A GEOMETRIA DAS CATEDRAIS GÓTICAS E · PDF fileEstas proporções também são encontradas na natureza e se manifestam nas mais variadas formas geométricas, como nas malhas hexagonais

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  • A GEOMETRIA DAS CATEDRAIS GTICAS E

    NEOGTICAS

    Maria Antonia Benutti UNESP FAAC, Departamento de Artes e Representao Grfica

    [email protected]

    Resumo

    Este trabalho busca estudar as relaes geomtricas presentes em estruturas religiosas, mais especificamente as Catedrais Gticas e Neogticas, atravs da anlise de plantas e imagens de estruturas arquitetnicas, para a verificao da utilizao de elementos da Geometria Sagrada, como a relao urea e o quadrado raiz de 5, assim como, as leis de harmonia e proporo do Traado Regulador, do Ad quadratum e Ad triangulum nos projetos destas estruturas sagradas. Palavras-chave: geometria, arquitetura, Catedrais Gticas, Catedrais Neogticas.

    Abstract

    This paper studies the present geometric relations in religious structures, more specifically the Gothic and Neo-Gothic Cathedrals, through the plants and images analysis of the architectural structures, for verification of the elements utilization of the Sacred Geometry like as golden proportion and square root of five, as well as the Tracing Regulator, harmony and proportion laws, of Ad quadratum and Ad triangulum in the projects of the sacred structures. Keywords: geometry, architecture, Gothic Cathedrals, Neo-Gothic Cathedrals.

    1 Introduo

    A organizao do nosso mundo fsico est diretamente ligada ao mundo csmico. Os

    fenmenos e variveis como o tempo, o espao, a cor, a luz, e o som, podem ser

    expressos em termos de freqncia de vibrao e a relao entre eles pode ser

    expressa por meio de propores.

  • Estas propores tambm so encontradas na natureza e se manifestam nas mais

    variadas formas geomtricas, como nas malhas hexagonais das colmias de abelhas,

    nas espirais das conchas de moluscos, nas estruturas dos galhos das rvores.

    Os antigos construtores conheciam estas leis de harmonia e proporo e as

    usavam nos templos e nas catedrais. Assim, estes monumentos foram posicionados e

    projetados segundo uma posio e geometria especficas, para que pudessem refletir

    no mundo fsico (micro universo) formas e propores correspondentes ao mundo

    csmico (macro universo). Das propores utilizadas nas estruturas religiosas, a razo

    urea um dos exemplos mais conhecido de proporo ideal. A seco urea uma

    relao que tem sido usada na arquitetura sagrada e na arte desde o perodo do

    antigo Egito.

    Esta relao entre o micro e o macro cosmo foi explorada pelos construtores de

    todas as estruturas religiosas, do paganismo ao cristianismo, tanto no oriente como no

    ocidente. E a presena da geometria, denominada sagrada, se reflete em todas estas

    construes de forma muitas vezes explicita, como no Parthenon e nas Catedrais

    Gticas.

    O objetivo principal da utilizao da Geometria Sagrada nas construes e

    estruturas sagradas era a busca da harmonia, pois a aplicao dos smbolos

    geomtricos sagrados possibilitava inserir o homem em um sistema de ritmo e

    harmonia semelhantes ao ritmo e harmonia naturais. Acreditava-se que se o homem

    vive e experimenta corretamente o produto da observao dos smbolos sagrados,

    poderia sustentar a harmonia como se estivesse afinando-a com a harmonia da

    criao.

    Segundo Rubino (2005), o antigo Egito demonstrou um extraordinrio

    conhecimento do poder evocatrio dos smbolos geomtricos e de seus cdigos, que

    mantidos rigorosamente secretos, eram usados na arquitetura dos templos, nos

    hierglifos, nos baixos-relevos, nas pinturas e nos desenhos reproduzidos nos papiros.

    Tais conhecimentos foram passados por sociedades secretas como as de origens

    manicas ou misteriosficas.

    Atravs dos tempos, estas estruturas sagradas foram os representantes fsicos

    destes conhecimentos, e os mestres maons e arquitetos os depositrios desses

    segredos.

    Os conhecimentos e a utilizao da geometria sagrada so apresentados em

    vrios tratados de arquitetura, sendo o mais famoso o Tratado de Arquitetura de

    Vitrvius, que aps quase um milnio de esquecimento foi redescoberto pelos

    arquitetos do Renascimento e tornou-se a principal obra consultada por eles.

  • A aplicao universal de princpios geomtricos idnticos em lugares separados

    por grandes espaos de tempo, lugares e crenas, como nas pirmides e templos do

    antigo Egito, nos Templos Maias, nos Tabernculos dos Judeus, nos Zigurates

    Babilnicos, nas Mesquitas Islmicas e nas Catedrais Crists atesta a natureza de

    certa forma transcendental que conectam como um fio invisvel estas estruturas

    sagradas por princpios imutveis da geometria.

    Embora presente por milnios nas estruturas sagradas, nos tempos modernos

    esta geometria foi relegada, primeiramente esfera estreita do desenho de templos, e

    depois quase completamente abolida em funo de objetivos prticos, perdendo-se

    com isso, conhecimentos valiosos.

    Neste trabalho analisaremos duas das principais Catedrais Gticas europias e

    uma Catedral Neogtica brasileira, para verificarmos quais elementos da geometria

    sagrada foram utilizados.

    2 Reviso bibliogrfica

    E foi com o compasso que o prprio Deus veio a ser representado na

    arte e literatura gticas, na qualidade do Criador que comps o

    universo segundo as leis geomtricas. apenas observar essas

    mesmas leis que a arquitetura se torna uma cincia no sentido

    agostiniano. E ao submeter-se geometria, o arquiteto medieval

    sentiu que estava a imitar a obra do seu divino mestre. (SIMSON,

    1991. p. 50).

    Para os projetistas, construtores e arquitetos do perodo gtico, a geometria era o elo

    entre o plano material e o espiritual e, por isso, o princpio fundamental das catedrais

    do estilo gtico.

    Vitruvius dizia que sem simetria e proporo no pode haver nenhum princpio no

    projeto de qualquer templo; isto , em edifcios perfeitos as diferentes partes devem

    estar em relaes simtricas exatas para com o todo. Vitruvius usava o termo simetria

    no sentido original grego, significando uma concordncia correta ou proporcional de

    medidas entre os elementos de uma mesma obra e da relao de uma certa parte com

    o esquema geral do conjunto, eleita como mdulo (POLLIO, 2007, p. 168).

    Segundo Calter (1998) tal sistema usaria a repetio de algumas propores

    chaves para assegurar harmonia e unidade ao projeto.

    Tomando-se formas bsicas, como tringulos ou quadrados, desenvolvem-se

    todas as outras dimenses da construo. O polgono serve como um mdulo para

    determinar as grandezas do projeto, como altura, comprimento, largura e profundidade

    de forma proporcional.

  • As catedrais gticas tm como uma de suas principais caractersticas o uso da

    geometria sagrada, como base para ordenao da construo. Essa geometria

    constituda por leis de harmonia e proporo, leis estas que tambm esto presentes

    na natureza e na msica.

    Viollet-le-Duc em seu famoso Dictionnaire Raisonn de lArchitecture define

    proporo da seguinte forma:

    Por propores, entendem-se as relaes entre o todo e as partes,

    relaes lgicas, necessrias, que satisfazem ao mesmo tempo a

    razo e aos olhos. Deve-se estabelecer uma distino entre

    proporo e dimenso. As dimenses indicam simplesmente alturas,

    larguras e superfcies enquanto que as propores so relaes entre

    as partes segundo uma lei. Ao contrrio do que frequentemente

    pensado, as propores, em arquitetura, no implicam relaes fixas

    entre as partes, mas relaes variveis, em vista de obter uma escala

    harmnica. As propores no derivam de um mtodo cego nem de

    uma frmula inexplicvel, mas de relaes entre os cheios e os

    vazios, as alturas e as larguras, as superfcies e as elevaes;

    relaes das quais a geometria cuida e cujo estudo demanda grande

    ateno e varia segundo o lugar do objeto. (VIOLLET-LE-DUC, 1860.

    Traduo nossa)

    A determinao das propores para efeitos de construes arquitetnicas

    denominada traado regulador. a forma mais expressiva da geometria sagrada, e

    pode ser definido como um traado geomtrico que orienta a construo de cada uma

    das partes da edificao. Eram determinados a partir de elementos da natureza,

    unidos matemtica e harmonia. A partir de mtodos matemticos, os construtores

    gticos garantiam que tanto as grandezas horizontais como verticais estivessem

    vinculadas. Assim, as principais medidas das construes possuam analogias entre

    si.

    Mesmo na idade moderna possvel notar a importncia do traado regulador na

    arquitetura como atesta LeCorbusier:

    O traado regulador uma satisfao de ordem espiritual que

    conduz busca de relaes engenhosas e de relaes harmoniosas

    [...] que traz essa matemtica sensvel que d a agradvel percepo

    da ordem. A escolha de um traado regulador fixa a geometria

    fundamental da obra; ele determina ento uma das impresses

    fundamentais. A escolha de um traado regulador um dos

    momentos decisivos da inspirao, uma das operaes capitais da

    arquitetura. (LeCorbusier, 1994, p.40).

    Esses traados eram, principalmente, baseados em formas simples e puras da

    natureza, no quadrado (Ad quadratum), no tringulo (Ad triangulum) e na relao

    urea.

  • O Ad quadratum (Figura 1) formado por sobreposio de quadrados, de modo

    que se dividem os lados do primeiro quadrado e inscreve-se outro quadrado

    rotacionado em 45 e repete-se o procedimento continuamente, o comprimento do

    inferior ser sempre a metade da diagonal do anterior. Variaes nesse processo

    existiam, obtendo assim, f