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A importância do 18 Brumário de Louis Bonaparte para a teoria marxista contemporânea do Estado capitalista 1 Renato Monseff Perissinotto DECISO-UFPR Apresentação Observações preliminares O objetivo deste artigo é identificar no 18 Brumário de Louis Bonaparte 2 algumas idéias esboçadas por Marx que se tornaram fundamentais para o desenvolvimento da teoria marxista contemporânea do Estado. Antes disso, entretanto, é necessário fazer algumas rápidas observações. Primeiramente, embora a importância desta obra para o desenvolvimento da teoria marxista do Estado tenha sido amplamente reconhecida 3 , não há, salvo engano, estudos que tenham como objetivo identificar sistematicamente os vínculos temáticos entre a análise de Marx e os trabalhos de meados do século XX que pretendiam dar forma a uma “teoria marxista do Estado capitalista”. Penso – e aqui anuncio a tese geral do presente texto - que a maioria dos autores marxistas contemporâneos que escreveram sobre o Estado capitalista circulam dentro de um conjunto de preocupações semelhantes e que é exatamente este “campo comum” que podemos encontrar esboçado na obra de Marx. Em segundo lugar, é preciso dizer que a leitura que proponho aqui se vale apenas de uma dentre várias outras “portas de entrada” existentes no texto de Marx. A relação entre Estado e classes sociais é certamente um tema capital dentro desta obra, mas ligado a ele surgem vários outros. Marx foi bastante sugestivo ao abordar questões que não costumamos vincular ao elenco de preocupações da tradição marxista, como, por exemplo, o peso da tradição e da simbologia na ação política, a relação entre representantes e representados, o papel da liderança carismática na luta política, dentre outros. Portanto, limitar-se a uma dessa vias de acesso ao texto certamente não faz justiça à multiplicidade de sugestões presentes na análise encontrada em O 18 Brumário. Por último, não me deterei aqui na infinidade de detalhes fatuais presentes na análise marxiana do golpe de 1851, a não ser quando isso for importante para o meu objetivo. Da mesma forma, não pretendo discutir as teses propriamente históricas de Marx, isto é, saber se as informações fornecidas e as suas explicações dos acontecimentos estão ou não corretas. Interessa-me, como disse, as sugestões teóricas ali presentes e as suas conseqüências para a teoria marxista do Estado capitalista. A estrutura do trabalho O presente texto se divide da seguinte maneira. Numa primeira parte, pretendo mostrar que O 18 Brumário de Louis Bonaparte é, do ponto de vista do problema do Estado, uma obra importante não apenas para 1 Este texto é uma versão modificada de minha apresentação no evento “Os 150 anos de O 18 Brumário de Louis Bonaparte”, organizado pelos centros acadêmicos de Ciências Sociais e História da UFPR. 2 Todas as referências apresentadas ao longo do texto foram retiradas de O 18 Brumário de Louis Bonaparte, Lisboa, 2 a edição, Editora Avante, 1984. Nas citações aqui reproduzidas indico apenas as páginas entre parênteses. 3 Ver, por exemplo, Nicos Poulantzas, 1986, p. 131 e Miliband, 1981, pp. 134-137.

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A importância do 18 Brumário de Louis Bonaparte para a teoria marxista contemporânea do Estado capitalista1

Renato Monseff Perissinotto

DECISO-UFPR Apresentação Observações preliminares O objetivo deste artigo é identificar no 18 Brumário de Louis Bonaparte2 algumas idéias

esboçadas por Marx que se tornaram fundamentais para o desenvolvimento da teoria marxista contemporânea do Estado. Antes disso, entretanto, é necessário fazer algumas rápidas observações.

Primeiramente, embora a importância desta obra para o desenvolvimento da teoria marxista do Estado tenha sido amplamente reconhecida3, não há, salvo engano, estudos que tenham como objetivo identificar sistematicamente os vínculos temáticos entre a análise de Marx e os trabalhos de meados do século XX que pretendiam dar forma a uma “teoria marxista do Estado capitalista”. Penso – e aqui anuncio a tese geral do presente texto - que a maioria dos autores marxistas contemporâneos que escreveram sobre o Estado capitalista circulam dentro de um conjunto de preocupações semelhantes e que é exatamente este “campo comum” que podemos encontrar esboçado na obra de Marx.

Em segundo lugar, é preciso dizer que a leitura que proponho aqui se vale apenas de uma dentre várias outras “portas de entrada” existentes no texto de Marx. A relação entre Estado e classes sociais é certamente um tema capital dentro desta obra, mas ligado a ele surgem vários outros. Marx foi bastante sugestivo ao abordar questões que não costumamos vincular ao elenco de preocupações da tradição marxista, como, por exemplo, o peso da tradição e da simbologia na ação política, a relação entre representantes e representados, o papel da liderança carismática na luta política, dentre outros. Portanto, limitar-se a uma dessa vias de acesso ao texto certamente não faz justiça à multiplicidade de sugestões presentes na análise encontrada em O 18 Brumário.

Por último, não me deterei aqui na infinidade de detalhes fatuais presentes na análise marxiana do golpe de 1851, a não ser quando isso for importante para o meu objetivo. Da mesma forma, não pretendo discutir as teses propriamente históricas de Marx, isto é, saber se as informações fornecidas e as suas explicações dos acontecimentos estão ou não corretas. Interessa-me, como disse, as sugestões teóricas ali presentes e as suas conseqüências para a teoria marxista do Estado capitalista.

A estrutura do trabalho O presente texto se divide da seguinte maneira. Numa primeira parte, pretendo mostrar que O 18 Brumário de Louis Bonaparte é, do

ponto de vista do problema do Estado, uma obra importante não apenas para 1 Este texto é uma versão modificada de minha apresentação no evento “Os 150 anos de O 18 Brumário de

Louis Bonaparte”, organizado pelos centros acadêmicos de Ciências Sociais e História da UFPR.

2 Todas as referências apresentadas ao longo do texto foram retiradas de O 18 Brumário de Louis Bonaparte, Lisboa, 2a edição, Editora Avante, 1984. Nas citações aqui reproduzidas indico apenas as páginas entre parênteses.

3 Ver, por exemplo, Nicos Poulantzas, 1986, p. 131 e Miliband, 1981, pp. 134-137.

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desenvolvimento posterior do marxismo, mas representa também um avanço qualitativo das considerações do próprio Marx sobre o Estado capitalista.

A segunda parte do texto dedica-se a mostrar como os avanços presentes na obra em questão (no que diz respeito estritamente ao problema do Estado capitalista) foram objeto de sistematização teórica por parte dos autores marxistas contemporâneos (os chamados neo-marxistas). Não tenho a intenção de rastrear passo a passo a apropriação das sugestões teóricas presentes n‟O 18 Brumário pelas produções atuais, mas apenas indicar rapidamente quais são elas, como Marx as trabalhou e como elas foram sistematizadas pelos autores contemporâneos.

O 18 Brumário de Louis Bonaparte no conjunto da produção clássica

Qual o significado de O 18 Brumário de Louis Bonaparte no interior da produção do próprio Marx? A resposta a esta questão exige um esclarecimento prévio. Quando falamos das idéias de Marx sobre o Estado é impossível não levar em conta os textos de juventude, reconhecidamente aqueles em que o autor mais se dedicou à análise do “Estado moderno” e da burocracia. Não gostaria de encampar integralmente a tese althusseriana da “ruptura epistemológica” existente entre as obras de juventude e as obras da maturidade. Penso, entretanto, que essa tese tem validade no que diz respeito especificamente ao tema do Estado4. As considerações do jovem Marx estão ainda impregnadas pela “problemática teórica” que entende o Estado como um poder pairando acima de indivíduos atomizados na sociedade civil. Ao criticar a existência do Estado enquanto realidade política abstrata, separada dos homens reais, o jovem Marx revela uma perspectiva normativa que compreende a política como esfera do interesse geral, locus de existência do cidadão e do homem genérico, em oposição à “sociedade civil”, entendida esta como o reino das particularidades, do indivíduo privado, do “homem egoísta” (o burguês).

A “problemática teórica” das obras imediatamente posteriores, em especial A Ideologia Alemã e O Manifesto Comunista, é diversa. É certo que nesses textos a expressão “sociedade civil” continua aparecendo, porém dotada de um conteúdo radicalmente diferente. O que temos agora não são mais os indivíduos, mas sim o “processo real de produção”, as “relações de produção”, as “forças produtivas”, as “classes sociais” e a luta de classes como o “motor da história”5. Por sua vez, o Estado não será mais uma entidade que, separada da sociedade civil, cai presa de uma burocracia que o utiliza para realizar os seus próprios interesses, mas sim uma instituição a serviço da dominação de classe. Agora, a política não será mais entendida como a esfera do homem genérico que, na sociedade burguesa, degrada-se em função da alienação política e da sua submissão a interesses privados (a burocracia, os direitos “homem egoísta”)6. Ao contrário, numa sociedade assentada em relações de produção que distribuem os homens em posições coletivas antagônicas, isto é, em classes conflitantes, a política e o Estado não podem ser outra coisa senão as esferas em que a classe economicamente dominante garante politicamente o seu predomínio. O Manifesto Comunista enuncia de forma admiravelmente sintética esta que poderia ser chamada de a teoria marxista geral do Estado: “O poder político é o poder organizado de uma classe para a opressão de outra” (Marx e Engels, s/d, vol. 1, p. 38). Por essas razões é que vou me limitar a analisar o conceito de Estado exclusivamente durante o período da maturidade, argumentando que O 18 Brumário de Louis Bonaparte ocupa ai um lugar central. 4 Quanto a este ponto, ver Louis Althusser, 1973, pp. 81, 108-110. Ver também Décio Saes; 1994, pp. 53-74.

5 Expressões como essa, ausentes nas obras de juventude, podem ser encontradas, por exemplo, em A ideologia Alemã, p. 55 e ss. e por todo Manifesto Comunista.

6 Ver, por exemplo, Marx, A questão judaica, p. 58-9.

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A tese apresentada por Marx e Engels em A ideologia Alemão e n‟O Manifesto Comunista sugere imediatamente uma questão. Se o Estado é o Estado da classe economicamente dominante, como devemos pensar a relação entre ambos? Questão ainda mais importante quando se tem em mente o Estado capitalista, isto é, o Estado de uma sociedade cuja característica fundamental é, como notaram Marx e todos os demais marxistas, a separação (a autonomização) do Estado em relação à economia. Se o Estado capitalista se constitui enquanto esfera separada das relações de produção e, portanto, da própria classe dominante, como explicar o fato de que o primeiro opera no sentido de atender aos interesses desta última?

Vejamos, primeiramente, a solução sugerida no próprio Manifesto Comunista. Nesse texto há uma outra sentença em que Marx e Engels se referem especificamente ao Estado moderno, sentença esta tão famosa quanto aquela anteriormente citada: “O Executivo do Estado moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa”7. Até meados da década de 1960, quando o debate sobre o Estado capitalista no campo do marxismo sofisticou-se, essa frase forneceu a orientação teórica mais geral que estava por trás da maior parte das teses marxistas sobre o Estado. O conteúdo da sentença, apresentado de forma tão direta, acabou dando origem aquilo que os críticos do marxismo chamaram de “instrumentalismo”. Para eles, essa frase condensa de maneira especialmente clara a compreensão simplista que Marx teria do Estado ao defini-lo como um mero comitê executivo das ordens burguesas, enfim, um mero instrumento que a classe economicamente dominante utilizaria para impor a sua política ao resto da sociedade.

Miliband (1988, p. 135), entretanto, chamou a atenção para o fato de que essa frase, que pela sua brevidade se prestou a incontáveis simplificações, pode ser entendida de maneira mais complexa. Quando Marx e Engels se referem ao Estado como uma organização que defende os “negócios comuns” de toda a classe burguesa, pressupõe-se que o faz em detrimento dos negócios particulares desta ou daquela fração de classe e, portanto, com um razoável grau de autonomia em relação aos interesses parciais da classe dominante. Embora essa abordagem seja plausível, parece-me que a interpretação instrumentalista é reforçada pelo receituário revolucionário que podemos encontrar no próprio Manifesto Comunista (s/d, vol. 1, p. 37). Segundo esse receituário, a revolução proletária deve expropriar a burguesia não apenas economicamente, mas também politicamente, isto é, o Estado deve ser tomado de suas mãos e usado, este mesmo Estado, a favor da transformação socialista da sociedade. Essa orientação parece reforçar a idéia de que para Marx e Engels o Estado é, em si, um instrumento neutro e que o “sentido social” de sua ação depende da classe que está à frente do seu leme. Dessa forma, para que o Estado seja burguês é preciso que a burguesia “controle” diretamente o aparelho; conseqüentemente, a sua transformação em Estado socialista se dá pela expulsão da burguesia do seu interior, isto é, pela expropriação política dessa classe.

Essa perspectiva “instrumentalista” foi certamente dominante no campo marxista. Podemos encontrá-la em A origem da família, da propriedade privada e do Estado, obra de 1895, em que Engels se refere ao Estado representativo como o “instrumento de que se serve o capital para explorar o trabalho assalariado”, como um Estado controlado pela burguesia seja por meio da corrupção direta dos funcionários, seja pela aliança entre o governo e a Bolsa (s/d, vol. 3, pp. 137-38). No entanto, podemos encontrá-la também em obras bem posteriores. Por exemplo, em textos publicados entre 1966 e 1976, Paul Boccara,

7 Traduzi essa sentença do texto em inglês retirado do sítio na internet

http://www.marxists.org/archive/marx/. A frase encontra-se, mais especificamente, no endereço http://www.marxists.org/archive/marx/works/1848/communist-manifesto/ch01.htm. A versão em português editada pela Alfa-Ômega substitui a palavra “Estado” por “governo”. Cf. Marx e Engels, s/d, vol. 1, p. 23.

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economista francês, numa série de análises sobre o “capitalismo monopolista de Estado”, denunciava aquilo que considerava a fusão entre o Estado e os grandes monopólios “numa totalidade orgânica única” e atacava o uso do Estado pela oligarquia monopolista (Boccara, 1978, p. 41). É interessante notar que também faz parte do receituário político de Boccara, pautado pelo reformismo e pela transição pacífica ao socialismo, a expropriação política dos grandes monopólios e o uso do Estado pelo “movimento operário e democrático” que, desse modo, poderia colocá-lo a serviço dos interesses da maioria (Boccara, 1978, p. 38).

Qual seria, do ponto de vista da relação entre Estado e classe economicamente dominante, a novidade encontrada n‟O 18 Brumário de Louis Bonaparte? A novidade reside numa outra breve frase em que Marx revela uma alteração qualitativa de sua compreensão acerca do Estado capitalista. Referindo-se à centralização estatal promovida pela primeira Revolução Francesa, Marx avalia que “todas as revoluções aperfeiçoavam esta máquina [centralizada do Estado] em vez de a destruir” (p. 125).

A mudança mais perceptível reside na diferença com que, segundo Marx, a revolução proletária deveria tratar o Estado capitalista. N‟O Manifesto Comunista, como vimos, tratava-se de se apropriar do aparelho de Estado a fim de utilizá-lo em benefício da revolução proletária. Em O 18 Brumário Marx percebe que, caso a revolução proletária se limitasse a fazer uso do antigo aparelho estatal, estaria repetindo o procedimento das revoluções anteriores e, portanto, estaria apenas reproduzindo uma forma de dominação previamente existente. De acordo com o novo receituário, é preciso destruir o aparelho estatal, pois este aparelho não é mais visto como um instrumento neutro. Ao contrário, trata-se de uma instituição que inscreve a dominação de classe na sua própria organização interna.

Mas em que contexto Marx apresenta essa sugestão? Ele o faz no momento em que está analisando o Estado francês de 1848, com seu imenso “poder executivo, com a sua imensa organização burocrática e militar, com a sua extensa e engenhosa maquinaria de Estado” (p. 124). Marx avalia que esse “gigantismo” do aparelho estatal, para utilizar a expressão de Hal Draper (1977, p. 396), surgiu no tempo da monarquia absolutista e “a primeira revolução francesa, com a sua tarefa de quebrar todos os poderes particulares locais, territoriais, municipais e provinciais, para criar a unidade burguesa da nação, tinha de desenvolver aquilo que a Monarquia absoluta havia iniciado: a centralização, mas ao mesmo tempo a extensão, os atributos e os servidores do poder e do governo” (p. 124, itálico meu).

Esta é à primeira vista uma estranha passagem, tendo em vista a tese de “destruição” do aparelho estatal enunciada acima. Como afirmamos, essa tese sugere que os aparelhos de Estado não são instrumentos neutros, mas inscrevem na sua organização interna formas de dominação de classe características de uma determinada época. Mas de acordo com a passagem acima, parece que a tese da destruição só valeria para o futuro Estado socialista, visto que à burguesia bastou aprofundar o processo de centralização criado pela Monarquia absolutista, numa interpretação muito próxima da de Alexis de Tocqueville. No entanto, fica claro pela passagem em itálico na mesma citação acima que Marx não se permite cair em tal formalismo. É verdade que, segundo ele, o Estado burguês surgido com a revolução francesa assemelha-se ao Estado pré-burguês da monarquia absolutista no que se refere à centralização, mas aquele só pôde surgir na medida em que “quebrou” os restos feudais deste.

Segundo Marx, já em Guerra Civil em França (1871), antes da Revolução Francesa existia uma estrutura estatal de tipo feudal, organizada com base em “direitos senhoriais”, “privilégios locais”, “monopólios municipais”, “códigos provinciais”. Essa estrutura estatal representava um obstáculo político e jurídico ao avanço da burguesia. Esta teve que destruí-la e o fez por meio da “escova gigantesca da Revolução Francesa do século XVIII [que] varreu todas essas relíquias de tempos passados, limpando assim, ao mesmo tempo, o

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solo da sociedade dos últimos obstáculos que se erguiam ante a superestrutura do edifício do Estado moderno”. Por essa razão é que “a classe operária não pode limitar-se simplesmente a se apossar da máquina do Estado tal como se apresenta e servir-se dela para seus próprios fins” (Marx, s/d, vol. 2, p. 78). A Comuna, ou a revolução proletária em geral, não poderia aproveitar-se dessa antiga estrutura estatal porque ela era uma estrutura de classe. Utilizá-la implicaria, necessariamente, reproduzir as formas burguesas de dominação correspondentes aos elementos burgueses da estrutura do Estado8: burocracia extensa, centralizada e despótica, separada da sociedade e não controlada por ela; representação política sem responsabilidade e insubstituível; exército permanente a serviço do Estado e não da sociedade; liberdade e igualdade puramente formais; separação entre executivo e legislativo e ausência de eleições para todos os cargos.

A tese de que o aparelho estatal traz inscrito na sua própria organização interna a natureza de classe da sociedade em que ele opera sugere uma outra: para que o Estado atenda aos interesses da classe dominante não é condição necessária que os membros desta classe “controlem” os cargos estatais. Essa mudança é fundamental, pois, do ponto de vista de uma teoria marxista geral do Estado, a perspectiva instrumentalista presente n‟ O Manifesto Comunista sofre de uma evidente limitação: se a natureza de classe de um Estado depende da origem social dos indivíduos que o controlam, então seria preciso aceitar a conclusão que decorre dessa afirmação, qual seja, a de que em situações históricas em que a burguesia não controla o Estado, este não poderia ser adjetivado de burguês, caindo por terra a tese geral do caráter de classe de todo e qualquer Estado.

Há várias passagens em O 18 Brumário de Louis Bonaparte em que Marx parece se dar conta de que o Estado burguês e a sociedade burguesa mantêm entre si uma relação que transcende as influências subjetivas que a burguesia e seus membros possam eventualmente exercer sobre os membros do aparelho estatal. Basta relembrar aqui a característica mais essencial do processo que leva ao golpe de dezembro de 1851 e ao crescente cerceamento do “poder político” da burguesia por Bonaparte. Como mostra Marx, quando a “burguesia parlamentar” vê o seu domínio político consolidado (depois de dissolvida a Constituinte em Janeiro de 1849 e derrotados os republicanos burgueses e a Montagne em junho do mesmo ano), abre-se o período de luta entre o poder executivo e a Assembléia Legislativa. Esse processo, como sabemos, leva à conturbação política, à paralisia decisória em função das divisões realistas do Partido da Ordem e ao distanciamento da “burguesia extraparlamentar” em relação aos seus representantes no Parlamento. Tudo isso gera “intranqüilidade” e a burguesia extraparlamentar, descontente com a ameaça que tal intranqüilidade gera para os seus negócios, abre mão do seu “poder político” (107). Por fim, vem o golpe e Marx diz: “somente sob o segundo Bonaparte parece ter-se o Estado autonomizado completamente” (125).

Mas quais são os resultados dessa autonomização? É o próprio Marx quem afirma: a burguesia pôde, enfim, “entregar-se plenamente confiante aos seus negócios privados sob a proteção de um governo forte e ilimitado” (p. 109), e “a força do poder executivo autonomizada, sente como vocação sua assegurar a „ordem burguesa‟” (133). Essa vocação não é aleatória, mas deve-se ao fato de que “o interesse material da burguesia francesa está precisamente entretecido do modo mais íntimo com a conservação dessa extensa e

8 O primeiro autor a perceber a originalidade de O 18 Brumário em relação ao Manifesto Comunista foi Lenin, no

seu O Estado e a Revolução. No entanto, por razões sobejamente conhecidas, Lenin estava muito mais interessado em utilizar o novo receituário revolucionário presente no texto de Marx para criticar o reformismo político da social-democracia alemã, em geral, e de Kautisky, em particular, do que em identificar as conseqüências teóricas implícitas em O 18 Brumário para a teoria do Estado no marxismo. As considerações de Lenin sobre a Guerra civil em França servem ao mesmo propósito. Cf. Lenin, 1983, pp. cap. II, em especial pp. 30, 35-39, 43-4, cap. III, em especial pp. 45-50.

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ramificadíssima máquina do Estado” (p. 67). Por fim, ao avaliar o papel do Segundo Império já em Guerra Civil em França, Marx afirma:

o Império foi aclamado de um extremo a outro do mundo como o salvador da sociedade. Sob sua égide, a sociedade burguesa, livre de preocupações políticas, atingiu um desenvolvimento que nem ela mesma esperava. Sua indústria e seu comércio adquiriram proporções gigantescas; a especulação financeira realizou orgias cosmopolitas; a miséria das massas ressaltava sobre a ultrajante ostentação de um luxo suntuoso, falso e vil. O poder estatal, que aparentemente flutuava acima da sociedade, era de fato o seu maior escândalo e o viveiro de todas as suas corrupções (Marx, s/d, vol. 2, p. 80).

Portanto, a autonomia do Estado e a supressão do “poder político” da burguesia conjugam-se com um desenvolvimento da sociedade burguesa “que nem ela mesma esperava”. É inegável, pelas citações acima, que o Estado cumpriu a sua função de garantir a ordem material da sociedade burguesa sem que para tanto fosse necessário que a burguesia estivesse à frente do leme do Estado. Ora, torna-se lícito supor, portanto, que existe entre essa sociedade e o aparelho estatal um vínculo que transcende as relações de controle direto ou influência indireta entre a classe economicamente dominante e o Estado9.

Se isso é verdade, tornam-se discutíveis as várias passagens em que Marx diz que a burguesia perdeu o seu “poder político” ou, por outra, perdeu a sua “capacidade de dominar” (p. 91). Na verdade, o que a burguesia perdeu foi a sua “influência política”, isto é, a capacidade de controlar diretamente os postos do aparelho estatal. Se entendermos o poder político como a “capacidade” de ter os seus interesses mais amplos assegurados, poderíamos dizer que o Segundo Império, ao contrário, fortaleceu o poder político burguês ao reproduzir a sociedade em que a burguesia ocupava posição material privilegiada. Certamente, a análise histórica de Marx deixa claro, muito mais claro do que a análise produzida por alguns teóricos contemporâneos do Estado capitalista, que essa reprodução da sociedade burguesa à revelia da própria burguesia, possibilitada por vínculos objetivos entre a sociedade e o Estado, ocorre dentro de uma dinâmica política que produz as suas próprias conseqüências para a configuração da sociedade francesa do período. Mais do que isso, muitos dos acontecimentos não são ditados pelas necessidades funcionais da sociedade capitalista, mas são o resultado da conduta estratégica dos atores envolvidos e que, no limite, poderiam ameaçar a reprodução da “ordem burguesa”. Como veremos, a própria revolução de 1848 é um exemplo disso.

9 Hal Draper também atribui ao 18 Brumário esta inovação acerca do Estado. Segundo este autor: “Marx e

Engels não fizeram do Estado uma mera extensão da classe dominante, sua ferramenta, seu fantoche, ou mero reflexo, num sentido simplista e passivo. Não meramente e certamente não simplesmente, pois a realidade pode de fato ser mais complexa, como mostrou o estudo de Marx sobre o Bonapartismo. Ao contrário, o Estado surge e expressa uma necessidade real e geral de organização da sociedade – necessidade esta que existe qualquer que seja a estrutura de classe particular. Porém, desde que exista uma classe dominante nas relações sócio-econômicas, ela utilizará esta necessidade para moldar e controlar o Estado de acordo com as orientações de classe.” Draper indica ainda que essa idéia já estava esboçada nos primeiros textos, como numa carta anterior a 1845, em que Marx afirma que “o Estado e a organização da sociedade não são, do ponto de vista político, duas coisas diferentes. O Estado é a organização da sociedade”. Draper observa, entretanto, que, naquele momento, esta idéia ainda não estava vinculada a uma teoria classista do Estado. Cf. Draper, 1977, pp. 318-19.

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O 18 Brumário de Louis Bonaparte e a teoria marxista contemporânea do

Estado O avanço fundamental que O 18 Brumário de Louis Bonaparte representa para as

considerações clássicas sobre o Estado reside, portanto, na nova percepção, expressa por meio de um novo receituário político, de que o aparelho de Estado não é uma forma institucional neutra. De forma mais condizente com o materialismo histórico, a estrutura estatal passa a ser vista como uma “forma política” que corresponde a um tipo específico de sociedade, com um tipo específico de estrutura de classe. Desse modo, não é o controle pela burguesia que define o caráter burguês de um Estado, mas sim a sua “materialidade específica” e a sua relação “estrutural” (Marx não utiliza nenhuma das duas expressões) com o mundo material da sociedade em que opera. Como complemento, percebe-se que a ação do Estado como garantidor da “ordem burguesa” não depende do controle direto da burguesia sobre o mesmo. Será nesse registro geral que a teoria marxista contemporânea do Estado capitalista se moverá. Cabe colocar agora duas questões: primeira, como esse novo registro se manifestou, de forma teoricamente sistemática, na teoria contemporânea do Estado capitalista? Segunda, como essa tese geral se vincula a uma outra – a da autonomia do processo político frente aos interesses imediatos das classes - tanto em O 18 Brumário como nos autores contemporâneos? Os dois itens seguintes visam a responder essas questões.

A natureza de classe do Estado capitalista como um atributo “objetivo” e a oposição entre

“interesses gerais” e “interesses imediatos” da classe burguesa No que se refere à primeira questão, observaremos que a tese mais geral de que o

Estado é uma instituição que reproduz a ordem social e que registra na sua forma de organização interna as relações de classe da sociedade em que opera apareceu na teoria marxista contemporânea do Estado por meio do trabalho pioneiro de Nicos Poulantzas, Poder Político e Classes Sociais. Para Poulantzas, uma teoria marxista do Estado deveria abandonar de vez as posições economicistas e instrumentalistas que, respectivamente, entendiam o Estado como mero reflexo da “infra-estrutura” e como simples objeto controlado pela classe dominante. Para se estudar o Estado capitalista, dois procedimentos deveriam ser fundamentais.

Primeiramente, adotar uma perspectiva funcional acerca do Estado em geral, entendendo-o como a instituição responsável pela coesão social e, portanto, pela reprodução das relações de classe que caracterizam uma dada sociedade. De acordo com esta perspectiva, o Estado, e suas diversas ações, beneficiariam a classe dominante não por ser um instrumento em suas mãos, mas por ser a instituição responsável pela reprodução do sistema social em que aquela classe ocupa posição dominante. Haveria, nesse sentido, uma “coincidência” entre as funções do Estado e os interesses da classe economicamente dominante (Poulantzas, 1986, pp. 42-54).

Em segundo lugar, o analista deveria perguntar-se: qual é a maneira específica do Estado capitalista realizar essa função geral, maneira pela qual ele se diferencia dos outros tipos históricos de Estado? Segundo Poulantzas, o Estado capitalista possui uma organização interna – o “burocratismo” – que corresponde à forma assumida pelas relações de produção capitalistas e que, ao lado do direito burguês, produz “efeitos ideológicos” que contribuem, de um lado, para desorganizar os trabalhadores como classe e, de outro, para organizar a dominação política da classe burguesa, mesmo que esta não esteja à frente do aparelho estatal (Poulantzas, 1986, pp. 119-133).

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Essa “perspectiva objetivista”, isto é, que situa o caráter de classe do Estado na função sistêmica que ele exerce dentro de uma sociedade dividida em classes e não nas motivações dos atores que o controlam, foi hegemônica no campo teórico marxista a partir do livro de Poulantzas. Não pretendo dizer com isso que os autores posteriores a Poulantzas tenham subscrito integralmente a sua abordagem do Estado. Muito pelo contrário, foram críticos contundentes do “funcionalismo” ou do “politicismo” poulantziano. Entretanto, grande parte deles adotou essa perspectiva mais geral de que uma teoria marxista do Estado capitalista deveria identificar o caráter de classe em elementos estruturais e não conjunturais e, portanto, ser uma “teoria geral” e não a teoria de um Estado específico numa conjuntura particular10. Como vimos, essa perspectiva se funda nas sugestões presentes em O 18 Brumário, embora, é claro, com um grau de sistematização infinitamente superior ao presente naquela obra11.

Como decorrência dessa nova perspectiva teórica, Poulantzas elaborou o seu famoso conceito de “autonomia relativa do Estado capitalista”. Este conceito, como se sabe, inspira-se diretamente em algumas passagens d‟ O 18 Brumário em que Marx se refere à oposição entre o Estado e a sociedade civil e à crescente capacidade do Estado se “destacar” da sociedade (p. 125). Em Poulantzas, entretanto, esta autonomia deixa de ser um elemento puramente conjuntural para tornar-se um traço constitutivo (estrutural) do Estado capitalista. Desse modo, a autonomia do Estado em relação às classes e frações dominantes está situada no contexto mais geral da organização interna do modo de produção capitalista, caracterizado pela separação entre o “econômico” e o “político” (Poulantzas, 1986, pp. 254-256).

Nos autores posteriores a Poulantzas encontramos este tema especialmente nos “derivacionistas”12, por meio do problema da “autonomização” do Estado capitalista, isto é, de sua constituição enquanto esfera separada das relações de produção. É certo que O 18 Brumário, no que se refere a esta escola, aparece mais como ilustração do que como fonte teórica propriamente dita, cabendo ao Capital este último papel. De qualquer forma, também aqui o caráter de classe do Estado capitalista é tido como um atributo objetivo e não como fruto da influência direta que a burguesia exerce sobre a burocracia estatal.

No entanto, se o Estado é uma instituição que opera para atender aos interesses da burguesia, como lidar teoricamente com os conflitos historicamente observáveis entre esta classe e o “seu” Estado? As análises históricas de Marx revelam ser essa uma situação

10 Excluo, evidentemente, Ralph Miliband, desde o início crítico contundente dessa perspectiva. Ver, por

exemplo, Holloway e Picciotto: “Poulantzas critica Miliband corretamente por negligenciar os vínculos estruturais essenciais entre a burguesia e o Estado capitalista. O que torna o Estado na sociedade capitalista um Estado capitalista não é a composição de classe do pessoal do aparelho de Estado mas a posição ocupada pelo Estado no modo de produção capitalista”. Holloway e Picciotto, 1978, p. 5. Claus Offe e Volker Ronge, ao fazerem a crítica da visão instrumentalista do Estado, “parte[m] do pressuposto de que o Estado em absoluto favorece interesses específicos. Em vez disso, ele protege e sanciona instituições e relações sociais que, por sua vez, constituem o requisito institucional para a dominação de classe do capital. O Estado nem está a serviço nem é o „instrumento‟ de uma classe contra outra. Sua estrutura e atividade consistem na imposição e na garantia duradoura de regras que institucionalizam as relações de classe específicas de uma sociedade capitalista”. Offe e Ronge, 1982, p. 123. Sobre este ponto, ver também Göran Therborn, 1989 e diversos textos de Block, 1987. A crítica de Miliband à identificação entre poder de Estado e poder de classe pode ser encontrada em Miliband, 1983.

11 Em reforço a essa idéia, é interessante a afirmação de Offe e Ronge de que a interpretação instrumentalista do Estado no campo do marxismo “pode apoiar-se com mais razão em O Estado e a revolução, de Lênin, que n‟O 18 Brumário de Marx...”. Offe e Ronge, 1982, p. 122.

12 A escola derivacionista foi formada, basicamente, por intelectuais alemães no início dos anos 1970. Seus autores buscaram elaborar uma teoria materialista do Estado capitalista em geral a partir do método utilizados por Marx em O Capital. Os textos produzidos geraram um debate teórico que ficou conhecido como o “debate alemão”. Cf. Holloway and Picciotto, 1978.

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A importância do 18 Brumário de Louis Bonaparte para a teoria marxista contemporânea do Estado capitalista

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muito recorrente13. Vejamos, primeiramente, como Marx resolveu essa questão em O 18 Brumário e, em seguida, a importância dessa solução para a teoria contemporânea do Estado?

Quando analisa o processo em que Bonaparte, ao destituir Changarnier, apodera-se do poder militar e consegue provocar defecções no Partido da Ordem, destruindo a maioria parlamentar deste, Marx se pergunta o que foi que permitiu a derrota deste Partido para o presidente. A resposta está na passagem a seguir:

Provou-se, pois, que o partido da ordem não só tinha perdido o ministério e o exército, mas também que nos conflitos com Bonaparte tinha perdido igualmente a sua maioria parlamentar independente, que um bando de deputados tinha deserdado do seu campo por fanatismo da conciliação, por medo da luta, por cansaço, por considerações de família, pelos vencimentos de Estado de parentes seus, por especulação com os postos de ministros deixados vagos (Odilon Barrot), por esse mesquinho egoísmo com que o burguês comum se inclina sempre a sacrificar o interesse geral da sua classe a este ou àquele motivo privado (p. 93, itálico nosso).

Ou, quando aborda o crescente distanciamento entre a burguesia parlamentar e a burguesia extraparlamentar no conflito com o executivo:

E esta burguesia extraparlamentar, que se tinha rebelado já contra a luta puramente parlamentar e literária a favor da dominação da sua própria classe e traído os chefes desta luta, atreve-se agora a acusar o proletariado por não se ter lançado por ela numa luta sangrenta, numa luta de vida ou morte! Ela, que a cada momento sacrificou o seu interesse geral de classe, isto é, o seu interesse político, ao mais tacanho, ao mais sórdido interesse privado ...! (109, itálico nosso).

Esta contraposição entre “interesse geral” e “interesse imediato” parece indicar que o interesse geral da classe não se constitui na mera somatória dos diversos interesses privados dos seus membros particulares. Como poderíamos, à luz da análise de Marx em O 18 Brumário, definir esses dois interesses?

O interesse imediato (“mesquinho”, “tacanho”, “egoísta”) parece residir na orientação da conduta do capitalista exclusivamente em direção ao seu lucro enquanto agente econômico. Trata-se, a meu ver, de uma preocupação exclusiva com os seus “negócios privados”. Nesse sentido, todas as opções do burguês individual são orientadas em função da lucratividade imediata de suas atividades econômicas.

O interesse geral da classe burguesa, por sua vez, é essencialmente um “interesse político” (pp. 67 e 109), isto é, a garantia da “ordem material” em que essa classe ocupa situação privilegiada ou, para usar uma expressão que em Marx parece transcender a

13 Situações em que as decisões do Estado geram reações adversas por parte da burguesia estão nas análises

que Marx faz das histórias francesa, inglesa e alemã. O exemplo mais marcante, porém, encontra-se em O Capital, mais especificamente no estudo das leis fabris impostas pelo Estado aos capitalistas ingleses no século XIX. Cf. Marx, 1973, vol. I, quarta seção, capítulo XIII, item 9 “Legislación fabril (cláusulas sanitarias y educativas) Su generalización en Inglaterra”.

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economia, a garantia da “ordem burguesa” (p. 130 e 133). É importante observar, entretanto, que esse “interesse geral” não se encontra presente na mente do burguês individual (cujos interesse privados, não raro, podem ameaçar os interesses gerais de sua classe, como vimos nas citações acima) e, por conseguinte, não se constitui num objetivo político conscientemente perseguido por ele. Na verdade, tal tarefa coube, na análise de Marx, exatamente ao Estado bonapartista que, a despeito dos constantes conflitos com a burguesia, garantiu, como já dissemos, a reprodução do capitalismo de uma forma que nem mesmo essa classe esperava. Com freqüência, Bonaparte feriu os interesses imediatos dos burgueses particulares, mas foi ele quem, por meio de um Estado cada vez mais autonomizado e centralizado, conseguiu por um ponto final na revolução e manter a ordem burguesa (p. 125).

Essa distinção entre “interesse geral” e “interesse egoísta” foi absolutamente fundamental para a teoria marxista contemporânea do Estado capitalista. Foi por meio dela que todos os neomarxistas, movidos pela sua recusa categórica ao “instrumentalismo”, conseguiram, cada um a sua maneira, conjugar a tese da autonomia com a tese do caráter de classe do Estado capitalista14. Este passa a ser claramente definido, então, como o representante do interesse geral da classe burguesa (a manutenção dos traços fundamentais do sistema capitalista) e não como o porta-voz dos seus interesses tais como articulados por seus membros individuais. Também para esses autores, o “interesse geral” não é uma motivação consciente dos burgueses particulares, mas um atributo do sistema social com o qual o Estado mantém uma relação funcional. Por essa razão, o Estado pode atender aos interesses dessa classe mesmo que separado dela e mesmo que para isso tenha que gerar conflitos acirrados com sua frações particulares.

Não cabe aqui entrar nas discussões teóricas e metodológicas que essa apropriação da tese de Marx gerou, mas é importante dizer que os teóricos contemporâneos deram pouca atenção às análises históricas. Desse modo, passou-se a impressão de que a funcionalidade do Estado para os interesses gerais da classe constituía-se, na verdade, num pressuposto teórico irrefutável. O que O 18 Brumário sugere é que se, de um lado, o Estado tem de fato essa “função”, ela, por outro lado, é exercida em contextos históricos de luta que, pela sua própria natureza, podem inviabilizá-la e, portanto, comprometer o interesse geral da classe burguesa. A luta de classes pode ser o grão de areia no inabalável mecanismo funcional previsto pela teoria contemporânea do Estado.

A autonomia do processo político Passemos à segunda questão deste item. As afirmações, em O 18 Brumário de Louis

Bonaparte, sobre a necessidade de destruir o aparelho estatal, sobre a separação entre Estado e “sociedade civil” e sobre a crescente autonomização do Estado geram, a meu ver, proposições acerca daquilo que poderíamos chamar de a “autonomia do processo político”15. Há, no texto de Marx, uma característica que salta aos olhos do leitor, qual seja, a autonomia da dinâmica dos acontecimentos políticos frente à dinâmica dos eventos

14 Por exemplo, as considerações sobre a função geral do Estado, em Poulantzas, e sobre o Estado como

“capitalista coletivo ideal”, entre os derivacionistas, são logicamente dependentes desta distinção.

15 Ao contrário, as teses opostas, a meu ver, impediriam levar a autonomia do processo político em consideração. Uma perspectiva em que o Estado precisa ser diretamente capturado e controlado pelos membros da burguesia para reproduzir a dominação de classe não só enfraquece a tese da separação entre Estado e “sociedade civil” (já que ambos se fundem no controle instrumental do Estado por parte da sociedade civil, isto é, a burguesia) como também suprime o espaço para a autonomia da política, pois o processo político deve, nessas condições, necessariamente refletir as vontades e os movimentos da classe que nele reina soberana.

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econômicos e frente aos interesses imediatos de classe16. Parece-me claro que a compreensão da sociedade francesa como uma sociedade marcada pela separação entre economia e Estado, pela constituição deste último como esfera cada vez mais “destacada” da sociedade, sugere, ao mesmo tempo, pensar a dinâmica política como algo que não deve ser visto como mero reflexo da economia ou, por outra, que o movimento produzido na esfera política não deve ser visto como um efeito mecânico produzido pelo movimento das classes na esfera da produção. Mas em que momentos esse reconhecimento da “autonomia do processo político” aparece na obra em questão? A meu ver, quando Marx analisa quatro temas.

(i) Grupos políticos sem base produtiva O primeiro deles, e talvez o mais evidente, refere-se à existência de grupos

politicamente estratégicos que não têm uma base produtiva e, portanto, não se constituem em classes sociais na acepção marxista do termo. Estou me referindo, é claro, aos republicanos burgueses do National que, segundo Marx, não são uma “fração da burguesia mantida coesa por grandes interesses comuns e delimitada por condições peculiares de produção. Era uma camarilha de burgueses, escritores, advogados, oficiais e funcionários de idéias republicanas” (p. 33), cujo objetivo político fundamental era a instauração da República (p. 34). É verdade que essa clique política foi derrotada no decorrer do processo político, mas desempenhou papel politicamente estratégico na condução da Assembléia Constituinte, de junho a dezembro de 1848. Mas se essa clique de republicanos não constitui uma classe, porque então adjetivá-los de “burgueses”?

(ii) a representação política de classe A resposta a essa questão exige tratar do segundo tema que, a meu ver, revela a

autonomia da política na análise de Marx. Segundo Marx, os republicanos não eram burgueses em função do seu vínculo econômico, mas em função de uma “visão de mundo” que via a “ordem burguesa” como a única ordem social possível. Nesse sentido, os republicanos burgueses são representantes de classe não pelos interesses econômicos imediatos que defendem, mas pela “ideologia” que professam. A “representação de classe” em Marx não é vista como um exercício de ventriloquia, em que o representado manipula o representante obrigando-o a verbalizar os seus interesses no interior das instituições políticas. Marx discute esse problema em duas importantes passagens. A primeira, quando analisa a representação pequeno-burguesa na Assembléia Nacional Legislativa, isto é, a Montagne, e os seus limites políticos. Nessa passagem, Marx diz:

16 Esta “autonomia da política” nas sociedades capitalistas, vale observar, não contradiz as teses fundamentais

do materialismo histórico. Ao contrário, ela se constitui no efeito necessário das relações de produção que caracterizam essa sociedade. Por essa razão, a análise materialista tem que, ao mesmo tempo, levar em consideração os condicionantes (e limites) materiais da ação política sem reduzi-la à condição de mero reflexo dos interesses de classe. Desse ponto de vista, tão equivocado quanto o mecanicismo seria o “politicismo”, que consiste em ver a prática política como uma esfera totalmente autônoma. Essa última posição representa, para o materialismo, uma capitulação empiricista frente às aparências criadas pela sociedade capitalista. Sobre este último ponto, ver Wood, 2003. Quanto aos condicionantes materiais da vida política, uma comparação das análises de Marx sobre a França e a Alemanha de 1848 pode ser ilustrativa. Podemos perceber que a configuração da cena política alemã, no que se refere aos seus principais atores políticos, era bastante diferente da encontrada na França. A diferença mais significativa residia na forte presença de um “partido feudal” na Alemanha em função do estágio pouco avançado do capitalismo naquele país. Ao contrário, o desenvolvimento do capitalismo francês, como observa Marx em O 18 Brumário, já tinha aburguesado completamente a antiga propriedade feudal e retirado das casas reais qualquer vínculo efetivo com o antigo regime. Cf. Marx, 1989, p. 201.

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... não se deve imaginar que os representantes democráticos são todos shopkeeper [lojistas, pequenos proprietários] ou pessoas que se entusiasmam com eles. Podem estar a um mundo de distância deles, pela sua cultura e pela sua situação individual. O que os faz representantes do pequeno burguês é que sua cabeça não ultrapassa os limites que aquele não ultrapassa na vida; que, portanto, são teoricamente impulsionados para as mesmas tarefas e soluções para as quais o interesse material e a situação social impulsionaram, praticamente, aquele. Tal é, em geral, a relação existente entre os representantes políticos e literários de uma classe e a classe que eles representam (p. 55).

A expressão “representante político e literário”, a meu ver, visa a conjugar o lugar estratégico que as classes sociais ocupam na explicação de Marx com a idéia de autonomia da atividade política. A representação da pequena burguesia não se faz por meio da presença direta de pequenos burgueses no interior da Assembléia Legislativa que, assim, atuariam como porta-vozes dessa classe, buscando em cada caso, em cada assunto, em cada lei e projeto discutidos promover os seus ganhos econômicos imediatos. Na verdade, a representação de classe reside numa “correspondência” de “visões de mundo” que leva o “representante político e literário” da pequena burguesia a se colocar problemas e soluções que são, em termos gerais, os mesmos que habitam o mundo pequeno burguês. A passagem acima é ainda mais interessante porque revela que esses representantes podem estar a “um mundo de distância” da situação vivida pelos membros da classe que representam. Ora, isso sugere que tais visões de mundo podem ser sistematizadas e absorvidas a partir de posições outras que não a posição no processo produtivo. Não fosse assim, o que explicaria que homens que não são pequenos burgueses do ponto de vista de sua situação econômica pudessem adotar uma “perspectiva ideológica” de uma classe a qual não pertencem objetivamente?

Essa forma complexa de entender a representação de classe repete-se na análise da relação entre a burguesia e os seus representantes políticos e literários. O fato de esses representantes atuarem numa esfera específica, isto é, na política e não no mercado, faz deles uma “categoria” que não raro toma decisões à revelia da classe que representam, entrando em conflito com ela. Mais uma vez, eles representam a burguesia no sentido acima descrito e não como meros porta-vozes dos interesses imediatos de suas frações. Esse tema é abordado por Marx por meio da famosa distinção entre “burguesia parlamentar” e “burguesia extraparlamentar”. No auge dos conflitos entre o Partido da Ordem e o chefe do Executivo, Marx diz:

Se o partido da ordem parlamentar, com a sua gritaria pela tranqüilidade, se condenava a si próprio à tranqüilidade, ... se declarava a dominação política da burguesia incompatível com a segurança e a existência da burguesia, na medida em que, na luta contra as restantes classes da sociedade, aniquilava pela sua própria mão todas as condições do seu próprio regime, do regime parlamentar, a massa extraparlamentar da burguesia, pelo seu servilismo face ao presidente, pelos seus insultos ao parlamento, pelo mau trato brutal da própria imprensa, levava Bonaparte a oprimir, a aniquilar a parte dela que falava e escrevia,

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os seus políticos e os seus literatos, a sua tribuna e a sua imprensa, a poder assim entregar-se plenamente confiante aos seus negócios privados sob a proteção de um governo forte e ilimitado. Declarava inequivocamente que suspirava por se desfazer da sua própria dominação política, para se desfazer dos cuidados e perigos da dominação” (109).

A lógica do raciocínio, como se percebe, vale também para a representação da classe burguesa. Os representantes políticos e literários dessa classe, isto é, a sua parte “que falava e escrevia”, representam os interesses da burguesia na medida em que vêem a “ordem burguesa” como a única forma possível de se organizar a sociedade. Nesse sentido, não apenas os legitimistas e orleanistas do Partido da Ordem são representantes da burguesia, mas também os republicanos burgueses que, como vimos, eram um grupo político sem qualquer vínculo direto com o setor produtivo, mas, ao mesmo tempo, ardorosos defensores da ordem burguesa, dispostos a excluir do governo provisório qualquer elemento socialista (p. 34), a aniquilar fisicamente os combatentes revolucionários e mesmo a não suportar os arroubos oposicionistas do partido pequeno burguês; enfim, dispostos a transformar aquele que poderia ser o acontecimento mais revolucionário da Europa no mais contra-revolucionário (p. 35). Segundo Marx, foi o comportamento irresponsável dessa “burguesia dentro do parlamento” que irritou a “burguesia fora do parlamento”. As lutas internas ao Partido da Ordem e as tensas relações do Parlamento com o Executivo criavam uma situação de intranqüilidade que levava a burguesia fora do parlamento a se afastar da burguesia parlamentar (87). Diz Marx,

O partido parlamentar não só se tinha desintegrado nas suas duas grandes frações e cada uma destas não só se tinha desintegrado ela própria no seu interior, como também o partido da ordem no parlamento se tinha dissociado do partido da ordem fora do parlamento. Os porta-vozes e escribas da burguesia, a sua tribuna e a sua imprensa, numa palavra, os ideólogos da burguesia e a própria burguesia, os representantes e os representados estavam divorciados uns dos outros e já não se entendiam mais (106).

Não preciso lembrar aqui quão importante foi esta cisão para o encaminhamento do próprio golpe de dezembro de 1851. Em nome da ordem e da tranqüilidade menosprezadas pela burguesia parlamentar, a burguesia extraparlamentar não hesitou em sair de cena para apoiar Bonaparte e demandar a sua proteção.

Penso ainda que é exatamente a partir dessa percepção intuitiva de que a representação de classe não deve ser vista como uma relação direta e mecânica entre o representante e o representado que podemos entender o sentido da expressão “cretinismo parlamentar”. Segundo Marx, o “cretinismo parlamentar” é uma “doença que aprisiona como por encanto os contagiados num mundo imaginário e os priva de todo o senso, de toda a memória, de toda a compreensão do rude mundo exterior” (94). Evidentemente, essa “doença” pressupõe o distanciamento do parlamentar em relação ao “mundo exterior”, pressupõe ser ele capaz de orientar a sua conduta seguindo exclusivamente as suas próprias racionalizações. A expressão é excessivamente retórica e pejorativa, mas parece descrever uma dimensão importante da compreensão que Marx tem da relação entre política e luta de classes.

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(iii) Ação política e resultado histórico A “autonomia da política” em O 18 Brumário expressa-se também por meio do

caráter “aberto” dos acontecimentos históricos, isto é, a idéia de que o “fato político” é, em grande parte, um resultado não pretendido, produzido pela interdependência entre as diversas opções e decisões estratégicas tomadas pelos agentes. Neste ponto, contrario a avaliação que o próprio Marx faz do golpe de 1851. Segundo ele, “se houve alguma vez um acontecimento que projetou diante de si a sua sombra muito tempo antes de se dar, foi o golpe de Estado de Bonaparte” (p. 113). Essa frase nos dá a impressão de que o golpe de 1851 já estava inscrito nos acontecimentos de fevereiro de 1848. A meu ver, a forma como Marx analisa o período de 1848 a 1851 na França desmente cabalmente essa interpretação. Gostaria de defender essa tese a partir das contribuições presentes no livro de John M. Maguire, Marx’s Theory of Politics. A meu ver, Maguire identifica duas razões que, segundo ele, permitem a Marx ver o processo político analisado nas obras históricas, em geral, e em O 18 Brumário, em particular, como um processo cujo resultado não pode ser previsto de antemão.

Primeiramente, segundo este autor, para Marx a motivação econômica não é a única a orientar a conduta dos atores políticos. Por exemplo, se é verdade que as duas casas reais que compunham o Partido da Ordem eram vistas, no fundo, como representantes de diversas frações da classe burguesa, não é menos verdade que Marx reconheceu, ainda que de forma ligeira, a presença de elementos políticos e ideológicos na relação entre legitimistas e orleanistas. Nesse sentido, o significado material das duas casas é fundamental, mas na relação entre ambas também “havia velhas recordações, inimizades pessoais, temores e esperanças, preconceitos e ilusões, simpatias e antipatias, convicções, artigos de fé e princípios que os mantinham unidos a uma ou outra casa real...?” (p. 52). A análise contida no texto como um todo autoriza dizer que esses elementos não-econômicos também se constituíam em importantes motivações a orientar a ação política dos membros do Partido da Ordem (Maguire, 1984, pp. 131-32). Lembre-se ainda todas as referências de Marx, nas páginas iniciais da obra em questão, à simbologia e à tradição política e de como ambas são fundamentais para a definição do comportamento dos atores políticos. Assim como a representação de classe, como vimos, não passa pela realização de interesses econômicos imediatos, mas pela adesão ideológica a uma ordem social, também esses elementos superestrutrais (tradição, simbologia, valores políticos etc.) só têm um caráter de classe na medida em que traduzem em princípios gerais as características fundamentais de um determinado tipo de sociedade.

Em segundo lugar, de acordo com Maguire, “a explicação que Marx fornece da ação política é instrumental racional, uma explicação que considera fundamental a motivação econômica, mas não universal nem „essencial‟ e que aceita, antes e depois do acontecido, que os indivíduos fazem na realidade escolhas e tomam decisões que poderiam ter sido diferentes” (1984, p. 137). “Decisões que poderiam ter sido diferentes”, eis o elemento fundamental da conduta estratégica. Se os atores políticos poderiam fazer diferente do que fizeram, isso quer dizer que o resultado histórico - no caso, o golpe de 1851 - é um resultado possível dentre vários outros, isto é, que poderia não ter ocorrido se as decisões fossem outras. Enfim, o processo político é permeado por motivações várias e sua dinâmica depende de decisões estratégicas feitas em situação de grande incerteza.

Há exemplos abundantes em O 18 Brumário que corroboram essa interpretação. Marx lembra que o enfraquecimento do parlamento na França foi fruto, em grande parte, de uma decisão da burguesia francesa de afastar de forma radical, pela repressão violenta, qualquer força popular (operários e social-democracia) daquela instituição. Foi essa opção, diz Marx, que contribui para enfraquecer o parlamento face ao poder executivo e face aos olhos do povo. Além disso, ao entregar vários deputados da Montagne aos tribunais, por

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ocasião da revolta de junho de 1849, a burguesia colocou em risco a sua própria imunidade parlamentar (p. 60). A partir das revoltas operária e pequeno-burguesa, respectivamente em junho de 1848 e junho de 1849, a burguesia e seus representantes decidiram estigmatizar qualquer reivindicação, qualquer conflito como fruto do “socialismo” e, por isso, como uma ameaça à tranqüilidade social. Foi, em grande parte, por medo da “intranqüilidade” que optou freqüentemente por fazer concessões políticas importantes a Bonaparte e, assim, cavar a sua própria sepultura (pp. 70-71).

O cálculo estratégico dos atores, em especial da burguesia parlamentar, aparece de forma contundente quando Marx analisa a proposta de revisão constitucional, apresentada em maio de 1851, cujo objetivo era revogar o artigo 45, que proibia a reeleição de Bonaparte. Os bonapartistas, evidentemente, apoiavam; os republicanos burgueses eram contra e contavam ainda com um número importante de deputados para frustrar a revisão.

Face a estas posições tão claras, o partido da ordem encontrava-se metido em inextricáveis contradições. Se rejeitasse a revisão, punha em perigo os status quo, não deixando a Bonaparte senão uma saída, a da violência, entregando a França no segundo domingo do mês de maio de 1852, no momento decisivo, à anarquia revolucionária, com um presidente que tinha perdido a sua autoridade , com um parlamento que há já muito que a não tinha e com um povo que pensava em reconquistá-la. Se votasse pela revisão constitucional, sabia que votava em vão e que os seus votos fracassariam necessariamente face ao veto constitucional dos republicanos. Se, anticonstitucionalmente, declarasse válida a simples maioria de votos, só podia confiar em dominar a revolução submetendo-se incondicionalmente às ordens do poder executivo e tornava Bonaparte senhor da Constituição, da revisão e do próprio partido da ordem. Uma revisão apenas parcial, que prorrogasse os poderes do presidente, abria o caminho à usurpação imperial. Uma revisão geral, que encurtasse a existência da república, levantava um conflito inevitável entre as pretensões dinásticas, pois as condições para uma restauração bourbônica e para uma restauração orleanista não só eram diferentes como se excluíam mutuamente” (p. 100).

Duas eram as alternativas mais plausíveis: enfrentar Bonaparte e recuperar de vez o poder para a Assembléia Nacional, àquela altura já bastante enfraquecida, ou simplesmente submeter-se, a fim de evitar a instabilidade política. Os deputados do Partido da Ordem decidiram submeter-se a Bonaparte e deram mais um passo em direção ao fortalecimento do poder executivo (p. 105). Em todo o livro Marx critica a burguesia francesa por optar sempre por não enfrentar Bonaparte, por não fortalecer a Assembléia. Por exemplo, por ocasião das eleições parciais de março de 1850, a social-democracia volta a ameaçar o predomínio do Partido da Ordem elegendo vários deputados, inclusive com o apoio do exército, o que muito assustou Bonaparte. Este, para recuperar o apoio da Assembléia Nacional, curvou-se ao partido da Ordem. Segundo Marx, “o Partido da Ordem não soube aproveitar este momento único. Em vez de tomar audazmente o poder que lhe ofereciam,

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não obrigou sequer Bonaparte a repor o ministério destituído em 1 de novembro [ministério Barrot-Falloux, o primeiro e último ministério parlamentar]” (p. 73 e p. 66).

Esses são rápidos exemplos que mostram como, seguindo a análise de Marx, o golpe de 1851 é o resultado não de 1848, mas das opções que os atores políticos escolheram a cada momento depois de desencadeada a revolução. É dessa forma que devemos entender a frase de Marx, segundo a qual o golpe foi “o resultado necessário e inevitável do processo anterior” (p. 114). Segundo Maguire, trata-se, na verdade, de uma “crescente inevitabilidade”. A análise contida em O 18 Brumário mostra que “a inevitabilidade [do golpe] aumenta devido ao tipo de decisão e de opção que os indivíduos tomam no tipo de situação em que se encontram. É, portanto, uma inevitabilidade criada e alimentada pelas próprias reações racionais (talvez imperfeitamente racionais) dos indivíduos frente às suas posições” (1984, p. 144-5). Assim, as opções feitas na esfera da luta política foram desenhando, pouco a pouco, o caminho para o golpe17.

4. a dialética das formas políticas Por fim, a tese implícita da autonomia da prática política se faz presente por meio

de um quarto tema bastante recorrente na obra em questão, qual seja, a “dialética das formas políticas”, para usar a expressão de Antoine Artous (1999, p. 168). Segundo este autor, a meu ver corretamente, o que podemos perceber na análise que Marx faz do período que vai de 1848 a 1851 é que o movimento das formas políticas não é o reflexo mecânico da vontade das classes economicamente dominantes; ao contrário, não raro são essas classes que buscam se adaptar às novas condições políticas produzidas à sua revelia. De saída, é preciso notar que a revolução de 1848 não foi criada pela classe burguesa. Ao contrário, o primeiro momento da revolução coloca o operariado na linha de frente do processo político que, “com armas na mão, ... imprimiu-lhe o seu selo e proclamou-se a república social” (p. 27). É certo que na derrocada da Monarquia de Julho, participaram, ao lado do proletariado, os republicanos burgueses, a oposição dinástica e a pequena burguesia democrático-republicana, mas o mais importante para se entender a dinâmica do processo político imediatamente posterior é ter em mente que o processo revolucionário abriu as portas para a participação do movimento operário radical que, como lembra Marx, mostrou-se disposto a discutir seriamente, desde o início, os problemas sociais (p. 28). Não era isso, certamente, o desejado pelas diversas facções burguesas. Por essa razão, o desenrolar da revolução de 1848 é, como diz o autor, a transformação desta de um evento revolucionário num acontecimento contra-revolucionário. A burguesia e seus representantes políticos e literários dedicaram todos os seus esforços a expulsar da cena política as forças populares (operários e pequenos burgueses). A burguesia monarquista não desejava a República, mas como seu advento não pode ser sustado, era preciso depurá-la dos seus elementos perigosos.

Mas se a República não foi criação exclusiva da classe burguesa, ao menos permitiu alçar o conjunto desta classe à cena política. Tanto os orleanistas como os legitimistas sabiam que só podiam atuar conjuntamente sob essa forma de governo. Ambas as casas reais odiavam a República, mas só nela poderiam garantir a sua coexistência. Entretanto, quando Bonaparte propõe, em maio de 1851, a revisão da Constituição, coloca-se ao mesmo tempo a possibilidade do fim da República. Essa possibilidade fomenta questões

17 A análise que Marx faz da revolução alemã de 1848 também é marcada por essa característica. Nos textos

em que aborda esse processo político, Marx costuma dizer que a revolução alemã não foi o que deveria ter sido por exclusiva opção da burguesia local ou, para ser mais exato, por pura hesitação entre fazer avançar a revolução ou cair nos braços da velha burocracia prussiana. Optou-se, no final das contas, pela segunda alternativa. Cf., por exemplo, Marx, 1989, 192-238.

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em torno de uma restauração monárquica, que, por sua vez, gera as conhecidas divisões entre as casas reais que compunham o Partido da Ordem (pp. 99-101). Essas divisões foram, em grande parte, responsáveis pela paralisia decisória no Parlamento que tanto irritaram a burguesia extraparlamentar e que aproximaram-na de Bonaparte. Fica claro que, para Marx, o processo político torna-se ainda mais importante quando começa a ameaçar a tranqüilidade social e os negócios privados. A aproximação da burguesia parlamentar com Bonaparte viabiliza o golpe, na medida em que retira apoio do Parlamento, o que não quer dizer que o “bonapartismo” seja produto direto da vontade desta classe. Ao contrário, a relação entre o presidente, depois imperador, e a burguesia extraparlamentar nunca foi das mais tranqüilas (Artous, 1999, p. 166-67).

Portanto, não é a burguesia unificada que constrói a república, mas o advento da república que permite a unificação da burguesia; não são os interesses parciais de determinadas frações burguesas que produzem a crise da república, mas a crise da república que, ao recolocar na ordem do dia a possibilidade de uma restauração monárquica, gera crises no interior da burguesia; não é a burguesia que reivindica o fim da república e o golpe de 1851, mas a paralisia decisória produzida pelos embates entre os representantes políticos da classe burguesa que leva esta classe a aderir ao golpe; numa palavra, não são apenas as estratégias das classes que afetam a configuração das formas políticas, mas também a configuração das formas políticas afeta o movimento estratégico das classes18.

Resta saber em que medida a “autonomia do processo político” se fez presente na teoria contemporânea do Estado. Para responder essa pergunta é preciso, primeiramente, fazer uma distinção entre a “autonomia do Estado capitalista” e a “autonomia do processo político”. O primeiro conceito, como vimos, descreve um “traço constitutivo” do Estado, fruto da estrutura interna do modo de produção capitalista. Nesse sentido, esse conceito não pretende dar conta da “história”, isto é, de conjunturas específicas, situadas no tempo e no espaço. Por sua vez, o “processo político” nos remete necessariamente a situações históricas que se desenvolvem no interior desse limite estrutural do modo de produção que é a separação entre o Estado e as relações de produção. O grau de autonomia do processo político depende, portanto, de conjunturas específicas, de como a luta de classes se desenvolve num determinado país e das opções concretamente feitas pelos grupos políticos que compõem uma cena política. Enfim, o processo político refere-se à “história imediata” e não aos traços estruturais do Estado e do modo de produção. É certo que esses elementos estruturais são fundamentais na constituição de um processo político autônomo, pois, afinal de contas, somente numa sociedade em que a política se apresenta como uma esfera separada das relações de produção é que o movimento na esfera política pode aparecer como um movimento autônomo em relação à economia. No entanto, o ritmo desse processo, a sua intensidade, quão autônomo ele será, tudo isso dependerá de elementos conjunturais, não estruturais.

Nesse sentido, é interessante reproduzir aqui a resposta que Poulantzas dirige à seguinte questão de Miliband sobre o conceito de autonomia relativa do Estado: “quão relativa é esta autonomia?”. Segundo Poulantzas,

O termo “relativa” na expressão “autonomia relativa do Estado” refere-se aqui à relação entre o Estado e as classes dominantes (i.e., relativamente autônomo em relação à classe dominante)... De fato, os princípios

18 Creio que a autonomia do processo político em O 18 Brumário expressa-se também por meio das

considerações de Marx sobre a importância dos aspectos propriamente institucionais do aparelho de Estado francês. Por motivos editoriais, não é possível desenvolver essa argumentação no presente texto. O leitor interessado pode consultar Codato e Perissinotto, 2001 e 2002.

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Renato Monseff Perissinotto

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fundamentais da teoria marxista do Estado indicam os limites negativos dessa autonomia. O Estado (capitalista), a longo prazo, só pode corresponder aos interesses políticos da classe ou das classes dominantes.... Contudo, dentro desses limites, o grau, a extensão, as formas etc. (quão relativo e como o Estado operacionaliza essa autonomia) dessa autonomia relativa do Estado só podem ser examinados ... com referência a um Estado capitalista dado e a uma conjuntura precisa da luta de classes correspondente ... (1976, p. 72, itálico do autor).

A necessidade de se combinar a análise estrutural com a análise histórica parece evidente na passagem acima. Porém, tanto Poulantzas como os autores marxistas seguintes se preocuparam fundamentalmente em elaborar uma teoria geral do Estado capitalista e, mesmo quando analisaram conjunturas específicas, não centraram sua atenção nas estratégias dos agentes políticos e nos impactos que suas opções causaram sobre o processo histórico. Por essa razão, mesmo os textos históricos desses autores operam sempre num altíssimo nível de abstração, isto é, em geral marcados pelo objetivo de identificar as macro-relações entre as formas assumidas pelo Estado e os estágios de desenvolvimento do capitalismo (competitivo, monopolista, oligopolista). No entanto, a ausência, nessas análises, das opções estratégicas dos agentes políticos e dos seus efeitos coloca problemas de natureza teórica. Por exemplo, a citação acima parece conter um excessivo funcionalismo que a análise presente em O 18 Brumário não autorizaria. Ora, por que dizer que “o Estado capitalista, no longo prazo, só pode corresponder aos interesses políticos da classe dominante?”. Se o processo político pode seguir o seu curso com razoável autonomia e se ele pode produzir resultados inesperados, nada impede que as ações estatais possam, dependendo da luta política, produzir, no longo prazo, resultados desestabilizadores (e não antecipados) para a ordem burguesa.

Conclusão A teoria social foi, durante todo o século XX, perpassada pela dicotomia entre

estrutura e ação. No campo específico da teoria marxista do Estado esta dicotomia se expressou de forma particularmente aguda no famoso debate entre Nicos Poulantzas e Ralph Miliband, travado nas páginas da New Left Review. De um lado, Ralph Miliband defendendo a importância de se levar em consideração os agentes políticos, i.e., suas características e opções, para se entender o movimento da história; de outro, Poulantzas, recusando a “problemática dos atores sociais” e insistindo na importância das “conexões objetivas” entre o Estado e o sistema capitalista. Como toda contraposição carente de nuanças, esta também se mostrava simplificadora (Blackburn, 1982, pp. 219-241).

Em O 18 Brumário de Louis Bonaparte, Marx, ao seu dedicar à análise de um processo político concreto, apresentou caminhos que já sinalizavam uma alternativa a essa oposição infrutífera entre estrutura e ação. Refiro-me à famosa passagem em que Marx diz: “os homens fazem a sua própria história, mas não a fazem segundo a sua livre vontade, em circunstâncias escolhidas por eles próprios, mas nas circunstâncias imediatamente encontradas, dadas e transmitidas” (p. 21).

A meu ver, toda a análise do livro orienta-se pelo espírito contido nessa frase. Nela podemos ver “atores sociais” engajados em condutas estratégicas, porém atuando em contextos político, simbólico e econômico não escolhidos por eles. Em sua análise, Marx mistura elementos que independem da racionalização dos atores com outros que remetem-

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A importância do 18 Brumário de Louis Bonaparte para a teoria marxista contemporânea do Estado capitalista

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nos a interações sociais em que as opções desses mesmos atores são fundamentais para definir o resultado final do processo histórico.

Como isso se apresenta no que diz respeito ao Estado? Penso que Marx consegue conjugar de maneira instigante dois níveis de análise. De um lado, ele percebe claramente que o Estado capitalista opera em condições materiais determinadas, mais especificamente, separado da “sociedade civil”, o que o coloca numa situação de dependência “estrutural” frente aos recursos materiais da ordem burguesa. O imposto, nesse sentido, é a base material da “autoridade política”. Além disso, depois do golpe, fica ainda mais claro que o Estado do Segundo Império não é o Estado da burguesia, mas sim o garantidor da “ordem burguesa”, daí a necessidade de a revolução proletária destruí-lo, em vez de dele se apropriar. Porém, se esse Estado garante a ordem social, i.e., reproduz a ordem burguesa à revelia da própria burguesia, ele, contudo, opera num contexto político de lutas e contradições que perpassam a sua organização interna e podem afetar o desempenho de sua função reprodutora. Nesse sentido, da mesma forma que o dezembro de 1851 não estava inscrito nos acontecimentos de fevereiro de 1848, também os efeitos funcionais da ação estatal não podem ser tomados como um mero pressuposto de qualquer análise histórica. A ação estatal deve ser avaliada a partir do seu impacto sobre os agentes políticos e da reação destes por meio de lutas que podem ou não afetar a ordem social.

A meu ver, pensar o Estado capitalista não como um instrumento, mas como uma função no interior do sistema social, como propuseram os autores contemporâneos, representou um salto de qualidade na teoria marxista do Estado. No entanto, por razões que sugerimos antes, esses autores pouco se dedicaram a aplicar essas teorias à análise de situações concretas e se mostraram pouco dispostos a conjugar a perspectiva estrutural com uma sociologia dos atores. Quem lê os interessantes trabalhos da escola derivacionista, por exemplo, fica com a nítida impressão de que o Estado capitalista funciona como um engrenagem plenamente “azeitada”, capaz de responder sempre adequadamente às exigências funcionais da acumulação privada. Nesse sentido, um retorno ao 18 Brumário é importante para mostrar como a “política” pode causar problemas para o funcionamento desta engrenagem. Como diz Claus Offe:

O caráter de classe do Estado comprova-se post faestum, depois que os limites de suas funções transparecem nos conflitos de classe, tornando-se ao mesmo tempo visíveis para o conhecimento objetivante [...] Se a compreensão do caráter classista do Estado só pode resultar da descoberta prática de sua seletividade de classe, torna-se questionável o estatuto lógico das teorias que pretendem antecipar-se a essa realização prática, indicando-lhe o caminho (Offe, 1982, p. 161).

A meu ver essa orientação de pesquisa já estava esboçada nas considerações de Marx em O 18 Brumário de Louis Bonaparte, o que se manifesta numa visão analítica que expressamente pretende conjugar a atenção às “dimensões objetivas” da ordem social, que independem da vontade dos homens, com o olhar atento sobre a conduta estratégica dos agentes políticos que, como lembra Marx, fazem a história19.

19 Nesse sentido, os homens não se constituem no “Sujeito” da história, no sentido apontado por Althusser,

isto é, “como Origem, Essência e Causa, responsável em sua interioridade por todas as determinações do „Objeto‟ exterior”. Cf. Althusser, 1978, pp. 66-71. São, isso sim, agentes que agem e escolhem dentro de determinadas condições que independem da vontade deles, mas que podem ser alteradas pelas suas ações.

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