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A COR QUE TEM AS NUVENS.
SAMUEL IVANI
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SUMÁRIO:
O ínicio depois do fim ...................................................... 5
A cor que tem as nuvens ................................................ 12
O dia na praia ................................................................... 16
O ápice da dor .................................................................... 24
Um dia antes do casamento: ........................................ 36
O que é felicidade? .......................................................... 47
Sala de tentativa de justiça .......................................... 52
Os biscoitos em forma de bichos ................................ 57
A biblioteca ........................................................................ 60
Um comentário extra ..................................................... 65
Os palhaços ....................................................................... 66
Um pouco a frente na vida de léo ............................... 72
"Coragem" ......................................................................... 73
Um pouco a frente na vida de léo ............................... 82
Tornados ............................................................................ 83
O livro de total felicidade ............................................. 103
Uma prova de amor ...................................................... 114
3
O acontecimento ............................................................ 117
Adaptando-se a nova realidade .................................. 135
O dia do encontro e depois dele ................................. 139
A felicidade como pode acontecer .............................. 147
Dedicatória:
Dedico esta obra a minha irmã: Jane Nascimento; que assim
como eu é uma amante dos livros e da literatura, e que de vez
em quando resolve também aventurar-se com as palavras, sendo
que me ajudou na medida do possível para tornar este livro o
mais legível possível. Dedico também aos leitores mais atentos
que com certeza irão tirar uma lição de vida desta obra. Sendo
que este livro só terá algum sentido para mim a parti destes
leitores que darão algum sentido a ele em suas vidas reais.
Prólogo:
4
Nesta obra tentei a todo custo repassar a felicidade em todos os
seus ricos momentos. Creio que nem sempre obtive sucesso, no
entanto minhas tentativas talvez não tenham sido inteiramente
em vão, pois não importando em que situação a vida dos
personagens se encontrem a felicidade é descrita com a
graciosidade da felicidade que possuo em minha mente.
Descrevo com a capacidade que possuo de ser feliz sempre, e
com o único instrumento que se é possível acionar todos os
sentimentos a vontade de nossos desejos; que é a mente humana.
Não pensei que poderia ter orgulho deste livro, pois no início
ao criar o enredo da estória, cheguei a conclusão que esta fosse
apenas um romance clichê que se ver todo dia no cenário
livreiro. No entanto ao finalizá-lo reconheci que se for possível
que eu crie algo que supere esta obra definitivamente descobrirei
e me convencerei que sou deveras um escritor.
Atente para um detalhe a respeito da estrutura do livro. Ele é
formado por capítulos que se alternam entre futuro e passado,
que descreve a vida de Emily, personagem principal, regredindo,
voltando no tempo, enquanto a vida de Léo segue o curso natural
em frente sempre.
Espero sinceramente que você leitor, consiga sentir a felicidade
que tentei repassar com esta obra. Se não, ao menos aprenda
com ele que se é possível ser feliz sempre.
“Das nuvens observo a vida em todos os seus ângulos e
âmbitos, sem perder os detalhes que tornam qualquer relato uma
boa estória. Daqui posso ver além do que os que se encontram
em terra. Daqui posso sentir além dos olhos, posso
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principalmente ver e descrever a áurea, ou alma que se reflete
nos corações dos homens.”
Das nuvens observo e conto esta estória.
CAPITÚLO I
O inicio depois do fim
- Hoje fiz por merecer meu ultimo ontem ao seu lado, ontem
esse que me fez merecer todos os amanhãs futuros.
Disse o jovem deixando as lágrimas deslizarem suas bochechas
rosadas por causa da exposição ao sol e praia no dia anterior.
Pela primeira vez na vida desaguava de seus olhos lágrimas que
não eram de sangue dor ou sofrimento. Alguém lhe
ofereceu um lenço que recusou sem pensar na desfeita que estava
fazendo a uma linda jovem educada ao seu lado. Não queria
conter aquelas lágrimas, queria mais que elas inundassem toda a
sua alma, todo o seu ser com aquela felicidade. Não queria
contê-las e não podia contê-las. Aquelas lágrimas em contraste
com um belo sorriso no rosto era uma promessa que havia feito
há tempos.
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Todos naquela cerimônia estranhavam aquele jovem a lacrimejar
e sorrir ao mesmo tempo;
- como podia ele sorrir em um momento tão triste? Sussurravam
todos ali como se o jovem não pudesse ouvir aquele disparate.
- Por que as pessoas acham que podem murmurar a vontade dos
que choram como se elas não estivessem ouvindo? Pensava ele
sem realmente se importar com o que diziam. Seu estômago
fervilhava ao imaginar nas possibilidades de seu futuro, no
passado que havia aprendido há pouco tempo a construir.
Todas aquelas pessoas de roupas coloridas e óculos em forma de
estrelas, contrastava com a tristeza em seus rostos maquiados.
Tristeza que ninguém deveras merecia. Tristeza essa que a
anfitriã jamais desejou.
A vida sem respirar não exerce forte influência nos que ainda
respiram. Repetia o jovem essas palavras vagarosamente em sua
mente, palavras essas que merecidamente enfeitavam uma faixa
reluzente de “glitter” que duas crianças carregavam a frente
daquela fila de indivíduos coloridos a caminhar a passos lentos.
O jovem acompanhado de uma linda garota enfeitada de
plumas nas cores do arco-íres, que segurava o seu braço
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enquanto caminhavam, suas mãos mesmo com luvas transferiam
um calor de vida, de vida de segundos atrás e do passado que
ainda construiriam juntos. Era a imagem do contraste da
sociedade moderna, da sociedade medieval, ou seja, de toda a
humanidade que viveu e ainda viverá em sociedade, este era um
casal formado a partir da alegria de viver o passado, de viver os
milésimos de segundos passados que a todo o momento
construímos.
Todos caminhavam desconsolados e conformados, dois
sentimentos tão antagônicos e que naquele momento andavam
juntos. Porém aquele belo casal não. Eles caminhavam felizes
com lágrimas de felicidade brotando de seus olhos. Caminhavam
na estrada da felicidade futura que aquela bela anfitriã
propositadamente lhe ensinara a conquistar.
O tempo estava se fechando, as nuvens começavam a encher o
céu com aquele azul escuro, e como uma grande cortina
começava a se fechar e cobrir os raios de sol que abrilhantavam
aquele dia, logo um leve sereno ensaiava uma chuva.
- Jamais umas gotículas de águas poderiam destruir a alegria de
um momento. Era o que ouvira o jovem Léo por várias vezes sair
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da boca daquela que agora lhe proporcionava o ultimo sorriso
regado a lágrimas.
Em todas as direções que se olhasse durante aquela caminhada,
se viam nomes e datas, fins e inícios. O que poderia representar
com tanta clareza os fins e os inícios se não aquelas datas?
Aquela que hoje todos viam o seu fim representava o inicio para
duas pessoas ou quem sabe para muitos outros.
À medida que caminhavam se aproximavam cada vez mais
daquele monumento que todos detestavam, no entanto aquele era
diferente, havia linhas perfeitas que dava forma a um belo
coração violeta, em vez das datas que tanto ditavam os fins e os
inícios de alguém. Havia apenas uma frase “O tempo de minha
vida não determina a intensidade dela.” Com o nome da anfitriã
logo abaixo esculpido com pouca destreza, provavelmente por
amadores. Emily viveu dezoito anos longos e com a intensidade
de um imortal.
Caminhavam todos em direção aquela escultura de linhas
perfeitas com escritos não tão perfeitos. O sereno começava a se
intensificar obrigando todos a abrirem seus guarda chuvas
coloridos e enfeitados com rendas nas bordas. A anfitriã
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definitivamente havia pensado em tudo, em todos os detalhes
para aquele dia de inicio.
Os passos se encerram, era chegada a hora daquele monumento
finalmente cumprir seu objetivo, iria fazer jus a sua existência
com o único intuito que as pessoas normais dão aquele objeto
inanimado. Demonstrar os fins e inícios de alguém. Mas esse de
cor diferente não, Já havia servido a vários propósitos, e hoje ele
não representaria a descrição de fins inícios e sim a
representação de um passado de alguém que viveu intensamente.
As lágrimas se intensificaram, era chegada à hora da ultima visão
daquela anfitriã de corpo presente. Era de uma dor indescritível
para todos ali, porém para aquele casal não. O que para todos
representavam o fim de alguém para aqueles dois representava
um inicio de uma história, não de uma vida. De uma história!
Algumas poucas palavras foram ditas por parentes e pelo
reverendo, não era preciso adiar a despedida. - Adiar as
despedidas só intensifica a saudade- Sábias palavras que a
anfitriã a todo o momento repetia a todos a sua volta. Dizia ela
que a saudade é um sentimento do futuro, não devemos antecipá-
la. A saudade deve ser um sentimento destituído de sentir falta.
Saudade em conjunto com a falta não é saudade é sofrimento.
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- Saudade soa tão bem foneticamente quando falo que não posso
vinculá-la ao sofrimento. Dizia ela sempre a vislumbrar algo no
alto em seu campo de visão.
A anfitriã há tempos já não se encontrava ali, aqueles
protocolos, tradições comuns aquele tipo de evento,
definitivamente não eram necessários. Queria a anfitriã que tudo
fosse com o mínimo de lágrimas e dor, o tempo da cerimônia só
elevaria a dor e as lágrimas. Todos ali faziam questão de atender
a seus pedidos, muitos com a ilusão que estavam honrando o que
foi aquela que hoje já não era pelo menos em corpo. No entanto
aquele jovem casal estava ali honrando o único e real desejo que
a anfitriã havia formulado com todos aqueles pedidos. Que ela
representasse pelo menos dois inícios reais para duas pessoas.
Dizia ela que antes de partir, queria conceber o inicio para pelo
menos duas pessoas assim seu fim seria positivo.
Uma ultima olhada naquele ultimo vestido rosa, não havia flores,
de nenhuma cor, não queria ela nada que representasse o fim
comum, que representasse o derradeiro suspiro, queria em volta
de si apenas serpentinas carnavalescas enfeitando seu
ectoplasma. Quanto menos se mostrasse a dor menos a sentiriam;
assim acreditava aquela doce vida que tanto foi.
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Quatro homens desconhecidos ergueram seu ultimo vestido
rosa, e direcionou-na a porta, a porta para o infinito, ou para o
fim de seus inícios, no plural, como sempre repetia aquela
anfitriã de uma cerimônia já terminada há horas atrás. A mãe
chorava inconsoladamente naquele ultimo momento. O jovem
casal abraçado em um dos poucos momentos que se deixaram
levar pela dor, dor que tanto a anfitriã havia ensinado a driblar.
As cordas foram retiradas, seu vestido rosa agora se encontrava
no alto da mais bela colina, não seria ela enterrada seria ela
elevada aos ventos por inúmeras fadas reluzentes, que jogavam
areia colorida para abrilhantar aquela bela anfitriã de vestido rosa
na sua ultima casa de boneca. Era assim que ela queria ser vista
no fim que todos agora viam, fim que para ela já acontecera a
horas atrás.
Pediu ela que todos se retirassem antes do ultimo e inevitável ato
das tradições humanas. Por que a vida não devia ser vista
naquele fim.
Dizia a sempre feliz:- não precisam ficar receosos de me darem
as costas, pois a horas estou à sua frente.
Com essas palavras em mente aquele belo casal de jovens foram
os primeiros a fazerem caminho e olhar para frente. Logo todos a
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passos lentos os seguiram. Nada deixaram ali, pois aquela que
preparara aquela cerimônia estava agora a sua frente. Em todos
os sentidos desta frase. E a saudade sem sentir falta devia ser
sentida apenas tempos depois.
A chuva agora já tomava proporções de uma quase tempestade.
- A vida a partir deste ponto deve ser vivida com a intensidade de
segundos, não com a acomodação rude de anos que achamos que
ainda viveremos. Dizia em coro o casal essa frase que aprendera
com o tempo, todo o seu real sentido. Fora o ultimo espetáculo
de Emily, assim como ela desejou tudo ocorrera na mais perfeita
ordem. Sentia todos agora um vazio justo, vazio que não
demoraria a ser preenchido. Foram-se todos para suas casas,
levando consigo um vazio, vazio este sentido por aquele casal,
mas não na mesma proporção que os demais.
Capitulo II
A cor que tem as nuvens
O jovem Léo sussurrou uma frase que repetia sempre, apenas
para seu contentamento:
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- E agora amor, vamos para casa? Uma frase tão simples, que
para ele lhe proporcionava uma felicidade indescritível, uma
satisfação que facilmente se identificava no brilho do seu olhar
ao falar. Ela respondeu:
- Vamos! Mas primeiro vamos nos libertar desse guarda chuva
que no momento nos impede de vivenciar esta bela chuva que cai
sobre nós, e de vislumbrar a bela cor azul escura do céu.
- Beleza! Lembrando o dia que sem querer havia dito que o céu
estava escuro, que o tempo estava feio e que Emily o repreendera
imediatamente dizendo: Não há fenômeno maior e mais belo
quanto à formação de uma chuva por mais que seja uma
tempestade. Aliás, quanto mais intensa a chuva mais belo o
espetáculo de sua formação e de sua execução. A cor do céu é
exuberante quando nublado, é de um azul que só se ver em penas
de galinha. Boba a comparação, mais Emily se lembrava de
galinhas que havia no quintal de casa quando criança. Ao vir a
chuva se formar vinculava a cor do céu com a das galinhas.
- A chuva é algo magnífico, grande, incontrolável, dizia ela
sempre com o olhar para o alto, fascinada com aquele fenômeno.
Dizia a sorrir que sonhava a noite com ela voando bem no centro
da formação de uma chuva com muitos ventos onde podia ver de
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perto aquele fenômeno, sentir o vento em seu rosto com
respingos de água. E Gritava desesperadamente a vivenciar
aquele espetáculo. Dizia Emily que se caso chovesse no dia de
seu ultimo espetáculo não seria o céu chorando de tristeza e sim
ele deixando se levar por gritos e lágrimas de alegria por aquela
que foi a sua maior fã agora encontrar-se mais próxima dele, e de
seus espetáculos.
- A chuva é o elixir da vida, a representação perfeita de que
união faz a força. A chuva acontece quando gotículas de água se
unem e vence a resistência do ar, e então caem sobre nós, é a
representação mais clara de vida.
O céu a imensidão, independente das condições climáticas a
encantava ao máximo. Ao se imaginar flutuando em meio aquela
imensidão de ventos e cores Emily parecia esquecer-se de tudo.
-Lembra Sonia, quando Emily nos contou pela primeira vez o
seu desejo? No primeiro momento achamos absurdo. Falou o
jovem a correr na chuva, sorrindo vindo abraçar aquela que hoje
representava a intensidade da vida para ele.
- Claro que lembro! Disse Sonia com um belo sorriso no rosto já
nos braços de Léo.
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- Podia imaginar alguém tão “forte” ter um sonho tão “fraco”?
Disse Léo ensaiando um beijo de amor com o desejo em seus
olhos como se fosse o seu primeiro beijo.
Emily disse que havia visto um documentário na TV, que
mostravam desastres naturais e a fúria da natureza, e que nos
Estado unidos havia empresas que levavam turistas viciados em
adrenalina para ver os tornados e suas formações. Munidos de
ferramentas potentes de meteorologia não havia perigo algum
nesta aventura.
- Vocês conseguem imaginar algo tão magnífico quanto o céu, na
formação dos tornados? Aquelas células enormes o céu todo
azul e o vento no rosto, Deve ser magnífico! Dizia Emily com os
olhos brilhando cheio de esperança.
- Eu confesso que me deu vontade de rir no momento que ela
descreveu o sonho pra gente.
– Eu também! Concordou Sônia com um sorriso nos olhos e nos
lábios.
- Engraçado! Hoje estamos sendo banhados pelo elixir da vida,
enquanto ontem estávamos nos deliciando em um belo dia de sol
na praia. Acho que a beleza do tempo está em suas mudanças, o
clima de hoje não é o mesmo o clima de amanhã. A vida deve ser
assim; a felicidade de ontem não deve representar a felicidade de
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hoje, devemos construir a felicidade a cada dia, a cada dia não, a
cada novo segundo devemos encontrar novos motivo para ser
feliz. Dizia Léo com os olhos em direção ao alto para a linha do
horizonte. Gesto que costumeiramente Emily repetia nos seus
dias de vida vivida intensamente.
- Acabo de rever em minha mente a ultima cena que lembro de
Emily, do nosso ultimo ontem ao seu lado. Comentou sonha.
Capitulo III
O dia na praia
Estava Emily protegida por aquele grande guarda sol na praia, a
matutar e vislumbrar o céu com suas cores, mesmo com o grande
mar a sua frente, Emily parecia ignorar o balanço das ondas e o
cheiro salgado e frio das águas em movimento.
Estavam os três naquele belo inicio de dia de sol na praia, a
realizar o sonho de Sônia e de Emily. Tal como ela descrevia
estavam os três na praia com um tapete vermelho devidamente
posto na areia enrugada por causa das pegadas das pessoas que
outrora estiveram ali.
Um semi arco feito da folha de uma palmeira retirada por Léo
anteriormente, todo enfeitado de flores, brancas e vermelhas
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ajudava a enfeitar o lugar. Hoje as flores estavam cumprindo o
papel do qual elas nascerem para cumprir, que é embelezar a
vida, hoje sim, elas foram exigidas e bem utilizadas. Alguns
ramos entrelaçavam o semi-arco posto ao final do tapete
improvisado de lençóis tingindo de vermelho. Emily estava
sentada protegida do sol ao final do tapete logo depois do arco
como um verdadeiro guru do amor esperando o casal que iria se
casar naquele dia na praia.
Sônia estava trajando um vestido branco, na altura pouco acima
do joelho, leve, com rendas em suas extremidades que ela mesma
havia confeccionando na supervisão de Emily. Usava também
um colar de búzios enfeitando o seu colo amostra. Léo estava
vestido de acordo com as exigências de Emily e Sônia, uma calça
também de cor branca arregaçada até os joelhos e uma camisa de
mangas longas de mesma cor, a beleza masculina rústica e
simples. Emily trajava um vestido também branco, no entanto
não havia enfeites, não necessitava de enfeites, o tecido do
vestido já aparentava renda, alem disso sua beleza dispensava
qualquer ajuste.
O casal caminhava sobre o tapete vermelho em direção a
Emily, uma leve musica instrumental dava trilha sonora ao
momento tão especial para os três. A medida que se
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aproximavam de Emily as emoções se intensificavam, as
lágrimas em conjunto com sorrisos mais uma vez entrava em
cena, como em quase todos os momentos desde que ambos se
conheceram.
As emoções preenchiam os espaços vazios naquela praia deserta
em conjunto com o vento que também se encarregava desta
missão, e de balançar a esmo os cabelos castanhos de Sônia,
cujos fios eram longos e macios. Léo vislumbrava aquela cena.
Passaram o semi-arco decorado de flores e ramos, chegaram a
Emily que diminuiu a musica, e se preparou para dizer às
palavras que foram escritas premeditadamente para aquele
momento:
- Estamos aqui reunidos para a união de Sonia e Léo, brincou
Emily com um largo sorriso no rosto.
Vamos aos discursos primeiro Sônia para Léo, depois Léo para
Sônia.
- Digo aqui antes de seus discursos que não estão aqui vivendo a
vida de alguém que não sejam a de vocês, e este ato faz a vida
que há em (mim) ter todo o sentido que um dia mereci. Emily
dizia essas palavras com toda a força abundante em seu corpo, a
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força que repassava para o jovem casal que hoje selaria um amor
de tempos atrás.
Léo e Sônia Deram as mãos e Sonia começou repetir as palavras
com voz trêmula, e um justo nervosismo pela emoção que havia
em toda parte especialmente nos três ali presentes.
- Meu amor de hoje e sempre, meu amor de segundos atrás, meu
amor das incertezas dos segundos à frente, incertezas apenas dos
segundos à frente, não desses segundos do amor presente que
agora sinto. Meu amor eterno de puras certezas, o tempo não é
certo, mas o amor que sinto, certo ou não, neste segundo presente
é eterno. - Meu amor, sem medo digo hoje aqui, neste presente
que como presente me entrego a ti inteiramente para que cada
amanhã que tivermos além deste momento façamos por merecer
os (ontens) que já tivemos. Meu amor, não quero e não mereço
meus amanhãs seguintes se não estiver ao seu lado.
Estas palavras chegariam ao mais profundo sentimento que o
casal podia sentir.
Com os olhos firmes nos olhos de Sônia Léo deixava fluir as
palavras que muito antes havia escrito com o mais puro
sentimento que o tempo presente podia lhe proporcionar.
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- Meu amor, hoje... Hoje com esses segundos que vivo e em
nome dos segundos que já vivemos, vivo a maior honra do
homem, pois não há honra maior para um homem do que a
chance mesmo que imaginária de viver todos os seus amanhãs ao
lado de quem se ama. Desejo intensamente viver meus segundos
futuros ao teu lado hoje e sempre. Não desejo e não mereço nem
um ontem sem ti. Se houver algum ontem a partir de agora e que
não esteja ao meu lado, tenha certeza que o vivi e não mereci.
Meu amor, com essas palavras em honra a ti, esses segundos
passados que usei a dizê-las de certo que os mereci. Amo-te!
Sônia.
Nas mentes e nos corações de todos havia mais lágrimas que as
águas que balançavam no mar em leves ondas daquela manhã de
sol.
Emily selou o amor e a união dos dois, com as sábias palavras de
sempre:
- o que o amor uniu o tempo não separa, que seus segundo sejam
eternos.
Neste instante as lágrimas desceram dos olhos secos de Emily
como em uma cachoeira de vazão de todas as águas do universo.
Segundos depois sorrisos demorados, sorrisos merecidos aos
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recém casados. Nada além de felicidade poderia preencher todos
os espaços que havia ali. Naquela praia deserta não poderia haver
tantos espaços livres, eram precisos sorrisos, milhões deles, e os
mais largos e demorados sorrisos para preencher os vazios.
E começam a dançar o belo casal a musica que fora escolhida
anteriormente para aquele momento, uma dança romântica com
os braços sobre os ombros e olhos nos olhos, dançavam em suas
mentes, coladinhos como deveria ser até os fins de seus dias. A
mais justa dança que um casal podia dançar era representada
naquele momento lindo e romântico. Léo, ao final da dança com
o sorriso necessário levanta a moça de vestido branco e a eleva
as alturas, girando-a na mais pura felicidade, girando com todas
as cores do arco-íres. Girando-a tanto que todas as cores
resumiam-se apenas ao branco, branco da junção de todas elas,
branco da junção do amor, alegria e paz que sentiam.
Emily acorda para a realidade e diz: - que musica lenta, agora é
necessário uma musica agitada para combinar com a alegria
deste momento.
Vamos dançar “Macarena” e soltou a musica mudando
totalmente a trilha sonora daquele dia dos sonhos. Léo e Sônia
dançavam a coreografia aos gritos com a ilusão que sabiam a
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letra da música. Emile batia palmas fortes com toda força que
transbordava em suas mãos suaves, com a felicidade que podia
viver aquele momento.
Depois de tocar toda a música, de dançarem era hora de irem
para casa, já estavam a algum tempo ali, o sol forte não faria bem
para ninguém, Emily precisava tomar sua sopa matinal, e logo
começaria a encher de gente na praia para aproveitar o belo dia
de sol.
CAPITULO III
DEPOIS DA PRAIA
Já em casa depois daquele lindo casamento amador, Emily se
encontra sentada na velha cadeira de madeira. Pouco depois do
meio dia a vida se abriu para ela e o tempo se fechou. Finalmente
com os olhos fechados, olhos que muito viram, se foram às
necessidades, se foram os objetivos dos segundos presentes. O
tempo e o espaço já não importavam. Sua atitude física para seu
ultimo espetáculo havia acabado de concluir.
Sua mãe ao olhar para ela de olhos fechados, com aquela
corriqueira calmaria, com o canto da boca curvado como se
estivesse com um leve sorriso, pensa que Jamais a vira tão feliz.
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A vida ainda fluía em sua calmaria, porém alguns segundos se
passaram sem que ela nada fizesse, nem sequer um gesto. Sua
mãe esperou mais um pouco a distância, esperava que ela
esboçasse qualquer reação, qualquer ato físico ainda que
minúsculo, a vida passara em sua mente, não a sua a de Emily.
Ela sabia que o inevitável acabara de acontecer, porém ela queria
dar uma chance para a vida compreender e voltar atrás, de
refazer aquela injustiça. Ela havia esperado já tanto tempo, o que
seria mais alguns segundos? Era preciso esperar, talvez a única
espera boba de sua vida, no entanto precisava dar a ela aquela
chance, aquela fé, aquela vontade que ela se levantasse daquela
velha cadeira e corresse para os seus braços, com seus longos
cabelos castanhos a balançar com o vento. Ela precisava esperar
de longe, para adiar a dor. Tanto que Emily havia falado para não
adiar o inevitável para não intensificar a dor.
As lágrimas mais uma vez entraram em cena e elas continuariam
ali por longas horas. Então o grito, o grito e a fuga da realidade,
um grito que levaram sua mente em constantes giros rápidos até
as nuvens brancas do dia lindo de sol. Correu até a cadeira,
segurou Emily em seus braços já aceitando a realidade, porem
não podia exigir de si mesma a fuga da dor daquele momento. A
partir de então nada mais viu ou sentiu. Adormeceu, parou no
24
tempo, parou na vida que Emily demonstrou pelo tempo que lhe
foi proporcionado.
Passou-se o dia, viu-se apenas sendo ajudada por Sonia a colocar
sua roupa colorida e se dirigirem para o fim que tolamente todos
achavam que aconteceria ao final daquela caminhada, porém
Emily já sabia que há tempos estaria à frente de todos. Mais era
inevitável os costumes, a honra dada aquela cerimônia que ela
aos poucos preparou nos seus mínimos detalhes. As vestes de sua
mãe apesar de colorida era a menos cheia de cor. Emily não
precisava que as cores das vestes de sua mãe chamasse a atenção
de todos naquele dia, e pediu que todos usassem roupas mais
coloridas que ela.
Léo vestiu seu terno no quarto ao lado, não era menos colorido
que o terno do coringa do Bátima. Emily havia brincado quando
o ajudara a escolher em uma loja de fantasias, Léo recordava e
sorria tentando manter a duras penas as lembranças boas em sua
mente, Porém não podia negar a sensação de alivio que fluía em
seu corpo. Sabia que Emily havia chegado ao seu ultimo
espetáculo atingido todos os objetivos que tinha idealizado. Os
objetivos que a vida como era lhe permitiu idealizar. Ele já havia
se preparado para aquele momento, quem mais teme o fim, mais
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se prepara para ele. Depois de prontos, todas aquelas cores
davam ao momento a leveza que Emily havia exigido.
Prontos e excessivamente coloridos todos se encaminhavam em
direção a ultima casa de boneca de Emily.
Capitulo IV
O ápice da dor
Dois dias antes do casamento na praia, Emily havia agido de
forma estranha. Em um ato que ninguém compreendera, e
mesmo assim compreensível para todos; como alguém tão
serena, tão calma até em meio ao caos havia perdido o controle
de forma tão violenta?
Emily havia destruído o seu quarto, quebrado todos os seus
objetos valiosos, todas as bonecas que havia guardado desde a
sua infância, dos quais tinha tanto apreço. Seus espelhos, suas
caixas de jóias, quadros, nada sobrara, nada escapou de sua fúria,
de seu justo descontentamento, porém incomum as suas atitudes
costumeiras. Sua serenidade teve que contê-la a força para não se
machucar em seu ato de derramar emoções tão humanas, de seu
caos acumulado ao decorrer de longos tempos passados. Até o
mais sereno dos homens acumula em seu coração emoções
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inerentes aos momentos de turbulência e caos e um dia essas
emoções precisam ser descarregadas.
Emily havia chorado, havia visto toda a injustiça da vida, havia
visto que merecer ou não merecer não é critério para que as
alegrias e as tristezas, as conquistas e as derrotas surjam na vida
de um ser humano. Ela havia quebrado, jorrado aos fragmentos
dos objetos e suas emoções e indignações. Emily estava cansada
de aceitar as formas perfeitas inexistentes para ela, ela havia
quebrado a vida imperfeita, quebrado as formas e as lembranças
perfeitas dos (ontens) que há tempos não merecia. Gritos de dor,
gritos de sofrimento, de agonia, gritos de qualquer sentimento
menos de esperança. Gritos que daria para ouvir nas estrelas com
suas formas imperfeitas.
Seu pai e sua mãe desesperados sobem as escadas a pressas e
com toda razão os gritos eram desesperadores.
Chegam frente à porta, os gritos só intensificam. O pai tenta
arrombar a porta, mas estava aberta. Dentro do quarto viram que
havia quebrado tudo, restava apenas sua mente forte como
sempre foi, restavam as lágrimas. Seu corpo no chão a segurar
sua ultima boneca inteira, seu vestido sujo de poeira dos vasos de
plantas e flores que a muito repugnava e que agora não estavam
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mais ali, Não em sua forma perfeita como humanos gostam de
ver.
- A perfeição aos olhos humanos mãe, são úteis para mim? Que
formas se encaixam a minha pessoa? Não há mais estereótipos,
formas perfeitas, que deformados criam em suas imperfeições.
Não fazem sentido, não para mim. Há uma formula perfeita para
mim mãe? Emily rasgava suas cordas vocais com a força que lhe
sobrara, força que obrigava o universo a si curvar a sua dor de
segundos presentes, dor que passaria necessariamente segundos a
frente.
Léo chegara à varanda da casa com as palhas verdes que serviam
perfeitamente para o semi arco do casamento. Era preciso conter
as lágrimas e a fraqueza justa a todos os homens, mas não a
Emily. Ela não queria que ele a naquele estado deprimente.
Precisava ser forte, ou pelo menos parecer ser. Não podia descer
não naquelas condições deprimentes, indignas e justas.
A mãe desce sozinha. Léo estranha:
- Cadê Emily, Não vai descer? Sua mãe responde ofegante com
um ar de preocupação que ela havia amanhecido indisposta,
estava no momento dormindo.
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Léo não estranhou. Ninguém estranharia, no entanto Léo ignorou
a mãe de Emily, subiu as escadas em disparada, entrou no quarto.
Tudo a sua volta que podia ser quebrado com a força física
humana, encontrava-se em pedaços, sabia ele, que a força da
mente podia ir além, podia quebrar muito além daqueles objetos
quebráveis e invisíveis, havia muito ali já quebrado há tempos
atrás.
Ele queria algo para quebrar também, ia a todas as direções sem
direções físicas e mentais, estava perturbado, precisava de algo
para quebrar urgentemente, para diminuir os danos. Para que não
se quebrasse a serenidade do passado, que naquele momento se
encontrava tão distante dos segundos presentes. Sequer sabia
onde colocar as mãos naquela perturbadora situação, não sabia se
as colocava na cabeça, ou na cintura, ou se si livrava delas de
uma vez. Quem poderia saber os objetivos das mãos naquele tão
incomum momento? -talvez um abraço! Pensou ele! Esse, talvez
seja o objetivo que deseja minhas mãos agora, porém havia
muito além em jogo. O que poderia representar um caloroso e
triste abraço naquele momento? Poderia trazer a dor tão temida
à tona? Dor que talvez sempre estivesse ali, apenas a
escondessem tolamente.
29
Ele percorria os quatro cantos do quarto, Emily ainda sentada a
chorar, com sua ultima boneca inteira nas mãos. Via-se em suas
expressões o quanto ela gritava, no quase silêncio de poucos
soluços. Ela ignorava a presença de Léo, mas sabia que ele se
encontrava ali com as mesmas dores, com o mesmo desejo de
quebrar tudo. Léo não sabia como reagir diante daquela situação.
Situação tão perturbadora em outra situação um simples abraço
resolveria, mas naquela hora, um abraço talvez não fosse correto.
Tantas questões passavam em sua mente que no momento não
tinha condições de pensar racionalmente. - O que poderia ser
racional? As malditas formas dos imperfeitos reinando a mente
de um imperfeito que naquele instante precisava agir
corretamente.
Léo não sabia como agir!
Os malditos muros que nós humanos construímos. Maldita
habilidade que temos de construirmos muros onde eles não são
necessários, muros que apenas separam a água da plantação,
malditos muros que impedem as flores de florescerem!
Devíamos construí-los apenas para represar a água até as
plantações, onde a fertilidade da vida simples pudesse nunca ser
impedida de florescer livremente.
30
Naquele momento nada além de um abraço, abraço talvez não
plausível! Porém era o que ele queria fazer, precisava fazer,
precisava abraçá-la, ele queria abraçá-la e gritar com ela.
Abraçou Emily com a força que lhe restava, e gritou:
- Aaaah! – ááááh! Nada além de gritos que nada diziam podia ser
dito. Gritavam! Quebravam as injustiças da vida juntos. Léo há
muito tempo queria quebrar tudo a sua volta. Jamais tinha
conseguido! Emily mais uma vez mesmo demonstrando
fraqueza, demonstrava ser mais forte que todos. Ser forte e calma
perante o caos. Não podia haver momento de mais serenidade e
sinceridade do que aquele. Eles estavam exalando com a calma
possível em meio ao caos todos os sentimentos acumulados no
passado.
Havia a necessidade dos gritos, e gritaram por alguns minutos
em silencio! Talvez o universo os ouvisse, era preciso o mais
rígido silencio para atingir as ondas sonoras para alcançar o
universo de suas vidas. Quanto mais o tempo passava mais
gritavam ao chão. Abraçados, com toda dor que mereciam sentir,
dor que precisavam sentir!
Emily depois de alguns minutos apenas gritando em silencio
disse:
31
- Era preciso que tudo físico ligado a minha existência física
fosse quebrado. Destruído! Ninguém precisa sentir a minha
presença em algo tão palpável. Eu não estarei aqui com esses
objetos. Não precisam desta ilusão. Ninguém precisa.
- Me ajude a levar todos esses destroços para o lixo! Léo não
compreendia como alguém podia ser tão sereno em um momento
tão perturbador. Ele sem forças, apenas concordou com um gesto
qualquer de confirmação! Léo beijava o lenço quente em sua
cabeça, lenços castanhos e lisos com o cheiro de sempre.
Deslizava a mão direita em seus longos e lisos cabelos castanhos
de outrora, eles estavam ali em suas mãos vivos como nunca.
Assim era seu desejo!
Emily demonstrou interesse em se levantar daquela dor. Era
preciso voltar para a realidade. Levantaram-se e começaram a
juntar os destroços que os dois aos gritos quebraram. A Terra
molhada das plantas que nunca mereceram estar ali, ela teria
maior gosto em se livrar delas, por razões simples aquelas
plantas a repugnavam.
Depois de Léo juntar os últimos estilhaços, Emily ainda segurava
sua ultima boneca, ninguém perguntou por que ela havia salvado
aquela boneca simples. Ela mesma talvez não soubesse, No
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entanto aquela boneca que com certeza não dava para quebrar
por ser de um material inquebrável, voltou ao seu lugar habitual.
Se fosse possível, com certeza ela a quebraria também.
Depois de todos os cacos em sacos plásticos, Emily começou
falar dos planos para o dia seguinte, apenas para fugir da dor do
momento passado;
-E o casamento na praia amanhã? Como está indo os
preparativos?
- Estão indo como planejado! Disse Léo com uma segurança que
de certo não era sua, era a segurança que Emily agora já deixava
transparecer como sempre.
- Cuide para que tudo ocorra como planejado! Sonia merece e
você também! Emily falava confortadamente como se nada
tivesse acontecido. Já preparamos os nossos vestidos e sua roupa.
Tem que ser exatamente como planejamos. Nada pode dar
errado! Dizia Emily já com o sorriso costumeiro, da maneira
como podia transparecer alegria.
A capacidade inerente que os humanos possuem de fingir e
esquecer acontecimentos recentes reinava naquele momento!
Eram cômodas suas atitudes! E já muito tinham desaguado parte
33
de suas emoções guardada a duras penas ao longo de tempos
passados.
Emily ainda limpava resquícios das ultimas lágrimas físicas que
haviam secado em seu rosto, e fingia que nada acontecera. Leo
seguia apenas os passos da personagem que iniciara aquele tão
desafiante momento para ele. Porém suas lágrimas ainda corriam
na pele de seu coração, as mais doloridas que poderiam
escorregar no coração de um homem, no entanto era preciso
secá-las, nem que fosse com a mesma dor que iniciaram, Emily
não as mereciam, ele menos ainda.
Léo precisava ir para a praia preparar o local para seu casamento
não oficial que representaria para os três a vida, o real laço de um
casal apaixonado.
Dirigiu-se até praia, Enquanto preparava o arco sentado na areia
fria e branca, ele imaginava na vida, nos momentos, o quanto a
reviravolta na vida independe de tudo para que aconteçam.
CAPITULO V
A vida segue
A vida continua para uns mesmo quando termina para outros. O
casal agora podia morar sozinhos em sua casa recém reformada,
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fruto de seus trabalhos. Era para onde se dirigiam no momento,
para o seu aconchego, caminhavam, corriam na chuva que agora
já diminuía. Apenas uma leve garoa respingava nos telhados e
calçadas da simpática rua que moravam. Flutuavam em direção a
sua casa ouvindo o som dos respingos típicos de finais de chuva.
Acalmava até o mais turbulento dos corações, caminhavam e
cantavam “macarena” ainda com a ilusão que conheciam a letra,
a felicidade visivelmente transbordava os dois.
Já em casa, Léo cansado e livre das roupas molhadas, se
preparava para dormir, o dia havia sido longo e árduo, estava
exausto, sensação que não era diferente em Sônia. Não só por
aquele dia, os dias anteriores também haviam sido cheios de
acontecimentos de tirar à calma e serenidade de qualquer um.
Léo e Sônia acordaram com o vento litorâneo e raios de luz no
dia seguinte, que balançavam as cortinas brancas e quase
transparentes da janela, efeito causado pelos raios de sol que a
atravessavam:
- O dia realmente está radiante, disse Sonia, com a felicidade que
entrava na casa dos dois pela janela. Certos que não precisavam
de felicidade exterior. Para eles, toda felicidade que
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necessitavam estavam dentro deles próprios, nas sensações que
já acumularam e, nas que irão lutar para conseguir a cada novo
segundo.
Sônia com um leve sorriso e tocando as bochechas rosadas de
Léo disse: dormimos com a janela aberta, podíamos ter
contraídos um resfriado. Beijou Léo, respirou fundo e disse:
- preciso fazer o nosso café!
– Vá meu amor! Disse Léo querendo apenas apreciar a sua
adorável esposa nos afazeres rotineiros de uma casa de família.
Havia em Léo a felicidade que merecia pelo ontem passado, e os
amanhãs futuros ao lado de Sônia.
Para ele nada faltava, assim como tinha que ser, assim como a
vida exigia, mesmo que injustamente. Porém a vida, a realidade
não trabalha com um censo de justiça que conhecemos. Talvez a
justiça sejamos nós que devemos construir. Todo homem deve
compreender a autonomia que possui para fazer a justiça em
relação a sua própria vida.
Lembrou de Emily e sentiu o vazio que mesmo não querendo
sentir, mesmo sabendo que não era o que Emily desejava não
podia evitá-lo. Sentiu aquele calafrio quando se pensa que
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alguém ou algo não volta mais, porém se conteve na medida do
possível.
CAPITULO V
Um dia antes do casamento: o coração violeta
Emily no dia anterior havia agido com tanta serenidade quanto
lhe era possível e comum as suas atitudes. Definitivamente a
vida dar reviravoltas sem perguntar a ninguém se é hora ou lugar
apropriado para acontecer.
Emily como sempre, chegou ao lado de Léo e Sonia que se
encontrava no quintal, com os retalhos de renda necessários para
seus vestidos. Aquela velha cabana de madeira no quintal de
Emily havia servido de palco para vários espetáculos da vida,
simples como ela é. Uma cabana octogonal com uma velha
pintura branca, um banco suspenso por correntes, uma cadeira de
balanço de madeira também branca.
Emily sentou-se e começou a impulsionar o velho banco com
seus pés fortes, na medida em que conseguiam ser. E começou
um lento balanço. Trazia nas mãos um molde de madeira, com
linhas perfeitas na forma de um coração. Léo estranhou aquele
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molde e perguntou, com suavidade na voz que aprendeu a usar
desde que conheceu Emily:
- O que é isso na sua mão? Não me diga que é um porta retrato
em forma de coração? Brincou Léo com o bom humor de quase
sempre.
- De certa forma talvez seja! Disse Emily: Aqui merecidamente
irá ficar minha foto, a melhor, de lembrança!
–Vamos Léo! Pegue cimento e um pouco de terra vamos
precisar para colocar minha foto neste molde!
-Vá até a garagem lá tem cimento suficiente. Disse Emily
demonstrando saber o que estava fazendo.
Léo sem pensar foi até a garagem e apanhou todo cimento que
restava ali, e um pouco de areia.
–Prepare a massa! Disse Emily com um tom autoritário e forte
que Léo jamais havia visto em suas atitudes. Ela parecia querer
demonstrar uma personalidade naquele momento que com
certeza não era de sua índole.
Léo não sabia para que serviria aquele molde ou a peça que dele
sairia. Ele estranhou o tom forte de Emily, no entanto nunca
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imaginou que o coração que iriam construir naquele momento
serviria de monumento do ultimo ato de seu espetáculo.
Léo começou a preparar a massa assoviando demonstrando a
calmaria de sua mente naquele instante presente. Enquanto Sônia
costurava seu vestido na supervisão de Emily que no calmo
balanço do velho banco a vislumbrar a sua volta a altura da sua
linha do horizonte, o mundo. Uma leve brisa de verão fazia com
que as flores do pequeno jardim dançassem à vontade da
natureza. Aquelas flores sim representavam beleza para Emily, o
brilho do sol as erva rasteiras, algumas verdes outras já secas
devido ao sol forte de sempre, o céu azul, o calor que ela
conseguia sentir na sua pele sedosa da forma como lhe era
possível. Emily podia passar horas a vislumbrar aquela cena.
Olhar a natureza em seus leves movimentos dava a ela a idéia
que o tempo parava. Não havia ontem, amanhã, não havia tempo,
não precisava de tempo.
– Ah a necessidade do tempo! Para que essa necessidade? Agora
devia ser sempre eternidade! Pensava ela em sua mente forte,
forte como continuamente foi.
Depois de terminar a massa, Léo enxugou o suor da testa, fitou
o sol, vislumbrou Sonia, até o olhar chegar a Emily, ele parou e
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ficou olhando por alguns segundos: Emily olhava para o
horizonte com sua calmaria costumeira, ele realmente admirava
aquela tranqüilidade, sua serenidade, sua vida. O tempo não a
havia abalado, muito pelo o contrário havia deixado-a serena e
mais bela da forma como sua mente podia transparecer.
Léo gritou:
- Está pronta a massa!
- Preencha o molde! Disse Emily com a estranha firmeza que
podia representar aquele momento.
Léo foi até ela, pegou o molde, o colocou na lisa madeira do piso
da cabana e preencheu com massa de cimento.
– Deixe bem liso e uniforme! Disse Emily. Ela queria a forma
perfeita da forma como as suas imperfeições podiam criar. Ela
não precisava da perfeição, muito menos os que iriam ficar em
plena respiração e metabolismo biológico, porem exigiriam a
perfeição da forma como conhecem! Os humanos exigem a
perfeição que nem de longe possuem em suas vidas ou na vida a
sua volta.
Emily levantou depois firme e forte, como podia, e disse escreva
com essas formas de letras a frase Léo.
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Léo perguntou:
- que frase?
Emily ficou em silencio, um maldito silencio necessário, repetia
há tempos a palavra esquecimento. Ela havia conseguido vários
objetivos com aquela pergunta de Léo. No entanto as dúvidas, as
malditas dúvidas não necessárias reinavam a sua cabeça. - Elas
acabariam e já! Repetia Emily sem cansar em sua mente essa
frase! E as dúvidas se foram. De acordo com a necessidade.
Repetiu Léo:
- Que frase? Desta vez sim! Emily havia interpretado aquela
pergunta com a racionalidade que lhe restava.
“O tempo de minha vida não determina a intensidade dela.”
Léo parou, ficou em silencio, o tempo voltou em sua mente.
Alguns segundos se passaram, Léo retorna do seu transe e
começa a afogar as letras na massa ainda flexível, para formar a
frase reproduzida por Emily.
Sonia continuava concentrada a costurar manualmente o seu belo
vestido branco.
41
Ao terminar a frase e usar quase todo o espaço daquele coração
de cimento. Emile levanta e com os dedos começa a desenhar o
seu nome nele. Sabia que aquele coração logo se petrificaria,
ficaria imaleável aponto de não poder influenciar mais nada em
sua estrutura, porém essa era uma característica justa e necessária
aquela escultura, que já tinha em sua forma muito de seu molde
original. Ela pouco podia modificá-lo a ponto de manter a
perfeição necessária a todas as esculturas, a menos que o
destruísse quando ainda estava mole. Talvez fosse racional
aquele ato, destruir aquele coração seria o correto a si fazer, para
que ele fosse deformado como o seu, que já não era possível de
concertar. Mais a justiça interior não representa a justiça que
podemos transparecer ao mundo, justiça criada com as formas
perfeitas idealizadas por quem se beneficiam delas.
O tempo passou Sônia já havia acabado de costurar as rendas
exigidas em seu vestido. Pediu o vestido de Emily para fazer o
mesmo, porém ela interveio dizendo que não era necessário, seu
vestido haveria de ficar na sua forma original. Para que algo em
sua superfície fosse da forma como era antes. Como ela havia
imaginado. Ela queria poder olhar para si e se enxergar na forma
perfeita de antes. Com a forma que a vida a criou nas suas
42
imperfeições. – Em minha mente sou livre! Dizia ela, não a fitar
o vestido, mas olhando o céu como sempre fazia.
- Agora é esperar secar o belo coração para dar a cor necessária a
ele. As cores das esculturas que são predeterminadas pelas regras
dos que não compreendem as cores. Pensou Emily. Ela não
gostava dos padrões da vida que determina até as cores de tudo.
- por que os corações têm que serem vermelhos? Dizia ela
sempre! Queria que os corações fossem verdes, ou azuis. Por que
ela não podia mudar a forma de algo que normalmente é de uma
forma comum para algo mais interessante? Ou mudar a cor de
algo que a vida predeterminou que seria branco ou cinza pra
outra cor? Ela definitivamente queria que aquele coração fosse
de outra cor! Não queria que ele fosse cinza como seu objetivo
real, nem vermelho como seu objetivo secundário.
Ela queria que fosse de outra cor, mais queria que fosse de uma
cor neutra no mundo dos vivos, roxo, lilás para ser uma cor mais
forte.
Pediu a Léo que depois que o coração secasse o pintasse de
violeta. O violeta, com exceção das flores, não representava além
nenhuma forma determinada. Lilás devia ser a cor a ser usada.
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- O “purple” da vida sem formas. - Quando essa escultura
chegar ao seu real objetivo, já não me importarei com as formas
perfeitas. Já não terei mais necessidade delas. Dizia a Léo às
palavras que serviram para compreender o que na verdade
estavam construindo com aquela forma de coração.
Ele parou, olhou para Emily. E colocou para fora o que desejava
há tempos:
- Sabe Emily! Cansei dessa sua vida mórbida. Dessa sua mania
de preparar o fim. Por que não prepara a vida? A vida está ai,
você está respirando! Sabe! Eu não queria ter pena de você,
mais você não está me dando muitas escolhas. Suas atitudes são
dignas unicamente de pena. Não me peça para não senti-la, por
que creio que não tenho muitas opções. Há tanta vida em você,
posso ver em seu olhar, em seus gestos involuntários, mais essa
vida não reflete em suas atitudes voluntárias. Você não pode
exigir que alguém viva se você mesmo não acredita na sua vida.
Você não pode passar uma verdade do qual você mesmo não
acredita.
- Por favor! Eu preciso da vida em você, quase sempre precisei.
Emily não perdeu a calma nem a serenidade nem diante de tão
duras palavras.
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- Léo, não pense que minhas esperanças algum dia se foram, no
entanto eu preciso de motivos para viver. Todos nós precisamos!
Eu encontrei os meus motivos em vocês. Não tire de mim essa
vida. Vocês não têm esse direito! Dizia Emily essas palavras em
fim olhando nos olhos de Léo.
- Eu não posso ignorar a realidade, a minha vida está muito além
de minha realidade. Ela será continuada na felicidade de vocês.
Não me neguem isso!
A vida é tão simples. Emily queria acreditar que seu fim
representaria dois inícios e de certa forma conseguiu.
Encontravam-se, naquela cabana em um belo dia de sol, a
discutir um assunto não tão belo. Emily sabia de suas condições,
no entanto a esperança de viver para sempre jamais saíra de sua
mente. A vida humana tem suas artimanhas de sobrevivência, a
vida de quem vive é sempre eterna.
– agora é sempre eternidade. Dizia Emily mais uma vez a
vislumbrar as nuvens que corriam as pressas em direção ao seu
fim, que seria a chuva, fim esse que representa milhares de
inícios. Em todos os sentidos, seu fim representava a
sobrevivência de várias vidas, vida que nem mesmo ela possuía.
Nada podia representar mais saldo positivo que nas equações das
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gotículas de águas que se juntam e formam chuva. Como se já
não fosse suficiente, tempos depois essas gotículas voltam ao seu
ciclo, e jamais se desfaz por completo. – como eu queria ser
como as nuvens de chuva; Encher-me ao máximo de mim, e se
só então desaguar minha existência a todos os meus objetivos, e
depois voltar ao meu mínimo e recomeçar preencher-me de todos
os sentidos para novamente desaguar. Sairia de mim apenas o
máximo, andaria sempre entre as estrelas e jamais cairia nos
meus mínimos que de muito não me servem.
- Como seria bom se todos os humanos resguardassem as suas
gotículas de vida até possuir força suficiente para fazer a
diferença, no entanto a natureza do ser humano ambiciosa não
possui o talento das nuvens. Como exigir dos homens os talentos
das nuvens? Devíamos ser como as estrelas, elas brilham tanto
que mesmo depois que morrem a sua luz viaja no espaço por um
longo período de tempo. E ainda continuamos vendo-as como se
estivessem vivas. Como exigir dos homens as capacidades das
estrelas? Devia ser simples, já que viemos da mesma natureza.
Mais não!
- Digo a vocês aqui hoje Léo e Sonia que se não for luz que
deixarei brilhando na mente das pessoas, desejo que de mim
46
esqueçam, esqueçam como mereço ser esquecida já que nada
brilhei.
Léo ouvia estático, sabia que Emily já muito havia feito por ele.
Ninguém em sua vida havia brilhado mais que ela.
Disse Léo: - saiba Emily, que nem um milhão de anos seu brilho
cessará em minha mente. - Desculpe por ter agido assim. Sei que
não merecia!
- Há sentido mais em mim que em vocês; brincou Emily.
Ele sorriu e começou chover, a chuva se iniciou devido o desejo
de Léo que naquele momento chovesse, ele queria demonstrar a
serenidade que Emily refletia, no entanto não conseguia, os
ventos da mais triste chuva o açoitavam com as finas cordas da
realidade. E doía, doía como devia doer, doía na intensidade que
merecia sentir. Era uma dor justa. Léo a escondia, mas ela estava
lá, negá-la não a diminuiria, no entanto a dor é transferível e
ninguém além dele merecia senti-la, e a resguardou. Um dia
aquelas dores haveriam de ganhar peso para cair assim como
aquela leve chuva que caia em sua mente que mais tarde se
transformaria em tempestade e ele teria que deixá-la fluir. Nem
que essa tempestade destruísse tudo a sua volta.
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Aquela chuva devia ficar apenas em sua mente, não desejaria que
aquelas gotículas egoístas molhasse a escultura de Emily.
Comprometeria a sua forma perfeita. O dia se passou no piscar
de olhos, a vida ali fluía em conjunto com a dor talvez nem tão
egoísta de Léo.
Léo voltou para sua residência. Sonia também! Emily ficou na
sua solidão inspiradora e costumeira. Definitivamente Emily
gostava da solidão, sozinha podia ser ela mesma, não sofria
influencia do mundo animado a sua volta, e encontrava a sua
plena felicidade. A felicidade que apenas ela podia arrancar dos
recônditos de sua mente, essa felicidade por um tempo conseguiu
se camuflar em dores e injustiças, mas ela já sabia onde se
escondia e sempre que necessitava a encontrava com facilidade.
Ela havia encontrado esta felicidade no alto, nas nuvens onde o
homem não consegue ir sozinho, no entanto, eram poucas as
vezes que Emily saia de lá.
CAPITULO VI
O que é felicidade
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Léo levanta escora na parede pintada de verde limão de sua
casa, a parede tinha o cheiro frio de tinta fresca, ficou lá
observando sua linda esposa cuidando dos afazeres domésticos.
Nada podia arrancar aquela felicidade dele.
A vida comum de um lar comum. Sônia de camiseta e meia,
linda, com suas poucas sardas abaixo dos olhos castanhos claros
e grandes, que combinava perfeitamente com seus cabelos
castanhos que ao sol parecia laranja. Léo observava e sonhava,
fazia planos. A descrição de forma perfeita de felicidade podia
ser descrita para Léo naquele instante. Por um longo tempo Léo
viveu sem ter sequer sonhos. A pior decadência de um homem
pode ser descrita quando ele perde a capacidade de sonhar.
Agora Ele podia sentir já a felicidade futura, que de certo não era
menor que a felicidade que sentia naquele momento. Como
sempre dizia Emily:
“A felicidade perfeita é a felicidade sentida agora.”
Emily tinha uma teoria que a felicidade nunca devia ser pautada
em momentos passados. Agora podia perfeitamente ser pautada
nos momentos futuros, antecipar a felicidade.
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- É algo vantajoso anteciparmos a felicidade. Já que antecipamos
a dor, por que não também a felicidade? Dizia Emily sempre que
tinha oportunidade.
Sônia compartilhava os mesmos sentimentos de Léo Já que a
felicidade ali se baseava na reciprocidade, a felicidade
multiplicada por dois.
- sabe Sonia, disse Léo levando a xícara do café horrível que
Sonia havia feito. Em tudo, novelas, filmes, livros, o sofrimento
é descrito em mais de noventa por cento do enredo da história. É
como se a felicidade para os humanos não fosse interessante de
ser lida ou vista. Lutamos a vida inteira para sermos felizes, no
entanto se tivesse um livro que descrevesse só a felicidade talvez
não fosse interessante.
- Léo, os humanos gostam de ver superação, gostam de ver o
sofrimento que passam na vida, si vêem dentro da história,
quando o personagem vence em um romance eles se realizam. E
sentem a felicidade que os personagens sentem. Quanto mais
árdua a batalha, mais se valoriza a conquista.
- Eu sei! Mais você não acha que a felicidade já que é o ápice da
história devia ocupar uma parte maior no enredo?
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- A felicidade possui um padrão, todos a conhecem. Não precisa
ser descrita. Respondia Sonia a sorrir com as caretas que Léo
fazia ao tentar tomar o café gosto de qualquer coisa menos de
café.
- Se todos a conhecemos por que é que não a conquistamos com
tanta facilidade?
- Pergunta retórica. Meu caro!
- Sabe, por que a felicidade não ocupa uma parte maior nas
histórias? Por que a felicidade para sempre se for descrita um
pouco além, em pouco tempo já encontra as adversidades. A
felicidade eterna não existe. Neste momento Sonia prova com a
expressão feliz o café feito com suas próprias mãos de fadas.
Expressão que não durou muito, logo cuspiu o horrível liquido
que levara a boca;
- Meu Deus Léo, como você consegue tomar esse café? Parece
que eu coloquei sal no lugar de açúcar.
Léo brinca: - é o preço da felicidade, minha vida!
- Não é um preço alto demais? Indaga Sônia ao tentar tirar aquele
gosto horrível da boca.
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- Se esse ato se repetir sempre com certeza vai ser. Léo sorrir e
em um ato sorrateiro agarra Sonia e a beija;
- Vamos tomar café na lanchonete.
- Desculpa, dizia Sonia desapontada.
-Não se preocupe. É um erro muito comum. Eu te amo!
Independente do sabor do seu café. Brincou Léo com o velho
bom humor de sempre. - Acho que vou escrever um livro
descrevendo a partir da felicidade para sempre das histórias.
Dando ênfase a felicidade. O que você acha Sônia?
- Apoio você em qualquer projeto. Meu amor! Dizia Emile
enquanto sem querer lambia a colher salgada do café frustrado
que acabara de fazer. A doce ilusão com o salgado gosto da
decepção e uma careta horrível após reprovar o gosto de seu feito
comum e memorável.
- Vamos para a lanchonete, antes que eu salgue nossa vida.
Dizia Sônia indo em direção ao quarto para se trocar.
Saíram de casa, em direção a lanchonete. No caminho não ao a
acaso encontraram a garota que para eles representavam uma
importante figura em suas vidas. A distância não era algo comum
em cidades médias, tudo era próximo, não que fosse exatamente
52
próximo apenas os meios de transportes permitia uma locomoção
rápida a toda parte.
Léo não planejou uma viagem de lua de mel, já havia viajado há
pouco tempo atrás, e não queria se distanciar de seu novo e
primeiro trabalho que o gratificava tanto com a alegria de ajudar
e disseminar a felicidade as pessoas.
CAPITULO VII
Sala da tentativa de justiça
Vários dias antes da construção do belo coração violeta que
lhe servira como muitas lições de vida; Apenas várias visitas
rotineiras a liga do jaleco sem cores. Eram todos super heróis
sempre testando novos super poderes em Emily que de certa
forma mantinha também o seu super poder. O super poder de
convivência comum com os demais, e o maior de todos os
poderes, os sorrisos; sorrisos que refletiam a vida que a falta de
cores na sala da tentativa de justiça não refletia.
Emily não gostava da falta de cores, deixavam sua boca cada vez
mais sem saliva. Dizia ela que queria sempre na sua vida as
53
cores, cores que refletiam a beleza da vida como o carnaval com
suas fantasias coloridas.
Em uma dessas visitas, uma das poucas que Léo ainda a
acompanhou, nos corredores da sala da tentativa de justiça, como
piloto conduzindo a nave que Emily era obrigada a usar naqueles
blocos sem cores e sua mãe a carregar um equipamento qualquer;
observando a falta de cores, vistas apenas algumas poucas flores
já sem vidas em vasos de vidros com água suja dizia:
- Um dia quero ir á uma festa de carnaval com tudo que tenho
direito; fantasias coloridas, óculos em forma de estrelas, muitas
serpentinas, confetes e músicas divertidas e dançantes. As cores
me fascinam!
Léo olhava para os lados observando a mesmice das dores mais
heterogenias que havia em toda parte, concordava e fazia uma de
suas ultimas promessas a Emily:
- Vamos preparar uma festa de carnaval pra gente com todas as
fantasias e cores possíveis.
- Acho que precisamos de um pouco de diversão carnavalesca.
A mãe de Emily concordava com a animação que conseguia
transmitir naquele momento.
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Emily queria uma festa de carnaval. Todos haviam lhe feito uma
promessa sem pretensões reais de cumprir pelo menos não antes
da época do carnaval.
As circunstâncias, no entanto obrigaram em honra a se próprios a
cumprir.
As viagens a sala de tentativa de justiça sempre eram cansativa
para Emily. Sempre que voltava tinha pouca chance de se
alimentar com as cores que lhe faltava. Dormia assim que
chegava, e é tão raro sonhos com cores vivas. Eles normalmente
são experiências opacas: - Os sonhos coloridos deviam ser mais
valorizados. Emily dizia estas palavras com a felicidade que
havia internamente em sua mente.
A liga do jaleco sem cor sempre fazia de tudo para tornar cada
fez mais forte os super poderes de Emily, no entanto nas horas
seguintes dos procedimentos ela ficava definitivamente pior.
Efeitos colaterais, os homens se orgulham e admiram as formas
perfeitas, e, no entanto, ainda não criaram uma máquina perfeita,
uma que não libere calor ou converta completamente a energia
em trabalho. Os malditos efeitos colaterais da vida.
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A vida para ser justa com Emily precisava dos efeitos
colaterais, da tão famigerada causa e conseqüência, ação e
reação. Emily por um curto período gastou tempo martelando
essas idéias em sua cabeça, mas ela não identificava as suas
ações que lhe propiciaram aquela reação. O porquê de a vida lhe
tirar o sentimento de imortalidade inerente a todo humano
comum. O porquê daquele tempo, que mesmo incerto, a vida lhe
privou. Depois de nada encontrar descobriu que não adianta
tentar encontrar justiça na vida com suas imperfeições. Elas
definitivamente não existem. Então passou a tentar encontrar
novos motivos para voltar a sentir a sensação de ser imortal dos
humanos tão comuns quanto ela.
O tempo livre de Emily tinha relativamente aumentado, ela não
podia fazer muito, então tinha tempo para analisar a vida, e
entender o instrumento principal para a luta diante das
adversidades, a sua mente. Na verdade quanto mais rápido se
pensa menos o tempo passa, o tempo é relativo, como dizem. A
sua mente havia se expandido, o tempo e as privações lhe
propiciaram essa reação.
Léo fita pelo retrovisor os olhos caídos e ainda assim fortes de
Emily, agora fora da sala de tentativa de justiça, daquela falta de
cores, já dentro de seu carro. Ambos voltam para a correria na
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rua engarrafada, bem comum a sua cidade natal, que tanto lhes
acolhera quando o seguimento da sociedade que devia acolhê-los
falhou nesta missão tão simples. A vida lhe passara pela mente,
mais uma vez, a maldita tristeza ensaiou cair, evidenciada por
suas mãos tremulas ao volante que firmemente segurava para não
perder o controle do carro, ou da sua vida. Não seria o momento
adequado, mas ele já não suportava tanto sentimento guardado
em sua mente e coração.
Ele começa a lutar com a mesma força física e mental que
apertava o volante do carro, e começa a pensar em Sônia, não
que Sônia significasse a sua fuga das responsabilidades ou da dor
que aquelas circunstancias o faziam sentir com relação a Emily.
Sonia era seu porto seguro e Emily com certeza aprovaria aquela
tentativa de driblar a dor.
Léo, já não tinha muito tempo para dedicar a Emily, havia na sua
vida outro alguém muito especial, e Emily fazia questão que ele
se dedicasse ao máximo ao amor que sentia por Sonia. Havia
apenas algumas atividades que realizavam juntos, como quando
resolveram pessoalmente decorar a biblioteca que tanto lhes dava
orgulho.
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CAPITULO. VIII
Os biscoitos em forma de bichos
Léo e Sonia começavam a sua vida a dois, dividindo o mesmo
teto, compreendendo as particularidades, entendendo que a vida
a dois não é tornar uma só vida, e sim duas vidas que aprendem a
conviver pacificamente.
A sua vida simples, a felicidade como dizem é muito clichê.
Sonia trabalhava com Léo na biblioteca que conseguiram
montar na cidade com ajuda de Emily, que agora já tinha um
numero de livros razoáveis. Biblioteca que a essa altura
funcionava como terapia para aplacar a dor que vez ou outra a
lembrança de Emily trazia. A terapia da convivência com os
sorrisos de crianças e jovens que gostavam de se aventurar em
viagens nas costas de um livro, e conhecer novos mundos.
Todos os dias eles faziam questão de abrir a biblioteca cedo,
para não proporcionar a decepção aos visitantes assíduos. Como
uma garota em especial. Tinha nove anos, mas odiava ser
chamada de garotinha, todos os dias ia a biblioteca para ler um
livro ou para simplesmente conversar com Léo e Sonia. Sempre
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comendo seus biscoitos em forma de bichos. Dizia ela que não
era o gosto do biscoito, era aquela curiosidade de saber qual
animal iria pegar depois. O mistério e a expectativa era o segredo
da empresa que fabricam os biscoitos.
Léo passou a gostar dos biscoitinhos. Comprovou que a diversão
em desvendar os animais independia da idade - biscoitos com
forma de animais são sempre divertidos. Dizia ele.
Roberta era como ela se chamava; um nome forte que não
combina muito com criança, no entanto todas as “Robertas”
adultas um dia já foram crianças. Ela sempre dizia que odiava
diminutivos, gostaria de ser chamada por seu primeiro Nome e
completo. Apesar da pouca idade já tinha personalidade forte,
assim como seu nome.
Roberta era uma das crianças que ajudou a carregar a faixa no
ultimo espetáculo de Emily, talvez ela tenha sido uma das
pessoas que mais a compreendeu durante a parte mais intensa da
sua vida.
Elas sempre conversavam, e dessas conversas sempre havia
muitos risos e gargalhadas que não necessitavam de sentido.
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Léo adorava conversar com a garota de personalidade forte, e
de assuntos sempre interessantes. Era incrível o vinculo afetivo
que tinha criado com Roberta. Os humanos criam vínculos
afetivos com lugares, músicas, pessoas ou qualquer coisa que
tem algum tipo de relação com quem amam. Léo adorava a
presença de Roberta, Conversavam muito. Ela de alguma forma
lembrava Emily, não por sua personalidade, mas por passarem
tanto tempo juntas e gostar tanto uma da outra que partes de uma
já se encontrava na outra. Em Roberta havia uma parte de Emily,
por isso além de gratificante era reconfortante para Léo a
presença dela, era como estar novamente com Emily.
Ela sempre lia livros infantis para Léo quando tinham tempo. A
vida estava definitivamente maravilhosa para todos, da forma
que sempre desejou Emily.
Roberta não surgira na vida de Léo ao acaso, ela sempre se
encontrava no hospital quando ele levava Emily para as suas
seções.
CAPÍTULO VX
A biblioteca
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Alguns dias anteriores. Estavam todos felizes e empolgados com
a decoração final daquele recinto que seria a biblioteca solidária,
idéia de Léo que pode se confirmar na empolgação de Emily
Sonia e Roberta. As partes grosseiras da decoração já haviam
sido concretizadas por alguns funcionários idôneos, restava agora
apenas à decoração nos seus detalhes mínimos, Roberta
carregava um vaso e colocava em qualquer lugar propicio e
adequado seguindo as orientações de Emily e Sonia que havia se
demonstrado decoradoras de uma elegância louvável. Léo
carregava e desenrolava um tapete com a imagem magnífica do
pequeno príncipe em seu minúsculo mundo, tapete que se
encaixou perfeitamente na entrada do imóvel que sempre esteve
lá próximo a sala de tentativa de justiça, do qual Léo jamais tinha
se interessado em usá-lo pra alguma coisa. Pensou em algumas
vezes fazer com que Emily se mudasse para lá, na intenção de
ajudar, deixando ela mais próximo daquele local que necessitava
sem muito gosto retornar sempre. No entanto a ideia não vingou.
Emily não queria sair de sua rotina, nada que pudesse influenciar
as suas atividades corriqueiras e que a impedisse mesmo que
ilusoriamente de ser alguém tão normal como os demais, a
deixavam empolgada e inclinada a aceitar.
61
Um quadro era posto ali, uma arrumação de uns livros aqui.
Todos se empenhavam com todo gosto para deixar aquele local
agradável aos olhos. E como queria a alma dos que necessitam
de felicidade.
Emily sobe em uma pequena escada, e inicia a arrumar alguns
livros de uma coleção bem antiga que achara na casa de Léo. Ela
passa a enfileirar aqueles livros de capas marrons e folhas
amareladas e com cheiro de mofo. Ao tocar um de titulo dourado
passou a refletir. Como ela queria ser um livro de letras
douradas, sem um visual impactante e capa de cor quase
vermelha. Apenas com um titulo bem elaborado para aguçar a
curiosidade dos leitores mais atentos. Um livro de conteúdo
complexo, mas de fácil compreensão, facilmente camuflado
dentre tantos outros. Um livro de capa grossa e folhas
amareladas de tanto lida na estante de qualquer leitor que
compreende a vida um pouco além de sua superficialidade. Sorte
daquele que notar-me em meio há tantos superficialmente iguais
a mim, e ter a curiosidade e oportunidade de folhear-me com a
minuciosidade necessária para fazer analogias com a vida.
Somente estes, serão dignos de minhas palavras. Ou posso ser
apenas um livro nunca lido em meio à poeira que cega os
homens, ainda sim, ser um livro. Quem haveria no universo de
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tirar isto de mim? Os livros são eternos bem diferentes de
muitos humanos que são esquecidos pouco tempo depois que
deixam de respirar o mesmo ar que os demais ainda usufruem.
Quem poderia tirar dela a chance de preencher o pequeno espaço
numa estante rústica de um leitor vislumbrado com a magia dos
livros, e em contra partida preencher algum vazio gigante que
eventualmente possa haver nos corações dos homens que lêem
para se encherem de vida?
Emily esquece-se em quais condições se encontrava. Na medida
em que se perdia em meio ao universo de sua imaginação, seus
pés perdem a sustentação da mesma forma que sua mente se
desprende da realidade e desaba em direção ao chão que lhe era
mais próximo. A lei da gravidade não perdoa, esta é a prova que
a ordem da vida quando foge de seu curso natural não deixa
culpados. Quando algo assim ocorre, a busca por estes culpados
que não existem só intensificam a dor. A lei da gravidade
funciona até nas condições que não devia. Se houvesse uma hora
em que ela não devesse existir seria naquele momento em que
Emily desabava em direção ao assoalho da nova biblioteca. No
entanto como esperado, Emily cai e por pouco não se machuca
seriamente, Léo sempre atento a agarra antes que ela toque ao
piso de madeira avermelhada daquele local charmoso.
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Uma cena digna de cinema. Léo a agarra pela cintura olha em
seus olhos e a nota bela em seu vestido rosa de laço violeta em
volta da silhueta insinuante de uma mulher graciosa,
características que apenas preenchia a sua imaginação fértil.
Alguns segundos em troca de olhares fixos e diz Emily:
- Achei que me esborracharia no piso.
- Ainda bem que não aconteceu! Estragaria a nossa animação
nesta decoração.
Voltaram todos ao seu trabalho, voltaram à decoração de suas
vidas como devia ser diante da realidade. O tempo passa tudo
ocorrera como combinado. Roberta já cansada precisava voltar
ao aconchego que fosse possível ao lado de sua mãe. Emily
exausta já não conseguia se por de pé, sua mente cansada tanto
quanto o corpo, os acontecimentos de outrora a fizeram refletir
mais ainda sobre a vida, por sorte apenas as motivações lhe
caíram à mente. Seu corpo frágil apenas acarretava preocupação
exagerada em todos, no entanto fugir e se isolar apenas
evidenciaria uma covardia que ela de certo não cultivava. Com
certeza esta não seria uma opção aceitável. Alem disso a firmeza
em sua mente compensava qualquer infortúnio que fosse
propiciado pela fragilidade de seu corpo físico. O mundo exigia
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que ela fosse frágil. As pessoas também imaginavam que era
assim, e de certa forma era verdade. Ela aceitara com maturidade
todos os sintomas e efeitos colaterais do tratamento, porém, em
sua mente ninguém podia tocar e jamais permitiria que suas
convicções se perdessem em um pensamento externo qualquer
que não proviesse de sua própria mente. Sua mente a cada dia se
tornava mais forte, fato que lhe era bastante útil.
CAPÍTULO X
Um comentário extra
A vida passa, apenas passa na pacata existência de Léo e Sonia.
Talvez a real felicidade de um homem esteja neste passar lento
da vida sem grandes acontecimentos, nesta maldita ordem que
não se altera, não para melhor. Talvez até melhore sempre, no
entanto o homem é que não atenta quando as mudanças lhe
proporcionam melhorias. Entretanto da uma ênfase exagerada
quando a ordem desmorona suas vidas em profundo sofrimento.
Definitivamente a felicidade é tão simples e clichê que só a
notamos depois de experimentar a falta dela.
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CAPITULO XI
“palhaços”
No aniversário de Roberta, Emily com o seu brilho intenso e
ainda se expandindo. Léo Sônia e Emily haviam preparado uma
festa surpresa para ela. Ali mesmo na sala de tentativa de justiça.
Todos adoravam Roberta não por sua situação em questão, e, sim
pelo encanto que emanava de seu semblante e sua suave e forte
voz de criança. Havia balões, serpentinas, na medida em que as
condições físicas do ambiente permitiam. Emily fantasiada de
palhaço e Léo também. Mesmo sabendo que Roberta odiava
palhaços, no entanto como Sônia mesmo dizia:
- Temos que causar nesta festa.
Roberta por inúmeras vezes já havia dito para todos que odiava
palhaços, eles na sua maioria não são engraçados, eles apenas
demonstram uma alegria falsa, contam umas piadas ensaiadas
66
anteriormente, seus gestos ansiosos não demonstram alegria,
pelo contrário demonstram apenas pressa em receber seus
pagamentos. Para Roberta os palhaços verdadeiros são aqueles
que até sem maquiagem são engraçados, características essas que
poucos cultivam.
Ninguém sabia de onde um ser humano com tanta pouca idade
tirava tantas teorias sobre tudo. Talvez as longas horas em frente
à televisão da sala de tentativa de justiça lhe davam as idéias
necessárias.
Porém aquele dia, todos estavam de palhaços e com a difícil
missão de passarem a alegria verdadeira que muitos palhaços não
possuem.
Roberta estava na casa de Emily, como combinam a mãe de
Emily a levaria para encontrar os palhaços na sala de tentativa de
justiça, depois do tempo necessário para Léo e sonha arrumarem
tudo. Talvez não se encontrasse lá uma cena apropriada para a
alegria necessária para aquele dia; um garoto em cadeira de
rodas, uma senhora que servia outra senhora um chá qualquer de
aquecimento da alma, uma jovem que parecia estar com poucos
meses de grávida acompanhada pelo o que parecia ser a mãe ou a
sogra.
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Emily sempre com a animação infinita de sua mente, dizia:
- A alegria estar em nós, em nossas mentes, talvez consiga até
transferir um pouco desta alegria a todos aqui.
Emily exibia seu grande sorriso que se evidenciava com a
maquiagem vermelha, que na maioria dos palhaços servia para
forçar um sorriso que não havia em sua alma. No entanto em
Emily a maquiagem apenas equilibrava o tamanho de seu sorriso
e alegria com o gesto físico que exalam os sorrisos.
Tudo preparado para a chegada de Roberta; um suspense
desnecessário, pois ela já devia ter percebido a trama de seus
companheiros há tempos, todos ali já haviam notado a esperteza
de Roberta. No entanto era inevitável que todos se sentissem
desesperado para ver a reação dela diante de todos aqueles
palhaços, de todas aquelas cores incomuns aquele local na sua
íntegra.
Roberta se aproximava, segundo o telefonema em códigos que
Léo recebera da mãe de Emily; os corações aceleraram
constantemente e no mesmo ritmo. Roberta chega à lanchonete;
segurava a mão da mãe de Emily, as luzes estavam a todo vapor,
as condições não permitiam que as luzes fossem desligadas, fato
que não diminuiu a intensidade da surpresa de Roberta. Certo
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que ela já sabia da surpresa que todos há alguns dias vinham
preparando, no entanto aqueles palhaços, aquelas cores, foram de
um espanto total para ela.
Ela se desprende das mãos que a segurava, e suavemente se
dirige até Léo, até então sem reconhecer as pessoas por traz das
maquiagens e fantasias. Ao fitar diretamente aos olhos de Léo o
reconhece, a alegria que não devia ser contida emanou por seus
braços e seu largo sorriso que se abriram em um longo abraço.
Ela viu em Léo que naquele grande sorriso maquiado havia a
alegria verdadeira, a alegria pelo dom de passar felicidade sem o
desejo por recompensa.
Roberta sai de seu personagem forte como sempre e deixa cair
uma lágrima de alegria, que para Léo significou a ligação de um
interruptor que havia em seus olhos e coração. Interruptor que
impedia que suas lágrimas desaguassem na ordem da natureza
imutável que diante de situações árduas deveriam correr
naturalmente para desaguar a dor. Porém ele as conteve com a
força que talvez não tivesse, mas que a encontrou em algum
recôndito de sua mente, pois o momento exigia que ele apenas
deixasse os sorrisos dominarem seu semblante.
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Roberta desce de seu longo abraço e corre em direção a Emily, a
alegria era justa e necessária. A justiça estava sendo concretizada
naquele ato reconfortante em todos que se encontravam na
lanchonete.
Abraça Emily na intensidade das cores daqueles balões que não
paravam quietos, a música era baixa, no entanto os ouvidos de
todos ali eram sensíveis o suficiente para ouvi-la na intensidade
dos sons que motivam os homens a feitos inimagináveis.
Emily agarra Roberta, com a força física que neste momento
transbordava em seus membros e a gira rodopia a vida juntas, na
tentativa não de mudar a ordem ou voltar no tempo, rodopia
apenas no intuito de sentir aquele momento. Roberta em seus
braços como em um espalha brasa. Emily sentia-se como o sol
no centro de tudo, com o poder e a sensação que podia sim, fazer
justiça em relação a sua vida.
Quando finalmente a realidade as deixa tontas de tanto girar as
suas vidas, Emily deixa Roberta deslizar em seus braços e
permite que seus pés toquem o chão novamente.
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E começaram todos a dançar ao som instrumental da charmosa
musica árabe. E suas típicas coreografias, Roberta adorava a
dança do ventre e seus passos de alegrias. Os palhaços ali
definitivamente gostavam dela e sorriam verdadeiramente.
Roberta estava feliz e agradecia todos com obrigados que saiam
espontaneamente de sua boca, e com a desenvoltura de sempre
pede para fazer um discurso. Todos ali em um coro disseram que
queriam muito ouvi-la.
Roberta sobe em um banco que parecia às cadeiras da lanchonete
ligadas uma nas outras.
- A felicidade que costumo encontrar em meus livros; encontrou
em todos vocês meus amigos. Sabe ao ler uma história qualquer
eu vivo a felicidade que com certeza há em mim, no entanto o
mundo real a minha volta impede que a felicidade plena me
preencha, devido às condições que todos aqui conhecemos. Digo
meus queridos amigos que agora eu posso sentir a felicidade
plena que todo ser humano merece. Quer dizer, nem todos
merecem esta felicidade, mas importante é que todos a buscam,
mas, nem todos conseguem. O que quero dizer é que estou feliz!
Roberta finalizou se embaralhando com as palavras, porém todos
compreenderam o que ela tentou passar.
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A partir deste momento surgiram em Léo à idéia de proporcionar
a felicidade a mais pessoas:
- Acho que posso construir uma biblioteca em um prédio em
desuso. Disse Léo empolgado a Emily.
Léo correu e agarrou Roberta:
- Que tal montarmos uma biblioteca?
- Legal! Assim podemos proporcionar a felicidade a mais
pessoas.
- É sim! Concordou Léo.
-A felicidade é tão simples! E se esta felicidade estiver em algo
tão simples como os livros, uma biblioteca é uma boa idéia para
investir o dinheiro que tenho sem muito orgulho. Não acha
Emily?
- Sim claro!
Todos que ali estavam tinham o sentimento de missão cumprida,
pois Roberta nunca se sentira tão feliz, e ainda esta felicidade era
um sentimento de todos. Nada pode ser mais gratificante para o
homem do que proporcionar a felicidade para alguém e esta
felicidade significar também a sua própria satisfação. O mundo
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egoísta às vezes tem suas atitudes nobres, e tais atitudes tornam a
vida suportável a quem não foi agraciada com o dom de saber
apreciar a verdadeira recompensa e razão da vida, que é respirar.
CAPÍTULO XII
Um pouco mais a frente no tempo na vida de Léo.
Léo e Sônia revezavam na administração da biblioteca
solidária; diariamente recebiam vários livros de doações de
pessoas sensibilizadas com a causa e de muitas outras que
trocavam livros por outros. A proximidade da sala de justiça da
liga do jaleco sem cor fazia com que cada vez mais pessoas se
comovessem com aquela atitude nobre de espalhar felicidade. O
sofrimento definitivamente torna as pessoas mais humanas.
Dizem que só se percebe que tem olhos quando eles param de
funcionar perfeitamente. Da mesma forma as pessoas só
percebem que necessitam uma das outras quando estão prestes a
perder alguém que é importante para elas. Um sentimento que
prova o quanto homem pode ser uma criatura desprezível.
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Roberta abrilhantava mais ainda aquela atitude nobre e
necessária de Léo e Sônia. Roberta era um símbolo daquele local
e passava horas lendo em voz alta para Léo que chegava a delirar
com sua constante boa atuação.
CAPÍTULO XIII
“Coragem”
Emily havia conhecido Roberta alguns dias depois de sua
viagem aos estados unidos, sendo que Roberta seria quem
inspiraria em Léo a idéia de abrir a biblioteca.
Em uma de suas visitas a sala de tentativa de justiça; se
encontrava ao lado daquele lugar de poucas cores, uma garotinha
segurando um pacote de biscoitos simplesmente olhando as
pessoas que passavam como se esperasse alguém ou algo. Emily
não pode deixar de notá-la! Havia nela alguma coisa que a
fascinava, havia vida em seus olhos e ao mesmo tempo
desesperança, havia alegria querendo saltar, pular daquele corpo,
mas algo impedia que essa alegria e esperança aflorassem
livremente. Talvez o ambiente em que ela se encontrava seria o
responsável por aquela sensação.
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Emily odiava sentir pena, tanto quanto odiava ser digna de pena,
no entanto sentiu ao fitar aquela garota, um misto de pena com a
mesma esperança ofuscada que via no olhar azul como o mar,
um mar de calmos ventos e ao mesmo tempo de tormenta da
linda garota dos biscoitos. Facilmente se via naquela linda
menina de vestido azul de laço ainda mais azul amarrado na
cintura o quanto aquela garotinha era forte.
Emily havia aprendido ver além, ver no olhar a personalidade
das pessoas, “aquilo que te casta te potencializa.” Tudo que a
vida privou de Emily ela havia compensado com a sua mente
maleável. Da mesma forma que pessoas que perdem órgãos
cruciais como os olhos, aguçam outros sentidos para compensar
a falta. Emily havia encontrado o sentimento de imortalidade
essencial a todo ser humano em sua mente que a cada dia
encontrava os motivos para intensificar mais ainda a sua vida.
Ela precisava falar com aquela garotinha, pediu que sua mãe
parasse a sua nave especial que a levaria para a sala de tentativa
de justiça ao passar pela a menina dos olhos azuis.
- Oi garotinha!
- Não me chame assim! Odeio esses diminutivos.
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- Então me diga o seu nome para que eu possa me dirigir a
corretamente.
Ela aparentemente ignorou o pedido de Emily. E disse:
- O seu lenço do bob esponja é ridículo! Devia usar um
personagem mais cheio de vida. Como o “Coragem”.
- Conhece o “Coragem”?
- para falar a verdade você já estar bem grandinha para usar
lenços personalizados de personagens de desenhos. Não acha?
Emily respondeu:
- Eu gosto deles! E conheço o “Coragem” gosto muito do seu
medo que não o impede de enfrentar a vida como ela é.
- Sabe garota... Garota você estar certa! Nenhum personagem
passa mais uma lição de vida quanto o “Coragem”. Vou pensar
seriamente nisso.
A garota olha para Emily e não esboça reação alguma de
estranheza, olhou para Emily como ela sempre desejou ser vista;
alguém normal com toda a vida que havia dentro de si. E disse
com as mãos no queixo como alguém que sabia o que estava
fazendo:
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- vamos ver o que seria seu style.
- Acho que seria legal você usar um lenço do “Slipknot” ; rock in
roll. Acho que seria mais seu estilo.
Emily riu como nunca havia conseguido rir naquele ambiente
sem cores. Cada segundo que passava a conversar com aqueles
lindos olhos azuis, mais ficava fascinada.
- Mas você ainda não disse seu nome!
- É Roberta! E gosto que me chamem de Roberta, sem
abreviações ou diminutivos.
- Você é inteligente! Disse Emily já se despedindo, já era hora de
mais uma seção dolorida e precisa de tentativa de prolongar seus
super poderes.
Já a uma distancia significativa a garota grita;
- Gosta de biscoitos?
Quebrando o silencio horroroso de poucos sussurros daquele
lugar.
Emily apenas acenou com a mão, com um gesto qualquer de
confirmação. E continuo. Já estava atrasada para a sua missão,
77
Repetitiva missão das tentativas ainda que nulas de manterem
viva a chama, talvez não a chama propriamente dela, no entanto
havia tantas outras labaredas a se manterem brilhando na
intensidade das estrelas naquelas missões diárias.
Ao se passar o tempo necessário Emily retorna ao mesmo
corredor um pouco mais forte que antes, no entanto com menos
força.
E agora com a necessária garrafa de elixir da vida em suas mãos,
sua boca ficava seca, sempre que os heróis da vida tentavam com
todo sucesso manter o desejo e a esperança em sua mente. Emily
olha em direção ao local onde vira menina adorável e cheia de si
que tanto a havia encantado, e nota que ela ainda se encontrava
lá, com outra roupa alegre, mais ainda naquele lugar de poucas
cores.
Emily olha em sua direção, esboça o maior sorriso que sua
imaginação conseguia deixar transparecer em direção a doce e
forte menina. Ela sorrir corre em sua direção, oferece no gesto
gentil como os seus olhos, os biscoitos que costumeiramente
carregava com sigo. Emily sorrir. Sua mãe diz: que ela não pode
comer biscoitos, suas gengivas estão sensíveis. Roberta entende
com uma naturalidade desconfortante atípica de uma criança.
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Mas a mãe promete que ela iria encontrá-la para comerem juntos
e conversarem. Emily confirma com a verbal voz que lhe restava.
Ela queria ir apenas para casa. Estava cansada. O cheiro daquele
local quase sem cor já a incomodava.
No entanto os olhos, e o gesto da garotinha não saíram de sua
mente e alimentaram os seus sonhos enquanto descansava. Nos
sonhos a realidade enchia a vida de Emily com a alegria que ela
tentava a todo custo manter depois que acordava:
- Os sonhos podem te acordar para um pesadelo, ou para um
sonho maior ainda. Essa ordem só depende do próprio individuo.
Dizia Emily com naturalidade a vislumbrar sempre algo no alto,
como se visse alguém ou algo com o qual poderia conversar e
dizer o que quisesse com a certeza que seria ouvida. Em seus
sonhos esse gesto fazia tanto sentido quanto a sua existência,
bem mais que na realidade de olhos abertos e acordada.
Emily fez questão de voltar à sala de quase justiça no dia
seguinte, por alguma razão acreditava que Roberta se encontrava
ainda lá. Logo ao chegar ao local a nota com o semblante de
calmaria e sabedoria que sempre passava. Emily não
compreendia aquela calmaria que aquele ser humano passava a
79
ela, no entanto sabia que a sua companhia a faria muito bem.
Aproximou-se de Roberta:
- Olá moça dos biscoitos!
Disse Roberta com o sorriso aberto e contente ao ver Emily:
- Olá, hoje infelizmente estou sem biscoitos.
- Não se preocupe.
- Podemos ir até a rua comprar.
- Não precisa.
- Biscoitos fazem mal para os dentes, apesar de divertidos.
- Por que tudo que é muito bom tem sempre que ter algo que
impede a sua perfeição?
Indagou Roberta com a compreensão que lhe era possível na sua
pouca idade.
- Talvez necessitemos deste equilíbrio, se não enjoaríamos
rapidinho daquilo que é bom. Emily compreendia aquela regra
da vida como ninguém.
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- Mas podemos comer algo um pouco mais saudável. Gosta de
sorvete?
- Adoro!
Caminharam até a rua em direção a banca de sorvete.
- Diga-me Roberta, por que está sempre aqui?
- Minha mãe, ela estar passando uns tempos aqui, tenho que ficar
com ela o tempo o todo. Roberta saltitava segurando a mão de
Emily com força.
- Sua mãe, o que ela tem?
- Ela está doente, os médicos dizem que as esperanças estão
vivas, porém apenas até que ela vá para o céu, e disseram que
não demora muito para que ela viaje.
- Eles tentam amenizar os fatos para que eu não sofra, mas sei
bem o que estar acontecendo.
- Eu sinto muito. Emily estava vendo o exemplo perfeito de
como queria que todos agissem diante de sua situação.
81
Desde esse dia Emily passava horas com a doce pessoa que era
Roberta, doce e forte como ela gostaria que todos fossem ao seu
redor.
Roberta se tornara uma personagem crucial a sua constante luta
por encontrar sentido a vida.
CAPITULO XIV
Um pouco a frente no tempo na vida de Léo.
Léo agora tinha tempo e disposição para por em prática todos
os planos que havia desenvolvido no passado e os novos planos.
A sua felicidade simples precisava ser descrita de alguma forma,
e sua conversa com Roberta estava lhe enchendo de ideias.
Roberta estava lendo o pequeno príncipe, o livro da felicidade
para Léo. Ele já tinha lido várias vezes, no entanto Roberta era
de uma graciosidade ao ler, sua boa dicção, seu timbre de criança
deixava a narração com o charme necessário ao livro. Léo ouvia
atentamente e tinha a idéia de escrever seu livro, cujo conteúdo
seria inteiramente enredando a felicidade. Ele estava entendendo
ou percebendo que a felicidade plena só é possível enquanto
criança, se não, no mínimo a felicidade é natural nesta fase da
82
vida. Em outras desenvolvemos as formulas de sermos felizes e
gastamos tempo demais nas formulações e esquecemos-nos de
ser felizes. Quando criança se é feliz sem fórmulas, apenas se
vive a felicidade. Suas idéias fluíam naturalmente, era a sua
chance de viver a infância no seu perfeito encanto, com o
encanto que toda criança que respira merece, porém a vida é
injusta. Enquanto criança, ainda não se tem autonomia para
fazer a justiça em relação a vida.
CAPITULO XV
Tornados
Uma de sua ultimas entregas inteiramente em prol de Emily
havia sido na viagem para os Estados Unidos, para uma visita a
sala de esperança de justiça daquele país. Que diziam ter sua
esperança, baseada no poder econômico, relativamente maior
que a nossa.
83
Emily não estava interessada em servir de cobaia para nem uma
experiência inovadora para evitar um capricho que a vida lhe
propusera. Ela só queria realizar um velho sonho, que não sabia
como surgira em sua mente. Apenas sabia que queria ver a
formação de tornados, e Léo estava disposto a realizar este
sonho.
Foram todos para a terra do tio Sam exatamente na época da caça
aos tornados, data escolhida propositadamente. chegaram
primeiramente na a capital do país, só depois iriam para a região
de Oklahoma, onde fica a famigerada “Tornado Alley” região
montanhosa dos estados unidos com eventos anuais de
tempestades, furacões e tornados. Léo já havia pesquisado
anteriormente, feito todos os preparativos, Contratado os
serviços de uma empresa séria de caça a tornados para
aventureiros. Emily estava pronta para se tornar uma “storm
chasers” mesmo sabendo dos riscos. Riscos estes que eram com
certeza amenizados com a contratação de uma agência séria,
especializada nesta área. Sabia ela que, mesmo com cautela e
segurança, a caça a tempestades apresenta riscos como; queda de
raios, granizo, grandes inundações, isolamento por conta de
estradas destruídas, destruição da rede elétrica e visibilidade
reduzida por conta de chuva, poeira ou nevoeiro.
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Emily não estava preocupada, esse era um sonho que há tempos
evoluía em sua mente e não queria perder a chance de realizá-lo.
A viagem aconteceu no mês ápice da temporada de tornados,
uma bela e ensolarada manhã de junho no país de onde saíram.
- Definitivamente a natureza e o homem são incríveis. Estamos
saindo aqui de um local calmo e ensolarado e em questão de
horas estaremos próximos do mais belo espetáculo da natureza
com toda a sua grandiosidade. Emily suavemente deixava essas
palavras saltarem de sua mente a Léo já no avião.
Sônia e a mãe de Emily as acompanhavam algumas poltronas à
frente, no entanto nem Sonia nem a mãe de Emily sabiam que
ambos tinham planos mais ambiciosos para aquela viagem.
O tempo passou apenas algumas poucas turbulências ao longo da
viagem, Emily não tirava os olhos da janela; adorava ver o
contraste das nuvens brancas com as que do alto pareciam cinza,
porém ela havia criado a sua própria cor das nuvens, ela não iria
mudar seu fascínio por aquela forma de vida tão extraordinária;
Fitava aqueles algodões de água e imaginava o quanto estava
próximo de tão rara beleza da natureza, no entanto todo aquele
metal à sua volta a impedia de sentir o vento, sentir a sua própria
85
vida em sopro em meio às rajadas de ventos que soprava além
daquelas paredes de metal que os mantinham pairando no ar.
Ao chegarem, se dirigiram para o hotel. Nos primeiros dias de
viagem não havia espaço para nada, se não para alimentar uma
esperança que havia nos corações de todos que se encaminharam
para aquele país, uma esperança que de certo era apenas uma fé
boba, uma vontade. Talvez não fé, era apenas desejo, um desejo
que a vida de todos retornasse a seu curso natural, pelo menos ao
do resto da humanidade, porém Emily seguia o curso de sua vida
da forma como ela lhe impusera. Havia em sua mente o
pensamento de injustiça, no entanto quando o tempo de um
indivíduo é encurtado ele passa a possuir todas as características
das faixas etárias da vida que ainda não viveu, e adquire a
capacidade louvável de reviver em sua mente as fases que um dia
já viveu com uma intensidade incrivelmente maior.
Emily havia adquirido uma maturidade que não havia nela
pouco tempo atrás, de vez em quando era rabugenta, e
principalmente tinha se tornado uma sonhadora como nos tempos
de criança e adolescente, se bem que não havia muito tempo que
vivera estas fases.
86
Ela tinha a maturidade para viver a intensidades de seus
segundos presentes sem pensar no passado ou futuro. Uma
característica que talvez não seja de uma pessoa madura e sim de
uma criança feliz, Emily era feliz apesar de tudo, apesar da vida
ter sido injusta. No fundo ela sabia que não podia tratar a vida
coletiva como uma entidade que decide os acontecimentos da
existência dos homens.
A vida é assim simples! Não é um ser que determina nada. É a
existência biológica de qualquer ser vivo que tem o prazer de
viver. O ser humano já ao nascer estar sujeito a todos os bens que
lhe é possível e os males, que esses sim, sem restrições são
possíveis a todo individuo independente de raça cor ou credo.
Emily tinha motivos para sonhar e querer realizar, porém muitos
destes sonhos se criavam em sua mente e se realizavam ali
mesmo, nos recônditos das nuvens de sua mente, talvez estes
sejam os sonhos realizáveis mais reais.
Emily passou três dias nos incontáveis testes que o dinheiro de
Léo diminuído bastante com a taxa de cambio podia pagar.
A esperança que apenas uma boa quantia em dinheiro podia
sustentar. Emily não necessitava daquela esperança, a sua real
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esperança estava em sua mente humana capaz de viver o presente
com a intensidade instintiva dos animais irracionais.
Depois de dois dias descansando dos atos heróicos daqueles
super heróis de poucos, dos mais favorecidos para ser mais
especifico.
- Definitivamente o senso que os humanos têm de justiça deve
estar completamente errado. Justiça há apenas em filmes e em
histórias em quadrinhos. Pensava Emily com seus botões
fechados.
Emily já não agüentava a ansiedade para ver os tornados.
Era chegada à hora, Léo sairia da capital com Emily até o estado
de Oklahoma para de certa forma realizar um sonho que também
era dele. Havia apenas um entrave em tudo isso. Sonia e a mãe
de Emily teriam que saber, era um pacote de dez dias não haveria
desculpas que poderiam usar para disfarçar uma viagem a
Oklahoma de tanto tempo. Então todos haveriam de se
encaminhar até lá para a caça aos tornados, essa nomenclatura
para Emily era revigorante, se sentia com a vida das estrelas.
A mãe de Emily ao ouvir os relatos dos dois sonhadores
estranhou de inicio, no entanto as frustrações da vida e das
88
tentativas em vão da ida a aquele país fizeram com que ela não
negasse um pedido tão cordial, e de uma bondade esplendorosa
que se via facilmente nos olhos de Léo que descrevia com
graciosidade seus planos com Emily. Não podia negar, era a
realização de um sonho de alguém que para ela era a vida.
Emily ouvia Léo relatando o seu sonho que também era dela. Ela
ouvia aquela voz que a fazia se sentir esplendorosa.
Sem nem um entrave viajaram até a terra dos tornados. Ao
chegarem se dirigiram para o alojamento que por fora parecia
singelo, no entanto era um forte construído para a proteção de
tornados.
- Devíamos ter um sonho mais seguro como caçar auroras
boreais, não acha Sônia? Perguntou Emily.
- É, por que vocês estão sozinhos nessa, eu não vou participar de
uma aventura tão arriscada.
- arriscada sim, mas pense na emoção e na beleza da formação de
um fenômeno tão grandioso da natureza!
- Não, prefiro a firmeza e o conforto de um local totalmente
seguro. Retruca Sônia.
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- Você que sabe, eu e Léo vamos com certeza.
- Vieram aqui para isso. Concluiu Sônia.
Sonia estava feliz por viajar para a maior potencia econômica do
mundo, para ela já era emoção suficiente, enquanto a mãe de
Emily, não conseguia esconder suas frustrações pela a pouca
esperança que a liga do jaleco sem cor daquele país a dera.
O especialista que os acompanharia naquela aventura era um
senhor pouco acima dos quarenta anos, cabelos loiros, um bigode
ruivo, e adorava fazer piadas, e brincar de assustar seus clientes,
dizia ele que era para aumentar a emoção de ver os tornados.
Disse ele logo no primeiro contato na chegada ao alojamento.
- Só existe uma regra em relação a tornados; se você não estiver
vendo o tornado indo a nenhuma direção visível, acredite ele
estar vindo em sua direção então é hora de correr. Lembrem
dessa regra. Sorriu abertamente o senhor loiro de bigode ruivo e
aparência forte.
Por sorte a mãe de Emily não entendeu.
- Mas não se preocupem. Eu me encarrego de indicar a direção
do salve-se quem puder. Brincadeira! Prometo que vão estar
90
seguros, já estou a mais de dez anos neste ramo, e nunca perdi
nem um soldado.
Léo no embalo das brincadeiras do senhor John brincou.
-Também com o preço que o senhor cobra se não garantir a
segurança. Estaríamos pagando pelo quê? Esta não foi uma das
suas brincadeiras mais inteligentes, no entanto John moldou sua
piada com outra qualquer para dar leveza ao momento.
- E ainda há uma chance de não ocorrer os tornados, não posso
garantir é um fenômeno da natureza somos pequenos demais
para controlar algo assim.
Emily pensou; a beleza dos tornados está exatamente na sua
grandiosidade. A cada segundo que se passava aumentava sua
ansiedade.
O senhor John começou a passar as instruções sérias.
E de vez e sempre uma piada para descontrair.
- Sabe o que faz os tornados perderem força e acabarem suas
atividades na vida terrena?
Emily gritou empolgada:
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- Não!
- É exatamente os destroços que ele suga quanto mais ele devorar
mais enche sua barriga e vai naturalmente perdendo força até que
desaparece. Então senhoras e senhores, se sentirem muito medo,
se joguem no tornado para que ele aplaque sua fúria o mais
rápido possível. No entanto creio que quem escolhe este tipo de
aventura turística não conhece o medo. Não é verdade? Disse
essas palavras fitando os olhos claros de Emily.
Emily por alguns instantes havia se esquecido de tudo, era
novamente em seu corpo e mente normal, como qualquer
individuo louco por aventura. Ela estava cheia de vida
exatamente como imaginou que seria.
Sônia ouvia sem entender muito bem o inglês, ela não iria se
aventurar com os dois, e não demonstrou interesse em ouvir as
palavras de John, o simpático homem sempre ao lado de sua
esposa, essa sim era totalmente ruiva, com grandes olhos azuis, e
sardas típicas dos ruivos.
Todos estavam encantados com o casal, e suas típicas
brincadeiras, a mãe de Emily não compreendia nada, mas sorriso
é uma linguagem universal e ela sorria com a alegria de sua filha,
92
que demonstrava uma felicidade que há muito tempo não notava
em seu semblante.
A primeira tentativa foi no segundo dia de sua estadia na região
de “Tornado Alley”. Emily e Léo ansiosos se dirigiram para o
jipe moderno do casal que os acompanhavam, começaram a curta
viagem até o sonho de Emily. Claro que havia mais turistas
britânicos, esses sim buscavam apenas estar em uma situação de
risco, para dar sentido a uma vida melancólica de países
desenvolvidos. Jovens universitários, um casal de uns trintas e
poucos anos que estavam em uma viagem romântica, um
meteorologista japonês, como se em seu país já não tivesse
fenômenos da natureza o suficiente. Porém nenhuma situação era
tão atípica quanto à de Emily e Léo; um casal de um país tropical
de belezas incontáveis estava ali para ver tornados. Todos
notavam o lenço que Emily usava, porém todos apenas
encantados com aquela cena incomum nada falavam sobre, nem
uma indagação desnecessária; apenas conversas sobre o que os
esperavam a poucos quilômetros. Parecia que todos notavam a
alegria de Emily e seu desejo de se sentir na igualdade justa em
relação ao restante dos aventureiros. Todos eram de uma
educação impecável, principalmente o jovem japonês, que a todo
93
o momento citava uma curiosidade que descobrira em seus
estudos sobre tornados durante a viagem:
- Só nesta região ocorre cerca de oitocentos tornados por ano.
- Imagine um funil girando sem parar na atmosfera. Agora
acrescente tempestades, chuvas e ventos que podem alcançar até
610km/h. Isso é um tornado, explica o jovem empolgado de
olhos puxados.
Emily estava encantada com tudo aquilo, ninguém estava lhe
proporcionando qualquer privilégio, definitivamente ela se
igualava a todos aqueles caçadores de tornados, e não era devido
à situação que não permitia os costumeiros privilégios. Era por
que todos compreendiam ou via nos olhos de Emily o seu desejo
de ser mais uma vez aquele ser humano vivo nos dois planos da
vida, mente e corpo. Perguntas não eram necessárias, bastava
olhar em seus olhos para ver a sua felicidade.
Ao chegaram a um local aberto, apenas capim verde dos dois
lados da estrada, via-se um contraste entre a vegetação verde
uniforme e o céu nublado em partes e em outras azuis como
nunca. Algumas plantações de milho ao longe, que só
abrilhantava aquela paisagem. Um local perfeito para observar o
círculo do horizonte. Emily já se encontrava em transe ao
94
observar todo aquele verde em contraste com o pouco azul do
céu.
Desceram todos do jipe, e John com seu tom cômico de sempre
dizia;
- Vamos torcer para não termos que enfrentar um f5.
Todos sem exceções riram.
Emily queria ir para a vegetação verde, sentir toda a vida que
havia ali a perder de vista. Ela queria correr, correr entre as cores
que pareciam estar mais vivas que nunca, no entanto a realidade
a impedia.
- Além daquele verde magnífico havia insetos, serpentes.
Explicava John para que não se distanciassem.
Ingressaram todos em uma estrada de terra com poucos locais
secos para pisar, lamaçais já davam uma nova cor às botas de
Emily. Caminharam até uma pequena estrutura de madeira que
se assemelhava a uma ponte, de certo porque com chuvas mais
intensas aquele local alagava em proporções maiores, já que não
havia lago ou qualquer local propicio para pontes ali. Apenas um
pequeno declive no terreno.
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- Espero que não ocorra uma enchente repentina hoje. Sussurrou
Emily no ouvido de Léo apoiando-se em seu ombro.
- Espero que não. Segure-se em mim, o terreno é bem imigre.
Disse Léo sorrindo e mirando em seus olhos. Emily segura mais
forte em seu ombro e sorrir, em um gesto simples olham para
frente com um ar de felicidade admirável. Emily sentido-se
segura, e sem preocupações.
O tempo naquele momento havia parado, havia apenas o presente
da forma como sempre sonhou.
John em um tom de voz alto diz:
- Parece que estamos com sorte! Vejam há uma super célula em
formação logo à frente. Ele já havia visto, e seus equipamentos
meteorológicos já o tinham alertado do fenômeno a tempos atrás,
ele apenas gostava de demonstrar aos turistas a emoção de
encontrar o tesouro como “Indiana Jones”. Ele não precisava
disfarçar muito, via-se em seu semblante a emoção de estar
prestes a mostrar algo com que ele já se encantava há tempos.
- Acredite, não importa quantas vezes você ver um tornado, a
experiência nunca se torna monótona, é sempre de uma emoção
impar. Dizia John com uma atuação real de empolgação guiando
96
o grupo para uma área de boa visão e que ficasse bem próximo
da estrada.
A esposa de John ficara no carro com os equipamentos passando
via rádio todas as informações para garantir a segurança.
A empolgação de John era multiplicada no coração de Emily. Ela
notou a grande nuvem de quilômetros e azul no céu, ventos
fortes, respingos de chuva em seu rosto.
Esperaram alguns minutos, o tornado começou a se formar nas
nuvens e rapidamente toca o solo. Emily com os olhos fixos
naquele fenômeno, os respingos se tornaram gotas de chuva
forte, Léo colocou a capa em Emily, ela não tirava os olhos do
pequeno tornado, a correr paralelo a ela. Enquanto Léo filmava
aquela maravilha, Emily gritava de emoção, ela não queria
pensar em nada, na vida, na vida dos que os cercam, em nada,
sua mente se esvaziava em quanto gritava de emoção.
- Dá um (tchauzinho) pra câmera! E um sorriso claro! Disse Léo
mirando a moderna filmadora em sua direção. Emily acena
involuntariamente, seus olhos fixos no tornado se desmanchavam
em lágrimas que se disfarçavam com as gotículas de chuva. Há
tantas utilidades na chuva! Pensou Emily com seus botões.
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Emily queria seguir o tornado, queria sumir junto com ele, em
ninguém havia mais destroços do que em sua existência curta, a
vida já era para si destruída. Ela era bela, no entanto os
periféricos de sua mente já haviam sido arrasados pela existência
avassaladora das injustiças de estar viva. Gritava desejando que o
tornado a ouvisse, que o tornado compreendesse seus gritos que
ninguém mais podia compreender. Ela era um tornado carregado
dos destroços de uma vida que se destruía com o tempo que
corria paralelo a tantas outras vidas que precisavam ser poupadas
de suas mazelas e tristezas. Emily disfarçava até seus gritos para
não parecerem que ela queria ser ouvida. Porém um dia ela teria
que expulsar todos aqueles gritos que não foram ouvidos.
Naquele momento extraordinário, ao redor de Emily havia
equilíbrio entre a grandiosidade de sua mente e a imensidão da
realidade. Naquele instante Emily compreendeu seu fascínio por
tornados, e tempestades. As explicações surgiam em sua mente
como a chuva que banhava seu rosto devido o forte vento
impulsionado pelo tornado. Compreendeu que via a realidade
pequena demais em relação à grandiosidade de sua mente. Com
aquele espetáculo entendeu que na verdade ela buscava apenas o
equilíbrio entre as aspirações de sua mente sonhadora e a dura
realidade que assolava sua existência. E ao presenciar tão
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incontrolável fenômeno da natureza ela encontrou este equilíbrio
que há tempos buscava, mesmo sem ter consciência dessa falta
que havia em sua existência.
O tornado de sua vida ia-se em tese de acordo com que o real
desaparecia para os olhos de Emily. Infelizmente o tornado
durara apenas alguns minutos, mas foi tempo suficiente para que
Emily atingisse todos os seus objetivos.
Nada além podia ser visto a escuridão sombria de qualquer
sentimento que insistia assolar a existência significativa a
cegaram. Emily se encontrou ao ver dentro de si, por sorte alguns
movimentos involuntários refizeram o caminho de onde viera.
Voltaram ao jipe Emily aparentemente, e de certa forma contente
e em silêncio dirigia-se de volta ao seu mundo real.
O tornado durou alguns minutos, eram fenômenos rápidos e
devastadores. Já era quase noite precisavam voltar para o
alojamento. Emily estava cansada daquela aventura que para ela
tinha sido apenas a observação de algo que a encantava, no
entanto em sua mente aprofundara sua dor, mesmo tendo
desaguado parte dela durante os minutos que durara aquela
exibição da natureza que equilibrara a imensidão do universo em
sua mente com a realidade pequena e comum da vida.
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- Foi um golpe de sorte termos presenciado um tornado no
primeiro dia de caça! Não acha Emily?
Indagou Léo na intenção de instigar voz naquele silencio em
Emily. Aparentemente ela devia estar feliz, por ter visto de perto
algo que preencheu em parte seus sonhos por um longo tempo,
no entanto se encontrava em um silencio que já se tornava
perturbador para Léo.
Emily permaneceu em silêncio por alguns segundos após a
tentativa de Leo iniciar um assunto. Olhou em seus olhos, apenas
um singelo sorriso de canto de boca como que forçado. Léo
estranhou o seu comportamento:
- Não compreendo sua atitude, não era o seu sonho Emily?
- Não leve a mal minhas atitudes. Hoje fui muito feliz e ainda
estou sendo em minha mente. Estou em silêncio apenas curtindo
as lembranças dos poucos minutos que presenciei um belíssimo
tornado.
- Você viu? Algo de uma força tão magnífica, não acha?
- Não se preocupe vou ser eternamente grata por ter me
proporcionado a realização deste sonho que por um tempo o
tratei apenas como utopia.
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- Não tem de que, sua alegria é minha missão! Moça dos olhos
castanhos que me agrada muito quando estes demonstram
felicidade. Brincou Léo dizendo as mais sinceras palavras que
um homem podia dizer para alguém que tem um curto tempo de
vida.
Ao voltarem para o alojamento. Encontraram Sônia entediada
lendo uma revista de automóveis no sofá a luz de velas, enquanto
a mãe de Emily rezava assustada com os fortes ventos que
provocaram a queda de luz na região.
- Então viram os tornados, aventureiros? Perguntou Sônia com
um ar de felicidade ao ver que agora teria companhia para uma
boa conversa.
- Claro! Disse Emily quebrando o silêncio de poucas palavras
durante o percurso até o alojamento.
- Emily não parece tão feliz, quase não falou depois de ver o
tornado. Disse Léo.
Retrucou Emily:
- Acredito que minhas palavras só iriam atrapalhar o estudante
japonês empolgado que tagarelava sem parar.
101
Concordou Léo com qualquer gesto de confirmação:
- Amanhã já podemos ir embora! Já vimos o tornado, acredito
que Emily não agüenta mais um dia de tantas emoções e esforço
físico.
- É podemos sim. Disse em couro Sônia e a mãe de Emily.
- Concordo! Acho que esta experiência foi inesquecível, e se
ficarmos aqui só será mais despesas para Léo. Afirmou Emily.
Sônia já havia aproveitado a capital daquele país como compras
e visitas a cartões postais enquanto Emily participava das
tentativas de manter a esperança viva em todos do seu ciclo de
amizades. No fundo Emily também precisava daquela esperança.
Todos precisam acreditar até que o fim chegue e seja inevitável.
No dia seguinte; aeroporto, apenas a mesma burocracia de
sempre passaporte, viagem longa e tranqüila de volta as suas
pacatas vidas.
Ao chegarem a casa Emily queria apenas dormir e descansar da
longa viagem, e de pensamentos que a perturbavam, e de
lembranças, mesmo aquelas que serviram para o seu equilíbrio e
contentamento. Emily agora cada vez mais tinha fascínio pela
natureza e pelo céu, o céu de incontroláveis e belos fenômenos.
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Queria dormir e sonhar com o céu azul de nuvens carregadas de
águas, para amenizar os pensamentos que faziam apenas ela ver
a vida real e biológica, injusta e sem culpados.
“Dormiu e sonhou!”
CAPÍTULO XVI
O livro de total felicidade
Léo começou a escrever o livro que, segundo ele, seria o livro da
felicidade. Em teoria a felicidade devia ser algo vantajoso ao ser
visto na sua íntegra em algo que transpusesse alegria, no entanto
a superação necessária a toda boa história era também preciso ser
utilizada.
- Muitas pessoas possuem vidas comuns, não passam por grandes
sofrimentos e vencem na vida. Então a vida já é uma superação,
não concorda amor? Perguntou a Sonia.
- É a idéia que a felicidade é relativa diminui um pouco seu
conceito, no entanto há muito sentido em suas palavras.
- Então está decidido, em meu livro contarei a historia de uma
vida comum de felicidade inicial e constante evolução da mesma.
103
Léo então inicia as primeiras palavras enquanto Sônia prepara
algo para comerem depois de um longo e gratificante dia na
biblioteca.
Ela larga o fogão e com o ato costumeiro de permanecer com
uma colher na boca em quanto cozinhava, vem em sua direção:
- Deixe-me ver suas primeiras palavras.
- Não! Disse Léo.
- Não se aprece. Você só irá ver quando a obra estiver completa.
Curiosa! Tirou os dedos dos teclados e beijou seu ombro com
aquele cheiro magnífico de sabonete que ele adorava, olhou em
seus olhos castanhos cor de qualquer coisa bela, sorriu e
continuou a digitar no teclado as palavras que segundo ele seria
as de um Best seller.
CAPÍTULO XVII
Antes da viagem aos Estados unidos: o pedido
Léo caminhava com Emily em uma calçada escura numa rua
qualquer da cidade; cheia de vida, de vitrines. Há passos lentos,
um segurando-se na insegurança do outro. Uma conversa casual
ali, outra aqui, na tentativa de esquecer a realidade que Emily já
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aceitara com a serenidade de uma sábia oriental que vive nas
montanhas de uma névoa qualquer.
- Acho que está na hora de você arranjar alguém. Disse Emily
demonstrando segurança no que dizia.
Léo estranhou aquele comentário:
- Por que deveria? Perguntou ele.
- Há você já não é tão jovem! Precisa pensar no futuro, na vida à
frente. E não sei se você sabe, mas na sociedade em que vivemos
quem não casa até os trinta é considerado um fracassado.
- Ainda estou bem distante dos trinta.
- Não quero saber, você precisa continuar a sua vida, conhecer
alguém especial.
- Eu já tenho você de especial na minha vida.
- Sabe do que estou falando!
Léo notou seu tom de seriedade ao dizer aquelas palavras.
- Pois me apresente alguém! Disse ele ainda em um tom cômico
não querendo crer nas palavras que saia da boca de Emily, ou do
coração.
105
Caminhavam eles em uma desconcertante estranheza de assunto.
Léo queria corresponder às expectativas de Emily quanto aos
seus desejos de ser feliz enquanto ainda podia respirar.
Mas aquele assunto lhe deixava intrigado, com incertezas, com
um desagradável desconforto no estômago, uma sensação que o
impedia de expressar o seu real sentimento naquele momento,
apenas sorrisos amarelos transpareciam em sua face que de
forma alguma desejaria ouvir aquelas palavras:
- Falo sério! Emily fixa os olhos em Léo.
- Que tal aquela moça ali entregando panfletos do outro lado da
rua?
Léo mira para a rua e nota uma moça inegavelmente linda, de
cabelos longos a entregar panfletos para os poucos que
aceitavam.
- Mas, você sabe que não posso Emily.
- Por que não? É lógico que pode e deve.
Emily queria do fundo de sua alma que Léo encontrasse alguém,
viver para alguém que tivesse uma vida tão longa quanto à dele.
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Léo remoia sentimentos em sua mente e coração, sentimentos
esses que não condiziam com a realidade, talvez com o mínimo
de vida real que restara ou lhe sobrara dos tempos passados que
não foram tão fácies de se viver, no entanto os desejos de Emily
tinham sentido. A vida precisava começar, não seria um
recomeço, seria puramente um inicio.
Emily sabia que precisava representar alguns inícios, não para
que sua vida biológica tivesse sentido, jamais tem. Seria para que
sua mente repousasse em sua colina perto do céu e poder ver a
felicidade de todos que ela ama em sua plena e temporária
satisfação.
Depois de remoer, engolir e regurgitar essas idéias, Léo decide
atender os desejos de Emily e tentar uma aproximação com a
linda moça dos panfletos.
Léo deixa Emily em sua solidão solidária e atravessa a rua.
Aproxima-se da moça que lhe oferece um panfleto de qualquer
ação solidária de alguma ONG que ele não conhecia.
- Oi. Disse Léo sutilmente para não assustar a bela jovem.
- Oi!
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- Eu sou um mágico! A moça estranhou um desconhecido em
plena tarde com aquela atitude.
Léo faz gestos com as mãos repetidamente, tentando imitar um
mágico, sem obter resultado:
- Deveria surgir uma rosa, disse o jovem galante.
- Acho que estou perdendo os meus poderes.
A jovem riu e complementou:
- O problema devo ser eu. Talvez eu seja sua “criptoníta.”
- Qual o seu nome?
- Sônia. Respondeu a moça sem pestanejar.
- Estou com aquela linda jovem do outro lado da rua. Podemos
ajudá-la a entregar os panfletos.
- Toda ajuda é bem vinda. Disse ela com o tom de segurança.
Léo logo notou que Sônia era uma moça bastante sociável além
de agradável aos olhos.
Léo vai até o outro lado da rua e volta trazendo Emily,
conduzido-a pelo braço.
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Foram feitas as apresentações clichês comuns a pessoas
desconhecidas, e começaram a abordar as pessoas naquele final
de tarde. A aparência de Emily e o lenço mágico em sua cabeça
ajudaram e muito as pessoas a aceitarem os panfletos.
Emily sabia que o sucesso naquela atividade temporária se devia
muito mais a sua simpatia que as razões a levaram a usar aquele
lenço. Quando o destino de ágüem já está traçado sem muitas
chances de mudá-lo, o recomendável é aproveitar todos os
benefícios que a vida oferece e da melhor forma possível antes
que este se concretize.
Todos conversavam e trabalhavam; Léo sempre muito simpático
e brincalhão, Sonia demonstrava ser de uma inteligência
louvável.
Eles conversavam e ganhavam intimidade, não era uma tarefa
difícil tanto Emily quanto Sônia possuíam características muitos
sociáveis que facilitavam, e muito, a convivência de pouco
tempo.
O tempo passou, já era tarde quase noite, não havia sido
exaustiva a entrega de panfletos como esta narração exigia.
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Léo então convida Sônia espontaneamente para tomar um
sorvete e claro; Emily teria que ir junto.
Sonia não recusou, estava faminta, e cansada bem mais que Léo,
pois já trabalhava a bem mais tempo.
Foram-se os três para a sorveteria, Emily sempre a puxar assunto
com Sonia na tentativa de convencer Léo que Sonia era uma
moça interessante e como ela tinha interesse que eles se
conhecessem mais profundamente. Um assunto ali outro aqui,
aquela amizade prometia. Não foi preciso muito tempo para que
Léo se encantasse por Sonia e Sonia começava a admirar a
bondade nítida em seus olhos.
Sonia curiosa pergunta por que Emily usa aquele lenço.
Emily fez questão de responder:
- O destino e a vida me agraciaram com algumas injustiças
irreversíveis.
- Eu sinto muito! Disse Sonia.
- Não se preocupe já superei e aceitei o destino, superei não,
apenas vou viver meus últimos trilhões de segundos fazendo o
que desejo, fazendo a vida ter sentido. Descobri que o tempo de
110
vida de alguém não deve determinar a intensidade dela. Por tanto
vou viver intensamente proporcionando a minha felicidade e na
medida do possível proporcionando a felicidade dos que me
cercam.
- É um bom sentido para a vida. Sonia parecia bem mais
encantada com Emily do que com Léo.
Emily complementou:
- Por tanto estou tentando arranjar uma namorada decente para
este meu amigo aqui.
Léo tímido e incomodado com o comentário saiu e foi ao
banheiro.
Sonia sorriu.
- Deve haver muitas moças capazes nesta cidade e especialmente
belas.
- É mais ele gostou de você. Com Léo no banheiro as duas já a
vontade trocavam confidencias como se se conhecem por uma
vida. Sonia era uma moça respeitosa e de uma calma elegante e
formidável. Certo que não era nem uma garota da alta sociedade,
entretanto era uma moça esforçada, batalhadora, inteligente,
111
definitivamente encantadora. Sonia ao certo não era uma garota
fácil de ser convencida, no entanto ela se encantara com aqueles
dois e nada a impedia de continuar uma amizade já iniciada. Era
preciso apenas deixar o destino se encarregar de caprichar na
construção daquela amizade, ou não, uma bela amizade é
construída com laços entrelaçados pelas pessoas e não por
capricho de destino. O destino se encarrega apenas de unir as
pessoas, seja pela razão que for. .
- Eu fiz o fujão, prometer que vai fazer de tudo para ser feliz e
me fazer feliz. Então está ele atado aos meus desejos e planos.
Brincou Emily
- Maquiavélica você!
Léo retorna depois de longos minutos no banheiro. Nunca
saberemos o que Léo fez durante todo aquele tempo de reclusão
no toalete, no entanto podemos imaginar o que alguém faz diante
do sacrifício.
Depois deste encontro um tanto peculiar Emily fazia questão de
manter uma proximidade acentuada entre Léo e Sonia. Ela queria
e precisava que Léo aprendesse a amá-la.
112
Certo dia após o encontro de apresentações, o romance inevitável
de Léo e Sônia fora elucidado, também pudera com uma
alcoviteira de tamanha elegância como! Sonia não sabia muito da
história que unia Léo a Emily, e na verdade não importava, ela
estava feliz com Léo. A cada dia que passava mais ela admirava
os dois, que em tão pouco tempo havia se tornado amigos tão
expressivos e Léo um conseqüente e inevitável amor.
Emily parecia um tanto controladora, no entanto era graciosa e
engraçada ao usar as palavras, sem contar que a situação em que
se encontrava lhe proporcionava um mimo especial de todos que
lhe permitiam a condição de guru do amor sem ser contestada.
Ela também fazia questão de que os dois tivessem seus próprios
momentos para construírem seus sonhos e fazerem planos.
Léo passou a diminuir o tempo que gastava com Emily, fazia
questão de está com Sônia sempre que podia.
113
CAPÍTULO XVIII
Uma prova de amor
Léo gastava horas do seu dia em seu projeto de felicidade, fazia
uma pausa apenas quando Roberta aparecia para visitá-lo, ou
quando ele mesmo ia vê-la na sala de tentativa de justiça. As
visitas não eram raras já que ficava próximo de sua biblioteca.
A cada dia a mãe de Roberta se aproximava mais da viagem
inevitável que a levaria para o descanso interminável de sua
alma. Roberta não se dava conta que ficaria sozinha no mundo,
jamais conhecera seu pai. Sua mãe jamais tinha contado o que
acontecera, disse apenas que ele havia sumido pouco tempo
depois de saber que ela estava grávida. Ela não tinha a menor
intenção de esconder a identidade de seu pai, apenas sempre
disse que não valia apena conhecê-lo.
A história de Roberta seguia a ordem de muitos que vivem em
meio às mazelas da sociedade. Roberta sempre aceitara o fato
com serenidade, e como sempre ouviu de sua mãe que seu pai
não traria uma vantagem imaginável fez com que ela sempre
aceitasse o fato com sabedoria. Na verdade sua mãe sequer
permitiu que ela aguçasse uma curiosidade sobre o pai. A
realidade de uma vida se difere e muito de roteiros de filmes e
114
boas estórias dramáticas. Dramas da vida real que dariam e dão
bons roteiros são exceções as regras.
A vida de Roberta apesar da dura realidade que se encontrava
não havia um drama acentuado, não em seu ponto de vista. É
incrível e notável a capacidade que os humanos possuem de
sempre ver a vida do outro, mais dramática que a sua, fazendo
assim a magia dos filmes, dos livros da vida, da grama mais
verde...
Léo tinha consciência da realidade de Roberta e jamais a
abandonaria:
- Como abandonar alguém que ele aprendera a gostar tanto?
Dizia ele para Sonia, que acenava com a cabeça em um gesto de
confirmação. Ele via Emily em Roberta, no entanto era inegável
e gratificante ver nela uma personalidade tão diferente e forte
que a deixava especialmente magnífica.
- Não me preocupo Léo, quando chegar à hora, sei que vai agir
com sabedoria.
- Roberta não tem ninguém alem da mãe. Não vou abandoná-la.
- A ordem da vida é inevitável e ela irá ficar sem ninguém logo.
115
- Você já faz muito por ela, você é um exemplo de ser humano.
Disse Sônia com os olhos a lacrimejar de emoção.
- Como está seu livro?
- Perfeito. Disse ele
- Ta conseguindo manter a felicidade em toda a estória?
- Com certeza. A felicidade é apenas sensações. Como dizem a
dor é inevitável, mas o sofrimento é opcional. É claro que a vida
às vezes pode ser dura a ponto de não ser possível sermos
racionalmente felizes, no entanto às vezes precisamos nos
beneficiar de nossas características irracionais e menos humanas.
- tudo bem, se você diz que a felicidade é sempre possível eu
acredito.
- Antes pensava que não, porém a vida me mostrou que é sim
possível.
- Espero que termine logo. Estou curiosa para lê a sua obra de
arte.
- Não se preocupe que será a primeira a ler. E não irá demorar,
muito já passei da parte que escrevo o livro, agora ele estar se
escrevendo. A sensação é como um orgasmo para quem escreve.
116
- Nossa! Bela analogia.
Léo se encontrava hoje em plena felicidade de seus segundos
presentes, e Sonia compartilhava este sentimento. Ele pensava no
que já havia passado; nas dificuldades de outrora e hoje estava
com uma família bem estruturada, apesar de apenas dois
membros diretos; na verdade três. Roberta já era considerada da
família.
CAPITULO XIX
O acontecimento
Uma bela tarde na praia um belo casal a correr, movidos por
típicas brincadeiras e beliscões de uma paixão em plena
vivacidade. Corriam, manifestavam e exercia um amor de
verdade, quando em uma brincadeira qualquer Emily deita-se
suavemente na areia branca e fofa da praia. Léo um pouco atrás
continua a correr até alcançá-la, imaginando que ela se deitara
apenas para descansar. Com a intenção de fazer o mesmo repete
seu gesto deitando-se em posição contrária a dela. Tenta abraçá-
la e ela não se mexe, é então que ele percebe que algo está
errado. Ele senta para poder observá-la melhor e nota que seus
olhos estão fechados e sua pele pálida como nunca. Uma triste
117
frieza enche seu coração e uma preocupação justa preenche todo
seu corpo.
Ele com a calma que lhe era possível e com reação que lhe vinha
à mente pega o corpo flácido e quase sem vida em seus braços e
corre até o carro, depois de verificar que ela ainda respirava.
Coloca-a no banco de trás e com o devido cuidado a envolve
com o cinto e avidamente se direciona para o hospital da cidade.
Chegando ao hospital com a ajuda dos enfermeiros Emily
rapidamente é encaminhada para o atendimento devido à
gravidade da situação. Léo tenta acompanhar a maca, entretanto
é impedindo com êxito por um enfermeiro que se utiliza das
frases clichês para desvencilhá-lo de sua caminhada e da ligação
que tinha com aquela doce garota que agora com certeza estava
precisando de sua ajuda.
Léo obrigou-se a ficar na sala de espera com a típica aflição das
esperas que sempre trazem maus pensamentos. Aproveitou o
momento para avisar a mãe de Emily que prontamente desliga o
telefone e se direciona para o hospital. Ao chegar o ver em uma
agonia justa. A partir de então, apenas às típicas cenas clichês se
sucedem, as cenas que eram predeterminadas pela situação de
Emily que tão comum a vida humana não precisam ser descritas.
118
Ele conta o que ocorrera na praia em todos os detalhes, deixando
a mãe ainda mais desnorteada. A falta de noticia e as constantes
suposições sobre o que poderia ter ocorrido com Emily deixavam
os dois desesperados.
Depois de um longo tempo de espera o médico de jaleco verde
claro se aproxima:
- Familiares de Emily Lewick!
- Somos nós! Responderam em coro.
-Diga-me doutor o que aconteceu com Emily? Indaga mãe de
Emily com a voz tremula de aflição.
-Tenho que ser sincero com vocês, as notícias não é das
melhores. Ela está com um quadro avançado de câncer na
hipófise. Devido ao seu estado o tempo de vida dela não passará
de... Estipulou um tempo curto de vida para Emily.
Léo não conteve as lágrimas e sentou-se sem forças em uma
cadeira acolchoada ao seu lado. Inevitavelmente em sua mente
começaram as indagações, as malditas indagações como se a
vida não pudesse continuar de forma alguma a partir daquela
notícia. E quando Emily souber? Qual será a sua reação? O que
vamos fazer? O que eu vou fazer? Como vou encará-la? E o que
119
fazer com meus sentimentos? O que fazer com os sentimentos
dela? As perguntas, as incertezas, a vida em contraste com a falta
de vida preenchiam involuntariamente sua cabeça.
A falta antecipada da presença de Emily já o afligia o mundo
como ele conhecia estava desmoronando em sua mente. As
lágrimas escorregavam sobre sua face em desespero como uma
cachoeira desaguando todas as alegrias de sua mente. A sua dor
era neste momento dupla e justa, ele sofria por ele e por Emily,
imaginando a dor que sentiria ao ter que conviver com aquela
nova realidade.
Ele sequer ouviu as ultimas palavras do médico que já se
retirando proporcionava a família um gesto automático de apoio.
A mãe de Emily senta-se em desespero, suas mãos não se
encontravam, seus gestos desconexos denunciavam a dor que
qualquer um entenderia só de imaginar, entretanto nunca a
imaginação de alguém chegaria à intensidade que é sentir
deveras a dor que os dois sentiam e transmitiam em um
profundo desconcerto.
Léo não perguntara se Emily estava acordada e já estava ciente
do que lhe ocorrera, aquela noticia o perturbou de tal forma que
lhe tirara a capacidade de raciocínio lógico.
120
Emily aparece naquela nave de rodas que não a elevaria até as
nuvens, no entanto era o inicio de um caminho até lá bastante
significativo. Nave esta que seria sua companheira em muitas
visitas aquele mesmo local a partir do fatídico dia de verão que
mudaria sua vida para o eterno tempo lhe restava.
A mãe olha aquela cena e as lágrimas começam a desaguar uma
dor agora já desmerecedora. Emily pede em um gesto qualquer
em conjunto com um carinho que a mãe se acalme. Léo
paralisado em sua mente corre em todas as direções no corredor
sem saber como reagir. Embora o desespero fosse normal
naquele momento ele tinha receio que Emily não suportasse sua
dor e também se desesperasse. Sem resistir às emoções ele se
entrega e desaba sobre o colo de Emily em um choro aterrador e
justo.
Emily passa a mão em seus cabelos e apenas diz as primeiras
palavras que lhe vem à cabeça, palavras estas que
definitivamente não partiam do coração:
- A vida imprevisível me proporcionou este destino, não cabe a
vocês intensificarem minha dor; preciso que todos sejam com
certezas mais fortes que eu.
121
É uma tarefa árdua, porém necessária. Emily estava sendo
sensata, uma sensatez que Léo quis acreditar que ela adquiriu
devido ao efeito de algum remédio. Ele sofria como nunca
naquele momento, a sua felicidade estava em jogo, a sua vida
planejada com tanto amor sentado ao cais na praia mais calma da
cidade ia-se com aquela triste notícia. Emily sempre calma
tentava sem sucesso acalmar os dois ali presentes, seria uma
tarefa árdua e que levaria um tempo para ser concluída, talvez
nunca totalmente, no entanto a habilidade do ser humano de
resguardar suas dores é admirável e a partir de entao precisaria
ser bem e sempre utilizada por todos.
Eles precisavam retornar para casa, Emily por enquanto não
tinha mais nada a fazer naquele local, entretanto precisaria voltar
ali mais do que gostaria. Ali ou a qualquer outro que seguisse a
mesma linha e falta de cores deste.
Sem condições nem para controlar suas emoções Léo entra em
contato com um amigo para levá-los até a casa de Emily. Ao
chegarem todos presenciaram um novo tipo de dor, a de retornar
aos locais que conviviam em plena felicidade e agora ter que
notá-los e já sentir uma saudade de poucas horas atrás. A cada
novo olhar em qualquer que fosse o local daquela casa nascia
122
uma nova lágrima, e as dores se intensificavam, foi ai que nem
Emily se conteve e se deixou levar pelas as emoções.
Léo leva-a até o quarto, onde por muito tempo serviria de local
para resguardar suas dores e que por longo período foi o local
onde guardou boas lembranças. Emily fita sua coleção de
bonecas, sua escrivaninha, penteadeira. Toda uma vida se
encontrava naquele quarto, ainda intacta. Ela olha para agenda
onde escrevera todos os momentos importantes de sua vida, e a
vida começa a passar rapidamente em sua cabeça: as alegrias
passadas, as lembranças ao lado de Léo. Sua felicidade ia-se de
acordo com que as recordações surgiam em sua mente.
Léo não iria abandoná-la naquele momento, e a todo instante
fazia questão de repetir isto para ela em palavras e gestos de
carinho, beijos e abraços que Emily aceitava comprazer. O medo
finalmente ou já atrasado surgira em seu coração, pensou na
morte, no fim de sua vida e no destino injusto que a vida
composta de células frágeis e desordenada lhe proporcionara.
Então a sensatez começa a dar o ar da graça novamente nos
pensamentos de Emily:
- Já que a vida me ofereceu este fim, vamos ter que aprender a
ser feliz com o mínimo que me resta. O que eu cabo de dizer?
123
Questionou ela a si mesma. Que palavras mais indignas acabam
de sair de minha boca! Nunca mais repetirei palavras tão
injustas. Léo! Ainda sou eterna e a vida está em mim. A
felicidade que todos desejam ainda se encontra intacta em meu
coração e mente. Não perderei tempo imaginando momentos que
me farão felizes, vou tratar de ser feliz nos meus segundos
presentes, assim como havíamos planejado. Não importa o meu
tempo de vida, ele não determinará a intensidade nem a
dimensão de minha felicidade. Dizia estas palavras aos gritos
torvos forçando sua garganta com toda força e poder que havia
em sua mente.
Léo apenas concordava estático àquela reação. Pensamentos
injustos e humanos transitavam sua cabeça em uma constante
discrepância entre mente e coração. Havia tanto a si pensar sobre
tudo o que ocorrera desde aquele momento de alegrias na praia
que se transformou em uma tristeza incomensurável. Naquele
momento a vida dera uma reviravolta de todos os graus possíveis
e o deixara com uma dor profunda, aguda e sem precedentes.
Ele não conseguia pensar racionalmente em nada, na verdade a
única racionalidade possível em uma situação tão árdua seria
permitir-se sentir toda dor possível. E foi o que Léo fez, deixou
que toda aquela dor o inundasse com qualquer sentimento que as
124
malditas reações químicas em seu corpo o transmitiam nas mais
variadas sensações.
Sentou-se ao assoalho próximo a cama de Emily e deitou
levemente a cabeça em suas pernas. Ela agitava seus braços em
um movimento continuo como um tíquete nervoso, talvez em
uma tentativa de mostrar ao universo que ela podia ainda
movimentar-se e expulsar as injustiças ou o curso natural da vida
que em casos como este não tinha culpado.
Léo apenas grita, resmunga os mais altos alardes que um ser
humano pode emitir no silencio de poucos soluços que se
evidenciavam nos sopapos de seu corpo ao colo de Emily. Sentia
o calor da vida de sua amada numa leve camisola de linho de cor
branca. Ele não queria deixar de senti-la ele não podia deixar de
senti-la em seus braços. Ela dera um sentido a sua vida sem
razões, dera um sentido e um valor ao ar que respirava. A vida
lhe passava diante dos olhos que permaneciam fechados, olhos
que nada viam senão aquela dor incalculável.
Vira seu pai em constante ausência por conta do trabalho, sua
mãe indiferente sempre, a morte dela não justa, no entanto as
suas próprias atitudes e seu intimo relacionamento com o álcool
a levaram ao inevitável fato do fim de sua vida. Recordara o
125
quanto a sua vida não fazia sentido antes de conhecer Emily, o
quanto o ato de voltar para casa era algo desagradável para ele
em vez de ser prazeroso. o quanto a palavras lar era uma palavra
usada incorretamente quando usada para se referir a sua casa. Por
sorte não se encandeou por caminhos que o levariam a mazelas
sem volta da sociedade, fato que se consumaria logo caso não
tivesse conhecido Emily.
Toda a sua vida, desde a infância, onde foi tratado com o mínimo
para não dizer nada de carinho por parte dos pais passava como
um filme em sua mente. Era inevitável o pensamento de que a
vida o estava destinando a não amar e não ser amado. Por que
agora que estava tudo ocorrendo como ele sempre sonhou o
universo resolvera lhe tirar tudo novamente? Disse numa
tentativa de encontrar os culpados para o curso de sua vida.
O tempo passou Emily em seu silencio necessário deixou que
Léo sentisse a dor que lhe era útil sentir, usou esse tempo para
organizar as idéias, para também antecipar o conformismo
humano muito útil a nossa sobrevivência.
Em silencio, depois de mais de uma hora, quando todas as
lágrimas do dia si esgotarem, Léo em uma aparente calma
levanta-se olha nos olhos de Emily, toca seu rosto, enxuga os
126
últimos vestígios de lágrimas em sua face, da as costas e sem
dizer qualquer palavra segue para a porta do quarto e si vai.
Emily não esboçou reação alguma, qualquer que fosse sua
atitude poderia acarretar outra daquelas emoções sem fim.
Desconsolado retorna a sua casa, deita-se e fecha os olhos na
esperança de que o amanhã jamais chegue. Na esperança tola que
todos nós um dia na vida já sentimos; dormir para acordar de um
pesadelo que é a vida, sonhando acordado que vai despertar no
outro dia em uma nova realidade em que nada do que ocorrera
hoje fora real. Na verdade ele desejava que jamais acordasse
daquele sono para não ver a realidade novamente, porém a vida e
sua ordem são inevitáveis para todos.
Na manhã seguinte Léo acorda, abre ligeiramente os olhos, mas
torna a fechá-los numa tentativa de esquecer que ainda vive uma
triste realidade, porém sem sucesso. Ele olha a sua volta, nota os
raios de sol que atravessam a fina cortina da janela, e então
aquela sensação invade suas entranhas como um parasita que
entra pela boca e começa a devorá-lo rapidamente por dentro.
Uma ânsia de vomito lhe cai ao estômago com a força de um
meteoro. A vida continuava, o dia retornava com suas malditas e
velhas cores opacas.
127
Não queria levantar da cama, mais uma vez fecha os lhos para
tentar dormir, numa tentativa sem sucesso. Tentativas essas que
se repetiram incontáveis vezes aquela manhã, embora a realidade
sempre lhe mostrando a sua cortante existência, ele não parava
de tentar. A fé é de longe a mais perigosa peculiaridade do
homem. Às vezes ela nos prende numa realidade inexistente de
que ainda se é possível conviver com a vida real, entretanto ela
pode também nos levar a loucura de esquecermos a vida real por
completo e passamos a viver uma realidade particular em
conjunto com a imaginação, se é que dá para distinguir fielmente
esses dois conceitos.
Para alguns, a fé não nos priva da realidade, mas nos faz crer que
é possível encontrar um novo caminho, uma nova solução, ainda
que não a esperada, o que nos dá esperança e nova força para
continuar. Cada pessoa crie seu próprio conceito de fé. Leo, no
entanto, talvez quisesse uma nova realidade, só que cada vez que
abria os olhos à realidade lhe era inevitável. Sem conseguir
retornar ao seu sono do esquecimento e fuga da vida que tanto
desejara, então resolve levantar e enfrentá-la.
O que se seguiu foram apenas atividades corriqueiras de toda
manhã, só que com uma falta de força e vigor aceitável; banho,
escovação de dentes, um café preto com pouco açúcar, pega o
128
carro na garagem, respira fundo, era chegada à hora de rever
Emily. Neste momento já sentia um sentimento agradável no
coração, um desejo de rever a beleza de sua amada era inevitável
e gratificante. Era a paixão revelando o seu poder no forte
homem de pouca fé, foi esse sentimento que o dominou,
limpando sua áurea de qualquer vestígio de dor. Já na estrada
acelera, pois o desejo de rever os olhos de Emily era quase que
incontrolável.
Estaciona em frente a casa, e então nota o ar mórbido que havia
se instalado naquele local, ele o repugna e entra sem bater. Todos
estavam sentados a mesa do café, expressões cansadas, olheiras,
o que indicava que pouco si dormira ali.
Léo senta-se próximo a Emily, seus olhos ameaçam novamente
desaguar. Uma ou outra lágrima ainda ameaçava cair como a
situação o exigia, porém ele as conteve a duras penas.
Uma palavra de comprimento cordial aos sogros, uma pergunta
clichê de como estavam, se estavam bem, como passaram a
noite. Respostas clichês; na medida do possível foi tudo bem.
Emily levanta-se do seu silêncio, olha para Léo e deixa fluir as
primeiras palavras desde a noite anterior:
129
- Léo você me leva até a praia?
Léo não estranhou seu comportamento, levanta-se já pegando a
jaqueta que estendera nas costa da cadeira e segue em direção a
porta. Uma ou outra recomendação da mãe, agora as
preocupações com Emily tinham que ser dobradas. Sua nova
realidade a obrigava a acometer-se de alguns privilégios,
privilégios estes que ela não desejava e certamente não os
usufruiria. Se para obtiver privilégios era necessário passar por
aquela situação, melhor seria não ter vantagem alguma. A mãe
desejando demonstrar-se forte deixa-a ir fingindo pouca
preocupação.
- Nós precisamos conversar. Disse Emily olhando firme nos
olhos de Léo já dentro do carro:
- É claro meu amor.
Chegam à velha e adorada praia onde se conheceram. Descem do
carro, dirigem-se até o velho cais de sempre. Emily fita seus
olhos com aquele doce olhar que costumeiramente acalmava Léo
e o faziam sentir-se nas nuvens.
- O que menos precisamos é negar a realidade, precisamos
aprender a sermos felizes com o que a vida sentenciou. É certo
130
que não tenho muito tempo de vida, e como minha felicidade
depende inteiramente em fazer as pessoas que amo felizes, vou
dedicar a minha curta eternidade a tratar de encontrar meios para
sermos felizes hoje, e também meios para os que aqui
permanecerem sejam felizes mesmo após minha viagem as
nuvens.
Léo estava encantado e agora sim estranhando a atitude de
Emily. Como ela podia agir com tanta serenidade diante de uma
situação tão aterradora? Das duas uma, ou ela já havia
conseguido praticar o bendito conformismo humano, ou estava
fingindo muito bem.
Emily falava sem parar, apenas desejando dizer tudo que havia
planejado anteriormente. Passara a noite planejando sua vida,
reformulando de acordo com a nova realidade. A vida teria que
ser agora vivida como nunca, dizia ela deixando seus lábios
levemente encostarem um no outro, fluindo o mais belo timbre
que alguém podia emitir ao falar. Pelo menos era o que Léo
ouvia e sentia ao olhar o movimento da boca de sua amada que
julgava ser eterna enquanto falava.
Ele apenas a observa, já não ouvia ou não compreendia suas
palavras apenas se deliciava com o som que emitia Emily ao
131
falar qualquer coisa. Ele a silencia com um beijo, um beijo que
para ele tinha sido o mais intenso de sua vida. Sentia sua amada
vibrar durante aquele beijo enquanto segurava seus braços.
Como ele queria que o tempo parasse naquele momento, como
eles queriam que o tempo parasse! Inevitavelmente cai uma
lágrima salgada dos olhos de ambos, talvez desde então, as
lágrimas mais justas que alguém já derramou enquanto beijava.
Lágrimas que com certeza não provinham dos olhos, lagrimas
que vinha das mais profundas vielas do coração e que seguiu o
caminho mais íngreme que existia para chegar até suas faces
encostadas uma à outra. Aquelas lágrimas chegavam até a
superfície, no entanto o percurso que percorrera não havia sido
fácil. Ela vinha cortando os sonhos de ambos, sonhos que fora
idealizados há algum tempo pelo jovem casal, que agora
choravam muitos mais seus questionamentos que propriamente
suas convicções sobre a nova realidade.
Este beijo durou a eternidade nas mentes do casal apaixonado, a
vida merecia aquele beijo eterno, o universo para ser ao menos
um pouquinho justo precisava eternizar aquele instante de amor.
A vida real em contradição com seus desejos exigiam que aquele
beijo durasse apenas alguns segundos. Retornaram a beleza da
praia que podiam ver e tocar, pelo menos em tese. Seus olhos
132
encharcados revelavam o quanto pode ser dura a vida. Entretanto
as palavras de Emily contradiziam tudo que a vida real queria
impor a alguém tão cheia de vida como aquela menina, àquela
mulher- que se encontrava sentada ao cais da vida pronta para
partir.
Dizia Emily soluçando:
- A felicidade está muito mais em mim.
Léo queria por força discordar de Emily, no entanto ele não sabia
quais eram seus planos. Pensou ele que viveria intensamente
aquele amor até o fim assim como no cinema. Mais Emily
sempre ligada à realidade não podia permitir que Léo sentisse
aquele sentimento até o seu ultimo dia na terra, não naquela
intensidade, seria muito duro para ele. Então tratou de encontrar
meios para tornar aquela paixão em amizade, fato que conseguiu
a duras penas e longos períodos tratando-o como apenas um
amigo. Rejeitando suas tentativas de beijá-la; não se dirigindo a
ele pelos apelidos carinhosos que inventaram no auge da paixão;
não demonstrando o que sentia em seu coração, que se rasgava
em milhões de minúsculos pedaços toda vez que tinha que
abrigar em calabouços de sua alma aquele sentimento tão
intenso.
133
E para remontá-lo? Não era possível que todos os pedaços
voltassem para seu local original, sendo que toda vez que se
estilhaçava; pouco daquele novo velho coração permanecia ao
chão sem jamais retornar ao que outrora foi, entretanto ela jamais
deixou de ser feliz por qualquer que fosse a razão.
Ambos fingiam, resguardavam seus sentimentos nos mais
escondidos recônditos da mente, ato que fora necessário. Não
podia ser representado aquele ato nobre como uma fuga, estava
mais para uma forma de continuar a vida da maneira mais fácil
que imaginaram, porém se demonstrou um tanto mais difícil a
execução dos planos do que apenas expressados verbalmente por
Emily.
Depois daquele eterno e ultimo beijo a vida passou um tempo
curto sem grandes acontecimentos. Apenas Emily tratando Léo
como um simples amigo para arrancar a força o sentimento que
havia inicialmente em seu coração.
Léo demorou um tempo para perceber qual era o objetivo de
Emily com aquele comportamento estranho, porém quando
percebeu já não tinha forças para revogá-lo, e aceitou sem
esboçar reação que a fizesse mudar de idéia. Léo passou a fingir
134
que nunca houve um romance entre eles, e aos poucos passaram
eles mesmos a acreditarem naquela realidade. Talvez ele nunca
esquecesse Emily realmente.
Emily jamais esqueceu Léo até mesmo por que não precisava.
Seu amor por ele jamais diminuiria, muito pelo contrário a cada
dia só crescia, pois o amor jamais retrocede. O amor não acaba
apenas muda a forma de agir. Se amor acaba, ou se transforma
em qualquer sentimento, seja raiva, rancor ou qualquer outro
sentimento é por que não era amor.
CAPITULO XX
Adaptando- se a nova realidade
Numa manhã qualquer não diferente de tantas; recebeu Léo em
sua biblioteca a noticia que a mãe de Roberta havia partido para
as nuvens como uma guerreira que havia lutado até as ultimas
conseqüências para deixar um local seguro e confortável para
sua filha. Porém a vida não havia lhe agraciado com dinheiro e
nada deixou de bens materiais, a não ser o verdadeiro desejo que
a filha fosse feliz.
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Léo a tempo ciente da situação de Roberta já havia preparado
tudo, inclusive a cerimônia que a sociedade exigia em todos os
conformes.
Léo corre até a sala de tentativa de justiça, que em muitos casos
conseguiam realmente atingir a tão almejada justiça, no entanto
em outros nada podia fazer. Ele chega e encontra Roberta com a
cabeça entre as pernas, sentada em um canto qualquer naquele
lugar sem cores. A via frágil como tinha que ser uma garotinha
que perdera a mãe. Aproxima-se dela, a toca na cabeça em gesto
de conforto, ela suavemente levanta a cabeça e revela seus olhos
que não se distinguia de uma cachoeira de lágrimas. Quando Léo
além vir compreende aquele gesto. Sente um profundo arrepio na
espinha, um intenso sentimento por aquela garotinha que fazia
questão de demonstrar que era forte em um ato tão frágil.
Ele a abraça e chora, chora ao ver os olhinhos de Roberta se
desmanchando em lágrimas, não resistiu e não conteve suas
emoções, desabou também em lágrimas. Pelo menos agora ele
podia chorar e estas lágrimas eram justas. Permaneceram alguns
minutos abraçados. Léo sentiu-se na obrigação de cuidar daquela
menina que agora não tinha mais ninguém além dele. Toma-a
nos braços e leva para sua casa, para aguardarem o corpo daquela
que já não se encontrava mais ali, já estava muita a frente de
136
todos. Ele então cuida de todos os tramites para os
procedimentos da cerimônia do ultimo espetáculo da mãe de
Roberta.
Léo preparava há algum tempo os papeis da adoção de Roberta
com o consentimento de sua mãe, ela teria um lar, Léo satisfaria
agora sua idéia de casa de família. O dia passou rápido, naquela
calma pressa inerente ao que se refere a estas cerimônias da vida
humana.
No dia seguinte, Roberta sentia aquele vazio inevitável a quem
perde alguém querido, agora tentava uma adaptação árdua a casa
de Léo. Léo e Sonia fazem todo o possível para tornar sua
permanência ali o mais fácil possível. Numa tentativa de animá-
la Léo aproxima-se de Roberta com uma linda boneca de vestido
salmão com rendas brancas em suas extremidades e chapéu
elegante de mesma cor, era uma boneca a moda dos tempos
coloniais e entrega-a.
- Sabe de quem era esta boneca?
Ela balança a cabeça em sinal de negação.
- Esta é a ultima boneca da coleção de Emily, e sei que ela
guardou especialmente para você, mesmo nunca tendo dito, sei
137
que ela deixou esta boneca intacta para que ela servisse a um
objetivo. Até então eu não sabia qual, mas agora sei que ela foi
guardada para que fosse entregue a uma linda garota de
personalidade forte que é você. Não consigo imaginar ninguém
que pudesse cuidar dela além de você e sei que Emily deseja que
você fique com ela e guarde com carinho. Roberta aceita
emocionada a ultima boneca de Emily, e dar um caloroso abraço
em Léo.
Não era fácil mudar de casa, no entanto Roberta Há muito
tempo não tinha um lar de verdade, e as constantes visitas a casa
de Léo antes mesmo de sua mãe partir, estavam ajudando na
medida do possível na adaptação. Não demorou muito para ela
para se acostumar. A casa era sempre cheia de vida, as
constantes piadas de Léo tornavam o ar mais leve, a capacidade
de Roberta em se manter serena e sempre de bom humor lhe foi
bem útil nesta adaptação. O tempo passou, Roberta se adaptou
perfeitamente a sua nova família. Ia com Léo e Sonia a
biblioteca, ajudava- os no que podia principalmente nas
indicações de livros, já que lia bastante com um prazer
incomensurável.
Léo em sua vida comum e feliz continuava a escrever seu livro
inteiramente de felicidade, missão que o deixava útil e feliz,
138
Sonia sempre com seu ar leve continuava a vida como tinha que
ser, o tempo passava, passava porque ele jamais para ou
retrocede. O tempo continua a passar independente de qualquer
coisa, independente do desejo que ele passe ou não, Léo não se
importava e nem contava mais o tempo, na verdade como dizem:
só percebemos que temos olhos quando eles param de funcionar
perfeitamente. A vida de Léo seguia seu curso natural sem
grandes acontecimentos, sem grandes surpresas.
CAPITULO XXI
O dia do encontro e depois dele
Emily sai de casa em um fim de tarde qualquer e se dirige a praia
com um lenço em volta do pescoço, de onde ele talvez nunca
devesse ter saído, eram lá que eles representavam a beleza pelo
qual foi criado para propiciar. A vida porém, sempre revela
surpresas, mais tarde ele passaria a ser usado com outro fim, o de
proteger sua cabeça. Ela ia à praia constantemente apenas para
correr em direção ao sol ou ao seu lado, sem objetivo algum, sem
interesses reais, apenas o seu próprio contentamento de poder ser
feliz por estar respirando. A felicidade de sua vida comum lhe
propiciava estes momentos.
139
Lá ela encontra Léo, Sentado na areia; calça jeans desbotada,
jaqueta de couro, artefatos de uma beleza contestável até mesmo
para ele que os usava, pulseiras com espinhos metálicos, a
perfeita descrição de um jovem rebelde. Olhava em direção ao
sol que ameaçava trazer a noite em sua costumeira fuga para
iluminar outra nação. Que pena que ele o máximo que conseguia
era se refugiar na praia e apreciar o sol se esconder todos os dias.
Léo queria ir, fugir e diferente do sol não mais regressar ou se
voltasse queria retornar renovado. A vida possuía suas mazelas,
apesar de ser de uma família rica lhe faltava o carinho e a
presença de seus pais. Era um jovem rico que podia ter tudo em
bens materiais, no entanto seu esforço para ter o carinho
necessário a toda família bem estruturada não lhe era oferecido,
então corria para a rua, praia, qualquer lugar longe da vida
humana que não influía em sua vida.
Em todos os fins de tardes ele vinha até o mesmo pequeno cais
que havia próximo de sua casa para ver o sol se pôr. Por acaso
aquele dia viu uma moça carregando um lenço a correr em
qualquer direção, apenas corria e deixava seus cabelos e o lenço
a pairar no ar, na ventania daquele fim de tarde. Ele não iria
incomodá-la e não o fez. Apenas ficou a fitá-la a vislumbrar
tamanha beleza; toda aquela leveza, aquelas cores alaranjadas de
140
fins de tarde que deixavam seus cabelos castanhos também
dourados como o sol. O lenço em suas mãos parecia um véu de
cor alguma em contraste com a luz do sol, era apenas uma
sombra de uma beleza incontestável. Observá-la já era
gratificante o suficiente, ela não tinha direção, talvez sequer
objetivos, queria apenas correr com a leveza e liberdade que a
vida de certo feliz a proporcionava, Léo via naquela linda jovem
a felicidade.
Ele não iria incomodá-la, no entanto ela o notou a observá-la e
então muda de direção, e corre ao seu encontro. Agora sim
aquela jovem tinha para onde ir, Léo nervoso não esboçou reação
alguma, apenas esperou. Ela se aproximou e olhando para o céu
em vez de olhar em seus olhos disse:
- O que faz aqui sozinho?
- Nada, só observando o sol.
- Devia correr atrás dele, ou você vai deixar que ele parta sem
fazer nada? Vamos correr atrás dele comigo! Ele não conseguia
entender aquela garota, ela mal o conhecia, na verdade não o
conhecia e já tinha com ele uma intimidade como se conhecesse.
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Léo ficou encantado e pensou que podia correr com ela, não que
ele estivesse acostumado a fazer tudo o que as pessoas sugeriam,
porém aquela moça tinha algo de interessante, para ele correr
seria a melhor escolha si fazer. Sem objetivos, sem cobranças,
apenas correr atrás, ou ao lado do sol. Aquela linda jovem até
então sem nome, lhe deixara leve e livre, nada lhe faria mais
feliz. Então levanta do pequeno cais limpa a calça e segura na
mão da moça e começam a correr.
Corriam sem objetivos, estavam certos que não daria para seguir
o sol, ou correr ao seu lado, era preciso apenas sentir o calor de
seus últimos raios, no entanto a ilusão era necessária e fácil de
senti-la naquele momento. Quando a vida demonstra ser no
mínimo igualitária aos que desfrutam do mesmo ar, as ilusões
são corriqueiras necessárias e dignas. Naquele momento
enquanto corriam as suas vidas eram perfeitas independente do
resto, no mínimo dava para fugir e sentir a beleza dos ventos não
cortantes daquele fim de tarde banhados pelos últimos raios de
sol de verão daquele dia.
Léo há muito tempo não se sentia tão feliz; a felicidade simples
de estar ao lado de alguém sem cobranças, sem preocupações de
estar agradando. Apenas corriam! Que cobranças poderia haver
em manter as pernas em movimentos?
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O sol se pôs e a bela moça sem nome teve que ir embora, Léo
retornou a sua solidão sentado ao cais; ele não conseguia parar
de pensar naquela moça, na verdade não queria parar, não havia
cobranças nem em relação aos seus pensamentos, em relação à
bela moça que o convencera a uma corrida ilusória ao lado do
sol. No dia seguinte depois de enfrentar o longo dia de cobranças
retornou ao mesmo local de sempre na praia, com a doce ilusão
de ver novamente a moça do lenço sem cor devido aos reflexos
do sol.
Esperou bastante tempo com os olhos fixos agora não em direção
ao por do sol e sim na direção ao local onde vira aquela linda
moça surgir. Agora havia outro sol, outra luz, e era palpável,
real, e ele com certeza podia caminhar correr ou até mesmo
flutuar ilusoriamente ao seu lado. Era uma sensação que não
necessitava de descrições como nomes de sentimentos ou coisa
do tipo, apenas sentir seria o justo e ele não poupava esforços
para sentir aquele sentimento.
Esperou bastante tempo sem que ninguém aparecesse, também
pudera ele havia ido duas horas antes do que de costume. Estava
ansioso para revê-la que se esqueceu de olhar à hora. Eis que um
vulto de longos cabelos alaranjados aparece por trás das velhas
madeiras do antigo cais já sem uso. O coração de Léo dispara,
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por mínimo que fosse aquele ato, em muito tempo aquele era o
momento em que sua vida fazia sentido, então aquela emoção era
justa e também digna.
Ela se aproxima com um sorriso que apenas Léo conseguia
imaginar, o sol a deixava com as incontestáveis sombras da
beleza. Ela senta-se ao seu lado sorrir e não diz nada, nem
mesmo uma palavra de educação, uma saudação qualquer. Léo
fica intrigado, mas também não diz nada. Eles permanecem
parados, apenas olhando o sol. Quão bom seria se todos os
humanos compreendessem o silencio de todos e não necessitasse
de desperdícios de palavras.
O silencio dos dois dizia mais que quaisquer palavras. Ia-se o sol
para o seu destino diário, e na mesma proporção o ombro
daquela linda jovem escorregava em direção aos braços de Léo.
Ele sem esforço mantinha-se paralisado, no entanto a sua mente
não perdia nem um instante daquele momento mágico. Daquele
dia em diante os dois sempre se encontravam na mesma hora e
sempre no mesmo local na praia para ver o sol. A partir deste dia
nasceu uma amizade calorosa, um amor estonteante entre Léo e a
linda moça de cabelos alaranjados pelo brilho do sol.
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Havia encontros não casuais em toda parte, eles conversavam
muito, faziam planos. Vivia uma relação doce e saudável, a vida
comum e simples apenas com as peculiaridades inerentes a vida
de cada um dominavam aquela relação. Havia os planos comuns
a todos. Planos que seguiam ordem natural da maioria dos
humanos sem os imprevistos. Léo vivia um amor adolescente e
ao mesmo tempo maduro, sempre se enchendo de sonhos e
fazendo planos que nunca antes a vida o tinha permitido de
sonhar.
A vida seguia, Emily foi conhecendo Léo e aprendendo a gostar
mais ainda dele:
Léo fazia questão de demonstrar seu amor sempre para Emily:
- Sabe, mesmo quando fecho os olhos ainda sinto sua beleza, isso
prova que seu encanto vai muito além do que se pode ver ou
tocar, eu posso senti-la até de olhos fechados. Minha princesa de
cabelos da cor do céu do fim de tarde.
- Você é muito gentil.
Emily sempre carregava consigo papel e qualquer coisa que
pudesse escrever em qualquer momento de inspiração.
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- Vamos escrever os discursos do nosso casamento? Disse Emily
ficando de joelhos.
- Não seriam os votos?
- Tanto faz! Disse ela já pegando o papel para escreverem os
votos do distante casamento do casal apaixonado.
- Só que só revelaremos um ao outro no dia de nosso casamento,
que com certeza será nesta praia, com tudo que tivermos direito.
- Tudo bem! Concordou Léo já tentando imaginar o que
escreveria. Eles passavam tanto tempo conversando sobre a vida,
sobre a capacidade de viver o presente como ninguém, que os
discursos com certeza não estariam de certa forma ligados, talvez
falassem das mesmas coisas.
Emily então já era todo e qualquer objetivo de Léo. Planejaram
entusiasmados todos os preparativos para o seu casamento, nos
mínimos detalhes, das cores de suas vestes até a música que
dançariam ao final. Escreveram seus discursos,
Emily era tão sensata em suas palavras, ajudava sempre Léo com
seus problemas em casa, o ajudava a buscar a serenidade de
buscar a felicidade dentro dele e não tentá-la encontrar nas
pessoas, o fazia compreender e tentar buscar a felicidade nas
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nuvens em vez de buscá-la em indivíduos com seus egoísmos
inerentes a racionalidade. Dizia ela sempre que as nuvens com
seus movimentos leves e suas cores ou a falta dela seria a melhor
inspiração para a vida humana injusta ou como ela pensava,
injusta, mas sem culpados.
A vida biológica cheia de surpresas aleatoriamente propicia
algumas injustiças. Emily se encantava com as nuvens sempre,
independentes do seu estado ou de suas cores. E tentava passar
sempre a Léo a graciosidade que via nelas. Ela com certeza
haviam mudado a forma que Léo via o mundo. Ele compreendeu
o quanto apenas respirar já seria um privilégio, e quem possui
este dom tem que torná-lo justo fazendo a sua vida ter sentido
principalmente para si.
Era uma vida comum; Acontecimentos corriqueiros e pitorescos
de uma vida simples. A vida segue a ordem comum a todos,
quando esta ordem foge da regra é que surge uma boa história.
CAPÍTULO XXII
A felicidade como pode acontecer
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Na casa de Léo a vida se seguia em uma felicidade que só vendo,
Roberta já se considerava um membro autentica da família. Seu
livro depois de um tempo finalmente ficara pronto. Enviou o
original para algumas editoras, que não demorou muito para
obter uma resposta positiva a respeito da publicação de sua obra.
Até então ninguém havia lido seu livro que deveria ser
totalmente de felicidade, nem mesmo Sonia.
Um belo dia Sonia entra no quarto enquanto Léo analisava o
texto final já editado de seu livro e diz:
- Tenho uma surpresa!
- Legal! Adoro surpresas. Disse Léo com um largo sorriso no
rosto.
- Tive um sonho maravilhoso ontem à noite, em que me
encontrava nas nuvens e alguém me agraciara com um bebe
lindo. Resolvi fazer o teste e adivinha o que aconteceu?
-Não! Disse Léo já comemorando aos pulos.
- Você estar grávida?
- Estamos grávidos!
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Léo gritava de alegria com sua amada nos braços aos pulos,
pulos este que logo cessaram demonstrando preocupação com a
saúde de Roberta que deveria ser perfeita durante a gravidez. Já
não queria deixar nem ela subir ou descer escadas, chegou ao
ponto de pensar em construir um elevador para o sobradinho
onde viviam. Mania que os homens têm de acharem que as
mulheres grávidas se tornam frágeis como cristais.
- Agora que lembro! Você ainda não me deixou ler o livro que
segundo você era uma tentativa de escrever uma história de pura
felicidade. Disse ela saindo do estado de êxtase que se
encontrava por conta do bebê.
Você já pode ler! Disse ele passando o texto eletrônico para uma
mídia removível para que ela pudesse ler na calmaria de seu
quarto no computador. Talvez ele não tenha conseguido escrever
uma estória que retratasse inteiramente felicidade, no entanto a
felicidade é uma questão de interpretação da vida que segue seu
curso natural, depende de como si ver, de como si nota
internamente os sentimentos de cada ser humano.
Sonia começa a ler e se encanta com a forma como Léo via a
vida, sabendo ela como ele era antes de conhecer Emily. Agora
ele tinha uma visão das adversidades bem diferentes, a cada nova
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palavra que lia ela amava mais seu esposo e namorado, o
relacionamento passara como um filme em sua mente,
relacionamento este que já rendera muitos frutos maravilhosos,
como Roberta e o bebê que estava a caminho.
A felicidade constante de acordo com o enredo da história talvez
não fosse possível, no entanto a forma como descrevera a vida
naquele livro era possível notar felicidade até quando narrava
momentos difíceis, como deve ser a vida.
Léo proporcionara novas cores à vida de Sonia, quando não, ao
menos ensinou que se é possível colorir o mundo nas cores que a
imaginação desejar, por tanto há tantas cores nas nuvens quanto
há no universo, tudo é apenas uma questão de imaginação.
Emily continuou cravada em sua memória e coração, não como
uma lembrança triste, mas como alguém que mesmo tendo
vivido pouco, viveu intensamente. Como alguém que, mesmo
tendo partido às nuvens precocemente continuaria sendo eterna.
Como alguém que tendo vivido parte de sua vida em preto e
branco, soube perfeitamente colorir seu mundo e não somente o
seu, mas o de todos à sua volta. Que distribuiu cores e ensinou
que a felicidade não está no estilo de vida, mas na qualidade que
se dar a ela. Era lembrada da forma como sempre desejou ser
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lembrada, como deveriam ser lembradas todas as pessoas que si
adiantam e dão um passo à frente de todos na vida.
A vida, independentemente das circunstâncias deve ser vista
como uma dádiva, um espetáculo único que jamais si repetirá
quando o show chegar ao seu final. Por isso mesmo dever ser
valorizada e aproveitada da forma mais justa que pode haver;
deixando que a felicidade reine na maior parte do tempo ainda
que os dias difíceis surjam. As lagrimas jamais devem ficar
presas, mas todo ser humano deve adquirir a capacidade de
converter suas dores em aprendizado e conseguinte em alegria.
“Não sei se vim das nuvens, não sei se vou para elas, não sei se
vejo nelas as suas verdadeiras cores ou se elas vêem em mim as
minhas cores reais, no entanto eu fui tudo o que desejei ser, nas
cores que imaginei.”
“Não importa se o mundo a sua volta é cinza ou de qualquer cor
opaca, há sempre um meio dentro de você de colori-lo de acordo
com as cores que sua imaginação desejar.” Emily Lewick.
FIM.
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