A Escolha Do Consorte e Do Regime de Bens Sob a Perspectiva Da Analise Economica Do Direito

Embed Size (px)

Citation preview

  • Ano XXII n 40, jul.-dez. 2013 ISSN 2176-6622

    https://www.revistas.unijui.edu.br/index.php/revistadireitoemdebatep. 67-90

    A ESCOLHA DO CONSORTE E DO REGIME DE BENS SOB A PERSPECTIVA DA ANLISE ECONMICA DO DIREITO

    Cristiana Sanchez Gomes-FerreiraMestre em Direito Civil pela UFRGS; advogada, com atuao exclusiva em Direito de Famlia e Sucesses [email protected]

    Csar Viterbo Matos Santolim

    Mestre e doutor em Direito (UFRGS). Auditor, substituto de Conselheiro do TCE/RS. Professor da Faculdade de Direito da UFRGS [email protected]

    Gicomo BalbinottoDoutor em Economia pela Universidade de So Paulo (USP). Professor do Programa de Ps-Graduao em Economia (PPGE) [email protected]

    Resumo

    A famlia, sob o aspecto instrumental, o ambiente que propicia o desenvolvimento e a estabilidade dos indivduos. A compreenso de seu processo de formao, transformao e dissoluo subsidiada pelo ferramental da Anlise Econmica do Direito, bem como pela moderna teoria econmica da famlia. A abordagem econmica do casamento, como um novo campo de estudo da economia, evidencia e ilustra a aplicabilidade desta cincia a toda e qualquer esfera do comportamento humano,1 resultando o matrimnio, por fim, de uma escolha racional tomada por indivduos que procuram, dentre aqueles disponveis no mercado de casamento, o parceiro que melhor venha a maximizar sua utilidade, enfrentando, para tal, as restries inerentes ao mercado no qual esto inseridos. No presente estudo so analisados o processo de funcionamento do denominado mercado de casamento, a Teoria da Sinalizao como ferramenta a se compreender o fenmeno de escolha dos parceiros e do regime de bens , e, finalmente, uma abordagem da escolha dos regimes matrimoniais sob a perspectiva da Law and Economics.

    Palavras-Chave

    Anlise econmica do Direito. Mercado de casamento. Teoria da sinalizao. Regimes de bens.

    1 Mckenzie, Richard B.; Tullock, Gordon. La Nueva Frontera de La Economia. Madrid: Espasa-Calpe, 1980. 386 p.

  • Abstract

    The family, under the instrumental aspect, is the environment that enables the development and stability of individuals. The understanding of its process of formation, transformation and dissolution is subsidized by the Economic Analysis of Law, as well as by modern economic theory of the family. The economic approach of marriage, as a new field of study of economics, highlights and illustrates the applicability of this science to every sphere of human behavior, resulting marriage, after all, as a rational choice made by individuals that seek, among those available in the marriage market, the best partner that will maximize their utility, facing, for such, the restrictions inherent in the market in which inserted. The present study analyzes the marriage market and the Theory of Signalling - as a tool to understand the phenomenon of choice of partners and matrimonial property regime, from the perspec-tive of Law and Economics.

    Keywords

    Economic analysis of law. Marriage market. Signaling theory. Property regimes.

    Sumrio

    1. Introduo 2. Existncia e Operacionalizao do Mercado Matrimonial. 3. A Teoria da Sinalizao e o Mercado Matrimonial. 4. A Escolha do Regime de Bens Sob a tica da Law and Economics. 5. Concluso. 6. Referncias.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    69Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    1 INTRODUO

    O objetivo deste trabalho promover uma anlise econmica do con-

    trato matrimonial e da escolha dos regimes de bens nupciais. Desta forma,

    primeiramente caber a abordagem da existncia e operacionalizao do

    denominado mercado de casamento, para que, a partir de ento, se possa

    aplicar a Teoria da Sinalizao escolha do parceiro conjugal e do regime de

    bens a incidir na sociedade conjugal, tudo sob a concepo da Anlise Eco-

    nmica do Direito (Law and Economics).

    At pouco tempo atrs, de acordo com Cooter e Ulen, o direito res-

    tringia o uso da economia s reas das leis antitruste, dos setores regulamen-

    tados, dos impostos e da determinao das indenizaes monetrias.2 Hoje,

    verifica-se uma verdadeira alterao de paradigma, notadamente a partir do

    incio da dcada de 60 do sculo 20, com a expanso da Anlise Econmica

    do Direito tanto a reas mais tradicionais (tais como propriedade, contratos

    e direito constitucional) quanto, paulatinamente, a reas no to usuais em

    um primeiro momento, como no auxlio explicao da escolha do indivduo

    em casar-se e divorciar-se.

    Conforme Ivo Gico Jr., a abordagem econmica serve para compre-

    ender toda e qualquer deciso individual ou coletiva que verse sobre recursos

    escassos, seja ela tomada no mbito do mercado ou no.3 Tendo-se a eco-

    nomia, pois, como a cincia que estuda como os indivduos, portadores de

    suas prprias preferncias, se comportam para maximizar seu bem-estar em

    um mundo no qual os recursos so escassos, a Anlise Econmica do Direito

    objetiva empregar seus ferramentais tericos a fim de balizar e sofisticar as

    normas jurdicas, provendo uma explicao cientfica s consequncias na

    incidncia normativa do comportamento dos agentes racionais.

    2 Cooter, Robert; Ullen, Thomas. Direito e economia. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2010. p. 23.

    3 Gico Junior, Ivo. Introduo ao Direito e Economia. In: Timm, Luciano Benetti (Org.). Direito e economia no Brasil. So Paulo: Atlas, 2012. p. 13.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    70ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    Parte tal Cincia da premissa de que os indivduos buscam seus objetivos

    a partir da escolha de determinadas formas de atuao, fenmeno nominado de

    racionalidade.4 Desta forma, e considerando que o casamento, a eleio do

    regime de bens conjugal e a sua alterao tratam de escolhas racionais tomadas

    pelos indivduos, que buscam, assim, maximizar sua utilidade a partir do enlace

    conjugal, muito tem a Law and Economics a contribuir no presente contexto.

    2 EXISTNCIA E OPERACIONALIZAO DO MERCADO MATRIMONIAL

    Foi no incio dos anos 70, tendo como precursor o economista Gary

    Becker, que se passou a analisar a famlia, sob a perspectiva econmica, como

    mais uma ferramenta aplicvel anlise de seu processo de formao e dis-

    soluo. Becker afirma que a teoria econmica deve contemplar o estudo de

    todo comportamento humano direcionado obteno de recursos escassos,

    no se cingindo, unicamente, a aspectos de natureza monetria. Segundo ele,

    a aplicao da teoria econmica ao casamento e ao divrcio contribui para

    a explicao de fenmenos, tais como taxas de nascimento e de crescimento

    populacional, participao das mulheres no mercado de trabalho, diferena de

    salrios entre consortes e companheiros, anlise de rendimentos da populao,

    dentre demais questes afetas ao desenvolvimento piramidal e estrutural de

    uma sociedade.5

    Para Becker, duas so as premissas das quais se deve partir para a

    anlise econmica do casamento: i) como ato voluntrio que , um indivduo

    somente vir a se casar se o nvel esperado de utilidade obtida a partir da

    formao da unio vier a superar aquela operada caso permanea solteiro;

    ii) verificando-se que homens e mulheres solteiros competem, entre si, na

    busca do parceiro adequado, detectvel a existncia do chamado mercado

    de casamento, no qual cada indivduo busca o melhor cnjuge, enfrentando,

    4 Friedman, David D. Price Theory. Chicago: South-Western Publishing Co.,1986. p. 2.5 Ibidem, p. 205.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    71Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    para tanto, as restries inerentes ao mercado matrimonial. Ademais, a anlise

    econmica da famlia parte tambm da premissa de que as preferncias dos

    indivduos raramente alteram-se em curto perodo de tempo, caracterizando-

    -se o mercado matrimonial como relativamente equilibrado no que tange s

    preferncias nele manifestadas, o que vem, assim, a facilitar seu estudo sob

    o enfoque econmico.6

    A primeira das premissas supra justifica, por exemplo, o porqu da

    preferncia, por parte de alguns, em jamais se casar.7 Infere-se de tal pre-

    suno que indivduos solteiros consideram o nvel de produo individual

    excedente quele resultante de unio com parceiro(a). Do mesmo modo,

    a segunda premissa autoriza a concluso de que h intangvel diviso no

    mercado entre aqueles j satisfeitos com o nvel de produo atingido com

    outrem (ou mesmo individualmente) daqueles ainda na busca do parceiro

    que venha a maximizar seus anseios materiais e imateriais. Sendo assim,

    a busca, no mercado, por novos parceiros, dar-se- tanto no perodo que

    antecede ao matrimnio como tambm na prpria constncia do casa-

    mento, sempre que o emprego de custos marginais na busca por um novo

    parceiro (que venha a melhor maximizar a utilidade esperada) no venha

    a superar os benefcios oriundos da relao matrimonial em vigor.

    A relevncia do estudo de uma anlise econmica do casamento re-

    pousa no fato de que sua ocorrncia irradia efeitos no bem-estar e utilidade

    dos indivduos, gerando custos queles interessados em sua consecuo. Para

    Bryant, so duas as espcies de custos a serem arcados pelos indivduos neste

    6 Ibidem, p. 206.7 Destaca-se que, no Brasil, em 2010, foram registrados 977.620 casamentos, havendo um

    incremento de 4,5% no total de registros de casamentos em relao ao ano de 2009. Desse total, 958 253 foram de cnjuges de 15 anos ou mais de idade e ocorridos e registrados no ano de referncia da pesquisa. Esse resultado fez com que a taxa de nupcialidade legal se elevasse em relao ao ano de 2009, atingindo o valor de 6,6 casamentos para 1.000 habitantes de 15 anos ou mais de idade (Brasil. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IBGE. Disponvel em: . Acesso em: 20 dez. 2012.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    72ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    contexto especfico: custos de transao e custos de perda. Os primeiros tra-

    tam de custos atinentes ao prprio ato do matrimnio, tais como custos com

    o procedimento de habilitao matrimonial das partes em cartrio, custos

    com a cerimnia, com honorrios de advogados que venham a prestar prvia

    consultoria, dentre outros mais vinculados prtica da celebrao do ato ma-

    trimonial em si. Paralelamente, custos de perda so atinentes aos benefcios

    abdicados pelas partes em prol do matrimnio (tais como aqueles gozados na

    condio de solteiras, e que variam entre os indivduos de acordo com seus

    costumes e valores).

    Os custos relativos s tomadas de deciso, perda de independncia,

    de oportunidade (posto que, a partir da escolha racional pelo matrimnio,

    oportunidades so perdidas) e respectivos ao prprio risco assumido de no

    se obter os bens e servios que satisfaam a preferncia dos cnjuges na cons-

    tncia matrimonial, so exemplos de custos de perda a serem sopesados aos

    benefcios esperados com a unio.8

    Nesta perspectiva, veja-se que o reconhecimento jurdico conferido s

    unies informais representa um redutor de custos de transao arcado por

    parte de um casal na busca de proteo jurdica a sua entidade familiar, afinal,

    enquanto ao matrimnio indispensvel a observncia das formalidades de

    habilitao ao ato (as quais impem custos monetrios aos nubentes), para

    a caracterizao de uma unio estvel basta a presena dos requisitos de

    publicidade, continuidade, notoriedade e inteno de constituio de fam-

    lia (segundo a legislao brasileira em vigor). Ratificando tal compreenso,

    vejamos que, no Brasil, o Censo 2010 apurou expressivo aumento nas unies

    consensuais em uma dcada (de 28,6% para 36,4%). Ainda, restou contabi-

    lizada a reduo no nmero de casamentos, de 49,4% para 42,9%, de 2000 a

    8 Balninotto Neto, Gicomo. A Teoria Econmica do Casamento e do Divrcio. In: Revista da Faculdade de Cincias Econmicas UFRGS Anlise Econmica, Porto Alegre, RS, n. 18, p. 125-41, set. 1992.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    73Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    2010. Os dados apontados demonstram a preferncia, por parte da popula-o, em no se casar devido aos custos de transao nsitos celebrao do contrato matrimonial.

    Nesse mesmo contexto, h ainda os custos inerentes busca do parceiro no mercado matrimonial, os quais sero oportunamente analisados quando da abordagem da teoria da sinalizao aplicada ao mercado matrimonial.

    Tendo-se o potencial de maximizar a utilidade como vetor escolha do parceiro ou mantena do status de solteiro, associa-se ser maior a utilidade quanto mais qualitativa a produo de filhos, prestgio, patrimnio, lazer, amor, companhia, vida sexual regular, status social e prazer a dois. Pode-se afirmar, portanto, que a famlia equiparvel a uma empresa, cujos insumos geraro produtos de maior ou menor valia na sociedade ante uma anlise da qualidade e quantidade da produo obtida.9

    Referentemente importncia dos filhos quando da opo pelo matri-mnio, cabe a transcrio das assertivas de Becker:

    A explicao para o casamento entre homens e mulheres repousa no desejo de produo de filhos e na atrao emocional existente entre os sexos. Nada distingue melhor sua produo familiar dos solteiros ou daqueles membros do mesmo sexo do que a presena, mesmo que indiretamente, dos filhos. Gratificao sexual, limpeza, alimentao e outros servios podem ser comprados, mas no filhos: o homem e a mulher so necessrios para produzir os seus prprios filhos e, talvez, para cri-los10 [Traduo nossa].

    9 Becker, Gary Stanley. The Economic Approach to Human Behavior. Chicago: The University Of Chicago, 1976. p. 207-208.

    10 The obvious explanation for marriages between man and woman lies in the desire to raise own children and the physical ans emotional attraction between sexes. Nothing distinguishes married households more from single households or from those with several members of the same sex than the presence, even indirectly, of children. Sexual gratification, cleaning, feeding, and other services can be purchased, but not own children: both the man and woman are required to produce their own children and perhaps to raise them. Becker, Gary Stanley. The Economic Approach to Human Behavior. Chicago: The University Of Chicago, 1976. p. 210

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    74ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    No Brasil, dados estatsticos apurados pelo Censo 2010, do Instituto

    Brasileiro de Geografia e Estatstica (IBGE), revelam significativa queda de

    fecundidade. Enquanto no ano 2000 o nmero mdio de filhos nascidos vivos

    por mulher ao final de seu perodo frtil era equivalente a 2,38 filhos, no ano

    2010 o nmero apurado foi 1,86 filhos, abaixo da taxa de reposio da popu-

    lao, que de 2,1 o que acelera o envelhecimento mdio dos brasileiros.11

    Informaes obtidas tambm junto ao IBGE confirmam que o recuo

    na fecundidade ocorre, principalmente, entre casais com maior nvel de esco-

    laridade e de rendimento, o que leva a concluir que h uma atual e paulatina

    tendncia de substituio da opo de criar filhos por um incremento na renda

    conjugal, contexto no qual o casal passa mais tempo dedicado ao trabalho do

    que ao prprio lar.

    Gicomo Balbinotto Neto explica que, enquanto a produo de

    mercado o tempo gasto no mercado de trabalho, ganhando-se um salrio

    que pode ser usado na compra de bens de mercado (como um almoo no

    restaurante), a produo domstica (Home Production) do tempo gasto

    em casa quando os agentes utilizam bens de mercado para produo do

    produto final. Refere que o maior problema atinente unidade familiar

    alocar, de forma tima, o tempo dispendido no mercado de trabalho e na

    produo familiar, de modo a dividir as funes de produo de acordo

    com as habilidades dos membros da famlia.12

    Com efeito, a diviso tima de tarefas mais complexa na famlia

    atual, na qual a mulher passou a integrar o mercado laboral e a assumir

    tarefas outrora atribudas exclusivamente aos homens. A despeito de tais

    mudanas, todavia, a dinmica prevalece a mesma: as mulheres so mais

    devotas ao lar do que os homens devido existente discriminao por

    11 Informaes disponveis em: . Acesso em: 7 nov. 2012.

    12 Balbinotto Neto, Gicomo. Notas de aula. Disponvel em: . Acesso em: 21 mar. 2013.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    75Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    gneros no mercado de trabalho. Ainda, questes de cunho biolgico

    apontam ser maior a ligao entre a mulher e a prole, o que tambm

    contribui neste sentido.13

    Desta forma, sob a perspectiva econmica, uma produo familiar

    eficiente requer especializao em distintas tarefas por parte de seus membros,

    de acordo com suas efetivas aptides e habilidades. Os ganhos (benefcios)

    oriundos de tal organizao em subtarefas especficas sero diretamente

    proporcionais qualidade de suas interaes e integrao, citando-se, como

    exemplo, a alocao de tempo em atividades como trabalho, cuidados com

    o lar e com a prole. Quanto mais eficiente a produo familiar, portanto,

    maior ser o nvel de utilidade resultante do matrimnio, dado que maior o

    excedente de produo (benefcios a serem entre todos divididos).

    3 A TEORIA DA SINALIZAO E O MERCADO MATRIMONIAL

    A procura pelo cnjuge no mercado de casamento reveste-se de ca-

    ractersticas econmicas, haja vista demandar a utilizao de determinados

    recursos para obteno de informaes sobre o provvel parceiro. Muitas so,

    portanto, as contribuies da cincia econmica para uma apurada anlise do

    processo de formao da sociedade conjugal.

    Michael Spence14 consagrou a Teoria da Sinalizao sob a tica do

    mercado de trabalho ao sustentar que as informaes atinentes aos candidatos

    s vagas de emprego dificilmente chegam ao conhecimento do empregador

    com facilidade, o que lhes obriga a embasar a escolha em caractersticas tidas

    como pr-requisitos (por exemplo, nvel de instruo ou educao visado),

    13 Posner, Richard. Economic Analysis of Law. 17th edition. New York: Aspen Pub, 2007. p.144.

    14 Spence foi ganhador do Prmio Nobel de Economia (2001) por seus trabalhos no campo da economia da informao moderna e por suas pesquisas sobre mercados com assimetria de informao, dividido com outros dois economistas estadunidenses, George Akerlof e Joseph Stiglitz

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    76ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    hbeis a sinalizar quais os atributos presentes no candidato so aqueles por si

    valorizados. Refere o autor que algumas caractersticas inerentes aos candi-

    datos a vagas de emprego so imutveis, involuntrias tais como raa, sexo e

    idade , enquanto outras so manipulveis pelos indivduos como educao,

    currculo, apresentao , atribuindo s primeiras a nomenclatura de ndices

    e, s segundas, a de sinais.15

    Para a teoria econmica, a anlise da sinalizao de maior relevn-

    cia, uma vez que sinais emitidos pelos indivduos so ajustveis e amoldveis,

    alterando-se de acordo com especficos investimentos em custos de sinaliza-

    o. A escolha em investir nos almejados sinais intenta maximizar a utilidade

    esperada, posto que o emitente ver-se- ostentando, no mercado desejado,

    caractersticas que lhe convm por alguma razo especfica. Segundo Spence,

    uma dinmica sinalizadora equilibrada aquela na qual as crenas desenvol-

    vidas pelos partcipes relativamente aos sinais indicadores das caractersticas

    (no exemplo, relativamente produtividade dos candidatos) so confirmadas,

    e tal, decorrentemente, induz as partes a investir em tais espcies de sinais

    como um verdadeiro ciclo.

    A escolha, por parte dos indivduos, dos adequados sinais a serem emiti-

    dos, resulta de um processo gradual de observncia queles que, efetivamente,

    logrem distinguir portadores de certas habilidades, caractersticas, expectativas

    e personalidade daqueles que no as possuem, o que gerar a credibilidade

    necessria sinalizao em cada contexto. Neste sentido, Molho, utilizando-

    -se tambm do mercado laboral como exemplo, ilustra a teoria da sinalizao

    (alicerado no pioneiro trabalho desenvolvido por Michael Spence). Vejamos

    as assertivas de Molho:

    Por que nem todos os candidatos a emprego investem em educao no mesmo nvel, a fim de receberem todos ofertas de emprego bem pagas? A resposta a esta pergunta, e a razo pela qual a educao como um sinal

    15 Spence, Michael. Job Market Signaling. The Quartely Journal of Economics, v. 87, Issue 3, p. 357, ago. 1973.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    77Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    pode funcionar, encontra-se na premissa de que h custos envolvidos na sinalizao que so maiores para os candidatos de baixa capacidade. (Isso pode ser porque mais difcil, em algum sentido, para as pessoas de baixa capacidade atingirem o nvel adequado na educao, por exemplo). Como resultado, os candidatos de baixa capacidade podem ser dissuadidos de investir na educao (...). A presena de diferenas nos custos de sinalizao para os trabalhadores de distintas qualidades d credibilidade ao sinal da educao. Assim, pode a sinalizao ser-vir para gerar informaes para os empregadores, como um processo endgeno do mercado16 [Traduo nossa].

    Vejamos, assim, que, sob a tica da Anlise Econmica do Direito, o

    processo de escolha do parceiro adequado no aleatrio, mas sim ancorado

    na interpretao de sinais emitidos pelas partes com um mesmo objetivo, qual

    seja: maximizao de sua utilidade e renda. Os custos de sinalizao, neste

    mbito, tratam de investimentos em educao, aparncia, higiene, sade

    fsica, profisso (incremento de currculo), beleza, vesturio, viagens,

    bons restaurantes, dentre alternativas outras que efetivamente reflitam as

    prioridades do indivduo quanto quilo que pretende expor sobre si, bem

    como um facilitador para que tambm encontre os parceiros a si ideais no

    mercado do casamento. Tais sinais ho que portar credibilidade quanto

    imagem que se intenta projetar no mercado conjugal, de modo que creia,

    o emitente, que a interpretao surtir o resultado perseguido: agregar

    como candidatos s npcias os parceiros que valorizem tais caractersticas

    devidamente sinalizadas.17

    16 Why dont all the job applicants invest in education to the level required in order to get well pais job offers? The answer to this question, and the reason why education signal might work, lies in the premise that there are costs involved in signaling which are greater for the low ability applicants. (This might be because it is harder in some sense for low ability people to make the grade in education, for example). As a result, low ability applicants may be deterred from investing in education ( ). The presence of differences in signaling costs for workers of different quality makes the signal of education potentially credible. Thus signaling behavior may serve to generate information for employers as an endouge-nous market process. Molho, Ian. The Economics of Information Lying and Cheating in Markets and Organizations. USA: Blackwell Publishers, 1997. p. 63.

    17 Becker, Gary Stanley. Tratado Sobre La Familia. Madrid: Alianza, 1987. p. 287.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    78ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    O economista Pery Shikida desenvolveu estudo de carter eminen-

    temente exploratrio, alicerado em informaes fornecidas por anncios

    feitos no Jornal Folha de So Paulo (intitulados homem procura mulher

    e mulher procura homem) no perodo compreendido entre 5/1/1997 e

    30/3/1997. O trabalho aponta ser maior o anseio masculino em informar

    a sua provvel parceira sua formao profissional e situao financeira,

    ainda que a mulher, mais que o homem, demanda do provvel parceiro

    situaes profissional e financeira definidas. Concernentemente faixa

    etria, cor da pele e estado civil, evidenciou-se que as mulheres geral-

    mente preferem homem de idade igual ou superior a sua, enquanto os

    homens, na maioria das vezes, preferem mulheres mais novas. Tambm,

    no que se refere idade, o estudo apontou maior concentrao nos ca-

    sos de faixa etria compreendida entre 31 a 39 anos, bem como maior

    propenso dos solteiros a declararem seu estado civil. Relativamente

    cor da pele, aferiu-se que morenos e brancos, e morenas e brancas,

    foram, dentre os que optaram por declarar a cor da pele, os que mais

    apareceram.18

    , assim, o estgio que precede ao casamento o momento ideal para

    que custos de informao quanto ao parceiro e suas reais expectativas de

    uma vida a dois sejam empregados, a fim de que se evite eventual compli-

    cao futura de assimetria informativa, originada na fase pr-contratual.

    Pode-se afirmar que quanto maior o dispndio de tempo (custo) junto

    ao parceiro, mais facilmente averiguar-se- a compatibilidade de suas

    caractersticas com aquelas almejadas. A conjuntura de todas as espcies

    de traos buscados no companheiro so o parmetro para se aferir a capa-

    18 Shikida, P. F. A. A. A economia e a formao de casais: evidncias empricas sobre anun-ciantes que procuram parceiros (as). Tempo da Cincia Revista de Cincias Sociais e Humanas, Cascavel (PR), v. 5, n. 9, p. 89-98, jan./jun. 1998.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    79Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    cidade de este somar utilidade produo j existente ou, a longo prazo,

    reduzi-la. justamente o potencial de maximizar o elemento empregado

    na busca como o principal norteador na procura do parceiro conjugal.19

    De acordo com Fernando Arajo:

    (...) o processo de recolha da informao prvia celebrao do contrato

    complexo mas da maior relevncia, sendo que muita da assimetria

    informativa que se verifica no contrato pode ser o resultado de decises

    tomadas no momento da recolha de informao, decises de inacaba-

    mento desse processo ainda que, no caso do contrato, esse inacabamen-

    to informativo, quando detectado pela parte fragilizada por ele, possa

    ser remediado pela abertura renegociao, ou at mais singelamente

    possa ser mitigado pela obteno de informao suplementar.20

    Neste norte, quanto maior o nvel de exigncia das partes, mais tempo

    e recursos sero gastos na busca do cnjuge ideal(izado).

    O contrato matrimonial, em si, tambm funciona como um sina-

    lizador em muitos aspectos. A comear, trata de natural indicador de

    comprometimento e de desejo de mantena de uma consistente relao. A

    pessoa casada sinaliza para a sociedade estar sexualmente indisponvel e

    afetivamente bem-resolvida. Segundo Robert Rowthorn, o cnjuge sinaliza

    comunidade seu estado positivo de sade, confiabilidade, estabilidade

    emocional e ambio, o que lhe gera benefcios exteriores nos mbitos

    laboral, familiar e social.21

    19 Posner, Richard. Economic Analysis of Law. 17th edition. New York: Aspen Pub, 2007. p.147.

    20 Arajo, Fernando. Teoria econmica do contrato. Lisboa: Almedina, 2007. p. 282.21 Rowthorn, Robert. Marriage as a signal. In: Dnes, Antony W.; Wowthorn, Robert (Edit.).

    The Law and Economics of Marriage and Divorce. Cambridge: Cambridge Press, 2002. p. 132-157.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    80ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    Vale referir que, atualmente, e na maioria das sociedades, no mais

    a sinalizao de tais caractersticas depende exclusivamente de um contra-

    to matrimonial, que forma menos onerosa na consecuo do objetivo de

    sinalizarem-se as mesmas caractersticas: famlia originada na unio estvel.

    Tambm verdade, todavia, que no para todos que a ausncia de um

    especfico contrato matrimonial garantir o mesmo nvel de comprometimento

    perante dada sociedade (ou mesmo perante a si e famlia, tendo-se em vista a

    heterogeneidade cultural e intergeracional) e de que a unio estvel em nada

    altera o estado civil do indivduo, que permanece sendo civilmente solteiro,

    sem gozar desse especfico efeito pessoal e social do matrimnio (alterao

    do estado civil). Assim, embora seja possvel, hoje, prover-se reconhecimento

    jurdico s mais variadas e distintas formas de famlia, a entidade matrimonial

    ainda vem a atuar como sinalizador a melhor maximizar o comprometimento

    objetivado pelos partcipes da relao conjugal.

    4 A ESCOLHA DO REGIME DE BENS SOB A TICA DA LAW AND ECONOMICS

    Trata o pacto antenupcial do instrumento a partir do qual os nubentes

    elegem e regulamentam a incidncia do regime de bens que vingar no curso

    da unio conjugal, bem como demais questes de natureza substancialmente

    patrimonial. No Brasil, sua ausncia redunda na incidncia do regime legal de

    bens, qual seja, o da comunho parcial. Intentar-se- abordar a contribuio da

    Law and Economics na explicao da escolha de um regime matrimonial por

    parte dos indivduos, buscando delinear as principais hipteses que suscitam

    distintas opes, bem como demonstrar, precipuamente, as contribuies da

    aplicabilidade da Teoria da Sinalizao tambm na etapa da eleio do regime

    matrimonial de bens.

    Para a cincia econmica, o pacto antenupcial pode ser visto como um

    acordo que busca reduzir os custos financeiros atribudos ao divrcio a partir

    de um planejamento dos consortes quanto ao desfecho de seus projetos con-

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    81Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    juntos, tendo em vista que nem sempre as normas jurdicas geram, por si s,

    uma deciso efetivamente eficiente s partes. Assim sendo, pode ser o contrato

    pr-matrimonial reputado como um redutor de nmero de decises judiciais

    ineficientes, prezando pela coerncia entre a alocao dos investimentos

    conjugais e o projeto dos cnjuges.22

    No cenrio de escolha das clusulas constantes do pacto antenupcial

    sejam elas relativas eleio de um regime de bens, ou a formularem um regime

    misto, cuja confeco requer maior sofisticao e detalhamento o que

    tambm pouco estudado so as variveis psicolgicas passveis de interferir

    de forma altamente significativa no processo de negociao do instrumento

    pr-nupcial.23

    Para Margulies mediador especializado em divrcio dos Estados Uni-

    dos , dentre os grandes percalos enfrentados pelas partes no momento da

    escolha do regime encontram-se as proposies emocionais que este propaga

    em um relacionamento afetivo, passveis de afetar o matrimnio de forma a

    impedi-lo de ser concretizado. Para ilustrar suas convices, o especialista narra

    um caso do qual participou, quando, enquanto o advogado do noivo sugeria

    ao casal clusulas que protegessem meticulosamente todos os interesses do

    varo, a noiva via a relao deteriorar-se ante a vulnerabilidade emocional que

    lhe tomava conta, sentindo-se desprotegida e injustiada. No caso em questo,

    as clusulas formuladas pelo varo (tais como a que impunha a separao

    total dos bens adquiridos no curso conjugal e a que manifesta a renncia do

    cnjuge mulher em receber alimentos na eventualidade do divrcio) foram

    interpretadas pela noiva como uma mensagem de falta de credibilidade do

    noivo na comunho, de modo que, somente aps inmeras e desgastantes

    brigas e tratativas, obtiveram um acordo.24

    22 Mahar, Heather. Why There Are So Few Prenuptial Agreements? Disponvel em: . Acesso em: 15 mar. 2012.

    23 Margulies, Sam. The Psycology of Prenuptial Agreements. HeinOnline 31 J. Psychiatry & L. 2003. p. 415.

    24 Margulies, loc. cit.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    82ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    Embora seja verdade que o amor romntico possa no ser sinnimo

    de formulao de um contrato antenupcial, ignorar a alternativa pode acarre-

    tar prejuzos irreparveis s partes, notadamente quando este no atenda da

    melhor forma os interesses patrimoniais envolvidos. E, nesse contexto, muito

    a Teoria da Sinalizao tem a esclarecer.

    irrefutvel que as tratativas negociais de natureza patrimonial que

    antecedem o matrimnio propiciam compreenses recprocas s partes quanto

    personalidade e expectativas dos companheiros. Assim, enquanto a Psico-

    logia atrela-se aos sentimentos despertados nas partes a partir da discusso

    quanto ao regime a ser eleito, a anlise econmica investiga o conjunto de

    fatores que, somados, fazem com que os indivduos inclinem-se, racionalmente,

    para a escolha de um ou outro regime de bens, provendo explicao lgica

    s principais hipteses e perfis de nubentes que optam por lanar mo do

    pacto antenupcial (ou seja, no Brasil, de todo e qualquer regime distinto do

    da comunho parcial de bens).

    A despeito de fato que, em alguns casos, tal espcie de contrato possa

    sinalizar inseguranas ou desconfianas imbudas na relao vindo, muitas

    vezes, a faz-la fenecer , os aspectos positivos predominam, uma vez que a

    discusso quanto aos investimentos a serem empregados na vigncia do con-

    trato de casamento acaba por esclarecer importantes traos de personalidade

    do parceiro, tais como se este generoso, egosta ou demais caractersticas

    que derradeiramente acabariam a ser reveladas na fase do divrcio, ou mesmo

    no curso do matrimnio.25

    A opinio do parceiro quanto ao adequado regime de bens capaz,

    portanto, de atuar como um efetivo emissor de sinais quanto a traos do

    companheiro, outrora ocultos. Desta forma, pode-se inferir que atua o contrato

    25 Sion, Michael. Money And Marriage: How to Choose a Financially Compatible Spouse. Disponvel em: . Acesso em: 9 mar. 2012.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    83Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    antenupcial como uma espcie de redutor de custos de informao, haja vista

    que antecipa reaes e revelaes de dados que possivelmente somente seriam

    aventados no momento do divrcio.

    Para Michael Sion, ainda alm de clarear reais interesses e aproximar

    (ou distanciar) os nubentes, em um mundo legalmente perfeito, as pessoas

    analisariam seus contratos antenupciais a cada cinco anos e verificariam se

    seria ou no necessrio ajust-lo.26 Atentemos que, no Brasil, toda e qualquer

    tomada de deciso por alterao do regime de bens matrimoniais vigente ne-

    cessita, imperiosamente, perpassar pelo crivo jurisdicional, mediante pedido

    a ser fundamentado ao juiz. Desta forma, sucessivas revises no contrato

    antenupcial, realizadas em curtos perodos de tempo, deparar-se-iam com

    entraves junto ao Poder Judicirio, cujas aes tramitam de forma, muitas

    vezes, morosa ou custosa s partes.

    Segundo Erika Haupt, so sete os principais perfis de casais que buscam

    um detalhado pacto antenupcial, divididos entre si em trs grupos. Primeiro,

    atribui a incidncia do instrumento a casais jovens ou que estejam em seu

    primeiro matrimnio. Neste perfil, so trs as possibilidades. A comear pelo

    casal profissional, que geralmente no planeja ter filhos e que privilegia a

    proteo de recursos acumulados a partir do desenvolvimento de suas carreiras,

    claramente indesejando a interseco entre suas vidas social e afetiva com a

    profissional e patrimonial. Ainda, neste caso resta claro que no pretendem

    os nubentes verem-se responsveis por pagamento de penso alimentcia ao

    parceiro no advento do divrcio. No mesmo grupo, esto os casais nos quais

    uma das partes arca com todos os custos de formao profissional do parceiro,

    de modo que geralmente estabelecem um quantum a ser pago quele que

    empregou recursos na formao do cnjuge, como uma espcie de indeni-

    zao. Por fim, aqueles casais jovens, porm preocupados com as dvidas ou

    26 Sion, Michael. Money and Marriage: How to Choose a Financially Compatible Spouse. Disponvel em: . Acesso em: 9 mar. 2012.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    84ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    mesmo com o potencial de acumulao de dvidas por parte do parceiro, e que

    buscam proteo contratual para que estas no se comuniquem na ocorrncia

    de divrcio.27

    Verifica-se que, no Brasil, as solues cabveis s hipteses anteriores

    seriam (a ttulo de mera sugesto) a estipulao do regime de separao de

    bens aos casais profissionais e queles detidos na preocupao quanto aos

    dbitos do consorte. No que diz respeito aos casais nos quais uma das partes

    custeia a formao profissional do parceiro, interessante seria que versasse o

    pacto acerca de tal realidade, prevendo, assim, uma espcie de indenizao

    associada renda do ex-estudante, porm que se reduzisse de forma propor-

    cional durabilidade do enlace conjugal.

    Em um segundo grupo encontra-se o perfil de casais mais velhos ou que

    estejam em um segundo casamento. Relativamente aos casais mais velhos e

    com filhos j independentes financeiramente, a autora reputa ser mais comum

    a eleio de um regime em que, na ocorrncia de divrcio, nada se comunique,

    porm o oposto ocorrendo se, casados, um venha a falecer, quando ento

    herdar os bens do consorte. Ainda, para casais em segundas npcias e com

    filhos ainda menores e dependentes, considera adequada uma escolha que lhes

    assegure no estarem incorrendo nos mesmos erros do primeiro matrimnio,

    de modo que sinteticamente a comunicabilidade patrimonial ou mesmo a

    obrigatoriedade de prestao de alimentos majore-se gradativamente a cada

    ano de sucesso da relao, alterando-se o regime com o passar do tempo.28

    No Brasil, o primeiro caso seria hiptese de eleio de regime de

    separao convencional de bens, mesmo que as partes tenham mais de 70

    anos de idade (a partir de quando o regime de bens arbitrariamente o da

    separao obrigatria de bens), haja vista a existncia de Smula (de n. 377)

    27 Haupt, Erika L. For Better, For Worse, For Richer, For Poorer: Premarital Agreement Case Studies. HeinOnline 37 Real Prop. & Tr. J., v. 2002-2003. p. 29.

    28 Haupt, Erika L. For Better, For Worse, For Richer, For Poorer: Premarital Agreement Case Studies. HeinOnline 37 Real Prop. & Tr. J. 2002-2003. p. 29.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    85Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    que prev, mesmo assim, a comunicabilidade daqueles bens adquiridos na

    constncia matrimonial. J aos casais em segundas npcias e cautelosos, com

    intuito de proteger o patrimnio amealhado at ento, e ainda aquele que

    vir a se transformar, a eleio de um regime misto seria alternativa hbil

    a promover os cuidados desejados, de modo que o envolvimento patrimonial

    das partes condicionasse extenso e consistncia da unio.

    verdade tambm que nubentes em segundas npcias revelam-se

    mais temerosos quanto s decorrncias patrimoniais da unio, seja por terem

    j vivenciado a falncia de uma relao afetiva (conhecedores, pois, de muitos

    de seus efeitos patrimoniais), seja por visarem a somente beneficiar os filhos

    com os bens j adquiridos, como recorrentes causas, conforme expe William

    Cantwell:

    Vrias preocupaes, fruto de um casamento anterior, podem fazer com

    que as partes busquem um pacto antenupcial. Pode haver filhos. (...)

    Pode haver negcios, heranas, graus e prticas profissionais. Se ambas

    as partes forem divorciadas, provavelmente haver um forte desejo de

    explorarem as possibilidades de contratao em um pacto antenupcial.

    Isso geralmente ocorre independentemente de pensam que seu divrcio

    foi uma vitria, uma derrota ou um empate29 [Traduo nossa].

    Por fim, um ltimo agrupamento de indivduos com perfil a contratantes

    de pacto antenupcial diz respeito queles que possuam prsperos negcios

    (empresas) familiares ou que venham a receber, futuramente, expressivos bens

    em herana. E comum que neste cenrio os parentes do nubente com maior

    29 Various concerns may compel parties to seek an antenuptial contract from a prior marriage. There may be children ().There may be business, inheritances, professional degrees and practices. If both parties have been divorced there probably is a strong desire to explore contracting possibilities. This will usually be true whether they think that their divorce was a win, a loss or a draw. Cantwell, William P. Premarital Contracting: Why and When. HeinOnline 8 J. Am. Acad. Matrimonial Law. 1992. p. 45.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    86ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    patrimnio familiar sugiram a eleio de algum regime que proteja o parente-

    -scio de eventuais e futuras divises de lucros, cotas sociais empresariais ou

    acrscimos patrimoniais.

    No dificilmente, tal postura vem a emitir sinais ao outro nubente no

    sentido de que a famlia e/ou o noivo(a) no creem na durabilidade da relao,

    fazendo com que o emocional sobreponha-se razo no momento da eleio

    do regime. Ocorre que isto pode gerar prejuzos a uma escolha ancorada em

    uma efetiva observncia realidade patrimonial dos indivduos, ou seja, em

    suas reais necessidades e pretenses de gesto patrimonial.

    Muito embora as idiossincrasias das partes e familiares influenciem

    no momento da eleio do regime de bens, com efeito que, quanto maior a

    discrepncia de riqueza entre os nubentes, mais fcil ser prever quais as clu-

    sulas a serem formuladas em tal contrato, quando uma delas assume posio

    de poder e a outra de vulnerabilidade. E o oposto tambm verdade,

    uma vez que, quanto mais equiparada a renda dos nubentes, maior o rol de

    alternativas a serem cogitadas no momento do acordo.30

    Dois so os principais fenmenos atribudos pouca utilizao do

    instrumento antenupcial nos Estados Unidos, quais sejam: pouco valor atri-

    budo ao pacto (decorrente da ignorncia quanto as suas funcionalidades) e

    subestimao, pelos agentes, da real probabilidade do divrcio.31

    Por outro lado, custos de informao relativos ao amplo rol de possi-

    bilidades de contedo a ser inserido no pacto antenupcial associados a sua

    pouca divulgao na sociedade muitas vezes frustram sua confeco. A fim

    de obter-se correto conhecimento jurdico-legal, consultas com advogados

    30 Cantwell, William P. Premarital Contracting: Why and When. HeinOnline 8 J. Am. Acad. Matrimonial Law. 1992, p. 45.

    31 Mahar, Heather. Why There Are So Few Prenuptial Agreements? Disponvel em: . Acesso em: 15 mar. 2012.

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    87Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    especializados no ramo so alternativas positivas alocao eficiente dos bens

    e dos interesses das partes, vindo a reduzir os custos de transao atinentes

    ao divrcio.

    Restou claro, ainda, em dita pesquisa, que a inclinao dos indivduos

    a serem otimistas (no sentido da crena de o divrcio dificilmente ocorrer)

    fator que proscreve a curiosidade pelo conhecimento da relevncia jurdica do

    instrumento, vindo a perpetuar a ignorncia quanto a sua eficcia e possveis

    benefcios.32

    Por fim, a crena de que o instrumento irradia sinais negativos quan-

    to s perspectivas de xito da relao dificulta uma considerao acerca de

    seus benefcios. Neste mbito, h os sinais de primeira-ordem, relativos

    atribuio do pacto falta de confiana na relao, ou seja, ao aumento das

    chances do divrcio e contrrio comunho de vidas que deve permear uma

    sociedade conjugal. J os sinais de segunda-ordem referem-se aos prprios

    termos do acordo, quando um dos nubentes, observando as proposies do

    companheiro, refora a crena nos sinais de primeira-ordem.33

    Do ora exposto, infere-se que, a despeito da constatada existncia de

    determinados perfis de casais que cada vez mais lanam mo do pacto antenup-

    cial, seu pouco uso pode ser atribudo ao negativismo que o pacto antenupcial

    incita em uma relao afetiva, sendo ainda facilmente interpretado como um

    estereotipado sinalizador de descrena das partes (ou de apena uma delas) na

    unio conjugal, deflagrando sentimentos passveis de faz-la fracassar antes

    mesmo de vir a formalmente existir.

    Aliadamente a isto, tambm a ignorncia dos indivduos quanto

    s reais chances de o divrcio vir a ocorrer e a ausncia de conhecimento

    quanto aos vastos benefcios oriundos do instrumento quando manejados

    32 Mahar, loc. cit.33 Mahar, loc. cit.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    88ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    adequadamente pelas partes, preferencialmente assessoradas por profissio-

    nais conhecedores do tema redundam em sua pouca incidncia prtica no

    Brasil e no mundo.

    5 CONCLUSO

    A aplicao do ferramental da Anlise Econmica do Direito revela-se

    um mtodo extremamente til compreenso dos fenmenos da escolha do

    consorte, do regime de bens e dos custos e benefcios inerentes unio conjugal.

    A anlise econmica da famlia que teve como principal precursor

    o economista Gary Becker parte do pressuposto de que existe um mercado

    matrimonial no qual os agentes formam pares, entre si, buscando maximizar

    sua utilidade, e enfrentando, para tal, as restries de recursos que se faam

    presentes. Pode a anlise econmica do casamento ser considerada um (ainda)

    novo campo de estudo para a Anlise Econmica do Direito, distinto daqueles

    mais tradicionais, tais como direito de propriedade e direito contratual.

    Sob este enfoque, verificou-se que a Teoria da Sinalizao auxilia na

    explicao dos processos de escolha do consorte e do regime conjugal, en-

    fatizando a importncia do emprego de custos de informaes relativos aos

    partcipes do mercado de casamento antes da formalizao do conbio. Ainda,

    tal abordagem prov uma explicao ao pouco uso do pacto antenupcial por

    parte dos casais, inferindo-se que tal se associa a uma interpretao negativa

    (e estigmatizada) do instrumento por parte dos indivduos em geral, crentes de

    que este irradia sinais negativos na sociedade acerca da unio, notadamente

    quando o regime o da separao convencional de bens.

    Do mesmo modo, tal pode decorrer da ignorncia quanto operacio-

    nalidade e possvel extenso do pacto antenupcial, passvel de contemplar

    disposies que no apenas circunscritas eleio de um regime predeter-

  • A Escolha do Consorte e do Regime de Bens Sob a Perspectiva da Anlise Econmica do Direito

    89Direito em Debate Revista do Departamento de Cincias Jurdicas e Sociais da Uniju

    minado de bens (tal como ocorre na formulao de um regime misto), ou,

    ainda, da propenso dos indivduos a serem em extremo otimistas, crendo

    no incorrerem no risco de virem a se divorciar.

    6 REFERNCIAS

    ARAJO, Fernando. Teoria econmica do contrato. Lisboa: Almedina, 2007. 1.340 p.

    BALNINOTTO NETO, Gicomo. A teoria econmica do casamento e do divrcio. In: Revista da Faculdade de Cincias Econmicas UFRGS Anlise Econmica, Porto Alegre, RS, n. 18, p. 125-41, set. 1992.

    ______. Notas de aula. Disponvel em: . Acesso em: 21 mar. 2013.

    BECKER, Gary Stanley. The Economic Approach to Human Behavior. Chicago: The University Of Chicago, 1976. 294 p.

    ______. Tratado Sobre La Familia. Madrid: Alianza, 1987. 366 p.

    BRASIL. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica IBGE. Disponvel em: . Acesso em: 20 dez. 2012.

    BRYANT, W. Keith. The Economic Organization of the Household. Cambridge: Cambridge University Press, 1990. 276 p.

    CANTWELL, William P. Premarital Contracting: Why and When. HeinOnline 8 J. Am. Acad. Matrimonial Law., p. 45, 1992.

    CIGNO, Alessandro. Economics of the Family. New York: Oxford University Press, 1991. 212 p.

    COHEN, Lloyd R. Marriage: The long-term contract. In: DNES, Antony W.; COHEN, Lloyd R. Marriage. Divorce, and Quase Rents; or, I gave him the Best years of my life. HeinOnline 16 J., Legal Stud., p. 267, 1987.

    COOTER, Robert; ULLEN, Thomas. Direito e economia. 5. ed. Porto Alegre: Bookman, 2010. 538 p.

    FRIEDMAN, David D. Price Theory. Chicago: South-Western Publishing Co., 1986, 549 p.

    GICO JUNIOR, Ivo. Introduo ao Direito e economia. Direito e economia no Brasil. In: TIMM, Luciano Benetti (Org.). Direito e Economia no Brasil. So Paulo: Atlas, 2012. p. 1-33.

  • Cristiana Sanchez Gomes-Ferreira Csar Viterbo Matos Santolim Gicomo Balbinotto

    90ano XXII n 40, jul.-dez. 2013

    HAUPT, Erika L. For Better, For Worse, For Richer, For Poorer: Premarital Agree-ment Case Studies. HeinOnline 37 Real Prop. & Tr. J., p. 29, 2002-2003.

    LECKEY, Robert. Relational contract and other models of marriage. HeinOnline 40 Osgoode Hall L.J. 1, 2002.

    MACNEIL, Ian. The Relational Theory of Contract: selected works of Ian MacNeil. London: Sweet & Maxwell, 2001.

    McKENZIE, Richard B.; TULLOCK, Gordon. La Nueva Frontera de la Economia. Madrid: Espasa-Calpe, 1980. 386 p.

    MAHAR, Heather. Why There Are So Few Prenuptial Agreements? Disponvel em: . Acesso em: 15 mar. 2012.

    MARGULIES, Sam. The Psycology of Prenuptial Agreements. HeinOnline 31 J. Psychiatry & L., p. 415, 2003.

    MOLHO, Ian. The Economics of Information Lying and Cheating in Markets and Organizations. USA: Blackwell Publishers, 1997. 262 p.

    POSNER, Richard. Economic Analysis of Law. 17th edition. New York: Aspen Pub, 2007, 787 p. -

    ROWTHORN, Robert. Marriage as a signal. In: DNES, Antony W.; WOWTHORN, Robert (Edit.). The law and Economics of Marriage and Divorce. Cambridge: Cambridge Press, 2002. p. 132-157.

    SHIKIDA, P. F. A. A. A economia e a formao de casais: evidncias empricas sobre anunciantes que procuram parceiros(as). Tempo da Cincia Revista de Cincias Sociais e Humanas, Cascavel, PR, v. 5, n. 9, p. 89-98, jan./jun. 1998.

    SION, Michael. Money and Marriage: How to Choose a Financially Compat-ible Spouse. Disponvel em: . Acesso em: 9 mar. 2012.

    SMITH, Ian. The Law and Economics of Marriage Contracts. Disponvel em: . Acesso em: 22 nov. 2012.

    SPENCE, Michael. Job Market Signaling. The Quartely Journal of Economics, v. 87, Issue 3, p. 355-374, ago. 1973.

    Recebido em: 1/7/2013

    Aceito em: 29/7/2013