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A MEDIAÇÃO DOCENTE EM PROCESSOS EDUCACIONAIS A DISTÂNCIA
Diferentes implementações de cursos a distância estão em voga e em expansão no Brasil
e no mundo. Há cursos que são oferecidos completamente a distância, outros
semipresenciais, cursos massivos (MOOC), etc. Também tem crescido a variedade de
cursos a distância em relação aos níveis de ensino, desencadeando diferentes formas de
organização desses cursos. Dados da ABED (2014) mostram que a maioria dos cursos
no Brasil é em nível de pós-graduação lato sensu (57%), seguido pelo ensino superior
(29%) e 18% em nível técnico, todos com ampla perspectiva de crescimento.
Admitindo-se a relevância dessas iniciativas que contribuem para a democratização do
acesso à educação formal, é preciso, também, alertar para a necessidade de que elas
assegurem condições pedagógico-didáticas para que essa democratização se dê com
qualidade. Dentro desse contexto, vale discutir o conceito de mediação na perspectiva
de analisar o papel da mediação docente nos cursos a distância. Desse modo, o objetivo
deste painel é trazer para o debate questões, ao mesmo tempo, político-institucionais e
pedagógico-didáticas, relacionadas com processos de mediação docente em cursos a
distância, em diferentes instituições e níveis de ensino. A partir disso, as três
comunicações propostas abordam: a) A mediação docente em cursos técnicos a
distância; b) A mediação docente via redes sociais; c) A mediação docente em cursos de
formação de professores.
Palavras-Chave: Mediação; Mediação Docente; Educação a Distância
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
367ISSN 2177-336X
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A MEDIAÇÃO DOCENTE NA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA A
DISTÂNCIA
Renata Luiza da Costa
Doutora em Educação (PUC-Goiás)
José Carlos Libâneo
Doutor em Filosofia e História da Educação (PUC-SP)
Resumo. O presente artigo apresenta uma análise dos processos de mediação docente
em cursos técnicos a distância a partir de orientações oficiais sobre o funcionamento
desses cursos. O estudo se justifica pelo crescimento de cursos a distância possibilitando
investigar a relação entre a expansão da oferta e a qualidade dos processos pedagógico-
didáticos desenvolvidos a distância. Sob pressupostos e referenciais teóricos do
materialismo histórico-dialético, foi realizada pesquisa documental, observações de
aulas online e entrevistas com coordenadores, professores e tutores de cursos técnicos
subsequentes de três escolas de educação técnica da rede federal. A análise dos dados
indicou que a mediação docente desenvolvida nos cursos técnicos a distância, na maior
parte dos casos, reproduz procedimentos de ensino tradicionais com escassas atividades
de prática profissional e extracurriculares, realçando aspectos da pedagogia tecnicista.
Verificou-se que, a despeito de tentativas de superação de concepções e práticas da
tradição do ensino profissional, as estruturas curriculares, as formas de organização do
trabalho docente e de funcionamento pedagógico não estimulam procedimentos de
ensino diferentes dos encontrados. Constatou-se, finalmente, que as orientações e ações
de ordem político-econômica, institucional e pedagógica vêm resultando na oferta de
cursos de frágil complexidade técnico-científica destinados a pessoas de classes baixas,
visando atender a necessidades imediatas de empregabilidade, a busca de consentimento
ativo e reforçando tendências de inclusão excludente, tal como vem ocorrendo com as
demais políticas de orientação neoliberal.
Palavras-chave: Mediação. Educação a distância. Educação Profissional Técnica.
Introdução
O percurso histórico da Educação Profissional Técnica de nível médio, no
Brasil, desenvolveu-se a partir de uma visão dualista conhecida como a separação entre
a educação geral e a educação técnica (MANFREDI, 2002; FRIGOTTO, 2001, 2010).
Nesse percurso, a partir dos anos 1990, dentro das orientações de organismos
internacionais financiadores da educação brasileira, a Educação Profissional Técnica
adquiriu novas nuances visando rearticulações entre esse nível educacional e o
desenvolvimento econômico no contexto do capitalismo globalizado. Ao mesmo tempo
que contribuíram para a manutenção do mencionado dualismo estrutural, promoveram
ainda mais uma educação profissional voltada aos interesses do mercado fortalecendo
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seu caráter instrumental e pragmático. Nesse contexto, em estreita ligação com o
Ministério do Trabalho e outros órgãos encarregados de políticas públicas sociais,
foram ampliadas as diretrizes políticas para a Educação Profissional Técnica,
expandindo a oferta de cursos em diferentes instituições de ensino e pondo em
evidência a aplicação de modelos de educação a distância. Uma das ações decorrentes
dessa expansão foi o Programa Rede e-Tec Brasil em 2007, cuja justificativa era
democratizar o acesso à educação profissional técnica gratuita e de qualidade,
especialmente em regiões periféricas do País (BRASIL, 2011). Nesse processo, os
cursos técnicos a distância tiveram rápido crescimento em sua oferta, tendo-se
verificado 8% de crescimento ao ano e 11% da formação a distância no Brasil,
conforme dados da ABED (2014). Porém, apenas 18% dos cursos oferecidos
corresponde à rede pública (Id.; SOUZA, 2013).
Entretanto, a despeito da efetiva influência ideológica e normativa exercida
sobre os processos educacionais de nível técnico por parte de organismos internacionais,
foi divulgado em 2010 documento intitulado Concepções e diretrizes para os novos
institutos federais, fruto de resistências e lutas de intelectuais e da sociedade em defesa
de uma formação ampla e culturalmente aprofundada para os trabalhadores. Nesse
documento, são encontradas várias menções de articulação da educação profissional
técnica com uma formação cultural ―orientando-a para a formação integral de cidadãos-
trabalhadores emancipados‖ (BRASIL, 2010a, p.14). Outros documentos nacionais
como as Diretrizes Nacionais para a Educação Profissional Técnica (BRASIL, 2012)
também preconizam a formação integral para os trabalhadores. Pode-se constatar,
assim, que esses documentos estariam indicando uma inflexão nas orientações dos
órgãos oficiais em relação à Educação Profissional, sejam aquelas provenientes da
tradição do ensino profissional sejam as decorrentes da influência do Banco Mundial.
É em meio a esse presumível dissenso em relação às finalidades da Educação
Profissional que se põe a problemática da mediação docente na educação profissional
técnica a distância. Que modelos de mediação docente vêm predominando? Qual
modelo foi sendo induzido nas orientações do Banco Mundial? As diretrizes surgidas a
partir de 2010 tiveram impacto diferenciado nos processos de mediação docente? Como
está se dando efetivamente a mediação docente em cursos técnicos a distância da rede
federal? Desse modo, o objetivo desta comunicação é discutir criticamente as formas de
mediação, tendo como parâmetro orientações teóricas e práticas da Teoria Histórico-
Cultural. Os dados foram obtidos por meio de pesquisa realizada em quatro cursos do
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Programa Rede e-Tec Brasil de três diferentes escolas federais de educação profissional
técnica em diferentes estados do país. A partir de entrevistas com coordenadores,
professores e tutores de cada um desses cursos, coleta de tarefas, de avaliações e
observações online e in loco, foi analisada a mediação docente.
As recomendações dos organismos internacionais para a Educação Profissional Técnica
O dualismo estrutural entre a educação geral e a técnica se reflete na oferta de
duas ―educações‖ diferentes para classes diferentes: uma educação científica e cultural
para os ricos e a educação técnica, com ensino restrito de competências profissionais,
para os pobres. Por detrás de tal dualismo está o discurso ideológico de que a
capacidade de pensar é inata. Nesse caso, a formação cultural e científica para pobres
seria inútil, além de ser de maior custo. Justifica-se, assim, a manutenção da dualidade
educacional visando ocultar os interesses econômicos e de classe de ―[...] perpetuar
diferenças sociais‖ (GRAMSCI, 1981, p. 213). Aos pobres são destinadas políticas de
alívio da pobreza nas quais se incluem a adoção do currículo instrumental visando
empregabilidade e escolas de socialização e integração social conforme recomendações
do Banco Mundial (EVANGELISTA e SHIROMA, 2006; LIBÂNEO, 2014).
Em relação à Educação Profissional Técnica, pesquisadores (FRIGOTTO, 2001,
2010; LEHER, 1998; KUENZER, 2000) denunciam que essas recomendações são
materializadas com a manutenção da dualidade, com a intensificação das parcerias
público-privadas, com a oferta de cursos profissionais de curta duração com frágil
formação profissional e estreita ligação com as demandas do mercado econômico. A
educação profissional para as classes baixas torna-se reduzida às habilidades e
competências consideradas necessárias para uma empregabilidade mínima com um viés
também assistencial. Trata-se de uma educação composta com itens mínimos suficientes
para empregos considerados de nível intelectual baixo, consequentemente remuneração
baixa e que, ao mesmo tempo, ocupe os jovens visando a ordem social. Em um dos
documentos específicos para a América Latina, pode-se encontrar:
Em particular nas escolas do ensino secundário, o foco deve ser em fornecer
um ambiente educacional que assegure o desenvolvimento dos
conhecimentos, habilidades e atitudes relevantes para a transiçãodos alunos
para o mercado de trabalho e em trabalhos com as comunidades para
erradicar problemas sociais relacionados com a juventude. (BANCO
MUNDIAL, 1999, p. 58-59).
Essa perspectiva mantém a existência das classes pobres para servir às classes
ricas e mantém as primeiras ignorantes, além de levar a uma educação de menor custo,
já que é eliminada do processo formativo grande parte dos elementos e conteúdos de
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natureza sociocultural. Kuenzer (2000), em análises dos documentos do Banco Mundial,
mostra como esses princípios aparecem para a Educação Profissional Técnica brasileira:
Em virtude do elevado investimento, [...] o Banco Mundial tem recomendado
que se priorize o ensino fundamental, deixando de investir em Educação
Profissional especializada e de elevado custo. […] O próprio banco concluiu
ser o nível fundamental o de maior retorno econômico e ser irracional o
investimento em um tipo de formação profissional cara e prolongada. A
pesquisa aponta a irracionalidade do investimento em educação acadêmica e
prolongada para aqueles que, segundo os resultados da investigação, são a
maioria e não nascem competentes para o exercício de atividades intelectuais:
os pobres, os negros, as minorias étnicas e as mulheres. Para estes, seria mais
racional, oferecer educação fundamental, padrão mínimo […],
complementando-a por qualificação profissional de curta duração e baixo
custo. (1995 apud KUENZER, 2000, p.20 – grifos nossos).
Ainda hoje, de maneira mais incisiva, instituições internacionais como a OCDE
– Organização para o Comércio e Desenvolvimento Econômico, UNESCO e o Banco
Mundial permanecem financiando e ditando regras para a educação brasileira:
[...] o aprimoramento da relevância do mercado de trabalho é um dos
principais objetivos da nova Estratégia. Atualmente, muitos jovens em países
em desenvolvimento estão deixando a escola e entrando no mercado de
trabalho sem o conhecimento, as habilidades e as competências necessárias
para prosperar e muma economia global competitiva. Com foco na
aprendizagem, a nova estratégia vai voltar a atenção não apenas para a
matrícula e conclusão mas para verificar se os egressos da escola têm o
conhecimento e as habilidades necessárias, e o objetivo é aumentar a parte de
projetos que inclui objetivos voltados para o mercado de trabalho. (BANCO
MUNDIAL, 2011, p. 27 – tradução nossa).
Com base nessas considerações, conclui-se que as orientações do Banco
Mundial e de outras instituições internacionais financiadoras dos projetos brasileiros
têm fundamentos econômicos e, por isso, suas orientações de natureza administrativa e
pedagógica são pautadas por princípios empresariais (FREITAS, 2011; LIBÂNEO,
2014). Ora, esses princípios, induzem formas de mediação de determinado tipo, as quais
costumam ser de ordem apenas instrumental.
Concepções e diretrizes para a Educação Profissional Técnica a partir de 2010
Em aparente discordância das orientações até aqui caracterizadas, o documento
Concepções e diretrizes para os novos institutos federais traz um conteúdo com um
sentido de educação emancipatória ―com estreito compromisso com o desenvolvimento
integral do cidadão trabalhador‖ (BRASIL, 2010a, p. 3). Para além da formação
profissional, são estabelecidos os objetivos da educação profissional:
A educação para o trabalho nessa perspectiva entende-se como
potencializadora do ser humano, enquanto integralidade, no desenvolvimento
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de sua capacidade de gerar conhecimentos a partir de uma prática interativa
com a realidade, na perspectiva de sua emancipação. [...] Com essa
dimensão, seria equivocado e reducionista, pois, imaginar que a necessidade
da formação para ocupar os postos de trabalho seja a razão exclusiva e
definidora para a educação profissional. (Id, p. 35).
As Diretrizes Curriculares Nacionais para Educação Profissional Técnica
(BRASIL, 2012) endossam essa ideia e apresentam como princípios norteadores:
I- A relação e articulação entre a formação desenvolvida no Ensino Médio e a
preparação para o exercício das profissões técnicas, visando à formação
integral do estudante; [...] III - trabalho assumido como princípio educativo,
tendo sua integração com a ciência, a tecnologia e a cultura como base da
proposta político-pedagógica e do desenvolvimento curricular; VI - [...] a
indissociabilidade entre teoria e prática no processo de ensino-aprendizagem;
(Id., p. 2).
Ademais, no que diz respeito ao currículo, tais diretrizes (Id., p. 5) preconizam:
I - diálogo com diversos campos do trabalho, da ciência, da tecnologia e da
cultura como referências fundamentais de sua formação;
II - elementos para compreender e discutir as relações sociais de produção e
de trabalho, bem como as especificidades históricas nas sociedades
contemporâneas;
III - recursos para exercer sua profissão com competência, idoneidade
intelectual e tecnológica, autonomia e responsabilidade, orientados por
princípios éticos, estéticos e políticos;
IV - domínio intelectual das tecnologias pertinentes ao eixo tecnológico do
curso, de modo a permitir progressivo desenvolvimento profissional e
capacidade de construir novos conhecimentos e desenvolver novas
competências profissionais com autonomia intelectual;
V - instrumentais de cada habilitação, por meio da vivência de diferentes
situações práticas de estudo e de trabalho;
Verifica-se nessas orientações uma outra perspectiva para a educação
profissional, indicando um outro tipo de mediação didática baseada numa formação
geral mais ampliada que integra ciência, cultura e tecnologia, visando capacitar o
estudante para domínio intelectual das tecnologias e geração de conhecimento. O
docente assumiria um trabalho pedagógico criterioso que implicaria preparação e
organização de atividades de ensino e estudo e a organização em função do
desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral dos alunos. No entanto, em que grau essas
novas orientações trouxeram mudanças efetivas nas estruturas curriculares e nas práticas
pedagógicas online de modo a alcançar a propalada formação integral dos
trabalhadores? Os processos educacionais de ensino técnico a distância levaram a
mudanças nas formas de mediação docente no sentido de atender a essas reorientações?
Os cursos analisados: que direções a mediação docente tem tomado?
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A partir do estudo do problema e do referencial teórico, foram analisadas as
categorias: Estrutura curricular, práticas pedagógicas online, infra-estruturas material
e pedagógica, e condições institucionais e administrativas dos cursos analisados.
A observação das aulas mostrou que eram organizadas em forma de pacotes
com um capítulo de livro em formato pdf, uma videoaula e um questionário para ser
respondido ao final. Os questionários eram compostos, majoritariamente, de questões
objetivas e na sala de aula online não aconteciam discussões no decorrer das
atividades. As atividades eram sempre individuais, sendo que os espaços de conversas
online eram utilizados apenas quando alguém precisava escrever alguma dúvida.
Assim, a mediação docente não ocorria em função de avançar o estado cognitivo atual
dos alunos suscitando suas participações. Na maior parte das situações observadas, o
que ocorreu foi uma mediação docente impregnada de aspectos instrumentais e
operacionais do ensino, ficando para o professor a organização e o manejo de recursos
técnico-didáticos, e a negociação de conflitos. Conforme Lenoir (2014), a mediação
instrumental por si só é insuficiente para a ampla formação, devendo ser a mediação
do professor, não reduzida "a uma função de composição de uma situação e de colocar à
disposição dos alunos alguns dispositivos. O professor, na sua função mediadora, é um
ator participante ativamente que orienta, que sustenta, que regula, que anima, que
igualmente transmite, não nos esquecendo: é um interventor!" (Ibid., p. 305).
A constatação sobre a presença da mediação instrumental corresponde às
orientações do documento oficial (BRASIL, 2010) de regulamentação dos cursos
pesquisados, as quais sinalizam em diversos eixos para princípios da pedagogia
tecnicista. Foi relatada pelos professores entrevistados a recomendação de que na
organização curricular os cursos não fossem longos, que fossem ligados aos
segmentos do mercado local e que explorassem as tecnologias da informação e
comunicação para democratizar o acesso e aumentar o número de vagas por turmas.
Cabe registrar, também, que os projetos de cursos criados para atender tais
recomendações tiveram excluídas disciplinas de formação humanista, atividades
extracurriculares e até estágios. Em relação à constituição do corpo docente, a
orientação é de que os professores não fossem contratados, mas remunerados por
bolsa. Além disso, o trabalho nesses cursos não é o trabalho principal dos professores.
Eles mencionaram que as aulas dos cursos a distância são complementação de renda:
O e-Tec não vou lá. Posto meu conteúdo e pronto 'fiz'. Não penso mais no curso, nem
no aluno. Acho que se ele fizesse parte dos cursos regulares iria funcionar melhor.
(Prof7, entrevistado em 13/5/2013).
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O pedagógico é muito afetado pelo administrativo. Os professores não são efetivos da
rede, então eles vêm aqui, ministram aula e vão embora. Na primeira semana de aula,
ele viu que a estratégia não funcionou, o que é feito? Nada. Se a coordenação
pedagógica chama ele para conversar, ele não vem. Ele não tem tempo nunca. Todos
trabalham todos os dias em outros empregos e vem para aula aqui à noite. É um bico.
Ele vem aqui, dá aula e vai embora. (Coord5, entrevistado em 25/9/2013).
A maior parte dos professores e tutores entrevistados não tinham formação
pedagógica e alguns nem tinham a docência como profissão, eram funcionários do
âmbito administrativo ou microempresários.
Esses registros mostram que as formas de condução pedagógico-didática visando
formação integral não fazem parte da política de acompanhamento do projeto de
educação profissional a distância. Quando se menciona ―acompanhamento dos cursos‖
verifica-se que se trata de ações meramente administrativas, por exemplo, o processo de
matrículas e a verificação da quantidade de matriculados. Essa constatação aponta para
o desinteresse de órgãos do governo pela qualidade desses cursos, talvez por lhes ser
inconveniente tomar consciência de sua fragilidade em relação ao discurso proclamado.
Pode-se concluir, assim, em primeiro lugar, que a mediação docente constatada é
instrumental, tanto do ponto de vista operacional do ensino quanto no sentido de
educação restrita à formação para o trabalho. As metodologias são associadas a
procedimentos tradicionais, por exemplo, transmissão de conteúdos, pouca
interatividade com os alunos, avaliações cobrando memorização, o que não favorece as
condições concretas propiciadoras de formação integral para os trabalhadores. Entende-
se que esse tipo de formação, rápida e restrita no que diz respeito às atividades e aos
conteúdos, não é suficiente nem para aprendizagem técnica com qualidade, embora
conceda elevação de escolaridade. A precariedade ocorre tanto no tratamento dos
conteúdos quando na formação de valores pessoais e profissionais.
Com efeito, no cenário apresentado dos cursos pesquisados, no Programa Rede
e-Tec Brasil estão presentes as recomendações internacionais para o ensino instrumental
e pragmático. Seus desdobramentos em cada instituição incidem, também, nas relações
pedagógicas, onde é visível o predomínio da mediação instrumental. É importante
lembrar, também, que essa visão busca a obtenção do consentimento ativo das grandes
massas por meio da oferta desses cursos que, apesar de não serem ofertados com os
mesmos critérios dos demais, levam o nome de instituições renomadas, mas seguindo
as orientações internacionais custam menos para o governo, atendem certa demanda de
mão de obra e, indiretamente, têm foco assistencial na medida em que preparam para
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uma ocupação e fazem os indivíduos crerem que o governo está lhes dando uma
oportunidade. Inserem-se, pois, nas políticas de redução da pobreza presentes nos
documentos do Banco Mundial em detrimento da sua extinção (EVANGELISTA e
SHIROMA, 2006; LIBÂNEO, 2012, 2014). Desse modo, a política de EaD, por um
lado, democratiza o acesso mas, por outro, gera outras formas de exclusão social tendo
em vista que os cursos são de frágil formação. Ou seja, instala a inclusão excludente.
Em segundo lugar, constata-se que nos cursos técnicos a distância não há uma
atenção para aspectos cognitivos e pedagógicos, tal como ocorre com os demais cursos
técnicos das instituições federais pesquisadas. Os próprios professores acreditam que o
intuito dos cursos a distância é fazer inclusão social para uma população cognitivamente
frágil e, por isso, não trabalham nas mesmas condições dos demais. Instaurada essa
ideia entre os professores, eles alteram as exigências de formação (COSTA, 2015).
Em terceiro lugar, é possível inferir que a maneira como foram criados e se
mantêm esses cursos indica que, apesar de serem ofertados por escolas federais com
ensino técnico de qualidade tradicionalmente reconhecida, eles concretizam práticas
pedagógicas que pouco coincidem com a formação profissional técnica dessas escolas.
Seguem um padrão de práticas pedagógicas de ensino tecnicista que coloca, em segundo
plano, o desenvolvimento das capacidades intelectuais e a formação humana em geral
dos trabalhadores. Isso quer dizer que, por detrás do discurso da democratização do
acesso, estão fatos como: a oferta de cursos de frágil complexidade técnico-científica;
provimento de uma educação qualitativamente inferior em relação aquela ofertada pelas
escolas técnicas de tradição; a oferta de cursos especificamente dirigida a pessoas da
classe pobre em estado mais acentuado de vulnerabilidade social e, como objetivo
maior, a construção de um aparato ideológico para busca do consenso ativo da
sociedade em função dos interesses do capitalismo mundializado.
Uma visão prospectiva
Uma concepção de educação crítica busca processos de emancipação dos
trabalhadores em que os sujeitos desenvolvam as capacidades humanas em sua
plenitude, de forma crítica e criativa, a fim de serem capazes de promover
transformações sociais. Segundo Manacorda (1991, p. 78), a formação integral ou
omnilateral implica ―[...] um desenvolvimento multilateral, em todos os sentidos, das
faculdades e das forças produtivas, das necessidades e da capacidade de satisfação‖, o
que quer dizer desenvolver um ensino visando ao desenvolvimento de capacidades
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intelectuais, práticas e morais, ou seja, não limitado às condições do indivíduo e nem às
competências profissionais. Para isso, é preciso que os indivíduos sejam inseridos em
processos educacionais fundamentados numa teoria pedagógica que articule a formação
cultural com a científica e comprometida diretamente com o desenvolvimento humano.
Libâneo (2013) explica que a abordagem tecnicista não surgiu por acaso, mas
com a evolução industrial que levou à necessidade de se modelar o comportamento
humano de maneira mais rápida a fim de atender aos avanços industriais. Por essa razão,
não enxerga o processo educacional como processo que forma pessoas, mas sim como
um processo que deve ser rápido por dever atender necessidades econômicas.
A ênfase na exercitação dos processos mentais como forma de se chegar à
auto-estruturação do conhecimento (típico da Escola Nova) foi deslocada
para o uso de técnicas de transmissão passiva; os meios educativos são
autonomizados e o ensino retoma a conotação dos métodos de
heteroestruturação do conhecimento, reeditando, com roupagem nova, a
pedagogia tradicional. (LIBÂNEO, 1990, p. 130 – grifos nossos).
A orientação pedagógica constatada nas observações e depoimentos é a
pedagogia tecnicista a qual usa de procedimentos e técnicas pedagógicas centradas,
como na pedagogia tradicional, na ideia de transmissão direta de conhecimentos, o que
coloca os alunos em situação passiva apenas de recebimento e memorização das
informações. Enquanto que na pedagogia tradicional o professor era o detentor e
transmissor do conhecimento, na tecnicista esse protagonismo se transfere para as
tecnologias didáticas e digitais (livros, videoaulas, portais de ensino, etc.). Contudo, o
aluno continua a receber e memorizar o conhecimento que agora vem de diversas fontes
para, posteriormente, fazer testes e apresentar os resultados. Trata-se de um ensino
concentrado na execução de atividades por si só, eliminando uma diversidade de
atividades de propriedades analítica, crítica e criadora. Tem-se, assim, um currículo de
caráter pragmático e imediatista fundamentados pelos preceitos mencionados
(LIBÂNEO, 2013, 2014). Em oposição ao tipo de formação que esses princípios
induzem, defendemos a Teoria Histórico-Cultural:
[...] defende um currículo assentado na formação cultural e científica em
interconexão com as práticas socioculturais. Tendo como pressuposto que a
escola é uma das mais importantes instâncias de democratização da sociedade
e de promoção de inclusão social, cabe-lhe propiciar os meios da apropriação
dos saberes sistematizados formados socialmente, como base para o
desenvolvimento das capacidades cognitivas e a formação da personalidade,
por meio da atividade de aprendizagem socialmente mediada. (LIBÂNEO,
2014, p. 42).
Para a Teoria Histórico-Cultural (VYGOTSKY, 1931, 2007; LEONTIEV,
1983, 2004; DAVYDOV, 1988), a formação dos processos psíquicos superiores
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decorre da atividade sócio-histórica e coletiva dos indivíduos, expressa em múltiplas
formas de mediação cultural do processo de conhecer, incluindo aí o papel central do
ensino acompanhado e regulado pela mediação didática do professor visando à
promoção do desenvolvimento intelectual, prático, moral e afetivo para o
desenvolvimento da personalidade articulada com um papel social determinado.
Um ensino voltado para a emancipação humana, pressupõe mediações culturais
e sociais: ―A aprendizagem resulta da interação sujeito-objeto, em que a ação do sujeito
sobre o meio é socialmente mediada, atribuindo-se peso significativo à cultura e às
relações sociais‖ (LIBÂNEO, 2010, p. 33, 54). Assim, para que o ensino atue no
desenvolvimento integral do aluno, é preciso que haja mediação didática:
O pensamento teórico não surge e nem se desenvolve na vida cotidiana
das pessoas, ele se desenvolve somente em uma instrução cujos
programas se baseiam na compreensão dialética do pensamento. É
exatamente este ensino que tem o caráter desenvolvimental.
(DAVYDOV, 1999, p. 5, 7 – grifos no original).
Nesse sentido, o desenvolvimento humano superior não ocorre
espontaneamente, requerendo uma intencionalidade e uma determinada organização do
processo de ensino-aprendizagem. Não se trata de memorização de informações ou de
aprendizagem de operações mecânicas. A mediação didática do professor deve
preocupar-se com a relação ativa que o aluno estabelece com o conhecimento. São
importantes os processos de pensamento e ação desenvolvidos na e pela atividade de
estudo, pois constituem-se em ferramentas intelectuais e práticas para futuras
necessidades e para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e moral. A mediação didática,
portanto, pode ser entendida como uma rede de ações e intervenções construída por
alunos e professores no processo de ensino-aprendizagem. Pressupõe uma relação
qualitativa que o aluno constrói com o objeto de conhecimento durante uma atividade
suscitando o desenvolvimento de ações analíticas, críticas e criadoras por parte dos
alunos. Para isso, as atividades de ensino-aprendizagem devem ser contextualizadas e
envolver ações coletivas e individuais, de caráter investigativo, a fim de que os alunos
possam simular situações e soluções para construir relações e significados em nível
conceitual e, ao mesmo tempo, possam ser trabalhados valores e atitudes para a
formação da personalidade.
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MEDIAÇÃO DOCENTE E DISTÂNCIA TRANSACIONAL: USO DO
FACEBOOK NUM MESTRADO EM REGIME MISTO (B-LEARNING)
Lia Raquel Oliveira
Doutora em Educação (Universidade do Minho)
Docente da Universidade do Minho, Portugal
Resumo. O Ensino a Distância (EAD) continua a ser uma modalidade alternativa ao
ensino presencial e nele persiste o problema da Distância Transacional. Não sendo esta
distância apanágio do EAD, ela constitui um problema concreto, porém passível de
minimização/resolução. O professor pode exercer uma mediação pedagógica
caracterizada por um comportamento de suscitador, facilitador e orientador da
aprendizagem. Para tal pode servir-se do Facebook para interagir com os estudantes,
criando um ambiente de familiaridade e informalidade. Apresenta-se aqui um caso de
lecionação num curso de mestrado acadêmico em Educação que funciona em regime b-
learning e no qual foi usado o Facebook, para além da plataforma institucional, como
fórum de discussão e espaço de partilha de trabalhos e sensibilidades. Para recolha de
dados foram usadas as técnicas da observação e análise de documentos. O curso
desenrolou-se num ambiente de investigação-ação crítica no qual o professor investigou
as suas práticas com a colaboração dos estudantes. Conclui-se que uma mediação
plástica exercida pelo professor, servindo-se do sistema de rede social Facebook para
criar um ambiente de familiaridade e informalidade, pode contribuir para superar a
distância transacional no ensino superior online.
Palavras-chave: Ensino superior online; Educação a distância; Distância transacional.
Enquadramento
O texto apresentado enquadra-se no grande tema da pedagogia universitária:
como fazer aprender em contextos de ensino superior? Particulariza no ensino superior
oferecido na modalidade a distância, por via de dipositivos online. Sustenta-se na figura
do professor investigador (DEWEY, 1933; SCHON, 1983, 1992; ZEICHNER 1993,
1996; VIEIRA, 1995) e desenrola-se num ambiente de investigação-ação crítica
(KINCHELOE, 2008).
O caso concreto abordado é o de uma Unidade Curricular (UC) designada
Conteúdos Educativos e Novas Literacias (CENL), integrante do curso de mestrado
acadêmico em Educação, na área de especialização em Tecnologia Educativa, na
Universidade do Minho (Braga, Portugal). O curso vem funcionando em regime de b-
learning (blended-learning) há oito anos. A estrutura curricular integra oito UC‘s,
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funcionando duas de cada vez (em simultâneo), ao longo de oito semanas cada uma. No
ano letivo 2013/2014 este curso funcionou inteiramente online para catorze estudantes e
híbrido (blended) para oito.
É sobre esta edição do curso que o texto se debruça, analisando o recorrente
problema da distância transacional (MOORE, 1993) e a forma como a mediação
docente pode ser exercida, com resultados positivos, através do uso das redes sociais,
aqui o Facebook (FB).
A problemática
O Ensino a Distância (EAD) continua a ser uma modalidade alternativa ao
ensino presencial, apesar de muitos entenderem que, no atual contexto neoliberal de
Economia do Conhecimento, deixou de existir ensino e passou a só haver
aprendizagem, transformando-se, por via da racionalidade técnica, o ensino online em
apenas aprendizagem. Desconsideramos, neste texto e por razões pragmáticas, a EAD
enquanto Educação a Distância. Consideramos o binômio ensino-aprendizagem e
entendemos que, do ponto de vista do professor, falamos de ensino e, do ponto de vista
do estudante, falamos de aprendizagem. Claro está, mas omitido não poderia ser, que:
O binômio ensino-aprendizagem faz sentido porque não existe ensino sem
aprendizagem. Contudo, existe aprendizagem sem ensino. A aprendizagem
no quadro do ensino-aprendizagem ocorre na sequência de um esforço
intencional, formal e dirigido — o ensino. Ocorre num ambiente ‗concertado‘
para o efeito. Nesta concertação participam, necessariamente, aqueles que
aprendem ou querem aprender. (OLIVEIRA, 2003, p. 253).
Nos ambientes e plataformas que funcionam online e permitem um ensino a
distância muito evoluído, em certos aspetos bastante próximo ao presencial, é possível
usar métodos ativos, aplicar a metodologia de projeto e centrar as atividades no
estudante, preferencialmente em equipes colaborativas de estudantes.
Todas estas metodologias são compatíveis com as práticas de e-learning —
aprendizagem em redes eletrônicas — sendo a expressão e-learning objetiva e
pedagogicamente correta (POUTS-LAJUS, 2002). Objetiva porque significa ―aprender
através de redes eletrônicas‖, designando, portanto, o ato de aprender e não o ato de
ensinar. Pedagogicamente correta porque coloca o acento na atividade autônoma do
aluno. A verdade é que a famosa convergência (JACQUINOT, 1993) entre os dois
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sistemas ou modalidades de ensino é uma realidade. Uma realidade que ultrapassa o
conceito que temos de sistemas mistos.
A distância transacional
A Distância Transacional cunhada por Michael Moore em 1993 foi e continua a
ser o calcanhar de Aquiles do EAD: a separação geográfica entre os envolvidos,
professores e estudantes, faz surgir ―um espaço psicológico e comunicacional a ser
transposto, um espaço de potenciais mal-entendidos entre as intervenções do instrutor e
as do aluno‖ (MOORE, 2002, p. 2). Esta distância constitui, portanto, um espaço
psicológico e educacional gerado pelas comunicações realizadas entre pessoas que estão
geográfica e temporalmente separadas. Esta distância varia de acordo com as situações e
as pessoas envolvidas e a sua diminuição traz efeitos positivos significativos para os
processos de ensino e aprendizagem que ocorrem na modalidade a distância.
Porém, e de acordo com artigo recente (OLIVEIRA, 2015), entende-se que a
distância transacional não é apanágio do EAD podendo ocorrer (ocorrendo) nas
situações de ensino presencial. Em aulas magistrais, em anfiteatros, em grandes ou
pequenas salas, que tipo de comunicação temos? Uma comunicação unidirecional na
qual o estudante é suposto estar atento e absorver a matéria. Desde logo, a matéria é
tudo o que tem massa e ocupa espaço, toda a coisa que tem existência física podendo ser
líquida, sólida ou gasosa e sendo definida pelas suas propriedades (gerais ou
específicas). As propriedades gerais são comuns a todo o tipo de matéria: massa, peso,
inércia, elasticidade, compressibilidade, extensão, divisibilidade, impenetrabilidade...
Será desta última propriedade que vem o termo matéria em educação? Esta espécie de
ensino — o magistral — usado por sistema, não deixa espaço nem tempo para que um
efetivo processo de comunicação se estabeleça. ―A distância transacional revela as
relações de poder entre professor e estudante‖ (Idem, p. 174). As palestras síncronas ou
assíncronas reproduzem ou tendem a reproduzir, a priori, este modelo de ensino. Ou
seja, um ensino-aprendizagem ativo e de qualidade não se suporta, apenas, em palestras
(aulas expositivas) dadas pelo professor.
A mediação docente
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O professor e a professora sempre foram mediadores: eles operam entre os
conteúdos de conhecimento e os estudantes, produzem e/ou selecionam conteúdos,
organizam-nos, ministram-nos (consoante o modelo pedagógico adotado) ou
estabelecem atividades que permitirão aos estudantes aceder a e reconstruir esse
conhecimento.
A origem dos processos de aprendizagem e desenvolvimento está, por natureza,
na relação e interação entre pessoas (VYGOTSKY, 1984).
O professor (...) assume uma nova atitude. Embora, vez por outra, ainda
desempenhe o papel de especialista que possui conhecimentos e/ou
experiências a comunicar, no mais das vezes desempenhará o papel de
orientador das atividades do aluno, de consultor, de facilitador da
aprendizagem, de alguém que pode colaborar para dinamizar a aprendizagem
do aluno, desempenhará o papel de quem trabalha em equipe, junto com o
aluno, buscando os mesmos objetivos; numa palavra, desenvolverá o papel de
mediação pedagógica. (MASETTO, 2000, p. 142).
Sendo características da mediação pedagógica o diálogo, a troca de experiências,
o debate de dúvidas, questões ou problemas, o questionamento, a orientação, entre
outras (Idem, p.145-146).
Desta forma, o professor é um ―gerador ativo de situações de potencial
aprendizagem‖ (OLIVEIRA, 2004, p. 87). Ele age intencionalmente para proporcionar
ao estudante as condições para que se assuma como sujeito da própria aprendizagem. A
mediação docente é uma práxis que imagina, atua e verifica.
A mediação pedagógica significa a atitude do professor, é caracterizada pelo
seu comportamento de facilitador e orientador da aprendizagem. Consiste em
estabelecer uma espécie de ponte entre o aprendiz e os conhecimentos a
serem construídos, de forma que o aprendiz chegue a seus objetivos pelo
exercício de sua autonomia, tornando-se sujeito do processo de
aprendizagem, de forma ativa e colaboradora. (MASETTO, 2000, p. 145).
Entre 1950 e 1963, Reuven Feuerstein desenvolveu, no contexto de trabalho com
crianças com profundas disfunções intelectuais e acadêmicas, e posteriormente
fundamentada pelo estudo de populações sócioculturalmente desfavorecidas, a teoria da
Experiência de Aprendizagem Mediada (EAM, em inglês MLE, Mediated Learning
Experience). A teoria da EAM debruça-se sobre a interação entre o ser humano e o seu
ambiente sóciocultural, através de um mediador humano (FEUERSTEIN &
FEUERSTEIN, 1999, p. 3-4).
Argumentamos que a EAM, enquanto uma qualidade da interação, é
responsável por dois fenómenos importantes característicos do ser humano:
modificabilidade e diversidade. Estes dois fenómenos, que estão fortemente
interligados, nomeadamente a propensão do ser humano para modificar e
diversificar as suas estruturas cognitivas ao longo de estádios de
desenvolvimento, são fundamentais para a teoria da modificabilidade
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cognitiva estrutural advogada neste volume. A teoria postula que uma das
mais importantes características da humanidade é a sua considerável
plasticidade e flexibilidade, tornando o humano capaz de modificar e
diversificar a sua estrutura cognitiva de uma forma radical que afetará a sua
capacidade para aprender e adaptar-se a situações mais complexas e não
familiares‖ (FEUERSTEIN & FEUERSTEIN, 1999, p. 12, tradução nossa).
Ou seja, o professor é, ou deve ser, um mediador modificável (também aprende)
e modificador (suscita aprendizagens nos outros), diverso (tem a sua própria estrutura),
flexível (adapta-se aos outros e às situações) e plástico (mantendo a sua identidade, lida
com diversas identidades).
Apresentam estes autores doze parâmetros para descrever a qualidade da
interação da EAM (idem, p. 15, tradução nossa):
1) Intencionalidade e reciprocidade;
2) Transcendência (ir para além dos objetivos da interação, tornar o outro
competente...);
3) Mediação do sentido;
4) Mediação do sentimento de competência;
5) Mediação da regulação e controle do comportamento;
6) Mediação da partilha do comportamento;
7) Mediação da individualização e da diferenciação psicológica;
8) Mediação da busca de metas, estabelecimento de metas e consecução dos
objetivos;
9) Mediação do desafio: a procura da novidade e da complexidade;
10) Mediação de uma consciência do ser humano enquanto entidade mutável;
11) Mediação da procura de uma alternativa otimista;
12) Mediação do sentimento de pertença.
Destes doze parâmetros, os três primeiros são condição necessária para que uma
interação possa ser classificada como EAM. As três são consideradas responsáveis pelo
que todos os seres humanos tem em comum: modificabilidade estrutural. São de uma
natureza universal, podendo ser encontradas em todas a raças, grupos étnicos, entidades
culturais e estratos socioeconômicos. As outras nove são fortemente dependentes da
cultura (idem, p. 23-24). ―A ausência de sentido é o efeito de uma falta de laços
emocionais/afetivos‖ (Idem, p. 36, tradução nossa). Importa, portanto, e para que exista
uma experiência de aprendizagem mediada no EAD, criar esses laços
emocionais/afetivos para que o sentido possa produzir-se.
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O Facebook
Redes sociais são, como é sabido, estruturas sociais compostas de pessoas ou
organizações. Enquanto estruturas sociais, caracterizam-se pela sua abertura o que
permite a existência de relações horizontais. As redes sociais suportadas por sistemas
online podem ser, como também é sabido, de variada natureza: de relacionamentos,
profissionais, etc.
De entre os múltiplos sistemas de redes sociais de relacionamentos, melhor
dizendo, sistemas de criação e sustentação de redes sociais online, que foram surgindo
nestas duas décadas iniciais do século vinte e um, o Facebook, lançado em 2004, impôs-
se rapidamente e tornou-se hegemônico. Cada vez mais, dificilmente alguém não tem
uma conta no Facebook.
Esta rede social permite que redes de pessoas se mantenham ligadas entre si e,
em certos casos, funciona mais eficazmente do que o telefone (ou telemóvel ou celular).
Para comunicar nascimentos, falecimentos, marcar encontros, convocar manifestações
de rua entre as mais comuns situações. Se esta rede social tem inúmeras facilidades e
vantagens, também tem um problema sério: distrai na sua superficialidade. Porém e
dadas as suas características e potencialidades:
- O seu caráter de uso generalizado e global;
- A sua usabilidade, em particular a facilidade de uso;
- A sua operacionalidade (se não carrega o Facebook nada carrega);
- As suas funcionalidades de comunicação (chat e videoconferência);
- A sua presença constante no quotidiano de um enorme número de pessoas (no
computador, no telefone);
O Facebook pode ser utilizado produtivamente para efeitos de ensino-
aprendizagem, no âmbito deste texto, no ensino superior e no ensino superior a
distância.
Objetivos e procedimentos metodológicos
Debruçando-se este texto sobre o recorrente problema da distância transacional
(MOORE, 1993) e a forma como a mediação docente pode ser exercida, com resultados
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positivos, através do uso das redes sociais, aqui o Facebook, temos os seguintes
objetivos de pesquisa:
- Confirmar se o uso do Facebook pode contribuir para superar a distância
transacional, num curso de mestrado a distância (para catorze dos estudantes e
blended para oito);
- Verificar de que forma pode ser usado o Facebook para esta finalidade;
- Analisar o tipo de mediação docente exercida.
Os procedimentos de recolha de dados incluem: observação participante com
recurso a notas de campo; análise documental de postagens no Facebook (neste caso
podendo esta técnica, julgamos, ser considerada como instrumento da observação);
análise documental de reflexões finais pedidas aos participantes; e produtos das
atividades pedagógico-didáticas (atividades) levadas a cabo (resultados acadêmicos,
avaliação das aprendizagens sob a forma de classificação na escala 0-20 valores).
Para obtenção de informações avaliativas sobre o entendimento dos participantes
relativamente ao funcionamento da UC e à medida da ausência de distância
transacional, foram pedidas aos participantes as reflexões acima referidas sob a forma
de atividade (a última, nº 8). É de realçar que esta atividade de autoavaliação e avaliação
do funcionamento da UC é uma nossa prática pedagógica habitual, de há muitos anos.
Esta prática permite-nos pensar as próprias práticas, revisitá-las, mantê-las ou modificá-
las.
Os dados recolhidos foram analisados por via de análise de conteúdo
convencional.
O uso do Facebook, nesta proposta, começou pela necessidade identificada de
realizar fóruns de discussão de forma fácil, ativa e participada. A funcionalidade de
fórum da plataforma Blackboard, usada institucionalmente, não se nos afigurou a
melhor nem a mais usável. Foram realizadas quatro atividades de fórum e as restantes
quatro atividades (confronto de versões narrativas audiovisuais, criação de vídeo
identitário, leituras teóricas recomendadas e apresentadas em e-book, avaliação) foram
também postadas, compartilhadas e comentadas (foram também depositadas na
Blackboard, assim como um pdf de toda a atividade no FB, para garante institucional).
Resultados e discussão
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Pela observação participante pudemos verificar as dinâmicas de aceitação desta
abordagem, por parte dos estudantes, ao longo do percurso formativo. A proposta
incluía um conjunto de atividades (para maior detalhe consultar OLIVEIRA, 2015) que
foram cumpridas na íntegra e nos prazos previstos. As quatro atividades de fórum, em
concreto, tiveram um adesão imediata (rapidez na realização) e muito envolvida
(emoções vivas e expressas). Supomos que talvez isso possa ter ocorrido pela natureza
das questões em discussão. Os temas dos fóruns foram lançados mediante a
apresentação de documentos audiovisuais (videos) com afirmações e perguntas
(questões) provocadoras. De qualquer forma, era essa a intenção pedagógica: provocar,
suscitar emoções e afetos, mexer com as pessoas, com a sua cognição e emoção,
inseparáveis como sabemos desde O Erro de Descartes de António Damásio: ―Sinto,
logo existo‖ (DAMÁSIO, 1995). Pensamos que foi possível criar sentidos, como
sugeriam Feurstein e Feurstein (1999), através da criação de laços emocionais/afetivos
entre professora e estudantes e entre estudantes e estudantes. Dois estudantes, em
particular, assumiram espontaneamente funções tutoriais, ajudando os colegas a resolver
problemas e a superar dificuldades. Igualmente pensamos que a mediação pedagógica
foi exercida, como referia Masetto (2000), pela atitude da professora e pelo seu
comportamento de facilitadora e orientadora da aprendizagem. Exerceu ainda a
professora, na lógica de Masetto, uma mediação modificável (também aprendeu),
modificadora (suscitou aprendizagens nos estudantes), diversa (tendo a sua própria
estrutura), flexível (adaptando-se aos outros e às situações) e plástica (mantendo a sua
identidade, lidando com as diversas identidades).
A atividade oito pedia reflexões finais e classificação das aprendizagens
(autoavaliação das aprendizagens) assim como avaliação do funcionamento da UC (do
gênero elencagem de aspetos positivos e negativos). Para esta atividade, uma das
equipas abriu um documento GoogleDocs que serviu como Diário de Bordo e que foi
sendo elaborado ao longo do tempo.
Nas reflexões sobre a UC, foram mencionadas as seguintes palavras, expressões
e frases: dificuldades, entraves, esforço, interesse, colaboração, construção colaborativa,
muitas aprendizagens novas, aprendizagens com aplicação na prática pedagógica,
clareza, organização, atualidade, relevância, construtivismo, grau de complexidade
progressivo, autonomia, liberdade de escolha de ferramentas, emancipação crítica,
capacidade de decisão, o Facebook como excelente estratégia de comunicação e
colaboração, presença inequívoca da docente e sua disponibilidade.
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Quanto a resultados acadêmicos, as classificações foram bastante boas, tendo
oscilado, na escala 0-20 valores, entre 13 e 20: três 13; cinco 14; quatro 15; quatro 16;
três 17; dois 19; e um 20. Os produtos finais das atividades revelaram envolvimento nas
tarefas e elevada qualidade. Um dos produtos (e-book) foi divulgado na página de FB
da docente como exemplo de um bom trabalho.
Considerações finais
A rede social Facebook, usada pelas pessoas generalizadamente e globalmente,
pode ajudar a superar a distância transacional permitindo mediar interações — ao nível
escrito e oral, postagens, comentários, chat, videoconferência — e aproximar, por
afinidades e plasticidade do professor, os participantes da situação de ensino-
aprendizagem.
Este nosso caso revelou elevada satisfação por parte dos envolvidos e atendeu
muito satisfatoriamente as necessidades de comunicação e partilha bem como de
armazenamento de produtos.
O EAD caracteriza-se pela distância física e temporal entre estudantes e
professor. Não sendo a Distância Transacional apanágio do EAD (OLIVEIRA, 2015), o
papel do professor — mediador — é o de esbater ou eliminar esse espaço e tempo. Este
papel remete para um perfil do professor orientador, companheiro de equipa, disposto a
também aprender, disposto a suscitar aprendizagens nos outros, diverso mas flexível —
com elevada capacidade de empatia (capacidade de sentir com) e plasticidade.
Uma mediação plástica exercida pelo professor, servindo-se do sistema de rede
social Facebook para criar um ambiente de familiaridade e informalidade, pode
contribuir para superar a distância transacional no ensino superior online.
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MEDIAÇÃO DIDÁTICA NOS AMBIENTES VIRTUAIS DE APRENDIZAGEM
Yara Oliveira e Silva
Mestre em Educação, Linguagem e Tecnologias (MIELT-UEG).
Docente da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Câmpus Itumbiara.
MirzaSeabraToschi
Doutora em Educação. Docente da Universidade Estadual de Goiás, Câmpus de
Ciências Socioeconômicas e Humanas e do Programa de Mestrado Interdisciplinar em
Educação, Linguagem e Tecnologias (MIELT-UEG). [email protected]
Resumo. Este texto é um recorte de pesquisa realizada em nível de mestrado. O estudo teve
como objetivo principal analisar a ocorrência da mediação didática nos ambientes de
aprendizagem online. Optou-se por um estudo de natureza qualitativa, fundamentado nas
concepções de Lüdke e André (1986). O embasamento teórico que permitiu compreender a
dimensão teórico-conceitual do problema estudado conta, principalmente, com Lenoir (2011),
Harasimet al (2005), Peters (2001, 2012), Moore e Kearsley (2013), Toschi (2010), Libâneo
(2005), D‘Ávila (2002) e Alonso (2010). A coleta de dados foi realizada em um curso de
especialização voltado à formação continuada de profissionais da educação. Os instrumentos
utilizados nessa coleta foram questionários semiabertos direcionados aos cursistas e
orientadores acadêmicos do curso, como também observação por meio de etnografia virtual,
orientada pelos estudos de Hine (2005). A análise dos dados foi realizada por meio da técnica da
análise de conteúdo, segundo a contribuição de Franco (2005). As categorias de análise se
solidificaram em três, sendo elas: a) o tempo e a educação a distância; b) a mediação didática; e
c) a interatividade. A análise dessas categorias evidenciou que a mediação didática ainda não é
uma realidade preponderante no ambiente virtual de aprendizagem. Infere-se que a mediação
didática exercida pelo professor a distância ocorre a partir de suas próprias convicções sobre o
que é interação, mediação e organização de um ambiente de aprendizagem online. Sendo assim,
não é exercida igualmente por todos os que atuam na educação a distância (EaD), já que a opção
pela organização didática e pelas intervenções feitas pelos mesmos não são consensuais. Nesse
sentido, exercer a mediação didática nos ambientes virtuais de aprendizagem (AVA) demanda a
atitude e o esforço do professor a distância a partir de seus próprios princípios didático-
metodológicos.
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Palavras-chave: Educação a distância e mediação didática. Mediação didática em
AVA. EaD e mediação.
Introdução
O principal objetivo desse estudo é analisar a ocorrência da mediação didática
nos ambientes de aprendizagem online, bem como a maneira pela qual o professor
intervém na relação do aluno com o conhecimento. Especificamente, pretendeu-se
identificar e analisar a concepção sobre a mediação didática na educação a distância
(EaD), assim como descrever como ocorre a utilização das ferramentas nos ambientes
virtuais de aprendizagem (AVA), tendo como propósito a compreensão de que forma
tais ferramentas podem favorecer a interação entre os diferentes sujeitos nos AVA. A
partir disso, objetivou-se investigar as intervenções didáticas decorrentes do uso das
tecnologias nos AVA, analisando a mediação didática, suas características e
contribuição no processo de construção de conhecimento.
O problema de pesquisa que norteou o estudo se apresenta na seguinte questão: a
partir de quais processos ocorre a mediação pedagógica nos ambientes de aprendizagem
online e como o professor a distância intervém na relação do aluno com o
conhecimento?
A mediação didática nos cursos online é fundamental, uma vez que,
possivelmente, promoverá a construção de conhecimentos no processo de formação já
que a mediação didática está pautada nos princípios de intervenção didática realizada
pelo professor a distância no propósito de suscitar no aprendiz o desejo pela construção
do seu próprio conhecimento. Trata-se da dupla dimensão da mediação apresentada por
Lenoir (2011): a mediação cognitiva e a mediação didática.
Discutir sobre a mediação didática na EaD nos remete a refletir sobre a didática
nos cursos a distância que, como assinala Peters (2001, p. 45), ―do ponto de vista
didático, a educação a distância é, portanto, realmente uma forma de ensinar e estudar
sui generis. Por essa razão, a solução de problemas didáticos que surgem no ensino a
distância deve ser buscada com princípios teóricos, interpretações, concepções e
experiências específicas próprias‖. A didática na EaD necessita de organização didático-
pedagógica própria a essa forma de ensino, o que torna perceptível que a didática na
EaD ainda se constitui num desafio e, por isso, merece atenção nas pesquisas.
Procedimentos metodológicos
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A opção pelo estudo de natureza qualitativa se embasou na contribuição de
Lüdke e André (1986) e consistiu no levantamento de informações sobre o processo de
formação continuada de professores em ambientes virtuais de aprendizagem.
Na realização da pesquisa de campo foram utilizados os seguintes instrumentos
de coleta de dados: questionários semi abertos aplicados presencialmente aos cursistas e
orientadores acadêmicos e observação por meio de etnografia virtual (HINE, 2005). A
escolha de um curso a distância recaiu em um curso de especialização voltado à
formação continuada de profissionais da educação, ofertado pelo Centro Integrado de
Aprendizagem em Rede da Universidade Federal de Goiás (CIAR/UFG).
A descrição e análise dos dados foram realizadas utilizando a técnica de análise
de conteúdo. Para Franco (2005), a análise de conteúdo requer que seja valorizado o
contexto, sobretudo em estudos qualitativos, o que possibilita ao pesquisador fazer
inferências a partir dos elementos de uma comunicação. Para a autora, existem alguns
elementos básicos que compõem o processo de comunicação: ―fonte ou emissão, um
processo codificador que resulta em uma mensagem e se utiliza de um canal de
transmissão; um receptor, ou detector da mensagem, e seu respectivo processo
decodificador‖ (FRANCO, 2005, p. 20). A partir dos dados levantados foram feitos
reagrupamentos, o que permitiu, por aproximações de respostas, agrupar gradativamente
os resultados obtidos, iniciando pelos índices, passando aos indicadores e, por fim às
categorias. A seguir apresentaremos os resultados.
Resultados
A princípio, seguindo as orientações de Franco (2005),levantou-se 15 macro
categorias, que emergiram das respostas obtidas por meio dos questionários, como ainda
das observações etnográficas no AVA. Após a realização de análises, aproximações e
reagrupamentos, as 15 macro categorias foram reduzidas a três categorias: 1) o tempo e
a educação a distância, 2) mediação didática e, 3) interatividade.
A partir da aproximação das teorias e dos dados coletados, procedeu-se a
categorização que emergiu destes dados e teorias. As três categorias permitiram a
organização dos dados, a definição das teorias que explicaram os dados e a análise e
interpretação deles. Os dados coletados, conforme já mencionado, foram coletados por
meio de questionários semi abertos entregues aos cursistas e orientadores acadêmicos
que atuaram no curso investigado. Já a observação foi feita no AVA seguindo as
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orientações de Hine (2005) sobre etnografia virtual. A seguir essas categorias são
apresentadas e discutidas.
A categoria materializada como ―o tempo e a educação a distância‖ foi
percebida pela coincidência de relatos de cursistas que alegaram ter o tempo como um
dos aspectos que determinam a escolha em cursar uma especialização a distância. O
tempo, na perspectiva de Rangel (2009), é importante para entender a presença, a
ausência e a participação dos cursistas em um ambiente de aprendizagem online.
Figura 1: Definição da primeira categoria: o tempo e a educação a distância
Fonte: elaborada pelas autoras deste estudo.
A categoria tempo pode ser analisada por duas vertentes. Na primeira vertente,
tem-se o tempo como elemento que determina a presença/ausência do cursista no
decorrer do curso (RANGEL, 2009). Por outra vertente, a palavra tempo aparece
associada à flexibilidade e acessibilidade, que permite aos profissionais, sobretudo os da
educação, a possibilidade da formação continuada para o exercício da profissão,
conforme apontado por Nóvoa (1999).
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A definição da segunda categoria aconteceu a partir de indicadores que
emergiram da coleta de dados realizada por meio dos questionários. Os indicadores
geraram oito macro categorias, que foram solidificadas em uma única, denominada
―mediação didática (MD)”. É possível observar que a MD foi possibilitada, segundo
informações obtidas, por elementos que viabilizam a interação do professor a distância
em meio ao diálogo proporcionado pelo uso de tecnologias no ambiente virtual. Nesse
diálogo, pode-se apreender a preocupação com a produção de conhecimento por parte
do aprendiz, conforme apontado por Peters (2001). Isso caracteriza que a MD está
relacionada ao conhecimento, na perspectiva apresentada por Lenoir (2011) e D‘Ávila
(2002). Para a compreensão dessa categoria, palavras como conhecimento, intervenção,
interação e feedbackauxiliaram significativamente.
Figura 2: Definição da segunda categoria: mediação
didática
Fonte: elaborada pelas autoras deste estudo.
Percebe-se que essa categoria se constrói baseada na necessidade da
comunicação, interação, diálogo e feedback de forma que o professor auxilie o aluno no
processo de construção do conhecimento. Por isso, centra-se no diálogo, na interação e
na comunicação (PETERS, 2012); (BELLONI, 2001). Foi observado que a mediação
didática era exercida no AVA (LENOIR, 2011). As definições apresentadas pelos
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cursistas sobre o que é mediação didática no AVA emparelham interação e mediação
como palavras sinônimas. No entanto, há diferenças entre elas.
Na figura 3, está representada a concretização da terceira categoria: a
“interatividade”. Para construir essa categoria, foram isoladas as respostas obtidas que
remetiam à MD. O resultado foi que as respostas restantes remetiam à ausência de MD e
à existência de estratégias utilizadas que determinavam a soberania de algumas
estratégias de interação, com mais intensidade de interatividade. O que fortaleceu a
determinação dessa categoria foi a percepção de elementos que demonstraram a
ausência de MD e de interação em casos específicos de algumas disciplinas no AVA. A
prevalência do uso do material didático no ambiente desprovido da mediação docente e
a necessidade de mais mediação, relatada por alguns cursistas, também justificaram a
interatividade como uma categoria de análise.
A organização do AVA com vista ao desenvolvimento de uma aprendizagem
apoiada nos materiais disponíveis no ambiente indica que a interatividade foi bastante
valorizada, já que a ausência da relação entre as pessoas percorre boa parte do curso. É
o que Belloni (2001) explica ao discorrer que a interatividade se define pela interface da
máquina com o ser humano. No caso do curso analisado nesta pesquisa, a interatividade
foi permitida a partir da disposição de materiais no AVA e ausência de diálogo e
feedback.
Por meio da etnografia virtual, pode-se realizar a observação do ambiente do
curso que mostrou a interatividade como uma tendência no ambiente virtual de
aprendizagem analisado. A descrição do curso e do ambiente no corpus do estudo
evidenciou que a simples descrição não demonstraria apenas suas possibilidades de
mediação didática, mas também a organização que permite ao aluno interagir com o
ambiente e com seus recursos. Por essa razão, essa categoria foi útil para entender como
está organizado o curso, com vistas a diferentes abordagens do processo de ensino e
aprendizagem, principalmente quando há ausência de mediação didática.
Figura 3: Definição da terceira categoria: interatividade
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Fonte: elaborada pelas autoras deste estudo.
Por meio da categoria interatividade, pode-se constatar que a atuação dos
orientadores acadêmicos é discordante, já que alguns se esforçam para realizar a
mediação didática, enquanto que outros sequer a tentam, deixando que as discussões
caminhem sem debate. Com isso, a mediação é transferida para o material didático
disponibilizado para estudos (D‘AVILA, 2002); (PRETI, 2010).
Após a análise das categorias que emergiram dos dados, pode-se afirmar que
exercer a mediação didática na EaD é um atributo próprio do ser humano que precisa
permitir-se a descobrir novas práticas.
Enfim, a mediação didática é um fenômeno que decorre de relações
exteriorizadas ao sujeito que necessita organizar a si próprio, assim como elaborar um
processo que o condicione à construção do conhecimento, conforme apontou Lenoir
(2011). Deriva daí a necessidade do professor mediador ser capaz de realizar
intervenções educativas, estimulando o aluno ao exercício de sua mediação cognitiva,
concomitantemente à mediação didática. Trata-se de um processo que necessita ter
como finalidade a produção de conhecimento por parte do aprendiz.
Conclusão
O objetivo principal da pesquisa, que intencionou analisar a mediação didática
nos ambientes virtuais de aprendizagem a partir da ação docente e de sua intervenção na
relação do aluno com o conhecimento, em especial de um curso de formação continuada
de professores, apontou para caminhos reveladores e promissores.
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Quando iniciados os estudos sobre a mediação didática nos cursos a distância,
tínhamos por certo que havia uma carência de estudos nessa área, fato confirmado pela
revisão de literatura que apontou poucos estudos envolvendo a didática na EaD.
Quando o problema da pesquisa propunha entender como o professor pode
intervir didaticamente na relação do aluno com o conhecimento, é destacado o fato de
que a mediação didática realizada pelo professor intenciona fortalecer a mediação
cognitiva realizada pelo aluno (LENOIR, 2011), o que não é tarefa simples, nem
desenvolvida por todos os professores que atuam na educação a distância. No curso
analisado, pelas características de atuação dos orientadores acadêmicos no ambiente
virtual de aprendizagem, é possível destacar que esse orientador, que em outras
instituições poderia ser chamado de tutor a distância, exerce função docente. Os
desafios da docência online, como apresentados por Toschi (2011) e Mendonça (2009),
são amplos. Essa docência não pode ser restrita apenas à viabilização do contato do
aluno com os materiais disponíveis no ambiente, o que poderia ser entendido como
interatividade alicerçada pelo uso de diversas tecnologias e recursos. Seu objetivo
principal deve ser o de contribuir no/com o processo de construção de conhecimento,
na/com a relação que pode ser estabelecida entre o aluno e o objeto, como
demonstraram os estudos de D Ávila (2002), Libâneo (2005) e Lenoir (2011).
Por essa razão, o professor a distância é colocado entre esses elementos, na
condição de mediador, de estimulador da curiosidade e da necessidade que precisa ser
despertada no aluno. Essa é a mediação didática realizada pelo professor (LIBÂNEO,
2005; LENOIR, 2011). Nesse processo, as tecnologias disponíveis para ampliar e
viabilizar o acesso aos conteúdos e objetos de aprendizagem podem se tornar aliadas,
desde que não sejam tomadas isoladas dos objetivos de ensino e de aprendizagem, mas
na concepção de dupla mediação, como apresentada por Toschi (2010).
Fazer a mediação didática em ambientes de aprendizagem online requer esforço
por parte dos professores que atuam na EaD. Para isso, não basta apenas a vontade, mas
todo o ambiente de aprendizagem precisa estar organizado numa concepção de
aprendizagem que possibilite diferentes mediações (MENDONÇA, 2009; TOSCHI,
2010): deslocar dos meios às mediações torna-se, nesse sentido, uma necessidade.
Essa necessidade foi percebida no curso investigado, já que, por diversos
momentos, a interatividade prevaleceu. A forma de apresentação de boa parte das
disciplinas no AVA, a disposição de recursos, a ausência de interação e de feedback,
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além da opção pelo desenvolvimento de atividades individualizadas, em detrimento das
colaborativas, são alguns indícios dessa supremacia.
A preferência de alguns orientadores acadêmicos por não diversificar os
recursos, assim pelo uso de uma única forma de realização das atividades no ambiente,
acabaram engessando e subtraindo as possibilidades de intervenção na relação entre o
aluno e o conhecimento. Peters (2001, 2012), Moore e Kearsley (2013) reafirmaram a
necessidade de que a aprendizagem em ambientes virtuais esteja pautada, sobretudo, no
diálogo, na comunicação e na interação. Da mesma forma, Harasimet al (2005)
vislumbraram que a comunicação mediada por computador (CMC) pudesse apontar
caminhos para a aprendizagem em redes, de forma colaborativa. No entanto, quando as
estratégias mais presentes remetem à interatividade que ocorre do sujeito aprendiz com
o AVA, tornando-a soberana, a mediação didática é silenciada e tende a não acontecer.
Todavia, a mediação didática não é o ponto mais forte da atuação dos
orientadores acadêmicos no curso investigado, até porque é exercida, de fato, pela
minoria e, de maneira figurada, por alguns que acreditam fazer MD, não fazendo mais
que interagir. A confusão entre interatividade, interação e mediação permeou as análises
quando se contrapunham as respostas obtidas nos questionários com a observação do
que acontecia no AVA.
Ao finalizar este estudo, ficou a sensação de que a pesquisa está apenas em seu
início, já que foram provocadas outras dúvidas, outros questionamentos que surgiram
involuntariamente, mas que foram inevitáveis. Além disso, realça um agravante já
detectado por outros estudos: a manutenção de resistências à compreensão da EaD como
uma forma de ensino secundarizada no interior das próprias instituições, como também
pelas políticas públicas educacionais que a geram. No interior das instituições, esse fato
fica comprovado pela dificuldade em obter dados acadêmicos e registros que fazem
parte das formalidades administrativas e rotineiras de uma instituição de ensino,
conforme apontou o estudo de Faria (2011). Em relação às políticas públicas, é
verificado o descompromisso com a profissionalização dos que atuam em boa parte das
instituições que ofertam EaD, já que, por não possuírem vínculo empregatício, os
profissionais rompem bruscamente com todo o processo no qual esteve inserido
(ALONSO, 2010; FARIA, 2011).
Esses fatores apresentam implicações didático-pedagógicas no processo de
construção de conhecimento, uma vez que podem ocasionar a descontinuidade das
ações didáticas praticadas pelos que atuam na educação a distância, não
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proporcionando, assim, o amadurecimento de boas práticas de EaD. Isso repercute na
ação docente e na dificuldade em exercer a mediação didática nos ambientes online de
aprendizagem.
Frente a esse quadro, espera-se que este estudo tenha contribuído para instigar
novas provocações e inquietações para estudos posteriores.
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