6,0%8,0%
10,0%12,0%
mar
/00
set/0
0
mar
/01
set/0
1
mar
/02
set/0
2
mar
/03
set/0
3
mar
/04
set/0
4
Fonte: BACEN
O significativo aumento do patrimônio dos FI’s composto por NTN-C’s, a partir
de setembro de 2002, como demonstra a figura 35, pode ser explicado por um conjunto
de ações do Governo. Primeiro, pelo fato da Secretaria do Tesouro Nacional passar a
realizar leilões de troca, em que eram oferecidos papéis NTN-C’s e aceitava-se como
forma de pagamento a entrega de Moedas de Privatização - MOP5. Estas representam os
5 A utilização da expressão “moeda de privatização” como sinônimo de “crédito securitizado”, foi comum até recentemente. Mas na verdade, além dos créditos securitizados, fazem parte outros passivos do Governo e das empresas públicas, a exemplo dos CP – Certificados de Privatização, OFND – Obrigações do Fundo Nacional de Desenvolvimento, TDA – Títulos da Dívida Agrária, vencidos e já registrados sob a forma escritural no Securitizar/CETIP, LH - Letras Hipotecárias de emissão especial da Caixa Econômica e Debêntures da Siderbrás com garantia do Tesouro Nacional (ANDIMA).
97
créditos securitizados resultantes da renegociação de dívidas de responsabilidade da
União, geralmente vencidas e não pagas. Segundo, pela intenção do Governo em
alongar o prazo da dívida pública, neste caso os papéis NTN-C’s se apresentavam como
um bom instrumento, visto que seus prazos de vencimentos são bastante dilatados
(ANDIMA, 2005).
Os fundos que detinham Moedas de Privatização optaram em trocá-los por
papéis NTN-C’s. A alternativa levava em conta a maior liquidez destes ativos, uma vez
que estes eram emitidos pelo Tesouro, negociados no mercado secundário e registrados
no Selic, diferentemente das MOP’s que são registradas no CETIP – Central de
Custódia e Liquidação Financeira de Títulos, com mercado secundário praticamente
inexistente. Acrescenta-se ainda que os ativos possuíam o mesmo indexador, ou seja,
índice de preços.
3.4 Conclusões
A gestão da DPMFi, tal como apresentado nos planos anuais de financiamento,
apresenta como objetivo constante desde 2001, a redução da fração de títulos atrelados à
taxa Selic (LFT) em prol daqueles prefixados (LTN e NTN-F) ou atrelados a índices de
preços (NTN-C e NTN-B). Tais objetivos, no entanto, não foram alcançados em função
de um conjunto de fatores. Em 2001, os efeitos do atentado de 11 de setembro e a
desaceleração da economia americana, assim como o agravamento da crise da Argentina
incrementaram a incerteza, implicando em redução da participação de LTN’s na
DPMFi. Já em 2002, as dúvidas relativas ao processo eleitoral e à continuidade das
políticas econômicas, aliada ao incremento da taxa básica de juros pelo Banco Central,
tiveram como conseqüência, uma vez mais a redução do volume de LTN’s a seu
98
patamar mais baixo em todo o período analisado, chegando a apenas 2,2% da DPMFi.
Em 2003, por outro lado, a sinalização de continuidade das políticas econômicas pelo
novo governo associou-se a uma expectativa positiva de queda nas taxas de juros, o que
implica, tal como discutido no capítulo um, uma perspectiva otimista “bull” com
tendência a adquirir títulos prefixados, que teriam seu valor incrementado. Verificou-se,
de fato, um maior investimento em LTN’s, que atingiram 12,5% do montante da dívida,
atingindo os objetivos do PAF para esse ano. Vale ressaltar uma significativa queda na
parcela de títulos atrelados ao câmbio, ainda em 2003, de 22% para 13,6%. Já em 2004,
a trajetória de crescimento das LTN’s manteve-se e chegou a 20,1% do montante total,
acompanhada de uma pequena queda na fração de LFT’s (61% para 57,1%).
No período de novembro de 1999 a dezembro de 2004, o comportamento dos
principais títulos da DPMFi em poder dos fundos (LFT, LTN e NTN-C) parece ter
acompanhado as variações da própria DPMFi. Mais de 40% da DPMFi esteve em poder
dos FI’s, exceto entre maio de 2001 e maio de 2003. Em agosto de 2002, esta fração
chega a apenas 30% em função do significativo volume de saques dos FI’s devido à
crise da Marcação a Mercado, que mostrou aos investidores a existência de um risco de
capital, além do risco de renda nos FI’s. Mais além, houve uma significativa redução
nas LTN’s derivada da incerteza sobre o resultado das eleições presidenciais. A partir de
setembro de 2002, no entanto, as LFT’s voltam a se recuperar em sua participação nos
FI’s, estabilizando-se em meados de 2003, com aproximadamente 65% do montante de
títulos da DPMFi em poder dos FI’s. A significativa queda das LTN’s em 2002, com
participação próxima de zero nos primeiros meses de 2003 e sua recuperação no
segundo semestre do mesmo ano é acompanhada pelos FI’s com participação em
dezembro de 2004 ligeiramente inferior à de novembro de 1999. Finalmente, quanto as
NTNC-s, sua participação se ampliou significativamente nos FI’s – atingindo 11% em
99
dezembro de 2004 – acompanhando o comportamento do papel na DPMFi, inclusive
no que se refere ao pico de crescimento no segundo semestre de 2002, em função da
possibilidade de trocas por moedas de privatização.
100
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Discutiram-se, neste trabalho, razões para a preferência pela liquidez, tanto na
perspectiva de Keynes, quanto no que se refere a Tobin ao tratar a preferência pela
liquidez como comportamento em relação ao risco. Tal análise conduziu a postular o
investidor típico como avesso ao risco e disposto a aceitar riscos mais elevados apenas
em troca de um maior retorno esperado. Dada esta premissa, analisou-se, tal como
proposto por Markowitz, o conceito de fronteira eficiente, ou combinações de risco e
retorno, nas quais, para um dado risco, tem-se o maior retorno esperado. As escolhas
eficientes seriam aquelas em tal fronteira. O ponto da fronteira pelo qual dar-se-ia a
escolha do investidor dependeria de sua função utilidade.
Uma alternativa de composição de carteira para o investidor individual, os
fundos de investimento consistem em portfólios de ativos gerenciados por profissionais
e divididos entre seus proprietários, ou cotistas. Entre as vantagens de tais fundos,
incluem-se a diversificação da carteira e conseqüente redução de risco, administração
profissional contínua de profissionais experientes e preparados para identificar
alternativas com mais propriedade do que os cotistas, e liquidez diária, permitindo a
rápida conversão das cotas.
A gestão de um fundo de investimento, ou a composição de seu portfólio toma
por base a fronteira eficiente e se localiza nesta em função do perfil dos investidores em
termos de sua função utilidade. Considerando-se os investidores como avessos ao risco,
os títulos livres de risco, particularmente os papéis da dívida pública tornam-se
particularmente relevantes, o que se reflete na sua predominância no portfólio dos
fundos. Dada a posição dos fundos de investimento como principais demandantes de
títulos da DPMFi, este trabalho buscou analisar a relação entre estes fundos e o mix de
tal dívida, em termos de forma de remuneração de seus títulos, mais especificamente,
101
participação de LTN’s (papéis prefixados), LFT’s (papéis vinculados à taxa Selic) e
NTN-C’s (papéis atrelados a índices de preços).
Pela ótica do gestor dos fundos de investimento, as LFT’s são os títulos
priorizados na composição do portfólio – preferencialmente as de vencimentos
próximos - dado o menor risco a que estão sujeitos, embora a crise da marcação a
mercado tenha indicado que o risco de capital é real quando se trata de LFT’s. A
tendência a evitar os riscos de papéis prefixados mostra-se claramente pelo uso de
hedge em derivativos para as LTN’s nos portfólios dos fundos. Por outro lado, os
objetivos do gestor da dívida pública são claramente explicitados nos planos de
financiamento anual no que se refere à redução do montante de LFT’s em prol de títulos
prefixados e alongamento dos prazos dos títulos.
A possibilidade de incrementar a participação de LTN’s no montante da DPMFi
foi limitada, durante o período de análise - novembro de 1999 a dezembro de 2004 - em
função de fatores tais como o aumento da incerteza e de uma expectativa pessimista
quanto à taxa de juros em 2001 – particularmente em função do atentado de 11 de
setembro e da crise Argentina – e em 2002 pelas dúvidas quanto ao resultado da
sucessão presidencial e seu impacto sobre a política econômica. Em 2002, a aversão ao
risco derivada de expectativas de aumento das taxas de juros por parte dos FI’s mostra-
se pelo patamar extremamente reduzido de participação de LTN’s em seu portfólio, que
aproxima-se de zero. No mesmo período, as LTN’s responderam por apenas 2,2% da
DPMFi. Apenas a partir de meados de 2003, com a perspectiva de continuidade da
política econômica pelo novo governo, houve uma recuperação do volume de títulos
prefixados, que se manteve em 2004. Por outro lado, o crescimento do montante de
NTN-C’s na DPMFi têm sido acompanhado fortemente pelos portfólios dos FI’s. A
análise visual das séries históricas de cada um destes títulos em poder do público e em
102
poder dos fundos de investimento mostra que estas apresentam comportamento muito
semelhante.
A crise da marcação a mercado dos fundos de investimento teve impactos direto
sobre a composição da DPMFi, o que se mostrou um indício de influência da demanda
dos FI’s sobre tal composição. Por outro lado, é prática comum da Secretaria do
Tesouro a consulta às mesas de operações das administradoras de fundos de
investimento antes da realização de leilões de colocação de títulos federais, o que
também sugere tal influência.
Neste contexto, a capacidade do Tesouro Nacional de colocar títulos que atinjam
seus objetivos em termos de minimização do custo da dívida enfrenta a demanda dos
principais detentores de tais títulos – especialmente os fundos de investimento – em
termos de seus objetivos para a composição ideal de portfólio, particularmente em
termos de aversão ao risco e preferência pela liquidez. Assim, os fundos de
investimento, como principais demandantes de títulos da Dívida Pública Mobiliária
Federal interna exerceriam uma relevante influência sobre a composição da mesma, à
medida em que condicionariam as emissões, em função da sua elevada participação em
tal mercado.
Os dados descritos no capítulo três do presente trabalho sugerem uma relação
entre os FI’s e a composição da DPMFi, e uma relação direta de influência dos
primeiros sobre a última quando se considera a consulta da Secretaria do Tesouro às
Assets antes dos leilões de títulos. A identificação de uma relação mais clara das
preferências dos fundos quanto às características dos títulos inclusos nos leilões e a
composição observada necessitaria de uma análise com base em dados mais precisos,
em termos de compradores de papéis nos leilões primários. Estes dados, no entanto, não
se encontravam disponíveis no momento da elaboração do presente trabalho.
103
Esta dissertação, no entanto, traz indícios de que a indústria de fundos de
investimento, como detentora de expressiva fração dos papéis da DPMFi poderia - em
função de seus objetivos para obtenção do portfólio mais adequado em sua fronteira
eficiente – condicionar a emissão de títulos pelo Tesouro Nacional. As conseqüências
de tal influência dos FI’s sobre a dívida pública mostra-se, ainda, relativamente
inexplorada na literatura nacional. Neste sentido, sugere-se, com o intuito de testar tal
hipótese, possíveis estudos futuros, que poderiam incluir:
• Analisar a dinâmica do perfil de emissões de títulos no mercado primário
– e não apenas variações mensais do estoque de papéis, como no presente
trabalho – em termos de sua forma de remuneração (atrelada à SELIC,
prefixada, vinculada a índices de preços).
• Estudar a evolução do mix da DPMFi não apenas em termos de formas
de remuneração, mas também de vencimentos dos títulos emitidos no
mercado primário.
Com dados de emissões primárias, estudos futuros poderiam estimar modelos
econométricos que permitiriam testar a hipótese levantada pelo presente trabalho, a
partir de uma análise qualitativa, a saber: A indústria de fundos de investimento no
Brasil condicionaria as emissões de títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal interna,
tanto no que se refere a forma de remuneração dos papéis quanto a seu vencimento.
104
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ANEXO A – Caracterização dos principais títulos da DPMFi
Fonte: Banco Central do Brasil, 2005
• Títulos prefixados
o LTN. Título prefixado com pagamento único, na data do resgate. O
rendimento baseia-se no deságio sobre o valor nominal. O resgate dá-se
pelo valor nominal.
o NTN-F. Título prefixado com pagamento semestral de cupons de juros,
os quais podem ser negociados separadamente do principal.
• Títulos remunerados por índices de preços
o Notas do Tesouro Nacional Série B (NTN-B). Título indexado ao IPCA,
com pagamento semestral de cupons de juros. A taxa de juros é definida
pelo Ministro de Estado da Fazenda, quando da emissão, em
porcentagem ao ano, aplicada sobre o valor nominal atualizado. O
pagamento de juros ocorre semestralmente, com ajuste no primeiro
período de fluência, quando couber. O primeiro cupom de juros a ser
pago contemplará a taxa integral definida para seis meses,
independentemente da data de emissão do título. O resgate dá-se em
parcela única, na data do vencimento.
o Notas do Tesouro Nacional Série B (NTN-C). Título indexado ao IGP-
M, com pagamento semestral de cupons de juros. A taxa de juros é
definida pelo Ministro de Estado da Fazenda, quando da emissão, em
porcentagem ao ano, aplicada sobre o valor nominal atualizado. O
pagamento dos juros dá-se semestralmente, com ajuste no primeiro
período de fluência, quando couber. O primeiro cupom de juros a ser
112
pago contemplará a taxa integral definida para seis meses,
independentemente da data de emissão do título.
• Títulos remunerados pela taxa Selic
o Letras Financeiras do Tesouro (LFT). Título indexado à taxa Selic, com
pagamento único na data de resgate – valor nominal acrescido do
respectivo rendimento, desde a data-base do título.
o Letras Financeiras do Tesouro Série A (LFT-A). Tem como rendimento
a taxa Selic acrescida de 0,0245% a.m. O resgate se dá em até 180
parcelas mensais consecutivas, vencendo a primeira no mês seguinte ao
da emissão, sendo cada uma delas de valor correspondente ao resultado
obtido pela divisão do saldo remanescente, atualizado e capitalizado, na
data do vencimento de cada uma das parcelas pelo número de parcelas
vincendas, inclusive a que estiver sendo paga.
o Letras Financeiras do Tesouro Série B (LFT-B). Título indexado à taxa
Selic, com pagamento único na data de resgate – valor nominal acrescido
do respectivo rendimento, desde a data-base do título.
• Títulos remunerados pela variação cambial
o Notas do Tesouro Nacional Série D (NTN-D). O valor nominal é
atualizado pela cotação de venda do dólar dos Estados Unidos no
mercado de câmbio de taxas livres, sendo consideradas as taxas médias
dos dias úteis imediatamente anteriores à data-base e à data do
vencimento do título. A taxa de juros é definida pelo Ministro de Estado
da Fazenda, quando da emissão, em porcentagem ao ano, aplicada sobre
o valor nominal atualizado. O pagamento dos juros ocorre
semestralmente, com ajuste no primeiro período de fluência, quando
113
couber. O primeiro cupom de juros a ser pago contemplará a taxa
integral definida para seis meses, independentemente da data de emissão
do título. Os cupons de juros dos títulos com prazo igual ou superior a
cinco anos emitidos em oferta pública entre 1o de outubro de 1997 e 17
de julho de 2000 poderão ser negociados separadamente do principal,
permanecendo com suas características de emissão. O resgate se dá em
parcela única, na data do vencimento.
o Notas do Banco Central do Brasil Série Especial (NBCE). O valor
nominal é atualizado pela variação da cotação de venda do dólar dos
Estados Unidos no mercado de câmbio de taxas livres, sendo
consideradas as taxas médias dos dias úteis imediatamente anteriores à
data-base e à data do vencimento do título. A taxa de juros é definida
pelo Banco Central do Brasil, quando da emissão, em porcentagem ao
ano, aplicada sobre o Valor nominal atualizado. O pagamento dos juros
se dá semestralmente, com ajuste de prazo no primeiro período de
fluência, quando couber. O primeiro cupom de juros a ser pago
contemplará a taxa integral definida para seis meses, independentemente
da data de emissão do título. O resgate ocorre em parcela única, na data
do vencimento.