A CONTINUIDADE TÓPICA EM SEQUÊNCIA DE CHARGES · Para tanto, como noção de texto, trabalhamos com a ideia do tópico discursivo e sua dinâmica de continuidade, envol-vendo aspectos

Castelo Branco Científica - Ano II - Nº 04 - julho/dezembro de 2013 - www.castelobrancocientifica.com.br 1

Faculdade Castelo Branco ISSN 2316-4255

A CONTINUIDADE TÓPICA EM SEQUÊNCIA DE CHARGES

Antonio Wallace Lordes Bárbara Santos

Lorraine Rodrigues Machado

Resumo: Neste artigo, de acordo com os pressupostos de Lins (2006), bus-ca-se estabelecer uma relação semântico-discursiva entre as charges pro-duzidas pelo artista Junião, no site http://www.juniao.com.br, com ênfase na marcação morfológica. Para tanto, como noção de texto, trabalhamos com a ideia do tópico discursivo e sua dinâmica de continuidade, envol-vendo aspectos da centração, entendendo, portanto, a charge como um tex-to coeso e coerente. O assunto abrangido por elas é as eleições 2012 e a corrupção, fato que já faz parte do ambiente político do brasileiro. Buscou--se mostrar como, numa sequência encabeçada por um super-tópico, os assuntos são mantidos ou sofrem uma ruptura, de acordo com a organiza-ção verbal e não verbal dos textos em questão. Por fim, observou-se que a

1 Mestre em Linguística pela Universidade Federal do Espírito Santo – UFES e Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP e Professor do curso de Letras Português/Inglês e respectivas literaturas na Fundação Educacional Presidente Castelo Branco - FUNCAB. E-mail: [email protected] Graduanda em Letras Português/Inglês e respectivas literaturas pela Fundação Educacional Presidente Castelo Branco - FUNCAB. E-mail: [email protected] Graduanda em Letras Português/Inglês e respectivas literaturas pela Fundação Educacional Presidente Castelo Branco - FUNCAB. E-mail: [email protected].

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ruptura casual com o super-tópico não significa a instabilidade do discurso das charges, que, geralmente, por uma questão de manutenção, é linear. Palavras-chave: Tópico discursivo; Super-tópico; Continuidade tópica; Ruptura; Marcação morfológica.

Abstract: In this paper, according to the assumptions of Lins (2006), we aim to establish a semantic-discursive relationship between the cartoons produced by artist Junião in http://www.juniao.com.br site, with emphasis on morphological marking. Therefore, the notion of text as we work with the idea of the topic and its discursive dynamics of continuity, involving aspects of concentration, understanding so, the charge as a cohesive and coherent text. The subject matter covered by them is the 2012 elections and corruption, a fact that is already part of the Brazilian political environment. We tried to show how, in a sequence headed by a super-topic, matters are kept or suffer a break, according to the organization of verbal and non--verbal texts in question. Finally, it was observed that casual break with the super-topic does not mean the instability of the charges, that, generally, as a matter of maintenance, is linear.Key-words: Discursive topic, Super-topic; Topical continuity; Break; Morphological marking.

INTRODUÇÃO

O gênero textual charge utiliza a linguagem verbal e não verbal para satiri-zar determinado acontecimento atual de forma humorística, sendo exibida em jornais, revistas, blogs, etc. A construção do tópico é feita da junção de caricaturas, figuras públicas ou não, com um texto, que geralmente é um



diálogo, gerando algum tipo de humor que o autor quer causar, ou seja, é necessária uma interação entre dois planos linguísticos (verbal e não ver-bal), pois um não terá sentido completo sem o outro. Além disso, no plano linguístico-discursivo4 é fundamental que o leitor tenha conhecimento do que está acontecendo ao seu redor, em termos político-sociais, já que a char-ge pode ser um instrumento de satirização da situação política de um país.

O tópico discursivo que o autor utilizar pode ser finalizado com uma única charge ou pode ser prolongado em uma sequência de charges apresentadas diariamente. Para caracterizar essa continuidade tópica é preciso manter uma ligação entre uma charge e outra, o que não impede de serem inseridos outros assuntos, mas o foco principal deve ser preservado.

Este estudo baseia-se no trabalho de Lins (2006), no qual se apoia para analisar a continuidade tópica de uma sequência de charges publicadas pelo chargista Junião no jornal Diário do Povo (Campinas/SP).

No âmbito deste trabalho, entende-se por tópico discursivo uma porção textual em torno do qual gira o princípio de centração, que seria falar de alguma coisa, considerando para a análise, a distribuição de segmentos discursivos sucessivos, segundo a abordagem de Lins (2006, p.125).

4 Entende-se aqui por Linguístico-discursivo a consideração das condições de pro-dução de um ato linguístico, ou seja, época, espaço, interlocutores e a relação de força entre os últimos.



UMA NOÇÃO DE TÓPICO DISCURSIVO

Para melhor compreender a continuidade tópica, tratada neste artigo, é ne-cessário saber que: o tópico discursivo indica o assunto que será tratado no corpus analisado e deve constar na introdução do mesmo. Koch (2008), afirma que um texto só é coerente se houver continuidade tópica ou pro-gressão tópica sem rupturas definitivas ou longas interrupções do tópico em andamento. Essa noção de progressão tópica se aplica também ao enunciado do texto analisado. De acordo com LINS (2006, p. 126) cada enunciado, numa se-quência conversacional, é tópica, semântica ou pragmaticamente relevante para o enunciado diretamente seguinte ou precedente, a conversa como um todo se apresenta como coerente; e para haver coerência é preciso estabe-lecer no texto alguma relação de unidade entre os elementos. Em charges publicadas diariamente a organização dos temas pode ser ela-borada de maneira linear em que só se passa a outro subtópico quando o anterior estiver totalmente esgotado ou pode ser desenvolvida de maneira desordenada sem obedecer a uma ordem cronológica dos acontecimentos.

A CONTINUIDADE DO TÓPICO DISCURSIVO EM SEQUÊNCIA DE CHARGES

De acordo com o dicionário Houaiss, a palavra charge tem sua origem no termo francês charger que significa carga, o que exagera o caráter de alguém ou de algo para torná-lo ridículo, representação exagerada e burles-



ca, caricatura. É um desenho humorístico, com ou sem legenda ou balão, geralmente veiculado pela imprensa e tendo por tema algum acontecimen-to atual, que comporta crítica e focaliza, por meio de caricatura, uma ou mais personagens envolvidas; caricatura, cartum. Portanto, considerando o que já foi aqui apresentado, entende-se que a charge constitui um texto coerente e coeso.

As imagens que compõem o corpus deste trabalho, de autoria do chargis-ta Junião, foram publicadas no jornal Diário do Povo, de São Paulo, no período de 10 de setembro a 26 de outubro de 2012, ou seja, em período eleitoral do ano referido. Elas criticam assuntos atuais relacionados com a opinião do povo a respeito das eleições para prefeito, primeiro e segundo turno, e vereador.

Partindo do propósito de observar a continuidade do tópico discursivo den-tro do tema Eleições 2012, as charges abaixo estão exibidas de acordo com sua data de publicação.



Figura 1 Charge publicada em 10/09/2012

Figura 2Charge publicada em 13/09/2012












Observando rapidamente estas imagens percebe-se que todas foram base-adas no assunto eleição/corrupção. Aprofundando a análise, encontram--se palavras que geram uma continuidade tópica entre essas charges. Tal continuidade se dá pelo tema corrupção, para comprovação é necessário analisar por partes. A primeira charge apresenta um candidato honesto sendo perseguido por outros por não aceitar as coisas erradas que os últimos fazem. Como efeito de humor, tal perseguição foi configurada pelo chargista como prática de bullying, pois o bullying é um dos temas mais discutidos atualmente por estar crescendo, principalmente, no meio escolar.



A segunda figura mostra a quantidade exorbitante de promessas feitas pe-los candidatos que, na opinião do chargista, deveriam ser recicladas para reduzir o gasto de papel, que é sempre altíssimo nas campanhas políticas para serem jogados nas ruas.

Já na terceira charge foi inserido, ao assunto geral, um acontecimento do período em que foi publicada: o julgamento do Mensalão. Ter conhecimento de mundo é essencial para a interpretação desta charge, pois a junção de dois assuntos atuais, o julgamento e a lei da ficha limpa aprovada esse ano, gerou a ironia entre os personagens símbolos dos partidos políticos envolvidos.Referindo-se ao dia das crianças, na quarta figura o chargista envolve um pai político prometendo algo aos seus filhos, porém até as crianças hoje em dia sabem que não dá pra acreditar em candidatos, já que a maioria deles apenas promete, mesmo que esse candidato seja o próprio pai.

Publicada dois dias depois do primeiro turno das eleições, a quinta charge relata as condições das ruas após as votações. Os candidatos que ainda não aprenderam que fazer boca de urna é crime espalham “santinhos” por todas as seções eleitorais sujando as ruas, o que pode ocasionar até aciden-tes com pedestres além da revolta da população que ouve promessas de preservação ambiental e depois precisam pagar a conta da limpeza urbana.

Baseado no segundo turno em São Paulo, na sexta charge, o autor uniu dois grandes acontecimentos que parariam a cidade: o comício de um dos can-didatos à prefeitura da cidade, Fernando Haddad, com a presidente Dilma e o final da novela exibida pela rede Globo, Avenida Brasil.



Na véspera do segundo turno, na última imagem, o chargista novamen-te expõe sua opinião criticando as medidas adotadas pelos candidatos em relação à segurança, alertando a população que a culpa de se ter tanta vio-lência nas ruas não é por existir bandidos e nem por incapacidade dos poli-ciais, e sim da população que elege políticos ruins para governar.Desta forma, de acordo com os segmentos do tópico discursivo, percebe-mos a seguinte estrutura:

Super tópico: Eleições 2012Quadro tópico: CorrupçãoSub tópico 1: BullingSub tópico 2: Cidade SustentávelSub tópico 3: Julgamento do Mensalão/ Lei da Ficha LimpaSub tópico 4: Dia das criançasSub tópico 5: Sujeira de CampanhaSub tópico 6: Final da novela Avenida BrasilSub tópico 7: Violência

Analisando superficialmente percebemos que cada charge fala de um as-sunto, poluição, bullying, etc., mas o léxico formador das frases que com-põem as sátiras, estudados morfologicamente dentro do ambiente político, remetem ao mesmo tema: a corrupção. Exemplos dessas palavras são:



Ele quer ser honesto e trabalhar sério para a sociedade! (figura 1)Ele não concorda com nossas maracutaias! (figura 1)Um absurdo pega ele!(figura 1)Promessas de Campanha (escrito em uma lixeira) (figura 2) Me diz como é enfrentar o processo do mensalão? (figura 3)Eu prometo. (figura 4)O pior é que é a gente que também paga a conta da limpeza! (figura 5)A culpa é de vocês que não cobram nossas promessas de campanha (ên-fase para a expressão promessas de campanha em letra maior) (figura 7)

Pode-se concluir, então, que esta é uma sequência linear, fugindo apenas do tema corrupção na penúltima charge (figura 6), que tem o mesmo assun-to geral, as eleições, mas nada se refere à corrupção, os personagens falam sobre o final da novela da rede globo, ou seja, o autor inicia um novo sub tópico com a ruptura da linearidade, mas não descaracteriza a continuidade do assunto tratado pelo chargista, que retoma o quadro tópico na ultima charge (figura 7) falando sobre violência.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A charge é uma forma bem conhecida e descontraída, no meio jornalís-tico, de expor fatos e problemas vividos no cotidiano. Para que se tenha compreensão deste tipo de desenho humorístico é necessário que ele seja avaliado dentro de um contexto extra-linguístico, isto é, se o leitor vir uma charge e não souber as notícias que estão “rolando” na mídia, vai ler uma porção de frases soltas com algumas ilustrações sem nenhum sentido.



A continuidade do tópico em algumas sequências de charges não é per-cebida automaticamente, como no caso analisado neste estudo. Porém, se observarmos mais criteriosamente, encontraremos um fio condutor que liga todas elas. Esse fio pode ser uma marcação, uma palavra presente em todas as figuras, um desenho comum e, como nesta sequência, as palavras utilizadas para a produção de todas as charges. Mesmo não sendo explí-cita, a linearidade e a continuidade do tópico estão presentes no léxico da sequência, em que todas as charges possuem palavras que fazem alusão à corrupção. Assim, pode-se concluir que, sob a perspectiva abordada aqui, a referência semântico-discursiva pode aparecer no interior do ato comuni-cativo, ou seja, cognitivamente falando, ou no entorno léxico-gramatical, marcado não só por essas estruturas, mas também por conteúdo ideologi-camente/socialmente sinalizado.

REFERÊNCIAS

KOCK, Ingedore G. V. As tramas do texto. Rio de Janeiro: Nova Fron-teira, 2008.

LINS, M. da Penha. Organização tópica do discurso de seqüências de tiras diárias de quadrinhos. Cadernos de Estudos Lingüísticos, Campi-nas, 48 (1): 125-134, 2006.

LINS, M. da P.; RANGEL, S. de A. S. O tópico discursivo em charges diárias. Cadernos do CNLF, vol. XVI, nº 4, t.1 – Anais do XVI CNLF, pag. 1013-1023.

Charges. disponíveis em: http://www.juniao.com.br. Acesso em: 05/12/2012

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