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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA UNB INSTITUTO DE LETRAS - IL DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS ESTRANGERIAS E TRADUÇÃO - LET PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA TRADUÇÃO POSTRAD A FORMAÇÃO DE TRADUTORES DE TEATRO PARA LIBRAS: QUESTÕES E PROPOSTAS VIRGÍLIO SOARES DA SILVA NETO Brasília DF Agosto / 2017

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UNB

INSTITUTO DE LETRAS - IL

DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS ESTRANGERIAS E TRADUÇÃO - LET

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA TRADUÇÃO – POSTRAD

A FORMAÇÃO DE TRADUTORES DE TEATRO PARA

LIBRAS: QUESTÕES E PROPOSTAS

VIRGÍLIO SOARES DA SILVA NETO

Brasília – DF

Agosto / 2017

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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB

INSTITUTO DE LETRAS - IL

DEPARTAMENTO DE LÍNGUAS ESTRANGERIAS E TRADUÇÃO - LET

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA TRADUÇÃO – POSTRAD

VIRGÍLIO SOARES DA SILVA NETO

A FORMAÇÃO DE TRADUTORES DE TEATRO PARA

LIBRAS: QUESTÕES E PROPOSTAS

Dissertação de Mestrado a ser submetido ao Programa de

Pós-Graduação em Estudos da Tradução da Universidade de

Brasília.

Orientadora: Professora Doutora Alice Maria de Araújo

Ferreira

Brasília – DF

Agosto / 2017

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VIRGÍLIO SOARES DA SILVA NETO

A FORMAÇÃO DE TRADUTORES DE TEATRO PARA

LIBRAS: QUESTÕES E PROPOSTAS

Dissertação de Mestrado a ser submetido ao Programa de

Pós-Graduação em Estudos da Tradução da Universidade de

Brasília.

Orientadora: Professora Doutora Alice Maria de Araújo

Ferreira

Banca examinadora

_____________________________________________

Professora Doutora Alice Maria de Araújo Ferreira

Orientadora (Presidente) -POSTRAD/ LET/IL/UnB

_____________________________________________

Professora Doutora Maria da Glória Magalhães dos Reis

Membro Efetivo -POSLIT/ IL/UnB

_____________________________________________

Professora Doutora Ana Regina Campello

Professora Membro Externo –INES

_____________________________________________

Professora Doutora Soraya Ferreira Alves

Suplente – POSTRAD/ LET/IL/UnB

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DEDICATÓRIA

Dedico esta dissertação aos encontros cármicos-

astrológicos que me proporcionaram ser quem eu sou.

Dedico à comunidade surda que me modificou,

ressignificou e que me constitui.

Dedico aos meus amigos, aqueles a quem olho nos olhos,

aos que nem palavras são necessárias. Aos que o conceito

de mentira ou verdade desaparecem e só o nós e o amor

permanecem.

Dedico a Jeane e Kelton, Tuxi, Falk e Luciana e à família

Gussi, sem os quais a jornada em Brasília já teria sido

encurtada e jamais teria chegado a este instante da vida.

Dedico a minha família, que me gerou, educou e me

amou.

Dedico a minhas entidades e meus guiam que me cuidam,

me zelam e caminham comigo;

Dedico aos meus TatatuLwango (o Raio Sagrado) e

MametuKisimbe (Mãe das Águas Doces) Deus na forma

de Pai e de Mãe, meus Nkisis, donos da minha mutuè e de

minha existência.

Dedico a NzmbiMpungu, o Deus todo poderoso, que nos

momentos de pouca fé me reestabelece as forças me

demonstrando nas sincronicidades o seu amor.

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AGRADECIMENTO

Por onde iniciar um agradecimento que tenta resultar em tudo o que constituiu um

ser até o dado momento? Elenquei em ordem cronológica tudo o que vem fazendo parte de

mim:

Agradeço a Nzambi a Mpungu, Deus criador e razão primeira de todas as coisas a

quem a tudo devo e que me conduziu pelos múltiplos caminhos do Sagrado. A Jeová,

primeira concepção que tive do transcendente e representação divina dos povos hebraicos-

cristãos. A Lwango (Raio Sagrado/Deus em forma de Justiça e Energia) que tem me

conduzido de maneira tão firme pelos seus caminhos e dono da minha Mutuè. E a

Ndandalunda Kisimbe (Mãe das Águas Doces / Deus em forma de mãe amorosa e cuidadora)

que me ampara e consola. Agradeço a Njila (Deus em movimento, ação e caminhos) que

entortou tantos caminhos para que, perdido, eu me encontrasse. Aos meus Guias espirituais, a

Entidades que me orientam e aos Anjos que me guardam. E a todos/as os/as sacerdotes e

sacerdotisas que me ajudaram e ajudam nessa caminhada. Pr. Odilon Izidro, Pr. Estevam

Fernandes, Pr. Emildson Jr., Pr. Kerly Carneiro, Pr. Sérgio Queiroz, Ialorixá Dora Barreto,

Babalorixá Haroldo Farias e a meu Tata Ria Nkisi Francisco Ngunz‟Tala, meu Pai de Santo,

pela sua navalha, cuidado e amor me guiando nos caminhos espirituais, bem como todos os

irmãos católicos, evangélicos e a minha amorosa família de Santo.

Agradeço a meu Avô Virgilio Soares da Silva (in memoriam) com quem tão pouco

convivi, cujas história e peripécias dele contadas e peripécias chegaram até mim e de quem

me orgulho por ter herdado o seu nome.

Agradeço a minha Avó Maria da Paz dos Santos Soares, viúva de fibra e fé que

conduziu a família com muita força e determinação e cujo amor é tão imenso quanto as águas

do mar.

A mainha, Maria da Paz Souto Soares da Silva, tão simples e tão honesta e

batalhadora, cujo amor era evidenciado não em palavras mas em ações. A minha mãe a minha

mais profunda gratidão.

Ao Meu Pai Antonio Carlos dos Santos Soares da Silva, (Tony), cuja busca por

compreender fenômenos e alcançar um pensamento crítico sempre foram meus parâmetros. O

berço do meu problematizar.

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Agradeço a Minha Segunda Mãe, Joselha dos Santos Soares da Silva (Tia Zelha),

com o seu amor e carinho me cuidou como verdadeiro filho sem nenhuma obrigação e a quem

devo tudo. Sem minha tia minha vida não seria nem metade do que é hoje.

A minha irmã Ingrid Souto Soares da Silva pelas vivências e desafios de aprender a

amar a diferença.

Ao meu sobrinho maravilhoso Iago Bruno Souto Suassuna por me impulsionar a ser

sempre alguém melhor por ele. Pelo seu carinho imenso e brilho nos olhos.

Agradeço a tia Martinha, minha madrinha linda do coração pelo amparo e amor

desde a mais tenra idade. A tia Sônia (in memoriam) pelos boas conversas e o excelente gosto

musical. A Tio Josinaldo pelo exemplo de ter sempre um sorriso no rosto mesmo em meio da

tormenta, e exemplo de dignidade e brio. A tio Leal pela generosidade e por ser um exemplo

de força e determinação. A Tio Jairo (in memoriam) pela alegria constante. E a todas as

primas e primos.

Agradeço a Lindenberg Matias Saraiva pela parceria constante e por ser um irmão

desde a primeira série do primeiro grau.

A Ivana Bezerra e Alberto Porto pelas primeiras aulas de Libras da vida e com eles

todos os membros, irmão e amigos da Igreja Presbiteriana de Jaguaribe.

A Heloisa e Wattson Perales Sans por me ensinarem a traduzir Libras. Pelo amor à

causa surda e por todos os momentos tão intensamente vivenciados que até hoje os chamo de

Mãe e Pai. E a todos os irmãos e irmãs da Primeira Igreja Batista de João Pessoa.

A Denise Coutinho por problematizar tantas questões concernentes a surdez e me

incitar a ter um olhar mais crítico e responsável.

A Renata Cristina, minha ex esposa, pelo amor e cuidado tão imensos e pela

convivência maravilhosa ao longo de quase dez anos de relacionamento. Por ter sido tão

importante em minha vida e me abrir os olhos para um novo mundo.

À comunidade surda que me acolheu e acolhe, pelas trocas, e principalmente pela

maravilhosa oportunidade de aprender essa língua tão rica e mágica .

A Janaína Peixoto pela amizade/irmandade e por me despertar e me ensinar a

traduzir/interpretar músicas para Libras e assim, ser uma das grandes responsáveis por esse

trabalho e todos os irmãos e irmãs da Igreja Cidade Viva, onde pude desenvolver o trabalho

no ministério com surdos.

À Família Gussi pelo amor, carinho e cuidado e por serem uma das minhas famílias

em Brasília.

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A Jeane Félix e Kelton Gomes, casal tão amoroso e exemplo de amor e

companheirismo. Muitas linhas desse trabalho, e de outros; assim como várias linhas da

minha vida foram escritas com eles. Aos quais também sou profundamente grato por tudo.

Às Cumadi e aos Cumpadi: Mateuzera, Wesley, Victor, Maíra, Tamine, Marinão,

Jackó, Victor, Fabi, Deisoca, Vina; e a pessoas tão próximas quanto como: Renathinha,

Rackelzona, Maria Claudia B., Yuri Mello, Paulitcha, Gnomo e tantos outros que

provavelmente estou sendo injusto.

Ao Instito de Letras – IL da Universidade de Brasília por me oportunizar trocas

acadêmicas tão significativas.

À Universidade de Brasília – UnB e por todo o aprendizado oportunizado.

À Professora Dra Patrícia Tuxi, amiga pessoal a quem devo as minhas próximas

encarnações por tantos favores e cuidados. Sem Tuxi, eu não completaria nem um décimo

desse trajeto.

Agradeço à Professora Dra Patrícia Pederiva por acreditar e agregar valor ao meu

trabalho, evidenciando questões de cunho teórico da música que estavam presentes em meu

trabalho e que eu mesmo não enxergava.

À Professora Dra Soraya Ferreira Alves por lançar um olhar intersemiótico na minha

tradução problematizando-as, proporcionando as primeiras teorizações sobre o meu trabalho.

À minha orientadora Professora Dra Alice Maria de Araújo Ferreira, pelo olhar

crítico, sistêmico e complexo. Pelas leituras, conversas, orientações e sorrisos. Por todas

aproblematizações e torções no meu olhar. Minha mais profunda gratidão.

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EPÍGRAFE

“A tradução poderia e deveria, ao invés, marcar a distância

entre as línguas, mostrar que existem línguas diferentes...

O seu papel é, pois, o de lembrar aos leitores de uma

determinada língua que é possível dizer o mundo de uma

outra forma, com uma outra pronúncia, com outras cores;

o de fazer ouvir (ver) a língua alheia na sua própria língua

e deixar entrar nela uma estranheza que enriquecerá as

possibilidades de expressão e a identidade do sujeito”

(Laplantine)

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RESUMO

Este trabalho é fruto de uma perseguição por uma tradução estética que contemple a

forma no fazer tradutório alicerçado a questões poéticas discutidas por Meschonnic (2010).

Tal inquietação conduziu-me a percursos de formação diversificados possibilitando-me

olhares múltiplos sobre o traduzir. A busca levou-me ao ingresso do Mestrado Acadêmico no

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução – POSTRAD da Universidade de

Brasília – UnB e posteriormente a minha filiação ao Grupo de Pesquisa “Tradução

Etnográfica e Poéticas do Devir” coordenado pela Professora Doutora Alice Maria de Araújo

Ferreira, minha orientadora. As leituras e discussões surgidas no grupo contribuiram

substancialmente para o constante exercício do deslocamento do olhar, buscando uma poética

tradutória etnográfica, mestiça e do exílio, a qual prime em por a língua em devir. Neste

processo tive a possibilidade de questionar-me a cerca da formação estética dos tradutores e

intérpretes de Língua de Sinais Brasileira na história e nos cursos de graduação existentes no

Brasil. Pude com isso verificar a inexistência de disciplinas na grade curricular dos cursos

com viés estético e vinculado a forma. Esses dados foram levantados e informados no

primeiro capítulo deste trabalho.

No segundo capítulo, fizemos um levantamento do que consideramos elementos

indispensáveis para a compreensão, ainda que introdutória, do universo teatral e suas estéticas

a fim de que tenham condições de embasar os seus projetos de tradução dos espetáculos.

O terceiro capítulo possui uma breve introdução e seguido de uma rápida crítica ao

que ocorre na tradução de teatro. Analisa práticas tradutórias realizadas em três espetáculos

traduzidos por nós, e discutimos a luz dos nossos referenciais teóricos

No quarto e último capítulo temos uma discussão sobre a tradução em contexto cênico.

Para tanto utilizamos, adaptamos e desenvolvemos um conceito criado por Barros de

Traduator, assim como trazemos a discussão das competências estéticas e poéticas que

deveria ser abordadas na formação deste profissional.

Palavras Chave: tradução estética; Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS); práticas de

tradução; tradução de teatro; tradutor.

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ABSTRACT

This thesis is the result of aresearch on aesthetic translation that comprises the form and the

practice of translation based on the arguments of poetic issues proposed by Meschonnic

(2010).This uneasiness took me to diversified education paths allowing different views of the

practice of translating. The ongoing research allowed me to apply for a master's degree at the

Translation StudiesPost-graduation Program (POSTRAD) at the University of Brasília – UnB

and, later on, to join the “Ethnographic and Poetic Translation of Devir‟s Research

Groupcoordinated by my counselor, Professor Alice Maria de Araújo Ferreira. The studies

and debates on the poetic issues raised in the group were substantially important for the

overlook exercise seeking for a poetic, ethnographic, half-breed and exiled translation that

locates the language in evidence. In this process, we had the possibility to inquire about the

aesthetics formation of translators and interpreters of Brazilian Sign Language in the history

and in the undergraduate courses in Brazil.We were able to verify that the curriculum of the

courses does not have disciplines with aesthetic bias and linked to the form. These data were

collected and are reported in the first chapter of this paper.In the second chapter, we made

survey elements that we considered indispensable for the understanding – although

introductory – of the theatrical area and its aesthetics, in order to be able to base the

translation projects of the spectacles.The third chapter has a brief introduction followed by a

quick review of what take places in theater translation. We analyze translational practices

carried out in three spectacles that we translate and discuss in the light of four theoretical

references.In the fourth and last chapter, we discuss about translation at the scenic context. In

this case we use, adapt and develop a concept by Barros called Translactor, as well as we

bring to discussion the aesthetic and poetic competences that should be approached in the

formation of the translation professional.

Key-words: aesthetic translation; Brazilian Sign Language (LIBRAS); translation practices;

theater translation;Translactor.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – Espetáculo Tradição Viva 54

Figura 2 – Equipe Tradição Viva 56

Figura 3 – Espetáculo Tradição Viva 58

Figura 4 – Espetáculo Tradição Viva 63

Figura 5 – Croqui Edifício Aurora 64

Figura 6 – Espetáculo Edifício Aurora 66

Figura 7 – Espetáculo Edifício Aurora 68

Figura 8 – Espetáculo Edifício Aurora 70

Figura 9 – Espetáculo Um Brinde A La Muerte 72

Figura 10 – Espetáculo Um Brinde A La Muerte 73

Figura 11 – Palco Italiano 81

Figura 12 – Palco Elisabetano 82

Figura 13 – Palco de Arena 82

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LISTA DE ABREVIATURA E SIGLAS

ILS – Intérprete de Língua de Sinais

LIBRAS – Língua Brasileira de Sinais

LS – Língua de Sinais

POSTRAD – Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução

TILS – Tradutor e Intérprete de Língua de Sinais

UFG – Universidade Federal de Goiás

UFSCAR – Universidade Federal de São Carlos

UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina

UFES – Universidade Federal de Espírito Santo

UFRR – Universidade Federal de Roraima

UnB – Universidade de Brasília

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 15

CAPÍTULO 1 18

O TRADUTOR INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 18

1.1 O TRADUTOR INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS – ANTES DA LEGISLAÇÃO 19

ASSOCIAÇÕES DE SURDOS 22

1.2A LEGISLAÇÃO E O TRADUTOR INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS 25

1.2.1 ProLibras 28

1.2.2Bacharelado em Tradução de Língua de Sinais: um panorama 30

CAPÍTULO 2 42

UMA FORMAÇÃO QUE CONTEMPLE ASPECTOS DA LINGUAGEM TEATRAL 42

2.1 TEATRO E TEATRALIDADE 43

2.2 TEXTO DRAMÁTICO 44

2.3CORPO E O TRADUTOR 46

2.4ASPECTOS CENOGRÁFICOS 49

Luz 49

Figurino 49

2.5ASPECTOS ESTÉTICOS 50

CAPÍTULO 3 52

A ATUAÇÃO DO TRADUTOR DE LIBRAS NO TEATRO: EXPERIÊNCIAS DE TRADUÇÃO 52

3.1 BREVE CRÍTICA A NÃO ESTÉTICA NAS TRADUÇÕES DE LIBRAS. POR UMA POÉTICA DA TRADUÇÃO 53

3.2 TRADIÇÃO VIVA: BREVE APRESENTAÇÃO 56

3.3 ELEMENTOS MULTILÍNGUES E ETNOGRÁFICOS 58

O texto: mito e multilinguísmo 60

3.5 UM BRINDE A LA MUERTE 71

Questões poéticas no projeto tradutório 72

CAPÍTULO 4 75

PROJETOS DE TRADUÇÃO DE TEATRO PARA LIBRAS E FORMAÇÃO DE TRADUATOR: PROSPOSTAS EM

QUESTÃO 75

4.1 TRADUÇÃO POÉTICA PARA LIBRAS – UMA NECESSIDADE 75

4.2 O TRADUATOR: ELEMENTOS FORMAIS E EPISTEMOLÓGICOS 77

4.3 CONTRIBUIÇÕES PARA A FORMAÇÃO DO TRADUATUAR 79

CONSIDERAÇÕES FINAIS 84

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REFERÊNCIAS 86

ANEXO 89

ANEXO I – GRADES CURRICULARES DOS CURSOS DE BACHARELADO EM LÍNGUA DE SINAIS DO BRASIL 89

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INTRODUÇÃO

Este trabalho fala do meu olhar para o mundo, do ponto de vista experenciado a

partir desses dois globos oculares e das experiências que me atravessaram e

contribuíram para constituição do meu ser. Das sensações corpóreas advindas dos

sentidos, e da inevitabilidade de compartilhá-las a partir de determinada leitura de

mundo.

A necessidade de compartir as impressões que a vida nos causa, os

sofrimentos, os dramas, as alegrias, a beleza são combustíveis da existência para

continuar. Entretanto, há que se buscar uma forma de fazê-lo. Não uma fórmula, mas

algum sistema de códigos que possam ser compartilhados e compreendidos e

socializados entre as partes. Sem que para isso se restrinjam a mera comunicação

sígnica de uma mensagem. Há mais amor, ódio e cores, e outras tantas forças emanando

vida no mundo com infindas formas de dizê-las, de compartilhá-las de saboreá-las.

Este trabalho fala dessas possibilidades, da paixão e da dor em e ao enunciá-

las. Do brilho único nos olhos dos seres que se entendem, do sentimento de completude

na partilha.

Como tradutor a busca por uma tradução em língua de sinais que

proporcionasse aos surdos uma construção de uma imagem mental similar a forma da

enunciação realizada na língua portuguesa foi uma meta desde as primeiras tentativas de

formar as configurações de mão.

Com o amadurecimento a necessidade de socializar estas vivencias cheias de

carga emocional precisaram ser amparadas por uma pesquisa que viabilizasse a

fundamentação teórica desse criar ou recriar, por assim dizer, artístico.

Assim, durante a trajetória no Mestrado Acadêmico no Programa de Pós-

Graduação em Estudos da Tradução, POSTRAD da Universidade de Brasília, pude ter

acesso às disciplinas que gradativamente contribuíram para sistematizar esses olhares e

essas sensações, não enjaulando-os, mas conhecendo-os.

Outro fator preponderante para contribuir com esse olhar foi e é à participação

no Grupo de Pesquisa Tradução Etnográfica e Poéticas do Devir orientado pela

Professora Doutora Alice Maria de Araújo Ferreira por quem tive a grata satisfação de

ser orientado nessa dissertação. As discussões advindas das no grupo mostraram-me que

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além do sentir é importante saber o que e porque está sentindo. E que conhecer mais

contribui não só para a qualidade deste sentir, mas para instrumentalizar-se para

expressá-lo.

Estes formação cooperou para um deslocamento do olhar, sobretudo no que diz

respeito a uma poética da tradução, refletindo questões como forma, enunciação,

estética, ética, alteridade, encontro, numa perspectiva etnográfica, mestiça cujo tendo

objetivando por a língua em um devir.

Desta forma o olhar para as performances dos tradutores em espaços artísticos,

cênicos e musicais ao ocuparem os postos na crescente demanda por tradução de Língua

Brasileira de Sinais, doravante chamada Libras, para o contexto artístico, encontrava-se

demasiadamente frágil, muitas vezes por estarem parcial ou totalmente desvinculadas à

forma e a estética do espetáculo. O que me levou a problematizar a formação desses

profissionais nesta dissertação de mestrado especificando o aspecto cênico na formação

dos tradutores..

Para tanto, no primeiro capítulo, realizei um levantamento histórico legislativo

e bibliográfico dos tradutores e intérpretes de Libras no Brasil, desde o voluntariado, as

ações evangelizadoras cristãs objetivando alcançar os surdos para Cristo. Passando

pelas associações de surdos, legislação de acessibilidade, criação da lei de Libras,

surgimento do PROLIBRAS e dos cursos de formação superior até a análise das

ementas. nos cursos de Letras tradução – Libras (ou com nomenclatura correlata) a fim

de analisar as ementas tentando encontrar qualquer vestígio de formação que,

minimamente, atentasse para questões poético-enunciativas em sua base curricular.

No segundo capítulo introduzo o teatro como gênero textual e narrativo

presente na história da humanidade há milênios e da necessidade da compreensão dos

elementos que o cercam para realizar uma tradução para libras. Desta forma, discutir a

definição de Teatro trazida pelo pesquisador de teatro Patrice Pavis (2011) o qual

apresenta elementos em seu dicionário tais como teatralidade, texto teatral, a encenação,

palco, ator, iluminação e etc, importantes para uma introdutória apresentação desse

universo.

Com o terceiro capítulo discuto a atual cena da tradução para Libras a partir da

análise de dois questionários. O primeiro enviado para tradutores de Libras que atuaram

em teatro e o segundo para diretores de teatro que trabalharam com esses profissionais

em seus espetáculos e relaciono com três experiências tradutórias vivenciadas no teatro

debatendo a luz do nosso referencial teórico.

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O quarto e último capítulo recupera elementos apresentados no capítulo dois e

apresenta argumentos defendendo propostas de componentes indispensáveis para

formação do que passo a chamar de traduatores para espaços cênicos. Inclusive

alegando os ganhos que tradutores de outras áreas teriam ao participar dessa formação.

E apresento as minhas considerações finais da nossa pesquisa, seguida das

referências que nos balizou. Além dos apêndices e anexos deste trabalho.

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CAPÍTULO 1

O TRADUTOR INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS NO BRASIL: UMA

REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Nesse capítulo, propomos apresentar e discutir o estatuto do Tradutor de Língua

Brasileira de Sinais - Libras e, para essa discussão, trazemos uma revisão bibliográfica

do estado da arte de sua formação e sua legislação. Estruturamos a discussão de

maneira histórica para acompanhar as concepções sobre a questão surda, a legitimidade

da tradução e do ensino nas políticas de inclusões e movimentos de conquistas e de lutas

que permitiram isso.

Ao mesmo tempo, essa discussão nos permite evidenciar as discrepâncias entre a

legislação e a execução (ou prática). Como veremos, as leis que preveem o acesso à

cultura (outra conquista importante das organizações e movimentos) são mais imediatas

que os processos de formações de tradutores, principalmente se buscarmos o modelo de

constituição deste na área artística-estética.

Portanto, na busca por uma compreensão acerca da constituição o Tradutor de

língua de sinais e sua formação, apresento este capítulo em três momentos que

correspondem a períodos históricos distintos (mas simultâneos-consecutivos). O

primeiro pretende traçar, a partir da bibliografia disponível, a formação dos tradutores

de Libras antes do momento institucional-legislativo. O segundo se inaugura com as

primeiras associações e primeiras conquistas sociais. No terceiro apresentamos a

política pública, hoje instituída, sobre academização/formação dos Tradutores de Libras.

Naúltima parte do capítulo, apresentamos a pesquisa realizada sobre os cursos de

formação para Tradutores de Libras em diferentes universidades do país para em

seguida verificar se há formação (específica ou geral) de tradução no campo de peças

teatrais, já que a legislação, hoje vigente, prevê essa necessidade.

A verificação da presença/ausência de uma formação cultural e/ou estética nas

grades curriculares dos cursos universitários nos permite justificar a urgência da

discussão que propomos na nossa dissertação.

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1.1 O TRADUTOR INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS – ANTES DA

LEGISLAÇÃO

Ao se buscar os registros da história dos intérpretes de línguas orais e suas

atuações é preciso construir um mosaico de informações por meio de memórias e

biografias dos próprios intérpretes (ROSA, 2006). Da mesma forma, segundo Aguiar

(2006), ocorre com os Intérpretes de Língua de Sinais - ILS1.

Precisar a data e o lugar dos primeiros ILS se constitui em uma tarefa difícil

de ser realizada. Por um lado, essa dificuldade se dá pelos raros documentos

escritos que tratam sobre a história dos ILS. Por outro lado, antigamente, a

atividade de interpretar não era reconhecida enquanto profissão, dificultando

saber quem eram essas pessoas. (AGUIAR, 2006. p.56)

Dentre os fatos que auxiliaram na escassez de dados está o papel que era

atribuído aos TILS no início de sua atuação. No início, a figura do Tradutor Intérprete

de língua de sinais surgiu em duas formas: i) no desempenho de atividades no meio

religioso, um ser de“alma boa” que tinha como missão a evangelização dos surdos na

língua de sinais e ii) como intérpretes CODAs2, que são os filhos de pais surdos, e têm

acesso à língua de sinais como primeira língua desde a mais tenra idade, o que os levam

em consequência a atuarem em atividades de tradução e interpretação, mesmo sem

terem formação acadêmica para isso (AGUIAR, 2006). Esses acontecimentos

contribuíram por anos, ou mesmo décadas para que o trabalho dos TILS não fosse visto

como uma atividade profissional.

De acordo com Tuxi (2009) aqueles que não eram filhos de surdos e não faziam

parte dos grupos religiosos tinham poucas chances de conhecer ou mesmo aprender a

língua de sinais, pois não havia cursos de formação dessa língua fora das igrejas. A

autora cita como exemplo, a cidade de Brasília, onde até meados dos anos 90, os cursos

de língua de sinais ocorriam em sua grande maioria, dentro de instituições religiosas e

seus conteúdos voltados para esse mesmotema. Somente com a criação da Associação

de Pais e Amigos do Deficiente Auditivo – APADA em 1999, surgem cursos para o

1A época da pesquisa de Aguiar (2006) não era comum o uso do termo Tradutor de Língua de Sinais. A

partir de 2008 com a criação do curso de bacharelado na área a sigla ILS passa a ser TILS que significa

Tradutor Intérprete de Língua de Sinais. Neste trabalho adotaremos a sigla TILS.

2CODAs: acrônimo da expressão em Inglês ChildrenofDeafAdults, refere-se aos filhos ouvintes de

adultos surdos

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aprendizado básico da língua de sinais voltados para pais e familiares que possuem o

desejo de se comunicarem com os surdos.

Vale destacar que em boa parte dos cursos, os profissionais não-surdos,

reconhecidos como TILS e que atuavam nesses espaços tiveram sua origem nos

ambientes religiosos.

... o trabalho de evangelização direcionado aos surdos implicava na

presença de ILS para realizar as interpretações. Diversas

denominações religiosas criaram ministérios de surdos em templos, a

fim de levar a palavra de Deus às pessoas surdas. Esse fato é um

marco na história dos ILS, pois a maioria dos profissionais, que hoje

atuam, tiveram origem nestes espaços e mantiveram relações estreitas

com as questões religiosas (AGUIAR, 2006, p. 47).

Assim é possível afirmar que o trabalho do tradutor, em sua origem esteve

atrelado à questão religiosa.Outro marco importante foi à abertura das igrejas

evangélicas, cujos propósitos incluíam o de salvar as almas dos surdos. “Como poderão

ouvir, se a mensagem não for anunciada?” (Epístola do São Paulo aos Romanos:

Capitulo 10, versículo 14). Atendendo a esse chamamento do Apóstolo, as igrejas

evangélicas se empenharam em encontrar os surdos e a evangelizá-los. Nesse momento,

há o primeiro grande crescimento vertiginoso tanto do ensino da Libras quanto do

surgimento de ILS. (LACERDA, 2009)

Os aprendizes ou postulantes a intérpretes sinalizavam (conversavam com as

mãos) em todos os lugares em que estavam. Na igreja, nos ônibus, nas praças e nos

bancos. Em diversos momentos, a conversa demorava horas em língua de sinais. Desde

os anos 80, segundo Rosa (2006, p. 110), esse é um dos motivos pelos quais os ILS

mais proficientes – exceto os filhos ouvintes de pais surdos – serem oriundos de

instituições religiosas. Gurgel e Lacerda (2011), em sua pesquisa realizada sobre os

TILS e o ambiente religioso e a formação, percebe o número significativo de integrantes

dessa categoria, cujo desenvolvimento se deu no âmbito da igreja, como vemos a seguir:

Em relação ao início da atuação como TILS, dos entrevistados 41% refere ter

se tornado intérprete pelo contato com surdos (familiares e ou comunidade

surda) dentro de espaços religiosos. Tal achado corrobora dados da literatura

que indicam que muitos intérpretes se formaram no espaço religioso que

cumpre papel de destaque e marca modos de ação dos TILS (ROSA, 2006).

Nas religiões, um foco privilegiado é trazer mais adeptos para a crença ou fé

professada, além do aspecto caridoso e de cuidados. É nesse contexto que,

muitos dos entrevistados se tornaram intérpretes, e nesta perspectiva pode-se

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inferir que, esta abordagem se manifeste em seus modos de constituição e

que, a ideia de ajuda e caridade, estejam presentes, por vezes, no cenário

acadêmico. (GURGEL E LACERDA, 2011. P.489).

Embora esse tenha sido o primeiro grande crescimento da área, suas bases foram

fundamentadas nos anos 60 com a chegada ao Brasil do padre Eugenio Oates, autor do

livro Linguagem das mãos (1988). Esse foi considerado o primeiro Glossário da Língua

Brasileira de Sinais. Embora ainda não tivesse ocorrido o reconhecimento do status de

língua, em sua obra Oates (ibid) já percebia aspectos fonológicos e morfológicos em sua

descrição inicial. Posteriormente, a obra serviu como base de bibliografias em diversos

cursos de língua de sinais, não só como fonte consultiva, mas, de certa forma, como

estruturador, uma vez que sua organização dos sinais por campos semânticos

influenciou o ensino da língua de sinais a época. (TUXI, 2017)

Outra literatura bastante utilizada e difundida no Brasil foi o livro O Clamor do

Silêncio(1991). Esse, de cunho mais ideológico, trazia experiências de missionários que

já haviam fundado ministérios com surdos.

A obra que tem como característica a percepção dos surdos sobre um

determinado prisma salvífico, prescrevendo orientações para a condução dos ministérios

em cada congregação. Conforme analisa Assis Silva:

O intérprete deve ter a consciência de que não é apenas a ponte entre o pastor

e o surdo, mas é também o canal para transmitir a mensagem de Deus.

Humanamente falando, o surdo depende do intérprete para participar do culto

e receber a mensagem do Senhor. Por isso, assim como a água não pode

passar pelo cano se estiver entupido, da mesma forma o intérprete não pode

transmitir a mensagem de Deus se não estiver com a vida santificada (Junta

de Missões Nacional - O Clamor do Silêncio, p. 24 apud ASSIS SILVA,

p.11, 2008)

A comunidade surda, sedenta por informações e por participação, passou a

conviver de forma mais sistemática com os tradutores e intérpretes de Libras em outros

espaços além dos religiosos. A convivência representava aspectos positivos para ambas

as partes, pois um conseguia entender e se fazer entendido, e o outro tinha uma

possibilidade ainda maior de aprendizado da língua.

Os ambientes religiosos, por necessidade de propiciar acesso à doutrina à

comunidade surda, favorecem a aprendizagem edesenvolvimento da fluência

em Libras criando condições para que pessoas interessadas atuem como

intérpretes mediando situações mais ou menos formais entre surdos e

ouvintes. Deste modo, o intérpretese molda às demandas da prática e vai

constituindo-se como TILS nas e pelas experiências vivenciadas.”

(LACERDA e GURGEL, 2011. P.483)

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No entanto, como todo agrupamento humano, havia disputas de poder. E as

relações, em determinados períodos se davam de forma tensa: pois em alguns casos o

surdo, que desempenhava o papel de professor da língua, estava no poder e em outros, o

ouvinte, membro da cultura hegemônica, utilizava-se do status quo, consciente ou

inconscientemente, para exercer poder sobre o surdo.

Além disso, a visão assistencialista, impregnada pelo pensamento de “trazer um

surdo para Cristo”, proporcionava em muitos casos uma confusão de papéis que, ora

produzia a situação de refém, por medo de perder “a alma”, ora produzia uma

dominação por ser detentor dos conhecimentos bíblicos e da salvação.

De toda forma, o fato é que a possibilidade de estar em constante aprendizado

trouxe aos ouvintes uma facilitação do aprender da língua em um contexto de imersão,

para além das salas de aulas. E isso impulsionou a própria atividade de interpretação

comunitária que ocorria quase que todo o tempo.

O desenvolver do contato externo, ou seja, além do espaço religioso, se tornou

mais forte com o surgimento das associações de surdos, que passou a ser um novo local

de formação de tradutores e intérprete de língua de sinais.

ASSOCIAÇÕES DE SURDOS

As associações de surdos foram espaços significativos para o aprendizado da

língua de sinais pelos TILS, além disso, eram também locais de aquisição de primeira

língua entre os próprios surdos. Em um período que a educação não era acessível, que a

língua de sinais não era difundida, ou muitas vezes proibida, os surdos tinham nesses

espaços um reduto social, político e intelectual, no qual tinham a liberdade de serem si

mesmos, sem os cerceamentos de ouvintes que corriqueiramente se incomodavam com

os sons emitidos por eles ou com a própria sinalização (STROBEL, 2008).

As associações buscavam oferecer espaços livres das influências dominadoras da

sociedade que os oprimia. Muitas vezes, eram nas associações que se mantinham

contato com surdos de outros municípios e até de outros estados. Esse período que

ocorre entre as décadas de 80 e 90. No que diz respeito às tecnologias, a internet ainda

não era uma possibilidade social e os telefones utilizavam apenas a voz. (STROBEL,

2008). Dessa forma, o contato face to face (cara a cara) era não apenas a forma mais

eficaz de comunicação, mas também a mais privada. Sem esse (contato), eles

dependiam de um ouvinte que interpretasse suas ligações telefônicas.

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As associações, portanto, foram durante muitos anos o principal locus de

encontro, debate e problematização dessa comunidade. E em muitos casos, também

possuíam outras finalidades.

Frequentemente, os dirigentes das associações interviam nas relações

trabalhistas das instituições que contratavam surdos, sanando conflitos, esclarecendo

procedimentos e orientando os surdos que, por não terem tido nenhuma recepção

contextualizadora do mundo do trabalho e de suas implicações, eram enquadrados como

indisciplinados e rebeldes pela chefia (STROBEL, 2008). Nesses espaços de

intercomunicação, surdos, associações e locais de trabalhos estavam o intérprete de

língua de sinais. Levado quase sempre pelo surdo e sem formação específica de como

atuar no contexto social, exercia um papel de “amigo do surdo”, ou seja, aquele que

vinha com a missão de salvar e resolver o processo de comunicação entre as partes.

(ROSA, 2006)

Situado, de forma sucinta no três parágrafos acima, o contexto social do surdo se

dava principalmente nas atividades mencionadas: i) igrejas; ii) associações e iii)

contextos de trabalhos que segundo Strobel (2008) e Perlin (2003) não eram

acessíveis. Faz-se necessário destacar que estamos abordando e caracterizando essa fase

para então introduzir a experiência vivenciada por intérpretes nesses espaços de

resistência cultural tão importante para comunidade surda.

Imersos no “olho do furacão”, os intérpretes tinham a possibilidade de vivenciar

a Libras em diversas esferas, como em idas a cartórios, discussões com políticos da

cidade, viagens para outros estados em torneios realizados pelas federações e pela

Confederação Desportiva de Surdos, aniversários de associações parceiras etc. E o

intérprete acompanhava-os em todos os eventos e reuniões. (AGUIAR, 2006)

E entre uma e outra resolução de problemas, as vidas se desvelavam, os laços se

estabeleciam. E a percepção das diversificadas identidades dos surdos se formava no

mapa conceitual que o ouvinte reformulava, percebendo agora à sua frente um sujeito

autônomo, de múltiplas capacidades, em uma sociedade que os limita por não

compreendê-los. Esse engajamento possibilitou a muitos intérpretes um aprendizado

ímpar, não só de aprofundamento da língua, como também de mudança de paradigma

na sua relação cotidiana com uma extensa e diversa gama de surdos.

Como resultado dessa relação, surdos e intérpretes, o espaço social se amplia e

de acordo com Leite (2005), os TILS passam a desempenhar atividades em eventos com

fins de políticas públicas, mesmo a Libras não sendo ainda reconhecida. E como marco

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histórico ocorre à primeira convocação oficial de intérprete no então Instituto Nacional

de Surdos-Mudos, sediado no Rio de Janeiro. Conforme registros o único profissional

que ali “sabia” língua de sinais, era o senhor Francisco Esteves, um funcionário da parte

administrativa, muito estimado pelos alunos. Comunicava-se muito bem com todos os

surdos, nos momentos informais. A autora destaca ainda que essa comunicação

acontecia apenas nos pátios ou nos portões da escola, pois dentro dos auditórios ou nas

salas de aula não era permitido fazer os sinais.

E no ano de 1988 devido à elaboração da Constituição Brasileira, é criada uma

comissão composta por Ana Regina e Souza Campello e João Carlos Carreira Alves,

surdos, que tinham como intérprete Denise Coutinho, primeira pessoa a interpretar em

eventos oficiais e públicos. Nesta mesma época, pela primeira vez o Hino Nacional é

interpretado em língua de sinais em um evento oficial. Quem o faz é o Tradutor

Intérprete de Língua Brasileira de Sinais Ricardo Sander. ( LEITE, 2005)

E a partir desses movimentos sociais e da necessidade dos tradutores e

intérpretes como fonte mediadora entre línguas ocorrem o I Encontro Nacional de

Intérpretes de Língua de Sinais, organizado pela Federação Nacional de Educação e

Integração do Surdo – FENEIS. Institui-se pela primeira vez, em 1888, um evento

oficial com o objetivo específico para os tradutores e intérpretes o que oportuniza um

intercâmbio entre ILS de diversas partes do Brasil, que até o momento não havia

ocorrido.

O II Encontro Nacional de Intérpretes de Língua de Sinais demora, mas

consegue ocorrer em 1992. Também organizado pela FENEIS, traz a grande novidade

de criação do Código de Ética3. O código do Brasil foi construído a partir de uma

tradução feita por Ricardo Sander do código de ética americano – Interpreting for Deaf

People (1965). Para Leite (2005), e o primeiro documento que traz uma definição sobre

o intérprete de língua de sinais e suas funções:

O intérprete deve ser um profissional bilíngüe; reconhecido pelas

associações e/ou órgãos responsáveis; intérprete e não explicador;

habilitado na interpretação da língua oral, da língua de sinais, da

língua escrita para a língua de sinais, e da língua de sinais para a

língua oral (CORDE 1996, p. 08).

3 Veja na obra o Tradutor e Intérprete de Língua Brasileira de Sinais e Língua Portuguesa em Código de

Ética em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/tradutorlibras.pdf (MEC, 2004, p.31)

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É importante destacar que os movimentos acima mencionados, foram, segundo

Tuxi (2009), possibilidades que o TILS teve para identificar os vários meios de atuação

e conhecer os novos espaços de formação. Porém foi com a regularização da Língua

Brasileira de Sinais – LIBRAS pelo Decreto 10.4364e a regulamentação da mesma pelo

Decreto 5626/20055 que toda característica de formação religiosa ou assistencialista

muda para um caráter de legislação e espaço de formação oficial.

1.2A LEGISLAÇÃO E O TRADUTOR INTÉRPRETE DE LÍNGUA DE SINAIS

A Libras veio a ser regulamentada no Brasil, na primeira década do nosso

século. Sua utilização e difusão, até o surgimento do marco legal, ocorria

principalmente nas instituições religiosas e nas associações de surdos, como já foi

explicado acima. A partir da promulgação e oficialização da Libras por meio da Lei nº

10.436, de 24 de abril de 2002 que dispõe que:

Art. 1º É reconhecida como meio legal de comunicação e expressão a Língua

Brasileira de Sinais - Libras e outros recursos de expressão a ela associados.

Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais - Libras a

forma de comunicação e expressão, em que o sistema linguístico de natureza

visual-motora, com estrutura gramatical própria, constituem um sistema

linguístico de transmissão de ideias e fatos, oriundos de comunidades de

pessoas surdas do Brasil. (BRASIL- 2002)

A Lei em questão, quando de sua proposição, apenas oficializou a língua como

forma de comunicação e expressão do sujeito surdo, sem mencionar o Tradutor e

Intérprete de Libras- TILS6. A menção a esse profissional, em documentos oficiais,

surge com a edição do Decreto nº 5.626 de 2005, que regulamenta a Lei n. 10.436/2002,

no artigo 14, inciso b, “a tradução e interpretação de Libras – Língua Portuguesa”

(BRASIL, 2005).

O capítulo V do Decreto supramencionado versa sobre a formação do Tradutor e

Intérprete de Libras- Língua Portuguesa, estipulando que a formação deste deve ocorrer

por meio de curso superior de tradução e interpretação, com habilitação em Libras –

4 Acesse a Lei 10.436 de 2002 em http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/lei10436.pdf

5 Acesse o Decreto 5626 de 2005 em http://portal.mec.gov.br/seesp/arquivos/pdf/decreto%205296-

2004.pdf

6Tradutor e intérprete de Libras: termo utilizado em documentos oficiais brasileiros para designar o

profissional que atua mediando às enunciações discursivas entre falantes de línguas diferentes, e que, no

caso específico, se dá entre a Libras e a Língua Portuguesa.

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Língua Portuguesa, mas menciona, ainda, outras possibilidades formativas ou

exigências mínimas necessárias para a realização dessa atividade, a saber:

Art. 18. Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste Decreto, a

formação de tradutor e intérprete de Libras - Língua Portuguesa, em nível

médio, deve ser realizada por meio de:

I - cursos de educação profissional;

II - cursos de extensão universitária; e

III - cursos de formação continuada promovidos por instituições de ensino

superior e instituições credenciadas por secretarias de educação.

O capítulo VI, que aborda a garantia do direito à educação das pessoas surdas ou

com deficiência auditiva, trata da organização necessária para a acessibilidade nas

instituições de educação do ensino fundamental e médio da educação básica, do ensino

profissionalizante e do Ensino Superior. Nesses, os TILS aparecem como viabilizadores

da acessibilidade, realizando tradução e interpretação em sala de aula, assim como nos

demais espaços pedagógicos, o que inclui a modalidade de educação à distância por

meio de Janela de Libras7.

A partir disso, surge a necessidade cada vez maior de regulamentação da

profissão do Tradutor e Intérprete de Libras. Essa conquista se materializa com a Lei nº

12.319, de 01 setembro de 20108. A norma regula a profissão, prescreve as

competências e indica as categorias de formação mínima para exercê-la. Sua

conceptualização ancora-se no Decreto 5.626/2005 e no código de ética, que é parte

integrante do Regimento Interno do Departamento Nacional de Intérpretes da

Feneisaprovado em 1992 no II Encontro Nacional de Intérpretes, realizado por essa

federação na cidade do Rio de Janeiro, conforme citamos no tópico anterior.

O código de ética, norteador da regulamentação da profissão e que como já

explicamos foi inspirado na tradução do código de ética de 1965 dos Estados Unidos,

possui um viés bastante moralizante sobre a profissão de intérpretes de Libras e prioriza

aspectos atitudinais do profissional.

7 Consideramos como Janela de Libras “O espaço destinado à tradução entre uma língua de sinais e outra

língua oral ou entre duas línguas de sinais, feita por Tradutor e Intérprete de Língua de Sinais (TILS), na

qual o conteúdo de uma produção audiovisual é traduzido num quadro reservado, preferencialmente, no

canto inferior direito da tela, exibido simultaneamente à programação”. (NAVES etall, 2016, p. 15-16

Guia para Produções Audiovisuais Acessíveis do Ministério da Cultura)

8 Acesse a Lei 12.319 de 2010 em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-

2010/2010/lei/l12319.htm

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Podemos constatar já no primeiro parágrafo: “1°. O intérprete deve ser uma

pessoa de alto caráter moral, honesto, consciente, confidente e de equilíbrio emocional.

Ele guardará informações confidenciais e não poderá trair confidencias, as quais foram

confiadas a ele” (BRASIL, 2010). Assim fica evidente que o discurso de moralidade é o

foco maior de formação do tradutor e intérprete e que este deve ser confidente e de

equilíbrio emocional. Em momento algum há referência à competência,

profissionalismo ou mesmo formação mínima para atuar na área.

No décimo primeiro parágrafo, é ainda mais moralista: “O intérprete deve

procurar manter a dignidade, o respeito e a pureza das línguas envolvidas. Ele também

deve estar pronto para aprender e aceitar novos sinais, se isso for necessário para o

entendimento” (BRASIL, 2010).

Estes dois exemplos são os mais emblemáticos desse caráter moralizadore,no

entanto, essa estética discursiva se mantém nos parágrafos 2, 3, 5, 6, e 8. Estas

similaridades entre o Código de Ética e as leis que regulamentam a profissão dos TILS

podem ser observadas em todos os seis incisos do artigo sétimo. Fato que indica a

possibilidade desses artigos serem criados sobre forte influência do Código de Ética da

FENEIS, inclusive por ter sido um dos poucos parâmetros de embasamento para os

profissionais em um período anterior às legislações específicas.

Contudo, apesar da regulamentação da profissão, quando da sanção presidencial,

verificou-se a vedação aos artigos que mencionavam a necessidade de formação ser

realizada por ensino superior, contrariando o Decreto 5626/2005. Ou seja, limitando-se

apenas, ao segundo artigo quarto, à formação profissional em nível médio, conforme se

verifica:

I - cursos de educação profissional reconhecidos pelo Sistema que os

credenciou;

II - cursos de extensão universitária; e

III - cursos de formação continuada promovidos por instituições de ensino

superior e instituições credenciadas por Secretarias de Educação. (BRASIL,

2005).

A formação em nível médio é a mesma descrita no Decreto 5626/2005, ou seja:

não há qualquer inovação. Na verdade temos um movimento contrário, pois na lei de

regulamentação dos tradutores e intérpretes é retirada a necessidade de formação em

nível superior, o que posteriormente seria lamentado por todos que atuam na área. Ao

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vetar essa formação de nível superior como obrigatória, a lei permite que a formação

que ocorria ao longo de todos esses anos, permaneça.

Assim, a partir desse levantamento feito verificamos que as legislações sobre o

Tradutor e Intérprete de Língua Brasileira de Sinais se baseiam ora na área educacional,

ora em aspectos de conduta, os quais não contemplam as diversas áreas de atuação. Ou

seja, a atuação do TILS em espaços outros que não sejam os mencionados, sequer é

cogitada.

Uma medida paliativa que foi tomada no ano de 2006, como forma de cumprir o

decreto de regulamentação da língua de sinais foi a criação de um Exame Nacional de

Proficiência em Libras o Prolibras, o qual será abordado no subtópico adiante.

1.2.1 ProLibras

Com o reconhecimento oficial da Libras como língua da comunidade surda

brasileira, por meio da Lei 10.436/2002, e com a sua regulamentação no Decreto de nº

5.626/2005, o Ministério da Educação criou um dispositivo para avaliar a proficiência

dos instrutores e professores da língua, bem como dos tradutores e intérpretes. Este

exame foi denominado Prolibrase segundo Quadros:

O exame Prolibras é uma combinação de um exame de proficiência

propriamente dito e uma certificação profissional proposto pelo Ministério da

Educação como uma ação concreta prevista no Decreto n. 5.626/2005,

decreto que regulamenta a Lei n. 10.436/2002, chamada “Lei de Libras”.

Basicamente,esse exame objetiva avaliar a compreensão e produção na língua

brasileira de sinais – Libras. O exame Prolibras não substitui a formação em

todos os níveis educacionais. (QUADROS, 2009. p. 23).

O Prolibras foi um exame criado para atender aos critérios exigidos no Decreto

acima citado. Havia a obrigatoriedade de se oferecer os serviços tradutórios e de ensino,

contudo como o curso de formação superior, que também teve início no ano de 2006 só

formaria a primeira turma em 2010, havia uma lacuna de quatro anos a ser preenchida.

Dessa forma surge o Exame de proficiência em Libras. Segundo Quadros “O exame

Prolibras é um exame de proficiência que objetiva certificar instrutores e professores de

língua de sinais e tradutores e intérpretes de língua de sinais.” (QUADROS, 2009, p.9)

Esse exame não foi criado como um modo paliativo de formação, pois há um

prazo para sua existência. Conforme estipula o Decreto 5.626/2005, nos artigos sétimo e

oitavo, da seguinte forma:

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Art. 7º Nos próximos dez anos, a partir da publicação deste Decreto, caso não

haja docente com título de pós-graduação ou de graduação em Libras para o

ensino dessa disciplina em cursos de educação superior, ela poderá ser

ministrada por profissionais que apresentem pelo menos um dos seguintes

perfis:

I – professor de Libras, usuário dessa língua com curso de pós-graduação ou

com formação superior e certificado de proficiência em Libras, obtido por

meio de exame promovido pelo Ministério da Educação;

II – instrutor de Libras, usuário dessa língua com formação de nível médio e

com certificado obtido por meio de exame de proficiência em Libras,

promovido pelo Ministério da Educação;

III – professor ouvinte bilíngue: Libras – Língua Portuguesa,com pós-

graduação ou formação superior e com certificado obtido por meio de exame

de proficiência em Libras, promovido pelo Ministério da Educação.

Art. 8ºO exame de proficiência em Libras, referido no art. 7º, deve avaliar a

fluência no uso, o conhecimento a competência para o ensino dessa língua.

§ 1ºO exame de proficiência em Libras deve ser promovido, anualmente,

pelo Ministério da Educação e instituições de educação superior, por ele

credenciadaspara essa finalidade.

§ 2ºA certificação de proficiência em Libras habilitaráo instrutor ou o

professor para a função docente.

§ 3ºO exame de proficiência em Libras deveser realizado por banca

examinadora de amploconhecimento em Libras, constituída por

docentessurdos e linguistas de instituições de educação superior. (BRASIL,

2005)

Apesar de ter um caráter temporário, o Prolibras passou a ser um certificado

valioso, pois é hoje um instrumento de seleção entre os TILS. No âmbito do legislativo,

por exemplo, na TV Câmara, o TILS deve ter uma formação de nível superior e

obrigatoriamente possuir o Prolibras em Tradução e Interpretação de nível médio ou

superior9. Nas instituições de nível superior, como universidades federais, para se tornar

um servidor publico da área é obrigado a ter o Prolibras.

O exame Prolibras certifica o tradutor-intérprete de língua de sinais para

atuar em diferentes contextos de tradução e interpretação. No entanto, a

formação nessa área é fundamental, pois a função desse profissional exige

profissionalismo e preceitos éticos, uma vez que eles intermediam relações

entre pessoas que usam diferentes línguas e tomam a palavra do outro para

passar a outro. (QUADROS, 2009, p. 21).

Apesar de todo o caráter regulamentador, esse exame não contempla as diversas

áreas de atuação. Seu texto se baseia em quesito contrastivo da língua e na prática da

tradução entre as estruturas da Libras e da Língua Portuguesa.

9 As duas primeiras provas realizadas no Brasil tiveram a distinção entre Tradutor Intérprete de Nível

Superior e Tradutor Intérprete de Nível Médio. Atualmente essa distinção não mais ocorre, sendo apenas entregue o certificado de proficiência em nível médio.

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Para Quadros (2009) o exame certifica, mas não forma. A autora deixa clara a

necessidade da formação em sentido acadêmico para que o trabalho do TILS ocorra de

forma no mínimo satisfatória para as partes envolvidas na mediação linguística. Dessa

forma o nosso próximo tópico é acerca da formação superiordos tradutores intérpretes e

se essa contempla realmente todos os campos de atuação, que no caso dessa pesquisa é

o cultural.

1.2.2Bacharelado em Tradução de Língua de Sinais: um panorama

Para identificar se na base de formação dos cursos acadêmicos de Tradução e

Interpretação está presente alguma formação voltada para a área da cultura, artes

cênicas ou de textos sensíveis, realizamos uma busca pelos cursos de graduação de

Tradutores e Intérpretes de Língua Brasileira de Sinais no Brasil.

A busca foi feita por meio da web, dentro dos sites específicos das universidades

pesquisadas. Vale informar que até o momento dessa dissertação, os cursos de

bacharelado com formação de tradutores e intérpretes, restringem-se a universidades

federais, ou seja, no âmbito estadual e nas outras Instituições de Ensino Superior – IES

esse campo ainda não foi aberto.

Como resultado,no primeiro momento, foi possível identificar a quantidade de

universidade que possuem o curso. No Brasil temos seis universidades federais que já

possuem o curso com foco na formação de bacharéis em tradução e interpretação da

Língua Brasileira de Sinais / Língua Portuguesa. Nestas tivemos acesso ao Projeto

Político Pedagógico, documento legal, e analisamos a grade curricular. A partir dessa

verificação foi possível realizar a identificação, ou não, de disciplinas que possibilitem a

formação do TILS na área cultural.

O primeiro curso de Bacharelado em Letras com foco na Tradução e

Intepretação da Língua de Sinais Brasileira e Língua Portuguesa foi criado inicialmente

em 2008, por força de justiça,que interpôs à Universidade Federal de Santa Catarina

(UFSC) a necessidade de um curso que atendesse, nos parâmetros da lei, a comunidade

não-surda, a qual não foi contemplada no vestibular realizado em 2006 pela mesma

instituição.No ano de 2006, a UFSC ofertou vagas preferenciais para surdos para

ingresso no curso de Licenciatura de Língua Brasileira de Sinais. Essa criação veio em

resposta ao Decreto 5626/2005, o qual evidencia seu caráter preferencial, para que o

ensino da Libras seja ministrado por surdos. Assim, no intuito de atender os

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profissionais não-surdos que atuavam na área, a Universidade Federal de Santa Catarina

(UFSC) cria o primeiro curso no Brasil de Bacharelado em Língua Brasileira de

Sinais.(QUADROS, 2014, p. 11)

É importante destacar que a criação de cursos acadêmicos voltados para essa

área representa um avanço para a profissão e, consequentemente, para a formação, que

até o momento ocorria por meio de cursos oferecidos pelas associações de intérpretes,

escolas inclusivas, igrejas e demais espaços onde há TILS.

Contudo as grades dos cursos foram criadas por cada uma das universidades, ou

seja, não possuem grades equivalentes entre as universidades. Essa autonomia é

interessante, pois cria o curso à imagem do desejo e necessidade local, mas tem seu lado

não tão interessante que e quanto a formação mínima que esse profissional deve ter.

Nesta pesquisa acreditamos na necessidade de uma formação do tradutor para

atuar em peças teatrais, eventos culturais enfim o que envolva elementos literários e

estéticos. Para tanto decidimos realizar um melhor detalhamento e compreensão da

formação que hoje é oferecida aos TILS no Brasil, buscamos nas grades curriculares, ou

fluxos de curso das seis universidades federais do Brasil que oferecem tais cursos,

disciplinas que tenham o olhar da tradução no meio teatral.

Para melhor compreensão da nossa análise, organizamos na forma de Anexo I as

grades curriculares das seis universidades federais. Em seguida optamos por buscar,

dentro da grade, disciplinas que tenham como foco específico a tradução cultural, que é

o foco desta pesquisa. Por fim realizamos breves comentários acerca da estrutura do

conteúdo da disciplina, baseados na ementa do curso.

Iniciamos a nossa análise a partir do primeiro curso criado pela Universidade

Federal de Santa Catarina - UFSC, considerada até hoje como o berço de pesquisas da

área de Tradução e Interpretação da Língua Brasileira de Sinais.

I. Bacharelado em Letras Língua Brasileira de Sinais da Universidade Federal de

Santa Catarina – UFSC.

O Curso de Bacharelado em Letras Língua Brasileira de Sinais foi criado como

resposta às determinações legais referentes ao reconhecimento da língua de sinais no

Brasil. No que diz respeito ao bacharelado, a UFSC oferece 20 (vinte) vagas para

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bacharelado e descreve o perfil do profissional como sendo este apto para atuar como

Tradutor/Intérprete de Libras-Português em diferentes contextos institucionais.

O Bacharelado está organizado em um mínimo de 8 (oito) períodos,perfazendo

um total de 3.708 horas-aula sendo: 576 h/a de conhecimentos básicos da área; 1.800

h/a de conhecimentos específicos; 792 h/a de formação profissional (incluídas 324 h/a

de prática como componente curricular e as 216 h/a de estágio supervisionado); 252 h/a

de atividades acadêmico científico-culturais e 288 h/a de disciplinas optativas. A

organização curricular compreende os seguintes eixos:

Conhecimentos básicos da área: articulam os conhecimentos fundamentais

para os estudos linguísticos, bem como os de natureza específica da visão histórica e

humanística da organização escolar;

Conhecimentos específicos: envolvem conhecimentos de Libras. Compreendem

o conjunto de disciplinas que possibilitam a construção do perfil do profissional da área

de Letras/Libras. Constituem o núcleo responsável pelo desenvolvimento de

competências e habilidades próprias do professor de primeira e de segunda língua.

Exploração de tecnologias de comunicação.

Conhecimentos de formação profissional (no bacharelado): constituem o

núcleo de disciplinas responsáveis pela construção do perfil para o tradutor e intérprete

de língua de sinais brasileira e língua portuguesa e que possibilitam o desenvolvimento

de competências e habilidades que garantam o desempenho profissional. Neste núcleo,

promovem-se discussões teóricas envolvidas nos processos de tradução e interpretação

de línguas, especificamente, das línguas envolvidas no curso. Também são discutidos

aspectos da ética profissional do tradutor e intérprete, bem como o seu papel nas

relações entre as comunidades linguísticas envolvidas. Analisam-se os processos

cognitivos, sociais, culturais e linguísticos envolvidos na tradução e/ou interpretação de

línguas, considerando especialmente os efeitos de modalidade de línguas (a língua de

sinais em uma modalidade visual-espacial e a língua portuguesa em uma modalidade

oral auditiva), bem como suas representações escritas (ideográfica e alfabética).

Diante da grade curricular proposta, entendemos que não há disciplinas que

tenha como objetivo a tradução cultura. Porém observamos disciplinas que podem

auxiliar na formação do tradutor nessa área, são elas:

- Literatura Surda I – a disciplina tem como objetivo apresentar a Introdução à

Literatura Surda. Busca demonstrar a expressividade estética e literária nas línguas de

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sinais. Define o gênero narrativo sua estrutura e funções. Trata da realidade e ficção e

dos Tipos de narrativa em língua de sinais;

- Literatura Surda II – a disciplina tem como objetivo apresentar a Literatura surda no

Brasil e no mundo. Traz também o gênero poético, as funções da poesia e os tipos de

poesia em línguas de sinais. Aborda a poesia e a criatividade linguística. Descreve a

prática em poesia. Conceitua as metáforas e outros recursos literários em língua de

sinais e

- Prática de Tradução II – a disciplina tem como objetivo apresentar a prática

tradutória envolvendo a escrita de sinais e os estudos de expressões literárias da cultura

surda. Trabalha com a edição de textos e direitos autorais.

Após analisar a grade curricular, foi possível perceber que não há disciplinas

específicas para a área de Tradução Cultural. O que identificamos foram disciplinas

voltadas para a Literatura, que podem auxiliar no processo de tradução cultural.

Portanto, apesar de ser o primeiro curso da área de Bacharelado de Língua de Sinais,

esse não contemplou todas as áreas de atuação da tradução e interpretação, em especial

a área cultural.

II. Curso de Bacharelado em Tradução e Interpretação em Língua Brasileira de

Sinais (Libras)/Língua Portuguesa na Universidade Federal de São Carlos -

UFSCar

O curso de Bacharelado em Tradução e Interpretação em Língua Brasileira de

Sinais Libras/Língua Portuguesa da UFSCar foi criado em 16 de dezembro de 2013, no

Campus São Carlos. Para que o curso ocorresse, o Ministério da Educação

disponibilizou 08 (oito) vagas docentes e 08 (oito) vagas de técnico-administrativos

(sendo 02 (duas) de nível E e 06 (seis) de nível D). Além disso, liberou recursos

financeiros, disponíveis em uma destinação deR$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais)

para investimento e em quatro destinações (uma por ano durante quatro anos) de R$

75.000,00 (setenta e cinco mil reais) para custeio do curso. O curso é de Modalidade

presencial e disponibiliza 30 (trinta) vagas. A carga horária total é de2.940 horas e o

diploma conferido é de Bacharel(a) em Tradução e Interpretação em Língua Brasileira

de Sinais (Libras)/Língua Portuguesa.

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Nesse curso, o profissional deverá ter, ao final, competência para garantir a

comunicação nos mais diversos espaços sociais, tais como nas esferas educacional,

legal, governamental e da saúde, como também em eventos diversos, em que sua

presença seja necessária.

Para atingir esse objetivo, a estrutura curricular do curso prevê disciplinas

obrigatórias de caráter teórico e prático voltadas à formação do Bacharel em Tradução e

Interpretação de Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) / Língua Portuguesa. Nesse

sentido, o curso organiza-se a partir de quatro eixos estruturantes: i) eixo A – referente a

Libras; ii) eixo B – referente à língua, linguagem e cultura; iii) eixo C – Tradução e

interpretação e iv) eixo D – Processos de Desenvolvimento Humano e de

Aprendizagem. Abaixo, apresentamos o objetivo e conteúdo de cada eixo na Grade

Curricular.

O eixo A abarca as disciplinas referentes à aprendizagem e aos usos da Libras, e

é estruturante e indispensável ao aluno que pretende se tornar Tradutor e Intérprete.

Apresenta caráter prático, dada a visualidade da língua em questão, e visa a prática

discursiva em Libras, de forma que o aluno adquira conhecimentos aprofundados sobre

essa língua e também fluência na mesma, capacitando-o para o exercício da tradução e

da interpretação. Estão compreendidas neste eixo as seguintes disciplinas: Libras I;

Libras II; Libras III; Libras IV; Libras V; Libras VI; Libras VII; Libras e os Parâmetros

Formacionais; Morfossintaxe: Libras; Gêneros textuais e Libras, Outras Línguas de

Sinais; Literatura em Libras.

O eixo B compreende as disciplinas que embasam os conhecimentos sobre

Linguística e Língua Portuguesa – nas modalidades oral e escrita –, bem como questões

concernentes à surdez, tais como desenvolvimento de linguagem, inclusão social e

aspectos culturais. Este eixo é composto pelas seguintes disciplinas: A ciência

Linguística; Leitura e Produção de Texto I; Linguagem e aspectos sócio-histórico da

Língua Portuguesa; Estudos da Oralidade; Leitura e Produção de Texto II; Fonética e

Fonologia: Língua Portuguesa; Políticas Públicas e Surdez; Morfossintaxe: Língua

Portuguesa; Leitura e Produção de Texto III; Português como segunda língua para

surdos; Leitura e Produção de Texto IV; Semântica, Pragmática e Discurso;

Multiculturalismo e Surdez.

O eixo C é composto por disciplinas voltadas à tradução e à interpretação da

Língua Portuguesa para a Libras e vice-versa, apresentando e consolidando os

conhecimentos sobre as línguas envolvidas nesses processos e promovendo ações

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práticas que contribuam para a atuação profissional do egresso. Este eixo pressupõe,

ainda, a apresentação dos diferentes espaços de atuação do futuro profissional,

promovendo conhecimentos específicos sobre cada um deles. As disciplinas

compreendidas neste eixo são: Introdução a Tradução e Interpretação e aos Estudos da

Surdez; Linguagem, Surdez e Educação; Tradução e Interpretação Consecutiva;

Tradução e Interpretação: atividade discursiva; Tradução e Interpretação na Esfera

Educacional I; Tradução e Interpretação I; Tradução e Interpretação na Esfera

Educacional II; Saúde Ocupacional do Tradutor e Intérprete de Libras; Tradução e

Interpretação II; Tradução e Interpretação na Esfera Educacional III; Tradução e

Interpretação em Eventos Científicos; Ética Profissional; Tradução e Interpretação na

Esfera da Saúde; Tradução e Interpretação nas Esferas Legal e Governamental.

O eixo D pode ser considerado como “estruturante”, posto que ofereça ao aluno

conhecimentos básicos e gerais sobre processos de desenvolvimento humano e de

aprendizagem. Este último eixo é composto pelas disciplinas: Desenvolvimento

Psicológico da Pessoa Surda; Aquisição e Desenvolvimento da Linguagem: Língua

Portuguesa; Aquisição e Desenvolvimento da Linguagem: Libras; Desenvolvimento,

aprendizagem e processos educacionais. O quadro abaixo sintetiza os eixos e as

disciplinas acima explicitados:

A partir da análise da Grade Curricular do Curso de Bacharelado em Tradução e

Interpretação da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, foi possível

compreender que não há, como disciplina registrada, uma área de pesquisa, de estudo ou

atuação voltada para a área de Tradução Cultural. Porém observamos disciplinas que

podem auxiliar na formação do tradutor nessa área, são elas:

- Literatura em Libras: a disciplina tem como objetivo apresentar os clássicos

da literatura nacional, poesia, metáforas em Libras. Também apresenta as manifestações

artístico-culturais em Libras relativas à esfera literária;

- Gêneros textuais e Libras: a disciplina tem como objetivo apresentar os

aspectos linguísticos da produção textual em Libras em diferentes gêneros discursivos;

- Surdez e visualidade: a disciplina tem como objetivo apresentar os aspectos

visuais e sua relação com estratégias de comunicação. Trabalha a relação de produção

de material visual em Libras e os aspectos visuais.

Como o curso de tradução da UFSC, fizemos uma analise da grade curricular,

foi possível perceber que não há disciplinas específicas para a área de Tradução

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Cultural. O que identificamos foram disciplinas voltadas para os aspectos Culturais, que

podem auxiliar no processo de tradução cultural. Portanto,mesmo sendo um curso com

foco na formação do tradutor e intérprete de Libras, este não contemplou todas as áreas

de atuação da tradução e interpretação, em especial a área cultural.

III - Curso de Bacharelado em Letras: tradução e interpretação em

Libras/Português No que diz respeito à Universidade Federal de Goiânia - UFG

O curso de Bacharelado em Letras: tradução e interpretação em

Libras/Português tem como objetivo a formação de tradutores e intérpretes de Libras

para Português e vice-versa, para atender às diversas demandas linguísticas existentes

na esfera social. O bacharel deste curso poderá também atuar em pesquisas no campo da

Linguística e da Tradução, bem como exercer funções que tenham como foco principal

a linguagem em uso, especificamente no que diz respeito à tradução e interpretação de

Libras para Português e vice-versa.

O curso de Letras - Tradução e interpretação em Libras/Português é composto

por disciplinas teóricas que dão suporte necessário à área de Letras (disciplinas do

Núcleo Comum), bem como por disciplinas específicas para a formação do tradutor e

intérpretes de Libras/Português (disciplinas do Núcleo Específico Obrigatório). A

participação do aluno nessas disciplinas garante uma formação profissional consistente

do bacharel em Letras: tradução e interpretação em Libras/Português por meio do

acesso a conhecimentos teóricos, técnicos e metodológicos.

Para a Faculdade de Letras da UFG, a formação de um profissional crítico,

reflexivo e investigativo, realiza-se de forma que esse possa exercer uma prática

cotidiana de formação continuada, considerando o eixo temático do curso: a linguagem

humana.

A partir da análise da Grade Curricular do Curso Bacharelado em Letras:

tradução e interpretação em Libras/Português foi possível compreender que não há,

como disciplina registrada, uma área de pesquisa, de estudo ou atuação voltada para a

área de Tradução Cultural. Porém observamos disciplinas que podem auxiliar na

formação do tradutor nessa área, são elas:

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- Introdução aos Estudos Literários: a disciplina apresenta os conceitos

fundamentais da literatura, aborda os gêneros literários. E dá noções sobre o poema, a

narrativa e o drama;

- Literatura Surda: a disciplina apresenta diferentes produções literárias de

autores culturalmente surdos, com ênfase no conto, na piada, no poema e na

dramaturgia;

- Literaturas Africanas de Língua Portuguesa: a disciplina tem como foco o

estudo da história das literaturas africanas de língua portuguesa, da crítica literária de

autores paradigmáticos de Portugal e do Brasil e das obras poética e narrativa de autores

de referência de cada um dos países selecionados. Aborda também o ensino das

literaturas africanas de Língua Portuguesa;

Apesar de ser um curso recente e de sua estrutura possuir as duas habilitações,

ou seja, licenciatura e bacharelado percebemos que não há disciplinas específicas para a

área de Tradução Cultural. O que identificamos foram disciplinas voltadas para os

aspectos Culturais, que podem auxiliar no processo de tradução cultural.

Portanto,mesmo sendo um curso com foco na formação do tradutor e intérprete de

Libras, este não contemplou todas as áreas de atuação da tradução e interpretação, em

especial a área cultural.

A despeito de não haver a disciplina voltada para a Tradução cultural, foi

possível perceber que essa grade inclui a disciplina “Tópicos de História da Literatura”,

que representa um diferencial na formação dos TILS que atuam nessa área. Para Costa

(2013), os Estudos da Tradução mantiveram em seu surgimento uma relação com a

literatura, pois é a partir dos estudos literários que distinguimos os tipos de tradução

feitas e seus impactos nos contextos sociais que são constituídos pela literatura.

IV - Bacharel em Tradução e Interpretação em Língua Brasileira de Sinais/Língua

Portuguesa na Universidade Federal de Espírito Santo - UFES

O curso de Bacharelado da UFES em Tradução e Interpretação em Língua

Brasileira de Sinais/ Língua Portuguesa foi criado a partir de um esforço coletivo dos

docentes da UFES, das Associações de Surdos, da FEBRAPILS (Federação Brasileira

das Associações Profissionais Tradutores e Intérpretes e Guia-Intérpretes de LIBRAS) e

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da APILES (Associação de Profissionais Tradutores e Intérpretes e Guia-Intérpretes do

Espírito Santo).

O Curso de Letras-Libras com habilitação em Tradução e Interpretação em Língua

de Sinais/Língua Portuguesa tem como objetivo produzir e divulgar conhecimento nas

áreas de língua, literatura, tradução e cultura, buscando disponibilizar os meios que

possam contribuir para a capacitação do futuro bacharel, integrados à sociedade através

da formação de profissionais competentes, críticos e criativos.

O perfil do bacharel é o de um profissional apto para atuar como

Tradutor/Intérprete da Língua Brasileira de Sinais em diferentes contextos. A graduação

em Letras-LIBRAS (Tradução e Interpretação em Língua de Sinais/Língua Portuguesa)

é voltada especialmente à tradução/interpretação simultânea e também a de textos. Os

alunos se formarão a partir de práticas de tradução/interpretação (da Língua de Sinais

para a Língua Portuguesa) e versão (da Língua Portuguesa para a Língua de Sinais) de

textos gerais, literários, jurídicos, econômicos, técnicos e científicos. O curso terá como

foco final a capacidade de refletir a respeito dos problemas com os quais vai se deparar

durante a prática, para que possa construir alternativas teórico-metodológicas adequadas

à realidade social com a qual irá se confrontar no mercado de trabalho.

A concepção de organização curricular se apoia nos seguintes princípios

metodológicos: a) Criticidade: condições de analisar o movimento real da sociedade,

perceber as suas contradições e posicionar-se diante delas; b) Pluralidade: a abordagem

de questões através de diversos enfoques e princípios teórico-metodológicos,

orientando-se pela consciência de que o avanço científico e tecnológico viabiliza a

possibilidade de amplo debate e de confrontação de diferentes pontos de vista; c) Ética:

o compromisso social e o respeito à diversidade, às diferenças e ao processo de inclusão

social e d) Interação: consideração às experiências e aos conhecimentos existentes,

confrontando-os com os novos desafios e ampliando o intercâmbio constante.

- Estudos Literários I – a disciplina tem como objetivo apresentar os estudos

teórico e comparativo de questões relativas aos vários períodos literários ocidentais, em

especial aqueles que repercutiram em Portugal e no Brasil, abordados tanto em

perspectiva diacrônica quanto sincrônica;

- Tradução e Interpretação de textos sensíveis – a disciplina tem como objetivo

apresentar as possibilidades de Tradução da Bíblia. Tradução de sagrados. Destaque

também para análise de procedimentos e estratégias tradutórias de textos sagrados.

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Realiza tradução de textos de autoajuda e a análise e discussão de interpretações

religiosas em Língua de Sinais e

- Tradução de textos literários: a disciplina tem como objetivo apresentar a

possibilidade de discussão de temas referentes à transposição de obras e textos literários

fontes para textos traduzidos e/ou adaptados. Música como gênero literário e a

tradução/interpretação. Análise de tradução de textos literários clássicos para a Língua

de Sinais; aplicação de modelos teóricos e de estratégias de tradução; tradução de textos

literários clássicos para o português ou para a Língua de Sinais.

Nessa grade curricular, é a primeira vez que encontramos a disciplina de

Tradução e Interpretação de Textos Sensíveis e Tradução de Textos Literários. Portanto,

nesse curso há a preocupação de formar o TILS com um olhar diversificado e

principalmente atuante in loco. Com a possibilidade de estudar e conhecer esses

princípios de formação, o TILS passa a ter um diferenciador na sua área de atuação.

V - LETRAS/LIBRAS – BACHARELADO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE

RORAIMA (UFRR)

O presente projeto propõe uma reformulação do Curso de Letras/Libras -

Bacharelado, com vistas a agregar maior qualidade e consolidar a formação de

Tradutores e Intérpretes da Língua Brasileira de Sinais com aptidão, tanto para o

exercício profissional, quanto para a pesquisa. O curso de Letras/Libras - Bacharelado, a

ser ofertado na modalidade presencial, tem como proposição atender às demandas

postas pelas atuais políticas públicas de inclusão educacional para surdos, a exemplo do

que está previsto no Decreto 5626/2005, que tanto regulamenta a Lei de Libras

10.436/2002 como visa garantir a acessibilidade conforme previsto na Lei 5296/2004.

Deste modo, optou-se pela estruturação de um curso de bacharelado, voltado para a

formação de Tradutores e Intérpretes da Língua Brasileira de Sinais.

Assim, visando atender a esses preceitos, o curso de Letras/Libras – Bacharelado

da UFRR objetiva:

- Produzir e divulgar conhecimentos das áreas da Língua Brasileira de Sinais e

cultura surda;

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- Produzir e divulgar conhecimentos das áreas de tradução e interpretação da

Língua de Sinais/Língua Portuguesa e, ainda, sobre os processos e especificidades da

atuação profissional de tradutores-intérpretes de língua de sinais (TILS);

- Disponibilizar meios para a capacitação do futuro bacharel, inter-relacionando

os conhecimentos relativos à área de modo integrado a realidade social;

- Formar profissionais competentes, críticos e criativos, que possam responder

aos desafios próprios de sua função, considerando os aspectos sociopolíticos, culturais e

ideológicos envolvidos nos contextos de exercício profissional.

De acordo com os pareceres CNE/CES 492/2001 e CNE/CES 1363/2001, os

quais tratam das Diretrizes Curriculares Nacionais para os Cursos de Letras, entre

outros, o Curso de Letras/Libras - Bacharelado pretende formar profissionais que sejam

capazes de lidar com as linguagens nos contextos oral, sinalizado e escrito bem como

tratar com a interculturalidade construindo e propagando uma visão crítica

A partir da análise da Grade Curricular do Curso Bacharelado em Letras/Libras

– Bachareladofoi possível compreender que não há, como disciplina registrada, uma

área de pesquisa, de estudo ou atuação voltada para a área de Tradução Cultural. Porém

observamos disciplinas que podem auxiliar na formação do tradutor nessa área, são elas:

- Traducão e Gêneros Textuais Discursivos: a disciplina tem como objetivo

apresentarnoções de Gêneros, textual ou discursivo, no complexo panorama das

Ciências da Linguagem. O Lugar dos Gêneros nas práticas de Tradução. Gêneros e

Contextos com ênfase no Interacionismo Sócio-discursivo.

O curso apresenta apenas uma disciplina que pode auxiliar na formação do

tradutor, ou seja percebemos que não há disciplinas específicas para a área de Tradução

Cultural. O que identificamos foi uma disciplina voltada para os aspectos Culturais, que

podem auxiliar no processo de tradução cultural. Portanto, mesmo sendo um curso com

foco na formação do tradutor e intérprete de Libras, este não contemplou todas as áreas

de atuação da tradução e interpretação, em especial a área cultural.

Baseados nos levantamentos feitos, junto às leis, aos decretos, aos sistemas de

ensino, as grade curriculares, podemos afirmar que os cursos de Formação para

Tradutores e Interpretes de Libras no Brasil, não contemplam a formação para atuação

cultural. Essa constatação nos leva a pensar qual seria a formação ideal para esse

profissional.

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Dessa forma nos próximos capítulos apresentamos o que para nós é o caminho de

formação do tradutor e intérprete de Língua Brasileia de Sinais que atua no meio

cultural como discurso artístico e estético.

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CAPÍTULO 2

UMA FORMAÇÃO QUE CONTEMPLE ASPECTOS DA LINGUAGEM TEATRAL

Desde a antiguidade, o teatro vem acompanhando as discussões humanas das

questões mais íntimas, as de âmbito macro. Tais problematizações tem trazido luz para

as nossas formas de ver o mundo, pensar e agir. Nesse sentido, o teatro é um dos

elementos de difusão cultural importantíssimo, pois traz consigo as discussões de um

povo em um determinado contexto histórico, social e político. Dessa forma, “o teatro

está mais aí para enviar uma imagem global e uniforme do seu gosto pelo divertimento,

mas ele se afirma como obra de arte, como obra estética [...].” (DORT 1971, p.

58. apud FERAL 2014 p. 10).

Entretanto, um grupo significativo da população não tem acesso a essa produção.

Ao lembrar que a comunidade surda tem escrito, dirigido e produzido os seus próprios

espetáculos e essas iniciativas tem sido bastante exitosas com atores surdos e belíssimas

montagens. Todavia, há um número expressivo de produções apresentadas pela

comunidade majoritária ouvinte, com questões diversas e distintas formas de

enunciações e estéticas, as quais os surdos, até bem pouco tempo, não tinham qualquer

tipo de acesso, pela ausência de mecanismos inclusivos que possibilitassem que esses

assistissem a peças teatrais. De fato, como já dissemos no capítulo anterior, a legislação

tem sido modificada com o intuito de garantir o acesso da comunidade. Entretanto, ao

sanar uma questão da equação, outras tantas se apresentam. E uma delas é a formação

dos tradutores de libras para realizar essa função, uma vez que os mesmos não possuem

formação específica para essa atividade. O próximo capítulo tem como objetivo

apresentar questões do teatro pertinentes à sua tradução, considerando a complexidade

dessa linguagem cênica.

Com o objetivo de apresentar, mesmo que de forma inicial o universo cênico,

selecionamos alguns elementos fundamentais para conseguir exercer nosso espaço no

teatro.

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2.1 TEATRO E TEATRALIDADE

Tentando contextualizar o tradutor de Libras em uma atmosfera particular que é

a cênica, buscamos apresentar alguns elementos deste espaço, a fim de trazer alguma

familiaridade aos leitores deste trabalho.

De acordo com Pavis (2011), em seu Dicionário de Teatro, podemos observar

conceitos de elementos fundantes e estruturantes do Teatro. Partimos de alguns destas

definições para nos auxiliar na compreensão deste universo, a fim de esclarecer as

discussões levantadas em nosso trabalho.

A palavra teatro tem a sua origem na palavra grega theatron, cujo sentido aponta

para uma “propriedade esquecida, porém fundamental, desta arte:” (PAVIS, 2011:

372);[o teatro] é o espaço onde os espectadores observam uma ação apresentadas a eles

de outro lugar. Nesse sentido,ele é o local de onde o público assiste a uma ação que lhe

é apresentada de um outro lugar: é um “ângulo de visão” ou “um olhar”, no qual há um

certo deslocamento da relação desses raios ópticos de observação da representação

ocorrida em uma determinada edificação. O autor corrobora sua concepção a partir

deBarthes,o qual afirma:

O denominador comum a tudo o que se costuma chamar „teatro‟ em nossa

civilização é o seguinte: de um ponto de vista estático, um espaço de atuação

(palco) e um espaço onde se pode olhar (sala), um ator (gestual, voz) no

palco e espectadores na sala. De um ponto de vista dinâmico, a constituição

de um mundo „real‟ no palco em oposição ao mundo „real‟ da sala e, ao

mesmo tempo, o estabelecimento de uma corrente de „comunicação‟ entre o

ator e o espectador (BARTHES, 1964, p. 41-42 apud PAVIS, 2011, p. 373).

Para nós, será esta a conceituação de teatro adotada, para pensarmos em uma

tradução de Libras em um determinado espaço cênico. No entanto, faz-se necessário

refletir outro conceito a fim de complementar a compreensão deste universo.

Barthes, conforme citado por Pavis, propõe a discussão da qualidade de teatro

em termos de teatralidade. Afirma que, sem o conceito de teatralidade, a compreensão

deste universo fica prejudicada, pois as “espessuras de signos e sensações” estabelecidas

na cena em virtude do argumento escrito assemelham-se a uma “espécie de percepção

ecumênica dos artifícios sensuais, gestos, tons, distâncias, substâncias, luzes, que

submerge o texto sob a plenitude de sua linguagem exterior.” (BARTHES, 1964: 41-

42apud PAVIS, 2011, p.372).

Assim, “teatralidade no texto dramático é aquilo que, na representação ou no

texto dramático, é especificamente teatral (ou cênico) no sentido que o entende...”

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(PAVIS, 2011, p.372). Desta forma, podemos admitir que a teatralidade está relacionada

à expressividade, ao espaço, ao visual e à especificidade da enunciação teatral, a

qualdefine como “a projeção, no mundo sensível dos estados e imagens que constituem

suas molas ocultas [...] a manifestação do conteúdo oculto, latente, que acoita os germes

do drama” (ASAMOV, 1964, p.13 apud PAVIS, 2011, p.372).

No entanto, ainda percebemos a ocorrência de uma confusão entre dois

conceitos próximos e do mesmo campo epistemológico, mas de maneira alguma

sinônimos. A fim de sanar essa confusão conceitual,Pavis segmenta e explicita as

diferenças entre teatralizar e dramatizar. Para o autor: “teatralizar um acontecimento ou

um texto é interpretar cenicamente usando cenas e atores para construir a situação. O

elemento visual da cena e a colocação dos discursos são as marcas da teatralização.”

(BARTHES, 1964, p.41-42 apud PAVIS, 2011, p. 372).

Já a dramatização remete ao movimento oposto, o da manutenção do foco

exclusivamente na estrutura textual: inserção em diálogos, criação de uma tensão

dramática e de conflitos entre as personagens, dinâmica da ação (dramática ou épica).

Tendo em mente essas distinções, propomos discuti-las nas próximas partes por

entendê-las como pertinentes às problematizações para tradução de peças teatrais.

Assim, entende-se a dramatização a partir de uma reflexão sobre as particularidades do

texto dramático; a cena e o aspecto visual que concerne tanto o teatro quanto a libras; e,

nessa perspectiva, o conceito de teatralidade, teatralização e dramatização são de suma

importância para o tradutor de Libras que atuará no teatro, pois, a partir desses, ele

poderá perceber que direção deverá conduzir, em momentos específicos, o seu projeto

de tradução.

2.2 TEXTO DRAMÁTICO

Desde o tempo dos gregos antigos, a palavra foi o centro do pensamento lógico,

e esteve no centro de toda e qualquer produção, incluindo a artística. Neste sentido, por

muitos séculos toda a encenação ocorria com o propósito de explicitar ou reelaborar o

que o texto já enunciava. No entanto, essa forma de compreender teatro vem sido

modificada e percebe-se que as imagens, música e outros elementos teatrais trabalham

no âmbito do inconsciente e concorrem para favorecer a estética teatral de forma não

submissa ao texto. (PAVIS, 2011, p. 406,407). Desta forma, compreendendo que uma

das peculiaridades do teatro contemporâneo principalmente é a multiplicidade de

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linguagens, o tradutor de libras deverá levar em consideração todos esses elementos em

seu projeto de tradução, tais como: a iluminação, cenário, imagens, música, encenação

etc., ou seja, toda a teatralidade com o propósito de harmonizar com a poética do

espetáculo e viabilizar uma experiência estética ao espectador surdo.

De toda forma, há de se lembrar que evocar uma definição de texto dramático é

cada vez mais difícil, uma vez que, na atualidade, como lembra Pavis (2011), esse

elemento cênico não se limita a diálogos ou descrições de cenas, mas pode chegar a

extremos, como em uma leitura da lista telefônica, por exemplo.

Ferreira, baseada em Pavis, traz nos elementos característicos do texto teatral,

cujo conhecimento é necessário para a compreensão da poética da peça e, assim,

possibilitar um projeto de tradução do Texto dramático. Ela aponta que ele (o texto

teatral) se configura como diálogo longo, composto por “réplicas trocadas entre os

personagens, e o comprimento das réplicas e os jogos de repetições informam sobre

natureza das relações entre eles.” (FERREIRA, no prelo). E que de acordo com

terminologia do teatro, quando essas réplicas são curtas, temos as chamadas

Esticomitias.“Este procedimento caracteriza uma troca viva, espécie de duelo, entre

dois personagens e pode manifestar a intensidade trágica ou produzir um efeito

cômico.” (FERREIRA, no prelo).

Outro artifício bastante empregado é o monólogo. Um discurso de uma

personagem para si mesmo, no entanto, distingue-se do solilóquio, convencionado pelo

teatro como aquele cuja finalidade é a de esclarecer uma situação ou expressar os

sentimentos de uma personagem. (FERREIRA, no prelo).

Há outros elementos igualmente importantes para a dinâmica do espetáculo

como:

a tirada, ou discurso inflamado, é uma longa réplica que se caracteriza

por uma sucessão de frases complexas, de questões e de argumentos.

Enfim, o quiproquó, diálogo fundado desde o início sobre um

malentendido, torna-se fonte de efeitos cômicos: um personagem ou

um objeto é tomado por outro, uma frase é mal interpretada, e assim

por diante (FERREIRA, no prelo).

Esses elementos do texto dramatúrgico devem ser conhecidos pelo tradutor de

Libras para alcançar a completude dessa obra durante a sua interpretação. De outra

forma, poderá incorrer no equívoco de não percebê-los e ignorá-los em seu projeto de

tradução.

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Para Ferreira (ibid), a importância de conhecer as características do texto

teatral é de suma importância para realização de uma leitura-analítica, mesmo que esse

conhecimento e leitura não sejam suficientes, por si só, para uma tomada de decisão

durante o processo de tradução-escrita:

A instância enunciativa do texto teatral é fundamental para dar

espessura às falas dos personagens, pois seu discurso traz elementos

que compõem a história, a posição social, a formação do

personagem,evitando o achatamento do discurso, ou seja, mais que

uma preocupação linguística de passagem de uma língua para outra, o

tradutor trabalha na instância enunciativa que lhe permite atribuir

coordenadas espaço-temporais a cada personagem e a cada

situação(FERREIRA, no prelo).

Desta forma, a estética literária torna-se de suma importância para elaboração do

projeto de tradução pelo tradutor intérprete. Assim, além das características particulares

do texto teatral, questões estético-literárias entram em jogo na elaboração do projeto de

tradução.

Para tanto, para realização do projeto de tradução, além das questões cênicas

envolvidas no texto, como os quiprocós, apartes, réplicas rápidas etc., faz-se necessário,

estudar as personagens e as características manifestadas nos diálogos, a partir da

construção da personagem pelo ator. Inclusive porque o tradutor não traduz apenas o

texto, mas o faz a partir do olhar e da enunciação do ator. Tais questões são

fundamentais para evitar o apagamento desses elementos cênicos e textuais na tradução.

2.3 CORPO E O TRADUTOR

Embora a nossa sociedade tenha criado uma dicotomia, no mínimo, curiosa entre

corpo e alma, ou corpo e espírito, compreendemos que o corpo faz parte de uma

totalidade. Entretanto, devido a essa concepção cartesiana, faz-se necessário refletir esse

receptáculo do nosso eu, a fim de compreender como essa relação com o corpos e

estabelece na cena e diz respeito a nós mesmos.

Nesse sentido, trago à tona algumas reflexões escritas por Sônia Machado de

Azevedo no Livro O papel do corpo no corpo do ator (2004), a fim de problematizar o

corpo do tradutor nesse momento do palco, uma vez que esse co-atua no espetáculo e

precisa enxergar-se em meio a uma determinada estética, e a partir dessa trabalhar o seu

corpo com o objetivo de alcançar uma determinada poética física. As crescentes

pesquisas no âmbito da tradução e interpretação de Libras limita-se a elencar e registrar

as enfermidades causadas por esforços repetitivos, acúmulo de trabalho e atuação, e

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apontam para a necessidade de um aquecimento com exercícios etc. Contudo, o que

trazemos nesta pesquisa é a necessidade de se refletir o corpo a partir de olhares da

dramaturgia. Desta forma, tomamos emprestado, ainda que de forma inicial, olhares que

examinem a cena de forma mais abrangente, mesmo sabendo que as demandas de

trabalho do corpo do ator podem, em determinados momentos,se aproximar das dos

tradutores, e, em muitos outros, se distanciar.

De toda forma, refletiremos sobre questões trazidas pelos teóricos do teatro e

pensadas para os atores, de acordo com algumas linhas teórico-metodológicas. Azevedo

(2014) traz-nos como a primeira contribuição, Stanislávski para as nossas reflexões.

Para ele, no período compreendido entre o “estado criador e a liberdade do ator”,existe

uma manifestação marcada pela ausência de tensão muscular: o corpo experimenta

liberdade. Sobre a gestualidade, os desafios a serem trabalhados são a luta contra o

clichê, a má “teatralidade”, bem como a busca de sinceridade, estabelecendo as

vontades das personagens para motivar o jogo do ator; fornecendo, ainda, um clima à

emoção cênica, com o propósito de desencadear uma emoção verdadeira no ator; é

necessário, também,lembrar de estabelecer um subtexto a exprimir nas peças, a exemplo

de Tchékhov, quese encontra nas entrelinhas, nos silêncios, para nutrir o texto. Para o

teórico, de acordo com Azevedo,

[...] a atuação deve ser orgânica, inteiramente de acordo com as leis naturais;

não somente durante o período de criação do papel, mas também sempre que

ele for apresentado, pois “em nossa arte é preciso viver o papel a cada

instante que o representamos e em todas vezes”. O corpo não será capaz de

dar vida ao papel se não estiver mobilizado pela experimentação da alma da

personagem, motivo e início da mobilização exterior. O corpo não pode

apenas se servir de formas vazias; nisso reside o perigo dos clichês, a que

todo artista do palco deve estar atento, pois, do contrário, eles “preencherão

todos os pontos vazios do papel que não estiver solidamente impregnado de

sentimento vivo. Mais ainda, os clichês muitas vezes se antepõe ao

sentimento e lhe barram a passagem. (AZEVEDO, 2014, p. 09 )

Desta forma, para Stannislávski a participação do ator é, então, consequência

dos passos dados internamente: circunstâncias dadas, imaginação e emoção, ligam-se,

automaticamente, às sensações produzidas no corpo do ator e o impulsionam às ações

exteriores.

Outra estética bastante marcada no Teatro é a Brechtiana. Para o dramaturgo e

teórico o ator não deve estar mergulhado nas emoções da personagem, e muito menos

em suas emoções particulares. Seu teatro pretende deixar à mostra o processo de feitura

das ações e reações humanas num contexto histórico claro.

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O gesto, para Brecht, deve ser, então, uma mostra das relações, uma

apresentação das relações sociais presentes na caracterização de um papel, e não a

exteriorização de conteúdos individuais. Os elementos de natureza emocional devem ser

totalmente exteriorizados durante o processo de trabalho, descobrindo-se, então, a

expressão exterior da personagem por meio de suas ações físicas; expressão essa que

revele, objetivamente, os acontecimentos do seu interior. O gesto torna-se um ato social,

passível de exprimir as relações estabelecidas entre os homens de determinada época e

tem, dessa maneira, a função de esclarecer o espectador. O ator, posicionando-se em

função do que apresenta no palco, sublinha e acentua, discorda ou reafirma, assume,

enfim, uma posição a respeito do que está fazendo, escolhendo e aprimorando cada

movimento em cena.

Nessa concepção, forma é um princípio importante de trabalho, já que é nela, e

por meio dela, que tudo se manifesta. Para que possa mostrar a personagem, o ator

deverá ter perfeito domínio de sua arte e de cada personagem, elaborada com clareza

durante os ensaios. Um ator Brechtiano deverá manter-se inspirado na teatralidade da

própria vida, prestando atenção contínua ao que acontece ao seu redor e colhendo,

assim, material para o seu trabalho. (AZEVEDO, 2014, p.24)

O corpo do ator, a serviço da personagem, recusa-se à metamorfose completa;

deve manter-se permanentemente relaxado, sem tensões aparentes, as quais só serviriam

para distrair o espectador daquilo que julga ser o essencial. Seu corpo retém as

características de atuante e igualmente a de narrador. Isso causa o estranhamento

desejado, que é conseguido através de ação e reflexão sobre cada ação realizada, como

que em um auto exame constante.

Na formação básica desse ator, Brecht recomenda matérias como a pantomima e

fundamentos de dança clássica, tiro (em vez de esgrima), filosofia, história da arte e

teatro. O ator precisa aprender, sobretudo, a relaxar-se, utilizar a mímica da vida diária,

perceber gestos corriqueiros para retrabalhá-los artisticamente, com o uso de sua

imaginação.

Desta forma, compreendendo os processos pelos quais o ator deve passar para

compor um determinado personagem, o tradutor de Libras teatral poderá também

exercitar o seu corpo de modo que busque alcançar uma similaridade estética e

expressiva a interpretação do ator, buscando uma sinergia no fazer cênico.

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2.4ASPECTOS CENOGRÁFICOS

Outro fator importante para que o tradutor de libras deve compreender, a fim de

atuar em contexto cênico, é o espaço cenográfico. Cenário ou cenografia “indica a

concepção mimética e pictórica da infraestrutura decorativa” (PAVIS, 2014, p.42). O

autor ainda nos lembra que a tentativa de modificar o termo para cenografia, em parte,

se dá pelo fato do primeiro termo carregar a inocência de um telão de fundo ou de

carregar um estigma de uma pretensão ilusionista. Na atualidade, o cenário não possui

mais a função mimética, mas assume sua própria totalidade, tornando-se maleável,

expansível e co-extensivo à interpretação do ator e à recepção do público.

Com o propósito de melhor exemplificar a questão, trouxemos a este trabalho

algumas funções cênicas de um número determinado de cenários.

Luz

A iluminação, design de luz ou simplesmente luz, é a responsável por modificar a

atmosfera do palco, ao flexibilizar, criar texturas, aumentar ou diminuir os espaços, criar

sombras, colorir, enfim, possibilitando uma maior expressividade cênica. O seu papel

não é meramente ilustrativo, mas sim o de trazer mais dramaturgia para a cena. Pavis

advoga que a luz tem um poder semelhante ao da música, preenchendo espaços,

modificando atmosferas, e é o único elemento externo que não traz distração para os

espectadores, agindo diretamente em sua imaginação, assumindo uma dimensão quase

metafísica, modalizando e gerando nuances.

Para o tradutor de Libras, a luz é um fator de suma importância que deve ser levado em

consideração no projeto de tradução. A Libras sendo visual necessita da luz para se

fazer presente (não é o caso da música, auditiva, que pode se dar no escuro). Assim,

propor luz de frente ou de cima pode reforçar um projeto de tradução; luz branca ou

colorida, enfim uma luz que possa mostrar e incorporar o mesmo a peça

Figurino

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O figurino é um dos elementos mais antigos da encenação. Na verdade, muito

provavelmente ele sempre existiu. Da histórica clássica a medieval, sacerdotes gregos

de Elêusius e padres mediáveis utilizavam vestimentas demasiadamente excessivas para

criar um efeito de sacralidade. No entanto, o figurino se reconfigura como uma

“segunda pele do ator” com o progresso da estética realista. Pensando em sua função,

vestir é o primeiro papel desse elemento. Entretanto, ele é um enunciador do

personagem, opondo-se ou aproximando-se a outros figurinos pelas cores, formas,

cortes, materiais, texturas e padronagens, a partir de um sistema interno que deveria ser

- se não o é - coerente, como afirma Pavis (2014, p. 169). O autor afirma ainda que todo

o figurino deve ser sempre visível ao público e que:

“a dificuldade está no fato de tornar dinâmico o figurino: fazer com que ele

se transforme, que não se esgote após um exame inicial de alguns minutos,

mas que “emita signos” por um bom tempo, em função da ação e da evolução

das relações actanciais.” (PAVIS 2014, p 169).

Nesse sentido, o figurino não se propõe apenas ao embelezamento ou até mesmo

à desfiguração. O seu propósito é, antes, o de trazer significado, a partir da relação

estética com a obra, fazendo com que os seus elementos carreguem conceitos da

personagem e enuncie-os ao público.

Assim, devemos problematizar o figurino do tradutor de Libras,o qual,

costumeiramente, sugere-se que seja preto - para se dizer neutro, fato que por si só

apresenta uma concepção de tradução bastante anacrônica, haja vista que as discussões

contemporâneas da tradução apontam para o caráter intersubjetivo e discursivo do

traduzir. Dessa forma, pensar o figurino do tradutor, seja para assumi-lo ou para apaga-

lo, talvez deva passar por uma reflexão mais profunda, ligada aos outros aspectos

teatrais. Percebendo a estética do cenário, do figurino e dos personagens, bem como o

projeto de iluminação, é possível que o figurino do tradutor tenha por objetivo destaca-

lo ou apaga-lo, mas não meramente omiti-lo por busca da neutralidade. E sim por uma

concepção estética.

2.5ASPECTOS ESTÉTICOS

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Os elementos anteriormente apresentados individualmente são componentes que

interagem dentro de uma determinada concepção estética do fazer artístico tanto da

direção do espetáculo quanto da companhia. Essas concepções, podem ser

problematizadas a partir de determinadas visões de teatro que foram historicamente

construídas por seu idealizadores, os quais, até hoje são cânones do teatro moderno e

contemporâneo formando escolas de teatro.

A partir do conhecimento de cada escola de teatro, suas características e

contribuições, o tradutor de Libras poderá estruturar o projeto de tradução de forma

conectada a proposta da companhia com quem trabalhará.

No próximo capítulo a fim de demonstrar esses espaços de tradução cultural, sua

estética e seu jogo em relação ao corpo cênico inicia com uma análise de questionários

feitos com Diretores e Tradutores Intérpretes de Língua Brasileira de Sinais – TILS no

meio cênico.

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CAPÍTULO 3

A ATUAÇÃO DO TRADUTOR DE LIBRAS NO TEATRO: EXPERIÊNCIAS DE

TRADUÇÃO

“Se não traduzimos, se não representamos, nós renunciamos à vida.”

(Le jornal de Chaillot, n. 10, fev. 1963 apud FERRAL, P. 17 – 2014)

Este capítulo tem como objetivo apresentar os dados obtidos a partir de

questionários destinados a dois grupos de profissionais. O primeiro destinado aos

tradutores de libras que atuaram em contexto cênico e o segundo aos diretores de teatro

que trabalharam com tradutores de libras nesses espaços em seus espetáculos.

Estes questionários pretendem traçar um panorama das visões dos dois grupos de

profissionais acerca do ofício, da atuação e dos processos tradutórios do primeiro grupo.

A partir da análise desses dados buscamos traçar a situação atual da tradução de teatro

para libras e discutir os problemas vivenciados tanto pelos tradutores em suas práticas

quanto pelos diretores em suas composições estéticas.

Em um segundo momento, apresentamos experiências de tradução de teatro

que vivenciamos e a partir das quais discutimos propostas de traduções que levem em

consideração a especificidade das peças. As experiências dizem respeito a três peças

que traduzimos com estratégias diferentes. São elas: Tradução viva: Contos Africanos

(2014 e 15), Edifício Aurora(2016) e Um Brinde a La Muerte (2016).

Esses relatos permitem-nos, em seguida, discutir os processos de tradução

amparados pelas contribuições teóricas de Walter Benjamim, Haroldo de Campos,

Henri Meschonic, AntonieBerman, Laplantine e Alex Nous, entre outros aos Estudos da

Tradução, bem como com autores apresentados no capítulo anterior sobre teatro.

As pesquisas relacionadas à atuação de tradutores de Libras em contexto

artístico ainda são relativamente recentes e escassas. Talvez, e muito provavelmente,

pelo fato desse campo de atuação, como vimos no capítulo 1, o qual discutimos os

cursos de Letras Libras Tradução, observamos a ausência de disciplina ou conteúdos

voltados a tradução de teatro.

No entanto devido a crescente demanda de editais de fomento a cultura cujas

diretrizes trazem como exigência ações de acessibilidade, as traduções vem ocorrendo

em diversos espetáculos por tradutores com as mais diversificadas formações e sob a

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égide de contratações variadas as quais se dão desde participar do processo criativo

como um todo até as que ocorrem horas antes, sem nenhum envolvimento anterior ao

momento de execução da interpretação.

Objetivando exemplificar as afirmações anteriores, traremos algumas reflexões

surgidas a partir das vivências tradutórias de três espetáculos dialogando com as

respostas obtidas dos dois questionários mencionados no início deste capítulo e com os

teóricos também já elencados. Esses foram enviados a tradutores que atuam no Distrito

Federal - DF e no Estado de São Paulo com reconhecida experiência e a diretores de

teatro do DF que dirigiram espetáculos com atuação de tradutores de Libras.

Informamos ainda que os questionários estão anexados a esta dissertação.

3.1 BREVE CRÍTICA A NÃO ESTÉTICA NAS TRADUÇÕES DE LIBRAS. POR

UMA POÉTICA DA TRADUÇÃO

Há algum tempo que o modelo de tradução praticado nos eventos culturais não

nos satisfazia por observarmos que não atendia as demandas estéticas exigidas para a

atuação nos mesmos. A tentativa de incorporar as regras de uma “neutralidade”, termo

utilizado no manual de tradução e interpretação da Feneis (1992) e que posteriormente

foi desenvolvida por Quadros (2004) nos inquietava pela sua fragilidade se contraposta

às teorias da tradução que viemos estudando.

Outro complicador é a busca por uma tradução do sentido a qual

costumeiramente vem acompanhada pela expressão “o que o autor quis dizer foi...:”,

como se houvesse um sentido subjacente, oculto a todos e que apenas alguns iluminados

o conhecessem.

A justificativa quase sempre se dá ao afirmar que uma tradução literal da língua

de partida fugiria da estrutura gramatical da língua de chegada. Afirmam que traduzir

palavra por palavra é um equívoco. Antoine Berman ao discutir a tradução de

provérbios de uma língua para outra desmistifica essa problemática.

“...frente a um provérbio estrangeiro, o tradutor encontra-se numa

encruzilhada: ou busca seu suposto equivalente, ou o traduz

“literalmente”, “palavra por palavra”. No entanto, traduzir literalmente

um provérbio não é simplesmente traduzir “palavra por palavra”. É

preciso também traduzir o seu ritmo, o seu comprimento (ou sua

concisão), suas eventuais aliterações etc. Pois um provérbio é uma

forma.” (BERMAN, 2012, p. 20)

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E ainda continua:

Não se trata, pois, de uma tradução palavra por palavra “servil”, mas

da estrutura aliterativa do provérbio original que reaparece sob uma

outra forma. (BERMAN, 2010, p. 21)

Assim, Berman com este exemplo nos mostra que a tradução literal tem uma

preocupação com a forma, buscando reproduzir formalmente a estrutura, ritmo, e

tamanho de uma sentença, provérbio ou determinada enunciação.

De acordo com a perspectiva do autor supra citado, o projeto de tradução deverá

ser pensado a partir de uma poética que não restrinja a compreensão de um determinado

sentido, mas que retome os elementos estéticos do discurso elaborado na língua de

partida para os da língua de chegada. Uma busca, portanto de uma teoria literária para

amparar a elaboração dessas enunciações.

Meschonnic em seu livro “Poética do Traduzir” traz como contribuição o estudo

da poética enquanto disciplina que se funde com outras teorias, a fim de contribuir com

a criticidade nesta estrutura.

“A poética só se desenvolve em procedimento de descoberta se ela se

liga ao conjunto da teoria, da literatura e da linguagem. Se ela própria

torna-se a teoria da linguagem... a poética da tradução desempenha um

papel maior como poética experimental. Então, a poética tem um

papel e um efeito críticos.” (MESCHONNIC, 2010, p. 03).

Desta forma, a crítica necessária ao observar uma determinada estética e

desenvolver estratégias linguístico-discursiva para recriá-la na língua de chegada,

aproximando-as. Partindo do pressuposto que queremos “uma tradução que visa o

encontro de línguas numa perspectiva analítica da instância enunciativa em que as

questões históricas e poéticas emergem.” (FERREIRA, no prelo, p.4)

Devemos ter a compreensão de que este encontro promove não só um

acolhimento, mas uma torção nos olhares ao pensar uma determinada forma de dizer

diferente. Esta, talvez seja uma preocupação mais producente do que a de querer dizer-

se de uma forma que o outro consiga compreender.

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Figura 1 – Espetáculo Tradição Viva

Fonte: SOARES, 2017

Normalmente por partir da premissa que a priori ele não conseguirá, e que o

tradutor deverá trazer esta iluminação, pois o leitor, espectador, não terá os recursos

necessários para compreendê-la. Como se de fato eu tivesse domínio e conhecimento de

toda a platéia que virá assistir a um espetáculo ou ler/ver a tradução de um livro.

Walter Benjamin discute esta questão da seguinte forma:

“Em caso algum a preocupação com o destinatário se revela fecunda

para o conhecimento e uma obra de arte ou de uma forma artística. E é

assim não apenas porque toda a relação com um público determinado

ou com os seus representantes corresponde a um desvio, mas também

porque até o conceito de destinatário “ideal” é nefasto em toda a

reflexão no âmbito da teoria da arte, porque a função desta última é

tão somente a de pressupor a existência e a essência do homem em

geral.” (BENJAMIN, 2008, p. 82).

Aparentemente a negativa de buscar uma aproximação formal do texto traduzido

dá-se pela crença da incapacidade de compreensão do público em questão. Como se

houvesse uma padronização do mesmo. Ou pior, como se todos fossem incapazes de

entender e que, o tradutor, seja o grande viabilizador desta compreensão.

No entanto, esta apreensão não se sustenta, uma vez que a obra existe por si e

não pelo espectador. Tão pouco preocupar-se com o leitor ou espectador torna

producente a tradução. Se não, vejamos o que Walter Benjamin escreve sobre essa

preocupação da tradução:

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“Mas se ela (a obra) estivesse destinada ao leitor, também o original o

deveria estar. Ora, se o original não existe em função dele, como se

poderá então compreender a tradução a partir de uma relação com o

leitor?” (BENJAMIN, 2008, p. 83)

Desta forma, defendemos que a elaboração de um projeto de tradução que

carregue os pressupostos teóricos de uma poética favoreça a própria tradução e a

comunhão com o “original”.

Ao observar estas e outras questões, o nosso fazer tradutório, amparado

principalmente por esses autores anteriormente citados, buscou um olhar crítico e um

realizar diferenciado das práticas costumeiras. Para tanto apresentaremos a seguir os

projetos de tradução de três espetáculos. A saber, “Tradição Viva: Contos Africanos”,

“Edifício Aurora” e “Um Brinde a laMuerte”.

3.2 TRADIÇÃO VIVA: BREVE APRESENTAÇÃO

O musical Tradição Viva narra dois mitos. O primeiro do surgimento do ser

humano segundo a tradição dos povos do Oeste Africano e o segundo o da criação do

mundo pela tradição ioruba. Para tanto, foram utilizadas diversas técnicas de teatro de

bonecos tais como: boneco de luva, boneco de manipulação direta e boneco de vara. Os

bonecos foram instrumentos dos atores tanto para exercer o papel de narrador, quanto o

de personagem dos mitos acima citados. O corpo do musical era composto por dois

atores operadores dos bonecos, uma atriz cantora, dois dançarinos, cinco músicos

instrumentistas (destes, três também atuavam como atores). Todos em palco tinham o

objetivo de retratar a relação com a sacralidade e às divindades dos povos do Oeste

Africano e a iorubana.

Ao todo, foram necessários dez artistas em cena. Destes, cinco atores, dois

dançarinos e o tradutor de Libras apresentaram o enredo representando oito personagens

que compunham a trama.

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Figura 2 – Equipe Tradição Viva

Fonte: SOARES, 2017

Em nosso trabalho, o foco da análise será destinado ao projeto de tradução do

espetáculo para a língua de sinais brasileira. Para melhor visualização da equipe que

compõem o trabalho em questão, apresento abaixo a ficha técnica.

Quadro1 – Equipe Técnica do Tradição Viva

Fonte: SOARES, 2017

O musical está dividido em dois atos. No primeiro, Seu Neco e Aroni

(representados por bonecos de manipulação direta), com a ajuda de Taú,- personagem

atuado ao mesmo tempo por duas atrizes e um ator - explica a Aroni, uma jovem e

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ansiosa garota, temas espirituais, rezas, tradições e como se deu a criação do ser

humano. Este mito adaptado para a peça é de origem do Oeste Africano do Povo Malê.

No ato seguinte os personagens Olorum, Obatalá, e Ododuá (representados por

bonecos de luva) e Exu (representado por um boneco de vara) dão o tom desse segundo

momento do espetáculo trazendo uma comicidade cheias de quiprocós e réplicas

rápidas, além de monólogos e solilóquios para apresentar o mito da criação do mundo

de tradição iorubana.

Os dois mitos são contados em português brasileiro com irrupções das línguas

malê e ioruba e cantado em ioruba e em português brasileiro.

3.3 ELEMENTOS MULTILÍNGUES E ETNOGRÁFICOS

Algumas questões foram relevantes para pensar um projeto de tradução que

abarcasse as características dessa peça. Inicialmente, distingui as poéticas envolvidas

nos discursos enunciativos. Dessa forma, dividi as traduções em: i) canções que

ocorreram no início e final da peça nas línguas iorubana e portuguesa; ii) contação de

história, ocorrida no primeiro ato da peça e iii) estrutura de teatro de mamulengos,

ocorrida no segundo ato. Em segundo lugar, observei as questões de multilinguímo e

mestiçagem (LAPLANTINE, 2002) ocorridas no roteiro. Diante do exposto, ponderei

na forma possível de realizar uma tradução que trouxesse à tona os aspectos

etnográficos (LAPLANTINE, 2004).

Figura 3 – Espetáculo Tradição Viva

Fonte: SOARES, 2017

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Para realizarmos este trabalho partirmos da poética de Henri Meschonnic. Nela

o autor afirma que “A poética da tradução constrói aí o estudo do traduzir, em sua

história, como exercício da alteridade, e coloca à provada lógica da identidade.

Reconhecimento de que a identidade só acontece pela alteridade.” (MESCHONNIC,

2010, p. 04).

Este pressuposto possibilitou-nos criar um projeto de tradução que estivesse

alicerçado entre encontros das alteridades. Uma vez que traduzimos um texto teatral

escrito em português brasileiro e que, no entanto possuía irrupções oriundas das línguas

bambara e iorubá oriundas dos seus respectivos povos, permeadas pelos seus

imaginários, religiosidades, e culturas. Desta forma, tentamos buscar estratégias que

possibilitassem evitar o apagamento das sentenças enunciativas ao traduzi-las para

Libras.

O projeto de tradução além de levar em conta o aspecto poético-etnográfico da

peça, também se propunha refletir a partir os elementos do teatro que apresentamos no

capítulo dois, ou seja: o corpo, o texto, a luz, a cena, etc.

O tônus muscular, a forma de estar em palco exige uma prontidão aproximada ao

do profissional de atuação a fim de que incorpore a estrutura da cena, seguindo as

indicações marcadas nas cenas pelos atores de forma que promova uma automação

coreografada dos movimentos da tradução que desembaraçam qualquer entrave e é

extremamente importante para interligar ação, expressão e fala.

Um dos elementos que contribuíram para esse fazer tradutório foi o espetáculo

“Palhaço Pra quê?".

Na montagem, dois palhaços se digladiavam com o objetivo de provar qual a

ótica seria mais coerente: a de ver os valores sublimes da arte se sobressaírem, ou a de

obedecer à lógica do capital.

O interessante, é que nessa peça, as duas intérpretes acompanharam os palhaços

todo o tempo. O figurino de cada uma remetia as cores e características dos trajes dos

personagens traduzidos. E a interação ocorria em alguns momentos específicos da peça,

demonstrando a visibilidade do tradutor (VENUTTI, 2004).

Diante dessa visão, foi possível repensar meu papel como tradutor e reestruturar

junto companhia todo o caminho de traduzir-atuar o espetáculo Tradução Viva.

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O texto: mito e multilinguísmo

Como mencionado anteriormente o texto é narrado e atuado em português

brasileiro com irrupções das línguas bambara e ioruba. Uma das principais questões ao

estruturar o projeto foi: como não correr o risco de apagar o multilinguísmo, ao realizar

uma tradução monolíngue das contações de mitos para Língua de Sinais Brasileira -

Libras? Para evidenciar essa problemática, trarei a seguir alguns fragmentos que

evidenciarão essas questões.

A peça se inicia com Seu Neco tomando vida nas mãos do bonequeiro,

cumprimentando a todos e indo conversar com os seus ancestrais. Nesse momento,

corta a luz para uma musicista que inicia um cântico em forma de prece em ioruba cuja

letra segue abaixo com a tradução bastante difundida, porém de autor desconhecido.

KíníjékíníjéolóodòYemonja ó

Ki a sòròpèléé, ìyáodò, ìyáodò.

Quem, quem é a dona dos rios? É Yemanjá.

A quem nos dirigimos expressando simpatia.

Mãe do rio, mãe do rio.

A canção possui uma melodia doce e ritmada com uma sonoridade que remete

a um acalento de mãe, à Iemanjá ou Yemanjá, cantada e rezada na língua iorubana. De

acordo com pesquisador Reginaldo Prandi (2001) essa divindade é evocada em entre os

povos iorubanos como uma das Senhoras das águas doces, assim como Oxum e Obá.

Sendo Olokum o Senhor dos mares e dos oceanos. Contudo,no Brasil, Iemanjá veio a

ser reverenciada como a Senhora das Águas Salgadas.

Esse entendimento foi importante para que no processo tradutório se

estabelecesse uma conexão entre as duas percepções. A princípio, durante o canto quis

trazer ipsis litteris o texto no idioma iorubano. Dessa forma, utilizei a datilologia da

letra da canção com as duas mãos, do centro para as laterais do corpo, num fluxo que

simulava o movimento das ondas do mar. Esta ação teve o objetivo de tentar

proporcionar um grau de estranhamento aos surdosda plateia ao lerem uma língua

estranha, semelhante aos que os ouvintes tiveram ao escutar uma música em outro

idioma.

Após algumas repetições, realizei a tradução indireta (ioruba – português –

Libras), utilizando o sinal de Iemanjá, inicialmente utilizei o sinal apresentado no

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glossário criado por Oliveira10

e posteriormente os sinais desenvolvidos do glossário da

pesquisa de Santana11

, cuja estrutura, grau de refinamento e profundidade me deixaram

bastante confortável para adotá-lo na tradução. Todos os sinais de Orixás passaram pelo

mesmo processo.

Dessa forma busquei a preservação dos campos lexicais dos mitos e da religião

afro-brasileira, apesar de encontrar obstáculos para enunciar um discurso de alteridade

(LAPLANTINE, 2001)com uma estrutura de língua fortemente marcada pelo

pensamento cristão.

Traduzir o conceito de “Deus” me fez ressignificar à estrutura lexical de um

sinal que não remetesse a Jeová/yeovah/ Javé/Elohim. Este processo foi para mim um

torcer de visão do mundo até então determinado por uma língua de sinais fortemente

produzida pelas enunciações de conceitos cristãos.

Desafio similar foi vivenciado à época ao traduzir “templo” e “oração”, quando

acabei me reportando ao sinal, que traz a imagem mental de uma igreja ou sinagoga

representada pelo ato de unir as mãos, em referência ao Sagrado. No entanto, esta não é

a única forma de representar o Sagrado, e se quer há um único entendimento do mesmo

ou de reverenciá-lo. Estes questionamentos vieram à tona a partir do pensamento sobre

tradução de Laplantine o qual diz:

A tradução poderia e deveria, ao invés, marcar a distância entre as línguas,

mostrar que existem línguas diferentes. A noção e o termo tradução só

aparecem no século XVI, quando se criam as delimitações linguísticas e

nacionais. O seu papel é, pois, o de lembrar aos leitores de uma determinada

língua que é possível dizer o mundo de uma outra forma, com uma outra

pronúncia, com outras cores; o de fazer ouvir língua alheia na sua própria

língua e deixar entrar nela uma estranheza que enriquecerá as possibilidades

de expressão e a identidade do sujeito. O mesmo só existe quando reconhece

o outro, tanto fora de si como no seu seio. (...) A tradução é diálogo entre

línguas. E pode dizer-se do diálogo o mesmo que do encontro ou da viagem:

o seu valor cumpre-se na distância percorrida. (LAPLANTINE, 2001, p. 41).

Proporcionar a compreensão de outros dizeres, de outras formas de pensar e

organizar o pensamento está para além da mera dicotomia língua de sinais x língua oral

10

Allison Maykell correia de oliveira, nome artístico: Bento Veríssimo, criou o glossário sobre cultura e

religiosidade negra em libras, https://www.youtube.com/watch?v=fnl7ko24td8, 2007 para um trabalhode

conclusão de curso – TCC.

11

Neemias Santana desenvolveu em sua pesquisa um Glossário “Orixás – LIBRAS” o qual foi publicado

apenas em 2016, contudo, o professor gentilmente me informou os dados preliminares, o que me

possibilitou realizar uma tradução com sinais que foram criados no âmbito dos surdos de comunidade de

terreiro. https://www.youtube.com/watch?v=LC2bq0rIxnc em 10 de janeiro de 2016.

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hegemônica. Até porque, ao pensar nessas formas não era exclusivamente a língua

portuguesa que estava em questão, mas as outras línguas. As quais seriam apagadas,

caso o projeto consistisse numa tradução domesticadora que priorizasse a língua de

chegada.

Se assim fosse, os surdos jamais teriam acesso (ao menos não pela peça) de

vislumbrar as estruturas de pensamento dos povos do outro lado do atlântico,

sequestrados, trazidos à força, escravizados. Mas que, todavia possuíam uma cultura tão

vasta e rica, com uma mitologia tão complexa que até hoje permeia as nossas ações e

fazeres.

O corpo em linguagem

Muito embora acredite que já tenha ficado claro, todavia há que ser dito que a

tradução a que nos referimos nesta dissertação não é a que ocasionalmente ocorre entre

as línguas orais, em que a tradução é realizada para que uma determinada trupe tenha

acesso ao texto e a partir daí desenvolva o seu espetáculo. Não. A tradução a que nos

referimos nesta dissertação é a presença do tradutor em cena com a companhia. Dito

isto, acho por bem justificar a adoção e defesa desses termos para a atividade

problematizada. Assim, gostaria de exteriorizar as semelhanças do nosso ofício a partir

das acepções do termo ator apresentadas por Patrice Pavis (2011) Para ele, “Ator” é

definido das seguintes formas: “[...] o ator, desempenhando um papel ou encarnando

uma personagem, situa-se no próprio cerne do acontecimento teatral. Ele é o vínculo

vivo entre o texto do autor, as diretivas de atuação do encenador e o olhar e a audição

do espectador”. O mesmo prossegue ao falar da relação de distância e proximidade

dizendo que

Na tradição ocidental, na qual o ator encarna sua personagem, fazendo-se

passar por ela, ele é, antes de mais nada, uma presença física em cena,

mantendo verdadeiras relações de “corpo a corpo” com o público, o qual é

convidado a sentir o lado imediatamente palpável e carnal, mas também

efêmero e impalpável de sua aparição. O ator ouve-se dizer com frequência, é

como que “habitado” e metamorfoseado por uma outra pessoa; não é mais ele

mesmo, e sim uma força que o leva a agir sob os traços de um outro. (PAVIS,

2011, p. 30).

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Pavis continua afirmando que:

O ator é um intérprete e um enunciador do texto ou da ação: é, ao mesmo

tempo, aquele que é significado pelo texto (cujo papel é uma construção

metódica a partir de uma leitura) e aquele que faz significar o texto de uma

maneira nova a cada interpretação. A ação mimética permite ao ator parecer

inventar uma fala e uma ação que na verdade lhe foram ditadas por um texto,

um roteiro, um estilo de representação ou de improvisação. (PAVIS,2011, p.

31).

Isto posto, aparentemente, de certa forma, relaciona-se tambémao ofício do

tradutor e que agora com essa incumbência de também atuar possui atribuições bastante

próximas. O tradutor cênico também enuncia um texto, encarna um personagem (ou

melhor, vários) e, de certa forma, se faz passar por ele, é uma presença em cena, e

abarcaria a maior parte desse extenso checklist. Todavia, o tradutor não é ator. Por quê?

A tradução em palco é uma atividade que mescla as competências do fazer

tradutório com as da atuação. Esse viés cênico está vinculado, e, por conseguinte,

dependente da encenação do ator. Este após estudar o roteiro e pôr a sua

intencionalidade ao enunciá-lo, gera uma atmosfera emocional que, ao ser captada pelo

tradutor, é reenunciada, carregada de similaridades ou aproximações formais da

estrutura interpretativa do ator a fim de proporcionar à plateia de surdos uma

experiência próxima da plateia de ouvintes. Dessa forma, reflito que a atividade do

tradutor, no que diz respeito a sua encenação, existe a partir do trabalho do ator.

Figura 4 – Espetáculo Tradição Viva

Fonte: SOARES (2017)

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3.4 Edifício Aurora – Imersão no Universo Cênico

O edifício Aurora foi um experimento vídeo cênico musical, a partir de nove

canções inéditas, duas atrizes e um ator, construíram processualmente versões destas

músicas que receberam alterações sintetizadas e reestruturadas pelas mãos de três

músicos que as adaptaram e redimensionaram a partir dos seus computadores e as

executaram.

Um dos elementos marcantes no espetáculo foi o cenário. Este possuía sete

telas de projeção. Nestas telas, as projeções, assim como os jogos de luz e sombra,

foram incididas durante as cenas, interagindo com os atores ou projetando vídeos que

traziam uma narrativa de certa forma conectada à música, mas não necessariamente à

cena que ocorria em palco. Esta versão final do cenário foi desenhada após a

estruturação das cenas. Muito embora sempre tenha havido a ideia de trazer projeções

de cenas pré-gravadas ao musical.

O projeto inicial, inclusive, foi que a tradução de Libras ocorresse em

diferentes telas durante diferentes momentos. No entanto o escopo do projeto foi maior

do que imaginávamos e por isso a tradução ocorreu em uma única tela, a de número „3‟

conforme assinalado no croqui que poderá ser observado na próxima figura.

Figura5 – Croqui Edifício Aurora

Fonte: ROBERTO DAGÔ (2015)

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É importante sublinhar que neste trabalho não temos a pretensão de defender a

projeção da tradução para libras de espetáculos teatrais para toda e qualquer montagem.

Na verdade, na maioria das peças ou musicais que participei como tradutor ou apenas as

assisti, a estética ficaria demasiadamente comprometida, inclusive prejudicando o

design de luz.

É necessário informar que o tradutor foi convidado pela direção e pela equipe

cênica para também atuar no musical. Essa empreitada só foi possível, pois, como já

dissemos, desde a concepção havia o intuito de projetar a tradução para Libras em

alguns telões objetivando compor com todo o espetáculo.

No caso específico do Edifício Aurora a projeção da tradução fazia sentido pois

a música instrumental, com exceção dos vocais, foi pré-gravada e discotecada no

momento de sua execução. Para que tudo ocorresse conforme o planejado, o vídeo

cenografista ligava a projeção da tradução no exato momento do início das músicas.

Como a tradução seguiu a mesma trilha, isso não provoca nenhum descompasso ou

atraso da tradução em relação à música cantada pelos atores.

Participar deste projeto na condição de ator oportonizou-nos um deslocamento

do olhar, assim como uma construção do projeto de tradução que dificilmente teríamos

em outros espaços. Pois a construção das enunciações (uma vez que não havia uma

personagens preestabelecidos, mas apenas discursos), foram experimentadas das mais

diversas formas enquanto ator/cantor, com diversos tonos corporais, buscando

movimentos que produzissem uma determinada estética e com uma intencionalidade

específica.

Ao trazer esta vivência da atuação para a tradução proporcionou um casamento

dos fazeres ainda mais amalgamados, trazendo da função do atuar elementos que

pudessem enriquecer o segundo. Como por exemplo, a movimentação dos atores, assim

como a percepção espacial das localizações da cena, que para Libras é de suma

importância realizar uma marcação dêitica, tanto de apontação como de localização das

pessoas no discurso, sem falar dos verbos direcionais constantemente utilizados numa

língua de sinais, mas ainda mais evidenciado na encenação.

Para a construção das cenas pelos atores houve a ação de uma preparadora

física que, em parceria com a direção, pensaram estratégias de movimentação com os

atores a fim de que os mesmos, ao experimentar os seus corpos cinesiologicamente

ressignificados, pudessem criar, não cenas pré-programadas, mas intenções de

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deslocamentos. Os quais ao invés de se tornarem coreografias, transformavam-se em

locomoções com o intuito de despertar nos colegas de cena reações para realizar

atividades fluidas e dinâmicas a partir das possíveis estéticas que as canções

suscitassem de forma que todo o corpo dos atores os impulsionasse para um

determinado fazer artístico.

Outro importante elemento foi o figurino. Era um misto entre uniformes de

funcionários de serviços gerais ou da construção civil a de soldados de uma realidade

cibernética pós-apocalíptica, conforme veremos na imagem logo a baixo. Havia óculos,

capacetes, luvas, coturnos, e uma gama de fragmentos de aparelhos eletrônicos

acoplados aos trajes para propiciar uma atmosfera futurista.

Figura 6 – Espetáculo Edifício Aurora

Fonte: SOARES (2017)

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Essas informações anteriores foram necessárias para mencionar o projeto de

tradução do espetáculo. Planejar e estruturar este projeto para o musical foi um

privilégio pela possibilidade do deslocamento do olhar, de poder pensar a tradução,

impregnado da experiência da atuação. Muito embora saibamos que nem sempre isso é

possível, e mais, que se quer é o objetivo, ponderamos o resultado bastante marcante

dos questionários destinados aos tradutores de Libras em espaço cênico.

A unanimidade dos profissionais tradutores que responderam ao questionário

afirmou que a contratação para tradução dos espetáculos em que atuaram em sua

maioria, ocorreu num espaço muito breve de tempo, quando não, em momentos antes da

exibição. Tal relação contratual aparentemente indica uma despreocupação com este

elemento na cena.

Outro elemento importante é a falta de formação específica para realização

desse trabalho. Como vimos no primeiro capítulo desta dissertação, a falta de formação

específica para realização deste tipo de empreitada, a partir de uma estrutura curricular

que abarque uma concepção poética, dificulta propor uma tradução que não restrinja a

unidade tradutória meramente a palavra, mas ao discurso.

“É na poesia e para a poesia que eu trabalho a poética da tradução. Na

tradução da literatura, a poética é necessariamente pressuposta: daí

aparece cruelmente a ausência de uma poética, em certos tradutores,

que acreditam resolvidos os problemas, geralmente, só pela filologia,

ou por uma linguística da tradução, que faz apenas uma aplicação

didática e dogmática do dualismo tradicional (o sentido e a forma),

conformando-o segundo os modos linguísticos, à gerativa ou

pragmática. (MESCHONNIC, 2010, p.42).”

Entretanto, em virtude das experiências apresentadas nesse trabalho e nas

afirmações contidas nos questionários destinados aos diretores de teatro, Hugo Casarisi

afirmou que:

“Foi fundamental a disponibilidade do competentíssimo profissional

que topou a empreitada. Para mim, não poderíamos simplesmente

incluir uma pessoa no orçamento do projeto e “mostrar as letras” pra

ele preparar uma tradução e aparecer uma vez ou outra pra

acompanhar o espetáculo, além dos dias das apresentações. As letras

eram neológicas, complexas, indiretas. A estrutura dramatúrgica era

relativa. Os vídeos projetados no cenário guiavam a maior parte da

encenação. Eu precisava de mais que um simples tradutor, eu

precisava de um co-criador. Foi muita sorte encontrar um profissional

disponível que entendesse a complexidade da missão e topasse atuar,

dançar, cantar e traduzir para libras os neologismos do compositor.

Nós filmamos em cromakey toda a tradução que foi projetada em

vídeo junto no cenário do resultado final.” (em questionário anexado a

este trabalho. 2017)

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Esta afirmativa faz-nos pensar que o tradutor, pode de fato ter uma participação

na construção do espetáculo de forma profissional e competente, agregando os seus

conhecimentos ao universo artístico, desde que munido de um arcabouço de repertórios

estéticos, linguísticos e tradutórios. Estas intervenções devem ocorrer a partir da

compreensão das especificidades do seu papel, e da multiplicidade transdisciplinar e

antropofágica do universo teatral.

Traremos agora algumas unidades tradutórias que exemplificam este relato do

diretor e nos auxilia na problematização das questões de tradução referentes ao texto no

aspecto formal, semântico e discursivo com a finalidade de auxiliar a pensar estes

elementos de forma mais interligada em um projeto de tradução.

“é nessa hora que o medo me afaga/ é um monstro imenso/ bem

alimentado/ muito bem alimentado/ tanto mais se alimenta/ tanto

dobra de tamanho e me afaga a cabeça/ por que o medo só é pra fora/

e eu só sou pra dentro/ ele é máscara, da mesma categoria da

vergonha,/ um tanto mais empoderado, muito empoderado/ quanto

mais me aninho no afago do medo/ tanto mais me anulo/ tanto mais

suicido/ pois foi tudo edificado/ como se fora vencido” (Edifício

Aurora, 2016)

Essa tradução não seria viável se os recursos utilizados para realizá-la

estivessem apenas no campo do significado. Se assim o fosse, a estruturação poética e a

possibilidade de recriá-la de forma a tentar uma aproximação estética seria perdida.

Figura 7 – Espetáculo Edifício Aurora

Fonte: SOARES (2017)

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Uma escolha cuja preocupação maior fosse o sentido, apoiado numa

perspectiva platônica de forma e conteúdo inviabilizaria a perspectiva estética por

preocupar-se unicamente com o sentido. Berman traz essa discussão ao dizer:

“Aplicada às obras, a cesura platônica sanciona um certo tipo de

“translação”, a do “sentido” considerado como um ser em si, como

uma pura idealidade, como um certo “invariante” que a tradução faz

passar de uma língua a outra deixando de lado sua casca, sensível, seu

“corpo”: de sorte que o insignificante, aqui, é antes o significante. Do

mesmo modo, todas as línguas são uma(s) pois nelas reina o logos, e é

isso que, além das suas diferenças, funda a tradução. (BERMAN,

2012, p. 44)”

Esta complexidade abordada por Berman fez pensar em um projeto de tradução

não binário, mas na necessidade da manutenção da forma sem que para isso o sentido

seja prejudicado.

Neste sentido podemos perceber que a talvez não tão óbvia distinção do que é

fora e dentro está marcada no discurso. Além dela, a marcação do “eu” na sentença foi

estruturada de forma que perceba-se que não é da primeira pessoa do singular que se

fala. Caso fosse, poderia ser traduzido pela configuração de mão (14) com o dedo

indicador virado para si. Entretanto, o poema refere-se a um “eu” interno, que esteja

mais próximo ao conceito de Self ou de “ego”. Como um outro ser, que na verdade é um

“eu” problematizado.

Outro elemento que podemos perceber da tradução é a aproximação do sinal de

“máscara” e do sinal de “vergonha”. A tradução em questão não utilizou o sinal usual

cuja configuração da mão é a (48) do quadro criado por Pimenta em movimento

escovação no ponto de articulação bochecha, mas utilizei a configuração (60) do mesmo

quadro, cuja configuração é da mão espalmada, levemente côncava, semelhante a que

poderia utilizar para mascara ou carnaval, objetivando trazer uma similaridade na

forma, e até mesmo de campo semântico, com fins de trazer essa vinculação conceitual

que no texto está identificada pelo trecho “ele é máscara, da mesma categoria da

vergonha”.

Outra solução que considero relevante foi o fato da tradução ter sido marcada

por uma postura mais agachada demonstrando essa uma pequenez em relação ao medo,

ao passo que este é marcado por movimentos amplos e crescentes para marcar o seu

poderio, enquanto que ao sujeito, a submissão diante deste gigante. Para tanto

utilizamos a reformulação das Transferências elaboradas por Cuxac as quais foram

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reformuladas por Campello (2008) e também apresentadas na dissertação de Luchi

(2013), as quais foram denominadas de Transferências elaborada de Tamanho e

Forma (TFF), Transferência Espacial (TE), Transferência de Localização

(TL),Transferência de Movimento e Transferência de Incorporação.

A criação dessa perspectiva imagética, de um medo crescente em que à medida

que apavora é a mesma que acomoda e cativa teria que ser enunciada de forma clara a

partir das Descrições Imagética (DI) criada por Campello (2008) e desenvolvida por

Luchi (2013). Luchi, a partir dos estudos da tese de doutorado de Campello (2008)

afirma que “Nas línguas de sinais há duas formas de produção de significado, uma pelas

Estruturas Altamente Icônicas (EAI) e outra pelo léxico padrão e apontamentos

manuais, sendo a segunda algo mais semelhante ao que temos nas línguas orais.”

(LUCHI, 2013, p. 42).

Figura 8 – Espetáculo Edifício Aurora

Fonte: SOARES (2017)

Esta afirmativa faz-nos refletir que a estrutura da Libras faz-nos buscar sempre

uma visualidade, uma narrativa espacial capaz de narrar ou descrever de forma tão

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representativamente imagética e ao mesmo tempo mimética como um filme, um

desenho, uma pintura em movimento utilizando para isso diversas estratégias.

“Existe ainda uma outra maneira de integração do espaço do evento

com o espaço real, formando um tipo de espaço integrado que Liddell

denomina espaço token. Apontamentos podem ser dirigidos também a

esse espaço. Diferentemente do espaço sub-rogado, em que o

sinalizador empresta seu corpo para a criação de uma integração, em

um espaço token,apenas áreas do espaço real são integradas a

conteúdos conceituais. Além disso, enquanto os sub-rogados

apresentam uma maior variedade de localizações, tokens estão

restritos ao espaço à frente do sinalizador.” (Barborsa, 2013, p. 54 e

55)

Alinhado com a descrição linguística das estruturas discutidas por Luchi (2013)

e Barbosa (2013) e as teorias de Meschonic (2010), Berman (2012) pudemos organizar

a tradução de forma a buscar criar uma imagem mental para os espectadores.

3.5 UM BRINDE A LA MUERTE

Breve síntese do espetáculo

O texto relata a vida de um casal de homens com 65 e 70 anos de idade que

dividem as suas vidas há cerca de 40 anos. O primeiro é dramaturgo e ator, que possui o

hobby de pintura. O segundo é servidor público aposentado, e recentemente passou a

viver em cadeira de rodas sendo cuidado pelo parceiro. Após alguns drinks necessários

para desvelar verdades o dramaturgo revela que o câncer não fora curado e que já não

quer mais lutar para se agarrar aos últimos fiapos de vida que lhe resta. Antes, prefere

empenhar-se em terminar mais uma de suas obras com bastante urgência, além de tratar

questões de ordem prática do cotidiano do casal e questões não resolvidas. A partida, a

solidão de quem fica, os amigos que já se foram e o medo de morrer são temas trazidos

por este texto.

A existência compartilhada por 40 anos vê-se rumo ao fim. E neste momento

as amenidades do cotidiano dão lugar a um diálogo mais tenso. O servidor não quer que

haja a separação e insiste para o regresso ao tratamento, no entanto o dramaturgo está

convicto que a manutenção do sofrimento não é uma opção. Ele inclusive oferece ao seu

amor uma pistola e sugere que, caso a vida não seja mais suportável, o suicídio.

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Este diálogo os põe em perspectiva com a finitude, com o dissipar das ilusões e

a possibilidade de eternizar esse amor. É um instante de extrema vulnerabilidade, desses

que fazem eclodir o que há de mais humano em nós. E à morte, o brinde, por nos

possibilitar mudar a perspectiva em relação à vida.

O espetáculo foi dirigida por Geraldo Martuchelli (Gê Martu), contando com o

Tainá como assistente de direção e atuada por Humberto Padrancini. O cenário foi

assinado por Roustang Carrilho, iluminado por Ana Quintas, maquiagem de Luma

LeRoy, Pedro Senna como ceno-técnico e Fábio Guabiroba com arte-finalista e designer

gráfico, e Virgílio Soares como tradutor de Libras.

A Peça possuía uma atmosfera nostálgica e familiar, carregada de

sentimentalismos oriundos das questões da separação definitiva, da despedida da vida e

do ter ou não o direito de interromper a própria trajetória.

Figura 9 – Espetáculo Um Brinde a laMuerte

Fonte: SOARES, 2017

Questões poéticas no projeto tradutório

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O espetáculo possuía uma atmosfera de muita intimidade vivenciada por um

casal com quatro décadas de convivência. A nostalgia perene possibilitava o surgimento

de críticas e ressentimentos travestidos de gracejos e recheados de ironias.

Os personagens traziam uma complexidade e uma espessura histórica as quais

motivavam gestos e trejeitos com um grau de refinamento expressado pelos experientes

atores. Para que a tradução os acompanhasse sem um elemento de figurino apropriado

foi necessário trazer uma iluminação mais condizente com os momentos de lembrança,

fazendo com que em inúmeros momentos a luz transformam-se o tradutor quase em um

vulto ou espectro de um passado não determinado.

Gostaria de salientar inclusive que este é um exemplo do alinhamento

harmonioso com a “equipe técnica”. Trago este termo entre aspas, pois,

costumeiramente nos remete a uma equipe quase que burocrática que, no entanto, são

artistas da luz, do som, da maquiagem, artistas visuais e etc., sem os quais o espetáculo

jamais teria a grandiosidade e a complexidade, com tantas nuances envolvidas,

dificultando ou ao menos não potencializando a equipe de atores chegassem ao ápice da

sua força interpretativa.

Essa luz projetada no tradutor teve o objetivo não apenas da obvia iluminação

da sinalização, mas também de acompanhar a atmosfera lúdica impressa pelo ritmo do

espetáculo. Seja nas discussões, nas elucubrações, nos delírios e/ou no romance.

Figura 10 – Espetáculo Um Brinde A La Muerte

Fonte: SOARES (2017)

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E o ritmo, preocupação em todo projeto de tradução, recebeu uma contribuição

significativa do pensamento cênico. Matteo Bonfito resgata a discussão de sobre a

consciência rítmica elaborada por Dalcroze o qual escreve:

“A consciência do ritmo é também a faculdade captar as relações entre

os movimentos físicos e os intelectuais, e de sentir as modificações

que imprimem nesses movimentos os impulsos da emoção e do

pensamento. Ela pede o emprego de todos os músculos conscientes.

Portanto, para criar o sentimento rítmico, a educação deve colocar em

movimento o corpo inteiro.” (Bonfitto, 2011, p.12)

Esta consciência provocada pela compreensão das necessidades cênicas

acarreta um estado de prontidão, de pré-estruturação dos movimentos assim como de

alerta que impelem a ação precisa e imediata. Que, no entanto só serão alcançadas após

um exaustivo treinamento.

As réplicas ocorridas nos momentos tensos do diálogo exigiam uma atenção

maior que em outros momentos e a uma tradução em cena que exigiam que a marcação

dêitica ocorresse de forma ainda mais harmônica e ritmada, fazendo com que as

escolhas da tradução fizessem com que o texto “coubesse na boca” jargão do teatro, que

no caso específico, seria mais adequado substituí-lo por “coubesse nas mãos”.

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CAPÍTULO 4

PROJETOS DE TRADUÇÃO DE TEATRO PARA LIBRAS E FORMAÇÃO DE

TRADUATOR: PROSPOSTAS EM QUESTÃO

4.1 TRADUÇÃO POÉTICA PARA LIBRAS – UMA NECESSIDADE

O objetivo deste capítulo é refletir acerca das questões que compõe um projeto

de tradução para Libras em espaços cênicos de forma a propor elementos de formação

para este tradutor.

Gostaria, nesse momento, de inicialmente retomar as discussões realizadas no

primeiro capítulo desta dissertação que versa sobre o histórico dos tradutores e

intérpretes de Libras – TILS no Brasil. Nele pudemos verificar a progressão da

profissão, bem como da qualificação dos tradutores em âmbito nacional.

Acompanhando o trajeto percorrido para passar do estágio de amadorismo até alcançar

o status atual de profissionais com formação com graduação e pós-graduação Latu e

stricto sensoespecíficas na área de atuação. Tais conquistas foram fruto de muita

militância política e pesquisas acadêmicas, ambas realizadas por surdos e ouvintes em

todo o território brasileiro. Esses esforços receberam um forte incentivo das igrejas,

associações, ligas, e da Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos –

FENEIS, das associações e sindicatos dos profissionais e posteriormente da Federação

Brasileira das Associações dos Profissionais Tradutores e Intérpretes e Guia-Intérpretes

de Língua de Sinais – FEBRAPILS.

No entanto, essa graduação superior em Letras Tradução – Libras (ou Libras –

Português), ou nome correlato que porventura tenha recebido nas suas instituições,

conforme também pudemos acompanhar no primeiro capítulo, tem uma formação ainda

bastante diferenciada entre os seus pares nas poucas universidades que a oferece. Além

disso, pudemos observar que pouquíssimas instituições oferecem disciplinas cujo

arcabouço teórico possibilite uma compreensão estética da linguagem e nenhuma

oferece a formação para uma tradução poética de português para Língua Brasileira de

Sinais.

É evidente que conhecer, compreender, discutir e elaborar uma conceituação a

cerca das poéticas das línguas de sinais, principalmente a brasileira, é de suma

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importância. Não só como competência tradutória, mas para própria produção textual

em LS. Há muitos anos venho defendendo que a melhor forma de aprender a Libras é

estando imerso na comunidade surda, participando, observando, criando um repertório

enunciativo dos dizeres em LS.

Este aprendizado pode ocorrer também de forma complementar a partir dos

vídeos que constituem principalmente a maior parte da literatura em LS. Ao menos, até

o nosso atual momento histórico, uma vez que não há uma consolidação uniforme da

escrita de LS. Mas é de suma importância a troca e a produção constante de enunciações

para que esse processo mental de construção destes enunciados ocorram gradativamente

de maneira mais fluida, sistêmica, elaborada e sofisticada.

No entanto, faz-se necessário também apropriar-se dessas discussões oriundas

das línguas orais, apreender e não ignorar toda essa produção de conhecimento milenar.

Ora, os estudos linguísticos das Línguas de Sinais no mundo não surgiram deles

mesmos. Tão pouco das línguas indígenas, ou se quer da língua portuguesa. Estes

estudos vieram do sânscrito, do grego, do latim, das línguas românicas, anglo saxônicas

e mais tarde das línguas de sinais. Portanto, não é demérito algum compreender estes

sistemas, linguísticos. Sobretudo para adaptá-los ou até mesmo superá-los. Esta é, ou ao

menos deveria ser a dialética nas pesquisas. Então, por que não trazer esse mesmo rigor

acadêmico para compreender as enunciações e os discursos? Problematizá-los e traduzi-

los.

Não há como ter perdas nesse aprendizado. Só ganhos. As demandas são

inúmeras. Desde os tradutores intérpretes em contexto educacional que se vêem

compelidos a traduzir textos literários, dramatúrgicos ou canções as mais diversas,

passando pelos intérpretes de conferência que, não raras às vezes, se vem em situações

semelhantes a que acabamos de relatar. Até os traduatores que atendem uma demanda

crescente, e já bastante significativa, dos editais que buscam pontuar no quesito

acessibilidade.

Felizmente um grupo representativo desses proponentes de projetos cultuais

acessíveis já conseguem perceber aspectos estéticos na performance tradutória dos

profissionais e preocupam-se em executar projetos de forma a realizar parcerias

harmoniosas e afinadas com o projeto estético do espetáculo.

Neste sentido, é mister pensar numa formação que capacite o tradutor de Libras

a elaboração de um projeto de tradução que leve em consideração a estética da peça e os

elementos composicionais do teatro, e as questões relativas a tradução de Libras com as

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suas respectivas estratégias e decisões amparadas na concepção do espetáculo a ser

traduzido.

4.2 O TRADUATOR: ELEMENTOS FORMAIS E EPISTEMOLÓGICOS

Para dar continuidade ao encadeamento desta reflexão gostaria de alterar a

nomenclatura do objeto da nossa pesquisa o qual, até então, denominávamos

maioritariamente de tradutor, mas as vezes de tradutor-intérprete, tils, ils entre outros.

Este profissional que até então recebia estas alcunhas, para o contexto do teatro, cinema

e TV ou demais suportes artísticos utilizaremos, de forma adaptada, a denominação

criada por Barros (2015, p. 123) de tradu-ator. Todavia, preferimos a grafia deste novo

termo da seguinte forma traduator, sem hífen,doravante grafado assim.

A necessidade de efetuar esta distinção, não possui a intenção da desvinculação

do profissional da traduatuação de libras em contexto cênico, literário e artístico dos

demais. No entanto, faz-se necessário esclarecer esta distinção, uma vez que as

competências exigidas para execução da atividade extrapolam os da tradução. Exigem

uma dramaticidade nos movimentos e uma estruturação textual que não se restrinjam ao

significado, mas a forma, questão recorrente durante todo o capítulo anterior.

“Esse dar vida teatral se apresenta como uma tradução com suas

estratégias e escolhas que modificam o sentido do texto, sua

interpretação e sua significação. O tom e a dicção do ator, os gritos,

risos, gemidos, choros ou suspiros, a movimentação espacial do ator

são trabalhos do diretor que também escolhe os figurinos, decide o

cenário, as cores, as proporções, escolhe a luz e a música, leva em

consideração ou não as rubricas, segue ou não a lógica do texto.”

(FERREIRA, 2017 no prelo).

Estas questões não são, e nem devem ser pormenorizadas. São cruciais para que

a traduatuação ocorra de forma eficiente. Ver-se enquanto traduator é pensar em sua arte

na condição de “poeta do movimento” e “dançarino da língua” como tão bem descreveu

Camila Oliveria12

. É pensar que pode ser mais ao estruturar o texto traduzido de uma

forma não inusitada com o proposito de deslocar o pensamento do outro e de criar

estratégias a fim de que as línguas se encontrem e se beijem.

A escrita literária, sendo esquiva e questionando, deslocando o

automatismo da linguagem, requer, para a sua transrepresentação, uma

tarefa hermenêutica que, não priorizando comunicar nem copiar, e

12

Camila Oliveira é dançarina, artista circense e popular, e descreveu um traduator como “poeta do

movimento” e“dançarino da língua” em um comentário em uma das redes sociais.

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tampouco imitar, como quer Walter Benjamin, viabiliza a mobilidade

do estético entre culturas. O ato transrepresentativo é entendido como

um processo inter-relacional cuja escolha sígnica, na passagem de

uma língua e/ou linguagem para outra, sofre interferências de

competências, de preferências lingüísticas e da função que será

atribuída ao texto transrepresentado na cultura de chegada. (VIANA e

ALVES, p. 121, 2000)

Assim sendo, pensar estas questões possibilitam refletir sobre a própria arte. O

próprio fazer. E a defendemos porque ela é criteriosa, trabalhada e trabalhosa, exige

pesquisa, tem inúmeras intencionalidades e fazemos porque acreditamos que ela pode

ser agregada ao projeto estético do espetáculo sem que haja prejuízo na concepção do

mesmo. Até porque ela não é dissonante, ao traduatuar nós o fazemos com a enunciação

casada ao discurso traduzido na língua de partida.

Este evento, além do benefício primeiro e motivo maior do nosso trabalho que é

o de proporcionar ao surdo uma experiência estética no teatro, ela, não necessariamente

tem que atrapalhar a encenação e a obra do dramaturgo, diretor e atores do espetáculo,

uma vez que os movimentos executados na tradução de Libras tendem a enfatizar o que

ocorre em palco e a corroborar com a estética dramática da encenação.

E não há uma intenção de competir com o ator. É inclusive descabido esse

pensamento. Não nos propomos a atuar. Mas para traduatuar. Como foi dito no capítulo

dois, a criação da personagem, ou das personagens e suas enunciações bem como os

modos de dizerem não ocorrem diretamente a partir do texto, mas da elaboração e

criação dos atores que conceberão gestos, movimentos, trejeitos, sotaques e formas de

enunciarem que somados, serão material para a produção destes discursos em Libras

imbuídos no fazer artístico em harmonia com os atores. A intenção se dá em recontar

esta historia numa outra língua. E de estruturar a interpenetração destas línguas de

forma que o haja uma mestiçagem nas formas de dizer. Que como disse Laplantine

(2002) não se trata de mesclar, mas de compreender as tensões que existem entre as

mesmas, sem o propósito de homogeneizá-las.

“Não é nenhuma novidade dizer que a tradução convoca questões

éticas e políticas para discutir nossa relação com a alteridade. Mais do

que nunca, nossos encontros devem se estabelecer horizontalmente

sem vaidades ou altivez de uma língua sobre a outra. Não considerar o

pensamento do exílio num mundo globalizado e em plena migração é

optar por uma globalização homogeneizadora a partir de um centro

disseminador de um pensamento único. É no pensamento do exílio

que a tradução mestiça as línguas e as culturas, provocando

instabilidades e estranhamentos.”

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Corroborando a Ferreira é importante que se diga que, por analogia, a pretensão

não é a manutenção da hegemonização das línguas orais em detrimento das línguas de

sinais. Nem tão pouco o inverso. Ou até mesmo da transformação da primeira na

segunda ou vice-versa. O objetivo é o encontro. É compreender que há tensões

existentes na convivência com ambas e pensar nos dizeres que interprenetram as

línguas, pondo-as em devir. Abandonando por tanto o mito de uma língua pura a qual se

pretende ser imune da influência da outra. Assim como a outra a influência de uma.

A traduatuação não visa esconder-se, invisibilizar-se. Nem tampouco ser o foco.

Apenas intenciona exercer seu papel consciente da necessidade dessa formação para

realizá-lo.

4.3 CONTRIBUIÇÕES PARA A FORMAÇÃO DO TRADUATUAR

O objetivo deste sub-tópico jamais poderia ser o pretender encerrar essa discussão

ou propor uma ementa acabada com uma formação voltada para o traduator. Muito

menos problematizar em profundidade todo o universo cênico do teatro, seus elementos

e desdobramentos e as respectivas teorias. Ansiamos, entretanto, com este trabalho,

possa contribuir apresentando elementos que poderão ser constitutivos para a formação

dos traduatores nesta área específica, além de instrumentalizar os profissionais na

elaboração de projetos de tradução para atuarem nesse seguimento crescente e

importante para proporcionar aos surdos uma experiência de acesso a uma tradução

estética e não meramente comunicativa.

Isto posto, gostaríamos de elencar algumas elementos importantes para a

traduatuação em espetáculos teatrais. Esta discussão está amparada no segundo capítulo

deste trabalho. Assim sendo, retomaremos alguns pontos com o intuito de trazer-lhes a

memória.

A estética teatral

A estética é uma teoria que se pretende transcender as obras particulares

objetivando definir critérios avaliativos da arte, vinculando assim com a realidade e

categorizando as experiências estéticas da contemplação, catarse, do trágico e do

cômico. (PAVIS p.144 e 145, 2011)

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Esta teoria durante a história teve vieses mais ou menos elitizados vindo de um

caráter mais normativo, descritivo eu estruturais. Atualmente possuem uma

preocupação maior com a:

1 produção: direcionando o seu olhar e análise a fatores como a formulação do

textual (atentando para determinações históricas ideológicas, entre outras), a cena e seu

funcionamento (materiais, condições e etc.);

e 2 com a recepção: atentando para a outra extremidade e examinando do ponto

de vista do espectador. Observando a partir do seu “horizonte de expectativa cultural e

ideológica, a série de obras que precederem este texto e esta representação, e etc.”

Faz-se necessário, no processo de formação dos profissionais que queiram

trabalhar com a traduatuação uma formação que atente para estes elementos e

proporcione uma compreensão das intencionalidades que a equipe busca gerar e criar

uma determinada experenciação aos espectadores.

Com estas representações do real, não na perspectiva platônica da mimese como

imitação, mas com o olhar reabilitado de Aristóteles, tendo a mimese como aprendizado

e como reprodução humana como na perspectiva Benjaminiana como aponta Gagnebin

(1993). Feral continua afirmando que:

“De fato, existe no teatro uma dupla mimese: uma mimese textual,

fundada na noção de representação por meio da linguagem, noção que

Aristóteles foi um dos primeiros a afirmar, e sobre a qual as pesquisas

de Saussure projetaram uma luz particular. Por seu lado, Derrida

comentou extensamente a representação que se coloca nos

fundamentos da língua e do pensamento ocidental. Existe também

uma misese que diz respeito à “representação” e, por tanto, ao jogo do

ator e da cenografia.” (FERAL, p. 101 e 102, 2015)

Neste sentido, continua Faral, as relações estabelecidas acerca da mimese

aplicadas ao teatro e a teatralidade é: em primeiro lugar do âmbito das fundamentações

teóricas, ou seja, filosofia e da metafísica. E a segunda, da pragmática da cena, assim,

mímesis e teatralidade fazem a cena funcionar a partir do texto, do jogo e da cenografia.

Assim, para Feral continua se questionando se a teatralidade não seria uma das

modalidades particulares da mimese. (FERAL 2015).

É de suma importância a compreensão desse fenômeno mimético para o

traduator, uma vez que o mesmo aparentemente realiza a mimese da mimese. Ou seja,

ele reproduz uma reprodução iniciada pelo ator.

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Outro fator preponderante par o formação do traduator é o palco onde normalmente o

traduator desempenhará o seu papel.

Há uma quantidade vasta de palcos, no entanto três categorias com algumas

subdivisões são as mais comumente utilizadas nas edificações de teatro ou para espaços

abertos. São elas: Os Palcos Elisabetanos, Os Palcos Italianos e Os Palcos de Arena.

Ao apresentá-los nós não temos a pretensão prescritiva de aprisionar o

traduator de certa maneira, num determinado lugar porque é no projeto de tradução, em

diálogo com a companhia que o traduator perceberá a melhor forma de se posicionar.

Apresentamos agora os palcos:

Figura 11 - Palco Italiano

Fonte: http://slideplayer.com.br/slide/1433724/

Caracterizado pelo posicionamento do público exclusivamente à frente do

palco. O traduator poderá manter-se ao lado do palco de acordo com a necessidade

estética do espetáculo.

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Figura 12 - Palco Elisabetano

Fonte: http://slideplayer.com.br/slide/1433724/

Este palco tem como característica o prolongamento frontal projetado ao centro

do público conforme a figura à cima. Neste tipo de palco, os tradutores necessitarão

observar o lado que vai priorizar, uma vez que a platéia estará dividida em três espaços

bem distintos.

Figura 13 - Palco de Arena

Fonte: http://slideplayer.com.br/slide/1433724/

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Neste modelo a cena ocorre ao centro e platéia arrodeia o palco. É um espaço

que exige bastante atenção para que o tradutor não esteja de costas para a platéia de

surdos. Sugerimos sempre que possível para organização e delimitação prévia do espaço

da platéia de convidados surdos a fim de evitar contratempos com a traduatuação.

Assim, sugerimos que as competências técnicas sejam pensadas enquanto

infraestruturas necessárias para viabilizar em materializar uma determinada estética.

Dessa forma faz-se necessário que os traduatores tenha uma formação estética que

busque pensar traduatuação vinculada a forma com o intuito de expressar em toda a

plenitude a sua intencionalidade artística.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho é fruto de inquietações que impulsionaram uma perseguição por

uma tradução estética que contemple a forma no fazer tradutório. Tal inquietação

conduziu-nos a percursos de formação diversificados que possibilitaram olhares

múltiplos sobre o traduzir. A busca levou-nos ao ingresso do Mestrado Acadêmico no

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução – POSTRAD da Universidade de

Brasília – UnB.

Durante este trajeto, deparamo-nos com inúmeros encontros significativos com

bibliografias, autores, seminários, e olhares que influenciaram os nossos, os torceram e

os deslocaram.

A nossa filiação ao Grupo de Pesquisa “Tradução Etnográfica e Poéticas do

Devir” coordenado pela Professora Doutora Alice Maria de Araújo Ferreira, nossa

orientadora, contribuiu substancialmente para o constante exercício do deslocamento do

olhar, buscando uma poética tradutória etnográfica, mestiça e do exílio, a qual prime em

por a língua em devir.

Neste processo tivemos a possibilidade de questionar-nos a cerca da formação

estética dos tradutores e intérpretes de Língua de Sinais Brasileira na história nos cursos

de graduação existentes em território nacional. O que, para nossa surpresa, pudemos

verificar a inexistência de disciplinas na grade curricular cuja ementa favoreça a

estruturação de uma tradução com viés vinculado a forma, a qual, para nós, faz parte do

conteúdo. Esses dados foram levantados e informados em nosso primeiro capítulo deste

trabalho.

No segundo capitulo, fizemos um levantamento do que consideramos elementos

indispensáveis para a compreensão, ainda que introdutória, do universo teatral e suas

estéticas. Nós os apresentamos com o intuito de mostrar para os tradutores de Libras de

forma que os mesmos tenham condições de embasar os seus projetos de tradução dos

espetáculos.

O terceiro capítulo inicia com uma breve introdução e segue com uma rápida

crítica ao que ocorre na tradução de teatro além de analisar práticas tradutórias

realizadas em três espetáculos traduzidos por nós, e trazendo uma discussão com o

nosso referencial teórico e com questionários que aplicamos a tradutores que atuaram

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em espetáculos teatrais e a diretores cujas peças foram traduzidas por tradutores de

Libras.

No quarto e último capítulo trouxemos uma discussão sobre a tradução em

contexto cênico e utilizamos, adaptamos e desenvolvemos um conceito criado por

Barros de Traduator, assim como trouxemos a discussão das competências estéticas e

poéticas que deveria ser abordadas na formação deste profissional.

Diante de tantas questões defendemos que há a necessidade de destinar uma

parte significativa da formação do Tradutor de Língua Brasileira de Sinais – Língua

portuguesa as questões estéticas. E particularmente a tradução de teatro, inclusive por

compreender que tais elementos só tem a contribuir com a as outras sub-áreas de

atuação do tradutor.

Isto posto, acredito que este trabalho poderá somar-se a tantos outros e contribuir

para a reflexão e dessas questões na formulação de currículos para os cursos de Letras

Tradução – Libras. Nesta pesquisa obtivemos uma quantidade significativa de dados os

quais pretendemos continuar analisando e difundir posteriormente na forma de artigos

científicos comunicações em congressos da área. Entretanto, acredito que este foi

apenas o início de uma trajetória de pesquisas que pretenderei dar continuidade no

Doutorado.

Esperamos que os tradutores de Libras, e a comunidade surda em geral se

beneficiem com a conclusão desta etapa de pesquisa.

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REFERÊNCIAS

AZAMBUJA DE, Diego, Almeida. “Arte e Antropofagia”. Tese de Doutorado, Brasília

UnB, 2016.

ASSIS SILVA, César Augusto. “Da falta à diferença no espaço público: considerações

sobre a missão cristã voltada para a surdez”. Trabalho apresentado na 26ª Reunião

Brasileira de Antropologia, realizada entre os dias 01 e 04 de Junho/2008, Porto Seguro,

Bahia, Brasil. GT 24: Etnias e Religiosidade: perspectivas políticas e cosmológicas,

Bahia, 2008.

BARBOSA, Thaís Bolgueroni, and Evani de Carvalho VIOTTI. "Processo de

referenciaçãona Libras: estudo de uma narrativa." ENAPOLL. 14ª edição do ENAPOL

(Encontro dos Alunos de Pós-Graduação em Linguística). São Paulo: USP 14: 15.

BARROS, Thatiane do Prado. Experiência de transmutação poética de português para

Libras: três poesias de Drummond. Dissertação de Mestrado. f 171 – UnB, 2015.

BENJAMIN, Walter. A tarefa do tradutor. Tradução de Susana Kampff Lages. In:

Escritos sobre Mito e Linguagem, Rio de Janeiro: Editora 34, 2011, p. 101 a 119.

BERMAN, Antoine. A prova do estrangeiro: Cultura e tradução na Alemanha

romântica. Tradução de Maria Emília Pereira Chanut. Bauru, SP: EDUSC, 2002.

BERMAN, Antoine. A tradução e a letra ou o albergue do longínquo. Tradução de

MarieHélène C. Torres, Mauri Furlan, Andreia Guerini. Revisão de tradução: Luana

Ferreira de Freitas, Marie-Hélène Catherine Torres, Mauri Furlan, Orlando Luiz de

Araújo. 2ª ed. Tubarão: Copiart; Florianópolis: PGET/UFSC, 2013.

BONFITTO, Matteo, O ator-compositor: as ações físicas como eixo: de Stanislávski a

Barba / MatteoBonfitto. São Paulo: Perspectiva, 2011.

BORIE, Monique; ROUGEMONT, Martine; SCHERER, Jacques. Estética Teatral:

Textos de Platão a Brecht. Tradução de Helena Barbas. Lisboa. Fundação

CalousteGulbenkian

BRANCO, Lucia Castello (org.). A tarefa do tradutor, de Walter Benjamin: quatro

traduções para o português. Belo Horizonte: Viva Voz, 2008.

CAMPOS, Augusto de; PIGNATARI, Décio; CAMPOS, Haroldo de. Teoria da poesia

concreta: textos críticos e manifestos 1950 – 1960. Cotia, SP: Ateliê Editorial, 2006.

CAMPELLO, Ana Regina e Souza; Aspectos da visualidade na Educação de Surdos. f.

245, Tese de Doutorado, Florianópolis UFSC 2008.

COSTA, Patrícia Rodrigues. Do ensino de tradução. 2013. 305 f. Dissertação (Mestrado

em Estudos da Tradução) – Programa de Pós-graduação em Estudos da Tradução -

POSTRAD, Instituto de Letras, Universidade de Brasília – UnB. 2013.

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87

DERRIDA, A prática da diferença. Org: OTTONI, PAULO. Campinas – SP, Unicamp.

2009

FÉRAL, Josette. Além dos limites: teoria e prática do teatro. Tradução por J. Guinsburg

et al. 2015.

FERREIRA, Alice M. A. Levi-Strauss Tradutor: Tristes Tropiques e a Tradução

Etnográfica. In SOUSA, Germana H. Pereira de. (Org.) História da tradução – Vol.1.

Campinas, SP: Pontes Editores, 2015.

FERREIRA, Alice Maria de Araújo. Traduzir Akakpo e o provérbios. (No Prelo)

LACERDA, Cristina Broglia Feitosa de; GURGEL, Taís Margutti do Amaral . Perfil de

tradutores-intérpretes de Libras (TILS) que atuam no ensino superior no Brasil. Revista

Brasileira de Educação Especial, v. 17, p. 481-496, 2011

LAPLANTINE, François e NOUSS, Alexis. A Mestiçagem. Tradução: Ana Cristina

Leonardo. Lisboa, Instituto Piaget. 2002

LAPLANTINE, François, A descrição etnográfica. São Paula: Terceira Margem, 2004.

LARANJEIRA, Mário. Poética da Tradução: Do sentido à Significância. – São Paulo:

Editora da Universidade de São Paulo, 2003. – (Criação e Crítica; v.12)

MESCHONNIC, Henri. Poética do traduzir. Tradução de Jerusa Pires Ferreira e Suely

Fenerich. São Paulo: Perspectiva, 2010.

PAVIS, Patrice. Dicionário de teatro. São Paulo -Perspectiva, 2011.

PAZ, Octavio. O Arco e a lira. Tradução: Ari Roitman e Paulina Wacht; São Paulo:

Cosac Naify, 2012.

PERLIN, Gladis Teresinha Taschetto; MIRANDA, Wilson. Surdos: o narrar e a

política. Ponto de Vista: revista de educação e processos inclusivos, n. 5, p. 217-226,

Florianópolis: UFSC, 2003.

PRANDI, Reginaldo. Mitologia dos Orixás. Companhia das Letras: São Paulo, 2013.

QUADROS, Ronice Müller e KARNOPP, Lodenir Becker. Língua de sinais brasileira:

estudos linguísticos. – Porto Alegre: Artmed, 2004.

ROSA, A. S.. Entre a visibilidade da tradução da língua de sinais e a (in)visibilidade da

tarefa do intérprete. Rio de Janeiro: Arara Azul, 2008. v. 01. 235p.

RODRIGUES, Cristina Carneiro. Os Estudos de Tradução nos programas brasileiros de

pósgraduação. In: Os estudos da tradução no Brasil nos séculos XX e XXI. Andréia

Guerini, Marie-Hélène Catherine Torres, Walter Carlos Costa (org.). Tubarão: Ed.

Copiart; Florianópolis: PGET/UFSC, 2013.

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88

SANTANA, Neemias. Glossario Orixás – LIBRAS

https://www.youtube.com/watch?v=LC2bq0rIxnc em 10 de janeiro de 2016.

SILVA, Anderson Almeida da; ALBRES, Neiva de Aquino; RUSSO, Angela. Diálogos

em estudos da tradução e interpretação de língua de sinais.1.ed.- Curitiva: Editora

Prismas, 2016.

STEINER, George. Depois de Babel: questões de linguagem e tradução. Tradução de

Carlos Alberto Faraco. Curitiba: Editora da UFPR, 2005.

STROBEL, Karin Lilian et al. Surdos: vestígios culturais não registrados na história.

Florianópolis: Editora da UFSC, 2008.

TODOROV, Tzvetan. As estruturas narrativas; [tradução Leyla Perrone-Moisés]. São

Paulo: Perspectiva, 2016.

TUXI, Patricia. A atuação do intérprete educacional no ensino fundamental. 2009. 112 f.

Dissertação (Mestrado em Educação)-Universidade de Brasília, Brasília, 2009.

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ANEXO

ANEXO I – GRADES CURRICULARES DOS CURSOS DE BACHARELADO EM

LÍNGUA DE SINAIS DO BRASIL

Grade Curricular do curso de Bacharelado de Tradução e Interpretação da Universidade

Federal de Santa Catarina - UFSC

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Fonte: Projeto Político Pedagógico do Curso de Letras Libras da UFSC

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91

1. Semestre do curso de Bacharelado da Ufscar.

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado da Ufscar.

2. Semestre do curso de Bacharelado da Ufscar

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado da Ufscar.

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92

3. Semestre do curso de Bacharelado da Ufscar

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado da Ufscar.

4. Semestre do curso de Bacharelado da Ufscar

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado da Ufscar.

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93

5. Semestre do curso de Bacharelado da Ufscar

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado da Ufscar.

6. Semestre do curso de Bacharelado da Ufscar

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado da Ufscar.

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94

7. Semestre do curso de Bacharelado da Ufscar

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado da Ufscar.

8. Semestre do curso de Bacharelado da Ufscar

Fonte: Projeto Pedagógico do Curso de Bacharelado da Ufscar.

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95

Fluxo Curricular do curso de Bacharelado em Letras: tradução e interpretação em

Libras/Português.

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Figura X - Matriz Curricular do Curso de Letras-Libras

(Bacharelado em Tradução e Interpretação) - UFES

1º Período

Disciplinas T.E.L CR CHT Caráter Pré-requisito

Introdução à Linguística 60 T 4 60 Obrigatória

Introdução aos Estudos da

Tradução

60 T 4 60 Obrigatória

Pesquisa em Tradução e

Interpretação

60 T 4 60 Obrigatória

Leitura e Produção de Texto 60 T 4 60 Obrigatória

Aspectos Histórico-Filosóficos da

Tradução

60 T 4 60 Obrigatória

2º Período

Disciplinas T.E.L CR CHT Caráter Pré-requisito

Estudos da Tradução I 60 T 4 60 Obrigatória

Fonomorfologia 60 T 4 60 Obrigatória *Introdução a

Linguística

Teorias de Aquisição de Segunda

Língua e de Língua Estrangeira

60 T 4 60 Obrigatória

Tradução e Interpretação em

Língua de Sinais I

60 T 4 60 Obrigatória

Estudos Literários I 60 T 4 60 Obrigatória

3º Período

Disciplinas T.E.L CR CHT Caráter Pré-requisito

LIBRAS e Produção Literária 60 T 4 60 Obrigatória Estudos

Literários I

História da Língua de Sinais 60 T 4 60 Obrigatória

Escrita de Sinais I 60 T 4 60 Obrigatória

Laboratório de Interpretação de

Língua Brasileira de Sinais e

Língua Portuguesa I

60 L 2 60 Obrigatória

Morfossintaxe 60 T 4 60 Obrigatória *Introdução à

Linguística

4º Período

Disciplinas T.E.L CR CHT Caráter Pré-requisito

Tradução e Interpretação em

espaços educacionais

60 T 4 60 Obrigatória

Tradução de Textos Científico-

Acadêmicos

30 T +

30 E

3 60 Obrigatória

Laboratório de Interpretação de

Língua Brasileira de Sinais e

Língua Portuguesa II

60 L 2 60 Obrigatória

Práticas Culturais e Língua de

Sinais: Estudos Surdos

60 T 4 60 Obrigatória

Semântica e Pragmática 60 T 4 60 Obrigatória *Introdução à

Linguística

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5º Período

Disciplinas T.E.L CR CHT Caráter Pré-requisito

Sociolinguística 60 T 4 60 Obrigatória *Introdução à

Linguística

Laboratório de interpretação em

Língua de Sinais e Língua

Portuguesa III

60 L 2 60 Obrigatória

Tradução e Interpretação de

Textos Sensíveis

30 T +

30 E

3 60 Obrigatória

Tradução de Textos Literários 30T +30

E

3 60 Obrigatória

Tradução e Interpretação Jurídica 30 T +

30 E

3 60 Obrigatória

Optativa I 60 T 3 60 Optativa

6º Período

Disciplinas T.E.L CR CHT Caráter Pré-requisito

Laboratório de Tradução e

Interpretação em Língua de

Sinais IV

60 L 2 60 Obrigatória Laboratório de

Interpretação de Língua Brasileira

de Sinais e

Língua Portuguesa III

Estágio Supervisionado I 15 T +

75 E

3 90 Obrigatória Laboratório de

Interpretação de Língua Brasileira

de Sinais e

Língua Portuguesa III

Seminário de TCC I 30T +

30E

3 60 Obrigatória

Optativa II 60 T 4 60 Optativa

Análise do Discurso 60 T 4 60 Obrigatória

Interpretação Médica 30 T +

30 E

3 60 Obrigatória

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98

7º Período

Disciplinas T.E.L CR CHT Caráter Pré-requisito

Revisão de Tradução 30 T +

30 E

3 60 Obrigatória

Optativa III 60 T 4 60 Optativa

Seminário de TCC II 15T+

60 E

3 75 Obrigatória

Estágio Supervisionado II 15 T+ 75

E

3 90 Obrigatória Estágio Supervisionado

I

Aspectos Tradutórios e

Interpretativos do Guia- Intérprete

30 T +

30 E

4 60 Obrigatória

8º Período

Disciplinas T.E.L CR CHT Caráter Pré-requisito

Estágio Supervisionado III 15 T +

75 E

6 90 Obrigatória Estágio Supervisionado

II

Seminário de TCC III 75 E 2 75 Obrigatória

Ética em Tradução e

Interpretação

60 T 4 60 Obrigatória

Optativa IV 60T 4 60 Optativa

Optativa V 60T 4 60 Optativa

Atividades Complementares 200

CARGA HORÁRIA TOTAL

DO CURSO

2840

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99

Fluxo Curricular do curso LETRAS/LIBRAS – BACHARELADO DA

UNIVERSIDADE FEDERAL DE RORAIMA (UFRR)

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100

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101

Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO

Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora: Profª. DrªAlice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA TRADUTORES EM CONTEXTO CÊNICO

Nome completo: Lenilson da Costa Silva

Formação: graduando em Letras – PBSL

Cidade Samambaia Norte Data: 24/07/17

Deseja se identificar?( x ) SIM( )NÃO

1. Qual a sua formação acadêmica? Possui formação em tradução de

Libras/português/Libras? Qual?

Estou me graduando em Letras com habilitação de ensino da língua portuguesa

como segunda língua para estrangeiros, surdos e indígenas. Possuo certificado

de proficiência em ensino e tradução/interpretação da Língua de Sinais,

ProLibras.

2. Em quantos espetáculos teatrais você já atuou como tradutor-intérprete de

Libras?

Mais de 10.

3. Como foi a negociação com a companhia de teatro?

Devido a exigências do Fundo de Apoio à Cultura as companhias devem incluir

em seus espetáculos acessibilidade, por isso, na maioria das vezes o primeiro

contato parte delas. Explico como se dá a acessibilidade para surdos em

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espetáculos teatrais e opino qual seria o melhor formato de interpretação a

depender do tipo de espetáculo.

4. Você foi chamado para traduzir apenas para o dia do espetáculo?

Sim ( x ) Não ( )

5. Se não, você foi convidado a participar dos ensaios?

Não, contudo, ao explicar nuances da interpretação e questões da Língua de

Sinais, deixo claro que assistir aos ensaios é parte crucial para se realizar um

trabalho de interpretação satisfatório.

6. Quanto tempo você pode ensaiar com a equipe? Conte um pouco sobre esse

processo.

Normalmente levo até 3 ensaios. Em cada dia tento observar aspectos diferentes

para a composição de sinais classificadores de personagens, por exemplo; pegar

trejeitos dos atores, pensar em tradução de músicas, afinar o “timing” de

interpretação das falas dos personagens entre outros processos.

7. Houve interação com a equipe ou somente com o diretor?

Com ambos.

8. Relate a interação com a equipe durante os ensaios?

De modo geral, no momento em que o intérprete explica os processos de

tradução/interpretação do espetáculo a equipe está presente e é também neste

momento que todos tiram suas dúvidas quanto aos aspectos da cultura e

comunidade surda à medida que vamos falando sobre. Essa interação faz se

importante para que todos compreendam noções básicas do público surdo e

mesmo questões técnicas que precisarão ser adotadas em cena como, por

exemplo, localização do ou dos intérpretes no palco.

9. A tradução foi integrada ao espetáculo ou ocorreu simultaneamente em paralelo?

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Na maioria das vezes a interpretação ocorre de maneira simultânea, deslocada da

cena num canto do palco, mesmo sendo esta a maneira menos preferida pelo

público surdo devido a consideráveis perdas de informações durante o

espetáculo, pois, os mesmos dividem a atenção tanto para a cena (atores) como

para o (s) intérprete (s).

10. Como se sentiu durante o processo tradutório?

Muitas vezes frustrado devido ao formato de interpretação deslocada da cena,

pois sei que para as pessoas surdas muito coisa é perdida nesse processo, coisa

que não acontece para o público não-surdo. Tecnicamente falando, sobre a

interpretação cênica: é um constructo que ainda não há um “manual” de como se

deve fazer, por isso, de certa forma é bom, pois há possibilidades criativas quase

ilimitadas que dependem muito do formato do espetáculo, por exemplo, se é um

musical, uma comédia ou monólogo, se é com pouca luz ou não, se é num palco

ou no meio da rua...

11. Alguma observação adicional?

Penso que deveria haver um curso/oficina específico para tradução cultural

(abrangente, eu sei!), pois essa é uma demanda emergente e a comunidade surda

merece profissionais de qualidade. Outra questão que penso ser importante é a

presença de pessoas surdas no processo de tradução dos roteiros, criação de

sinais para personagens, pois, até o momento isso, e outras tantas questões,

ficam a encargo do intérprete que muitas vezes trabalha sozinho. Um olhar surdo

faz toda diferença.

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Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO

Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora: Profª. DrªAlice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA TRADUTORES EM CONTEXTO CÊNICO

Nome completo: William S. Tomaz

Formação: Superior

Cidade: Brasília - DF Data:27/07/2017

Deseja se identificar?(X) SIM( )NÃO

1. Qual a sua formação acadêmica? Possui formação em tradução de

Libras/português/Libras? Qual? Sou formado em Gestão de Pessoas e Pós

Graduado no Ensino e Tradução de Libras

2. Em quantos espetáculos teatrais você já atuou como tradutor-intérprete de

Libras? Algumas dezenas de espetáculos

3. Como foi a negociação com a companhia de teatro?

Através de contrato

4. Você foi chamado para traduzir apenas para o dia do espetáculo?

Sim (X) Não ( )

Já aconteceu muito

5. Se não, você foi convidado a participar dos ensaios?

Prezo por isso e quando não é possível fica difícil realizar o trabalho

6. Quanto tempo você pode ensaiar com a equipe? Conte um pouco sobre esse

processo.

Cada caso é um caso, procuro absorver o máximo, mas nem sempre existe

sensibilidade e abertura por parte da equipe essa é a parte carne de pescoço,

geralmente os ensaios são combinados e tento fechar o máximo de ensaios ou

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pelo menos assistir o máximo de vezes a peça, mas sem ensaio compromete a

qualidade da interpretação e também do espetáculo.

7. Houve interação com a equipe ou somente com o diretor? É raro ter interação

com toda equipe, mas é o que proponho sempre antes de fechar. Hoje em muitos

casos sim, outros ainda seguem a velha cultura do fazer pra inglês ver e ter fotos

para anexar na prestação de contas.

8. Relate a interação com a equipe durante os ensaios?

Quando a equipe tem abertura para dialogar sobre a qualidade da interpretação

tudo fica harmonioso e produtivo, quando isso não acontece fico parecendo um

intruso que precisa ser eliminado daquele espaço.

9. A tradução foi integrada ao espetáculo ou ocorreu simultaneamente em paralelo?

Busco a integração, mas nem sempre a equipe entra em acordo, logo tem

espetáculos que até chegam a mudar parte do roteiro por conta disso, já outros

não tem como fugir.

10. Como se sentiu durante o processo tradutório?

É um momento de descontruir aquele texto reconstruindo o mesmo de outra

forma e isso é um pouco trabalhoso, as vezes procuro ajuda de colegas com

outras ou mais experiência. Percebi também que é preciso sistematizar em etapas

para alcançar o esperado.

11. Alguma observação adicional?

Por mais que a divulgação do espetáculo tenha qualidade e seja antecipada, o

sucesso de público espontâneo só acontece quando um Surdo faz parte de

alguma etapa do espetáculo, geralmente na minha equipe essa figura atua na

divulgação (chamadas).

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Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO

Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora: Profª. DrªAlice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA TRADUTORES EM CONTEXTO CÊNICO

Nome completo: Thalita Laís de Lima Passos

Formação: Psicologia/ especialização em Tradução e Interpretação de Libras e

Português

Cidade São Paulo – SP Data: 23/07

Deseja se identificar?( x ) SIM( )NÃO

1. Qual a sua formação acadêmica? Possui formação em tradução de

Libras/português/Libras? Qual? Especialização em Tradução e Interpretação de

Libras e Português pelo Instituto Singularidades

2. Em quantos espetáculos teatrais você já atuou como tradutor-intérprete de

Libras?

Em torno de 20

3. Como foi a negociação com a companhia de teatro?

Foi tranquila apesar de alguns acharem que o cachê estava alto. Explico sempre

a necessidade de horas de estudo e pesquisa anterior, horas de ensaio, o que

justifica o cachê.

4. Você foi chamado para traduzir apenas para o dia do espetáculo?

Sim ( ) Não (x)

5. Se não, você foi convidado a participar dos ensaios?

De alguns.

6. Quanto tempo você pode ensaiar com a equipe? Conte um pouco sobre esse

processo.

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Geralmente, o último ensaio, depois de ter tido acesso ao texto. Neste ensaio é

definida nossa posição.

7. Houve interação com a equipe ou somente com o diretor?

Em alguns sim, a questão de posicionamento e luz é sempre decidida junto a

direção, que é em quem encontramos certa resistência as vezes. Alguns diretores

se propõe a pensar junto conosco, outros são autoritários e inacessíveis.

8. Relate a interação com a equipe durante os ensaios?

Em alguns deles não tive essa oportunidade. Nos que pude conversar com outras

pessoas da equipe a interação foi positiva, contribui muito para o processo

tradutório, pois as vezes conseguia novas informações para compor a tradução.

9. A tradução foi integrada ao espetáculo ou ocorreu simultaneamente em paralelo?

Simultaneamente em paralelo foi a situação de todas os que participei. Não tive

a oportunidade de fazer tradução integrada.

10. Como se sentiu durante o processo tradutório?

Confortável, pois em quase todos eu tive oportunidade de pesquisar e me

preparar para o dia da tradução.

11. Alguma observação adicional?

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Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO

Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora: Profª. DrªAlice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA TRADUTORES EM CONTEXTO CÊNICO

Nome completo: Carolina Fernandes Rodrigues Fomin

Formação:

Bacharel em Arquitetura e Urbanismo – Universidade Presbiteriana Mackenzie

Especialização em Acessibilidade – Universidade Nove de Julho

Especialização em Tradução e Interpretação de Libras/Português – Instituto

Singularidades

Mestranda em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem – PUC SP

Cidade São Paulo – SPData: 24/07/17

Deseja se identificar?( X ) SIM( )NÃO

1. Qual a sua formação acadêmica? Possui formação em tradução de

Libras/português/Libras? Qual?

Possuo Bacharel em Arquitetura e Urbanismo – Universidade Presbiteriana

Mackenzie, Minha formação em tradução e interpretação se deu após já ser

intérprete profissionalmente, em uma Especialização em Tradução e Interpretação

de Libras/Português – Instituto Singularidades e atualmente Mestranda em

Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem – PUC SP

2. Em quantos espetáculos teatrais você já atuou como tradutor-intérprete de

Libras?

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Já perdi a conta, mas por volta de 70 - 80

3. Como foi a negociação com a companhia de teatro?

Em cada espetáculo é uma negociação diferente. No meu caso, sou contratada da

instituição Cultural onde o espetáculo acontecerá e não da companhia de teatro.

Por isso, muitas companhias tem ressalvas no início e nem sempre a presença do

intérprete é bem aceita.

4. Você foi chamado para traduzir apenas para o dia do espetáculo?

Sim ( X ) Não ( )

5. Se não, você foi convidado a participar dos ensaios?

Às vezes consigo assistir um ensaio no mesmo dia em que o espetáculo

acontecerá, ou a passagem de lux/som, com trechos do espetáculo.

6. Quanto tempo você pode ensaiar com a equipe? Conte um pouco sobre esse

processo.

Houve um espetáculo infantil em que pude acompanhar 3 ensaios e decidir

questões de tradução, posicionamento e interação com os atores com

antecedência. Esse espetáculo, apresentamos 9 vezes, então também foi possível

fazer ajustes durante a temporada de apresentações.

7. Houve interação com a equipe ou somente com o diretor?

Houve bastante interação com a equipe no caso relatado acima, mas em todos os

outros, não. O contato na maioria das vezes é com o diretor e ainda assim, pouco

e rápido.

8. Relate a interação com a equipe durante os ensaios?

Quando há interação com a equipe, normalmente, tiro dúvidas de partes do

texto, intenções e questões em que surgiram dúvidas. Além disso, questões de

posicionamento, figurino e uso de roupas adequadas ao espetáculo.

9. A tradução foi integrada ao espetáculo ou ocorreu simultaneamente em paralelo?

Normalmente ocorre simultaneamente.

10. Como se sentiu durante o processo tradutório?

Cada espetáculo é uma nova experiência. Em geral, me sinto bem, mas sempre

tenho a sensação de que o processo de tradução pode ser melhorado se houver

mais interação entre a equipe e o intérprete.

11. Alguma observação adicional?

Não.

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Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO

Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora:Profª. DrªAlice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA TRADUTORES EM CONTEXTO CÊNICO

Nome completo: Hellen Thalita José Araújo

Formação: Licenciatura Artes (cursando)

Cidade Brasília-DF Data: 25/07/2017

Deseja se identificar?(x) SIM( )NÃO

1. Qual a sua formação acadêmica? Licenciatura Artes (cursando)Possui formação

em tradução de Libras/português/Libras? Sim Qual? PROLIBRAS 2008

*caso a formação em tradução se refira à graduação, a resposta é não.

2. Em quantos espetáculos teatrais você já atuou como tradutor-intérprete de

Libras?

Por volta de 30 a 40 espetáculos

3. Como foi a negociação com a companhia de teatro?

Normalmente sou contratada para os espetáculos, porém na negociação

geralmente acrescento os ensaios.

4. Você foi chamado para traduzir apenas para o dia do espetáculo?

Sim ( x ) Não ( )

No início sim, mas as trupes/grupos que me contratam atualmente, já

consideram ensaios, tradução do texto, tradução de músicas.

5. Se não, você foi convidado a participar dos ensaios?

Não, geralmente sou eu que ofereço.

6. Quanto tempo você pode ensaiar com a equipe? Conte um pouco sobre esse

processo.

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Em alguns participei desde o processo de criação do espetáculo, juntamente com

os atores até a apresentação, em outros construí a personagem em libras, outros

somente uma semana antes da apresentação do espetáculo e na maioria horas

antes do espetáculo que pude participar do ensaio.

7. Houve interação com a equipe ou somente com o diretor?

Depende de como foi o processo para acessibilizar o espetáculo, mas é comum

que seja somente com o diretor ou com o contratante.

8. Relate a interação com a equipe durante os ensaios?

É relativo, como disse, depende de como é a acessibilidade do espetáculo,

quando estou há mais tempo com o grupo a interação geralmente é tranquila, o

grupo faz sugestões de como posso quebrar a parede de tradução x cena e me

tornar mais parte da cena, gradativamente vamos criando a tradução e a poética,

o grupo entende as possibilidades de tradução para o espetáculo e eu a poética e

o conceito do espetáculo. Quanto menos tempo de ensaio, maior é o desconforto

com o grupo e menor a possibilidade de ter uma tradução integrada.

9. A tradução foi integrada ao espetáculo ou ocorreu simultaneamente em paralelo?

Já ocorreram das duas formas, embora seja mais comum simultaneamente em

paralelo, ofereço sempre a opção de tentar minimamente integrar a tradução,

seja com figurino, com o posicionamento na cena e a partir daí sinto a

receptividade do diretor e sigo inserindo sugestões da forma mais tranquila

possível, nem sempre existe uma boa receptividade.

10. Como se sentiu durante o processo tradutório?

No que se refere a relações interpessoais várias vezes me senti invadindo ou

forçando a minha presença, o que interferiu em muito na minha desenvoltura na

tradução, quanto ao processo de tradução unicamente pela tradução, sinto pesar

o limiar entre atuação e tradução, quando acontece a tradução integrada sinto

que o meu papel é mais claro diante do público e do grupo.

11. Alguma observação adicional?

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Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora: Profª. DrªAlice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA OS DIRETORES DE TEATRO QUE

TRABALHARAM COM TRADUTORES-INTÉRPRETES DE LIBRAS

Nome completo: Hugo Carvalho Santos Ribeiro da Silva

Cidade Brasília Data: 22 07 2017

Deseja se identificar?(X) SIM( )NÃO

1. Quantos espetáculos você dirigiu com tradução/interpretação para Libras

Que eu dirigi, apenas um, o edifício aurora, em 2015. Mas já participei de

muitas produções que tinham tradução para Libras em outras funções.

2. O que motivou a contratação de tradutores-intérpretes de Libras para o seu

espetáculo?

Um dos maiores enfoques do edital do FAC, para nós, naquele ano, era a

questão da acessibilidade. Fazer um espetáculo “acessível” não estava nos

nossos orçamentos, mas estava nas nossas intenções e nos objetivos do projeto

em si. Como se tratava de um experimento videocênico musical, o

desenvolvimento de uma forma de comunicar uma estrutura estética similar

para pessoas que não podem ouvir era crucial. Em uma proposta em que a

maior parte das emoções e sensações era inicialmente planejadas e construídas

como músicas, ou seja, estruturas de comunicação que utilizam a voz - entre

outros elementos da música - era a língua portuguesa falada que servia para

projetar a nossa dramaturgia, o fio da meada por onde o expectador poderia

acompanhar o espetáculo.

3. Os tradutores-intérpretes foram convidados para ensaiar com a equipe?

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Foi fundamental a disponibilidade do competentíssimo profissional que topou a

empreitada. Para mim, não poderíamos simplesmente incluir uma pessoa no

orçamento do projeto e “mostrar as letras” pra ele preparar uma tradução e

aparecer uma vez ou outra pra acompanhar o espetáculo, além dos dias das

apresentações. As letras eram neológicas, complexas, indiretas. A estrutura

dramatúrgica era relativa. Os vídeos projetados no cenário guiavam a maior

parte da encenação. Eu precisava de mais que um simples tratador, eu

precisava de um co-criador. Foi muita sorte encontrar um profissional

disponível que entendesse a complexidade da missão e topasse atuar, dançar,

cantar e traduzir para libras os neologismos do compositor. Nós filmamos em

cromakey toda a tradução que foi projetada em vídeo junto no cenário do

resultado final.

4. Como se deu a relação com o tradutor?

Não foi fácil traduzir, mas a disponibilidade dele permitiu que a gente

dissecasse o universo semântico do compositor e criasse soluções visuais para

essa tradução. Filmar num chromakeymadmax improvisado, editar e projetar

isso também foram etapas delicadas da produção.

5. Eles ficaram no palco?

O resultado final foi o tradutor dançando, atuando e cantando no palco junto

com as outras atrizes/cantoras/dançarinas, ao som de três djs e sob a luz de uma

projeção de vídeo. Na projeção, os filmes que compunham a dramaturgia e as

filmagens da tradução, acontecendo simultaneamente em diferentes lugares do

cenário.

6. Como a direção tomou a decisão de integrar a tradução ou deixá-la em

paralelo?

Não havia a menor chance de deixar qualquer etapa da composição “em

paralelo”. Talvez isso seja útil em emergências e/ou improvisos, debates, e

vários outros serviços. Mas qualquer produção artística que se preocupe com a

acessibilidade pode, com planejamento, investimento e algumas concessões,

também fazer da sua estética e da sua forma de arte mais acessível, ao invés de

categoricamente negligenciar esse público durante toda a produção e, depois de

tudo pronto, acoplar um tradutor, como um acessório. Com o tempo e o

trabalho necessários, pode ser algo que cresce junto com a produção,

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descobrindo e resolvendo sucessivos problemas assim como as outras etapas da

produção, como a iluminação, a cenografia e etc..

7. Em sua opinião a tradução prejudica a estética do espetáculo?

Talvez, se for inserida como um acessório adjunto e destacado do projeto. Mas

isso não significa que a tradução sempre atrapalha na imersão no espetáculo,

ou que toma toda a atenção para si, mas ao invés de competir por atenção,

poderia contribuir e colaborar.

8. A estética do espetáculo é prejudicada, a seu ver, quando a tradução é integrada

ou quando ela está em paralelo?

A estética é prejudicada quando não se resolve, ou não se aceita a interferência

deste serviço. Quando, mesmo sabendo que deve haver tradução no projeto

final, o criador do espetáculo toma a decisão de não incluir esse termo na sua

encenação, prevendo que poderá simplesmente usar um destaque de iluminação

ou de cenário para afastar esse tradutor do procenio, para que ele “atrapalhe” o

mínimo possível. É uma escolha idiota. Mas isso também dependeria de varias

coisas. Por exemplo de achar um profissional que se prontifique a criar,

adaptar, ensaiar, apresentar e etc., por um valor que pode não ser o de mercado,

entre outras dificuldades do campo do teatro. Por exemplo, ter uma produção

que “soubesse” desde o momento da montagem do espetáculo, ou seja com

uma antecedência cinematográfica, que vai haver essa tradução. “Soubesse”

assim entre aspas porque, na minha visão, é obvio que, se você vai abrir as

portas do seu espetáculo para uma cidade inteira, vão aparecer pessoas com

todas as características, inclusive com todo tipo de dificuldades, porque essas

pessoas existem na sociedade. Pensar que essas pessoas não vão consumir os

seus produtos culturais eh invisibilizar essas pessoas, uma parcela grande da

população, que como um todo já tem cada vez menos acesso a cultura.

Quais foram as principais dificuldades e quais as sugestões para que as mesmas sejam

evitadas?

Planejamento. Principalmente organização, método. Para que as propostas não fiquem

impossíveis, ou inexequíveis. Quando a gente pensa em distorcer um objeto artístico

para que ele possa se adaptar a uma outra verão de relação com a realidade, muitas

coisas podem vir a parecer destrutivas, parecer que incomodam, ou que tem que

observar os limites das duas ciências: onde a linguagem da licença para que a arte brilhe

mais, ou onde a arte abaixa a crista para que a linguagem comunique melhor. É um jogo

de compensar. Observa o seu projeto, abre a cabeça, desapega, abre a mão, e,

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principalmente conversa com alguém que possa orientar. Foi o que permitiu que a gente

conseguisse executar todas essas tarefas, com relativamente pouco recurso e em

relativamente pouco tempo.

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Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora: Profª. DrªAlice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA OS DIRETORES DE TEATRO QUE

TRABALHARAM COM TRADUTORES-INTÉRPRETES DE LIBRAS

Nome completo: Abaetê Queiroz e Cavalcanti

Cidade: Brasília Data:22/07/2017

Deseja se identificar?(X) SIM( )NÃO

1. Quantos espetáculos você dirigiu com tradução/interpretação para

Libras

Não sei ao certo. Dirigindo, apenas um. Enquanto ator, já tive a oportunidade

de dividir o palco com estes profissionais umas cinco vezes. Mas já assisti a

vários espetáculos com a presença de intérpretes de Libras.

2. O que motivou a contratação de tradutores-intérpretes de Libras para o

seu espetáculo?

Não escrevi o projeto e não fui responsável pela contratação de ninguém.

Acredito que a maior motivação para esse novo serviço é a pontuação nos

editais locais. Como toda forma de inclusão valoriza os projetos fomentados

pelo estado, o intérprete de Libras se tornou muito requisitado na cidade.

3. Os tradutores-intérpretes foram convidados para ensaiar com a equipe?

Volta a dizer que não fui responsável pela contratação dos profissionais. Logo,

não sei precisar o contrato dos envolvidos. O que acredito é que não se paga,

nem se cobra a presença dos intérpretes como os demais artistas.

4. Como se deu a relação com o tradutor?

Cem por cento das vezes, os intérpretes estavam entre os mais capacitados,

empolgados e assíduos.

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5. Eles ficaram no palco?

Nos meus projetos, apenas uma vez. Mas já presenciei em mais um espetáculo.

6. Como a direção tomou a decisão de integrar a tradução ou deixá-la em

paralelo?

Especificamente no espetáculo “Tradição Viva”, tínhamos muitos motivos para

centralizar o intérprete no palco.

Primeiro: a dimensão gigantesca do palco. Se eu o deslocasse para a lateral do

teatro, seria como uma legenda na lateral do cinema.

Segundo: o trabalho misturava dança, música, teatro, manipulação de bonecos,

uma iluminação virtuosa e um grande cenário. A pluralidade de técnicas

apresentadas exigia a presença do intérprete entre os demais artistas. Tirá-lo do

palco seria entortar a estética e desprezá-lo como linguagem.

Terceiro: numa obra que visa aproximar culturas, seria extremamente

contraditório excluir o intérprete de Libras do foco da cena.

Quarto: nosso profissional envolvido, Virgílo Soares, se demonstrou um artista

tão capacitado ou mais que os demais integrantes do processo. Impossível não

dar a ele o espaço que naturalmente ele conquistou.

7. Em sua opinião a tradução prejudica a estética do espetáculo?

Como tudo que é muito novo, é necessário aprender como utilizar e integrar

um profissional dessa área. Assisti a um espetáculo chamado “Copo de Leite”.

A intérprete de Libras estava completamente integrada à peça. Se tirá-la, a

história ficará incompleta. Mérito da direção e a da própria intérprete.

8. A estética do espetáculo é prejudicada, a seu ver, quando a tradução é

integrada ou quando ela está em paralelo?

Sim. Na grande maioria das vezes. Ainda existe uma falta de vontade, falta de

visão, banalização e desrespeito por parte dos artistas que tentam encaixar a

Libras de última hora em seus trabalhos. E é óbvio que a linguagem de sinais é

altamente cênica, chamativa e curiosa. É muito fácil se tornar um show a parte.

Quais foram as principais dificuldades e quais as sugestões para que as

mesmas sejam evitadas?

No meu caso, não tivemos problemas devido à singularidade do trabalho. Mas

acredito que a presença constante nos ensaios dos espetáculos seja o primeiro

passo. Integrar o intérprete como mais um profissional, fixo, dos processos de

criação de uma obra.

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Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO

Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora: Profª. DrªAlice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA TRADUTORES EM CONTEXTO CÊNICO

Nome completo: Carolina Fernandes Rodrigues Fomin

Formação:

Bacharel em Arquitetura e Urbanismo – Universidade Presbiteriana Mackenzie

Especialização em Acessibilidade – Universidade Nove de Julho

Especialização em Tradução e Interpretação de Libras/Português – Instituto

Singularidades

Mestranda em Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem – PUC SP

Cidade São Paulo – SPData: 24/07/17

Deseja se identificar?( X ) SIM( )NÃO

1. Qual a sua formação acadêmica? Possui formação em tradução de

Libras/português/Libras? Qual?

Possuo Bacharel em Arquitetura e Urbanismo – Universidade Presbiteriana

Mackenzie, Minha formação em tradução e interpretação se deu após já ser

intérprete profissionalmente, em uma Especialização em Tradução e Interpretação

de Libras/Português – Instituto Singularidades e atualmente Mestranda em

Linguística Aplicada e Estudos da Linguagem – PUC SP

2. Em quantos espetáculos teatrais você já atuou como tradutor-intérprete de

Libras?

Já perdi a conta, mas por volta de 70 - 80

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3. Como foi a negociação com a companhia de teatro?

Em cada espetáculo é uma negociação diferente. No meu caso, sou contratada da

instituição Cultural onde o espetáculo acontecerá e não da companhia de teatro.

Por isso, muitas companhias tem ressalvas no início e nem sempre a presença do

intérprete é bem aceita.

4. Você foi chamado para traduzir apenas para o dia do espetáculo?

Sim ( X ) Não ( )

5. Se não, você foi convidado a participar dos ensaios?

Às vezes consigo assistir um ensaio no mesmo dia em que o espetáculo

acontecerá, ou a passagem de lux/som, com trechos do espetáculo.

6. Quanto tempo você pode ensaiar com a equipe? Conte um pouco sobre esse

processo.

Houve um espetáculo infantil em que pude acompanhar 3 ensaios e decidir

questões de tradução, posicionamento e interação com os atores com

antecedência. Esse espetáculo, apresentamos 9 vezes, então também foi possível

fazer ajustes durante a temporada de apresentações.

7. Houve interação com a equipe ou somente com o diretor?

Houve bastante interação com a equipe no caso relatado acima, mas em todos os

outros, não. O contato na maioria das vezes é com o diretor e ainda assim, pouco

e rápido.

8. Relate a interação com a equipe durante os ensaios?

Quando há interação com a equipe, normalmente, tiro dúvidas de partes do

texto, intenções e questões em que surgiram dúvidas. Além disso, questões de

posicionamento, figurino e uso de roupas adequadas ao espetáculo.

9. A tradução foi integrada ao espetáculo ou ocorreu simultaneamente em paralelo?

Normalmente ocorre simultaneamente.

10. Como se sentiu durante o processo tradutório?

Cada espetáculo é uma nova experiência. Em geral, me sinto bem, mas sempre

tenho a sensação de que o processo de tradução pode ser melhorado se houver

mais interação entre a equipe e o intérprete.

11. Alguma observação adicional?

Não.

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Universidade de Brasília (UnB)

Instituto de Letras (IL)

Programa de Pós-Graduação em Estudos da Tradução (POSTRAD)

Pesquisa: FORMAÇÃO DO TRADUTOR/INTÉRPRETE DE LIBRAS NO

TEATRO Mestrando Pesquisador: Virgílio Soares da Silva Neto.

Orientadora: Profª. Drª Alice Maria de Araújo Ferreira

QUESTIONÁRIO PARA OS DIRETORES DE TEATRO QUE

TRABALHARAM COM TRADUTORES-INTÉRPRETES DE LIBRAS

Nome completo: Sérgio Sartório Silva

Cidade__Brasília-DF________________________ Data:20/05/2017

Deseja se identificar?( x) SIM( )NÃO

1. Quantos espetáculos você dirigiu com tradução/interpretação para Libras- Tres

espetáculos

2. O que motivou a contratação de tradutores-intérpretes de Libras para o seu

espetáculo? A primeira vez que tive um espetáculo com tradução/interpretação

para Libras foi um iniciativa do contratante, o SESC de Porto velho, Rondonia.

A experiência foi muito positiva. Por isso as duas montagens que se seguiram

com minha direção, nós ja previmos a tradução desde a elaboração do projeto

para o FAC-DF. O que também conta pontos para a avaliação no edital.

3. Os tradutores-intérpretes foram convidados para ensaiar com a equipe? Não.

mandamos o vídeo e o texto.

4. Como se deu a relação com o tradutor? Nos conhecemos pouco antes das

apresentações.

5. Eles ficaram no palco? Sim

6. Como a direção tomou a decisão de integrar a tradução ou deixá-la em

paralelo? Sempre colocamos os tradutores no palco, bem ao lado da encenação.

7. Em sua opinião a tradução prejudica a estética do espetáculo? Não.

8. A estética do espetáculo é prejudicada, a seu ver, quando a tradução é integrada

ou quando ela está em paralelo? Não sei se você considera os tradutores no

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palco, mas fora do cenário, como integrada ou paralela.

Quais foram as principais dificuldades e quais as sugestões para que as mesmas sejam

evitadas?