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A EXCEÇÃO DA VERDADE ROGÉRIO TADEU ROMANO Procurador Regional da República aposentado e advogado I – A EXCEÇÃO DA VERDADE E OS CRIMES CONTRA A HONRA Se há uma calúnia, que é imputação falsa de um crime a alguém, deve-se facultar a quem a proferiu que demonstre que tal fato é verdadeiro. Há, como bem disse Magalhães Noronha1, um interesse social em que não fique impune o autor do crime, donde a admissão da exceptio veritatis. 1 E. Magalhães Noronha, Curso de Direito Processual Penal, São Paulo, Saraiva, 11ª edição, 1979, pág. 300 a 301. 2 Guilherme de Souza Nucci, Código de Processo P enal Comentado, São Paulo, RT, 10ª edição, pág. 929. É certo que a demonstração da verdade deve fulcrar-se no fato, na sua existência. Perguntar-se-ia: Se foi imputada uma calúnia, o fato é verdadeiro? Na exceção da verdade, procura o acusado demonstrar que, embora haja a imputatio facti, não existe delito por inexistência de um elemento do tipo, que é a falsidade. No que concerne à difamação, por certo, não pode o acusado defender-se com a exceção da verdade. Não estamos diante de imputação de crime, não se visualizando um interesse social em conhecer a prática de ato imoral(não delituoso) que a pessoa tenha cometido. Contudo, num caso admite-se a prova da verdade, isto é, quando o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções. Assim há um interesse social na apuração da realidade do fato, na medida em que é do interesse público saber se há irregularidades no funcionamento do serviço público. Como bem explicita Nucci2, não se admite a exceção da verdade ou da notoriedade, no caso de injúria, uma vez que esse delito atinge a honra subjetiva, que é o amor-próprio ou a autoestima do ofendido, e não a honra objetiva, que é sua imagem perante a sociedade, o que torna incabível qualquer prova da verdade. 2 A exceção da verdade pode ocorrer seja quando a ação é privada, promovida por queixa-crime, seja pública, como se dá com a ação penal pública condicionada, como bem explica Espínola Filho3. Será pública a ação penal se o ofendido for o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro ou ainda se for funcionário público, em razão de suas funções, artigo 145 do Código Penal. 3 Eduardo Espínola Filho, Código de Processo Penal Brasileiro, pág. 136. 4 O Código de Processo Penal chama de exceção da verdade, a teor do artigo 139, parágrafo único. 5 Heleno Cláudio Fragoso, Lições de Direito Penal, Rio de Janeiro, Forense, Parte Especial, Rio de Janeiro, Forense, 1983, 7ª edição, pág. 175. Costuma-se distinguir a exceção da verdade da exceção de notoriedade do fato. A exceção da verdade diz respeito ao crime de calúnia(imputar a alguém, falsamente, fato definido como crime), enquanto que a exceção de notoriedade4 refere-se ao crime de difamação de funcionário público no exercício de suas funções(imputar a alguém fato ofensivo a sua reputação). O presente estudo tem como objetivo estudar a natureza jurídica do instituto e seu procedimento. Desde já, lanço a idéia de que estamos diante de uma verdadeira prejudicial a ser objeto de discussão e que se põe como conditio sine qua non para decisão do mérito. II – OS CRIMES CONTRA A HONRA A exceção da verdade surge com especial interesse nos crimes contra a honra, que se referem a alçada privada, pois antes de receber a queixa o juiz oferecerá oportunidade às partes para se reconciliarem, marcando audiência de conciliação, onde, depois de ouvir as partes, em separado, achando provável a reconciliação, o juiz promoverá o entendimento entre elas, e, obtendo a reconciliação irá lavrar termo de desistência, sendo a queixa arquivada. Registro que tal conciliação não ocorrerá nos crimes de ação penal pública condicionada a representação. Sem dúvida, como explica Fragoso5, para os romanos, a honra era direito da personalidade. Na calúnia, a ação incriminada consiste em imputar a alguém falsamente a prática de um crime. O fato atribuído, na calunia, deve ser um crime, isto é, uma conduta penal vigente definida como crime6. Assim a imputação de contravenção pode se caracterizar em difamação. 3 6 RTJ 61/25. 7 D.47, 10, 18). 8 Heleno Cláudio Fragoso, obra citada, pág. 187. Nas mesmas penas do crime de calúnia incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala e divulga. Pode ser praticado o crime de calunia contra os mortos(artigo 138, § 2º). Se a calúnia é, por definição, imputação falsa, admite-se, em regra, a exceptio veritatis, admitindo-se que o agente prove que é verdade o que alegou, excluindo, assim, o crime. Tal solução tem raízes no direito romano7 e não a acolhia o direito canônico, assim como, modernamente, os direitos penais uruguaio e japonês, como nos informou Fragoso8.

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A EXCEÇÃO DA VERDADE ROGÉRIO TADEU ROMANO Procurador Regional da República aposentado e advogado I – A EXCEÇÃO DA VERDADE E OS CRIMES CONTRA A HONRA Se há uma calúnia, que é imputação falsa de um crime a alguém, deve-se facultar a quem a proferiu que demonstre que tal fato é verdadeiro. Há, como bem disse Magalhães Noronha1, um interesse social em que não fique impune o autor do crime, donde a admissão da exceptio veritatis. 1 E. Magalhães Noronha, Curso de Direito Processual Penal, São Paulo, Saraiva, 11ª edição, 1979, pág. 300 a 301. 2 Guilherme de Souza Nucci, Código de Processo P enal Comentado, São Paulo, RT, 10ª edição, pág. 929. É certo que a demonstração da verdade deve fulcrar-se no fato, na sua existência. Perguntar-se-ia: Se foi imputada uma calúnia, o fato é verdadeiro? Na exceção da verdade, procura o acusado demonstrar que, embora haja a imputatio facti, não existe delito por inexistência de um elemento do tipo, que é a falsidade. No que concerne à difamação, por certo, não pode o acusado defender-se com a exceção da verdade. Não estamos diante de imputação de crime, não se visualizando um interesse social em conhecer a prática de ato imoral(não delituoso) que a pessoa tenha cometido. Contudo, num caso admite-se a prova da verdade, isto é, quando o ofendido é funcionário público e a ofensa é relativa ao exercício de suas funções. Assim há um interesse social na apuração da realidade do fato, na medida em que é do interesse público saber se há irregularidades no funcionamento do serviço público. Como bem explicita Nucci2, não se admite a exceção da verdade ou da notoriedade, no caso de injúria, uma vez que esse delito atinge a honra subjetiva, que é o amor-próprio ou a autoestima do ofendido, e não a honra objetiva, que é sua imagem perante a sociedade, o que torna incabível qualquer prova da verdade. 2 A exceção da verdade pode ocorrer seja quando a ação é privada, promovida por queixa-crime, seja pública, como se dá com a ação penal pública condicionada, como bem explica Espínola Filho3. Será pública a ação penal se o ofendido for o Presidente da República ou chefe de governo estrangeiro ou ainda se for funcionário público, em razão de suas funções, artigo 145 do Código Penal. 3 Eduardo Espínola Filho, Código de Processo Penal Brasileiro, pág. 136. 4 O Código de Processo Penal chama de exceção da verdade, a teor do artigo 139, parágrafo único. 5 Heleno Cláudio Fragoso, Lições de Direito Penal, Rio de Janeiro, Forense, Parte Especial, Rio de Janeiro, Forense, 1983, 7ª edição, pág. 175. Costuma-se distinguir a exceção da verdade da exceção de notoriedade do fato. A exceção da verdade diz respeito ao crime de calúnia(imputar a alguém, falsamente, fato definido como crime), enquanto que a exceção de notoriedade4 refere-se ao crime de difamação de funcionário público no exercício de suas funções(imputar a alguém fato ofensivo a sua reputação). O presente estudo tem como objetivo estudar a natureza jurídica do instituto e seu procedimento. Desde já, lanço a idéia de que estamos diante de uma verdadeira prejudicial a ser objeto de discussão e que se põe como conditio sine qua non para decisão do mérito. II – OS CRIMES CONTRA A HONRA A exceção da verdade surge com especial interesse nos crimes contra a honra, que se referem a alçada privada, pois antes de receber a queixa o juiz oferecerá oportunidade às partes para se reconciliarem, marcando audiência de conciliação, onde, depois de ouvir as partes, em separado, achando provável a reconciliação, o juiz promoverá o entendimento entre elas, e, obtendo a reconciliação irá lavrar termo de desistência, sendo a queixa arquivada. Registro que tal conciliação não ocorrerá nos crimes de ação penal pública condicionada a representação. Sem dúvida, como explica Fragoso5, para os romanos, a honra era direito da personalidade. Na calúnia, a ação incriminada consiste em imputar a alguém falsamente a prática de um crime. O fato atribuído, na calunia, deve ser um crime, isto é, uma conduta penal vigente definida como crime6. Assim a imputação de contravenção pode se caracterizar em difamação. 3 6 RTJ 61/25. 7 D.47, 10, 18). 8 Heleno Cláudio Fragoso, obra citada, pág. 187. Nas mesmas penas do crime de calúnia incorre quem, sabendo falsa a imputação, a propala e divulga. Pode ser praticado o crime de calunia contra os mortos(artigo 138, § 2º). Se a calúnia é, por definição, imputação falsa, admite-se, em regra, a exceptio veritatis, admitindo-se que o agente prove que é verdade o que alegou, excluindo, assim, o crime. Tal solução tem raízes no direito romano7 e não a acolhia o direito canônico, assim como, modernamente, os direitos penais uruguaio e japonês, como nos informou Fragoso8. O Código Penal admitiu, como regra geral, a exceção da verdade, no crime de calúnia, recusando-a, apenas em três casos: a) Se o crime imputado for de ação penal privada, e o ofendido ainda não foi condenado por sentença irrecorrível;

b) Não se admite a exceção da verdade se a ofensa é irrogada contra o Presidente da República ou chefe do governo estrangeiro;

c) Não se admitirá também a demonstratio veri, se o ofendido tiver sido absolvido por sentença irrecorrível do fato criminoso que lhe é imputado.

É certo que nos crimes de ação privada, deixa a lei ao arbítrio do ofendido a iniciativa da ação penal, considerando que a strepitus judicii, a publicidade do processo judicial, pode lhe trazer ainda mais prejuízos. A doutrina considera que é evidente contradição permitir a lei a prova da verdade relativamente a um crime, cuja investigação e processo faz depender dos interesses da vítima. Respeita-se ainda a coisa julgada com a impossibilidade de ajuizamento de exceção da verdade quando já houver pronunciamento com relação a conduta do querelado já objeto de decisão. Na difamação, a ação consiste em atribuir a alguém a pratica de determinado fato, que lhe ofende a reputação ou o bom nome, a estima que goza na sociedade. O crime de difamação se consuma desde que a imputação desonrosa chegue a conhecimento do ofendido ou de qualquer outra pessoa. Já se disse que se permite, de forma excepcional, a exceção da verdade nos casos de difamação se ela é feita a funcionário público. Funcionário público, para fins penais, é todo aquele que embora transitoriamente e sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública, estando 4

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a ele equiparado o que exerce cargo, emprego ou função em entidades paraestatais, como empresas públicas, sociedades de economia mista. Assim só terá cabimento a excepto veritatis, se o fato difamatório for relacionado com o exercício de cargo público, propter officium. Entende-se que se o ofendido tiver deixado de ser funcionário público, não mais se admitirá a prova da verdade, mesmo que o fato imputado tenha sido praticado no exercício do cargo. Já a injúria imputa não fatos, mas defeitos morais que dizem respeito à dignidade da pessoa humana, seja por gestos, palavras, atitudes, etc. Por outro lado, há a injúria real que envolve contra a vítima a violência ou vias de fato, sempre uma ofensa a dignidade ou ao decoro. Se houver lesão corporal a ação penal será pública. Fala a redação do Código Penal de 1940, em sua parte especial, que pode haver o perdão judicial(forma de extinção da punibilidade), deixando o juiz de aplicar a pena nos seguintes casos: a) Quando o ofendido, de forma reprovável, provocou diretamente a injúria;

b) No caso de retorsão imediata, que consista em outra injúria.

Por fim, não constituem injúria ou difamação, a teor do artigo 142 do Código Penal: a) A ofensa irrogada em juízo na discussão da causa, pela parte ou por seu procurador9;

b) A opinião desfavorável da critica literária, artística ou científica, salvo quando inequívoca a intenção de injuriar;

c) O conceito desfavorável emitido por funcionário público, em apreciação ou informação que preste no cumprimento do dever de oficio10.

9 O atual Estatuto do Advogado mantém tal exclusão de antijuridicidade. 10 Aqui o agente público traz informações de interesse coletivo, ficando acobertado do crime, desde que no cumprimento do dever funcional. Preceitua o artigo 7º, § 2º, do Estatuto da Advocacia que o advogado tem imunidade profissional, não constituindo injúria, difamação ou desacato puníveis qualquer manifestação de sua parte, no exercício de sua atividade, em juízo ou fora dele, sem prejuízo das sanções disciplinares perante a Ordem dos Advogados do Brasil, pelos excessos que cometer. Tal prerrogativa se funda na necessidade de amplitude do direito de defesa, direito esse assegurado na Constituição Federal, que assim justifica e exige a imunidade judiciária. 5 O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADIn 1.127-8, declarou parcialmente inconstitucional o disposto no artigo 7º, § 2º, do Estatuto da Advocacia, determinando a exclusão do termo desacato, entendendo que estaria criando uma disparidade entre o juiz e o advogado, retirando a necessária autoridade daquele em conduzir o processo. III – A EXCEÇÃO DA VERDADE COMO FORMA DE PREJUDICIALIDADE. O PROCEDIMENTO Já ensinava em obra pioneira Oskar Von Bülow11 que exceção processual não é outra coisa que pressuposto processual expressado negativamente em forma de exceção. Eram os exceptio fori imconpetentis, de prevenção, de juiz suspeito, impedido, etc. 11 A Teoria das Exceções Processuais e dos Pressupostos Processuais (1868), ed. LZN, Campinas, São Paulo. Não se pode perder de vista a lição do mestre de que o processo é uma relação jurídica que avança gradualmente e se desenvolve passo a passo. Essa relação processual se aperfeiçoaria coma litiscontestação - contrato de direito público entre o Estado e as partes (resquício da época privada) Para Von Bülow a exceptio praejudii é uma exceção processual e tem lugar no interesse de um processo futuro e não é uma exceção processual. De praejudicialibus excepcionibus, Heidelberg, 1863). Diverso era o decreto de prejudicialidade. No processo romano, tinha lugar em tal caso unicamente a praetoria cognitio, pois se 2(duas) ações eram conexas, estavam pendentes de debate judicial ao mesmo tempo, o magistrado não esperava o protesto do demandado, mas, sim, de ofício, tomava medidas no intuito de estabelecer uma ordem sucessiva adequada entre ambos processos, pois suspendia o menos importante até que o de maior transcendência fosse resolvido. Era um decreto suspensivo chamado de decreto de prejudicialidade. Já na exceção de prejudicialidade o juízo não deve velar de ofício por um processo só possível no futuro. É um direito do réu, particular, no interesse de processo futuro, que deverá seguir as seguintes prescrições: competência, capacidade e insuspeitabilidade do juiz, capacidade processual das partes, dos representantes, citação e obrigação entre vários processos, que consistem numa abólitio da instância. Sirvo-me da lição do mestre Von Bülow, à luz de Ulpiano, ao fazer a distinção entre o decreto e a exceção de prejudicialidade, entre iudicium majus praesens e futurum. No primeiro, o magistrado detém um processo ante o perigo de prejulgar a matéria de outro, diversa da exceção de prejudicialidade no 6 interesse de processo futuro. Ora, no decreto está a raiz histórica da conexão por prejudicialidade. Havia o decreto de prejudicialidade, diante de processos conexos. Quanto a exceptio de prejudicialidade ter-se-ia: a exceptio quod praejudicium hereditati, praedio, in reum capitis non fiat. No caso da exceptio quod praejudicium praedio non fiat, a vindicação do prédio importa um perigo de prejulgamento, através da ectio confessoria. O autor usa uma servitis sem estar na posse do praedium dominans. Não tenho dúvidas em firmar a prejudicialidade como forma de conexão. Vemos isso no liame entre a questão (ponto duvidoso; ponto, fundamento da afirmação referente à pretensão) prejudicial que venha ser resolvida principaliter juntamente com a questão principal, transformando-se em causa (possibilidade de ser objeto de processo autônomo) prejudicial ligada a prejudicada. A prejudicial liga-se a prejudicada, por um condicionamento lógico e necessário por laços o mesmo ramo de direito da prejudicada) de tal forma a determinar, nos laços da lei, a suspensão de uma causa prejudicada a aguardar a solução da outra, prejudicial. Identificada a prejudicialidade, com 2(duas) lides conexas, o magistrado deve, de ofício, estabelecer a ordem sucessiva, adequada entre esses processos. A prejudicialidade é forma de conexão ainda que não se possa falar, necessariamente, em reunião de causas. Tal se vê, nitidamente, nas raízes históricas do decreto de prejudicialidade em que, de ofício, o magistrado suspendia a menos importante, até que a mais importante fosse resolvida. Dessa conexão decorre um grande efeito da conexão: a suspensão da causa. A prejudicial condiciona, vincula, ainda que traga obstáculos, o teor da decisão sobre a subordinada. As preliminares, ao contrário, são questões que não vinculam o futuro pronunciamento, apenas obstaculam. As questões prejudiciais pode ser devolutivas(absolutas ou relativas) ou não devolutivas. As prejudiciais devolutivas absolutas são aquelas sempre solucionadas pelos órgãos civis. As devolutivas relativas podem ser solucionadas no juízo extrapenal. A remessa ficará a discrição do juiz penal. Com a exceção da verdade ou da notoriedade do fato estamos diante de uma prejudicial homogênea. Para Nucci12 estamos diante de um meio de defesa indireto. 12 Guilherme de Souza Nucci, obra citada, pág. 929. Penso que nosso sistema jurídico não adota a fórmula de uma ação declaratória incidental para o caso. 7

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Estamos diante de um meio de defesa e a forma procedimental é a própria resposta ao que afirmamos. A exceção deve ser apresentada no prazo previsto para a defesa prévia, que é a primeira oportunidade de manifestação, por meio de defesa técnica do querelado. Para Mirabete13 a exceção pode ser ajuizada em qualquer momento processual, uma vez que a lei não a especifica. 13 Júlio Fabbrini Mirabete, Processo Penal, São Paulo, Atlas, pág. 566. 14 Questões Prejudiciais e Coisa Julgada, Rio de Janeiro, Borsoi, 1967, p. 126 e Questões Prejudiciais e Questões Preliminares 15 Questões Prévias e Limites Objetivos da Coisa Julgada, São Paulo, RT, 1977, pg. 21 e 22. 16 Obra citada, pg. 47. Veja-se quanto a prejudicial de ação o caso do servo, que dizia não o Servo, essencial, para que pudesse acusar o Senhor. De toda sorte, impossível ver a exceptio fora do que chamamos sistema acusatório, que implica o estabelecimento de uma verdadeira relação processual, estando em pé de igualdade o autor e o réu, sobrepondo-se a eles um órgão imparcial de aplicação da lei, o juiz. Sendo assim as partes acusadora e acusada estão em mesmo pé de igualdade, há o contraditório como garantia política do cidadão, o processo é público, as funções de acusar e ser acusado são atribuições distintas, não é dado ao juiz iniciar o processo. A exceção da verdade deve ser resolvida antes da questão principal, daí o seu caráter prejudicial. Não resta dúvida na doutrina que a relação entre a questão prejudicial e a prejudicada é de subordinação. É a prejudicial um antecedente lógico e necessário da prejudicada. Nada tem a prejudicial com a preliminar, que impossibilita a decisão sobre a subordinada. Aqui, na questão prejudicial condiciona-se o teor da decisão sobre a subordinada. Necessariedade e subordinação lógica da questão (ponto controvertido) prejudicada é questão prejudicial, pois precisa-se, necessita-se da solução da questão. Porém, Barbosa Moreira14, examinando as questões prejudiciais relativas às condições da ação e ao processo, face a coisa julgada, conclui que as decisões sobre as questões prejudiciais são sempre incidentais, não podendo adquirir autoridade de coisa julgada. Nega, pois, o critério da autonomia, acolhendo Menestrina para quem a prejudicialidade jurídica nasce de que há igual natureza do juízo prejudicial e do final não podendo ser objeto de processo, ação ou juízo autônomo. Na corrente do mestre Barbosa Moreira, a Professora Tereza Alvim15 entende que o critério da autonomia, à luz do que entende Scarance Fernandes16, ser objeto de processo autônomo, não é adequado. Ora, as decisões sobre as prejudiciais não poderiam adquirir a qualidade dos efeitos da sentença, imutabilidade e 8 indiscutibilidade, a coisa julgada. Posso ter questão prejudicial sobre valor da causa, em relação a questão acerca do recurso cabível da decisão de 1.ª instância (apelação ou embargos) ou valor da causa com relação a espécie de procedimento. Posso ter prejudiciais não relacionadas ao mérito como o caso da legitimação para propor ação popular: o autor é cidadão brasileiro? Há prejudiciais de ação e de sentença? A exceção da verdade ou de notoriedade dispensa a formação de autos independentes, devendo ser resolvida antes da questão principal, pelo próprio juiz do feito, dispensando a formação de autos independentes, como ocorre com outras exceções, como a de suspeição, por exemplo. Tourinho Filho17 cita Espínola Filho para quem não há um processo destacado de exceção, mas admitida pelo Juiz será objeto de prova, no curso normal da ação penal, e juntamente com qualquer outra modalidade de defesa de que se tenha socorrido o acusado. 17 Fernando da Costa Tourinho, Processo Penal, volume IV, São Paulo, Ed.Saraiva, 12ª edição, pág. 153. 18 Eugênio Pacelli de Oliveira, Curso de Processo Penal, 10ª edição, Rio de Janeiro, Lumen Juris Editora, pág. 626. 19 José Frederico Marques, Elementos de direito processual penal, volume III, São Paulo, Forense, 1961 pág. 294. Para Oliveira18 a exceção não é procedimental, mas excludente da ilicitude, não havendo necessidade alguma de oferecimento dela em separado. Assim recebida a exceção da verdade não há um desdobramento do procedimento. Frederico Marques19 ensina que se outro processo já tiver sido instaurado para verificar a ocorrência do crime objeto de exceção da verdade, há uma verdadeira conexão instrumental(artigo 76, III, do Código de Processo Penal), devendo haver a junção dos feitos para julgamento único. A conexão instrumental tem por fim a utilidade unificada da prova de uma infração ou de outras circunstâncias que venham a influir na prova de outro delito. Oferecida a exceção sendo ela admissível suspende o curso do processo principal. Intimado o Ministério Público ou o querelante, oferecerão contestação no prazo de dois dias. O rol de testemunhas oferecido na queixa poderá ser mantido para a instrução da exceção. No entanto, justifica-se a formação de novo rol de testemunhas, visto que o panorama probatório pode mudar com a produção da exceptio. Após a contestação o juiz determina o prosseguimento do feito, pelo rito comum, ouvindo-se as testemunhas arroladas pela acusação e, depois, as da defesa, envolvendo a prova tanto os fatos constantes na queixa ou da denuncia, como na exceção. 9 Como meio de defesa indireto a decisão sobre a exceção deve se dar na sentença final, após as alegações finais das partes. IV – A PROBLEMÁTICA DO FORO PRIVILEGIADO Quando o querelante, em ação penal privada, ou o funcionário público, em ação penal pública condicionada, for beneficiário de foro privilegiado, a exceção contra ele deve ser julgada pela instância superior competente. Em primeiro grau, será feito o juízo de admissibilidade da exceção para em seguida ser oferecida a contestação e, após, remetido o feito ao Tribunal. Admitido o recebimento contra ele cabe o recurso de agravo e se for ele mantido ou não ajuizado o Relator sorteador poderá encaminhar carta de ordem para instrução do feito no primeiro grau. Retornam os autos ao Tribunal, já com as razões finais, para o julgamento da exceção. Caso ela seja considerada improcedente, retornam os autos a primeira instância para o julgamento com relação ao crime contra a honra.

Se julgada procedente a exceção os autos permanecem no Tribunal para a tomada da medida cabível contra o

querelante ou ofendido possuidor do foro privilegiado, julgando improcedente o pedido formulado em ação penal

contra o querelado ou formulado pelo Ministério Público em ação penal pública condicionada.