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Trilhas, Belém, v.2, n.1, p. 7-18, jul,2001 5 Artigo A Influência do Pensamento de Gramsci no Serviço Social Brasileiro O presente texto resgata o processo histórico em que ocorreu a aproximação do Serviço Social Brasileiro ao pensamento de Antonio Gramsci, com destaque para as principais produções que compõem a historiografia profissional. Categorias como Estado ampliado, sociedade civil, classes subalternas, intelectual orgânico e tradicional, revolução passiva, filosofia da práxis, hegemonia, dentre outras, são destacadas por sua contribuição ao avanço teórico-metodológico, ético-político e prático-operativo da profissão. A importância dessas categorias e do legado de Gramsci, de maneira geral, são apresentados como fundamentais para pensar não apenas o Serviço Social como também as grandes transformações societárias na transição entre os séculos XX e XXI, além de desvelar os problemas contemporâneos da vida social e política num momento em que “o velho morre e o novo ainda não encontra espaço para nascer”. RESUMO PRIMEIROS ATORES - PRIMEIRAS IDÉIAS Quando as primeiras obras de Gramsci foram traduzidas e publicadas no Brasil, em meados dos anos 1960, o Serviço Social já desfrutava de reconhecimento legal e afirmava-se como profissão liberal. É neste período também, que se observam os primeiros questionamentos às matrizes conservadoras que subsidiavam o discurso e a prática profissionais desde os anos de 1930. As propostas de natureza crítica que emergiam no interior do Serviço Social, neste período, não encontraram, no entanto, espaço para se desenvolver, pois com o golpe militar de 1964, a tendência pragmático-tecnocrática é assumida como forma de responder às necessidades do crescente processo de acumulação capitalista. Há que se considerar, contudo, que as ações repressivas que atingiam toda a sociedade, se, por um lado, dificultavam o encaminhamento de reflexões de natureza ideopolítica, por outro, não impediram que se gestassem algumas formas de crítica ao Estado autoritário e aos aportes teóricos que permeavam o Serviço Social no período. É o caso da experiência desenvolvida na Universidade Católica de Minas Gerais, em Belo Horizonte, entre 1972-75 que irá se expressar através do chamado método BH. Com o início da chamada abertura democrática entre 1978-84 e a revogação do AI-5, ocorrerá uma ampliação dos espaços de participação dos movimentos populares, incluindo novos itens na agenda política, que iam desde o direito à greve até melhores condições de trabalho o que permitiu ampliar a consciência crítica dos trabalhadores e ressaltar a importância da sua participação como sujeitos políticos. No âmbito do Serviço Social, essa nova conjuntura política pressionou, na época, os organizadores do CBCISS que haviam realizado os encontros de Araxá e Teresópolis e organizavam o encontro de Sumaré, a incorporar ao debate as vertentes fenomenológica e marxista em que a professora Creusa Capalbo, ao tecer algumas considerações sobre o método dialético fará, também, indicações sobre a questão do Estado, da hegemonia e dos intelectuais a partir do pensamento de Gramsci. As modificações sofridas pela realidade brasileira neste período ampliaram, conseqüentemente, os espaços da ação profissional dos assistentes sociais, com práticas não mais restritas ao âmbito institucional, mas também junto ao movimento organizativo das classes subalternas. Nesse sentido, as reflexões profissionais mudam de direção à medida que se colocam frente a frente com a realidade e com as condições de existência das camadas exploradas da população. O processo de reorganização do Estado, a necessidade de fortalecimento da sociedade civil e a dinâmica mesmo da realidade brasileira, incentivaram os profissionais a buscarem novos referenciais que possibilitassem recuperar a prática e a formação profissional. O novo cenário fez surgir tendências diversas que apontavam para uma renovação, ainda que restrita à esfera acadêmica, mas recolocova em debate diferentes tendências no âmbito do marxismo, entre elas o pensamento de Gramsci, que passa, nesse Ivete Simionatto* *Professora Titular do Departamento de Serviço Social da UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina

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Trilhas, Belém, v.2, n.1, p. 7-18, jul,2001 5

Artigo

A Influência do Pensamento de Gramscino Serviço Social Brasileiro

O presente texto resgata o processo histórico em queocorreu a aproximação do Serviço Social Brasileiro ao pensamentode Antonio Gramsci, com destaque para as principais produçõesque compõem a historiografia profissional. Categorias como Estadoampliado, sociedade civil, classes subalternas, intelectual orgânicoe tradicional, revolução passiva, filosofia da práxis, hegemonia,dentre outras, são destacadas por sua contribuição ao avançoteórico-metodológico, ético-político e prático-operativo daprofissão.

A importância dessas categorias e do legado deGramsci, de maneira geral, são apresentados como fundamentaispara pensar não apenas o Serviço Social como também as grandestransformações societárias na transição entre os séculos XX e XXI,além de desvelar os problemas contemporâneos da vida social epolítica num momento em que “o velho morre e o novo ainda nãoencontra espaço para nascer”.

RESUMO

PRIMEIROS ATORES - PRIMEIRASIDÉIAS

Quando as primeiras obras de Gramsci foramtraduzidas e publicadas no Brasil, em meados dos anos1960, o Serviço Social já desfrutava de reconhecimentolegal e afirmava-se como profissão liberal. É nesteperíodo também, que se observam os primeirosquestionamentos às matrizes conservadoras quesubsidiavam o discurso e a prática profissionais desdeos anos de 1930.

As propostas de natureza crítica queemergiam no interior do Serviço Social, neste período,não encontraram, no entanto, espaço para sedesenvolver, pois com o golpe militar de 1964, atendência pragmático-tecnocrática é assumida comoforma de responder às necessidades do crescenteprocesso de acumulação capitalista.

Há que se considerar, contudo, que as açõesrepressivas que atingiam toda a sociedade, se, por umlado, dificultavam o encaminhamento de reflexões denatureza ideopolítica, por outro, não impediram quese gestassem algumas formas de crítica ao Estadoautoritário e aos aportes teóricos que permeavam oServiço Social no período. É o caso da experiênciadesenvolvida na Universidade Católica de Minas

Gerais, em Belo Horizonte, entre 1972-75 que irá seexpressar através do chamado método BH.

Com o início da chamada aberturademocrática entre 1978-84 e a revogação do AI-5,ocorrerá uma ampliação dos espaços de participaçãodos movimentos populares, incluindo novos itens naagenda política, que iam desde o direito à greve atémelhores condições de trabalho o que permitiu ampliara consciência crítica dos trabalhadores e ressaltar aimportância da sua participação como sujeitospolíticos.

No âmbito do Serviço Social, essa novaconjuntura política pressionou, na época, osorganizadores do CBCISS que haviam realizado osencontros de Araxá e Teresópolis e organizavam oencontro de Sumaré, a incorporar ao debate as vertentesfenomenológica e marxista em que a professora CreusaCapalbo, ao tecer algumas considerações sobre ométodo dialético fará, também, indicações sobre aquestão do Estado, da hegemonia e dos intelectuais apartir do pensamento de Gramsci.

As modificações sofridas pela realidadebrasileira neste período ampliaram, conseqüentemente,os espaços da ação profissional dos assistentes sociais,com práticas não mais restritas ao âmbito institucional,mas também junto ao movimento organizativo dasclasses subalternas. Nesse sentido, as reflexõesprofissionais mudam de direção à medida que secolocam frente a frente com a realidade e com ascondições de existência das camadas exploradas dapopulação.

O processo de reorganização do Estado, anecessidade de fortalecimento da sociedade civil e adinâmica mesmo da realidade brasileira, incentivaramos profissionais a buscarem novos referenciais quepossibilitassem recuperar a prática e a formaçãoprofissional. O novo cenário fez surgir tendênciasdiversas que apontavam para uma renovação, aindaque restrita à esfera acadêmica, mas recolocova emdebate diferentes tendências no âmbito do marxismo,entre elas o pensamento de Gramsci, que passa, nesse

Ivete Simionatto*

*Professora Titular do Departamento de Serviço Social da UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina

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período, a fazer parte da nossa cultura e a iluminarcom suas categorias, diversas formas de interpretaçãoda realidade brasileira.

Dois grandes marcos da produção do ServiçoSocial desse período são, sem dúvida, o Método BH eo livro Legitimidade e Crise no Serviço Social deMarilda Iamamoto. Mas ao lado dessas duaselaborações, há, ainda, todo um acervo de formulaçõesque instauram um novo debate no interior da profissãona virada dos anos de 1970 e início de 1980. Pensoaqui na larga produção que, no eixo da tradiçãomarxista, busca no aporte teórico gramsciano subsídiospara refletir sobre o Serviço Social frente às novasdemandas da realidade brasileira.

No final da década de 1970, quando seobserva um relativo distanciamento do pensamentoalthusseriano, Gramsci passa a ser um marco teóricosignificativo nas elaborações do Serviço Social. Asidéias de Gramsci passaram a ser progressivamenteincorporadas pelo Serviço Social, abrindo novaspossibilidades para pensar seus referenciais teóricos esuas ações interventivas. De uma forma ou de outra, opensamento de Gramsci repercutiu fortemente naprodução do Serviço Social desde os anos de 1980 eprossegue hoje em forma de livros derivados de tesesacadêmicas, ensaios diversos, artigos e análises daprática profissional.

As primeiras referências ao pensamento deGramsci no Serviço Social, encontram-se nasproduções de Vicente de Paula Faleiros através dacategoria da hegemonia e da análise da práticaprofissional no contexto da sociedade capitalista.Serão, no entanto, as produções de Safira BezerraAmmann, Alba Maria Pinho de Carvalho, FranciGomes e Marina Maciel que possibilitaram a efetivaaproximação do Serviço Social ao pensamentogramsciano. O trabalho de Safira B. Ammann éextremamente relevante, uma vez que se constitui naprimeira formulação que adota o referencial dopensador italiano para analisar o processo sócio-histórico do desenvolvimento de comunidade natransição democrática. A produção de Alba MariaPinho de Carvalho é extremamente significativa àmedida que apresenta um estudo histório-crítico dopensamento de Gramsci a partir de fontes originais. E,por último, mas não menos importante, o texto deFranci Gomes e Marina Maciel que busca em Gramscisuporte teórico para subsidiar as práticas interventivasdo Serviço Social. As produções dessas autoras sãomarcos significativos no trato de categorias

fundamentais como: hegemonia, Estado ampliado,sociedade civil, classes subalternas, cultura, revoluçãopassiva, intelectual orgânico, intelectual tradicional,filosofia da práxis, bloco histórico, dentre outras.

Estas mesmas categorias continuampermeando as produções do Serviço Social nacontemporaneidade com problematizações relativas àsclasses sociais, às transformações sofridas pelo Estado,pela sociedade civil, ao papel das ideologias e dacultura na análise e compreensão da realidade social oque tem contribuído para operar mudançassignificativas tanto no que se refere ao referencialteórico-metodológico, ético-político quanto prático-operativo1 .

Mas, de que forma o pensamento de Gramscicontinua sendo importante tanto para pensar o ServiçoSocial quanto e para analisar a realidadecontemporânea? Quais as principais categorias dessepensador que continuam sendo atuais em pleno séculoXXI cujo cenário que temos diante dos olhos éparadoxal e assustador?. Diante das tempestadespolítico-sociais e das transformações societárias dofinal do século XX e início do século XXI, em quemedida é possível pensar os problemascontemporâneos da vida social e política a partir dolegado de Gramsci? Em que sentido seu pensamento écapaz de nos ajudar a desvelar as novas questões postaspela ordem presente?

Trazer o pensamento de Gramsci para pensareste novo século, exige tratar de alguns temas que sãorealmente inevitáveis. Irei me centrar na questão datotalidade, cultura, política, hegemonia, Estado esociedade civil, com seus respectivos desdobramentos.

A PERSPECTIVA DE TOTALIDADE

O pensamento gramsciano tem sidoabordado das mais variadas maneiras, seja nos meiosacadêmicos, seja nos meios políticos. Se, por um lado,Gramsci é analisado como um pensador reformista(tema tão em voga nos dias atuais), e, por outro, comoelaborador de uma teoria revolucionária de ocupaçãode trincheiras no interior do aparelho do Estado, éimportante sinalizar que, na presente abordagem,Gramsci será tomado como pensador marxista cujaobra é perpassada por uma visão crítica e histórica dosprocessos sociais. Isto porque Gramsci não toma omarxismo como doutrina abstrata, mas como métodode análise concreta do real em suas diferentesdeterminações. Debruça-se sobre a realidade enquanto

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totalidade, desvenda suas contradições e reconhece queela é constituída por mediações, processos e estruturas.Essa realidade é analisada pelo pensador a partir deuma multiplicidade de significados, evidenciando queo conjunto das relações constitutivas do ser socialenvolve antagonismos e contradições, apreendidos apartir de um ponto de vista crítico que leva em conta ahistoricidade do social, sendo este, segundo Gramsci,o único caminho fecundo na pesquisa científica.

Demarcar o ponto de vista da totalidade naanálise do real, significa contrapor-se à “razão cínica”ou à “miséria da razão”, que se afirmam cada vez mais,como perspectivas particularistas e manipulatóriasconsonantes às manifestações multifacetadas,características da realidade contemporânea. A inserçãodos indivíduos no espaço social, na atualidade, vemocorrendo de forma crescente através de açõesmultidimensionais, descontínuas e fragmentárias. Avida social, enquanto totalidade, é, no dizer de Jameson(1996), cada vez mais irreconciliável com a lógica quepreside o mundo atual. Nesse rastro ocorre aproliferação de teorias do fragmentário, daheterogeneidade, do aleatório, reforçando a “alienaçãoe reificação do presente” e provocando umestilhaçamento dos nossos modos de representação.

Enquanto crítica da política, a reflexãoteórica do pensador italiano trabalha o real a partir decategorias que se elevam do abstrato ao concreto, daaparência à essência, do singular ao universal, e vice-versa. Sua reflexão categorial vai apreendendo aprocessualidade e a historicidade do social, o jogo dasrelações que permite desvendar a realidade e suascontradições constitutivas.

Do jovem Gramsci ao Gramsci damaturidade encontramos fortemente impregnada emseu pensamento, a preocupação constante com aconstrução de um novo projeto civilizatório, de umanova civiltà capaz de vencer os desafios damodernidade e construir uma democracia “de baixopara cima”, uma democracia econômica, política esocial. Em sua breve trajetória de vida, deixa, comolegado, um pensamento crítico comprometido com arealidade essencialmente marcada por processos deexclusão social, por antagonismos e diferenças sociais,regidos por regras tradicionais conservadoras, peloinstituído, pelas leis injustas, quase sempre utilizadasem função da manutenção de privilégios.

Na tessitura da obra gramsciana encontramoso compromisso com a interpretação dos processossociais, o desvendamento das desigualdades da

sociedade capitalista, o caráter das lutas de classe, tantosob a ótica da burguesia quanto das massastrabalhadoras, marcando as possibilidades históricasde cada uma no processo de construção da hegemonia.É nesse jogo contraditório entre as classes, queGramsci tematiza as relações sociais, tomando-asenquanto processos totais e evidenciando osantagonismos que engendram. Athos Lisa (1973: 77),companheiro de prisão, relembra, em suas Memórias,que Gramsci “não se colocava jamais problemasabstratos separados e isolados da vida dos homens”, oque indica sua capacidade de estabelecer a necessáriarelação dialética entre teoria e prática.

Ao examinar as transformações ocorridas nopós-Primeira Guerra Mundial na organização social eeconômica do capitalismo, Gramsci passa a interrogar-se sobre como deveriam ser entendidas tais mudanças,e sobre os novos problemas que elas sinalizavam,principalmente no tocante ao movimento operário. Éno contexto dessas preocupações que aprofunda suasreflexões a respeito das relações Estado/sociedade eclasses sociais, e passa a pensar em uma nova estratégiarevolucionária para o Ocidente, a ser construída a partirdo quadro sócio-histórico do seu tempo. Esse períodopõe em cena a emergência de novas relações sociais,perpassadas por uma crescente socialização da políticae, conseqüentemente, permite visualizar a ampliaçãodo fenômeno estatal. Gramsci percebe que nasociedade capitalista madura o Estado se ampliou e osproblemas relativos ao poder complexificaram-se,fazendo emergir uma nova esfera que é a “sociedadecivil”, tornando mais complexas as formas deestruturação das classes sociais e sua relação com apolítica. É nesse contexto que indica as possibilidadesde construção de uma nova sociabilidade, detransformação das condições de vida das classessubalternas, passando, necessariamente, pelaconstrução de uma nova hegemonia, cujo processo deestruturação não ocorre somente a partir do campoeconômico. Exatamente porque Gramsci tem a claracompreensão de que a estrutura da sociedade éfortemente determinada por idéias e valores, a luta pelahegemonia também encerra em si um debate sobre acultura.

A compreensão da historicidade do social,no pensamento gramsciano, não está desvinculada daeconomia, do desvendamento das relações deprodução, mas o pensador italiano tambémcompreende que a luta pela emancipação política do

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A discussão da cultura como esferaconstitutiva do ser social é recuperada por Gramsciem seu sentido coletivo e não individual, ou seja, elenão trabalha essa temática do ponto de vista idealista,deslocada do campo marxista, mas buscareproblematizá-la na interface com a economia e coma política. Vale ressaltar que Gramsci não é umculturalista, mas preocupa-se com o desenvolvimentodaquilo que chamamos de cultura política, necessáriaà crítica da ordem das coisas. Para ele, crítica significacultura e cultura não significa a simples aquisição deconhecimentos, mas sim tomar partido, posicionar-sefrente à história, buscar a liberdade. A cultura estárelacionada, pois, com a transformação da realidade,uma vez que através da “conquista de uma consciênciasuperior (...) cada qual consegue compreender seu valorhistórico, sua própria função na vida, seus própriosdireitos e deveres” (Gramsci, 1975: 24).

Em Gramsci encontramos elementos que,justamente, nos possibilitam problematizar a esferacultural na ordem presente, uma vez que em sua obratransparece uma idéia de cultura forjadora da liberdade,capaz de propiciar a ultrapassagem da heterogeneidadee da imediaticidade da vida cotidiana, das lutaseconômico-corporativas que atravessam o ser socialpara lutas mais duradouras e universais, voltadas àconstrução de uma nova hegemonia.

A passagem do momento corporativo aomomento ético-político, da estrutura à superestrutura,essa tarefa “ontológico-dialética” de construir um novobloco histórico, expressa-se em Gramsci através doconceito “amplo” de política, denominado por ele de“catarse”. “Pode-se empregar o termo catarse” -escreve ele - “para indicar a passagem do momentomeramente econômico (ou egoístico-passional) parao momento ético-político, ou seja, a elaboraçãosuperior da estrutura em superestrutura na consciênciados homens. Isso significa, também, a passagem do‘objetivo ao subjetivo’. A estrutura, a força exteriorque esmaga o homem, que o assimila a si, que o tornapassivo, transforma-se em meio de liberdade, eminstrumento para criar uma nova forma ético-política,em origem de novas iniciativas” (Gramsci, 1977:1244). A catarse significa, assim, o momento em quea esfera egoístico-passional, a esfera dos interessescorporativos e particulares, eleva-se ao ético-político,ao nível da consciência universal.

Essa tarefa de transformação da forçaeconômica em direção ético-política que se expressano momento catártico é mediada pela vontade coletiva

CULTURA, POLÍTICA E HEGEMONIA

Embora a obra gramsciana não contempleuma exaustiva discussão sobre as determinaçõeseconômicas, nela encontramos outros elementos, aolado da esfera infra-estrutural, que nos ajudam acompreender a realidade presente. A centralidade dessaobra é marcada pelo estudo dos fenômenossuperestruturais, da esfera da política e da cultura esuas expressões no âmbito da ordem capitalista.Gramsci colabora, assim, para a crítica ontológica deoutras esferas do ser social que não a estritamenteeconômica

Discutir as determinações sociais e políticasdo real no plano da totalidade significa, também, trazerem cena o debate sobre a cultura, não compreendida,aqui, como esfera autônoma na organização dosprocessos sociais, mas como lógica interna queparametra as manifestações do capitalismo nesteestágio globalizado.

Nada mais concreto, para Gramsci, do quediscutir a cultura política em um país como a Itália,eivado pela ideologia secular da Igreja e damentalidade católico-jesuítica que criou (e ainda cria)uma postura de passividade, subserviência econformismo. Nada mais procedente do que discutir acultura política hoje, à medida que o estágio docapitalismo em que vivemos encerra em si uma lógicacultural que vem provocando transformaçõessignificativas no plano da superestrutura. Asmanifestações culturais dessa nova/velha ideologiareatualizam, no presente, tendências políticas e sócio-culturais fortalecedoras de ações corporativas,individuais e despolitizantes.

proletariado não se esgota no terreno econômico, pois,dadas as condições de subalternidade intelectual àsquais sempre estiveram submetidas as classestrabalhadoras, torna-se necessário o encaminhamentode um novo projeto cultural que propicie odesenvolvimento de uma vivência democráticaindependente do domínio ideológico da classeburguesa. O legado de Gramsci tomado, portanto, doponto de vista da totalidade, congrega umadialeticidade entre conceitos como hegemonia, cultura,economia, história, ideologia, senso comum, Estado,sociedade civil, classes sociais, cidadania, democracia,revolução, dentre outros, essenciais para pensarmosas novas determinações da realidade contemporânea.

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e política, “pela vontade como consciência operosa danecessidade histórica, como protagonista de um real eefetivo drama histórico” (Gramsci, 1977: 1559). Parachegar-se a esse momento, é preciso vencer ocorporativismo, a visão particularista e restrita que,sob a ótica política, desconhece os valores próprios dahegemonia e de sua perspectiva de totalidade. Somenteelevando-se ao plano ético-político, as classes sociaisconseguirão imprimir à própria ação, caracteressocialmente universais e qualitativamente integrais.Isso significa, também, a elevação da vida cultural-política daqueles estratos sociais que, antes de obtê-la, viviam passivamente e, portanto, não haviamsuperado o limiar da consciência histórica. Sair dapassividade, para Gramsci, é deixar de aceitar asubordinação que a ordem capitalista impõe a amplosestratos da população, é deixar de ser “massa demanobra” dos interesses das classes dominantes. É ser,acima de tudo, intransigente, pois a intransigência “éa única prova que uma determinada coletividade existecomo organismo social vivo, que possui um fim, umavontade única, uma maturidade de pensamento. Porquea intransigência requer que cada parte singular sejacoerente com o todo, que cada momento da vida socialseja pensado e examinado em relação à coletividade”(Gramsci, 1975: 136).

Passar do momento econômico-corporativoao ético-político significa, também, levar em conta oprocesso de correlação de forças sociais, que implicaa passagem da “estrutura para as superestruturas maiscomplexas; é a fase na qual as ideologias germinadasanteriormente se tornam ‘partido’, colocando-se emconfronto e entrando em luta, até que somente umadelas ou uma combinação de ideologias tende aprevalecer e a difundir-se sobre toda a área social,determinando, além da unidade econômica e política,a unidade intelectual e moral, mediante um plano nãocorporativo, mas ‘universal’, criando, assim, ahegemonia de um grupo social fundamental sobre osgrupos subordinados” (Gramsci, 1977: 1583-584). Acorreta análise das relações de força indica que osfenômenos parciais da vida política e social, ao seremremetidos à totalidade, podem sugerir estratégias etáticas, tanto para manter a ordem vigente como parafortalecer a construção de uma contra-hegemonia.

Mas, para tal, Gramsci insiste na necessidadede que as classes sociais abandonem o seu modo depensar corporativo, produto das relações sociais e domodo de ser próprio da sociedade burguesa, queobstaculiza a formação de um projeto coletivo. A

construção da hegemonia exige, assim, compromissosde classe, superação de interesses particularistas eindividuais, abertura de espaços para congregar asvárias frações de classe. A partir da superação dessemodo de ser e de pensar, a vontade coletiva avança evai delineando uma nova consciência, que se manifestae se concretiza na prática política. Constituir-se comoclasse hegemônica significa, assim, “tornar-seprotagonista das reivindicações de outros estratossociais (...) de modo a unir em torno de si esses estratos,realizando com eles uma aliança” (Gruppi, 1978: 59)na luta por interesses comuns.

A noção de hegemonia, enquanto totalidade,significa a unificação da estrutura em superestrutura,da atividade de produção e de cultura, do particulareconômico e do universal político. Não se trata de umauniversalidade ideológica, mas antes concreta, pois osinteresses particulares passam a articular-se com osinteresses universais. O grupo social universaliza-seporque absorve, num projeto totalizador, a vontade dosgrupos subalternos, “num trabalho incessante paraelevar intelectualmente estratos populares cada vezmais amplos, isto é, para dar personalidade ao amorfoelemento de massa, o que significa trabalhar e suscitarintelectualmente elites intelectuais de um tipo novo,que surjam diretamente das massas e permaneçam emcontato com elas” (Gramsci, 1977: 1591). Hegemoniaé, assim, por um lado, vontade coletiva, e, por outro,autogoverno; e esse último se alcança através de umtrabalho “de baixo” que incorpora o singular aocoletivo e que, nesse processo, não mantém os grupossubalternos no plano inferior, mas os eleva, torna-osmais capazes de dominar as situações, confere-lhesuma maior universalidade, o que significa, paraGramsci, a realização de uma “reforma intelectual emoral”.

Quando Gramsci fala da hegemonia como“direção intelectual e moral” afirma que essa direçãotambém se exerce no campo das idéias e da cultura,manifestando a capacidade de conquistar o consensoe de formar uma base social, pois hegemonia “é algoque opera não apenas sobre a estrutura econômica esobre a organização política da sociedade, mas tambémsobre o modo de pensar, sobre as orientaçõesideológicas e sobre os modos de conhecer” (Gruppi,1978:5).

Vencer as forças sociais que se colocam nocenário da história implica, portanto, uma compreensãode que, nesse processo, não se pode levar em contasomente a situação objetiva, mas ainda os elementos

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partir deste, o conceito de transformismo, que significauma experiência privada de hegemonia, de elementoscapazes de possibilitar o encaminhamento detransformações e reformas profundas, excluindo davida democrática amplos setores populares. Agrega-se ao transformismo a noção de “revolução passiva”,uma revolução cujos principais sujeitos históricos sãoexcluídos do processo e cooptados pela hegemonia declasses totalmente alheias aos seus interesses.

Os processos de revolução “pelo alto”também tiveram lugar na história brasileira, daIndependência ao Colégio Eleitoral, passando pelaRepública Velha, Revolução de 1930, Golpe de 1964e prosseguimos, hoje, com vários momentos de“revolução passiva” à medida que os processos deexclusão ainda estão presentes na nossa frágildemocracia. Nesses contextos, as decisões sempreforam levadas a efeito de forma elitista e com aexclusão das massas populares, através do consensopassivo, indicando a prevalência dos métodos desupremacia em detrimento das formas de hegemonia.Na conjuntura presente, essas contradições reaparecemsob nova roupagem, à medida que também se alteramas relações de força postas na dinâmica da vida social.Essa tendência pode ser relacionada diretamente aosprocessos macropolíticos que marcam tanto as classescapitalistas quanto as trabalhadoras, mais precisamentea partir da conjuntura dos anos 1980, expressa pelascrises do Welfare State e do padrão fordista-keynesianoe pelo colapso do socialismo real. Nesse processo nãoestão em jogo apenas os novos padrões e as novasformas de domínio no campo econômico, necessáriosà reestruturação do capital, mas também a necessidadede socialização de novos valores e novas regras decomportamento, para atender tanto a esfera daprodução como a da reprodução social (Mota, 1995).

As relações Estado/Sociedade, nesse cenário,elidem a formação de uma cultura que substitui arelação estatal pela livre regulação do mercado. Nessaótica, a classe burguesa busca eliminar os antagonismosentre projetos de classe distintos, no intuito de construirum “consenso ativo” em nome de uma falsa visãouniversal da realidade social. Procede-se, assim, umaverdadeira “reforma intelectual e moral”, sob a direçãoda burguesia, que, em nome da crise geral do capitalem nível internacional, consegue socializar uma“cultura da crise” transformada em base material doconsenso e, portanto, da hegemonia.

Esse discurso genérico tem um efeitoimediato no campo prático-operativo, à medida que

subjetivos norteadores de uma consciência de classecrítica e uma independência em relação às outrasclasses. Cultura e política aparecem aqui comoquestões inseparáveis, pois cultura é, para Gramsci,um dos instrumentos da práxis política, sendo esta,justamente, a via que pode propiciar às massas umaconsciência criadora de história, de instituições,fundadora de novos Estados.

Mas a “reforma intelectual e moral” tambémcontém os processos de socialização da economia eda política. “Pode haver reforma cultural, evoluçãocivil das camadas mais baixas da sociedade sem umaprecedente reforma econômica?” - pergunta Gramsci(1977: 1561). Se a “reforma intelectual e moral” nãoestá desvinculada de uma reforma econômica, parececlaro que Gramsci defende a idéia de que “o avançoda democratização política é, ao mesmo tempo,condição e resultado de um processo de transformaçãotambém nas esferas econômica e social”. O projetopolítico-social voltado para o fortalecimento da ordemeconômica confere ao Estado, no entanto, um fortepotencial de cooptação e supremacia, provocando, nocampo ideológico, a conseqüente despolitização dasclasses subalternas. Essa prática, marcadamenteconservadora, antidemocrática e excludente, leva aburguesia a fazer e refazer suas alianças, a romper oselos que unem as classes e seus dirigentes, tornando-as cúmplices da dominação burguesa e cerceando aspossibilidades de formação de organizaçõesrevolucionárias.

O Estado, por outro lado, repousa sobre umabase cultural protegido por uma malha sólida contraas revoluções, contra as irrupções violentas, e sua ação,que é a mesma do grupo social dominante, é vasta ecapilarizada. Sua hegemonia conforma massashumanas de cidadãos, porque estão ligadas ao modode vida burguês e a ele consentem e aderem. Nessesentido, a hegemonia não significa apenas asubordinação de uma classe em relação à outra, mas acapacidade das classes na construção de uma visão demundo, ou seja, de efetivamente elaborar uma “reformaintelectual e moral”. A preocupação de Gramsci é, pois,com a transformação dessa visão de mundo, com aelevação das condições de vida das classessubalternizadas e com a sua inclusão no cenáriohistórico, excluídas que sempre foram dos processoshistórico-sociais.

É exemplar, aqui, a análise do Risorgimentoitaliano, que toma a hegemonia enquanto categoriaanalítica no seu movimento dialético, indicando, a

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as ações desenvolvidas para a recuperação econômicasão de natureza transclassista, ou seja, beneficia a todossem distinção. No entanto, do ponto de vista político,essa estratégia também cria a subalternidade dasdemais camadas de classe, obstaculizando apossibilidade das mesmas elaborarem uma visão demundo de corte anticapitalista e articular alianças eestratégias em defesa de seus interesses. A abstrataidéia de uma crise de caráter universal tende aprevalecer e a difundir-se por toda a sociedade,determinando, “além da unidade econômica e política,a unidade intelectual e moral, mediante um plano (...)‘universal’, criando, assim, a hegemonia de um gruposocial fundamental sobre os grupos subordinados”(Gramsci, 1977:1583-584). Tal situação também égeradora de uma cultura de passividade e deconformismo, atingindo diretamente o cotidiano dasclasses subalternas, reforçando o corporativismo e asações particularistas, em detrimento de projetos denatureza coletiva. Ocorre, dessa forma, umadesqualificação das práticas dessas classes, tanto doponto de vista social e político quanto do econômico.

Assim, a luta pela hegemonia não se travaapenas no plano das instâncias econômica e política(relações materiais de produção e poder estatal), mastambém na esfera da cultura. A elevação cultural dasmassas assume importância decisiva nesse processo,a fim de que possam libertar-se da pressão ideológicadas velhas classes dirigentes e elevar-se à condiçãodestas últimas. A batalha cultural apresenta-se comofator imprescindível ao processo de construção dahegemonia, à conquista do consenso e da direçãopolítico-ideológica por parte das classes subalternas.Exercitá-la consiste, também, na capacidade dosintelectuais e do partido político participarem daformação de uma nova concepção de mundo, deelaborarem uma proposta transformadora de sociedadea partir “de baixo”, fazendo com que toda uma classeparticipe de um projeto radical que “envolva toda avida do povo e coloque cada um, brutalmente, dianteda própria responsabilidade inderrogável” (Gramsci,1977: 816). Não havendo um avanço nesse processo,nem uma compreensão dessas mediações, que secolocam como fundamentais na apreensão do real, asclasses em presença tendem a formar alianças com ossetores tradicionais dominantes da sociedade.

Mesmo considerando que a história dasclasses subalternas é fragmentada, desagregada,episódica, atravessada facilmente pelas ideologiasconservadoras, Gramsci compreende que é a partir da

práxis política que se pode passar dessa fragmentaçãoà unicidade, do modo de pensar desagregado a umaforma de pensar crítica e coerente. São expressões de“conformismo e resistência”, de determinismo evoluntarismo, de senso comum e de bom senso que seinscrevem na prática cotidiana e que podem serresgatados não apenas como simulacro, como açõesdesencarnadas da história, mas como possibilidadesconcretas na construção de uma nova racionalidade.

Nesse campo contraditório, a luta de classesnão desaparece e as alianças continuam cada vez maisnecessárias, mesmo manifestando-se de forma maisproblemática, dadas as diferentes iniciativas políticasque ora perpassam os movimentos sociais, às vezescoincidentes, outras excludentes, bem como os novospadrões de sociabilidade, que não ocorrem, comoindica Gramsci, somente no plano econômico-objetivo,mas também no ideológico-subjetivo. É esse o patamarque vem cimentando a ideologia dos gruposdominantes, pois conseguem abranger, num projetototalizador, a sua vontade como sendo a mesma dosgrupos subalternos. A hegemonia é reconstruída,assim, através da imagem abstrata de universalidaderepassada pelo Estado, que esfacela ainda mais o pontode vista dos segmentos subalternizados,despolitizando-os, fragmentando as suas formas deexpressão, no sentido de que suas lutas particularesnão se articulem em vontades universais. O que eracoletivo dissolve-se no singular e as massaspermanecem no plano inferior, tornando-se incapazesde dominar as situações que as oprimem, de rompercom a licenciosidade que as tornam passivamenteagarradas à pragmaticidade e à imediaticidadecotidianas.

A crise do capitalismo contemporâneo, “criseorgânica” no dizer de Gramsci, resulta, portanto, dedificuldades não somente no terreno econômico, mastambém no ideológico, esfera onde se produzem e semantêm as resistências aos impulsos de unificação daconsciência humana. Romper essa unidade ideológica,criticar a concepção de mundo “imposta” do exterior,requer a elaboração de uma nova forma de pensar,crítica e coerente, viabilizadora de práticas sociais “nãono abstrato, mas no concreto: sobre a base do real e daexperiência efetiva” (Gramsci, 1977: 2268). Dasituação de subalternidade pode-se sair quando seassume a consciência do significado do próprio operar,da efetiva posição de classe, da efetiva natureza dashierarquias sociais, quando se elabora uma novaconcepção de economia, de política, de Estado e de

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coercitivos, mas, também, através de uma novaesfera do ser social que é a sociedade civil. O queconfere originalidade ao seu pensamento é,justamente, o novo nexo que estabelece entreeconomia e política, entre sociedade civil esociedade polít ica, esferas constitutivas doconceito de Estado ampliado.

A sociedade civi l , no pensamentogramsciano, apresenta-se como o “conjunto dosorganismos chamados ‘privados’ e quecorresponde à função de hegemonia que o grupodominante exerce sobre toda a sociedade”(Gramsci, 1977: 1518). A denominação “privados”não aparece em contraposição ao que é público,nem nega o caráter de classe desses organismos esuas diferentes formas de expressão, à medida quea sociedade civil não é um espaço homogêneo, maspermeado por contradições.

A rigor, a “sociedade civil” é um conceitotomado indistintamente como expressão exclusivados interesses das classes subalternas. Ora, nasociedade civi l estão organizados tanto osinteresses da classe burguesa, que exerce suahegemonia através de seus aparelhos “privados”,reprodutores de sua ideologia, representados hojequer pelos meios de comunicação quer pelodomínio dos aparatos do Estado e dos meios deprodução; quanto os interesses das camadas declasses subalternas, que buscam organizar-se parapropor alternativas que se contraponham àsparcelas minori tár ias detentoras do poder,afirmando a prioridade do público sobre o privado,do universal sobre o particular, da vontade coletivasobre as vontades particulares.

Podem-se apontar duas questões básicasque marcam a diferenciação entre a esfera dasociedade civil e a esfera da sociedade política. Aprimeira é a “diferença na função que exercem naorganização da vida social, na articulação ereprodução das relações de poder” (Coutinho,1979: 77); enquanto na sociedade política oexercício do poder ocorre sempre através de umaditadura, ou seja, de uma dominação mediantecoerção, na sociedade civil esse exercício do poderocorre através da direção política e do consenso.A partir dessa compreensão, essas esferas podemtornar-se terreno para o encaminhamento de umaação transformadora ou de uma ação conservadora.A segunda diferença refere-se à “materialidade

ESTADO E SOCIEDADE CIVIL

O estudo sobre a complexidade dasrelações Estado/Sociedade próprias do capitalismodesenvolvido, preocupação constante nopensamento gramsciano, também se apresenta hojecomo eixo fundamental para pensar astransformações do capitalismo contemporâneo, asnovas formas de expressão do Estado, da sociedadecivil e, conseqüentemente, os processos deconstrução da hegemonia neste cenário histórico.É, precisamente, a partir da crescente socializaçãoda polí t ica verif icada nas sociedadescontemporâneas que Gramsci elabora sua teoria“ampliada” do Estado, indicando que o poderestatal, nesse novo contexto, não se expressaapenas através de seus aparelhos repressivos e

sociedade, capaz de provocar a desarticulação daideologia dominante. Nesse sentido, a hegemoniatambém coloca-se num novo campo de lutas, dealianças, de construção/desconstrução de saberes eexperiências, pois, antes de mais nada, “toda relaçãode hegemonia é necessariamente uma relaçãopedagógica” (Gramsci, 1977: 1331-332), à medida queencerra em si possibilidades de emancipação coletivas,não só para determinados indivíduos, mas para toda asociedade.

A compreensão da esfera da cultura éfundamental para os assistentes sociais à medida queas suas ações profissionais, travadas na relação diretacom as formas de vivência cotidiana dos sujeitossociais, permite identificar os modos como se forma aidentidade social, o senso comum, a função dasideologias, dos mitos, ou seja, aquilo que Gramscichamou de conformismo e, ao mesmo tempo, a formade superá-lo, uma vez que este, também, é o terrenopara a criação de uma vontade política capaz de rompercom a razão instrumental que funda a ordem capitalista.

Vale considerar que, se a prática do ServiçoSocial ocorre tanto no espaço institucional quanto naesfera da sociedade civil há que se reconhecer que oterreno cultural permite discutir novas formas deorganização da vida social e de identificação dediferentes sujeitos políticos. Assim, “quando astransformações culturais são vistas como alvos da lutapolítica e a luta cultural como instrumento para amudança política, está em marcha uma nova definiçãoentre cultura e política” (Dagnino, 2000:78).

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nova organização do Estado, destituído de seucaráter público e cada vez mais submetido aosinteresses daquelas classes. As regras do chamado“ajuste econômico”, expressão das políticasneoliberais, vêm promovendo a “morte pública”do Estado, desqualificando-o enquanto esfera derepresentação dos interesses das camadas declasses subalternizadas. Nesse sentido, o Estadovem atuando, com uma fúria jamais vista, comprocedimentos voltados a um verdadeiro desmonteda esfera pública, efetuando a privatização dosmais elementares bens públicos (como saúde eeducação), sob o propalado discurso danecessidade de reduzir o déficit público.

A idéia de déficit público é freqüentementevinculada pelos governos à relação direta com aprodução de bens sociais de caráter público e nãoà presença dos fundos públicos na reprodução dopróprio capital. É no interior desse discurso quese fortalece a dicotomia entre “público” e“privado”, caracterizando-se por público tudo oque é ineficiente, aberto ao desperdício e àcorrupção; e por privado, a esfera da eficiência eda qualidade. Oculta-se, também, de formacuidadosa, o fato de que a precária situação dascontas públicas não tem origem apenas no excessode investimentos em ações de natureza pública,mas também na incapacidade dos governos emampliar suas fontes via reformas no sistematributário, controlar as taxas de evasão esonegação, que ocorrem em larga escala.

No dizer de Atílio Borón (1995: 78), esse“discurso satanizador do público” passa afortalecer a idéia da crise estrutural do Estado,criando-se uma cultura anti-Estado que cimenta anecessidade de privatizar bens e serviços denatureza pública, apropriados pelas empresasprivadas como fonte de novos lucros. É com essalógica que se fortalecem as relações Estado-sociedade-mercado e criam-se padrões, no âmbitoda subjet ividade e do consentimento, danecessidade de sacrifício de todos os segmentosde classe para “salvar” a nação. Enquanto nosperíodos populistas as classes hegemônicas faziamconcessões aos setores populares, na atualidade,há uma inversão desse processo, à medida que oEstado, em nome das elites econômicas, impõesacrif ícios às classes populares, as quaisconsentem em favor da hegemonia burguesa.

(social e institucional)” própria a cada uma. Osportadores materiais da sociedade política são osaparelhos repressivos do Estado, cujo controle érealizado pelas burocracias executiva e policial-militar; já na sociedade civil os portadoresmateriais, denominados por Gramsci de “aparelhosprivados de hegemonia”, possuem uma certaautonomia em relação à sociedade política. Éjustamente essa independência material que marcao fundamento ontológico da sociedade civil, e que,ao mesmo tempo, a distingue como uma esfera comestrutura e legalidade próprias, mediadora entre aestrutura econômica e o Estado-coerção. Aontologia materialista do ser social, que funda ateoria social de Marx, reaparece em Gramsci, porexemplo, na afirmação de que “não há hegemonia,ou direção política e ideológica, sem o conjuntodas organizações materiais que compõem asociedade civil enquanto esfera do ser social”(Coutinho, 1989: 78). Em outros termos, asociedade civil compreende o conjunto de relaçõessociais que engloba o devir concreto da vidacotidiana, da vida em sociedade, o emaranhado dasinstituições e ideologias nas quais as relações secult ivam e se organizam, não de maneirahomogênea, mas como expressão de projetos epráticas sociais diferenciados, cenário de luta dasclasses sociais e espaço de disputa na construçãoda hegemonia através de suas diferentesinstituições.

Nesse sentido, longe das interpretaçõesidealistas, a sociedade civil não existe descoladadas condições objetivas, plano em que ocorre aprodução e a reprodução da vida material e,consequentemente, a reprodução das relaçõessociais. A esfera da sociedade civil, dessa forma,pode ser abordada a partir das diferenciações declasse e de interesses que se modificam peloimpacto das novas dinâmicas econômicas, políticase sócio-culturais.

São cada vez mais expressivas as fraçõesda sociedade civil articuladas em torno de umaoligarquia financeira globalizada, que buscamgarantir seus interesses ampliando os canais e asinstituições capazes de aglutinar seus projetos, oque lhes confere uma hegemonia polí t ico-econômica assegurada pela performance do atualestágio de desenvolvimento do capitalismo. Taiscanais encontram-se ancorados, principalmente, na

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ganha força, também, a indústria cultural destinadaa criar atitudes e comportamentos que valorizamos interesses corporativos de classe, em detrimentodos institutos de caráter coletivo. As formascoletivas de organização e representação vêm,desse modo, sendo erodidas através de umprogressivo processo de esvaziamento efragmentação de suas protoformas de luta e de seusreferenciais políticos de classe. Despolitiza-se otrabalhador, principalmente através doalardeamento da “ideologia do medo”, pelofechamento de inúmeros postos de trabalho e peladesmontagem das formas jurídicas de resoluçãodos conflitos trabalhistas, fazendo com que nãomais se respei tem garantias e direi tosconquistados. Essa fragmentação vai ,sorrateiramente, destruindo as possibilidades deconstrução de uma “vontade coletiva”, de ummomento “ético-político”, trilhando o caminho devolta para o que Gramsci denominou de momento“econômico-corporativo”. Essa nova hegemoniafragmenta os sujeitos coletivos, quer do ponto devista material, reflexo da reestruturação produtivado capital, quer do ponto de vista político-cultural,através de valores particulares e individuais quedesorganizam as classes em relação a si mesmas eas articulam organicamente em relação ao ideáriodo capital. O “pertencimento” de classe cede lugarao individualismo e ao “desencantamentoutópico”.

As estratégias de desmonte dasorganizações coletivas são enfeixadas no discursoenganoso sobre a sociedade civil, remetendo-se aesta a responsabilidade no encaminhamento deprojetos para dar conta dos complicadores dasnovas expressões da “questão social”. Mas aqui asociedade civil é tomada ao avesso do sentidogramsciano, à medida que é deslocada da esferaestatal e atravessada pela racionalidade domercado, sendo, em última instância, a expressãodos interesses de insti tuições privadas quecontrolam o Estado e negam a existência deprojetos de classe diferenciados. Tomada emsentido transclassista, é convocada, em nome dacidadania, a realizar parcerias de toda ordem,sendo exemplares os projetos de refilantropizaçãodas formas de assistência (como o ComunidadeSolidária), em face das seqüelas da “questão

Reforça-se, assim, uma “cultura política da crise”,cuja pretensa verdade é repassada à sociedade eincorporada, principalmente pelas camadas declasse subalternas (mas não só), como única, numaassimilação de concepção de mundo matriz de umaunidade ideológica que congrega toda a sociedade.Reafirma-se, assim, a hegemonia burguesa, àmedida que uma determinada visão de mundoconverte-se em senso comum, tornando-se ocimento de um novo bloco histórico.

À medida que esses pressupostos seuniversalizam, transformando-se em senso comum,transfere-se para as classes dominantes uma“poderosíssima ferramenta de controle político esocial” (Borón, 1995: 95), convertendo-se ocapitalismo na organização econômica final dahistória. A classe dominante consegue, assim,legitimar a sua ideologia, porque, em primeirolugar, detém a posse do Estado e dos principaisinstrumentos hegemônicos (organização escolar,mídia), “lugar constituinte dos valores sociais egarantia de sua reprodução” (Vianna, 1991: 155),e, em segundo, possui o poder econômico, querepresenta uma grande força no seio da sociedadecivil, pois, além de controlar a produção e adistribuição dos bens econômicos, organiza edistribui as idéias. Assim, as superestruturasganham materialidade, isto é, a classe dominantereatualiza a sua “estrutura ideológica” a fim dedefender e manter um certo tipo de consenso dosaparelhos de hegemonia em relação aos seusprojetos, legitimados por via democrática. Atransformação da objetividade burguesa emsubjetividade e sua naturalização na sociedadeexpressam-se através de um “movimentomolecular” que, conforme indica Badaloni (1991:109), “envolve indivíduos e grupos, modificando-os insensivelmente, no curso do tempo, de modotal que o quadro de conjunto se modifica sem aaparente participação dos atores sociais”.

No Brasil, a Reforma do Estado que vemocorrendo é farta de exemplos. O processo deprivatização do público posto pelas burocraciasligadas aos aparelhos executivos e repressivos doEstado está intr insecamente relacionado àrearticulação de novas ideologias na esfera dasociedade civi l , cujos projetos das el i teseconômicas sobrepõem-se aos das classessubalternas. Sob o manto dessa nova ideologia,

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social”. Ocorre, assim, um progressivoesvaziamento da sociedade civil, cujas formas deprotesto irrompem, muitas vezes, através daviolência, do racismo, da xenofobia e defundamentalismos de diversos tipos. A crítica deGramsci às promessas fáceis do liberalismo doséculo XVIII, que adentram os séculos XIX, XX eXXI, reatual izam o f igurino, mas seguemprivilegiando a hegemonia do capital financeiro,sendo a esfera econômica a dimensão mais alta damodernidade, e o mercado o “novo príncipe” docenário nacional e internacional. Mas essamodernidade ilusória é totalmente despida de umadimensão ético-política, à medida que reforça osistema de exclusão, as injustiças sociais e adeterioração das condições de vida de imensosestratos populacionais.

Se tal hegemonia ideológica é, por um lado,o sustentáculo do novo estágio do capitalglobalizado, por outro, constitui-se no espaço deflorescimento de “novas formas de expressão docoletivo”. As instituições da sociedade civilrepresentativas do protesto dos “de baixo” tambémtendem a crescer no interior da crise mesmo docapitalismo. A cultura pública e democrática,gestada com o intenso processo de socialização dapolítica, precisa ser reafirmada, de forma que osorganismos de base não sejam esfumados por esseprocesso de fragmentação, desmobilização epassividade, esvaziador da democracia e dacidadania. O dilema está no esforço para que essaslutas cotidianas não se restrinjam a reformaspontuais, desencarnadas de um projeto totalizador,acabando por perder-se no vazio. As lutas dasminorias, do acesso à terra, moradia, saúde,educação, emprego, hipertrofiam-se em umturbilhão de demandas fragmentadas, facilmentedespolitizadas e burocratizadas pelo próprioEstado, situando-se naquilo que Gramsci denominade “pequena política”, que engloba questõesparciais e cot idianas e que precisa,necessariamente, vincular-se à “grande política”para criar novas relações.

Mesmo considerando as característicasheterogêneas e multifacetadas da sociedade civil,não sendo tomada aqui de forma generalizada, nemmesmo como o centro de todas as virtudes, épossível, a partir dela e de sua interface com oEstado, buscar o alargamento da participação nos

processos decisórios e o bloqueamento dasestratégias de destruição dos direitos sociais e dosinstitutos de representação coletiva. Destaca-se,também, a importância do “partido político”enquanto articulador de interesses universais, cujacrise atual tem tornado cada vez mais tênues osseus vínculos com o conjunto da vida social.Gramsci não deixa, jamais, de pensar o partidocomo instituição ético-política que, enquanto“intelectual coletivo”, no dizer de Togliatti, ou“partido de massa”, conforme expressa Ingrao (emesmo Gramsci), possui a tarefa permanente deorganizar politicamente a classe e ajudá-la na lutapela construção da hegemonia.

O alargamento da democracia diretareforça a ação do partido, através de uma novadinâmica democrát ica, recuperando sualegit imidade na formação de al ianças e naaglutinação de interesses de classe em torno de umprojeto radicalmente voltado à socialização dopoder econômico e do poder político. É o conjuntoplural de forças progressistas (portadoras deprojetos de classe e não de um pluralismo pastichee folclórico) que será capaz de fazer retornar o“pêndulo da história” para o campo da justiça, daigualdade e da democracia, expressão da vontadecoletiva, e fortalecer uma consciência “ético-política” necessária à criação de um novo “blocohistórico”.

Fica evidente, assim, que se a sociedadecivil na atualidade não é mais a mesma do tempode Gramsci, ele levantou questões fundamentais eapontou caminhos que até hoje permanecem emaberto para se pensar a construção de umasociedade radicalmente democrática que incluacada vez mais a massa de excluídos esubalternizados pelo atual sistema. O potencialmobilizador da sociedade civil indicado porGramsci, desloca o eixo da ação política dasinstituições formais para o terreno criativo dasinúmeras formas de organização social que buscamreafirmar a primazia do espaço público narepresentação dos anseios e interesses dapopulação (Semeraro, 1999).

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A recuperação do referencial teóricogramsciano tem possibilitado ao Serviço Socialinterrogar-se sobre questões relativas às instânciasestrutural e superestrutural, com problematizações nãosomente na esfera econômica, mas também política,ideológica e cultural o que tem permitido à profissão,o encaminhamento de propostas efetivas no âmbitodas políticas sociais públicas, privadas e nas diferentesformas organizativas da sociedade civil.

Se o tempo presente não é o mesmo deGramsci, nos parece que as questões cruciais dopassado, instauram-se na atualidade de forma cada vezmais avassaladora. As desigualdades sociais não foramresolvidas, antes acirraram-se e polarizaram-se emquestões decisivas como o acesso à terra, salário,emprego, habitação, condições de trabalho, saúde,educação, cidadania, democracia, dentre outras. Maisdo que nunca, no momento presente se põe a nu odescompasso entre as condições mínimas desobrevivência das classes subalternizadas em relaçãoàs camadas que hoje detêm grande parte da riquezaem termos globais.

O autor dos Quaderni espalhou por todos oscontinentes a idéia de revolução contra a ordem dascoisas. Desenvolveu uma reflexão radical sobre ocapitalismo, o poder político, a opressão. Se Gramscidesenvolveu, em relação a Marx e Lênin, um processode conservação/superação, por perceber que a ordemcapitalista havia-se complexificado sensivelmente, omesmo processo devemos realizar hoje, uma vez quenovas determinações colocam-se no desenvolvimentocapitalista contemporâneo.

À GUISA DE CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS