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Os jovens que são encaminhados aos abrigos por determinação judicial e Conselho Tutelar só devem permanecer na instituição até a idade máxima de 18 anos, conforme Constituição Federal e Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), sendo dessa forma obrigados a saírem do local que em muitos casos conviveram desde a primeira infância ou até mesmo o nascimento, aprendendo a reconhecer como sua casa ou seu lar, modificando seu contexto social adquirido e passando por uma ruptura brusca de sua realidade, em que se vêem responsáveis por sua própria manutenção e seus atos, buscando alternativas como Repúblicas que nem sempre são viáveis, para gerir e suprir suas necessidades básicas e financeiras. O presente estudo busca compreender quais são os procedimentos e programas adotados pelas instituições para atender as necessidades mínimas de formação profissional e educacional, que possam propiciar autonomia gradativa para os jovens até completarem a idade limite permitida por lei, e como a prática profissional da Psicologia pode auxiliar nessa transição social, possibilitando um maior preparo possível para sua adaptação.
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UNIVERSIDADE CAMILO CASTELO BRANCO
Curso de Psicologia
A inserção de jovens abrigados após a maioridade em seu novo contexto social
São Paulo
2013
ii
ÂNGELA FELICETE
BRUNA CRISTINA PAZ DE OLIVEIRA
FERNANDA MARIA COSTA OLIVEIRA
MARIA LUZINETE RODRIGUES DE MACÊDO ALVES
NAYARA DOS SANTOS
PALOMA TUANNY
RAMON ALVES
A inserção de jovens abrigados após a maioridade em seu novo contexto social
Projeto de pesquisa do Estágio Básico Supervisionado da
disciplina de Psicologia Social e Comunitária do Curso de
Psicologia da Universidade Camilo Castelo Branco –
Unicastelo, sob orientação da Profª. Susy de Oliveira
Amorim de Campos.
São Paulo
2013
iii
Sumário
Lista de figuras ........................................................................................................................ iv
Resumo .................................................................................................................................... v
1 – Introdução .......................................................................................................................... 08
1.1 – Crianças institucionalizadas ........................................................................................... 08
1.2 – Caracterização da instituição .......................................................................................... 17
2 – Resultados obtidos ............................................................................................................. 19
2.1 – Entrevistas ...................................................................................................................... 19
2.2 – Discussão ........................................................................................................................ 21
3 – Conclusão .......................................................................................................................... 25
4 – Referências bibliográficas ................................................................................................ 26
4.1 – Referências literárias ...................................................................................................... 26
4.2 – Referências eletrônicas ................................................................................................... 27
iv
Lista de figuras
Figura 1 – Roda dos expostos da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo .......................... 12
Figura 2 – Roda dos expostos da Basílica de Misericórdia de Lisboa .................................... 12
Figura 3 – Tabela CNCA Estados com maior número de crianças acolhidas no Brasil ......... 15
Figura 4 – Gráfico IPEA causas da inserção de crianças em abrigos no Brasil ...................... 16
v
RESUMO
Conforme conceitos chaves da Disciplina de Psicologia Social e Comunitária, é necessário
conhecer o processo histórico do indivíduo para construção de uma identidade mais profunda,
com conteúdo que prevaleça relações mais estáveis e maduras, inclusive nas instituições que são
também responsáveis por essa construção de identidade, formando-se grupos que exige uma
dinâmica com bases teóricas para entendimento do que se faz e suas respostas, podendo usar suas
teorias para desenvolvimento desse grupo. Pensando nesse contexto, o estágio básico
supervisionado da disciplina nos permitiu conhecer um pouco mais dessa dinâmica institucional
através do tema proposto, já que os jovens que são encaminhados aos abrigos por determinação
judicial e Conselho Tutelar só devem permanecer na instituição até a idade máxima de 18 anos,
conforme Constituição Federal e Estatuto da Criança e Adolescente (ECA), sendo dessa forma
obrigados a saírem do local que em muitos casos conviveram desde a primeira infância ou até
mesmo o nascimento, aprendendo a reconhecer como sua casa ou seu lar, modificando seu
contexto social adquirido e passando por uma ruptura brusca de sua realidade, em que se veem
responsáveis por sua própria manutenção e seus atos, buscando alternativas como Repúblicas que
nem sempre são viáveis, para gerir e suprir suas necessidades básicas e financeiras. Assim, o
presente estudo busca compreender quais são os procedimentos e programas adotados pela
instituição para atender as necessidades mínimas de formação profissional e educacional, que
possam propiciar autonomia gradativa para os jovens até completarem a idade limite permitida
por lei, e como a prática profissional da Psicologia pode auxiliar nessa transição social,
possibilitando um maior preparo possível para sua adaptação. Pelos resultados obtidos
percebemos como é difícil quebrar os paradigmas inadequados do sistema para uma dialética
social mais produtiva, sendo a prática da Psicologia Social e Comunitária uma ferramenta útil
dentro da instituição para esse processo de reconstrução de novas identidades, podendo ser
utilizada como intervenção terapêutica de seus membros, auxiliando na transformação desses
jovens pós-abrigos que podem passar de simples produtos a produtores de sua história.
vi
TEMA
Pesquisa sobre os procedimentos e projetos elaborados para a preparação de jovens pós-abrigados
em seu novo panorama social para um grupo de 22 crianças e adolescentes entre as idades de 0 a
17 anos, que são abrigados pela instituição CCR - Casa do Cristo Redentor, e atendidos pelo
Serviço de Acolhimento Institucional para Crianças e Adolescentes (SAICA) Vovô Nelson,
núcleo participante da referida instituição.
OBJETIVO GERAL
Verificar e compreender os procedimentos dos trabalhos desenvolvidos por psicólogos e outros
profissionais para preparação dos jovens em sua nova condição social, visando minimizar o
impacto que sofrem dessa transição social com esta ruptura abrupta por seu afastamento da
instituição.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
• Conhecer os objetivos e projetos iniciais da instituição em relação aos jovens acolhidos.
• Compreender quais as possíveis dificuldades que passam os jovens abrigados após sua
saída do abrigo e quais procedimentos viáveis para suprir essas necessidades.
• Verificar os projetos disponíveis para capacitação profissional e administração da vida
econômica dos jovens para gestão financeira após a maioridade.
• Apurar os procedimentos tomados para inserção gradativa e adaptativa dos jovens num
novo contexto social após o término de sua permanência na instituição.
• Verificar a execução desses projetos e quais os benefícios e dificuldades para alcançarem
sua finalidade.
• Averiguar os resultados presentes desses procedimentos e quais as perspectivas futuras da
instituição.
• Refletir sobre a prática profissional da Psicologia, bem como de outros profissionais, em
relação a relevância social do trabalho desenvolvido.
vii
METODOLOGIA
A pesquisa teve como população alvo os funcionários e profissionais que auxiliam na
manutenção e atendimento aos jovens da instituição. Como procedimento foi aplicado um roteiro
de entrevistas com perguntas abertas, utilizando para tal fim, os instrumentos de um gravador de
som e um roteiro de entrevista.
8
1 – Introdução
O presente estudo tem como objetivo refletir sobre a prática da psicologia nas instituições,
com relação aos trabalhos desenvolvidos por psicólogos e demais profissionais, em consonância
com a demanda social pertinente ao grupo. A proposta deste trabalho está baseada em uma
pesquisa realizada na instituição Casa do Cristo Redentor, que tem como fim o acolhimento a
crianças necessitadas, pela compreensão dos serviços desenvolvidos e prestados pelos técnicos da
instituição para promoverem a reinserção dessas crianças abrigadas a um novo contexto social,
após sua maioridade.
Conforme Silvia Lane (1933 - 2006), para se compreender uma situação atual é necessário
entender os processos sócio-históricos do qual fazem parte, portanto, com o intuito de melhor
compreendermos o panorama social dessas crianças abrigadas, bem como suas necessidades,
faremos um breve estudo sobre as causas e condições que as levam aos abrigos no Brasil.
1.1 – Crianças institucionalizadas
Quando uma criança é apartada de sua família, por diversos fatores, e passa por algum
tempo de sua vida a viver em situação de acolhimento por uma instituição, é chamada de criança
institucionalizada. Esse termo denota um estigma social grande, carregado de discriminação pela
sociedade, o que de fato é.
A historicidade dessa realidade apresenta um quadro antigo de descaso, preconceito e
problemas políticos de nossa sociedade, que remonta a vários séculos atrás, num contexto social
totalmente adverso ao atual, mas que infelizmente, mesmo mudando-se os personagens, situações
ou causas, sua prática perdura até hoje.
É fato histórico da humanidade que na Antiguidade as crianças eram vistas sem grande
importância no quadro social, onde podemos constatar isso até mesmo nos diversos filmes que
retratam a história medieval ou da Antiguidade. A existência da criança não tinha valia alguma
para a sociedade, quando não raro, era tida como estorvo e peso morto na economia familiar,
somente mudando essa situação quando a criança era possuidora de algum título ou nobreza que
justificassem ou valesse sua existência.
9
A incumbência pela vida e destino da criança cabia ao pai decidir, pelo antigo pátrio
poder, assim é que muitas eram trocadas ou vendidas para suprir despesas familiares, ou
completamente abandonadas à sorte e mendicância pela família que também já vivia em estado
de miséria, ou ainda, os casos em que a criança era vista somente como um acordo comercial,
valendo mais tarde um contrato de núpcias rentável para a família. A criança não tinha lugar
compreendido ou respeitado em seus valores sociais, já que nada tinha que pudesse oferecer à
sociedade. Até mesmo o senso materno era indiferente a ela, sendo a mulher totalmente oprimida
e exclusa, sem encontrar elementos ou respaldo numa sociedade patriarcal dividida em duas
classes: os nobres, que ditavam as regras e podiam tudo, e os pobres, que nada podiam e somente
cumpriam as regras para tentar sobreviver.
Vemos em estudo desenvolvido pela psicóloga Maria Tereza Maldonado (1949), que
diante de uma sociedade semicivilizada a mulher era vista somente como procriadora, e com isso,
o adultério e filhos ilegítimos eram aceitos com normalidade. O pai, quando possuidor de
recursos, recolocava socialmente o filho ilegítimo, e quando não, este se via lançado a própria
sorte. Somente na Idade Média, a partir do século XVI, com a Reforma Protestante e a
contrarreforma católica, essa situação se torna insustentável pela Igreja que passa exigir a
fidelidade dos casais e a castidade dos religiosos, agravando a situação da mãe numa sociedade
regida por uma política masculina e preceitos religiosos, para a qual passa agora a ser vista como
imoral e pecaminosa, sendo por isso, comum o infanticídio com milhares de recém-nascidos
mortos ou abandonados no lixo para esconder uma situação irregular e a vergonha da mãe
(Maldonado, 1997).
Essa prática foi tão largamente difundida que a Igreja em meio a sua crise, se vê
compungida a mudar esse panorama, surgindo na história da humanidade um movimento social
caritativo para mudar esse quadro de mortalidade infantil, influenciado pela Igreja da Itália, que
volta seu olhar à criança para esconder os filhos ilegítimos da nobreza, poupando a honra de suas
famílias, passando assim a buscar pelo assistencialismo ampará-las com a criação da Roda dos
Expostos, a primeira instituição assistencialista as crianças abandonadas.
A Roda dos Expostos tinha como objetivo amparar o recém-nascido e garantir o
anonimato do expositor, que recompensava a instituição com benefícios monetários, o que se
tornava um acordo vantajoso para ambos os lados. Assim, esse sistema ganha vulto se estendendo
10
pelos séculos, passando a ser difundido amplamente por toda Europa. Apesar disso, as crianças
ainda eram desconhecidas pela sociedade vivendo dentro de uma cultura sem laços afetivos, por
um total desinteresse parental, como cria gerada pelas consequências do coito. Isso fica
perceptível, ainda pela enorme ocorrência de casos de infanticídio na época, mesmo passando o
infanticídio a ser punido por leis severas, sendo disfarçados por “acidentes” domésticos em que
muitas crianças morriam asfixiadas nas camas dos pais em que dormiam, sendo muitos filhos
legítimos do casal, o que ressalta a falta de afetividade da família com a criança.
Foi somente a partir da Idade Contemporânea, que a criança começa a mudar seu quadro
dentro da sociedade, ganhando aos poucos importância social e sentimental, não por inspiração
humanitária devido ao seu alto índice de mortalidade infantil, mas pelo seu significado e valor
social. Assim, a criança começa a ganhar uma identidade social que até então não possuía, sendo
vista e compreendida até o século XVII como um adulto, até em seu vestuário, só que em
miniatura. Um dos pensadores que contribui para essa mudança social foi Jean Jacques Rousseau
(1712 – 1778) por volta do século XVIII, influenciando até mesmo na mudança do vestuário
infantil que passa a ter maior leveza e condições próprias para o uso infantil, ganhando relevância
econômica e status social por essa independência.
Foi também a partir dessa época, que se começou a dar importância ao contato da mãe
com o filho, enfatizando sua presença na primeira infância para transmissão de valores
educacionais e religiosos, caindo dessa forma à taxa de mortalidade infantil, tão grande e comum
até então (Maldonado, 1997).
Com isso, se demonstra nitidamente a influência sócio-cultural para mudança na
subjetividade parental, com crescimento nos laços afetivos e início de valorização e respeito à
criança.
Também podemos refletir sobre esse declínio na mortalidade infantil, quanto à constância
da mãe junto ao bebê na primeira infância, o que conforme a teoria sobre os três organizadores
psíquicos do psicanalista René Spitz (1887 - 1974), tem grande significação para a permanência
da existência e desenvolvimento da criança nessa fase, podendo ocorrer por sua ausência, morte
psíquica.
11
Conforme Spitz, a mãe tem uma função primordial no primeiro ano de vida do bebê,
sendo ela quem faz o intercâmbio do bebê com o mundo exterior e o auxilia na formação do seu
mundo interior. Inicialmente a mãe o ajuda na interpretação dos seus desejos básicos fisiológicos,
suprindo toda sua necessidade de sobrevivência, gerando uma relação simbiótica entre mãe e
filho a ponto de um ser a extensão do outro, consagrando uma compreensão mútua que
transcende a comunicação verbal. Os sentimentos se mesclam sendo satisfatórios para ambos,
estabelecendo um prazer recíproco entre os dois, o que posteriormente será o elemento
fundamental para a construção psíquica do bebê, que terá a mãe como seu objeto libidinal, a
representação simbólica da satisfação primária dos seus desejos.
Assim, a figura materna é necessária para auxiliar no desenvolvimento da psique infantil
através dessa troca, das relações objetais iniciais, que é fundamental para continuidade desse
desenvolvimento progressivo na psique da criança. Sem esse processo psíquico inicial, há
possibilidade da criança não sobreviver as exigências psíquicas, levando-a a um estado de apatia
intensa, e com seu organismo infantil ainda frágil, podendo até mesmo ocasionar sua morte física
(Spitz, 1991).
Entretanto, mesmo com sua notoriedade social, a criança continua sendo largamente
negligenciada em suas necessidades, o que para suprir essa carência seria preciso rever outras
situações políticas e econômicas, que até hoje ainda necessitam de revisão.
No Brasil, vemos o mesmo quadro à infância se desenvolver, já que sua condição social
foi importada pela Europa junto com seus colonizadores. Durante o império, o abandono e
infanticídio eram tidos como fato comum nas cidades, tendo menor ocorrência no meio rural
devido a mão de obra escassa e, a criança ser vista como mais um produto para o trabalho, não
podendo ser descartada.
Dentre outros sistemas importados pelo Brasil, a Roda dos Expostos também veio na
importação, e passou pelos diversos regimes políticos brasileiros, da monarquia à república,
somente se extinguindo na década de 50.
A primeira Roda registrada no Brasil foi, no estado da Bahia em Salvador, fundada em
1726 no período colonial, sob a influência da Igreja. A Roda era feita por um sistema de madeira
12
giratório em seu próprio eixo com uma divisória ao meio, onde de um lado era vazado com sua
face voltada para a rua, destinada para ser colocada a criança enjeitada. Depois o expositor
girava, passando então a abertura para o lado de dentro para o interior da casa, o que permitia seu
total anonimato, e em seguida apertava a campainha que alertava a freira, vindo e recolhendo a
criança abandonada.
Roda dos Expostos da Santa Casa de Roda dos Expostos da Basílica da Misericórdia de São Paulo Misericórdia de Lisboa
A Roda foi o primeiro sistema formal utilizado para abrigar crianças desamparadas,
acolhidas pelos diversos hospitais da Santa Casa de Misericórdia, veiculadas aos ideais da Igreja
e de um sistema assistencialista. É assim que inicia no Brasil o acolhimento às crianças
abandonadas, dentro de um contexto social visto como alternativo ao infanticídio, no regime
colonial em que a prática do abandono, miséria e falta de direitos sociais eram vigentes diante de
uma política escravocrata e que, portanto, totalmente parcial e arbitrária.
Esse sistema de acolhimento caritativo pela Igreja perdura no Brasil até o final do século
XIX, quando o regime político passa de Monarquia para República, e com isso explode o
capitalismo e as revoluções industriais, transformando toda uma sociedade com a expansão das
indústrias, das cidades e das classes sociais.
13
Com a libertação dos escravos e a vinda da população rural para as capitais, surge um
novo panorama urbano, criado pela necessidade de suprir essa demanda desenfreada sem
estrutura econômica para uma nova classe de proletariados, surgindo assim os cortiços, que irão
gerar uma nova paisagem urbana e condição social, com suas crianças expostas nas ruas das
principais cidades e capitais, mostrando suas misérias e condições paupérrimas de uma classe
explorada e oprimida.
Novamente os olhares se voltam as crianças, mas desta vez para esconder a vergonha
pública de um sistema político e econômico negligente e deficitário. A criança volta a ser um
problema social a ser pensado, saindo da Igreja para as mãos do Estado, passando de uma
condição puramente assistencialista para uma condição “filantrópica” assistencialista, sob o
discurso da necessidade de formação profissional às crianças que são o futuro da nação,
investindo na educação dentro das instituições acolhedoras, o que na realidade não passava de um
artifício para inseri-las no mercado de trabalho pela mão de obra barata, com vistas à crescente
produtividade futura do país, e conseqüente retirada da pobreza das ruas, o que representaria a
imagem fictícia de uma sociedade mais bonita e justa.
Mais uma vez a história se repete, com a sociedade usando de suas manhas e artifícios
para escamotear uma situação problema, escondendo-a na superfície, ao invés de resolvê-la em
seu âmago.
Assim inicia-se uma nova fase para a criança no século XX, que passam a ser um
elemento fundamental na sociedade, como uma nova classe de trabalho. A criança agora é um
bem do Estado “o futuro da nação”, em que todos os olhares voltam-se a elas, passando a chamar
atenção de toda sociedade. O que antes era permitido socialmente passa agora a ser questionado e
reprovado. Todos os sistemas públicos revisam o quadro infantil, e surgem novas instituições
dentro dessa nova ordem, pensando na formação moral e educacional da criança, evitando assim
um mal maior na sociedade, de um futuro delinqüente e mal-feitor, o que denotaria a
delinqüência da própria sociedade.
Mas, o problema social de uma classe de trabalho oprimida e explorada ainda existe até os
tempos atuais, já que a sociedade só reproduz sua história sem modificá-la. E é por esse problema
maior que vemos ainda algumas famílias recorrerem as instituições para auxiliarem na formação
14
de seus filhos, devido à falta de estrutura familiar conseqüente de uma sociedade de dominação
regida por um sistema capitalista e político que privilegiam relações sociais alienadas e
dependentes do sistema econômico, ocasionando situações limites para população que não
possuem informações e esclarecimentos suficientes, que sem saída, não enxergam outro recurso
ou meio de subsistência.
Freud (1856 – 1939) em uma visão psicanalítica da sociedade, atenta por esse paradoxo
imposto pela sociedade como sendo necessário para nossa civilização, pois as regras e normas
sociais acionam o mecanismo do princípio do prazer em contradição ao princípio da realidade, o
que sem isso, retornaríamos ao primitivismo.
O homem é essencialmente primitivo, movido pela busca desenfreada de prazer do id, por
aquilo que lhe satisfaça a libido, sendo o ego, esse intermediário que fará a mediação entre seu
mundo externo e interno, levando ao id elementos que lhe satisfaçam a libido, ou ao menos, que
evitem seu desprazer. Quando o ego não encontra no mundo externo esses elementos para sua
satisfação, não tem como limitar os desejos do id, o que levaria o homem ao seu retorno
primitivo, a buscar somente seu prazer do mundo interno, sem medidas com a realidade do
mundo externo, liberando suas repressões do inconsciente.
Assim, a sociedade deve buscar sempre condições sociais satisfatórias para uma vivência
tranquila do homem, afastando-o de condições que promovam infelicidade, evitando seu
desprazer, através de instrumentos bem colocados e direcionados que lhe dariam satisfação
interna como a arte, a educação e o trabalho, permitindo com isso uma vivência mental saudável
em conjunto com seu mundo externo, consonantes em sua rotina real. Mas, que isso seja em
condições acessíveis e possíveis para esse prazer, não como a que vemos, em situações que
promovem mais ainda sua insatisfação e seu sofrimento, perdendo seu elo com a civilização ou
levando-o cada vez mais a doenças mentais, por não conseguir conciliar seus dois princípios, de
prazer e realidade. Quanto menores condições humanas a sociedade dá ao homem para a sua
civilização, menos seres civilizados e humanos ela terá.
Com isso, é possível compreender porque em nossa sociedade vemos situações tão
alarmantes de famílias desestruturadas. Não há bases socioeconômicas necessárias que
intercedam para que elas possam exercer seu papel de grupo familiar, responsáveis pela
15
segurança, acolhimento afetivo e educação moral e intelectual a seus filhos, já que a sociedade
não lhes fornece suficientes instrumentos de apoio.
Atualmente, cresce no Brasil o número de famílias que buscam instituições para
acolherem seus filhos para dar-lhes as bases que não conseguem dar.
Em uma pesquisa feita em Fevereiro de 2012, pelo Cadastro Nacional de Crianças e
Adolescentes Acolhidos (CNCA), o número de jovens e crianças acolhidas em instituições é de
37.240, tendo o estado de São Paulo o maior número, entre outros.
Seja por fatores econômicos, políticos ou sociais, o fato é que esse quadro demonstra que
qualquer um que seja o motivo, este é deflagrado por um erro no sistema organizacional da
sociedade, que não visa o bem-estar social em todas as demandas necessárias do homem, não o
vendo como um ser explicitamente social, portanto, tendo a sociedade responsabilidade em
abancar todos os seus aspectos, tanto físicos, psíquicos, econômicos e sociais, para totalidade de
sua civilização.
Com uma demanda cada vez mais exigente, psíquica e social, regida por um sistema
econômico totalmente parcial e injusto, as famílias literalmente empobrecidas não encontram
outro meio de manter suas exigências, buscando nas instituições alternativas para suprir suas
16
carências sociais e consequente desestrutura familiar, mesmo não sendo este o melhor caminho,
mas o único muitas vezes acessível às classes sociais de baixa renda discriminadas e
negligenciadas pela sociedade.
Por um estudo apresentado pelo IPEA em 2004, fica fácil de compreender essa realidade
encontrada em suas estatísticas, em que os dados apontados não diferem muito em seu percentual
sendo todos provindos do mesmo denominador comum, a falha de uma sociedade, apresentando
no contexto estudado irrelevância em seu diferencial.
Com isso, crianças institucionalizadas são crianças violentadas pelo sistema que
perderam, na maioria dos casos, o contato primário de sua socialização, o convívio familiar. A
família é o primeiro grupo que o indivíduo tem contato, sendo este importante para sua formação
interior independente de sua estrutura sócio-econômica, pois é este primeiro contato que fornece
as bases para cumprimento de sua estrutura psíquica, conforme vimos anteriormente. No entanto,
essas crianças acabam tendo como alternativa uma vida restrita dentro de instituições
desconhecidas por elas, limitadas em suas necessidades psíquicas e sociais, o que possivelmente,
agravará sua estrutura psicológica pela falta desse contato primário, um mundo interior que foi
internalizado com conflitos e transtornos, que posteriormente será exteriorizado da mesma forma
por suas ações.
C aus as da ins erç ão de c rianç as em
abrig os no B ras il
21,6%
15,5%
12,6%11,3%
0
5
10
15
20
25 abandono familiar
violênc ia domés tic a
dependênc ia químic a ou
alc oólic a
c arênc ia de recurs os
financeiros
17
1.2 - Caracterização da instituição
Assim, buscando compreender como essas crianças institucionalizadas viverão depois que
concluírem o período imposto por lei, já que perderam muito dessa dialética social necessária
para sua construção e desenvolvimento psíquico, procuramos através de uma instituição
conhecida por um dos integrantes do grupo, estudar como a instituição e seus profissionais
podem auxiliar para minimizar esse impacto de transição social de pós-abrigo aos jovens, já
fragilizados em seu mundo interior, retornando para esta mesma sociedade que os violentou em
seu primeiro contato social com o grupo familiar.
A Casa do Cristo Redentor – CCR é uma instituição assistencial sem fins lucrativos,
fundada em 27 de Dezembro de 1956, pelo casal “Dona” Matilde Rocha Barros e Dr.Nelson
Lobo de Barros. Inicialmente a CCR foi projetada e construída pelo casal que não possuíam
filhos, para atender crianças órfãs e necessitadas em regime de internato, visando sua assistência
fraterna, familiar e social, promovendo condições para seu crescimento saudável em todos os
aspectos de sua vida, contribuindo para a formação de jovens cidadãos éticos e responsáveis.
Hoje, após mais de 50 anos, o ideal permanece com algumas mudanças físicas na instituição e
inserção de novos projetos sociais, ampliando seu atendimento não somente as crianças abrigadas
pela instituição, bem como as famílias carentes da comunidade, que desfrutam de um espaço de
aproximadamente seis alqueires com diversos projetos assistenciais, sócio-educativos e
psicopedagógicos.
Nome completo da instituição: Casa do Cristo Redentor - CCR
Endereço completo com CEP: Rua Agrimensor Sugaya, 986 – Itaquera São Paulo/SP –
CEP 08260-030
Endereço Eletrônico: www.casadocristoredentor.org.br
E-mail: [email protected]
Telefone: 11-2521-6211
CNPJ: 62.366.844/0001-08
Registrada no Serviço Social do Estado Sob nº 2058, em 3/6/69
Registrada no Conselho Nacional do Serviço Social Sob nº 238.906/69
18
Declarada de Utilidade Pública Pela Lei Estadual nº 6646, de 4/1/62
Decreto Federal nº 73190 de 22/11/73
Nome completo e telefone do profissional que acompanha os alunos na instituição:
Luciene Stevanin Miranda – administração da CCR. Telefone: 11-2521-6211.
Valéria – psicóloga do SAICA Vovô Nelson. Telefone: 11-2071-4908. E-mail:
19
2 – Resultados e discussão
2.1 – Entrevistas
Durante a visita feita para conhecer o espaço físico da instituição, tivemos a oportunidade
de conhecer um pouco mais da história da CCR. Inicialmente a instituição foi projetada e
construída para acolher em suas dependências jovens e crianças órfãs, que até pouco tempo atrás
residiam na CCR, mas pela necessidade de ampliar suas relações sociais com mais interatividade
e propiciar uma relação de maior autonomia social às crianças, foi preciso repensar um espaço
que dessem condições para essa situação, um local que fosse o mais semelhante possível a uma
residência familiar, com vizinhança próxima, comércio, escola, etc. Assim, foi preciso realocá-las
para um novo espaço, deslocando as crianças acolhidas para casas alugadas, onde residem
atualmente.
Com isso surgem novos desafios, novas regras a cumprir para suprir essa demanda
originada por essa transformação. São implantados inicialmente dois SAICAS, Vovô Nelson e
Vovó Matilde em homenagem aos seus fundadores, abrigando as crianças existentes na
instituição, já que uma residência comum não comportaria a quantidade de aproximadamente 40
crianças, mais as instalações de técnicos e profissionais com toda sua rotina necessária para
cuidar e acolher essas crianças. Com a desapropriação de um abrigo próximo da região, o
conselho tutelar e vara da infância, pedem o acolhimento provisório de aproximadamente mais 20
crianças, que passam a residir na CCR, mas que ao passar do tempo e com a falta de uma
instituição para acolherem-nas, acabam ficando efetivamente na instituição, sendo necessária a
locação de mais uma casa, surgindo assim o novo SAICA Vovó Cecília.
Essas mudanças trazem uma nova configuração para a instituição, que passa a servir como
sede e administração, abrindo portas para novos projetos sociais e educacionais, alguns geridos
para tentar suprir essa nova demanda e realidade encontradas, e outros para auxílio na formação
educacional dos assistidos. Assim nascem novos projetos e desafios, mas sempre buscando
manter o foco nas crianças acolhidas e suas necessidades, enquanto lutam pela estabilidade
20
financeira, sem deixar as causas sociais da comunidade, já assumidas anteriormente, de fora
desse contexto.
Com essa nova modelagem, os SAICAS passam a assistir jovens e crianças que são
encaminhadas judicialmente. No SAICA Vovô Nelson são fornecidos aos assistidos atividades
variadas como oficinas de música, teatro, cursos profissionalizantes, etc. Como muitos projetos e
atividades são desenvolvidos para as crianças menores, a maioria dos jovens oferece resistência a
essas atividades, preferindo não faze-las, no que são respeitados em sua vontade pelos
profissionais.
Os técnicos e profissionais trabalham em parceria para oferecer aos jovens oportunidades
de cursos profissionalizantes para inserção no mercado de trabalho, e alguns jovens participam
dessas atividades com maior facilidade do que outros, compreendendo a intenção de se
qualificarem para o mercado de trabalho, enquanto outros acabam ficando num estado de
acomodação ao que a instituição oferece, sem demonstrarem interesse ou preocupação com o seu
futuro.
Uma das maiores dificuldades apontadas pelo assistente social para alocação dos
assistidos no mercado de trabalho é a falta de emprego para o jovem aprendiz e a exigência de
experiência por parte dos empresários, dificultando a construção de sua autonomia financeira.
Outro fator também observado foi que muitas empresas depois de conhecer a origem e residência
dos assistidos que se candidatam às vagas de emprego, desistem de emprega-los pelo fato destes
jovens serem abrigados, acarretando decepção, desânimo e frustração aos assistidos.
Os técnicos e profissionais que atuam junto aos assistidos tem como principal objetivo, o
de contribuir para que eles aprendam a lidar com seus direitos e deveres em relação à sociedade,
respeitando seus valores e direitos de poder viver em grupo, em uma sociedade. Há ainda no
SAICA um profissional da psicologia que atua junto aos assistidos para ajuda-los em suas
dificuldades emocionais, utilizando da escuta e técnicas de observações para auxiliá-los em sua
inserção social, práticas que são registradas em relatório para o planejamento individual de cada
criança, para registro e análise posterior de sua história.
21
2.2 – Discussão
Conforme proposto pelos estudos em Psicologia Social, é necessário compreender o
processo sócio-histórico para melhor entendimento da situação. Assim, com a pesquisa realizada
podemos compreender a historicidade da instituição, desde sua fundação até o momento atual, e
verificamos que a instituição se encontra como um grupo dentro de um movimento de
transformação, em que os ideais inicialmente que os moviam foram sendo ajustados com o
advento de novos movimentos sociais e pelas necessidades daqueles que acolhem. A demanda
também foi crescendo necessitando ajustar as estruturas iniciais, mas buscando manter o foco no
acolhimento às crianças e em seu futuro. Isso se configura nas mudanças que ocorreram aos
projetos iniciais pelas novas legislações e regras sócio-educacionais, gerando mudanças nem
sempre agradáveis, mas trabalhadas com novos projetos que acabam desenvolvendo novas
perspectivas e atividades na instituição.
Lane, em um de seus estudos sobre o processo grupal na sociedade, pontua alguns grupos
dentro de tipologias e estágios que se encontram, conforme características estudadas e definidas
por diversos autores, estabelecendo relações com nossa cultura e sociedade atual. Assim, ela
analisa a forma e prática de alguns grupos institucionais para entender sua dialética social e
compreender onde podemos mudar as ações para quebrar essa alienação que engessa nossa
interação social e conseqüentes transformações construtivas para o indivíduo diante da sociedade.
Além de enfocar a necessidade dos grupos em se distanciar da instituição para reconstruir sua
identidade, ela também salienta a importância de se conhecer suas reais necessidades, negando
sua construção inicial para conseguir modular novamente sua identidade de forma mais crítica e
concisa.
Dessa forma, vemos que a CCR após percalços, desafios e derrotas em busca de suas
realizações, se encontram dentro do estágio do grupo “possessivo” por se encontrarem com
tarefas definidas pelo líder do grupo, a psicóloga, caminhando para um grupo “coeso” avaliado
pelas respostas dos profissionais que buscam com determinação encontrar estabilidade e
segurança em sua produtividade, mantendo a hierarquia por membros mais antigos e a liderança
de um sistema ainda reprodutivo, agregando novos projetos e mudanças internas, mas com receio
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em se abrir para novos elementos que possam desestruturar o equilíbrio conquistado pelos
membros atuais.
Através da pesquisa, é possível perceber como os técnicos possuem uma sobrecarga
burocrática exigida pelo sistema para conseguirem gerir a instituição, o que ocasiona um excesso
administrativo que os enlaça e os mantêm presos nessa rede, sem conseguirem sair sem que
esbarrem numa crise ou desânimo, continuando dessa forma dentro do “grupo-objeto”, que são
mantidos pelas contradições que permeiam os ideais em contraponto aos papéis sociais que ainda
se mantêm fortes e definidos pelo regime político que os cativam.
Para se alcançar a definição do “grupo-sujeito”, que seria o tipo de um grupo forte o
bastante para conseguir uma dialética social construtiva se sobrepondo a alienação do sistema, é
preciso que o grupo se distancie dos vínculos institucionais para pensar em seu ideal, agregando
suas necessidades pessoais a ele, sem regras adestradas e normas hierárquicas que não tenha um
objetivo comum, o que ainda em nossa sociedade é um caminho tortuoso e difícil para a grande
maioria das instituições, já que nosso sistema capitalista promove o exercício da competição e do
individualismo, e não da comunhão solidária e partidária.
Somente é possível pensar na realização do “grupo-sujeito” em duas situações: quando
não há nenhum crivo de moral ou ética entre os membros do grupo que facilitam esse
distanciamento da instituição sem prejuízo a outros grupos, ou; quando há uma prática de
intervenção atuando constantemente com os membros do grupo, fazendo um verdadeiro trabalho
terapêutico para melhor entendimento de seus ideais, conscientizando os indivíduos em suas
necessidades para suas realizações, redefinindo papéis sociais ultrapassados e descartáveis, para
que haja uma nova identidade e, com isso, uma interação social mais produtiva tanto para o
indivíduo, enquanto sujeito de sua história, quanto para o grupo, enquanto produto dessa história.
Não é possível haver transformação sem que haja mudança. E para se mudar é preciso
conhecer os personagens sociais que compõem a história, suas necessidades e seus desejos,
conhecendo sua identidade. Somente pelo autoconhecimento dos papéis que desempenhamos na
sociedade é que podemos mudar nossas ações para transformar nossa realidade, construindo
constantemente novas identidades que não se encaixam com os papéis definidos pela sociedade,
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redefinindo esses papéis que não nos servem e modulando novos, para realização e satisfação
individual, reconstruindo dessa forma nossas múltiplas identidades sociais para formação de uma
totalidade única, mais politizada e mais saudável.
Em uma de suas canções o cantor e compositor Raul Seixas (1945 – 1989) nos alertava:
...Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante...do
que ter aquela velha opinião formada sobre
tudo...sobre o que é o amor, sobre o que eu nem
sei quem sou, se hoje eu sou estrela amanhã já se
apagou, se hoje eu te odeio amanhã lhe tenho
amor, lhe tenho amor, lhe tenho horror, lhe faço
amor, eu sou um ator....
(Raul Seixas, 1973).
Os papéis sociais nos são impostos desde nossa concepção no mundo, e isso infere em um
desenvolvimento psíquico deturpado ou inadequado com sua roupagem social adquirida. É como
vestir uma roupa que não é sua ou não lhe serve mais, ficando desconfortável, causando mal-estar
e até mesmo baixa estima consigo mesmo, já que a velha roupa não favorece suas qualidades e
nem lhe cai bem.
Para uma re-inserção de crianças institucionalizadas na sociedade, é preciso mudar os
papéis sociais que lhe foram impostos, lhes vestindo roupas novas sempre que necessário, saindo
da mesmice que os aprisiona para buscar uma roupagem inédita, que estimule o ânimo e lhes
cause prazer.
Mas para que haja aceitação desse novo papel perante a sociedade, é preciso que tanto o
jovem quanto o grupo social ao qual pertence confirme essa identidade, pois sem isso, seriam
apenas imagens, máscaras representativas de um papel social reprovado pela sociedade,
ocasionando amarras que aprisiona ao sistema vinculado ao papel definido por ela, sem que o
jovem consiga redefinir sua identidade conforme sua necessidade e desejo. Mas infelizmente, o
que vimos pelas entrevistas com a psicóloga e assistente social foram profissionais atados pelo
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sistema, tendo como maior dificuldade a própria sociedade que não disponibiliza ferramentas
mais úteis para inserção dos jovens no mercado de trabalho, dificultando seu ingresso na vida
econômica e conseqüente autonomia social, tendo somente a seu dispor dispositivos que mais
servem a alienação e reprodução de papéis, como projetos disponíveis do governo para cursos
rápidos profissionalizantes, e a falta de aceitação da própria sociedade que os estigmatiza.
Por isso, percebemos que para conseguir essa transformação social é necessário um
agrupamento de pessoas unidas pelo mesmo ideal, para isso seria preciso que tanto os jovens,
quanto os profissionais, a instituição e a comunidade caminhassem juntos em parceria,
confirmando suas identidades e construindo novos papéis, numa dialética social de interação e
transmutação constante, ações construtivas que permitem a transformação de uma cultura, em
sintonia com o progresso da sociedade e evolução do homem, para construção de sua história.
É dessa forma que os grupos refletem sua conduta na sociedade, produzindo cultura e
história, marcas indeléveis que registram nossa passagem no tempo e pela humanidade, como
seres sociais.
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3 - Conclusão
A partir do estudo realizado, observamos que para a instituição conseguir transformar a
realidade das crianças institucionalizadas abrigadas por ela, seria preciso uma intervenção mais
contundente para quebra de paradigmas, compondo novas estruturas que possibilitasse recriar
suas identidades já tão estereotipadas e corrompidas pelo sistema, o que ocasiona uma construção
deturpada das mesmas.
Assim, concluímos que as instituições precisariam ter mais psicólogos atuando para
alcançarem esse objetivo, pois percebemos que a prática da psicologia serve como uma
ferramenta para se alcançar os objetivos de grupos institucionais, atuando como processo
terapêutico em cada membro do grupo, fornecendo-lhes subsídios para ampliação de suas
consciências condizentes com suas reais necessidades e metas, e não seres autômatos encaixados
em papéis que garantam a manutenção e não construção de suas identidades. Somente a partir
dessa reformulação de suas identidades é que o grupo teria consequente transformação em suas
ações, tornando-se construtores de papéis com um novo olhar e novas perspectivas, o que
permitiria maiores possibilidades de mudarem sua história.
Mas, infelizmente, nosso regime político não privilegia causas de responsabilidade social
e nem os favorece, ao contrário, o que se vê são normas e regras rígidas que dificultam a
ampliação e realização de causas comunitárias, engessando os profissionais em seus ideais dentro
das instituições, que muitas vezes se vêem amarrados dentro desse sistema de meros reprodutores
de normas, cumprindo regras e exigências incabíveis, para conseguirem a subsistência necessária
para sobreviverem dentro dessa mesma sociedade que os oprime, sendo difícil de sair por mais
que se queira por ser um regime enraizado em nossa história sociocultural, perpetuada por longos
anos de permissividade e submissão, como vimos anteriormente no tópico sobre crianças
institucionalizadas, sendo, portanto, difícil para instituições como a CCR se manterem em seus
ideais, realizando uma árdua tarefa de responsabilidade social junto às crianças que acolhem,
buscando paulatinamente coexistir frente às contradições sociais, sem fraquejar ou sucumbir ao
nosso sistema deficitário e voraz.
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4 – Referências Bibliográficas
4.1 - Referências Literárias
Bibliografia Básica BOCK, A.M.B. (org). Psicologia e Compromisso Social, São Paulo: Cortez, 2003. CAMPOS, S.O. A., A Clínica do Social e as Formas de Intervenção, TCC de Psicologia,
1997, Unicastelo. Lane, S.T.M., CODO, W. Psicologia Social: o homem em movimento, São Paulo:
Brasiliense, 2006. ______, O que é Psicologia Social, São Paulo: Brasiliense, 1983. RODRIGUES, A., ASSMAR, E.M.L., JABLONSKI, B. Psicologia Social, Petrópolis, RJ:
Vozes, 2007. SPINK, M.J.P Psicologia Social e Saúde, Petrópolis, RJ: Vozes, 2007. VASCONCELOS, E.M. O que é psicologia comunitária, São Paulo: Brasiliense, 1989. Bibliografia de Apoio ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofando: Introdução à Filosofia, São Paulo:
Moderna, 1994. BOCK, A.M.B., FURTADO. O., TEIXEIRA, M.L.T. Psicologias, uma introdução ao
estudo de Psicologia. São Paulo: Ática, 2001. MALDONADO, Maria Tereza. Psicologia da gravidez: parto e puerpério. São Paulo:
Saraiva, 1997. SPITZ, René. O Primeiro Ano de Vida. São Paulo, Martins Fontes, 1991. TEIXEIRA, João Gabriel L.C. A teoria da sociedade em Freud, São Paulo: EPU, 1991. 4.2 – Referências eletrônicas
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deficiência vivendo em abrigos. Disponível em: {http://www.abrapso.org.br/siteprincipal/anexos/AnaisXIVENA}. Acesso em: 24/04/2013.
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para crianças e adolescentes. Disponível em: {http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/publicacoes/bpsociais}. Acesso em: 05/03/2013.
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PEPSIC – Periódico Eletrônico em Psicologia. O significado do abandono para crianças
institucionalizadas. Disponível em: {http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?pid=S1677-11682005000100003&script=sci_arttext}. Acesso em: 05/03/2013.
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esquecimento. Disponível em: {http://www.sbpj.org/materias/Abrigamento_Prolongado.doc}. Acesso em: 26/04/2013.
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UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Programa de Pós-Graduação em Psicologia Social e Institucional. Abrigos para adolescentes - função de lar transitório? Disponível em: {http://www.proceedings.scielo.br/scielo.php?pid=MSC0000000082005000200060&script=sci_arttext}. Acesso em: 05/03/2013.
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