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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS RICARDO RODRIGUES NEVES COSTA A MOEDA DESDE A ANTIGUIDADE: sua evolução como equivalente universal de mercadorias GOIÂNIA 2013

A Moeda Desde a Antiguidade_sua Evolução Como Equivalente Universal de Mercadorias_FINAL

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Conta a histórias das moedas desde a antiguidade.

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE GOIÁS

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS ECONÔMICAS

RICARDO RODRIGUES NEVES COSTA

A MOEDA DESDE A ANTIGUIDADE:

sua evolução como equivalente universal de mercadorias

GOIÂNIA

2013

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RICARDO RODRIGUES NEVES COSTA

A MOEDA DESDE A ANTIGUIDADE:

sua evolução como equivalente universal de mercadorias

Monografia apresentada ao curso de

Ciências Econômicas da Pontifícia Universidade

Católica de Goiás, como parte dos requisitos para

obtenção do título de bacharel em Ciências

Econômicas.

Orientador: Prof. Dr. Aristides Moysés

GOIÂNIA

2013

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Curso de Ciências Econômicas – Pontifícia Universidade Católica de Goiás

A MOEDA DESDE A ANTIGUIDADE:

sua evolução como equivalente universal de mercadorias

MONOGRAFIA

Apresentada ao corpo docente do Curso de Ciências Econômicas da Pontifícia

Universidade Católica de Goiás, para obtenção do título de:

Bacharel em Ciências Econômicas

Por:

RICARDO RODRIGUES NEVES COSTA

Banca examinadora

Orientador:

Prof. Dr. Aristides Moysés – PUC GO

Avaliador 1:

Avaliador 2:

Nota:

Aprovada Reprovada

Gesmar José Vieira Diretor do Curso de Ciências Econômicas

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DEDICATÓRIA

Aos meus Mestres: Márcia Rodrigues, minha imponente mãe; Dr. Augusto

Rodrigues, meu tio sábio-rabugento; Dr. Augusto “Niemar” Rodrigues Jr, primo-irmão

e mentor; Dr. Patrícia Cabral, prima-irmã-cunhada e amiga-mentora; e à minha

parceira Priscila Cabral.

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AGRADECIMENTOS

Temo aqui, não fazer jus a todos aqueles que de alguma maneira me

influenciaram e consequentemente mudaram o curso de minha vida nesses últimos

quatro anos.

Arriscar-me-ei ao tentar fazê-lo. Ao longo dessa empreitada me embebedei

de carinho pelo Departamento de Ciências Econômicas da Pontifícia Universidade

Católica de Goiás (PUC-GO), cada um dos membros do corpo docente ficará em

minhas memórias: O Mestre Gesmar que com sua batuta, nos incentivava e apontava

o caminho; o Professor Ms. Antônio José Porto Bandeira, sempre transbordando

sabedoria e credibilidade; o Professor Dr. Carlos Leão, a encarnação da econometria;

o Professor Ms. Eber Vaz, sempre muito profissional; o Professor de peso do

Departamento, Eduardo Rodrigues da Silva; o Professor Dr. Jeferson de Castro Vieira,

e sua experiência; o meu primeiro Professor do curso e seu entusiasmo, Ms. Mauro

César de Paula; meu segundo Professor do curso de economia, Mauro Jardim

Amorim; o calmo Professor Ms. Miguel Rosa dos Santos; o grande amigo Professor

Wilson Costa Ferreira; a sempre bela e elegante Professora Ms. Nair de Moura Vieira,

e as mais prazerosas aulas sobre Celso Furtado; o arguto Professor Dr. Luis Antônio

Estevam; o Mestre Goyaz do Araguaia Leite Vieira, e suas lições sobre a vida; e por

último meu orientador, por ter conseguido suportar esse des-orientando no último ano.

Por todos tenho muito carinho e respeito!

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RESUMO

A união do homem em grupos levou cada indivíduo a se especializar em

uma única atividade. Uma divisão do trabalho propiciou um comércio primitivo com

escambo de mercadorias e, este diante das necessidades crescentes da sociedade,

tornou-se mais complexa. Essa complexidade levou os lídios a utilizarem o metal

electrum como moeda. Uma mercadoria que, por sua raridade, foi utilizada como

forma de pagamento e medida de valor. Além do valor intrínseco, a moeda metálica

possuía benefícios que outras formas de dinheiro não tinham. Tais como a fácil

divisibilidade, não ser perecível e, se caso separado, era simples fundi-lo. Com a

difusão dessa nova forma de dinheiro alguns inconvenientes ficaram visíveis. A moeda

metálica poderia ser facilmente falsificada. Essa e outras dificuldades levaram os

governantes a criarem métodos que garantissem o valor da moeda. Assim nasce o

banco da cidade de Amsterdã, o qual era responsável por proteger o valor da moeda

e o fazia pegando estas adulteradas, cunhando-as novamente e dando em troca de

um bilhete de banco no valor equivalente ao metal entregue. O qual todos tinham

confiança em seu valor e caso quisessem era só troca-lo novamente pelas moedas

metálicas guardadas nos cofres bancários. Percebendo que o metal ocioso pode ser

utilizado como empréstimo que serão futuramente pagos pelo tomador com juros. Os

bancos criaram assim a primeira forma de multiplicar a moeda. A partir daí várias

outras inovações financeiras foram criadas, impulsionando o comércio entre grandes

nações, mas também com o intuito do ganho pecuniário, o que levou a humanidade a

severas crises econômicas. Juntamente com a evolução da moeda se criou novas

formas de controla-la. Mas ainda assim, mesmo nos dias de hoje, muitas instituições

e homens se utilizaram da moeda para ganhar dinheiro sem produzir uma única

mercadoria.

Palavras chave: Moeda; Bancos; Comércio; História Econômica; Sociedade.

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“A hóstia, uma vez consagrada, não apenas simboliza o corpo de Cristo; ela é

o corpo de Cristo. A moeda, uma vez cunhada, não apenas simboliza uma

quantia monetária; vale como mercadoria.”

Oscar Pilagallo

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 9

1. CAPÍTULO 1 - O DINHEIRO E SUA FUNÇÃO NAS COMUNIDADES PRIMITIVAS .... 11

1.1. O Início da Divisão do Trabalho e o Excedente Produtivo .................................... 11

1.2. A Primeira Forma do Dinheiro ....................................................................................... 13

1.3. As Tabuletas da Babilônia .............................................................................................. 15

2. CAPÍTULO 2 - A MOEDA NA ECONÔMIA ........................................................................... 18

2.1. A moeda Starter ................................................................................................................ 18

2.2. Senhoriagem à Grega ...................................................................................................... 22

2.3. A Senhoriagem Romana: a desvalorização da moeda ........................................... 25

3. CAPÍTULO 3 – A EVOLUÇÃO DOS BANCOS E SEU PAPEL NA ACUMULAÇÃO DE

EXCEDENTES .................................................................................................................... 29

3.1. A Idade das Trevas para a moeda ................................................................................ 30

3.2. O Renascimento da moeda ............................................................................................ 32

3.3. As Grandes Navegações................................................................................................. 37

3.3.1. O Nascimento das Sociedades por Ação ................................................................... 37

3.3.2. Os Grandes Banqueiros .................................................................................................. 38

3.3.3. O Primeiro Banco Público: o Banco de Amsterdã ................................................... 41

3.3.4. As Primeiras Aventuras Financeiras ........................................................................... 43

3.3.5. O Primeiro Banco Central: o Banco da Inglaterra.................................................... 45

3.4. A Revolução Americana: o papel-moeda ................................................................... 48

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3.5. A Grande Liberalização ................................................................................................... 52

3.5.1. O Padrão-Ouro ................................................................................................................... 52

3.5.2. A Quebra da Bolsa de Nova York ................................................................................. 53

3.6. Keynes e a Moeda ............................................................................................................. 57

3.6.1. O New Deal e a Segunda Guerra Mundial .................................................................. 57

3.7. A União Monetária Europeia .......................................................................................... 60

3.7.1. “O Homem que Quebrou o Banco da Inglaterra”: George Soros ........................ 61

CONCLUSÃO ..................................................................................................................................... 68

BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................................... 70

LEITURAS COMPLEMENTARES ................................................................................................... 71

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INTRODUÇÃO

Diariamente convivemos com o dinheiro, comprando, vendendo,

pechinchando, negociando os melhores termos para adquirirmos produtos que

satisfaçam alguma necessidade ou desejo. Mas afinal, o que é dinheiro e o que é

moeda? O que é esse objeto pelo qual trocamos nosso trabalho para obtermos alguma

quantia? O que é essa mercadoria que, ao possuirmos, a trocamos por alguma outra,

produto do trabalho alheio e que irá nos satisfazer?

Pretensiosamente, ao buscar a resposta para essas perguntas, somos

tragados para o início da história da própria humanidade. Pela qual viajaremos

cronologicamente verificando o nascimento e as primeiras transformações da moeda.

Observaremos quais foram as condições impostas ao homem para que ele se

organizasse de maneira coletiva e menos nômade, facilitando com isso sua

sobrevivência, o seu trabalho e suas habilidades singulares.

Ao debruçarmos sobre o estudo da moeda, intencionamos compreender a

relação desta mercadoria como equivalente universal de todas as outras, o quanto ela

desenvolveu ou estagnou a economia. Este trabalho utilizará de bibliografias de

autores já consagrados nessa área de estudo, abordando em seu primeiro capítulo

como se deu o início dos primeiros grupos sociais, como a especialização do trabalho

criou excedentes produtivos, o que impulsionou o homem a trocá-lo por outras

mercadorias que lhe faltava e como tentou acumular os excedentes que cresciam

cada vez mais.

No segundo capítulo, acompanha-se a evolução do dinheiro para a sua

forma metálica: a moeda. Os lídios (na atual Turquia) cunharam a primeira moeda

com o electrum, metal composto de ouro e prata, raro e de valor intrínseco, que o

permitiu ser uma mercadoria equivalente nas trocas por outros produtos e, claro, um

meio de pagamento. No que a moeda metálica, ao contrário das outras formas de

dinheiro, podia ser acumulada sem perda ou perecimento de sua riqueza.

No último capítulo e última parte do trabalho, vemos as consequências de

todo o processo monetário em relação a história da humanidade. Por exemplo a crise

de 29 que originou os primeiros motivos para que Alemanha, Inglaterra, França e

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Rússia entrassem em guerra. Há uma crise, a moeda em circulação diminui e o grande

conflito estoura. Os homens, em busca de enriquecimento pecuniário, travam guerras.

Antes o dinheiro acabava com esses conflitos, hoje é o motivo pelo qual iniciam-os.

Em meio a conflitos, inflações e crises geradas pela má administração da

moeda, o homem sempre encontra uma maneira para desfazer as bolhas financeiras.

Entre altos e baixos há aqueles que sobressaem dentro dessa atmosfera oscilante,

aproveitando de crises alheias para ganhar bilhões. Se nos primórdios se produzia e

comercializava mercadorias, hoje a liberalização e desregulamentação dos mercados

somados às inovações financeiras proporcionam lucro sem uma única mercadoria

produzida através do dinheiro pelo dinheiro.

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1. CAPÍTULO 1 - O DINHEIRO E SUA FUNÇÃO NAS COMUNIDADES PRIMITIVAS

1.1. O Início da Divisão do Trabalho e o Excedente Produtivo

Ao fim da Era Glacial, o aquecimento proporcionou o crescimento de

vegetação, expansão da quantidade de animais, ou seja, uma maior diversificação da

fauna e flora na Terra. O solo, em determinadas regiões, se tornou muito fértil e o

homem foi aprendendo a plantar. Isso o tornou menos nômade e o fez desenvolver-

se mais rapidamente nessas áreas, pois, se o resultado de sua caça fosse ruim ele

ainda poderia subsistir com os recursos gerados pelo seu plantio (VERSIGNASSI,

2011, p. 27).

A propensão natural do homem em sobreviver da maneira menos

trabalhosa possível o leva agrupar-se de forma coletiva (sociedade) nessas áreas

mais férteis – afinal plantar é mais fácil do que caçar – e também induz cada indivíduo

a desenvolver de forma espontânea e singular habilidades que lhe permitissem

cumprir a tarefa de subsistir da maneira menos dispendiosa. Gradualmente as

sociedades começam a se desenvolver juntamente com as habilidades individuais, ou

como diria Adam Smith em sua grande obra, A Riqueza das Nações, “[...] no tocante

ao trabalho e aprimoramento; o que, em uma sociedade em estágio primitivo, é o

trabalho de uma única pessoa, é o de várias em uma sociedade mais evoluída.”

(SMITH, 1996, p. 66).

A sobrevivência é uma necessidade comum a todos, e conforme o homem

lentamente divide suas tarefas com os outros do mesmo grupo o seu dia-a-dia fica

menos árduo:

“percebemos que sem a ajuda e cooperação de muitos milhares [cada um a sua maneira]

não seria possível prover às necessidades, nem mesmo de uma pessoa de classe mais

baixa [...], por mais que imaginemos – erroneamente – é muito pouco e muito simples

aquilo de que tais pessoas necessitam.” (SMITH, 1996, p. 71).

Nessas comunidades, enquanto uma pessoa plantava e produzia grãos,

a outra caçava, produzindo com isso a carne para à alimentação e a pele para a

vestimenta. A partir daí outros com sua habilidade individual produziriam o pão,

preparariam a carne e costurariam as roupas. Na medida em que o trabalho

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aumentava, a sua divisão também. “A divisão do trabalho, na medida em que pode

ser introduzida, gera, em cada ofício, um aumento proporcional das forças produtivas

do trabalho.” (SMITH, 1996, p. 66).

Quão intensamente o homem se concentrava em comunidades, mais se

multiplicavam as suas necessidades e mais se fazia preeminente a divisão do

trabalho. A sobrevivência exigia não só a produção de alimentos, vestimentas e

moradia, mas também a proteção desses meios de vida. Nascendo deste modo a

classe dos guerreiros, e posteriormente os líderes dessas sociedades.

“A princípio não existia a propriedade privada da terra, e todos os membros da comunidade

dela usufruíam. Posteriormente, a terra tornou-se propriedade nominal do governante, um

rei divinizado que personificava os interesses da comunidade.” (COTRIM, 2002, p. 24).

O “latifundiário que então foi chamado de Rei” (VERSIGNASSI, 2011),

tinha as terras que mais produziam. Com essa produção ele sobrevivia e o seu

excedente produtivo, começou a trocar por favores, roupas, bebidas, faculdades das

quais ele era desprovido. Então aqueles que não possuíam terras foram obrigados a

trocar a sua força de trabalho por comida.

Não somente o rei, mas todos os que possuíam alguma habilidade de

trabalho, utilizavam-se dessa para o seu próprio consumo e, o excedente era usado

para adquirir outras mercadorias que fossem do seu interesse. O que Smith destaca

como um jogo de interesses: “Dê-me aquilo que eu quero, e você terá isto aqui, que

você quer – esse é o significado de qualquer oferta desse tipo; e é dessa forma que

obtemos uns dos outros a grande maioria dos serviços de que necessitamos.” (SMITH,

1996, p. 74).

A própria divisão do trabalho, segundo Smith, é consequência dessa

tendência natural do ser humano em comercializar, intercambiar, permutar, trocar

aquilo que tem pelo que deseja.

“E dessa forma, certeza de poder permutar toda a parte excedente da produção de seu

próprio trabalho que ultrapasse seu consumo pessoal estimula cada pessoa a dedicar-se

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a uma ocupação específica, e a cultivar e aperfeiçoar todo e qualquer talento ou inclinação

que possa ter por aquele tipo de ocupação ou negócio.” (SMITH, 1996, p. 75).

1.2. A Primeira Forma do Dinheiro

O homem passa agora a sobreviver das trocas, todos passam a ser de

certa maneira comerciantes, compradores e vendedores do produto de seu trabalho

excedente, aquele que é fruto da habilidade individual e que ultrapassa o consumo

próprio. Em outros termos podemos explicar que, o indivíduo ao se especializar

naquilo que faz de melhor, produzirá quantitativamente mais e qualitativamente

melhor do que se outro qualquer desempenhar a mesma função. Por conseguinte o

açougueiro ao exercer a sua habilidade produzirá o suficiente para seu próprio

consumo e, o que sobrar será utilizado para que ele possa adquirir outras

mercadorias. Vemos nesse exemplo que a carne produzida pelo açougueiro,

personificação do trabalho em mercadoria, é utilizada como meio de pagamento para

adquirir tudo aquilo que lhe seja necessário. Ou seja, o fruto do trabalho, a carne é

dinheiro, “a encarnação social direta de todo trabalho humano” (MARX K. , 2012, p.

160).

É compreensível que um homem gere, através do seu trabalho, algum

excedente e queira comprar aquilo que lhe falta. Por exemplo, o açougueiro queira

comprar cerveja, entretanto, ao cervejeiro não lhe interessa a carne. O primeiro seria

um cliente do segundo, contudo, o segundo não seria cliente do primeiro e assim não

haveria nenhuma troca.

Esse empecilho fez com que as pessoas acumulassem várias mercadorias

com fins de facilitar as suas trocas futuras. Tendo vários artigos algo certamente seria

do interesse daquele com o qual se queria realizar uma troca.

Nas sociedades primitivas, como até então, o gado1 foi muito utilizado tanto

para mensurar a riqueza, quanto como mercadoria de troca, dinheiro. “A couraça de

1 Ainda nos tempos da Roma antiga se utilizou o gado como mercadoria de troca, dinheiro. É do latim “pecus” (gado) que deriva a palavra “pecuniário”.

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Figura 1: Crescente Fértil.

Diomedes, afirma Homero, custou somente 9 bois, ao passo que a de Glauco custou

100 bois.” (SMITH, 1996, p. 82). Embora o gado consistisse na mercadoria mais usada

para as trocas, outras também foram usadas. Toda a mercadoria de extrema

necessidade para a vida, e que fosse necessário muito trabalho para se conseguir, ou

produzir, passaram a ser utilizadas como dinheiro. O sal, utilizado para salgar e manter

a carne, e também os grãos.

Uma região da antiguidade que era muito fértil, berço das primeiras

civilizações, a Mesopotâmia, ou literalmente a “terra entre rios” (Tigre e Eufrates), na

qual os homens tiveram como principal atividade econômica a agricultura. Como já

não era preciso passar todo o tempo caçando, e no plantio também não era necessário

semear continuamente, havia o período de entre safra. O período de ócio

proporcionou várias invenções, dentre elas a que vale destacar para o nosso estudo

é a escrita cuneiforme (sinais em forma de cunha), realização atribuída aos sumérios

(3500-2550 a.C.), primeira civilização da Mesopotâmia.

Posteriormente, os babilônios cujo rei mais importante foi Hamurábi (1728-

1686 a.C.), dominaram toda a região da mesopotâmia, tendo a agricultura (Cevada,

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trigo, e tâmara) como principal atividade econômica. A pecuária também existia e

estava intimamente ligada à agricultura, pois o gado era utilizado para puxar os carros

e arados. Do rebanho bovino provinha a carne e o leite, para o transporte terrestre

utilizava-se asnos. Nas grandes cidades, as várias oficinas de artesãos (alfaiates,

carpinteiros, ourives, ceramistas, tecelões e etc.) propiciou um comércio primitivo. Os

comerciantes trocavam produtos agrícolas e artesanais por matérias-primas (madeira,

cobre, estanho, ouro, prata e etc.).

1.3. As Tabuletas da Babilônia

O comércio incipiente dos babilônios os impulsionou a criar métodos

melhores que facilitassem as trocas de suas mercadorias, dentre tantas ideias, a que

ficou consagrada pela história foi uma espécie de tabuleta de argila e um silo para

estocagem dos grãos excedentes. Algo que seria como uma cédula e um banco

primitivo. Qualquer um que desejasse armazenar seus grãos nos silos mantidos pelo

rei receberia em troca um tablete de argila, no qual estava gravada a quantidade de

mercadoria “depositada”. Essas tabuletas começaram a ser trocadas por tudo o que

se desejasse comprar, era só trocar a tabuleta ou soma delas pela mercadoria

precificada em grãos. Isso só era possível uma vez que as tabuletas asseguravam

que havia aquela quantidade de grãos depositada no silo do próprio rei.

(VERSIGNASSI, 2011, p. 30).

Figura 2: Tabuletas da Babilônia.

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16

Os babilônios até onde se sabe foram os únicos povos, até então, a utilizar

um objeto que não seja algum tipo de alimento como mercadoria de troca. Outras

civilizações ainda faziam uso do gado e dos grãos no seu comércio. Os bois eram

amplamente aceitos, contudo, tinha um grande empecilho durante a troca. Uma

pessoa que quisesse comprar sal, por exemplo, seria obrigado a comprar todo o valor

do gado em sal, já que o valor deste era maior que o do último e não poderia ser dado

meio boi na permuta. Sendo assim, não se poderia comprar uma pequena quantidade

de qualquer mercadoria, suficiente para satisfazer uma necessidade imediata.

A falta de divisibilidade do gado levou naturalmente as sociedades a

adotarem os metais como mercadoria de troca, pois, eram de fácil transporte e simples

fraciona-los. Exigia muito trabalho extrai-los, e os mais preciosos dificilmente podiam

ser localizados, isso lhes deu um valor de troca mais alto que o próprio gado.

Entretanto, seu valor de uso, excetuando-se a utilização como utensílios e armas, era

praticamente nulo. Uma vez que não se poderia usa-los como alimento igual aos grãos

ou bois, obviamente. A princípio qualquer metal era fundido em barras e, caso se

fizesse necessário comprar poucas quantidades de outras mercadorias poderia ser

perfeitamente dividido de acordo com o quanto se quisesse e, se estivesse

fragmentado era possível fundi-lo novamente. Outra grande vantagem em relação aos

alimentos utilizados como mercadoria de troca é que, ao contrário desses, os metais

não perdiam facilmente seu valor, já que não eram perecíveis.

Mesmo com tantas vantagens os metais tinham dois inconvenientes,

segundo SMITH: o da pesagem e a verificação da autenticidade. Durante todas as

trocas usavam-se balanças para pesar o metal, quando utilizado um metal menos

nobre, a precisão da quantidade de gramas não era muito importante. Entretanto,

quando se tratava de prata e ouro algumas gramas faziam muito diferença. Para

verificar a autenticidade desses últimos era ainda mais difícil. Quem não se sujeitasse

a verificar a pesagem e autenticidade provavelmente seria fraudado.

Foram dessas dificuldades impostas pelos metais, apesar de suas

praticidades, que veio a necessidade de gravação oficial garantindo tanto o quilate

quanto o peso dos metais.

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2. CAPÍTULO 2 - A MOEDA NA ECONÔMIA

2.1. A moeda Starter

Após a morte de Hamurábi, o Império Babilônio entra em decadência, e é

conquistado por outros povos, que posteriormente também são subjugados, o que

leva a cidade da Babilônia à independência e mais uma vez seja dominada, agora

pelos neobabilônios (caldeus). Seu principal rei foi Nabucodonosor, responsável pela

construção dos famosos Jardins Suspensos da Babilônia e da Torre de Babel. Os

novos babilônios prosperaram por algum tempo,

Em 550 a.C. os persas, comandados por Ciro O Grande, empreendem

uma expansão militar que anexa o território babilônio e faz com que dominem uma

região de aproximadamente 5 milhões de km. (COTRIM, 2002, p. 41).

Figura 3: Império Persa - Séc VI-V a.C. .

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19

Figura 4: Ciro II da Pérsia, ou Ciro, O Grande.

Essa expansão, consequentemente, induz os persas a absorver as culturas

de outros povos, assim como difundir a sua própria cultura entre estes últimos. É desta

maneira que a ideia babilônia de dinheiro (tabuletas) e também a utilização dos metais

chega a outros povos e é sob essa influência que a Lídia (atual Turquia) cunha por

volta do ano 640 a.C. a primeira moeda metálica de que se tem notícia na história de

acordo com Heródoto:

“Todas as jovens mulheres da Lídia prostituem-se, e com isso obtêm seus dotes; estes,

juntamente com suas pessoas, são posteriormente aplicados conforme julgam apropriado... Os

modos e costumes dos lídios não diferem em sua essência dos da Grécia, exceto quanto à

prostituição das mulheres jovens. Esse foi o primeiro povo, segundo se sabe, que cunhou

moedas de ouro e prata e as negociou generalizadamente.” (HERODOTO. Livro I. Clio. p. 31

Apud (GALBRAITH, 1977, p. 8).

É claro que a primeira atribuição dada à moeda lídia é a de servir como

dinheiro, ou seja, meio de pagamento amplamente utilizado nas trocas. A segunda é

a de medida de valor2.

2 Quantificação de uma mercadoria em unidades monetárias.

Page 20: A Moeda Desde a Antiguidade_sua Evolução Como Equivalente Universal de Mercadorias_FINAL

20

Figura 5: A primeira moeda (Starter) cunhada com metal (Electrum).

A moeda Starter (nomenclatura dada à moeda lídia por ser a primeira

moeda metálica cunhada) se tornou um equivalente universal. Ela tinha sua liga

composta naturalmente por ouro e prata, o que dava o tom de amarelo esmaecido.

Em todas as moedas existiam uma cabeça de leão e o sinete ou emblema pessoal do

comerciante abastado, responsável pela cunhagem e, posteriormente, do governante.

Esse selo oficial, gravado na moeda, garantindo a quantidade e qualidade do metal

favoreceu para que as trocas fossem efetuadas utilizando as unidades de moeda, e

não o seu peso. Eliminou-se dessa maneira as balanças usadas durante qualquer

comercialização.

A Starter facilitou muito o comércio, tanto que é na própria Lídia em que

veremos os primeiros lojistas, ou seja, vendas no varejo em base permanente. “Em

tempo em que a riqueza costumava ser acumulada por violentas conquistas militares

seguidas de saques, os lídios diferenciaram-se por alcançar a prosperidade pela via

pacífica do mercado.” (PILAGALLO, 2009, p. 42).

Foi com a moeda e com a consequente prosperidade comercial lídia que

Creso, último rei da Lídia da Dinastia Mermnada (560-546 a.C.), acumulou grande

fortuna. Segundo a mitologia, antes do embate bélico com Ciro II da Pérsia, ou Ciro O

Grande, o rei lídio foi consultar o oráculo de Delfos, o qual lhe falou que ao cruzar o

rio Hális com seu exército um grande império cairia. Creso aliou-se com Nabonidus

da Babilônia, Amasis II do Egito e com a cidade grega de Esparta. De fato um grande

império caiu, o lídio. Ao perder a batalha do rio Hális, Creso é feito prisioneiro na

cidade de Sardes, mas Ciro, conhecido por sua benevolência poupa a vida do rei lídio

e o faz seu conselheiro na corte persa.

Page 21: A Moeda Desde a Antiguidade_sua Evolução Como Equivalente Universal de Mercadorias_FINAL

21

De acordo com a mitologia, os metais que tanto fizeram a Lídia e Creso

prosperarem são oriundos das areias auríferas do rio Pactolo, onde Midas para se

livrar da maldição do seu toque de ouro teria se lavado em suas águas, mas antes

tocou as areias, por isso ainda hoje elas são douradas. Creso acumulou tanta riqueza

em vida que foi dele a ordem e os recursos para a construção do templo de Artêmis,

na antiga cidade de Éfeso, atual Turquia, onde a Starter foi encontrada nos tempos

atuais por arqueólogos.

Figura 6: Pintura de como seria o Templo de Artêmis na antiguidade.

Figura 7: Destroços do Templo de Artêmis atualmente na região da Turquia.

Décadas após a primeira moeda ser cunhada na Lídia a ideia se difunde

pelo Peloponeso, a cidade de Atenas começa cunhar suas moedas em torno do ano

575 a.C., assim como outras cidades começam por volta deste período. Somente

Esparta começa 300 anos mais tarde. O historiador Alexandre Versignassi (2011)

explica que a cidade espartana não tinha mercado e nem mesmo democracia.

Page 22: A Moeda Desde a Antiguidade_sua Evolução Como Equivalente Universal de Mercadorias_FINAL

22

Também, devemos entender que os cidadãos espartanos eram criados para a guerra,

e não para o comércio.

2.2. Senhoriagem à Grega

Falando em democracia, Oscar Pilagallo (2009) cita um suposto conselho

que Creso teria dado à Sólon, um dos Sete Sábios da Grécia antiga, de que o dinheiro

e poder não significam felicidade. Nesse período, Atenas vivia uma típica crise

econômica, na qual seus agricultores de grãos (trigo) começaram a ter dívidas

insolúveis com os ricos que produziam azeite de oliva e vinho. No princípio, os

atenienses que viviam de plantar trigo tinham uma situação confortável, uma vez que

o solo da região não ajudava no plantio de grãos e estes sempre eram escassos

fazendo com que os preços subissem. Entretanto, os agricultores de azeite e vinho,

incentivados pelos preços altos, começaram a importar grãos do leste (atual Rússia)

onde a terra era mais fecunda. Eles trocavam seus produtos e mais um pouco de

prata, que é o metal que começou a ser mais utilizado para cunhagem de moedas,

por grãos. Os cultivadores de grãos perdem mercado e agora buscam empréstimos

junto aos mais abastados (agricultores de azeite de oliva e vinho) para também

começarem a plantar estes produtos, porém não conseguem pagar os altos juros3

cobrados e acabam como escravos, o nível mais degradante que o cidadão grego

poderia chegar.

O aristocrata Sólon, conhecido por sua inteligência, é indicado pelos nobres

governantes de Atenas para resolver o problema econômico da cidade. A sua primeira

medida é proibir a escravidão como forma de pagamento de dívidas. Em seguida, ao

3 Não se pode dizer ao certo quando se começou a pratica de conceder empréstimos, tão pouco a cobrança de juros, entretanto, ATTALI (2011) afirma que “Os hebreus comerciam até mesmo produtos que eles não têm o direito de consumir. E fornecem crédito a juros aos babilônios. Não que estes não possam fazer isso: do velho código de Hamurábi conservaram, além da lei de talião, a autorização para o empréstimo a juros.” Nesta época ainda não existiam moedas cunhadas, somente como dissemos anteriormente, existia a cevada, trigo, tâmaras e lingotes de ouro estampilhados como dinheiro. Mais tarde, Aristóteles além de fazer críticas significativas às “teorias monetárias” é o primeiro intelectual a condenar a usura, já que para ele não era natural o dinheiro gerar mais dinheiro, assim como a terra. Suas ideias serão depois usadas por São Tomás de Aquino.

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invés de perdoar toda a dívida e realizar uma “reforma agrária”, ele preferiu comprar

a produção de trigo dos mais pobres. Porém, a cidade de Atenas não possuía dinheiro

suficiente, tão pouco minas de prata, das quais pudesse recorrer para cunhar mais

moedas. A alternativa foi misturar à dracma4 metais menos nobres, assim “a moeda

de prata, agora, tinha só 73% do minério. O resto era cobre.” (VERSIGNASSI, 2011,

p. 39). Isto é, em outros termos, Sólon utilizou-se da senhoriagem, que é a receita

decorrente da diferença entre o valor nominal da moeda e tudo que engloba o serviço

de cunhagem do metal (SANDRONI, 2005, p. 764). Mesmo sem ter uma reserva

abundante do metal precioso, Sólon tinha agora mais moedas em circulação, as quais

colocou no mercado através da compra das safras de trigo.

O plano realmente funcionou, já que os atenienses acreditaram que a

dracma continha o valor original. O que Sólon poderia ter acrescentado ao conselho

de Creso é que “dinheiro às vezes significa democracia” (PILAGALLO, 2009, p. 44),

pois a estabilidade econômica adquirida pela cidade de Atenas facilitou as reformas

políticas que Sólon realizaria. A principal foi o direito de ricos obterem cargos públicos,

que antes eram destinados somente aos nobres. Pilagallo (2009, p.45) ratifica que

“[...] se não houvesse emergido uma classe beneficiária da mobilidade social

proporcionada pela maior circulação do dinheiro e que, como tal, pressionava por

representação política condizente” a democracia não teria sido possível dada a

situação anterior.

Por décadas o mundo helenístico prosperou, entretanto, os sucessores de

Ciro II da Pérsia continuaram a expandir o território. Com uma ambição, conquistar a

Grécia. Dario I, o primeiro a tentar, fracassa na famosa Batalha de Maratona (490

a.C.). A expansão persa é interrompida, apesar disso, o próximo sucessor Xerxes

também aventura-se e, após a grande perda de seu efetivo de guerra, que Leônidas I

de Esparta infligira na Batalha de Termópilas, o rei Persa é derrotado pela frota

ateniense na Batalha naval de Salamina no ano de 480 a.C. O império Persa chega

ao seu limite, nada além da Trácia fora conquistado do solo helênico.

4 “O dracma, cujo nome deriva do verbo grego que significa “pegar”, é a base do sistema monetário do mundo helenístico, de moedas facilmente reconhecíveis pela indefectível efígie da coruja, ave associada a Atena, a deusa protetora da cidade. Com 100 dracmas tem-se uma 1 mina (mesmo nome usado na Mesopotâmia); e 60 minas valem 1 talento, também uma medida de peso.” (PILAGALLO, 2009, p. 46).

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Castigada pelas Guerras Médicas (492-479 a.C.), pela Guerra do

Peloponeso (431-404 a.C.) e por conta da desunião dos povos gregos, toda a Grécia

cai diante de Filipe, rei da Macedônia que consegue a conquista na Batalha de

Queronéia. Alexandre III O Grande, ou Alexandre Magno, que herda o trono de seu

pai Filipe empreende uma campanha militar expansionista que em dez anos lhe

rendeu vitórias na Ásia Menor, no Egito, na Mesopotâmia, na Pérsia (Dario III é

derrotado) e na Índia até o vale do rio Indo. (COTRIM, 2002, pp. 53-54).

Como podemos ver na Figura 8, a expedição militar de Alexandre começa

pela Macedônia e cruza pela Ásia Menor (onde está situado o antigo império Lídio até

então anexado pelos persas), Fenícia, Egito, Síria, Babilônia (todos estes últimos

integrantes ao império Persa) e, finalmente, terminando na Índia. Alexandre Magno,

era conhecido por absorver a cultura dos povos estrangeiros, incentivando até mesmo

seus generais a se casarem com as mulheres persas, provavelmente adorou as ideias

lídias sobre a moeda que os gregos melhoraram, tanto que Alexandre O Grande foi o

primeiro a estampar o seu busto em uma moeda. O seu busto não foi utilizado como

o selo do estado garantindo o peso e qualidade do metal, era uma homenagem a si

próprio (GALBRAITH, 1977, p. 9).

Figura 8: Extensão máxima do império de Alexandre, O Grande.

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Figura 9: Dracma com o busto de Alexandre O Grande.

A praticidade gerada pela cunhagem de moedas em seus diversos

quesitos, juntamente com a difusão do dracma que Alexandre Magno promoveu em

seu território, fez com que a moeda se tornasse comum, entretanto, o dinheiro de

metal se tornou um convite a fraudes de todos os tipos. Diz-se que já em 540 a.C.,

Polícrates de Samos teria enganado os espartanos com moedas de ouro falso. Mais

tarde, vemos que os romanos impelidos pelas guerras depauperaram a moeda,

deliberadamente, em grande escala, ao contrário da forma comedida em que Sólon

realizou tal tarefa em Atenas.

2.3. A Senhoriagem Romana: a desvalorização da moeda

Roma por volta de 268 a.C., ainda antes de ser império, começa a cunhar

a sua primeira moeda, o “ás”. Cobre cunhado em formato circular. Pouco depois, se

iniciou o período que ficou conhecido na história de Roma como Guerras Púnicas5.

Nesse período, talvez, a moeda só não tenha sofrido mais que sua população, pois

“[...] a desvalorizaram constantemente; primeiramente, para financiar as conquistas,

depois, para pagar pela defesa das longínquas fronteiras.” (PILAGALLO, 2009, p. 52).

Para financiar a guerra “os romanos aumentaram a produção dos asses a toque de

caixa. Tão a toque de caixa que nem se preocuparam em adicionar metal vagabundo

5 Série de três conflitos bélicos entre Roma e Cartago, cidade-estado fenícia.

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ao bronze para manter o mesmo tamanho de antes.” (VERSIGNASSI, 2011, p. 51).

No fim da primeira guerra, após cinco anos, o “ás” foi reduzido a um quinto do peso

padrão, Roma ganhou o conflito, conquistou o território da Sicília, era “a força do

dinheiro virtual, de mentira, produzindo coisas reais.” (VERSIGNASSI, 2011, p. 52).

Em 218 a.C. começa a Segunda Guerra Púnica, uma hiperinflação já

tomava conta. Mesmo assim, Roma utiliza seu artifício, depauperando a moeda, tanto

que a população não a utilizava mais, pois não acreditava mais no seu valor. Outros

objetos de valor intrínseco voltaram a ser utilizados, como o ouro, a prata, o sal e os

escravos. Enquanto isso, Aníbal Barca aproxima suas tropas dos portões de Roma.

Nesse mesmo período, a capital romana realiza uma grande reforma monetária,

institui o denário, moeda de prata que equivale a dez asses, valor expresso no “X”,

em algarismo romano, gravado ao lado da efígie de Roma.

Figura 10: Denário romano.

É da palavra denário em latim que deriva a palavra “dinheiro”. No início, o

denário possuía os brasões das famílias responsáveis pela cunhagem, além de uma

figura romana com quatro cavalos puxando uma carruagem, e havia também a figura

de Juno Moneta6, padroeira do Estado. Era no templo da deusa em que parte das

moedas eram cunhadas e é do nome Moneta que advém a palavra “monetária”. Após

aproximadamente 20 anos, a guerra acaba. O denário mal tinha sido criado e

apresentava agora somente 60% de prata. Em alguns casos ele era cunhado com

bronze e foleado com prata. (VERSIGNASSI, 2011, pp. 58-59).

6 A palavra moneta no latim significa “avisar”, “advertir”. Existem pelo menos três mitos dos quais o nome pode derivar. Uma

sustenta que ela os teria alertado para um tremor de terra a tempo de salvá-los. Outra dá conta do grasnar de gansos sagrados que teria denunciado um ataque de gauleses. E uma terceira versão, atribui a Juno o conselho que teria garantido o sucesso

na guerra contra Pirro, o general grego invasor da península italiana que com suas vitórias que mais pareciam derrotas deu origem à expressão “Vitória de Pirro”. (PILAGALLO, 2009, p. 52).

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Cartago ainda sobrevive, então, mais uma guerra ocorre. Enquanto os

soldados romanos vão mais uma vez à guerra, o senado grita “delenda Cartago Es”7.

Cartago foi destruída por volta de 146 a.C. ao mesmo tempo em que o denário

também foi subjugado pelas onerosas despesas bélicas. “A moeda acabou com

minguados 5% de prata.” (VERSIGNASSI, 2011, p. 59).

A guerra chega ao fim, após mais de um século entre o início do primeiro

conflito e o termino do último. Os grandes custos de guerra que levavam Roma a

dilapidar a sua moeda também chegam ao fim, a estabilidade monetária finalmente é

alcançada, já que agora as receitas são bem maiores que as despesas. O domínio

total do Mediterrâneo faz com que toda a riqueza dessa região seja encaminhada para

a capital do futuro império, seja ela na forma de espólios de guerra ou tributos das

diversas regiões anexadas.

Décadas mais tarde, em 50 a.C., na empreitada dos romanos para

conquistar a Gália (atual França), “[...] Júlio César levou uma casa da moeda para ir

cunhando o soldo de suas tropas8 a medida que avançava para o norte.”

(VERSIGNASSI, 2011, p. 59). Após conquistar a Gália, Júlio César fica tão famoso

que é o primeiro governante de Roma a ter seu busto reproduzido no denário.

Figura 11: Este denário, de Júlio Cesar, tem como tipo a fuga de Enéias de Tróia em chamas, carregando nos ombros o seu pai, Anquises, já muito idoso, e a estátua de Palas Atenas. De acordo com uma das tradições, Enéias teria sido o fundador de Roma.

7 “Cartago deve ser destruída.” 8 Vale lembrar que as tropas também eram pagas com sal e, em muitos casos, também foi usado como dinheiro. A palavra salário advém do termo sal.

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Após muitos estratagemas, que não cabe aqui nós enveredarmos por eles,

Otaviano, filho adotivo de Júlio César, chega ao poder, tornando-se César Augusto,

imperador de Roma em 27 a.C. . A reforma monetária foi uma das ações iniciais do

primeiro imperador romano, Augusto continuou cunhando moedas com a face de Júlio

César para obter politicamente a legitimidade no poder.

A esse respeito, Pilagallo, afirma que:

“Com mais moedas, é possível lubrificar o intenso comércio com as províncias e dar início

ao período que ficaria conhecido como a Pax Romana, quando os povos sob o guarda-

chuva do império, se pagavam impostos a Roma e admitiam o controle militar da capital,

também desfrutavam da prosperidade propiciada pelo mercado comum, que facilitava,

devido a tarifas baixas, a venda de produtos para os que controlavam a moeda.”

(PILAGALLO, 2009, p. 55).

A moeda romana ainda perderia muito do seu valor. Várias outras foram

criadas e, assim como as anteriores, foram desvalorizadas. Entre as muitas

atrocidades de Nero, uma delas foi a de retirar 90% da prata da moeda por volta do

ano de 64 d.C. . Dessa vez não existia nenhuma guerra, a senhoriagem foi excessiva

somente para bancar suas extravagâncias.

Com Diocleciano, Roma experimenta mais uma reforma monetária,

restituindo o valor do metal, conforme preconizara Adriano, e emitindo a Maximis

Pretiis, uma tabela de preços máximos que os comerciantes poderiam praticar, como

primeira tentativa de resolver o problema da alta dos preços. Assim como nos tempos

hodiernos a medida é ineficaz, sendo futuramente revogada, já que ao invés de

segurar os preços das mercadorias fizeram com que elas desaparecessem do

mercado. Há historiadores que digam que a queda de Roma teve como um fator

relevante a desvalorização de sua moeda.

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3. CAPÍTULO 3 – A EVOLUÇÃO DOS BANCOS E SEU PAPEL NA ACUMULAÇÃO

DE EXCEDENTES

Atualmente, sabemos que um banco nada mais é que uma instituição, na

qual suas atividades básicas consistem em “guardar dinheiro ou valores e conceder

empréstimos”. (SANDRONI, 2005, p. 64). Essas duas atividades (guardar valores e

emprestar valores) permeiam todo o desenvolvimento do dinheiro e da moeda, desde

os primórdios. Como já relatamos anteriormente, os hebreus já realizavam

empréstimos a juros aos babilônios. Na Grécia antiga, os tesouros eram guardados

nos templos, pois ninguém se arriscaria ser castigado pela fúria dos deuses do

Olimpo.

Segundo Paulo Sandroni (2005, pp.64-65), o termo “banco” vem das

atividades dos chamados “trapezistas”9. Esses “banqueiros” (laicos), a partir do século

IV a.C., foram incumbidos de guardar as riquezas e efetuar pagamentos e cobranças

em regiões distantes. O serviço oferecido por eles era muito mais prático para aqueles

indivíduos que detinham alguma riqueza, seja ela em lingotes de qualquer metal

precioso ou em moedas, tendo em mente as dificuldades com transporte e segurança.

Em contra partida ao dinheiro protegido nos cofres dos banqueiros, estes emitiam uma

espécie de certificado com o detalhamento do valor armazenado para os seus

proprietários. Algo bem parecido com que os babilônios faziam na Mesopotâmia com

as suas tabuletas. E assim como na babilônia, em pouco tempo perceberam que ao

invés de transferirem o dinheiro de um local para o outro, poderiam simplesmente

entregar os “títulos” como forma de pagamento, já que estes certificavam que naquele

banco existia determinado montante e o seu detentor tinha direito de “saca-lo”.

Em Roma, a atividade bancária ficou restrita a uma casta seleta, na

república aos publicanos e na época do império aos argentarii10 ou mensarii11. A

principal atividade dos banqueiros consistia no câmbio (trocar) de moedas

9 Do grego trapezión, que significa “banca”, “mesa pequena”. 10 Não se pode confundir os argentarii com banqueiros comuns ou mesmo com os mensarii. Eles não eram funcionários públicos mas eram lojistas que realizavam a troca de moedas estrangeiras pela moeda corrente prédios públicos. Seu único objetivo era o ganho pecuniário. 11 Os mensarii prestavam vários serviços financeiros, porém, não tantos quanto os argentarii.

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estrangeiras por moedas correntes, mas também guardavam dinheiro e faziam

empréstimos.

“A atividade bancária teve uma existência importante nos tempos do

Império Romano, e depois declinou na Idade Média, à medida em que o comércio

tornava-se mais difícil e a concessão de empréstimos entrava em choque com a

objeção religiosa à usura.” (GALBRAITH, 1977, p. 19).

3.1. A Idade das Trevas para a moeda

Após a queda do Império Romano ocidental e com a nova ordem política

(feudos), moedas como o ainda remanescente denário caíram em desuso, assim

como os bancos. “A atividade econômica restringia-se ao interior de cada feudo, que

era autossuficiente. Se algo faltasse, ficava mais fácil dar um pulo até a aldeia vizinha

e recorrer ao velho escambo.” (PILAGALLO, 2009, p. 64). Antes, os favores foram

pagos com moedas, agora o senhor feudal dava um pedaço de terra para uma família

cultiva-la e dela retirar a sua subsistência, o excedente iria para o senhor das terras.

A terra, mais do que nunca, refletia riqueza, por isso muitas guerras foram travadas

para tomá-las.

Alguns poucos reinos ainda cunhavam moedas. A Inglaterra, recém-

unificada, era a única a cunha-las (pêni)12 para que fossem utilizadas no comércio

exterior. Contudo, ela não tinha o mesmo valor do besante bizantino (antigo Império

Romano do Oriente).

“O sistema de cunhagem na Inglaterra era herança do império da dinastia carolíngia, a

única tentativa de reunificar a Europa e devolver-lhe a cultura clássica perdida com o fim

do domínio romano. Liderado por Carlos Magno, rei dos francos, o projeto não se

12 Pêni ou penny de offa, nome do rei da Mércia contemporâneo de Carlos Magno. 12 penny’s equivaliam a 1 xelim, e 20 xelins formavam 1 libra.

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consolidou, mas legou essa moeda que nascera da reforma monetária promovida no

século 8 por seu pai, o rei Pepino, o Breve.” (PILAGALLO, 2009, p. 67).

Com novas técnicas de cultivo, como por exemplo o rodízio das lavouras,

a produção de alimentos se eleva, permitindo que o excedente, cada vez maior, fosse

comercializado com o Império Bizantino. O senhor das terras começa a remunerar

seus trabalhadores com moeda e esse também prefere receber pelas terras

arrendadas em dinheiro, pois é com isto que ele irá importar as especiarias do Oriente.

Para PILAGALLO (2009, pp.68-69) as Cruzadas trarão de volta o lubrificante da

economia na Europa medieval, a reintrodução da moeda.

As primeiras Cruzadas tem o intuito de reconquistar a península Ibérica que

estava em poder dos muçulmanos a partir de 711 d.C. . As Cruzadas para o Oriente,

visando libertar Jerusalém, começam por volta do século XI. Elas levaram milhares de

pessoas a cruzarem o continente na esperança de conquistar terras, já que o santo

papa deu sua indulgência para os que expropriassem as terras dos inimigos. Aos que

estivessem endividados, a recompensa seria ainda melhor, pois enquanto estivessem

fora de sua pátria eles se “beneficiariam de uma moratória sobre os juros e o principal

da dívida”. (PILAGALLO, 2009, p. 69).

No século XII, a Ordem dos Templários, militares rigidamente treinados que

fizeram voto de castidade e pobreza com o único objetivo de proteger os peregrinos

no caminho em direção a Terra Santa, receberam tantas propriedades de reis em toda

a Europa, pela sua assistência, que acabaram ficando ricos.

Futuramente, eles começam emprestar o dinheiro acumulado para os

próprios reis e aristocratas. Isso foi possível uma vez que, seguindo seu voto de

pobreza, eles não utilizaram o dinheiro. Como podemos ver os Cavaleiros Templários

transformaram-se nos banqueiros da Idade Média, e com eles voltou a monetização.

Os Templários acumularam muitas riquezas, em terras, em ouro, prata, e

em todo tipo de dinheiro, se tornaram mais poderosos que a própria Igreja Católica

Apostólica Romana, detentora de um terço das terras da Europa. Então, no dia 1313

de outubro de 1307, o papa Clemente V aliado ao rei Filipe o Belo, ambos motivados

13 A famosa sexta-feira 13.

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por seus interesses políticos e financeiros, despacha ordens de execução a todos os

membros da Ordem, acusando-os, entre outras coisas, de heresia.

3.2. O Renascimento da moeda

É com a queda do Império Romano que acontece o declínio do uso da

moeda mas é também com o Renascimento e com o prodigioso comércio das cidades

italianas de Florença, Gênova e Veneza que ressurge os bancos. Segundo

GALBRAITH “[...] nenhum banqueiro, desde então, nem mesmo os Rothchilds ou J.

Pierpont Morgan, conseguiram igualar os Medicis em grandiosidade [...]”. Para ele,

“tanto quanto se pode associar algum tipo de atividade empresarial a um tipo étnico,

a atividade bancária pertence aos italianos.” (GALBRAITH, 1977, pp. 53-).

Uma grande influência da cultura árabe, sofrida pelos europeus durante as

Cruzadas, foi no campo da matemática, já que agora estes últimos passaram a utilizar

os algarismos arábicos, dispensando assim, vários especialistas e seus ábacos da

simples tarefa de somar, subtrair, multiplicar e dividir, e claro, de calcular os juros, já

que os algarismos romanos não facilitavam tal tarefa.

Quando se fala em juros, ou mais precisamente em ser recompensado com

juros, o homem tem um instinto natural para inovações financeiras. Desde os primeiros

banqueiros, foi perceptível como eles poderiam ter algum rendimento sobre todo

aquele depósito ocioso. Emprestariam a quem requisitasse uma soma em dinheiro

que seria paga posteriormente com acréscimo de juros. Enquanto isso, nada impedia

que o proprietário do dinheiro fosse resgata-lo e receber, pois certamente haveria um

depósito de outro indivíduo qualquer que permitiria com que o banco honrasse seu

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certificado de depósito. Os alquimistas14 teriam dito que os banqueiros encontraram

uma maneira de “multiplicar o dinheiro”.

A descoberta de que bancos podiam criar moeda surgiu juntamente com a

atividade bancária. “O processo pelo qual os bancos criam dinheiro é tão simples que

até repugna a mente. Quando algo tão importante está envolvido, parece que seria

apenas decente haver algum mistério mais profundo.” (GALBRAITH, 1977, p. 20)

O comércio e atividade bancária passam a crescer a cada dia, no entanto,

as estradas, nas quais as mercadorias e o dinheiro cruzam, são perigosas diante de

tantas guerras por terras. A velha classe dos senhores feudais está enfraquecida por

ter vendido tantos bens para financiar as Cruzadas além de perderem muitos vassalos

em batalha. Os comerciantes já estavam fartos de tantas extorsões por parte desses

senhores.

“Necessitava-se de uma autoridade central, um Estado nacional. Um poder supremo que

pudesse colocar em ordem o caos feudal. Os velhos senhores já não podiam preencher

sua função social. Sua época passara. Era chegado o momento oportuno para um poder

central forte.” (HUBERMAN, 1962, p. 85).

A figura do rei na Idade Média era meramente ilustrativa, contudo, os

comerciantes recorreram ao poder real, doando-lhes grandes somas de dinheiro pra

que os reis pudessem comprar armas e exércitos permanentes e se livrarem de todo

o mal que lhes acometesse. É claro que toda a quantia doada visava não só a

proteção, mas também benefícios financeiros.

14 Os alquimistas eram conhecidos na Idade Média por serem detentores de grande conhecimento em diversas áreas: Química, Antropologia, Astrologia, Magia, Filosofia, Metalurgia, Matemática, Misticismo e Religião. Mas eram realmente famosos por buscarem a pedra filosofal, uma substância mística; que segundo dizem era alcançada com o Elixir da Longa Vida, que ao ser ingerido curaria todos os males e daria vida longa; e com a transmutação de metais inferiores em ouro.

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Figura 12: Banqueiros mercantis no fim do século XIV faziam depósitos e empréstimos, convertiam moedas estrangeiras e vigiavam a circulação em busca de moeda falsificadas ou proibidas.

Os reis passaram a depender muito financeiramente da nascente classe

burguesia. Em 1439 na França, introduziu-se o taille, imposto regular em dinheiro.

Obviamente, os cofres da realeza somente se enchiam conforme o crescimento do

comércio. A seguir um grande exemplo da força dos comerciantes, conforme citado

em Huberman:

“Sir Robert de Asheby, representando o Rei, foi à Municipalidade de Londres e em nome

do Rei, convocou o Alcaide e os Intendentes da Cidade... ... E o Rei então fez oralmente

menção das despesas que realizara em sua guerra em países além do mar, e que ainda

teriam de ser feitas, e pediu-lhes um empréstimo de vinte mil libras esterlinas... ...

Unanimemente eles se prontificaram a emprestar-lhe cinco mil marcos, soma que,

segundo disseram, não poderiam ultrapassar. Ao que o Rei Nosso Senhor rejeitou

imediatamente, ordenando ao Alcaide, Intendentes e outros que se lembrassem do voto

de lealdade que lhe deviam, e pensassem melhor sobre o assunto em questão... ... E

embora isso fosse difícil, eles concordaram em emprestar cinco mil libras ao Rei Nosso

Senhor, o que foi por este aceito. Doze pessoas foram escolhidas e juradas, para procurar

todos os homens da cidade mencionada, e seus subúrbios, e todos segundo sua condição,

para levantar a dita soma de cinco mil libras e emprestá-la ao Rei Nosso Senhor.”

(Memorials of London and London life, pp. 208-210. Apud. (HUBERMAN, 1962, pp. 86-

87).

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Ainda no século XII, grandes feiras medievais movimentaram as grandes

cidades. Elas eram temporárias e, somente neste período, os comerciantes poderiam

cobrar mais que o “preço justo” (igual ao custo de produção) da Igreja. As cidades que

ofereciam tais feiras prosperaram e com elas os cambistas que ganhavam com o

serviço de câmbio de moedas estrangeiras. A Igreja entra em ação e no Concílio de

Latrão deixa claro a sua posição quanto à usura. Reafirmando isso, mais tarde, no

Concílio de Lyon, o qual proíbe até mesmo o aluguel de casas a usurários,

radicalizando ainda mais no Concílio de Viena, no qual ordena excomungar todo nobre

e governante que aprove tal pecado. (PILAGALLO, 2009, p. 73).

Figura 13: As comunidades medievais eram exigentes com os preços cobrados pelos comerciantes. Em 1321, William le Bole de Londres foi arrastado pelas ruas por vender pão abaixo do peso.

Na falta dos Templários, os italianos prosperam como banqueiros assim

como suas grandes cidades que comercializam com o oriente. Os italianos

continuavam driblando a Igreja, emitindo agora letras de câmbio, “título negociável no

mercado que consiste em uma ordem de pagamento (crédito), no qual uma pessoa

(sacador ou emitente) ordena que uma segunda pessoa (sacado ou instituição

financeira) pague determinada quantia a uma terceira (tomador ou beneficiário).”

(SANDRONI, 2005, pp. 484-485). Sobre esse crédito é que eram cobradas taxas, não

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ficando assim explícitos os juros. Veneza chegou a ter mais de cem instituições desse

tipo e em Florença a atividade reiunou com os Medici.

“A rivalidade natural que havia entre essas cidades acirra-se a partir de 1453, quando,

após tomar Constantinopla [antiga Bizâncio], os turcos concentram o comércio com

Veneza, levando Gênova e Florença a se defender financiando viagens marítimas que

abririam nova rota para o Oriente [...].” (PILAGALLO, 2009, p. 79).

Figura 14: As letras de câmbio, como esta de 1713, passaram a ser os cheques bancários comuns. Todos os tipos são promessa de pagar ao portador tal quantia de dinheiro em certa data.

A burguesia, agora importante, dispõe da sua influência política e social,

além de seu capital intelectual a serviço do Estado monárquico. Jacques Coeur,

banqueiro de Lion, torna-se conselheiro real da França. Thomas Cromwell, advogado

e Thomas Gresham, merceeiro, são nomeados ministros da coroa inglesa.

A Igreja, já não mais tão poderosa quanto antes, havia perdido muitos de

seus “monopólios”, seja na educação, na cultura e em outras áreas, mas ainda sim a

Santa Sé possuía grande força. Ela ainda defendia o Senhor feudal e, no campo

econômico, continuava a condenar terminantemente os empréstimos com juros

(usura). Dinheiro muito importante para o desenvolvimento do comércio e de novos

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empreendimentos. O grande embate entre monarquia e clero estava por vir, a

chamada Reforma Protestante.

A grande contribuição nessa área, ao contrário do que normalmente se

pensa, foi do francês João Calvino da segunda geração da reforma protestante e não

de Martinho Lutero. Este último, apesar de propor algumas reformas, incentivou a

caça aos “desordeiros”. Calvino sistematizou suas ideais em termos mais econômicos

e não teológicos. Para ele, a usura é a cobrança de juros exorbitantes, acima de 12%

ao ano (teto do direito romano), o que é condenável. Entretanto, juros em torno de até

5% ao ano seria legítimo. Em meio a esse turbilhão de acontecimentos, os judeus,

“estrangeiros na jurisdição moral da Igreja Católica” (PILAGALLO, 2009, p. 77),

proibidos de exercer qualquer profissão “digna”, ficaram à margem dos novos

empreendimentos, cabendo-lhes unicamente o vil ramo de empréstimos.

3.3. As Grandes Navegações

3.3.1. O Nascimento das Sociedades por Ação

Em 1497, buscando uma nova rota para se alcançar as Índias e romper

com o monopólio Veneziano, Vasco da Gama contorna o Cabo da Boa Esperança e,

finalmente, chega ao seu objetivo. “Na primeira viagem [...], os lucros atingiram

6.000%!” (HUBERMAN, 1962, p. 105). Visto o ganho de Vasco da Gama, a corrida

em busca de novas rotas marítimas estava lançada. A expansão comercial foi

avassaladora, novos mercados, novos produtos. Aproveitando-se do clima de

otimismo, inúmeras empresas, dos mais variados ramos, foram abertas. Uma das

mais famosas na época, com nome no mínimo curioso, chamava-se “Mistério e

Companhia dos Aventureiros Mercadores para a descoberta de regiões, domínios,

ilhas e lugares desconhecidos”. (HUBERMAN, 1962, p. 106).

Por mais lucrativas que fossem tais viagens, eram muito dispendiosas.

Organizar recursos e, principalmente, acumular dinheiro para financiar a empreitada

se mostrava uma tarefa árdua e arriscada, uma vez que toda a mercadoria poderia ir

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para o fundo do mar juntamente com os navios. Diante dessa dificuldade é que

nascem as sociedades anônimas (por ação). Muitas pessoas unindo um pouco do seu

dinheiro poderiam fazer grandes somas. No final o lucro era dividido entre os sócios.

Em caso de prejuízo, esse seria muito menor do que se estivessem sozinhos.

A primeira empresa a nascer nesse modelo foi a Vereennigde

Nederlandsche Oostindische Compagnie (Companhia Unida Holandesa das Índias

Orientais), não por acaso, mas por iniciativa do Estado Holandês. De acordo com

Alexandre Versignassi (2011, pp.114-115), isso se deve à cultura holandesa, já que a

região era tradicionalmente inóspita, muito alagada, na qual o sistema político feudal

praticamente inexistira. Toda e qualquer produção só era possível através do

empenho coletivo, já que drenar as áreas alagadas era uma tarefa extremamente

árdua e impossível para uma única pessoa.

Para ter parte do lucro só era preciso ir à denominada bourse (bolsa)15 e

comprar uma ação (cota), quanto mais ações mais lucro, se fosse o caso. “Essa foi a

época áurea do comércio, quando se fizeram fortunas – o capital acumulado – que

formariam o alicerce para a grande expansão industrial dos séculos XVII e XVIII.”

(HUBERMAN, 1962, p. 109).

3.3.2. Os Grandes Banqueiros

Foi nesse período das grandes navegações que a família alemã Fugger,

mais especificamente Jacob Fugger, acumulou grande fortuna comercializando lã e

especiarias. Mas foi, principalmente, como banqueiros que se destacaram,

emprestando capital a outros mercadores e, sobretudo, a reis e príncipes. Em troca

recebiam benefícios comerciais e proventos dos mais variados tipos. Em caso de

inadimplência, as minas, terras e o que houvesse sido dado como garantia, seria de

propriedade dos Fuggers. Leo Huberman (1962, p.109) cita em sua obra uma carta

15 Local onde os comerciantes se encontravam para negociar. Segundo a lenda, o nome veio de um certo Hôtel

des Bourses (Hotel das Bolsas) onde mercadores se reuniam.

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de Jacob Fugger cobrando o rei Carlos V da Espanha que atrasara o pagamento de

um empréstimo16, demonstrando com isso o poder do banqueiro:

“[...] Além disso, adiantamos aos emissários de Vossa Majestade uma grande quantia,

parte da qual nós mesmos tivemos que levantar, através de amigos. É bem sabido que

Vossa Majestade Imperial não teria obtido a coroa do Império Romano sem a minha ajuda,

e posso prová-lo com os documentos que me foram entregues pelas próprias mãos dos

enviados de Vossa Majestade. Neste negócio, não de importância à questão de meus

próprios lucros. Porque, tivesse eu deixado a Casa da Áustria e me decidido em favor da

França, muito mais teria obtido em dinheiro e propriedades, tal como, então, me

ofereceram. Quão graves desvantagens teriam, nesse caso, resultado para Vossa

Majestade e a Casa da Áustria, bem o sabe Vossa Real Inteligência.”

Fugger era a principal casa bancária da época, mas haviam outras tantas

de grande porte: Casa di San Giorgio (Gênova, 1586), Banco di Rialto (Veneza, 1587),

Banco di Sant’Ambrosio (Milão, 1593), e outros que surgiram posteriormente.

Com o deslocamento do comércio na região mediterrânea para o Atlântico,

a Antuérpia (atualmente localizada na Bélgica) se tornou o principal centro de

atividade comercial e financeira, visto que as feiras das demais cidades, como citado

anteriormente, tinham somente uma suspensão temporária das barreiras ao comércio,

enquanto nesta cidade não existiam barreiras. Tão significativa foi que “o comércio de

tecidos ingleses estava centralizado em Antuérpia, e Antuérpia era também o mercado

mais importante das especiarias da Índia.” (HUBERMAN, 1962, p. 111).

O enorme fluxo de metal precioso, que a pouco havia sido descoberto na

América espanhola, causava uma terrível alta dos preços no continente europeu, o

que ficaria mais tarde conhecido como “Revolução dos Preços”17. Não era

16 Fugger emprestara ao rei Carlos V a quantia de 543 mil florins para que este comprasse a coroa do Sagrado Império Romano que lhe custou ao todo 850 mil florins. 17 “Em ação estava a proposição básica quanto à relação entre moeda e preços, embora de uma maneira primitiva, mas inegável – a teoria quantitativa da moeda. Esta afirma, em sua forma mais elementar, outros fatores permanecendo constantes, que os preços variam em relação direta à variação da quantidade de moeda em circulação.” (GALBRAITH, 1977, p. 12).

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simplesmente as mercadorias que tinham seus preços elevados, era o metal em

abundância que se desvalorizava, saía das minas com destino à nobreza ibérica, a

qual o esbanjava com importações dos mais variados produtos e, principalmente, com

guerras. Galbraith (1977, p.12) calcula que na Inglaterra, por volta de 1673 e 1682:

“quando os preços estavam três vezes e meia acima dos níveis pré-colombianos,

parece provável que os salários fossem apenas duas vezes mais altos. Havia uma

diferença semelhante na França, e pode ser feita a mesma suposição quanto às

cidades comerciais dos Países-Baixos e do norte da Europa”.

Toda a Europa foi contaminada pelo ouro espanhol e com isso os preços

aumentaram exageradamente. Apesar da abundância do metal, a Inglaterra vive

problemas econômicos que são agravados por Henrique VIII. Este utiliza do velho

truque dos romanos: “Em dez anos, entre 1542 e 1551, a moeda perdeu um terço de

peso e um quarto de pureza da prata.” (PILAGALLO, 2009, p. 83). A atividade dos

monarcas ficou conhecida como debasement, ou seja, as moedas eram cunhadas

(coinage) com um percentual mínimo de metal nobre, e o restante, para manter o peso

e o tamanho original, com metal barato. Isso perdurou até o reinado de Eduardo VI. O

economista brasileiro Gustavo Franco, em sua obra Shakespeare e a Economia, faz

uma comparação: “As trapaças monetárias dos reis eram os ‘pacotes econômicos’

daqueles dias.”. A exemplo do rei, a população também praticou algo parecido. Os

comerciantes, em sua maioria, raspavam as moedas (clipping) ou as cortavam, mas

com cuidado para ninguém perceber a fraude e para que pudessem assim ser

utilizadas como se valesse o seu valor de face. Foi neste período que Nicolas

d’Oresme, considerado o maior economista medieval, fez uma importante

observação: “a moeda ruim expulsa a moeda boa de circulação”. O aforismo ficou

conhecido como Lei de Gresham, pois segundo a lenda, o ministro das finanças

Inglês, sir Thomas Gresham, enviou uma carta à rainha Elisabeth “onde ele nada fazia

além de afirmar que a depreciação da libra fora causada pelos debasements

provocados por Henrique VIII e Eduardo VI.” (FRANCO, 2009, p. 33). As práticas de

abuso contra a moeda foram quase extintas no reinado de Elisabeth I. Todas as

moedas foram recolhidas e refeitas, o que podemos chamar de “política monetária

restritiva ou saneamento do meio circulante” (FRANCO, 2009, p. 33) daqueles

tempos.

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41

Para Karl Marx, não foi só os preços altos e os baixos salários

impulsionaram a acumulação do capital primitivo que levou a economia mundial a um

novo estágio, mas também “os tesouros espoliados fora da Europa diretamente

mediante o saqueio, a escravização e o latrocínio refluíram à metrópole e lá se

transformavam em capital.” (MARX K. , 2013, p. 823)

Em suma, “o regime feudal no campo e a constituição corporativa nas

cidades impediram o capital monetário, constituído pela usura e pelo comércio, de se

converter em capital industrial.” Mais tarde “essas barreiras caíram com a dissolução

dos séquitos feudais e com a expropriação e a parcial expulsão da população rural”

(MARX K. , 2013, p. 820).

3.3.3. O Primeiro Banco Público: o Banco de Amsterdã

Apesar de dolorosa, a reforma de Elisabeth reduziu a inflação na Inglaterra,

entretanto, os outros países da Europa também padeceram deste mal. As falsificações

da moeda na Europa se tornaram tão corriqueiras que os comerciantes utilizavam,

novamente, balanças para verificar o peso da moeda. O que tornava a moeda inútil,

já que o seu selo garantidor de peso e qualidade não era mais digno de credibilidade

como outrora e, assim, não facilitava as trocas através de suas unidades monetárias.

A falsificação de moedas se tornou tão desmedida que a cidade holandesa de

Amsterdã teve uma iniciativa que entraria para a história, criou o primeiro banco estatal

em 1609.

Por conta do grande número de comerciantes, a cidade holandesa recebia

moedas de todo o canto do mundo. A incerteza em relação a qualidade da moeda em

circulação tornava-a 9% menor que a moeda recém cunhada. Esta, por sua vez, assim

que aparecia no mercado era levada embora. (SMITH, 1996, p. 459). De acordo com

Adam Smith (1996, pp.458-466), os comerciantes com grande quantidade em

dinheiro, muitas vezes não conseguiam encontrar dinheiro bom suficiente para as

suas letras de câmbio, isso desvalorizava as letras e dificultava o comércio. Para se

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42

livrar dessa incerteza, o banco da cidade de Amsterdã recolhia todas as moedas

estrangeiras, impuras ou aviltadas e, deduzia apenas uma tarifa para cobrir as

despesas com a cunhagem e administração. Em seguida, o banco creditava o saldo

em uma conta contábil em nome do proprietário do dinheiro e a este, era entregue, o

que denominou-se bilhete de banco. Logo, a cidade de Amsterdã também impôs uma

lei de que todas as letras de câmbio em valor igual ou superior a 600 florins fossem

pagas com bilhete de banco. Essas medidas eliminaram as incertezas quanto ao

dinheiro corrente, pois ele valia exatamente o mesmo que uma moeda recém-saída

da Casa da Moeda.

Por anos o banco funcionou extraordinariamente bem, tendo a cidade como

proprietária e o objetivo de prestar serviços aos cidadãos e não visar o lucro. Sendo

assim, os depósitos permaneciam imóveis dentro dos cofres do banco até serem

sacados ou transferidos, com a autorização do titular da conta de origem para a conta

de outro indivíduo. Os comerciantes tinham total confiança que o seu dinheiro estaria

ali, contudo, em 1672, quando os exércitos de Luís XIV aproximaram-se da cidade e

todos os mercadores correram para o banco com medo que a sua riqueza não

estivesse mais lá, GALBRAITH descreve que todos sacavam o dinheiro e o recebiam,

percebendo que o dinheiro estava ali, não mais o desejavam retirar. GALBRAITH

narra ainda a relação de amizade entre o prefeito da cidade, os senadores de

Amsterdã, os diretores do banco e os diretores da Companhia Holandesa das Índias

Orientais, que era a época muito bem estruturada financeiramente, mas necessitava

de capital de giro para a armação dos navios até que estes retornassem dos portos.

Assim, o banco começou a financiar com o dinheiro de seus cofres as empreitadas da

grande Companhia.

Contudo, no final do século, quando a grande Companhia Holandesa das

Índias Orientais começara a ter dificuldades financeiras após pesadas perdas de

cargas e navios para a Inglaterra beligerante, os pagamentos ao banco começaram a

ser mais lentos. Se todos os comerciantes fossem agora retirar o seu dinheiro,

provavelmente não o teriam. As dívidas agora insolúveis da Companhia das Índias

começam a ser pagas com mercadorias e, percebendo as dificuldades do banco, os

comerciantes correm para retirar as suas riquezas dos cofres, com isso o banco passa

a limitar os saques. Sem liquidez os bilhetes emitidos pelo banco de Amsterdã

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43

desvalorizam-se e, derradeiramente, o Banco de Amsterdã encerra seus serviços em

1819.

3.3.4. As Primeiras Aventuras Financeiras

Ainda no século XVII, os holandeses não só descobriram a engenhosidade

dos bancos, como também a Tulipa. Flor de origem turca trazida por comerciantes.

Ostentar uma Tulipa denota nobreza, tal status poderia ser alcançado por uma

bagatela de 20 florins holandeses, preço da tulipa da espécie Gouda, a mais comum;

ou 2 mil florins pela tulipa da espécie Semper Augustus – o mesmo valor de uma casa

em Amsterdã. (VERSIGNASSI, 2011, p. 13). A semper augustus só se diferenciava

pela pigmentação azulada decorrente de um vírus, fato que não era sabido na época.

Em menos de um ano, a Semper Augustus alcançou o valor de 6 mil florins (200% de

aumento), enquanto a Gouda, 225 florins (1.025% de aumento). Isso fez com que a

flor deixasse de ser um artigo de luxo para ser um investimento, já que seu preço até

então nunca havia caído. Os floristas que antes negociavam somente na primavera,

quando os bulbos floresciam, passaram agora a vendê-los antes mesmo de serem

cultivados. Todos compravam os títulos que davam direito às flores ainda inexistentes,

com a esperança de que elas continuassem a se valorizar. Não demorou muito para

que os próprios títulos fossem negociados e foram muitos os que fizeram fortuna com

as Tulipas. “Um holandês qualquer que acordasse sem um tostão no bolso podia fazer

o empréstimo de manhã, comprar a tulipa ao meio-dia, vender mais caro à tarde, pagar

o que devia com juros e ir dormir com o lucro”. (VERSIGNASSI, 2011, p. 13). Em 1637,

se acabaram os compradores desses títulos, pois eles só eram vendidos a preços

exorbitantes, não condizentes com a realidade. E para agravar a situação foram

descobertas inúmeras fraudes. Floristas vendiam mais contratos do que havia bulbos

em estoque e, tão rapidamente quanto subiu o valor dos títulos, ele despencou. Toda

a especulação em torno da alta nos preços das tulipas, e sua consequente crise,

levaram muitos à bancarrota. Este fato ficou conhecido como a primeira bolha

financeira da história.

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Figura 15: A pintura da tulipomania de Hendrik Pot (1640) mostra as deusas das flores passeando com bêbados que pesam dinheiro. outros seguem a carroça, loucos para ficar com o grupo.

Neste mesmo período, John Law, escocês de Edimburgo, fugindo de uma

acusação de assassinato – decorrente de um duelo – encontra em Amsterdã os

famosos bilhetes do banco da cidade que lhe fomentam uma ideia, que mais tarde

apresenta para o Duque de Orléans, o qual assume uma França debilitada

economicamente, quase falida, de seu antecessor Luís XIV, o Rei Sol. Law recebe a

autorização do Duque para emitir notas que eram repassadas ao Estado Francês,

este, por sua vez, pagava seus credores com tais títulos. Aproveitando-se dos

privilégios com o Estado, Law cria agora a Companhia do Mississipi, com a finalidade

de extrair ouro do estado da Louisiana ainda pertencente à França na época. O

dinheiro levantado com a venda das ações da Companhia vai também para o Estado

francês, este paga seus credores que correm para comprar as valorizadas ações da

Companhia do Mississipi. Mais uma vez, Law empresta o dinheiro ao Estado.

(PILAGALLO, 2009, pp. 89-91).

Não tarda para que os investidores percebam que provavelmente não há

ouro em Louisiana. A desconfiança gera uma corrida para sacar o dinheiro em metal

equivalente a ações. Como todo o dinheiro já havia sido emprestado ao Estado

francês e este pagara seus credores, os títulos de Law acabam sem nenhum valor.

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45

A mal engendrada aventura de Law na França não impediu que os ingleses

fizessem o mesmo com a Companhia dos Mares do Sul, que ganhou direito exclusivo

de comércio na América do Sul. A especulação quanto às atividades da empresa fez

com que as ações da mesma se multiplicassem por nove. (PILAGALLO, 2009, p. 91).

Aproveitando-se da euforia, várias empresas foram criadas: uma para compra de

pântanos na Irlanda, outra para proibir a venda de cidadãos ingleses como escravos.

Em 1720 a Companhia não se mostra tão lucrativa e os preços das ações finalmente

não se sustentam levando mais uma vez muitos à ruína.

As crises especulativas em relação aos papéis, notas e títulos, tidos como

dinheiro, se tornam consecutivas, cada vez maiores e mais devastadoras, pois são

emitidos por todo o tipo de aventureiro financeiro que promete soluções mágicas aos

governantes e, até mesmo, a investidores. Sendo que estes não se sujeitam a

nenhuma regra ou supervisão.

3.3.5. O Primeiro Banco Central: o Banco da Inglaterra

É ainda nos tempos da Companhia dos Mares do Sul que o Banco da

Inglaterra é fundado, por William Paterson, com o objetivo de arrecadar dinheiro para

o governo do monarca Guilherme de Orange que enfrentava uma grave crise

financeira:

“Uma companhia bancária seria organizada por autorização real, com um capital de

1.200.000 de libras inglesas. Quando o capital fosse subscrito, os recursos seriam

emprestados a Guilherme; a promessa de pagamento do governo seria a garantia de uma

emissão de notas no mesmo valor. As notas assim autorizadas circulariam como

empréstimos a tomadores privados dignos de crédito. Juros seriam recebidos tanto sobre

esses empréstimos quanto os empréstimos ao governo.” (GALBRAITH, 1977, p. 35).

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46

Os títulos do Banco da Inglaterra eram concorrentes dos da Companhia

dos Mares do Sul e, quando esta veio a falência, seus títulos eram os únicos que

tinham liquidez. O banco continuou a levantar fundos para o governo inglês ainda em

dificuldades. Como compensação o banco recebeu autorização para criar outros

bancos sob a forma de sociedades anônimas. Monopólio que, segundo GALBRAITH,

durou quase um século. Obviamente as funções de guardião da moeda que

futuramente o Banco da Inglaterra teria, foram adquiridas gradativamente. Isso pode

ser explicado pelo fato de que as notas do Banco, ao contrário dos demais,

transmitiam maior confiança. Portanto, a sua liquidez era mais alta e assim os demais

bancos tornaram-se simples bancos de depósitos.

É preciso compreender, que os títulos do banco inglês nada mais são do

que a dívida pública daqueles tempos. Sobre os empréstimos do Banco da Inglaterra

ao governo inglês Marx descreve:

“Esse banco começou emprestando seu dinheiro ao governo a um juro de 8%, ao mesmo

tempo que o Parlamento o autorizava a cunhar dinheiro com o mesmo capital, voltando a

emprestá-lo ao público sob a forma de notas bancárias. Com essas notas, ele podia

descontar letras, sob a forma de notas bancárias. Com essas notas, ele podia descontar

letras, conceder empréstimos sobre mercadorias e adquirir metais preciosos.” (MARX K. ,

2013, p. 825)

Para Marx a dívida pública impulsionou as sociedades por ações, a

comercialização de quaisquer papéis, a agiotagem, “numa palavra: o jogo da Bolsa e

a moderna bancocracia.” (MARX K. , 2013, p. 825).

É claro que as funções principais de um banco dos bancos moderno ainda

precisavam ser apreendidas pelo primeiro Banco Central, já que os bancos menores

levados por uma crise de euforia e especulação poderiam emprestar dinheiro sem

lastro, causando consequentemente um colapso financeiro. O próprio Banco da

Inglaterra também precisava de um fiscal para si mesmo, pois no final do século XVIII

a Inglaterra entra em guerra com as colônias americanas e, posteriormente, contra

Napoleão. Torna-se assim necessário financiar os gastos de exércitos, obrigando,

portanto, o banco a emitir dinheiro. Até que em 1797, sob grandes pressões e temores,

vendo suas reservas quase se esgotarem, o banco inglês proíbe a conversão dos

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seus títulos em moedas de ouro e prata. Consequentemente isso fez com que os

metais além de desaparecerem tivessem seu preço elevado. Outra ação do banco

piora a crise, ele imprime mais notas de uma e duas libras. (GALBRAITH, 1977, pp.

37-38).

Como vimos nas experiências passadas, essa emissão de dinheiro

desenfreada, sem nenhum lastro, provocaria grande pressão inflacionária. O trigo, por

exemplo, aumentou em torno de 167% até o ano de 1800. Os aumentos dos preços,

principalmente do ouro, levou a Câmara dos Comuns instaurar em 1810, uma

comissão para apurar se o valor das notas do Banco da Inglaterra tinham caído ou se

o preço do ouro é que tinha subido. A conclusão da comissão hoje nos parece óbvia:

emissão desmedida das notas fizeram seu preço cair. Em 1811 surgiria um debate

que entrou para a história não só pelo tema, mas também pelo seu participante ilustre,

que expôs da seguinte maneira o que pensava sobre a administração da moeda:

“Durante as últimas discussões da questão do ouro, foi afirmado, com muita justiça,

que uma moeda, para ser perfeita, deve ser de valor absolutamente constante.”.

(David Ricardo. The Works and Correspondence of David Ricardo, Vol. IV, Pamphlets

1815-1823, Piero Sraffa, ed. (Cambridge: Cambridge University Press, 1951, p.58

Apud (GALBRAITH, 1977, p. 40).

David Ricardo, que mais tarde se tornaria uma referência para todos os

economistas vindouros, defendeu arduamente o que denominou de padrão-ouro. Sem

essa restrição imposta pelo ouro, a moeda “ficaria exposta a todas as flutuações as

quais a ignorância ou o interesse dos emitentes poderiam sujeita-la.” Após o fim da

guerra, o conselho do economista fora ouvido e o Banco voltou a trocar as notas por

seu equivalente em ouro. Mal passará uma década e o banco sofrera novamente com

uma expansão desenfreada dos seus empréstimos, e acabou ironicamente salvo por

banqueiros franceses.

Após essa grave crise, o banco sob a liderança de Sir Robert Peel, se

enquadra em um rigoroso sistema que ficaria mais tarde conhecido como “sistema de

ferro fundido”. Para evitar expansão de empréstimos em todo o sistema bancário, o

Banco da Inglaterra aumentava a taxa de redesconto (ou interbancária), que é o preço

pago pelos empréstimos que o banco central concedia. Ele também poderia,

concomitantemente, vender títulos do governo e, com isso, enxugar o dinheiro

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existente no mercado. Essas duas ferramentas o transformam em um banco central

moderno. Assim, em 1825, o Banco da Inglaterra passa a ter a responsabilidade de

“emprestador de última instância”.

Nessa mesma época outros países criam instituições parecidas: em 1800

as necessidades de Napoleão criam o Banco da França; em 1875 é criado o

Reichsbank. GALBRAITH ressalta: “em 1867, num congresso pouco divulgado em

Paris, os representantes dos principais países industriais da Europa decidiram que daí

por diante, o pagamento em espécie significaria apenas pagamento em ouro.” Com

isso os bancos centrais passaram a fiscalizar a conversibilidade do dinheiro em ouro.

3.4. A Revolução Americana: o papel-moeda

A moeda de metal nos mostrou ao longo dos séculos a sua praticidade nas

trocas e a sua divisibilidade, podendo ser acumulada sem que seu valor se perdesse,

exceto quando o preço dos metais variasse. Mas enquanto a Inglaterra desenvolvia

as técnicas de controle da moeda com o Banco da Inglaterra, a América, no final do

século XVII, precisava de dinheiro.

Como a metrópole inglesa proibia os colonos americanos de constituírem

qualquer tipo de casa bancária e os metais eram escassos, a falta de um meio

circulante os fez experimentar todo o tipo de moeda. Uma das primeiras foi uma

espécie de concha que dependia dos índios, pois eram eles que as convertiam

conchas em peles de castor, semelhantes à troca do bilhete de banco por moeda

metálica. Outra experimentação foi o fumo, este durou muito tempo, principalmente

na Virgínia. (GALBRAITH, 1977, pp. 51-52). Obviamente muitos outros metais menos

nobres que o ouro e a prata foram utilizados, e claro, sempre havendo a manifestação

da Lei de Gresham.

Mas é em 1690 que Sir William Phips ao liderar uma desastrosa guerra

contra a colônia de Quebec, da qual imaginava que os espólios de guerra lhe dariam

algum lucro, viu sua colônia de Massachusetts totalmente endividada e então emitiu

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notas aos heróis de guerra derrotados, prometendo pagamento em dinheiro vivo. Em

meados do século XVIII os estoques de ouro e a prata, pelos quais as notas eram

trocadas, se reduziram a 1/10 em cinquenta anos. (GALBRAITH, 1977, p. 56). Várias

colônias já haviam se familiarizado com notas, com o papel-moeda: Nova Inglaterra,

Carolina do Sul e Rhode Island. Algumas, é claro, emitiram seu dinheiro com menos

prudência, conforme um comentarista da época: “Rhode Island compra da... Baía de

Massachusetts todos os tipos de produtos britânicos e estrangeiros com este papel

impresso que nada custa, o que lhe permite competir conosco no comércio.” (William

Douglas, “A Discourse Concerning the Currencies of the British Plantations in

America”, Boston, 1740, Apud. (GALBRAITH, 1977, p. 56). Contudo, em pouco tempo

as colônias centrais já tinham adquirido grande destreza no manuseio do papel-

moeda, tanto que em 1723 a Pensilvânia que vivenciava o que hoje podemos chamar

de depressão, com preços em declínio, emitiu papel-moeda até os preços se

estabilizarem. Medida semelhante a de Sólon na Grécia.

O dinheiro em papel tinha um forte defensor, Benjamin Franklin18, editor da

Pennsylvania Gazette que parava a impressão do jornal para imprimir dinheiro.

Benjamin não só o fazia para ganhar dinheiro como tinha convicção de que era

necessário um meio circulante sem dependência do metal e da metrópole. Mais tarde

ele diria:

“Esta moeda, da maneira que administramos, é uma máquina maravilhosa. Presta seus

serviços quando a emitimos; paga e veste as tropas, e proporciona mantimentos e

munição; e quando somos obrigados a emitir uma quantidade excessiva, paga a si mesma

pela desvalorização.” (Carta a Samuel Cooper, 22 de abril de 1779, em The Writtings of

Benjamin Franklin, Albert Henry Smyth, ed. Nova York: Macmilan Co, 1906, vol. VII. p.

294, Apud. (GALBRAITH, 1977, p. 65).

18 Além de editor foi jornalista, autor, filantropo, abolicionista, funcionário público, cientista, diplomata, inventor conhecido por suas citações e experiências com a eletricidade, enxadrista estadunidense, religioso, calvinista e uma figura representativa do iluminismo. Correspondeu-se com membros da sociedade lunar e foi eleito membro da Royal Society. Em 1771, Franklin tornou-se o primeiro Postmaster General (ministro dos correios) dos Estados Unidos. E sobretudo, foi um dos líderes da Revolução Americana.

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50

Obviamente a Inglaterra não aprovava as experiências monetárias das

suas colônias e em 1751 o Parlamento proibiu a emissão de mais papel-moeda. As

colônias protestaram e Benjamin Franklin levou pessoalmente seus argumentos à

Câmara dos Comuns, porém sem sucesso. Essa proibição foi um dos fatores que

levaram à guerra as colônias americanas e a Inglaterra.

O papel-moeda das colônias inglesas beneficiou não só as colônias como

também a metrópole, entretanto, agora na guerra de independência, a moeda seria

uma importante arma contra os ingleses. Do mesmo modo que Roma financiou seus

exércitos de legionários contra Cartago, o governo das colônias americanas financiou

suas tropas com a emissão de uma nota que se denominou continental. Tal moeda foi

produzida em papel extremamente barato, media 6 por 8 centímetros, impressa na

vertical, ao contrário das demais. “A estampa não deixava dúvida sobre o caráter

revolucionário do continental: treze argolas interligadas em círculo, representando a

união das colônias, e no centro, o mote: Congresso Americano, Nós Somos Um.”

(PILAGALLO, 2009, p. 100). Como em Roma, as notas não tinham qualquer lastro,

sua aceitação quando não era patriótica era simplesmente uma obrigatoriedade do

Congresso, que lançou uma resolução advertindo quem não aceitasse as notas. E

como os romanos a nova república pagou caro pela emissão desenfreada de notas

continental. Uma famosa expressão surgiu no país, devido a moeda fraca, após a

guerra: it’s not Worth a continental (não dou a mínima importância). O valor do

continental era expresso em dólar19, que seria em 1785, dois anos depois da Guerra

de Independência a moeda oficial.

Como visto, foram os americanos que difundiram o uso do papel-moeda20.

Provavelmente, iniciaram a utilização desse tipo de moeda, influenciados pelos relatos

19 A origem da palavra dólar é duvidosa, entretanto, algumas versões dizem que ela deriva do nome Joachimsthaler, a abreviação thaler ficou conhecida na região da Boemia, onde metais eram extraídos para a cunhagem de moedas no início do século XVI. O nome foi utilizado na região da Escócia, já que estes queriam diferenciar a sua moeda da dos seus vizinhos dominadores ingleses. 20 É necessário aqui ressaltar um conceito que talvez possa não ter ficado claro: o papel-moeda utilizado pelos norte-americanos nada mais é do que uma moeda fiduciária, ou seja, ela não é conversível em ouro ou prata, seu valor de face só é válido pela confiança das pessoas e pelas leis dos governos. Já a moeda-papel, embora também seja fiduciária, ela é conversível em ouro ou prata. O bilhete bancário emitido pelo Banco de Amsterdã em 1609 é um exemplo de moeda papel. Sua desvantagem em relação ao papel-moeda é que qualquer especulação quanto ao seu valor pode promover uma corrida aos bancos, como no caso do próprio banco da

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de um certo viajante veneziano, quando este visitou a China no século XIII.

Presenciando a técnica que os chineses já dominavam desde os princípios da era

cristã, Marco Polo, em As Viagens, descreve o papel-moeda chinês da seguinte

maneira:

“Nesta cidade de Camblau encontra-se a casa de moeda e o banco do Grã-Cã. São tão

bem estruturados que se pode dizer que o Grã-Cã conhece o segredo da alquimia. [...] O

rei, manda fabricar uma espécie de dinheiro. Manda extrair a casca de uma árvore que se

chama amoreira, cujas folhas servem de alimento ao bicho-da-seda. Dessa árvore retiram

a casca mais fina e dela faz-se um papel como algodão, porém de cor preta. Dividem-se

os pedaços grandes em outros menores, de diferentes tamanhos. [...] Com este papel

fazem-se os pagamentos, pois é válido em todas as províncias, reinos e terras sob o

domínio do Grã-Cã, onde ninguém o recusa, sob pena de morte.” Apud (PILAGALLO,

2009, p. 95).

Outra grande característica da moeda, que entraria para a história, talvez

tenha nascido de um mero desgaste da moeda espanhola 8 reales. Nas colônias

inglesas essa moeda se popularizou mais que a libra, ela equivalia a 1 dólar no final

do século XVII. Por conta do uso contínuo, o seu “8” acaba se tornando um “S” e mais

tarde acaba somado as colunas de Hércules, que eram utilizadas em outra moeda

espanhola, também muito utilizada nas colônias americanas. Dessa forma nasceu o

“$” que utilizamos até os dias hodiernos, conforme descreve Jack Weatherford em sua

obra A História do Dinheiro (Apud. (PILAGALLO, 2009, p. 102).

Enquanto na América do Norte, a constituição americana entra em vigor no

ano de 1789, e com ela medidas mais conservadoras em relação ao dinheiro de papel,

do outro lado do Atlântico, a França vive um turbilhão revolucionário. Nobres, reis e

rainhas eram guilhotinados e, como não podia deixar de ser, a velha moeda francesa

e sua tradicional subdivisão monetária também foi guilhotinada.

cidade de Amsterdã e como no famoso caso do banco de John Law, na França. E podendo, portanto, promover uma “quebradeira”.

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Normalmente usavam-se moedas inferiores para troco e transações de

menor valor. Por exemplo, a libra tinha o penny para ser usado como troco; já os

americanos utilizavam os cents (centavos de dólar), que era o próprio dólar com base

dez, aonde 100 cents equivaliam a 1 dólar; assim também era feito com o rublo na

Rússia. Porém, a técnica de se utilizar a base dez entrou mesmo para a história com

os franceses que o revestiram de todo o tipo de conotação ideológica quanto foi

possível. Eles gostaram tanto da base dez que resolveram alterar a contagem do

tempo, a hora passou a conter 100 minutos e cada minuto 100 segundos.

(PILAGALLO, 2009). Isso logo foi revogado, mas as unidades monetárias decimais

passaram a ser amplamente utilizadas, excetuando-se na Inglaterra, que cultivaram a

sua tradição de sistema monetário com subdivisões irregulares até 1971.

3.5. A Grande Liberalização

3.5.1. O Padrão-Ouro

A moeda forte, estável, com lastro no ouro que David Ricardo tanto

defendeu entrou em vigor somente em 1821, por conta das guerras napoleônicas, as

quais tiveram, mais uma vez, a necessidade de serem financiadas com a emissão de

moeda sem lastro. A princípio, somente a Inglaterra adotou o sistema monetário rígido

(padrão-ouro), outras potências econômicas como França, Estados Unidos e

Alemanha adotariam essa medida conservadora somente cinquenta anos mais tarde.

Em seguida vários outros países também adotariam a medida. O padrão-ouro trouxe

estabilidade para o comércio internacional, uma vez que a taxa de câmbio era fixada

de acordo com o estoque do metal na reserva nacional. Contudo, não só o câmbio era

limitado pelo estoque de ouro em reserva, mas também as despesas dos governos.

O estoque limitado reprimia não só a emissão desenfreada de moeda como a própria

economia, uma vez que o crescimento se limitava a extração do metal.

A guerra em 1914 impôs a suspensão do sistema monetário lastreado pelo

ouro, já que os países beligerantes tiveram que emitir grandes quantidades de moeda

para custear, mais uma vez, a guerra. Os Estados Unidos, que ficou de fora em grande

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parte do conflito, viu suas reservas de ouro dobrar durante a guerra (PILAGALLO,

2009, p. 121). O metal enviado a esse país para a compra de armamentos

desequilibrou totalmente o padrão-ouro, permitindo agora que somente os Estados

Unidos o mantivessem. Diante da escassez do metal, adotou-se um sistema

ligeiramente diferente, o padrão-câmbio-ouro, no qual a moeda era trocada por outra

que fosse conversível em ouro, no caso o dólar e a libra esterlina. Após a guerra, os

países vencedores prosperaram, já que tinham um sistema monetário rígido e uma

gorda indenização paga pelos perdedores da Primeira Guerra Mundial. Contudo, a

prosperidade terminaria em 24 de outubro de 1929.

3.5.2. A Quebra da Bolsa de Nova York

Em 1917 os Estados Unidos entram na Grande Guerra para assegurar os

empréstimos que fez às nações aliadas e com isso se sai como o grande vitorioso do

conflito. Finda a guerra, inicioa-se uma onda de grande prosperidade e otimismo,

afinal, as incertezas acabaram e a “América” se sobressae como a maior potência

econômica mundial. É importante destacarmos aqui o papel de uma inovação

financeira durante a guerra, o Bônus da Liberdade como era chamado. Desde o início

da guerra, em 1914, o governo americano vendia o bônus para financiar a guerra, era

uma maneira de pegar emprestado o dinheiro do povo. Em recompensa os detentores

dos papeis recebiam de seis em seis meses os juros sobre o valor dos bônus, além

dos papeis poderem ser negociados no mercado. Celebridades como Charles Chaplin

e Douglas Fairbanks, fizeram propaganda e comícios em favor do Bônus da

Liberdade. Muitos tornaram-se investidores pela primeira vez.

O bônus do governo criou uma nova cultura de investimentos e,

vislumbrando a oportunidade de lucrar com esse “novo mercado” é que Charles

Mitchell, presidente do National City Bank, criou um novo produto financeiro, os bônus

corporativos. Esses nada mais eram do que ações de empresas listadas na bolsa de

valores para criar capital privado.

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Gradualmente, pessoas que nunca sonharam em investir em ações

estavam fazendo agora. O estigma de que ações eram arriscadas havia sido

quebrado, investir no mercado de ações passou a ser seguro, confiável e respeitável.

Para explorar o processo Mitchell abriu corretoras em todo o país, nas quais pessoas

que tinham algum dinheiro, mas não tinham experiência investindo em ações,

pudessem especular. Em pouco tempo não só os profissionais do mercado de ações

especulavam, mas também pessoas comuns. O número de investidores cresceu

exponencialmente em pouco tempo. Nos EUA havia nada menos do que três milhões

de investidores no final dos anos vinte.

Aproveitando o frenesi, muitas empresas começaram a abrir o seu capital

nas bolsas de valores, principalmente, na de Nova York, localizada na Rua Wall Street

juntamente com os maiores bancos do país. Empresas de cinema, empresas de

aviação, todas as companhias de automóveis e outras tantas abriram seu capital na

bolsa. Todas as empresas que tinham ações na Bolsa viam sua cotação só aumentar,

dia após dia. Assim como na Holanda das tulipas, os especuladores pegavam

empréstimos, investiam em ações de várias empresas, para vendê-las mais tarde com

a cotação em alta, daí pagavam o empréstimo e tinham algum lucro. Fortunas foram

feitas, dessa maneira, da noite para dia.

As pessoas tinham agora tanta fé no “bull market” (mercado viril), que os

bancos, claro, aproveitando-se do otimismo aumentavam inadvertidamente a sua

“multiplicação do dinheiro” pegando mais dinheiro junto ao FED21 (Federal Reserve

ou Sistema de Reserva Federal) para emprestar mais dinheiro. A cultura do crédito

fácil, do “compre agora, pague depois”, ganhara força na década de vinte e se

espalhou também pelo Mercado de Valores. As corretoras iniciaram um processo de

alavancagem, no qual, recebiam só parte do dinheiro destinado a compra de ações, a

outra parte era bancada pela própria corretora. O dinheiro da corretora, por sua vez,

provinha dos bancos. Esse procedimento ficou conhecido como “compra à margem”

ou como é muito utilizado hodiernamente “compra à descoberto”, no qual uma média

de 40% dos valores na bolsa proviam dessa alavancagem. Isso empurrou mais ainda

o preço das ações, que em 1928 chegaram a aumentar 50% em apenas doze meses.

21 Criado em 1919 para ser o banco central dos Estados Unidos e, portanto, protetor da moeda norte americana.

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Constantemente o mercado era manipulado pela elite de banqueiros de

Wall Street, mas tanto o FED quanto o próprio governo norte americano de Calvin

Coolidge (1923-1929) viviam sob as crenças liberais, de maneira que o estado não

interferiria na economia (laissez faire – mão invisível de Smith). Dias após o discurso

de posse do presidente Herbet Hoover (1929-1933), em março de 1929, um banqueiro

altamente respeitado, Paul Warburg, se rebela contra a elite de Wall Street e adverte

a todos: se “orgias especulatórias continuarem a se espalhar, o colapso final vai

provocar uma depressão geral, que atingirá o país inteiro.” (BBC, 2009). Como já

sabemos, Warburg foi ignorado. Porém o presidente Hoover começou a ficar inquieto

com tal situação e investigou Wall Street, no que recebeu um memorando de Thomas

W. Lamont, presidente do JP Morgan & Co. e o homem mais influente do mercado

financeiro, dizendo que o mercado corrigiria a si mesmo, não havendo nenhuma

necessidade de intervenção do governo. Cinco dias depois a Bolsa de Valores de

Nova York quebrou. Após cinco anos consecutivos em alta não haviam mais

compradores para as ações de preços exorbitantes.

Não se sabe ao certo como iniciou-se a súbita perda de confiança, mas

tudo aconteceu no final da quarta-feira, 23 de outubro, e o dia seguinte se transformou

na “quinta-feira negra”. Na qual, simplesmente, uma brusca queda nas ações

automobilísticas provocou um frenético comércio de última hora e, 2,5 milhões de

ações foram repentinamente vendidas em uma hora. (BBC, 2009).

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Figura 16: Multidão ansiosa junta-se diante da Bolsa de Valores de Nova York em 24 de outubro de 1929, dia da quebra. Metade do valor de ações americanas sumiu em um dia, iniciando a Grande Depressão.

Nos dias que se seguiram, tudo piorou, as ações não paravam de cair,

milhares de pessoas faliram, já que perderam tudo o que tinham e o que não tinham.

Haviam investido todo o seu dinheiro mais o empréstimo das corretoras. As corretoras,

que fizeram “compra à margem” sentiram o baque da inadimplência, e

consequentemente os bancos. Para piorar a situação o FED (emprestador de última

instância) corta os empréstimos aos bancos temendo os efeitos inflacionários da crise.

Herbert Hoover e seu Secretário do Tesouro sentiram que não era papel do governo

interferir nos negócios de Wall Street. Eles acreditavam fielmente no capitalismo puro

e livre, assim, eles fizeram pouco, ou nada para aliviar a queda. Para eles a solução

seria natural. Em 1931 já somava-se mais de 1.800 bancos falidos, em 1933 um terço

dos bancos americanos desapareceram. Já não havia mais o milagre da

“multiplicação dos bancos”, assim como não havia dinheiro nos bancos. (PILAGALLO,

2009, p. 122).

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Milhares de pessoas correram aos bancos para sacar seu parco dinheiro,

mas sem sucesso, o banco já não existia. As empresas já não tinham crédito a curto

prazo para pagar seus funcionários, renovar os estoques e pagar os fornecedores.

Com isso elas começaram a falir, e conforme faliam demitiam seus operários. O

desemprego atingiu um quarto da mão de obra, 13 milhões de pessoas. (PILAGALLO,

2009, p. 122). Quanto mais havia demissões, mais a crise se agravava, pois diminuía

a moeda em circulação. A Quebra da Bolsa de Valores de Nova York não gerou a

Grande depressão dos anos trinta, mas iniciou uma série de eventos que levariam as

economias mundiais a primeira grande crise mundial, A Grande Depressão, e

consequentemente a crises políticas em vários países, principalmente, Rússia,

Alemanha e Itália. Essas tensões políticas culminariam com a Segunda Guerra

Mundial.

Figura 17: Homens procuram trabalho em agência de empregos de Chicago em 1931. Em 1933, mais de 13 milhões de americanos tinham perdido o emprego. O Estado respondeu com um pacote de estímulo chamado New Deal.

3.6. Keynes e a Moeda

3.6.1. O New Deal e a Segunda Guerra Mundial

Após a Grande Depressão John Maynard Keynes foi responsável por

profundas transformações no entendimento da moeda e, da própria economia. Suas

concepções eram radicalmente diferentes das ideologias liberais que reinavam na

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época. Keynes defendia a intervenção do Estado na economia, ou seja, como não

havia, nunca houve e nem haverá economia perfeita, o Estado deveria criar estímulos

ou dissolve-los, através de gastos públicos em setores ou áreas da economia que

estivessem enfrentando dificuldades ou confiança exacerbada. Para ele, a economia

não era capaz de se auto ajustar, este que era o pilar principal dos liberais.

Cem dias após assumir a presidência nos Estados Unidos, em 1933,

Franklin Delano Roosevelt, estabeleceu as bases do seu New Deal, fundamentando-

se nas premissas Keynesianas. O plano econômico de Roosevelt pretendia

basicamente investir em obras públicas de infraestrutura; eliminar estoques agrícolas,

para conter a quedas dos preços; controle sobre os preços e a produção, evitando

novamente crises de superprodução e diminuição da jornada de trabalho, aumentando

com isso o número de vagas.

Figura 18: Em 1933, o presidente americano Roosevelt assinou decreto garantindo os depósitos bancários. A corrida aos bancos diminuiu, mas alguns acham que tais garantias

aumentam os riscos.

Tendo-se como objetivo estimular a economia o padrão-ouro é novamente

suspenso e, ao contrário dos temores liberais, a queda desse sistema não criou

inflação, pelo menos até o fim da Segunda Guerra Mundial, pois o desemprego ainda

era muito alto 17% no início da guerra. (PILAGALLO, 2009). O desemprego seria

praticamente instinto somente após 1942, quando os EUA entram na guerra e

ampliam a produção.

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Keynes ainda viria a contribuir de maneira decisiva, em 1944, com a

criação do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial, na conferência de

Breton Woods. “Na época, o acordo entre as nações signatárias assegurou um

mecanismo de cooperação monetária com o objetivo de estabilizar as taxas de câmbio

e, com isso, reduziu-se o papel do ouro nas transações internacionais.” (PILAGALLO,

2009, p. 131).

Ao fim da Segunda Grande Guerra e antes da grave crise que se

enfrentará, o mundo passa a prosperar, mas logo os ensinamentos de Keynes são

esquecidos, dando lugar agora às ideias monetárias de Milton Friedman e, com ele se

estabelece novamente o padrão-ouro. Entretanto, em 1971, diante da reeleição, da

Guerra do Vietnã e de uma grave crise econômica o presidente Richard Nixon

desvincula definitivamente o dólar do metal. A partir daí todas as moeda passaram a

ser unicamente fiduciárias, ou seja, dependem totalmente da confiança que a

sociedade tem para com elas.

O fato é que, após a última grande guerra as economias voltaram a ser

liberais, tendo alguns soluços keynesianos nos momentos de crise. Mas, fora isso,

seguiram rigorosamente o receituário neoliberal de Friedman, a exemplo, os governos

de Ronald Reagan e Margareth Thatcher nos anos 80. Em meados da década de 90

vimos a confiança reinar e um mercado cada vez mais próspero e que forçava mais

desregulamentações, principalmente nas áreas financeiras.

Figura 19: Ronald Reagan, dos EUA, e Margaret Thatcher, da Grã-Bretanha, eram aliados conservadores próximos. Ambos aplicaram políticas monetarista rígidas durante sua gestão.

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3.7. A União Monetária Europeia

A unificação econômica e monetária Europeia se tornou assunto de pauta

desde meados do ano de 1957, quando se criou a Comunidade Econômica Europeia

(CEE), ou como podemos compreender, o mercado comum. Após a Segunda Guerra

Mundial, e com o início da Guerra Fria, se pensava que um mercado livre na Europa

facilitaria e fomentaria o comércio como também manteria a paz no continente.

As crises do petróleo no início e no final da década de 70 desestabilizou a

economia de diversos países, inclusive do Brasil. Várias moedas mundo afora sofrem

com sua desvalorização, os contratos de comércio exterior sofreram horrivelmente

com a oscilação monetária, dada as incertezas quanto ao preço do câmbio.

Assim, em 1979 se criou na Europa o Mecanismo de Taxa de Câmbio

(MTC), com o intuito de ser “um programa mais amplo para criar uma moeda europeia

unificada. Uma moeda única iria, conforme se esperava, estabilizar os negócios

europeus.” (SLATER, 2010, p. 149). Com o MTC as moedas da Europa não estariam

mais atreladas ao dólar, que abandonara o padrão ouro; elas seriam negociadas

dentro de uma banda cambial, ou seja, teriam um valor mínimo e um máximo para

serem cambiadas por outras. “Se qualquer moeda encostasse nos limites superior ou

inferior da banda, o banco central do país seria obrigado a colocar a moeda de volta

aos eixos, vendendo no limite superior ou comprando no inferior.” (SLATER, 2010, p.

150). Os países que aderiram ao MTC poderiam deixar suas moedas flutuarem em

relação as de outros países em até 2,25%, sendo que a moeda que balizaria era o

marco alemão.

Sendo assim o Mecanismo de Taxa Cambial “também teria o efeito de

diminuir o poder dos investidores e especuladores, que poderiam tornar a vida difícil

para os banqueiros do governo, especialmente quando esses governos agiam como

se não fizessem parte de uma união monetária.” (SLATER, 2010, pp. 149-150).

Em 1989 o Conselho Europeu que se reuniu em Madrid adotou um plano

de três etapas para que a Europa continuasse no caminho da união econômica e

monetária. Em 1992 é assinado o Tratado de Maastricht que incorporou as decisões

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do Conselho Europeu e deu “[...] esperança de uma unidade europeia mais firme [...]”

(SLATER, 2010, p. 150).

A primeira etapa do plano que se iniciou em 1990 com a circulação de

capitais sem nenhuma sobre taxa ou controle cambial; um mecanismo de crédito

destinado a corrigir os desequilíbrios das regiões europeias e uma convergência

econômica entre os países que se daria através da taxa de inflação com variação

máxima de 1,5% em relação aos 3 países de inflação mais baixa; taxas de juros de

longo prazo com variação máxima de 2% em relação aos 3 países com as taxas mais

baixas; déficit público inferior a 3% do PIB (Produto Interno Bruto); dívida pública

inferior a 60% do PIB; estabilidade cambial de acordo com o MTC. Devemos ressaltar

que todos os países deveriam respeitar a convergência econômica para serem

membros da União Europeia.

No ano de 1994 se deu a implantação da segunda etapa com criação do

Instituto Monetário Europeu, mais tarde substituído pelo Banco Central Europeu; com

a independência dos bancos centrais nacionais e uma forte regulamentação sobre os

déficits orçamentais. Na terceira e última etapa foi implantada a moeda única, o Euro,

em janeiro de 1999. Que teve de início 11 países: Áustria, Bélgica, Finlândia, França,

Alemanha, Irlanda, Itália, Luxemburgo, os Países Baixos, Portugal e Espanha. Talvez

um grande defeito do acordo de União Econômica e Monetária tenha sido a

independência dos bancos centrais nacionais frente ao Banco Central Europeu como

veremos adiante.

3.7.1. “O Homem que Quebrou o Banco da Inglaterra”: George Soros

Budapeste, 12 de agosto de 1930, nascia o húngaro Dzjchdzhe Shorash,

filho de um descendente de judeus e antissemita, prisioneiro austro-húngaro que

sobreviveu a Primeira Guerra Mundial e de uma típica dona de casa, Tivadar e

Elizabeth. Apesar da fama de infiel e avesso ao trabalho, Tivadar tinha algum dinheiro

e conseguiu dar uma boa vida aos seus filhos. (SLATER, 2010, pp. 15- 20).

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Durante a Segunda Guerra Shorash foi para a Inglaterra fugindo da

Gestapo22, onde trabalhou como garçom e salva-vidas para sobreviver, lá também ele

foi para London School of Economics, na qual teve uma paixão pela filosofia analítica.

Mais tarde, Shorash, anglizou o nome para George Soros, “embora o sobrenome seja

pronunciado shorosh em húngaro, George o adaptou para seus amigos e conhecidos

americanos e ingleses, e o pronunciava soros.” (SLATER, 2010, p. 17).

Durante a infância ou a juventude, Soros nunca despertou a atenção de

ninguém, “ele não era, de acordo com todos os relatos, nenhum gênio, mas era

inteligente e muitas vezes demonstrava iniciativa” (SLATER, 2010, p. 20).

Posteriormente, já radicado nos Estados Unidos, em Nova York, George se torna um

grande investidor da bolsa, e a premissa de se manter no anonimato é unanime em

Wall Street. Afinal, ninguém gostaria de falar como ganhava seu dinheiro na Bolsa de

Valores.

Porém, em 16 de setembro de 1992, George se torna o investidor – ou

como alguns dizem, especulador – mais famoso do mundo, após ganhar $2 bilhões

apostando contra a libra esterlina ($1 bilhão com a libra e mais $1 bilhão com o caos

futuro ligado às moedas italiana e sueca e na bolsa de Tóquio). Os ingleses chamaram

esse dia de Quarta Feira Negra, Soros o chamou de Quarta Feira Branca.

Com o MTC em vigor, as principais moedas europeias estavam lastreadas

no marco alemão. A libra, por exemplo, valia no ano de 1987 o equivalente a 2,95

marcos. Lembrando que a moeda inglesa, assim como a de outros países membros

do MTC, não podia oscilar mais que 2,25%, ou seja, seu piso era 2,7780 marcos. Já

em 1992 fiou claro para os investidores e especuladores que as moedas europeias

estavam supervalorizadas em relação a outras mais fortes, nesse caso não só a libra

mas também a lira italiana. Como a Inglaterra passava por uma recessão23, poucos

pensavam que a Inglaterra seria capaz de sustentar a libra no mesmo patamar. “Os

especuladores farejavam desgraça.” (SLATER, 2010, p. 151).

Ainda que o Tratado de Maastricht tenha sido assinado diversos países

europeus estavam desalinhados em relação as suas políticas econômicas. Os

22 Polícia política secreta da Alemanha nazista. 23 Um país em recessão é quando quantificação de todas as riquezas produzidas (PIB ou PNB) por ele são praticamente zero naquele período.

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especuladores imaginavam que os juros britânicos não poderiam se manter tão altos,

em relação aos de outros países, estando a economia inglesa em recessão24,

imaginavam que único caminho para o Primeiro Ministro Britânico, John Major, seria

abaixar os juros. Isso significaria sair automaticamente do MTC, uma vez que sua

moeda seria desvalorizada25.

Em meados de agosto de 1992, o Ministro das Finanças inglesas, Norman

Lamont, afirmou: “Não vamos desvalorizar a libra [...] se como alguns sugerem,

sairmos do MTC e cortamos as taxas de juros, as coisas podem piorar” (Apud.

(SLATER, 2010, p. 153). O governo não queria baixar as taxas de juros, pois para eles

isso deixaria a libra mais fraca e vulnerável aos especuladores e ao hedge26.

No final de agosto, com a economia piorando e a pressão sobre a moeda

aumentando, Lamont declara: “faremos tudo o que for necessário. Estamos agindo.”

(SLATER, 2010, p. 153). Esse pronunciamento do Ministro veio logo depois do

governo comprar 300 milhões de libras para tentar conter a queda dessa. Contundo,

os pronunciamentos do governo não dissuadiam especuladores que, assim como

Soros, vislumbravam uma oportunidade de ganhar com o desastre da moeda inglesa.

Ao iniciar o mês de setembro, o Ministro das Finanças declara que o

governo tomara um empréstimo de 7,5 bilhões de libras de vários bancos

24 Devemos entender, após o advento de Keynes, que toda economia em recessão deve receber estímulos por parte do governo. Um desses estímulos seria a taxa básica de juros, que uma vez estando em patamares menos elevados promoverá negociações com preços baixos no Mercado Primário – onde o governo negocia seus títulos – e assim, os bancos comerciais vendem entre si esses títulos no mercado secundário e repassaram essa queda nos preços à aqueles com poupança deficitária, e estes tomando dinheiro emprestado nos bancos a um custo menor irão consumir mais. 25 Uma vez em que os juros básicos da economia – ou seja, a taxa de juros que o governo negocia seus títulos da dívida pública – estejam baixos os investidores estrangeiros irão retirar seu capital vendendo a moeda do país e irão troca-la pela moeda de outro país onde a taxa seja mais rentável. A venda massiva da moeda irá aumentar oferta dessa moeda no mercado fazendo com que ela se desvalorize. Vemos aqui, mais uma vez, a manifestação da TQM (Teoria Quantitativa da Moeda). 26 “Termo em inglês que significa salvaguarda. É um mecanismo utilizado por operadores do mercado financeiro e de commodities para se resguardarem de uma flutuação de preços. [...] Exemplo: um operador da Bolsa de Cereais que compra soja spot (entrega imediata) e vende para entrega futura. Suponhamos que este operador compre, no dia 1º de maio, 10 mil sacas de soja ao preço de 12,75 dólares cada saca na Bolsa de São Paulo, o que equivale a 127.500 dólares. Desejando proteger-se contra flutuações no preço da soja, vende nesse mesmo dia na Bolsa de Chicago 10 mil sacas de soja a futuro por 12,95 dólares, o que equivaleria a um total de 129.500 dólares. Nesta operação haveria um ganho bruto de 2 mil dólares. [...] Assim, se o preço a futuro baixasse (situando-se em 12,65 dólares), este operador poderia vender 5 mil sacas de soja a um produtor de óleo por um preço de 10 centavos menor do que o preço futuro e, portanto, a 12,55 dólares, e, para proteger-se desta venda, comprar 5 mil sacas de soja no mercado futuro a 12,65 dólares, acusando, nesse caso uma perda de 63.250 – 62.750 = 500 dólares. No final dessas duas operações de hedging, o ganho do operador seria o que obteve na primeira operação (2 mil dólares) menos o que perdeu na segunda (500 dólares)”. (SANDRONI, 2005, p. 395).

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internacionais. Isso deu uma sobrevida à moeda até outro pronunciamento, o do

Presidente do Bundesbank27, Helmut Schlesinger, no Wall Street Journal. George

Soros relata tempos depois:

“Pessoalmente, não previa o colapso do Mecanismo de Taxa de Câmbio. [...] Vi a tensão

entre as autoridades. Depois se tornou óbvio que a tensão era muito grande, que a

desunião era muito grande, e houve uma entrevista em particular com Schlesinger, o

diretor do Bundesbank, publicada no Wall Street Journal que foi efetivamente uma

convocação para que todos saíssem da libra.” (Apud. (SLATER, 2010, p. 155).

Na entrevista de Schlesinger entendeu-se que os alemães não estavam

dispostos a salvar outros países europeus pondo em risco a sua própria economia.

Os países em risco tentavam negociar com a Alemanha um corte na sua taxa juros,

em troca os italianos desvalorizariam a lira, talvez assim todos os países poderiam

sair ilesos, ou quase, da crise.

Segundo Slater, biografo de George Soros, ele traçou um plano complexo

ao ver-se diante da ruina da libra:

“Ele [Soros] acreditava que a ruína do MTC, agora inevitável, desencadearia uma série de

acontecimentos: primeiro, um enorme realinhamento das moedas europeias; segundo,

uma queda acentuada nos juros europeus; terceiro, um declínio nas bolsas europeias. Ele,

então, decidiu vender a descoberto28 as moedas europeias fracas e apostar nas taxas de

juros e nos mercado de valores mobiliários. Em jogada corajosa, Soros e seus associados

venderam a descoberto libras na ordem de $7bilhões – e compraram $6 bilhões em

marcos alemães. Em escala menor, também compraram francos franceses [que era uma

moeda forte]. Ao mesmo tempo, especulou na baixa das ações alemãs e francesas. O

raciocínio de Soros era que o valor elevado do marco prejudicaria as ações, mas

beneficiaria os títulos, já que as taxas de juros seriam mais baixas. Soros tinha muito

crédito, portanto, ele conseguiu manter todas essas posições com apenas $1 bilhão de

garantia. Ele havia tomado $3 bilhões emprestados para completar a aposta de $10

bilhões. [...] ‘Tínhamos $7 bilhões em títulos de participação acionária e nossa posição

27 Banco Central Alemão. 28 A Venda a Descoberto é a alavancagem que a corretora dá ao investidor, ou seja o crédito.

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total estava em torno de $10 bilhões. Portanto, chegava uma vez e meia todo o nosso

capital’. Soros observou. Com os recursos de seu Quantum Fund, ele tomou emprestado

5 bilhões de libras. Então, ele trocou as libras por marcos na taxa do MTC de 2,79 marcos

por uma libra. (SLATER, 2010, pp. 156-157).

George Soros assim como outros especuladores sabiam que a briga seria

entre o Banco da Inglaterra e o Bundesbank. E todos já sabiam que os ingleses

perderiam.

Na terça feira, 15 de setembro, durante a noite, Soros está em seu

apartamento na Quinta Avenida, em Nova York, certo de que tudo estava acontecendo

conforme planejado “fez uma refeição simples, preparada por seu chef. Depois do

jantar, foi dormir.” (SLATER, 2010, p. 161).

Enquanto isso, manhã de quarta-feira na Inglaterra, Lamont anuncia

publicamente a alta dos juros em dois pontos, a taxa passava agora de 10% para 12%

ao ano. Concomitante John Major convoca o Parlamento em pleno recesso29 para

discutir a crise do MTC. Na tarde de quarta-feira o Banco da Inglaterra já estava

subindo, pela segunda vez no mesmo dia, as taxas de juros. A taxa foi fixada em 15%

a.a..

Nada abalou especuladores, e a libra esterlina fechou o dia em 2,71

marcos, bem abaixo do piso de 2,778. Ao final da tarde do mesmo dia “o primeiro-

ministro John Major falava ao telefone [...], agora com o primeiro-ministro francês,

Pierre Beregovoy, e como o chanceler alemão, Helmut Khol. A notícia que Major

trouxe era sombria. Ele declarou que teria que tirar a Grã-Bretanha do MTC. Não havia

escolha.” (SLATER, 2010, p. 164). No fim de setembro de 1992 a libra chegaria a valer

somente 2,5 marcos. Os ingleses baixaram novamente sua taxa de juros para 10%,

os italianos os seguiram retirando a lira do Mecanismo de Taxa de Câmbio. A moeda

da Grã-Bretanha sofreu uma desvalorização de 16%, seguida por 28% da espanhola

e 22% da lira italiana.

29 Algo que só havia acontecido 10 vezes após a Segunda Guerra.

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Apesar de George Soros ter ganho a fama de “o homem que quebrou o

Banco da Inglaterra” ele obviamente não estava sozinho. Muitas outras instituições

financeiras ganharam muito dinheiro, Robert Slater relata em sua obra:

“Bruce Kovner, da Caxton Corporation, e Paul Tudor Jones, da Jones Investments, foram

grandes ganhadores. Estima-se [apesar de não terem sido declarados oficialmente] que

os fundos de investimento de Kovner tenham ganhado $300 milhões e os de Jones $250

milhões. Bancos americanos importantes com grandes operações de câmbio – em

especial Citicorp, J.P. Morgan e Chemical Banking – também tiveram ganhos. Juntos, no

terceiro bimestre, os bancos ganharam acima de $800 milhões líquidos a mais do que um

rendimento normal para o bimestre com o câmbio.” (SLATER, 2010, pp. 166-167).

Na manhã seguinte em Nova York, George Soros é despertado as 7h com

um telefonema de um dos seus parceiros de negócio, Stanley Druckenmiller, que lhe

informou que a aposta de $10 bilhões de libras foi um sucesso, o que rentabilizara

para Soros um total de $2 bilhões.

Posteriormente George se pronunciaria na revista Times de Londres:

“ganhei [somente com a quebra da libra] um bilhão com a queda da libra”. Disse

também:

“Tenho certeza de que houve consequências negativas... Mas isso não cabe em meu

pensamento. Não pode. Se eu me abstiver de certas ações por escrúpulos morais, deixo

de ser um especulador eficiente. [...] Não tenho nem uma sombra de remorso por ter

lucrado com a desvalorização da libra. A desvalorização pode acabar sendo para o bem.

A questão é: não especulei contra a libra para ajudar a Inglaterra. Nem especulei para

prejudica-la. Fiz isso para ganhar dinheiro.” (SLATER, 2010, p. 170)

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CONCLUSÃO

Nota-se que a moeda nasce da tendência natural do homem em diminuir

as suas dificuldades do dia a dia e em reduzir seu trabalho, o que só foi possível com

o advento de metais escassos30 que eram divisíveis, não pereciam e, se separados,

poderiam ser facilmente fundidos. Essa nova forma de dinheiro metálico facilitou as

trocas, deu maior dinamismo à economia, reduziu também os custos de transação

entre as mercadorias31, o que propiciou a reprodução do comércio. Este, por sua vez,

se tornava mais complexo e com necessidades cada vez maiores.

A divisão do trabalho também aumentou e, consequentemente, a

produção, o que de acordo com o nosso estudo, seria o fruto da especialização do

trabalho. Este aumento da produção proporcionou excedentes que permitiram os

indivíduos adquirirem outras mercadorias que necessitavam.

A moeda impulsionou a economia – agora economia monetária – de tal

maneira que, a princípio, as sociedades abandonam a atividade bélica como método

de supressão de suas necessidades e acúmulo de riqueza. Ao se espalhar pelo

mundo antigo, a moeda potencializa o comércio entre as nações, o que gera

inovações financeiras, tais como os bancos, as notas bancárias e as ações. Deveras,

essas inovações impulsionam mais uma vez o comércio, entretanto, quando

desregulamentadas à sorte da confiança de consumidores, causam grande caos

econômico. Como ainda hoje o faz.

Dessa forma percebemos aqui o quanto a evolução da moeda permeou o

desenvolvimento da própria sociedade como um todo. Nos é permitido entender que

as diversas formas de dinheiro (metálico, papel, magnético, eletrônico e etc.) são um

mero reflexo das necessidades e desejos humanos. Ou seja, é esta outra mercadoria

que materializa o trabalho humano. Somente o trabalho humano pode incentivar a sí

próprio na construção, transformação e destruição de seres e objetos em uma

sociedade.

30 Lembrando-se que o valor de uma mercadoria é dado pela sua raridade. 31 Conforme o exemplo que demos no item 1.3., na página 17.

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“ O dinheiro é como um pássaro assustado. Ao menor farfalhar das

folhas ele voa para outra árvore”.

Arthur Miller

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