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A EDUCAÇÃO ESCOLAR NA EUROPA OCIDENTAL Introdução Para que você compreenda a introdução do uso das tecnologias na educação escolar, será necessário analisarmos as práticas educativas dentro do contexto sócio-histórico em que foram sendo construídas ao longo da história. O tempo, objeto da história, possui uma dimensão cultural, isto é, ele é marcado pelas ações dos homens no espaço social. Há uma integração entre o passado e o presente e seus movimentos de mudanças e permanências que vale a pena revisitar para a compreensão da educação atual. A nossa disciplina está organizada em três momentos: o primeiro, sobre a educação na Europa Ocidental e o aparecimento da escola moderna; o segundo, sobre a organização da educação escolar no Brasil; e, no terceiro, sobre o uso das tecnologias na educação numa perspectiva histórica. Este primeiro momento que tratará sobre a educação escolar na Europa Ocidental se fundamentará, principalmente, nas pesquisas de Mario Alighiero Manacorda, Franco Cambi, Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Lúcia Spdeo Hilsdorf. 1. A ruptura com a Idade Média Na Europa Ocidental da Idade Média, a sociedade foi reorganizada em feudos devido às invasões bárbaras. A sociedade feudal era um regime social hierarquizado e socialmente estático, agrícola e marcado por práticas de Você já imaginou um mundo sem escola, sem salas de aula e mobiliários? Parece impossível, não é? Mas esse modelo de escola como temos hoje começou a ser delineada na Época Moderna. Vejamos:

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A EDUCAÇÃO ESCOLAR NA EUROPA OCIDENTAL

Introdução

Para que você compreenda a introdução do uso das tecnologias na

educação escolar, será necessário analisarmos as práticas educativas dentro do

contexto sócio-histórico em que foram sendo construídas ao longo da história.

O tempo, objeto da história, possui uma dimensão cultural, isto é, ele é

marcado pelas ações dos homens no espaço social. Há uma integração entre o

passado e o presente e seus movimentos de mudanças e permanências que

vale a pena revisitar para a compreensão da educação atual.

A nossa disciplina está organizada em três momentos: o primeiro, sobre

a educação na Europa Ocidental e o aparecimento da escola moderna; o

segundo, sobre a organização da educação escolar no Brasil; e, no terceiro,

sobre o uso das tecnologias na educação numa perspectiva histórica.

Este primeiro momento que tratará sobre a educação escolar na Europa

Ocidental se fundamentará, principalmente, nas pesquisas de Mario Alighiero

Manacorda, Franco Cambi, Maria Lúcia de Arruda Aranha e Maria Lúcia Spdeo

Hilsdorf.

1. A ruptura com a Idade Média

Na Europa Ocidental da Idade Média, a sociedade foi reorganizada em

feudos devido às invasões bárbaras. A sociedade feudal era um regime social

hierarquizado e socialmente estático, agrícola e marcado por práticas de

Você já imaginou um mundo sem escola, sem salas de aula e mobiliários?

Parece impossível, não é? Mas esse modelo de escola como temos hoje

começou a ser delineada na Época Moderna. Vejamos:

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servidão. A posição social de uma pessoa era definida pelo nascimento, pelo

título e/ou posse de terras.

Nesse contexto, a Igreja Católica exercia um papel de muita visibilidade

na sociedade, pois, além de cuidar da vida espiritual, exercia influência na

política e na moral da população. Não foi por acaso que a educação ficou sob

sua orientação, organizando escolas nos monastérios, paróquias e catedrais,

garantindo uma unidade religiosa. Cabe ressaltar que o povo durante a Idade

Média (e na Idade Moderna) era analfabeto. Seus conhecimentos estavam

relacionados ao senso comum, crenças e tradições. Já as classes sociais mais

altas eram alfabetizadas.

Era costume que os filhos dos nobres se educassem na casa de outros

nobres ou do monarca, criando, desse modo, laços. Nessas casas, recebiam sua

formação e davam os primeiros passos para a vida adulta. A instrução era

iniciada aos 7 anos até os 10 ou 11 anos. Para os meninos, a educação baseava-

se na equitação e no manejo com as armas, paralelamente com o ensino da

leitura, voltado para a religião, do latim e a escrita do trivium (gramática, lógica e

retórica). Do mesmo modo, deveriam adquirir valores e normas que se refletiriam

no social: o código da cavalaria, que é fundamentado na lealdade, amabilidade,

bondade, honra e valentia.

Assim, a educação cavalheiresca dos jovens acontece igualmente pela

espada e pelos livros. No caso dos filhos herdeiros e dos grandes nobres, esses

estudavam também os manuais de governo que expõem modelos para os

governantes (VALDALISO, 2009).

Contrapondo à sociedade feudal fechada e agrícola, uma classe social

urbana, empreendedora e dinâmica foi crescendo. Essa nova classe social que

surgia, denominada de burguesia, foi se constituindo inicialmente com as trocas

ocasionais e, com a sua constância, em algumas feiras que se tornaram locais

de permanentes transações comerciais.

As permutas entre o campo e a cidade acentuaram-se, a população

cresceu, renascendo os intercâmbios comerciais e as atividades artesanais.

Mercadores e artesãos se uniram em corporações. As associações de

mercadores possibilitaram o comércio a longa distância, o enriquecimento, as

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técnicas de comercialização e a formação da mentalidade produtiva. Já a

corporação de artesãos valorizou o papel social das oficinas, impôs regras

uniformes à profissão. Segundo Cambi (1999, p. 175), as corporações

exerceram um papel educativo de massa “emancipando o trabalhador de uma

ética apenas religiosa e eclesiástica e marcando a mentalidade em sentido laico,

técnico e racionalista”.

Essas novas aglomerações foram se organizando em fortalezas, criando

os burgos, a fim de se protegerem das invasões e da violência, dando abrigo aos

servos que fugiam dos campos de seus senhores. No entorno dos burgos se

formaram novas cidades. Nesse cenário, a praça do mercado tornou-se o centro

da vida urbana, onde a atividade comercial se dinamizava e os burgueses e suas

práticas empreendedoras se expandiam.

Ligada a intercâmbios e empreendimentos, essa nova classe social deu

sustentação a novos valores e ideais, tais como a liberdade, a individualidade e

a produtividade, que se desenvolveram na Época Moderna.

1.1 Os mestres livres

Concomitantemente ao surgimento da economia mercantil e a

organização em comunas, as formas de escolarização foram se modificando

segundo a nova realidade. O ofício docente que era ocupado por bispos e

clérigos passou a ser preenchido também por homens leigos e comuns que

compravam a licença para ensinar, sob a tutela jurídica da Igreja: os mestres

livres.

As escolas catedrais passaram a oferecer o studium generale, como se

chamava a universidade. Os estudos duravam de cinco a sete anos. Quatro

faculdades se expandiram na Idade Média: artes liberais, medicina,

jurisprudência e teologia. A metodologia utilizada baseava-se na forma de ensino

iniciada pelo mestre livre Pedro Abelardo, a dialética.

Assista ao filme “Em nome de Deus”, que trata sobre a vida de Pedro Abelardo e analise a

metodologia de ensino utilizada por ele na escola da Catedral de Notre Dame, em Paris. O

filme está disponível no YouTube.

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Os mestres livres também lecionavam fora dos muros da cidade,

satisfazendo as necessidades da nova classe social, pois os filhos dos

burgueses, mercadores das comunas do centro-norte da Itália, precisavam de

instrução tanto quanto os que frequentavam as escolas catedrais, porém por

outros motivos, devido à organização do comércio. Como exemplo dessa nova

cultura, segue um documento florentino privado, que fala da instrução e do

trabalho do filho de Donato Velluti, nascido em 1342:

Coloqueio-o na escola; tendo ótimas aptidões, memória e inteligência, aprendeu a ler..., em pouco tempo tornou-se um bom gramático; passei-o para o ábaco e logo tornou-se habilíssimo no cálculo; em seguida levei-o... para uma loja de arte de lã, coloquei-o no caixa... e, tendo-lhe entregado o livro de dar e haver, segurava-o, manuseava-o e dominava-o como se tivesse quarenta anos. (apud MANACORDA, 2002, p. 170).

Como se vê, a formação voltava-se para as práticas comerciais: a

correspondência e a contabilidade. Coexistiam, nesse contexto, os mestres

autônomos, mestres que pagavam outro mestre como auxiliar, mestres pagos

pelas comunas ou pelas corporações que comercializavam seus conhecimentos,

renovando e revolucionando os métodos de ensino.

2. Os primórdios da sociedade moderna

A sociedade medieval entrou em crise nos fins dos quatrocentos com a

falta de alimentos devido às perdas agrícolas, espalhando a fome entre a

população; devastação de aproximadamente 1/3 da população da Europa devido

à Peste Negra; o conflito político com a Guerra de Cem Anos; e a perda de

autoridade religiosa. Para Cambi (1999), a Modernidade se apresenta como uma

revolução em muitos âmbitos:

GEOGRÁFICO

As viagens expandem territórios e colocam em contato com

novas etnias e culturas.

Nasce o sistema capitalista, baseada na mercadoria, na

capitalização, no investimento e na produtividade.

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ECONÔMICO

POLÍTICO

SOCIAL

IDEOLÓGICO-CULTURAL

2.1 O humanismo italiano e a renovação educacional

Com o surgimento de uma nova classe social, uma nova cultura também

foi se delineando atendendo aos anseios da burguesia, que valorizava a cultura

clássica do racionalismo e do espírito crítico. Esse quadro afirmou-se primeiro

na Itália e expandiu-se por toda Europa a partir de meados do século XV.

Os mecenas italianos (ricos comerciantes) patrocinaram os artistas

humanistas e contribuíram para a formação do movimento cultural denominado

de Renascimento. Esse movimento caracterizou-se pelo humanismo, no qual o

homem negava-se ao mundo de renúncias imposto pela religião e, conforme

Cambi (1999, p. 224), encontrava-se “pronto para imergir no mundo histórico real

com intento de dominá-lo e nele expandir sua humanidade”. Não era um

movimento irreligioso e, nem mesmo, que excluía Deus, mas que valorizava a

razão e o conhecimento geral acerca das coisas.

A educação não era mais assunto da Igreja, mas de educadores,

literatos, políticos, mercadores, artesão e banqueiros que tinham por finalidade

preparar os alunos em nível teórico e prático para atuar nessa nova sociedade

Estado Moderno: Estado centralizado, controlado por um

governante que regula todos os setores sociais e

econômicos. Muda a concepção de poder e controle.

Promove a formação e afirmação da classe burguesa, com

suas formas de relacionar socialmente e novas relações de

poder.

Laicização – Libertando o homem da visão religiosa do

mundo. Racionalização – legitimação do saber pelo uso

da razão.

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que estava se formando. Para essa burguesia, segundo Hilsdorf (2012), a

educação não se dava ainda em ambientes escolares, era assunto de família,

por meio do exemplo. O pintor D. Guirlandaio em sua obra (1490), afirmou:

Quando estivessem na idade razoável para isso, que podia variar em cada criança, uma formação ampla, com exercícios corporais, música, geometria, gramática, filosofia da natureza e ética, seria ministrada por mestres virtuosos, nem muito severos nem muito rígidos, que pudessem lhe fornecer preceitos de bons costumes: o professor é, para ele, o ‘pai do ânimo e dos costumes’. E o procedimento? Seria o de ensinar muitas coisas ao mesmo tempo, para evitar o tédio das crianças! (HILSDORF, 2012, p. 34).

As famílias contratavam os mestres para ensinar os estudos

humanísticos aos seus filhos. Dentre eles, destaca-se Guarino Guarini de

Verona e Vittorino dos Ramboldi de Feltre que, contratados pelas famílias para

ensinar às crianças da burguesia, preferiram a forma de pensionatos como

haviam visto em Pádua. No alojamento, alunos e mestres compartilhavam dos

espaços, da alimentação e dos estudos de latim, cálculo, gramática, dialética,

retórica, aritmética, geometria, harmonia, astronomia, desenho, música, filosofia,

ética, formação religiosa, exercícios físicos e as boas maneiras. Introduziram a

graduação dos conteúdos e a prática dos cadernos como auxiliares de estudo.

Vittorino estava dando aulas em Pádua quando o príncipe Juan

Francisco Gonzaga de Mântua lhe confiou a educação de seus descendentes.

Ele transformou a residência dos Gonzaga em um centro educacional, a Casa

Giocosa (Casa Alegre), onde começou a educação secular com métodos

diferenciados dos anteriores, oferecendo uma formação integral, privilegiando a

formação do corpo, por meio das atividades de educação física e da

personalidade, além da dimensão intelectual dos alunos.

Ficou conhecido por não ser adepto dos castigos físicos, preferindo a

afeição e a firmeza. Moacir Gadotti afirmou ser esse mestre “um percursor da

moderna escola antiautoritária. Afirmou que “numa época em que predominavam

o método autoritário da escolástica, centrados no mestre, De Feltre propunha

métodos ativos com a participação direta dos alunos” (GADOTTI, 1995, p. 10).

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2.2 Novas mudanças…

O movimento do Renascimento influenciou, também, a religião. A Igreja

Católica ficou sujeita a críticas referentes a sua estrutura autoritária centrada no

Papa e suas práticas sacramentarias, como a venda de indulgências. A Reforma

Protestante apregoava o retorno às Escrituras Sagradas. Começou com a

pregação do sacerdote agostiniano Martinho Lutero, que analisou tais práticas

conforme as Escrituras, condenando-as.

Com a Reforma protestante e seu plano doutrinal (o princípio do ‘livre

exame’ e da ‘salvação apenas pela fé’), não só os pilares da doutrina católica

foram abalados, como todas as dimensões da vida humana. Aranha (1990)

assinala que os protestantes angariaram o apoio da rica burguesia, que,

contrariamente à Igreja Católica, via no enriquecimento um sinal de

favorecimento divino.

Para os reformadores, a educação se torna um instrumento de

divulgação dos princípios religiosos, por dar condições a todos de leitura e

interpretação da Bíblia. Nesse sentido, Lutero, Melanchthon e Calvino

trabalharam para a implantação da escola primária para todos. Lutero defendeu

a educação universal e pública, e solicitou que as autoridades assumissem esse

papel, por considerá-lo de competência do Estado. Quanto à prática de ensino,

repudiava os castigos físicos e o verbalismo. Propôs jogos, exercícios físicos,

conteúdos literários e o ensino de história e da matemática (ARANHA, 1999).

A esse movimento reformador, a Igreja Católica reagiu num movimento

denominado de Contrarreforma, que reafirmou a doutrina, a supremacia papal e

a prática da Inquisição de modo mais premente.

Para combater a expansão do protestantismo, a Igreja Católica

incentivou a criação de ordens religiosas que se dedicassem ao ensino. Foi

assim que Inácio de Loyola fundou a Companhia de Jesus, vinculada

diretamente à autoridade papal. O objetivo principal era a pregação missionária

da fé e a luta contra infiéis e heréticos. Os jesuítas se espalham pelo mundo,

primando pela conquista da alma dos jovens, mais suscetíveis às influências, por

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meio da escolarização. Em 1579, a Ordem possuía 144 colégios espalhados

pelo mundo, sendo que, em 1749, chegou a 669.

A Ordem preocupou-se com a formação dos mestres. Sua organização

e plano de estudos foram sistematizados no documento Ratio Studiorum. Quanto

às orientações de como ensinar, o documento discriminava:

Preleção. Na preleção só se expliquem aos autores antigos, de modo algum os modernos. De grande proveito será que o professor não fale sem ordem nem preparação, mas exponha o que escreveu reflexivamente em casa e leia antes todo o livro ou discurso que tenha em mãos. A forma geral da preleção é a seguinte:

Em primeiro lugar leia seguidamente todo o trecho, a menos que, na Retórica ou na Humanidade, fosse demasiadamente longo.

Em segundo lugar exponha em poucas palavras o argumento e, onde for mister, a conexão com o que precede.

Em terceiro lugar leia cada período e, no caso de explicar em latim, esclareça os mais obscuros, ligue um ao outro e explane o pensamento, não com metafrase pueril inepta, substituindo uma palavra latina por outra palavra latina, mas declarando o mesmo pensamento com frases mais inteligíveis. Caso explique em vernáculo, conserve quanto possível a ordem de colocação das palavras para que se habituem os ouvidos ao ritmo. Se o idioma vulgar não o permitir, primeiro traduza quase tudo palavra por palavra, depois, segundo a índole do vernáculo.

Em quarto lugar, retomando o trecho de princípio faça as observações adaptadas a cada classe, a menos que prefira inseri-las na própria explicação. Se julgar que alguns devem ser apontadas – e não convém sejam muitas – poderia ditá-las ou a intervalos durante a explicação, ou, terminada a lição, em separado. É bom que os gramáticos não tomem notas senão mandados (FRANCA, 1952, p. 186).

Posteriormente, várias foram as críticas à pedagogia jesuítica,

assinalando o monopólio religioso, a separação entre a vida e a escola, o

conservadorismo, a não valorização dos conhecimentos científicos. Além disso,

foram os jesuítas acusados de “ter enriquecido e de exercer poder político sobre

os governos, visando suas próprias conveniências” (ARANHA, 1999, P. 94).

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Desse modo, em 1759, o marquês de Pombal, primeiro ministro de

Portugal, expulsou os jesuítas do reino e de suas colônias e, em 1773, o papa

Clemente XIV extinguiu a Companhia de Jesus.

3. O surgimento da escola moderna

No século XVII, a Europa vivia a contradição entre os valores da nobreza

feudal e os novos valores da burguesia que se estabelecia nos centros urbanos

e trabalhava para aumentar a sua riqueza e prestígio. As produções artesanais

individuais davam lugar ao movimento de trabalhos grupais nos galpões. Além

disso, foi um período de guerras e perseguições, que pode ser representado pela

Guerra dos Trinta Anos (1618-1648), nome dado a uma série de guerras que

aconteceram na Europa pelos mais variados motivos. Cambi (1999, p. 279) o

descreve como “Um século trágico, contraditório, confuso e problemático”, mas

que proporcionou uma grande transformação na economia para uma vertente

capitalista, na formação do Estado Moderno e na cultura laica.

Essa contradição refletiu, também, na educação. A ciência, que na Idade

Média era desvinculada das aplicações do saber no qual o homem era um

contemplador da natureza, vai passando por reformulações, pois o burguês

necessitava de uma ciência que investigasse a natureza para usá-la em seu

benefício e, assim, saber para transformar.

A educação ficou encarregada pela regeneração do homem e a

incorporação de normas para a convivência social. Nesse momento, decorrente

de todos os aspectos sociais, econômicos e culturais, constrói-se o modelo da

escola moderna, racionalizada na estrutura e nos programas e valorizando a

formação do homem civil, suas relações de boas maneiras, "partindo da

aristocracia para chegar depois aos diversos grupos burgueses e invadir com

seu estilo de comportamento a sociedade inteira (excluído o povo, por muito

tempo ainda)” (CAMBI, 1999, p.280). Destacam-se as ideias pedagógicas de

Comenius e o modelo de La Salle, entre as demais iniciativas religiosas.

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John Amos Comenius (1592-1670), embora vivesse tal realidade,

defendia a ideia de educação transformadora e universal, que não tivesse

diferença de sexo ou classe social, dividida por faixa etária, com metodologias

próprias para tornar o ensino atrativo e significativo. Em 1657, em Amsterdã,

escreveu a Didactia Magna, obra que fundamenta suas ideias a respeito da

educação. Iniciou a obra com o “Tratado da Arte Universal de Ensinar Tudo a

Todos”:

Processo seguro e excelente de instituir, em todas as comunidades de qualquer Reino cristão, cidades e aldeias, escolas tais que a juventude de um e de outro sexo, sem exceptuar ninguém em parte alguma, possa ser formada nos estudos […].

A proa e a popa da nossa Ditactica será investigar e descobrir o método, segundo o qual os professores ensinem menos e os estudantes aprendam mais; nas escolas, haja menos trabalho inútil, e, ao contrário, haja mais recolhimento, mais atractivo e mais sólido progresso […] (COMÉNIO, 1966, p. 43-45).

A obra foi organizada em 33 capítulos, distribuídos em

quatro partes. A primeira trata sobre os fundamentos

teológicos e filosóficos da educação; a segunda é

consagrada aos princípios gerais; a terceira dedica-se

às didáticas especiais (o ensino das ciências, artes,

línguas e para incutir piedade); e, por fim, a quarta parte

estabelece um plano dos estudos das diferentes etapas

do ensino (COMÉNIO, 1966).

Além de defender a escola para todos, Comenius avançou na proposta

de organização escolar em quatro fases, resumidas por Cambi (1999, p. 290):

a) A escola maternal para a infância, a mais importante, a que prepara para ‘o terreno da inteligência’ e à qual está ligada ´toda a esperança da reforma universal das coisas´;

b) A escola nacional ou vernácula para a meninice, cuja finalidade é ´fazer adquirir prontidão e esbeltez para o corpo, para os sentidos, para a inteligência1. É articulada em seis classes nas quais se aprendem a leitura, escrita, a matemática, mas também os primeiros preceitos morais e os rudimentos da fé;

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c) A escola de latim ou ginásio para a adolescência, cujo o objetivo é colocar em forma a floresta de noções recolhidas pelos sentidos, para a inteligência’. É chamada de latim porque educa para a elegância expressiva e para a leitura pessoal dos textos;

d) A academia para a juventude, cuja finalidade é a ´formação da luz harmônica, plena, universal, que consagra sapiência, virtude e fé´. É chamada academia porque se coloca como ´conselho’ de sábios e está situada em lugar apartado e tranquilo.

Além disso, Comenius defendia que o ensino deveria partir do concreto

para o abstrato, do simples para o complexo e, ainda, que a aprendizagem

deveria ser agradável. É possível afirmar que ele tinha uma visão inovadora para

época e que suas ideias ainda estão presentes nos debates atuais acerca da

educação. Porém, HIlsdorf (2012, p. 136) aponta a postura contraditória pois,

segundo a autora, “ele está enquadrado nos movimentos mais gerais do seu

tempo, e seus procedimentos têm também outras dimensões tradicionais:

religiosa, exotérica e enciclopédica”.

O francês Jean Baptist de La Salle (1651-1719) defendia e oferecia um

ensino elementar e popular, gratuito e obrigatório com professores formados

para exercer o ensino. Visava ensinar a criança a viver numa sociedade urbana,

independentemente de sua origem familiar por meio da ordem, disciplina,

pontualidade, autodomínio, obediência e silêncio.

O curso oferecido era organizado em seis classes. O currículo era

composto dos seguintes saberes: leitura e escrita da língua materna, as quatro

operações e civilidade cristã que permitia controlar os comportamentos para o

convívio segundo as normas do convívio social.

As escolas lassalistas introduziram o ensino simultâneo no ensino

elementar, isto é, ensinavam a um grupo de alunos o mesmo conteúdo. Além

disso, não ensinavam um conhecimento de cada vez, mas sim utilizando livros

de leitura e a prática do exercício escolar. Por outro lado, o controle dos corpos

era feito por meio da palmatória e do feixe de varas. Nos fins do século XVIII,

esse modelo de La Salle já se fazia presente em toda Europa.

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No decorrer do século XVII, a escola foi se renovando e assumindo as

características da escola moderna, ainda que de modo embrionário. A

escolarização já estava organizada articuladamente entre escola elementar,

média ou secundária e a superior ou universitária, embora ainda não estivesse

na gestão do Estado.

A vida escolar vai ganhando novos contornos: divide o tempo das lições;

a avaliação sob a forma de exames ganha caráter público ou semipúblico; a

metodologia difundida pretende garantir a aprendizagem partindo do concreto

para o abstrato; a organização da classe por idades; introdução de sistemas de

controle, rituais e instrumentos que permanecerão na escola moderna (CAMBI,

1999).

4. A educação na contemporaneidade

O século XVIII é apontado por Cambi como o divisor de águas entre o

mundo moderno e contemporâneo, acabando de completar o processo de

laicização. Nesse cenário, o homem intelectual era visto como o novo sujeito

social, imagem do Estado, mediador entre a sociedade e o poder e educador.

À educação foi delegada a função de reproduzir classes e grupos sociais

e de formar os cidadãos para a produtividade social. Tinha como objetivos “dar

vida a um sujeito humano socializado e civilizado, ativo e responsável, habitante

da cidade e capaz de assimilar e também renovar as leis do Estado que

manifestam o conteúdo ético da sua vida no homem-cidadão” (CAMBI, 1999, p.

326).

Mas foi a escola que se renovou drasticamente, se laicizando, se

tornando pública, dando vida a um sistema escolar orgânico e sistêmico,

contendo novos conhecimentos científicos, língua nacional e saberes utilitários

Até esse período da história, as alterações na educação vão acontecendo de

forma lenta e gradual. Após o século XVIII, as mudanças acontecerão de modo

cada vez mais surpreendente. Vamos ver por quê?

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ensinados por metodologias inovadoras, empíricas (Rosseau) ou mais práticas

(Pestalozzi).

Às mulheres foi dado o direito à instrução e a uma educação apropriada,

mas que não a desnaturalizasse. À população foi reivindicada uma educação

que o inserisse na sociedade como um elemento produtivo.

A época contemporânea nasceu nos fins do século XVIII com a

Revolução Francesa e com as transformações sociais que marcaram

definitivamente e profundamente a sociedade em seus mais diferentes aspectos.

Mas esse período é marcado, também, pela Revolução Industrial com o

nascimento das fábricas, dos direitos, das massas e da democracia.

O século XIX sofreu o impacto de todas essas mudanças. Aranha (1996)

chama a atenção para o fato de que o advento das máquinas modificou as

relações de produção e proporcionou novas técnicas na agricultura. Houve uma

revolução nos meios de transportes, novas fontes de energia, e acentuou-se a

migração do campo para a cidade, em busca de melhores oportunidades de

emprego.

Manacorda (2002, p. 270) explica que o ex-artesão, ao adentrar na

fábrica, passou a ser um homem livre das corporações e transformou-se num

moderno proletário. Com isso, não possuía mais nada: “nem o lugar do trabalho,

nem a matéria-prima, nem os instrumentos de produção, nem a capacidade de

desenvolver sozinho o processo produtivo integral, nem o produto do seu

trabalho, nem a possibilidade de vendê-lo no mercado”. Ele perdeu o que havia

aprendido, e passou a adquirir a ignorância.

A urbanização acelerada decorrente da industrialização exigiu da

educação a formação de mão de obra qualificada para o trabalho. Embora desde

o século XVIII se discutisse a educação universal, foi no século XIX que se

concretizaram iniciativas de Estado para estabelecer a escolarização elementar

universal, gratuita e obrigatória.

Estamos diante de um processo de escolarização que renovou a cultura

escolar, tornando-a laica, com um programa estabelecido e cada vez mais

disciplinar. Em toda a Europa foi se organizando um sistema escolar destinado

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ao povo que ganhou maior impulso de expansão, voltado para a escolarização

em massa, na segunda metade dos oitocentos.

Quanto à organização, criou-se o seguinte sistema escolar coordenados

pela administração pública: escolas de primeira infância, educação elementar,

escola secundária e o universitário.

O sistema fabril ocupava a mulher no trabalho fora do lar e, para isso,

era necessário acolher os filhos da classe trabalhadora. Manacorda relata que,

em 1816, o pastor protestante Robert Owen abriu junto à sua fábrica têxtil um

Instituto para a Formação do Caráter Juvenil para os filhos de seus funcionários.

Essa instituição previa classes infantis, sendo considerado o início da escola

moderna da infância, pois se voltava para a ação educativa e instrução básica

da criança, superando o modelo assistencialista. Essa experiência foi difundida

em Londres, na Alemanha, na Itália e sucedida pela iniciativa dos jardins de

infância de Froebel.

No ensino primário, funcionaram dois grandes modelos: o do ensino

mútuo e o de Pestalozzi. O ensino secundário dividiu-se em clássico e técnico,

o primeiro voltado para a elite burguesa com ensino propedêutico, e o segundo

com ensino específico para a classe popular. No universitário, os cursos

dividiram-se em formação científica e os cursos politécnicos para atender a

demanda decorrente do avanço das tecnologias.

Segundo Cambi (1999), para a burguesia, o povo deveria ser educado

para que se evitassem as desordens sociais, formando valores para o trabalho,

da poupança e do sacrifício. Para o povo, a educação escolar era o caminho

para a sua emancipação política por meio da liberdade da mente. Tal

pensamento é difundido por volta da metade do século, refletindo dois modelos

ideológicos que se contrapunham: o burguês, inspirado no positivismo; e o

proletário, ligado ao socialismo.

O positivismo exalta a ciência e a técnica, a ordem burguesa da sociedade e seus mitos (o progresso em primeiro lugar), nutre-se de mentalidade laica e valoriza os saberes experimentais: é a ideologia de uma classe produtiva na época de seu triunfo [...]. O socialismo é a posição teórica (científica) da classe antagonista, que remete aos valores ‘negados’ pela ideologia burguesa (a solidariedade e a igualdade, a participação popular no governo da sociedade) e delineia estratégias de conquista do

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poder que insistem sobre as contradições insanáveis da sociedade burguesa (principalmente entre capital e trabalho), delineando a sociedade ‘sem classes’ (CAMBI, 1999, p. 466).

O fim do século XIX apresentava-se em fase de tensões e crises nos

âmbitos político, social, cultural e pedagógico. Em contraposição ao positivismo,

a pedagogia se encontrava envolvida com a fermentação de novos modelos e

ideias pedagógicas.

5. O século das transformações educativas

O século XX foi inovador em todos os aspectos da vida social. Na

economia, viu a afirmação e a renovação do sistema capitalista, a defesa de um

modelo socialista baseado na superação da propriedade privada dos meios de

produção e, nos últimos anos, viu surgir o modelo neoliberal, que defende a não

participação do Estado na economia e, com isso, a liberdade para lidar com o

mercado.

No campo político, a presença antagônica entre a democracia e o

totalitarismo estiveram presentes frente a frente. No final da década de 1920, a

base econômica global foi abalada pelo início da Grande Depressão de 1929, a

qual produziu um cenário de países arrasados pela devastação já bastante

fragilizados pelas consequências da Primeira Grande Guerra.

Somado a isso, a quebra da bolsa de valores de Nova York generalizou,

ainda mais, o espectro da miséria, da fome e, assim, a população ficou à mercê

da subjugação de políticos que passaram a defender medidas autoritárias para

conter o caos social reinante. A fragilidade dos governos naquele momento foi

um dos motivos que favoreceu a subida de governos ditatoriais ao poder em

vários países, com a promessa de um Estado novo com propostas populistas,

empenhado em superar a grave crise econômica, política e social que a

população enfrentava, e que assegurava proteger a sociedade das ideias

comunistas que angariavam cada vez mais adeptos. Nesse contexto, Hitler

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assumiu o poder à força na Alemanha; Stalin, na URSS; Mussolini, na Itália;

Franco, na Espanha; Salazar, em Portugal; dentre outros.

Os comportamentos e mentalidades individuais e sociais transformaram-

se. Conforme Cambi (1999, p. 510-511): “Estamos diante de um modelo

antropológico novo, guiado pela ideia de felicidade, a qual é medida pelo

consumo, equiparada ao haver, à acumulação de experiências, de bens, de

relações (com o mundo e com os outros)”. O individualismo exacerbou-se,

depois cresceu o hedonismo (o consumo vale mais que a produção, o tempo

livre mais que o trabalho) e, por fim, o surgimento do homem-massa, “que vive

em simbiose com outros indivíduos que têm as mesmas aspirações e que se

ligam aos mesmos mitos, que cumpre ritos coletivos nos jogos e no divertimento,

que assume um estilo de vida cada vez mais padronizado”.

Com isso, a educação também passou por transformações:

A prática educativa voltou-se para a formação do homem-massa e para

o homem-indivíduo ao mesmo tempo;

Impôs novos protagonistas (a criança, a mulher, o negro, o deficiente);

Renovou as instituições educativas (escolas, família, fábricas, etc.)

dando vida a um processo de socialização das práticas;

A teoria educacional colocou as ciências, principalmente as humanas,

num papel cada vez mais central para desenvolver e guiar os saberes

da educação;

Renovação educativa e renovação pedagógica com a proposição das

escolas novas e do ativismo que inaugurou um novo jeito de pensar a

escola;

A presença de grandes filosofias-ideologias que agiram sobre a

elaboração teórica e sobre a prática educativo-escolar;

O crescimento cientifico da pedagogia e da educação e a nova relação

que liga à filosofia e à psicologia (CAMBI, 1999).

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5.1. As experiências com as “Escolas Novas”

Entre o final do Século XIX à metade do Século XX, algumas

experiências educativas tendo como base as descobertas da psicologia,

contrapondo ao formato tradicional, afirmaram-se na Europa. São denominadas

como “escolas novas”.

Esse novo modelo escolar proposto se distingue da escola tradicional

nos seguintes pontos: o professor torna-se mediador da aprendizagem, deixando

o lugar central do processo educativo; a criança passa a ser compreendida como

uma fase da vida que deve ser estimulada; a metodologia deixa de ser por meio

de repetição e memorização para tornar-se ativa, isto é, “aprender fazendo”.

Essa nova proposição de escola nasce como experimentos isolados,

ligados ao investimento de particulares ou profissionais da educação, tendo uma

rápida repercussão no mundo. No Brasil, como veremos no próximo fascículo,

essa proposição teve a característica de política pública.

As escolas novas foram consideradas um protesto conta o mecanicismo

da sociedade industrial e tecnológica, voltada para uma ideologia democrática e

progressista, inspirada na participação ativa dos estudantes na vida social e

política.

A primeira experiência das “escolas novas” foi na Inglaterra por Cecil

Reddie que, em 1889, abriu em Abbotsholme uma escola para rapazes dos 11

aos 18 anos. Para ele, a escola deveria estar adequada às exigências no mundo

moderno, tonando-se uma miniatura do mundo real e prático, unindo

sistematicamente o desenvolvimento da inteligência, a força física, energia,

habilidade manual e agilidade.

Haden Badley, um adepto das ideias de Reddie, afastou-se de

Abbotsholme para fundar em Sussex, mais especificamente em Bedales, uma

escola-internato que valorizava no seu interior um sistema de autogoverno e o

princípio da coeducação.

Baseado no experimento de Reddie, o francês Edmond Demolins criou,

em 1899, numa área rural na Normandia, a École des Roches. O objetivo dessa

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escola era operar a formação global da criança, desenvolvendo sua

intelectualidade, a moral, o físico e o social. O estudo era desenvolvido por

“centros de interesse” com atividades práticas com a terra.

Na Alemanha, Hermann Lietz, inspirado nas experiências de Reddie e

Demolins, fundou suas Casas de educação no campo. Porém, foram Gustav

Wyneken e Georg Kerschensteiner que desenvolveram escolas de forma mais

original com os ideais de uma renovação educativa.

O primeiro elaborou um modelo educativo anárquico, antiburguês e

libertário que exerceu forte influência na juventude alemã até a Primeira Guerra

Mundial. Suas ideias baniam a autoridade da família, dos adultos, os métodos

pedagógicos conformadores. Valorizava a livre iniciativa dos jovens de maneira

autônoma.

O segundo organizou um modelo escolar que denominou de “escola do

trabalho”. A formação de Kerschensteine ocorreu por meio do americano John

Dewey. Para desenvolver suas ideias, ele fez em Mônaco uma reforma orgânica

das escolas profissionais pós-elementares, tendo como princípio de que o

trabalho é fundamental na vida humana e, por isso, deve ser posto no centro da

educação infantil. Assim, o objetivo da educação popular, dar como ideal de vida

aos jovens, “o colocar-se a serviço dos outros, mediante o mesmo empenho que

cada um deve assumir para desenvolver com precisão e responsabilidade o

próprio trabalho” (CAMBI, 1999, p. 517).

Na Itália, a renovação pedagógica deu-se por meio das experiências de

Maria Boschetti Alberti, em Muzzano e em Agno; Rosa Agazzi, em Mompiano; e

Giuseppina Pizzigoni, em Milão, no âmbito do que foi denominado de “escola

serena”. Tal escola baseava-se numa continuidade entre a família e a escola,

valorizando a criança como um artista espontâneo.

O movimento Europeu das “escolas novas” teve uma interpretação de

Cousinet e Freinet, que refletiram sobre os fundamentos teóricos e

metodológicos e políticos dessa nova proposição de educação escolar.

Atividade: Pesquise as concepções teóricas das “escolas novas”, principalmente

dos teóricos Decroly, Ferrière e Montessori e faça uma análise contrapondo com

o modelo de educação anterior.

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Chegamos ao final da nossa conversa sobre a educação na Europa

Ocidental. Espero que tenham gostado. A intenção foi fazer com que

percebessem as mudanças da educação decorrentes das mudanças

socioeconômicas, políticas e culturais de cada época.

No próximo momento, iremos percorrer a educação no Brasil. Até lá!

REFERÊNCIAS

ARANHA, M. L. A. História da Educação. 2ª edição. São Paulo:

Moderna, 1996.

CAMBI, F. História da Pedagogia. São Paulo: Editora UNESP, 1999.

COMÉNIO. J. A. Didactia Magna: Tratado da arte universal de ensinar

tudo a todos. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1966.

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FRANCA, Leonel. O método pedagógico dos jesuítas. Rio de Janeiro.

Agir. 1952.

GADOTTI, Moacyr. A escola cidadã. São Paulo: Cortez, 1995.

HILSDORF, M. L. S. O aparecimento da escola moderna: uma história

ilustrada. 2ª edição. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2012.

KAPLAN, Nancy Ridel. O homem de negro por trás da corte. Revista

de História da Arte e Arqueologia, UNICAMP, número 6, dez/2006, p. 21-

31.

MANACORDA, M. A. História da Educação: da antiguidade aos nossos

dias. 10ª edição, São Paulo: Cortez, 2002.

VALDISO, C. Vivir em um castillo medieval. Madrid: La esfera de los

libros, 2009.

HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

Introdução

Como vimos no Módulo I, a ascendência da burguesia e de suas atividades

mercantis favoreceram novas empreitadas comerciais, como a expansão marítima.

Nesse contexto, a burguesia portuguesa, em busca de novas rotas que aumentassem

o lucro sobre as mercadorias, anulando a figura do atravessador, acabou por chegar

na América do Sul.

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A educação brasileira tem como parâmetro mais de 500 anos de experiências

sociais, políticas, econômicas, culturais e educacionais. Nesse Módulo, procuraremos

revisitar esse processo. Inicialmente, trataremos da educação na chegada dos

portugueses ao território chamado de Novo Mundo no período histórico denominado

Brasil colonial. Na segunda parte, abordaremos a primeira legislação educacional

brasileira; seguida da educação republicana e seus princípios liberais; a educação na

Era Vargas (1930-1945) e pós-Vargas (1945-1888).

Ao visitar cada parte, reflita sobre como foi a sua formação escolar e quais

foram as influências sobre ela. Vamos lá?

1. A educação do Brasil Colonial

A colonização portuguesa do novo território (século XVI) foi bastante

tumultuada, por isso, o rei de Portugal, Dom João III, envolveu a Monarquia na

ocupação das novas terras nomeando Tomé de Souza como governador geral do

Brasil. Este chegou ao Brasil em 1549, juntamente com os primeiros jesuítas,

chefiados por Manuel de Nóbrega (SAVIANI, 2013).

O cenário encontrado por eles era bem diferente de Portugal: floresta virgem,

silêncio, animais, pouca população com características e culturas muito diferentes da

europeia. Havia muito índio para poucos portugueses, como salientou Paiva (2000).

Tal realidade traçou o cotidiano dos portugueses na colônia, que se fazia

entre o ataque e a defesa, entre o ideal religioso e o praticado, pois a violência estava

sempre presente para conquistar a terra, subjugar e escravizar os indígenas.

Os padres jesuítas, entre outras ordens que se estabeleceram no Brasil,

criaram escolas, colégios e seminários, onde ensinaram aos nativos da terra os

saberes da leitura, escrita e cálculos de forma rudimentar, mas principalmente a

catequização, de modo que a cultura nativa não era respeitada. Não podemos ignorar

que os portugueses trouxeram um padrão de educação europeu, especificamente

lusitano, o que não significa que as populações que por aqui viviam não possuíam

características próprias de educar.

As letras, conforme Paiva (2000), era a adesão à cultura portuguesa. Esse

modelo de educação pensado pela Igreja Católica, numa relação estreita com o

governo português, tinha como finalidades: persuadir os indígenas a adotar os

princípios da fé cristã; estimular o hábito do trabalho; e engrossar o número de

aliados, uma vez que os indígenas convertidos eram incentivados a lutar contra

inimigos externos, como também contra os indígenas que resistiam à conversão.

Veiga (2007) destaca um aspecto importante que é a chegada dos nativos

africanos escravizados pelos portugueses a partir do século XVI. Nesse contexto, o

“O que representava a alfabetização para os jesuítas a ponto de quererem, desde o início, alfabetizar os índios, quando nem em Portugal o povo era alfabetizado?” (PAIVA, 2000, p. 43)

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ensinar estava destinado aos indígenas, aos nativos africanos e aos filhos dos

colonizadores brancos. Portanto, aos indígenas e nativos africanos eram ofertados

além da alfabetização, da pregação e do trabalho, o ensino de artes e ofícios.

A certa altura, os colégios se voltaram para os filhos dos colonos que

recebiam um ensinamento mais aprofundado, não restrito à propagação da fé cristã.

Esses seriam padres, advogados ou ocupariam cargos públicos, possibilitando à

sociedade se expandir (PAIVA, 2000).

A educação jesuítica procurava seguir um documento curricular: o Ratio

Studiorum, que foi elaborado em 1599. A sua diretriz tinha como base o conteúdo

organizado pela Igreja Católica: o ensino da gramática média, da gramática superior,

das humanidades, da retórica, da filosofia e da teologia. O ensino rejeitava as ciências

físicas ou naturais, bem como a técnica ou as artes, visando apenas à formação

humanística, literária, abstrata, além de dogmática (ARANHA, 1996).

Com o Tratado de Madrid entre Portugal e Espanha no ano de 1750, a até

então confortável situação da Companhia de Jesus no Brasil começou a se deteriorar.

Em 1759, a expulsão desta ordem religiosa das terras brasileiras, comandada pelo

então primeiro-ministro de Portugal, Marquês do Pombal, significou uma remodelação

total do sistema de ensino brasileiro. Por ordem do Estado, os jesuítas tiveram seus

livros e manuscritos destruídos pelos portugueses e a religião foi deixada de lado nos

currículos. A desestruturação da escola jesuíta fez com que os índios perdessem

espaço no sistema de ensino.

A reforma educacional pombalina, que ocorreu em 1772, sofreu influência dos

ideais iluministas com vistas a modificar a educação no Brasil. Tratava-se de uma

tentativa de introduzir matérias mais práticas no dia a dia escolar.

Depois da instauração das mudanças ocasionadas após a interrupção da

educação jesuítica, o Brasil caminhou na criação de um ensino público, implantando,

dessa forma, as aulas régias que, segundo Cyntia Greive (2007), eram estudos

avulsos ministrados por um professor autorizado pelo rei para lecionar em salas

alugadas ou nos antigos prédios da Companhia de Jesus, dando protagonismo ao

professor no processo educacional. As aulas régias, por serem realizadas nas casas

dos próprios professores, eram difíceis de serem controladas pelo governo. Não havia,

também, uma sistematização da idade escolar.

Com a transferência da Corte para o Brasil, em 1808, a educação que

predominou tinha como objetivo formar profissionais aristocráticos e da corte, ficando

de fora os grupos sociais inferiores. D. João optou por implantar o sistema mútuo ou

lancasteriano que, para ele, exigia menos recurso e era mais racional, pois ensinava

oralmente a um maior número de alunos por meio da repetição e memorização.

A presença da coroa portuguesa impulsionou alguns investimentos na área

da educação, aportes que culminaram na criação das primeiras escolas de ensino

superior. Estes locais tinham como foco, exclusivamente, preparar academicamente

os filhos da nobreza portuguesa e da aristocracia brasileira.

2. A educação se torna lei

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Em 1822, anunciou-se a independência do Brasil declarada por D. Pedro I,

dando início ao período Imperial. No movimento de estruturação do Império, uma das

primeiras ações refere-se à elaboração de leis.

A constituição de 1824 instituiu a instrução primária e gratuita para todos os

cidadãos brasileiros e o oferecimento de colégios e universidades. Faria Filho (2009)

chama a atenção para o fato da instrução primária ser gratuita, mas não obrigatória.

Isto porque sem tornar a escolarização obrigatória, a demanda por escolas seria

justamente das classes mais abastadas, se revelando como uma forma de favorecer

os já privilegiados financeiramente. Por outro lado, a gratuidade do ensino não

representou investimentos em construção de escolas com espaços físicos adequados.

Em 15 de outubro de 1827, foi sancionada a primeira Lei Geral relativa ao

Ensino Elementar. O artigo 1º estabelecia que “Em todas as cidades, vilas e lugares

mais populosos, haverão as escolas de primeiras letras que forem necessárias” e,

também, exames para seleção de mestres e mestras.

Nesse cenário, a escola merece uma atenção especial porque, como pontua

Souza (1999), impunha hábitos de pontualidade – remetendo à questão do tempo

escolar, ordem e aproveitamento máximo desse tempo por meio das aprendizagens

importantes para a vida adulta. O currículo estabelecido pelo artigo 6º era: o ensino da

leitura, da escrita e da matemática, além dos princípios de moral cristã da religião

católica e da história do Brasil.

Antes de investir na formação dos professores, o preparo docente era dado

nas escolas de ensino mútuo instaladas a partir de 1820. A Lei de 15/10/1827 em seu

art. 5º afirmava que “os professores que não tiverem a necessária instrução deste

ensino irão instruir-se em curto prazo e à custa de seus ordenados nas escolas da

Capital”. Cabia ao professor buscar a sua formação, custeando-a.

O Ato Adicional de 1834, instituído pelo governo regencial, definiu que o

ensino elementar, o secundário e a formação de professores seriam de

responsabilidade das províncias, e o ensino superior ficaria sob a responsabilidade do

poder central. Com a descentralização do ensino, foi criada a primeira Escola Normal

na Província do Rio de Janeiro, pela Lei n° 10, de 1835, que determinava: “Haverá na

capital da Província uma escola normal para nela se habilitarem as pessoas que se

destinarem ao magistério da instrução primária e os professores atualmente existentes

que não tiverem adquirido necessária instrução nas escolas de ensino mútuo, na

conformidade da Lei de 15/10/1827.”

Nos anos de 1840, o ensino mútuo entrou em desuso e foi substituído pelo

método simultâneo ou misto com o auxílio de monitores durante as aulas. No período

de 1868-1876 foi implantado o método intuitivo e as lições de coisas, isto é, o aluno

tinha contato com objetos, animais etc, todavia, este método passou a ser mais

divulgado a partir de 1870. Nesse momento, as cartilhas passaram também a ser

inseridas, havendo um investimento maior em materiais escolares impressos. Mesmo

assim, a educação primária se encontrava em condições precárias apesar dos

dispositivos legais.

Já o ensino secundário, destinado aos filhos da elite, que se voltava para a

preparação para o ingresso no ensino superior ou para ocupar cargos administrativos,

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tinham o Colégio D. Pedro II, criado em 1837, no Rio de Janeiro, como referência de

ensino e de administração.

Em relação ao ensino superior, frequentado pelos homens, foram criadas

duas faculdades de direito, duas de medicina, duas de farmácia, e duas de

engenharia. Havia também academias militares e aulas avulsas de ensino superior.

Após o período imperial, diminuiu a preocupação com a educação e ela

deixou de ser prioridade, pois a educação primária, a secundária e também o ensino

superior receberam poucos investimentos.

3. A educação republicana

A partir de 1850, o Brasil vivia um período de “prosperidade” com a introdução

do trabalho assalariado, crescimento industrial e modernização agrícola, surgindo,

desta maneira, um novo quadro econômico e social no país. Cada vez mais se

acentuavam as oposições ao governo devido à escravidão e à política imigratória, na

qual os trabalhadores estrangeiros substituíam a mão de obra escrava na lavoura,

mas uma parte, com o tempo, acabava a se deslocar para a cidade em busca de

oportunidades de trabalho. Com isso, a indústria recebeu uma massa de

trabalhadores livres já com experiência, o que resultou numa produção maior.

Foi, então, que se deu o primeiro grande surto de desenvolvimento da rede

de ensino paulista, quando a Província conheceu considerável progresso material,

graças à expansão da cultura e do comércio do café, à construção das estradas de

ferro, aos primeiros ensaios à industrialização, isso tudo aliado, posteriormente, à

abolição do trabalho escravo. Desta forma, o trabalho passou a ser visto dentro de

uma concepção capitalista, de gerador de riquezas e a educação como responsável

pela homogeneização da cultura brasileira, conforme os anseios da Ordem e do

Progresso. Era preciso,

Regenerar as populações brasileiras, núcleo da nacionalidade, tornando-as saudáveis, disciplinadas e produtivas, eis o que se esperava da educação, erigida nesse imaginário em causa cívica de redenção nacional. Regenerar o brasileiro era dívida republicana a ser resgatada pelas novas gerações. (CARVALHO, 1989, p. 10).

Segundo José Murilo de Carvalho (1992, p.10-1), para a elite republicana

“educação pública significava acima de tudo, formar almas, sendo por isso, peça

fundamental”. Para atingir tal objetivo, formalizou as ideias de obrigatoriedade e

gratuidade do ensino, fornecendo condições dentro de critérios científicos, para o povo

exercer a cidadania e ser produtivo.

Os republicanos paulistas identificavam a formação do professor como passo

essencial para a renovação eficiente do ensino, sendo a Escola Normal polo

multiplicador das luzes, “que colocam as ideias em marcha, impulsionando a história

em direção ao progresso e à liberdade” (MONARCHA, 1999, p.172).

O artigo de André Paulo Castanho (2017), publicado na Revista Histedbr, trata sobre os métodos de ensino utilizados no século XIX. Localize a obra publicada na internet e analise as características do método monitorial e mútuo e intuitivo.

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Em 1890, o curso de formação dos professores passou por uma reforma de

ensino, entrando numa fase considerada como “uma das mais brilhantes da história”

(AZEVEDO, 1996). O governador do Estado de São Paulo, Prudente de Moraes,

confiou ao Dr. Caetano de Campos a direção da reforma de ensino normal, que

procurou imprimir a sua crença no poder educativo das ciências. Sendo assim,

Sobre a desoladora figura do mestre-escola do Império, combalido, sem vitalidade e sem ânimo, vergado pelo abandono e pela precariedade de recursos financeiros e materiais – sobre a figura do mestre-escola da palmatória e do compêndio –, foi construída a figura enaltecida dos apóstolos da instrução primária. Profissionais de sólida competência, cônscios de sua missão, formados pela Escola Normal – o “templo de luz”, o viveiro de onde sairiam os heróis anônimos da República. (SOUZA, 1998, p.62).

Anexa à Escola Normal, funcionava a Escola Modelo, laboratório onde as

futuras professoras observavam e exercitavam a profissão sob a orientação de um

professor. Essa modalidade escolar ficou conhecida como grupos escolares.

Constituiu-se assumindo uma nova concepção de escola primária, contrapondo-se à

escola isolada, em que um só mestre ensinava a um grupo de alunos cujas idades e

conhecimentos cobriam todo o ensino primário. Pressupunha alunos classificados e

agrupados o mais homogeneamente possível, em função da sua idade e

conhecimentos.

Sendo assim, o emprego do método simultâneo e a consequente organização

dos alunos em classes sob a regência de um professor para cada grupo de alunos

favoreciam não somente a distribuição do trabalho, como também a maior capacidade

de supervisão e controle da ação dos professores e dos alunos. À organização das

escolas graduadas, então, foram acrescidas as técnicas de supervisão e eficiência das

instituições, cercadas de racionalidade científica, o exame e classificação científica

das crianças e a distribuição, previamente planejada, de tempos e tarefas,

movimentos e ações (FRAGO, 1998).

É possível relacionar as estruturas e modalidades organizativas da escola

com a inculcação de valores e normas de comportamentos, com a estatização do

ensino, com a evolução de formas de organização do trabalho, com o

desenvolvimento de uma administração escolar burocratizada, com a afirmação da

escola como organismo social, com a definição das estruturas de poder no seu interior

e com a evolução do currículo.

Dessa forma, as escolas graduadas foram organizadas no sentido de formar

as crianças não só com os conhecimentos morais e científicos necessários, mas

também com hábitos e valores pertinentes ao mundo do trabalho. O grupo escolar se

constituiu um modelo escolar a ser implementado pelos outros estados do país.

Viagens de estudo a esse estado e empréstimo de técnicos passam a ser rotina

administrativa na hierarquia das providências com que os responsáveis pela Instrução

Pública de outros estados tomam iniciativas de remodelação escolar na Primeira

República (CARVALHO, 2000, p.226).

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3.1. Movimento pela Escola Nova

Nos anos 1920, os intelectuais viram na educação um modo de formar a

nacionalidade por meio da inculcação de uma cultura nacional e uma educação moral

que assegurassem o progresso na Nação. Os integrantes desse grupo se dedicaram a

ler e a traduzir textos estrangeiros de várias obras; e criaram a Associação Brasileira

de Educadores (1924), responsável pela organização das Conferências Brasileiras de

Educação, nas quais circulavam as novas proposições educacionais. Assim, este

ideário, principalmente na versão dos norte-americanos John Dewey e William

Kilpatrick, chegou ao país e conquistou novos adeptos entre os jovens intelectuais.

No Brasil, a Escola Nova apresentou três dimensões: a pedagógica, a política

e a filosófica ou das finalidades (VIDAL, 2006). Na dimensão pedagógica, a Escola

Nova caracterizou-se pela contraposição à escola tradicional, na qual o professor é o

centro do processo de ensino e aprendizagem, transmitindo seus conhecimentos aos

alunos; a criança é aquela que ouve, numa atitude imóvel; e a aprendizagem acontece

através da memorização dos conteúdos. Em oposição, a Escola Nova propõe os

métodos ativos, através dos quais a criança constrói o seu conhecimento através de

experiências; e uma nova organização do espaço escolar com suas cadeiras e móveis

facilitando o trabalho em grupo. Nessa perspectiva, o aluno ocupa o papel central do

processo de ensino-aprendizagem e o professor torna-se mediador desse processo.

O movimento apresentou também uma dimensão política, pois a expansão do

escolanovismo deveu-se também no campo das iniciativas públicas. Diferentemente

do modo que surgiu em outros países como uma alternativa ao ensino oficial, no

Brasil, vários estados brasileiros investiram na reforma dos seus sistemas educativos

e, para isso, convidaram educadores de peso para este fim: São Paulo – Sampaio

Dória (1920-25), Lourenço Filho (1930-31), Fernando de Azevedo (1933) e Almeida Jr.

(1935-36); Pernambuco – Carneiro Leão (1928-1930); Minas Gerais – Francisco

Campos (1927-1930); Ceará – Lourenço Filho (1922-23); Bahia – Anísio Teixeira

(1925-27); Rio de Janeiro – Carneiro Leão (1922-26), Fernando de Azevedo (1927-

1930) e Anísio Teixeira (1931-35).

No cargo de reformadores, esses intelectuais vão se deparar de frente com

os problemas educacionais e pensar solução para eles, buscando, com isso, a

resposta para o lugar da escola na constituição da sociedade brasileira. As

proposições educacionais dos reformadores contribuíram significativamente para a

penetração e expansão do ideário escolanovista no país.

As diferentes finalidades da educação, terceira dimensão do movimento pela

Escola Nova, apontadas por Vidal (2006), justificam parte dos embates entre Católicos

e Liberais, que se acirraram a partir de 1930, quando é criado o Ministério da

Educação e Saúde, trazendo para a esfera federal as discussões sobre a educação

nacional.

Tanto quanto os reformadores liberais, os intelectuais católicos estariam

preocupados com a formação da nacionalidade por meio da educação popular.

Porém, os católicos contrapuseram-se a alguns princípios e à doutrina pedagógica

difundida pelos intelectuais, tais como a “substituição da religião pela razão e pela

ciência”, acusando-os por suas propostas materialistas, utilitaristas e pragmatistas,

esquecendo os valores espirituais (PAGNI, 2000). Por outro lado, os intelectuais

liberais acusavam os católicos de defenderem a manutenção do ensino religioso, não

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oferecendo liberdade de escolha aos alunos; e de praticarem um ensino acadêmico,

classicista, verbalista e pouco prático (DI GIORGI, 1992).

A partir de 1945, segundo Di Giorgi (1992), as ideias escolanovistas já não

eram estranhas ao professorado do país. É possível percebermos a sua influência até

os nossos dias, pois uma das maiores preocupações do professor é não ser chamado

de “tradicional”, sinônimo de atraso nas concepções e práticas pedagógicas.

Acostumamo-nos, enquanto professores, a dizer que a função social da escola é

formar cidadãos críticos, pois, desta forma, estaremos contribuindo para a

transformação escolar. Tal expressão é a materialização da apropriação pelos

educadores das ideias propagadas pela Escola Nova, ainda que a prática esteja longe

de um ensino centrado no aluno, com métodos renovados.

4. A educação na Era Vargas (1930-1945)

Em 1930, o presidente Washington Luiz foi deposto por um movimento

armado que colocou Getúlio Vargas no poder. Os anos do Governo Provisório foram

marcados por lutas e conflitos. Com o golpe, alguns nomes de projeção na educação

da década anterior ocuparam posições de destaque no cenário educacional.

É no governo provisório de Getúlio Vargas que se iniciou um movimento no

sentido de criar um sistema organizado de ensino. Uma das primeiras iniciativas do

governo foi a criação do Ministério da Educação, ocupado por Francisco Campos, e

das secretarias estaduais de Educação.

Ao assumir o Ministério, Campos promulgou vários decretos em 1931 e 1932,

visando uma ação para unificação da educação nacional. Com isso, legislou sobre a

organização da universidade do Rio de Janeiro e o estatuto das universidades,

incluindo a Faculdade de Educação, Ciências e Letras voltada para a formação do

professor secundário; criou o Conselho Nacional de Educação; dispôs novos

direcionamentos para o ensino secundário dividindo-o em dois ciclos: um fundamental

de cinco anos, e outro complementar de dois anos, voltado para a preparação para o

acesso ao curso superior; e, por fim, legislou sobre o curso comercial. (ARANHA,

1996).

Nesse cenário, os intelectuais que estiveram à frente das reformas

educacionais dos estados e que participavam da ABE, ao apoiarem o golpe de 1930,

alimentavam a expectativa de que o Governo Provisório rompesse com as oligarquias

regionais e com as influências católicas, porém isso não aconteceu, frustrando-os. Em

meio a um contexto político tumultuado é que foi gestado o Manifesto dos Pioneiros

pela Educação Nova (1932), redigido por Fernando de Azevedo, mas contendo as

posições teóricas de outros intelectuais, inclusive de Anísio Teixeira.

Nessa reformulação proposta pelo redator do documento, e autorizada por seus signatários, preservam-se também algumas bandeiras do liberalismo como a igualdade, da individualidade e da liberdade formal, bem como a defesa da extensão da educação pública comum a todos e a sua diferenciação conforme as aptidões individuais e as funções profissionais necessárias à sociedade atual (PAGNI, 2000, p. 120).

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Esse movimento, que resultou na publicação do Manifesto, saiu vitorioso por

ter desencadeado a criação da Universidade de São Paulo e a incorporação de

algumas de suas reivindicações na Constituição de 1934, que foi a primeira a incluir

em seu texto um capítulo inteiro sobre a educação.

3.2 As escolas rurais em debate

Você acha que os debates acabaram por aí? Certamente não! As escolas rurais, que

eram maioria no país, se tornaram alvo também de preocupação dos intelectuais da

educação.

Isso mesmo! Após muito tempo de descaso, a escolarização da infância rural

tornou-se pauta de debates entre intelectuais e governantes que defendiam a

educação enquanto como mola propulsora do progresso e, com isso, o direito dos

brasileiros à escolarização.

Nesse período, a indústria brasileira ganhava um grande impulso que foi

acompanhado pela formulação de leis voltadas para a regulamentação do mercado de

trabalho e medidas de investimentos em infraestrutura. No entanto, além de provocar

uma grande disparidade regional, pois as indústrias encontravam-se restritas aos

grandes centros urbanos da região sudeste, gerou um problema social e econômico

devido ao grande deslocamento da população rural para as regiões urbanas

industrializadas.

Os problemas gerados pela crescente industrialização, responsável pela

migração de parte da população que morava no campo para as cidades com intuito de

buscar melhores condições de trabalho e de vida, impulsionaram a ação e a

propagação do pensamento ruralista. Concomitantemente, nessa época, acirraram-se

os debates sobre as especificidades da escola na zona rural, emergindo, assim,

algumas correntes de pensamento em defesa de uma educação diferenciada que

fornecesse subsídios para fixar o homem no campo.

Assim, duas correntes pedagógicas voltadas para o campo se sobressaíram:

o ruralismo pedagógico e a escola comum. O ruralismo pedagógico foi um movimento

delineado e constituído para definir uma proposta de educação do trabalhador rural

que tinha como fundamento básico a ideia de “fixação do homem no campo por meio

da pedagogia” (BEZERRA NETO, 2003, p. 15). Dessa forma, a proposta defendida

Fernando de Azevedo defende algumas teses no Manifesto relacionadas à educação pública no Brasil. Pesquise o documento na internet, leia e sintetize as ideias principais.

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pelo movimento ruralista girou em torno de três elementos fundamentais para uma

educação diferenciada: o professor, o método de ensino e o currículo. Para essa

corrente, os professores deveriam potencializar o ensino a fim de fornecer

possibilidades para que o homem permanecesse no campo, se orgulhasse do seu

modo de vida e tivesse uma educação que atendesse às necessidades de cada

região:

[...] entendiam como sendo fundamental que se produzisse um currículo escolar que estivesse voltado para dar respostas às necessidades do homem do meio rural, visando atendê-lo naquilo que era parte integrante do seu dia-a-dia: o currículo escolar deveria estar voltado para o fornecimento de conhecimentos que pudessem ser utilizados na agricultura, na pecuária e em outras possíveis necessidades de seu cotidiano. (BEZERRA NETO, 2003, p. 15).

Sud Mennuci, representante dessa corrente pedagógica voltada para a zona

rural, sustentava em seu discurso um modelo de escola rural de características

regionais sob a alegação de que “Temos que separar o Ensino das cidades do Ensino

dos meios rurais e do ensino da zona litorânea” (MENNUCCI, 1934, p. 133), pois, na

sua visão, era: “[...] mister diferenciá-los quanto à sua orientação e ao seu alcance,

cindi-los para que produzam três mentalidades absolutamente diversas e que, no

entanto, reciprocamente se completem para o equilibro social do organismo nacional”

(MENNUCCI, 1934, p. 133).

Nesse sentido, acreditava em uma escola rural que atendesse as

características da realidade em que estivesse inserida e, também, em uma formação

específica para o professor que lá fosse atuar, já que as escolas normais brasileiras,

com alto padrão de excelência na sua visão, formavam professores urbanos. Para

isso, o Estado deveria criar escolas Normais Rurais que se organizariam sob três

aspectos cruciais: o pedagógico, o higiênico/sanitário e o agrícola. Essas escolas

deveriam “[…] formar professores quase hostis à vida citadina, perenemente

preocupados com a maior eficiência do campo e de tal modo que se constituam em

leaders do núcleo em que vão servir” (MENNUCCI, 1934, p. 144-145).

No entanto, as ideias ruralistas de educação rural, voltadas para a formação

do trabalhador rural, não foram unânimes entre os intelectuais da época. Existiam

aqueles que saíram em defesa de uma escola comum, capaz de atingir

indistintamente toda a população estudantil brasileira da cidade ou da roça, como os

intelectuais divulgadores da Escola Nova, principais representantes do Ensino comum.

Entre eles, destaca-se Anísio Teixeira que, ao defender e divulgar os ideais da escola

comum, anunciava que essa escola deveria voltar-se “à formação comum do homem e

à sua posterior especialização para os diferentes quadros de ocupações em uma

sociedade moderna e democrática […]” (TEIXEIRA, 2007, p. 44). Para tanto, ela não

deveria distinguir aqueles que precisavam ou não de trabalhar, mas a sua finalidade

deveria ser educar a todos para o trabalho, “distribuindo-os pelas ocupações,

conforme o mérito de cada um e não segundo a sua posição social ou riqueza”

(TEIXEIRA, 2007, p. 60).

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Essa escola deveria ser uma instituição com programas voltados para a vida

da comunidade, considerando a realidade social, o trabalho e as tradições. Ao

considerar esses aspectos, o intelectual argumentava que: “A escola primária, por este

motivo, tem de ser instituição essencialmente regional, enraizada no meio local,

dirigida e servida por professores da região, identificada com os seus mores, seus

costumes” (TEIXEIRA, 2007, p. 67). Desse modo, o docente, partilhando da mesma

realidade dos alunos, compreenderia que o programa da escola é a “própria vida da

comunidade, com o seu trabalho, as suas tradições, as suas características,

devidamente selecionadas e harmonizadas” (TEIXEIRA, 2007, p. 67).

Nessa visão, a escola não poderia restringir os conhecimentos comuns para

as crianças em razão delas estarem inseridas em um meio rural e substituí-los pela

formação profissional. Ao contrário, ela deveria oferecer a educação comum a todas

as crianças o maior tempo possível, considerando o meio social em que estavam

inseridas. Em outras palavras, a escola proposta seria “a escola fundamental de

educação comum do brasileiro, regionalmente diversificada, comum não pela

uniformização, mas pela sua equivalência cultural” (TEIXEIRA, 2007, p. 67). A defesa

de Anísio Teixeira era por uma escola primária organizada e comprometida com a

formação do cidadão, tanto na cidade quanto no campo.

Almeida Junior (1944) também segue em defesa do ensino comum, igual para

todas as crianças, democrático, que respeitasse o direito de acesso e de

oportunidades às crianças do campo e da cidade. Em seu artigo intitulado “Os

objetivos da escola primária rural”, publicado na Revista Brasileira de Estudos

Pedagógico, assinalava que os brasileiros estavam insatisfeitos com a escola rural por

três aspectos: pelo número insuficiente para atender a demanda; por responsabilizá-la

pelo fluxo migratório da roça para a cidade; e pela inadequação de seu programa, não

sendo capaz de dar às crianças a formação devida.

Com relação à inadequação do ensino primário rural à sua finalidade, que era

escolarizar a infância para atuar na sociedade, o autor advertiu que a escola, como

estava organizada, oferecia pouco (tempo, conteúdo, qualidade, etc.) e era

inadequada. Mas para melhorá-la seria necessário prover instalações e equipamentos,

formar os professores para atuar no meio no qual iriam trabalhar e adequar os

programas, o que possibilitaria “[…] a ambientação do ensino, flexivelmente, não só

aos interesses psicológicos do meio rural em geral, mas ainda a cada um dos seus

aspectos particulares” (ALMEIDA JÚNIOR, 1944, p. 29).

Se por um lado a sociedade apontava esses três fatores como problemáticos

para o sucesso da escola rural, por outro lado, Almeida Júnior (1944) asseverava que

seu maior problema era a questão dos objetivos. Nesse sentido, referenciava a

dicotomia existente entre dois grupos de intelectuais: um que defendia a escola

primária rural profissional, cujo objetivo do professor rural era educar a criança para

ser um trabalhador agrícola (ruralismo pedagógico); e o outro grupo que defendia a

escola comum, tanto para o campo quanto para a cidade, ou seja, para esse grupo a

escola primária não poderia ter nenhum caráter vocacional.

Embora as discussões acaloradas acontecessem em âmbito nacional, não

existia ainda uma legislação educacional federal que organizasse um sistema nacional

de educação. A educação primária ficava sob a responsabilidade dos estados da

federação, que legislavam sobre ela e a financiavam, de maneira que as

características, os programas e os métodos direcionados para o ensino primário não

convergiam em âmbito nacional.

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3.3 Educação no Estado Novo

Em 1937, por força da Constituição que o impediu de continuar no cargo,

Vargas e seus aliados arquitetaram um Golpe de Estado, que o manteve na

presidência até 1945, no período denominado de Estado Novo.

Pode-se dizer que o período do Estado Novo, instaurado por Getúlio Vargas,

foi um dos mais significativos na história do país no que se refere às transformações

políticas, econômicas e sociais. Esse período se desenvolveu por um regime ditatorial

nacionalista marcado pela transição da economia rural brasileira para uma nova fase

industrial urbana pautada por um plano desenvolvimentista com o objetivo de

ingressar o Brasil no rol dos países desenvolvidos.

Capelato (2011) explica que esse período foi marcado por uma grande

mobilização em defesa da modernização nacional que resultou na reorganização do

Estado, reordenamento da economia e num novo redirecionamento das esferas

pública e privada. Uma nova relação entre o Estado e a sociedade pode ser verificada

a partir de então no exercício do poder, no incentivo às práticas culturais

modernizantes e no trato do líder com as massas.

Como estratégia de proteção da nação contra influências estrangeiras, o

Estado Novo colocou em prática ações integralistas voltadas ao fortalecimento de um

espírito patriótico uno de maneira a superar o multiculturalismo nacional. Nesse

sentido, a educação monitorada pelo Estado seria caminho eficaz para a

homogeneização cultural do país.

Em novembro de 1937, foi promulgada uma nova Constituição. Nela, o

governo retrocede em questões fundamentais, como o direito à educação, a

obrigatoriedade e a gratuidade do ensino. Como assim? Observe os artigos 125 e 130

na nova Carta:

Artigo 125 – A educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a esse dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua execução de suprir suas deficiências e lacunas da educação particular.

Artigo 130 – O ensino primário é obrigatório e gratuito. A gratuidade, porém, não exclui o dever de solidariedade dos menos para com os mais necessitados; assim, por ocasião da matrícula, será exigida aos que não alegarem, ou notoriamente não puderem alegar, escassez de recursos, uma contribuição módica e mensal para a caixa escolar.

Com isso, o Estado assume papel secundário na educação pública e deixou

subentendido que os de maiores recursos deveriam custear a educação dos mais

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pobres. Além disso, em seu artigo 129, reforça a diferença oferecida de educação

entre as classes sociais mais e menos favorecidas:

Art. 129. A infância e a juventude, a que faltarem os recursos necessários à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela fundação de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais.

O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes menos favorecidas é, em matéria de educação, o primeiro dever de Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais.

É dever das industrias e dos sindicatos econômicos criar, na esfera da sua especialidade, escolas de aprendizes, destinadas aos filhos de seus operários ou de seus associados. A lei regulará o cumprimento desse dever e os poderes que caberão ao Estado, sobre essas escolas, bem como os auxílios, facilidades e subsídios a lhes serem concedidos pelo poder público.

Assim, o estímulo dado às classes sociais menos favorecidas, limitava-se ao

ensino profissionalizante, para que fosse útil à Nação com a força do seu trabalho.

Na vigência do Estado Novo (1937-1945), o ministro Gustavo Capanema

empreendeu outras reformas do ensino, regulamentadas por diversos decretos-leis: a

lei orgânica do Ensino Industrial (1942); cria o Serviço Nacional de Aprendizagem

Industrial (SENAI) (1942); A lei orgânica do Ensino Secundário (1943); e a lei orgânica

do ensino comercial (1943).

Nesta reforma, Gustavo Capanema estipulou que o curso secundário seria

reestruturado passando a ser constituído pelo ginásio, de 4 anos, e o ensino colegial,

de 3 anos. O ensino colegial dividia-se em clássico e científico, sendo a grade

curricular do primeiro ano da área de humanidades.

Somente os alunos do Ensino Secundário tinham acesso à universidade. Não

havia articulação entre os níveis educacionais e ramos do ensino profissional,

inviabilizando a mudança de curso por parte do aluno preso ao sistema político

educacional. Neste período, o ensino ficou assim composto:

I – 5 anos de curso primário (de 7 a 11 anos);

II – 4 anos de curso ginasial (12 a 15 anos);

III – 3 anos de colegial (16 a 18 anos), podendo ser na modalidade clássico ou

científico (que acabou concentrando 90% dos alunos desse nível). O ensino colegial

(Ensino Médio) perdeu o seu caráter “propedêutico” (preparatório para o ensino

superior) e voltou-se para a formação geral.

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5. Educação no Brasil pós-Vargas

Com o término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e com a deposição

de Vargas, deu-se início a Segunda República. O período pós-guerra afirma, também,

a supremacia econômica dos Estados Unidos, que choca com o modelo nacionalista

existente até então. Aranha (1996) assinala que não tardou para que as empresas

multinacionais, principalmente as automobilísticas, adentrassem o Brasil e, com isso, a

cultura americana.

Com isso, “crescem as disparidades regionais, os centros urbanos começam

a inchar, aumenta a inflação e as distorções da concentração de renda agravam a

pobreza” (ARANHA, 1996, p. 196).

O interesse do governo pela educação nacional estava articulado com o

contexto político, econômico e social do país pós-1930, período de redemocratização,

quando a economia e a cultura sofreram uma série de mudanças com o processo de

internacionalização. Na educação, o marco foi a promulgação da Constituição de

1946, na qual a educação surge como “um direito de todos”.

Em 1948, é apresentado um anteprojeto da Lei de Diretrizes e Bases para a

educação, baseado no trabalho de educadores sob a liderança de Fernando de

Azevedo em defesa da democratização do ensino público, que leva 13 anos para ser

promulgada. Isso se deu devido a algumas divergências no percurso, como o

substitutivo do deputado Carlos Lacerda em defesa da escola particular, sendo esta

majoritariamente de iniciativa religiosa. Com isso, ao se posicionarem a favor da

liberdade de ensino, consequentemente, estavam contra a democratização da

educação, dificultando o acesso da camada popular às escolas.

Porém, os intelectuais escolanovistas que estiveram à frente do Movimento

pela Educação Nova retomaram a luta pelas conquistas obtidas na Constituição de

1934. Apoiados por intelectuais, estudantes e líderes sindicais, iniciam a Campanha

em Defesa da Escola Pública. O movimento culmina com o manifesto "Mais uma vez

convocados” (1959), que contou com a assinatura de 189 pessoas, entre elas

Florestan Fernandes, Darci Ribeiro, Anísio Teixeira, Fernando Henrique Cardoso, Caio

Prado Júnior, entre outros, em defesa do escola laica, pública, obrigatória e gratuita.

Em 1961, é promulgada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação –

Lei nº 4.024. Apresenta como vantagens a possibilidade de dar mais autonomia aos

órgãos estaduais, garante 12% do orçamento da União e 20% dos municípios para a

educação, garante a obrigatoriedade escolar no ensino primário. Porém, segundo

Aranha (1996), são inúmeras as desvantagens dessa lei: mesmo com as pressões

para destinar recursos apenas para educação pública, a lei atende também às escolas

privadas; o ensino técnico continua fora da área de interesse, quer seja o setor

industrial, comercial ou agrícola.

Procure na internet o manifesto “Mais uma vez convocados” (1959) e analise o conteúdo comparando com o primeiro Manifesto já lido por você (1932).

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Com o golpe militar de 1964, o país vive tempos sombrios da ditadura,

sinônimo da destituição do estado de direito. Em nome da segurança nacional é usado

qualquer mecanismo de tortura, censura, exílio, calando qualquer manifestação

popular, principalmente das minorias. Na economia, o governo investe cada vez mais

na vinculação ao capitalismo internacional, investindo na “industrialização excludente",

que garante o desenvolvimento econômico às custas do desenvolvimento social, por

meio da desigual distribuição de renda (ARANHA, 1996).

Esse período é contraditório, pois se de um lado o governo autoritário se

justificou pela defesa da identidade nacional, por outro submeteu-se ao capital

estrangeiro e, consequentemente, o trabalhador à ausência de qualidade de vida

devido aos salários insuficientes.

A educação sofreu diretamente com tal direcionamento da vida política,

econômica e social. A repressão extingue a UNE – União Nacional dos Estudantes,

considerada subversiva, que continuou a agir clandestinamente, sendo seus

integrantes “reprimidos” pelos militares. Os grêmios escolares são convertidos em

Centros Cívicos sob a responsabilidade do professor de Educação Moral e Cívica,

cargo de confiança do diretor e sem passagem pelo Departamento Estadual de Ordem

Política e Social (Deops). Em 1969, por meio do Decreto-lei nº 477, proíbe alunos,

professores e funcionários a qualquer manifestação de caráter político.

A LDB 4024/61 não foi revogada, mas passa por adequações impostas por

meio das Leis 5.540/68 que estabelece alterações no terceiro grau, e a 5692/71 que

legisla sobre o 1º e 2º graus.

No terceiro grau, a reforma extinguiu a cátedra, isto é, o cargo de professor

universitário titular em uma disciplina, unificou o vestibular, reuniu as faculdades em

universidades para concentração de recursos humanos e financeiros e definiu que o

cargo de reitor poderia ser alheio ao quadro de professores, podendo ser ocupado por

alguém indicado pelo governo (ARANHA, 1996).

Com a Lei 5692/71, o governo reformulou a educação básica com o que

Aranha (1996, p. 215) considerou “aparentes vantagens”, pois o fato de que estavam

na letra da lei não significa de que saíram do papel:

extensão obrigatória do 1º grau (1ª a 8ª séries);

escola única: superação da seletividade com a eliminação do dualismo escolar, já que não há separação do ensino secundário propedêutico, pois existe a terminalidade;

integração geral do ensino primário ao superior (continuidade);

cooperação das empresas na educação.

Em 1985, termina o governo militar, deixando o país com uma enorme dívida

externa sob o controle do FMI – Fundo Monetário Internacional e, com isso, uma

população empobrecida. Foram vários os planos de estabilização econômica, que

previam mudança de moedas e congelamento de preços.

Na educação, o fracasso da Lei 5692/71 já era reconhecido. Por isso, a Lei nº

7044/82 "dispensa as escolas da obrigatoriedade da profissionalização, sendo

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retomada a ênfase para a formação geral” (ARANHA, 1996, p. 216). A situação da

educação nacional foi motivo de debates nos trabalhos da Constituinte 1987/1988.

O quadro a seguir, com base nas considerações de Aranha (1996, p. 223-4),

relaciona alguns pontos importantes sobre a educação na Constituição de 1988.

gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

ensino fundamental obrigatório e gratuito;

extensão do ensino obrigatório e gratuito, progressivamente, ao ensino médio;

atendimento em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos;

acesso ao ensino obrigatório e gratuito como direito público subjetivo, ou seja, o seu não-oferecimento pelo poder público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente (podendo ser processada);

valorização dos profissionais do ensino, com planos de carreira para o magistério público;

autonomia universitária;

aplicação anual pela União de nunca menos que 18%, e aos estados, Distrito Federal e o municípios de 25%, no mínimo, da receita resultante dos impostos;

distribuição dos recursos públicos assegurando prioridade ao atendimento das necessidades e ensino obrigatório nos termos do plano nacional de educação;

recursos públicos destinados às escolas comunitárias confessionais ou filantrópicas, desde que comprovada a finalidade não-lucrativa;

plano nacional de educação visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis e à integração das ações do poder público que conduzam à erradicação do analfabetismo, universalização do atendimento escolar, melhoria da qualidade do ensino, formação para o trabalho, promoção humanística, científica e tecnológica do país.

Chegamos finalmente à elaboração da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), que se encontra em vigor, elaborada observando as linhas mestras da Constituição.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, um projeto que tratava

da educação nacional observando as novas diretrizes nacional foi apresentado pelo

deputado Octávio Elísio à Câmara Federal.

Para a elaboração do texto final da proposta, foi eleito o deputado Jorge Hage

como relator do projeto. A proposta foi negociada, amplamente discutida com diversos

segmentos da sociedade por meio de debates e seminários com intelectuais

convidados para discutir os pontos polêmicos da reforma educacional. Em todo o

processo, setores da iniciativa privada, como de costume, se posicionaram e

buscaram angariar apoio de alguns parlamentares.

Esses debates e negociações deram origem a duas novas versões do texto

do deputado Elísio, sendo a última votada e aprovada na sessão de 13 de maio de

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1993. Tal projeto, ao passar pelo Senado, retornou a Câmara dos Deputados, pois o

senador Darcy Ribeiro (PDT/RJ), como relator na Comissão de Constituição, Justiça e

Cidadania do Senado, o rejeitou em seu parecer com o argumento de haver

inconstitucionalidades. Com o apoio do Ministro da Educação, Paulo Renato,

apresentou o substitutivo ao projeto que, após a apresentação de várias versões, o

substitutivo foi aprovado no dia 8 de fevereiro de 1996 e, no dia 29 do mesmo mês,

sua redação final (Parecer nº 72/96).

No dia 20 de dezembro de 1996, é sancionada, sem vetos pelo presidente da

república, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96).

Agora é a sua vez! Como vimos, cada LDB é resultante de seu contexto

histórico. Após ler a nova LDBEN/96 e pesquisar a respeito, aponte as contribuições

da nova LDBEN para a educação e para a formação do cidadão brasileiro na

atualidade.

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ROMANELLI, O.O. História da educação no Brasil. Petrópolis (RJ): Vozes, 1997.

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VIDAL, Diana Gonçalves. Educadores Brasileiros: Anísio Teixeira, Loureço Filho e Fernando de Azevedo. Apresentação: Coleção Grandes Educadores 2006. (Apresentação de DVD).

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HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

Introdução

Como vimos no Módulo I, a ascendência da burguesia e de suas

atividades mercantis favoreceram novas empreitadas comerciais, como a

expansão marítima. Nesse contexto, a burguesia portuguesa, em busca de

novas rotas que aumentassem o lucro sobre as mercadorias, anulando a figura

do atravessador, acabou por chegar na América do Sul.

A educação brasileira tem como parâmetro mais de 500 anos de

experiências sociais, políticas, econômicas, culturais e educacionais. Nesse

Módulo, procuraremos revisitar esse processo. Inicialmente, trataremos da

educação na chegada dos portugueses ao território chamado de Novo Mundo

no período histórico denominado Brasil colonial. Na segunda parte, abordaremos

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a primeira legislação educacional brasileira; seguida da educação republicana e

seus princípios liberais; a educação na Era Vargas (1930-1945) e pós-Vargas

(1945-1888).

Ao visitar cada parte, reflita sobre como foi a sua formação escolar e

quais foram as influências sobre ela. Vamos lá?

1. A educação do Brasil Colonial

A colonização portuguesa do novo território (século XVI) foi bastante

tumultuada, por isso, o rei de Portugal, Dom João III, envolveu a Monarquia na

ocupação das novas terras nomeando Tomé de Souza como governador geral

do Brasil. Este chegou ao Brasil em 1549, juntamente com os primeiros jesuítas,

chefiados por Manuel de Nóbrega (SAVIANI, 2013).

O cenário encontrado por eles era bem diferente de Portugal: floresta

virgem, silêncio, animais, pouca população com características e culturas muito

diferentes da europeia. Havia muito índio para poucos portugueses, como

salientou Paiva (2000).

Tal realidade traçou o cotidiano dos portugueses na colônia, que se fazia

entre o ataque e a defesa, entre o ideal religioso e o praticado, pois a violência

estava sempre presente para conquistar a terra, subjugar e escravizar os

indígenas.

Os padres jesuítas, entre outras ordens que se estabeleceram no Brasil,

criaram escolas, colégios e seminários, onde ensinaram aos nativos da terra os

saberes da leitura, escrita e cálculos de forma rudimentar, mas principalmente a

catequização, de modo que a cultura nativa não era respeitada. Não podemos

ignorar que os portugueses trouxeram um padrão de educação europeu,

especificamente lusitano, o que não significa que as populações que por aqui

viviam não possuíam características próprias de educar.

“O que representava a alfabetização para os jesuítas a ponto de quererem, desde o início, alfabetizar os índios, quando nem em Portugal o povo era alfabetizado?” (PAIVA, 2000, p. 43)

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As letras, conforme Paiva (2000), era a adesão à cultura portuguesa.

Esse modelo de educação pensado pela Igreja Católica, numa relação estreita

com o governo português, tinha como finalidades: persuadir os indígenas a

adotar os princípios da fé cristã; estimular o hábito do trabalho; e engrossar o

número de aliados, uma vez que os indígenas convertidos eram incentivados a

lutar contra inimigos externos, como também contra os indígenas que resistiam

à conversão.

Veiga (2007) destaca um aspecto importante que é a chegada dos

nativos africanos escravizados pelos portugueses a partir do século XVI. Nesse

contexto, o ensinar estava destinado aos indígenas, aos nativos africanos e aos

filhos dos colonizadores brancos. Portanto, aos indígenas e nativos africanos

eram ofertados além da alfabetização, da pregação e do trabalho, o ensino de

artes e ofícios.

A certa altura, os colégios se voltaram para os filhos dos colonos que

recebiam um ensinamento mais aprofundado, não restrito à propagação da fé

cristã. Esses seriam padres, advogados ou ocupariam cargos públicos,

possibilitando à sociedade se expandir (PAIVA, 2000).

A educação jesuítica procurava seguir um documento curricular: o Ratio

Studiorum, que foi elaborado em 1599. A sua diretriz tinha como base o conteúdo

organizado pela Igreja Católica: o ensino da gramática média, da gramática

superior, das humanidades, da retórica, da filosofia e da teologia. O ensino

rejeitava as ciências físicas ou naturais, bem como a técnica ou as artes, visando

apenas à formação humanística, literária, abstrata, além de dogmática

(ARANHA, 1996).

Com o Tratado de Madrid entre Portugal e Espanha no ano de 1750, a

até então confortável situação da Companhia de Jesus no Brasil começou a se

deteriorar. Em 1759, a expulsão desta ordem religiosa das terras brasileiras,

comandada pelo então primeiro-ministro de Portugal, Marquês do Pombal,

significou uma remodelação total do sistema de ensino brasileiro. Por ordem do

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Estado, os jesuítas tiveram seus livros e manuscritos destruídos pelos

portugueses e a religião foi deixada de lado nos currículos. A desestruturação

da escola jesuíta fez com que os índios perdessem espaço no sistema de ensino.

A reforma educacional pombalina, que ocorreu em 1772, sofreu

influência dos ideais iluministas com vistas a modificar a educação no Brasil.

Tratava-se de uma tentativa de introduzir matérias mais práticas no dia a dia

escolar.

Depois da instauração das mudanças ocasionadas após a interrupção

da educação jesuítica, o Brasil caminhou na criação de um ensino público,

implantando, dessa forma, as aulas régias que, segundo Cyntia Greive (2007),

eram estudos avulsos ministrados por um professor autorizado pelo rei para

lecionar em salas alugadas ou nos antigos prédios da Companhia de Jesus,

dando protagonismo ao professor no processo educacional. As aulas régias, por

serem realizadas nas casas dos próprios professores, eram difíceis de serem

controladas pelo governo. Não havia, também, uma sistematização da idade

escolar.

Com a transferência da Corte para o Brasil, em 1808, a educação que

predominou tinha como objetivo formar profissionais aristocráticos e da corte,

ficando de fora os grupos sociais inferiores. D. João optou por implantar o

sistema mútuo ou lancasteriano que, para ele, exigia menos recurso e era mais

racional, pois ensinava oralmente a um maior número de alunos por meio da

repetição e memorização.

A presença da coroa portuguesa impulsionou alguns investimentos na

área da educação, aportes que culminaram na criação das primeiras escolas de

ensino superior. Estes locais tinham como foco, exclusivamente, preparar

academicamente os filhos da nobreza portuguesa e da aristocracia brasileira.

2. A educação se torna lei

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Em 1822, anunciou-se a independência do Brasil declarada por D. Pedro

I, dando início ao período Imperial. No movimento de estruturação do Império,

uma das primeiras ações refere-se à elaboração de leis.

A constituição de 1824 instituiu a instrução primária e gratuita para todos

os cidadãos brasileiros e o oferecimento de colégios e universidades. Faria Filho

(2009) chama a atenção para o fato da instrução primária ser gratuita, mas não

obrigatória. Isto porque sem tornar a escolarização obrigatória, a demanda por

escolas seria justamente das classes mais abastadas, se revelando como uma

forma de favorecer os já privilegiados financeiramente. Por outro lado, a

gratuidade do ensino não representou investimentos em construção de escolas

com espaços físicos adequados.

Em 15 de outubro de 1827, foi sancionada a primeira Lei Geral relativa

ao Ensino Elementar. O artigo 1º estabelecia que “Em todas as cidades, vilas e

lugares mais populosos, haverão as escolas de primeiras letras que forem

necessárias” e, também, exames para seleção de mestres e mestras.

Nesse cenário, a escola merece uma atenção especial porque, como

pontua Souza (1999), impunha hábitos de pontualidade – remetendo à questão

do tempo escolar, ordem e aproveitamento máximo desse tempo por meio das

aprendizagens importantes para a vida adulta. O currículo estabelecido pelo

artigo 6º era: o ensino da leitura, da escrita e da matemática, além dos princípios

de moral cristã da religião católica e da história do Brasil.

Antes de investir na formação dos professores, o preparo docente era

dado nas escolas de ensino mútuo instaladas a partir de 1820. A Lei de

15/10/1827 em seu art. 5º afirmava que “os professores que não tiverem a

necessária instrução deste ensino irão instruir-se em curto prazo e à custa de

seus ordenados nas escolas da Capital”. Cabia ao professor buscar a sua

formação, custeando-a.

O Ato Adicional de 1834, instituído pelo governo regencial, definiu que o

ensino elementar, o secundário e a formação de professores seriam de

responsabilidade das províncias, e o ensino superior ficaria sob a

responsabilidade do poder central. Com a descentralização do ensino, foi criada

a primeira Escola Normal na Província do Rio de Janeiro, pela Lei n° 10, de 1835,

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que determinava: “Haverá na capital da Província uma escola normal para nela

se habilitarem as pessoas que se destinarem ao magistério da instrução primária

e os professores atualmente existentes que não tiverem adquirido necessária

instrução nas escolas de ensino mútuo, na conformidade da Lei de 15/10/1827.”

Nos anos de 1840, o ensino mútuo entrou em desuso e foi substituído

pelo método simultâneo ou misto com o auxílio de monitores durante as aulas.

No período de 1868-1876 foi implantado o método intuitivo e as lições de coisas,

isto é, o aluno tinha contato com objetos, animais etc, todavia, este método

passou a ser mais divulgado a partir de 1870. Nesse momento, as cartilhas

passaram também a ser inseridas, havendo um investimento maior em materiais

escolares impressos. Mesmo assim, a educação primária se encontrava em

condições precárias apesar dos dispositivos legais.

Já o ensino secundário, destinado aos filhos da elite, que se voltava para

a preparação para o ingresso no ensino superior ou para ocupar cargos

administrativos, tinham o Colégio D. Pedro II, criado em 1837, no Rio de Janeiro,

como referência de ensino e de administração.

Em relação ao ensino superior, frequentado pelos homens, foram

criadas duas faculdades de direito, duas de medicina, duas de farmácia, e duas

de engenharia. Havia também academias militares e aulas avulsas de ensino

superior.

Após o período imperial, diminuiu a preocupação com a educação e ela

deixou de ser prioridade, pois a educação primária, a secundária e também o

ensino superior receberam poucos investimentos.

3. A educação republicana

A partir de 1850, o Brasil vivia um período de “prosperidade” com a

introdução do trabalho assalariado, crescimento industrial e modernização

agrícola, surgindo, desta maneira, um novo quadro econômico e social no país.

Cada vez mais se acentuavam as oposições ao governo devido à escravidão e

à política imigratória, na qual os trabalhadores estrangeiros substituíam a mão

O artigo de André Paulo Castanho (2017), publicado na Revista Histedbr, trata sobre os métodos de ensino utilizados no século XIX. Localize a obra publicada na internet e analise as características do método monitorial e mútuo e intuitivo.

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de obra escrava na lavoura, mas uma parte, com o tempo, acabava a se deslocar

para a cidade em busca de oportunidades de trabalho. Com isso, a indústria

recebeu uma massa de trabalhadores livres já com experiência, o que resultou

numa produção maior.

Foi, então, que se deu o primeiro grande surto de desenvolvimento da

rede de ensino paulista, quando a Província conheceu considerável progresso

material, graças à expansão da cultura e do comércio do café, à construção das

estradas de ferro, aos primeiros ensaios à industrialização, isso tudo aliado,

posteriormente, à abolição do trabalho escravo. Desta forma, o trabalho passou

a ser visto dentro de uma concepção capitalista, de gerador de riquezas e a

educação como responsável pela homogeneização da cultura brasileira,

conforme os anseios da Ordem e do Progresso. Era preciso,

Regenerar as populações brasileiras, núcleo da nacionalidade, tornando-as saudáveis, disciplinadas e produtivas, eis o que se esperava da educação, erigida nesse imaginário em causa cívica de redenção nacional. Regenerar o brasileiro era dívida republicana a ser resgatada pelas novas gerações. (CARVALHO, 1989, p. 10).

Segundo José Murilo de Carvalho (1992, p.10-1), para a elite

republicana “educação pública significava acima de tudo, formar almas, sendo

por isso, peça fundamental”. Para atingir tal objetivo, formalizou as ideias de

obrigatoriedade e gratuidade do ensino, fornecendo condições dentro de critérios

científicos, para o povo exercer a cidadania e ser produtivo.

Os republicanos paulistas identificavam a formação do professor como

passo essencial para a renovação eficiente do ensino, sendo a Escola Normal

polo multiplicador das luzes, “que colocam as ideias em marcha, impulsionando

a história em direção ao progresso e à liberdade” (MONARCHA, 1999, p.172).

Em 1890, o curso de formação dos professores passou por uma reforma

de ensino, entrando numa fase considerada como “uma das mais brilhantes da

história” (AZEVEDO, 1996). O governador do Estado de São Paulo, Prudente de

Moraes, confiou ao Dr. Caetano de Campos a direção da reforma de ensino

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normal, que procurou imprimir a sua crença no poder educativo das ciências.

Sendo assim,

Sobre a desoladora figura do mestre-escola do Império, combalido, sem vitalidade e sem ânimo, vergado pelo abandono e pela precariedade de recursos financeiros e materiais – sobre a figura do mestre-escola da palmatória e do compêndio –, foi construída a figura enaltecida dos apóstolos da instrução primária. Profissionais de sólida competência, cônscios de sua missão, formados pela Escola Normal – o “templo de luz”, o viveiro de onde sairiam os heróis anônimos da República. (SOUZA, 1998, p.62).

Anexa à Escola Normal, funcionava a Escola Modelo, laboratório onde

as futuras professoras observavam e exercitavam a profissão sob a orientação

de um professor. Essa modalidade escolar ficou conhecida como grupos

escolares. Constituiu-se assumindo uma nova concepção de escola primária,

contrapondo-se à escola isolada, em que um só mestre ensinava a um grupo de

alunos cujas idades e conhecimentos cobriam todo o ensino primário.

Pressupunha alunos classificados e agrupados o mais homogeneamente

possível, em função da sua idade e conhecimentos.

Sendo assim, o emprego do método simultâneo e a consequente

organização dos alunos em classes sob a regência de um professor para cada

grupo de alunos favoreciam não somente a distribuição do trabalho, como

também a maior capacidade de supervisão e controle da ação dos professores

e dos alunos. À organização das escolas graduadas, então, foram acrescidas as

técnicas de supervisão e eficiência das instituições, cercadas de racionalidade

científica, o exame e classificação científica das crianças e a distribuição,

previamente planejada, de tempos e tarefas, movimentos e ações (FRAGO,

1998).

É possível relacionar as estruturas e modalidades organizativas da

escola com a inculcação de valores e normas de comportamentos, com a

estatização do ensino, com a evolução de formas de organização do trabalho,

com o desenvolvimento de uma administração escolar burocratizada, com a

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afirmação da escola como organismo social, com a definição das estruturas de

poder no seu interior e com a evolução do currículo.

Dessa forma, as escolas graduadas foram organizadas no sentido de

formar as crianças não só com os conhecimentos morais e científicos

necessários, mas também com hábitos e valores pertinentes ao mundo do

trabalho. O grupo escolar se constituiu um modelo escolar a ser implementado

pelos outros estados do país. Viagens de estudo a esse estado e empréstimo de

técnicos passam a ser rotina administrativa na hierarquia das providências com

que os responsáveis pela Instrução Pública de outros estados tomam iniciativas

de remodelação escolar na Primeira República (CARVALHO, 2000, p.226).

3.1. Movimento pela Escola Nova

Nos anos 1920, os intelectuais viram na educação um modo de formar

a nacionalidade por meio da inculcação de uma cultura nacional e uma educação

moral que assegurassem o progresso na Nação. Os integrantes desse grupo se

dedicaram a ler e a traduzir textos estrangeiros de várias obras; e criaram a

Associação Brasileira de Educadores (1924), responsável pela organização das

Conferências Brasileiras de Educação, nas quais circulavam as novas

proposições educacionais. Assim, este ideário, principalmente na versão dos

norte-americanos John Dewey e William Kilpatrick, chegou ao país e conquistou

novos adeptos entre os jovens intelectuais.

No Brasil, a Escola Nova apresentou três dimensões: a pedagógica, a

política e a filosófica ou das finalidades (VIDAL, 2006). Na dimensão pedagógica,

a Escola Nova caracterizou-se pela contraposição à escola tradicional, na qual

o professor é o centro do processo de ensino e aprendizagem, transmitindo seus

conhecimentos aos alunos; a criança é aquela que ouve, numa atitude imóvel; e

a aprendizagem acontece através da memorização dos conteúdos. Em

oposição, a Escola Nova propõe os métodos ativos, através dos quais a criança

constrói o seu conhecimento através de experiências; e uma nova organização

do espaço escolar com suas cadeiras e móveis facilitando o trabalho em grupo.

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Nessa perspectiva, o aluno ocupa o papel central do processo de ensino-

aprendizagem e o professor torna-se mediador desse processo.

O movimento apresentou também uma dimensão política, pois a

expansão do escolanovismo deveu-se também no campo das iniciativas

públicas. Diferentemente do modo que surgiu em outros países como uma

alternativa ao ensino oficial, no Brasil, vários estados brasileiros investiram na

reforma dos seus sistemas educativos e, para isso, convidaram educadores de

peso para este fim: São Paulo – Sampaio Dória (1920-25), Lourenço Filho (1930-

31), Fernando de Azevedo (1933) e Almeida Jr. (1935-36); Pernambuco –

Carneiro Leão (1928-1930); Minas Gerais – Francisco Campos (1927-1930);

Ceará – Lourenço Filho (1922-23); Bahia – Anísio Teixeira (1925-27); Rio de

Janeiro – Carneiro Leão (1922-26), Fernando de Azevedo (1927-1930) e Anísio

Teixeira (1931-35).

No cargo de reformadores, esses intelectuais vão se deparar de frente

com os problemas educacionais e pensar solução para eles, buscando, com

isso, a resposta para o lugar da escola na constituição da sociedade brasileira.

As proposições educacionais dos reformadores contribuíram significativamente

para a penetração e expansão do ideário escolanovista no país.

As diferentes finalidades da educação, terceira dimensão do movimento

pela Escola Nova, apontadas por Vidal (2006), justificam parte dos embates

entre Católicos e Liberais, que se acirraram a partir de 1930, quando é criado o

Ministério da Educação e Saúde, trazendo para a esfera federal as discussões

sobre a educação nacional.

Tanto quanto os reformadores liberais, os intelectuais católicos estariam

preocupados com a formação da nacionalidade por meio da educação popular.

Porém, os católicos contrapuseram-se a alguns princípios e à doutrina

pedagógica difundida pelos intelectuais, tais como a “substituição da religião pela

razão e pela ciência”, acusando-os por suas propostas materialistas, utilitaristas

e pragmatistas, esquecendo os valores espirituais (PAGNI, 2000). Por outro

lado, os intelectuais liberais acusavam os católicos de defenderem a

manutenção do ensino religioso, não oferecendo liberdade de escolha aos

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alunos; e de praticarem um ensino acadêmico, classicista, verbalista e pouco

prático (DI GIORGI, 1992).

A partir de 1945, segundo Di Giorgi (1992), as ideias escolanovistas já

não eram estranhas ao professorado do país. É possível percebermos a sua

influência até os nossos dias, pois uma das maiores preocupações do professor

é não ser chamado de “tradicional”, sinônimo de atraso nas concepções e

práticas pedagógicas. Acostumamo-nos, enquanto professores, a dizer que a

função social da escola é formar cidadãos críticos, pois, desta forma, estaremos

contribuindo para a transformação escolar. Tal expressão é a materialização da

apropriação pelos educadores das ideias propagadas pela Escola Nova, ainda

que a prática esteja longe de um ensino centrado no aluno, com métodos

renovados.

4. A educação na Era Vargas (1930-1945)

Em 1930, o presidente Washington Luiz foi deposto por um movimento

armado que colocou Getúlio Vargas no poder. Os anos do Governo Provisório

foram marcados por lutas e conflitos. Com o golpe, alguns nomes de projeção

na educação da década anterior ocuparam posições de destaque no cenário

educacional.

É no governo provisório de Getúlio Vargas que se iniciou um movimento

no sentido de criar um sistema organizado de ensino. Uma das primeiras

iniciativas do governo foi a criação do Ministério da Educação, ocupado por

Francisco Campos, e das secretarias estaduais de Educação.

Ao assumir o Ministério, Campos promulgou vários decretos em 1931 e

1932, visando uma ação para unificação da educação nacional. Com isso,

legislou sobre a organização da universidade do Rio de Janeiro e o estatuto das

universidades, incluindo a Faculdade de Educação, Ciências e Letras voltada

para a formação do professor secundário; criou o Conselho Nacional de

Educação; dispôs novos direcionamentos para o ensino secundário dividindo-o

em dois ciclos: um fundamental de cinco anos, e outro complementar de dois

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anos, voltado para a preparação para o acesso ao curso superior; e, por fim,

legislou sobre o curso comercial. (ARANHA, 1996).

Nesse cenário, os intelectuais que estiveram à frente das reformas

educacionais dos estados e que participavam da ABE, ao apoiarem o golpe de

1930, alimentavam a expectativa de que o Governo Provisório rompesse com as

oligarquias regionais e com as influências católicas, porém isso não aconteceu,

frustrando-os. Em meio a um contexto político tumultuado é que foi gestado o

Manifesto dos Pioneiros pela Educação Nova (1932), redigido por Fernando de

Azevedo, mas contendo as posições teóricas de outros intelectuais, inclusive de

Anísio Teixeira.

Nessa reformulação proposta pelo redator do documento, e autorizada por seus signatários, preservam-se também algumas bandeiras do liberalismo como a igualdade, da individualidade e da liberdade formal, bem como a defesa da extensão da educação pública comum a todos e a sua diferenciação conforme as aptidões individuais e as funções profissionais necessárias à sociedade atual (PAGNI, 2000, p. 120).

Esse movimento, que resultou na publicação do Manifesto, saiu vitorioso

por ter desencadeado a criação da Universidade de São Paulo e a incorporação

de algumas de suas reivindicações na Constituição de 1934, que foi a primeira

a incluir em seu texto um capítulo inteiro sobre a educação.

3.2 As escolas rurais em debate

Você acha que os debates acabaram por aí? Certamente não! As escolas rurais,

que eram maioria no país, se tornaram alvo também de preocupação dos

intelectuais da educação.

Fernando de Azevedo defende algumas teses no Manifesto relacionadas à educação pública no Brasil. Pesquise o documento na internet, leia e sintetize as ideias principais.

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Isso mesmo! Após muito tempo de descaso, a escolarização da infância

rural tornou-se pauta de debates entre intelectuais e governantes que defendiam

a educação enquanto como mola propulsora do progresso e, com isso, o direito

dos brasileiros à escolarização.

Nesse período, a indústria brasileira ganhava um grande impulso que foi

acompanhado pela formulação de leis voltadas para a regulamentação do

mercado de trabalho e medidas de investimentos em infraestrutura. No entanto,

além de provocar uma grande disparidade regional, pois as indústrias

encontravam-se restritas aos grandes centros urbanos da região sudeste, gerou

um problema social e econômico devido ao grande deslocamento da população

rural para as regiões urbanas industrializadas.

Os problemas gerados pela crescente industrialização, responsável pela

migração de parte da população que morava no campo para as cidades com

intuito de buscar melhores condições de trabalho e de vida, impulsionaram a

ação e a propagação do pensamento ruralista. Concomitantemente, nessa

época, acirraram-se os debates sobre as especificidades da escola na zona

rural, emergindo, assim, algumas correntes de pensamento em defesa de uma

educação diferenciada que fornecesse subsídios para fixar o homem no campo.

Assim, duas correntes pedagógicas voltadas para o campo se

sobressaíram: o ruralismo pedagógico e a escola comum. O ruralismo

pedagógico foi um movimento delineado e constituído para definir uma proposta

de educação do trabalhador rural que tinha como fundamento básico a ideia de

“fixação do homem no campo por meio da pedagogia” (BEZERRA NETO, 2003,

p. 15). Dessa forma, a proposta defendida pelo movimento ruralista girou em

torno de três elementos fundamentais para uma educação diferenciada: o

professor, o método de ensino e o currículo. Para essa corrente, os professores

deveriam potencializar o ensino a fim de fornecer possibilidades para que o

homem permanecesse no campo, se orgulhasse do seu modo de vida e tivesse

uma educação que atendesse às necessidades de cada região:

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[...] entendiam como sendo fundamental que se produzisse um currículo escolar que estivesse voltado para dar respostas às necessidades do homem do meio rural, visando atendê-lo naquilo que era parte integrante do seu dia-a-dia: o currículo escolar deveria estar voltado para o fornecimento de conhecimentos que pudessem ser utilizados na agricultura, na pecuária e em outras possíveis necessidades de seu cotidiano. (BEZERRA NETO, 2003, p. 15).

Sud Mennuci, representante dessa corrente pedagógica voltada para a

zona rural, sustentava em seu discurso um modelo de escola rural de

características regionais sob a alegação de que “Temos que separar o Ensino

das cidades do Ensino dos meios rurais e do ensino da zona litorânea”

(MENNUCCI, 1934, p. 133), pois, na sua visão, era: “[...] mister diferenciá-los

quanto à sua orientação e ao seu alcance, cindi-los para que produzam três

mentalidades absolutamente diversas e que, no entanto, reciprocamente se

completem para o equilibro social do organismo nacional” (MENNUCCI, 1934, p.

133).

Nesse sentido, acreditava em uma escola rural que atendesse as

características da realidade em que estivesse inserida e, também, em uma

formação específica para o professor que lá fosse atuar, já que as escolas

normais brasileiras, com alto padrão de excelência na sua visão, formavam

professores urbanos. Para isso, o Estado deveria criar escolas Normais Rurais

que se organizariam sob três aspectos cruciais: o pedagógico, o

higiênico/sanitário e o agrícola. Essas escolas deveriam “[…] formar professores

quase hostis à vida citadina, perenemente preocupados com a maior eficiência

do campo e de tal modo que se constituam em leaders do núcleo em que vão

servir” (MENNUCCI, 1934, p. 144-145).

No entanto, as ideias ruralistas de educação rural, voltadas para a

formação do trabalhador rural, não foram unânimes entre os intelectuais da

época. Existiam aqueles que saíram em defesa de uma escola comum, capaz

de atingir indistintamente toda a população estudantil brasileira da cidade ou da

roça, como os intelectuais divulgadores da Escola Nova, principais

representantes do Ensino comum. Entre eles, destaca-se Anísio Teixeira que,

ao defender e divulgar os ideais da escola comum, anunciava que essa escola

deveria voltar-se “à formação comum do homem e à sua posterior especialização

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para os diferentes quadros de ocupações em uma sociedade moderna e

democrática […]” (TEIXEIRA, 2007, p. 44). Para tanto, ela não deveria distinguir

aqueles que precisavam ou não de trabalhar, mas a sua finalidade deveria ser

educar a todos para o trabalho, “distribuindo-os pelas ocupações, conforme o

mérito de cada um e não segundo a sua posição social ou riqueza” (TEIXEIRA,

2007, p. 60).

Essa escola deveria ser uma instituição com programas voltados para a

vida da comunidade, considerando a realidade social, o trabalho e as tradições.

Ao considerar esses aspectos, o intelectual argumentava que: “A escola

primária, por este motivo, tem de ser instituição essencialmente regional,

enraizada no meio local, dirigida e servida por professores da região, identificada

com os seus mores, seus costumes” (TEIXEIRA, 2007, p. 67). Desse modo, o

docente, partilhando da mesma realidade dos alunos, compreenderia que o

programa da escola é a “própria vida da comunidade, com o seu trabalho, as

suas tradições, as suas características, devidamente selecionadas e

harmonizadas” (TEIXEIRA, 2007, p. 67).

Nessa visão, a escola não poderia restringir os conhecimentos comuns

para as crianças em razão delas estarem inseridas em um meio rural e substituí-

los pela formação profissional. Ao contrário, ela deveria oferecer a educação

comum a todas as crianças o maior tempo possível, considerando o meio social

em que estavam inseridas. Em outras palavras, a escola proposta seria “a escola

fundamental de educação comum do brasileiro, regionalmente diversificada,

comum não pela uniformização, mas pela sua equivalência cultural” (TEIXEIRA,

2007, p. 67). A defesa de Anísio Teixeira era por uma escola primária organizada

e comprometida com a formação do cidadão, tanto na cidade quanto no campo.

Almeida Junior (1944) também segue em defesa do ensino comum, igual

para todas as crianças, democrático, que respeitasse o direito de acesso e de

oportunidades às crianças do campo e da cidade. Em seu artigo intitulado “Os

objetivos da escola primária rural”, publicado na Revista Brasileira de Estudos

Pedagógico, assinalava que os brasileiros estavam insatisfeitos com a escola

rural por três aspectos: pelo número insuficiente para atender a demanda; por

responsabilizá-la pelo fluxo migratório da roça para a cidade; e pela inadequação

de seu programa, não sendo capaz de dar às crianças a formação devida.

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Com relação à inadequação do ensino primário rural à sua finalidade,

que era escolarizar a infância para atuar na sociedade, o autor advertiu que a

escola, como estava organizada, oferecia pouco (tempo, conteúdo, qualidade,

etc.) e era inadequada. Mas para melhorá-la seria necessário prover instalações

e equipamentos, formar os professores para atuar no meio no qual iriam

trabalhar e adequar os programas, o que possibilitaria “[…] a ambientação do

ensino, flexivelmente, não só aos interesses psicológicos do meio rural em geral,

mas ainda a cada um dos seus aspectos particulares” (ALMEIDA JÚNIOR, 1944,

p. 29).

Se por um lado a sociedade apontava esses três fatores como

problemáticos para o sucesso da escola rural, por outro lado, Almeida Júnior

(1944) asseverava que seu maior problema era a questão dos objetivos. Nesse

sentido, referenciava a dicotomia existente entre dois grupos de intelectuais: um

que defendia a escola primária rural profissional, cujo objetivo do professor rural

era educar a criança para ser um trabalhador agrícola (ruralismo pedagógico); e

o outro grupo que defendia a escola comum, tanto para o campo quanto para a

cidade, ou seja, para esse grupo a escola primária não poderia ter nenhum

caráter vocacional.

Embora as discussões acaloradas acontecessem em âmbito nacional,

não existia ainda uma legislação educacional federal que organizasse um

sistema nacional de educação. A educação primária ficava sob a

responsabilidade dos estados da federação, que legislavam sobre ela e a

financiavam, de maneira que as características, os programas e os métodos

direcionados para o ensino primário não convergiam em âmbito nacional.

3.3 Educação no Estado Novo

Em 1937, por força da Constituição que o impediu de continuar no cargo,

Vargas e seus aliados arquitetaram um Golpe de Estado, que o manteve na

presidência até 1945, no período denominado de Estado Novo.

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Pode-se dizer que o período do Estado Novo, instaurado por Getúlio

Vargas, foi um dos mais significativos na história do país no que se refere às

transformações políticas, econômicas e sociais. Esse período se desenvolveu

por um regime ditatorial nacionalista marcado pela transição da economia rural

brasileira para uma nova fase industrial urbana pautada por um plano

desenvolvimentista com o objetivo de ingressar o Brasil no rol dos países

desenvolvidos.

Capelato (2011) explica que esse período foi marcado por uma grande

mobilização em defesa da modernização nacional que resultou na reorganização

do Estado, reordenamento da economia e num novo redirecionamento das

esferas pública e privada. Uma nova relação entre o Estado e a sociedade pode

ser verificada a partir de então no exercício do poder, no incentivo às práticas

culturais modernizantes e no trato do líder com as massas.

Como estratégia de proteção da nação contra influências estrangeiras,

o Estado Novo colocou em prática ações integralistas voltadas ao fortalecimento

de um espírito patriótico uno de maneira a superar o multiculturalismo nacional.

Nesse sentido, a educação monitorada pelo Estado seria caminho eficaz para a

homogeneização cultural do país.

Em novembro de 1937, foi promulgada uma nova Constituição. Nela, o

governo retrocede em questões fundamentais, como o direito à educação, a

obrigatoriedade e a gratuidade do ensino. Como assim? Observe os artigos 125

e 130 na nova Carta:

Artigo 125 – A educação integral da prole é o primeiro dever e o direito natural dos pais. O Estado não será estranho a esse dever, colaborando, de maneira principal ou subsidiária, para facilitar a sua execução de suprir suas deficiências e lacunas da educação particular. Artigo 130 – O ensino primário é obrigatório e gratuito. A gratuidade, porém, não exclui o dever de solidariedade dos menos para com os mais necessitados; assim, por ocasião da matrícula, será exigida aos que não alegarem, ou notoriamente não puderem alegar, escassez de recursos, uma contribuição módica e mensal para a caixa escolar.

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Com isso, o Estado assume papel secundário na educação pública e

deixou subentendido que os de maiores recursos deveriam custear a educação

dos mais pobres. Além disso, em seu artigo 129, reforça a diferença oferecida

de educação entre as classes sociais mais e menos favorecidas:

Art. 129. A infância e a juventude, a que faltarem os recursos necessários à educação em instituições particulares, é dever da Nação, dos Estados e dos Municípios assegurar, pela fundação de instituições públicas de ensino em todos os seus graus, a possibilidade de receber uma educação adequada às suas faculdades, aptidões e tendências vocacionais. O ensino pré-vocacional profissional destinado às classes menos favorecidas é, em matéria de educação, o primeiro dever de Estado. Cumpre-lhe dar execução a esse dever, fundando institutos de ensino profissional e subsidiando os de iniciativa dos Estados, dos Municípios e dos indivíduos ou associações particulares e profissionais. É dever das industrias e dos sindicatos econômicos criar, na esfera da sua especialidade, escolas de aprendizes, destinadas aos filhos de seus operários ou de seus associados. A lei regulará o cumprimento desse dever e os poderes que caberão ao Estado, sobre essas escolas, bem como os auxílios, facilidades e subsídios a lhes serem concedidos pelo poder público.

Assim, o estímulo dado às classes sociais menos favorecidas, limitava-

se ao ensino profissionalizante, para que fosse útil à Nação com a força do seu

trabalho.

Na vigência do Estado Novo (1937-1945), o ministro Gustavo Capanema

empreendeu outras reformas do ensino, regulamentadas por diversos decretos-

leis: a lei orgânica do Ensino Industrial (1942); cria o Serviço Nacional de

Aprendizagem Industrial (SENAI) (1942); A lei orgânica do Ensino Secundário

(1943); e a lei orgânica do ensino comercial (1943).

Nesta reforma, Gustavo Capanema estipulou que o curso secundário

seria reestruturado passando a ser constituído pelo ginásio, de 4 anos, e o

ensino colegial, de 3 anos. O ensino colegial dividia-se em clássico e científico,

sendo a grade curricular do primeiro ano da área de humanidades.

Somente os alunos do Ensino Secundário tinham acesso à universidade.

Não havia articulação entre os níveis educacionais e ramos do ensino

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profissional, inviabilizando a mudança de curso por parte do aluno preso ao

sistema político educacional. Neste período, o ensino ficou assim composto:

I – 5 anos de curso primário (de 7 a 11 anos);

II – 4 anos de curso ginasial (12 a 15 anos);

III – 3 anos de colegial (16 a 18 anos), podendo ser na modalidade clássico ou

científico (que acabou concentrando 90% dos alunos desse nível). O ensino

colegial (Ensino Médio) perdeu o seu caráter “propedêutico” (preparatório para

o ensino superior) e voltou-se para a formação geral.

5. Educação no Brasil pós-Vargas

Com o término da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) e com a

deposição de Vargas, deu-se início a Segunda República. O período pós-guerra

afirma, também, a supremacia econômica dos Estados Unidos, que choca com

o modelo nacionalista existente até então. Aranha (1996) assinala que não

tardou para que as empresas multinacionais, principalmente as automobilísticas,

adentrassem o Brasil e, com isso, a cultura americana.

Com isso, “crescem as disparidades regionais, os centros urbanos

começam a inchar, aumenta a inflação e as distorções da concentração de renda

agravam a pobreza” (ARANHA, 1996, p. 196).

O interesse do governo pela educação nacional estava articulado com o

contexto político, econômico e social do país pós-1930, período de

redemocratização, quando a economia e a cultura sofreram uma série de

mudanças com o processo de internacionalização. Na educação, o marco foi a

promulgação da Constituição de 1946, na qual a educação surge como “um

direito de todos”.

Em 1948, é apresentado um anteprojeto da Lei de Diretrizes e Bases

para a educação, baseado no trabalho de educadores sob a liderança de

Fernando de Azevedo em defesa da democratização do ensino público, que leva

13 anos para ser promulgada. Isso se deu devido a algumas divergências no

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percurso, como o substitutivo do deputado Carlos Lacerda em defesa da escola

particular, sendo esta majoritariamente de iniciativa religiosa. Com isso, ao se

posicionarem a favor da liberdade de ensino, consequentemente, estavam

contra a democratização da educação, dificultando o acesso da camada popular

às escolas.

Porém, os intelectuais escolanovistas que estiveram à frente do

Movimento pela Educação Nova retomaram a luta pelas conquistas obtidas na

Constituição de 1934. Apoiados por intelectuais, estudantes e líderes sindicais,

iniciam a Campanha em Defesa da Escola Pública. O movimento culmina com o

manifesto "Mais uma vez convocados” (1959), que contou com a assinatura de

189 pessoas, entre elas Florestan Fernandes, Darci Ribeiro, Anísio Teixeira,

Fernando Henrique Cardoso, Caio Prado Júnior, entre outros, em defesa do

escola laica, pública, obrigatória e gratuita.

Em 1961, é promulgada a primeira Lei de Diretrizes e Bases da

Educação – Lei nº 4.024. Apresenta como vantagens a possibilidade de dar mais

autonomia aos órgãos estaduais, garante 12% do orçamento da União e 20%

dos municípios para a educação, garante a obrigatoriedade escolar no ensino

primário. Porém, segundo Aranha (1996), são inúmeras as desvantagens dessa

lei: mesmo com as pressões para destinar recursos apenas para educação

pública, a lei atende também às escolas privadas; o ensino técnico continua fora

da área de interesse, quer seja o setor industrial, comercial ou agrícola.

Com o golpe militar de 1964, o país vive tempos sombrios da ditadura,

sinônimo da destituição do estado de direito. Em nome da segurança nacional é

usado qualquer mecanismo de tortura, censura, exílio, calando qualquer

manifestação popular, principalmente das minorias. Na economia, o governo

investe cada vez mais na vinculação ao capitalismo internacional, investindo na

“industrialização excludente", que garante o desenvolvimento econômico às

Procure na internet o manifesto “Mais uma vez convocados” (1959) e analise o conteúdo comparando com o primeiro Manifesto já lido por você (1932).

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custas do desenvolvimento social, por meio da desigual distribuição de renda

(ARANHA, 1996).

Esse período é contraditório, pois se de um lado o governo autoritário se

justificou pela defesa da identidade nacional, por outro submeteu-se ao capital

estrangeiro e, consequentemente, o trabalhador à ausência de qualidade de vida

devido aos salários insuficientes.

A educação sofreu diretamente com tal direcionamento da vida política,

econômica e social. A repressão extingue a UNE – União Nacional dos

Estudantes, considerada subversiva, que continuou a agir clandestinamente,

sendo seus integrantes “reprimidos” pelos militares. Os grêmios escolares são

convertidos em Centros Cívicos sob a responsabilidade do professor de

Educação Moral e Cívica, cargo de confiança do diretor e sem passagem pelo

Departamento Estadual de Ordem Política e Social (Deops). Em 1969, por meio

do Decreto-lei nº 477, proíbe alunos, professores e funcionários a qualquer

manifestação de caráter político.

A LDB 4024/61 não foi revogada, mas passa por adequações impostas

por meio das Leis 5.540/68 que estabelece alterações no terceiro grau, e a

5692/71 que legisla sobre o 1º e 2º graus.

No terceiro grau, a reforma extinguiu a cátedra, isto é, o cargo de

professor universitário titular em uma disciplina, unificou o vestibular, reuniu as

faculdades em universidades para concentração de recursos humanos e

financeiros e definiu que o cargo de reitor poderia ser alheio ao quadro de

professores, podendo ser ocupado por alguém indicado pelo governo (ARANHA,

1996).

Com a Lei 5692/71, o governo reformulou a educação básica com o que

Aranha (1996, p. 215) considerou “aparentes vantagens”, pois o fato de que

estavam na letra da lei não significa de que saíram do papel:

extensão obrigatória do 1º grau (1ª a 8ª séries);

escola única: superação da seletividade com a eliminação do dualismo escolar, já que não há separação do ensino secundário propedêutico, pois existe a terminalidade;

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integração geral do ensino primário ao superior (continuidade);

cooperação das empresas na educação.

Em 1985, termina o governo militar, deixando o país com uma enorme

dívida externa sob o controle do FMI – Fundo Monetário Internacional e, com

isso, uma população empobrecida. Foram vários os planos de estabilização

econômica, que previam mudança de moedas e congelamento de preços.

Na educação, o fracasso da Lei 5692/71 já era reconhecido. Por isso, a

Lei nº 7044/82 "dispensa as escolas da obrigatoriedade da profissionalização,

sendo retomada a ênfase para a formação geral” (ARANHA, 1996, p. 216). A

situação da educação nacional foi motivo de debates nos trabalhos da

Constituinte 1987/1988.

O quadro a seguir, com base nas considerações de Aranha (1996, p.

223-4), relaciona alguns pontos importantes sobre a educação na Constituição

de 1988.

gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

ensino fundamental obrigatório e gratuito;

extensão do ensino obrigatório e gratuito, progressivamente, ao ensino médio;

atendimento em creches e pré-escolas às crianças de zero a seis anos;

acesso ao ensino obrigatório e gratuito como direito público subjetivo, ou seja, o seu não-oferecimento pelo poder público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente (podendo ser processada);

valorização dos profissionais do ensino, com planos de carreira para o magistério público;

autonomia universitária;

aplicação anual pela União de nunca menos que 18%, e aos estados, Distrito Federal e o municípios de 25%, no mínimo, da receita resultante dos impostos;

distribuição dos recursos públicos assegurando prioridade ao atendimento das necessidades e ensino obrigatório nos termos do plano nacional de educação;

recursos públicos destinados às escolas comunitárias confessionais ou filantrópicas, desde que comprovada a finalidade não-lucrativa;

plano nacional de educação visando à articulação e ao desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis e à integração das ações do poder público que conduzam à erradicação do analfabetismo, universalização do atendimento

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escolar, melhoria da qualidade do ensino, formação para o trabalho, promoção humanística, científica e tecnológica do país.

Chegamos finalmente à elaboração da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN), que se encontra em vigor, elaborada observando as linhas mestras da Constituição.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, um projeto que

tratava da educação nacional observando as novas diretrizes nacional foi

apresentado pelo deputado Octávio Elísio à Câmara Federal.

Para a elaboração do texto final da proposta, foi eleito o deputado Jorge

Hage como relator do projeto. A proposta foi negociada, amplamente discutida

com diversos segmentos da sociedade por meio de debates e seminários com

intelectuais convidados para discutir os pontos polêmicos da reforma

educacional. Em todo o processo, setores da iniciativa privada, como de

costume, se posicionaram e buscaram angariar apoio de alguns parlamentares.

Esses debates e negociações deram origem a duas novas versões do

texto do deputado Elísio, sendo a última votada e aprovada na sessão de 13 de

maio de 1993. Tal projeto, ao passar pelo Senado, retornou a Câmara dos

Deputados, pois o senador Darcy Ribeiro (PDT/RJ), como relator na Comissão

de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, o rejeitou em seu parecer com

o argumento de haver inconstitucionalidades. Com o apoio do Ministro da

Educação, Paulo Renato, apresentou o substitutivo ao projeto que, após a

apresentação de várias versões, o substitutivo foi aprovado no dia 8 de fevereiro

de 1996 e, no dia 29 do mesmo mês, sua redação final (Parecer nº 72/96).

No dia 20 de dezembro de 1996, é sancionada, sem vetos pelo

presidente da república, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei

nº 9.394/96).

Agora é a sua vez! Como vimos, cada LDB é resultante de seu contexto

histórico. Após ler a nova LDBEN/96 e pesquisar a respeito, aponte as

contribuições da nova LDBEN para a educação e para a formação do cidadão

brasileiro na atualidade.

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REFERÊNCIAS

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FARIA FILHO, L. M. Os projetos de brasis e a questão da instrução no nascimento do Império. In: Tarcísio Mauro Vago; Marcilaine Soares Inácio; Julina Cesário Hamdan; Hércules P. dos Santos. (Org.). Intelectuais e escola pública

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FRAGO, A. V. Tiempos escolares, tiempos sociales. Barcelona: Editorial Ariel, 1998.

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MENNUCCI, S. A crise Brasileira de Educação. Editora Piratininga. São Paulo: SP, 1934. Versão para eBook/eBooksBrasil, 2006. http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/sudeducacao.html. Acesso em: 20/08/2017.

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TEIXEIRA, A. S. Educação não é privilégio. 7ª edição/comentada por Maria Cassim; organização da coleção Clarice Nunes. Rio de Janeiro: Editora UFRJ, 2007.

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VIDAL, Diana Gonçalves. Educadores Brasileiros: Anísio Teixeira, Loureço Filho e Fernando de Azevedo. Apresentação: Coleção Grandes Educadores 2006. (Apresentação de DVD).

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HISTÓRIA DA TECNOLOGIA NA EDUCAÇÃO

Introdução:

Com as mudanças ocorridas na sociedade e na economia e nos modos

de produção, a tecnologia vai, progressivamente, adentrando na sociedade, no

cotidiano dos sujeitos e nas formas de se relacionarem, transformando-os.

Tanto na Europa Ocidental quanto no restante do mundo, incluindo o

Brasil, a educação sofreu alterações significativas na educação, pois a

sociedade se encontrava cada vez mais aberta e dinâmica e, com isso,

necessitava da formação de sujeitos capazes de interagir com as inovações

culturais, sociais e tecnológicas.

Kenski (2004, p. 22) afirma que “o surgimento de um novo tipo de

sociedade tecnológica é determinado principalmente pelos avanços das

tecnologias digitais de comunicação, informação e pela microeletrônica”,

gerando novas perspectivas sociais, econômicas, científicas e políticas.

Com isso, os demais setores da vida social, além na informação e

comunicação, como o agronegócio, a medicina e transportes sofreram

significativos avanços promovendo a circulação de informações e socialização

de pesquisas nas mais diversas áreas.

Contraditoriamente, o avanço tecnológico também gerou desemprego,

pois a mão-de-obra, em alguns setores, foi sendo substituída pelas máquinas e,

com isso, o empobrecimento da população e as desigualdades sociais foram se

intensificando. Nesse contexto, o papel da tecnologia é oferecer condições para

que o ser humano resolva seus problemas da vida diária.

A educação também influenciou e foi influenciada pelas novas

tecnologias de informação e comunicação. A formação de um novo homem

dependia da construção de novas formas de ensinar, de novos saberes e de

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outro formato de sociabilidade. As tecnologias ingressam no cenário educacional

não somente como recursos didáticos, mas para a abertura de novas

informações e saberes.

Esse fascículo pretende responder as seguintes perguntas: Quais foram

as primeiras iniciativas de uso das tecnologias na educação? E no Brasil, como

as tecnologias foram introduzidas na cultura escolar? E nas políticas públicas

para a educação?

1. As tecnologias na educação

Inicialmente, as tecnologias adentraram a educação no plano da cultura

material. Isso desde o século XVIII, com aparatos como Hornbook, um pedaço

de madeira com impressos para auxiliar no ensino da leitura e da escrita

(BRUZZI, 2016).

(Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/Hornbook#/media/File:Campion-Hornbook.jpg)

O incremento do capitalismo e do industrialismo

entre os séculos XVIII e o XIX, bem com o

surgimento de novas práticas sociais, levaram a

educação, como vimos anteriormente, a novas

práticas educativas. Em 1870, podemos observar a

Magic Lantern, um tipo inicial de projetor que

empregava imagens pintadas ou fotografias em

Fonte:

https://www.sutori.com/item/mag

ic-lantern-1870-the-precursor-to-

a-slide-projector-it-was-dubbed-

the-magi

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folhas de vidro, uma lente e uma fonte de luz brilhante. Foi usado até a invenção

do projetor de slides.

Em 1890, surgiu o School Slate, seguido pelo Chalkboard, ambos

precursores do quadro negro ou branco desde 1890.

Fonte:

https://www.objectlessons.org/childhood-

and-games-victorians/school-slate--pencil-

victorian-original/s67/a1016/

Em 1905, tivemos o Estereoscópio, modelo

individual do projetor de slides. O aparelho

existia desde meados do século anterior,

tendo a Rainha Vitória como entusiasta. Foi

pouco conhecido até o início dos anos

1900, quando os fabricantes de

estereoscópios começaram a vender o

dispositivo aos professores. O 3-D

percorreu um longo caminho desde então.

Fonte:

https://blog.scienceandmediamuseum.org.uk/hidden-

treasures-our-collection-stereo-viewers/

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Em 1925, surge o Film Projector, o primeiro projetor de filmes. Por meio

dele, os vídeos instrucionais puderam ser usados nas salas de aula para

complementar as lições e aproveitar o que os professores explicavam. Logo

aparece também o rádio, seguido pelo Retroprojetor.

Em 1940, circula no ambiente escolar a caneta esferográfica e o

mimeógrafo e, em 1951, os Videotapes, o acelerador de leitura. Em 1958, surge

a Televisão Educativa, seguida pela fotocopiadora, em 1959, que é sucedida

pelo Liquid Paper em 1960.

A década de 60 deu início à "revolução eletrônica”, inicialmente com a

expansão do rádio e da televisão, que propiciou uma profunda revisão dos

modelos de comunicação usados, devido à capacidade de influência sobre

milhões de pessoas, gerando mudanças nos costumes sociais, na maneira de

fazer política, na economia, no marketing, na informação jornalística e também

na educação.

Com o aparecimento dos computadores pessoais a partir dos anos 80,

a educação em massa ganhou novos contornos, fundamentalmente sob a

concepção de ensino individualizado. Encontramos novas possibilidades de uma

"primeira geração" de programas com um enfoque do apoio lógico-educativo

baseado no modelo associacionista que recupera os conceitos do ensino

programado e das máquinas de ensinar. Chegam, também, sob a denominação

de "novas tecnologias da informação e da comunicação", novas opções

Fonte:

https://www.sutori.com/item/19

25-film-projector-this-piece-of-

technology-is-why-we-

all-get-that-happy-feel

Fonte: https://www.grupoescolar.com/pesquisa/on

de-foi-inventado-o-primeiro-radio.html

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apoiadas no desenvolvimento de máquinas e dispositivos projetados para

armazenar, processar e transmitir, de modo flexível, grandes quantidades de

informação.

Com a rápida e cada vez mais constantes mudanças nas tecnologias da

informação e da comunicação, com a criação de novos materiais audiovisuais e

informáticos, a necessidade de projetar as suas aplicações educacionais

correspondentes vem despertando o interesse dos técnicos da educação.

Entre os anos de 1960 e 2010, vimos surgir o Microfilm (1965), a

Calculadora Manual (1970), o cartão perfurado (1972), o computador pessoal ou

computador de mesa (1980), CD ROOM (1985), Quadro interativo (1999), o

computador por aluno (2006) e o Apple Ipad (2010).

Com o avanço das tecnologias, principalmente as tecnologias de

informação e comunicação, diversos recursos e meios foram disponibilizadas

para facilitar o processo de ensino-aprendizagem. E, com a internet, surge uma

forma de facilitar a comunicação, que pode ocorrer tanto de um aluno para o

outro, como de um para muitos, ou entre muitos, ampliando a forma de interação,

o que possibilita a formação de grupos e o trabalho colaborativo, como apoio ao

ensino presencial.

Nogueira (2016) dividiu em quatro as fases o uso das Tecnologias na

educação:

FASE CARATERÍSTICA

Estática Lousa

Giz

Livro Impresso

Materiais didáticos

concretos

Dinâmica Retroprojetor

Mimeógrafo

Fotocopiadora

Multimídia Microcomputador

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Software

Uso do CD-Room para

aprendizagem

Virtual Internet

Vídeo conferência

Chats/EAD

Tutoria à Distância

2. As tecnologias na educação brasileira

Percebe-se que, historicamente, a tecnologia sempre esteve

relacionada à educação, à necessidade de deixar culturas e saberes para as

próximas gerações. Porém, no meio educacional, era utilizada como método,

produtos, instrumentos e como aplicação científica.

Em 1970, a Comissão sobre Tecnologia Educacional dos Estados

Unidos define a tecnologia educacional:

É uma maneira sistemática de elaborar, levar a cabo e avaliar todo o processo de aprendizagem em termos de objetivos específicos, baseados na investigação da aprendizagem e da comunicação humana, empregando uma combinação de recursos humanos e materiais para conseguir uma aprendizagem mais efetiva. (PABLOS PONS apud LITWIN, 1999, p.6).

Assim, podemos afirmar que a tecnologia sempre existiu na educação,

se ela for compreendida como métodos e instrumentos para garantir a

aprendizagem do saber a ser transmitido. Segundo Oliveira (1977), as

tecnologias aplicadas à educação surgem no Brasil na tentativa de melhorar o

ensino através de técnicas provenientes dos meios de comunicação de massa

tais como: televisão, cinema e o rádio.

Como você pode perceber, algumas tecnologias utilizadas na educação não foram

contempladas. Pesquise na sua família, com seus colegas e na internet. Faça um

texto sobre elas e, se possível, insira imagens.

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Em 1937, foi criado o Serviço de Radiodifusão Educativa, uma iniciativa

do governo de Getúlio Vargas, que foi dirigido por Roquette-Pinto até 1943. O

órgão era destinado a promover, permanentemente, a irradiação de programas

educativos. Com o Estado Novo (1937-1945), o rádio sofre intervenção.

(ANDRELO, 2012). Essa tecnologia foi essencial na formação de jovens e

adultos no passado.

Nos anos 60, com a predominância do tecnicismo na educação, que

percebia a escola como observadora da sociedade (LIBÂNEO, 1994), as

propostas curriculares dos anos de 1960 e 70 foram planejadas utilizando

métodos com objetivos instrucionais independentes de questões sociais.

Tal corrente pedagógica, segundo Crochik (1998), está relacionada à

economia e educação, que se relacionam ao movimento dado pela contradição

entre forças produtivas e a organização do trabalho, decorrentes do processo de

trabalho fabril. Conforme Saviani (2003), “buscou planejar a educação de modo

a dotá-la de uma organização racional capaz de minimizar as interferências

subjetivas que pudessem pôr em risco sua eficiência” (SAVIANI, 2003, p.12). Por

isso, era necessário “[...] operacionalizar os objetivos e [...] mecanizar o

processo. Daí a proliferação de propostas pedagógicas tais como o enfoque

sistêmico, o micro-ensino, o tele-ensino, a instrução programada, as máquinas

de ensinar, etc (SAVIANI, 2003, p.12).

Na década de 1970, a instrução programada com base na psicologia da

educação, proposta por Shinner, adentrou o ambiente educacional, mas não

conseguiu suplantar a ideia de outros estudiosos.

Nos anos de 1980, foram realizados vários seminários organizados pelo

SEI (Secretaria Especial de Informática), pelo MEC e pelo CNPq (Conselho

Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Foram eles:

Agosto/1981- I seminário de Informática na Educação (UNB-Brasília-DF);

Agosto/1981- II Seminário Nacional de Informática na Educação (UFBA-

Salvador-BA).

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Em 1983, foi instituída a Comissão Especial Informática na Educação

por meio da Portaria SEI/CSN/PR 001/1983. Conforme Moraes, essa comissão

tinha por finalidade propor a orientação básica da política de uso das tecnologias

da informação no processo ensino-aprendizagem.

A comissão apresentou o projeto Educom em 1983, que visava a

implantação experimental de centros-piloto equipados para o desenvolvimento

de pesquisas que se estendeu para o ensino de 2º grau. Coube ao Centro de

Informática do MEC (Cenifor) a responsabilidade de implantação do projeto. A

partir desse momento, o MEC assumiu a frente no processo de informatização

da educação brasileira.

Em 1984, os primeiros convênios foram firmados entre a Funtevê/MEC

e as Universidades Federais de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Pernambuco,

Rio de Janeiro e a Universidade Estadual de Campinas para o início das

atividades no âmbito do projeto.

Inúmeras foram as ações do Educom como pesquisas de pós-

graduação, criação de softwares educativos, formação de professores de várias

formas, assessoramento às secretarias de educação e aos órgãos ministeriais,

bem como programas de cooperação técnica promovidos pela OEA

(Organização dos Estados Americanos) e a UNESCO (Organização das Nações

Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura.

A UNESCO, conforme explicitado em seu site, em colaboração com

seus parceiros, desenvolve recursos que podem ajudar os países a

elaborarem TIC nas políticas, estratégias e atividades educacionais de forma

efetiva, incluindo a garantia de que essas estratégias enfrentem desafios

causados pela exclusão digital das populações mais desfavorecidas. Seu

programa inclui:

Capacitação e aconselhamento de políticas públicas para o uso

de tecnologias na educação, particularmente nos domínios

emergentes como a aprendizagem móvel.

Garantia de que professores tenham as habilidades

necessárias para usar as TIC em todos os aspectos da prática

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de sua profissão por meio de ferramentas como o Marco Político

de Padrões de Competência em TIC para Professores.

Apoio do uso e desenvolvimento de recursos e softwares

educacionais plurilíngues, que sejam disponíveis para uso e

reuso como resultado de licenças abertas (recursos

educacionais abertos – REA; software livre e aberto [free and

open source software – FOSS]).

Promoção de TIC para educação inclusiva, que inclua pessoas

com deficiências e proporcione a igualdade de gênero.

Coleta de dados estatísticos e desenvolvimento de indicadores

sobre o uso de TIC na educação.

Provisão de apoio a políticas públicas que garantem que o

potencial de TIC seja aplicado efetivamente por todo o sistema

educacional.

O Instituto de Tecnologias de Informação para a Educação

(UNESCO Institute for Information Technologies in Education –

IITE), com sede em Moscou, se especializa em intercâmbio de

informações, pesquisa e treinamento sobre a integração das TIC

em educação.

O fato do país não ter ainda se apropriado dos conhecimentos técnico-

científicos na área das tecnologias fez com que o MEC iniciasse as ações

primeiramente envolvendo pesquisas nas universidades, para depois investir na

capacitação de professores públicos, que resultou no Projeto Formar.

O Projeto Formar, coordenado pela UNICAMP, ofereceu dois cursos de

especialização em Informática da Educação, em nível de pós-graduação lato

sensu. A intenção é que os profissionais capacitados projetassem e

implantassem um Centro de Informática Educativa (Cied) junto à Secretaria de

Educação. No curso de dois anos, 17 Cieds haviam sido criados.

Cada Cied visava atender alunos e professores de 1º e 2º graus, de

educação especial e a comunidade geral, constituindo-se um centro divulgador

das tecnologias da informática nas escolas.

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Em 1989, por meio da Portaria nº 549/89, o MEC instituiu o Programa

Nacional de Informática na Educação – Proninfe, de forma a assegurar a unidade

política, técnica e científica, imprescindível para os investimentos na educação.

O Proninfe tinha como objetivo:

Desenvolver a informática educativa no Brasil, através de projetos e atividades, articuladas e convergentes, apoiados em fundamentação pedagógica sólida e atualizada, de modo a assegurar a unidade política, técnica e científica imprescindível ao êxito dos esforços e investimentos envolvidos.

O Programa visava a capacitação continuada de professores dos três

níveis de ensino para o domínio das tecnologias no ambiente de ensino e

pesquisa, a utilização da informática na cultura escolar, ampliação de pesquisas

e socialização de práticas envolvendo as tecnologias.

Na área de software, o Proninfe estabelecia a criação de equipes

interdisciplinares de produção e avaliação de programas educativos virtuais. No

setor de equipamentos, buscava uma configuração básica de custo reduzido

para viabilizar a implantação dos laboratórios nas escolas, propondo que o MEC

atuasse como mediador do processo de informatização da educação, por meio

do incentivo à indústria nacional a adequar seus equipamentos às necessidades

pedagógicas.

Em 1990, o MEC aprovou o Plano de Ação Integrada (Planinfe) para os

anos 1990-1993. O Plano destacava que a formação de professores só seria

eficiente se envolvesse universidades, secretarias, escolas técnicas e empresas

como o Senai e Senac. Nota-se que o Proinfe e o Planinfe destacavam a

necessidade premente de um forte programa de formação de professores e

técnicos na área de informática educativa, acreditando que nenhuma mudança

tecnológica seria possível sem a capacitação dos recursos humanos envolvidos.

Em seu site, a UNESCO aponta para o mesmo sentido: “O Brasil precisa

melhorar a competência dos professores em utilizar as tecnologias de

comunicação e informação na educação. A forma como o sistema educacional

incorpora as TIC afeta diretamente a diminuição da exclusão digital existente no

país”.

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Exemplo disso foi o Kit tecnológico recebido por algumas escolas

públicas, isto é, o conjunto de TV, vídeo e antena parabólica fornecido pelo

Ministério da Educação e Cultura. Esse material foi fornecido para capacitação

docente, por meios dos vídeos (TV Escola, Canal Futura, Um salto para o

Futuro), e para apoio metodológico às aulas.

Registros informam que tais materiais viraram sucatas nas escolas, pois

os professores não sabiam como lidar com a tecnologia, não era disponibilizado

tempo para que os professores assistissem os programas e a supervisão escolar

não sabia gravar os programas para que fossem socializados com os

professores. Enfim, o recurso oferecido não foi acompanhado com a formação

não só para que os professores soubessem usar, mas se apropriassem do

objetivo.

Registros do MEC apontam que de 1997 a 2003 o Proinfo investiu na

compra de 147.355 microcomputadores, atendendo a todos os estados da

federação, alcançando 5.564 municípios.

O Censo Escolar da Educação Básica de 2013 indica que, das escolas

públicas de ensino fundamental, 48,6% possuíam laboratórios de informática e

45,8% possuíam acesso à internet, e das escolas de ensino médio, 92%

possuem laboratório de informática e 93% possuem acesso à internet.

Já o Censo Escolar/INEP 2016 registra a existência de 49% das escolas

públicas do ensino fundamental com laboratórios de informática e 62% com

acesso à internet. Das escolas de ensino médio, 87% das escolas possuem

laboratório de informática, permanecendo mesmo índice em relação ao acesso

à internet [Qedu 2017].

Almeida (2009) aponta que, nas últimas três décadas, a não observância

às diversidades culturais locais e suas singularidades fizeram com que as

tecnologias fossem percebidas como ferramentas, pois a forma pela qual o

programa foi implantado favoreceu a utilização racionalista, mecânica e

instrumental dos computadores e dos usos das tecnologias da informação e

comunicação na educação. Várias são as críticas ao Programa. Cordeiro e

Bonilla (2018) apontam:

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A opção pelo software proprietário implantado nas máquinas, em sua

primeira fase, aumentou os gastos do projeto e não favoreceu o

desenvolvimento de tecnologia nacional;

A formação de professores se deu de forma superficial, não abrindo

oportunidade a uma formação mais intensa dentro das próprias escolas,

numa perspectiva que integrasse efetivamente o uso das tecnologias

aos projetos pedagógicos;

A partir de 2007, o governo passa a investir em programas que têm o

foco na utilização de tecnologias digitais móveis e na incorporação do

software livre. No entanto, a dinâmica continuou a mesma, distribuir

tecnologia e equipamentos às escolas da rede pública, com conteúdos

pedagógicos embutidos, sem oferecer condições de formação, de

conectividade banda larga e de infraestrutura geral;

A lógica adotada por essa política pública põe em evidência uma

concepção de educação e tecnologia onde não são discutidas maneiras

de dar sustentabilidade a esses processos (tanto de infraestrutura,

logística, manutenção, pedagógico, etc). Assim, quando acabam os

investimentos do governo ou os programas de formação, as escolas

sentem-se fragilizadas a ponto de abandonarem os projetos, pois os

dispositivos começam a apresentar defeitos ou quebram e não há,

dentro da escola, ou mesmo nas Secretarias de Educação, um suporte

para atender a essas demandas. A lógica de instrumentalização, base

da estratégia de inserção das tecnologias digitais na escola, bem como

a própria proposta de formação dos professores, que é feita de maneira

muito específica para cada tipo de dispositivo, impede que os

educadores reestruturem suas práticas à medida que mudam os

suportes ou dispositivos digitais.

As autoras apontam que tais problemáticas vêm acompanhando a

implantação das tecnologias digitais nas escolas públicas, como Projeto UCA,

responsável pela distribuição de laptops educacionais a, aproximadamente, 300

escolas públicas de educação básica em zonas rurais e urbanas do país. Seu

objetivo era intensificar e atualizar as tecnologias da informação e da

comunicação (TIC) nas escolas, complementando as ações já existentes, como

os laboratórios de informática.

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Tinha-se a expectativa de que tal projeto, por se tratar de tecnologia

digital móvel, trouxesse em seu cerne princípios fundantes que pudessem

encaminhar outros processos e propostas pedagógicas dentro da escola. No

entanto, o que é possível observar, na plataforma E-Proinfo, foi o caráter linear

e homogeneizador, que sugere etapas sequenciais de conhecimento da

máquina, depois de seus aplicativos, planejamento de atividades para só depois

trabalhar com os alunos (CORDEIRO; BONILLA,2018).

Cordeiro e Bonnilla (2018) acreditam que, por ser uma tecnologia digital

móvel, deveria estar acompanhada com conectividade de qualidade dentro da

escola, para que professores e alunos pudessem inserir-se no contexto digital

de forma plena, acessando conteúdos, criando sites, participando de redes

sociais, produzindo e disponibilizando conteúdos na rede, e até inserindo suas

comunidades nesse processo.

O Programa Um Computador Por Aluno – Prouca, nos mesmos moldes

do Projeto UCA, é instituído pela Lei nº 12.249, de 14 de junho de 2010, para

promover a sua expansão. Porém, no âmbito desse projeto, os computadores

não deveriam ser mais encaminhados pelo Governo Federal, podendo ser

adquiridos conforme os interesses de estados e municípios, com recursos

próprios ou com financiamento do BNDES.

Se no UCA o problema de conectividade foi relatado, tal situação se

agravou com o Prouca, quando passa a ficar sob responsabilidade dos estados

e municípios. Isso porque, segundo Cordeiro e Bonilla (2018), em muitos desses

entes não há uma política clara, definida com objetivos e sustentada

teoricamente sobre qual o significado da presença das tecnologias digitais

móveis nos processos educativos.

O Portal do MEC coloca o tablet dentro do projeto Educação Digital –

Política para computadores interativos e tablets, que contempla um pacote com

computador interativo, que reúne projeção, computador, microfone, DVD, lousa

e acesso à internet e lousas eletrônicas, compostas de caneta e receptor,

juntamente à formação de professores para utilizarem esses equipamentos.

Nesse sentido:

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[...] o projeto inicial, pensado na gestão do ministro Fernando Haddad, era distribuir tablets a professores e alunos, seguindo a lógica do Projeto UCA; no entanto, na gestão de Aloísio Mercadante, decide-se entregar, em um primeiro momento, somente aos professores do ensino médio, com a justificativa de que esta etapa da Educação Básica possuía os piores indicativos de qualidade e evasão. Estipulou-se alguns pré-requisitos para contemplar as primeiras escolas: ser escola urbana de ensino médio, ter internet banda larga, laboratório do Proinfo e rede sem fio (Wi-Fi). A promessa do governo foi de que depois dos professores do ensino médio seria a vez dos professores das séries finais do ensino fundamental (CORDEIRO; BOULLA, 2018, s/p).

Nenhuma das iniciativas até então, referentes às tecnologias na

educação, dialogam entre si. As formas de apropriação se intercalam entre o

enfrentamento de amor e ódio, endeusamento e temor. As intencionalidades dos

projetos governamentais esbarram com os interesses das grandes empresas

que, muitas vezes, contam com a conivência do governo, que não se mostra

interessado em expandir os serviços para a população desassistida e às regiões

mais necessitadas. Há muito caminho a ser percorrido para que que todos

tenham acesso e saibam explorar as tecnologias da informação e comunicação

no âmbito escolar.

REFERÊNCIAS

Faça uma pesquisa para saber quais as políticas públicas, na área das tecnologias de

informação e comunicação, estão sendo executadas em sua cidade.

Page 77: A EDUCAÇÃO ESCOLAR NA EUROPA OCIDENTAL Introdução · sobre o uso das tecnologias na educação numa perspectiva histórica. Este primeiro momento que tratará sobre a educação

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