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Volume 5 n o 2 1 A NOÇÃO DE ROSTO EM EMMANUEL LÉVINAS Rubens Machado 1 Matêus Ramos 2 Resumo: Lévinas argumenta que existem realidades que escapam ao poder totalizante da razão e seu poder constituinte. É o caso, por exemplo, do rosto do outro homem. O rosto do outro homem adquire, assim, um lugar central no nosso autor, pois, é o lugar mesmo da verdade; verdade esta não mais teórica, mas verdade ética, ou metafísica já que o rosto não se presta a objetivação, seja do desvelamento seja da adequação. Esta verdade ética se torna possível se tomarmos em consideração que o rosto é a expressão da singularidade, do indivíduo, único a existir; singularidade esta que se torna possível se a considerarmos como separada da totalidade. Palavras-Chave: Lévinas. Razão. Rosto. Verdade.Singularidade. Totalidade. The concept of face in of Emmanuel Lévinas Abstract: Lévinas argues that there are realities that escape the totalizing power of reason and its constituent power. This is the case, for example, the face of the other man. The other man's face thus acquires a central place in our author, therefore, it is the very place of truth; this fact no longer theoretical but ethical truth, metaphysical or as the face does not lend itself to objectification, is the unveiling is appropriateness. This ethic is possible true if we take into account that the face is the expression of the uniqueness of the individual, only to exist; this uniqueness that it is possible to consider like separate of totality. Key-Words: Lévinas. Reason. Face. Singularity. Totality. Uniqueness. 1 Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria-RS.Professor de Filosofia e Sociologia na Escola Estadual de Ensino Médio Visconde de Mauá, Butiá-RS. E-mail: [email protected] 2 Especialista em Ética e Ciências da Religião. Pós-Graduando em Antropologia e Sociologia. E-mail [email protected]

A NOÇÃO DE ROSTO EM EMMANUEL LÉVINASrevistalampejo.org/edicoes/edicao-10/Artigo_A_Nocao_de...originária. Esta experiência que Levinas repete, demasiadamente seria a proximidade

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

    Volume 5 no 2 1

    A NOO DE ROSTO EM

    EMMANUEL LVINAS

    Rubens Machado1

    Matus Ramos 2

    Resumo: Lvinas argumenta que existem realidades que escapam ao poder totalizante da razo e

    seu poder constituinte. o caso, por exemplo, do rosto do outro homem. O rosto do outro

    homem adquire, assim, um lugar central no nosso autor, pois, o lugar mesmo da verdade;

    verdade esta no mais terica, mas verdade tica, ou metafsica j que o rosto no se presta a

    objetivao, seja do desvelamento seja da adequao. Esta verdade tica se torna possvel se

    tomarmos em considerao que o rosto a expresso da singularidade, do indivduo, nico a

    existir; singularidade esta que se torna possvel se a considerarmos como separada da totalidade.

    Palavras-Chave: Lvinas. Razo. Rosto. Verdade.Singularidade. Totalidade.

    The concept of face in of Emmanuel Lvinas

    Abstract: Lvinas argues that there are realities that escape the totalizing power of reason and its

    constituent power. This is the case, for example, the face of the other man. The other man's face

    thus acquires a central place in our author, therefore, it is the very place of truth; this fact no

    longer theoretical but ethical truth, metaphysical or as the face does not lend itself to

    objectification, is the unveiling is appropriateness. This ethic is possible true if we take into

    account that the face is the expression of the uniqueness of the individual, only to exist; this

    uniqueness that it is possible to consider like separate of totality.

    Key-Words: Lvinas. Reason. Face. Singularity. Totality. Uniqueness.

    1 Mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Santa Maria-RS.Professor de Filosofia e Sociologia na Escola Estadual de Ensino Mdio Visconde de Mau, Buti-RS. E-mail: [email protected]

    2 Especialista em tica e Cincias da Religio. Ps-Graduando em Antropologia e Sociologia. E-mail [email protected]

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

    Volume 5 no 2 2

    Introduo

    mmanuel Lvinas nasceu em Kovno, Litunia em 1906. Em 1923 vai para a

    Frana estudar Filosofia em Estrasburgo e conhece Maurice Blanchot, que ser

    seu amigo. Nos anos de 1928 e 1929 vai para Friburgo estudar com Husserl.

    Assiste ao seminrio de Heidegger e participa do famoso encontro de Davos entre

    Heidegger e Cassirer sobre Kant. Em 1930, com apenas 24 anos, publica sua tese de

    doutorado: Thorie de lintuition dans la phnomnologiede Husserl. Com este trabalho

    Lvinas adere Fenomenologia e introduz esta na Frana. Afilosofia, desde sua origem

    supostamente na Grcia recebe de Lvinas uma interpretao aguda. Por vezes feroz. A

    ideia de universalidade em que o formalismo a sua maior expresso combatida por

    nosso autor porque essa universalidade apagou da cena a concretude do ente humano na

    sua singularidade a insistncia na singularidade rendeu filosofia de Lvinas o ttulo de

    empirismo; porm, ele tambm descreve uma universalidade: o rosto do outro homem,

    que no da ordem emprica ; singularidade esta que pode ser verificada no amor e

    tambm no dio, no nome e no apelido. Afinal, a quem amamos?Um universal?

    lamore d accesso allunicit. Lindividuo nico amato (LVINAS; RICUR, 1998,

    p. 78) A quem odiamos? Um universal? A quem estendemos a mo... Quem nos

    estende a mo quando estendemos ou quando nos estendida? Numa palavra: um

    conceito universal abstrato? A quem perdoamos quando perdoamos? A quem

    culpamos quando culpamos? este quem (qui) mais do que o qu (quoi) ou o como

    (comme) Lvinas no faz uma filosofia do mtodo, apenas se utiliza de um mtodo para

    fazer filosofia; mtodo este que a fenomenologia que interessa a Lvinas, ainda que a

    sua filosofia tenha encontrado na fenomenologia objeto e mtodo; objeto que se viu

    depois no se tratar de um objeto, porm, o sujeito ou subjetividade. E por isso a sua

    filosofia chamada de tica; afinal, acaso um conceito morre ou mata? Nos

    comportamos com conceitos quando operamos no dito, contudo nos comportamos com

    pessoas quando operamos no dizer. Se a diferena entre ser e ente a diferena

    ontolgica, a diferena entre dizer e dito a diferena tica, ou a no.

    A filosofia de Lvinas se caracteriza por um dilogo constante com a tradio.

    Porm, este dilogo marcado por uma tenso, por uma tentativa de superao de uma

    filosofia que, nas suas palavras, dominada por um clima ontolgico. Este clima

    expresso na noo de saber, conhecimento, tematizao. Talvez Lvinas no tenha

    defendido seno uma nica tese: a necessidade de sair do ser, da ontologia que tambm

    chamada por ele de guerra.

    Lvinas anuncia a sua filosofia comprometida com ahospitalidade, com o

    acolhimento do Outro. Contudo, no se trata de boa vontade. O Outro enquanto Outro,

    expresso consagrada por Lvinas em oposio ao ser enquanto ser , resiste aos

    poderes de uma filosofia totalizante; no se trata de opo ideolgica ou de preferncia

    pessoal. O que ocorre que Outrem no afeito a uma abordagem terica; Outrem no

    objeto; a presena do Outro sua exigncia tica (SOUZA, 2004, p. 175).

    E

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

    Volume 5 no 2 3

    A vida interior, cuja expresso o rosto ou a palavra do Outro s pode ser

    acolhida, recebida; no compete ao Eu descrever esta vida interior cujo modo de ser

    consiste precisamente em no se deixar desvelar: a sua verdade o seu ocultamento, seu

    velamento ao ser descobridor. Este o ponto de ruptura com a filosofia do Todo e o ponto

    problemtico da filosofia de Lvinas que quer ser filosofia da pluralidade. O conceito de

    plural se levado s ltimas consequncias nos conduz ideia de Infinito; ou melhor, a

    ideia de Infinito em ns que nos conduz filosofia plural porque o Outro, na epifania do

    seu rosto, escapa a todo instante aos poderes objetivantes do Mesmo, ao conceito,

    definio que seria seu fim como Outro.

    Nesta pesquisa, propomos-nos, tendo como fio condutor da pesquisa a noo de

    rosto, apresentar o conceito de separao (sparation), pois, sem separao, nos diz

    Lvinas, no teria havido verdade,apenas teria havido ser (LVINAS, 1980, p. 48).

    Rosto e Enigma

    A noo de rosto na filosofia de Lvinas aparece aps um perodo de maturao;

    no se trata, portanto, de uma teleologia, que o conduziria a formulao da tica como

    filosofia primeira ou escatologia ou conscincia moral. Dizemos isso porque algumas

    caractersticas que identificamos nessa noo j se apresentam nos seus primeiros textos

    e at mesmo na sua obra Thorie de lintuition dans la phnomnologie de Husserl, de

    19303. Como Lvinas mesmo nos adverte, no nessa obra o lugar para uma crtica mais

    sistemtica a algumas posies da filosofia de seu mestre. Porm, encontramos

    indicaes de quando e onde Lvinas se afasta de seu mestre e por qu. Nesse sentido, o

    que mais incomoda Lvinas na obra de Husserl o que ele chama intelectualismo:

    Em sua filosofia (e aqui onde nos separamos de sua proposta), o conhecimento

    e a representao no so modos de vida no mesmo grau que os outros; tampouco so um

    modo secundrio. A teoria e a representao jogam um papel preponderante na vida;

    servem de base a toda a vida consciente, so a forma de intencionalidade que assegura o

    fundamento de todas as demais (LVINAS, 2004, p. 81).

    Aqui Lvinas apresenta no s os pontos discordantes do seu pensamento com o

    do seu mestre Husserl como tambm aponta o rumo que pretende dar ao seu. Os modos

    de vida que Lvinas vai dar nfase dizem respeito volio, ao sentimento, tica, modos

    de vida que no so conhecimento, ou outro modo de conhecimento. O que nosso autor

    no aceita em Husserl que esses modos de vida tm seu fundamento na

    intencionalidade terica e na representao. No entanto nosso autor encontra, ainda em

    Husserl, o que ele chama intencionalidade axiolgica, irredutvel ao conhecimento e

    3 Para esta dissertao utilizaremos: LEVINAS, Emmanuel. La teora fenomenolgica de la intuicin. Traduo Tania Checchi, Salamanca, Ediciones Sgueme, 2004.

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

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    que pode ser buscada na relao com o Outro e que se constitui como que o norte da sua

    obra, pois o mundo e sua constituio no o domnio das meditaes de Lvinas e sim o

    homem e seu destino e neste sentido que podemos dizer que a sua filosofia se constitui

    como metafsica da alteridade (SOUZA, 2007, resumo).

    A obra Totalidade e Infinito considerada a primeira grande obra de Lvinas e

    exatamente nesta obra onde o tema do rosto tem um destaque central. Se a verdade

    mantm algum nexo com o discurso, ento o rosto o lugar mesmo da verdade, pois,

    para Lvinas, o rosto fala, significao. mais: significao sem contexto O rosto

    significao, e significao sem contexto. Ele o que no se pode transformar num

    contedo, que o nosso pensamento abarcaria; o incontvel, leva-nos alm (LVINAS,

    1982, p. 78); o rosto significa a partir de si mesmo a sua significao precede

    Sinngebung (LVINAS, 1980, p. 240, grifo do autor); significao sem signo e, nesse

    sentido, a condio mesma da verdade.

    A noo de rosto em nosso autor no tal que no carea de maiores

    esclarecimentos. Pelo contrrio. Encontramo-nos em apuros aqui. Do que Lvinas quer

    nos falar atravs dessa noo? Uma primeira interpretao indicaria a inteno de

    constituir sua tica; por outro lado, Lvinas mesmo diz, ele busca o sentido: A minha

    tarefa no consiste em construir a tica; procuro apenas encontrar-lhe o sentido

    (LVINAS, 1982, p. 82). Portanto, a noo de rosto entendida como abertura para o

    Infinito seria o lugar mesmo dessa inteno tica. Porm, convm antecipar, no temos a

    pretenso de resolver essa questo, mas to somente procurar elucidar ou quem sabe

    apontar alguma possibilidade de leitura. O estudioso levinasiano David Sebbah

    considera essa noo como aquela que designa o aspecto mais genuno e a intensidade

    do pensamento levinasiano, o ponto em que se comprime, de forma tensionada, toda a

    extenso do que pensado por ele (SEBBAH, 2009, p. 43). Isso porque, o rosto de

    Outrem trs sempre uma novidade, algo no pensado (ainda). Convm lembrar que o

    desconhecido vem de fora, exterior, estrangeiro e me trs algo que eu no possua. Pode

    ser um ensinamento; precisamente ensinamento de seu rosto. Contudo, devemos atentar

    para esse encontro entre Eu (Mesmo), em minha casa, no meu trabalho e esse Outro

    (rosto) que toca minha campainha. Como poderamos descrever esse encontro? Lvinas

    o chama frente afrente (face--face) , ou ainda relao tica (LVINAS, 2012, p.71)

    que dirige-se ao ser na sua exterioridade absoluta e cumpre a prpria inteno que

    anima a caminhada para a verdade (...) este dizer a Outrem esta relao com Outrem

    como interlocutor, esta relao com um ente precede toda a ontologia, a relao

    ltima no ser. A ontologia supe a metafsica (LVINAS, 1980, p. 34-35, grifos do

    autor):

    Para Levinas face a face a linguagem, o primordial, a experincia originria

    do inter-humano, quer dizer, do humano: a posteriori na funo a priori. Experincia

    originria. Esta experincia que Levinas repete, demasiadamente seria a proximidade

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

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    tica com o Outro, de nudez sem mscara. Neste sentido, .4

    Convm, aqui, ressaltar o seguinte: a relao frente a frente se d entre singulares,

    entre entes, pois, Lvinas no faz uma filosofia terica onde o sujeito permanece em si; na

    relao frente a frente, ou justia, h questo e resposta e por isso chamada relao tica.

    verdade que o Mesmo carrega todo o peso da ontologia: O homem inteiro ontologia

    (LVINAS, 2009, p. 22), porm a relao com outrem no ontologia (LVINAS,

    2009, p. 29). A relao com outrem enquanto experincia moral concreta o que me

    permito exigir de mim prprio no se compara ao que tenho direito de exigir de Outrem

    (LVINAS, 1980, p. 41) uma relao com o rosto, este rosto (singular, que posso

    querer matar): A relao com o rosto, acontecimento da coletividade a palavra-

    relao com o prprio ente, enquanto puro ente. (...) O ente como tal (e no como

    encarnao do ser universal) o homem (...) enquanto rosto. (LVINAS, 2009, p. 32).

    A experincia do rosto a nica experincia que permite ao sujeito sair de si

    mesmo e da totalidade, pois o rosto inquietude. a possibilidade para o homem poder

    ser ensinado, de receber um ensinamento do exterior. O rosto remete para uma verdade

    mais antiga do que a ontologia, a um passado que nunca foi presente: O rosto est

    presente na sua recusa de ser contedo. Neste sentido, no poder ser compreendido,

    isto , englobado. Nem visto, nem tocado- porque na sensao visual ou tctil, a

    identidade do eu implica a alteridade do objeto que precisamente se torna contedo

    (LVINAS, 1980, p. 173).

    O rosto, portanto, outro de uma alteridade absoluta no pertencendo

    comunidade do gnero ou das espcies; ele no se presta ao conhecimento o rosto no

    do mundo ele rasga o sensvel (LVINAS, 1980, p. 177). O saber enquanto

    sincronizao de toda alteridade num presente (no ser, no ), na presena (passado e

    futuro so reunidos num presente eterno e total e, portanto, finito) esquece a alteridade

    do rosto enquanto ensino e questionamento. Outrem o mestre que fala e a quem

    escutamos. Nesse sentido, nos diz Lvinas: O ensino uma maneira para a verdade se

    produzir de forma que no seja obra minha, que eu no a possa manter a partir da minha

    interioridade (LVINAS, 1980, p. 275). A verdade, nesse sentido, me vem de fora, de

    Outrem, em dois sentidos: de Outrem, enquanto o Mestre e que me trs ensinamento e

    como tal condio da verdade e de Outrem enquanto verdade mesma, como o que

    excede, ultrapassa e escapa a toda determinao, a toda ordenao ordem do ser,

    daquilo que . A verdade do rosto da ordem da resistncia, resistncia tica aos poderes

    do Mesmo. Tais reflexes, nos diz Souza acabam por conduzir possibilidade de uma

    concepo diferente de verdade. No a verdade como adequao do intelecto e da coisa,

    4 GRZIBOWSKI, Silvestre. Transcendncia e tica. Um estudo a partir de Emmanuel Levinas. So Leolpoldo: Oikos, 2010, p. 56, grifo do autor. Consoante s palavras de Grzibowski encontramos em Kovac (KOVAC, 1993, p. 185) uma interpretao importante da relao ao rosto de Outrem. Segundo Kovac Levinas encontra no rosto de Outrem o prprio comeo (commecement/ arch) da filosofia como tica. A possibilidade de pensar esta exterioridade do pensamento pelo encontro do roso de Outrem. A relao frente a frente como evento inaugural da filosofia tambm destacado por Petitdemange (1993, p. 338) quando a considera linteligible premier.

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

    Volume 5 no 2 6

    tambm no no sentido de A-ltheia: a verdade em sentido tico a irredutvel

    inadaequatio rei (a Alteridade doOutro) et intellectus (a dinmica da Totalidade). A

    verdade o desafio tico doOlhar do Outro, em originariedade irredutvel, e a tentativa de

    corresponder a esse desafio de maneira justa (SOUZA, 1999, p. 142, grifo do autor).

    Esta nova verdade nova porque no se trata de pensar a noo de verdade a

    partir da perspectiva terica , se deve ao que Lvinas chama assimetria entre o Mesmo e

    o Outrem e impossibilidade de categorizao do Outro pelo Mesmo haja vista que ele

    prope a relao a partir da ideia de Infinito, inadequao por excelncia. E no h o que

    desvelar porque Outrem est nu na expresso do seu rosto restando, ento, a justia, que

    acolhimento de frente no discurso. preciso considerar, tambm, que a verdade se

    diz a algum, o interlocutor neste sentido, um dizer a..., pois no h seno discursos

    de homens entre si ou como nos diz Lvinas: Para procurar a verdade, j mantive uma

    relao com um rosto que pode garantir-se a si prprio, cuja epifania tambm , de algum

    modo, uma palavra de honra. Toda a linguagem, como troca de signos verbais, se refere

    j palavra de honra original (LVINAS, 1980, p. 181).

    A palavra de honra um juramento (juro dizer a verdade), um compromisso,

    uma responsabilidade para com o Outro e esta responsabilidade no da ordem terica.

    O dizer ou o enunciar no implica, necessariamente, um que fala (e escuta) e outro que

    escuta (e fala)? E ser que todo enunciado redutvel ao modo predicativo? Um isto

    enquanto aquilo, ou isto como aquilo? Estas so questes que nos parecem importantes e

    que se relacionam diretamente com a questo a verdade supe a justia.

    O que podemos verificar, fazendo a leitura da obra Totalidade e Infinito, que

    Lvinas trata de uma relao. A relao de que trata Lvinas no pode ser classificada

    como do tipo sujeito/objeto, que caracteriza, por exemplo, a relao de conhecimento. O

    que Lvinas caracteriza como princpio, como o ponto a partir do qual se inaugura a

    filosofia a postura de deixar o outro ser o outro.Assim, no h uma objetivao

    daquele que se manifesta. A tica, ento, o comeo; a preservao do particular por e

    para outrem.

    Rosto e Vestgio

    Lvinas utiliza algumas imagens quando quer falar do rosto. Uma das imagens

    utilizadas por ele a da caa. O caador procura sua presa pelas marcas (vestgios)

    deixadas pela caa. A caa no est ali, esteve ali. J no est mais. Aquela marca j um

    passado, marca de um passado que no foi presente para mim. O rosto nunca se d numa

    presena. Nesse sentido, ele no fenmeno. Lvinas reserva a palavra enigma para

    descrev-lo. E essa a sua verdade: Essa porta simultaneamente aberta e fechada a

    extraordinria duplicidade do Enigma (LVINAS, s/d, p. 259); porta aberta que pode

    significar ensino, o Mestre; porta fechada que designa o inabarcvel, no-englobvel e

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

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    nesse sentido resistncia tica e do nico (...); o rosto como ser-a concreto do nico. O

    nico que no pode ser capturado porque j est ausente. Nesse sentido, o rosto jamais

    entra no registro do ser, sempre fugidio, no se deixa apreender em um presente. O rosto

    uma presena ausente ou uma ausncia presente, um outro modo que ser:

    O modo como o Outro se apresenta, ultrapassando a ideia do Outro em mim,

    chamamo-lo, de fato, rosto. Esta maneira no consiste em figurar como tema sob o meu

    olhar, em expor-se como um conjunto de qualidades que formam uma imagem. O rosto

    de Outrem destri em cada instante e ultrapassa a imagem plstica que ele me deixa, a

    ideia minha medida e medida do seu ideatum- a ideia adequada. No se manifesta por

    essas qualidades, mas . Exprime-se. O rosto, contra a ontologia contempornea, traz

    uma noo de verdade que no o desvelamento de um Neutro impessoal, mas uma

    expresso: o ente atravessa todos os invlucros e generalidades do ser, para expor na sua

    forma a totalidade do seu contedo, para eliminar, no fim de contas, a distino de

    forma e contedo (...). A condio da verdade e do erro teortico a palavra do Outro a

    sua expresso que qualquer mensagem j supe (LVINAS, 1980, p. 37-38, grifos do

    autor).

    Assim, o rosto de Outrem que me conduz alm (e nesse sentido que ele

    metafsico- grifo nosso), no tematizvel. No se trata de uma fenomenologia do

    rostohumano; o rosto no sentido levinasiano no descritvel (encontramos aqui o limite

    da fenomenologia husserliana, particularmente do conceito de intencionalidade que era

    to cara para Lvinas?). o rosto que me revela e que provoca em mim o comeo da

    filosofia, a tica. No que o rosto paralisa meus poderes [constituintes], mas paralisa o

    prprio poder de poder (...). Na contextura do mundo, ele no quase nada. Mas pode

    opor-me uma luta, isto , opor a fora que o ataca, no uma fora de resistncia, mas

    prpria imprevisibilidade da sua reao (LVINAS, 1980, p. 177).

    Quando Lvinas nos diz que a primeira palavra do rosto no matars, ele abre

    aqui uma multiplicidade de interpretaes (sentido). A primeira nos oferecida por

    Lvinas mesmo, de modo enftico, e significa: tu fars tudo para que ele (Outrem) viva e

    com essas palavras se abre a dimenso da bondade e a bondade, ou a ideia do Bem, nos

    remete ideia do Infinito, pois, o Bem infinito e infinito porque Desejo (Desir): O

    Desejo no pertence atividade, mas constitui a intencionalidade do afectivo

    (LVINAS, s/d, p. 249, nota 175); a relao com o rosto no se descreve em termos de

    intencionalidade (teoria), mas como movimento em direo ao Outro, ao Outro modo,

    Desejo do Outro e por isso mesmo Desejo metafsico a metafsica surge e mantm-se

    neste libi : o Desejvel do Desejo infinito. (LVINAS, s/d, p. 262) O Desejo do

    Outro a negao da violncia inerente Razo, ao discurso racional, ao movimento do

    Mesmo e da Ontologia (FABRI, 2001, p. 252); violncia que consiste em reduzir o

    Outro identidade do Mesmo, ao Mesmo. O rosto do Outro, como verdade tica, um

    no-saber e resiste a toda tentao de saber:

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

    Volume 5 no 2 8

    Por trs da postura que ele toma ou suporta em seu aparecer, ele me

    chama e me ordena do fundo de sua nudez sem defesa, de sua misria, de sua

    mortalidade. na relao pessoal, do eu ao outro que o acontecimento tico,

    caridade e misericrdia, generosidade e obedincia, conduz alm ou eleva

    acima do ser (LVINAS, 2009, p. 269).

    A relao com o rosto no da ordem da intencionalidade, mas da proximidade;

    ela se distingue pelo seu carter no sincrnico e, portanto assimtrico. Os termos em

    relao, Eu e o Outro, no pertencem ao mesmo tempo, simultaneidade da

    representao. A relao de proximidade a ruptura com a sincronia e no faz parte de

    um sistema de puras relaes porque o Outro vem ao Mesmo. A aproximao do Outro

    no se traduz na tematizao, ela permanece dia-cronia pelo fato mesmo que o Outro tem

    um rosto. o que Lvinas chama a no-fenomenalidade do rosto, ou o vestgio (la trace)

    (VASEY, 1980, p. 232, grifo do autor).

    O pensamento constitui o que ele pensa, o pensado relao de dominao; a

    experincia tica, o frente a frente, nos coloca diante de uma realidade que o pensamento

    jamais poder constituir: quando a conscincia intencional encontra Outrem, ela se

    desmonta; fracasso da conscincia constituinte; o rosto de Outrem, que no se apresenta

    conscincia, extriorit totale et irrductible. (HERNNDEZ, 2009, p. 24) Com

    efeito, no pelo conhecimento, mas a relao ds-inter-esse com outrem que permite

    pela tomada de conscincia de minha responsabilidade para com ele interromper o

    murmrio annimo e insensato do ser. (LVINAS, 1997, p. 25)A relao de dominao

    frente a outrem d lugar a uma relao tica substituio do ser pelo Outro , onde o

    sujeito vai se colocar a servio do outro substituio da ontologia pela tica. Outrem

    no , na relao ao Eu, um alter ego: o encontro com outrem revela o que ele tem de

    nico e de inapreensvel e abre, pois, a uma radical exterioridade alteridade que ir

    despertar o sujeito do seu egoismo. O despertar tico um acontecimento provocado pela

    expresso do rosto de Outrem, na expresso da sua vulnerabilidade, sofrimento e misria

    dos meninos e meninas de rua, dos idosos abandonados e este despertar requer ir ao

    mundo (s coisas mesmas) para escut-lo o rosto fala , para ter a noo do que real

    e importante. Para Lvinas o rosto no da ordem emprica porque j linguagem e

    como tal da ordem do discurso, do significado e por isso podemos dizer que o rosto a

    expresso da metafsica de Lvinas porque nos remete ao transcendente, ao alm que eu

    no posso poder: o rosto no do mundo. Para Lvinas a humanidade inteira est ali

    naquele rosto que me envia um apelo, porm No na humanidade annima, mas na

    humanidade visada naquele (ou naquela) que quando o seu rosto resplandece

    precisamente aquele ou aquela que espervamos. (LVINAS, s/d, p. 258).

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    A filosofia de Lvinas tem como propsito central pensar o Outro e a relao tica pela

    simples razo de que no h tica quando se considera s um indivduo e porque o acesso

    a Outrem s se d pela tica j que esta respeita a sua alteridade a deixa ser , escuta seu

    apelo e no lhe toma seus lbios emprestados; e neste sentido que Lvinas tanto critica a

    filosofia ocidental como ontologia, pois esta no respeita a alteridade; a tica pressupe a

    ideia de relao, pois, a tica uma relao primordial. necessrio, ento, considerar

    esse Outro da relao tica.

    Rosto e Infinito

    a) Rosto, diacronia e verdade

    a partir da ideia de Infinito que acedemos noo levinasiana de

    transcendncia(transcendence), noo que Lvinas toma, segundo suas palavras, de Jean

    Wahl (LVINAS, 1980, p. 23), e que tambm atingimos a sua filosofia como metafsica

    ou tica, pois a transcendncia um movimento em direo ao outro, ao infinito; ela

    designa uma altura e uma nobreza, uma transcendncia (LVINAS, 1980, p. 29).

    Neste sentido, muito sugestivo seu livro Dieu, la mort et le temps, pois trata-se de

    abordar realidades que no se prendem imanncia da totalidade, que esto alm da

    totalidade, pois o que me vem ideia no parte de mim, me vem de fora, transcendente:

    O infinito me vem ideia na significncia do rosto. O rosto significa o

    Infinito. Este no aparece como tema, mas nessa significao tica mesma: isto , no fato

    de que mais eu sou justo, mais eu sou responsvel. H um infinito na exigncia tica por

    ela ser insacivel. Ela exigncia de santidade. Ningum pode dizer em momento algum:

    cumpri todo o meu dever. Exceto o hipcrita (LVINAS, 1982, p. 97, grifo do autor).

    Poderamos, quem sabe, afirmar que a noo de rosto, por seu carter central na

    obra Totalidade e infinito, rene em si as ideias de Deus, tempo e morte. Isto porque

    Lvinasdescreve o rosto como vestgio de Deus, como temporalidade diacrnica e que,

    como tal, descreve uma nova verdade verdade dia-crnica dia-cronia da verdade sem

    sntese possvel (...) desordem que no outra ordem, l onde os elementos no podem

    fazer-se contemporneos, por exemplo, na maneira (mas ser isso um exemplo ou a

    exceo?) pela qual Deus escapa presena da re-presentao (LVINAS, 2008, p. 103,

    nota 17) trata-se, pois, de acontecimento do qual no sou o mestre.

    Se tomarmos a srio as anlises apresentadas acima (Rosto e fenmeno e Rosto e

    enigma) podemos dizer que h toda uma teoria do tempo nas anlises que Lvinas realiza

    acerca da noo de rosto. Isto porque o rosto se d como uma passividade, termo

    ambguo no nosso autor, embora possamos identificar um eidos como j ido, passado,

    como passagem ou vestgio; no um objeto intencional, pois ele expresso da

    transcendncia que quebra atotalidade e instaura uma nova ordem, a tica ou metafsica.

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    A noo de rosto em Emmanuel Lvinas, pp. 14 - 26

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    Sua alteridade precisamente o que escapa intencionalidade da conscincia e

    lhe impe um limite; a alteridade no faz parte da ordem dos objetos, eu no posso faz-la

    minha. O outro e permanece um mistrio, como o que me escapa sempre, eu no posso

    tom-lo tal como um objeto. Nesse sentido o rosto ausncia que nunca est presente j

    que a presena o registro do ser. O estatuto do rosto no ontolgico, trata-se de

    outramente que ser, ou tica; para Lvinas a teoria incapaz de respeitar o outro em sua

    alteridade, pois: teoria significa tambm inteligncia logos do ser ou seja, uma

    maneira tal de abordar o ser conhecido que a sua alteridade em relao ao ser

    cognoscente se desvanece (LVINAS, 1980, p. 29-30, grifo do autor).

    a partir da noo de alteridade que Lvinas procura mostrar que certas

    realidades resistem categorizao, ao conceito. A alteridade como temporalidade

    passiva, como exposio exposio, nfase da posio , que me passa e me afeta como

    envelhecimento e que tem no rosto do outro homem o seu lugar tambm a infinitude do

    infinito. Todas as consideraes de Lvinas ideia do infinito, nos diversos contextos em

    que esta noo aparece, dizem respeito ao inabarcvel e em especial na obra Totalidade e

    infinito diz respeito ao rosto; a alteridade do rosto escapa toda tematizao e o que a

    ideia do infinito em ns vem contestar. Alteridade como temporalidade j diferente do

    tempo da conscincia que conscincia do tempo. Alteridade: temporalidade passiva

    mais passiva do que toda passividade; mais passiva do que a receptividade. Alteridade

    como temporalidade da diferena, ao contrrio da identidade que temporalidade do

    idntico, do Mesmo, do Eu.

    Uma tal noo de alteridade s possvel em uma relao onde o Outro Outro a

    partir de si mesmo (`) para um termo cuja essncia permanecer o Mesmo. Esse

    termo cuja essncia permanecer o Mesmo Lvinas chama Eu (Moi). Para que a relao

    se constitua enquanto tal preciso que os termos estejam separados, isto , no formem

    totalidade.

    Rosto e tica

    Emmanuel Lvinas, seguindo a mxima fenomenolgica segundo a qual preciso

    voltar s coisas mesmas descreve uma situao irredutvel; irredutvel significa que no

    podeser posta entre parnteses e que no remete a uma situao que seria seu

    fundamento. Trata-se de uma relao original e originria, pois fundante da filosofia, do

    pensamento, da linguagem e do sentido; Lvinas a chama tica. A tica, enquanto relao

    entre existentes metafsica e no do existente com a sua existncia ontolgica e

    mais antiga do que a ontologia; condio mesma da ontologia. A ontologia enquanto

    compreenso do verbo ser um acontecimento que pressupe a relao social entendida

    como ensino e justia. A apropriao da linguagem um processo social; por relao

    social Lvinas entende a relao Eu-Outro; sem outrem no tem tica, pois, a tica se d

    na relao e sem outrem no tem nem mesmo o ser. A relao tica no tem objeto e por

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    isso metafsica; o Outro no vem funcionar como objeto intencional que preenche uma

    inteno. A correlao noese-noema, que a estrutura bsica da intencionalidade

    teortica, uma rgua comum entre o pensamento e o pensado. Porm, o Outro com o

    qual mantenho relaes ultrapassa toda medida, toda escala comum entre eu e ele. Por

    outro lado, o mesmo e o outro esto separados, pois, so absolutos, isto , podem se

    desligar da relao. Se o mesmo e o outro no estivessem separados eles seriam o mesmo

    e no haveria alteridade:

    Uma dessemelhana est operando e ela constitutiva. No h sujeito sem o

    outro, e um e o outro nascem uma comum defeco (...). Haveria assim, primeiro, uma

    socialidade, fundadora, originante. Esta socialidade no justaposio. Ela , ao

    contrrio, tenso, disjuno, orientao (PETITDEMANGE, 1993, p. 337).

    Esta dessemelhana, esta diferena o que Lvinas chama assimetria e que faz

    com que seja impossvel uma sincronizao do Outro no Mesmo; esta assimetria indica a

    impossibilidade radical de falar no mesmo sentido de si e dos outros; por consequncia,

    tambm a impossibilidade da totalizao. (LVINAS, 1980, p. 41); assimetria que

    torna possvel a separao, condio da relao.

    Concluso

    O rosto ou o Outro acorda a razo terica, a conscincia constituinte exigindo

    uma outra atitude: no mais de posse e sim de acolhimento; no mais de desvelamento e

    sim justia; no mais doao de sentido e sim recepo de sentido, sentido tico vindo do

    Outro homem e que depe a conscincia constituinte dos seus poderes posicionais

    (tticos) frente ao infinito do Outro. Portanto, como diz Lvinas, no sou eu que me

    recuso ao sistema (...), o Outro (LVINAS, 1980, p. 28), isto , no por uma

    deficincia do Eu que o Outro escapa aos poderes objetivantes do Mesmo e sim pelo

    infinito do Outro. A relao entre o Mesmo e o Outro onde intervm, mais uma vez a

    ideia do Infinito , dada a distncia infinita que os separa, s pode ser pensada como

    relao tica, pois, Outrem jamais se deixa abarcar no sistema do Mesmo, ou, na

    mesmidade do Mesmo, na sincronizao.

    Assim, a verdade do Outro enquanto passagem-passado, vestgio expresso no

    seu rosto e que exige acolhimento e no se deixa abarcar que se constitui na verdade tica,

    verdade do rosto e que nos esforamos para mostrar aqui nesta dissertao. Verdade

    tica que permite paz com o Outro; verdade tica que tem por escopo interromper a

    absoro da alteridade na identidade do Mesmo, interromper a guerra, a totalidade, a

    totalizao. Nesse sentido, pensamos que a relao que Bernard faz entre pravda e a

    noo de verdade em nosso autor, isto , a verdade como acolhimento de Outrem

    expressa o que nos pareceu indicar Souza quando cita Horkheimeir e Adorno: s h uma

    expresso para a verdade: o pensamento que nega a injustia; vale dizer, um pensamento

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    que no nega a fome, a misria, a vulnerabilidade como verdade do Outro; verdade esta

    que a analtica da existncia enquanto desvelamento no permite reconhecer, pois, nivela

    o Outro e o Mesmo onde o Outro e o Mesmo so o Mesmo, formam totalidade, formam

    unidade, sistema e a unicidade do nico se desvanece.

    Assim, o ponto de partida a sobrevivncia do homem e o fim do genocdio

    devido ao reinado da violncia reduo do Outro ao Mesmo onde o cada um se

    converte em um, inteligncia do nico; saber do nico que, incapaz de conviver com a

    multiplicidade, faz-lhe violncia ao no reconhecer sua unicidade. A filosofia ocidental

    que converte a realidade em saber desta realidade perde de vista a unicidade do nico,

    perde de vista a diversidade de rostos, perde de vista o ensinamento que cada um trz na

    sua expresso. Alm de egolgica a filosofia ocidental se converte em monolgica, pois, o

    Outro absorvido no discurso do Mesmo o Outro no fala, empresta seus lbios ao

    Mesmo. o que Lvinas chama de violncia, guerra, alergia ao Outro. Porm, o Outro

    me chama e o seu chamado j injuno impossibilidade de desviar , apelo por

    acolhimento; traumatismo que arranca o Eu do seu ser si, do seu gozo do mundo

    convertendo-o em responsvel pelo Outro

    Para Lvinas, o rosto intervm no real de um modo absolutamente diferente:

    trata-se de um modo que no se descreve pela ontologia, pois o rosto no fenmeno. Ao

    contrrio, trata-se de um outramente que ser, ou bondade, acolhimento a substituio

    do ser pelo Outro.

    REFERNCIAS

    HERNNDEZ, Francisco Xavier Snches. Vrit et justice dans la philosophie

    deEmmanuel Lvinas. Paris:LHarmattan,2009.

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    ______. De Deus que vem ideia. Pergentino Stefano Pivatto (Coord. e revisor).

    Traduo: Marcelo Fabri, Marcelo Luiz Pelizzoli, Evaldo Antnio Kuiava. 2. ed.

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    ______. Entrevista com Emmanuel Levinas. Cadernos de Subjetividade. So Paulo, v. 5,

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    Superviso: Prof. Lus Cludio Figueiredo. Traduo: Clia Gambini. Reviso da

    traduo: Martha Gambini.

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    ______. La teoria fenomenolgica de la intuicin. Traduo: Tania Checchi.

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    ______. Descobrindo a existncia com Husserl e Heidegger. Traduo: Fernanda

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