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3º Simpósio Nacional o Rural e o Urbano no Brasil 30 de Novembro a 02 de Dezembro de 2011. UFRGS A JUVENTUDE RURAL A CAMINHO DAS CIDADES: QUAL O FUTURO DO BAIRRO RURAL BÁRBARAS? Alex Cristiano de Souza 1 Ana Rute do Vale 2 Universidade Federal de Alfenas-MG 1 Introdução Na chamada sociedade pós-moderna a juventude é colocada, ora em posição para assumir os tempos que virão, ora como se as ações já estivessem sendo tomada por esta fase natural do ser humano. Todavia, esta forma de pensar não é estendida ao campo brasileiro, onde não apenas a juventude, mas as comunidades são preteridas dos planejamentos político-econômicos, e por consequência, excluídos dos processos das tomadas de decisões, que acabam refletindo na geografia com raríssimos trabalhos envolvendo a juventude rural. É importante ressaltar que o meio rural vem deixando de ser um espaço exclusivamente agrícola, tornando-se cada vez mais heterogêneo e plural sob o efeito da diluição das fronteiras entre o rural e o urbano, e a juventude rural é uma parcela da sociedade muito afetada por esse processo, sendo permanentemente seduzida a migrar para as cidades. A falta de perspectiva na agricultura os leva a buscar alternativas que permitam a construção de projetos que os insira no mundo moderno, mesmo que optando em permanecer no estabelecimento rural. O processo de transformação das sociedades rurais contemporâneas atinge de forma direta seus habitantes no que tange à concepção de mundo, modo de vida, modalidades de trabalho e, acima de tudo, os processos de tomada de decisão. Não é mais possível pensar no campo brasileiro e sua população sem a influência da urbanização, sobretudo sobre a juventude rural. Os jovens se sentem desmotivados a continuar no campo, por conta das enormes as dificuldades enfrentadas pelas comunidades rurais, seja em termos de produção e comercialização da produção agrícolas, seja em termos de infra-estrutura (transporte, estradas, saneamento básico, etc.) e serviços (escolas, atendimento médico, etc.), muitas vezes precários. Além disso, as oportunidades de emprego no campo vêm diminuindo na medida em que o agronegócio, altamente mecanizado, se expande pelo país. A questão, é que ao migrar para as cidades, estes jovens não estão qualificados suficientemente para a inserção no mercado de trabalho urbano, consequentemente acabam dirigindo-se para o mercado informal, aumentando a massa de despossuídos das cidades. No município de Alfenas, localizado na região sul/sudoeste do estado de Minas Gerais, o bairro rural Bárbaras, abriga uma comunidade em transformação que, por conta da mobilidade espacial (dista 10 km da sede do município) e da fragmentação territorial (predominância de estabelecimentos rurais inferiores a 2,0 hectares), enfrenta dificuldades de manter as famílias em atividades agrícolas. Esta é uma das justificativas de o porquê muitos jovens acabam migrando para a cidade. Sem dúvidas, a presença dos jovens no campo varia de acordo com as regiões brasileiras, destacando-se mais naquelas onde as influências da urbanização são menores e as oportunidades de emprego no campo são maiores. Estamos aqui nos 1 Graduando em Geografia. E-mail: [email protected] 2 Doutora em Geografia e professora adjunta do curso de Geografia da UNIFAL-MG. E-mail: [email protected]

A JUVENTUDE RURAL A CAMINHO DAS CIDADES: QUAL O … · familiar do bairro, buscando caracterizá-las nos aspectos sociais, econômicos e culturais, entrevistando jovens (entre 15

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3º Simpósio Nacional o Rural e o Urbano no Brasil 30 de Novembro a 02 de Dezembro de 2011. UFRGS

A JUVENTUDE RURAL A CAMINHO DAS CIDADES: QUAL O FUTURO DO BAIRRO RURAL BÁRBARAS?

Alex Cristiano de Souza1

Ana Rute do Vale2 Universidade Federal de Alfenas-MG

1 – Introdução

Na chamada sociedade pós-moderna a juventude é colocada, ora em posição para assumir os tempos que virão, ora como se as ações já estivessem sendo tomada por esta fase natural do ser humano. Todavia, esta forma de pensar não é estendida ao campo brasileiro, onde não apenas a juventude, mas as comunidades são preteridas dos planejamentos político-econômicos, e por consequência, excluídos dos processos das tomadas de decisões, que acabam refletindo na geografia com raríssimos trabalhos envolvendo a juventude rural.

É importante ressaltar que o meio rural vem deixando de ser um espaço exclusivamente agrícola, tornando-se cada vez mais heterogêneo e plural sob o efeito da diluição das fronteiras entre o rural e o urbano, e a juventude rural é uma parcela da sociedade muito afetada por esse processo, sendo permanentemente seduzida a migrar para as cidades. A falta de perspectiva na agricultura os leva a buscar alternativas que permitam a construção de projetos que os insira no mundo moderno, mesmo que optando em permanecer no estabelecimento rural.

O processo de transformação das sociedades rurais contemporâneas atinge de forma direta seus habitantes no que tange à concepção de mundo, modo de vida, modalidades de trabalho e, acima de tudo, os processos de tomada de decisão. Não é mais possível pensar no campo brasileiro e sua população sem a influência da urbanização, sobretudo sobre a juventude rural. Os jovens se sentem desmotivados a continuar no campo, por conta das enormes as dificuldades enfrentadas pelas comunidades rurais, seja em termos de produção e comercialização da produção agrícolas, seja em termos de infra-estrutura (transporte, estradas, saneamento básico, etc.) e serviços (escolas, atendimento médico, etc.), muitas vezes precários. Além disso, as oportunidades de emprego no campo vêm diminuindo na medida em que o agronegócio, altamente mecanizado, se expande pelo país. A questão, é que ao migrar para as cidades, estes jovens não estão qualificados suficientemente para a inserção no mercado de trabalho urbano, consequentemente acabam dirigindo-se para o mercado informal, aumentando a massa de despossuídos das cidades.

No município de Alfenas, localizado na região sul/sudoeste do estado de Minas Gerais, o bairro rural Bárbaras, abriga uma comunidade em transformação que, por conta da mobilidade espacial (dista 10 km da sede do município) e da fragmentação territorial (predominância de estabelecimentos rurais inferiores a 2,0 hectares), enfrenta dificuldades de manter as famílias em atividades agrícolas. Esta é uma das justificativas de o porquê muitos jovens acabam migrando para a cidade.

Sem dúvidas, a presença dos jovens no campo varia de acordo com as regiões brasileiras, destacando-se mais naquelas onde as influências da urbanização são menores e as oportunidades de emprego no campo são maiores. Estamos aqui nos

1 Graduando em Geografia.

E-mail: [email protected] 2 Doutora em Geografia e professora adjunta do curso de Geografia da UNIFAL-MG.

E-mail: [email protected]

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referindo aos jovens que pertencem a um ambiente social específico (o campo), sobretudo, à unidade de produção familiar, onde existe uma interligação entre propriedade, trabalho e família (LAMARCHE, 1993).

Dessa maneira, os objetivos deste trabalho busca de modo geral, analisar a situação dos jovens (entre 15 e 24 anos de idade) que vivem no bairro rural Bárbaras no município de Alfenas (MG) no contexto da realidade da agricultura familiar, buscando compreender os motivos que ainda os mantém no campo, seja atuando em atividades agrícolas ou não-agrícolas, além de investigar pontualmente: 1) o resgate da história da formação e implantação bairro de modo a compreender sua atual configuração socioespacial e econômica atual; 2) diagnosticar e mapear a presença de unidades de produção familiar pluriativas no bairro as atividades e rendas não-agrícolas adotadas; 3) a quantificação do número de jovens que moram no bairro (entre 15 e 24 anos de idade), em termos de gênero (masculino e feminino) e o papel que desempenham na unidade de produção familiar (atuando ou não na atividade agrícola); e por fim 4) compreender o caminho feito pela juventude e o futuro do bairro rural Barbaras sob a ótica da juventude e dos velhos do bairro.

A metodologia utilizada na produção deste trabalho é composto por revisão bibliográfica juntamente com coleta de dados primários: aplicação de questionários semi-estruturados junto aos membros responsáveis pelas unidades de produção familiar do bairro, buscando caracterizá-las nos aspectos sociais, econômicos e culturais, entrevistando jovens (entre 15 e 24 anos) residentes bairros e os que migram para a cidade em busca de novas oportunidades de emprego; e dados secundários Prefeitura Municipal de Alfenas (MG), EMATER, IBGE, etc.

Ainda consta a elaboração de material cartográfico com a distribuição espacial das unidades de produção familiar no bairro e suas características coletadas nos questionários.

Foram entrevistadas 50 unidades produtivas, das 80 existentes no bairro, totalizando 62,5% de propriedades, donde um total de 166 pessoas foram catalogadas, das quais haviam 59 homens e 65 mulheres ambos com idade superior a 25 anos; 14 jovens do sexo masculino e 10 do feminino, ainda tendo 14 crianças do sexo feminino e 4 do sexo masculino, conforme a figura 1.

Figura 1: Caracterização dos moradores do bairro. Fonte: Pesquisa de Campo (janeiro de 2011)

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2 – Caracterização da área pesquisada

O estudo sobre a juventude no contexto da agricultura familiar no bairro rural Bárbaras se mostra relevante perante a situação de esquecimento político e social por qual passa a juventude no campo. O ritmo frenético com o qual os jovens vêm abandonando o campo é um importante fator que reforça a ampliação de debates a cerca do planejamento que está sendo proposto ao campo brasileiro. Pensar o campo como setor produtivo-econômico é, ao mesmo tempo, caminhar para o seu esvaziamento.

No contexto do município de Alfenas (MG), que possui população total de 73.774 habitantes (Censo 2010) e apresenta um elevado grau de urbanização (93,8%) e uma tendência à concentração fundiária, por conta da expansão das monoculturas de café e cana-de-açúcar, o bairro rural pode ser considerado uma exceção pela dimensão do tamanho dos estabelecimentos rurais. Por outro lado, não podemos deixar de destacar a importância dos pequenos estabelecimentos nos municípios, onde predomina a agricultura familiar, merecendo especial destaque aqueles com menos de 10 hectares. Esse quadro é mais agravante para a juventude do bairro, que têm migrado constantemente para a cidade, embora seus predecessores ainda se mantenham na agricultura familiar. O gênero também marca posicionamento na questão da produção, pois boa parte das mulheres, além de ajudarem nas culturas agrícolas, trabalham também como artesãs, confeccionando bordados e crochês. Inclusive, existe no bairro a Associação de Mulheres Agricultoras e Artesãs.

Seria impossível fazer uma análise sobre a juventude de determinada região sem ao menos compreender que espaço é este, qual a sua caracterização, como se originou, em quais conjunturas, como são as relações no interior deste espaço, sua territorialização, sua função perante a cidade. Enfim, o que é este espaço que costumeiramente chamamos de bairro rural? 3 – Levantamento histórico e geográfico do Bairro Rural Barbáras

Diferentemente do ideário urbano impregnado na atual sociedade, comunidades rurais não vivem isoladas. No campo brasileiro há intensa relação entre campo e cidade onde não se pode pensar o urbano isolado do campo e nem o campo isolado da cidade, como é o caso do bairro rural Bárbaras, que é uma unidade territorial do município de Alfenas-MG. Este bairro é caracterizado pela predominância de pequenas propriedades, sendo a maior parte do trabalho realizado no bairro movido a força de trabalho familiar. O bairro dista cerca de 10 km da cede municipal, facilitando a comunicação entre estes, possibilitando ainda intercâmbio entre o bairro rural a municípios vizinhos como Fama e Paraguaçu. As relações entre a comunidade e as áreas urbanas acontecem de maneira natural, desde a comercialização da produção agrícola, passando pelo consumo de bens e serviços na cidade, até a educação das crianças. Assim, o bairro rural não pode ser analisado de maneira isolada, sendo evidente a integração deste com o meio urbano (BOMBARDI, 2004).

O bairro rural Bárbaras teve origem, segundo os relatos de seus antigos moradores, “com o retalhamento de uma grande propriedade rural cujo proprietário, Sr. Marcondes, casou-se com a senhora Maria Bárbara, que foi a primeira pessoa a residir na comunidade, com o pseudônimo de Bárbara, por volta de 1830”. Com o passar do tempo esse pseudônimo deu origem ao nome do bairro, que passou a ser também o mesmo de seus descendentes (EMATER, 1990).

Inicialmente, os moradores do bairro dedicavam-se à pecuária e à agricultura de subsistência (milho, arroz, feijão, cana). Até a década de 1950, o leite era desnatado no próprio bairro e o creme produzido levado ao município vizinho de Fama, aonde, por meio de estrada de ferro, chegava à indústrias de manteiga do

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estado. Porém, a partir da década de 1960, a modernização da sociedade (incluindo a própria implantação da hidrelétrica de Furnas na região), provocou desestruturação nas atividades agropecuárias do bairro, causando desemprego e o êxodo rural de moradores, que foram em busca de empregos urbanos. Na década de 1970, outra fonte de emprego passou a ser as grandes lavouras de laranja e café do município (EMATER, 1990).

Atualmente, a maior fonte de renda agrícola das 80 famílias residentes nos Bárbaras são os hortifrutigranjeiros, seguido pela produção de cereais e pequenas criações de animais, atividades típicas de pequenas propriedades, que se tornaram insuficientes para sustentar uma família, na medida em que ela foi crescendo. Essa situação, aliada às dificuldades de produção - especialmente a falta de maquinários e acesso ao crédito agrícola – e de comercialização dos produtos – falta de meios para transportá-los e exploração dos intermediários -, têm contribuído para o aumento da procura por atividades não-agrícolas como complemento da renda dos agricultores familiares (EMATER, 1990).

O número de propriedades no bairro caracteriza uma transformação no espaço, de um momento menos ocupado, em que havia menor número de famílias, o que levava a um maior tamanho das propriedades, que trabalhando sobre áreas férteis, tinham maior capacidade de produção de alimentos, sendo o alho o principal produto, distribuído para as capitais da região sudeste. Este período, primeira metade do século XX foi marcado pela abundância na produção agrícola do bairro, que se destacava também na produção de arroz e leite. Este período foi sucedido por um momento em que as propriedades tiveram sua fragmentação intensificada, aumentando assim a ocupação do bairro.

Um segundo momento de transformações espaciais é marcado pelo alagamento do Complexo Hidrelétrico de Furnas que atinge o bairro3, o qual promoveu uma verdadeira “involução” no processo produtivo agrícola, reduzindo as áreas de várzeas onde se mantinham a maior parte da produção e das terras agricultáveis. Neste contexto, uma das moradoras entrevistadas comenta:

que até a década de 60, até o alagamento de Furnas na região, havia vida próspera no bairro, onde havia o cultivo de arroz, feijão, milho e alho, além da pecuária leiteira que mantinha o bairro em fartura. Com o alagamento das várzeas, o bairro perdeu boa parte de suas áreas agricultáveis, intensificando o processo de redução do tamanho dos lotes e da produção, levando o bairro a um significativo empobrecimento.

No mesmo período em que se deu a instalação de Furnas, houve a abertura e implementação da rodovia BR-491 que liga, entre outros, os municípios de Alfenas a Paraguaçu, caracterizando um fator fundamental para a análise deste bairro, intensificando as relações deste com os centros urbanos de Alfenas, Fama e Paraguaçu. A rodovia passa pelo ponto mais alto do bairro, cerca de 850 metros, fator relevante segundo um morador entrevistado na pesquisa, pois “a implementação da rodovia desvalorizou a parte mais alta do bairro porque não é rica em água” contribuindo com o processo de parcelamento, neste caso, através e compra da terra por trabalhadores urbanos. Ademais, a alteração decorrida pela abertura da rodovia, é avaliada como positiva pelos moradores que viveram esta época, pois facilitou o transporte e a comunicação com a cidade, o acesso ao atendimento médico e ampliou as possibilidades de se continuar estudando.

3 O Complexo Hidrelétrico de Furnas foi implantado na gestão Juscelino Kubistchek para atender o

programa desenvolvimentista do Brasil dos anos 1960. Esta obra tinha como objetivo atender a demanda

do setor industrial por eletricidade e para isso, alagaram representativa parte do Sul e Sodoeste mineiro.

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Os elementos que explicam a existência de estabelecimentos rurais no bairro com pequena área de extensão e baixa produção agropecuária são: 1) a partilha hereditária que dado sua grande proporção, reduziu o tamanho dos estabelecimentos através de um processo geracional natural; 2) a inundação provocada pelo lago de Furnas onde imensas áreas agricultáveis foram alagadas, fenômeno este que não é específico a este bairro; e 3) a implementação da BR-491como importante eixo de integração entre o Sul e Sodoeste de Minas com a capital mineira e importantes regiões econômicas do estado de São Paulo. Esta rodovia substituiu a ferrovia no projeto rodoviário brasileiro e possibilitou conexões mais rápidas entre as cidades e regiões. É importante ressaltar que o movimento independente e particular de cada um desses itens não justifica o tamanho das propriedades de hoje, mas, a confluência destes três elementos contemplam uma justificativa ao fato de as propriedades serem cada vez menores e o processo pendular campo/cidade ter intensificado.

A instalação da Usina Hidrelétrica de Furnas, concretizadas no governo Juscelino Kubitschek, tinha como objetivo gerar energia elétrica para o país que passava pela onda desenvolvimentista (Furnas, 2005), contudo, a energia elétrica no bairro, inundado pelo megaprojeto, chegou em tempos tardios, apenas nos anos 80. Com relação a outros tipos de infraestrutura, até os dias atuais não há coleta e tratamento de água e esgoto no bairro. Ou seja, o desenvolvimentismo que justificou alagar 1.440 Km² de terras sul mineiras (PREFEITURA MUNICIPAL DE ALFENAS) foi e é incapaz de beneficiar os atingidos diretos pelas águas. Ainda hoje não há transporte público municipal que ligue o bairro à sede do município, sendo a forma de transporte coletivo os ônibus intermunicipais que passam pela BR-491, que é distante da maioria das residências do bairro. Hoje há no bairro um PSF rural em que há atendimento médico mensal e um agente de saúde, contudo o atendimento médico não é o suficiente para toda a comunidade.

4 – Atividades agrícolas: Agricultura Familiar e a Pluriatividade

A organização da agricultura brasileira a partir das agudas modernizações capitalistas ocorridas em meio ao século passado é um convite a pensar a atualidade e os dilemas do futuro no campo brasileiro. Esta modernização “industrializou-se desigualmente cidade e campo, regiões e país. Todas as atividades produtivas tendem a subordinar-se aos movimentos do capital” (Palheta, 2001. p. 29), desta forma, ampliou os contrastes entre campo e cidade e com ele mesmo, produzindo espaços altamente modernos e especializados, em detrimentos de espaços não modernizados tecnicamente pela necessidade do capital.

Estas alterações no campo, decorridas da intensificação da modernização agrícola, não se limitaram ao tamanho das propriedades e ao maquinário, mas alteraram também a cadeia produtiva e o modo de se viver no campo. Deste modo, o trabalho foi se tornando escasso, o tamanho das propriedades foi reduzindo e o êxodo rural se intensificou.

A respeito da redução do tamanho das propriedades, podemos observar, segundo a figura 2, a predominância de pequenas propriedades, já que 80% corresponde a tamanhos inferiores a 1,5 hectares enquanto apenas 20% das propriedades são de tamanho superior a 1,5 hectares.

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Figura 2: Tamanho das propriedades em hectares. Fonte: Pesquisa de Campo (janeiro de 2011)

Apontando possibilidades de famílias permanecerem no campo, seja através

dos trabalhos não agrícolas no meio urbano e/ou até mesmo com a complementação da renda familiar através de transferências sociais como aposentadorias e bolsas ofertadas pelo governo e até mesmo nas atividades realizadas no campo que não possuem vínculo direto com a agricultura. Seguindo as características do bairro Rural Barbaras, sobretudo no que tange a média dos lotes e o papel agricultura familiar, os agricultores do bairro utilizam a mão-de-obra familiar como principal força de trabalho, sendo rara a contratação de funcionários.

A pluriatividade surge como estratégia para a permanência do agricultor familiar no campo, onde há atividades de extração de renda agrícolas e/ou não agrícola na propriedade ou fora dela (Schneider, 2003), já que o reduzido tamanho das propriedades dificulta a prática agrícola e o estreitamento das relações campo-cidade possibilitou maior fluidez para o homem do campo, tornando possível maior atividade deste fora de seu estabelecimento agrícola. Outros importantes elementos que inserem a pluriatividade na vida do homem do campo estão relacionadas a produção e a comercialização, onde a produção é dificultada devido os elevados preços das novas tecnologias como os insumos e os implementos e a comercialização vem com o desafio de superar o atravessador4.

Na figura 3, observamos qual é o destino final da produção agrícola dos moradores do bairro. Mesmo considerando que mais de 40% desta produção seja direcionada ao autoconsumo, outras maneiras são encontradas pelos moradores como forma de escoar sua produção sendo as feiras livres, as vendas diretas, a merenda escolar e a negociação feita dentro do próprio bairro, as formas mais rentáveis, pois a comercialização é feita de modo com que todo lucro (mesmo que pequeno) fique todo nas mãos do agricultor. Outras formas de negociação da produção agrícola é através de terceiros em que o produtor rural repassa sua mercadoria ao Laticínio Alfenas, a supermercados e até mesmo a pessoas para fazerem a venda da produção.

4 Atravessador é aquele individuo que compra do produtor rural a um baixo preço e revende por uma

quantia maior, prejudicando o produtor, pois tira deste significativa parte da renda, e prejudica também o

consumidor final, pois a diferença entre produção é preço final é pago pelo consumidor.

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Figura 3: Destino da produção agrícola Fonte: Pesquisa de Campo (janeiro de 2011)

A principal atividade agrícola desenvolvida pelas famílias residentes no bairro é a horticultura, tendo a produção destinada para os mercados das cidades de Alfenas e Fama, além de auxiliar no abastecimento das feiras locais. Outros fenômenos relevantes é o crescente número de chácaras de veraneio no bairro, chegando a números superiores a 20 propriedades. Estas chácaras de veraneio são de posse de pessoas exógenas ao bairro, sendo muitas vezes de cidades maiores do Sul de Minas como Pouso Alegre e Poços de Caldas, e até mesmo das capitais Belo Horizonte e São Paulo.

Deste modo, a prática da pluriatividade se alastra pelo bairro. É interessante mencionar a metamorfose por qual passa o bairro, considerando que a menos de um século o bairro era predominantemente voltado à agricultura, hoje este horizonte é outro como podemos ver na figura 4, onde, embora na maior parte dos estabelecimentos rurais, 66% haja atividades agrícolas, o número de propriedades que não exercem relações de trabalho agrícolas apresentam um número significativo de 34%.

Nessas unidades produtivas a pluriatividade se manifesta, sobretudo através da aposentadoria, sendo 21 casos, representando 35% do total. Logo atrás se encontra as propriedades que contam com a renda de aluguel (imóveis urbanos), representando 10% e em seguida as pessoas que se ocupam nos serviços gerais, seja no centro urbano ou mesmo no campo, com o total de 8%. O número expressivo de outras atividades como açougueiro, agente de saúde, cozinheira, domador de cavalos, eletricista, técnico em informática, leiturista, manicure, mecânico e vigilante somam 17% do total.

Autoconsumo 42%

Feiras livres 15%

Vendas Diretas 12%

Laticinio Alfenas 12%

Merenda Escolar 8% Terceiros

5%

Supermercado 3%

Bairro 3%

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Figura 4: Relação de trabalho agrícola. Fonte: Pesquisa de Campo (janeiro de 2011)

Na figura 5 mapeamos as unidades em de produção familiar pluriativas e as

unidades de produção em que não há rendas agrícolas, este mapeamento foi possível através de entrevistas realizadas. A delimitação do bairro orientada por moradores do bairro e por um funcionário da EMATER, já que não existem dados oficiais a respeito da delimitação do bairro, segundo a própria EMATER.

Figura 5: Unidades de produção familiar pluriativas e rendas não agrícolas. Fonte: Pesquisa de campo (agosto 2011)

A figura 6 apresenta de modo mais claro as atividades executadas nas

unidades pluriativas do bairro rural Bárbaras.

34%

66%

Sem relações agrícolas

Com relações agrícolas

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Figura 6: Atividades pluriativas. Fonte: Pesquisa de Campo (janeiro de 2011)

Da juventude entrevistada que habita o bairro, nenhum exerce atividades

exclusivamente agrícolas, e quando perguntado se gostaria de trabalhar com a agricultura tal como seus pais a resposta que prevalece é não. Já quando os pais eram questionados sobre o que pensavam a respeito da permanência de seus filhos no campo, exercendo atividades agrícolas, a resposta não era diferente de seus filhos. Embora achasse interessante o prosseguimento da tradição agrícola, os pais acham que o melhor caminho para os filhos trilharem é o aprofundamento nos estudos e a procura de trabalho no meio urbano, e este pensamento é justificado devido aos baixos investimentos na agricultura familiar.

5 – Educação

Compreendido o espaço estudado como território, a educação é uma ação que deve acontecer confluindo com a cultura local. Ainda assim se faz justo assinalar que a educação do campo é uma importante política social, necessária ao desenvolvimento local, como assinala Fernandes (2006)

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A educação é uma política social que tem importante caráter econômico porque promove as condições políticas essenciais para o desenvolvimento. Desse modo, para o desenvolvimento do território camponês é necessária uma política educacional que atenda a sua diversidade e amplitude e entenda a população camponesa como protagonista propositiva de políticas e não como beneficiários e ou usuários. [...] Portanto, atribuímos à Educação do Campo, a política educacional voltada para o desenvolvimento do território camponês como parte do campo brasileiro. Este território é um campo específico e disperso que possui singularidade na sua organização por meio do trabalho familiar. Portanto, não estamos falando de um campo genérico, mas sim de um Campo como território camponês (p. 30)

Embora existam escolas no campo, estas nem sempre estão preparadas para trabalhar com os indivíduos do campo e para o campo, apresentando em seu cotidiano escolar problemáticas associadas a formação dos professores, (SIMÕES, 2011) disserta a respeito das diferenças entre a educação rural, convencional no campo brasileiro e a educação no campo que compreende a construção educacional e política do indivíduo, bem como a transformação dos espaços de produção no campo em territórios em que a cultura camponesa é colocada como elemento fundante daquele território (SIMÕES, 2011). Fernandes (2006) assinala que tanto a temática Educação do Campo, quanto a Educação na Reforma Agrária são novos temas trabalhados pelo governo, tendo como momento de gestação meados da década de 1990.

A Escola Municipal Nicolau Coutinho, ilustrada pela figura 6 é responsável pela educação das crianças, oferecendo o Ensino Fundamental I (1º ao 5º ano) à comunidade5. A metodologia e a formação dos professores não são adequadas para exercer as atividades no campo (CAMPOLIN, 2000), tendo em vista que,

“os programas de educação escolar tradicionais sempre tomaram como perspectiva a homogeneização na transmissão de conhecimento, isto é, não levavam em consideração os contextos socioculturais de crianças, jovens e adultos” (FREIRE, 1983)

5 Há de ser lembrado aqui que na escola do bairro há, além de alunos do bairro rural, alunos que moram

na cidade.

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Figura 6: Escola Municipal Nicolau Coutinho Fonte: Pesquisa de campo (agosto 2010)

Nas entrevistas realizadas junto aos jovens do bairro que estudaram na escola

do bairro, foi comprovado que o ensino, em geral não vincula o alunato a seu território. A ponderação mais frequente feita pelos indivíduos que tiveram participação na pesquisa é que a construção do conhecimento não tem como referência o espaço onde acontece a prática escolar.

Os jovens entrevistados não fazem distinção entre as metodologias encontradas na escola rural e as metodologias encontradas nas escolas urbanas, apenas acham “legal” a escola e o ensino que tiveram na escola do bairro, mesmo com o consenso de que a educação trabalhada na escola do bairro não seja o suficiente para que o aluno consiga se manter na mesma regularidade – padrão – dos alunos das escolas urbanas.

O que é surpreendente neste caso é a postura destes jovens em não manifestar, a princípio, a insatisfação quanto ao modo de como se trabalha a educação na escola. Todavia, em conversas posteriores as entrevistas (enquanto buscava alguns elementos práticos para que os jovens pudessem refletir melhor) eles diziam sobre a importância de se ter uma escola no bairro e que embora o ensino fosse “legal” não era feito trabalho com a terra e as atividades não eram voltadas ao meio rural. Alguns exaltaram a prática pedagógica da professora Tani Rose, hoje secretária municipal de Educação e Cultura, que quando trabalhou na escola do bairro re-introduzia elementos da cultura camponesa às crianças trabalhando com preservação ambiental, discutindo os impactos que provocamos na natureza e reforçando a importância da agricultura, mesmo que em pequenas hortas.

Ainda assim, identificamos que este tipo de educação se porta como um agente a serviço do capital, não compreendendo o bairro como território dotado de significados particulares, pelo contrário, trabalhando a educação no bairro rural Barbaras como é trabalhado nos territórios urbanos. Esta prática é indutora da desterritorialização camponesa, dentro da perspectiva da perda da identidade local. Para Fernandes (2006), há duas formas de compreender a educação do campo

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compreendendo o Campo como um território, a Educação precisa ser pensada para o seu desenvolvimento. Compreendendo o Rural como uma relação social do campo, a Educação é pensada como forma de inserção no modelo de desenvolvimento predominante, no caso, o agronegócio. (p. 38)

Esta afirmativa nos obriga pensar novos modos de se trabalhar com a

educação no campo, e daí surge a importância de se valorizar os cursos de graduação como a Pedagogia no Campo, proposto pela UFMG juntamente com movimentos sociais do campo. Daí a importância de se envolver na escola da comunidade pessoas realmente ligadas a esta, não partindo apenas dos professores que atuam nas salas de aulas, mas de toda a comunidade escolar: diretores, professores e demais funcionários. É necessário que os professores compreendam o espaço onde estão inseridos e o público com o qual esta sendo trabalhado.

6 – A Juventude Rural

Carente de políticas públicas que firmem o papel dos jovens na sociedade, sobretudo no meio rural, esta faixa etária, hoje, é a quem representa os protagonistas do êxodo rural no Brasil, diferente de décadas passadas. Este quadro é marcado ainda pelas estatísticas de Baeninger (1998 apud Weisheimer 2005) apontando a juventude como a maior parte dos migrantes.

Devido à configuração físico-territorial das propriedades e do bairro, as possibilidades de se manter no campo já são ameaçadas para os jovens, quando são consideradas a limitação do tamanho das propriedades, dificultando extrair renda da agricultura para se manter no campo. Outro elemento a ser compreendido é o continuísmo do retalhamento das propriedades devido ao processo hereditário, que seguidas vezes são negociadas com moradores urbanos, ou por haver desentendimento entre as partes herdeiras ou por não haver interesse em continuar com o trabalho na terra.

Dos 24 jovens, apontados na figura 7, que ainda persistem morando no bairro poucos são os que pretendem por lá ficar. As causas que mais contribuem a esta prevalência é a carência de emprego no campo e, como já observada, a limitação física das propriedades, que pequenas e confrontadas por vizinhos, é deveras difícil de ampliar.

Do total dos 24 jovens, 14 deles, representam 58% moram no bairro e não exercem atividades remuneradas e deste total, 7 deles tem até 18 anos e não pretendem permanecer morando no bairro e quanto mais a idade se aproxima dos 18 anos, mais aumenta a vontade de procura de trabalho no meio urbano. Os 25% dos jovens que trabalham na cidade e moram no campo tem mais de 18 anos, e fazem o movimento pendular campo-cidade. A questão de gênero não faz diferença neste termo, onde 3 homens e 3 mulheres estão sob a mesma condição. E por fim 17% dos moradores jovens trabalham na cidade e voltam ao bairro aos fins de semana. Esta última categoria é marcado pelo gênero masculino, correspondente a todos os casos.

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Figura 7: Jovens residentes no bairro que exercem atividades na cidade Fonte: Pesquisa de Campo (janeiro de 2011)

Para além das relações de trabalho, poucas são as atividades de lazer no

bairro percebendo-se pouca atividade dos jovens pesquisados na comunidade. O telecentro comunitário municipal instalado no bairro possibilita entretenimento aos jovens, causando euforia as crianças. Aos jovens do sexo masculino, o que realmente faz falta no bairro é o futebol de domingo que não mais acontece.

Ainda assim é importante salientar as tradicionais festas que acontecem no bairro como a festa de Santa Barbara e a Folia de Reis, que serve como um bom entretenimento, não apenas aos jovens, mas a toda comunidade, uma vez que a festa atrai grande quantidade de indivíduos urbanos, e neste ano aconteceu o primeiro Bárbaras Fest Show, movimentando dois fins de semana. Mesmo estas atividades não sejam frequentes e como no último caso, nem tradicionais, são importantes para a juventude do bairro se espelhar nas tradições. 7 – Conclusões

Tendo como base os objetivos norteadores desta pesquisa de Iniciação Científica, compreendemos com maior propriedade a necessidade de se estudar as comunidades rurais, bem como a juventude que ali residem, com a perspectiva de se prover algo em seu benefício, a partir de uma abordagem endógena.

O histórico do bairro rural Barbaras elaborado pela EMATER (1992) é refutado por parte da comunidade quanto a sua construção histórica, enquanto grande parte dos moradores sequer conhecem o histórico do bairro e quando questionados sobre o mesmo, contam a história segundo a EMATER, ressaltando ser uma “verdade” da empresa, justificando que seus antepassados contavam outras histórias referentes ao bairro.

Embora a noção de identidade de bairro vá aos poucos esvaecendo da comunidade, nota-se que as festividades populares como a festa de Santa Bárbara e a Folia de Reis são, nos dias atuais o que sustenta a identidade de bairro rural.

É interessante notar a perspectiva que os moradores idosos têm do bairro, que quando se sujeitam a fazer um prognóstico do futuro do bairro, colocam-no como sendo um espaço urbano no meio rural. Em contrapartida, parte da juventude vê o

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Não exercem atividaderemunerada

Trabalham na cidade emoram no bairro

Trabalham na cidade evoltam ao bairro aos fins

de semana

homem

mulher

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bairro no futuro apenas como dormitório ou mesmo não mais existindo. A estes dois pontos de vista, dos jovens e dos velhos, concluímos que o primeiro é decorrência do avanço técnico pelo qual passou a sociedade nestes últimos 50 anos, não apenas na cidade, como também no campo. Outro fator associado a este modo de analisar o futuro é o maior retalhamento das propriedades, uma vez que os senhores com idade superior a 70 anos, em sua juventude, presenciaram o bairro com menor número de pessoas e, por consequência, menor número de propriedades, e este fato projeta nos moradores mais velhos uma comunidade urbanizada. Em contraposição, os jovens que convivem diariamente com o meio urbano se deslocando até a escola, pensam no futuro do bairro como um local onde poderão passar dias de sossego, aos finais de semana, e ou, em grande parte também, os jovens vêem o futuro do bairro como um espaço com pouca habitação, onde há a tendência de migração para a cidade.

A educação trabalhada no bairro, assim como em todo o restante do campo brasileiro, não condiciona o jovem a permanecer no campo, contribuindo com o processo aculturador pelo qual passa os jovens rurais. É importante ressaltar a necessidade de se trabalhar com o jovem e a criança tomando como princípio, seu meio, ou seja, o campo como território dotado de singularidades próprias e muitas vezes distintas do meio iurbano, daí a necessidade de se valorizar e apoiar movimentos de educação como as Licenciaturas em Educação do Campo, como nos casos da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), da Universidade de São Carlos (UFSCar) e outras mais.

Ainda na juventude, inicia-se o processo migratório para a cidade. A primeira fase corresponde ao ensino, quando os jovens fazem o movimento pendular (campo-cidade) diariamente para estudar. O segundo momento acontece quando o jovem se aproxima da maioridade civil, os 18 anos, ou quando o mesmo conclui o ensino médio e sai a procura de trabalho no meio urbano. Nesta fase, identificamos a continuidade do primeiro momento, quando as pessoas vão à cidade diariamente e voltam para o bairro para dormir. E o terceiro momento, é o que acontece a partir dos 22 anos, quando os jovens passam toda a semana na cidade voltando ao bairro no fim de semana.

O processo de esvaziamento do campo pelo qual passa a sociedade brasileira é também acompanhado em escala local. A partir deste quesito, concluímos que se não for tomada medidas públicas, o campo continuará expelindo jovens de seu espaço de origem. Há de se fazer justiça quanto ao poder local, que propõe e executa reformas de casas, melhorando as condições de vida no campo, através do PLHIS (Plano Local de Habitação de Interesse Social), embora isto ainda não seja suficiente para manter os jovens no campo.

Em se tratando da produção agrícola, há no bairro a prática da horticultura e a produção de leite é significativa, quando se trata de um bairro em que as propriedades são de pequenas dimensões. Como assinalado no corpo do relatório grande parte das propriedades praticam a pluriatividade, fenômeno este, causado pela reduzida área dos estabelecimentos rurais, e que possibilitam às famílias do campo continuarem em seus espaço, extraindo renda de formas diversas como aposentadorias e aluguéis. Ainda é importante salientar que a maior parte da produção, 42% é feita para o próprio consumo e que a venda para a merenda escolar é apontado como um importante mecanismo de se valorizar o trabalho do agricultor, quando se tira o atravessador do percurso entre produtor e consumidor final.

O tamanho da propriedade se apresenta também como limite a permanência do jovem no campo, como comprovado com o trabalho, onde, ao término do ensino médio, os jovens partem à procura de trabalho e estudo na cidade. Quando o jovem encontra trabalho no meio urbano, ele parte para a cidade e este movimento vem se mostrando permanente, uma vez que esta não é a primeira geração em que os jovens buscam seu “futuro” na cidade, “abandonando” o campo.

Por fim, concluímos que se não houver mudanças na visão urbanicista de sociedade que temos hoje, em que contrapõe campo a cidade, numa lógica

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maniqueísta e binária, o campo morrerá ocasionando maiores distúrbios nas cidades, culminando com o colapso da alimentação, onde não haverá produção alimentos, já que o agronegócio é voltado a produção de commodities. Ainda que descaracterizado de suas origens, o bairro rural Barbaras ainda se mostra como um espaço de esperança em meio a sociedade, em que ainda é possível ter uma vida mais distante do grande capital acumulado que gera as grandes diferenças sociais. Neste sentido, sem uma revolução em nossa sociedade, estamos fadados a completa territorialização do capital em nossas vidas, em que tanto urbano quanto rural caminham para o abismo da destruição! Referências Teóricas BOMBARDI, L.M. O Bairro Rural como Identidade Territorial: a especificidade da abordagem do campesinato na geografia. Revista Agrária, nº1, julho/dezembro de 2004. Disponível em http://www.geografia.fflch.usp.br/revistaagraria/revistas/1/bombardi.pdf acessodo em 23/01/2011

CAMPOLIN, A.I. Quando os alunos e alunas são rurais e a escola é urbana: o significado do ensino médio para os jovens rurais. Dissertação de mestrado, Programa de Pós-Graduação em Educação/Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2000.

EMATER. Diagnóstico da comunidade rural bárbaras – Município de Alfenas (MG), 1990 (mimeo).

FERNANDES, B. M. Os Campos da pesquisa em educação do campo: espaço e território como categorias essenciais, inn Educação do campo e pesquisa: Questões para reflexão. Brasília, Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2006.

FURNAS http://www.furnas.com.br/memoria_curiosidades_04.asp acesso em 10/02/2012, 15:00.

LAMARCHE, H. A agricultura familiar: comparação internacional. Campinas: Ed. Unicamp, 1993 (Col. Repertórios).

PREFEITURA MUNICIPAL DE ALFENAS. Plano Diretor De Alfenas. Leitura Técnica em processo de revisão, 2006.

SCHNEIDER, S. A Pluriatividade na Agricultura Familiar. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2003. SIMÕES, W. A educação do campo no território institucional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED/PR): algumas considerações. In SAQUET, M. A.; SUZUKI, J. C.; MARAFON, G. J. Territorialidade e Diversidade nos Campos e nas Cidades Latino-Americanas e Francesas. Outras Expressões, São Paulo, 2011.

WEISHEIMER, Nilson. Juventudes Rurais: Mapa de estudos recentes. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, 2005.