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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO-PEDAGÓGICAS DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS CURSO: PSICOPEDAGOGIA A ESCOLA DE HORÁRIO INTEGRAL Aluna: Leandra Drumond Cabral Rio Janeiro Dez./2.001

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO-PEDAGÓGICAS DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS CURSO: PSICOPEDAGOGIA

A ESCOLA DE HORÁRIO INTEGRAL

Aluna: Leandra Drumond Cabral

Rio Janeiro Dez./2.001

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES INSTITUTO DE PESQUISAS SÓCIO-PEDAGÓGICAS DIRETORIA DE PROJETOS ESPECIAIS CURSO: PSICOPEDAGOGIA

A ESCOLA DE HORÁRIO INTEGRAL

Monografia apresentada por

Leandra Drumond Cabral

como requisito f inal para

conclusão do curso de

especialização em

Psicopedagogia a nível de

Pós-graduação “LATU-

SENSU”.

Orientador(a): Maria Ester de Araújo Oliveira

Rio Janeiro Dez./2.001

i

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DEDICATÓRIA Esta monografia é dedicada a

todos que buscam uma escola

de horário integral de

qualidade e bem estruturada,

que vise construir cidadãos

plenos, destinada

principalmente aos alunos

provenientes de classe

popular, que tem o seu

cotidiano marcado pela

carência cultural, afetiva,

educacional e profissional.

i i

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AGRADECIMENTOS “Até aqui me ajudou o Senhor” Agradeço primeiramente a

Deus por me dar forças para

está concluindo o curso de

Psicopedagogia. A minha mãe

e avôs, que me apoiam em

tudo que desejo fazer desde

que seja para o meu

crescimento pessoal e

profissional.

Aos professores do curso a

Vez do Mestre, selando

inclusive uma amizade, a

escola CIEP Theóphilo de

Souza Pinto, em fim agradeço

a todos que de uma forma ou

de outra me deram apoio.

.

i i i

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RESUMO Esta monografia tem a f inalidade de apresentar

uma breve revisão bibl iográfica sobre o tema A Escola de Horário

Integral. Está constituído por quatro partes, onde são

apresentados: Os CIEPs, A escola pública de horário integral no

Rio de Janeiro, A funções sociais da educação e A ampliação das

funções da escola: situando a questão na realidade brasileira

considerando o aspecto em que ela deva ser contínua e dentro da

perspectiva atual centrada na própria escola em uma ação

conjunta para a transformação da realidade.

iv

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SUMÁRIO

Introdução 07

Capítulo I

Os CIEPs 08

Capítulo II

A escola pública de Horário Integral no Rio de Janeiro 14

Capítulo III

A Funções Sociais da Educação 31

Capítulo IV

A ampliação das funções da escola: situando a questão na realidade brasileira 39

Conclusão 52

Referências Bibl iográficas 53

Anexos 56

v

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INTRODUÇÃO

A escola fundamental que os países desenvolvidos

oferecem às suas crianças já é uma realidade Brasileira. Pela

primeira vez na História do Brasil, o Governo Federal assume um

compromisso com a educação fundamental, retomando e

ampliando a proposta de uma escola pública de tempo integral,

sonho que Leonel Brizola corporif icou em 1983 com a criação dos

primeiros CIEPs – Centros Integrados de Educação Pública – no

Estado do Rio de Janeiro.

Com a inauguração dos primeiros CIACs em nosso

estado toma forma uma ação social transformadora da maior

importância econômica, cultural e polít ica. Uma ação que vem

somar-se ao programa dos CIEPs, incorporando com eles a idéia

de Anísio Teixeira, de que A Escola Popular Para Uma Sociedade

Subdesenvolvida e Com Acentuada Estratif icação Social, Longe de

Poder Ser Mais Simples, Faz-se Mais Complexa E A Mais Difíci l

Das Escolas.

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CAPÍTULO I

Os CIEPs

No Brasil, antes da criação dos CIEPs, nunca se fez

uma escola popular de dia completo. Em lugar disso, adotou-se o

desdobramento do regime escolar em vários turnos, numa solução

falsa para o crescimento populacional. Essa deformação do

sistema de ensino, com o tempo, t irou as qualidades já escassas

da antiga escola pública e deixou-a despreparada para atender ao

desafio de adaptar-se à crescente cl ientela oriunda das zonas

rurais ou das comunidades pobres da periferia das metrópoles.

Logo no início de sua primeira gestão no Governo do

Estado, Leonel Brizola pensou em multipl icar pequenas escolas

por todo Estado, como já f izera quando administrou o Rio Grande

do Sul, objetivando atender à demanda por maior número de

matrículas nas regiões de alta densidade demográfica. Entretanto,

logo se verif icou que a ampliação do número de escolas, por si só,

não resolveria a questão da jornada escolar muito reduzida,

adotada pela maioria das escolas, como também não resolveria os

problemas de repetência e de evasão escolar.

Surgiu então a idéia, que chegou a ser considerada uma

das metas do Programa Especial de Educação, de instalar

CENTROS CULTURAIS COMUNITÁRIOS em regiões previamente

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selecionadas, para receber as crianças durante 5 horas adicionais,

antes ou depois das aulas, para dar-lhes uma refeição, estudo

dirigido, recreação e atividades culturais. Chegou a ser cogitada,

também, a conveniência de construir no Estado do Rio diversas

Escolas-Parque semelhantes às que Anísio Teixeira e Darcy

Ribeiro implantaram em Brasíl ia e que promovem uma integração

entre os estudos curriculares, at ividades recreativas e artíst icas.

Mas a prática recomendou a superação dessas proposições

iniciais, porque os Centros Culturais Comunitários ou as Escolas-

Parque acabariam favorecendo as crianças já privi legiadas nas

áreas de maior poder aquisit ivo.

O governador Leonel Brizola contribuiu decisivamente

para solucionar o problema, fazendo notar que, em países como

Uruguai ou Japão, o sistema de educação de base oferece às

crianças um regime escolar de horário integral. Brizola tomou

então a histórica decisão de criar uma escola de dia completo,

denominada CIEP – Centro Integrado de Educação Pública, que o

povo passaria a chamar carinhosamente de Brizolão .

CARACTERÍSTICAS DO CIEP

O CIEP é uma escola que funciona das 8 horas da

manhã às 5 horas da tarde, com capacidade para abrigar 1000

alunos. Projetado por Oscar Niemeyer, cada CIEP possuí três

blocos. No bloco principal, com três andares, estão as salas de

aula, um centro médico, a cozinha e refeitório, além das áreas de

apoio e recreação. No segundo bloco f ica o ginásio coberto com

sua quadra de vôlei-basquete-futebol de salão, arquibancada e

vestiário esse ginásio é chamado de Salão Polivalente, porque

também é uti l izado para apresentações teatrais, shows de música,

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festas etc. No terceiro bloco, de forma octogonal, f ica a bibl ioteca

e, sobre ela as moradias para alunos-residentes.

Os CIEPs estão localizados, preferencialmente, onde se

encontram as populações mais carentes do Município e do Estado.

Cada CIEP oferece os cursos de CA a 4ª série ou então de 5ª a 8ª

série, de modo agrupar em cada unidade as crianças de mesma

faixa etária. No conjunto, em todos sos CIEPs, estarão

matriculados cerca de 500 mil alunos em cursos diurno (das 8 às

17 horas) ou nas vagas complementares para jovens de 14 a 20

anos, no horário noturno (das 18 às 22 horas).

Traduzindo a proposta educacional do Governo do

Estado, o CIEP é fundamentalmente uma boa escola de 1º grau,

funcionando em regime de dia completo, implantada pela primeira

vez no Brasil. Cada CIEP, durante um período de 8 horas diárias

(com acompanhamento de mais 1 hora para o almoço), ministra

aos alunos currículo do 1º grau, com aulas e sessões de estudo

dirigido, além de oferecer atividades como esportes e participação

em eventos culturais, numa ação integrada que objetiva elevar o

rendimento global de cada aluno.

Tendo em vista as necessidades específ icas da maioria

dos alunos, proveniente dos segmentos sociais de baixa renda, o

CIEP fornece assistência médico-odontológica, quatro refeições e

banho todos os dias.

Também funciona nos CIEPs o projeto inédito Alunos-

Residentes, possibil i tando que crianças temporariamente

desassist idas morem nos escolões , ocupando os apartamentos

especiais projetados por Niemeyer. Essas crianças freqüentam as

aulas durante o dia e, à noite, permanecem nos CIEPs em grupos

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de até 12 meninos ou de 12 meninas, que são cuidados por casais

selecionados e treinados para a tarefa de orientá-los.

Os CIEPs exercem adicionalmente a função de

autênticos centros culturais e recreativos numa perspectiva de

integração efetiva com a comunidade.

A proposta pedagógica para

Escolas de Educação Integral

Transpor os muros da escola e trazer para seu interior

informações acerca do mundo, através de atividades que

privi legiem a cultura, a ciência e a tecnologia, são pré-requisitos

básicos para efetivação de uma educação escolar que possibil i te a

reinterpretação crít ica das visões de mundo que as camadas

populares vêm construindo ao longo de sua história. Para isso é

preciso que o professor conheça como se dá o processo

apreensão, por parte dessas classes, das questões que permeiam

seu dia-a-dia. A partir daí, numa ação intencional e crít ica, que

caracteriza uma educação escolar emancipatória e transformadora,

o professor irá construir com seus alunos conhecimentos que dêem

um sentido científ ico ao saber que já possuem em nível de senso

comum.

Para responder a esse desafio, a proposta é que o

CIEP se organize de maneira a implementar, no seu interior,

projetos que dinamizem e consolidem o trabalho escolar,

mesclando ações de educação formal e não formal num processo

que enseje a formação do aluno de maneira abrangente, sem as

l imitações que escola l iberal muitas vezes impunha.

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É nesse sentido que o estudo dirigido, a teleducação, a

saúde, a bibl ioteca, a animação cultural, a educação física, a

educação juvenil se inscrevem na educação básica.

Tantas opções poderia se tornar inócuas, não fosse a

preocupação em promover a prática educativa a partir do

planejamento coletivo e integrador, cujo objetivo é conjugar ações

comuns e específ icas num mesmo trabalho.

Para isso é imprescindível que as atribuições de cada

segmento do CIEP sejam pensadas com intuito de se identif icar os

pontos de contato possíveis na construção efetiva da prática

educativa.

As especif icidades dos diferentes projetos

desenvolvidos no CIEP tornam-se compatíveis na medida em que

se vai tecendo uma proposta de trabalho integrado, que não

atomize o processo de construção do conhecimento com

informações múltiplas, sem o contexto que explicite suas

interações e pertinência.

É justamente no momento da definição de contextos

próprios para o desenvolvimento do trabalho escolar que todos os

projetos do CIEP deverão estar representados por seus

profissionais.

A caracterização destes contextos se dá por meio de

um pré-diagnóstico ou levantamento preliminar de dados.

O conhecimento preliminar fruto da interação dos

profissionais da escola e da comunidade, deverá ser uti l izado

como fonte importante para o planejamento de uma ação educativa

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que tenha como ponto de partida a leitura de um mundo particular,

leitura que pouco a pouco deve ser ampliada de maneira a deixar

de ser local, para ser instrumento de interpretação crít ica da

realidade social e histórica.

Uma vez caracterizado o contexto é preciso que grupo

passe a operar no sentido de identif icar que aspectos do mesmo

serão abordados e qual é a competência de cada um na ação a ser

desenvolvida.

Delineiam-se, assim, os pontos comuns e específ icos

do trabalho, sem as rupturas observadas quando o planejamento é

organizado por profissionais isolados em suas áreas de atuação.

O planejamento deve ser compreendido como processo

permanente e se formula, sempre, com base em novas

problemáticas resultantes da interação do homem com seu meio

social e cultural.

Estes procedimentos viabil izam a integração entre os

diversos projetos dos CIEPs e as diferentes áreas do

conhecimento. Tal integração não ocorre quando a prática

educativa se dá por meio do recurso uti l izado em algumas escolas,

de impor temas – como se t ivessem valor em si mesmas – para

serem desenvolvidas por toda escola em determinado momento.

Tal atitude é geradora de uma pseudo – integração e da

globalização dos conteúdos de sua transmissão de forma

estanque, ignorando princípios que privi legiam a construção do

conhecimento.

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CAPÍTULO II

A escola pública de horário integral no Rio de Janeiro

Só uma escola nova, concebida com o

compromisso de atender as condições objetivas

em que se apresenta o aluno oriundo das

classes menos favorecidas, educará o Brasil.

(Ribeiro, 1995, p. 15).

Se acreditamos nisso, temos que considerar que uma

das metas que se deve empreender no Brasil, no campo da

educação popular, para que se possa criar escolas que não

produzam mais analfabetos que alfabetizados ,é formar um novo

professorado, devidamente qualif icado pelo estudo e pela

formação em serviço, para o exercício eficaz do magistério.

O Brasil necessitará, na próxima década, para ocupar o

lugar dos que se aposentam e para ampliar o sistema, de um

milhão de novos professores. No entanto,

se eles forem formados como agora, a educação

brasileira continuará fracassando.(Ribeiro, 1995,

p.13)

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E por que tem fracassado a educação brasileira? Sim,

porque pelo menos para os f i lhos das famílias mais pobres, o que

se tem observado é o fracasso da educação escolar.

Todos sabemos que

a rica direita brasileira, desde sempre no poder,

sempre soube dar a melhor educação a seus

f i lhos aos pobres e que tem dado a caridade

educativa mais barata que pode, indiferente à

sua qualidade.(Ribeiro, 1995, p.11).

Isto é velho no Brasil . Pedro II, em 45 anos de governo,

criou apenas o Instituto de Cegos e o de Surdos. Para o

Imperador, a educação era uma caridade e os portadores de

necessidades especiais eram os únicos a merecer sua atenção,

isso no momento em que Argentina e o Uruguai já contavam com

uma rede de educação popular.

Só nos anos 30, no Brasil, a educação aparece como

um projeto nacional.

Com a revolução de 30, alguns dos reformadores

educacionais da década anterior passaram a

ocupar cargos importantes na administração do

ensino. Procuravam, então, colocar em prática

as idéias que difundiam. Como resultado, a

educação brasileira sofreu importantes

transformações que começaram a dar-lhe a

feição de um sistema articulado, segundo

normas do Governo Federal.(Pilett i , 1991, p.74)

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O Manifesto dos Pioneiros da Educação, em 1993, foi a

primeira proposição programática, lançada por educadores

brasileiros que se preocupava em estender a educação a todos

como um direito.

As idéias de uma nova escola, de uma educação

progressiva, já vinham sendo colocadas em prática desde outubro

de 1931, quando Anísio Teixeira assumiu o cargo de diretor geral

da Instrução Pública na Prefeitura do Distri to Federal.

A presença de Pedro Ernesto na prefeitura abriu

para Anísio Teixeira a oportunidade de tentar

realizar o programa de ação que sonhava para a

instrução pública a afirmar-se Nacionalmente no

campo de atuação que escolhera. (.. .) A

importância da passagem de Anísio Teixeira pela

Diretoria da Instrução Pública é inegável. Prova

disso é o interesse (...) dos pesquisadores sobre

esse momento de certa forma privi legiado na

história da educação brasileira (...) (Nunes,

2000, p.229-231).

Quando Anísio Teixeira inicia a administração do

sistema distri tal de ensino, no Governo Pedro Ernesto, percebe

uma série de problemas que marcavam a nossa escola. Colocava

ele que

os sistemas escolares modernos, para darem o

mínimo da educação indispensável à vida

civi l izada, despendem seis e oito anos em cursos

de mais de 180 dias, com dias escolares de seis

horas, em média. Nós, com três anos de curso,

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pode-se dizer, períodos anuais de 160 dias em

média e dias escolares de quatro horas, não

podemos fornecer, salvo milagre, o mínimo

equivalente às nações civi l izadas.(Teixeira,

1997, p.81).

Com o objetivo de dotar a Cidade do Rio de Janeiro,

então capital da República de um sistema escolar que respondesse

às necessidades da população, Anísio Teixeira propõe um amplo

programa de edif icações de prédios escolares, Não desejava ele

palácios luxuosos, mas construções econômicas

e nít idas que [apoiassem], com uma simples e

forte base física, a obra educacional entrevista

pelos que [al imentavam] os ideais de um

reconstrução da própria vida pela escola.

(Teixeira, 1997, p. 248).

Uma grande contribuição do educador escolanovista foi

propor, nos prédios que deviam ser construídos,

escolas nucleares e parques escolares, sendo

obrigada a criança a freqüentar regulamente as

duas instalações. (Teixeira, 1997, p.243).

Em os prédios e aparelhamentos escolares, o Diretor da

Instrução Pública propunha que o sistema escolar funcionasse em

dois turnos, sendo que cada criança teria de ir a escola em ambos

os turnos: no primeiro receberia,

em prédio adequado e econômico, o ensino

propriamente dito; no segundo (receberia), em

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um parque-escola aparelhado e desenvolvido, a

sua educação sanitária, a assistência alimentar e

o uso da leitura em bibliotecas infantis e juvenis

(Teixeira, 1997, p.243-244).

O programa idealizado por Anísio, que deveria se

estender até 1938, acabou batendo de frente com a onda fascista

que se instala no Brasil com o Estado Novo quando a educação

assume uma nova perspectiva, voltada para a capacitação

profissional, que era destinada prioritariamente às camadas

populares. No entanto

as proposições e o movimento revolucionário de

1930 – fortemente centrado na visão l iberal –

trouxeram a sociedade brasileira uma nova forma

interpretativa do processo produtivo e econômico

que desembocava em situação concreta de bem-

estar, direitos, participação, etc.(Leite, 1999,

p.29-30).

A população entende a educação, como um direito de

cidadania e, forçando a porta da escola, cria uma demanda enorme

de vagas.

Para fazer frente a estas exigências, em lugar de

construir mais escolas, simplesmente criaram-se 3 e até 4 turnos

nas existentes. Para Darcy Ribeiro, esta escola que tem

pouquíssimo tempo para ensinar às suas crianças, e que adota em

relação aos alunos que provêm,das camadas mais pobres uma

atitude de “rejeição, rechaço e repulsa”, é “uma escola simulatória,

fazendo de conta que ensina”.(Ribeiro, 1984, p.50-52).

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Como se tem constatado, na escola de turnos, acabam

sendo excluídas as crianças que são oriundas de famílias que têm

pouco ou quase nenhuma experiência intelectual, nas quais o

acesso a l ivros, revistas, jornais é muito l imitado e onde o estímulo

ao seu desenvolvimento integral é pequeno. Com isso, menos da

metade das nossas crianças concluiu o primeiro segmento do

Ensino Fundamental em quatro anos, sem carregar nenhuma

repetência.

Isso, segundo Darcy, signif ica

uma condenação ao atraso porque país algum no

mundo conseguiu alcançar o desenvolvimento e

a integração autônoma na civi l ização de seu

tempo, com tão grande massa de i letrados.

(Darcy, 1995, p.12)

O espírito que criou a escola de turnos, um ano letivo

dos menores do mundo, a crença de que para pobres basta uma

educação pobre, l iquidou, também, com a formação do magistério.

Deixou que os institutos de educação, instituições públicas

capazes de dar formação teórica e prática ao magistério, fossem

sendo substituídos por escolas normais criadas pela iniciativa

privada, que acabaram se convertendo em meros negócios. O

efeito educacional foi o mais desastroso possível, degradando o

ensino normal ao mais baixo nível.

No nível da Educação superior, os efeitos dessa

ideologia também foram nefastos. Em lugar de forçar a ampliação

de matrículas nas instituições públicas, que contavam com bons

professores, laboratórios e bibl iotecas, concedeu-se l iberdade total

para se converter o ensino superior em negócio.

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Em conseqüência, assist imos à degradação dos corpos

profissionais com que conta o país, entre eles os da educação.

É urgente, no dizer de Darcy Ribeiro, empreender um

grande esforço nacional, no sentido de alcançar algumas metas

mínimas no campo da educação pública. Entre essas metas

podemos ressaltar:

a) Criar escolas de dia completo, para todos os

alunos, sobretudo aqueles que vivem nas áreas

metropolitanas onde se concentra grande

quantidade de crianças condenadas à

marginalidade e ao abandono;

b) Dotar essas escolas de uma rotina educativa

competentemente planejada, a partir da qual

também as crianças pobres alcancem êxito nos

estudos;

c) Formar um novo professorado, devidamente

qualif icado para o exercício do magistério, em

cursos normais superior e em serviços e

d) dar ao novo professor, devidamente formado,

condições aceitáveis de trabalho em escolas de dia

completo.

Acreditamos que essas ações, entre outras, são

fundamentais para que os educadores brasileiros possam

contribuir no sentido de romper com uma lógica perversa que tem

condenado

nosso povo a viver à margem da civi l ização

letrada, sofrendo as conseqüências do

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desemprego e de uma fome e ignorância

crescentes.(Ribeiro,1995, p.14)

Os professores e professoras devem estar atentos e

prontos a lutar contra o modelo de escola corrente que não

alfabetiza nem educa as crianças pobres.

As pesquisas têm comprovado que, efetivamente, com

escolas adequadas, os alunos e alunas provindos das camadas

mais pobres mesmo que tenham sofr idos sérios revezes, podem

ser introduzidos no mundo do conhecimento e completar a

educação básica.

Isso só não acontece no Brasil, hoje, porque se tem

negado

à infância pobre a escola que integrou na

civi l ização letrada a infância de todos as nações

civi l izadas.(Ribeiro, 1995, p.15)

Para superar essas questões em que a educação

escolar brasileira vem se debatendo secularmente, Darcy Ribeiro

propõe o funcionamento de escolas em turno único, à semelhança

do que Anísio Teixeira havia pensado quando, nos 30, fala nas

escolas-classe e nas escolas-parque. Este foi o substrato do

Programa Especial de Educação.

O Programa Especial de Educação (PEE), que

implantou o horário integral em escolas públicas do Rio de Janeiro,

foi gestado no período de retomada da democracia no Brasil,

época de intensa agitação polít ica, com reorganização de

entidades representativas da sociedade civi l . Foram criados a

Associação Nacional de Pós-Graduação (ANPEd), o Centro de

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Estudos de Educação e Sociedade (CEDES) e a Associação

Nacional de Educação (ANDE) que realizaram a 1ª Conferência

Brasileira de Educação (CBE) em 1980, em São Paulo, com mil e

quatrocentos part icipantes. Nesse ano, a reunião da SBPC, no Rio

de Janeiro, teve como tema Ciência e Educação na sociedade

democrática. Em 1981, foi aprovada emenda constitucional que

garantiu ao professor aposentadoria aos 25 ano de serviço; em

1982, a 2ª CBE reuniu 2 mil part icipantes em Belo Horizonte onde

discutiram Educação: perspectiva na democratização da

sociedade.

Os governos estaduais empossados em março de 1983

tiveram seus programas influenciados pelos debates que se

tratavam nos anos de 78 a 82. No Estado do Rio de Janeiro,

Leonel Brizola nomeou a Comissão Coordenadora de educação e

Cultura, presidida por Darcy Ribeiro, Vice-Governador e Secretário

de Cultura, e integrada pelas Secretárias de Educação do Estado e

do Município do Rio de Janeiro, Iara Vargas e Maria Yedda

Linhares. Este foi o órgão diretor do Primeiro Programa Especial

de Educação.

A descrição completa do 1º PEE foi publicada por Darcy

Ribeiro, em 1986 no Livro dos CIEPs (Ribeiro, 1986). Segunda

Cavalieri, essa obra faz um diagnóstico essencialmente polít ico e

não técnico da educação pública brasileira e propõe currículo

comprometido ideologicamente com a transformação social. O

horário integral aparece como essencial no processo de

aprendizagem e se diferencia de um semi-internato por ter

justif icativa estritamente pedagógica: a educação integral prevê a

social ização, a instrução escolar e a formação cultural, vista como

parte essencial do processo de aprendizagem e não como adereço,

tornando-se a escola espaço social privi legiado para a formação

do cidadão. O currículo apresenta diferentes origens f i losóficas,

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refletindo as diversidades do pensamento educacional brasileiro.

(Cavalieri, s/d)

O debate sobre a extensão do tempo diário de

escolarização acirrou-se tanto durante a campanha para os

Governos Estaduais, em 1986, que a Fundação Carlos Chagas,

considerando que as discussões a respeito dessa proposta

caminhavam para defesa de interesse de grupos, decidiu fazer um

estudo sistemático a respeito dos CIEPs no Rio de Janeiro e do

Programa de Formação Integral da Criança (PROFIC) em São

Paulo. Em fevereiro de 1987, realizou um seminário denominado

Escola Pública de Tempo Integral: uma questão em debate, para o

qual foram convidados especialistas que deveriam desenvolver três

temas propostos a produzir textos específ icos para a discussão em

grupo fechado. O seminário, primeiro momento de estudo, t inha

dois objetivos (Paro et al i i , 1988): complementar o incipiente

referencial teórico sobre o assunto e levantar as questões sobre o

tema numa perspectiva teórico-prática. O segundo momento foi o

trabalho de campo, recorrendo a três fontes: discursos oficiais a

respeito de cada projeto; entrevista com profissionais, alunos, pais

de alunos e outros envolvidos na realização dessas experiências;

observações diretas em uma unidade de cada projeto, infel izmente

em momento em que já não era polít ica de governo. O seminário

atingiu o objetivo de contribuir para o desenvolvimento do

referencial teórico sobre a escola de horário integral, pois os

art igos e l ivro decorrentes dele tornaram-se referência bibl iográfica

de qualquer estudo sobre escola de horário integral, tão

indispensável quanto o Livro dos CIEPs. Apesar do objetivo

alegado ser uma apreensão objetiva do problema, o tratamento de

algumas questões gerou polêmica.

O 2º PEE, que se desenvolveu de 1991 a 1994, já se

deu em outro contexto polít ico. Sua descrição foi publicada na

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revista Carta nº 15, distr ibuída pelo gabinete do Senador Darcy

Ribeiro, sob o título de Novo l ivro dos CIEPs. No prólogo A

Educação e a Polít ica , Darcy Ribeiro faz em decálogo das medidas

mais urgentes para a educação no Brasil. Segue-se um balanço

crít ico do 2º PEE, além de uma atualização das diretr izes

pedagógicas que já se faziam presentes no 1º PEE e sua

operacionalização no 2º. Constam textos referentes aos diversos

projetos desenvolvidos no Programa. No final há uma descrição do

curso de atualização de professores de escola de horário integral e

uma análise dos resultados das avaliações externas aplicadas aos

CIEPs em 1993 e 1994. Esta últ ima verif icou que os índices de

aprovação da comunidade em relação ao horário integral, ao

prédio escolar, à integração criança-escola e à qualidade de vida

da comunidade após a implantação de escola f icaram acima de

80%.

Passados 18 anos de divulgação da proposta de

implantação de escolas públicas em tempo integral no Município e

Estado do Rio de Janeiro, lê-se em O Globo (04/03/2001):

“Crianças do Rio passam mais horas na escola”. Levantamento

feito pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

(INEP) indica que o Estado do Rio de Janeiro é o líder em número

de alunos do ensino fundamental em turno superior a 5 horas

diárias e que tem 19% desses 2.472.017 alunos estudando em

horário integral em escolas públicas e privadas. Constata-se,

portanto, que o horário integral em escolas públicas do Município e

do Estado do Rio de Janeiro tem conseguido manter continuidade,

apesar de ter sofrido retrocessos em sua implantação no Estado

(de 1987 a 1990 e de 1995 a 1999) e de jamais ter sido

restabelecida enquanto polít ica educacional no Município do Rio

de Janeiro desde 1987.

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Alguns pontos de reflexão são necessários para que se

possa compreender a permanência da escola de Horário Integral.

O primeiro ponto a destacar é a compreensão de

autores signif icativos para o debate a respeito da Escola de

Horário Integral que ele se deu num contexto de disputa partidária

que levou à exacerbação. Até a motivação do seminário proposto

pela Fundação Carlos Chagas fundamentou-se nesse

reconhecimento. Essa tendência se manteve na recusa da

Fundação Carlos Chagas em realizar a avaliação externa dos

CIEPs em 1994, apesar da insistência dos organizadores do

Programa Especial de Educação. O art igo de Zaia Brandão (1989)

A escola de 1º Grau em tempo integral : as l ições da prática expõe

sua relutância em participar deste seminário tal o cl ima

“emocional” em relação ao PEE. Relata a origem do seu crit icismo

com os CIEPs, mas reconhece que ele reflete preconceitos e vícios

da academia: tendência a desconfiar dos polít icos e a “não sujar

as mãos”. Afirma que o impacto nacional causado pelo programa

dos CIEPs colocou em discussão não as escolas, mas a disputa

polít ico-partidária representada por Brizola, Darcy e Niemeyer.

Apesar de reconhecer o boicote da imprensa ao governo Brizola,

considera que as crít icas veiculadas expressavam a polêmica

levantada pelos CIEPs.

O segundo ponto constado por vários autores foi a

dif iculdade de avaliar os resultados da escola pública de horário

integral tendo em vista a exigüidade de tempo de vigência dessa

implantação (Oliveira, 1991; Cunha, 1991; Garcia, 1992).

O terceiro ponto foi decorrente de estudos realizados

junto ao grupo de professores que freqüentava atualmente os

fóruns promovidos pelo NEEPHI. (Núcleo de Estudos das Escolas

Públicas de Horário Integral), na UNI-RIO. Estes professores, em

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quase 100% dos casos, trabalhavam em horário integral nos CIEPs

e 80% afirmam que preferem trabalhar em escola de horário

integral. No Município do Rio de Janeiro, destacam-se ainda dois

fatos que podem colaborar com o desenvolvimento dessa escola:

mais de 70% desses docentes estão em função dirigente e mais de

90% têm nível superior, sendo 1/3 com pós-graduação.

O estudo revelou que, na ótica professores,

potencialmente multipl icados da escola pública de horário integral,

f ica clara a necessidade dessa escola por parte da população, seja

porque a mãe precisa trabalhar fora e não tem onde deixar a

criança, seja porque lá as crianças podem se alimentar melhor,

seja porque é oferecida educação infanti l em horário integral, seja

porque mãe ou f i lho gostam da escola. Não é a falta de alternativa

que leva à opção pela escola de horário integral.

Esses pontos conformam um novo contexto para a

discussão a respeito da viabil idade de ampliação de oferecimento

da escola de horário integral à população: a) a permanência de

19% de alunos do ensino fundamental em horário integral; b) a

existência de um núcleo de estudos da escola de horário integral

cujos fóruns de discussão são freqüentados regular e

espontaneamente por profissionais desta escola; c) o

reconhecimento de que o debate travado há 14 anos atrás estava

minado de expectativas; d) a constatação de que ainda não foi

possível avaliar os efeitos do horário integral escolar por

descontinuidade dessa polít ica; e) a evidência de que possíveis

mult ipl icadores dessa polít ica já implantados nas escolas; f) a

percepção desses multipl icadores potenciais de que há demanda

escola por parte da população.

De fato esses pontos são indicadores de que há espaço

social para a introdução ou recuperação da escola de horário

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integral em cumprimento à determinação da lei Darcy Ribeiro

(9394/96). Entretanto a implantação dessa polít ica requer

condições que não são resultado apenas de profissionais bem

intencionados ou defensores ardorosos dessa concepção de

educação. Essas são frutos de uma polít ica de educação que se

proponha a restabelecer as bases sem as quais uma escola de

horário integral está fadada ao fracasso. A escola de horário

integral só é possível: com disponibil idade de recursos humanos

para atender à diversif icação de at ividades; com horário contínuo e

exclusivo do professor para que ele tenha tempo de dedicação à

sua formação em serviço e para a integração interdiscipl inar; com

salários que permitam a atividade contínua e exclusiva do

professor, coma presença de profissionais das áreas de saúde

cultura para que as carências e diferenças não se tornem

impedimentos para o desenvolvimento do processo educativo; com

recursos materiais e humanos necessários para que as refeições,

indispensáveis no horário integral, possam ser oferecidas

regularmente.

Atender a essas condições visando o horário integral

escolar para todo o ensino fundamental é meta irrealizável a curto

a prazo só pode ser atingida por etapas. Cabe então perguntar:

ainda tem sentido falar em horário integral hoje? Deixemos de

lado, provisoriamente, o horário e vamos falar então em educação

integral. Esta concepção fundamenta-se na compreensão de que a

educação perpassa todos os aspectos da vida, que a realização de

ações cotidianas, individuais e sociais, são facil i tadas pelo

domínio de conhecimentos universais acumulados historicamente.

Sendo mais específ ico: deixar de ter acesso a esses

conhecimentos implica na impossibil idade de participação na

sociedade atual, com toda a tecnologia de que ela faz uso nas

mais corriqueiras situações do dia a dia. Isto não reduz a exclusão

do mercado de trabalho, mas à exclusão da sociedade em si de se

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beneficiar do que ela coloca à disposição do grupamento social e

de ter instrumentos para lutar contra a desigualdade que ela

impõe. Até a algumas décadas atrás esta exclusão se

material izava no analfabetismo. Hoje ela se material iza na falta de

acesso a tudo que diz respeito e comunicação, matérias primas

desse milênio.

Oferecer acesso a essas matérias primas é função de

qualquer escola. Esta afirmativa seria correta se não fosse a

defasagem que há entre o que se oferece atualmente de educação

ás crianças das classes populares como um todo e o que elas

precisam alcançar para serem cidadãs do Brasil em 2001; entre o

que elas vivenciam nos lugares em que residem e o que precisam

experimentar para adquirirem a dimensão de como é o país delas

em 2001. Sintetizando, a distância que há entre o que elas

manuseiam em torno delas e o que vêem nas imagens da TV é tal

que se tornou intransponível se não houver uma instituição

específ ica, de acesso público, que faça uma ponte entre o lócus

atual dessas crianças e o patamar que lhes permita participar da

sociedade que se torna, nesse aspecto, cada vez menos

democrática. Essa instituição vai ter que oferecer não apenas

conhecimentos, mas instalações de uso coletivo em que as

crianças vão exercitar esse conhecimentos, que antes eram

adquiridos no seio famil iar. Por exemplo, hoje as normas de

higiene não são mais exeqüíveis para muitas famílias, porque

antes de ter escovas de dente a criança tem que ter comida.

Assim a escola é levada a l idar com funções que

anteriormente eram atributo da famíl ia. A criança vai ter que

aprender regras que nunca conheceu nem viu serem praticadas,

vai ter que usar instrumentos a que nunca teve acesso. E quem vai

ensinar é o professor e ele precisa de infra-estrutura e carga

horária disponível para isso, além de sua própria preparação para

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desempenhara função. Não adianta mais o conhecimento de que a

criança é f i lha de analfabetos, portanto não tem acesso à matéria

prima da leitura, portanto não aprende a ler e portanto vai terminar

sendo analfabeto também, depois de se evadir da escola após

sucessivas reprovações. Não adianta reclamar da indiscipl ina do

aluno, que desemboca em violência, se não se cria um código

comum para que tanto professor como aluno possam dist inguir o

que é permitido do que não é, quais são os l imites das ações pelos

atores no cenário escolar.

Assim a escola precisa de infra-estrutura material,

carga horária disponível, diversif icação de mão de obra, tempo de

preparação do seu profissional, para atender a essas funções que

a sociedade fez surgir no ambiente escolar. Isso signif ica que todo

o material de uso coletivo, do refeitório à bibl ioteca, do vídeo ao

computador, têm que estar instalado e funcionando; é necessário

compreender que isso não é supérfluo, é condição para escola

desempenhar não as novas tarefas, mas a sua função antiga, de

dar acesso ao conhecimento universal; as novas são condições

que se se interpuseram entre o desempenho da antiga e a situação

em que a nossa sociedade criou para a criança que chega pela

primeira vez à escola. E tudo isso leva tempo: não há como

ensinar a leitura crít ica do código não verbal sem gastar tempo

vendo fi lme de um padrão que não seja o global, e comparar com

este, e discutir e... E o professor precisa aprender a manipular o

vídeo, conhecer e discutir com os colegas outras imagens que

nunca viram, gastar horas na internet para perceber que

conhecimento hoje implica em seleção de informação e...

Finalmente é necessário tempo para a escola se reunir e perceber

se ela está avançando no processo de socialização de seus

alunos, se eles estão transferindo conhecimentos de uma área

para outra, se a organização da escola está facil i tando esse

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processo o que é necessário redimensionar para que os obstáculos

surgidos sejam superados.

Assim, mesmo que não existam condições de

oferecimento de horário integral escolar para o ensino

fundamental, deve estar sempre no horizonte a perspectiva de

extensão do horário, para que a educação integral que se faz

necessária hoje seja exeqüível. Até a chegada plena desse

momento, é imprescindível, desde já, que a avaliação contínua do

aluno se integre ao planejamento da escola e do professor para

que uma educação integral comece a ser desenvolvida. Caso

contrário estaremos colaborando para que a escola, em vez de

promover a inclusão social, continue excluindo, mesmo antes da

criança atingir o mercado de trabalho e continuaremos todos

crit icando a escola porque ela não cumpre sua função precípua de

ensinar.

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CAPÍTULO III

A Funções Sociais da Educação

Se agora falamos em educar as pessoas

como o mundo precisa, de devemos compreender

que esse processo, necessariamente, não será

uma educação para o conformismo, mas voltada

à l iberdade e autonomia, pois somente baseado

em indivíduos verdadeiros poderá existir o

verdadeiro “mundo”.

(Cláudio Naranjo)

As ações humanas, sejam no âmbito da educação ou de

qualquer outra natureza, estão sempre impregnadas de crença e

valores que as orientam para determinadas f inalidades. “

consciente ou inconscientemente, explícita ou implicitamente,

quem vive possui uma fi losofia de vida, uma concepção de

mundo”(Buzzi, 1973,p8-9)

Assim também o é com relação a uma proposta de

educação para totalidade que tem por trás de si uma determinada

visão de mundo, de homem e de conhecimento.

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Isto também acontece, como é natural com a maioria

dos professores.

Inspirados necessariamente numa fi losofia educacional

que dá sentido a sua atividade docente, muitas vezes eles não

reconhecem suas próprias diretrizes e tendem a exercer o

magistério com baixo nível de consciência.

Por outro lado, é possível o educador não permanecer

apenas num senso comum. Para isso, é fundamental que se torne

claro pára si mesmo que é o homem que deseja educar, que papel

lhe está reservado no mundo, como se apresenta de fato a

sociedade, o que ela pretende e representa, que f inalidade devem

ter suas ações pedagógicas em sala de aula, se propondo, assim,

a exercitar continuamente uma reflexão fi losófica a respeito da sua

prática escolar.

Através da busca deste senso crít ico em educação, os

educadores podem entende-la, segundo Luckesi, de três maneiras

diferentes, ou seja, cumprindo as funções de redenção, de

reprodução ou de transformação da sociedade.

A educação, numa perspectiva redentora, se

fundamenta numa visão acrít ica da sociedade. Sem que se

processe uma reflexão a respeito da ordem social estabelecida,

atribui-se à educação a função de integrar à sociedade, tanto as

novas gerações como aqueles que se encontram porventura, em

situação de marginalidade.

Tal concepção se apresenta impregnada de otimismo

ingênuo, ao acreditar que a educação, por si só, passa garantir o

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perfeito funcionamento da ordem social, desconhecendo os

determinantes sociais que as condicionam, tais como aspectos

polít icos, econômicos, sociais etc

Trata-se de uma visão conservadora de educação, uma

vez que sua função é entendida como a de redimir as possíveis

mazelas da sociedade, ajustando os sujeitos ao previamente

estabelecidos, sem cogitar de uma possível mudança na estrutura

social que vise a superação das desigualdades existentes entre os

homens.

A outra tendência a ser considerada é aquela que

percebe a educação como mecanismo de reprodução da

sociedade. Nesse caso, ela se fundamenta numa atitude de

crit icidade diante das injustiças sócias provocadas pela relações

de trabalho. A sociedade é concebida não como um todo

harmônico ao qual devem ser ajustados os indivíduos mas sim

como o palco de lutas entre classes antagônicas e onde a

educação contribui para a marginalização da maioria das pessoas.

O processo de marginalização desempenhado pela

escola reprodutora se dá por meio de diversos mecanismos de

exclusão cultural impostos a grupos socialmente discriminados.

Estes mecanismos são evidenciados, por exemplo,nos altos

índices de evasão e repetência observados no sistema educacional

brasileiro. A escola, por não garantir o acesso ao saber

sistematizado a todos, faz com que as oportunidades sejam

desiguais e as pessoas não tenham as mesmas chances para o

exercício da sua cidadania.

A educação reprodutora, ao contrário da redentora, é

marcada por um grande pessimismo, não vislumbrando para si

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outra alternativa, senão a sua subordinação aos condicionantes da

sociedade, o que faz com que ela desempenhe um eficaz papel na

manutenção da ordem social.

A análise reprodutivista da educação foi feita por

teóricos, entre eles Baudelot e Establet, Bourdier e Passerron e

Althusser, dando origem a teoria crít ico-reprodutivista em

educação.

Esta concepção, por ser empregnada de péssimo, “não

se traduz numa pedagogia, ou seja, (.. .) não estabelece um modo

de agir para educação, como propunha a tendência anterior e

como proporá a subseqüente” (Luckesi,1991,p.42). Se, por um lado

a pedagogia reprodutivista não apresenta nenhuma proposta

pedagógica, l imitando- se a crít ica a escola por outro, a visão

transformadora de educação, embora não desconhecendo os

condicionantes sócias, entende que a escola tem possibil idade de

contribuir para a democratização da sociedade.

Trata-se de uma tendência crít ica sem, no entanto, a

pegar-se “ao otimismo i lusório quanto o péssimo imobil izador”

(Luckesi, 1995, p.51), característicos das tendências anteriores.

A educação transformadora é considerada numa

relação dialética com a sociedade, sofrendo e exercendo

simultaneamente influências sobre elas. Assim entendida, a

educação também é mediadora, ou seja, serve de instrumento, de

meio para a concretização de um modelo ideal de sociedade.

O quadro a seguir procura sintetizar as principais

características das funções sociais da educação, segundo Luckesi:

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Funções

Aspectos

Redentora

Reprodutora

Transformadora

Visão de

sociedade

acrít ica

crít ica

crít ica

Atitude diante

da educação

otimista

pessimista

consciente de

suas

possibil idades e

l imitações

Papel da

educação

conservador

reprodutor

mediador

Para que se pergunte sobre a função social da

educação numa visão de totalidade, é preciso retomar o conceito

que temos acerca de homem e da própria educação.

Numa perspectiva de totalidade, o homem é concebido

como um ser de relação, que influi e sofre influência do meio

natural e de outros homem. Conseqüentemente, este homem

encontra-se em permanente mudança, fato que atribui à educação,

a característica de processo, de continuidade, de interminabil idade

de infinitude. Ao atuar sobre a realidade o homem tem um

compromisso, um papel a desempenhar junto a ela, papel este que

deve ser orientado por valores que visem sua harmonia e

preservação. “A educação e o educar-se são um processo de

comprometimento com a realidade, com o cotidiano que está diante

de mim e que acontece a todo estante” (Ribeiro,1991, p.137).

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No entanto, o que a educação de um modo geral, e a

escola, em particular, têm feito, é fornecer ao homem uma visão

fragmentada de mundo e dele mesmo. Esta fragmentação do

conhecimento não lhe permite agir conscientemente para a

transfomação da realidade, uma vez que a consciência a respeito

de alguma coisa só é atingida quando percebemos a sua

total idade. Se tentarmos situar a função social de uma prosposta

educacional para a totalidade dentre as categorias preconizados

por Luckesi, concluiremos que ela só poderá ser localizada numa

perspectiva de crit icidade e transformação da sociedade.

Com relação a esta questão, no entanto, o aspecto que

nos parece fundamental é a idéia de que a tão almejada

transformação social só poderá se efetivar simultaneamente à

transformação pessoal de cada um, num processo crít ico e

dialético de interinfluências contínuas. E é neste ponto que a

educação assume importância no que se refere à sua função

transformadora.

O que acabamos de afirmar f ica evidente quando Frei

Beto diz que o processo educacional, numa visão holística, abarca

cinco dimensões: “transmissão do patrimônio cultural, despertar

das suas potencialidades humanas e espirituais, reflexão do que

se vive, capacidade de modif icar a realidade e aprimoramento do

ser propriamente humano”(Frei Beto, 1992, p.16).

A terceira das dimensões apontas – reflexão do que se

vive – evidencia o caráter de crit icidade da educação numa visão

de totalidade.

O quarto tópico – capacidade de modif icar a realidade –

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caracterizada explicitamente a idéia de transformação e a últ ima

afirmativa - aprimoramento do ser propriamente humano -, nos

remete para a importância da transformação individual, que está

presente também na segunda dimensão registrada – despertar das

potencialidades humanas e espirituais.

Constata-se, assim, que a educação escolar tem, quase

que exclusivamente se preocupado com a primeira dimensão

apontada por Frei Beto, descuidando-se das demais.Isto evidencia

que o âmbito de atuação da maioria das instituições de ensino se

apresenta muito estreito, com relação a uma proposta de educação

holística, uma educação para a total idade.

É lamentável que, por não se preocupar com a

formação integral dos educandos, a escola de um modo geral

venha deixando de facil i tar o encaminhamento da humanidade para

a solidariedade universal, enfatizando relações interpessoais

altamente competit ivas, entre alunos professores e direção. Estas

relações só fazem garantir a manutenção das estruturas de poder

al i existentes. Esta é uma das razões para que educação escolar,

em todos os níveis de ensino, venha, através dos tempos,

contribuindo para a confirmação dessas mesmas estruturas de

poder al i existentes. Esta é uma das razões para que educação

escolar, em todos os níveis de ensino, venha, através dos tempos,

contribuindo para a confirmação dessas mesmas estruturas

existentes na sociedade, numa atitude conservadora do seu “status

quo”.

Parece estar evidente que a educação de que

necessitamos na virada do terceiro milênio é uma educação

voltada para o desenvolvimento da consciência, voltada para a

l iberdade e autonomia. Uma educação que possibil i te o indivíduo

chegar a um nível de maturidade tal “que ele passe da perspectiva

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da individualidade isolada e mentalidade tribal ao sentimento

plenamente desenvolvido de comunidade e perspectiva

planetária”(Naranjo, 1991, p.115).

A transformação da sociedade na direção destes

valores, portanto, jamais poderá ocorrer como um mecanismo de

introjeção de idéias l iberado pelos educadores como um processo

de condicionamento social, característico da função redentora da

educação.

É preciso, portanto, que a transformação ocorra, antes

de mais nada, nos próprios educadores. Ao desenvolverem a

consciência da sua própria consciência, estarão em condições de

facil i tar que outro descubra também aquilo que existe dentro de si.

Àqueles que experimentam uma transformação posit iva em suas

vidas, não parece impossível uma transformação da própria

sociedade, por acreditarem que, assim como eles, um número

suficiente de pessoas possa mudar, conspirando para”criar um

mundo hospitaleiro para a imaginação, crescimento e cooperação

humanos”(Ferguson, 1992,p.67)

Fica assim evidente que a educação tem uma enorme

responsabil idade no que se refere à transformação individual,

incluindo-se aí a autotransformação dos educadores. É

fundamental, portanto, que cada um deles se dê conta da sua

responsabil idade neste processo de evolução da humanidade.

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CAPÍTULO IV

A AMPLIAÇÃO DAS FUNÇÕES DA ESCOLA:Situando a

questão na realidade brasileira

Na segunda metade deste século, generalizou-se no

Brasil a demanda pela escolarização básica, tendo também sua

oferta efetivamente se ampliado e atingido praticamente todas as

crianças do país. Entretanto, a qualidade desta escolarização, ou

seja, a contribuição civi l izatória que a escola tem de fato oferecido

à maioria da população brasileira aquém daquilo que se poderia

esperar em comparação com as experiências de outros países, ou

mesmo em relação ao nosso grau de desenvolvimento econômico-

industrial.

Criou-se no Brasil a estranha civi l ização na qual grande

parte das crianças tem acesso à escola – com índice médio

nacional de 4,8 anos de escolarização – mas não é garantia de

que neste período realizem progressos signif icativos. A fase

escolar na vida da maioria de nossas crianças é marcada por

percalços, fracassos e frustrações.

A constatação desta precariedade de escola brasileira

e a necessidade de superá-la tem levado estados, municípios e

federações a diferentes iniciativas na área educacional. Muitas

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destas iniciativas têm como características comum a proposta de

ampliação do horário escolar diário e das responsabil idades

educacionais da escola. Entre estas iniciativas situam-se o

Programa dos CIEPs no Rio de Janeiro, o PROFIC em São Paulo,

o projeto Curumim em Minas Gerais, os CEIs na prefeitura de

Curit iba, os CAICs em âmbito federal.

Este t ipo de iniciativa tem como antecedente histórico a

experiência pioneira do Centro Educacional Carneiro Ribeiro, ou

“Escola-Parque”, inaugurado em Salvador por Anísio Teixeira, no

ano de 1950. O projeto se apresentava como uma concepção de

educação integral e era fortemente influenciado pelo ideário da

Escola Nova americana. O Centro era constituído de quatro

escolas-classe e uma escola-parque. A escola-parque

complementava de forma alternada o horário das escolas-classe, e

assim o aluno passava o dia inteiro no Complexo, onde além das

aulas, se alimentava, tomava banho, freqüentava a bibl ioteca,

praticava esportes e realizava trabalhos em oficinas.

Também nas leis brasileiras, começa a aparecer a

tendência a um aumento do horário e das responsabil idades

escolares: os dois projetos de LDB, atualmente em tramitação no

Congresso Nacional. A Constituição de Minas Gerais, promulgada

em 1990, prevê, na área de educação, o aumento da carga horária

das escolas de 1º grau, pré-escolas e creches públicas, de 4 para

8 horas diárias. A Constituição do Rio de Janeiro, de 1989, afirma

que “a atuação do Estado e dos Municípios no setor educacional

dará prioridade à criação e manutenção de creches e pré-escolas,

assim como ao estabelecimento progressivo de turno único”.

Todas as iniciativas acima, concretas ou legislativas,

giram em torno do aumento da carga horária e das

responsabil idades da escola de 1º grau. Apesar das

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inconsistências e fragil idade de muitas destas proposta, elas não

deixam de representar espasmos de um sentimento e generalizado

de reafirmação da importância da escola tanto na reversão

emergencial de uma série de mazelas de nossa sociedade como

também, de um ponto de vista crít ico e prospectivo, de

fortalecimento das condições para o desenvolvimento democrático.

Na verdade, não se deve entender estas iniciativas

apenas como sendo respostas imediatistas à situação particular de

injustiça social, violência, abandono da infância, enfim,

degradação das condições de vida por que passa a população

brasileira. Tal entendimento não daria conta nem explicaria

inteiramente a tendência que elas revelam.

Até aqui estivemos abordando esta tendência no setor

público, mas o fato é que, também nas escolas privadas, que

atendem às camadas médias brasileiras, ampliam-se cada vez

mais as responsabil idades e a variedade das ações educacionais.

Espera-se que, além dos papéis convencionais,

aspectos l igados a comportamento sexual, afetividade, padrões de

conveniência social, “conscientização polít ica”, parâmetros de

higiene e saúde, uso de drogas e suas respectivas implicações

ético-morais e outros mais, e comunidades transferindo parte das

funções educativas, antes exercidas espontaneamente por elas,

para as instituições escolares.

Em suma, além da instrução básica, outros campos de

atuação estão cada vez mais presentes no universo das tarefas

das escolas públicas e privadas. Transfere-se para a escola a

responsabil idade para com os problemas de ordem prática e moral

que as famílias não se encontrariam em condições de enfrentar por

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vários motivos: nas famílias de classe média, em conseqüência da

disseminação do trabalho feminino, das f lutuações matrimoniais,

da rapidez das mudanças nos costumes e nos valores; nas classes

pobres pela justaposição das condições de miséria e

desinformação às anteriormente citadas, o que aumenta ainda

mais as necessidades e expectativas dessas em relação às tarefas

da escola.

Em países do chamado Primeiro Mundo, socialmente

mais equil ibrados e homogêneos, as funções escolares são já

tradicionalmente mais amplas. O horário escolar varia de seis a

oito horas diárias e as atividades incluem cultura, esportes e lazer.

Como tendência mundial, ocorre um inegável

fortalecimento do papel exercido pelos sistemas educacionais

formais na educação das crianças. Por toda a parte observa-se o

crescimento das redes de creches e pré-escolas, e a tendência a

que assumam o sistema de dia completo.

O tempo total de escolarização de cada indivíduo tende

a se expandir devido ao aumento do nível de qualif icação exigido

pelo mercado de trabalho e também devido ao aumento

progressivo do desemprego. Segundo estudos nessas áreas, os

sistemas de educação devem também considerar.

“. . . a retenção da força de trabalho nas escolas como

forma de contrarrestar efeitos sociais e polít icos do desemprego,

sendo hoje esta questão pensada não apenas em relação aos

jovens, mas também aos adultos excluídos do mercado de trabalho

e às pessoas da terceira idade (...) e o fato de que, cada vez mais,

os requisitos de qualif icação do sistema produtivo hoje são de t ipo

que não pode ser obtido por uma escolarização curta”.

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Ocorre assim, simultaneamente, um aumento tendencial

no tempo de escolarização, pelo ingresso precoce e saída tardia

do sistema escolar, e no tempo diário de permanência de cada

indivíduo na escola.

A despeito desta tendência mundial, a proposta de

ampliação das funções da escola básica, no caso brasileiro, exige

uma problematização que aponte os caminhos para sua possível

justif icação. Tem ela, para nós uma características essencialmente

emergencial ou pode servir efet ivamente como alternativa

educacional generalizável? Pode ela vir a reforçar o controle social

ou, dependendo de como se organize, servir ao desenvolvimento

democrático e aos interesses de emancipação?

Não podemos deixar de considerar, nesta

problematização, a situação paradoxal de que, paralelamente à

tendência de crescimento do papel da escola na vida dos

indivíduos ocorre o questionamento sobre a capacidade desta

mesma escola, em seu formato atual competir com os demais

meios de informação e comunicação.

Independentemente de uma perspectiva crít ica, a crise

na educação escolar é um tema recorrente, presente em diferentes

t ipos de pensamento e nos mais variados países. Parece

configurar-se um quadro em que há necessidades objetivas de

“mais escolas” ao lado de enorme dif iculdade em adaptá-la às

características da vida contemporânea.

No Brasil, todas essas contradições f icam agravadas e

as possibil idades de diagnóstico, e planejamento são dif icultadas

pelas vicissitudes da nossa situação social e pela precariedade do

sistema educacional público instalado.

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Quando ausente a perspectiva de uma real

transformação sócio-polít ica, o fortalecimento da escola pode

aparecer vinculado à pretensão de reforço do comportamento

submisso e conformista das classes populares. Ou seja, o

galopante avanço da crise social, por exemplo, leva a que a idéia

de ampliação das responsabil idades da escola surja algumas

vezes com o sentido prioritário de controle social. Tal pretensão,

entretanto, para alcançar efetividade, necessitaria de um tipo

muito particular de organização escolar, com um nível de

repressão e uma homogeneidade de seus quadros profissionais,

difíceis de imaginar na atual sociedade brasileira.

Já do ponto de vista das forças ditas progressistas,

identif icadas com os interesses das camadas populares, há uma

revalorização em geral da experiência escolas como uma

experiência que pode contribuir para as transformações em direção

à construção da democracia. Lembremos que esta revalorização

acompanha a retração, em todo o mundo, dos projetos

revolucionários e o conseqüente investimentos em reformas

polít icas e sócio-culturais de longo prazo.

Entretanto, mesmo no campo mais identif icado com os

interesses populares, a revalorização da importância estratégica

da experiência escolar não apresenta unanimidade em relação ao

que sejam os objetivos e funções da escola básica. Parece que

nele se delineiam dois t ipos de pensamento: o primeiro identif ica a

qualidade do ensino com a garantia de condições mínimas

necessário ao tradicional funcionamento escolar – recuperação de

prédios, valorização e aperfeiçoamento de professores, critérios

modernos e sistemáticos de avaliação. Rejeita explicitamente que

a escola venha a ampliar e diversif icar suas funções. Nesta l inha,

podemos citar Guiomar Namo de Mello.

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“A escola não é um mundo à parte da sociedade. Além

dela atuam as famílias, as igrejas, os partidos, os sindicatos, os

meios de comunicação, as manifestações culturais. É da ação

educativa conjunta de todos esses elementos que se formam as

consciências, os valores, as opções ideológicas. Propor que

educação escolar substitua todos eles, é o pior que pode

acontecer porque irá desviá-la do seu objetivo fundamental, aquele

que lhe é específ ico(...)”.

A afirmação, cujo o tema será aprofundado mais

adiante, torna-se caricatural pelo uso do termo “substituta”, mas

expressa com clareza uma concepção de escola especializada,

que não se desvia do seu “objetivo instrucional fundamental”.

O segundo tipo de pensamento, do qual estamos

tratando neste trabalho, associa à tradicional noção de qualidade

uma maior participação da escola na vida das crianças e das

comunidades; considera necessária a transformação do formato da

escola básica de maneira que esta venha cumprir função

importante nas esferas cultural e comunitária e que a instrução

escolar apareça associada a expansão do convívio social, aos

esportes, às artes, ao lazer e a saúde.

Não se trata apenas de justapor novas tarefas àquelas

tradicionais. A associação da instrução escolar a múlt ipla outras

experiências deve objetivar uma modif icação na própria natureza

da instrução escolar.

Assim, esta segunda formulação aponta em direção a

outro t ipo de experiência escolar que dominaremos, daqui por

diante, de educação escolar integral ou, quando for o caso, escola

de educação integral.

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Como afirmamos anteriormente, o objetivo deste estudo

é indicar uma reconceptualização da escolarização, de forma que

esta possa vir a contribuir para os processos emancipatórios da

maioria da população brasileira.

Para isso argumentaremos a favor de uma concepção

da escola que, preliminarmente pode ser definida da seguinte

forma: uma experiência escolar mult idimensional, que atue

integradamente em aspectos da vida dos alunos relacionados a

seu bem estar físico (saúde, al imentação, higiene); ao seu

desenvolvimento como ser social e cultural e à sua capacitação

como ser polít ico. Hoje, para que uma escola alcance esta

amplitude de objetivos precisa ser uma espécie de “escola-casa”,

uma espécie de “escola-clube”, uma espécie de “escola-

universidade”, aberta à famíl ia e à comunidade. Enfim, uma escola

organizada de tal forma, que os aspectos reguladores e

repressivos inerentes à ordem institucional, sejam dirimidos pela

riquezas das experiências democráticas ali vivenciadas.

A escolha do termo “educação integral” para designar a

concepção de escolarização de que tratamos, envolve questões

semânticas e históricas.

Entre as iniciativas governamentais anteriores citadas e

que, mesmo precariamente, nos servem como referenciais

empíricos, o termo “educação integral” é uti l izado por apenas uma

delas – os Centros de Educação Integral (CEIs) de Curit iba. Nos

demais, a designação “integral” é em geral associada apenas ao

horário (horário integral), e alguma vezes a formação (formação

integral). A palavra freqüentemente uti l izada é “integrada/o” como

em “escola integrada”, “Centro integrado”, “educação integrada”.

Têm estas expressões, a vantagem de apresentar de forma bem

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clara a idéia de que a educação escolar deve ser um conjunto de

ações interindependente, entrosadas e coerente, que formam um

sentido e têm um objetivo. Entretanto tem a desvantagem de não

fornecer qualquer pista em relação a abrangência destas ações.

Explicando melhor, a qualif icação “integrada” diz apenas que as

ações realizadas mantém nexos entre si, mas não diz da natureza

ou amplitude destas ações. Pode-se, por exemplo, ter uma

concepção de educação escolar integrada, que se refira à uma

postura metodológica em uma relação ao conhecimento

convencionalmente escolar e às formas de didaticamente organizá-

lo (ou integrá-lo), sem que isso signif ique uma mudança ou

ampliação das funções educacionais desta escolas.

Quando à expressão “educação integral”, esta também

não esta l ivre de problemas. Entre eles evidenciamos o fato que,

por mais planejada e compartimentada que seja a sociedade

moderna é difíci l e indesejável imaginar a possibil idade de que a

educação seja integralmente promovida por apenas uma instituição

social. Se como afirmava Dewey, “educação é vida”, onde há

atividade humana há, necessariamente educação. Inevitavelmente,

a formação das novas gerações será fruto de um complexo de

ações, intencionais ou não, originárias de várias insti tuições

sociais, das mais fragil izadas, como hoje nos parecem a família e

a comunidade, e, no caso brasileiro, a própria escola, às mais

fortalecidas como os atuais meios de comunicação.

O reconhecimento destas múlt iplas fontes educacionais

não impede que se dist inga a educação escolar como aquela que,

entre todas, reúne, hoje, as melhores condições para atuar de

forma polivalente, consciente e principalmente crít ica, exercendo

uma ação que considere a criança como um ser integral. A

educação famil iar, apesar de sua profunda e primordial atuação,

esta sempre l imitada às particularidades de cada família e às

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injunções afetivas em seu interior; a educação religiosa,

particularmente no mundo moderno, exerce uma ação bastante

direcionada aos aspectos espirituais específ icos de cada religião;

a educação comunitária espontânea, com a destruição dos

espaços de convivência e o anonimato e individualismo das

grandes cidades, parecem em fraca decadência; a ação educativa

dos meios de comunicação de massa, hoje tão fortalecida, é quase

sempre um subproduto dos interesses econômicos da indústria

cultural e da propaganda, não atendendo aos interesses da

democracia e da emancipação humana.

A noção de “educação escolar integral”, em suma, se

não é incoerente com o fato de que há sempre inúmeros agentes

educativos em ação, traz implícito o reconhecimento de que, como

instância educativa intencional, é a escola que pode propiciar a

mais abrangente, múlt ipla e crit icamente refletida ação

educacional no mundo contemporâneo.

Já esta claro que a “educação integral” de que tratamos

aqui diz respeito à educação formal, planejada, especif icamente

escolar. O aprendizado natural já traz em si a integralidade. Nas

comunidades primit ivas não há educação que não seja integral, da

mesma forma que, na Idade Média, o aprendizado moral, rel igioso

e para o trabalho era decorrência espontânea da convivência entre

adultos e crianças.

Mas a prática de uma educação institucional integral,

visando fins definidos, tem exemplos longínquos, entre eles a

formação de indivíduos para a vida clerical. Neste caso já na

época medieval, esta formação consistia em uma educação

sistemática abrangente, na qual aprendiz era imerso, ainda jovem,

e por longos anos, na historia, nos hábitos e nas obrigações da

vida religiosa.

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Como projeto de prática social generalizada, visando a

interferência dos destinos não só do indivíduo, mas na sociedade

como um todo, a idéia de uma educação integral é algo que só

pôde entrar em pauta, no mundo ocidental, coma escolarização em

massa ocorrida a part ir do século XVIII.

A generalização social da escola, ou seja, da educação

apartada da vida cotidiana e produtiva, fez surgir, lentamente, dois

t ipos de compreensão, de certa forma antagônicas: de um lado, a

defesa deste apartamento, como sendo a base para realização da

tarefa educativa. De outro lado, a preocupação com a necessidade

de reatamento entre educação e vida, que teve sua expressão

precoce em Rousseau e, posteriormente (séculos XIX e XX), com

diferentes enfoques, nas concepções socialistas e escolanovista

de educação.

A escola, ao separar educação e vida, crianças e

adultos, aprendizagem e trabalho, trabalho manual e intelectual,

ação e pensamento, colocou no horizonte de possibil idades essa

expectativa de que tal separação fosse mais, ou menos radical,

atingisse ou não determinados aspectos e mesmo viesse a

desaparecer. A chamada “quarentena” a que são submetidas as

crianças durante a fase escolar continua sendo um ponto de

permanentes questionamentos.

Os vínculos entre educação escolar e natureza, valores

espirituais, valores morais, formação da cidadania, formação para

o trabalho e outros foram, em diferentes momentos da história,

considerados insatisfatórias ou até mesmo rompidos. Em últ ima

instância, as diversas correntes do pensamento educacional

representam tentativas de recuperar algum ou alguns destes

vínculos, fortalecendo determinado tipo de formação. É justamente

quando o pensamento revela grande convicção no poder da razão

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que se fortalece a idéia de uma atuação da educação escolar que

será prioritária, global e determinante tanto individual como

socialmente. Não é por acaso que junto às idéias i luministas

revolucionárias, ao pensamento socialista e à concepção

pragmatista f loresceram proposta de educação integral.

Quando se espera alcançar uma atuação educativa

ampliada, esses reatamentos e vínculos se tornam ainda mais

estreitos; imagina-se uma espécie de “reunif icação” entre a escola

e aquilo que cada uma desta visões considera que seja o

fundamental para a vida.

Enfim, a opção pela expressão “educação integral” foi

também, de certa maneira uma opção pela “reconsideração” das

história, ou seja, pela busca de raízes e elos que emprestem maior

substância às nossas pretensões inovadoras.

Ainda que estejamos vivendo um momento de muito

poucas convicções quanto ao poder de razão, e talvez justamente

por isso, estamos considerando a possibil idade de uma instituição

escolar capaz de atuar tendo em vista uma pedagogia da crít ica,

isto é, da capacidade do exercício da crít ica.

A ambição da escolaridade contida na concepção de

educação escolar integral tem como horizonte as grandes utopias

da modernidade: as utopias da democracia, da l iberdade, do

progresso civi l izado, da busca por uma existência emancipada.

Contudo, não queremos deixar de ver aquilo que nessas utopias se

tornou obsoleto ou que não chegou, em qualquer sentido, a ser

cumprido, particularmente em se tratando de realidade brasileira.

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Em uma sociedade onde predomina um referencial de

escolarização que se caracteriza pela l imitação e burocratização

de suas funções – o que tem como conseqüência imediata a

desescolarização precoce das camadas populares – a proposta de

ampliação do tempo e das responsabil idades educacionais da

escola pode apontar em direção à realização de uma educação

efetivamente pública e democrática. Para isso fundamentalmente

que esta ampliação seja acompanhada de uma reformulação

radical da concepção polít ico-pedagógica do sistema existente,

isto é, que seja, de fato, uma ampliação transformadora e não

apenas duplicadora.

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CONCLUSÃO

A construção do Horário Integral perpassa pelas

atividades e projetos que desenvolvam uma proposta – polít ico –

pedagógica de inclusão e que respeite a diversidade local, com

profissionais capazes de atender aos objetivos dos diferentes

níveis e modalidades de ensino. O artigo 34, da Lei nº 9394/96,

reafirma: “A jornada escolar no Ensino Fundamental incluirá pelo

menos quatro horas de trabalho efet ivo em sala de aula, sendo

progressivamente ampliado o período de permanência na escola”.

Dentro da proposta de Escola Integral, os projetos e

ações desenvolvidos no interior dos CIEPs vão ao encontro,

também, do Decreto 25.959/2000 – Programa nova Escola, já que

a qualidade do trabalho educativo é baseada na ampliação do

tempo de permanência do aluno na unidade, mesclando ações de

Educação formal e não-formal, visando ao pleno desenvolvimento

deste e garantindo “a formação comum indispensável para o

exercício da cidadania e fornecer-lhe meios para progredir no

trabalho e em estudos posteriores” conforme o art igo 22 da Lei nº

9393/96 (nova LDB).

Para garantir uma Escola de Qualidade é necessário

que a escola se organize e planeje de acordo com sua realidade, o

seu horário e atividades que possam ser oferecidas para que o

aluno seja plenamente atendido.

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ANEXOS

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