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Universidade Lusíada de Lisboa A Comunicação no Museu Maria Isabel Rocha Roque Dissertação Final do Curso de Pós Graduação em Museologia e Património Artístico Orientadora: Dr.ª Maria Natália Correia Guedes Lisboa, ano lectivo 1989/90

A Comunicação no Museu - Depósito de Dissertações e Teses …dited.bn.pt/31586/2573/3088.pdf · l. INTRODUÇÃO O alargamento e intensificação dos meios de comunicação no

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Universidade Lusíada de Lisboa

A Comunicação no Museu

Maria Isabel Rocha Roque

Dissertação Final do Curso de Pós Graduação em

Museologia e Património Artístico

Orientadora:

Dr.ª Maria Natália Correia Guedes

Lisboa, ano lectivo 1989/90

ÍNDICE

l. INTRODUÇÃO ......................................................................................................3 2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS ..............................................................................6

2.1. CRITÉRIOS PEDAGÓGICOS NA EVOLUÇÃO DO MUSEU .....................6 2.2. O DIALOGO ENTRE O PUBLICO E O MUSEU......................................12 2.3. TIPOS DE APRENDIZAGEM ................................................................17 2.4. O ESTATUTO DO OBJECTO ...............................................................20 2.5. ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO NO MUSEU .................................25 2.5.1. Exposições........................................................................................25 2.5.2. Acções pedagógicas ..........................................................................30 2.6. COMUNICAÇÃO COM GRUPOS ESPECIAIS .......................................34 2.6.1. Minorias étnicas e sociais...................................................................34 2.6.2. Deficientes ........................................................................................37 2.7. A DIVULGAÇÃO DO MUSEU NA COMUNIDADE ..................................39

3. OBSERVAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE PÚBLICO E MUSEU...............................44

3.1. CARACTERIZAÇÃO DOS ESPAÇOS DE ANÁLISE ...............................45 3.1.1. Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA)..............................................45

História da colecção......................................................................................45

O Museu Nacional de Arte Antiga no Palácio Alvor e no convento das Albertas 47

3.1.2. Museu da Cidade (MC) ......................................................................49 História da colecção......................................................................................49

O Museu da Cidade no Palácio Pimenta ........................................................51

3.2. ANÁLISE DO PUBLICO - MNAA/MA .....................................................52 3.2.1. Preâmbulo ........................................................................................52 3.2.2. Observação Naturalista......................................................................53 3.2.3. Inquérito............................................................................................57 3.2.4. Conclusão .........................................................................................68 3.3. FUNÇÃO COMUNICATIVA DO MUSEU................................................69 3.3.1. Informação - MNAA/MC.....................................................................69 3.3.2. Dinamização - MNAA/MC...................................................................78 3.3.3. Serviço educativo - MNAA/MC............................................................85 3.3.4. Contacto com grupos étnicos .............................................................91

3.4.4.1. Minorias étnicas e sociais..................................................................91

3.3.4.2. Deficientes .......................................................................................96

3.3.5. Propaganda e mercado.................................................................... 102 4. CONCLUSÃO .................................................................................................. 107 5. BIBLIOGRAFIA................................................................................................ 110

l. INTRODUÇÃO

O alargamento e intensificação dos meios de comunicação no nosso quotidiano

provocaram a ocorrência de fenómenos que marcam, do ponto de vista sociológico, o Homem

de hoje: a aceleração do ritmo de vida e alterações sucessivas e rápidas dos padrões que a

norteiam; a divulgação maciça de conhecimentos em simultâneo com uma cada vez maior

especialização dos campos de saber; a urbanização crescente e a sua progressiva influência

nos meios rurais; em suma, uma directa ou indirecta manipulação das ideias, dos actos e das

vontades individuais criando no Homem actual uma preocupação dominante pela pressa na

corrida contra o tempo. O indivíduo actua, sobretudo, no sentido de não se deixar ultrapassar

pelo progresso e pela mudança, investindo o máximo dos seus pensamentos, da sua

criatividade e das suas realizações no Presente. Esta situação provoca, a par de um grande

isolamento do indivíduo na sua comunidade, sentida como um grupo de desconhecidos, uma

nostalgia crescente pelos mais variados campos de referência das suas tradições e História.

Na medida em que o museu se considera como uma instituição que procura ilustrar a

evolução da Humanidade através dos documentos que o Passado nos legou, a função que

cumpre na sociedade é hoje e no enquadramento dos parâmetros traçados mais premente que

nunca – a de desvendar, elucidar ou animar fragmentos das culturas e civilizações

protagonizadas pelo Homem. A dinamização do museu deriva da sua capacidade de

adaptação às coordenadas em que a sociedade actual se move; é através do reconhecimento

daquilo que interessa e estimula a comunidade em que se insere que o discurso de uma

qualquer instituição museológica ganha impacto e eficácia.

Como centro de cultura, o museu procura revitalizar a sua capacidade dialogante,

assumindo-se como um meio de comunicação fulcral entre o Passado e o Presente. Emissor, o

museu cumpre uma dupla função: a de actuar como pólo catalizador do meio comunitário e,

simultaneamente, como desmistificador da Ciência, Arte e Cultura, no sentido em que

interpreta estes campos do saber, tornando-os mais próximos do homem comum. O objecto,

cerne da comunicação que se procura travar, é a mensagem, fulcro e fonte de todo o discurso

museológico, através do qual perpassam todas as informações que o museu veicula. Daí que o

estudo de cada peça, a análise material, estética e histórica, o conhecimento tão profundo e

vasto quanto possível, sejam critérios imprescindíveis para que o objecto possa ser

correctamente utilizado no discurso efectuado pelo museu.

Determinar as coordenadas espaço-temporais a que o documento histórico se refere e

avaliar o seu grau de representatividade permite inserir a peça num todo significante, com uma

função ilustrativa, específica e concreta. O objecto, que perdeu a sua real importância ao

desinserir-se do universo para que foi criado e em que foi utilizado, ganha uma dimensão

simbólica que modifica o seu valor inicial, potenciando-o ou reduzindo-o. Se, em certos

aspectos, o afastamento do seu verdadeiro contexto torna a leitura do objecto mais obscura, é

necessária a criação de suportes que reforcem a compreensão e aprendizagem, clarificando-o

através de uma informação adicional: novas mensagens paralelas, produzidas em linguagem

verbal ou imagética, com uma função essencialmente explicativa e que completem a

informação dada pelo objecto; e a estruturação do espaço expositivo de modo que se não

sobreponha à dimensão e valor das peças, mas que as integre de forma lúcida e coerente sem

artificialismos desnecessários. É, pois, necessário que se definam vários discursos utilizando

códigos verbais e sensoriais que respondam aos diferentes tipos de inquietações, buscas e

ansiedades sentidas pela massa de visitantes que procura o museu com intenções muito

específicas, das mais gratuitas às mais complexas mas às quais urge dar resposta, fora de

qualquer abordagem em termos de juízos de valor. As estratégias a utilizar aqui são, elas

próprias, um factor de modernidade da instituição consoante o grau em que efectivamente

adopta técnicas de comunicação e outras que o progresso coloca ao seu dispor. Das

audiovisuais à informática, do “marketing” ao design, dos materiais sintéticos aos estudos de

arquitectura de interiores e estrutura do espaço, há uma vasta gama de elementos que

permitem tornar mais inteligível, mas também mais bela e sedutora, a mensagem transmitida,

alargando o campo de acção do museu muito para lá dos grupos restritos e elitistas do ponto

de vista cultural, a novas camadas de um público anónimo, mais vasto e heterogéneo. A

pesquisa que, ao longo dos anos, se tem vindo a desenvolver neste sentido confere uma

vitalidade mais acentuada aos canais utilizados na divulgação da mensagem museológica: a

exposição permanente, síntese mais ou menos conseguida do acervo da instituição;

exposições temporárias que procuram desenvolverem determinado tema com objectivos mais

declaradamente didácticos. Canal da comunicação, suporte através do qual se veicula o

discurso, a exposição dos objectos supõe um trabalho prévio de investigação científica,

pluridisciplinar, que permita encontrar, entre as múltiplas opções, a sequência e ordenação que

melhor facilitem a leitura e compreensão, escolhendo a via mais clara e acessível na

divulgação dos conhecimentos a que se propõe. A disposição das peças e a sua relação com o

espaço, o jogo entre o espaço ocupado e o vazio envolvente, são factores de destaque que

influenciam a leitura da exposição, pelo que se deve observar um especial cuidado em não

adulterar o significado do objecto, em não manipular erroneamente os conhecimentos

fornecidos ao visitante e em evitar a fantasia e o desmesurado artificialismo estático que

conduziria à criação de um universo paralelo ao objecto.

Tudo converge para o potencial receptor da mensagem que o museu procura

transmitir: um público cada vez mais vasto dos pontos de vista etário e sócio-cultural. Trata-se

de um público heterogéneo que é curioso na sua globalidade, ávido de ver, compreender e

saber, actuando e reagindo de forma única e personalizada, na medida em que surge

condicionado por múltiplas e variadas vivências. É a diversidade de expectativas e atitudes que

cada visitante traz consigo que urge analisar, a partir do momento em que o museu se dispõe a

actuar para o benefício cultural e social de todos. Esta pesquisa poderemos caracterizá-la

como aberta, isto é, continuamente sujeita a novas amostragens e feita de informações que

jamais poderemos considerar fixas e definitivas tal como, no espaço formal ainda que

dinamizado, que é o Museu, se procura travar um diálogo que sincronize todos os públicos,

através da variedade de perspectivas que oferece.

A observação dos visitantes também não esgota, por muito exaustiva que seja a

informação que se procura obter, no sentido de optimizar a multifuncionalidade que o museu

deve assumir com crescentes graus de exigência e capacidade crítica. Não só porque o

público, sujeito a numerosas influências e solicitações, está em permanente mutação mas,

sobretudo, porque se trata apenas de um grupo redutivo de todos os potenciais receptores da

mensagem museal.

2. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS

2.1. CRITÉRIOS PEDAGÓGICOS NA EVOLUÇÃO DO MUSEU

A primitiva função atribuída ao museu foi a de guardar e mostrar objectos de significado

histórico ou, como tal, tornados simbólicos de uma época ou de uma cultura. Este objectivo

pressupunha, por um lado, uma atitude passiva da instituição e a continuidade da sua proposta

inicial sem mudanças nem interrogações e, por outro, um distanciamento do público face ao

objecto mitificado num espaço em que tudo tende a sacralizar-se em nome da História.

Não obstante, para lá da vontade, algo exibicionista, de mostrar peças raras,

poderemos encontrar uma tendência ancestral e embrionária para valorizar algumas das

colecções mais antigas, explicando-as e divulgando-as em moldes didácticos. A ideia de que o

museu é um meio educacional em potência esteve latente a partir do momento em que se

estabeleceu que a introdução de cada objecto num conjunto museológico devia ser presidida

por critérios de significado histórico ou valor estético ou científico. Esta noção, tendo germinado

ao longo dos séculos, encontra-se, hoje, perfeitamente inserida no próprio conceito de museu

público.

Nos primórdios da nossa História podemos já encontrar as primeiras colecções de

objectos preciosos nos templos ou nos túmulos dos soberanos egípcios e mesopotâmicos ou

nos santuários votivos dos gregos. As civilizações clássicas retomaram o culto das artes e o

gosto pelo coleccionismo. Edifícios públicos e domicílios de personalidades importantes eram,

em geral, profusamente ornamentados com esculturas e pinturas.

Nestas colecções, a aglomeração de objectos luxuosos parece ter tido apenas uma

função decorativa ou, nalguns casos, religiosa; foram quase sempre uma forma de ostentação

da própria riqueza, factor de importância ou marca de uma posição relevante na sociedade.

O Renascimento parece ter trazido novas preocupações juntamente com a paixão pelo

coleccionismo de obras de arte. Em 1477, o Papa Sisto IV fundou um Antiquarium aberto ao

público no Capitólio de Roma e este exemplo foi seguido pelos Cesarini, na mesma cidade, e

pelos Uffizi em Florença. No século XVI, a influência clássica, veiculada pela corrente

humanista, trouxe o gosto pelo coleccionismo, recheando galerias de pinturas, esculturas e de

toda uma variedade de peças genuínas ou réplicas da Antiguidade. A semelhança das cortes

reais, também os altos dignitários eclesiásticos e as famílias com maior prestígio social e

poderio económico procuravam distinguir-se através de opulentas colecções, cuja visita era

franqueada a artistas, amadores e estudiosos. A criação de gabinetes de curiosidades ou de

ciências naturais destinados a estudiosos pressupunha a busca de uma aprendizagem; isto é,

as colecções funcionavam já como um meio a utilizar no conhecimento do Homem. Em

Portugal, D. Leonor, D. Manuel e D. João III criaram Gabinetes nos Paços Reais de Lisboa e

Évora. Entretanto, à semelhança de Lourenço de Medici, que nomeou Donatello conservador

da sua colecção, os senhores começam a empenhar-se significativamente na educação de

alguns dos maiores artistas da época cujas obras contribuíram para o enriquecimento dos

espólios dos seus próprios mecenas. Alguns artistas de mérito encontraram, neste

procedimento, uma oportunidade de cultivar as suas técnicas e expressões artísticas, vi ajando

e convivendo com outros grandes mestres e alargando a sua própria visão artística a expensas

do mecenato dos coleccionadores. Estas iniciativas, espalhadas um pouco por toda a Europa,

estimularam o desenvolvimento de novos valores de irrefutável importância na divulgação e

engrandecimento das colecções, ao mesmo tempo que delas se serviam para a sua formação

pessoal. Os artistas mais conceituados procuravam, eles próprios, dar continuidade a esta

corrente. As oficinas onde trabalhavam e iniciavam aprendizes, devido à grande variedade de

obras e à normal dinamização do espaço, eram utilizadas como local de reunião de gente

interessada pela arte, exprimindo já o prazer estético que hoje se busca no Museu.

No séc. XVII, existe uma maior preocupação em tornar lógica a leitura dessas

aglomerações de objectos, estruturando as colecções numa pers pectiva histórica ou

iconográfica; no século seguinte a intenção didáctica tornou-se mais evidente através da

legendagem das peças, catálogos ou inventários que traduziam já a vontade de tornar a

exposição acessível aos seus visitantes eventuais. Museografia – o mais antigo tratado de

coleccionismo e guia de amadores de arte conhecido – foi publicado em 1727, por um

mercador de Hamburgo, Gaspar Neickel.

Os trabalhos arqueológicos de Winckelmann e os que se lhe seguiram fornecem um

novo estímulo ao coleccionismo, simultâneo de um generalizado gosto neoclássico. O rico

manancial encontrado vai permitir que quase todos os homens ricos da Europa se tornem

coleccionadores privados, cujo acervo será fonte de inspiração de algumas manifestações

artísticas da época e um estímulo ao renovado interesse pela Antiguidade.

A vontade de conhecer e de saber vai encontrar resposta nas modifi cações políticas e

sociais decorrentes da Revolução Francesa, através da vulgarização cultural que então se

procurou efectivar. As várias colec ções aristocráticas foram apropriadas como bens públicos.

Embora persistam como uma forma de ostentação de riqueza, agrupando obras de arte ou

outras segundo critérios de quantidade em detrimento da qualidade, os primeiros museus

públicos permitiram uma tomada de consciência dos educadores acerca do valor didáctico das

colecções. Na primeira metade do século XIX, em plena era liberal e romântica, o ideal da

difusão de conhecimentos, tão vasta quanto possível, e a curiosidade pelas Ciências Humanas

e Exactas favoreceram o aparecimento de Museus notáveis por toda a Europa. Esta tendência

alarga-se a outros parâmetros: sociedades filantrópicas e sociais trans formaram as suas

colecções tornando-se locais de curiosidades; velhos hospitais começaram a expor as suas

colecções de espécimes anatómicos com propósitos informativos; junto às Universidades e

Academias criaram-se locais de estudo com carácter museológico. O público, mais

generalizado, afluía a estes locais para aprender, animado pelo interesse que a descoberta e a

aquisição de novos conhecimentos e experiências lhe proporcionava.

Em Portugal, onde, já no reinado de D. Maria I, o Marquês de Angeja esboçara o

projecto para um Museu de História Natural, o interesse por este tipo de instituições é marcado

pela Reforma Pombalina de 1772 a qual cria, em estabelecimento anexo à Universidade de

Coimbra, uma colecção de objectos que ilustram os "três Reinos da Natureza". Seguiu-se-lhe a

criação de outros gabinetes de História Natural e de Jardins Botânicos ou Zoológicos que

traduziam uma curiosidade emergente pela vida exótica das plantas e animais de outras partes

do mundo e funcionavam, na prática, como locais de divulgação científica. Em 1799, D. Frei

Manuel do Cenáculo abriu o Museu Cenáculo Pacense (primeiro em Beja, de onde será

transferido para Évora) com uma colecção de lápides romanas e medievais, elementos

decorativos e arquitectónicos, fragmentos de escultura e várias espécies etnográficas e de

História Natural, definindo explicitamente o objectivo de "ilustrar" o público. Os primeiros

museus, encarados como uma entidade colectiva, parecem ter privilegiado o aspecto didáctico,

eixo mais valorizado na maioria das colecções, enquanto a originalidade e a autenticidade dos

objectos são critérios básicos de exposição. Uma parte considerável do património cultural

português perdeu-se, ao longo do século XVIII, devido a uma série de catástrofes naturais que

então sucederam e das quais a mais desastrosa parece ter sido o terramoto de 1755. Desapa-

receram, então, magníficos tesouros de igrejas, conventos e palácios e, sobretudo, as

colecções existentes no Paço da Ribeira e na Patriarcal. Privado deste espólio, foi difícil ao

País sincronizar-se com o movimento europeu na constituição de uma galeria de arte

representativa do seu património cultural. O aparecimento dos museus públicos, com a criação

do Museu Portuense em 1833 a que outros de imediato se seguiram deu um novo impulso à

museografia em Portugal e introduziu o conceito de Museu como centro de cultura e arte a ser

utilizado por artistas e povo. A extinção da Companhia de Jesus e das ordens religiosas e,

mais tarde, a separação Igreja-Estado, levaram à nacionalização de um importante acervo de

bens culturais o que permitiu enriquecer os Museus Nacionais. Estes dois factos tiveram como

principal consequência a dinamização de toda a relação entre o público e as colecções durante

tanto tempo inacessíveis. Enquanto a sociedade se consciencializa de que possui um espólio

cultural ao seu dispor, exige das instituições museológicas novas perspectivas de

apresentação e divulgação das suas peças. Se as colecções particulares haviam sido

destinadas à utilização exclusiva de uma elite social, cientistas, artistas ou universitários, o

museu, como serviço público adquire outras funções e deve obedecer às exigências que lhe

são impostas pelos novos utentes.

Um pouco por todo o lado criam-se nos museus estruturas de suporte às iniciativas de

índole pedagógica que, aparecendo em primeiro lugar na América, em breve se espalharam

pelo mundo como requisitos fundamentais de qualquer instituição deste tipo.

O séc. XX é, na sequência deste interesse generalizado pelo passado, o tempo dos

museus.

A Humanidade sofreu, em pouco tempo, modificações profundas na sequência de uma

época de revoluções políticas, sócio-económica e, por inerência, culturais. A democratização; o

advento de uma nova estrutura social com o operariado e a média-burguesia; as novas

relações de trabalho; a industrialização e a produção em série; a criação de grandes espaços

urbanos sem história e sem tradição; os novos hábitos de consumo; a velocidade das actuais

formas de comunicação e transporte; a invasão dos meios audiovisuais; em suma, toda a

evolução do modo de vida deu-se no sentido da massificação e da aceleração provocando no

indivíduo, cada vez mais carente de pontos de referência no tempo e no espaço, uma viragem

para a descoberta da história humana. Enquanto nos primórdios da sua história o Homem vivia

o tempo presente, protegido da noção de dever pelos laços absolutos que o ligavam à sua

comunidade e à natureza, os quais funcionavam para ele como dados universais, o Homem

actual, mais desenraizado e solitário face a tudo o que o cerca, procura apropriar-se da História

como uma defesa face à aglutinação da massa populacional e da aceleração que o cerca. O

papel dos museus na comunidade passa, nesta perspectiva, pela utilização das suas colecções

com fins educativos. Ou seja, é necessário informar para instruir. E o conhecimento alcançado

será necessário para justificar os pontos de partida e as diversas vias de evolução do Homem

e daquilo que o rodeia.

Numa sociedade que se pretende cada vez mais activa e dinâmica, esta função e esta

mentalidade teriam por força de realizar, no museu, uma progressiva aproximação entre o

público e o objecto. O objectivo do museu actual oscila entre a sua concretização como meio

de aprendizagem e como espaço lúdico; isto é, procura funcionar como um centro em que a

cultura se torna, essencialmente, numa fonte de prazer. Esta concepção inovadora da estrutura

do espaço e da disposição da colecção no museu encontrou uma ampla ressonância nos seus

corpos directivos e administrativos; ignorar estes pressupostos seria prevalecer na crise do

abandono a que os museus foram, por largo tempo, votados.

O museu começa a assumir novas perspectivas de acção, convertendo-se em

intérprete da colecção, veículo activo de cultura que promove, junto do público, a apreciação, a

informação e a compreensão que cada objecto permite.

Na medida em que a vertente pedagógica do museu permaneceu elitista – ao traduzir a

ideia de que as maravilhas da Natureza e as preciosidades do passado, encaradas como

elementos de um Universo maravilhoso e raro, impondo uma distância que quase as sacraliza,

transmitindo ao visitante um sentimento de deferência e temor – há que encontrar uma forma

de aniquilar a sensação de afastamento provocada. A abertura do museu ao público não foi

absolutamente eficaz, à partida, dado que se manteve isolado daquela maioria que não

conseguia seduzir mas que, agora, procura. Esta alteração do conceito museológico pressupõe

a realização de programas diversificados, o recurso a técnicas de comunicação e divulgação

tão variadas quanto possível e a alteração da estrutura física do museu, tornando-o num centro

de cultura que permita a investigação e o estudo mas, também, o repouso, o convívio e o

divertimento. Ainda neste sentido, reconhecer os factores de crise no funcionamento da

instituição deve corresponder à renúncia de todas as concepções que se mostraram ineficazes,

substituindo-as por elementos até agora marginalizados e pela realização de experiências

inovadoras relacionadas com a projecção sobre o meio social envolvente e a dimensão

pedagógica do museu.

Os museus americanos foram os pioneiros nas realizações relacionadas com as novas

perspectivas da sua função enquanto instituição social, mas essas iniciativas foram, em geral,

seguidas nos museus da Europa ocidental e de leste e nos países em vias de

desenvolvimento. Divulgaram-se actividades paralelas ao funcionamento tradicional do museu,

mas com este intimamente relacionadas: cursos sistematizados ou aulas esporádicas para

crianças e adultos; conferências; visitas comentadas; exposições temporárias; sessões

audiovisuais; estúdios ou laboratórios para o ensino e pesquisa de determinadas técnicas

científicas ou artísticas. Construíram--se ou adaptaram-se as instalações de suporte a estas

acções, bem como bibliotecas e salas de estudo, restaurantes, zonas de lazer e departamentos

de venda de livros, reproduções, material didáctico e uma série de outros produtos

relacionados com a instituição. Qualquer tipo de iniciativa depende sempre da criatividade e

capacidade de dinamização dos profissionais com que conta cada museu. A primeira grande

consequência destas realizações foi provar que esta nova orientação era irrefutável e

indiscutivelmente intrínseca a qualquer projecto museológico; mas, também, e não menos

importante, a experiência de alguns anos de actividades didácticas em museus dos diversos

pontos do mundo indica-nos a necessidade de algum comedimento na elaboração dos

programas. Qualquer acção deve pressupor todo o tipo de precauções prévias que garantam e

assegurem a sua efectividade e que afastem qualquer experiência perigosa, arriscada, efémera

ou insignificante para o fim em vista. Mais do que levar a cabo modernas e espectaculares

acções pedagógicas, importa que estas sejam eficazes e úteis em qualquer aspecto lúdico,

sensorial, estético ou cultural, evitando gastos supérfluos em termos materiais, técnicos e

humanos.

2.2. O DIALOGO ENTRE O PUBLICO E O MUSEU

O visitante penetra no museu como num espaço vedado, de portas cerradas que é

necessário franquear, do direito de adquirir uma senha de entrada, de normas explícitas a que

deve obedecer, de uma guardaria omnipresente que lhe impede a espontaneidade por se sentir

observado, da distância obrigatória que mantém face ao que está exposto, do percurso que lhe

é sugerido numa imposição de vontade alheia, da atitude de silêncio e avançar discreto, da

observação interiorizada que lhe é exigida; o visitante deambula através de todo um conjunto

de forças desligadas do quotidiano e é neste contexto que se induz a vivência que o museu

tem para lhe oferecer. Esta imagem, porém, acaba por comprometer qualquer alternativa no

sentido da função social do museu que, a todo o custo, se pretende atingir. Isto é: a rigidez

normativa implica que o museu se apresente como um espaço severo no qual o visitante se

sente coibido de se exprimir e comportar livremente. O respeito imposto pelos museus face aos

objectos expostos e cujo significado não está claro e definido, tornando-se inacessíveis,

confere-lhe um aspecto frio e alheio que não consegue captar a empatia de uma parte do

público.

O diálogo entre o visitante e o museu é uma realidade difícil de conseguir através do

espaço físico em que o primeiro se movimenta e o segundo permanece. Os objectos estão fora

do alcance do visitante, pela introdução de barreiras, estrados, vitrinas e todo um arsenal físico

e psíquico que os separa definitivamente; mas, sobretudo, o objecto encontra-se deslocado do

seu mundo real, da função específica para que foi concebido e em que foi utilizado. O museu é,

portanto, um mundo artificial em que os indivíduos, imanência da realidade, se defrontam com

vestígios daquilo que, habitualmente, já não é. Este distanciamento provoca uma aura mítica

que envolve o museu numa espécie de autoridade prevalecente sobre o público a qual é posta

em realce pela riqueza da colecção, pela sua raridade, pela carga do passado que suporta e

pelo universo cognitivo que contém. A componente imperativa com que o museu se apresenta

ao público deriva do facto de ser este um local extraordinário em que o indivíduo se defronta

com documentos relacionados com uma outra experiência de vida, pelo que lhe são distantes,

mas relacionada com o Homem, pelo que lhe estão próximas. Ainda que estes elementos

sejam concretos, eles atingem, em simultâneo, uma dimensão simbólica na medida em que

representam algo que ultrapassa o Presente, fazendo parte do horizonte onírico de cada um de

nós. A acumulação das peças e do conhecimento, que lhes está subjacente, sacralizam todo o

espaço, porque se situam numa exposição para lá do que é comum.

Se a museologia actual pretende que o espectador actue como personagem

interveniente e actuante, como protagonista face à mensagem que lhe é transmitida e em

função dos estímulos que a exposição lhe proporciona, o museu deve conseguir, como factor

primordial das suas preocupações, abandonar a sua postura rígida e distanciada, promovendo-

se como um elemento comunicante a todos os níveis e reconhecer que, em definitivo, o seu

discurso não deve ser unilateral mas interactivo. Esta função deveria, assim, investigar no

sentido de evitar a passividade do visitante, criando canais de comunicação entre estes e a

instituição e destes entre si, determinando os diversos níveis em que o público evolui. Existe

um espaço físico, limitado e concreto, a partir do qual o visitante estabelece relações sensoriais

imediatas de contacto com o Museu, sobretudo porque este é um local de apelos

essencialmente visuais. O percurso é definido a partir de toda uma série de elementos mais ou

menos aparentes e que funcionam, para cada indivíduo de forma muito específica, como

barreiras ou catalizadores. Não se trata apenas dos vários instrumentos utilizados

propositadamente pela instituição para sugerir um itinerário pensado em termos de segurança

e apresentação dos objectos, mas de todo o dispositivo museológico, o enquadramento e a

sequência dos elementos que o compõem, bem como a forma como tudo age e interactua com

o indivíduo, seduzindo ou repelindo. Este não é um fenómeno uniforme que se repita de um

visitante para outro nem mesmo que se mantenha constante em toda a visita na medida em

que, para lá de todas as potencialidades de optimização do espaço asseguradas pelo museu

há o factor imprevisível e variável das disposições individuais em gostar ou rejeitar. Existe, num

outro nível, o espaço sócio-afectivo das relações que cada um estabelece com o grupo de

pessoas que partilham do seu tempo de visita. As reacções raramente são espontâneas em

absoluto ou independentes da forma como se pretende impressionar o meio em que a pessoa

se move e com que se defronta, em vários círculos de que ele é o centro: o grupo em que se

integra, os outros visitantes ou o pessoal do museu. As atitudes são intencionais, sejam elas

intimadas e fugitivas ou ostensivas e provocatórias; mas são sempre formas de relacionamento

interpessoais, mesmo que se não manifestem através de um contacto directo, porque o

Homem é, antes do mais, um ser social. A forma como o visitante actua é parcialmente definida

em relação aos outros e àquilo que sociologicamente é suposto ser o comportamento próprio

no espaço museal. Num último plano, a vivência que cada indivíduo faz do museu deriva do

seu próprio universo cognitivo. As ideias e conceitos pré-estabelecidos que traz consigo

determinam a sua pesquisa e o modo como gere a aprendizagem que lhe é propiciada. O

percurso, o ritmo da visita e os pólos de atracção são formulados, a este nível, pela área

racional do indivíduo, o quociente de conhecimentos já adquiridos e o âmbito cultural em que

estes se desenvolvem. O espaço físico em que o museu se situa e as características sócio-

afectivas e culturais do público são, portanto, factores de perturbação no diálogo que, entre

ambos, se trava. Isto implica que o museu conheça, igualmente, os limites da sua própria

comunicação, ou seja, que respeite e estimule a subjectividade do seu público-interlocutor e a

forma como este apreende a mensagem de forma única e pessoal. Activamente, portanto, se o

diálogo entre museu e visitante for eficaz.

Qualquer aproximação entre o museu e o seu público será sempre uma relação viciada

pelos valores, ideologia e vontade de quem o organiza. O risco será, talvez, maior quando se

pretende uma função didáctica porque, neste caso, a mensagem a transmitir é enfatizada e,

como tal, a sua dimensão expressiva é potenciada. O objecto, para lá de ser mostrado, sua

função permanente, possui significados múltiplos de incidência variável consoante o contexto e

o ângulo em que é exposto. Uma amostragem não é, por isso, um acto inocente e, muito

menos, neutro, porque dirige a atenção em determinado sentido e procura atingir um objectivo

específico com a sua utilização. O público vê, sente ou experimenta o que lhe é dado dentro de

determinados parâmetros previamente definidos. O percurso do visitante é orientado e leva-o a

atingir e assimilar as propostas que o museu lhe oferece.

Todo o acto de comunicar envolve este risco ou, simplesmente, esta perspectiva:

captar a adesão do interlocutor e levá-lo a comungar do nosso próprio universo e da nossa

vontade em estabelecer diálogo. Cabe, neste sentido a qualquer indivíduo-receptor agudizar o

seu sentido crítico e capacidade selectiva criando, na leitura que lhe é dada, a sua própria

interpretação e vivência interior. E cabe, também, ao indivíduo ou grupo-emissor multiplicar as

abordagens, valorizar o objecto como significante diversificado e, na medida do possível,

desvendar aquilo que na exposição existe de especificamente subjectivo em torno de cada um.

A abordagem é múltipla, tal como as vivências que se proporcionam e a pluralidade de públicos

a que todas as intervenções de um museu se dirigem; partindo de uma montagem expositiva

única, em determinado momento, faz-se eclodir diversas acções simbólicas que se

desenvolvem e manifestam a vários níveis, consoante aquele que as recebe ou participa.

A função social do museu parece incidir sobre uma profunda transformação da sua

imagem tradicional. Será difícil alterar a essência do conceito, até pelo risco de essa mudança

o tornar numa outra instituição, diferente nos seus princípios, estrutura e objectivos. Daí que

todas as tentativas de ruptura e inovação tenham sido, sobretudo, experiências de carácter

formal e parcial. Porém, os museus continuam, criam-se uns, ampliam-se outros, dinamiza-se a

maior parte deles e, de qualquer forma, há sempre algum público que os procura. Tem,

portanto, que haver uma alternativa ao diálogo que se quer estabelecer; se este é, ainda,

incerto e problemático deve, pelo menos existir alguma via de enfrentar a situação e encontrar

soluções dinâmicas e flexíveis que lhe permitam inserir-se eficazmente na nossa sociedade

actual e nela desempenhar o papel cultural que lhe compete.

Na nova concepção do museu e da sua capacidade interactiva com um público

diversificado cabem novos objectivos, métodos e meios mas, sobretudo, a noção de que

nenhuma solução é definitiva e imutável. O que, em determinada conjectura de tempo e

espaço possa resultar não implica que a sua eficácia seja permanente mas, apenas, que já foi

válido. Os fenómenos que, mais acentuadamente, parecem marcar a vida de hoje passam

pelas transformações políticas muito rápidas e profundas, por uma impressionante dinâmica

social e cultural e pelo aparecimento de novas crenças e mitos. Para que possa subsistir, o

museu terá que captar e reagir às vivências da sociedade que o rodeia e responder-lhes

positivamente, adaptando-se ao meio envolvente. Enquanto instituição ao serviço da sociedade

tem que lhe assumir e interiorizar as mudanças como ponto de partida da sua própria

actividade. Como elemento activo, o museu torna-se num processo aberto e de carácter

temporário. A velha tradição do espaço cristalizado atrás dos expositores imutáveis terá

dificuldade em sobreviver isoladamente.

Para que o seu diálogo seja eficaz é também necessária a sua desmistificação, isto é,

ultrapassar a sobrevalorização do seu conteúdo, o objecto, para se passar a definir através de

um papel sócio-cultural acessível a um público mediano. A aglomeração de peças essenciais e

simbólicas do saber e da história humana, portadoras de uma cultura apenas inteligível por

uma elite já não funciona por si só. Para que um museu se concretize na sua função social,

dialogante com o público a que se destina, terá que avaliar as necessidades culturais

específicas da comunidade e elaborar um programa de acção consoante as características do

meio envolvente.

Qualquer comunidade possui determinado índice de continuidade comum; isto é, cada

grupo social traz no âmago uma carga de passado e de património que é a sua herança

cultural. Na actualidade, os aglomerados comunitários tendem para a diversidade, na medida

em que constituem o resultado de uma evolução complexa, de múltiplos e diferentes

ancestrais, de conhecimentos variados e de dados culturais que se completam e combinam.

Um museu ligado à realidade e cooperante com o meio em que se insere necessita de

encontrar a via do diálogo que lhe permita transformar-se num dos pólos catalizadores dessa

comunidade.

A animação do museu é importante no espaço urbano, com especial incidência nas

zonas periféricas, e no espaço rural, ao tentar suprir as carências existentes a nível da

informação e cultura, através de acções pedagógicas adequadas. Este tipo de museu é

específico de um determinado local, porque criado em sua função. Para cada grupo ou

comunidade importa este carácter particular da expressão desenvolvida pelo museu. Qualquer

objecto ou colecção poderá ser explorado em diversos parâmetros, de forma a encontrar

sempre aquele que diga respeito a cada público, estimulando a sua participação activa. A

aprendizagem, tomada no sentido muito lato de experiência positiva, adquirida no museu pode

ser encarada como um factor de renovação da personalidade do indivíduo. A passagem por um

lugar tão especial em que se desvendam outras realidades estranhas ou distantes não esgota

nunca a apresentação de algo de novo, por muito exaustiva que seja a observação que aí se

realize. O museu, sobretudo se se assumir na prática da sua actuação como uma instituição

dinâmica e empreendedora no estudo público, pode surgir como um espaço lúdico e cultural

que potência as capacidades individuais de descoberta, compreensão e aquisição de novos

valores, conhecimentos e ideias.

As acções de reconquista e revitalização dos meios em crise, marginalizados, implica a

possibilidade de diversas directrizes partindo da valorização das suas memórias e da

participação na vida comunitária. Na procura de um maior e mais efectivo diálogo com o seu

público o museu propõe-se formar, juntamente com os seus utilizadores, um instrumento de

consciencialização e iniciativa cultural. Tratando-se de uma instituição que é, inevitavelmente,

reflexo do grupo que o cria, reflectindo as tradições, as crises e os objectivos deste, importa

que o público seja, mais do que o objecto, o próprio sujeito da sua acção. O museu torna-se,

então, numa obra colectiva e cooperativa, no qual cada indivíduo ocupa um papel específico.

Porque não se questiona o que se desconhece, esta parece ser hoje, uma via no sentido de

absorver a energia de elementos dispersos e distanciados dos critérios intelectuais, de fornecer

um suporte cultural capaz de desbloquear a criatividade de uma população até agora inapta ou

desaproveitada; em suma, de dinamizar o diálogo com os seus públicos múltiplos e

diversificados.

2.3. TIPOS DE APRENDIZAGEM

A função social do museu não se reduz a um serviço pedagógico. Porém, entre as

inúmeras actividades do seu quotidiano, informar é uma das vertentes mais relevantes. A

disposição da colecção não é um processo fortuito; apresentá-la pressupõe uma intenção, pelo

que importa realçar o resultado que se pretende. Manipular uma peça a fim de lhe conferir um

significado específico, formular a mensagem que se pretende veicular no museu, de acordo

com uma determinada linha temática e os objectivos da própria instituição, é sempre uma

actividade pedagógica, ou seja, trata-se de uma tarefa que tem por finalidade transmitir algo.

Dar a conhecer não implica, apenas, fornecer uma informação mas, também, fornecer as

condições necessárias para que o indivíduo aprenda a ver, a sentir, a descobrir ou a

maravilhar-se perante aquilo que o museu, do passado ao presente, tem para lhe oferecer. A

função pedagógica poder-se-á definir a dois níveis: uma actuação subtil, sugerida pelo museu,

que pouco mais exige e proporciona para lá da contemplação do objecto e o gozo estético ou

intelectual que este permite; e, uma actuação mais óbvia, solicitada por grupos de elite ou de

aprendizes empenhados em pesquisas de cariz cultural e que exigem programas didácticos

bem estruturados. Em ambos os casos, a acção pedagógica deve ser focada no sentido de

combater os preconceitos e, em certa medida, o obscurantismo que determinado tipo de

visitante menos informado tenha acerca da temática da exposição quando a visita pela primeira

vez. Dado que o público não é uniformizado mas de universos linguísticos e sensoriais

diferentes, urge que, nos museus actuais, se avalie o comportamento daqueles que serve face

ao seu discurso expositivo. A eficácia de qualquer actividade cultural sob o ponto de vista

pedagógico implica o prévio conhecimento do público que se pretende atingir e a definição do

tipo de aprendizagem que melhor se lhe adapta. A actuação será, tanto quanto possível,

específica para cada grupo, quer através da elaboração de múltiplas estratégias que, partindo

do mesmo campo expositivo, permita experiências diversificadas, quer através da planificação

de actividades complementares e de objectivos variados conforme aqueles a que se destina.

O princípio da aprendizagem deriva de uma experiência concreta. O indivíduo

experimenta algo e reflecte sobre isso. Passa à fase seguinte em que começa a tornar-se

observador, a reflectir sobre o acontecido, esperando e desejando novas experiências. Depois

do período de reflexão e observação, tenta dar sentido ao que experimentou, procura padrões,

termos de comparação e explicações para os acontecimentos; procura relações de causa-

efeito e começa a colocar hipóteses e explicações para os acontecimentos. A esta terceira fase

segue-se a experimentação: deseja experimentar as suas hipóteses e explicações no mundo

exterior. Uma vez experimentadas, isto leva-o à próxima etapa durante a qual vai procurar mais

experiências.

Este é um padrão comum de aprendizagem que se aplica a qualquer tipo de aquisição

de conhecimentos ou de resolução de problemas.

Para aprender efectivamente é necessário possuir aptidões em todas as quatro áreas.

Contudo, em cada indivíduo há uma parte deste ciclo de aprendizagem que prevalece sobre as

outras; isto é, as quatro fases deste modelo correspondem a quatro estilos de aprendizagem: o

que sente – Experiência Concreta; o que observa – Observação Reflectiva; o que pensa -

Conceptualização Abstracta; o que executa – Experimentação Activa.

Apesar de se poder aprender segundo cada estilo, o individual e predominante

prevalecerá sempre como modo preferencial, mesmo que, na globalidade um dos outros estilos

pudesse contribuir para uma aprendizagem mais eficiente. O que isto significa realmente é que

determinadas experiências de aprendizagem são mais fáceis para uns indivíduos do que para

outros.

A intervenção do museu deve ter em conta, na programação das suas actividades, os

conhecimentos pedagógicos que permitam alargar o seu campo de acção e torná-lo mais

produtivo do ponto de vista cultural. O desenvolvimento dos estudos no campo da pedagogia

tem produzido uma vasta gama de informações acerca dos vários métodos de informação e

aprendizagem; a utilização desses conceitos no planeamento das exposições museológicas

significa torná-las mais eficazes do ponto de vista educativo. A abordagem da mensagem que

o museu pretende transmitir será mais eficaz no propósito de transmissão e aquisição de

conhecimentos se tiver em conta as diferentes esferas de aprendizagem – o concreto, o

abstracto, o reflectivo ou o activo – e, idealmente, a combinação de todos estes estilos.

Os indivíduos cujo expoente se encont ra no estilo de Observação Reflectiva são mais

estimulados numa aprendizagem imparcial e reflectiva e confiam numa observação cuidadosa

ao elaborarem uma opinião acerca do que lhes é dado. Num museu, abordam as peças a partir

da sua legendagem, dos textos explicativos e catálogos, na medida em que preferem situações

de aprendizagem através da leitura, o que lhes permite desempenhar o papel de observadores

objectivos imparciais, sem que a sua tendência para a introversão seja agredida.

Os indivíduos cujo expoente se encontra no estilo da Conceitualização Abstracta indica

uma aproximação à aprendizagem analítica e conceptual, confiam no pensamento lógico e na

avaliação racional. Respondem eficazmente às situações de aprendizagem impessoal duma

visita guiada no museu, em que um profissional, monitor, dê realce à análise sistemática da

colecção e à teoria ou conhecimentos que lhe estão subjacentes.

Os indivíduos cujo expoente se encontra no estilo da Experiência Concreta aproximam-

se duma aprendizagem receptiva, baseada na experiência e confiam em juízos baseados nos

sentimentos. Geralmente, não encontram utilidade nas aproximações teóricas e preferem tratar

cada situação como um caso único. Dada a sua natural tendência para enfatizar as questões e

para orientar uma abordagem teórica, com indivíduos de interesses próximos dos seus,

procuram aprender em situações de debate e de discussões, no âmbito de conferências ou nos

espaços de convívio que o museu lhes proporciona.

Os indivíduos cujo expoente se encontra no estilo de Experiência Activa aproximam-se

da aprendizagem através da realização, pelo que o acesso a cursos práticos no âmbito de

oficinas e laboratórios, que lhes permitam recriar as técnicas artísticas ou científicas que pode

observar no museu, são para eles uma óptima fonte de conhecimentos.

Para lá dos tipos de aprendizagem enunciados, é fundamental reter que o fenómeno de

aquisição de conhecimentos é um processo pessoal; ou seja, apesar das generalizações em

que a pedagogia pretende integrar o indivíduo num grupo, aprender é um acto único que, em

cada um, acontece de maneira especificamente diferente, consoante a sua personalidade, inte-

resses, capacidades, sentido estético e todo o conjunto de particularidades que definem o Eu

por oposição à globalidade do Homem. A aprendizagem é, ainda, um processo constante, além

de gradual e cumulativo: a memória guarda informações e integra-as no campo mais vasto dos

conhecimentos gerais do indivíduo, permanecendo simultaneamente receptiva, na medida em

que tudo aquilo que o indivíduo capta e assimila constitui uma informação. Sendo tão vasto o

campo da pedagogia, o museu não pode alhear-se da problemática proposta pela

comunicação – transmissão de conhecimentos para que as suas intervenções neste domínio

possam ser potenciadas em termos de qualidade e eficácia, ao adequar os conteúdos teóricos

e actividades práticas à multiplicidade do seu público.

A introdução da pedagogia como disciplina de formação museológica deve constituir

factor prioritário na elaboração do discurso pretendido pelo museu sob pena de aquele se

converter em mera retórica desprovida de eficácia.

2.4. O ESTATUTO DO OBJECTO

O objecto exposto no museu é, por excelência, o veículo de comunicação com o seu

público, a expressão concreta da mensagem que se quer transmitir. O conceito que emana do

objecto pelo facto de estar exposto num ambiente que, em geral, o potencia como um símbolo,

entre as circuns tâncias e valores do ambiente cultural a que pertence, supõe sempre uma

valorização mas é, simultaneamente, uma mutilação. A separação do objecto do seu meio

ambiente original é uma acção contrária à animação cultural, se a entendermos como

consciencialização. O objecto foi retirado do seu envolvimento primitivo e perdeu, ou viu

transformada, a função utilitária, estética, científica ou religiosa que era a sua; no museu, é um

elemento entre outros, criteriosamente escolhidos, com um objectivo comum. Toda a colecção

é exposta num enquadramento artificial com o propósito de informar e agradar o público, mas

retirando-lhe as hipóteses de uma análise profunda, de manusear, pôr em funcionamento ou de

valorizar qualquer peça numa perspectiva realista. O objecto é o ponto de partida e suporte

exclusivo de qualquer acção museológica, pelo que nos surge, como função primordial do

museu, a par da conservação e segurança das peças, a sua abordagem numa perspectiva

científica e topológica que incida sobre o contexto histórico, arqueológico, etnográfico e

artístico do objecto, isto é, todos os aspectos que contribuam para o situar no tempo e meio

cultural que lhe é próprio, a fim de determinar com precisão a sua função primitiva. Por

conseguinte, renunciar à análise do objecto pode significar uma apropriação abusiva, ou seja,

submetê-lo a uma aproximação estranha à sua natureza, ignorá-lo ou adulterá-lo.

O desenraizamento implica, neste sentido, uma quebra na leitura imediata de todos os

aspectos ligados à sua utilização no quotidiano para que foi criado. Sendo outro o contexto, a

interpretação que este permite deixa de ser a mesma, ainda que resulte idêntica. No museu,

este afastamento entre aquilo que foi e aquilo que, através do objecto, pretendemos realizar

como interpretação do passado pode cair no risco de transformá-lo num objecto ilustrativo ou

paráfrase de algo que lhe seja estranho. A utilização desse documento histórico como um

testemunho ou um índice, como elemento específico que é, surge facilmente ultrapassado no

seu enquadramento museológico o que constitui uma apropriação abusiva do seu significado

estereotipado, tal como se analisássemos um facto histórico à luz de um documento apócrifo.

Na medida em que a análise do objecto deriva do seu contexto, este deve ser pensado

com critérios de uma clara demarcação entre o real e o artificial, optando por uma atitude

discreta em todo o seu envolvimento. O objecto é classificado, catalogado e escolhido em

função do seu valor representativo. Porém, tal como é visto no museu, é sempre algo mais do

que aquilo que a sua apresentação independente poderia sugerir. Ao ser exposto num espaço

museológico, o objecto transforma-se através do seu relacionamento com o meio onde vários

factores de ordem física se interpenetram. O suporte arquitectónico, os sistemas expositivos e

a colecção no seu todo são elementos que, no museu, actuam sobre o objecto, na medida em

que possuem um conteúdo intencionalmente significante, para que possa emitir a mensagem

pretendida. No outro pólo deste diálogo, o público possui uma inalienável carga emocional e

cognitiva que determina a relação específica que cada indivíduo trava com o que lhe é dado

observar. A subjectividade com que o público encara a mensagem que, neste caso, coincide

com o objecto museal e a influência do espaço em que este se integra são factores que não

funcionam isoladamente, pois sobrepõem-se e condicionam-se mutuamente. Daí a

preocupação em evitar, tanto quanto possível, o isolamento do objecto fora do seu contexto,

explicitando tudo o que constitua o seu envolvimento real, a fim de definir, com precisão, o

conhecimento, a utilização a que aqueles se destinam. Isto significa que, na programação das

exposições em que se pretenda satisfazer requisitos de âmbito cultural, científico e

pedagógico, se deve realçar que os objectos no conjunto da colecção, por mais completa que

seja, não passam de um fragmento daquilo que representam, bem como do seu trabalho e

acção nos campos a que se referem.

Ao expor uma colecção, os objectos são seleccionados de acordo com a projecção que

possam alcançar dentro dos objectivos de demonstração a que a exposição se propõe. Aí, o

objecto assume-se como protagonista da informação cultural que se pretende efectuar, desde

que a sua exposição não surja como uma opção arbitrária mas, pelo contrário, que tenha sido

determinada após um estudo que avalie o seu valor e a aptidão concreta para que foi criado,

abstraindo-se de toda a carga de preconceitos não comprovados que, eventualmente, o

envolvessem. Excluem-se, portanto, os juízos de valor extrínsecos ao objecto em si mesmo;

isto é, quando o que se pretende não é a demonstração de um aspecto estético ou artístico,

mas de uma cultura ou civilização, o valor do objecto deriva da sua adequação ao conceito em

que, no seu mundo original era considerado.

Os objectos que se expõem no museu são valiosos e significativos na medida em que

se referem a uma realidade, da qual se conhecem as coordenadas do tempo e do espaço.

Neste sentido, o conceito de objecto-museal alargou-se a campos anteriormente desprezados,

dada a crescente necessidade de coisas concretas reais, numa época em que a produção é

mecanizada, e de criações genuínas do Homem, numa época de informatização. Todos nós

experimentamos uma imensa necessidade de sentir coisas reais, talvez mais premente nos

tempos actuais do que nos séculos anteriores em que o papel do artesão era ainda

preponderante. O Homem de hoje capta o mundo a duas dimensões através da observação

passiva dos meios de difusão falada, escrita ou audiovisual. Os únicos objectos que lhe é dado

possuir são produtos estereotipados, fabricados industrialmente. A tridimensionalidade das

coisas concretas, isto é, aquilo que lhe permite uma apropriação sensorial completa, é-lhe

oferecida com toda a banalidade do que se encontra repetido até à exaustão do mercado.

A massificação dos objectos que a sociedade de consumo põe ao dispor do homem

leva à sobrevalorização do objecto único. Este, porém, não é significativo por si próprio; ou

seja, o objecto material é indeterminado, não necessariamente verídico. Para que o possamos

utilizar como referente de algo que pretendemos demonstrar há que determinar o seu valor

como objecto do conhecimento e defini-lo face ao visitante, tendo em atenção que aquele

apenas se revela aos indivíduos que foram iniciados nessa temática ou educados para decifrar

essa mensagem. O significado de um objecto é apreendido e adquirido através de uma

estrutura de referência. Se o seu contexto for ambíguo ou inadequado, o visitante comum ver-

se-á na contingência de formular significados e conceitos inapropriados àquilo que observa. A

necessidade de clarificação daquilo que se expõe implica diminuir o isolamento do objecto fora

do seu contexto, mesmo recorrendo a um artificialismo que o restitua àquilo que constituía o

seu envolvimento real, a fim de esclarecer com precisão acerca do conhecimento e utilização

de que aquele era sujeito.

A função pedagógica, porém, não deve ser demasiado óbvia. Há um público que entra

no museu com o objectivo único de ver, de deambular num espaço que lhe agrada, de

reencontrar as reminiscências de um passado próximo ou longínquo. Esta atitude precisa de

ser respeitada e salvaguardada, na medida em que se trata de um público indispensável ao

museu, não agredindo as suas interpretações e vivências pessoais com uma informação

insistente acerca do que lhe é dado ver. Um museu aberto a todos será aquele que prevê nos

seus circuitos uma informação completa e actualizada acerca das suas colecções e dos seus

aspectos sócio-culturais, com uma intenção fortemente pedagógica mas, também, aquele que

liberta esses mesmos circuitos de uma intenção informativa demasiado evidente e que respeita

a imaginação, os sentimentos e as emoções dos seus visitantes.

Por seu turno, a maneira como os objectos são expostos deve ser acessível e

responder às solicitações daqueles que sabem concretamente aquilo que desejam ver e

conhecer. Textos informativos colocados em locais chave do museu, catálogos actualizados

das exposições permanentes e temporárias, arquivo fotográfico, documentários audiovisuais,

banco de dados informatizado, salas de estudo e biblioteca podem ser alguns dos elementos

colocados ao dispor do público que pretende informar-se acerca da natureza e temática

relacionadas com as colecções existentes no museu.

Esta multiplicidade de informações concernentes ao objecto, da legendagem sucinta

aos dados mais exaustivos, permite captar a diversidade de mensagem que aquele tem para

oferecer. Determinar o estatuto do objecto significa, em última análise, sublinhar a sua

polivalência, ou seja, o facto de que, pela sua própria natureza, pela multiplicidade das suas

funções e fi nalidades, pode suportar múltiplas práticas e aproximações.

A informação relativa ao objecto, assim disseminada e tão completa quanto possível,

permite avaliá-lo em vários níveis significantes sem sobrecarregar a sua apresentação nas

salas de exposição.

O facto de cada elemento poder oferecer um leque de informações no domínio da

cultura, da civilização, da técnica, do quotidiano ou outros permite que, no espaço habitual do

museu, se destaque um objecto ou um conjunto de peças e explorá-los numa linha temática

específica, aprofundando o seu carácter pluridisciplinar e rodeando-o de um aparato pedagó-

gico mais actuante. Quando o museu proporciona aos seus utilizadores uma informação

detalhada acerca da ambiguidade cultural que cada peça encerra e lhe fornece dados

concretos ou pistas de investigação, tendo como ponto de referência a sua colecção, pode

dizer-se que realiza um programa interdisciplinar. Neste sentido, a utilização da colecção

implica uma atitude criativa, dado que a sua capacidade significante não se esgota numa

representação: nem o âmbito pluridisciplinar de uma peça nem uma colecção temática

pluridisciplinar se poderão considerar completas numa acepção simples. São inúmeras as

possibilidades que cada objecto oferece, quer isolado, quer na sua relação com o conjunto ou

com as intenções de cada público.

O museu surge-nos, pois, como uma instituição aberta a tudo o que constituir a vida do

homem e que, por essa razão, pode englobar todas as disciplinas relacionadas com a sua

história, com a arte, a técnica, a ciência ou a natureza. O museu, assim considerado, é um

local em que se acumulam objectos e documentos ao serviço da comunidade. A identificação,

documentação e preservação do objecto existe não só para que o visitante os veja mas,

também, para que este, enquanto investigador, se sirva deles como um instrumento de

trabalho. O museu, assumindo-se como um banco de dados concretos acessível a todos,

torna-se numa escola de saber não formal, um local de encontro com o público, um sítio

particularmente propício à criação de novas formas culturais, novas relações sociais e novas

soluções para os problemas existenciais que afectam os indivíduos e as comunidades.

Enquanto o sistema de ensino tradicional se processa, através de representações do

real, de artifícios, utilizando essencialmente um tipo de linguagem verbal, o museu exprime-se

através de uma linguagem mista fundamentada no objecto concreto e, na qual, os signos

linguísticos se encontram em função destes. A sua finalidade, no campo da comunicação, ou a

sua capacidade expressiva, é tão mais relevante quanto a civilização dos objectos e dos sinais

é tão mais vasta, complexa e, talvez, mais significativa do que a palavra, na medida em que a

cultura humana não se iniciou com o verbo ou com a escrita, nem a estes se reduz.

2.5. ESTRATÉGIAS DE COMUNICAÇÃO NO MUSEU

2.5.1. Exposições

São variadas as vocações dos museus na execução dos seus projectos, orientando-se

para a história, a arte, a ciência, a técnica ou a etnologia. Um museu pode ter por objectivo

primordial da sua acção a animação, a investigação, a apresentação, o estudo das obras, a

sua divulgação ou outros. Mas, qualquer que sejam os princípios que o norteiam e os

objectivos que persegue, a exposição é a sua estrutura básica, o mecanismo específico mais

imediato da comunicação entre o museu e o seu público. A exposição permanente num museu

consiste, afinal, no reflexo da sua imagem na sociedade, pelo que se deve apresentar um

resumo coerente e significativo das suas colecções e escolhido com critérios de diversidade

cultural e unidade no discurso.

Qualquer uma destas acções pressupõe múltiplas hipóteses o que implica, em última

análise, uma escolha mais ou menos objectiva. Como tal, a acção de expor num museu é algo

que envolve controvérsia. Daí que se procure encontrar soluções não definitivas, mas

fundamentadas nos estudos da museologia, como disciplina científica. Perante a tradicional

acusação de ser o museu uma espécie de armazém de luxo em que os objectos perdem a sua

identidade e significação, aumenta a responsabilidade de organizar uma exposição tendo em

vista a inserção das colecções num contexto que, embora artificial, lhes não seja estranho nem

incomportável. Para obviar os riscos de desambientação das peças, alguns organizadores de

exposições esforçam-se no sentido de recriar, fiel e exaustivamente o meio natural em que

aquelas foram utilizadas, enquanto outros, defendendo que o conhecimento do contexto

histórico, por profundo que fosse, não poderá ser perfeito, optam pela ausência de elementos

supérfluos na apresentação dos objectos, esvaziando o espaço de qualquer suporte decorati-

vo. Actualmente, parece prevalecer uma posição ecléctica que, ao apresentar a colecção, a

envolve num ambiente adequado, esteticamente aceitável ainda que não demasiado marcante

e criativo, sem tentar reproduzir uma realidade perdida. Em paralelo, a apresentação das obras

não deve contemplar apenas obras-primas ou raras mas, sobretudo, as peças que contribuíam

para inserir as criações e produções humanas, numa larga escala da evolução cultural e

civilizacional do homem global. Traduzindo, no seu conjunto, o programa geral do museu e

respondendo, neste aspecto, às necessidades da educação e à procura do público, a

exposição deve ser tão completa quanto possível.

Atendendo aos avanços da museologia, ao enriquecimento das colecções, às

alterações das exigências do público e às mutações sofridas pelo próprio museu, podemos

afirmar que uma exposição deve ter, também ela, um carácter de mudança, sob pena estagnar

ideologicamente. Isto significa que a exposição precisa de um certo dinamismo o que não

implica necessariamente, a substituição ou rotatividade das colecções apresentadas, mas sim

a variedade de perspectivas que estas ofereçam. A imobilidade da apresentação de um museu

não significa que esta seja estática, desde que a sua intervenção social e pedagógica se revele

actuante e eficaz do ponto de vista da comunicação com o seu público. A sistematização lógica

das colecções deve facilitar esta mesma actuação ao definir percursos distintos dentro do

mesmo espaço, consoante os sistemas e as diversas ligações apropriadas entre as peças, ao

invés de um único circuito rotineiro mais propício ao cansaço e ao aborrecimento. O visitante

precisará de ter o acesso facilitado às diversas propostas que o museu lhe oferece. Uma visita

guiada é, tão-somente, uma aproximação inicial, na qual o público assume uma atitude passiva

que recebe determinados conteúdos culturais sem os aprofundar. A utilização de guias breves

e esquemas elucidativos dos vários percursos propostos permite que essas observações sejam

efectuadas pelo público de forma mais actuante, ainda que não totalmente espontâneas.

Qualquer um destes processos tem, por finalidade, aproximar o museu da comunidade em que

se insere e atrair o público integrando-o numa activa oferta cultural.

A ambientação, a forma como o meio envolve o visitante, pode ser uma forma de

comunicação entre o museu e o seu público; porém, dada a multiplicidade que este encerra, as

suas diversas aptidões e vontades, é necessário encontrar vários canais comunicantes, de

linguagens específicas, capazes de informar e de se acomodar a cada grupo. Poder-se-á

promover, num mesmo museu, espaços distintos consoante o público a que se destina, o que

significa escalonar zonas de estudo, onde se preserve uma maior concentração e intimismo, e

que serão preferencialmente escolhidas pelos especialistas ou investigadores, dado o carácter

específico dos seus conteúdos culturais ou científicos, em percursos independentes do circuito

geral, destinado à maioria dos visitantes apressados e pouco motivados ou àqueles que

apenas pretendem contemplar as peças. Para responder à variedade de exigências deste

público compósito, verifica-se uma frequente divisão das apresentações museológicas em dois

grandes tipos: a exposição cultural e a exposição científica. O primeiro apresenta objectos reais

e espécimes, numa sequência lógica que se propõe interpretar, recorrendo a imagens

auxiliares, textos elucidativos e de todos os meios técnicos e audiovisuais que possam con-

tribuir para uma melhor informação do público. O segundo, especialmente destinado a uma

investigação pessoal, é mais especializado e sistemático. Se se pretender utilizar apenas um

sistema de apresentação, a dificuldade deriva da necessidade de integrar a tipologia e um

percurso escolhido segundo um sistema ideológico preciso.

Um museu, porém, não se esgota na mensagem que veicula através da sua exposição

permanente nem de outras acções culturais dela decorrentes. Como mecanismo específico da

comunicação com o público, o museu necessita de realizar amostragens de maior alcance

didáctico, utilizando as suas colecções, as reservas, peças cedidas especialmente por outras

instituições ou por particulares, como objecto de conhecimento e como meio de o difundir.

Uma exposição temporária oferece uma estrutura mais rígida do que uma amostragem

permanente; mas, dada a necessidade de investir todo um projecto museológico num espaço

de tempo limitado, há uma maior preocupação em tornar lógico, acessível e, sobretudo,

completo o discurso que se pretende enunciar para que a mensagem seja facilmente

apreendida. A exposição temática não pode ter a veleidade de esgotar o assunto que propõe

mas, por se tratar de uma acção mais ou menos efémera, permite provocar a adesão do

público através da apresentação e da relação entre as peças e o espaço, ou através dos

suportes, da cor ou da iluminação. Permite-se um jogo cénico que actue sobre o visitante numa

função apelativa. Uma exposição temporária pode, em suma, ser incisiva.

Independentemente dessa tendência para o espectáculo ou para a ostentação, persiste

uma função didáctica: ilustrar um tema e expô-lo ao conhecimento do público. Qualquer que

seja a disciplina em que a exposição se insere ou o tema que procura abordar, esta exposição

implica uma preparação cuidadosa, a nível do critério museográfiço mais adequado e da

investigação científica e histórica a qual será, simultaneamente, consignada no catálogo. Este

é um elemento primordial de qualquer exposição e funciona como a sua materialização para lá

do tempo em que é acessível, tomando a importância de um estudo histórico e crítico. Neste

tipo de abordagem temática permite-se a introdução de cronologias, textos ou quadros

traçando a panorâmica política, económica, social e psicológica do contexto de origem das

peças. Numa exposição itinerante podem utilizar-se obras de menor valor, reproduções

fotográficas permitindo comparações, quadros explicativos e mapas, situando as relações

geográficas do que se expõe. As exposições temáticas, no espaço do museu ou no seu

exterior suscitam um interesse crescente por parte do público, atraído pela novidade; permitem

igualmente aos investigadores o desenvolvimento de um tema, de forma mais aprofundada,

circunscrevendo-o com precisão; por outro lado, são uma ocasião propícia para a

apresentação de objectos que não têm lugar na exposição permanente e cujo acesso é

habitualmente reservado aos especialistas. Todas as estratégias, procuradas por uma equipa

de especialistas em vários domínios (de conservadores e bibliotecários a designers, de

professores, críticos, investigadores a psicólogos ou sociólogos), serão válidas se, sem

deslumbrar enganosamente o público, contribuírem para a desmistificação da arte e da ciência,

tornando-as mais próximas, e para o seu alargamento cultural. A exposição temporária é

didáctica por excelência pois, sendo de carácter temático, permite uma melhor integração

ambiental da colecção, tendo esta uma maior definição espaço-temporal.

Em ambas as realizações - exposições permanentes e temporárias - o que as torna

experiências marcantes e, tanto quanto possível, inolvidáveis é um princípio de envolvimento.

O público torna-se parte da exposição, perdendo-se nele e afastando-se da noção concreta do

tempo.

Para responder à função didáctica do museu, à sua vocação informativa, esta empatia

não é uma consequência suficiente, ainda que signifique muito em termos de comunicação. A

fim de cumprir esta missão, o museu necessita de suscitar e estimular a reflexão histórica

através da sua colecção, de encontrar uma fórmula que torne as suas peças significativas do

ponto de vista da evolução humana, ao situá-las com exactidão no passado a que se referem e

num quadro suficientemente lógico para que se possam tirar ilações acerca da sua ligação com

o conjunto da sociedade. O museu precisa de inserir aquilo que apresenta no contexto

adequado à descodificação das colecções na medida em que o público sente e interpreta o que

observa, perpetuando na memória o conhecimento que adquire acerca das coisas. Aí o museu

terá cumprido a sua função pedagógica.

Neste sentido, a melhor proposta parece ser a reconstituição tão completa quanto

possível ou, idealmente estimular artificialmente determinados estados emotivos: forjar, no

visitante, o aparecimento de um estado de espírito que, prolongando-se em profundidade, lhe

permita imaginar outras vidas, tempos, espaços, quotidianos, sem o qual a capacidade

imaginativa do indivíduo continuaria bloqueada, impedindo-o de recriar outros períodos

históricos mais emotivos e sensorialmente mais ricos do que a actualidade. Não se trata de

uma simples reposição ou de um diorama, mas de um programa mais vasto que convida o

público a participar activamente e no qual os visitantes se envolvem emotiva e sensorialmente,

tal como na vivência de um quotidiano.

Se qualquer exposição, e talvez a temporária mais do que a permanente, pretende ferir

a sensibilidade do público de modo a tornar-se actuante, é necessário que a apresentação das

peças diga respeito ao visitante. O indivíduo é tocado, mesmo no plano emocional, através

daquilo que já conhece, já experimentou e, no museu, reconhece como algo que também já

viveu. No fundo, apenas se aprende aquilo que já se conhece. Será então formativo, a todos os

níveis, mostrar-lhes como o tempo é homogéneo e não está dividido por barreiras impeditivas

de regressos ou avanços; mostra-lhes que hoje se vive em consequência de, contra ou a favor,

mas sempre em ligação, nunca em completa ruptura.

A escolha das peças e a metodologia da sua apresentação pode recorrer à função

apelativa inerente a estas constantes da História. Para lá das transformações diacrónicas que

sofreu, a Humanidade continua a viver os mesmos medos, paixões ou ódios, isto é, continua

imutável na sua essência. Persiste ainda com a mesma ingenuidade em olhar o mundo e sentir

a vida. Se o museu lhe transmitir esta continuidade, o indivíduo que o visita recebe-o como

coisa sua, num cenário que lhe é próprio e face à demonstração ou representação daquilo que

já viveu.

Simultaneamente, a exposição no museu vive daquilo que já não é, das peças que se

não usam, dos quotidianos abandonados ou dos erros que a história corrigiu.

Integrando ambos os aspectos de forma dinâmica, conceptual e interpretativa, pode-se

estabelecer a comunicação entre o museu e o seu público, incentivando o contacto com os

objectos, a criatividade, a compreensão e assimilação de um mundo diferente, isto é, atingir

uma ocasião única de aprendizagem.

Partindo da emoção, o público atingirá o conhecimento que procura.

2.5.2. Acções pedagógicas

À função pedagógica de um museu tem por objectivo levar a cabo programas que

realizam a difusão, informação e investigação relacionadas com as linhas temáticas propostas

pela sua colecção. As actividades que, neste âmbito, se podem realizar são múltiplas, desde as

mais convencionais às mais imaginosas, passando por visitas guiadas, comentadas e

orientadas a grupos especiais; ciclos de conferências e palestras; cursos e trabalhos práticos

em oficinas ou laboratórios e que permitam a exploração de diversas técnicas artísticas ou

artesanais, pela recriação de peças do museu ou a experimentação prática de fenómenos

observados; sessões de cinema, audições musicais, programas de dança e teatro; bibliotecas,

zonas de estudo ou inves tigação; empréstimo de peças e exposições itinerantes; venda de

reproduções, guias, objectos, cartazes e tudo o que, directa ou indirectamente se relacione

com o museu; e cooperação com os programas escolares, entre outras actividades possíveis.

Enquanto algumas exposições visam apenas a apresentação de determinados fundos,

outras pretendem oferecer ao visitante propos tas de conteúdo didáctico ou realizar autênticos

ciclos culturais e informativos de todas as circunstâncias que rodearam o assunto representado

ou com ele se relacionam. Em qualquer destas situações existe o propósito de transmitir

conhecimentos e de efectuar uma intervenção cultural. Mas, na medida em que nem todos os

que visitam o museu conseguem, por si próprios, tirar partido da situação de aprendizagem que

aí lhes é oferecida, a partir da simples observação ou gozo estético face aos objectos, é

necessário efectuar uma programação prévia que marque as linhas gerais de actuação a fim

de alcançar o objectivo de informação cultural que nestas exposições se pretende.

Esta intervenção revela-se de uma crescente importância no actual panorama

museológico. Trata-se de uma função indispensável ao lado das tradicionais recolha,

conservação e apresentação das peças, na maioria dos museus. Ao lado da massificação

cultural, da sua divulgação através dos meios de comunicação e da extensão educativa de

instituições cada vez mais ao serviço de toda a população, pertence ao museu uma posição de

destaque como complemento educativo destes programas, partindo dos objectos reais ao seu

dispor e das relações significantes que entre eles se possa estabelecer. Como espaço

cognitivo, o museu pode contribuir para a premente desmistificação da arte e da ciência e

tecnologia como um saber ao dispor de quem por ele se interesse, e para a formação de novos

conceitos e aplicações. Como complemento do ensino institucional, o museu deve providenciar

ocasiões de aprendizagem acessível à população escolar, mas também àqueles que não têm

acesso à educação formal, procurando--se diversificar as actividades, tornando-as acessíveis a

todos os grupos e indivíduos que por elas se possam interessar.

Daí a preocupação crescente e renovada que a programação de actividades

pedagógicas despertam no actual panorama da museologia, a qual procura viabilizar vias de

comunicação com um público cada vez mais numeroso, sem que isso implique uma quebra de

qualidade do museu, nem o esgotamento dos seus conteúdos e metodologias. A oferta cultural

do museu relaciona-se com uma programação geral que visa a adesão do público e fomentar,

neste, uma atitude imaginativa. Essas realizações processam-se através de trabalhos artísticos

e científi cos que têm na oficina ou no laboratório e na biblioteca o seu núcleo de

desenvolvimento.

Determinado tipo de acções, como as visitas, conferências e programas musicais de

dança ou teatro, pelo seu carácter efémero e descontínuo ou pelo facto de se não relacionarem

directamente com as colecções, podem ser ratificadas por propiciarem a dispersão e

superficialidade no museu; são, porém, actividades profícuas do ponto de vista de intervenção

cultural e preenchem uma função apelativa indispensável para trazer o público ao museu e que

actuam como veículo de ligação com as restantes actividades propostas.

Menor será a participação dos programas didácticos da difusão directa do museu dado

o seu carácter específico. Dirigidos a pequenos grupos, estas actividades devem cumprir uma

função lúdica de experimentação e aprendizagem. É neste sentido que definimos a importância

da componente prática destas acções. Os sentidos da visão e da audição permitem uma

melhor assimilação e favorecem uma recordação mais permanente e viva. A teorização com

que a arte, a ciência ou a tecnologia são habitualmente abordadas, comentadas e interpretadas

converte-se em mera retórica que, por muito atractiva que seja, carece de efectividade dado o

menor grau de memorização que permite; será através de uma adequação bem elaborada

entre os conteúdos teóricos e as actividades práticas propostas nestes trabalhos que se

adquire uma melhor garantia de eficácia em termos de aprendizagem. Como tal exigem uma

preparação cuidadosa e minuciosa de molde a se adequar aos interesses, capacidades e

níveis etários e psicológicos dos participantes e a evitar actividades estéreis que contribuam

para a dispersão destes. A programação deve ser suficientemente clara e acessível para que

todos possam cumprir tarefas propostas e alcançar os objectivos pretendidos de tornar

acessíveis e compreensíveis os fundos do museu, qualquer que seja a óptica com que se

equacionam os parâmetros da acção.

Estes programas devem, com efeito, ser formulados em função do quotidiano e das

potencialidades do público específico, concreto e real, conjugando os seus interesses e

vocações particulares com as próprias características físicas e disciplinares do museu. Os

cursos e actividades realizados com uma forte incidência didáctica podem ter vários níveis de

exigência, focando, de forma iniludível, o estabelecimento de relações mais ou menos

profundas entre um objecto ou uma colecção e o público que os contempla e defronta. As

barreiras que o museu coloca habitualmente entre estes dois pólos da sua acção quebram-se

ou atenuam-se se se estabelecer um contacto directo entre ambos e se se encarar

frontalmente as dificuldades que afectam os códigos de comunicação e a utilização de

elementos expressivos até se encontrar uma linguagem cujo significado transcenda os seus

próprios limites materiais.

Espaço humano de convívio e comunicação, estes cursos são um aparato específico

da função didáctica do museu; porém, pode ser variada, traçando planos que visem o gozo da

contemplação ou um estudo mais profundo. Ensinar a ver, insinuar formas de olhar e

compreender é tuna vertente destes cursos, por vezes tão complexa como o acto de veicular

conceitos ou de introduzir a colecção num contexto económico e cultural. Quando os

participantes numa oficina de arte experimentam técnicas, manuseiam materiais, criam e

constroem objectos e sentem a relação destes com o espaço envolvente; quando, nos

laboratórios, até então de acesso exclusivo aos investigadores especializados, podem recriar

experiências e verificar os postulados e leis da ciência; quando, de algum modo, jogam com

situações do passado, técnicas e modos de vida em sessões de drama e expressão cultural;

podemos, então, dizer que no museu se realizam situações de aprendizagem activa e aberta.

Através destas actividades criativas, cada participante apreende novas formas e significados;

isto é, adquire conhecimento.

Toda a acção pedagógica visa estimular a observação, a criatividade, a crítica e a

expressão, pelo que terá de ser dinâmica. Qualquer programa, por muito eficaz que se

suponha, precisa de flexibilidade a fim de se adequar aos fundos museográficos e aos diversos

níveis de desenvolvimento e erudição dos seus participantes, adaptando-se, a cada realização,

às exigências imediatas que lhe são postas.

A sensibilização do público processa-se, primordialmente, através da palavra. O signo

linguístico está omnipresente no espaço do museu, desde a legendagem das peças e a sua

catalogação aos estudos, comparações e interpretações efectuadas a pretexto da colecção. O

objecto é enunciado através da linguagem verbal, a gula deve traduzi-lo fielmente e de acordo

com a capacidade perceptiva do seu receptor.

À compreensão dos códigos utilizados nas exposições ou nas intervenções teóricas e

práticas, passa hoje pela utilização de outros meios de comunicação relacionados com o som,

a imagem e a informatização, na medida em que todas as instituições sociais do nosso tempo

necessitam de uma flexibilidade cada vez maior, de modo a poderem adaptar-se às exigências

de mobilidade horizontal e vertical características de uma civilização em rápida mudança.

Todas as técnicas e formas de valorização e difusão da palavra e do documento visual e

auditivo integram-se no museu como descodificadores da mensagem que este pretende

difundir, quer em actividades no âmbito do seu espaço físico, quer como elemento publicitário

dos seus conteúdos e actuação, no exterior. Ambos os processos, meios audiovisuais e

informática, são igualmente a materialização dos conhecimentos e registo dos objectos,

exposições e outras acções pedagógicas, tornando-se acessíveis ao público, para lá do tempo

e do espaço em que se realizam ou se encontram.

Qualquer estratégia poderá ser permitida como prática museológica, na medida em que

contribua para tirar partido das colecções do museu e para intensificar a memória colectiva ou

na medida em que provoque a sensibilização do público e a sua emoção face aos testemunhos

do passado.

2.6. COMUNICAÇÃO COM GRUPOS ESPECIAIS

2.6.1. Minorias étnicas e sociais

As minorias que ocupam um tecido urbano não são por definição, e devido a uma

complexa rede de circunstâncias e contingências, habituais frequentadores de museu.

Os diversos grupos étnicos imigrantes têm tendência a aglomerar-se em círculos

fechados, pouco permeáveis a influências estranhas, dentro de limites físicos facilmente

definíveis e coincidentes com bairros periféricos ou, se dentro da cidade, marginais. Nesses

espaços procuram estabelecer as ordens da sua origem, as regras e os hábitos do povo a que

pertencem. A aculturação, sofrida sobretudo a nível da população mais jovem, atinge as zonas

superficiais do comportamento social e as suas manifestações mais aparentes, sem modificar o

substrato profundo das suas raízes culturais. O meio age sobre os imigrantes na medida em

que estes são obrigados a participar do seu quotidiano, a adaptar-se ao ritmo da cidade e a

enfrentar e submeter-se às múltiplas regras que a comunidade formula e pelas quais se rege, a

fim de permitir uma convivência entre todos, sem conflitos exacerbados ou dificilmente

ultrapassáveis. Isto significa que a acção do meio sobre grupos minoritários de etnias

diferentes é um processo forçado de integração e não uma procura voluntária desses

indivíduos em conhecer o espaço sócio-cultural envolvente.

Os "excluídos" que vivem em meios desfavorecidos e se sentem num outro mundo,

dispersos em zonas de crise económica de forte incidência migratória são, socialmente

considerados vítimas de um sistema discriminatórios e acumulam uma série de coincidências

desfavoráveis: são estrangeiros desenraizados que pertencem a outras culturas diferentes e,

no seu conjunto, diversificadas; têm lacunas no seu referencial de ligação com o meio sob

todos os pontos de vista; há uma elevada percentagem de velhos ou jovens excluídos da vida

profissional; são extremamente marginalizados e eles próprios consideram-se vítimas de uma

inultrapassável miséria no seu sentido mais lato.

Esta fracção populacional procura integrar-se na cultura dominante mas de uma forma

difusa, pouco consistente, uniforme e constante. Acabam por adquirir determinados pontos de

interligação com o meio ambiente mas excluem-se, simultaneamente, da sua cultura de origem

e, em parte, da vida quotidiana e dos hábitos culturais da sociedade em que se encontram,

exceptuando a televisão e certo tipo de cinema e literatura mais difundido.

Esta população sobrevive porque se alimenta, mas são atraídos ao consumo sem que

o possam realizar e interessam-se por determinadas actividades lúdicas, mas do ponto de vista

do espectador, não do participante. Poderia haver um outro tipo de sobrevivência, de âmbito

não material, se esta população pudesse aproveitar as suas próprias raízes culturais,

geralmente de cariz oral, ou se lhe permitissem qualquer prática artesanal ou manual. Porém,

de uma forma geral, as instituições não têm esta população em consideração nem encontram

os meios de as servir ou de as atrair.

Uma comunidade, sendo um grupo de pessoas com referência a um território comum,

pressupõe, ainda, um passado e um património; ou seja, envolve parâmetros de continuidade e

de aproximação genealógica. Na nossa sociedade, o desenvolvimento comunitário, embora

implicando fenómenos de crise relacionados com problemas de acção social, económica e

cultural que englobam a inserção do indivíduo no meio, exprime também a força da vontade de

todos em participar, decidir e realizar os acontecimentos que fazem a História paralela à do

poder institucional.

Num meio cosmopolita conjugam-se fontes e heranças muito diversificadas que

compõem uma estrutura cultural complexa. Porém, mesmo que sejam múltiplos os ancestrais e

variadas as origens, à comunidade é o resultado de uma evolução em que todos os elementos

se combinam, interpenetram e completam mutuamente, mas cuja capacidade de aculturação

não atinge todos de maneira uniforme.

Este fenómeno pode ser eventualmente potenciado dado que a perda de identidade

cultural é um factor negativo para os grupos minoritários na medida em que os indivíduos

consideram os seus dados particulares como um estigma de inferioridade, levando-os a inibir

actos espontâneos de participação e envolvimento e a recalcar as suas potencialidades

próprias no domínio das iniciativas e criações.

Ao museu não basta debruçar-se sobre o exterior mas agir como pólo catalizador desta

comunidade múltipla em que se integra e assumir-se como meio de comunicação e ponto de

encontro, permitindo através da sua colecção, dos objectos reais que apresenta, a aproxi-

mação e o conhecimento dos que lhe são estranhos. Neste aspecto, um dos objectivos do

museu será a exploração dos diversos atributos e do coeficiente significativo daquilo que

apresenta para que detenha um papel activo face à totalidade dos seus públicos virtuais e

consiga um alargamento das acções culturais.

À negação de um público virtual proveniente destes círculos minoritários provém, por

um lado, de uma atitude de sofisticação extrema que considera demagógica as manifestações

mais populares e, por outro, de um brio profissional mal compreendido que encara tudo o que

ultrapassa o campo teórico do seu saber como algo para lá da sua função. Por seu turno,

existe toda uma série de circunstâncias que impedem a realização de determinadas

manifestações, como o centralismo das grandes instituições e da acção cultural que actuam no

sentido de consagrar actividades elitistas que reforçam o público restrito e tradicional. Trata-se

de uma acção cultural rígida e bloqueada por fórmulas que reproduzem as limitações do

público; as instituições dirigem-se preferencialmente aos privilegiados do ponto de vista

económico e social.

Atrair ao museu novas camadas de público, grupos desfavorecidos ou marginalizados,

implica transformá-lo em objecto e sujeito da sua acção, desbloqueando a criatividade de uma

população que se julga incapaz por não possuir hábitos ditos culturais. A exposição temporária

e outras estratégias ocasionais podem, pelo seu carácter efémero, catalizar a energia destes

elementos dispersos e ajudá-los a readquirir a consciência da sua riqueza cultural, reforçando-

lhe o carácter de diferença numa perspectiva de valorização. A preparação destas acções pode

fundamentar-se na participação activa das comunidades a que se refere, basear as iniciativas

na sua capacidade criativa, fornecendo à comunidade o sentido de verdadeira existência social

e, portanto, transformando-a em sujeito consciente. O entendimento e a compreensão desta

herança ou a sua apropriação pela comunidade não pode ser fornecida por animadores

culturais que lhe veiculem uma imagem formada por estudiosos ou especialistas mas

estranhos à própria comunidade; é esta, a detentora da sua genealogia de forma específica.

À atitude verdadeiramente cultural não é aquela que recusa todas as criações que

surjam à margem das instituições elitistas ligadas ao saber e à arte, mas aquela que aproveita

novos sistemas e empreendimentos e que conquista as iniciativas que apareçam no contexto

de um qualquer meio sociológico, com toda a carga de tradição e sensibilidade que lhe seja

própria.

O museu empenhado na comunicação pode servir de veículo a esta intervenção das

minorias criando, no contexto da complexidade de experiências e memórias que prevalecem no

espaço urbano, uma vida cultural comprometida com a libertação de todas as formas de

expres são e que, portanto, seja original e inovadora na sua capacidade de intervenção social.

Não se trata de reduzir noções de culturas mas, antes, de as ampliar.

2.6.2. Deficientes

À visita a um museu implica uma globalidade de factores sensório-motores que

possibilitam a cada indivíduo a movimentação num determinado espaço físico e a fruição, aos

níveis intelectual e emocional, de uma experiência lúdica, estética e cognitiva.

A abertura do museu aos indivíduos portadores de qualquer deficiência mental ou física

supõe preocupações específicas, logo a partir do momento da sua concepção arquitectónica,

na busca das melhores soluções para tornar o espaço acessível a todos. Em edifícios antigos,

cuja estrutura tenha sido adaptada a museu, torna-se igualmente necessário adequar todo o

espaço àqueles cuja incapacidade não permita a presença de qualquer barreira. Dos entraves

mais óbvios aos mais subtis, todos podem fazer com que um acesso aparentemente livre seja,

para o deficiente, um caminho difícil ou impraticável.

Os obstáculos postos por uma má concepção da construção ou da implantação dos

vários elementos no espaço limitam o público virtual do museu aos indivíduos de mobilidade e

capacidades sensoriais normalizadas. Seja através de programas ou equipamentos especiais

ou, simplesmente, através de uma maior racionalização de toda a estrutura museológica, cabe

ao museu, recorrendo ao parecer científico e técnico do pessoal especializado, analisar e

avaliar quais as melhores estratégias que o permitam adequar-se aos limites impostos por

cada tipo de deficiência: problemas de mobilidade, de comunicação, de visão, mentais ou os

que de uma maneira geral afectam pessoas de idade avançada ou de saúde debilitada. O

acesso a uma instituição pública de cultura como o museu deve pautar-se por uma total

abertura de percursos e de atendimento, evitando qualquer atitude elitista ou que, como tal seja

apercebida pelo visitante. Uma instituição considerada como reservada àqueles que tiveram

oportunidade de aceder a um tipo de cultura académica, que são beneficiários de determinado

nível de riqueza material, e por tal são considerados, e cujas capacidades sensório-motoras

não apresentam falhas apenas será utilizado por essa fracção de sociedade, tornando-se em

certo sentido num factor de inibição a todos os indivíduos carenciados em termos culturais,

sócio-económicos, físicos ou mentais. Isto pressupõe que um museu que não atende às reais

necessidades do deficiente contribuirá para o seu afastamento, aumentando o seu grau de

incapacidade em participar nas diversas oportunidades que se oferecem ao indivíduo não

carenciado.

À atitude que cada indivíduo revela face ao deficiente, e os instintos e comportamentos

sociais que este desperta naquele, é determinada por um conjunto de circunstâncias que

formam a sua própria personalidade. Os princípios ou preconceitos morais e estéticos, as

regras de conduta ditadas pelo meio social e, até, os instintos herdados ao longo da evolução

biológica predispõem o indivíduo para a negação dos elementos da sua espécie que, por

alguma fraqueza ou deficiência, se afastam da norma. Este comportamento que, no animal não

racional, tem a selecção natural como contrapartida, exprime-se no Homem através de

reacções de agressão física e psicológica. Sendo reconhecido que as modificações genéticas

podem ser de origem exclusivamente endógena ou ligadas a factores exógenos, a influência de

um meio discriminatório sobre o deficiente pode acarretar problemas suplementares de

inadaptação.

Qualquer atitude forçada ou exagerada, quer seja de benevolência, desprezo ou

agressão, será sempre inibitória do trajecto do deficiente, influenciando a sua forma de estar,

sentir, pensar ou agir. Daí que a forma como é recebido no museu seja igualmente um factor

de acessibilidade, na medida em que a estrutura humana se lhe apresenta como um estímulo

ou uma barreira ao aproveitamento do espaço museológico e de todas as suas ofertas.

A busca de aperfeiçoamento das instalações, apresentação e acolhimento tendo em

vista uma estrutura especial adequada aos deficientes implica, na realidade, o melhoramento

do nível global das exposições, da sua compreensão e leitura e dos serviços e apoio que lhe

são prestados, ou seja, a optimização de todo o espaço e actuação do museu.

2.7. A DIVULGAÇÃO DO MUSEU NA COMUNIDADE

No plano da comunicação entre o público e o museu, a mensagem, coincidente com a

colecção exposta e todas as acções delas decorrentes, é veiculada no espaço físico e concreto

da sua estrutura arquitectónica. Sendo este um canal fixo, o público é o conector fundamental

de todo o processo de comunicação, ou seja, é ao indivíduo que cabe a decisão de se deslocar

ao museu e de aderir e assimilar a experiência lúdica e cognitiva que este lhe propõe.

À transição entre o comportamento passivo que se supõe subjacente à condição do

museu e uma atitude mais agressiva que lhe permita ir ao encontro daquele público virtual que

o ignora ou despreza, passa pelo reconhecimento da função que a propaganda assume na

sociedade contemporânea. Face a una realidade sociológica que gira em torno de uma

economia de consumo comandada por estratégias publicitárias que dirigem o fluxo de bens e

serviços do produtor ao consumidor ou utilizador e face à informação massificada que se

veicula através de meios de comunicação que o avanço da técnica torna cada vez mais

persuasivos, o museu passa a converter esta situação que, à partida, lhe seria adversa, pondo-

a ao serviço da sua própria divulgação, e das suas actividades e serviços.

À tendência que cada indivíduo, como animal gregário, sente para seguir um

comportamento de massas, definível através de modas universais, ainda que transitórias, pode

ser aproveitada pelos museólogos no sentido de tornar este espaço num centro de cultura e

lazer aberto a todos. Abandonando conceitos elitistas e sectários, a divulgação do museu como

um local público de múltiplas potencialidades vivenciais realiza-se através dos meios de

comunicação de maior tiragem ou audiência.

Para que a propaganda surta efeito, o museu necessita de visualizar e conhecer as

condições a que estas estão sujeitas e cuja influência sobre o público é inevitável, sob pena de

inadequação dos seus recursos estratégicos. O estudo dos factores culturais, sociais, pessoais

e psicológicos, que interferem nas decisões de cada indivíduo, é determinante para a eficácia

da actuação museológica. Poderão ser aplicadas, neste contexto, os programas relacionados

com o estudo do mercado: conhecer quais os modelos explícitos e implícitos de

comportamento adquirido e de que faz parte a cultura de um povo; identificar os grupos de

referência social; e avaliar a confluência de factores ligados à idade, ao nível socio-económico

e cultural e ao autoconceito dos indivíduos a que se propõe atrair bem como aos seus hábitos,

motivações, crenças, atitudes e ambições. Esta pesquisa deve ser constante porque todos os

dados que se obtenham não são conclusivos, dado que nenhum indivíduo ou grupo possui

uma dimensão estática.

Em consequência, o museu necessita de planos de acção dinâmicos e abertos que lhe

permitam adquirir vantagens competitivas reais, através da utilização adequada das suas

instalações e espólio na resposta às reais exigências e expectativas do seu público. O plano de

promoção, o alargamento e a propaganda das suas ofertas, assume um papel fundamental na

integração das funções e recursos disponíveis com os objectivos do museu. Tudo isto num

programa simultaneamente simples e abrangente para uma acção coordenada para os vários

níveis de público.

Os desafios da venda estão hoje presentes em todas as actividades, mesmo tratando-

se de serviços públicos não lucrativos, numa sociedade competitiva de oferta e procura, os

quais necessitam de administrar a sua demanda, através da aplicação de técnicas de mercado.

Após a definição destes itens, o museu deve estabelecer um comportamento

promocional: a difusão do logótipo, âmbito do espólio, actividades e serviços; propaganda

conduzida através dos meios de comunicação; e, por fim, acções diversas sob o seu evidente

patrocínio. Para que estas acções adquiram um posicionamento no universo referencial do

indivíduo, levando--o a aderir às propostas do museu e a consumir a sua oferta em termos de

mercado, é necessário que a mensagem que transmitem seja consistente e adequada a estes

objectivos. Isto implica que a linguagem na sua propaganda seja convincente, enfatize a sua

ligação à melhoria de um estilo de vida e a símbolos de personalidade e que o tipo de apelo

esteja em consonância com o espaço museal no seu todo. Pressupõe-se, ainda, uma avaliação

contínua da promoção para caracterizar os índices de aceitação junto aos seus públicos-alvo.

Entre as várias actividades a desenvolver pelo sector publicitário contam-se as

comunicações para a imprensa que divulguem notícias de ordem vária relacionadas com o

museu e um departamento de relações públicas que difunda, interna e externamente através

de todos os organismos de índole cultural, de espectáculos e de lazer, comunicações que

tornem a instituição mais conhecida e aceite pela comunidade.

Se o crescimento da demanda de serviços depende dos seus méritos reais aliados à

eficácia do esforço publicitário há que ter igualmente em conta os factores emocionais e

psicológicos que levam o indivíduo a aderir ao que o museu lhe oferece para que a publicidade

exerça o seu papel na diferenciação face a outras situações e experiências culturais. Se a

mensagem que o público recebe contém apelos mais ou menos eficazes isso relaciona-se com

a qualidade dos argumentos e da credibilidade da sua fonte emissora. A persuasão depende,

também, em larga escala do modo como o consumidor descodifica as informações que recebe

e do grau de importância que este lhes atribui.

Isto implica considerar a vantagem do visitante, isto é, aquilo que o indivíduo comum é

levado a acreditar e o que adquire na situação de visita ao museu; porque as reais

necessidades do público não são homogéneas, torna-se necessário elaborar um vasto plano

de diferentes benefícios que permitam realizar uma segmentação de mercado, a gula

possibilite a identificação de subgrupos de consumidores e o desenvolvimento de comu-

nicações eficazes.

O produto que, neste caso, coincide com o museu na sua globalidade, passa a ser

entendido como importante quando o seu significado simbólico ajuda o indivíduo a projectar um

importante aspecto da sua auto-imagem. Aqui, o museu detém uma vantagem: sendo uma

instituição tradicionalmente prestigiada, a sua propaganda tem assegurado, à partida, uma

maior eficácia psicossociológica, ao adequar-se a uma atitude típica das classes médias em

ascensão que procuram agir de acordo com um ritual colectivo próprio do grupo social superior

a que aspiram pertencer.

À prestação de serviços culturais implica uma simultaneidade de produção e consumo,

tal como a comunicação se faz em presença, ou seja, só se transmite a mensagem quando a

emissão latente em toda a sua postura é descodificada e compreendida pelo público-receptor.

A oferta do museu não é, em consequência, uniforme e padronizada porque, para lá das suas

características globais, há componentes individuais que o reformulam em cada momento da

comunicação. Isto significa que, se a propaganda deve apresentar uma variedade tão vasta

quanto possível dos vários aspectos da acção do museu em relação aos seus públicos

múltiplos e diversificados, também a sua avaliação depende de um grande número de factores

objectivos e subjectivos, dado que a intangibilidade é uma característica destes serviços.

Há, porém, outras técnicas de mercado que, cada vez mais, são postas ao alcance da

divulgação museológica e da sua rentabilização concreta.

Numa conjectura de contenção económico-financeira, situação cíclica do sistema de

produção da nossa sociedade e de que a cultura é sempre uma das primeiras vítimas/ torna-se

essencial incluir no estudo de mercado, a descriminação dos objectivos, programas e

orçamento da acção de propaganda que o museu se propõe realizar. Um serviço de utilidade

pública não tem o lucro como meta, mas se não possuir um cabimento orçamental suficiente

para suportar todas as despesas que a sua actividade implica, poderá utilizar programas que

permitam compensar a insolvência de outros. O objectivo cultural subjacente a todas as

estratégias que empreende poderá aliar-se a uma filosofia empresarial que proporcione

recompensas financeiras aos investimentos realizados.

À rentabilização do museu passa pela criação de espaços de comércio no seio da

instituição e com ela relacionados. Não se trata apenas da venda de bens e serviços culturais,

mas de outros que se inspirem, reproduzam ou dêem continuidade à exposição. A. loja e o

restaurante são um complemento natural dos serviços oferecidos pelo museu e detêm um

papel importante na sua divulgação e na motivação do público em relação às ofertas gratuitas

que são o fundamento da acção museológica.

3. OBSERVAÇÃO DA RELAÇÃO ENTRE PÚBLICO E MUSEU

À eficácia das exposições ou de qualquer outra actividade que se leve a cabo no

âmbito do museu poderá ser avaliada através da forma como o público lhe reage. Isto não

significa tanto que se faça um registo quantitativo de visitantes ou participantes mas implica,

sobretudo, analisar como se processa a relação entre estes e as propostas que lhe são feitas,

isto é, se entre ambos se revelou um diálogo activo e operante o que se traduz pela verdadeira

animação do local ou se, pelo contrário, houve uma interpelação muda por parte do museu

sem obter respostas mas apenas a passagem de indivíduos passivos e inertes que não

cooperam em qualquer tipo de comunicação mais profundo. Pressupõe-se, então, que a busca

de eficácia implica necessariamente a realização de estudos, tão variados quanto possível,

acerca dos comportamentos observados junto ao público. Para que um museu se concretize na

sua função social, dialogante com aqueles a quem se destina, terá que avaliar ainda as

necessidades culturais específicas da comunidade e elaborar um programa de acção

consoante as características do meio envolvente.

Lisboa é, desde há muito, uma zona de convergência à qual afluem gentes de várias

partes; centro de migração permanente ou transitória/ define-se por uma complexidade de tipos

humanos com vivências quotidianas muito diversificadas. Do ponto de vista cultural, Lisboa é,

tendo como referência o País, macrocéfala no sentido em que engloba uma multiplicidade de

caminhos, linguagens e tendências, radicando-as ou promovendo a sua passagem pela cidade.

Congrega a grande maioria das instituições comprometidas com a investigação e a criatividade

e projecta ou promove a quase totalidade de iniciativas e manifestações relacionadas com o

saber e a arte, ainda que outras regiões e cidades, com especial referência para o Porto,

tenham vindo a demonstrar uma vitalidade cada vez mais aguerrida, desenvolvendo propostas

culturais extremamente interessantes.

À avaliação da população de Lisboa tendo em vista a política de actuação museológica

será, neste contexto, inoperante porque no universo urbano todas as expectativas e

solicitações têm cabimento, justificando todas as propostas de rentabilização da sua

mensagem. Importa, assim sendo, tentar uma aproximação ao público real do museu, isto é,

aqueles que, de facto, o visitam e usufruem, usando como metodologia a observação e

abordagem directa dos indivíduos em situação, enquadrados em espaços museológicos

distintos quanto à tipologia, âmbito da colecção e objectivos.

O estudo efectuado incidiu sobre dois museus: um, nacional, de arte e visando um

público muito diversificado, dos estudantes e investigadores a turistas nacionais e estrangeiros;

outro, municipal, de história e com um público essencialmente local e escolar.

3.1. CARACTERIZAÇÃO DOS ESPAÇOS DE ANÁLISE

3.1.1. Museu Nacional de Arte Antiga (MNAA)

O Museu Nacional de Arte Antiga apresenta cerca de sete séculos de história nacional

e estrangeira através da pintura, escultura e arte ornamental de que possui um rico espólio

distribuído por várias colecções de que destacamos: pintura portuguesa e das escolas espa-

nhola, italiana, alemã, holandesa e flamenga; escultura; ourivesaria; cerâmica e tapeçaria.

História da colecção

À abolição das ordens religiosas em 1834, por decreto de 28 de Maio, provocou a

nacionalização dos bens culturais pertencentes aos conventos, tornando premente a criação de

espaços em que essas peças de valor real e simbólico pudessem ser guardadas e expostas de

modo a ficarem acessíveis ao grande público. Para lá da urgência prática de acomodar o

recente espólio de bens do Estado, o novo poder pretendia veicular, através destas peças, a

ideologia do regime, desmistificando-lhes a anterior função no contexto religioso, integrando-as

num cenário laico. No ano seguinte foi nomeada uma comissão com a incumbência de estudar,

classificar e organizar todos os objectos retirados dos conventos, para o que foram colocados

sob a responsabilidade da Academia de Belas Artes e depositados no antigo convento de S.

Francisco, onde aquela funcionava e onde surgirá, igualmente, a Galeria Nacional de Pintura.

Com a tripla função de conservar o património móvel dos antigos conventos, de organizar

exposições públicas de Belas-Artes e de preparar artistas e artesãos, o Convento de S.

Francisco depressa se revelou impróprio para actividades tão diversas, ainda que

complementares, propiciando a degradação de peças valiosas e votando ao esquecimento as

colecções aí armazenadas.

No entanto, a ideia da criação de um museu que expusesse a colecção aí armazenada

só encontrará resposta em 1882 no decurso da Exposição de Arte Ornamental, no Palácio dos

Condes de Alvor. A exposição foi inaugurada pelos reis D. Luis de Portugal e D. Afonso XII de

Espanha. A mostra apresentava ao público português as peças que haviam figurado numa

exposição de arte da Península Ibérica realizada no ano anterior em Londres. O êxito que

conheceu, o elevado número de visitantes que teve e a polémica que suscitou foram elementos

determinantes para que se começasse a considerar o palácio como uma hipótese viável para a

concretização desse espaço em museu.

Dois anos depois, o Estado comprou o edifício das Janelas Verdes que lhe estivera

alugado e determinou que para lá fossem transferidas as colecções que se encontravam sob a

responsabilidade da Academia.

O Museu de Belas Artes e Arqueologia abriu ao público a 12 de Junho de 1884,

integrando o mais valioso espólio artístico do país.

A colecção inicial proveniente dos conventos extintos enriquecia-se com outras de

diversas proveniências: peças outrora pertencentes à rainha D. Carlota Joaquina, entretanto

vendidas em hasta pública, após a derrota miguelista; colecções legadas ou adquiridas com

verbas oferecidas para esse fim por diversas personalidades entre as quais poderemos

destacar os reis D. Fernando e D. Luis, o conde de Carvalhido, o visconde de Valmor, o conde

dos Olivais e Penha Longa, entre outros; e, por fim, peças adquiridas pela própria Academia a

particulares ou em leilões.

Em 1911, com o advento da República, o Decreto de 26 de Maio desdobra o Museu de

Belas Artes e Arqueologia em duas instituições museológicas distintas: o Museu Nacional de

Arte Antiga continua sediado na Rua das Janelas Verdes e engloba todas as colecções

anteriores a 1850; as restantes colecções são reconduzidas ao antigo convento de S.

Francisco, dando origem ao Museu Nacional de Arte Contemporânea.

À direcção do Museu Nacional de Arte Antiga é entregue ao Dr. José de Figueiredo que

impôs uma dinâmica nova no âmbito da museologia. Para lá de toda a polémica em que a sua

actividade como inves tigador e crítico de arte possa incorrer, José de Figueiredo conseguiu

animar a habitual apatia em que o mundo dos intelectuais se movia, criando o Grupo dos

Amigos do Museu que, entre outras activi dades de carácter cultural, tem desde a sua fundação

contribuído para a aquisição de peças, alargando o espólio do Museu.

Simultaneamente, o Museu conhecia um novo e importante afluxo de peças

provenientes dos palácios reais, tal como irá acontecer com o património das sés e palácios

episcopais após a publicação da lei da separação da Igreja e do Estado.

A fim de garantir a possibilidade de manobra do Museu no mercado de arte é-lhe

atribuído pelo Estado (tal como acontece com todos os Museus) uma verba anual para a

aquisição de peças, podendo ainda requerer aumentos extraordinários em casos que mereçam

especial atenção pelo seu elevado valor cultural.

As peças depositadas no Museu por entidades oficiais ou particulares são outro factor

importante para o enriquecimento das colecções do Museu.

O Museu Nacional de Arte Antiga no Palácio Alvor e no convento das

Albertas

O Museu Nacional de Arte Antiga ocupa o antigo Palácio dos Condes de Alvor e um

anexo que ocupa o antigo Convento das Albertas.

O Palácio Alvor foi mandado construir em 1690 por D. Francisco de Távora, conde de

Alvor; o filho vendeu-o a Matias Aires da Silva de Eça, provedor da Casa da Moeda;

posteriormente, ainda, foi adquirido por Paulo Carvalho de Mendonça, irmão do Marquês de

Pombal, a quem acabará por pertencer, através de herança. Tendo permanecido na família do

Marquês, foi por diversas vezes alugado, primeiro a Gabriel Gildemester, cônsul holandês em

Lisboa e, por último, ao Estado que aí acaba por realizar a Exposição de Arte Ornamental. Ao

longo de todo este período, o edifício sofreu várias campanhas de obras que desvirtuaram a

sua traça original.

Contíguo ao Palácio, a oeste, ficava o Convento das Albertas, de freiras carmelitas

descalças, fundado em 1584 pelo arquiduque Alberto, de cujo interior apenas se conservou a

capela, integrada no museu como um excelente exemplo de decoração de azulejos e talha

dourada, típicos em Portugal entre os séculos XVII e XVIII.

Em 1911, o problema mais premente que se punha era a falta de espaço em que o

Museu se debatia e que tornava difícil a manutenção de um espólio muito vasto e cada vez

mais numeroso. Mesmo o desdobramento das colecções em dois museus não solucionou o

problema. Consciente desse facto, o Dr. José de Figueiredo, secundado pelo Grupo dos

Amigos do Museu, levou a cabo uma importante campanha de opinião através da imprensa, a

fim de conseguir a remodelação das velhas instalações e a obtenção de novos espaços.

Porém, só em 1940 se aproveitou o convento das Albertas, contíguo ao Palácio Alvor e que

fora entretanto derrubado, como um Anexo ao Museu, o qual foi inaugurado com a Exposição

dos Primitivos Portugueses.

Manteve-se, inicialmente, a divisão do edifício do antigo convento em três pisos. O

inferior foi destinado a arrecadações, galeria de estudo e instalações de pessoal, enquanto as

superiores se destinavam à exposição de peças, desenvolvendo-se em torno de um vasto

salão central, circundado, a nível do segundo piso por uma galeria perimetral.

Após a utilização do anexo, procedeu-se à remodelação do palácio, ao qual se

acrescentaram, no lado oriental, instalações para a biblioteca, o gabinete de estampas e um

auditório no primeiro piso, enquanto no piso superior se procedia à abertura de novas salas

destinadas à exposição de pintura europeia, em complemento das já existentes no corpo

ocidental; existem, ainda, neste piso, zonas de exposição destinadas às artes decorativas

europeias e um pequeno núcleo de escultura. No lado ocidental do edifício antigo realizaram-

se, igualmente, algumas remodelações a fim de obter um espaço para exposições temporárias

no lado norte e, no lado sul, instalações para a direcção, serviços e gabinetes de estudo. É na

zona da entrada deste edifício que existe o acesso ao bar do Museu o qual comunica com o

jardim.

No início da década de 80, no âmbito da XVII Exposição do Conselho da Europa,

realizaram-se importantes obras no anexo, com o objectivo de, cortando o pé direito do salão,

criar um piso intermédio e, no lugar da antiga escadaria, abrir duas novas salas de exposição.

Após a Exposição, deu-se início às obras de adaptação de todo este espaço às reais

características e necessidades do Museu, as quais se têm revelado bastante polémicas e,

sobretudo, demoradas. No primeiro piso, ao nível da entrada e da zona de comunicação com o

palácio convertida em local de vendas e repouso, existe, na ligação com a capela, uma

exposição de artes ornamentais portuguesas. No segundo piso localizam-se as zonas de

exposição de ourivesaria e cerâmica portuguesa e dos objectos resultantes dos contactos dos

Portugueses em África e no Oriente. O último piso destina-se à exposição de pintura e

escultura portuguesa.

No seu conjunto, o Museu Nacional de Arte Antiga oferece-nos três grandes núcleos

museológicos: arte portuguesa que engloba pintura, escultura, pintura luso-flamenga; influência

da África e Ásia através de objectos de origem africana, chinesa, arte nambam e arte indo-

portuguesa; e arte estrangeira na qual encontramos pintura europeia do séc. XIV ao XIX, artes

ornamentais, ourivesaria e têxteis.

3.1.2. Museu da Cidade (MC)

O Museu da Cidade procura documentar a história de Lisboa desde os vestígios mais

remotos ao início da República, através de peças arqueológicas, pintura, escultura, artes

decorativas e documentos gráficos, recorrendo eventualmente a réplicas de originais e ao uso

de maquetas.

História da colecção

À primeira proposta séria feita no sentido da criação de um museu de História

municipal parece ter surgido por iniciativa do vereador republicano António Tomás Cabreira,

chegando a ser nomeada uma comissão directiva para a sua instalação, a. qual era formada

por D. José Pessanha, Gabriel Pereira e Freire de Andrade, entre outros. Não obstante, e em

parte como consequência do conturbado período político que então se viveu, o projecto não

teve seguimento e a referida comissão revelou-se inoperante. Só na década seguinte, a ideia é

retomada com planos concretos que conduziram à sua execução: em sessão de Câmara de 26

de Maio de 1921 é outorgada à Associação dos Arqueólogos Portugueses a responsabilidade

da criação do Museu. Passado cerca de um ano era inaugurada a exposição de uma pequena

colecção do então chamado Museu Olisiponense, no Convento do Carmo. Porém, a

inexistência de um plano museológico concreto e a falta de instalações próprias levaram a que

a colecção fosse integrada na do Museu Arqueológico que já existia nesse mesmo espaço.

Em 1935, o vereador Coronel J. M. Pereira Coelho retoma a ideia de um museu

municipal que versasse a História da cidade, projectando a sua instalação no antigo palácio

dos Arcebispos ou da Mitra, então já propriedade do Município. O Dr. Mário Chicó, conservador

dos Museus Municipais foi incumbido da realização do plano e montagem do Museu da

Cidade, o gula foi inaugurado em 1942 com uma amostragem provisória das colecções

pertencentes à Câmara. Esta exposição conheceu algum êxito na época, apesar de todas as

condições adversas a que se sujeitou: espaço exíguo, má compartimentação e a excêntrica

localização do Palácio.

O reconhecimento destes problemas levantou, de novo, a questão da localização do

museu, o que só encontrará solução viável após a compra, pelo Município, do Palácio Pimenta,

ao Campo Grande. Trata--se de uma residência solarenga, construída entre 1744-48, nos

arredores da cidade. A grandiosidade da obra talvez confirme a tradição segundo a qual o

Palácio terá sido mandado construir por D. João V que o destinaria a Madre Paula. O autor do

projecto também não é conhecido, ainda que sejam evidentes as características que

aproximam o edifício das construções de época, assinadas por Ludovici e pelos arquitectos da

sua escola: linhas austeras, janelas altas guarnecidas por molduras elegantes e portal simples.

O palácio não sofreu grandes transformações, mantendo traços próprios de uma

residência nobre suburbana. O corpo principal, com fachada para a rua é constituída por dois

pisos e um terceiro amansardado. O andar térreo prolonga-se para a retaguarda, desen-

volvendo-se em torno de um pátio para o qual se abrem a capela e a cozinha. Mantêm-se

também, com poucas alterações, um jardim de cerimónias. Encontramos, ainda/ algumas

construções que confirmam o carácter rural que terá estado inicialmente ligado ao edifício:

poço de rega, nora e um alpendre para alfaias agrícolas.

Dignos de realce são os alizares de azulejos existentes em todos os compartimentos

do rés -do-chão e do andar nobre do corpo principal e nos quais podemos distinguir duas

épocas: da primeira, em 1746, época em que o palácio foi construído, são os azulejos

figurativos da ala sul do rés-do-chão apresentam cenas inspiradas em “chinoiseries”, paisagens

ribeirinhas, cenas mitológicas e caçadas; da segunda, em 1760, são os azulejos de grande

qualidades que decoram a escadaria principal e os compartimentos do andar nobre.

O Museu da Cidade no Palácio Pimenta

Em 1974 foi aprovado um plano que organizava o Museu da Cidade como expressão

da história e da vida de Lisboa, com uma sequência evolutiva completa e coerente.

Após as obras de conservação e adaptação do Palácio Pimenta às suas novas funções

como espaço museológico, o Museu era aberto ao público, segundo um programa de

inaugurações faseado, entre 1979 e 1984. A exposição desenrola-se cronologicamente

sugerindo um itinerário que conduz o visitante pela História de Lisboa, desde as suas origens

pré e proto-históricas à implantação da República. A própria disposição das salas delimita os

vários sectores, entre os quais destacamos: a dominação romana, documentada através de um

importante espólio arqueológico proveniente de vários locais situados dentro da área da

cidade; a Lisboa quinhentista, que retrata as modificações urbanas que então se verificaram e

alguns aspectos do quotidiano da sua população; a maqueta de Lisboa antes do Terramoto,

planeada por Matos Sequeira e executada por Ticiano Violante; a época pombalina que inclui

os originais das plantas da reconstituição de Lisboa; a colecção das Faianças do Rato; Lisboa

novecentista; a Revolução de 5 de Outubro; e, entretanto, a reconstituição dum ambiente

fidalgo setecentista com o aproveitamento das estruturas existentes e de que fazem parte a

capela, a cozinha, a copa, a alcova e as salas.

Os acontecimentos históricos, o desenvolvimento urbanístico da cidade, os usos e

costumes da população e o seu artesanato são referenciados através de uma abundante

documentação iconográfica, de que fazem parte pinturas, gravuras, desenho, cerâmica, peças

arqueológicas e manuscritos, a qual é complementada com gráficos, moldagens, mapas e

maquetas.

Procura-se, entretanto, aproveitar os espaços verdes envolventes, situados para além

da mata, desocupados por enquanto, mas que permitirão a construção de pavilhões destinados

à exposição de colecções complementares como a de azulejaria de Lisboa, os trans portes e a

arte contemporânea de temática relacionada com a cidade, as quais, pelas suas características

e volume exigem condições museografias especiais, de que o actual Museu não dispõe.

3.2. ANÁLISE DO PUBLICO - MNAA/MA

3.2.1. Preâmbulo

O fenómeno de comunicação pressupõe uma situação de sintonia entre o emissor e o

receptor da mensagem. Para que aquela se estabeleça é necessária uma prévia avaliação dos

códigos e dos canais comunicantes adquiridos pelos indivíduos a quem se pretende transmitir

algo. A eficácia do discurso que o museu pretende efectuar junto do público implica, portanto,

uma abordagem paralela que investigue as reais características, potencialidades, interesses e

preferências dos seus visitantes, a fim de lhes adequar os tipos e funções de linguagem que

melhor se lhes adeqúe. Em complemento, a identificação do seu público real permite-lhe

detectar as lacunas que comete face à comunidade em que se insere, ou seja, descobrir os

excluídos da sua acção museológica a fim de encontrar as estratégias que melhor os motivem.

Optimizar a capacidade comunicativa dos Museus Nacional de Arte Antiga e da Cidade

foi objectivo global do estudo efectuado junto aos seus públicos.

Esta investigação foi levada a cabo ao longo do mês de Outubro, tendo este período

sido escolhido por ser aquele que tem uma afluência dentro do valor médio anual: no Museu

Nacional de Arte Antiga, 4504 visitantes para uma média simples mensal de cerca de 4852; no

Museu da Cidade, 1876 visitantes para uma média simples mensal de aproximadamente 2065.

A abordagem abrangeu os vários dias e horas em que os museus se encontram abertos, a fim

de se obter uma mostra tão diversificada quanto possível e que, como tal, fosse representativa

das populações que os frequentam.

Recorreu-se, em ambos os museus, a uma investigação junto ao público, na situação

de visitante, procurando captar as suas reac ções face ao espaço expositivo, as formas de

abordagem que aí se manifestavam, os pólos catalizadores da sua atenção, o ritmo em que

efectuava a visita, a utilização dos vários serviços de que dispunha e, por fim, a recolha do seu

depoimento. Esta abordagem foi levada a cabo em duas vertentes: a observação naturalista e

o inquérito. Em qualquer dos processos, foi realizado um tipo de investigação não participativo,

no qual o agente que levava a cabo a sondagem se anulou e distanciou para que a sua

presença não provocasse alterações no comportamento do público, retirando-lhe a espontanei-

dade própria por se sentir observado e avaliado.

3.2.2. Observação Naturalista

À Observação Naturalista foi realizada junto aos visitantes individualmente ou em

grupo, conforme aqueles realizavam a sua visita, desde o momento da sua entrada no museu

até à sua saída. Foi realizado um pré-teste no Museu da Cidade, junto a uma turma do 6° Ano

do Ensino Básico, que nos surgiu como um grupo de níveis etário e escolar mediano em

relação à globalidade do público que frequenta a museu. Essa experiência comprovou a

inadequação desta metodologia de observação e análise em relação ao tipo de visita que aqui

se realiza, sobretudo porque se trata de grupos demasiado grandes (cerca de 30 elementos).

Pudemos constatar que, apesar de se tratar de um grupo inicialmente homogéneo e bastante

interessado na visita, após a primeira parte da exposição, sensivelmente por altura das salas

relativas a Lisboa Quinhentista, começou a evidenciar comportamentos diferenciados,

mostrando sintomas de cansaço, quebra de atenção e irrequietude. Embora a maioria dos

elementos do grupo continue a seguir as propostas enunciadas pelo monitor, há gestos subtis,

ainda que carregados de significado, que fogem à norma pelo que a partir desta altura se

tornou praticamente impossível registar as diversas atitudes assumidas pelo grupo. Por outro

lado, e dado que a visita é guiada é, em certo aspecto, viciada pelo monitor que a dirige, o qual

determina a leitura a fazer face aos objectos e à exposição no seu todo, os ritmos de

observação e o itinerário ao longo de todo o espaço, a aplicação desta metodologia de análise

não teria aqui grande significado. No Museu Nacional de Arte Antiga, tendo-se comprovado

através do pré-teste que a maioria dos visitantes entra pela Rua das Janelas Verdes, optou-se

por iniciar a observação nesta zona. Dado que esta é uma metodologia de campo de actuação

mais restrito procurou-se, a partir do referido pré-teste, definir alguns tipos básicos de visita, a

fim de se estabelecer a estratégia a utilizar na observação. Verificou-se, na sequência do pré-

teste, a possibilidade de enquadrar o público do MNAA em quatro categorias: os visitantes

nacionais que vão ao museu ao domingo, aproveitando o ingresso grátis; os visitantes

nacionais que frequentam o museu por motivos relacionados com o estudo ou a sua formação

profissional; os estrangeiros que abordam o museu movidos por interesses muito

diversificados; e, ainda, aqueles que realizam aqui vêm isoladamente ou porque são habituais

frequentadores ou por qualquer outra razão ligada ao prazer da visita. A. partir deste

escalonamento, escolhido entre várias outras hipóteses possíveis, aplicou-se a Observação

Naturalista junto a cada uma das categorias acima definidas. O observador seguiu os

visitantes, tão discreta e anonimamente quanto possível, agindo como uma pessoa comum em

visita ao museu e registando o seu comportamento, ao longo do percurso efectuado, através

da grelha de observação proposta (em Anexo). A escolha deste campo de registo justifica-se

pelo facto de se necessitar de um suporte esquemático, de fácil transporte e anotação. Embora

a pré-determinação dos itens considerados limitasse a observação a aspectos considerados

essenciais, evitou, por outro lado, que o observador fosse obrigado a elaborar um registo

descritivo com uma maior carga de subjectividade.

A Observação Naturalista l foi realizada a um domingo em relação a um grupo

constituído por três elementos, sendo um do sexo feminino e dois do masculino, um dos quais

era adolescente. Durante a visita apercebemo-nos tratar-se de um bloco familiar formado por

pai, mãe e filho.

A chegada ao museu dirigiram-se à recepção, onde recolheram os ingressos, sabendo

de antemão que estes eram gratuitos.

O primeiro espaço visitado foi a exposição temporária que aí decorria, relativa às artes

do fogo. Trocaram entre si abundantes comentários quer em relação às peças expostas quer

em relação ao videograma que viram integralmente. Os elementos mais velhos destacavam

alguns objectos e chamavam frequentemente a atenção do mais novo sobre os seus

pormenores.

Visitaram, de seguida, a exposição permanente. Observaram com alguma atenção as

salas de pintura europeia e portuguesa de que consultaram algumas legendas, continuando o

mais novo a ser alvo das explicações dos pais. As últimas salas, relativas às colecções

africana e oriental e de ourivesaria portuguesa e cerâmica, foram vistas rápida e

superficialmente, mas tentaram espreitar a colecção de artes ornamentais, cujas salas se

encontravam encerradas. Apesar de o grupo denotar já alguns sinais de cansaço, nunca

utilizaram as salas ou bancos existentes para descansar.

Durante toda a visita não consultaram qualquer informação adicional às legendas.

Na passagem pela loja, observaram as publicações e outros objectos, comentaram o

preço, mas não adquiriram nada.

O grupo saiu do museu 2 horas depois de lá ter entrado.

A Observação Naturalista 2 foi realizada num dia útil face a um indivíduo de meia-

idade que efectuou a visita sozinho.

Após a entrada, dirigiu-se imediatamente à recepção, onde adquiriu o bilhete de

entrada e indagou os funcionários acerca das novidades do museu.

Dirigiu-se à exposição temporária que observou em pormenor, mas não se deteve a ver

o filme que a completava.

Tendo passado à exposição permanente, atravessou as salas vendo as peças na sua

globalidade, parando eventualmente junto de alguns objectos. Mais acentuada foi a observação

da colecção de ourivesaria e de arte oriental que viu detalhadamente, detendo-se junto de cada

vitrina ou objecto. Não consultou a informação disponível nas salas.

Na loja, observou os diversos produtos, acabando por adquirir um catálogo temático,

relacionado com Arte Nambam. Questionou os funcionários acerca da reposição das peças

esgotadas.

Dirigiu-se à sala de repouso onde consultou o catálogo comprado e documentação

própria.

Voltou à zona de entrada onde iniciara a visita, foi ao bar e ao jardim.

Antes de abandonar o museu, consultou o quadro das actividades do museu de que

tirou algumas notas.

A visita demorou, no total, cerca de Ih 30m.

A Observação Naturalista 3 incidiu sobre a visita efectuada por um casal de

estrangeiros, que se exprimia em inglês, e cuja idade parecia rondar a casa dos 30.

Tendo-se dirigido ao balcão de atendimento, a fim de adquirir o ingresso, pediram

indicações acerca da planta e guia do museu e modo de adquiri-la.

Antes de iniciarem a visita, sentaram-se nos bancos existentes na zona e consultaram

a documentação que traziam.

Deslocaram-se à sala de exposições temporárias que viram superficialmente sem se

deter junto de qualquer peça.

A observação da exposição permanente foi mais demorada e atenta. Parte das peças

expostas foram vistas em pormenor e efectuaram frequentes consultas ao livro que traziam a

propósito do que lhe era dado observar, com abundante troca de comentários. Estiveram

sentados a observar As Tentações de S. Antão de Jerónimo Bosch, primeiro em silêncio e

depois com troca de alguns comentários.

À chegada à sala de repouso sentaram-se novamente, trocando impressões entre si.

Compraram postais, blocos, marcadores de livros e duas taças de cerâmica na loja do

museu.

Antes de se retirarem, foram ao bar e tomaram uma refeição ligeira no jardim, cuja vista

estiveram a observar.

Estiveram 2h 45m no museu.

A Observação Naturalista 4 incidiu sobre um grupo de duas estudantes com cerca de

20 anos.

Na zona de atendimento apresentaram o respectivo cartão.

Não visitaram a exposição temporária, tendo-se dirigido imediatamente à exposição

permanente cujas primeiras salas atravessaram, sem parar, conversando animadamente

quase em discussão. Detiveram-se numa das salas de pintura portuguesa junto ao Retábulo de

St. Auta. Trocaram ideias e tiraram algumas notas junto aos quadros. Consultaram a

documentação existente à entrada da sala de onde copiaram alguns trechos.

Dirigiram-se à loja onde consultaram o mostruário de diapositivos, mas não adquiriram

nada.

Por fim, dirigiram-se à biblioteca onde permaneceram a consultar bibliografia diversa

relacionada com iconografia e História de Arte.

Das visitas observadas parece ser lícito concluir que a exposição permanente do

museu é, de facto, entendida pelo público como o ponto fulcral a partir do qual se justificam as

outras iniciativas. A exposição temporária pode servir como catalizador para a deslocação a

este espaço, devido até à publicidade de que foi alvo em todos os canais de imprensa, mas

nos casos observados nenhum dos visitantes deixou de visitar as salas de exposição

permanente. Nesta, são diversos os pólos de atracção porque, embora se trate de um espólio

relacionado globalmente com arte, as colecções são suficientemente variadas e ricas para

despertar distintos centros de interesse e abordagens.

Os serviços prestados pelo museu são procurados e utilizados pelo público,

possibilitando momentos de paragem ou de mudança, aliviando o peso cultural da instituição

com outras propostas de carácter mais prático ou lúdico. O facto de serem pouco explorados

em termos de oferta, suscita eventualmente algumas reclamações por parte do público.

3.2.3. Inquérito

O Inquérito – método que permite abranger um grande número de pessoas e obter a

recolha das suas opiniões em relação ao museu – foi distribuído juntamente com o bilhete de

ingresso, tendo sido entregue apenas um por cada grupo de visitantes. Não se contabilizaram,

em termos de resultados, os que não foram devolvidos.

O inquérito elaborado procurava analisar o público em relação aos seguintes aspectos:

− Características sociológicas dos inquiridos

− Condições em que se processa a visita ao museu:

- assiduidade

- companhia

- estímulo

− Preferência

− Critérios de escolha

- factores externos ao museu

- factores internos

− Modo como efectua a visita ao museu

− Reacção às condições oferecidas pelo museu:

- apresentação da colecção e informação

- acesso, horário e preço da entrada.

O inquérito é constituído por 21 pontos. As questões foram agrupadas tematicamente,

tendo em conta os objectivos propostos.

Os pontos l, 2 e 3 visam a caracterização das condições em que se processa a visita

ao museu.

Os pontos 4 e 5 referem-se às preferências do público face aos museus que conhece.

Os critérios de escolha aparecem caracterizados através dos pontos 6 e 7.

No ponto 8 é focado o modo como a visita é efectuada. Do ponto 9 ao 15 recolhem-se

informações acerca das condições oferecidas ao público pelo museu no qual está a decorrer o

inquérito. Os pontos de 16 a 20 referem-se aos dados sociológicos dos inquiridos: sexo, idade,

profissão, nível de instrução e local de residência.

Foi distribuído a um pequeno grupo um pré-teste de modo a poder substituir as

questões mais ambíguas, a se detectar erros e incoerências e a estabelecer um tempo médio

de preenchimento não demasiado longo (cerca de 5 minutos). Só após esta aferição se passou

o inquérito junto aos visitantes dos museus.

O pré-teste realizado no Museu Nacional de Arte Antiga provou a necessidade de se

traduzir o inquérito para inglês devido ao grande afluxo de estrangeiros ao museu, que

constituem a maioria dos visitantes nos dias de semana.

À introdução tem por objectivo dar aos inquiridos uma ideia acerca do objectivo

subjacente ao inquérito para que solicitámos a sua colaboração. Não pretendemos, porem, que

fosse demasiado explícita para não induzir o inquirido à resposta.

Os dados obtidos através dos inquéritos passados em cada museu são apresentados

sob a forma de percentagem, dada a disparidade numérica dos inquéritos obtidos em cada

museu, em virtude de os índices de visitas no Museu de Arte Antiga ser mais elevado do que

no Museu da Cidade onde/ por seu turno, os grupos organizados costumam trazer um maior

número de visitantes.

Dos dois espaços museológicos escolhidos para análise, a diferença passa igualmente

pelo quantitativo de público que em cada um se observa, corroborando, aliás, a maior

importância e projecção naturalmente atribuída a um museu nacional em detrimento de um

outro de âmbito municipal. A observação comparada da distribuição dos visitantes em cada

museu ao longo do ano de 1989 mostra que, embora os ritmos de afluxo sejam muito

semelhantes nos dois casos, há uma diferença consubstanciai em termos de números totais. O

MNAA é o mais procurado, tendo o MC apenas cerca de 42,6% de visitantes em relação

àquele.

O MNAA (Anexo I) registou um total de 58250 visitantes no ano de 1989, sendo a

frequência mais elevada nos meses de Abril e Maio (71% acima da média de cerca de 4854

visitantes/mês); fenómeno muito semelhante se observa em relação ao MC (Anexo II), em que

se nota um grande aumento de público nos mesmos meses (56,7% acima da média de cerca

de 2066 visitantes/mês). Isto poder-se-á justificar pelo facto de se tratar de uma época entre os

segundo e terceiro período escolar, altura em que, por excelência, se realizam visitas de

estudo. Maio é o mês em que, no dia 18, se comemora o Dia Mundial dos Museus, o que

significa uma maior variedade de iniciativas e de frequentes e maiores regalias aos visitantes,

que se traduzem num aumento considerável do número de visitas. Por outro lado, e em relação

ao MNAA, esta é uma das alturas preferidas pelos turistas estrangeiros que se deslocam com

objectivos culturais, aproveitando a amenidade das condições climatéricas primaveris. A

relativa queda dos números relativos aos meses de Verão corresponderá ao êxodo dos

lisboetas e à abertura de outras solicitações de férias.

A assiduidade do público (Anexo IV) em relação a estes dois museus é também muito

diferente de um para o outro caso. A maioria das pessoas que entram no MNAA (64%) já aqui

estiveram anteriormente; os restantes, aqueles que se encontram a visitar o museu pela

primeira vez, são sobretudo estrangeiros que se encontram de visita ao nosso país. No MC só

25%, na sua maioria professores, repetem visitas anteriores. Esta situação parece dever-se ao

facto de o público deste museu ser constituído, em grande parte, por grupos escolares:

enquanto os professores repetem programações e estratégias que obtiveram êxito noutras

turmas ou anos lectivos, os alunos, por muito positiva que tenha sido a experiência, raramente

lá voltam sem serem novamente enquadrados num esquema de visita organizado por outrem.

O facto de o visitante ser levado à repetir a visita ao MNAA parece ficar a dever-se,

sobretudo, a riqueza e representatividade da colecção. Existindo um tempo médio de visita e

de capacidade de atenção, o visitante sai deste museu com um determinado grau de

insatisfação por o não ter visto ou apreendido na sua globalidade, sentindo-se impelido a voltar

e a buscar novas fontes de int eresse. Além disso, o MNAA realiza frequentes actividades

temporárias, cuja divulgação traz mais visitantes ao museu mesmo que já conheçam a sua

exposição permanente. A tudo isto acresce o facto de o museu dispor de serviços paralelos, do

restaurante à biblioteca, que possuem um número considerável de utentes,

independentemente da sua visita às salas de exposição.

O MC, apesar de se situar ainda dentro de Lisboa, junto à Cidade Universitária, numa

zona servida por muitos transportes públicos e de fácil acesso e parqueamento, não consegue

estimular os seus visitantes a repetir a experiência. O público que o desfruta tem tendência a

considerá-lo definitivamente visto após a primeira abordagem.

É rara a visita solitária ao museu. Ao MNAA acorrem visitantes que, sendo

habitualmente frequentadores deste espaço, aí se deslocam sozinhos, por motivo de estudo ou

por puro prazer pessoal. Porém, a maioria (76,4% de visitantes no MNAA e cerca de 100% no

MC) frequenta o museu integrado em pequenos grupos (Anexo V), apesar da constituição

destes variar de um para outro. No MC, 41,7% dos inquiridos dizem estar integrados num

grupo organizado e 50% referem os seus acompanhantes como amigos. Em relação a estes

últimos, é de salientar que, tratando-se de grupos escolares, os alunos se designam entre si

desta forma. No MNAA, os visitantes vêm, também, integrados em grupos organizados pelos

estabelecimentos de ensino formal ou outros que têm no museu um complemento da sua

formação, mas o grupo familiar tem uma maior representatividade (27,3%), sobretudo nas

visitas de domingo e no caso dos visitantes estrangeiros. Os turistas surgem, também,

frequentemente integrados em grupos excursionistas. De todos os inquiridos, apenas 14,5%

referem ir acompanhados por amigos.

Entre as várias hipóteses apontadas no inquérito como motivo para a visita ao museu

(Anexo VI), a maioria das respostas (40,4% no MNAA e 75% no MC) incidiu sobre motivos de

estudo. Em ambos os casos, a divulgação do museu a nível dos órgãos de comunicação social

é pouco eficaz. Nenhum dos inquiridos visita o museu por indicação dos serviços de Turismo.

No MNAA, inclusivamente, são frequentes as denúncias de desagrado por parte dos

estrangeiros que, em notas à parte, confirmam a falta de informação ou os erros de que esta

enferma nos postos e agências em que solicitaram apoio. Os visitantes estrangeiros (28,8%)

conhecem o museu e o espólio através de Guias de Lisboa, livros e outras publicações,

adquiridos nos seus países de origem, o que desperta neles um prévio interesse pela visita,

mesmo que aqui não obtenham mais informações. A divulgação mais eficaz que é feita ao

museu parece ser o conselho gratuito de quem, tendo-o visitado e apreciado, transmite a sua

experiência aos amigos, incitando-os à visita. O MNAA consegue, ainda, alguma promoção

através da propaganda televisiva que é feita às suas exposições temporárias.

Seria muito oportuno que em ambos os museus, mas com especial incidência no MC,

se iniciasse uma campanha publicitária que divulgasse as suas actividades e serviços através

da imprensa escrita e que, por outro lado, fornecesse aos serviços de turismo os dados

necessários para que estes operassem com qualidade.

O leque dos últimos museus visitados (Anexo VII) pelo público do MC é muito restrito.

Os seus visitantes frequentam sobretudo o Museu do Traje, o que se poderá justificar pelo

facto de existir aqui um Serviço Educativo oficial e bem estruturado, o qual age como factor de

qualidade junto aos professores, pelo apoio que presta às escolas. O público do MNAA, em

contrapartida, surge como um habitual frequentador de museus. Os últimos museus que

visitaram foram o Museu dos Coches (14,4%), Fundação Calouste Gulbenkian (12,9%), Museu

do Traje (11,3%) e Museu da Marinha (5,3%). No tratamento de ambos os museus incluímos

na categoria "outros" todos os museus referidos por 5% ou menos dos inquiridos: no MNAA é

aqui mencionada a uma grande variedade de museus tanto nacionais como estrangeiros; no

MC as referências restringem-se à área de Lisboa com extensão no sentido da linha de Sintra,

abarcando os museus, monumentos e palácios aí existentes. Este facto parece corroborar a

diferença de estímulos, perspectivas e hábitos com que os públicos dos espaços observados

encaram a visita ao museu.

Enquanto os visitantes do MNAA preferem o Museu da Fundação Calouste Gulbenkian

(29,4%) e o Museu dos Coches (17,6%), o público do MC elege o Museu do Traje, dando

continuidade ao que foi referido em relação às últimas visitas efectuadas a espaços

museológicos. E reforçado o interesse do público do MNAA por uma alargada tipologia de

museus, tendo optado por uma variada lista de museus, sem se cingir aos relacionados com a

História de Arte, enquanto o do MC prefere aqueles que, dentro da sua área, são mais

visitados por escolas e cujas colecções se adequam aos programas de ensino vigentes.

Inquiridos acerca das razões das suas preferências pelos museus mencionados, os visitantes

apontaram, para lá do seu gosto pessoal, critérios como a riqueza e variedade das colecções,

a organização da exposição e a qualidade do espaço envolvente.

Nos hábitos de frequência de museus (Anexo VIII) observa-se, também, uma

distribuição diferente em ambos os museus. O público do MNAA frequenta os museus da sua

área de residência (81,3%), mas nota-se uma maior incidência nas visitas que efectua quando

viaja (95,6%). Quando se encontra em viagem, as opções apontam para os de maior renome, o

que se compreende face à limitada disponibilidade de tempo. Já em relação à sua área de

residência, a maioria (71,8%) prefere visitar todos os museus que tem à sua disposição. No MC

a percentagem de visitantes que não frequenta os museus da sua área de residência (54,5%)

ou de que dispõe quando viaja (27,3%) é superior aos valores registados no MNAA. O público

que afirma visitar os museus da sua zona procura conhecê-los todos mas, quando em viagem,

só entra nos de maior renome.

São, igualmente, diversos os motivos que atraem os visitantes aos dois museus

observados (Anexo IX). No MNAA, o principal estímulo é a sua exposição permanente (46,5%),

seguida pela exposição temporária (40,8%). Ainda que em menor percentagem, alguns dos

inquiridos vão ao museu motivados por outras actividades culturais (7%) ou pelos serviços que

aí são prestados (5,7%). No MC, ainda que este limite a sua oferta à exposição permanente,

53% dos visitantes afirma que visita os museus levado pelas suas exposições temporárias; não

se registou aqui qualquer referência a outras actividades ou serviços que, aliás o museu não

costuma realizar nem possui. De um modo geral, portanto, o público desloca-se ao museu

atraído fundamentalmente pelas peças que lá são expostas, a título permanente ou temporário.

Se esta é uma conclusão óbvia e condizente com um dos objectivos fundamentais da prática

museológica, o de mostrar e dar a conhecer o objecto, ressalta, como uma lacuna, a carência

de outras propostas. Os serviços e actividades colaterais são importantes num museu como

suporte à visita que aí se realiza. Embora existam no MNAA, mesmo aqui eles são pouco

divulgados, pelo que, sobretudo os visitantes esporádicos, diziam desconhecê-los. No MC, por

seu turno, não existem serviços de apoio, como um bar ou um posto de vendas, e as

actividades que promove, estando a sua propaganda a cargo da Câmara Municipal de Lisboa,

são pouco divulgadas. Além disso, este museu não possui um espaço de exposições

temporárias, ainda que haja uma grande rotatividade das peças expostas em virtude da grande

extensão de reservas que o museu possui.

Reafirmando o que foi dito na análise da Observação Naturalista, os comportamentos

evidenciados durante a visita ao museu (Anexo X) não são uniformes. A maioria dos visitantes

do MNAA (51,9%) passeia pelas salas, detendo-se junto àquilo que mais desperta a sua

atenção. Quanto aos restantes (31,5%) vê o museu em pormenor e 12,9% segue visitas

guiadas. Este comportamento está amplamente justificado pela própria tipologia do museu:

numa abordagem inicial, as várias colecções de arte podem ser abarcadas na sua globalidade.

Por outro lado, a dimensão do museu e a extensão do percurso proposto tornam inviável a

observação minuciosa de todas as peças. No MC a percentagem de público que afirma ver o

museu em pormenor (40%) e a que diz seguir uma visita guiada (26,7%) podem considerar-se

como fazendo parte de uma única forma de abordagem do museu, no sentido em que os

grupos de estudo orientados por um monitor são levados a realizar um tipo de observação mais

cuidada de todo o espólio exposto. Dado que nem todo o público tem a possibilidade ou a

vontade de seguir uma visita guiada, na qual são destacados os pormenores mais significativos

da exposição, e atendendo a que no geral os visitantes se mostram muito sensíveis às

chamadas de atenção seria positivo rodear as peças de maior importância e valor histórico-

artístico com alguns dados informativos adicionais e inseri-las num contexto de realce que

provocasse a sua curiosidade.

Ambos os museus observados são avaliados pelo público (Anexo XI) de forma

bastante positiva. A exposição do MNAA foi considerada agradável por 64,7% dos inquiridos e

como causadora de impacto por 23,5%. Porém, justificavam-no pela qualidade das obras

enquanto acusam o espaço envolvente e os suportes de pouco atractivos nas salas do Palácio

Alvor defendendo a modificação das vitrinas e o enquadramento da pintura segundo conceitos

de exposição mais actuais e adequados a obras desta craveira. No entanto, 7,9% dos

inquiridos acha o museu demasiado cansativo pois, apesar de ter algumas zonas de descanso,

elas localizam-se num dos pólos da exposição, não permitindo pausas a meio do percurso,

apesar de haver assentos nalgumas salas para observação mais demorada de alguns

objectos. Alguns visitantes (3,9%) referem, ainda, que a visita se torna monótona devido à falta

de informação.

No MC, 90,9% dos inquiridos acha a colecção agradável e 9,1% que causa impacto.

Aqui, é necessário ter em conta que a maioria do público é constituída por grupos escolares, a

quem a situação de visita de estudo transmite alguma euforia. Além disso, tratando-se de um

público jovem ou pouco habituado a frequentar museus e, portanto, com reduzidos pontos de

referência, é compreensível a falta de sentido crítico e a dificuldade em avaliar o espaço que se

lhes apresenta.

Em relação à informação que se pode obter no museu (Anexo XII), os visitantes

acusam também uma relativa falta de sentido crítico. No MNAA, 56,3% considera suficiente a

informação junto às peças; os 39,6% que a acha irregular e os 4,1% que a consideram

insuficiente não o justificam nem propõem alternativas. No MC, a grande maioria (83,3%) acha

a informação suficiente, o que se poderá justificar, uma vez que os visitantes integram

habitualmente grupos organizados cujo monitor suprime eventuais lacunas informativas. Os

restantes inquiridos (16,7%) considera a informação irregular.

As condições de acesso são diferentes nos dois museus considerados (Anexo XIII). No

MNAA, 41,3% considera o acesso fácil, o que talvez se justifique pelo facto de ser já um

caminho conhecido por aqueles que repetem a visita ao museu, dado que 36,9% indica que,

embora sendo fácil, está mal sinalizado e os restantes 21,8% o consideram muito confuso,

apontando igualmente a falta de indicações ao longo da cidade e na própria zona. O facto do

museu se situar numa zona antiga da cidade, entre os bairros de Santos e da Lapa, onde as

características urbanas são muito semelhantes e as ruas estreitas e de traçado confuso é

difícil, a quem aí se desloca pela primeira vez, encontrar o caminho sem pedir informações aos

transeuntes. No MC, a maioria dos visitantes (66,7%) afirma que é fácil chegar ao museu;

apenas 25% acha o acesso fácil mas mal sinalizado e 8,3% considera-o confuso. De facto,

neste museu, a sinalização existente encontra-se apenas nalgumas das zonas de acesso,

nomeadamente, a seguir a Entrecampos, na II Circular e junto ao Estádio José Alvalade, mas

está pouco visível, até devido à arborização da zona.

São variados os meios de transporte utilizados pelos visitantes na ida ao museu (Anexo

XIV). No MNAA apenas 35,4% dos inquiridos utiliza viatura própria. Em relação a estes, só

16,4% não conseguiram estacionamento num raio de 500 metros. Embora junto ao museu

exista uma considerável área de estacionamento esta não lhe está reservada pelo que,

sobretudo nos dias úteis, é difícil estacionar. Este facto, aliado ao facto de o acesso não ser

muito fácil, faz com que muitos visitantes (60,4%) cheguem ao museu utilizando transportes

públicos. Destes, 72,4% utiliza autocarro: tratando-se de grupos organizados deslocam-se em

autocarros alugados; nas visitas normais utilizam as carreiras da Carris, 27, 40 e, sobretudo, o

49 o qual, embora passe pelo centro viário da cidade, é o mais directo para a Rua das Janelas

Verdes. É para os autocarros de aluguer que mais se nota a falta de um parque de

estacionamento próprio, dado que a sua inexistência os força a aguardar, durante o tempo da

visita, circulando na zona ou estacionando sobre os passeios, o que obriga os peões a se

deslocarem para a faixa de rodagem. Ainda em relação aos que utilizam transportes públicos,

17,2% desloca-se em carro alugado ou de táxi e apenas 3,4% opta pela única carreira de

eléctricos, a 19, que circula junto ao museu.

No MC, apenas 16,7% dos visitantes utilizam viatura própria, mas conseguem

estacionamento a menos de 100 metros, dado que junto ao museu existe uma boa área de

parqueamento devido à sua proximidade do estádio de Alvalade. A percentagem que utiliza

transportes públicos (50%) utiliza autocarros na sua totalidade, sendo este o transporte

habitualmente escolhido na preparação de visitas de estudo.

Em ambos os museus apenas uma minoria se desloca a pé: 4,2% no MNAA e 33,3%

no MC, coincidindo estes últimos com visitantes provenientes de estabelecimentos de ensino

localizados próximo ou que, tendo utilizado o metro fizeram de facto uma caminhada a que não

estão habituados e, por isso, a referem.

Muitos dos inquiridos não responderam à questão relativa ao preço de entrada (Anexo

XV). Em ambos os museus parte dos visitantes (14% no MNAA e 41,7% no MC) afirma

desconhecê-lo; estas percentagens dizem respeito aos visitantes de domingo, às horas em que

o ingresso é gratuito, a estudantes e portadores de Cartão-jovem, a reformados e aos grupos

organizados e outros que estejam isentos do pagamento da entrada. No MNAA, 28% dos

inquiridos considera o preço adequado e 22% acha-o barato em relação a outras actividades

culturais, mas 14% diz ser um impeditivo para visitar o museu mais vezes. No MC, onde a

maioria também não paga ingresso, 33,4% acham-no adequado e 16,6% dizem que é barato;

apenas 8,3% considera ser um preço demasiado alto.

Dada a falta de recursos com que o museu se debate, e porque não parece viável o

aumento global dos preços de entrada nos museus mas, antes, que esta fosse gratuita durante

um maior período de tempo e a um leque de pessoas mais alargado, seria conveniente a

criação de dois tipos de ingresso visando, por um lado, os visitantes nacionais, a quem devem

ser dados mais estímulos para conhecer, apreciar e defender o nosso património cultural e, por

outro, os estrangeiros, cujo ingresso seria onerado.

O tempo que os visitantes utilizam na visita é também diferente de museu para museu:

no MNAA uma visita demora, em média, cerca de Ih 30m e no MC dura à volta de Ih. É natural

o facto de a visita ser mais demorada no MNAA, dado tratar-se de um museu de maiores

dimensões, com um número mais elevado de peças expostas e cuja importância justifica uma

atenção mais demorada. Além disso, este tempo não é real na maior parte dos casos, dado

que há visitantes que passam o dia inteiro no museu, a ver ou estudar a colecção, em parte ou

na globalidade, ou aproveitando os outros serviços de que aí dispõem, por motivo de estudo,

em complemento da sua formação ou por puro deleite pessoal. Tal não acontece no MC: o

público que aí se desloca leva o único intuito de visitar a exposição, por falta de alternativas

complementares.

É difícil identificar correctamente o público dos dois museus observados, dado que

optámos por entregar apenas um inquérito a cada grupo de visitantes. Na distribuição dos

inquiridos por sexo (Anexo XVI) é necessário observar que, nos grupos em que integravam

elementos masculinos e femininos eram estes a quem, invariavelmente, incumbia a tarefa do

preenchimento dos inquéritos; aqueles mostravam uma atitude muito mais inibida, chegando

mesmo a ignorar o nosso pedido para receber o inquérito ou recusando-se a fazê-lo.

À amostragem de público que frequenta estes museus situa-se em níveis etários

igualmente diversificados (Anexo XVIII). Os visitantes que responderam ao Inquérito no MNAA

situam-se maioritariamente ao nível etário acima dos 41 anos (62%) e apenas 2% tinham

menos de 20. No MC, pelo contrário, a grande maioria situa-se abaixo dos 40 anos, sendo a

percentagem dos jovens com menos de 20 anos (50%) a mais significativa. Apesar desta

última situação, podemos caracterizar o público que se desloca espontaneamente ao museu

como adulto. As camadas mais jovens, talvez pela própria ligação que os espaços

museológicos têm com o passado, sentem-se pouco motivadas e os nossos museus

apresentam raras iniciativas que as possam atrair, revelando-se como um espaço que, para lá

das possibilidades cognitivas que possui, lhes ofereça alternativas lúdicas válidas.

Em termos profissionais, o público do MNAA é mais diversificado do que o do MC:

enquanto no primeiro os inquiridos preenchem, sobretudo, uma vasta gama do sector terciário,

dos quadros médios a superiores, no segundo são quase exclusivamente professores e alunos

dos Ensino Básico e Secundário.

Os níveis de instrução dos inquiridos (Anexo XVIII) distribui--se, no MNAA, entre o

Secundário (28% completo e 8% incompleto) e a Licenciatura (26% completa e 14%

incompleta), tendo 22% referido outras habilitações como cursos médios ou de pós-graduação.

No MC, a maior percentagem diz respeito ao Secundário e Licenciatura incompletos (33% em

cada um dos casos); com o Secundário completo responderam 25% e com a Licenciatura,

apenas 9%.

São várias as proveniências dos visitantes nos dois museus (Anexo XIX), sendo mais

alargadas no MNAA do que no MC. No primeiro, 40% dos inquiridos habitam em Lisboa e 26%

nos seus concelhos limítrofes; dos restantes, 16% são estrangeiros, na sua maioria europeus

mas, também, australianos, canadianos e americanos. No segundo, 33,3% dos inquiridos são

de Lisboa e os restantes vêm dos seus concelhos limítrofes.

Se, no MC nenhum dos inquiridos se mostrou suficientemente motivado ou esclarecido

para indicar algumas sugestões relativas ao funcionamento e actividades do Museu, já o

público do MNÀA se mostrou bem mais cooperante. Apontam para o alargamento do horário

de abertura do museu, sem interrupção à hora do almoço e a criação de dois turnos durante o

Verão, um dos quais permitiria a abertura do museu até mais tarde. Pedem também uma maior

divulgação das suas actividades culturais e a sua diversificação, a áreas como a música e a

dança, bem como a introdução de mais informações acerca das peças e um eventual acesso

às reservas. Pretendem a abertura urgente das salas que se encontram fec hadas por motivo

de obras ou por falta de pessoal. Solicitam uma melhor sinalização do museu bem como a

criação de uma planta menos confusa e colocada em sítio facilmente visível ou entregue

gratuitamente aos visitantes. Há quem refira a falta de uma biblioteca destinada a jovens ou a

não especialistas em termos de arte e a necessidade de mais material de apoio, como postais

e diapositivos.

3.2.4. Conclusão

O que ressalta de forma mais imediata na análise aos públicos de ambos os museus é

a diferença de abordagem que cada um deles suscita. Sendo espaços de metodologias e

objectivos distintos, ainda que com pontos de contacto comuns, sendo um mais localizado

geograficamente e o outro tipologicamente mais especializado, atraem a visita de indivíduos

com solicitações culturais caracterizadas a vários níveis do comportamento e de exigência.

À oferta que as instituições proporcionam correspondem à multiplicidade dos públicos

que a abordam: quanto maior for a uniformidade dos visitantes, mais se atrofiam os campos de

acção levados a cabo pelo museu. Em simultâneo, se as propostas feitas ao público se

cingirem igualmente a aspectos muito limitados, todos os potenciais visitantes que não sejam

abrangidos se colocarão, eles próprios à margem da vida do museu.

O equilíbrio desta situação passaria, certamente, pela adequação de espólio de cada

um dos espaços em que decorreu esta análise a uma comunidade alargada e recrutada em

todos os níveis etários, sociais, económicos e culturais. Trata-se de divulgar uma mensagem

que corresponde ao nosso património e que como tal deve ser encarado e assumido o que

implica, em relação ao museu, identificar-se como meio de comunicação posto ao alcance de

todos.

Se, de uma forma geral, não há uma educação museológica, forjada através da

frequência destes espaços, a crítica que surge não pode ser nem verdadeiramente objectiva e

construtiva, porque afastada da realidade dos museus e das condições impostas pela

conservação das peças, nem, tão pouco, será incisiva por desconhecer as possibi lidades que

toda a conjuntura museal lhe pode oferecer. Por isso, é muito pouco o que este público solicita

e menos ainda, aquilo que exige. E esta será, sem dúvida, uma desvantagem para o museu

que se vê sem grandes estímulos para dinamizar e alargar a sua acção, e sem pretextos para

convencer os serviços oficiais ou as entidades responsáveis acerca das reais carências com

que estas instituições se defrontam e que passam por problemas orçamentais e quadros de

pessoal incompletos, os quais só conseguem ser ultrapassados através do esforço e

entusiasmo dos profissionais que lhe conseguem garantir a vitalidade possível.

3.3. FUNÇÃO COMUNICATIVA DO MUSEU

3.3.1. Informação - MNAA/MC

O objecto-museal cumpre-se através da mensagem que o museu transmite; isto supõe

que, sendo ele próprio, o fulcro do discurso emitido pelo museu, necessita de suportes verbais

e gráficos que ajudem à sua descodificação. Encontramos, por isso, uma informação paralela

ao objecto, mas com ele directamente comprometida, no sentido em que a sua função e

identificá-lo e, eventualmente, explicar a sua função no percurso expositivo.

Para que o museu se assuma como uma instituição virada para a divulgação de

conhecimentos e culturas e realize esta missão de forma eficaz, a informação deve ser correcta

e adequada. Porém, em ambos os museus analisados, a informação que rodeia os objectos é

insuficiente e, como tal, é sentido pelos visitantes inquiridos.

Num museu de referência face a todos os seus congéneres nacionais, como é o de

Arte Antiga, cuja colecção é essencial para o conhecimento e a compreensão da história de

arte portuguesa, a informação paralela deve ser extremamente cuidada, desenvolvendo-se a

vários níveis, de molde a oferecer dados tão completos e vastos quanto possível, abarcando

toda a produção literária e ensaística realizada em torno da temática da sua colecção. Exige-se

que, por um lado, o itinerário normal do museu não seja perturbado por uma informação

demasiado incisiva, mas que todas as peças sejam legendadas com os dados necessários à

sua identificação e localização espaço-temporal e, por outro, uma estrutura de apoio que

facilite aos especialistas todas as condições necessárias à investigação.

No percurso que efectua, ao longo do museu, o visitante não possui qualquer

informação prévia acerca da estrutura do espaço museológico e da distribuição das colecções,

nem encontra qualquer indicação acerca dos itinerários. Como introdução teórica às várias

temáticas e tipos de acervo, o visitante dispõe, à entrada das salas ou no início da exposição

das colecções, de textos informativos, escritos nos códigos linguísticos que correspondem à

realidade do seu público (português, francês e inglês) mas que não contemplam todo o museu.

Além disso, não são de fácil e cómodo acesso: tratando-se de uma folha dactilografada, inserta

numa capa plástica e presa ao suporte por uma corrente metálica, quem quiser consultar o

texto tem de se cingir ao espaço de entre portas e ler de pé aquilo que lhe interessa, mais ou

menos afastado das peças a que a informação se refere.

O visitante comum pode servir-se de um pequeno guia, igualmente em português,

francês e inglês, que o introduz no museu de forma acessível e atraente, que lhe apresenta

uma planta esquematizada, caracteriza as colecções de forma genérica e refere os serviços

prestados. Porém, se pretender um conhecimento mais alargado do museu e do seu espólio, o

visitante defronta-se com a inexistência de catálogos gerais e roteiros que faltam desde o início

das obras de restauro do museu, que se prolongam desde a XVI Exposição do Conselho da

Europa em 1983. Esta carência é parcialmente compensada pela edição de catálogos

temáticos, alguns dos quais exemplares do ponto de vista de concepção, desenvolvimento e

apresentação dos conhecimentos e por outras publicações que tem como referência peças e

colecções do museu. Além disso, havendo duas zonas de recepção distintas, em cada um dos

pólos do espaço expositivo, o visitante que entre no museu pela Rua das Janelas Verdes, e

dado que não existe nenhum guia ou folheto gratuito que aqui se ofereça, tem de atravessar o

museu na sua quase totalidade antes de poder adquirir qualquer uma das publicações no único

espaço de vendas situado no Anexo.

De um modo geral, portanto, detectam-se lacunas e deficiências na inserção do objecto

no discurso museológico: falta a um número considerável de peças e a algumas áreas

temáticas da colecção, a informação que corresponda à curiosidade elementar de um público

medianamente interessado.

Como serviço de apoio ao estudo e à investigação existe, no espaço do museu, uma

biblioteca especializada em História de Arte e um arquivo fotográfico para eventual consulta.

Se bem que razoavelmente apetrechados há uma série de condicionantes que dificultam o seu

acesso: um reduzido horário de acesso, a organização complexa e incompleta dos ficheiros e a

falta de conforto da sala, para lá de um defi ciente serviço de cópia e da consulta interdita de

algumas obras importantes.

Uma instituição que, pela dimensão e valor da colecção, se liga obviamente à pesquisa

académica - a qual fornece um vasto campo de investigação ainda por realizar em torno da

História da Arte - acaba por prejudicar todas essas tentativas de trabalho, aliás indispensável

para o conhecimento e protecção do nosso património cultural, ao não investir numa infra-

estrutura de apoio adequada a esta função.

O Museu da Cidade é um espaço consagrado à história local, pelo que a apresentação

das peças obedece a um critério diacrónico e não tipológico, intercalando peças cujo valor

histórico e artístico é muito variável, se avaliadas independentemente mas que, ao inserirem-se

na globalidade da colecção, adquirem uma indiscutível importância no discurso museológico.

Simultaneamente, serve um público que, no geral, não é especializado nos temas abordados e

que, no museu, procura adquirir uma informação global acerca da cidade.

O discurso paralelo que referencie a carga significante do objecto e que interprete a

sua inserção no percurso histórico que se efectua no museu, é essencial para que a

mensagem que este pretende emitir seja correctamente compreendida e assimilada pelo seu

público. Porque a escolaridade média dos seus visitantes corresponde a um nível médio, que

naturalmente não procura a consolidação ou o aprofundamento dos conhecimentos obtidos,

através de consulta bibliográfica ou de outros elementos apôs a visita, o museu deve investir

sobretudo na informação junto as peças.

O objecto exposto no Museu da Cidade nem sempre justifica ou, mesmo, permite uma

legendagem com dados muito exaustivos, mas impõe-se que seja completa e correcta, ainda

que sucinta. Neste museu, as legendas, que não contemplam todas as peças, não se

questionam pelo seu rigor histórico, mas pelo seu suporte: os caracteres são impressos numa

placa de fibra acrílica transparente, separada da parede e que, ao ser iluminada projecta

sombras que dificultam a leitura. Este tipo de informação é completado, nalgumas salas com

quadros e gráficos explicativos que auxiliam na decifração dos objectos expostos, sobretudo no

caso das peças arqueológicas.

Há a registar, porém, uma distribuição desequilibrada da legendagem, ao longo da

exposição. Se nas primeiras salas não se notam grandes falhas, nas do primeiro piso, a

utilização de legendas é muito irregular, enquanto na reconstituição da casa nobre do século

XVIII é inexistente. Por outro lado, os quadros explicativos são, a este nível, fundamentais para

a compreensão do contexto histórico a que a peça se reporta. No caso das maquetas, um dos

elementos que no museu maior interesse desperta, nota-se a falta de uma planta actual da

cidade - o espaço conhecido pelo visitante - com a zona reproduzida na peça marcada de

forma facilmente identificável, permitindo uma melhor compreensão da relação entre o real e o

representado e, consequentemente, forjar uma ideia mais correcta acerca do desenvolvimento

urbano de Lisboa.

A exposição de objectos que, no museu, se afirmam como pertencentes a uma

determinada época não são por si só justificativas da escolha efectuada: o recurso a

reproduções de época que localizem a peça no seu contexto, embora surja com carácter

eventual, poderia ser mais utilizadas, favorecendo a compreensão da mensagem proposta.

O visitante comum, mesmo sem estar directamente vocacionado para a pesquisa

posterior, manifesta com frequência um grande interesse em prolongar a visita através de

folhetos e catálogos com a reprodução dos objectos expostos ou em reserva e um texto

explicativo da colecção e do percurso histórico proposto. A total inexistência deste tipo de

material, a falta de zonas de leitura, de consulta bibliográfica, arquivística e gráfica, são das

lacunas que, neste aspecto mais afectam o Museu da Cidade.

PROPOSTAS:

− Circuito liberto de informação - legendagem.

− Informação destinada ao interesse do visitante ocasional:

- textos explicativos,

- catálogos gerais.

− Introdução ao estudo de determinado tema:

- catálogos temáticos.

− Centros de apoio à investigação:

- biblioteca,

- arquivos de gravuras, fotografias, diapositivos, filmes e registos,

videográficos com monitores de observação individual,

- terminal de computador - banco de dados; monitores individuais,

- salas de estudo junto às reservas.

− Serviço de apoio - centro de cópia:

- fotocopiadora a preto e branco / a cores

- impressora laser a cores

SUGESTÕES:

I. Legendas

− Junto às peças.

− Informação sucinta, sobre um suporte discreto e neutro e, tanto quanto

possível, uniforme.

− Dados a introduzir na legenda:

- designação da peça ou titulo da obra,

- designação da autoria (de; atribuído a; cópia; da oficina de; da escola de; à

maneira de),

- proveniência: local,

- data (de realização),

- função do objecto (quando necessário),

- dimensões,

- número de inventário,

- eventualmente, reprodução da marca do artífice (ourives, etc.).

Quando se trate de uma cópia ou reprodução, indicar o sít io onde se encontra o

original.

2. Textos explicativos

− Colocação em sítios estratégicos: à entrada da sala onde se principia a

apresentação de uma colecção (pintura, mobiliário, etc.) de um estilo, de uma

época, de um tema, etc.

− Colocação em suportes facilmente identificáveis e fácil acesso (não muito

altos), mas sem se destacarem demasiado no conjunto da exposição.

Ex.: caixas em acrílico ou numa estrutura metálica;

se os folhetos forem colocados num recipiente de material não transparente

e que não permita identificar imediatamente o conteúdo, aquele deve ser de

cor neutra e ter aposto um símbolo que indique o que contém (este símbolo

deve vir identificado a entrada do Museu, no bilhete de entrada, etc.).

− Os folhetos, destinando-se ao uso individual ou de pequenos grupos de

visitantes, devem ser repostos antes de se esgotarem.

− Ao longo da exposição devem destinar-se locais de descanso e que

proporcionem a leitura dos folhetos perto das peças a que se referem.

− Informação contida nos folhetos:

- explicação geral da colecção, do ponto de vista histórico e artís tico;

características gerais do estilo e dos elementos decorativos das peças,

- panorâmica histórica da época em que as peças foram produzidas (no

âmbito socio-económico e cultural),

- quando não seja óbvio, explicação do modo de utilização das peças ou da

sua função, .

- referências especificas às peças mais significativas e aos autores mais

importantes.

3. Catálogo geral (MNAA)

− Introdução: história, característica e objectivos do Museu.

− Enumeração de todas as peças expostas no Museu e, eventualmente, de

algumas peças importantes em reserva (caso de peças sujeitas a uma

exposição rotativa):

- caracterização da peça através dos dados referidos na legendagem,

- reprodução fotográfica (a preto e branco; as peças mais signifi cativas, a

cores);

- referência a dados particulares; verso e reverso de moedas, medalhas,

retábulos, etc.

Catálogo geral (MC)

− Expor e contar a História da Cidade: texto sucinto, ilustrado com as peças

expostas no Museu. Num índice iconográfico as peças apresentadas seriam

referidas com os dados constantes da sua legendagem.

4. Catálogos temáticos

− Apresentação das várias colecções do Museu, através de um texto explicativo

que possa introduzir o estudo do tema.

- Ex.: - pintura e escultura portuguesa; artes decorativas e mobiliário *; pintura

europeia; escultura; ourivesaria *; marfins *; tapetes e tapeçarias; etc.

(MNAA)

- azulejaria; vestígios arqueológicos; tipos, figuras e cos tumes do século XIX;

época Pombalina; o Terramoto, etc. (MC)

* Catálogos já existentes no MNAA.

− Apêndice com informações que remetam qualquer interessado para uma

investigação mais aprofundada no espaço do Museu (pistas de inves tigação

relacionadas com o tema):

- indicação bibliográfica de títulos existentes na biblioteca do Museu ou à

venda na sua loja, . indicação de diapositivos, de filmes, ou outros registos

gráficos e da forma como poderão ser encontrados e utilizados no Museu,

- indicação de dados disponíveis no computador.

5. Biblioteca

− Especialização da Biblioteca segundo o tipo de Museu:

- Biblioteca da História de Arte e temas afins (MNAA),

- Biblioteca de títulos relacionados com a cidade e a. sua evolução ao longo

dos temas; personalidades, etc. (MC)

− Sala de estudo adequada em termos de acessibilidade aos documentos

pretendidos pelo visitante, de iluminação e conforto.

− Documentos mais raros valiosos ou importantes disponíveis sob a forma de

microfilmes e estrutura adequada à sua leitura.

− Ficheiros completos (actualizados): temáticos, por títulos e por autores.

− Acesso facilitado ao centro de cópia.

6. Arquivo fotográfico e de filmes

− Fotografias e diapositivos à luz normal das peças expostas e em reserva:

- plano geral das peças,

- pormenores.

− Fotografias técnicas: macro fotografia, luz rasante, a infra-vermelho, a ultra-

violeta, radiografia (MNAA).

− Fotografias obtidas durante exames laboratoriais a que as peças tenham sido

submetidas: cromatografia, espectro fotometria, etc.; fotografias dos resultados.

(MNAA)

− Hologramas de peças a três dimensões. (MNAA)

− Filmes relacionados com temas apresentados no Museu.

− Arquivo fotográfico com aspectos da cidade nos últimos 100 anos. (MC)

− Registos videográficos de acções promovidas no Museu: acções educativas,

exposições temporárias, conferências, representações teatrais, etc.

− Registos videográficos de acções promovidas no exterior pelo Museu.

7. Banco de dados

− Ficheiro de todas as peças existentes no Museu, com chamada por:

- tipo (pintura, escultura, mobiliário, etc.),

- tema (mitológico, religioso, histórico, etc.),

- época,

- data,

- estilo,

- escola,

- autor,

- colecção.

− Ficheiro de peças existentes noutros Museus e Monumentos do Pais ou

estrangeiro (ligação a computadores de outros Museus).

− Informação acerca de cada peça, com chamada por:

- número de inventário,

- designação.

− Informação disponível acerca das peças (MNAA):

- história da peça, desde a sua fabricação,

- descrição da peça: tema, função, elementos decorativos, elementos

iconográficos,

- modificações sofridas,

- restauros,

- estudos realizados sobre a peça,

- indicações bibliográficas,

- inventariação de peças que se relacionem com aquela.

3.3.2. Dinamização - MNAA/MC

No Museu Nacional de Arte Antiga, a colecção, embora muito rica, suporta vários

problemas que afectam a sua exposição. Os edifícios, antigos domicílios nobre e conventual,

embora não tenham sido construídos com funções especificamente museológicas, tem vindo a

ser sucessivamente adaptados à sua actual situação. Porém, a última campanha de obras tem

vindo a revelar-se demasiado morosa; existe, actualmente, um piso que se encontra encerrado

para restauro e várias salas que, desde 1983, não tornaram a ser abertas ao público, o que

signifi ca uma diminuição drástica do espaço com consequências gravosas para a execução de

um plano conveniente da exposição permanente.

Os objectos aqui expostos são, pelas características do Museu, de elevado valor

histórico e artístico e é do reconhecimento deste parâmetro que vive a apresentação na maior

parte do percurso, sendo manifestamente insuficiente para a criação de um espaço atractivo. O

envolviment o das peças, ainda que seja discreto a ponto de não colidir nem sobrepor-se ao

objecto, tem uma função estética que neste Museu nem sempre é observada, o que implica

algumas zonas demasiado frias e inóspitas.

Apesar deste Museu se afirmar como a maior e a mais completa pinacoteca do pais, a

exposição de pintura é particularmente insípida: numa sucessão de salas relativamente

amplas, os quadros são colocados directamente sobre paredes brancas e planas, deixando

aberto o espaço central, atapetado numa cor neutra, a que uma iluminação zenital uniforme,

confere uma maior sensação de vazio e monotonia. Uma tentativa de ruptura com o espaço

formal, passando pela valorização das obras expostas e realçando as de cotação artística mais

elevada, pela utilização de suportes adequados à exposição dos diversos tipos de pintura,

cavalete, trípticos, retábulos, pela iluminação pontual e pela criação de zonas de repouso nas

salas cujas peças suscitem maior interesse, poderia conduzir à reformulação do discurso

museológico, tornando-o mais atraente e eficaz junto do visitante comum.

O anexo, remodelado na década passada, ainda que o seu arranjo final tenha

suscitado alguma polémica, oferece uma apresentação museográfica mais dinâmica em

consequência da utilização de suportes e cromatismos estudados em função das peças e da

sugestão de um ritmo variado da visita pela sequência de espaços plenos e vazios. Isto não

impede que a apresentação de algumas colecções pareça saturada. Este problema é

sobretudo notório na exposição de ourivesaria em que a aglomeração de peças, devido ao

brilho ofuscante e ao grande contraste de luz/sombra que provocam algum cansaço na

observação dos objectos.

O percurso da exposição é, neste Museu, muito extenso e diversificado, atendendo à

amplitude e va riedade das colecções, pelo que uma visita atenta e pormenorizada é

inconcebível, por demasiado demorada o que, aliás colidiria com o próprio horário de abertura.

Tal como existe, o museu propicia uma observação vaga e imprecisa, detendo-se

apenas nalgum elemento que suscite uma atenção especial, mas não corresponde à.

necessidade de quem lá entra motivado pelo interesse previamente definido por determinada

peça ou colecção. A falta de uma planta e da anotação facilmente identificável dos espaços

ocupados pelas diversas colecções e a inexistência de itinerários sugeridos são uma das

lacunas aqui detectáveis.

Em contrapartida, as exposições temporárias são um dos pólos de animação mais

conseguidos nos campos de actividades realizadas pelo museu. Pretexto para divulgar parte

do espólio guardado em reserva, este tipo de mostra tem vindo a impor-se pelo cuidado posto

na sua execução, criatividade demonstrada e recurso a técnicas de sensibilização paralelas, no

domínio dos suportes, iluminação e audiovisuais e pela oportunidade dos temas que têm vindo

a ser escolhidos.

No Museu da Cidade coexistem dois espaços museológicos distintos: a apresentação

de documentos relacionados com a História local e a reconstituição de um solar lisboeta de

seiscentos, a qual aproveita parte da estrutura original do edifício.

O itinerário de uma visita completa é bastante longo e encontra-se, nalgumas zonas,

demasiado preenchido. A colecção referente à História do município é muito vasta e

diversificada, mas não recebe um tratamento uniforme ao longo do percurso. As primeiras

salas até cerca do núcleo referente à Expansão Marítima, inclusive, são marcadas por um

didactismo muito aparente, com recurso a quadros explicativos, réplicas e outros elementos

que, embora actuais, ilustram a carga significante das peças históricas originais. O contraste

entre os vestígios do passado e o presente, pondo este ao serviço daquele, contribui para uma

melhor leitura da exposição, ao mesmo tempo que a alivia de uma imposição histórica

demasiado pesada e hermética, tornando-a mais acessível ao grande público. Em

contrapartida, as salas que se seguem à reconstituição do espaço doméstico, estão

sobrecarregadas de documentação da época. A exposição, em compartimentos mais

pequenos que as do piso térreo, desenvolve-se junto as paredes e num bloco central, por

vezes, suficientemente alto para que se não tenha uma visão do outro lado da sala. Aliás,

atendendo a que uma importante percentagem de público que frequenta este Museu é consti-

tuída por adolescentes dum nível etário correspondente à população escolar até ao secundário,

poderemos considerar, duma maneira geral, os suportes museográficos como demasiados

altos para uma adequada observação das peças. Tornando ainda a exposição mais densa e

cansativa, são praticamente inexistentes quaisquer elementos paralelos que, ao inserir a

colecção, demasiado profusa, a dinamizassem.

O itinerário que é imposto ao visitante não é totalmente coerente, oferecendo, a dado

momento, uma evolução anacrónica, motivada em parte pela introdução do ambiente

seiscentista a partir da estrutura original da casa. Entre a maqueta de Lisboa antes do

terramoto e a cozinha da época, existe uma sala cujas paredes estão cobertas de gravuras

referentes a tipos populares do século XIX. Para além de ser uma apresentação

desaconselhável por motivos de conservação, ela surge despropositada nesta altura do

percurso. Por seu turno, num museu com um itinerário muito longo, sem zonas de repouso,

esta sala, situada num ponto de interrupção entre dois núcleos expositivos, poderia converter-

se num espaço de lazer que seria aqui, mais do que propicio, necessário.

Poder-se-ia, igualmente, intervalar o percurso e definir itinerários através da conversão

do pátio central em espaço de lazer, restaurando-o ao gosto seiscentista o que propiciaria,

ainda, a dinamização do local em termos culturais e lúdicos.

O museu debate-se com problemas de espaço que se traduzem na referida

acumulação de peças. Retirar da exposição tudo o que não fosse indispensável a

compreensão da mensagem, afastar todos os elementos supérfluos, poderia ser uma solução

transitória para as salas demasiado sobrecarregadas. Porém, o aproveitamento dos espaços

envolventes continua a ser indispensável para a construção de pavi lhões suplementares, aliada

a recuperação do traçado primitivo dos jardins.

Num museu com referência a Lisboa, cidade de múltiplos parâmetros e perspectivas,

são muitas as temáticas susceptíveis de tratamento museológico efémero, revelando novos

aspectos do desenvolvimento urbano e dos costumes e tradições locais. A falta de um espaço

destinado a exposições temporárias impede o museu de se realizar numa das suas vertentes

mais aliciante e dinâmica: o estudo e a investigação subordinados a assuntos específicos e dos

quais se apresentam resultados, aproveitando o ensejo para mostrar ao público as colecções

em reserva e, neste caso, os numerosos bens museológicos, bibliográficos e arquivísticos

pertencentes ao município.

PROPOSTAS:

− Definição de itinerários:

- apresentação do itinerário global proposto pelo museu,

- desenvolvimento de vários temas através da utilização de recursos

existentes no museu e outros.

− Visitas guiadas:

- apresentação histórico-cultural e artística das colecções expos tas,

- exploração de peças e colecções segundo várias perspectivas temáticas

propostas pelo museu ou sugeridas pelos receptores e atendendo aos níveis

etário e de escolaridade destes.

− Conferências e colóquios:

- dissertações acerca de temas directa e indirectamente relacionados com a

colecção, tipologia e âmbito do museu, a cargo de especialistas e

investigadores,

- abordagem de temas relacionados com a Museologia nas suas diversas

vertentes.

− Recurso a outras artes:

- música,

- bailado

- teatro

- poesia.

SUGESTÕES:

1. Definição de itinerários

− Planta geral do Museu na sala de entrada e em cada piso (ou área/ala dos

edifício) com a indicação das várias secções.

− Definição de vários itinerários parcelares: folhetos com a planta do Museu na

qual se marcará o percurso (através de um jogo de cores;

ex.: uma cor definida para o itinerário em contraste com uma cor neutra para a

representação do restante espaço do Museu) através de uma época, um estilo

artístico ou determinada forma de arte.

O folheto deverá indicar as salas ou as peças existentes em determinada sala

relacionadas com o tema proposto pelo itinerário.

− Actividades complementares:

- recolha e apresentação de textos relacionados com os temas a desenvolver,

- recolha e apresentação de diapositivos, fotografias, filmes,

- criação de pequenos núcleos temáticos, “museobus” ou maleta pedagógica

em funcionamento no espaço do museu ou itinerantes,

- colóquios.

− Extrapolação do estudo do tema para fora do espaço do Museu; indicação de

outros vestígios históricos relacionados com o tema e não existentes no

Museu:

- sugestão de itinerários pela cidade, pela região, pelo pais,

- visitas guiadas fora do Museu, tendo nele início.

− Museu Nacional de Arte Antiga

- Vários itinerários relacionados com cada uma das secções do Museu: pintura

e escultura portuguesas? artes decorativas europeias; pintura e escultura;

ouriversaria e cerâmica portuguesa; contactos com a África e o Oriente; e

Capela e Arte Ornamental portuguesa,

- possibilidade de definir outros itinerários relacionados com a obra de um

artista, de uma escola ou de uma época.

- Exemplos:

retábulos conventuais

pintura religiosa

retratos

produção artística no reinado de D. Manuel

arte indo-portuguesa

porcelanas da China

tapeçaria flamenga e/ou francesa

tapetes de Arraiolos

a Baixela Germain

− Museu da Cidade

- Exemplos de vários itinerários no espaço do Museu:

A História da Cidade antes da Nacionalidade

A Idade Media

Os Descobrimentos

Lisboa antes e depois do Terramoto

Usos e costumes do século XIX

A implantação da República

Azulejaria

Artes Decorativas

- Hipótese de correlação entre determinadas colecções do Museu (ex.:

Azulejaria) e proposta de outros itinerários no espaço da cidade – propostas

de passeios ou de visitas guiadas a vários pontos da cidade, particularmente

significativos.

2. Visitas guiadas

(Acções especialmente dirigidas a grupos de visitantes)

− Visitas guiadas ao Museu na sua globalidade.

− Exploração de uma peça exposta ou de um determinado tema (de acordo, por

exemplo, com os vários itinerários parcelares propostos); acção dirigida por um

monitor.

− Museu Nacional de Arte Antiga

- O Universo de Jerônimo Bosch

- Arte Nambam (exploração do tema com recurso a textos da Peregrinação de

F. M. Pinto *)

− Museu da Cidade

- A vida no Terreiro do Paço antes do Terramoto de 1755, no quadro de Dirk

Stoop.

* Leitura dos textos, através, por exemplo, do recurso à cooperação com alunos da

Escola de Teatro.

3. Conferências e Colóquios

− Acções relacionadas com temas de Arte (M.N.A.A.) e de História local (M.C.).

4. Cursos de Formação

− Museu da Cidade - possibilidade de cooperação com o curso de História da

Faculdade de Letras situado na área do Museu.

3.3.3. Serviço educativo - MNAA/MC

A dinamização no Museu Nacional de Arte Antiga e no Museu da Cidade passa pelas

actividades de carácter educativo que empreendem. O contacto que, nestas acções, se

propicia permite ao museu adquirir um conhecimento directo e imediato, ainda que relativo, do

seu público, através de sugestões recebidas das propostas formuladas, das discus sões que se

travam e dos interesses, dúvidas, conceitos e curiosidades que se confessam. O

reconhecimento destes sinais, a interpretação dos métodos e critérios que impõe, deriva da

formação e sensibilidade do monitor que enceta e coordena o diálogo, nesta vertente da acção

museológica.

No acompanhamento das várias estratégias formuladas e desenvolvi das pelo museu, o

monitor deve empenhar-se sobre a pessoa concreta que acompanha, captando a sua própria

interpelação face ao que está exposto, e abrindo novas vias de contacto e estimulando a sua

capacidade de observação e compreensão, de relacionar e interpelar.

A experiência que cada indivíduo vive no espaço do museu deriva das alternativas que

lhe são postas; ao monitor compete estimular a descoberta daquilo que, estando implícito no

espaço físico da exposição, não é imediatamente claro e evi dente mas que, por isso mesmo, é

possível de suscitar fascínio e inspiração.

As visitas guiadas são, em ambos os museus, o eixo fulcral das actividades

pedagógicas que ai se efectuam, na medida em que é através delas que se estabelece a

primeira ligação com os visitantes e se considera que são estes que condicionam, justificam e

mostram todas as iniciativas que ai se processam. Tratando-se de visitas solicitadas por grupos

já estabelecidos incidem, de uma maneira geral, sobre temas sugeridos por aqueles a quem se

destina; havendo contactos prévios com os responsáveis ou representantes do grupo é norma

ajustar as activi dades no museu às suas opções e expectativas especificas, aos seus gostos

particulares; no caso de visitas de estudo, estas poderão adequar-se às matérias curriculares,

tornando-as ilustrativas de um tema previamente determinado e com objectivos definidos.

Porém, não se esgota aqui, a actividade dos serviços educativos de qualquer um dos

museus observados.

Apesar de não possuir ainda um serviço educativo oficializado, logo nos primórdios da

sua fundação o Museu Nacional de Arte Antiga aparece ligado a um projecto que, embora algo

incipiente, envolvia já aspectos de índole pedagógica. Definia-se como um dos seus objectivos,

a formação de artistas, alunos ou mestres da Academia ou das Escolas de Artes Decorativas,

através da observação e estudo das obras expostas.

A mudança para a Rua das Janelas Verdes, a desanexação do espólio que passa a

integrar o Museu Nacional de Arte Contemporânea, as reformas operadas pelo novo director,

José de Figueiredo, vieram propiciar uma maior aproximação ao público, na busca de visitantes

mais heterogéneos, fora da costumeira esfera elitista. João Couto reformulará esta orientação

ao procurar travar um diálogo inovador com a população mais jovem e ao abrir o museu como

local de estudo e animação: fomenta-se a vinda de turmas de estudantes, realizam-se aulas

vivas nas salas de exposição, enviam-se circulares às escolas propondo o museu como um

local de encontro e descoberta; criam-se estruturas especifi camente destinadas ao público, tais

como uma biblioteca especializada, um auditório e salas de exposição temporária.

Tempo depois, na sequência deste contacto, era criado um centro onde gente entre os

4 e os 17 anos podia dar livre curso à sua imaginação fora dos habituais formalismos

escolares. Reunidos em grupo era-Ihes permitido escolher entre os materiais e técnicas

disponíveis na oficina - pintura de cavalete e mural, gravura, modelação, olaria, carpintaria,

tecelagem - aqueles que mais lhes agradava explorar. A experimentação táctil, aliada a todo

um fenómeno de descoberta e criatividade funcionava como uma ocasião lúdica de

aprendizagem prática, insubstituível para o reconhecimento das personalidades e aptidões

pessoais de cada um dos participantes e da sua capacidade de integração num trabalho

colectivo. A oficina era, dentro dos referidos limites etários, aberta a todos os que nela

quisessem trabalhar, depressa se tornando num campo de encontro fértil de realizações,

sobretudo para todas as crianças da zona, mas servindo também as áreas envolventes num

grande raio de acção que compreendia toda a grande Lisboa. Não obstante, estas instalações

foram demolidas, subtraindo ao museu qualquer hipótese de iniciativas neste sentido.

As visitas guiadas são, hoje em dia, a parte principal das acções empreendidas pelo

Serviço Educativo deste Museu (Anexo XX). O apoio prestado ao visitante implica uma

abordagem correcta da exposição, facultando uma informação oportuna no momento e

circunstâncias adequadas a fim de colmatar as carências alargadas que se têm vindo a registar

no campo dos conhecimentos históricos e artísticos e que a Escola e, de um modo geral, todo

o ensino formal não conseguem colmatar de forma eficaz e suficiente. O reconhecimento deste

facto levou a que o museu procure intervir organizando cursos e conferências subordinados a

toda uma temática relacionada com Sociologia e História critica de Arte destinada a

estudantes, professores e, de um modo geral, a todo um público interessado.

Os professores, aliás, têm vindo a revelar-se os interlocutores privilegiados de

inúmeras iniciativas realizadas no museu, na medida em que a sua participação activa é um

factor fundamental no desenvolvimento e aprofundamento das estratégias museológicas

visando a população escolar. O professor m, em certa medida, o elo entre o museu e a escola,

dele dependendo a sugestão da visita, a sua motivação, o acompanhamento do grupo e, por

fim, o aproveitamento e avaliação das experiências. O museu tem procurado, por isso, investir

de forma muito específica e concreta na formação de professores, dando-lhes a conhecer

formas variadas de aproveitamento do seu espaço e colecções como elementos a utilizar num

ensino vivo e indicando todas as possibilidades de apoio e exploração úteis que aqueles

oferecem. Em contrapartida, os professores têm vindo a auxiliar o museu no acompanhamento

de alunos e na modificação de ambientes rotineiros, pedagogicamente pouco estimulantes.

Se analisarmos os quantitativos de visitantes que, directa ou indirectamente,

receberam apoio do Serviço Educativo entre 1985 e 1989 (Anexo XXII) verifica-se que o

número de alunos dos níveis primário e secundário integrados em visitas guiadas por pessoal

do museu tem vindo a decrescer, apesar do equilíbrio registado nos últimos dois anos,

enquanto nos grupos que realizam a sua vi sita dirigidos por professores preparados pelo

Serviço Educativo se observa uma subida considerável. O facto de esta tendência se inverter

no ano de 1986 não parece significativa nem contraria a importância da formação de

professores pelo museu, cujos números se têm mantido dentro de valores relativamente

constantes, embora revele uma subida nos últimos três anos (Anexo XX).

Actividades do Serviço Educativo - MNAA:

− Acompanhamento de visitas.

− Apoio a professores:

- apoio individualizado ou em grupo.

− Acções de formação-cooperação entre o Serviço Educativo e os professores:

- conhecimento da colecção e levantamento das suas potencialidades de

acordo com os programas escolares (eventualmente em

interdisciplinaridade),

- escolha da metodologia e estratégias a utilizar com os diversos grupos de

alunos - preparação das visitas,

- preparação dos guiões de visita,

- acções destinadas à exploração, no museu, de colecções relacionadas com

determinado tema,

- elaboração de actividades lúdicas (jogos, gincanas, etc.) de apoio ao

encontro com o museu,

- contacto com Escolas Superiores de Educação,

- Encontros e Seminários.

− Actividades complementares:

- acolhimento ao visitante individual,

- troca de experiências com os Serviços Educativos de outros museus

nacionais e estrangeiros,

- actualização da diapoteca e elaboração de programas de diapositivos para

empréstimo a grupos,

- elaboração/compilação de textos de apoio a acções destinadas a

professores, alunos ou público em geral,

- apoio a estudantes (do Secundário e universitários) na realização de

trabalhos,

- participação no estudo, idealização e divulgação das acções do museu,

- planificação e programação das acções,

- colaboração com o Sindicato dos Guias-Intérpretes de Lisboa, no sentido de

propiciar a estes profissionais um melhor conhecimento da colecção e

actividades do museu.

− Intervenção noutras actividades do museu:

- colaboração no estudo e projecto das folhas de informação a colocar nas

salas para utilização do publico,

- participação no estudo para a sinalização do museu,

- colaboração com um arquitecto paisagista no estudo e conservação do

jardim,

- participação na planificação e realização do vídeo "Descobrir os

Descobrimentos no Museu Nacional de Arte Antiga".

No Museu da Cidade não foi ainda criado um serviço educativo, a título oficial. A

animação do museu está, desde Abril de 1988, confiada a uma única funcionária do Quadro de

Pessoal, com a categoria de Técnica Superior. Até esta data realizavam-se visitas guiadas

pelas próprias conservadoras do museu, mas apenas com carácter muito esporádico e

destinadas a grupos especiais que o solicitassem como enquadramento de um roteiro cultural

oficial.

Actualmente, a visita guiada é a base e o fundamento de todas as estratégias de

comunicação encetadas pelo museu (Anexo XXIII). Sendo o seu público constituído

essencialmente por grupos organizados no âmbito da Escola, nos níveis básico e secundário

da escolaridade, a visita ao museu é um complemento ou uma extensão do ensino formal e

sofre de todos os vícios adquiridos na sala de aula. Exterior ao seu quotidiano, o museu surge

a estes visitantes como reflexo de uma outra realidade, diacrónica que, para abordar vários

temas dos seus programas curriculares, o faz a partir de objectos concretos, aos quais se alia

uma exposição teórica de carácter interactiva. O monitor que acompanha visitas de grupos

escolares, aliás sem hábitos adquiridos de frequência de museus, precisa de dar aos visitantes

um tempo e um espaço de adaptação, para que aqueles possam distinguir, na exposição, entre

o objecto e o seu suporte, ou seja, entre o que ai existe de concreto e de artificial; é sua

função, ainda, tornar esta situação numa experiência lúdica e cognitiva que organize o grupo

face a um determinado objectivo de aprendizagem, sem lhe retirar a espontaneidade e o prazer

da descoberta.

A visita é combinada com os respectivos responsáveis por cada grupo: o facto de a

marcação ser feita à segunda-feira, dia em que o museu está encerrado, permite uma maior

disponibilidade da parte do monitor para acertar com o professor o tema que a visita irá

abordar, os moldes em que irá decorrer e, simultaneamente, adequar as actividades às

características dos visitantes, nível intelectual, de maturidade e de concentração e aos seus

gostos e interesses gerais. Estas reuniões com os professores permitem também elaborar um

esquema de adequação do espólio e das características do museu em relação aos temas

abordados nos programas escolares.

Recebendo um número máximo de 30 elementos, as actividades com os grupos

escolares começam, de ordinário, com a visita ao museu que dura em média 60 minutos. Este

tempo pode ser alargado em relação aos tipos escolares mais avançados, até porque a

participação destes se torna mais exigente do ponto de vista da aprendizagem, mas é mais

abreviada e com espaços de paragem para os alunos da primeira fase do Ensino Básico,

naturalmente mais dispersos e com tempos de atenção muito limitados. Existe, também, a

preocupação de avaliar a adesão da criança ao museu e a sua compreensão da mensagem

que este propõe: a seguir à visita, o grupo é conduzido a um espaço improvisado no corredor

subterrâneo sob o pátio central onde, conforme as suas características, são projectados

diapositivos relacionados com a História do município, preenchem fichas formativas que se

apresentam de forma basicamente lúdica ou, simplesmente, se entregam a actividades de

expressão plástica.

3.3.4. Contacto com grupos étnicos

3.4.4.1. Minorias étnicas e sociais

Em Portugal, para lá de um constante, ainda que variável, afluxo de gente, houve

recentemente um fenómeno de imigração massiva e violenta, pelo que teve de

desenraizamento repentino e dramático e de inserção num meio diferente, com toda a carga de

desconfiança que habitualmente acompanha o sentido de dever com que os refugiados são

recebidos. Pouco mais de uma década não foi tempo suficiente para resolver todos os

problemas de integração com que esta população se defrontou, não sendo ela, na sua maioria,

especializada em termos de formação. Tendo, portanto, poucas defesas e garantias no

mercado de trabalho são poucas as suas hipóteses de promoção socio-económica, obrigando-

os à subsistência em condições precárias e degradantes. Formaram-se ilhas de muitos dramas

e solidão, que tornam esses grupos permeáveis e indefesos face a todos os males da vida

marginal e a todos os processos aparentes e inúteis de fuga à realidade.

Estes problemas, que afectam sobretudo as comunidades negras, os retornados das

antigas colónias portuguesas, mas que, com diferentes graus de intensidade, afectam outros

grupos imigrantes, servindo de enquadramento a todas as populações desfavorecidas e

periféricas a nível de urbanismo, habitação, trabalho e saúde pública com consequente perda

de identidade e desgaste do seu património, quer sejam indianos ou timorenses, ciganos ou,

simplesmente, portugueses marginalizados.

O museu, como instituição de cariz cultural, tem uma função de integração e promoção

que lhe cumpre assumir. Qualquer indivíduo ou grupo, seja qual for a sua condição, faz parte

de um público virtual, para o qual é necessário encontrar respostas, isto m, a mensagem que,

sem desvirtuar o conceito de museologia, lhe seja adequada.

A definição de museu de arte não parece suportar, de imediato, as populações

minoritárias cujas origens têm poucas referências à história da civilização ocidental e às quais

toda uma série de circunstâncias afasta de um tipo de informação e actividades culturais ditas

superiores, do ponto de vista académico. Porém, o Museu Nacional de Arte Antiga apresenta

um conjunto de objectos reais que abarcam a expressão erudita de culturas com quem tivemos

contacto entre os séculos XII e XIX, pelo que m possível detectar referenciais de todas as

partes do mundo, das civilizações que, com o espaço português, travaram um relacionamento

de mútuas influências. Tratando-se, embora, de objectos que não fazem parte do universo

cognitivo das populações migrantes, suburbanas e periféricas em relaç ão a campos do

conhecimento mais elaborado, é possível tentar uma abordagem que suscite o imaginário das

suas origens, aquilo que, da sua raça, lhe esteja latente.

As várias comunidades étnicas existentes em Lisboa têm vindo a desenvolver

programas de inserção destas minorias nos diversos planos da vida urbana, nomeadamente a

nível das populações mais jovens, através de uma política de acção conjunta com a Escola.

Existe, portanto, uma estrutura que, ao longo da escolaridade obrigatória, visa aproximar estes

indivíduos dos conteúdos programáticos que lhe são ministrados e fornecer-lhes um

enquadramento cultural mais próximo da sua realidade. As diversas acções que se

desenvolvem neste âmbito poderiam passar pelo intercâmbio com o Museu, aproveitando o

espólio disponível com maior carga significante para a compreensão das ligações existentes

entre as suas culturas de origem e a nossa. Uma vez que o objectivo pretendido é a integração

de duas expressões distintas e não uma assimilação cega dos dados culturais que a nossa

sociedade propõe, com a consequente rejeição daquilo que, não sendo entre nós considerado

por ser desconhecido, poderia ser avaliado como estigma de inferioridade, o Museu pode

traduzir a riqueza dessa mesma diversidade cultural. Ao realçar a originalidade de peças onde

se note a influência de outras paragens, a diferença dos materiais exóticos utilizados, a beleza

intrínseca do objecto e dos mitos, histórias ou tradições que este evoca, a acção do Museu de

encontro às minorias que fazem parte da nossa História pode ser uma estratégia insubstituível

do ponto de vista cultural. Em intervenções pontuais, como exposições temporárias ou outro

tipo de programação que se baseie no núcleo museológico, que estejam relacionadas com

uma região ou uma cultura, cujos elementos tenham representatividade no nosso meio social,

é possível solicitar a cooperação de embaixadas ou grupos de estrangeiros. Pode-se-lhes pedir

a divulgação do Museu mas, sobretudo, a sua própria participação dando às várias realizações

um envolvimento cultural mais vasto através de outras expressões artísticas, como a música, a

dança, ou a dramatização de ritos, crenças ou costumes.

No contexto de um museu local cabe uma abordagem etnológica, a par de outras

perspectivas que extravasem a História no seu sentido mais restrito. Pelo seu âmbito

pluridisciplinar, procurando reflectir os vários acontecimentos e circunstâncias que fazem parte

do desenvolvimento de um centro urbano que é quase a síntese de toda a História nacional, o

Museu da Cidade pode considerar-se vocacionado para uma acção junto das minorias,

ajudando-as a enquadrar-se no meio social em que se inserem.

A leitura deste museu parcialmente concebido a partir de objectos do quotidiano é

didáctica, porque muito interpretativa. A compreensão da sua mensagem não exige erudição,

pelo que se trata de um espaço que, pela sua própria natureza, se encontra vocacionado para

um público sem conhecimentos especializados.

No museu, o visitante m confrontado com uma outra visão, analítica e explicativa, das

peças com as quais convive numa vizinhança assumida e que são referência da sua cidade,

cenário em que actua; fragmentos que presenciam e testemunham êxitos, fracassos, medos,

frustrações ou alegrias, em suma, a sua vida.

Os objectos encontram-se expostos de molde a permitir ao visitante a apropriação do

seu significado e valor histórico. Se o conhecimento das coisas comporta, em determinado

sentido, a sua apropriação, este museu, ao divulgar a cidade aos seus habitantes, torna-a um

espaço particular e, como tal, fomenta o desejo da sua preservação, simultâneo de um

sentimento de posse afectiva. Neste sentido, o Museu da Cidade pode desempenhar um papel

determinante na integração de estrangeiros na vasta e heterogénea comunidade que é Lisboa.

Ao funcionar como catalizador de minorias e cooperar na sua inserção social, o museu

poderia alargar a sua acção, abarcando todos os grupos que fazem hoje a História desta

cidade sem ferir os seus patrimónios e identidade cultural. As várias comunidades que

coabitam neste território urbano tem mantido níveis e ritmos diferentes de aculturação que as

afastam ou aproximam das suas raízes. Porém, mesmo nos indivíduos que já se identificam

com o meio em que se inserem sem traumas nem conflitos, subsistem determinadas

expressões ancestrais que surgem espontaneamente em situações de festa ou dor. A recolha

de ritos, danças, cantares, ornamentos ou artesanato, não fazendo parte do espólio fulcral

deste museu, poderia interceptar pontualmente a sua dinamização, favorecendo a observação

de universos culturais paralelos ou convergentes e o reconhecimento da sua

complementaridade.

Ao promover o conhecimento da cidade através das suas mais variadas vertentes, o

museu pode facultar igualmente a difusão de outras expressões que, embora extrínsecas,

fazem parte do imaginário e do passado de parte desse seu público e cuja apresentação pode

contribuir para o enriquecimento de todos.

Simultaneamente, e porque não se procura assumir como um espaço elitista e fechado,

o museu pode aproximar-se dos problemas desses grupos minoritários e marginalizados. A

consciencialização dessas situações de crise pode ser levada a cabo através de exposições

temporárias de forte componente didáctica que, em cooperação com outros organismos de

acção social ou outros, apresentem atitudes apropriadas e soluções concretas para a

resolução de problemas concretos, estejam eles relacionados com o analfabetismo ou a

higiene e saúde. Esta acção, embora passe por estratégias de cariz museológico a realizar no

seu próprio espaço, pressupõe ainda a actuação no exterior, levando o museu a sítios

esquecidos e ignorados, das colectividades de bairro as casas de repouso para doentes e

idosos, numa linguagem lúdica e apelativa que participe na promoção individual de todos.

SUGESTÕES:

1. Museu Nacional de Arte Antiga

− Encetar contactos com embaixadores, associações comunitárias e empresas

cujo quadro de pessoal tenha uma percentagem significativa de imigrantes, no

sentido de organizar visitas temáticas ao museu:

- influência do Oriente na arte ocidental, nos ornatos das peças e nos fins a

que estas se destinam - porcelanas e artes decorativas orientais,

- tapetes persas e azulejos da Pérsia e da Turquia (semelhanças e contrastes

dos motivos que utilizam) recorrendo, ainda, à observação dos ambientes e

funções em que eram utilizados através de pinturas e gravuras,

- arte Nambam - utilizar a colecção dos biombos quinhentistas do museu para

a observação dos costumes e das técnicas náuticas dos fins do século XVI, a

partir da influência oriental.

− Catalizar a minoria com referência budista a partir do bronze Bodhisattva.

− Reproduzir rituais como o cerimonial do chá (realizado recentemente).

− Organizar um conjunto de objectos vulgares, com referência em obras de arte,

e que exponha a diferença de civilizações e culturas em termos não só visuais,

como também olfactivas e tácteis.

− Aproveitar um itinerário em torno das pinturas da Visita dos Reis Magos para

uma exploração de temas relacionados com a diversidade rácica, zonas de

origem e características étnicas.

2. Museu da Cidade

− Organizar exposições temporárias com base nas reservas do museu

(brinquedos, têxteis, máscaras, etc.), relacionadas com a África e o Oriente e

cujos objectos, que directa ou indirectamente influenciaram a nossa cultura,

são nalguns casos, ainda hoje, manufactura

dos com as mesmas técnicas ancestrais. Eventualmente, e em cooperação

com as embaixadas, promover a vinda de artesãos ou aproveitar os imigrantes

conhecedores dessas técnicas de fabrico.

− Organizar ciclos de exposições temporárias em cooperação com os serviços

culturais dos municípios geminados com Lisboa.

− Cooperar em acções de formação destinadas a bairros periféricos, em termos

de higiene e saúde pública.

Exemplo: Partindo da colecção de gravuras com tipos do século XIX, mostrar

as consequências para a saúde pública de hábitos menos correctos.

3.3.4.2. Deficientes

Um dos objectivos assumidos durante a campanha de obras para Exposição Europeia

em 1983 foi a adequação do Museu Nacional de Arte Antiga aos deficientes.

O acesso dos deficientes motores à exposição permanente faz-se pela entrada do

Anexo, onde foi implantada uma rampa ao lado da escadaria. Na zona de atendimento pode-se

solicitar o empréstimo de uma cadeira de rodas a quem dela necessite para a visita. A própria

concepção museográfica reflecte uma preocupação de resposta às reais necessidades dos

deficientes: o espaço de circulação é largo e não existem desníveis muito marcados; as vitrinas

estão suficientemente baixas para permitir a vi são integral das peças a quem se desloque em

cadeira de rodas; a legendagem está colocada a uma altura razoável, os tipos gráficos

utilizados são facilmente legíveis e apostos sobre suporte neutro. Foram também projectados

serviços de apoio adequados a este tipo de visitantes: casas de banho com instalações e

dimensões apropriadas e elevadores suficientemente largos para permitirem a entrada de uma

cadeira de rodas.

E, porém, saliente que esta estrutura, embora melhorando as condições de utilização

do museu a todos os visitantes, de maneira global, contempla essencialmente os deficientes

motores. Mesmo estes terão de enfrentar algumas dificuldades se pretenderem visitar o pise

térreo do Palácio da Alvor ao qual não têm acesso pelo piso superior por falta de um elevador

de alternativa à escadaria central. A entrada pela rua das Janelas Verdes é logo dificultada

pelos passeios demasiado estreitos e de piso irregular numa rua muito movimentada e pele

própria abertura da porta que não pode ser aberta para o lado de« dentro, por estar travada por

um tapete saliente do solo, exigindo assim mais força e movimento. Nesta zona, o piso

apresenta degraus, sem contrapartida, para o balcão de atendimento, para a sala de

exposições temporárias e para a biblioteca e outros serviços. Igualmente devido à inexistência

de elevador, o deficiente motor não ter acesso ao bar nem ao jardim do palácio.

Actividades de animação especialmente visando o deficiente são esporádicas e

coincidem na, generalidade, com a acção do Serviço Educ ativo. No entanto, m de registar o

carácter inovador da exposição temporária "Para uma Visão Táctil" organizada pelo museu em

1973, a qual esteve aberta com grande sucesso durante mais de dois meses mas que não

gerou qualquer plano de continuidade em acções do museu visando o público deficiente visual.

Pior, neste aspecto, é a situação do Museu da Cidade, no qual não tem sido feito

qualquer esforço para a integração do deficiente: pisos irregulares e com desníveis sem que

haja estrados ou rampas; inexistência de elevador adequado para o acesso ao primeiro piso;

salas demasiado cheias dificultando o percurso; vitrinas que não permitem uma correcta

observação das peças a partir de um ângulo de visão baixo; não é permitida a leitura táctil dos

mapas e maquetas, nem esta seria sempre legível por falta de contraste de texturas; algumas

legendas e outra informação de difícil leitura; e, por fim, falta de outros serviços

complementares, do bar aos sanitários.

A adaptação do edifício com características domiciliárias a museu não teve em conta

este aspecto, pelo que não congeminou qualquer estrutura que, sobrepondo-se à original sem

a prejudicar nem adulterar de forma definitiva, pudesse contribuir para uma abertura eficaz do

museu a este público especial.

SUGESTÕES:

1. Deficientes motores ou indivíduos com dificuldades de marcha.

− Substituir escadas e degraus por rampas de acesso:

- providenciar rampas na entrada pela Rua das Janelas Verdes nos degraus

que dão acesso à zona de atendimento, exposições temporárias e à

biblioteca (MNAA),

- providenciar rampas sobre os degrau e desníveis de pavimento no piso

térreo (MC).

− Instalar elevadores em locais de fácil acesso, com:

- dimensões suficientes para permitir a entrada a visitantes em cadeira de

rodas,

- botões de comando a uma altura acessível a um deficiente que se desloque

em cadeira de rodas, ou

- comando através da voz, (definir limites de utilização dos elevadores pelas

crianças)

- instalar um elevador que estabeleça o acesso do piso térreo ao primeiro piso

no Palácio dos Condes de Alvor (MNAA),

- instalar um elevador entre o piso térreo e o primeiro piso (MC),

- em caso de impossibilidade de instalação de elevadores, organizar

projecções de diapositivos ou de videogramas comentados sobre o museu e

a sua exposição, especialmente destinados àqueles que não possam subir

aos andares superiores.

− Providenciar passadeira rijas e uniformes sobre os pavimentos irregulares:

- instalar um estrado de madeira com tratamento à prova de água sobre os

lajeados de pedra (MC).

− Instalar portas suficientemente largas e com um sistema que não exija força

para se abrirem (eventualmente com células fotoeléctricas).

− Providenciar passadeiras ou alcatifas anti-derrapantes sobre os soalhos

envernizados demasiado escorregadios:

- estender uma passadeira contínua ao longo de todo o itinerário da

exposição, a fim de evitar os ressaltos provocados por tapetes no centro da

sala (MNAA).

− Iluminar bem e sinalizar as zonas onde haja desníveis do solo. Evi tar bruscas

mudanças de luminosidade que, conduzindo ao ofuscamento, provoquem o

desequilíbrio do visitante.

− Prever salas e galerias com boas condições de acesso oferecendo espaço

suficiente para a circulação de cadeiras de rodas. Nas salas mais pequenas,

retirar os corpos expositivos centrais ou substitui-los por outros de menores

dimensões (MC).

− Evitar o uso de vitrinas demasiado altas ou com a parte inferior opaca que

impeçam a visão das peças aos que se deslocam em cadeiras de rodas;

colocar também a legendagem e outros textos a. uma altura acessível (MC).

2. Surdos e indivíduos com problemas de comunicação verbal

− No contacto directo, providenciar para que a pessoa que emite a mensagem

articule clara e correctamente as palavras e se coloque face ao visitante ou

grupo, num sítio bem iluminado.

− Elaborar brochuras e desdobráveis com informações úteis acerca do museu e

das suas colecções.

− Realizar um registo áudio que acompanhe o percurso sugerido pela exposição

permanente.

− Fornecer o registo e o aparelho de leitura, no serviço de atendimento, aos

visitantes que o solicitem.

− Prever a tradução simultânea em linguagem gestual de conferências ou outras

actividades faladas, mantendo o intérprete em local bem iluminado e facilmente

visível pelo grupo de deficientes auditivos que tenha solicitado esse serviço.

− Fazer versões de filmes ou outro tipo de sequência audiovisual para surdos,

inserindo na imagem legendas ou a montagem de um circulo com linguagem

gestual.

− Instalar, nas áreas de atendimento do Serviço Educativo, um sistema que

permita, ao portador dum aparelho de surdez, ser ligado a um sistema central

de som que lhe permita ter acesso à informação sonora, vocal ou musical.

3. Deficientes visuais (cegos e amblíopes)

Os visitantes com este tipo de deficiência são os mais desfavorecidos num meio com

estímulos e propostas de experiências predominantemente visuais. Um museu obedece a

critérios estéticos e faz do Belo, enquanto criação artística, o seu próprio objecto. Dai que a

integração de deficientes visuais num espaço com estas características seja um desafio à

criação de outras propostas sensoriais.

− Apresentar uma maqueta do edifício e a respectiva planta em relevo, a fim de

inserir o visitante no espaço físico em que se encontra.

− Fornecer, na zona de atendimento, guias e registos falados e respectivos

aparelhos de leitura, com uma sucinta abordagem teórica do museu e a

descrição da exposição permanente estimulando a manipulação das peças a

isso destinadas e deixando ao utilizador tempo para encontrar os objectos

apresentados:

- eventualmente inserir nestes registos notícias ou informações acerca do

funcionamento do museu, das suas actividades e dos serviços que presta.

− Criar espaços tácteis nas exposições permanentes:

- elaborar no percurso da exposição um itinerário secundário através de

pequenos núcleos ou peças isoladas passíveis de manipulação,

- organizar maletas pedagógicas com elementos destinados à exploração

táctil, auditiva ou olfactiva, para propiciar um melhor conhecimento dos

materiais usados nos objectos observados no museu,

- realizar secções de exposição inter-activa, de carácter temático e com

recurso a uma exploração sensorial variada, (possibilidade de utilização de

reproduções sempre que tal se justifique a fim de se resguardar a

conservação da colecção).

− Apresentar planos e plantas em relevo e informação impressas em Braille ou

em caracteres de tamanho gigante.

− Fazer a reprodução de alguns quadros mais ilustrativos, do ponto de vista

temático (paisagens, cenas domésticas, vestuário, estilos artísticos, etc.), a

partir de contrastes de texturas:

- realizar reproduções em relação a quadros particularmente signifi cativos,

painéis rotativos que possuam duas faces nas quais o assunto seja

explorado através da cor, numa delas, e da textura noutra,

- providenciar, em relação a algumas obras escultóricas (ex.: estátua de D.

José na Praça do Comércio) a construção de uma maqueta, cujo pedestal

seja fixo e permita a montagem dos restantes elementos depois de

observados isoladamente, a fim de melhorar a sua exploração iconográfica

(MC),

- realizar uma maqueta com a estrutura de gaiola utilizada na Baixa Pombalina

(MC).

− Colocar a legendagem impressa a preto e de forma clara sobre uma superfície

não reflectora e com um tipo gráfico facilmente legível (evitar o tom sobre tom e

o suporte em tons demasiado carregados):

- substituir a fibra acrílica da legendagem por vidro olho-de-mosca (MC).

− Definir um percurso de visita seguro, de acordo com as áreas de circulação

abertas ao público e em torno das peças, e marcá-lo através de um

revestimento especial do solo:

- escolher um revestimento de solo de textura imutável ao longo do percurso.

− Projectar uma iluminação correcta e adequada ao deficiente sem danificar as

peças:

- instalar um interruptor perto do objecto exposto, permitindo aumentar

momentaneamente a intensidade da luz,

- emprestar lâmpadas portáteis no balcão de atendimento/

- projectar iluminação ao nível do solo através de lâmpadas de vigi lância perto

dos obstáculos ou desníveis.

− Tornar a parte da frente dos degraus facilmente identificáveis e visíveis a uma

distância razoável.

− Sinalizar as portas de vidro através de uma fita de cor viva.

3.3.5. Propaganda e mercado

São poucas as iniciativas de mercado nos museus portugueses. O Museu Nacional de

Arte Antiga é um dos raros espaços onde a loja tem alguma representatividade e cujo

restaurante tem capacidade para o serviço de almoços.

No espaço de vendas encontram-se, sobretudo, catálogos e publicações relativas ao

espólio do Museu. Há, também, outros objectos afins: postais avulso ou em colecções

temáticas, gravuras, cartazes, blocos, cadernos, livros para receitas, marcadores de livros;

gravuras a água-forte; diapositivos, videogramas e discos; reproduções de objectos de

cerâmica; cópias em casquinha de peças de ourivesaria; e um conjunto de jóias em prata que

reproduzem uma flor de lótus, motivo decorativo entalhado na mesa da entrada.

O bar encontra-se aberto das 10 às 17 horas, oferecendo os seus serviços

inclusivamente à hora do almoço em que os espaços expositivos se encontram encerrados.

Funcionando em regime de auto-serviço permite aos seus utentes a utilização de mesas no

interior e na esplanada arranjada no jardim fronteiro. Embora o serviço não ofereça muitas

opções de escolha, é uma razoável alternativa para o público que se vê obrigado a interromper

a visita, devido ao encerramento das exposições a meio do dia ou para aqueles que esperam a

abertura da biblioteca e do gabinete de estampas ou, ainda, para aqueles que se encontram a

participar em acções de formação promovidas no museu.

O Museu da Cidade apenas permite a referência a uma pequena vitrina horizontal com

algumas publicações relativas ao museu ou à história do município mas que não são aqui

vendidas nem, tampouco, a sua consulta é possível.

SUGESTÕES:

1. Publicidade

− Divulgar as iniciativas do museu através da imprensa escrita, falada e

televisiva.

− Distribuir folhetos actualizados, pelos serviços públicos, de turismo, hotéis, etc.,

nos quais se apresente o museu, as suas actividades e serviços.

− Utilizar os suportes de publicidade de rua para a divulgação dos aspectos mais

sugestivos do museu em termos gráficos.

− Criar uma publicação periódica com boa qualidade científica, artística e de

impressão que publique os trabalhos de pesquisa realizados pelos

conservadores e outros investigadores que se relacionem com o espólio do

museu ou com temática afim.

− Realizar emissões televisivas de filmes de pequena e média duração que

apresentem as peças mais significativas do museu de forma clara, correcta e

atraente (MNAA).

2. Loja

− Criar um espaço de venda de livros destinados a vários níveis etários e a todos

os graus de erudição:

- livraria de arte com bibliografia nacional e estrangeira (MNAA),

- livraria de história, arte e etnografia local e nacional (MC).

− Organizar um espólio de peças de colecção a partir da reprodução fiel de

objectos concretos ou representados na pintura do museu:

- reprodução de gravuras a partir de matrizes pertencentes ao museu,

- cópia autenticada de algumas peças das colecções de têxteis, cerâmica,

vidros, ourivesaria ou joalharia.

− Reproduzir pinturas e outros objectos em postais, cartazes e gravuras

− Utilizar elementos decorativos de algumas peças para ornamentação de

objectos de produção em série: postais, cartazes, blocos, cadernos, baralhos

de carta, ou caixas de fósforos, colecções de selos.

− Criar linhas especiais de objectos para o escritório, a casa ou a escola e de

vestuário utilizando elementos ornamentais dos objectos da colecção, aliados a

um estilismo de fundo discreto e simples, mas actual, as quais teriam um

lançamento sazonal sujeito a propaganda específica.

− Vender diapositivos a avulso ou em colecções temáticas com texto de síntese,

discos e videogramas de divulgação e complemento às colecções do museu.

− Criar jogos didácticos:

- puzzles - reconstrução de quadros,

- jogos de diferenças - introdução de elementos estranhos a uma

- pintura que terão de ser identificados,

- jogos competitivos de questões relacionadas com a história de Arte (MNAA),

- reprodução do Jogo da Glória adaptado à história do município (MC),

- livros para colorir e figuras para recortar,

- casas e monumentos de cartão para recortar e armar, permitindo

- reproduzir zonas urbanas mais características de Lisboa (MC).

− Utilizar o logótipo do museu (MNAA) ou o símbolo da cidade (MC) na

personalização de objectos miúdos: porta-chaves, canetas, isqueiros,

lenços, camisolas, carteiras e outros.

3. Restaurante

− Criar um restaurante/salão de chá na estufa existente no jardim (MC).

− Apresentar, na ementa, pratos e doçarias típicos de Lisboa (MC).

− Optimizar os espaços existentes e melhorar o serviço de refeições (MNAA)

4. Rentabilização de serviços

− Disponibilizar determinadas áreas, esporadicamente, para a realização de

recepções oficiais ou particulares, como lançamentos editoriais,

comemorações, ou outras, cujo carácter elitista seja compensado pelos

proventos que traga ao museu.

− Aproveitar os cenários da exposição para a realização de serões de poesia,

música de câmara ou canto lírico que, de alguma forma, se conecte com a

colecção (MNAA).

− Criar um espaço intimista propício à realização de pequenos concertos para

um instrumento, serões de fado e guitarra portuguesa (MC).

− Aproveitar o traçado do jogo da péla para dinamizar os jardins através da

realização de jogos tradicionais (MC).

− Recriar uma refeição, serões e outras cerimónias ou cenas do quotidiano

oitocentista, partindo do espaço do antigo palácio com extensão para o pátio e

jardim (MC).

− Cooperar com empresas para a produção de ofertas personalizadas aos seus

clientes e funcionários:

Exemplos:

- agendas e calendários, utilizando iluminuras do Livro de Horas de D. Manuel

II (MNAA),

- albúm de gravuras com figuras típicas do século XIX (MC),

- reprodução de frascos em vidro ou cristal com perfumes (MNAA),

- reprodução dos leques (MC),

- reprodução da caneta com que foi assinada a proclamação da República

(MC),

- reprodução das figuras do Presépio de Machado de Castro (MNAA),

- criação de medalhas relativas ao Museu, a efemérides relacionadas com as

Artes Plásticas ou com as suas Exposições Temporárias (MNAA) ou com a

comemoração de datas históricas relacionadas com Lisboa (MC).

4. CONCLUSÃO

O desenvolvimento da Museologia, como ciência pluridisciplinar e de múltiplas

incidências nos vários campos do saber, integra-se numa complexa conjuntura de alterações

culturais que, em síntese podemos traduzir por ganhos de informação postos ao serviço do

homem comum, em simultâneo com a perda de valores tradicionais. O empenhamento posto

no presente, na conquista diária de uma posição entre os demais e na luta face à aceleração e

uniformização dos quotidianos, não consegue quebrar os laços que ligam cada indivíduo ao

passado criando-lhes, pelo contrário, um interes se crescente pelo que já foi.

O museu é, neste aspecto, um local de eleição onde a História como facto e vivência, a

Ciência como saber e a Arte como criação são contados através dos objectos que nesses

universos já cumpriram uma função real. E, por isso, atrai.

O museu não é mais o círculo cultural fechado, cujo destinatário exclusivo era um

público restrito e elitista do ponto de vista intelectual. Hoje, trata-se de actuar como um centro

ao qual acorrem públicos múltiplos e diversificados e cujo dinamismo passa pela sua

capacidade de adequação e resposta às experiências específicas que compõem todo o espaço

comunitário em que se insere. A vitalidade do museu e o alargamento das suas funções, como

instituição vocacionada para o benefício cultural e social de todos traduz -se, de imediato, no

aumento quantitativo dos seus visitantes provenientes de camadas sociais e etárias cada vez

mais vastas. Não é, porém, através de uma estatística quantitativa que se deverá processar a

abordagem do público do museu mas, no decurso de uma análise constante, procurar

identificá-lo nas suas inúmeras cambiantes. Sendo o museu um local onde vestígios

documentais de outras épocas ou lugares se aliam e conjugam de forma específica, o público

que capta e motiva é, encarado globalmente, único na sua forma de estar e de se enquadrar no

espaço em que decorre o contacto.

Em consequência, a observação e análise da comunicação do museu com o seu

público não pode ser considerada em abstracto mas, pelo contrário, impondo-se limites físicos

e conceptuais bem demarcados. O estudo que realizámos incidiu sobre dois espaços

museológicos diferentes quer quanto à dimensão, tipologia e valor simbólico e artístico do

espólio, quer em relação à entidade de tutela, planos de actuação e meios humanos e

financeiros de que dispõem. Aplicando métodos estatísticos adaptados à investigação dos

comportamentos e conceitos dos visitantes de cada um dos museus e após a leitura dos

resultados, tornou-se notório que duas propostas distintas provocam reacções igualmente

diferenciadas. Um museu permite e oferece aos seus visitantes alternativas variadas à sua

função essencial de mostrar objectos, provoca um público caracterizado pela multiplicidade das

atitudes, vontades e perspectivas. Um museu, cuja única acção visando a comunidade se

processa através de um serviço de monitores a trabalhar junto de grupos escolares, obtém um

público mais uniforme, em resposta à sua oferta controlada.

O conhecimento do público não corresponde apenas a uma necessidade de

identificação. Trata-se, sobretudo, de obter um ponto de partida para o reconhecimento da

acção real do museu e das limitações impostas à sua função comunicativa. O objectivo dos

métodos de observação e análise aplicados ao público que frequenta cada um dos museus em

estudo corresponde a um preambulo/ apôs o qual se poderão planear com fundamento as

estratégias de dinamização a realizar.

Às propostas formuladas no sentido de colmatar algumas das lacunas sentidas no

âmbito da comunicação têm por objectivo global abrir o museu a todos os públicos virtuais que

ainda o não descobriram e fornecer aos seus visitantes reais um espaço sugestivo dos pontos

de vista cultural e lúdico.

À mensagem do museu passa, então, a ser polivalente, na medida a que responde às

inúmeras solicitações que lhe são postas, encontrando a linguagem adequada a cada tipo de

visitante. Porém, muito do que se propõe será latente à situação e à abordagem que lhe for

feita nesse sentido. Esta discrição justificar-se-á pelo objectivo de não sobrecarregar o espaço

com aliciamentos e serviços muito diversificados, pelo respeito que todo o visitante merece em

não ser importunado ao longo do seu percurso com discursos apelativos muito evidentes. O

museu passa a encerrar respostas que se evidenciam à medida que solicitadas, a fim de não

agredir um público a favor de outro.

Se propomos o alargamento das perspectivas oferecidas a favor de um maior

dinamismo que sincronize a deslocação do visitante no espaço do museu em vários sentidos e

orientações, e se isto implica o aumento quantitativo dos visitantes, não é este o nosso

propósito exclusivo. Em relação à estrutura física do museu não é, tão pouco, aconselhável

uma invasão em massa. Aquilo que se pretende é um afluxo discriminado de indivíduos que

procuram um determinado museu movidos por interesses que serão satisfeitos ao longo da sua

permanência neste espaço.

5. BIBLIOGRAFIA

Germain BAZIN, Le temps des Musées, Desoer Editions, Liege-Bruxelles, 1967

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