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388 A INTERNET NA ESCOLA COMO SUPORTE PARA TRABALHO COM PROJETOS EM MATEMÁTICA Miriam Godoy PENTEADO 1 Maria Dirlene da SILVA CATTAI 2 Adriana Ribeiro LANNES 2 Denival BIOTTO FILHO 3 Rodrigo Montenegro REIS SILVA 3 Jader Franco GÓES 3 Ronaldo Rouvher GUEDES SILVA 3 Marcelo GASPAROTO 3 Resumo: Este artigo traz uma reflexão sobre um trabalho realizado em parceria com professores de matemática de escolas da Rede Estadual de Ensino de São Paulo. É uma tentativa de contribuir com a discussão sobre o uso de tecnologia informática nas escolas. Há uma seção sobre a Internet e seu uso nas escolas e então um relato das atividades desenvolvidas nas cinco escolas, através do Projeto intitulado “Projetando o seu futuro”. Utilizou-se o ambiente Teleduc como suporte para as interações virtuais. A análise do trabalho realizado permitiu afirmar que em relação ao uso da Internet não se conseguiu fazer com que a comunicação eletrônica tivesse o alcance planejado. São muitos os problemas técnicos e falta de manutenção dos laboratórios. Os alunos demonstraram interesse em utilizar a Internet, em especial o fato de poder habitá-la com registro de sua própria produção. A experiência também foi uma contribuição para o desenvolvimento profissional dos professores envolvidos. Palavras-chave: Internet; trabalho com projetos; Educação Matemática. INTRODUÇÃO Neste artigo trazemos uma reflexão sobre um trabalho realizado em parceria com professores de matemática de escolas da Rede Estadual de Ensino de São Paulo. A nossa temática de trabalho nos últimos anos tem sido o uso de tecnologia da informação e comunicação (TIC) nas escolas. Além do uso de software em situações de ensino e aprendizagem de um determinado conteúdo matemático nos voltamos também para o estudo da Internet. Fala–se muito da potencialidade dessa tecnologia para transformar a educação escolar. A possibilidade de acesso a informações diversas e, principalmente, de aproximar pessoas que estão em territórios distantes é algo pouco explorado no âmbito da escola pública. A reflexão que apresentamos aqui é uma tentativa de ampliar e contribuir para a discussão sobre esta temática. Iniciamos com uma seção sobre a Internet e seu uso nas escolas e então seguimos para um relato das atividades desenvolvidas nas escolas, através do Projeto intitulado “Projetando o seu futuro”. 1 Professora do Departamento de Matemática, IGCE, Unesp, Rio Claro. Coordenadora do Projeto vinculado ao Núcleo de Ensino. 2 Professora de Matemática de uma das escolas participantes do projeto. 3 Alunos de graduação em Matemática do IGCE envolvidos no projeto.

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A INTERNET NA ESCOLA COMO SUPORTE PARA TRABALHO COM PROJETOS EM MATEMÁTICA

Miriam Godoy PENTEADO1 Maria Dirlene da SILVA CATTAI2

Adriana Ribeiro LANNES2 Denival BIOTTO FILHO3

Rodrigo Montenegro REIS SILVA3 Jader Franco GÓES3

Ronaldo Rouvher GUEDES SILVA3 Marcelo GASPAROTO3

Resumo: Este artigo traz uma reflexão sobre um trabalho realizado em parceria com professores de matemática de escolas da Rede Estadual de Ensino de São Paulo. É uma tentativa de contribuir com a discussão sobre o uso de tecnologia informática nas escolas. Há uma seção sobre a Internet e seu uso nas escolas e então um relato das atividades desenvolvidas nas cinco escolas, através do Projeto intitulado “Projetando o seu futuro”. Utilizou-se o ambiente Teleduc como suporte para as interações virtuais. A análise do trabalho realizado permitiu afirmar que em relação ao uso da Internet não se conseguiu fazer com que a comunicação eletrônica tivesse o alcance planejado. São muitos os problemas técnicos e falta de manutenção dos laboratórios. Os alunos demonstraram interesse em utilizar a Internet, em especial o fato de poder habitá-la com registro de sua própria produção. A experiência também foi uma contribuição para o desenvolvimento profissional dos professores envolvidos.

Palavras-chave: Internet; trabalho com projetos; Educação Matemática.

INTRODUÇÃO

Neste artigo trazemos uma reflexão sobre um trabalho realizado em parceria com

professores de matemática de escolas da Rede Estadual de Ensino de São Paulo. A nossa

temática de trabalho nos últimos anos tem sido o uso de tecnologia da informação e comunicação

(TIC) nas escolas. Além do uso de software em situações de ensino e aprendizagem de um

determinado conteúdo matemático nos voltamos também para o estudo da Internet. Fala–se muito

da potencialidade dessa tecnologia para transformar a educação escolar. A possibilidade de

acesso a informações diversas e, principalmente, de aproximar pessoas que estão em territórios

distantes é algo pouco explorado no âmbito da escola pública. A reflexão que apresentamos aqui é

uma tentativa de ampliar e contribuir para a discussão sobre esta temática. Iniciamos com uma

seção sobre a Internet e seu uso nas escolas e então seguimos para um relato das atividades

desenvolvidas nas escolas, através do Projeto intitulado “Projetando o seu futuro”.

1Professora do Departamento de Matemática, IGCE, Unesp, Rio Claro. Coordenadora do Projeto vinculado ao Núcleo de Ensino. 2Professora de Matemática de uma das escolas participantes do projeto. 3Alunos de graduação em Matemática do IGCE envolvidos no projeto.

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A INTERNET NA ESCOLA

A Internet é considerada uma mídia aberta e descentralizada. Cada um pode

acessar o que melhor lhe convir e fazer contato com quem quiser. É possível criar seu próprio

ritmo de navegação2. Não importa a distância nem o local, uma vez conectados, podemos nos

comunicar com pessoas em qualquer parte do mundo. É crescente o uso da Internet nas

atividades diárias e esforços têm sido feitos no sentido de ampliar a possibilidade de seu uso. Hoje

em dia não ter acesso a Internet é um sinal de exclusão social.3

No que diz respeito às escolas seu uso também tem aumentado. No ensino superior

encontramos um destacado avanço. Hoje podemos encontrar várias faculdades que trabalham

com educadores e educandos em lugares diferentes, e horários mais flexíveis, vídeo aulas, vídeo

conferência. Algumas também oferecem plantões de dúvidas na Internet em que um professor

permanece on line durante um período de tempo para que o aluno faça contato. Neste nível de

ensino a Internet tem servido tanto para cursos totalmente a distância como para suporte aos

tradicionais cursos presenciais.

Já no nível fundamental ou médio o uso da Internet está em ritmo lento mas há um

crescimento do interesse governamental em impulsionar a chegada de computadores nas escolas.

Isso é notado em escolas da Rede Pública do Estado de São Paulo em que é possível encontrar

laboratórios amplos com um número razoável de computadores, aparelho de DVD, computador

interligado a TV de 29 polegadas e conexão com Internet banda larga. Importante ressaltar aqui

que a quantidade de escolas neste nível está longe de ser satisfatória.

Em geral são muitos alunos para poucas máquinas. Além disso, mesmo as que

possuem um laboratório de informática adequado à realização de tarefas envolvendo a Internet,

nem sempre o fazem porque a simples disponibilidade de tecnologia não significa garantia de

sucesso desse tipo de atividade. A gestão escolar é fundamental aqui. Muitas vezes a falta de

planejamento da própria escola e as atitudes de coordenadores e diretores podem obstruir as

iniciativas dos docentes. Pode ocorrer intimidações, como por exemplo se a direção atribuir ao

professor a responsabilidade sobre qualquer dano causado nos equipamentos. Que professor de

escola pública quer se arriscar a assumir tal responsabilidade sozinho? Isso acarreta uma

sobrecarga de trabalho que poucos professores estão dispostos a enfrentar. Além da sobrecarga

de trabalho tem também o aspecto da formação. Muitas vezes, talvez na maioria dos casos, a falta

de envolvimento dos professores não é simplesmente para esquivar-se de mais trabalho, e sim por

não ter formação para isso. Por toda essa problemática, o sucesso do uso de TIC nas escolas

2Esta é uma expressão bastante utilizada na literatura: “navegar pela Internet” que significa acessar os vários sites disponíveis. 3Uma discussão detalhada sobre esse aspecto é feita por Castells (1996)

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pressupõe uma alteração na cultura do trabalho docente no sentido de um maior compartilhamento

das ações.4

Não queremos aqui fazer uma apologia ao uso da Internet como algo que vai

melhorar o sistema educacional. Na verdade pouco se sabe sobre as vantagens dessa adoção em

larga escala. É preciso pesquisar e conhecer melhor suas contribuições. Não podemos ter a

ingenuidade de crer que a Internet resolverá todos os problemas da Educação.

Certamente o uso de uma tal tecnologia implica um novo papel tanto para alunos,

quanto para professores. Abre possibilidades para novas abordagens metodológicas tais como os

trabalhos em grupos em torno de um tema. O professor deixa de ser o centro das informações

para o aluno. Muitas coisas o aluno descobre através de sua navegação e traz como contribuição

para a sala de aula. (BORBA & PENTEADO, 2001)

A nossa perspectiva para o uso de Internet na escola é para estimular que os alunos

trabalhem em grupos na investigação de determinados temas e que esse trabalho possa ser

realizado também com a colaboração de pessoas que estão distantes geograficamente da escola.5

A idéia é ampliar a rede de interlocutores dos alunos e professores.

Em uma rede as relações entretecem-se, articulam-se em teias, em redes, construídas social e individualmente, e em permanente estado de atualização. A rede é constituída por nós e ligações.(...) As ligações são as relações entre os nós. Os nós e as ligações (...) criam relações de reciprocidade, de dualidade, de não-linearidade, de múltiplas articulações, de abertura a mudanças. (MACHADO, 1995 p. 138 apud ALMEIDA, 2000 p.73)

Vejamos algumas ferramentas computacionais que podem ser utilizadas nessa

perspectiva de trabalho colaborativo:

Correio eletrônico

- pode servir como meio de comunicação entre professores e alunos;

- uma maior facilidade de comunicação;

- criação de grupos de discussão.

FTP – Transferência de pastas de dados

- permite compartilhar informações (ex: material de estudo) numa escola ou rede de

escolas;

- recolher dados de bibliotecas informatizadas.

4Penteado (2001) traz uma discussão detalhada sobre os riscos do uso de TIC para os professores. 5Atividades denominadas de projetos telecolaborativos. Ver mais detalhes sobre isso em Penteado, Biotto Filho & Silva (2006).

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Bate papo on line

- fazer conferência sobre temas específicos de uma disciplina ou material de estudo;

- debates entre alunos de diferentes escolas;

Existem vários ambientes computacionais que integram essas ferramentas e são

especialmente desenhados para dar suporte ao trabalho colaborativo pela Internet. Em nossa

pesquisa as escolas utilizaram o ambiente Teleduc6. A seguir descreveremos algumas das

possibilidades deste ambiente para a interação entre alunos e professores:

Em “Material de Apoio” podemos disponibilizar artigos, dissertações, etc;

Geralmente é disponibilizado pelo coordenador da atividade. As discussões podem ser feitas na

sala de bate-papo (link bate-papo). Neste ambiente a comunicação se dá através da escrita e

impera a informalidade. A preocupação não é escrever corretamente o idioma e sim transmitir uma

idéia. A colaboração ocorre de forma síncrona e em tempo real, onde acontece o que Borba &

Penteado (2001) descrevem como multiálogo, o acontecimento de diversos diálogos

entrecruzados.

Há também a possibilidade de se enviar mensagens de correio eletrônico para todos

ou para apenas um dos participantes com cópia para e-mail externo. Esse tipo de comunicação

acontece de forma assíncrona. Ainda de forma assíncrona pode-se utilizar o ‘fórum’ que permite a

criação de temas de discussão e as pessoas contribuem cada qual conforme seu tempo. As

mensagens ficam disponíveis para todos os participantes. O fórum é organizado por temas.

Há o mural para divulgação de notícias. Existem ainda outras ferramentas tais como

portifólio para que cada participante disponibilize seu material. Segue abaixo uma tela do Teleduc.

6 http://teleduc.unicamp.br/teleduc/

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A seguir descrevemos as atividades realizadas pelas escolas participantes de nossa

pesquisa.

O TRABALHO NAS ESCOLAS O trabalho realizado na escola teve como base a perspectiva acima mencionada. O

seu objetivo era ampliar nossa compreensão sobre o uso da Internet em atividades pedagógicas.

Para isso, contatamos escolas que possuíam acesso à Internet, quer na sala de informática ou na

secretaria. Manifestaram interesse e participaram inicialmente do projeto quatro7 escolas da cidade

de Rio Claro e uma da cidade de Araras. A equipe foi formada por professores das escolas,

pesquisadores da Unesp e alunos do curso de licenciatura em Matemática da Unesp. Grande

parte já havia trabalhado em projetos anteriores conosco.

Uma vez definida a equipe, passamos a fazer reuniões semanais para discussão de

como organizar as atividades com os alunos. Nossa idéia era trabalhar a Matemática com base em

problemas não necessariamente matemáticos8. A maioria da equipe já havia estudado aspectos

teóricos dessa abordagem e desenvolvido atividades dessa natureza em projetos anteriores. A

discussão girava em torno de como trabalhar colaborativamente com diferentes escolas.

Passamos um bom tempo discutindo se o tema deveria ser livre de forma que cada aluno

escolhesse sobre o que gostaria de pesquisar, ou seria um tema diferente por escola ou ainda se

seria um mesmo tema para todas as escolas. Decidimos que seria um mesmo tema para todas as

escolas pois achávamos que isso facilitaria a interação entre os alunos já que estariam tratando de

7Iniciamos com quatro escolas em Rio Claro mas em uma delas o trabalho foi interrompido. Os motivos são expostos na seção sobre o trabalho nas escolas. 8Metodologia de trabalho com projetos ou aprendizagem baseada em problemas. Em Inglês a sigla é PBL – problem based learning

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um mesmo assunto. Uma professora trouxe um material9 com sugestões de temas para trabalhos

dessa natureza. Dois foram os temas que nos chamaram mais a atenção. Um era sobre escolha

profissional, que envolvia pesquisar o mercado de trabalho, salário, vocações e influências. O

outro abordava o assunto consumo, que envolvia a pesquisa sobre Código de Defesa do

Consumidor, cesta básica, comparação de preços, despesas e prazo de validade. Inicialmente

pensamos em fazer uma reunião desses projetos e usar a proposta de atividades que os

acompanhavam. Mas de nossos estudos sobre o trabalho com projetos como prática pedagógica,

entendíamos que aquelas atividades propostas pelo livro eram muito diretivas. Precisávamos de

uma orientação mais aberta de forma a possibilitar diferentes caminhos de investigação por parte

dos alunos. Após muita conversa, decidimos por propor uma situação comum para todos mas a

forma de investigá-la seria discutida e decidida com cada grupo de alunos.

A situação apresentada aos alunos foi a seguinte: Título: Projetando o seu futuro.

"Imagine que você já é adulto, tem uma profissão e precisa investigar sobre as condições para

morar sozinho e se sustentar de forma a viver bem’”.

Investigar isso implicava, dentre outras coisas, escolher e pesquisar uma profissão,

o mercado de trabalho, o que consideravam como viver bem, o que precisavam para morar

sozinho, que gastos teriam e qual um salário para manter uma vida como aquela.

É importante observar que para chegarmos a esta decisão foram necessários vários

encontros, discussões, negociação e simulação do que aconteceria com os alunos. Fizemos isso

presencialmente e também pela Internet. O próximo passo foi pensar na operacionalização. A

primeira questão a ser resolvida era: trabalhar com uma classe toda ou com um grupo de alunos

num horário extra? Tendo em vista o número reduzido de computadores nas escolas e também o

fato de que queríamos uma participação voluntária dos alunos, resolvemos que faríamos em

horário extra-aula com um grupo de nove alunos em média por escola, na faixa etária entre 14 e

17 anos. O trabalho teria a duração aproximada de dez encontros. Durante o desenvolvimento, os

alunos de uma escola fariam contato com os de outra através da Internet. Para isso utilizaríamos o

Teleduc como base de integração do trabalho das cinco escolas. Os grupos deveriam armazenar e

disponibilizar tudo o que produziam durante o projeto, para que se pudesse conhecer o que estava

sendo feito em cada uma das escolas. Podia-se saber o que outros grupos estavam

desenvolvendo, dar sugestões, fazer perguntas e comentários. Ao final do trabalho nas escolas,

haveria um encontro presencial com todos os participantes. Vejamos a seguir o rumo que cada

escola perseguiu.

Escola A 9Livros da Coleção Educação Matemática, 5ª a 8ª série, Célia Carolino Pires, Edda Curi e Ruy Pietropaolo. Atual Editora, São Paulo, 2002.

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Esta escola se localiza ao lado da universidade, num bairro afastado do centro da

cidade, e trabalha há muitos anos em parceria conosco. Possui uma boa sala de informática com

cerca de 10 computadores e conexão com Internet banda larga. Muitos professores costumam

usar esta sala para dar aulas, e a direção incentiva e apóia bastante esse tipo de atividade.

Aqui contamos com a participação de dez alunos e foram realizados dez encontros.

Iniciamos com a apresentação da proposta. Em seguida eles escolheram as profissões e

começaram a planejar as atividades que desenvolveriam para projetar o futuro. Nesta escola o

principal instrumento de pesquisa foi a Internet. A maioria dos alunos não tinha acesso a ela em

casa, assim poder usá-la na escola foi essencial para a pesquisa. Ao final de cada encontro, eles

acessavam o Teleduc para arquivar e compartilhar o que descobriam. Vale lembrar que houve um

momento de familiarização com o Teleduc o que não ocupou muito tempo pois ele é muito fácil de

ser usado.

O primeiro passo dos alunos foi pesquisar sobre profissões. Entre as escolhidas

estavam: professor de matemática, engenheiro mecânico, jornalista, dona de loja de roupas,

bióloga, veterinária e ator. Depois eles pesquisaram que estudos eram necessários para

exercerem aquelas profissões, e escolheram as instituições em que estudariam. Também

pesquisaram o mercado de trabalho e o salário. Interessante que durante essas pesquisas muitos

mudaram de profissão e outros optaram por ter duas profissões: uma para se manter, outra para

‘fazer o que gostavam’.

Após a pesquisa das profissões, cada um dos alunos construiu uma tabela (tabela

1) com a previsão de seus gastos mensais. Eles incluíram gastos com produtos de limpeza, de

higiene pessoal, comida, energia elétrica, água, gás, roupas, transporte, produtos pessoais,

aluguel e telefone. Alguns incluíram gastos com Internet (banda larga), plano de saúde e lazer.

Tabela 1 - Tabela de gastos mensais de uma aluna (em R$)

Produtos de limpeza 25,00

Mercado 250,00

Energia elétrica 50,00

Água e esgoto 25,00

Gás 14,00

Roupa 150,00

Transporte 350,00

Produtos pessoais 50,00

Financiamento da casa 350,00

Telefone 50,00

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Este encontro em que foram planejadas as

despesas gerou muitas discussões que se estenderam

por mais dois encontros.

Uma delas foi sobre os valores a serem gastos:

“Quanto seria gasto por mês em comida? Em telefone?

Em aluguel?...” Eles davam opiniões nos gastos uns dos

outros e chegavam a um consenso sobre o que é ‘gastar

demais’ (ou insuficientemente) em cada item.

Também foi bastante discutido sobre o que eles

iriam possuir e como comprariam: “Vou ter automóvel?

Vou ter quais eletrodomésticos? Eles são econômicos?

Como vou comprá-los: à vista ou a prazo?...”

Interessante que muitos mudaram suas escolhas depois

destas conversas.

Outro problema foi sobre a compra da casa: “O

que é melhor: comprar ou alugar uma casa? Financiá-

la?...” Para os alunos, o aluguel de uma casa

aumentava muito o valor das despesas. E era muito

caro comprar uma.

Uma aluna até

chegou a dizer: “O

melhor é eu ficar morando com meus pais!”

No nono encontro, eles compararam seus salários e

suas despesas e analisaram quais os ajustes que poderiam

fazer, caso fossem necessários.

No décimo encontro foi solicitado que eles fizessem

uma redação. Deveriam tratar sobre os planos para o futuro e

incluir o que tinham pesquisado nos encontros passados sobre

os salários e as despesas10.

10 Veja Quadro 1 e Quadro 2.

Quadro 1 - redação de um aluno

“(...) sou ator de teatro e produtor diretor,

(...) gasto por mês r$2000,00, sei que é

com coisas banais, mas também com

coisas importantes, (...) e sempre lutando

por uma vaga maior em um outro teatro, e

quem sabe talvez numa novela. (...) a

minha casa é financiada (...), pago também

o meu carro em 24 parcelas (...). mas

aonde eu tento economizar e não consigo é

no supermercado (...) e todo mês tenho que

comprar pelo menos uma peça de roupa,

pois é feio ir sempre ao teatro com a

mesma roupa. (...) passei por situações

críticas para estudar cinema e artes

cênicas. agora quero fazer medicina, afinal,

foi um dos meus primeiros sonhos. nos fins

de semana vou visitar a minha mãe. e lá vai

gasolina. (...) quase não sobra nada para

mim, mas tenho tudo (quase) que sempre

sonhei. (...) sempre que posso ajudo a

minha mãe. (...)”

Quadro 2 - Redação de uma aluna

“(...) Tenho 25 anos. Cursei uma

faculdade. (...) morei com meus

pais até conseguir um emprego fixo,

(...) hoje sou formada em

administração, tomo conta de minha

própria loja que consegui com a

ajuda de meus pais. Tenho minha

casa própria que consegui comprar

com meu salário. Mobiliei minha

casa por partes, comprando uma

coisa por vez, sem pressa. Gasto,

por mês, em média, R$ 1311,00,

com (...)”

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Escola B Esta escola se situa na periferia da cidade e a maior parte dos alunos que a

freqüenta é de classe econômica não muito favorecida. Da mesma forma que na escola anterior,

aqui participaram dez alunos. A escola possui sala de informática, mas seus computadores não

são conectados à Internet. Na secretaria havia um computador conectado a Internet mas somente

em dois encontros eles conseguiram usar esse computador para conhecer o Teleduc. A maioria

das informações sobre o projeto era disponibilizada pela professora a partir de acesso a Internet

de sua casa. Durante os encontros, que aconteciam em período contrário ao das aulas dos alunos,

eles se reuniam e relatavam o que haviam pesquisado sobre suas profissões. O principal meio de

pesquisa deles foi entrevistar profissionais relacionados à sua escolha; também usaram guias de

profissões e ajuda de professores que conheciam melhor a profissão.

Os alunos calcularam e anotaram os gastos mensais e também os gastos que

teriam com móveis, eletrônicos e utensílios domésticos. Alguns alunos foram bastante detalhistas

nesta atividade. Por exemplo, um deles pensou em: garfos, xícaras, toalhas, pano de prato, etc.

Ele tentou pensar em tudo o que se precisa em uma casa. Além disso, ele teria uma casa muito

bem equipada: com computador, TV 29", DVD, etc. Outra aluna chegou até mesmo a fazer a

previsão de quantas escovas de dentes teria que comprar. Ainda outro calculou quanto precisava

para comprar uma casa, pois queria financiar uma, visto que achava o aluguel muito caro; ele fez

uma previsão para saber por quanto tempo teria que depositar 300 reais por mês na poupança

para ter o dinheiro para comprá-la. Enquanto que para outro aluno poucas coisas tais como: uma

cama - esqueceu o colchão - TV, sofá, fogão, eram suficientes para viver bem. Segue alguns

destaques do trabalho que os alunos desenvolveram nesta escola.

Profissão escolhida: Psicóloga

Pessoa entrevistada: Uma tia que é psicóloga. Ela tinha bastante pacientes, mas passou a morar em outra cidade e a ter apenas três pacientes.

Formação: É necessário fazer o curso de Psicologia que dura 5 anos (na faculdade que a tia fez). A tia possuía uma bolsa de estudos e tinha apenas as despesas com o transporte (a faculdade era numa cidade vizinha). Segundo ela, nos dois primeiros anos são estudadas disciplinas como Matemática, Português e Ciências, e depois se estudam as matérias específicas da Psicologia.

Salário: Depende do número de pacientes que a pessoa tiver.

Comentário: Este item gerou uma discussão interessante. A aluna conversou com sua tia por telefone. A tia deu o exemplo: “se ela tivesse 10 pacientes, com uma sessão por semana, cobrando R$ 50,00 por sessão...”. A aluna responde: “então ela irá ganhar R$ 500,00 por semana”. A conversa com a tia continuou, e a aluna foi anotando algumas contas em seu caderno. Durante o encontro ela reviu em seu caderno: 4 x 500 = 2000, mas ela não sabia por que havia anotado: “Eu não sei de onde saiu isso: 4 x 500 = 2000”. O grupo raciocinou: “Se ela tivesse 10 pacientes, quanto ganharia por semana? Quantas semanas têm em um mês? Quanto ela ganharia por mês?”.

Local de trabalho: A pessoa precisa ter um consultório ou uma clínica. Mas, no início até ela conseguir dinheiro suficiente para montar o consultório, pode trabalhar na Prefeitura, dando assistência aos alunos das escolas públicas que precisarem de atendimento. Isso levantou a seguinte questão: “O que é preciso para trabalhar na Prefeitura? Há vagas? Não é sempre que a Prefeitura contrata psicólogos”.

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Profissão escolhida: Administrador de Fazendas

Pessoa entrevistada: Um funcionário de uma universidade e um fazendeiro.

Formação: O funcionário da universidade o informou que poderia fazer um curso de Administração, de Agrimensura ou de Zootecnia. Já o fazendeiro, disse que ele não precisa fazer nenhum curso: “é só ir ao sítio, começar a trabalhar, aprender o serviço e tentar arrumar um emprego de administrador de fazendas”.

Salário: Segundo o fazendeiro, o salário pode chegar a R$ 3.000,00. E segundo o funcionário, R$ 10.000,00. O aluno ficou bastante entusiasmado com esses valores!

Escola C Esta é uma das principais escolas de Rio Claro, situada no centro da cidade, que

recebe em sua maioria alunos de bairros próximos com um nível social um pouco mais elevado do

que os das outras escolas envolvidas no projeto. A sala de informática possuía oito computadores,

ligados em rede, mas sem acesso a Internet.

Houve uma proposta da direção para que o trabalho envolvesse as turmas do

período da manhã e da noite. Decidiu-se trabalhar com 10 alunos do período da manhã, com

participação voluntária e envolver uma classe toda do período da noite – 40 alunos. Foi um grande

desafio envolver esse número de alunos com participação compulsória.

Nessa turma a idade dos alunos estava entre 18 e 24 anos. A professora de

matemática era a mesma para o período da manhã e da noite. Para amenizar o problema de falta

de espaço e de computadores no laboratório de informática, a turma foi dividida em cinco grupos

com uma média de oito alunos em cada um sendo que três grupos trabalhavam em uma aula

dupla e dois em outra, dividindo assim a turma entre o laboratório de informática e a sala de aula

com a professora. No laboratório de Informática, as atividades eram orientadas por dois alunos da

graduação da Unesp.

Abaixo o exemplo de uma apresentação de uma aluna do noturno:

Oiiieeeeeee.

Meu nome é Maria11, estou no 3°D na escola XXX.

Nasci em Bambuí –MG mas moro em Rio Claro há 8 anos.

Tenho como perspectiva do meu futuro fazer faculdade de DANÇA, mas prestar vestibular para dança esse ano será quase impossível, porém estou indecisa entre Biologia ou Educação Física, mas eu não sei nadar para prestar Educação Física. Contudo tenho preferência por Educação Física e depois me especializar em dança e no futuro abrir uma Academia de dança Evangélica. e trabalhar com projetos Sociais em Presídios, Febens e Favelas.

Os alunos do noturno, em geral, já trabalham, porém nenhum deles tomou sua

profissão atual como a desejada para o futuro. Outro ponto de destaque é que a maioria já tinha

familiaridade com os computadores e isso facilitou o trabalho.

11Nome fictício

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Devido ao grande número de alunos, as atividades foram mais dirigidas se

comparadas com as das outras escolas. Embora tenha havido uma boa participação, é importante

ressaltar que nem todos estavam interessados. Isso ficou explicito pela excessiva ausência dos

alunos nas aulas, em particular na véspera de feriados. É importante lembrar que na turma da

noite os alunos não tinham a opção de não participar do projeto.

Com a turma da manhã o trabalho foi desenvolvido durante doze encontros e

envolveu dez alunos da terceira série do ensino médio com idade entre 17 e 19 anos. Houve um

grande número de interessados e foi preciso fazer uma seleção. O projeto foi desenvolvido durante

as aulas de matemática: das cinco aulas semanais, duas foram dedicadas ao projeto. A idéia era

estudar o conteúdo de matemática financeira no contexto da situação problema proposta.

Enquanto esse grupo trabalhava no projeto, o restante da classe ficava trabalhando com a

professora na sala de aula.

O primeiro encontro foi dedicado à discussão da situação proposta e da

necessidade de pesquisa. Foi surpresa perceber que muitos alunos já tinham em mente suas

profissões e até alguns planos para alcançá-las. Uma vez definida a profissão, iniciou-se a fase de

pesquisa. Como a escola estava sem Internet, essa fase foi feita em casa pelos alunos. Os que

não possuíam acesso a Internet, eram auxiliado pelo material levado pelos orientadores. Este

material era composto de revistas, jornais e panfletos.

Nos encontros seguintes, foram discutidos os resultados das pesquisas sobre os

salários, mercado de trabalho e a formação necessária. Isto foi feito no laboratório de informática,

os dados foram preparados para serem posteriormente adicionados ao Teleduc.

Abaixo segue a apresentação de um aluno.

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Posteriormente, a discussão girou em torno do que se entendia por “viver bem” e a

conclusão foi a de que era preciso ter uma harmonia entre boa situação financeira e boa saúde. A

partir dessa discussão cada um elaborou uma lista sobre o que necessitaria para viver bem. Essa

lista também foi objeto de discussão na sala. Por que precisamos disso ou daquilo? A seguir,

fizeram um levantamento do custo de vida que haviam planejado. Neste momento o acesso à

Internet na escola fez muita falta. Para auxiliar, foram fornecidos diversos jornais e panfletos de

lojas com artigos que continham nas listas.

Os alunos perceberam que várias listas eram impossíveis de serem mantidas com o

salário que receberiam. Alguns incluíram aplicação na poupança, e calcularam os juros para a

compra de um imóvel e o parcelamento em lojas. Fizeram até um ‘projeto de casamento’. Nesse

momento o conteúdo de matemática financeira foi importante. Utilizamos os computadores em

quase todo o projeto com planilhas de cálculos e produção de textos.

Chegou-se a um ponto em que os próprios alunos teriam que decidir sobre o ‘rumo’

de suas vidas, principalmente aqueles que concluíram que o salário não supria as despesas. A

solução tomada por alguns foi diminuir a lista de consumo. Outros, optaram por mudar a profissão.

Em geral o trabalho nessa escola transcorreu bem apesar da deficiência do

laboratório de informática. O laboratório possuía oito máquinas e ao final do projeto elas foram se

danificando e apenas três estavam operando.

ESCOLA D Esta escola também está situada em um bairro de periferia de Rio Claro e tem aulas

nos períodos da manhã, da tarde e noite. Iniciamos nosso trabalho com alunos do período da

manhã. Neste período funcionam salas do 2º. Ciclo do Ensino Fundamental. Optamos por alunos

com mais de 13 anos, ou seja, os que cursavam as 7ªs e 8ªs séries. Eles deveriam voltar à escola

no período da tarde para desenvolver as atividades.

A seleção dos alunos foi feita pela professora de Matemática a partir de conversas

com eles na sala de aula. Nem todos os alunos podiam voltar para a escola para atividades extras,

porque trabalhavam ou porque não tinham quem os trouxessem até a escola. Com tudo isso

considerado, oito alunos manifestaram interesse em participar. A administração da escola

colaborou bastante com o projeto. Apesar de se interessar por este tipo de parceria, ela raramente

o faz, pois está localizada em um bairro muito distante da universidade.

O primeiro encontro foi utilizado para uma atividade de familiarização com o

computador já que poucos sabiam utilizá-lo. Contou com a participação de seis alunos. Iniciar com

o computador e explorar a Internet fascinou os alunos presentes. Aproveitou-se essa oportunidade

para providenciar um endereço de e-mail para quem ainda não o possuía.

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O segundo encontro contou com apenas quatro alunos, e foi dada a continuidade na

exploração de sites de busca na Internet e como utilizar o Teleduc. Houve uma conversa com os

alunos sobre a necessidade de presença nos encontros. A professora de Matemática se

comprometeu a auxiliá-los nas pesquisas em horário de aula.

Abaixo segue a profissão escolhida e a apresentação no Teleduc de um aluno desta

escola:

A partir desse encontro a situação tomou um rumo desfavorável para a continuidade

das atividades. Houve uma interrupção por coincidir com feriados. Além disso, vários encontros

tiveram que ser cancelados porque a prioridade do uso da sala de informática tinha sido dada para

projetos de recuperação de alunos com rendimento insuficiente em outras disciplinas. Não

conseguimos retomar as atividades com os alunos e o trabalho foi suspenso a partir do segundo

encontro.

ESCOLA E A escola E é situada no centro da cidade de Araras e recebe estudantes de vários

bairros da periferia e também do centro da cidade É uma escola que, assim como a maioria das

escolas, segundo os professores, apresenta muitos problemas de disciplina. Participaram do

projeto doze alunos, com faixa etária entre 14 e 16 anos de idade. Vale ressaltar que não houve

qualquer problema relacionado à indisciplina entre os participantes durante o projeto.

Os encontros semanais eram realizados no período contrário ao horário de aula. O

local dos encontros alternava entre a sala de informática e a sala de aula. Nas reuniões realizadas

na sala de aula eles sentavam em círculos e discutiam o tema e os assuntos específicos do

projeto. Na sala de informática, eles utilizavam os computadores conforme a necessidade.

Primeiramente, o tema foi exposto aos estudantes e iniciou-se a pesquisa sobre as

profissões. Foram levantados aspectos tais como o salário, mercado de trabalho, a qualificação

necessária entre outros. Depois os alunos expuseram e discutiram o que pesquisaram. Mas os

dados das pesquisas e das discussões não estavam sendo registrados. Por isso, distribuímos

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fichas para serem preenchidas a fim de facilitar a fase de registro das informações. As fichas

constavam do seguinte:

Você agora é um profissional, descreva: Sua profissão; Seu salário; Seu nível de escolaridade; Mais detalhes que julgar importante sobre sua profissão. Você vive sozinho e é o profissional que escolheu, diga o que é necessário para viver bem e descreva seus gastos mensais.

No decorrer das pesquisas, alguns alunos resolveram mudar de profissão e outros

demoraram mais tempo que os demais para definir a escolha. Quando começaram a analisar o

custo de vida, todos eles se lembravam de gastos com celular, roupas, passeios, mas, por outro

lado, eles não tinham muita noção do que precisava para se alimentar durante um mês, isso

produziu grande discussão entre os alunos para que pudessem fazer esta análise. Ao compararem

os gastos e o salário perceberam que apenas uma aluna tinha os gastos dentro de seu orçamento.

Neste momento, passaram a repensar as escolhas feitas, tanto de profissão, como, e

principalmente, dos gastos, até poderem chegar num equilíbrio entre despesas e salário.

Inicialmente, tentou-se utilizar a Internet para pesquisa na escola. Porém, isso não

foi possível porque dos dez computadores disponíveis apenas dois permitiam o acesso à Internet,

e mesmo esses, tinham a conexão muito lenta. No restante dos computadores a conexão era

interrompida antes mesmo de se conseguir acessar o Teleduc. Por isso, os alunos passaram a

usar a Internet em casa, e aqueles que não tinham esse acesso, o faziam em lan houses12. Além

da Internet, os alunos entrevistaram profissionais da área e parentes. Também pesquisaram em

jornais, revistas e publicações das universidades.

Devido ao problema de lentidão dos computadores no acesso à Internet os alunos

tiveram dificuldade no processo de alteração da senha do Teleduc. Com isso só começaram a

interagir com os alunos das demais escolas a partir da terceira semana.

12são lojas que cobram um valor por hora para se utilizar o computador com acesso a Internet.

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ENCONTRO PRESENCIAL O encontro presencial, para encerramento das atividades, aconteceu no dia 1 de

dezembro, nas dependências do Departamento de Matemática. Todas as escolas participantes

enviaram representantes. Muitos alunos não conheciam a universidade e estavam bastante

ansiosos com esta visita. Até mesmo um aluno que não participou do projeto pediu para ir ao

encontro.

Cada grupo liderado pela professora fez uma apresentação em power point. Depois

cada um dos alunos falava um pouco da profissão escolhida, do futuro planejado, e também da

sua própria atuação no projeto (como pesquisou, etc). Os que estavam assistindo podiam fazer

questionamentos.

Veja abaixo a foto de um slide de uma das apresentações.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste artigo relatamos um trabalho que buscou inserir o uso da Internet para dar

suporte ao processo de interação entre alunos de diferentes escolas. Descrevemos como as

atividades ocorreram em cada escola e as dificuldades encontradas.

A abordagem baseada numa situação problema e a forma como foi conduzida

possibilitou aos alunos uma reflexão matemática diferente das que acontecem normalmente nas

salas de aulas. No momento em que os alunos tiveram que tomar decisões sobre comprar ou

alugar uma casa, e dizer de onde sairia o dinheiro para isso, houve uma reflexão Matemática muito

importante, que envolveu juros, rendimento de poupança e a perda do dinheiro do aluguel. Os

alunos criaram estratégias sobre aquisição de casa própria e como equipá-la. Houve quem, por

exemplo, planejou até que usaria os móveis da mãe dele (de uma loja de móveis usados que ela

tem) e que conforme fosse comprando os seus, devolveria os da mãe. Uma menina queria ser

professora de 1ª a 4ª série. Mas como sobreviver com R$ 750,00? No começo, quando ela viu o

salário, achou que fosse muito. Quando fez a relação de suas despesas mensais, viu que os 750

reais não eram suficientes para a vida que havia planejado. Daí começou a cortar despesas: “Ah,

não! Não preciso ficar tanto tempo no banho! Vou tirar um pouco em energia elétrica” e assim os

demais fizeram o mesmo.

Ainda sobre a estratégia adotada pareceu-nos que a participação voluntária traz

resultados muito melhores do que a compulsória. Isso ficou evidente na escola em que tivemos a

participação de uma classe toda. Houve muita falta e interrupções. Assim, fica o desafio de como

implementar uma abordagem de trabalho com projetos na escola de maneira que envolva um

número maior de alunos. Há que se pensar em ambientes diferenciados do que usualmente temos

com aulas de 50 minutos. Também se pensar o papel do professor como orientador em atividades

dessa natureza.

Outro ponto a ressaltar é o encontro presencial em que os grupos tiveram que fazer

uma apresentação pública como resultado do que discutiram nas escolas. Isso gerou ansiedade

mas de uma forma muito positiva. Eles expuseram algo que produziram. O trabalho de escola não

ficou guardado na gaveta do professor. Consideramos isso muito importante quando se trabalha

com projetos em escolas.

Com relação ao uso da Internet, percebemos que apesar de um planejamento

cuidadoso, não conseguimos fazer com que a comunicação eletrônica tivesse o alcance que

imaginávamos. São muitos os problemas técnicos e falta de manutenção dos laboratórios. Porém,

a experiência vivida traz indícios de que é importante continuar nesta direção. Os alunos

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demonstraram interesse em utilizar a Internet, em especial o fato de poder habitá-la13 com registro

de sua própria produção. O fato de ser autor nos pareceu mais importante para os alunos do que o

de ser consumidor de informações disponíveis. A Internet nos possibilita essas duas opções.

Principalmente os alunos com poder aquisitivo menor, aqueles que não têm acesso

à Internet em casa, se sentiram valorizados por poderem participar desse trabalho. Não podemos

fechar os olhos ao que acontece fora dos muros escolares, o mundo todo se encontra interligado e

através da Internet é possível saber o que acontece do outro lado do planeta numa fração de

segundos. Nossos alunos sabem disso. A Internet pode ser utilizada de forma a promover novos

ambientes de aprendizagem na escola e também promover a inclusão digital de alunos com

situação econômica menos favorecida.

Cabe aqui também falar da relevância que esse trabalho teve para o

desenvolvimento profissional de todos os envolvidos: professores, alunos e pesquisadores. O

trabalho com projetos, embora bastante disseminado nas escolas brasileiras, implica em muitos

desafios e maneiras novas de organizar a aprendizagem. A inserção do uso de tecnologia

informática traz um elemento a mais que requer o enfrentamento de várias situações imprevisíveis

como pudemos ver na seção anterior. Para tudo isso é preciso ter profissionais disponíveis a

correr risco dessa natureza.

Finalizamos com a sugestão de que outros trabalhos continuem nessa direção de

forma a compreender melhor a complexidade do ambiente escolar com a inserção de tecnologia

informática e criar demandas para que a escola pública possa ter condições de oferecer esse tipo

de acesso aos seus alunos.

13 Aqui nos baseamos no trabalho de Garcia, 2005

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