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Isaías e Jeremias: dois «profetas» face à política internacional de Judá

Autor(es): Gonçalves, Francolino

Publicado por: Instituto Oriental da Universidade de Lisboa

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ISAÍAS E JEREMIASDOIS «PROFETAS» FACE À POLÍTICA INTERNACIONAL DE JUDÁ(1)

Por FRANCOLINO J. GONÇALVESÉcole Biblique et Archéologique

Française de Jerusalém

Os profetas bíblicos e a política é um tema frequente da exegese histórico-crítica(2). E é natural que assim seja. Com efeito, expresso nas categorias da modernidade ocidental de que a exegese histórico- -crítica é uma das manifestações, o profetismo bíblico é uma realidade eminentemente política. Pode dizer-se outro tanto de todos os profe- tismos do Próximo Oriente antigo conhecidos, como veio confirmar 0 imponente corpus profético descoberto nos arquivos reais de Mari(3).

Os estudos sobre 0 profetismo bíblico e a política têm sido domi- nados pela questão de saber em que se fundavam os profetas e, correlativamente, qual era a pertinência política das suas tomadas de posição. Os profetas agiam em nome da sua clarividência, de axio- mas religiosos, dos interesses de um grupo? As suas opções políticas eram realistas ou, pelo contrário, utópicas? Em questões de política internacional, os profetas eram patriotas ou, pelo contrário, quintas- colunas?

Além disso, os estudiosos têm partido do pressuposto de que o profetismo hebraico foi um fenómeno relativamente homogéneo. Os profetas teriam constituído uma espécie de corporação com contornos bastante bem definidos, a qual teria permanecido fundamentalmente idêntica durante os sete ou oito séculos da sua existência. Ora, isso não corresponde à realidade histórica. De facto, nem sempre é fácil distinguir um profeta de um adivinho, outro especialista da comunica­

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FRANCOLINO GONÇALVES

ção entre 0 mundo divino e o mundo humano. Além disso, profeta - em hebraico nabi’ - tornou-se já no Antigo Testamento, um termo gené- rico e acabou por designar várias classes de especialistas da reve- lação divina inspirada: profetas propriamente ditos (nebî’îm), videntes (ro’îm), visionários (hozîm), homens de Deus ('/s ’elohîm) e até pes- soas que não pertenciam a nenhuma dessas classes tradicionais(4).

Não tendo em conta a complexidade do fenómeno profético bíblico, os estudiosos têm procurado uma espécie de denominador comum das tomadas de posição dos diferentes agentes da revelação inspirada. O resultado tem sido, em geral, um nivelamento que esconde 0 que cada um deles tem de específico.

Para a tradição bíblica, Isaías e Jeremias são, entre os cha- mados «profetas clássicos», os que tiveram maior actividade política. Is 1-39 e 2 R 18,17-20,19 apresentam Isaías como sendo um dos principais actores na cena política de Judá na segunda metade do séc. VIII a. C. Segundo 0 seu livro, Jeremias desempenhou um papel semelhante no fim do séc. VII e no começo do séc. VI a. C. (5) De aí que Isaías(6) e Jeremias(7) sejam os mais estudados relativamente às suas posições políticas. Fica-se, no entanto, com a impressão de que, de maneira mais ou menos implícita, se projeta nos textos de Isaías 0 sentido óbvio dos textos de Jeremias, modelando assim a personagem política de Isaías à imagem da personagem política de Jeremias. Por isso, parece-me valer a pena retomar a questão.

O meu propósito é, no entanto, muito modesto. Consiste em ten- tar responder às seguintes perguntas: Na opinião de Isaías e de Jere- mias, que devia fazer ou não fazer Judá em matéria de política inter- nacional, e porquê? Procurarei primeiro isolar as posições de cada um deles para depois as comparar.

Isaías

Segundo 0 livro que tem 0 seu nome, Isaías ben Amos exerceu a sua actividade em Jerusalém entre cerca de 740 e 700 a. C. Foram tempos de grandes transformações no Próximo Oriente, das quais a Assíria foi 0 principal motor. A tendência para 0 expansionismo, parti- cularmente em relação aos países situados a oeste e a sudoeste do seu território nacional, fora desde sempre uma das características da política assíria. Com Tiglat-Pileser III (745-727 a. C.) e seus sucesso- res esta tendência traduziu-se num verdadeiro projecto imperialista cujo objectivo era teoricamente 0 domínio universal. A Assíria e o Egipto vão disputar a hegemonia na Palestina e na Fenícia. Judá foi

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ISAÍAS E JEREMIAS

apanhado no turbilhão assírio aquando da chamada guerra siro-efrai- mita (2 R 15,37; 16,5-9 e Is 7,1-9), entre 735 ou 734 e 732. Segundo a hipótese corrente, a guerra siro-efraimita era um episódio da organi- zação da resistência ao avanço assírio. Querendo evitar a existência de um país neutro, senão pró-assírio na retaguarda, Damasco e Isra- el, que já estavam sob 0 domínio assírio, tentam obter a adesão de Judá á coligação anti-assíria. Perante a recusa de Judá, intervêm mili- tarmente para instalar no trono de Jerusalém um partidário da luta contra a Assíria. Embora suscite algumas dificuldades(8), esta inter- pretação da guerra siro-efraimita talvez seja preferível a outras que se propuseram. Tem, pelo menos, a vantagem de situar esse conflito local no contexto da política internacional.

Segundo 2 R 16,5-9, Judá tornou-se vassalo da Assíria aquando da guerra siro-efraimita. Acaz aparece numa lista de reis que pagaram tributo a Tiglat-Pileser III(9). Esta lista confirma que Judá era vassalo da Assíria, mas não diz desde quando nem em que circunstâncias se deu a submissão de Judá à Assíria. Nada indica que tenha sido de- pois de 732 a. C. Em conformidade com 0 direito internacional da época, concretamente com a prática assíria, a submissão deve ter sido ratificada por um tratado que definia o estatuto de Judá no impé- rio assírio. Judá guardava as suas instituições nacionais e tinha direito à protecção assíria caso fosse ameaçado por outro país, mas não gozava de verdadeira independência. Com efeito, tinha de alinhar-se pelos objectivos da política assíria. O seu exército estava às ordens do rei da Assíria, que podia mobilizá-lo quando bem 0 entendesse. Judá tinha que enviar todos os anos à corte assíria o tributo estipulado e, ao mesmo tempo, renovar 0 acto de submissão. O mínimo desvio ou negligência relativamente a uma ou outra dessas obrigações eram severamente punidos: destituição ou execução dos responsáveis, pesadas penalidades pecuniárias, deportação de uma parte da popu- lação, redução do território ou a sua anexação, conforme os casos(10).

Estando então a política internacional de Judá dominada pela questão das relações com a Assíria, as tomadas de posição de Isaías nessa matéria têm a ver de uma maneira ou outra com a Assíria. Que se saiba, a maior parte delas tiveram lugar, primeiro, aquando dos acontecimentos que levaram à submissão à Assíria e, depois, por ocasião das revoltas de 713-711 e de 705-701.

O seu livro conserva a recordação de várias intervenções de Isaías aquando da crise siro-efraimita. Isaías insiste na fraqueza dos coligados e garante que não conseguirão realizar os seus planos de apoderar-se de Jerusalém e de substituir-lhe o rei. Por isso, Judá não tem nada a temer (Is 7,1-9). Por meio do nome simbólico Maher Chalal

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FRANCOLINO GONÇALVES

Hach Baz (Rápida Presa Iminente Saque), que dá a um dos seus filhos, Isaías anuncia a derrota iminente dos coligados pela Assíria (Is8,1-4) (11). Este anúncio não tardou a cumprir-se: 0 reino de Damasco foi destruído em 732; o reino de Israel ficou então muito enfraquecido e desaparecerá dez anos mais tarde, em 722. Aos olhos de Isaías, a ruína de Damasco e de Israel não implicava necessariamente a paz e 0 bem-estar de Judá. Com efeito, a paz e o bem-estar de Judá não dependiam de forma alguma do destino dos seus inimigos, mas uni- camente da sua política. É 0 que diz Is 7,9b: ’im lo ’ ta’amînû kí 10’ té’aménû, famoso jogo de palavras que as traduções portuguesas habituais por «se não crerdes, não subsistireis ou não vos mantereis firmes» não conseguem transpor.

É verdade que os cap. 7-8 do livro de Isaías não mencionam a aliança com a Assíria. Mas, vistas as razões da sua oposição, mais tarde, à aliança com 0 Egipto, é legítimo concluir que Isaías também se opunha à aliança com a Assíria, em nome da fé que reclamava de Judá. Em 8,5-8a Isaías denuncia a rejeição das «águas de Siloé que correm mansamente» (v.6) e, como consequência disso, anuncia a Judá a invasão assíria sob a imagem de um transbordamento do Eufra- tes. Seja qual for a realidade que elas designam, assim como as suas conotações, as «águas de Siloé que correm mansamente» evocam uma atitude de calma, que tem a sua fonte em lavé. Em que consistiu a rejeição dessa calma? Terá sido no facto de ceder ao pânico perante os coligados siro-efraimitas (Is 7,2)? De facto, Is 7,2 insiste no pânico de Acaz e de todo 0 povo de Jerusalém. A correspondência normal entre 0 acto ou 0 comportamento mau e as suas consequências sugere a existência de uma relação entre a rejeição da calma e a Assíria. Numa palavra, tudo indica que a rejeição da calma consistiu na aliança com a Assíria. Numa eloquente inversão de papéis, Isaías anuncia a Judá que, em vez da paz e do bem-estar que esperava, da Assíria só lhe virá a desgraça.

Em 713 ou 712 Yamani, rei de Achdod, promove uma coligação anti-assíria. Procura a adesão dos outros Estados filisteus, de Judá, de Edom e de Moab, assim como o apoio do Egipto(12). A Assíria intervém em 711. Yamani refugia-se no Egipto, talvez na Núbia. Em vez de 0 proteger, o Egipto extradita-0 para Nínive. O exército de Sar- gão II conquista Achdod, Achdod Marítima e Gat. Nem os documentos assírios nem os textos bíblicos dizem qual foi então a política de Judá, cujo rei era Ezequias. Em contrapartida, conhece-se a opinião de Isaías sobre a situação. Segundo Is 20, expressou-a de uma ma- neira que não devia passar despercebida. Nu e decalço durante três anos, mimou de antemão 0 destino dos prisioneiros egípcios e núbios

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ISAÍAS E JEREMIAS

que a Assíria levará. Embora anuncie 0 infortúnio do Egipto e da Núbia, Isaías dirige-se a Judá. Avisa-0 de que nem ele nem os outros Esta- dos palestinenses podem contar com os países do Nilo para sacudir0 jugo assírio.

Como ocorria habitualmente, a mudança de reinado na Assíria depois da morte de Sargão II em 705 foi ocasião de revoltas no impé- rio. Julgando que tinha chegado 0 momento de se libertar do domínio assírio, Ezequias revolta-se e toma uma parte muito activa na orga- nização de uma coligação anti-assíria entre os Estados da Palestina e da Fenícia, apoiada pelo Egipto. Aderiram Ascalon, Ekron, Tiro e Sídon. Houve um vaivém de embaixadores entre Judá e 0 Egipto (Is18,1-2.4; 30,1-5.6-8; 31,1.3) e negociações entre Ezequias e 0 caldeu Marduk-apal-iddina(13), rei da Babilónia e chefe da frente sul da revolta.

Após ter esmagado as revoltas no Sul e no Este em 703 e 702, Senaqueribe consagrou a sua terceira expedição militar, em 701, a submeter a Fenícia e a Palestina. Os documentos assírios(14) e os textos bíblicos mais antigos, alguns dos quais devem ser contemporâ- neos dos acontecimentos, são unânimes(15). A campanha foi desas- trosa para Judá. O exército assírio conquistou todo 0 território e sitiou Jerusalém. Ezequias rendeu-se e teve que pagar indemnizações de guerra elevadíssimas. Além disso, 0 rei da Assíria levou despojos de guerra muito importantes, assim como um grande número de prisionei- ros, e distribuiu uma boa parte do território de Judá entre os reis filis- teus que lhe haviam permanecido leais.

A maior parte dos oráculos de Isaías relativos à política interna- cional conservados pela tradição parecem datar dos anos 705 a 701. Se a tradição reflecte a realidade histórica, as tomadas de posição de Isaías foram então mais numerosas do que em nenhum outro momento da sua longa carreira. Como fizera já em 713-711, Isaías denuncia a aliança com 0 Egipto (Is 18, 1-2.4; 30,1-5.6-8; 31,1-3). Ora a aliança com 0 Egipto tinha por alvo a Assíria. Por isso, os exegetas e os histo- riadores concluem de maneira praticamente unânime que Isaías con- denava a revolta contra a Assíria. Uns pensam que Isaías era pela neutralidade(16). Esquecem-se de que, estando ligado à Assíria pelo menos desde 732, Judá não podia ficar neutro. Só tinha a escolha entre a fidelidade ao juramento prestado pelo seu rei, isto é, a sub- missão à Assíria, e a infidelidade, isto é, a revolta. A mínima veleida- de de neutralidade da parte de Judá seria considerada pela Assíria como uma revolta. Outros autores pensam que Isaías era pela sub- missão à Assíria(17). Avançaram-se várias razões pelas quais Isaías teria adoptado essa posição. Uns sugeriram considerações de Realpo- litik·. dada a grande potência da Assíria, qualquer tentativa judaica de

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EMANUEL BOUZON

sacudir 0 seu jugo estaria votada ao fracasso(18). Outros propuseram razões de ordem religiosa: a concepção isaiana da Assíria como ins- trumento de lavé para punir Judá(19); o facto de que Judá estava liga- do à Assíria por um juramento feito em nome de lavé(20); a certeza de que Judá estava condenado e teria 0 mesmo destino que Israel(21).

Não há nos oráculos de Isaías nenhum indício de que ele se opunha à revolta e militava pela neutralidade ou pela submissão à Assíria. Embora seja corrente, a interpretação dos seus oráculos nesse sentido parece-me resultar em grande parte de uma leitura feita à luz dos oráculos de Jeremias(22). De facto, tal interpretação contradiz 0 sentido óbvio de Is 30,15.

15: «Com efeito, assim diz 0 Senhor lavé, 0 Santo de Israel: “Pela inactividade e pelo repouso tereis a vitória, na tranquilidade e na calma estará a vossa valentia”, mas vós não quereis!

16: Pois dizeis: “Não, correremos a cavalo!”Pois bem, fugireis!E (ainda): “Montaremos cavalos velozes!”Pois bem, velozes serão os vossos perseguidores!

17: Mil perante a ameça de um só, perante a ameaça de cinco fugireis até que fiqueis como um mastro no cimo de um monte, como um estandarte numa colina.»

Afasto-me das traduções correntes em vários pontos(23). Limito- me a justificar a tradução do verbo tiwwasé'ûn, no v. 15, por «tereis a vitória/sereis vitoriosos», que é essencial para 0 meu propósito. Os tradutores vertem unanimemente esse verbo por «sereis salvos/tereis a salvação». De facto, o radical yâsa em todas as suas formas verbais e nominais, pode ter a acepção de salvação ou vitória. Assinalo só as passagens da Bíblia onde o radical tem claramente a segunda acep- ção. São numerosas. As formas verbais nifal(24) e hifil(25) significam «ter a vitória, ser vitorioso, dar a vitória». O hifil tem o sentido de «dar a vitória» mesmo quando o beneficiário da vitória em questão é um agressor que se lançou numa guerra de conquista(26). As formas nomi- nais (yesa ‘ (27), )fs 'ûâh{2*) e fsû 'âh(29)) têm frequentemente 0 sentido de vitória. O contexto de Is 30,15 exige essa acepção do radical, devendo 0 nifal tiwwasé'ûn traduzir-se não por «sereis salvos/tereis a salvação», sentido que seria demasiado geral, mas por «tereis a vitó- ria/sereis vitoriosos». Com efeito, 0 verbo tiwwasé'ûn está em paralelismo sinonímico com a expressão «estará a vossa valentia/força/bravura» (gebúrah). Ora, 0 termo gebúrâh tem certamente uma conotação militar.

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ESCRAVIDÃO E DÍVIDAS NA LEGISLAÇÃO CUNEIFORME

Tal deve ser também a conotação do seu paralelo, 0 verbo tiwwasé'ûn. Além disso, os dois versículos seguintes só falam de realidades milita- res: cavalos velozes para 0 ataque, perseguição de um exército em debandada, sinal para 0 ajuntamento dos guerreiros (v. 17). Numa pala- vra, lavé promete a vitória a Judá mediante a «inactividade e 0 repouso, a tranquilidade e a calma». A esses meios propostos por Isaías em nome de lavé, os políticos de Jerusalém contrapõem a sua própria estratégia, que eles preferem. À estratégia dos políticos de Jerusalém, centrada na rapidez da cavalaria, Isaías contrapõe, finalmente, a rapi- dez da debandada, que sublinha a grandeza da derrota.

Isaías formulará, de uma maneira geral, as condições de qual- quer vitória de Judá contra qualquer inimigo? Parece mais provável que se refira à vitória contra um inimigo concreto, em circunstâncias particulares. Que se saiba, os inimigos de Judá no tempo de Isaías foram os coligados siro-efraimitas e a Assíria. Nada sugere que se trate dos primeiros. Os oráculos que se lhes referem anunciam a sua derrota pelos Assírios, mas não falam de nenhuma vitória de Judá. Deve, portanto, tratar-se da Assíria. O lugar de Is 30,15-17 aconselha a datar esse texto entre 705-701 e a ver na Assíria 0 inimigo que se espera vencer. Com efeito, Is 30,15-17 está no meio de uma série de oráculos de 705-701 que denunciam a aliança com 0 Egipto, aliança essa que visava a Assíria. Is 30,16 parece-se com Is 31,1.3. Os dois textos têm em comum 0 tema da confiança na cavalaria. Is 31.1.3 explicita que se trata da cavalaria egípcia.

Deve supôr-se que lavé deseja a vitória para a qual põe as con- dições. Se 0 inimigo de Judá é a Assíria, é forçoso admitir que lavé deseja a vitória de Judá contra ela. Ora, a vitória contra a Assíria pressupõe necessariamente a revolta de Judá contra essa potência e parece inconcebível que Isaías não se apercebesse desse facto. Deve portanto concluir-se que, longe de se lhe opôr, Isaías caucionava a revolta de Judá contra a Assíria(30). É verdade que, na opinião de Isaías, a invasão de Senaqueribe em 701 teve consequências desas- trosas para Judá, das quais os políticos de Jerusalém são inteiramente responsáveis (Is 1,4-8 e 22,1-14) (31). No entanto, nada sugere que Isaías tenha censurado os políticos de Jerusalém pelas causas da invasão, isto é, pela revolta. Censura-os, sim, por terem «abandonado lavé, desprezado 0 Santo de Israel» (Is 1,4), ou mais precisamente, por se terem então voltado para 0 sistema defensivo de Jerusalém em vez de se terem voltado para lavé (Is 22,8b-11). Isso supõe que, segundo Isaías, a invasão teria tido um resultado completamente dife- rente, caso Judá se tivesse entregado inteiramente nas mãos de lavé. A invasão teria tido como resultado a vitória de Judá.

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FRANCOLINO GONÇALVES

Por que razões Isaías se opunha então à aliança com 0 Egipto? Nada indica que o fazia por razões políticas(32) ou militares. Com efeito, Isaías reconhece que 0 Egipto tem muitos carros e uma pode- rosa cavalaria (Is 31,1), mas declara que lavé fará perecer ao mesmo tempo 0 Egipto e Judá (Is 31,3). Isaías apelida 0 Egipto de Raab, 0 nome de um dos monstros marinhos do Caos(33), mas recorda aos políticos de Judá que lavé venceu Raab e 0 reduziu à inactividade. O Egipto pode parecer uma potência tão terrível como Raab, mas, de facto, é um Raab já vencido. A sua força é ilusória (Is 30,6-8).

Para Isaías a aliança de Judá com o Egipto não é só uma reali- dade político-militar, mas é antes de mais uma realidade teológica. É um pecado. Is 30,1-5 e Is 31,1.3 dizem de maneira particularmente clara e incisiva em que consiste esse pecado. Cito Is 31,1.3.

1: «Ai! Os que descem ao Egipto em busca de ajuda.Apoiam-se nos cavalos,põem a sua confiança nos carros, porque são muitos, e nos cavaleiros, porque são muito poderosos, mas não voltam os seus olhares para 0 Santo de Israel nem buscam lavé.(...)

3: Mas 0 Egipto é humano e não divino, os seus cavalos são carne e não espírito, lavé estenderá a mão,tropeçará o que ajuda e cairá 0 que é ajudado, ambos juntos perecerão.»

Este discurso está inteiramente estruturado pela oposição entre, por um lado, 0 Egipto e a sua cavalaria e, pelo outro, lavé, 0 Santo de Israel. O seu sentido é cristalino: fazer aliança com 0 Egipto é optar pelo Egipto contra lavé, pelo ser humano contra Deus, pela carne contra 0 espírito, pela fraqueza contra a força.

A estrutura e a mensagem de Is 30,1-5 são praticamente idênti- cas às de Is 31,1.3. Cito Is 30,1-3.

1 : «Ai! Filhos que se rebelam, oráculo de lavé, executando um plano, mas que não é meu, fazendo uma efusão, mas que não é do meu espírito, a fim de acumular pecado sobre pecado;

2: que se põem a caminho para descer ao Egipto, mas a minha boca, não a consultaram, para se refugiar no refúgio do Faraó e abrigar-se à sombra do Egipto.

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ISAÍAS E JEREMIAS

3: Ora, o refúgio do Faraó tornar-se־á a vossa vergonha e o abrigo à sombra do Egipto (a vossa) confusão.»

Isaías evoca a confiança que os dirigentes de Judá punham no Egipto por meio das imagens do refúgio e do abrigo. O vocabulário e as imagens usadas por Is 30,2-3 evocam regularmente nos Salmos e noutros textos aparentados a protecção que 0 orante procura ou encontra em lavé/Deus ou numa realidade que está em relação ime- diata com lavé/Deus. Isaías serve-se assim das imagens do refúgio e do abrigo para expressar 0 seu juízo teológico sobre a aliança de Judá com 0 Egipto. Dizer que Judá procura 0 seu refúgio e 0 seu abrigo no Faraó e no Egipto equivale a dizer que Judá atribui ao Faraó e ao Egipto um papel que só lavé/Deus pode desempenhar. Numa palavra, fazendo aliança com 0 Egipto, Judá põe esse país e a sua potência militar no lugar de lavé/Deus.

No fundo, Isaías dá uma única razão da sua oposição à aliança com 0 Egipto. Essa razão é de ordem religiosa(34). Fazer aliança com 0 Egipto é esperar do Egipto a vitória e a paz, bens que só lavé pode conceder a Judá. Por conseguinte, é escolher 0 Egipto como Deus, em vez de lavé. Semelhante troca de Deus por uma realidade humana é, para Isaías, pôr 0 mundo do avesso, subverter-lhe completamente a ordem. Pela mesma lógica, Isaías condena não só qualquer aliança com os povos estrangeiros - incluída a submissão à Assíria - mas também 0 recurso aos meios militares próprios, ofensivos (Is 30,15- -17) e defensivos (Is 22,8b-11), os quais também tomariam o lugar de lavé(35). Para Isaías, a confiança em lavé, que só pode ser absoluta, exclui qualquer estratégia militar. As duas são incompatíveis.

Jeremias

Jeremias exerceu a sua actividade em fins do séc. VII e começos do séc. VI a. C. (36) Foi um período particularmente conturbado no Próximo Oriente. Assírios, Babilónios, Egípcios e até Medos degladia- vam-se então numa luta encarniçada pela hegemonia. A Assíria desa- pareceu definitivamente em 606 a. C. Ficavam em liça a Babilónia e 0 Egipto. O reino de Judá vai ser jogado de uma para 0 outro, não tardando a cair. Recordo sucintamente os principais desenvolvimentos históricos que foram 0 quadro, ou a ocasião, da actividade de Jere- mias(37).

Em 609 Judá estava do lado babilónico. O seu rei, Josias, foi morto nesse mesmo ano, em Meguido, ao opôr-se ao faraó Necao II,

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FRANCOLINO GONÇALVES

aliado da Assíria contra os Babilónios e os Medos. O «povo do país» instala no trono de Judá Joacaz, um dos filhos de Josias (2 R 23,29- -30), mas algumas semanas mais tarde Necao destituiu-0 e levou-o prisioneiro para 0 Egipto, onde morreu. O Faraó pôs no lugar de Joacaz o seu irmão Eliaquim, cujo nome mudou para Joaquim. Judá tornou-se assim vassalo do Egipto (2 R 23,31-35). O equilíbrio das forças mudou graças à vitória dos Babilónios contra os Egípcios em Carquemich, no Verão de 605, e Judá teve que aceitar a suserania babilónica (2 R 24,1). Uma posterior vitória egípcia contra os Babiló- nios despertou em Judá a esperança de se libertar do domínio babiló- nico, Joaquim recusa-se a pagar 0 tributo e volta-se para 0 Egipto. Como resposta, Nabucodonosor cerca Jerusalém no começo de 597. A 15 ou 16 de Março, Joiaquin, que tinha sucedido ao seu pai Joa- quim no fim de 598 (2 R 24,6), rende-se. Nabucodonosor deporta-o para Babilónia com uma parte da população da cidade e substitui-0 pelo seu tio Matanias, que tomou 0 nome de Sedecias (2 R 24,1-17). Sedecias recusa 0 tributo em 589 ou 588 (38). No fim do mesmo ano ou no começo do ano seguinte, Nabucodonosor sitiou de novo Jerusalém. A intervenção de um exército egípcio na Palestina obriga os Babilónios a levantar o cerco (Jr 37,5-10). Recomeçaram-no e apoderaram-se da cidade no Verão de 587 ou 586. Sedecias foge, mas é capturado e levado para Babilónia, onde morrerá. Houve então uma nova deporta- ção (2 R 25, 1-21.27-30; Jr 52,3-34). Os Babilónios confiam 0 governo de Judá a Godolias, filho de Aicam, membro de uma das grandes famílias de Jerusalém, partidária da submissão à Babilónia. Godolias instala a sua sede em Mispá. Foi assassinado por Ismael, de sangue real, que queria provavelmente continuar a resistência contra 0 domí- nio babilónico (2 R 25,2-25; Jr 40,7-41,15). Um dos chefes militares, Yohanan, filho de Careah, refugia-se no Egipto com um grupo de habitantes de Judá, entre os quais se encontravam Jeremias e Baruc (2 R 25,26; Jr 41,16-43,7).

Jeremias condena as alianças com 0 Egipto e a Assíria. Lê-se essa condenação em Jr 2,17-19.36-37. Os vv. 36-37 visam directa- mente a aliança com o Egipto, mas Jeremias recorda o fracasso da aliança com a Assíria, garantia e ilustração do fracasso a que está igualmente votada a aliança com 0 Egipto. O v. 18 denuncia ao mes- mo tempo a aliança com 0 Egipto e a aliança com a Assíria:

«E agora, que te vale desceres ao Egipto para beberes a águado Nilo?que te vale desceres à Assíria para beberes a água do Rio (istoé, do Eufrates)?»

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Segundo a opinião mais corrente, o texto refere-se a duas alian- ças simultâneas, devendo datar de um momento em que a Assíria ainda não tinha sucumbido(39). Os vv. 17-19 dão claramente a razão da oposição à aliança com 0 Egipto e com a Assíria. Essas alianças equivalem a abandonar lavé.

As outras tomadas de posição de Jeremias a respeito da política internacional de Judá resumem-se num apelo à submissão à Babiló- nia. Lê-se esse apelo em Jr 21,1-10, mas sobretudo nos relatos de tipo biográfico de Jr 27-29.37-43. A exegese desses relatos debate-se com grandes dificuldades(40). A sua discussão, impossível no quadro desta exposição, não me parece indispensável para 0 meu propósito.

Segundo Jr 27,2-4.11 (41), aceitar a autoridade da Babilónia é para cada uma das outras nações a condição para que lavé lhe con- ceda a paz e a prosperidade. Jeremias expressou isso por meio de uma acção simbólica. Com um jugo na nuca, dirige aos reis de Edom, de Moab, de Tiro e de Sídon a seguinte mensagem: «A nação que põe a nuca sob 0 jugo do rei da Babilónia e 0 serve, conceder-lhe־ei a tranquilidade na sua terra, oráculo de lavé, cultivá-la-á e habitá-la- -á» (v. 11). O v. 3 situa 0 episódio no tempo de Sedecias. Os exege- tas datam-no habitualmente em 594/3. Os embaixadores dos países mencionados estariam em Jerusalém para organizar uma revolta con- tra a Babilónia, aproveitando a ocasião de distúrbios ocorridos no exército babilónico em 595/4. A acção simbólica seria a reacção de Jeremias perante a organização da revolta.

Excepto em Jr 27,2-4.11, todos os apelos à submissão à Babiló- nia se dirigem a Judá, ao rei ou a uma parte do povo. Jeremias reitera este apelo em cada nova circunstância. Assim, segundo Jr 29,5-7, escreve uma carta aos Hierosolimitanos que Nabucodonosor deportara em 597 para os exortar a fazer como se devessem viver para sempre na Babilónia. A carta termina assim: «Tomai a peito 0 bem do país(42) para onde vos exilei e rogai a lavé por ele, porque no seu bem estará 0 vosso bem» (v. 7). Admite-se geralmente que a carta é mais ou menos contemporânea da acção simbólica de Jr 27. Jeremias desen- ganaria aqueles entre os deportados que viam nos distúrbios do exér- cito babilónico os prenúncios de um regresso iminente a Jerusalém.

Os outros apelos à submissão têm por quadro o cerco de Jeru- salém entre 589-587/6 e os acontecimentos consecutivos à queda da cidade (Jr 37-43). Durante 0 cerco, esses apelos tomam a forma de uma exortação a render-se. Segundo Jr 38,17-18, Jeremias põe 0 rei Sedecias perante a seguinte alternativa: Se se rende, salvará a vida ele e a sua família, e Jerusalém não será incendiada; se resiste, a cidade será incendiada (cf. também 0 v. 23). Em 38,2 e 21,9 (43) é

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todo o povo que é posto diante dessa alternativa: resistir na cidade sitiada e morrer; entregar-se aos Caldeus e salvar a vida. Ambos os relatos da libertação de Jeremias (Jr 39,11-14 (44) e 40,1-6) dizem que ele ficou com Godolias a quem os Babilónios entregaram 0 governo de Judá. Segundo Jr 40,1-6, foi 0 próprio Jeremias que tomou essa decisão. Dando-lhe os Babilónios a escolha entre ir para a Babilónia e ficar em Judá, Jeremias escolhe ficar em Judá. Em perfeita coerência com 0 que sempre dissera ser a vontade de lavé, Jeremias cauciona assim, com a sua presença, 0 estatuto de Judá imposto pela Babiló- nia. É o que ressalta ainda mais claramente do relato da fuga para o Egipto (Jr 41,16-43,7). Jeremias declara que a ida para 0 Egipto está em contradição com a vontade divina, lavé quer que o povo fique no país sob a autoridade do rei da Babilónia. É no país de Judá que ele decidiu fazê-lo prosperar (Jr 42,7-22).

Os relatos de Jr 27-29 e 37-43 são 0 reflexo das lutas pela su- premacia entre as diferentes comunidades judaicas que se formaram depois de 587/6 a. C. Jr 41,16-43,7 afirma que Yohanan arrastou para 0 Egipto todos os habitantes de Judá que os Babilónios não haviam deportado. Por conseguinte, 0 país de Judá teria ficado vazio. Por outro lado, segundo esses mesmos relatos, foi contra a vontade de lavé, explicitamente formulada por Jeremias, que Yohanan e todo 0 povo foram para o Egipto. A comunidade judaica do Egipto teria assim nas- eido de uma desobediência a lavé, estaria marcada por um pecado original e condenada a um extermínio iminente. Com uma só penada, os autores de Jr 41,16-43,7 matam duas comunidades judaicas: a da Judeia, apagada do mapa; a do Egipto, deslegitimada e votada ao extermínio. Que resta então? Só a comunidade judaica da Babilónia, a qual é por conseguinte a única herdeira de Judá e da sua legitimidade.

É óbvio que, pelo menos na sua forma actual, os relatos de Jr 37-43 são um documento de propaganda da comunidade judaica da Babilónia. Tê-lo-ão sido sempre? Sim, responde Lohfink, que vê nesses relatos uma unidade fundamental(45). Em contrapartida, Stipp distingue três relatos, dos quais só um, que ele intitula «Queda do judaísmo palestinense», seria de origem babilónica. Com esse relato a comunidade judaica da Babilónia quereria mostrar que nada fez para ser a única herdeira da legitimidade. Ter-lhe-ia tocado a legitimi- dade em exclusivo por as outras comunidades se terem excluído dela por sua culpa(46). Para Pohlmann, a propaganda «pró-diáspora» babi- lónica do livro de Jeremias é inteiramente o fruto de uma redacção do séc. IV a. C. (47)

Que eu saiba, Carroll é um dos raros autores que vê nos relatos de Jr 37-43 o produto exclusivo do conflito entre as comunidades

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judaicas a partir do séc. VI a. C. Para esse exegeta, Jeremias é antes de mais a personagem literária do livro que tem esse nome. Pode ser que essa personagem corresponda a uma pessoa histórica, mas 0 livro não nos dá acesso a ela(48). Com a grande maioria dos exege- tas, não partilho 0 cepticismo de Carroll(49). Penso que por detrás da propaganda veiculada por Jr 37-43 há alguns factos históricos. Assim, não há razões válidas para duvidar de que Jeremias, pelo menos a partir de 597, militou pela aceitação da «ordem babilónica» e de que ele próprio conformou com isso a sua actuação. Jeremias declara que foi essa a decisão de lavé. Por que razão tomou lavé essa decisão? Porque quer punir Judá por causa da ruptura da aliança e encarregou a Babilónia de executar 0 castigo, respondem, por exemplo, Bright e Martin-Achard(50). É uma resposta que os textos não fundam. Com efeito, nada neles sugere que a submissão à Babilónia seja 0 castigo da ruptura da aliança com lavé ou de qualquer outra falta de Judá. Semelhante interpretação fica até excluída pelo facto de que, segundo Jr 27,11, a submissão à Babilónia é uma obrigação de todos os po- vos e não só de Judá. Longe de ser um castigo, a submissão à Babi- lónia é a condição da paz e do bem-estar de todos os povos. Muito pelo contrário, é a recusa da submissão que constitui uma falta que lavé punirá severamente. Numa palavra, a submissão à Babilónia é, para Jeremias, uma decisão soberana de lavé para a qual não dá nenhuma razão.

Conclusões

Os tempos de Isaías e de Jeremias são semelhantes sob muitos pontos de vista. Judá estava em tempos de Isaías submetido à Assí- ria; no tempo de Jeremias, cerca de um século mais tarde, sob 0 domínio da outra grande potência mesopotâmica, a Babilónia, que entretanto tomara o lugar da Assíria. Nos dois casos Judá acariciava a esperança de sacudir 0 domínio estrangeiro, contando para isso com a aliança com 0 Egipto, a grande potência rival das «super- potências» mesopotâmicas.

Isaías e Jeremias têm muitas coisas em comum, a mais funda- mental sendo 0 facto de que ambos se apresentam como fiéis men- sageiros ou porta-vozes de lavé. Dizem 0 que lavé manda, com os meios da sua escolha e isso em todos os domínios. As posições que eles expressam em matéria de política internacional apresentam-se como sendo as posições do próprio lavé. Isaías e Jeremias reprovam ambos as alianças com 0 Egipto e com a Assíria. No livro de Jere­

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mias lê-se explicitamente essa condenação duas vezes (Jr 2, 18- -19.36-37). A condenação da aliança com 0 Egipto é frequente no livro de Isaías (Is 18,1-2.4; 20,1-6; 30,1-5; 31,1.3). Para Isaías a aliança com a Assíria devia ser tão condenável como a aliança com o Egipto. Ambos dão uma só razão, de ordem religiosa: as alianças equivalem a abandonar lavé. Jeremias só esboça essa razão (Jr 2,17-19). Na sua denúncia da aliança com 0 Egipto, Isaías desenvolve-a e tira dela as últimas consequências. Aliando-se com 0 Egipto, Judá substitui lavé pelo Egipto; escolhe 0 Egipto e a sua força militar para Deus.

Em contrapartida, Isaías e Jeremias têm posições diametralmente opostas relativamente à atitude a adoptar face à potência dominante. Com uma coerência sem falhas, Isaías quer a ruptura da aliança que submete Judá à Assíria. O seu desacordo com a política oficial de Jerusalém, pelo menos entre 705 e 701, incide unicamente nos meios para obter a libertação da tutela assíria. Ao passo que Isaías espera obtê-la «pela inactividade e pelo repouso, pela tranquilidade e pela calma» que decorrem da confiança absoluta em lavé, os políticos de Jerusalém pensam consegui-la pela força egípcia, pela sua própria cavalaria e pelo sistema defensivo de Jerusalém.

Não se sabe se Isaías era uma voz isolada ou se representa uma posição política partilhada por outros. Vistas a escassez de infor- mações e a distância temporal, é arriscado julgar o valor político da sua posição. No entanto, pode duvidar-se que o apelo à neutralidade aquando da guerra siro-efraimita fosse realista, pois é difícil imaginar que a Assíria permitisse a Judá ficar fora da sua alçada. A esperança de levar a bom termo a revolta contra a Assíria entre 705 e 701, sem recorrer aos meios militares nem estrangeiros nem próprios era total- mente utópica. A imagem que dão de Isaías os seus oráculos é a da testemunha de lavé, 0 «três vezes santo», que passou a vida a inter- vir na política de Judá em nome da sua experiência ou da sua intui- ção da soberania absoluta de lavé, realidade que não é do âmbito político. Em termos modernos, as posições de Isaías em matéria de política estrangeira e de defesa são totalmente ideológicas, de uma coerência implacável e de uma falta de realismo absoluta(51).

Não pode dizer-se 0 mesmo de Jeremias. Este não dá provas da mesma coerência que Isaías. A razão da oposição de Jeremias à aliança com o Egipto e a Assíria, que parece ser absoluta, curiosa- mente, não vale tratando-se da Babilónia. Muito pelo contrário, Judá como as demais nações deve submeter-se à Babilónia. Essa obriga- ção é tanto mais surpreendente que Jeremias não diz por que razão lavé a impôs. Na realidade, a posição de Jeremias representa uma das duas opções políticas então possíveis em Jerusalém. Muitos dos

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seus concidadãos fizeram a mesma escolha por realismo político. São os membros do chamado partido pró-babilónico, na oposição. Cons- cientes do desiquilíbrio das forças, militam pela submissão à Babilónia como um mal menor. Jeremias age e fala como um membro do par- tido pró-babilónico e toda a gente 0 considera como tal. Os membros desse partido colaboram(52) com ele e protegem-no, salvando-lhe a vida (Jr 26,24). Os seus adversários, aproveitando-se do facto de terem 0 poder, prendem-no por alta traição: passar ao inimigo (Jr 37, 11-16) ou desmoralizar as tropas (Jr 38,1-6), segundo 0 relato. Por fim, os Babilónios concedem-lhe um tratamento de favor, sem dúvida, pelos serviços prestados à sua causa.

Contrariamente à posição de Isaías cerca de um século antes, a posição de Jeremias era realista do ponto de vista político. A catás- trofe provocada pela revolta mostrou que ela era a opção correcta, ou seja a menos má. O realismo político coincidia assim com 0 que Jere- mias dizia ser a vontade de lavé. Segundo Jr 43,1-3, os que se refu- giaram no Egipto acusavam Jeremias de se opôr à sua diligência sob a instigação de Baruc, membro de uma grande família pró-babilónica. Jeremias ter-se-à assumido como um membro do partido pró-babiló- nico ou terá sido por ele instrumentalizado para dar à sua posição 0 aval divino? São perguntas a que não sei responder. Duvido que alguém saiba fazê-lo de maneira convincente.

Em contrapartida, parece-me certo que a comunidade judaica da Babilónia, formada sobretudo por membros do partido adverso, o par- tido anti-babilónico, se serviu do nome de Jeremias, após a morte dele. Para legitimar a sua supremacia em relação à comunidade da Palestina, de longe a mais numerosa, assim como à do Egipto, a comunidade da Babilónia e os seus herdeiros puseram na boca de Jeremias, porta-voz de lavé, uma parte da sua propaganda.

Lista de abreviações e siglas

BKAT - Biblischer Kommentar. Altes Testament, Neukirchen-Vluyn.BZAW - Beihefte zur Zeitschrift für die Alttestamentliche Wissenschaft, Berlin-New

York.

JNES - Journal of Near Eastern Studies, Chicago.

JSOT(.SS) - Journal for the Study of the Old Testament (Supplement Series), Sheffield.

RHPR - Revue d’Histoire et de Philosophie Religieuses, Strasbourg.

VT - Vetus Testamentum, Leiden..ZAW ^ïZeitschYtfV fiïr die Alttestamentliche Wissenschaft, Berlin-New York־

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Notas

(1) Texto retocado de uma conferência proferida no dia 31 de Março de 1998 na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

(2) L. RAM LOT, «Le prophétisme», Supplément au Dictionnaire de la Bible VIII, Paris, Letouzé & Ané, 1971, 1050-1099; B. ALBREKTSON, «Prophecy and Politics in the Old Testament», in H. BIEZAIS (ed.), The Myth of the State (Scripta Instituti Donneriani Aboensis VI), Stockholm, Almqvist & Wiksell International, 1972, 45-56.

(3) D. CHARPIN, F. JOANNES, Sylvie LACKENBACHER et B. LAFONT, Archives épistolaires de Mari 1/2 (Archives Royales de Mari XXVI), Paris, Recherche sur les Civilisations, 1988, 294-295; J. M. DURAND, Archives épistolaires de Mari 1/1 (Archives Royales de Mari XXVI), Paris, Recherche sur les Civilisations, 1988, 377-482; J. M. DURAND, «Le mythologème du combat entre le Dieu de l’orage et la Mer en Mésopotamie», MARI 7(1993) 43-46 (41-61).

(4) F. J. GONÇALVES, «Os videntes e os visionários no profetismo do Antigo Testamento», in Actas do Congresso Internacional de Fátima. Fenomenologia e Teologia das Aparições (9-12 de Outubro de 1997), Santuário de Fátima, 1998, 559-574; IDEM, «Les “prophètes écrivains” étaient-ils des ים יא ,«?נב in Michele DAVIAU and M. WEIGL (ed.), The World of the Aramaeans: biblical, historical and cultural studies in honour of Paul-E. Dion (JSOT. SS), Sheffield, Academic Press (no prelo).

(5) Ao passo que Jr 37-44 atribui um papel importante a Jeremias nos acontecimentos relativos à conquista do reino de Judá pela Babilónia, 2 R 24,18-25,30 e Jr 52 relatam esses mesmos acontecimentos sem mencionar Jeremias. Veja-se P. R. ACKROYD, «Historians and Prophets», Svensk Exegetisk Ársbok 33 (1968) 37-54 (18-54) = IDEM, Studies in the Religious Tradition of the Old Testament, London, SCM Press, 1987, 138-151 (121-151).

(6) F. WILKE, Jesaja und Assur. Eine exegetisch-historische Untersuchung zur Politik des Propheten Jesaja, Leipzig, Dietrich, 1905; J. KUECHLER, Die Stellung des Propheten Jesaja zur Politik seiner Zeit, Tübingen, 1906; W. DIETRICH, Jesaja und die Politik (Beiträge zur Evangelische Theologie 74) München, Kaiser, 1976; F. HUBER, Jahwe, Juda und die anderen Völker beim Propheten Jesaja (BZAW 137), Berlin-New York, Walter de Gruyter, 1976; J. H0GENHAVEN, «Prophecy and Propaganda. Aspects of Political and Religious Reasoning in Israel and the Ancient Near East», Scandinavian Journal of the Old Testament 1 (1989) 125-141; IDEM, «The Prophet Isaiah and Judaean Foreign Policy under Ahaz and Hezekiah», JNES 49 (1990) 351-354; F. J. GONÇALVES, «Os profetas hebraicos e a política do seu tempo: 0 caso de Isaías», Cadmo 2 (1992) 15-59.

(7) R. MARTIN-ACHARD, «Ésaïe et Jérémie aux prises avec les problèmes politiques. Contri- bution à l’étude du thème: Prophétie et politique», RHPR 47 (1967) 208-224; F. J. GONÇAL- VES, «Isaïe, Jérémie et la politique internationale de Juda», Biblica 76 (1995) 282-298.

(8) R. TOMES, «The Reason for the Syro-Ephraimite War», JSOT 59 (1993) 55-71, esboça a história desta hipótese e critica-a.

(9) J. BRIEND et M.־J. SEUX, Textes du Proche-Orient ancien et histoire d’Israël, Paris, Éd. du Cerf, 1977, 104-105.

(10) A respeito do período de Isaías, pode ver־se F. J. GONÇALVES, L’expédition de Sennachérib en Palestine dans la littérature hébraïque ancienne (Études Bibliques 7), Paris,

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Gabalda, 1986 = (Publications de l’institut Orientaliste de Louvain 34), Louvain־la־Neuve, Institut Orientaliste, 1986, 3-134.

(11) Talvez seja também esse 0 sentido do nome de Chear lachub (Um Resto Voltará), outro filho de Isaías (Is 7, 3); R. E. CLEMENTS, Isaiah 1-39 (New Century Bible), Grand Rapidsi/ London, Eerdmans/Marshall, Morgan & Scott, 1980, 83; J. DAY, «Shear-jashub (Isaiah vii 3) and ‘the remnant of wrath’ (Psalm Ixxvi 11)», VT 31 (1981) 76-78; J. H0GENHAVEN, «The Prophet Isaiah and Judaean Foreign Policy under Ahaz and Hezekiah», JNES 49 (1990) 352-353.

(12) J. BRIEND et M.-J. SEUX, Textes du Proche-Orient ancien, 113-116.

(13) Chamado Merodak-Baladan em 2 R 20,12-19 par. Is 39,1-8.

(14)D . D. LUCKENBILL, The Annals of Sennacherib (The University of Chicago Oriental Institute Publications II), Chicago, Illinois, The University of Chicago Press, 1924; J. BRIEND et M.-J. SEUX, Textes du Proche-Orient ancien, 118-126.

(15) Existe uma abundante bibliografia sobre as tradições bíblicas relativas aos acontecimen- tos de 701. Assinalo alguns dos estudos recentes: F. J. GONÇALVES, L’expédition de Sennachérib en Palestine, 135-544; IDEM, «Senaquerib na Palestina e a tradição bíblica. Da grande derrota de Judá à maravilhosa salvação de Jerusalém», in J. C. das NEVES, V. COLLADO BERTOMEU, V. VILAR HUESO (ed.), Ill Simposio Bíblico Espanol (I Luso- Espanhol), Valencia, Fundación Bíblica Espanola/Lisboa, Publicações da Universidade Cató- lica Portuguesa, 1991, pp. 203-230 = Didaskalia 20 (1990) 5-32; IDEM, «2 Rois 18,13-20,19 par. Isaïe 36-39. Encore une fois, lequel des deux livres est le premier ?», in J.-M. AUWERS et A. WÉNIN (ed.), Lectures et relectures de la Bible. Festschrift P .-M. Bogaert (Bibliotheca Ephemeridum Theologicarum Lovaniensium 144), Leuven, University Press, 1999, 27-55; E. VOGT, Der Aufstand Hiskias und die Belagerung Jerusalems 701 v. Chr. (Analecta Biblica 106), Rome, Biblical Institute Press, 1986; G. W. VERA CHAMAZA, Hizkijjahu rey de Judá. Interpretación y reconstrucción de las narraciones de Ezequias (Institución San Jerônimo 20), Valencia, 1988: L. CAMP, Hiskija und Hiskijabild. Analyse und Interpretation von 2 Kön 18-20 (Münsteraner Theologische Abhandlungen 9), Altenberge, Telos Verlag, 1990; C. HARDMEIER, Prophetie im Streit vor dem Untergang Judas. Erzählkommunikative Studien zur Entstehungssituation der Jesaja- und Jeremiaerzählungen in II Reg 18-20 und Jer 37-40 (BZAW 187), Berlin/New York, Walter de Gruyter, 1990; C. R. SEITZ, Zion’s Final Destiny. The Development of the Book of Isaiah. A reassessment of Isaiah 36-39, Minneapolis, Fortress Press, 1991.

H K. ELLIGER, «Prophet und Politik», ZAW 53 (1935) 17 (3-22); R. MARTIN-ACHARD, «Ésaïe et Jérémie...», RHPR 47 (1967) 208-218; W. DIETRICH, Jesaja und die Politik, 133, 222, 266; J. VERMEYLEN, Du prophète Isaïe à l ’apocalyptique. Isaïe l-XXXV, miroir d’un demi-millénaire d’expérience religieuse en Israël, I (Études Bibliques), Paris, Gabalda, 1977, 318; H. WILDBERGER, Jesaja. 3. Teilband Jesaja 28-39. Das Buch, der Prophet und seine Botschaft (BKAT X/3), Neukirchen-Vluyn, Neukirchener Verlag, 1982, 1185. H. DONNER, Israel unter den Völkern. Die Stellung der klassischen Propheten des 8. Jahrhunderts v. Chr. zur Aussenpolitik der Könige von Israel und Juda (Supplements to VT 11), Leiden, Brill, 1964, 169-172, usa o termo “Neutralität” , mas, de facto, fala da submissão à Assíria para evitar 0 pior, isto é, a extinção do reino de Judá e a anexação do seu território pela Assíria.

(17) R. KITTEL, Geschichte des Volkes Israel, II, Stuttgart, W. Kohlhammer, 1917, 558; O. EISSFELDT, «Nüah, “sich vertragen”», in Kleine Schriften III, Tübingen, J. C. B. Mohr (Paul Siebeck), 1966, 124-128; N. K. GOTTWALD, All the Kingdoms of the Earth. Israelite Prophecy and International Relations in the Ancient Near East, New York, Harper & Row,

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FRANCOLINO GONÇALVES

1964, 147-208; G. FOHRER, Das Buch Jesaja, II (Zürcher Bibelkommentare), Zürich/ Stuttgart, Zwingli Verlag, 19672, 101-102; J. D. W. WATTS, Isaiah 1-33 (Word Biblical Commentary 24), Waco, Texas, Word Books, 1985, xxvii, 78, 93, 117-118, 286, 397; IDEM, Isaiah 34-66 (Word Biblical Commentary 25), Waco, Texas, Word Books, 1987, 30.

(18) H. DONNER, Israel unter den Völkern, 169-172.

H H. DONNER, ibidem.

(20) H. H. ROWLEY, «Hezekiah’s Reform and Rebellion», Bulletin of the John Rylands Library 44 (1962) 422-423 (395-431); G. C. I. WONG, «Isaiah’s Opposition to Egypt in Isaiah XXXI 1-3», VT 46 (1996) 392-401.

(21) M. GRANT, The History of Ancient Israel, New York, Charles Schribner’s Sons, 1984, 150.

(22) É a impressão que dão, por exemplo, os estudos recentes de J. H0GENHAVEN, «Prophecy and Propaganda», Scandinavian Journal of the Old Testament 1 (1989) 125-141; IDEM, «The Prophet Isaiah and Judaean Foreign Policy...», JNES 49 (1990) 351-354.

(23) Podem ver־se as justificações em F. J. GONÇALVES, L’expédition de Sennachérib en Palestine, 166-178.

(24) Dt 33,29; Za 9,9; SI 33,16.

(25) Dt 20,4; Jz 7,2.7; 1 S 14,6.23.39; 17,47; 1 Cr 11,14; SI 20,7; 44,4.7.8.

(26) 2 S 8,6.14; 1 Cr 18,6.13.

(27) SI 20,7.

(28) Ex 14,13; 15,2; 1 S 14,45; Is 12,2; Ha 3,8; SI 18,51 = 2 S 22, 51; SI 20,6; 21,2.6; 44, 5; 118,14.15.21; 2 Cr 20,17.

(29)Jz 15,18; 1 S 11,13; 19,5; 2 S 19,3; 23,10.12; 2 R 5,1; 13,17; SI 33, 17; 144,10; Pr 21,31; 1 Cr 11, 14.

(30) W. ZIMMERLI, «Jesaja und Hiskia», in H. GESE und P. RÜGER (ed.), Wort und Geschichte. Festschrift für Karl Eiliger (Alter Orient und Altes Testament 18), Kevelaer, Verlag Butzon & Bercker /Neukirchen-Vluyn, Neukirchener Verlag, 1973, 109-208, foi, que eu saiba, 0 único autor a sugerir que Isaías era partidário da revolta anti-assíria, ou talvez mesmo um dos seus inspiradores. No entanto, este exegeta apoia-se em considerações diferentes das minhas. Com efeito, parte do facto de que o plano de lavé previa a destrui- ção da Assíria no país de Judá (Is 14,24-27). Para que esse plano pudesse realizar-se, era preciso atrair a Assíria a Judá, 0 que a revolta faria com toda a certeza.

(31) F. J. GONÇALVES, L’expédition de Sennachérib en Palestine, 178-187 e 235-255.

(32) A opinião de G. BRUNET, Essai sur l ’Isaïe de l’histoire. Étude de quelques textes notamment Isaïe VII, VIII & XXII, Paris, A. et J. Picard, 1975, segundo a qual Isaías se opunha às alianças em nome de um nacionalismo isolacionista não tem qualquer apoio nos textos.

(33) SI 89,11; Is 51,9; Job 9,12; 16,12.

(34) É, no entanto, gratuito supor que Isaías se opunha às alianças com os povos em nome da aliança com lavé, como faz, por exemplo, R. MARTIN-ACHARD, «Ésaïe et Jérémie»,

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ISAÍAS E JEREMIAS

212-218 - essa noção não estando documentada no livro de Isaías - ou por medo das influências religiosas, designadamente por medo do reconhecimento dos deuses estrangei- ros que a aliança talvez comportasse, como faz J. BRIGHT, A History of Israel, Philadelphia, Westminster Press, 31981, 292-293.

(35) A opinião de G. BRUNET, Essai sur l ’Isaïe de l’histoire, segundo a qual Isaías seria partidário da «solution du rempart» e se oporia só à guerra ofensiva e ao combate em campo aberto não tem fundamento nos textos.

(36) H. CAZELLES, «La vie de Jérémie dans son contexte national et international», in P.-M. BOGAERT (ed.), Le livre de Jérémie. Le prophète et son milieu. Les oracles et leur transmission (Bibliotheca Ephemeridum Theologicarum Lovaniensium 54), Leuven, University Press (1981), Nouvelle édition mise à jour, 1997, 21-39 e 418-422.

(37) A. MALAMAT, «The Kingdom of Judah between Egypt and Babylon: A Small State within a Great Power Confrontation», in W. CLAASSEN (ed.), Text and Context. Old Testament and Semitic Studies for F. C. Fensham (JSOT.SS 48), Sheffield, JSOT Press, 1988, 117-129; F. J. GONÇALVES, «El “destierro”. Consideraciones históricas», Estúdios Bíblicos 55 (1997) 431-461.

(38) A cronologia dos acontecimentos relativos à segunda conquista babilónica de Jerusalém é uma questão controversa. H. CAZELLES, «587 ou 586?», in Carol L. MEYERS and M. O’CONNOR (ed.), The Word of the Lord Shall Go Forth. Essays in Honor of David Noel Freedman (American Schools of Oriental Research. Special Volume Series 1), Winona Lake, Indiana, Eisenbrauns, 1983, 427-435.

(39) S. HERRMANN, Jeremia (BKAT XX/2), Neukirchen-Vluyn, Neukirchener Verlag, veja- -se 134-136.

(40) Isolados por B. Duhm e chamados a fonte B por S. Mowinckel, os relatos de Jr 19-20; 26-45 e 51, 59-64 foram objecto de numerosos estudos. Assinalo só alguns. B. DUHM, Das Buch Jeremia (Kurzer Hand-Commentar zum AT XI), Tübingen und Leipzig, J. C. B. Mohr, 1901, xi-xx; S. MOWINCKEL, Zur Komposition des Buches Jeremia, Kristiania, Jacob Dybwad, 1914; G. WANKE, Untersuchungen zur sogennanten Baruchschrift (BZAW 122), Berlin, W alter de Gruyter, 1971; N. LOHFINK, «Die Gattung der “ H istorischen Kurzgeschichte” in den letzten Jahren von Juda und in der Zeit des Babylonischen Exils», ZAW 90 (1978) 319-347; K.-F. POHLMANN, Studien zum Jeremiabuch. Ein Beitrag zur Frage nach der Entstehung des Jeremiabuches (Forschungen zur Religion und Literatur des Alten und Neuen Testaments 118), Göttingen, Vandenhoeck & Ruprecht, 1978; H. MIGSCH, Gottes Wort über das Ende Jerusalems. Eine literar- stil- und gattungskritische Untersuchung des Berichtes Jeremia 34, 1-7; 32, 2-5; 37, 3-38, 28 (Österreichische Biblische Studien 2), Klosterneuburg, Österreichisches Katholisches Bibelwerk, 1981; C. R. SEITZ, Theology in Conflict. Reactions to the Exile in the Book of Jeremiah (BZAW 176), Berlin/New York, Walter de Gruyter, 1989); C. HARDMEIER, Prophetie im Streit vor dem Untergang Judas (n. 15); A. GRAUPNER, Auftrag und Geschick des Propheten Jeremia. Literarische Eigenart, Herkunft und Intention vordeuteronomistischer Prosa im Jeremiabuch (Biblisch-Theologische Studien 15), Neurkirchen-Vluyn, Neukirchener Verlag, 1991; H.-J. STIPP, Jeremia im Parteienstreit. Studien zur Textentwicklung von Jer 26, 36-43 und 45 als Beitrag zur Geschichte Jeremias, seines Buches und judäischer Parteien im 6. Jahrhundert (Athenäums Monografien: Theologie - Bonner Biblische Beiträge 82), Frankfurt a. M., Anton Hain, 1992; W. MCKANE, A Critical and Exegetical Commentary. Volume II. Commentary on Jeremiah XXVI-LII (The International Critical Commentary), Edinburgh, T. & T. Clark, 1996, cxxxiii-clvi.

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FRANCOLINO GONÇALVES

(41) Admite-se comummente que a acção simbólica relatada por esses versículos constitui 0 núcleo primitivo do capítulo.

(42) No grego. No hebraico lê-se «cidade», em vez de «país».

(43)Pensa-se geralmente que Jr 21,1-10 é secundário. W. McKANE, A Criticai and Exegetical Commentary on Jeremiah. I. Introduction and Commentary on Jeremiah l-XXV (International Critical Commentary), Edinburgh, T & T Clark, 1986, 491-506.

(44) Ausentes do grego, os vv. 11-13 são provavelmente secundários.

(45) N. LOHFINK, «Die Gattung...», ZAW 90 (1978) 319-347.

(46) H.-J. STIPP, Jeremia im Parteienstreit, 130-284.

(47) K.-F. POHLMANN, Studien zum Jeremiabuch, 183-197.

(48) R. P. CAR ROLL, The Book of Jeremiah. A Commentary (Old Testament Library), London, SCM Press, 1986, 670.

(49) Veja-se J. H. Le ROUX, «In Search of Carroll’s Jeremiah», Old Testament Essays 7(1994) 60-90.

(50) J. BRIGHT, Jeremiah (Anchor Bible 21), Garden City, NY, Doubleday, 1965, ci e cix; R. MARTIN-ACHARD, «Ésaïe et Jérémie...», RHPR 47 (1967) 222.

(51) Os que qualificam de utópica a política dos «profetas clássicos» têm razão no que diz respeito às tomadas de posição de Isaías em questões de política de defesa e de política internacional; veja-se 0 estado da questão dado por B. ALBREKTSON, «Prophecy and Politics in the Old Testament», 45-56.

(52) Baruc, da família de Mahseiah, é 0 colaborador de Jeremias (Jr 32,12; 36,1-32; 43,1-3; 45,1-5). Lê 0 rolo na sala de Guemaryahu, filho de Chafan (Jr 36,10). Guemaryahu é um dos dignitários que tentam dissuadir 0 rei de queimar 0 rolo (Jr 36,25). O seu filho, Mikayehu, informa os dignitários do teor do rolo (Jr 36, 11-13). Elasa, outro filho de Chafan, é um dos portadores da carta que Jeremias envia aos exilados (Jr 29,3).

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