A Fun¸c˜ao Zeta de um Corpo de Fun¸c˜oes e o Teorema de ...ftorres/ENSINO/MONOGRAFIAS/Hasse-Weil.pdf · Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho E-mail: [email protected]

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  • A Funcao Zeta de um Corpo de Funcoes e o

    Teorema de Hasse-Weil

    Tiago N. CastilhoE-mail: [email protected]

    Resumo

    Faremos um estudo sobre a funcao Zeta de um Corpo de Funcoes F/K buscandoestabelecer uma estimativa para o numero de lugares de grau um nessa extensao. Paraque isso faca sentido devemos considerar K um corpo finito, digamos Fq. Veremosque em geral nao existe uma formula que calcula explicitamente esse numero, maspodemos encontrar cotas inferiores e superiores dependendo exclusivamente do generog de F/Fq e de q. Este sera o Teorema da Cota de Hasse-Weil. A funcao Zeta de umCorpo de Funcoes, que definiremos adiante, tem papel crucial na demonstracao desseteorema e por esse motivo sera feito um estudo extensivo de suas propriedades.

    1 Introducao

    O objetivo central deste trabalho e apresentar uma exposicao da demonstracao de E.Bombieri da Hipotese de Riemann para Corpos de Funcoes, ou em outra linguagem, paraCurvas sobre Corpos Finitos. Este resultado tambem e conhecido como o Teorema deHasse-Weil e possui diversas consequencias interessantes, entre elas o Teorema (da cota)de Hasse-Weil que ira fornecer uma estimativa para o numero de lugares de grau umda extensao. Para curvas hiperelpticas a Hipotese de Riemann para Corpo de Funcoesfoi primeiramente conjecturada, em 1920, por E. Artin. Em 1930, H. Hasse ofereceu aprimeira contribuicao substancial provando para o caso particular de um corpo de funcoescom genero um, isto e, para curvas elpticas. Em 1940, A. Weil forneceu um metodo paraprovar o caso geral. Ele deu duas demonstracoes. A primeira envolvendo a Teoria daIntersecao sobre Superfcies Algebricas e a segunda envolvendo Representacoes l-adicase Variedades Abelianas. Ambas as demonstracoes usam metodos sofisticados de geome-tria algebrica. Em 1960, S.A. Stepanov escreveu uma nova demonstracao, embora quepara casos especiais, que utilizou nada mais que o conhecimento da teoria envolvida nademonstracao do Teorema de Riemann-Roch. Logo apos, W. Schimdt utilizou das ideiasde Stepanov para demonstrar o caso geral. Finalmente, E. Bombieri escreveu uma sim-plificacao substancial das demonstracoes de Stepanov e Schimdt. Recentemente Voloch eStohr deram uma nova demonstracao da Hipotese de Riemann para Corpos de Funcoesbaseada na teoria de Pontos de Weierstrass. A demonstracao que faremos neste trabalhoe dual a de E. Bombieri. O objeto principal desta demonstracao e a funcao Zeta quee extremamente relacionada a classica funcao Zeta de Riemann (veja Secao 3), por essemotivo faremos um estudo extensivo de suas propriedades.

    Em todo texto F denota um corpo de funcoes algebricas de genero g cujo corpo deconstantes 1 e o corpo finito Fq. Denotaremos por DF o conjunto dos divisores de F e por

    1Dado um corpo de funcoes algebricas F/K, dizemos que K e o corpo de constates dessa extensao seF e algebricamente fechado sobre K, isto e, todo polinomio com coeficientes em K tem suas razes em F .

    1

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    PF o conjunto dos lugares de F . Na verdade, DF e o Z-grupo abeliano livre gerado peloselementos de PF . Para cada P PF , OP denotara seu anel de valorizacao associado. Se De um divisor de F , entao denotaremos por L(D) o conjunto formado por todos os elementosx F tais que (x) + D 0 e por L(D) o Fq-espaco vetorial definido por L(D) {0} cujadimensao finita e l(D). Tambem e costume usar a notacao dim(D) := dim(L(D)) paraa dimensao do espaco L(D). O Teorema de Riemann-Roch calcula l(D) e admite comocorolario a desigualdade

    l(D) deg(D) + 1 g,

    sendo que a igualdade e valida sempre que deg(D) 2g 1.

    2 A Funcao Zeta de um Corpo de Funcoes

    Nessa secao iremos expor as principais propriedades do que vamos chamar de funcao Zetade um corpo de funcoes (ou simplesmente funcao Zeta).

    Lema 2.0.1 Para todo inteiro nao negativo n, existe apenas um numero finito de divisorespositivos de grau n.

    Demonstracao: Todo divisor positivo e soma de divisores primos. Deste modo, bastaprovar que o conjunto S := {P PF ; deg P n} e finito. Escolhendo um elemento x F\Fq transcendente em Fq podemos considerar o conjunto S0 := {P0 PFq(x); deg P0 n}.E claro que para todo P S se tem P Fq(x) S0 e que todo P0 S0 admite apenas umnumero finito de extensoes em F . Deste modo, basta mostrarmos que S0 e um conjuntofinito. De fato, para cada lugar em S0, exceto possivelmente o polo de x cujo graue um, podemos corresponder um polinomio irredutvel com coeficientes em Fq com omesmo grau, como a cardinalidade do conjunto desses polinomios e finita, o resultadosegue imediatamente.

    Ao longo deste captulo usaremos PF para denotar o subgrupo de DF formado portodos os divisores principais (x) =

    PPF vP (x)P onde 0 6= X F . O grupo quociente

    CF = DF /PF e chamado grupo das classes de divisores de F/Fq. Dois divisoresD,D DF sao ditos equivalentes se D = D +(x) para algum divisor principal (x) PF ,neste caso usamos a notacao D D. A classe de D no grupo de divisores CF e denotadapor [D]. Divisores equivalentes tem o mesmo grau e a mesma dimensao, deste modo dadoum divisor D DF os inteiros

    deg[D] := deg(D) e dim[D] := dim(D)

    estao bem definidos.

    Definicao 2.0.1 O subgrupo de DF definido por

    D0F := {D DF ; degD = 0}

    e chamado o grupo de divisores de grau zero, e

    C0F := {[D] CF ; deg[D] = 0}

    e o grupo das classes de divisores de grau zero.

    2

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Proposicao 2.0.1 A cardinalidade (ou a ordem) do grupo C0F e finita.

    Demonstracao: Escolha B DF de grau n g, e considere o seguinte conjunto

    CnF := {[C] CF ; deg[C] = n}.

    A aplicacao : C0F CnF[A] 7 [A + B]

    e injetora e bem definida, assim e suficiente mostrarmos que CnF e finito. Primeiramenteobserve que se A DF entao

    L(A) 6= A DF , A > 0 t.q. [A] [A].

    Agora, para todo [C] CnF temos deg[C] = n g, assim podemos usar o Teorema deRiemann-Roch para concluir que

    dim[C] = dim C n + 1 g 1.

    Isto quer dizer que L(C) 6= e portanto existe C DF , C > 0 t.q. [C ] [C]. Segueque cada classe do conjunto CnF pode ser representada por um divisor positivo. Pelo Lema??, o numero dessas classes e finito. Portanto a cardinalidade de C0F e tambem finita.

    Pela Proposicao ?? esta bem definido o seguinte inteiro positivo:

    h := hF := #C0F ,

    onde #C0F denota a cardinalidade de C0F .

    Observacao 2.0.1 A aplicacao : C0F CnF[A] 7 [A + B]

    definida na demonstracao da Proposicao ?? para n g e na verdade uma bijecao. Destemodo, cardinalidade de CnF coincide com a cardinalidade de C0F , i.e., #CnF = h.

    Considere o inteiro positivo definido por

    := min{deg A > 0 ; A DF }. (1)

    Observacao 2.0.2 A aplicacao deg : DF Z e um homomorfismo de grupos. Assimsua imagem e um subgrupo de Z, a saber Img(deg) = Z, segue que o grau de qualquerdivisor de F/Fq e um multiplo de .

    Para todo inteiro nao negativo n, definimos:

    An = |{A DF ; A > 0 e deg A = n}|

    Observacao 2.0.3 A0 = 1 e A1 e exatamente o numero de lugares P PF cujo grau e1. An = 0 se 6 |n.

    3

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    A partir de agora convencionaremos que L(D) := L(D)\{0} e que l(D) := dimL(D).Antes de definirmos a funcao Zeta, consideremos o seguinte lema:

    Lema 2.0.2 (a) Para todo [C] CF , vale a igualdade

    |{A [C] ; A 0}| = ql(C) 1q 1

    .

    (b) Para todo n > 2g 2 com |n, vale a igualdade

    An = h qn+1g 1

    q 1.

    Demonstracao: (a) Seja A {A [C] ; A 0}, entao

    0 A = (x) + C para algum x L(C).

    Como L(C) e um Fq-espaco vetorial de dimensao l(C), existem ql(C) 1 elementos x L(C), digamos x1, . . . , xql(C)1, logo

    (x) + C {(x1) + C, . . . , (xql(C)1) + C} =: X.

    Afirmamos que existem exatamente q 1 elementos iguais a (x) + C em X. De fato,

    (x) + C = (y) + C (x) = (y) (xy1) = (0)

    vp(xy1) = (0) P PF xy1 Fq\{0} x = cy,

    onde c Fq\{0}, logo existem exatamente ql(C)1q1 possibilidades para representar o divisor

    A = (x) + C e o resultado segue.(b) Como #CnF = h < podemos por CnF = {[C1], . . . , [Ch]}. Com a hipotese n > 2g

    2, usamos o Teorema de Riemann-Roch para concluir que l(Ci) = n+1 g (i = 1, , h).Pela parte (a),

    |{A [Ci] ; A 0}| =ql(Ci) 1

    q 1=

    gn+1g 1q 1

    .

    Como cada divisor de grau n esta em alguma classe [Ci] podemos concluir que

    An =h

    j=1

    |{A [Ci] ; A 0}| =h

    j=1

    gn+1g 1q 1

    = hqn+1g 1

    q 1.

    Definicao 2.0.2 A serie de potencias

    Z(t) := ZF (t) :=

    n=0

    Antn C[t]

    e chamada de funcao Zeta de F/Fq.

    Lema 2.0.3 Se F/Fq e um corpo de funcoes com genero g = 0, entao a cardinalidade deC0F e um.

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    Demonstracao: Mostraremos que, com a hipotese g = 0, todos os divisores de grau zerosao principais. Seja A DF t.q. deg(A) = 0. Entao deg(A) > 2g 2 = 2. Pelo Teoremade Riemann-Roch, dim(A) = deg(A)+1 g = 1 e portanto existe um elemento x F t.q.(x) + A 0, i.e., vP ((x) + A) 0 P PF . Agora,

    0 = deg((x) + A) =

    PPF

    (vP ((x) + vP (A)) 0

    deg(P ) >0

    ,

    logovP (A) = vP ((x)) P PF , i.e., A = (x) = (x1).

    Portanto A e principal. Como todos os divisores principais sao equivalentes, 2 segue que#C0F = 1.

    Proposicao 2.0.2 A serie Z(t) =

    n=0 Antn converge sempre que |t| < q1 e seu unico

    polo e em t = 1. Mais precisamente, para |t| < q1 temos que:

    (a) Se F/Fq tem genero g = 0 entao

    Z(t) =1

    q 1

    ( q1 (qt)

    11 t

    ).

    (b) Se F/Fq tem genero g 1 entao Z(t) = F (t) + G(t) onde

    F (t) =1

    q 1

    0deg[C]2g2

    qdim[C] tdeg[C],

    eG(t) =

    h

    q 1

    (q1g(qt)2g2+

    11 (qt)

    11 t

    ),

    onde h e cardinalidade de C0F .

    Demonstracao: Mostraremos apenas a parte (a) pois a demonstracao de (b) e analogacom uma notacao mais elaborada (veja ref. [1] pag. 161). Pelo Lema ?? o numeroh = #C0F e 1. Como para todo inteiro positivo n vale n > 2g 2 = 2, podemos aplicara parte (b) do Lema ?? para obter

    n=0

    Antn =

    n=0

    Antn =

    n=0

    1q 1

    (qn+1 1)tn =

    =1

    q 1

    (q

    n=0

    (qt)n

    n=0

    tn)

    =

    =1

    q 1

    ( q1 (qt)

    11 t

    ),

    sempre que |qt| < 1. Isto demonstra (a).

    2De fato, se (x) e (y) sao dois divisores principais, entao (x) = (x) (y) + (y) = (xy1) + (y), logo(x) (y).

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    Observacao 2.0.4 A partir de agora, a menos que seja dito o contrario, estaremos sem-pre supondo que Z(t) esta definida para |t| < q1.

    A proxima proposicao caracteriza Z(t) =

    n=0 Antn como um produto, chamado de

    Produto de Euler. Este nome sera justificado na proxima secao quando mostrarmos quea funcao Zeta de um corpo de Funcoes nao e nada mais do que um analogo da famosafuncao Zeta de Riemann.

    Proposicao 2.0.3 (Produto de Euler) Sempre que |t| < q1, a funcao Zeta pode serrepresentada por

    Z(t) =

    PPF

    (1 tdeg P )1.

    Demonstracao: Basta observar que quando |t| < q1, vale

    PPF

    (1 tdeg P )1 =

    PPF

    n=0

    (tdeg P )n =

    PPF

    n=0

    tdeg nP =

    ADF ,A0tdegA =

    =

    degA=0

    tdegA +

    degA=1

    tdegA + + . . . = 1A0 + A1t + . . . =

    n=0

    Antn = Z(t)

    Observacao 2.0.5 Segue da proposicao anterior que Z(t) 6= 0 quando |t| < q1.

    Por simplicidade denotaremos por Zr(t) a funcao Zeta sobre o corpo Fr = FFqr cujocorpo de constantes e Fqr . O proximo passo sera determinar de forma precisa o valor definido em (??). Para ser mais exato iremos mostrar que = 1 e concluir que deg :DF Z e na verdade um epimorfismo3. Este vai ser um corolario da proxima proposicao.Antes precisamos do seguinte lema:

    Lema 2.0.4 Seja P um lugar em F/Fq de grau m e estenda o corpo de constantes Fq paraFqr . Se considerarmos P como um lugar em Fr/Fqr , entao P admite uma decomposicaoP = P1 + . . . + Pd onde cada Pi PFr , deg Pi = m/d e d = mdc(r, m).

    Demonstracao: Seja P PFr tal que P |P , entao P e nao ramificado4 e FP = FP Fqr(veja ref. [1] pag. 103). Como [FP : Fq] = m, temos FP ' Fqm . Seja l = mmc(m, r),entao

    FP = FP Fqr = FqmFqr = Fql

    Como[Fql : Fq]

    l

    = [Fql : Fqr ] l/r

    [Fqr : Fq] r

    ,

    e deg(P ) = [FP : Fqr ] = [Fql : Fqr ], temos deg(P ) = l/r. Por outro lado, comol = mmc(m, r) e d = mdc(m, r), entao mr = ld, i.e., l/r = m/d. Portanto deg(P ) = m/dpara todo P PFr tal que P |P .

    3homomorfismo sobrejetor.4Dizemos que um lugar P PFr tal que P |P e nao ramificado se e(P |P ) = 1.

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    Para demonstrar a proxima proposicao tambem iremos precisar da seguinte propriedadepolinomial elementar: Se m 1 e r 1 sao inteiros e d = mdc(m, r), entao

    (Xr/d 1) =r=1

    (X m),

    onde percorre sobre as r-ezimas razes da unidade em C. Se substituirmos X = t1 naequacao e multiplicarmos por tmr, obteremos

    (1 tmr/d)d =r=1

    (1 (t)m). (2)

    Observe que d = 1 sempre que m = 1. Neste caso, podemos reescrever a equacao (??)acima como

    1 tr =r=1

    (1 t). (3)

    Proposicao 2.0.4 Sejam Z(t) e Zr(t) as funcoes Zeta sobre F e Fr respectivamente,entao para todo t C

    Zr(tr) =r=1

    Z(t),

    onde percorre o conjunto das r-ezimas razes da unidade.

    Demonstracao: Basta verificarmos para |t| < q1. Nesta regiao podemos usar aProposicao ?? para obter a seguinte igualdade

    Zr(tr) =

    P PFr

    (1 trdeg P )1 =

    PPF

    P |P

    (1 trdeg P )1 (4)

    Fixado P e pondo m = deg P e d = mdc(m, r) temosP |P

    (1 trdeg P )1 = ((1 trmd )d)1 =

    r=1

    (1 (t)m)1 =r=1

    Z(t),

    onde as igualdades (*) e (**) decorrem respectivamente do Lema ?? e da equacao (??).Substituindo em (??) segue que

    Zr(tr) =

    PPF

    r=1

    (1 (t)m)1 =r=1

    PPF

    (1 (t)m)1 =r=1

    Z(t).

    Corolario 2.0.1 = min{deg A > 0; A DF } = 1.

    Demonstracao: Para = 1, temos

    Z(t) =

    PPF

    (1 (t)deg P )1 =

    PPF

    (1 tdeg P )1 = Z(t),

    7

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    pois divide o grau de P para todo P PF . Pela Proposicao ??, Z(t) = Z(t) . Agora,pela Proposicao ??, Z(t) tem um polo simples em t = 1, enquanto que Z(t) tem umpolo de ordem . Deste modo, = 1.

    Observacao 2.0.6 Pelo Corolario ?? a imagem da aplicacao deg : DF Z e Z. Destemodo, em qualquer corpo de funcoes cujo corpo de constantes e finito sempre existiraodivisores de grau um.

    Corolario 2.0.2 Qualquer corpo de funcoes F/Fq de genero g = 0 e racional e sua funcaoZeta e dada por

    Z(t) =1

    (1 t)(1 qt).

    Demonstracao: Pela Observacao ?? existe A DF tal que deg(A) = 1 2g 1, poisg = 0. Pelo Teorema de Riemann-Roch, dim(A) = 1 + 1 0 = 2 e portanto existe A 0tal que A A, dim(A) = dim(A) e deg(A) = deg(A) = 1. 5 Como dim(A) = 2,podemos escolher x L(A)\Fq tal que (x) + A 0. Como A 0 podemos concluir que(x) = A. Agora,

    [F : K(x)] = deg (x) = degA = 1,

    e portanto F = K(x), i.e., F/K e racional. A segunda parte decorre diretamente do item(a) da Proposicao ??.

    A demonstracao da proxima Preposicao e so trabalhosa e nao apresenta acrescimosteoricos, portanto sera omitida.

    Proposicao 2.0.5 (Equacao Funcional da Funcao Zeta) A funcao Zeta de F/Fq sat-isfaz

    Z(t) = qg1t2g2Z(1qt

    )

    Demonstracao: Veja ref. [1] pag. 165.

    Definicao 2.0.3 O polinomio L(t) := LF (t) := (1 t)(1 qt)Z(t) e chamado de L-polinomio de F/Fq.

    Observacao 2.0.7 Pelo Corolario ??, se F/Fq tem genero 0 entao L(t) = 1. PelaProposicao ?? facilmente vemos que o grau do polinomio L(t) e inferior a 2g.

    Definicao 2.0.4 Se o L-polinomio L(t) e dado por L(t) = a0 + a1t + . . . + a2gt2g, entaodefinimos o polinomio recproco de L(t) por

    L(t) = a0t2g + a1t2g1 + . . . + a2g.

    As razes de L(t) sao ditas razes recprocas.5De fato, como dim(A) = 2 existe x L(A)\ Fq t.q. (x) + A =: A 0. As aplicacoes : L(A)

    L(A), x 7 xz e : L(A) L(A), x 7 xz1 sao homomorfismos entre espacos vetoriais inversos umdo outro. E claro que deg A = deg (A + (z)) = deg A.

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  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    E facil ver que

    L(t) = t2gL(1t).

    Logo, e raiz de L(t) se, e somente se, 1 e raiz de L(t).

    A seguir daremos uma serie de propriedades relativas ao polinomio L(t). Iremos sem-pre supor que g 1, pois o caso g = 0 e trivial.

    Propriedade 1 L(t) = qgt2gL(1/qt).

    Demonstracao: Isto nao e nada mais que a equacao funcional Zeta.

    Propriedade 2 Escrevendo L(t) = a0 + a1t + . . . + a2gt2g, entao valem

    (i) a0 = 1 e a2g = qg.

    (ii) a1 = N (q + 1) onde N e o numero de lugares P PF de grau um.

    Demonstracao: (i) Pela equacao funcional dada pela propriedade 1, temos

    L(t) = qgt2gL(1/qt) =a2gqg

    +a2g1qgi

    t + . . . + qga0t2g.

    Segue quea2gi = qg1ai (i = 0, . . . , g).

    Agora, observe que

    L(t) = (1 t)(1 qt)

    n=0

    Antn =

    = (1 t)(1 qt)A0t0 + (1 t)(1 qt)A1t1 + (1 t)(1 qt)

    n=2

    Antn =

    = (1 t)(1 qt) + (1 t)(1 qt)Nt1 + (1 t)(1 qt)

    n=2

    Antn =

    = 1 t(q + 1) + qt2 + (t t2(q + 1) + qt3)N + (1 t)(1 qt)

    n=2

    Antn =

    = 1 + t(N (q + 1)) + qt2 + (t2(q + 1) + qt3)N + (1 t)(1 qt)

    n=2

    Antn,

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  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    logo a0 = 1 e a1 = N (q + 1) e da igualdade a2gi = qg1ai podemos concluir quea2g = qg.

    Propriedade 3 Em C[t], o polinomio L(t) pode ser fatorado da forma

    L(t) =2gi=1

    (1 it)

    onde os is sao inteiros algebricos6 tais que, por uma troca de ndices se necessario,

    cumprem ig+i = q, i = 1, . . . , g. Na verdade, os is sao as razes recprocas de L(t).

    Demonstracao: L(t) e um polinomio monico de grau 2g e com coeficientes em Z.Portanto, suas razes 1, . . . , 2g C sao inteiros algebricos e podemos escrever L(t) =2g

    i=1(t i). Assim,

    L(t) = t2gL(1t) = t2g

    2gi=1

    (1t i) =

    = t2g2gi=1

    (1t(1 ti)) =

    2gi=1

    (1 ti).

    Agora, usando a equacao L(t) = qgt2gL( 1qt) vemos que

    L() = 0 L(1) = 0 L(q) = 0 L( q

    ) = 0,

    isto e, e raiz de L(t) se, e somente se, q e raiz de L(t). Logo, podemos reorganizar

    as razes de L(t) da forma1, . . . , 2g,

    q

    1, . . . ,

    q

    2g.

    Pondo i = i para i = 1, . . . , g e j = qj para j = g + 1, . . . , 2g, vemos facilmenteque ig+i = q, i = 1, . . . , g. Isto conclui a demonstracao.

    Propriedade 4 Se Lr(t) = (1 t)(1 qrt)Zr(t) denota o L-polinomio de corpo de con-stantes Fr = FFr, entao

    Lr(t) =2gi=1

    (1 ri t),

    onde os is sao dados na propriedade anterior.

    6Um numero complexo e dito inteiro algebrico se e raiz de algum polinomio com coeficientesinteiros.

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  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Demonstracao: Usando a Proposicao ?? e a equacao (??), temos

    Lr(tr) = (1 tr)(1 qrtr)Zr(t) = (1 tr)(1 qrtr)r=1

    Z(t) =

    = (1 tr)(1 qrtr)r=1

    L(t)(1 t)(1 qt)

    =r=1

    L(t) =

    =2gi=1

    r=1

    (1 it) =2gi=1

    (1 ri tr).

    Portanto Lr(t) =2g

    i=1(1 ri t).

    Ainda usando a notacao Fr = FFqr , considere para cada r 1 o numero

    Nr := N(Fr) := |{P PFr ; deg P = 1}|.

    A proxima proposicao e essencial para a demonstracao do Teorema de Hasse-Weil e euma consequencia imediata das propriedades estudadas acima.

    Proposicao 2.0.6 Para todo r 1,

    Nr = qr + 12gi=1

    ri ,

    onde 1, ... 2g C sao as razes recprocas de L(t). Em particular, temos

    N = q + 12gi=1

    i

    Demonstracao: A parte (ii) da Propriedade 2 aplicada ao L-polinomio Lr(t) diz que ocoeficiente de t em Lr(t) e Nr (qr + 1). Por outro lado, a Propriedade 4 diz que estemesmo coeficiente e

    2gi=1

    ri .

    3 O Teorema de Hasse-Weil

    Essencialmente, o que faremos nesta secao e demonstrar o seguinte Teorema:

    Teorema 3.0.1 (Teorema de Hasse-Weil) As razes recprocas do L-polinomio LF (t)satisfazem

    |i| = q1/2 (i = 1, . . . , 2g).

    Alguns textos se referem ao Teorema de Hasse-Weil como a Hipotese de Riemann paraCorpos de Funcoes. O motivo para esta denominacao e a analogia existente entre a famosafuncao Zeta de Riemann e a funcao Zeta ZF (t) que construmos na secao precedente.Faremos um breve comentario sobre tal analogia.

    11

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Lembremos que a funcao Zeta de Riemann e a aplicacao dada por

    (s) :=

    n=1

    ns =p

    11 ps

    ,

    onde s C e tal que Re(s) > 1 e o produto a direita (identidade de Euler) percorre todosos numeros primos. Defina a norma absoluta de um divisor A DF por

    N (A) := qdeg(A).

    Por exemplo, a norma absoluta N (P ) de um lugar P PF coincide com a cardinalidadedo corpo das classes residuais FP . Defina

    F (s) := ZF (qs).

    Observe que F (s) pode ser escrita como

    F (s) =

    n=0

    Anqsn =

    ADF ,A0

    N (A)s,

    que e uma aplicacao analoga a funcao Zeta de Riemann (s). A classica Hipotese deRiemann, ate hoje nao demonstrada, diz que todos os zeros nao triviais 7 de (s) estaosobre a reta Re(s) = 1/2.

    No caso de corpos de funcoes, o Teorema de Hasse-Weil garante que

    F (s) = 0 ZF (qs) = 0 L(qs) = 0 L(qs) = 0Teo. H.W.

    |qs| = q1/2 qRe(s) = q1/2 Re(s) = 1/2.

    Deste modo, o Teorema ?? pode ser visto como um analogo da classica Hipotese de Rie-mann.

    Uma importante consequencia do Teorema ?? e o

    Teorema 3.0.2 (Teorema (da cota) de Hasse-Weil) O numero N de lugares de F/Fqcujo grau e um pode ser estimado por

    |N (q + 1)| 2gq1/2.

    Demonstracao: Pela Proposicao ??,

    N (q + 1) = 2gi=1

    i.

    Deste modo, o Teorema (da cota) de Hasse-Weil e uma consequencia imediata do Teoremade Hasse-Weil.

    Note que se aplicarmos o Teorema anterior para o corpo de funcoes Fr/Fqr , iremosobter

    |Nr (qr + 1)| 2gqr/2.

    O proximo lema e trivial.7Os chamados zeros triviais de (s) sao s=-2,-4,-6,. . .

    12

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Lema 3.0.5 Seja m 1. Entao, o Teorema de Hasse-Weil vale para F/Fq se, e somentese, vale para a extensao Fm/Fqm.

    Demonstracao: Seja Lm(t) o L-polinomio de Fm/Fqm . Se as razes recprocas de LF (t)sao 1, . . . , 2g, entao as razes recprocas de Lm(t) sao m1 , . . . ,

    m2g, pela Propriedade 4.

    O lema segue imediatamente do fato de |i| = q1/2 se, e somente se, |mi | = (qm)1/2.

    Lema 3.0.6 Se existe uma constante c R tal que, para todo r 1,

    |Nr (qr + 1)| cqr/2,

    entao o Teorema de Hasse-Weil vale para F/Fq

    Demonstracao: Pela Proposicao ??,

    Nr (qr + 1) = 2gi=1

    ri ,

    logo

    |2gi=1

    ri | cqr/2.

    Considere a funcao

    H(t) :=2gi=1

    it

    1 it.

    Seja := min{|1i | ; 1 i 2g}. Observe que e precisamente o raio de convergenciade H(t) em torno de t = 0. Deste modo, quando |t| < temos

    H(t) =2gi=1

    r=1

    (it)r =

    r=1

    (2gi=1

    ri )tr,

    logo

    |H(t)|

    r=1

    cqr/2|t|r = c

    r=1

    (q1/2|t|)r.

    Imediatamente vemos que a serie H(t) converge quando |t| < q1/2. Deste modo, q1/2 e temos

    q1/2 |i| (i = 1, . . . , 2g). (5)

    Agora, sabemos que por uma troca de ndices sempre podemos obter a igualdade i2g+i =q para todo i = 1, . . . , 2g e portanto

    2gi=1

    i = qg,

    comparando com (??) segue imediatamente que |i| = q1/2.

    13

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    O proximo passo sera encontrar condicoes favoraveis para que exista uma constante ccomo no Lema anterior. Antes precisamos fixar alguns conceitos que serao utilizados aolongo das demonstracoes. Nas primeiras consideracoes a exigencia sobre o corpo K e queele seja no mnimo perfeito. Alguns dos resultados que apresentaremos terao suas demon-stracoes omitidas, pois fazem parte da teoria classica de corpos de funcoes e escapam doobjetivo deste trabalho. Para um estudo detalhado do que sera apresentado agora consulteref. [1].

    Uma extensao M/L finita e dita ser extensao de Galois se o grupo de automorfismosAutL(M) = { : M M ; e isomorfismo com (a) = a para qualquer a L} temordem igual a [M : L]. Neste caso, dizemos que AutL(M) e o grupo de Galois daextensao M/L e escrevemos Gal(M/L) := AutL(M). Para maiores detalhes da teoria deGalois consulte as referencias [3] e [4].

    Uma extensao F /K do corpo de funcoes F/K e dita ser Galois se F /F e umaextensao de Galois de grau finito.

    Lema 3.0.7 Sejam F /F uma extensao algebrica de corpos onde F e F sao corpos defuncoes sobre K. Considere um automorfismo AutF (F ). Se P e um lugar em F talque P |P , entao:

    (i) (OP ) := {(x) ; x OP } e anel de valorizacao em F .

    (ii) (P ) := {(x) ; x P } e um lugar em F .

    (iii) (P )|P

    (iv) v(P )(y) = vP (1(y)) y F .

    Demonstracao: Claramente (OP ) e um anel de valorizacao de F , e (P ) e um idealmaximal, desta forma (P ) e um lugar de F cujo anel de valorizacao correspondente e(OP ). Se t e um elemento primo de P , i.e., P = tOP , entao (P ) = (t)(OP ),assim (t) e um elemento primo de (P ). Isto demonstra (i) e (ii). Quanto a (iii),basta observar que P = (P ) (P ), assim (P )|P . Finalmente, para demonstrar (iv)considere 0 6= y F com y = (x). Podemos escrever x = tnu com u OP \P evP (x) = n. Entao temos que y = (x) = (t)n(u) onde (u) O(P )\(P ) e (t) eum elemento primo de (P ). Deste modo,

    v(P )(y) = n = vP (x) = vP (1(y)).

    Observacao 3.0.8 Se F/K e um corpo de funcoes, entao sabemos que existe um elementox F tal que F/K(x) e uma extensao algebrica. Como F e K(x) sao corpos de funcoessobre K, as hipoteses do lema estao trivialmente satisfeitas.

    Observacao 3.0.9 Se F /F e como no lema com a hipotese adicional de ser Galois,entao o grupo Gal(F /F ) age sobre o conjunto PF via (P ) = {(x) ; x P }.

    Para o proximo Teorema precisamos da seguinte definicao:

    14

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Definicao 3.0.5 Seja F/K um corpo de funcoes de grau [F : K] < . Cada elemento L induz uma aplicacao K-linear : L L, definida por (z) := z para todoz L. Definimos a norma de na extensao L/K por

    NL/K() := det().

    Ou seja, se {1, . . . , n} e uma base de L/K e

    i =n

    j=

    aijj com aij K,

    entaoNL/K() = det(aij).

    Observacao 3.0.10 Uma propriedade basica da aplicacao norma e que se a extensaoL/K for separavel e 1, . . . , n : L forem homomorfismos, constantes em K, definidosem L e tomando valores em algum corpo algebricamente fechado K, entao

    NL/K() =n

    i=1

    i()

    Teorema 3.0.3 Sejam F /K uma extensao de Galois de F/K e P1, P2 PF extensoesde P PF . Entao P2 = (P1) para algum Gal(F /F ). Em outras palavras, o grupode Galois age transitivamente sobre o conjunto das extensoes de P .

    Demonstracao: Assuma que o Teorema e falso, i.e., (P1) 6= P2 para todo G :=Gal(F /F ). Existe um resultado classico, sob o nome de Teorema da Aproximacao (vejaref. [1] pag. 11,31) que garante a existencia de um elemento z F tal que vP2(z) > 0e vQ(z) = 0 para todo Q PF com Q|P e Q 6= P2. Considere a aplicacao normaNF /F : F F . Temos que

    vP1(NF /F (z)) = vP1(

    Gi(z)

    )=

    G

    vP1((z)) =

    =G

    v1(P1)(z) =G

    v(P1)(z) = 0, (6)

    pois P2 nao pertence ao conjunto dos elementos (P1) com percorrendo G. Em outraspalavras,

    vP2(NF /F (z)) =G

    v(P2)(z) > 0. (7)

    Por outro lado temos NF /F (z) F , e assim

    vP1(NF /F (z)) = 0 vP (NF /F (z)) = 0 vP2(NF /F (z)) = 0.

    Isto contradiz (??) e (??).

    Corolario 3.0.3 Com as hipoteses do Teorema ?? sejam P1, . . . , Pr todos os lugares deF que estao sobre P , entao

    15

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    (a) e(Pi|P ) = e(Pj |P ) e f(Pi|P ) = f(Pj |P ) para todo i, j. Deste modo, podemosdefinir

    e(P ) := e(Pi|P ) e f(P ) := f(Pi|P ),(b) e(P ) f(P ) r = [F : F ]. Em particular e(P ), f(P ) e r dividem o grau [F : F ].

    Demonstracao: (a) e evidente do teorema anterior e do Lema ??. Quanto a (b), econhecido da teoria de corpos de funcoes que se P1, . . . , Pr sao todos os lugares em F

    que estao sobre P e se ei := e(Pi|P ) e fi := f(Pi|P ) sao respectivamente o ndice deramificacao e o grau relativo de Pi|P , entao

    ri=1 eifi = [F

    : F ]. Deste modo, (b) econsequencia imediata de (a).

    Definicao 3.0.6 Seja F /F uma extensao de Galois com grupo de Galois G := Gal(F /F )tal que F e F sao corpos de funcoes sobre K. Considere os lugares P PF e P PF tais que P |P . O grupo de inercia de P |P e o subgrupo de G definido por

    I(P |P ) := { G ; vP (z z) > 0 z OP }.

    O proximo lema e essencial para a demonstracao do Teorema de Hasse-Weil. Contudo,sua demonstracao escapa ao proposito deste trabalho e portanto sera omitida.

    Lema 3.0.8 A cardinalidade do grupo de inercia I(P |P ) coincide com o ndice de rami-ficacao e(P |P ).

    Demonstracao: Ver ref. [1] pag. 118.

    A partir de agora, voltaremos a supor que o corpo K e finito com q elementos, digamosK = Fq. Dados um automorfismo AutFq(F ) e um lugar P PF , usaremos porcomodidade as notacoes

    P := (P ) e OP := (OP ).Um automorfismo AutFq(F ) tambem induz um isomorfismo natural entre as classes

    residuais OP /P e OP /P , a saber x + P 7 (x) + P . Para cada lugar P PF e cada AutFq(F ) considere a aplicacao

    P : F OP /P {} (8)definida por P (x) = 1(x) + P se x OP e P (x) = se x F\OP .

    Observe que quando e a identidade, P nada mais e do que a aplicacao canonicax 7 x + P . A aplicacao P tem as seguintes propriedades

    (i) P (x + y) = P (x) + P (y)(ii) P (xy) = P (x)P (y).

    Sabemos que a aplicacao x 7 xq e um automorfismo do fecho algebrico F de F que econstante em Fq. De modo analogo podemos considerar a aplicacao

    P q : F OP /P {},definida por P q(x) = xq + P se x OP e P q(x) = se x F\OP . E claro que P qtambem cumpre as condicoes (i) e (ii) acima.

    16

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Observacao 3.0.11 Uma observacao importante sobre o automorfismo x 7 xq e queP q = P se, e somente se, deg(P ) = 1. 8

    No restante desta secao iremos investigar a expressao

    N ()(F ) :=

    P =Pq

    deg(P ).

    Pela Observacao ??, quando e a identidade a expressao acima fornece exatamente onumero de lugares de grau um de F . Neste caso temos N ()(F ) = N .

    Os dois primeiros lemas desta secao, (??) e (??), reduzem o problema da demonstracaodo Teorema de Hasse-Weil a encontrar constantes positivas c1 e c2 que satisfazem

    Nr qr + 1 + c1qr/2

    eNr qr + 1 c2qr/2,

    para todo r 1. Quando c1 = c2 = 2g, os valores q + 1 + 2gq1/2 e q + 1 2gq1/2 recebemrespectivamente o nome de cota superior de Hasse-Weil e cota inferior de Hasse-Weil. Veremos que podemos estabelecer estas cotas tomando um q apropriado. Faremosisto em duas partes.

    3.1 A Cota Superior

    Suponha, por extensao de constantes se necessario, que F/Fq satisfaz

    (i) q e um quadrado

    (ii) q > (g + 1)4.

    Seja AutFq(F ). Nestas condicoes o que iremos mostrar agora e o

    Teorema 3.1.1 (Teorema da cota Superior) O numero N () pode ser estimado por

    N () < (q + 1) + (2g + 1)q1/2.

    Demonstracao: Seja Q PF m lugar em F/Fq com grau um. Pondo

    q0 := q1/2, m := q0 1 e n = 2g + q0

    temosr := q 1 + (2g + 1)q1/2 = m + nq0.

    Fixe AutFq(F ) e suponha por um momento que existe um elemento x L(rQ) naonulo tal que

    x P P PF com P = P q e P 6= Q, (9)8De fato, deg P = 1 OP /P ' Fq x = xq x OP /P x + P = (x + P )q x + P = xq + P

    P = P q .

    17

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    isto e, x esta na interseccao de todos os lugares P PF distintos de Q que cumpremP = P q . Isto quer dizer que todos os lugares P tais que P = P q , exceto Q, saozeros de x. Entao e imediato concluir que

    deg(x)0 N () 1. (10)

    Como x L(rQ), entao

    (x) + rQ 0 (x) (x)0 rQ

    vP (x) vP (rQ) ={

    0 se P 6= Qr se P = Q

    Deste modo, denotando por o conjunto dos polos de x, temos

    deg(x)0 = deg(x) =P

    vP ((x))deg P r deg Q = r = q 1 + (2g + 1)q1/2.

    Combinando esta desigualdade com a desigualdade (??) obtemos N () q + (2g + 1)q1/2,o que demonstraria a proposicao. O que faremos agora e mostrar a existencia de umelemento x satisfazendo (??). Primeiramente observe que deg(mQ) = m = q0 1 =q1/2 1 > (g + 1)2 1 = g2 + 2g > 2g 1. Pelo Teorema de Riemann-Roch,

    dim(mQ) = m g + 1.

    Considere a cadeia ascendente de Fq-espacos vetoriais

    L(0) L(0) . . . L(mQ). (11)

    Existe um resultado classico na teoria de corpos de funcoes sob o nome de Teorema dasLacunas de Weierstrass (veja ref.[1] pag 32) que garante a existencia de exatamente gigualdades na cadeia (??) e portanto existem exatamente m g inclusoes proprias, deonde podemos extrair uma base = {ui ; (ui) = iQ e i I} de L(mQ) onde I ={i ; 1 i m e u F com (u) = iQ}. 9 Considere o subespaco vetorial de L(rQ)definido por

    L :={

    iIuiy

    q0i ; yi L(nQ)

    }.

    Afirmacao 1 dim(L) = dim(mQ)dim(nQ).

    Prova da afirmacao: Basta verificar que todo elemento y L pode ser escrito uni-camente na forma

    y =iI

    uiyq0i com yi L(nQ) e ui .

    A existencia da representacao e clara pela definicao. Para demonstrar a unicidade suponhaque exista uma equacao

    iIuiy

    q0i = 0

    9Observe que ui L(iQ)\L((i 1)Q) (ui) + iQ 0 e (ui) + (i 1)Q < 0 (ui) = iQ vQ((ui)) = i e vP ((ui)) = 0 P PF com P 6= Q (ui) = iQ.

    18

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    com yi L(nQ) nao todos nulos. Para cada ndice i I com yi 6= 0, temos quevQ(uiy

    q0i ) = i + q0vQ(yi), logo vQ(uiy

    q0i ) i(mod q0). Deste modo, se tivermos

    vQ(uiyq0i ) = vQ(ujy

    q0j ) entao i j(mod q0) com 1 i, j m = q0 1. Logo i = j.

    Usando a desigualdade triangular estrita obtemos

    = vQ(0) = vQ(iI

    uiyq0i ) = miniI{vQ(uiy

    q0i )} 6= .

    Com esta contradicao conclumos a afirmacao.

    Lembrando que deg Q = 1, a Afirmacao 1 e o Teorema de Riemann-Roch garantemque

    dim(L) (m + 1 g)(n + 1 g).

    Deste modo, pela hipotese q > (g + 1)4 vemos facilmente que

    dim(L) > q + g + 1. (12)

    Agora, fixe AutFq(F ) e defina um Fq-espaco vetorial por

    L :={

    iI(1ui)q0yi ; yi L(nQ)

    }.

    Afirmacao 2 L L(mq0Q + nQ) e deg(mq0Q + nQ) = q + 2g.

    Prova da afirmacao: Basta mostrar que 1(ui)q0yi L(mq0Q +nQ) para todo i I.Como Q e o unico polo de ui vemos que para todo P PF , vP (1ui) = vP (ui) i m. Em particular vQ(1ui) m, ou seja, (1ui) mQ. Deste modo, temos que(1(ui)q0yi) = q0(1ui)+(yi) mq0QnQ. Portanto 1(ui)q0yi L(mq0Q+nQ).Quanto ao grau, a verificacao e imediata a partir das definicoes de m e n. Isto conclui aafirmacao.

    Observando que deg(mq0Q + nQ) = q + 2g > 2g 2, podemos usar novamente oTeorema de Riemann-Roch e a Afirmacao 2 para obter que

    dim(L) dim(mq0Q + nQ) = deg(mq0Q + nQ) g + 1 = q + g + 1. (13)

    Defina uma aplicacao linear : L L por 10

    (

    iIuiy

    q0i

    )=

    iI

    (1ui)q0yi.

    Comparando as desigualdades (??) e (??) vemos facilmente que dim(L) < dim(L), logoo Kernel de e nao trivial, isto e, existe 0 6= x =

    iI uiy

    q0i tal que

    iI(1ui)q0yi = 0.

    10Na verdade e um homomorfismo do grupo aditivo de L e, pela Afirmacao 1, esta bem definido.

    19

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Em particular x L(rQ). Se P PF e distinto de Q, entao P (ui) 6= e P (yi) 6= pois Q e o unico polo de qualquer elemento de L. Se alem disso P satisfaz P = P q , ouequivalentemente, P q = P , entao

    P (x) = P(

    iIuiy

    q0i

    )=

    iI

    P (ui)P (yi)q0 =

    =iI

    P (1ui)qP (yi)q0 = P(

    iI(1ui)q0yi

    )q0= P (0).

    Deste modo P percorre no conjunto dos divisores que sao zeros de x. Em outras palavras,x P para todo P PF distinto de Q que satisfaz P = P q . Isto conclui a demon-stracao.

    Corolario 3.1.1 Se por extensao de constantes F/Fq satisfaz

    (i) q e um quadrado

    (ii) q > (g + 1)4,

    entao existe c > 0 tal que numero Nr de lugares de Fr/Fqr cujo grau e um pode serestimado por

    Nr < qr + 1 + cqr/2,

    para todo r 1.

    Demonstracao: Da teoria de corpos de funcoes sabemos que o genero g de F/Fq einvariante por extensoes do corpo das constantes. Entao, basta tomar igual a identidadeno teorema anterior e c = 2g + 1.

    3.2 A Cota Inferior

    O que faremos agora e demonstrar e existencia da cota inferior de Hasse-Weil. No proximolema iremos utilizar a aplicacao definida em (??).

    Lema 3.2.1 Seja F /F uma extensao de Galois com grupo de Galois G := Gal(F /F ) talque F e F sao corpos de funcoes. Considere para cada P PF sua restricao P := P Fem PF . Entao

    P = P q se, e somente se, G t.q. P = P q .

    A cardinalidade do conjunto formado pelos automorfismos G que cumprem estacondicao e o ndice de ramificacao e(P ) de P sobre P .

    Demonstracao: Suponha que P = P q . Se x OP = OP F , entao (x) = x G e x + P = xq + P , logo x xq P F = P , ou seja, P q = P .Reciprocamente, se P q = P entao deg(P ) = 1, i.e., FP := OP /P ' Fq. Como [FP :FP ] =: m < , temos FP ' Fqm , logo a aplicacao x 7 xq define um automorfismo deFP que e constante em FP onde x := x + P com x OP . A extensao FP /FP e Galois e

    20

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    para cada Gal(FP /FP ) existe G tal que (P ) = P e (x) = (x) + P (veja ref[1] pag 119 ). Agora, se e o automorfismo inverso de x 7 xq entao para todo x OP temos xq + P = xq = 1(x) = 1(x) + P , ou seja, P = P q . A segunda parte dolema e uma consequencia imediata do Lema ??.

    Lema 3.2.2 Sejam F/Fq um corpo de funcoes e F uma extensao de Galois de F comgrupo de Galois G := Gal(F /F ) tal que Fq e algebricamente fechado em F , entao

    N(F ) = [F : F ]1G

    N ()(F ).

    Demonstracao: Sejam P um lugar em PF e P = P F sua restricao em F . Denotepor f(P ) := [FP : FP ] o grau relativo de P sobre P e seja g(P ) o numero de lugaresP PF que estao sobre P . Pelo Corolario ?? , estes numeros nao dependem de P .Usando o Lema ?? e o Lema ?? vemos que

    GN ()(F ) =

    G

    P =P q

    deg(P ) =P |P

    P =Pq

    e(P )deg(P ) =

    =

    P =Pq

    g(P )e(P )[FP : Fq] =

    P =Pq

    g(P )e(P )[FP : FP ][FP : Fq] =

    =

    P =Pq

    g(P )e(P )f(P )deg(P ) = [F : F ]

    P =Pq

    deg(P ).

    Portanto,N(F ) = [F : F ]1

    G

    N ()(F ).

    Observacao 3.2.1 Sejam F/Fq um corpo de funcoes e AutFq(F ) um automorfismocom ordem finita. Denote o corpo fixo de por E. Entao F e uma extensao finita eseparavel de E. Como Fq e perfeito podemos escolher um elemento x E, transcendentalsobre Fq, tal que E e uma extensao finita e separavel de Fq(x). Sejam F a menor extensaode Galois de F e Fq o fecho algebrico de Fq em F . Entao F e FqF sao corpos de funcoessobre Fq e pode ser estendida a um automorfismo em AutFq(F

    ).

    Usando a observacao anterior podemos supor, por extensao de constantes se necessario,que F/Fq satisfaz

    (i) F tem uma extensao finita F que e Galois sobre Fq(x) com x sendo um elementode separacao transcendente sobre Fq, i.e., F/Fq(x) e uma extensao finita separavel.

    (ii) Fq e algebricamente fechado em F com fecho algebrico igual a Fq.

    (iii) q e um quadrado maior que (g + 1)4, onde g e o genero de F /Fq com Fq sendoo fecho algebrico de Fq em F .

    Nestas condicoes o que iremos mostrar agora e o

    21

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Teorema 3.2.1 (Teorema da cota Inferior) O numero N de lugares de grau um deF/Fq pode ser estimado por

    N (q + 1) (nm)m

    (2g + 1)q1/2,

    onde m = [F : F ] e n = [F : Fq(x)].

    Demonstracao: Sejam H := Gal(F /F ) e G := Gal(F /Fq(x)). Vemos facilmente queH e um subgrupo de G. Pelo Lema ?? temos

    N(F ) =1m

    H

    N ()(F ) (14)

    eN(Fq(x)) =

    1n

    G

    N ()(F ).

    Por outro lado, como Fq(x)/F e uma extensao racional e o corpo Fq possui exatamente qelementos, o numero N(Fq(x)) de lugares em Fq(x) de grau um e q + 1. Deste modo,

    1n

    G

    N ()(F ) = q + 1. (15)

    Aplicando o Teorema ?? temosG

    N ()(F ) =H

    N ()(F ) +

    GHN ()(F )

    H

    N ()(F ) +

    GH(q + 1) + (2g + 1)q1/2 =

    =H

    N ()(F ) + (nm)(q + 1) + (2g + 1)q1/2.

    Deste modo, usando a equacao (??) temos queH

    N ()(F ) G

    N ()(F ) (nm)(q + 1 + (2g + 1)q1/2 =

    = m(q + 1) (nm)(2g + 1)q1/2.Finalmente, usando a equacao (??) temos

    N = N(F ) (q + 1) (nm)m

    (2g + 1)q1/2.

    Corolario 3.2.1 Se por extensao de constantes F/Fq satisfaz

    (i) q e um quadrado

    (ii) q > (g + 1)4,

    entao existe c > 0 tal que numero Nr de lugares de Fr/Fqr cujo grau e um pode serestimado por

    Nr > qr + 1 + cqr/2,

    para todo r 1.

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  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Demonstracao: Da teoria de corpos de funcoes sabemos que o genero g de F/Fq e osnumeros m e n sao invariantes por extensoes do corpo das constantes. Entao, basta tomarc = (nm)m (2g

    + 1) no teorema anterior.

    Das consideracoes feitas o Teorema de Hasse-Weil decorre diretamente dos Corolarios?? e ??.

    4 Consequencias do Teorema de Hasse-Weil

    Nesta secao serao apresentadas algumas consequencias relevantes do Teorema (da cota)de Hasse-Weil. A pergunta evidente a se fazer agora e:

    Podemos aprimorar a estimativa obtida por esse teorema?

    Veremos que se q nao e um quadrado a estimativa pode ser suavemente melhorada.Este sera o conteudo do Teorema (da cota) de Serre. Ao final da secao estaremos apresen-tando um exemplo onde a cota de Hasse-Weil e efetivamente atingida, i.e., daremos umexemplo de corpo de funcoes F/Fq tal que N = q + 1 + 2gq1/2. Isto sera suficiente paraencerrarmos a questao levantada.

    Seja A o conjunto dos inteiros algebricos. i.e., um numero complexo esta em A se, esomente se, este numero e raiz de algum polinomio com coeficientes inteiros. Um fatoelementar da teoria dos numeros algebricos e que A Q = Z e que A e na verdadeum subanel de C. Dado um elemento C, usaremos a notacao para designar seuconjugado. A notacao [a] ira significar a parte inteira do numero real a.

    Teorema 4.0.2 (Teorema de Serre) Para o corpo de funcoes F/Fq de genero g, onumero de lugares de grau um pode ser estimado por

    |N (q + 1)| g[2q1/2].

    Demonstracao: Se g = 0 o resultado e trivial. Suponha que g > 0 e considere o L-polinomio L(t) =

    2gi=1(1 it) em F/Fq. Pelo Teorema (da cota) de Hasse-Weil os is

    sao inteiros algebricos que cumprem |i| = q1/2. Sabemos que eles podem ser ordenadosde forma que ig+i = q, deste modo e facil ver que

    i = g+i = q/i, (i = 1, . . . , g).

    Definai := i + i + [2q1/2] + 1

    ei := (i + i) + [2q1/2] + 1.

    Os elementos i e i sao inteiros algebricos e, como |i| = q1/2, eles sao positivos.Dado um homomorfismo : Q(1, . . . , 2g) C podemos observar que ele permutaos elementos 1, . . . , 2g, pois L(t) =

    2gi=1(t i) Z[t]. Observe tambem que se

    (i) = j entao(i) = (q/i) = q/(i) = (i) = j .

    23

  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    Deste modo, age permutando os elemento de {1, . . . , g} e {1, . . . , g}. Se definirmos

    :=g

    i=1

    i e :=g

    i=1

    i,

    vemos facilmente que e sao inteiros algebricos invariantes por qualquer homomorfismode Q(1, . . . , 2g) em C. Deste modo, podemos concluir que , AQ = Z.11 Como oselementos i e i sao positivos, entao > 0 e > 0 e temos

    gi=1

    i 1 eg

    i=1

    i 1.

    A desigualdade entre a media aritmetica e a media geometrica fornece

    1g

    gi=1

    i (g

    i=11i)

    1g 1.

    Deste modo,

    g g

    i=1

    i =g

    i=1

    (i + i + [2q1/2] + 1) =

    =g

    i=1

    (i + i) + g[2q1/2] + g =2gi=1

    i + g[2q1/2] + g.

    Da igualdade N = q + 12g

    i=1 i, obtemos

    g q + 1N + g[2q1/2] + g,

    logoN q + 1 + g[2q1/2].

    Procedendo de modo analogo para , obtemos

    N q + 1 g[2q1/2].

    Portanto|N (q + 1)| g[2q1/2].

    A busca por corpos de funcoes com muitos lugares de grau um motiva a seguintedefinicao:

    Definicao 4.0.1 Um corpo de funcoes F/Fq de genero g e dito ser maximal se N =q + 1 + 2gq1/2.

    Observacao 4.0.2 A observacao obvia que segue da definicao e que para um corpo defuncoes F/Fq ser maximal e necessario que q seja um quadrado, caso contrario a expressaoN = q + 1 2gq1/2 nao faria sentido.

    11E conhecido da teoria de extensoes de corpos que um numero algebrico C que e invariante portodos os homomorfismos : Q() C e na verdade um elemento de Q.

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  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    A proxima proposicao mostra que para uma curva ser maximal existe uma condicaonecessaria sobre o genero g em relacao a q.

    Proposicao 4.0.1 Se F/Fq e maximal, entao g (q q1/2)/2.

    Demonstracao: Sejam 1, . . . , 2g as razes recprocas do L-polinomio L(t). Sabemosque

    N = q + 12gi=1

    i e |i| = q1/2.

    Por hipotese F/Fq e maximal, logo N = q + 1 + 2gq1/2 e podemos concluir que

    2gi=1

    i = 2gq1/2, i.e., i = q1/2 (i = 1 . . . , 2g).

    Agora, considere o numero N2 de lugares de grau um em FFq2/Fq2 . Temos N2 N e

    N2 = q2 + 12gi=1

    2i = q2 + 1 2gq.

    Assim,q + 1 + 2gq1/2 q2 + 1 2gq.

    Por uma manipulacao simples da desigualdade acima, g qq1/2/2 segue imediatamente.

    Em 1994 C. Xing e H. Stichtenoth demonstraram que se F/Fq e um corpo de funcoesmaximal cujo genero e g, entao g (q1/2 1)2/4 ou q q1/2/4 g q q1/2/2, vejao artigo The genus of maximal function fields over finite fields. Neste mesmo artigo foiconjecturado que se g > (q1/2 1)2/4 entao vale a igualdade g = q q1/2/2. Em 1995R. Fuhrmann e F. Torres demonstraram esta conjectura utilizando teoria de Pontos deWeierstrass desenvolvida por Voloch e Stohr, veja o artigo The genus of curves over finitefield with many rational points.

    4.1 O Corpo de Funcoes Hermitiano

    Nesta secao daremos um exemplo simples de um corpo de funcoes maximal cujo generog atinge efetivamente a cota obtida na Proposicao ??. Seja Fq2 um corpo finito com q2elementos, onde q e potencia de algum primo. Considere o corpo de funcoes H = Fq2(x, y)onde x e y satisfazem a equacao

    Y q + Y = Xq+1 (16)

    O corpo de funcoes H/Fq2 e dito ser o corpo de funcoes Hermitiano. O conjuntodos pontos que satisfazem a equacao (??) determina uma curva denominada a curvaHermitiana. O que faremos nesta secao e mostrar que H e na verdade um corpo defuncoes maximal, i.e., demonstremos que numero N de lugares de grau um atinge a cotasuperior de Hasse-Weil

    N = q2 + 1 + 2gq. (17)

    Primeiramente observe que se e sao elementos de Fq2 entao q+1 e q+ sao elementosde Fq. De fato, basta observar que (q+1)q = q

    2+q = q2q = q = q+1 e (q + )q =

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  • A Funcao Zeta e o Teorema de Hasse-Weil Tiago N. Castilho

    (q)q + ()q = q2+ q = + q, logo q+1 e q + sao razes do polinomio Xq X e

    portanto sao elementos de Fq. Agora, para cada Fq2 considere equacao

    Y q + Y = q+1.

    Facilmente vemos que o polinomio Y q+Y q+1 e irredutvel e separavel em Fq2 e portantoadmite exatamente q razes. Adicionando o ponto no infinito vemos rapidamente que onumero de pontos que satisfazem a equacao (??) e q3 + 1. Agora, o genero do corpo defuncoes H e conhecido e vale

    g =q(q 1)

    2,

    substituindo em (??) e imediato que N = q3 +1. Portanto H e um corpo de funcoes max-imal. Observe tambem que o genero de H mostra que a estimativa obtida na Proposicao?? nao pode ser melhorada.

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    Referencias

    [1] H. Stichtenoth, Algebraic Function Fields and Codes, Springer-Verlag (1993).

    [2] M.D. Fried, M.Jarden, Field Arithmetic, Springer-Verlag (1980).

    [3] S. Lang, Algebra, Springer-Verlag (2006).

    [4] S. Roman, Field Theory, Springer-Verlag (2006).

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