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2 MAURICLEIA SOARES DOS SANTOS A Política habitacional no município de Diadema e a intervenção do assistente social (1994 – 2004) Mestrado em Serviço Social PUC/SP 2006

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MAURICLEIA SOARES DOS SANTOS A Política habitacional no município de Diadema e a

intervenção do assistente social

(1994 – 2004)

Mestrado em Serviço Social

PUC/SP

2006

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MAURICLEIA SOARES DOS SANTOS A Política habitacional no município de Diadema e a

intervenção do assistente social

(1994 – 2004)

Dissertação apresentada à banca Examinadora

da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,

como exigência parcial para obtenção do título

de Mestre em Serviço Social, sob a orientação do

Prof. Dr. Evaldo Amaro Vieira.

PUC/SP

2006

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Dedico

Aos meus filhos, Gabriela e Renê

Aos meus pais, Manuel e Cleonice

E ao meu companheiro e amigo Celso

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Banca examinadora

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___________________________

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SIGLAS

ABCDMRR - Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano, Diadema, Mauá, Ribeira Pires, Rio Grande da Serra ABEPSS - Associação brasileiro de ensino e Pesquisa em Serviço Social AEIS - Áreas Especiais de Interesse Social ANAS - Associação Nacional de Assistentes Sociais BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento BNH - Banco Nacional de Habitação CAPES - Fundação Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior CDRU - Concessão Direito Real de Uso CLT - Consolidação das Leis do Trabalho CRESS - Conselho Regional de Serviço Social CUT - Central Única dos Trabalhadores FCP - Fundação da Casa Popular FHC - Fernando Henrique Cardoso FGTS - Fundo Garantia de Tempo de Serviço FMI - Fundo Monetário Internacional FUMAPIS - Fundo Municipal de Apoio à Habitação de Interesse Social ONGS - Organizações não-governamentais IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IBH - Instituto Brasileiro de Habitação ICMS - Imposto de Circulação de Mercadoria e Serviços IDH - Índice de Desenvolvimento Humano INESC - Instituto de Estudos Socioeconômico IPMF - Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras. LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social MDDF - Movimento de Defesa dos Direitos dos Favelados MNRU - Movimento Nacional da Reforma Urbana MST - Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra PAIH - Plano de Ação Imediata para Habitação PAR - Programa de Arrendamento Residencial PIB - Produto Interno Bruto PNH - Política Nacional de Habitação PROER - Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro PSB - Partido Socialista Brasileiro PT - Partido dos Trabalhadores RMSP - Região Metropolitana de São Paulo SABESP - Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo SANED - Companhia de Saneamento de Diadema SBPE - Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo SEADE - Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados SEHAB - Secretaria de Habitação de Diadema SERFHA - Serviço Especial de Recuperação de Favelas e Habitações Anti-Higiênicas SFH - Sistema Financeiro de Habitação UNE - União Nacional dos Estudantes

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RESUMO

Esta dissertação tem como tema “A política habitacional no município de Diadema e

a intervenção do assistente social”, e tem como objetivo compreender a cidade

como espaço de produção e reprodução das relações sociais e a intervenção do

assistente social na política habitacional desse município, tendo como referência o

processo histórico da formação da cidade de Diadema e a política de habitação

desenvolvida no período compreendido entre 1994-2004.

Nesse sentido, procuramos contextualizar essa política nas questões estruturais

decorrentes da sociedade capitalista, na sua fase neoliberal e globalizada. Assim, as

cidades brasileiras reproduzem em seus territórios, por um lado, grandes

desigualdades econômicas, sociais, políticas e culturais; por outro lado a

concentração de riqueza, de renda, de infra-estrutura e equipamentos urbanos com

grandes vantagens, em termos de quantidade e qualidade, em bairros de classe

média e alta, enquanto para a população de baixa renda restam tão-somente áreas

distantes e sem investimento.

É, portanto, nesse contexto de enormes desigualdades que os assistentes sociais

desenvolvem sua prática interventiva, na luta por políticas sociais, junto à população

no seu processo de organização para conquista de seus direitos. É o que ressalta o

resultado da nossa pesquisa, que se utilizou de fonte documental e de entrevistas.

Palavras-chave: urbanização, industrialização, habitação, política social, trabalho.

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ABSTRACT

This dissertation is about: “The habitational politic of Diadema´s city and the

social assistants’ intervention”. It has the objective of understanding the city as a

space of production and reproduction of social relations and the Social assistant’s

intervention in the habitational politics of this city. The reference is the historical

process, the creation Diadema´s city and the habitational politics developed between

1994 and 2004.

In this way, we contextualize this politic in the structural questions of

capitalistic society, on its neo-liberal and global stage. So the Brazilian cities have, in

their territories, a great amount of economical, social, political and cultural

inequalities; on the other side, the concentration of wealth, infrastructure and superior

equipments in the high-class neighbors are huge. For the low class people only

remains a distant area, without investment.

Therefore, in this context of enormous inequalities that social assistants’

develop their intervention practice for social politics, with the population, searching

for their rights.

That is what shows the researches, utilizing documents and interviews.

Key-words: urbanization – industrialization – habitation – social politics - work

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO.................................................................................13

Capítulo I - DIADEMA E A OCUPAÇÃO URBANA

1.1. Origem da cidade de diadema.............................................................16

1.2. Processo de ocupações do território de Diadema............................24

1.3. A política urbana em Diadema............................................................30

Capítulo II - A MORADIA NO BRASIL

2.1. Alguns elementos para a contextualização da moradia no Brasil...40

2.2. A política habitacional brasileira........................................................47

2.3. A política habitacional em Diadema: 1994/2004................................71

Capítulo III - O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA POLÌTICA

DE HABITAÇÃO NO MUNICÍPIO DE DIADEMA.

3.1. O assistente social e a política de habitação: uma expressão da

“questão social”....................................................................................84

3.2. A pesquisa e a metodologia utilizada: documentos e entrevistas...88

3.3. O contexto histórico da implantação do Serviço Social na política de

habitação..........................................................................................................91

CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................119

BIBLIOGRAFIA..............................................................................123

ANEXOS.......................................................................................132

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FAVELA

Numa Vasta Extensão

Onde Não Há Plantação

Nem Ninguém Morando Lá

Cada Um Pobre Que Passa Por Alí

Só Pensa Em Construir Ser Lar

E Quando O Primeiro Começa

Os Outros, Depressa, Procuram Marcar

Seu Pedacinho De Terra Pra Morar

E Assim A Região Sofre Modificação

Fica Sendo Chamada De Nova Aquarela

E Aí Que O Lugar Então Passa A Se Chamar

Favela.

Jards Macalé

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INTRODUÇÃO

“-Pai, por que a gente veio morar aqui no mangue?”.

Mas, por que aqui no mangue,

por que não fomos morar na cidade, do outro lado do mangue?

Lá é tão bonito, tão diferente, é como fosse um outro mundo."

(Josué de Castro. Homens e caranguejos. 1967)

O presente trabalho tem por objetivo estudar, a partir da experiência do Serviço

Social na Secretaria de Habitação do Município de Diadema, no Programa de

Urbanização de Favelas, a atuação do assistente social, sua trajetória e

pressupostos teóricos que norteiam sua ação profissional, bem como se propõe a

compreender a cidade como espaço de produção e reprodução das relações sociais.

Inicialmente, iremos tratar da origem da cidade de Diadema, sua relação com o

desenvolvimento do capitalismo no Brasil e a interferência deste modelo econômico

na construção das cidades brasileiras. A ocupação do solo urbano está diretamente

relacionada ao processo de concentração de renda por parte de uma pequena

parcela da população. A maioria dos trabalhadores à margem da aquisição da terra,

e estes têm como única solução habitacional a ocupação de áreas degradadas, à

beira de córregos, áreas de mananciais, ocorrendo uma periferização da cidade.

No Brasil o processo de industrialização acelerou a urbanização, contribuindo para

um crescimento das cidades brasileiras, que hoje abrigam 81% da população,

gerando uma concentração de capital e trabalho nos maiores centros urbanos.

A falta de moradia tem raízes históricas e está no centro da problemática urbana.

Atualmente no Brasil existe um déficit quantitativo de 6,6 milhões e um déficit

qualitativo de 15 milhões de moradias que são inadequadas.

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Partimos da compreensão de que a política habitacional é uma política social de

direito, em que cada cidadão tem direito à sua moradia, conforme a Declaração dos

Direitos Humanos e a Constituição Federal de 1988, entre tantos outros documentos

que expressam esse direito.

Portanto, entendemos que a questão habitacional se constitui numa das expressões

da questão social, visto ser marcada por contradições que devem ser enfrentadas

pelo poder público nas suas instâncias municipal, estadual e federal através de

programas e projetos para a população de baixa renda, proporcionando-lhe a

participação em toda sua etapa. E como um direito dos trabalhadores que por meios

dos movimentos sociais, devem garantir esta conquista através da organização

dessa população. A habitação deve ser compreendida como uma política social e a

moradia como um bem social. Para reforçar este pensamento Peter Marcuse, no

texto A cidade apresenta suas armas, afirma:

As cidades podem investir em habitação social, evitar a especulação imobiliária, controlar os aluguéis – além de construir habitação para a população ou tornar o solo urbano acessível para a construção de moradia popular. 1

Nesta dissertação, o capítulo I – Diadema e a ocupação urbana – tem como objetivo

discutir: a cidade como espaço de reprodução das relações sociais na sociedade

capitalista; o processo de industrialização e urbanização no Brasil; a origem da

cidade de Diadema, sua formação econômica, social, política e a forma como

aconteceu a ocupação do seu território, e, ainda, o histórico da construção da

política urbana nacional e no município de Diadema.

Já o capítulo II – A moradia no Brasil – tem como objetivo contextualizar a

problemática da moradia popular no Brasil, os fatores que determinam sua

existência enquanto problema para as classes trabalhadoras e a política

desenvolvida pelo Estado brasileiro para intermediar esse conflito entre os

trabalhadores e o capital. A política habitacional desenvolvida pelo município de

1 MARCUSE, Peter. A cidade apresenta suas armas. Revista Fórum, São Paulo: Editor Publisher Brasil, 2001, p. 26.

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Diadema a partir 1994, quando da aprovação do Plano Diretor que definiu as Áreas

Especiais de Interesse Social (AEIS), foi um importante instrumento para definição

da política de moradia no município.

Por fim, o capítulo III – O trabalho do assistente social na política de habitação no

município de Diadema – objeto desta dissertação, foi elaborado a partir de

levantamento bibliográfico e de entrevistas realizadas com assistentes sociais e

representantes do movimento de moradia com o intuito de discutir a importância do

trabalho desse profissional. Também foram abordados os pressupostos teóricos

que norteiam a atuação do assistente social no programa de urbanização durante o

período de 1994 a 2004, sua trajetória, seus avanços e impasses na construção do

trabalho do Serviço Social na política habitação do município.

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Capítulo I

DIADEMA E A OCUPAÇÃO URBANA

“A cidade é o centro e expressão de domínio sobre

um território, sede do poder e da administração,

lugar da produção de mitos e símbolos.” (Raquel

Rolnik)

1.2. ORIGEM DA CIDADE DE DIADEMA

Para entender uma cidade, é necessário compreender o processo histórico de sua

formação. É importante resgatar alguns aspectos sociais, políticos, econômicos e

culturais que refletem a totalidade em que ela está inserida. Rolnik define a cidade

como uma obra coletiva que desafia a natureza, nasce com o processo de

sedentarização e seu aparecimento delimita uma nova relação homem-natureza. 1

A origem de Diadema está vinculada ao processo de colonização do Brasil pela

Coroa portuguesa, iniciado a partir do século XVII. Consistiu no povoamento de toda

a costa brasileira e na divisão em capitania hereditárias. Os donatários - como eram

conhecidos os donos das capitanias hereditárias - tinham usufruto da terra, que

receberam como doações. Geralmente, as capitanias possuíam grandes extensões,

podendo ser cedidas aos colonos para sua fixação na terra. No seu livro Raízes do

Brasil, Sérgio Buarque faz um comentário a respeito das medidas adotadas pela

Coroa, que era conter a povoação no litoral e seu adentramento pelas terras,

evitando assim a perda das bases marítimas para outras potências, como também

não necessitava investir em grandes obras na colônia que não produzissem 1 ROLNIK, Raquel. O que é cidade. São Paulo: Brasiliense, 1995, p. 8.

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benefícios imediatos para a metrópole. Nesse período, Portugal investiu na busca de

novos mercados, pois a Inglaterra e França detinham o monopólio do comércio, que

crescia desordenadamente. A concepção posta em prática pela Coroa portuguesa

era de exploração das riquezas encontradas nas suas descobertas para

comercialização, a exemplo do pau-brasil, pois a medula do sistema mercantilista

reside no monopólio do comércio colonial assumido pelo Estado ou reservado à

classe mercantil da metrópole. Segundo Francisco de Oliveira “(...) a concentração

de terras e de propriedades que a forma mercantil do Estado português implantou na

sua colônia (...) transformou-se em riqueza concentrada quando a própria passagem

do capitalismo mercantil para industrial (...)”. 2 Essa forma de colonização de

exploração da terra e dos homens existentes nela viabilizou a construção de cidades

de base agrária (latifúndio), que passaram a se organizar em função do mercado .

Documentos históricos3 registram que Diadema pertencia à sesmaria de Pedro

Nunes, localizada na Borda do Campo da Vila de Santo André. Sua localização

geográfica era entre o litoral (Vila de São Vicente) e o planalto (Vila de São Paulo de

Piratininga). Com o surgimento da Vila de São Paulo de Piratininga e a construção

da via de ligação entre São Bernardo e Santo Amaro, esse caminho entre esses dois

povoados era precário, mas contribuiu para a chegada das poucas famílias nessa

região.

Em 1850, foi promulgada a Lei das Terras, e a supressão de fato da importação de

escravos. A posse da terra no Brasil passou a ser propriedade privada, podendo ser

adquirida pela compra, pois até aquele momento as terras eram heranças ou

doações. Essa nova lei que regulamenta a propriedade privada no Brasil, em

conjunto com a proibição da importação de escravos, constrói as bases para o

trabalho assalariado, possibilitando esta nova relação de trabalho, o assalariamento.

Os latifundiários detinham o monopólio do mercado de trabalho e o trabalhador para

sobreviver vende sua força de trabalho, recebendo-a em forma de salário, para

comprar seu próprio sustento. As terras que abrangiam o atual município de

2 OLIVEIRA, Francisco de. Elegia para uma Re(li)gião. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1981, p.60. 3 PREFEITURA MUNICIPAL DE DIADEMA. Diadema: Referências Históricas: 1501-2000. Diadema:

PMD, 2002, p.7

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Diadema só foram registradas seis anos depois, constando das seguintes

propriedades: Curral Grande, Curral Pequeno, Taboão, Mercês, Pinhauva,

Mateuzinho, Quatro Encruzilhadas, todas adquiridas mediante heranças.

Todo esse processo de crescimento e ocupação das cidades brasileiras durante o

período colonial, segundo Singer, foi realizado com tal ênfase que: “(...) a

urbanização, mesmo no período colonial, foi condicionada pela localização e

natureza dos recursos naturais, pela topografia das várias regiões que condicionou

também a rede de comunicações, etc”. 4

A cidade no capitalismo tem a distribuição da população e das atividades

econômicas no solo urbano seguindo uma regra básica: o poder aquisitivo das

classes é o determinante desta distribuição. As classes mais favorecidas se

localizam na melhor estrutura das cidades em relação ao trabalho, à oferta de

serviços urbanos, ao comércio, à cultura e ao lazer, ou seja, para aqueles que têm

poder para adquirir terra, moradia, uma vez que a estrutura fundiária urbana é

extremamente concentrada.

Com o crescimento da cidade de São Paulo em meados da década de 1920,

acontece um deslocamento das famílias em busca de áreas de lazer e descanso.

Nesse momento, Diadema oferecia uma paisagem rural, formada por pequenas

chácaras, favorecendo o aparecimento de investidores imobiliários, que passaram a

se interessar pela região, criando vários loteamentos. A construção da Represa

Billings, na região do Eldorado, possibilitou trazer atrativos turísticos, mas causou

grande impacto ambiental e cultural.

No Brasil, a partir de 1930 o modelo de desenvolvimento capitalista muda o foco de

interesse, de agro-exportador passa a investir na industrialização do país. Nesse

momento, ocorre uma redefinição do modelo de urbanização no Brasil, com a

concentração espacial do capital alterando a relação campo-cidade, atraindo um

4 SINGER, Paul. Economia Política da Urbanização. São Paulo: Brasiliense, 1977, p.84.

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contingente populacional às metrópoles - as migrações. Essas metrópoles oferecem

melhores empregos, reformulando os padrões de propriedade e a divisão social do

trabalho.

A proximidade geográfica com São Paulo e o processo de industrialização que

ocorria surtiram pouco efeito em Diadema, Vila pertencente a São Bernardo, sem

importância econômica regional, servindo de via de circulação de mercadoria.

Na década de 1940, a região de Diadema era constituída de quatro povoados

pertencentes a São Bernardo: Piraporinha, Eldorado, Taboão e Vila Conceição.

Nesse período, prevaleceram as atividades econômicas manufatureiras e uma

agricultura voltada à subsistência, destacando-se as atividades de olarias,

carvoarias e extração de madeira. Outras atividades foram iniciadas: a exploração

de uma pedreira na região de Taboão, beneficiamento de milho, através do Moinho

Fabrini, e a indústria moveleira na região de Piraporinha. As estradas construídas

tinham como objetivo principal o escoamento de mercadorias produzidas localmente.

O comércio era sua principal fonte de renda, como também o estímulo à venda de

chácaras que estavam sendo loteadas, com o objetivo de iniciar um reordenamento

de espaço.

Em 1947, foi inaugurada a via Anchieta, sinalizando nova fase da industrialização,

com a construção de grandes parques industriais-mecânico-metalúrgico, químico-

petroquímico, na região. Nos anos seguintes, foram instaladas em São Bernardo

indústrias de grande porte, multinacionais, já em Diadema foram instaladas

indústrias de micro e pequeno porte, dos setores secundário e terciário formais, e

microempresa no setor informal, o que modificou e transformou a vida local, levando

a um processo de industrialização e urbanização acelerado em toda a região.

A economia brasileira, do término da 2ª Guerra Mundial até final dos anos de 1970,

apresentou profundas transformações estruturais. O processo de industrialização

iniciado e consolidado com o Plano de Metas (1956-1961) torna a sociedade

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brasileira, até então predominantemente rural, numa sociedade urbana e

metropolitana. O Estado brasileiro aqui desempenhou papel determinante,

assegurando as condições políticas e econômicas, com pesados investimentos para

a implantação do processo de industrialização, contribuindo de forma contundente

para a acumulação de capital, produzindo uma exclusão social com grande

concentração de renda, característica do modelo econômico adotado.

Na década de 1960, de cada 10 brasileiros 6 moravam no campo, mas esse

processo de industrialização altamente concentrado contribuiu para o deslocamento

de grandes contingentes populacionais do campo para os centros urbanos, o que se

caracteriza como êxodo interno. A região sudeste do país foi a que mais recebeu

trabalhadores que se deslocaram para as cidades mais dinâmicas economicamente,

situadas principalmente nas áreas urbanas- onde se concentram as capitais- em

busca de melhores condições de vida. Em 1960 Diadema apresentava uma

população em torno de 12 mil habitantes (IBGE: 1960).

A economia brasileira no período compreendido entre os anos de 1970 e 1980

passou por um dinamismo e diversidade nas atividades econômicas, impulsionando

a mobilidade social e ocupacional. Esse padrão de desenvolvimento não alterou a

estrutura fundiária das grandes propriedades, mas acelerou a modernização do

campo, expulsando trabalhadores rurais para as grandes cidades.

O processo de industrialização acelerou o crescimento das cidades já que nelas se

concentram capital e força de trabalho, fazendo surgir questões sociais vinculadas

ao crescimento de populações nos centros urbanos: a valorização da terra - solo

urbano, as migrações, a concentração dos meios de consumo coletivos e a

concentração do capital e do trabalho. Estas questões são historicamente

caracterizadas como (problemática) urbana, e estão relacionadas ao contexto social,

refletindo as determinações econômicas, sociais e políticas inerentes a cada época.

Todos esses fatores contribuíram com o processo de urbanização altamente veloz,

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resultando na proliferação de ocupações do solo urbano de forma desordenada,

determinando a conformação de um mercado de trabalho urbano extremamente

desfavorável aos trabalhadores, assim como invertendo em poucas décadas a

proporção entre população rural e urbana.

No início do século XXI cerca de 80% da população brasileira vive nos centros

urbanos, ou seja, 8 em cada 10 brasileiros vivem nas cidades. No município de

Diadema, estima-se que a cidade passe a contar com 389.503 habitantes (IBGE

2005), já dados da Fundação SEADE (2005) informam que a cidade é 100% urbana.

Para reforçar esta idéia citamos Henri Lefebvre que, em seu livro O direito à cidade,

escreve:

(...) se distinguirmos o indutor e o induzido, pode-se dizer que o processo de industrialização é indutor e que se pode contar entre os induzidos os problemas relativos ao crescimento e à planificação, as questões referentes à cidade e ao desenvolvimento da realidade urbana (...). 5

O processo de industrialização e urbanização está intrinsecamente interligado.

Esses dois processos nas cidades brasileiras ocorrem dentro desse modelo de

ocupação econômica, territorial e política de características patrimonialista,

acontecendo de forma acelerada e sem planejamento, atendendo aos interesses do

desenvolvimento do capital externo e da burguesia brasileira.

Essa ocupação do território expressa as desigualdades geradas no processo de

produção e nas relações sociais ao se materializar nos espaços urbanos

segregados, ou seja, espaços que consolidam as precárias condições de vida da

população no que se refere à habitação, transporte, saneamento, saúde e educação.

As cidades brasileiras, atualmente de modo mais visível, apresentam grandes

desigualdades nos padrões de qualidade de vida. Diadema não difere dessa

5 LEFEBVRE, Henri. O Direito á Cidade. São Paulo: Centauro editora, 2001, p.3, (grifo do autor).

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realidade situada na região metropolitana, seu crescimento econômico ocorreu

devido à descentralização e expansão da indústria, recebendo uma população de

baixa renda, com pouca qualificação profissional.

A lógica seguida na construção das cidades foi a mesma da produção e circulação

de mercadorias. Henri Lefebvre, em seu livro A revolução urbana afirma que “a

indústria se implanta próxima às fontes de energia, das matérias-primas, das

reservas de mão-de-obra”. 6

A indústria brasileira, ao longo de seu desenvolvimento, apresenta caráter

concentrador, o que gerou processos de modificações urbanas profundas, a terra

transforma-se em mercadoria com alto valor de venda. O espaço urbano expressa

estas contradições: grande concentração de renda, de serviços urbanos, ocorrendo

grandes investimentos por parte do Estado. Por outro lado, para grande parcela da

população, não há redistribuição da riqueza produzida socialmente: há pouco

investimento do Estado nos bairros periféricos, que na sua maioria são

superadensados, daí podermos dizer que esse crescimento está ligado à construção

de uma não-cidade, pois é necessário entender o tecido urbano na sua totalidade.

6 LEFEBVRE, Henri. A revolução Urbana. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2004, p. 25.

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1.2 – PROCESSO DE OCUPAÇÕES DO TERRITÓRIO DE DIADEMA

Para compreender a política urbana adotada no município de Diadema,

principalmente a partir da década de 1980, faz-se necessário entender a

estruturação do espaço territorial e a relação entre industrialização e urbanização.

Diadema está inserida na Região Metropolitana de São Paulo-RMSP, reunindo 39

municípios. A região do ABCDMRR é a maior e está entre as primeiras regiões

metropolitanas criadas por lei federal em 1973. Constituída por sete municípios: de

Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá,

Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. Essa região configura o principal pólo

industrial automotivo do Brasil, respondendo por quase 12% da atividade industrial

do Estado de São Paulo (SEADE/1996). Nessa região residem aproximadamente

2.349.965 de habitantes (IBGE/2000), o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH)

demonstra elevado padrão de qualidade de vida, resultado de décadas de

industrialização e investimentos sociais. Apesar do processo de intensa

reestruturação produtiva pelo qual tem passado nos últimos anos, manteve a sua

importância nas atividades industriais. As primeiras indústrias na região formaram-

se à margem da Estrada de Ferro São Paulo Railway, que ligava Santos – Jundiaí.

REGIÃO METROPOLITANA DE

SÃO PAULOBRASIL

DIADEMAREGIÃO

METROPOLITANA DE SÃO PAULOBRASIL

DIADEMA

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Localizada na região do ABCDMRR, Diadema emancipa-se de São Bernardo em

1959, tem uma população de 357.064 habitantes. (IBGE - Censo 2000). Dados

atuais da Prefeitura-Secretaria de Habitação de Diadema - SEHAB (2004), um

quarto desses habitantes residem em núcleos habitacionais e loteamentos de

interesse social, ocupando 4,5% do total do território.

O município registra uma concentração demográfica média de 116/habitantes por

hectares, tornando-se a segunda maior densidade demográfica do país e a primeira

do Estado de São Paulo. Possui área de 30km², dos quais 7 km², ou seja, 22% do

total da área encontra-se na bacia da Represa Billings, que são terras de proteção e

recuperação dos mananciais. O restante do território encontra-se inserido na bacia

do alto Tamanduateí. Os limites territoriais do município só foram definidos em 1964.

No início do século XX Diadema, por estar próxima à capital – São Paulo e

apresentar potencial turístico, oferece grande interesse aos investidores imobiliários,

com a intenção de torná-la área de lazer e turismo. Esses negociantes compraram

quase toda a terra das famílias, que, na sua maioria, tinham herdado,

transformando-a em loteamentos, com a construção de pequenas chácaras. Além

desse fator anteriormente citado, também desperta interesse dos investidores pela

sua localização geográfica entre o litoral - região portuária- e o planalto-produção e

comércio-, e por ser a via de ligação entre São Bernardo e Santo Amaro.

Em função da economia que se desenvolvia na região, a necessidade de transporte

para seu escoamento e de estimular as vendas das chácaras, acontecia o primeiro

reordenamento espacial da cidade. Como podemos perceber, essa ação de

reordenamento emerge vinculada às transformações sociais, favorecendo a

acumulação de capital nas mãos de grupos, os quais definem a forma de ocupação

da terra urbana, dividida em lotes geométricos, facilitando atribuir seu preço a terra,

e a aberturas de vias para comercialização da produção, privilegiando o mercado.

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Com o processo de expansão industrial para o Grande ABCD, ocorre um

crescimento demográfico e a ocupação do território foi marcada por indústrias e,

também, por habitações precárias.

Em dez anos, período compreendido entre os anos de1960 e 70, a cidade cresceu

640%, contando com população de 80 mil habitantes (Censo de 1970). Sua mão-de-

obra oriunda de várias regiões do país era absorvida na construção e expansão do

parque industrial da Região do Grande ABCD, o que contribuiu para uma intensa e

rápida ocupação do território em condições precárias de infra-estrutura básica - rede

de água e esgoto, saúde, educação, transporte, cultura, lazer.

A cidade de Diadema ficou conhecida como “cidade dormitório”, por estar localizada

um pouco afastada do núcleo central da industrialização e apresentar proximidade

com o trabalho. O acesso a terra nesse período tornou-se mais barato, pois as terras

eram procuradas pelas famílias dos trabalhadores com menor qualificação, atraídos

pelos empregos e melhor qualidade de vida. Essas terras eram adquiridas com

pouca ou nenhuma infra-estrutura urbana. Em 1966 ocorrem as primeiras

ocupações, pelas famílias de trabalhadores “excluídas” do processo de

industrialização, terras estas localizadas em áreas de mananciais e beira de

córregos.

Nas décadas de 1970 e 1980, alguns fatores impulsionaram a chegada das

indústrias na região. Um deles é a implantação da Rodovia dos Imigrantes, ligando

São Paulo ao porto de Santos. Outro fator é o governo municipal que, com o objetivo

de incentivar a instalação de indústrias, estabelece incentivos fiscais, através da

isenção de impostos municipais; além do fator da existência de um grande

contingente de mão-de-obra no município. Neste período, de 1970-1980, acontece

a expansão industrial e econômica no município: várias indústrias de médio e

pequeno porte foram instaladas, absorvendo a mão-de-obra local e modificando em

ritmo acelerado a paisagem rural de Diadema.

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A inserção do município na vida econômica da região deveu-se a vários fatores:

primeiro que as indústrias instaladas no município guardavam uma estreita relação

de dependência e complementaridade entre elas; a participação do município no

produto industrial da região que triplicou, passando 2,6% para 9,9%, este movimento

efetivou de vez a integração de Diadema na conformação do Grande ABCD. Outro

fenômeno que contribuiu para sua inserção na economia da região foi o processo de

desconcentração industrial na região metropolitana de São Paulo, pois os outros três

municípios do ABCD - Santo André, São Bernardo e São Caetano - já apresentavam

elevado grau de industrialização.

Durante o período compreendido entre 1980 a 1993, a produção industrial do

município sextuplicou, proporcionou um aumento real de arrecadação do Imposto

Circulação Mercadoria e Serviços (ICMS), passando de “cidade dormitório” para

“cidade industrial”. Esse cenário de expansão industrial não promoveu grandes

efeitos redistribuidores de renda, mas impôs novas demandas ao município e à

região. São demandas inter-setoriais da produção e do comércio por insumos, novos

tipos de serviços especializados e complementares, como armazenagem,

transporte, comunicação. São também demandas por serviços: educação, saúde,

lazer, cultura, transporte, segurança, entre outros, para atender às necessidades

sociais da população. O processo de industrialização e urbanização gera novos

padrões de consumo e de vida urbana.

Entre 1995 e 1996, o município de Diadema realizou o Censo Econômico e a

Pesquisa Socioeconômica, com o objetivo de construir estratégias para o

desenvolvimento socioeconômico, pois estava diante de um quadro de globalização

e desemprego estrutural, com políticas macroeconômicas de corte neoliberal

adotada pelo governo brasileiro. Os municípios sofrem com os efeitos desta política,

expressos no aumento do desemprego, na queda de arrecadação municipal, na

evasão fiscal e na crise social. A pesquisa traz um diagnóstico, segundo o qual, que

67,7% das pessoas ocupadas estavam no emprego industrial, apontando para um

crescimento no setor terciário. Indica, ainda, que as indústrias instaladas no

município se caracterizam por ter a estrutura industrial diversificada, como podemos

constatar através destes dados: em 1970 era composta de 12 gêneros de produtos,

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em 1980 passou para 19 gêneros. A taxa de desemprego em expansão atinge a

população economicamente ativa com idade a partir de 18 anos.

A primeira lei de zoneamento do uso do solo (1961) estabelecia que 74% da área

total do município destinava-se à atividade industrial, 24% para área turística e

menos de 2% para uso residencial. A faixa localizada no centro era pequena, onde

se concentrava o maior número de serviços. Nela residiam os moradores de maior

poder aquisitivo. Já para a população trabalhadora de baixa renda, migrante na sua

maioria, que vinha em busca de melhores condições de vida e trabalho, não foi

definida nenhuma área, indo ocupar as áreas periféricas da cidade.

Como podemos constatar, essa lei de zoneamento contribuiu para intensificar a

segregação urbana, demonstrando opção clara por uma política de prioridades para

a implantação das indústrias em detrimento da criação de políticas sociais,

especialmente a política de habitação. O primeiro plano diretor de Diadema (1973)

definiu 41% do território para zona residencial, 49,3% para industrial, 4,9 para

comercial e 4,8 para área turística. Esse plano construído em plena ditadura militar,

quando ocorreu o incremento de investimentos estrangeiros e estatais para o parque

industrial, localizado na região do ABCDRMM, continuava com a mesma lógica

adotada pela lei de zoneamento, ou seja, priorizar o processo de industrialização.

Como observamos, a forma de ocupação do solo no município de Diadema está

ligada ao processo de industrialização e urbanização da região do ABCDRMM.

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1.3 - A POLITICA URBANA EM DIADEMA

No Brasil, desde a década de 1960, o movimento pela reforma urbana iniciou a luta

tendo como eixo a valorização política da questão urbana, paralisada durante o

regime militar.

Na década de 1980, o processo de redemocratização contribuiu para renovação dos

atores sociais envolvidos com a problemática urbana. Sader define esse momento

importante na vida da sociedade brasileira da seguinte maneira: “Nessa

representação a luta social aparece sob a forma de pequenos movimentos que, num

dado momento, convergem fazendo emergir um sujeito coletivo com visibilidade

pública”. 7

Uma articulação popular e o tema da reforma urbana é posto na ordem do dia,

envolvendo setores da sociedade brasileira – movimentos sociais e profissionais que

trabalham com a questão urbana. Nesse momento é criado (1985) o Movimento

Nacional da Reforma Urbana-MNRU, com o objetivo de intervir na reformulação da

Constituição Brasileira, propondo princípios para construção de uma Política Urbana

e Habitacional comprometida com democratização da gestão, garantia de eqüidade

e justiça social.

Como resultado dessa mobilização nacional, tivemos a Constituição Federal de 1988

que, pela primeira vez, instituiu um capítulo específico referente à política urbana,

nos artigos de nº. 182 e 183, que definem três eixos fundamentais para nortear essa

política, que são: a função social da propriedade e da cidade; a gestão democrática

da cidade; e o direito à cidade e à cidadania.

Na Constituição Federal de 1988, os municípios assumem a categoria de ente

federativo, co-responsável por promover as políticas habitacional e urbana. Isso

7 SADER, Eder. Quando novos personagens entraram em cena. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995,

p.29.

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possibilitou aos municípios uma maior autonomia para propor políticas locais e

referendar algumas experiências de conquistas já existentes.

Os movimentos sociais, as associações, os sindicatos e Organizações Não-

Governamentais – ONGS, voltados para o tema da moradia, lutaram durante anos

para que esses artigos da Constituição Federal fossem regulamentados. A partir

dessa organização local e nacional, vários instrumentos foram criados para

regulamentar as diretrizes da política urbana e habitacional no país, nos três níveis

de governo, dentre eles encontram-se o Estatuto da Cidade - Lei 10.257/01, que

regulamenta os instrumentos urbanísticos, tornando obrigatória a construção de

Planos Diretores que incorporem os princípios constitucionais em municípios com

mais de 20.000 habitantes. O Plano Diretor é o instrumento fundamental para a

implementação do Estatuto da Cidade. Esse plano necessita estar imbuído das

novas funções para deixar de ser tecnocrata e atender às necessidades reais da

população em cada cidade.

Com relação à referida mobilização, queremos ressaltar especialmente os

movimentos populares que atuaram como sujeitos coletivos, passando a ser atores

ativos no processo de construção das políticas sociais. Para reforçar essa idéia e a

importância desse movimento numa articulação nacional na luta por terra urbana

para moradia social, fazemos uso mais uma vez das afirmações de Sader ”(...)

quando uso a noção de sujeito coletivo é no sentido de uma coletividade onde se

elabora uma identidade e se organizam práticas através das quais seus membros

pretendem defender seus interesses e expressar suas vontades, constituindo-se

nessas lutas”. 8

Posteriormente, foi constituído o Fórum Nacional da Reforma Urbana, que tem na

sua composição diferentes movimentos sociais, com o objetivo de construção de

uma agenda de luta unificada. Outro importante instrumento, para a política de

habitação em âmbito nacional, foi a criação do Sistema Nacional de Habitação de

Interesse Social, Fundo Nacional de Interesse Social e o seu Conselho Gestor, que

8 SADER, Eder. Quando novos personagens entraram em cena. 1995, p.55

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teve como base o primeiro projeto de lei de iniciativa popular de 1992, subscrito por

1 milhão de eleitores, e que recebeu em 2002 uma emenda substitutiva decorrente

de vários acordos entre o Governo Federal, o Fórum de Reforma Urbana e a

Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara de Deputados. Entretanto, o SNH

só foi aprovado recentemente, com a Lei 11.124, de 16/06/2005 que o institui.

Estes instrumentos proporcionam aos governos locais maior autonomia para

promover a política urbana garantindo as funções sociais da cidade, no combate à

espoliação urbana, mediante o reconhecimento das necessidades das camadas

mais expropriadas da sociedade.

Conforme exposto anteriormente, a situação urbana tem sua origem num conjunto

de questões articuladas, oriundas de problemas estruturais: propriedade privada,

concentração do capital e o processo de industrialização.

Por outro lado, vários municípios não esperaram que tais instrumentos legais fossem

promulgados para instaurar práticas de mobilização e conquistas da terra, tendo

como base os princípios expressos na Constituição Federal de 1988.

Na década de 1980, com o desenvolvimento industrial, comercial e a ocupação do

solo em Diadema, a terra foi valorizada e seus moradores expulsos para as áreas

periféricas, aumentando o processo de favelamento do município. As cidades

brasileiras passaram a retratar de forma mais visível as desigualdades da

sociedade, no caso específico de Diadema, a precariedade habitacional assumiu

contornos graves, expressando-se no aumento vertiginoso de favelas, que ocupam

morros, mangues, beiras de córregos e mananciais, no superadensamento dos

loteamentos irregulares e clandestinos.

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Quadro de crescimento das favelas em Diadema

Ano Nº. de Favelas População

1968 02 ______

1977 31 12.741

1982 128 79.271

1995/96 192 99.196

1998 200 101.146

1999/2000 204 102.026

2002 207 104.081

Fonte: Secretaria de Habitação de Diadema. 2002

Cabe ressaltar que a expansão econômica e populacional no município atingiu uma

dimensão significativa em curto espaço de tempo, acelerando a natureza e a

dimensão dos diferentes problemas urbanos, excluindo sistematicamente a maioria

da população do acesso a bens, serviços e direitos.

Os problemas relacionados à falta de moradia, de saúde, de educação e

saneamento básico proporcionaram um forte crescimento dos movimentos sociais e

o surgimento do Movimento de Defesa dos Favelados – MDF (1982), e suas

principais bandeiras de luta eram: a posse da terra, o direito de morar e o repúdio à

política habitacional desenvolvida que consistia na remoção de favelas.

Em Diadema, a principal bandeira de luta dos movimentos era a urbanização de

favelas, juntamente com a legalização da posse da terra, o que levou o movimento a

uma forte organização, resultando num processo de mobilização social na cidade. O

acúmulo de várias lutas fortaleceu os movimentos sociais e sindicais na região, que

passaram a enfrentar os problemas das favelas conjuntamente. No plano político o

reflexo acontece nas eleições gerais, com o aparecimento de partidos com

plataformas social-democráticas e de esquerda.

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Contudo, as sucessivas administrações populares, ligadas ao Partido dos

Trabalhadores (PT) – que a partir de 1983 se instalou no município–, o movimento

pela reforma urbana e a organização dos movimentos sociais refletiram de forma

positiva em Diadema, possibilitando uma ruptura com a política urbana e

habitacional até aquele momento desenvolvida.

A política urbana que começa a ser adotada propõe a inversão de prioridades,

alocando recursos nas áreas onde estavam localizadas as favelas, construindo uma

visão da cidade diferente da existente, com a participação popular. Para desenvolver

a política urbana e habitacional no município foi criada uma estrutura administrativa

a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitacional.

A política urbana desenvolvida no município viabilizou a revisão e construção de

vários instrumentos legais, que garantiram a permanência das famílias em áreas que

apresentavam condições de habitabilidade.

Em 1985, foi criada a lei que dispõe sobre a Concessão do Direito Real de Uso –

CDRU. Este instrumento reconhece o direito da população permanecer nas áreas

públicas ocupadas, por 90 anos, dando garantias legais aos moradores de

permanecerem no local em que construíram suas moradias. Essa lei, reivindicação

antiga do movimento por moradia, teve importância para o processo de

democratização do acesso à terra urbana no município, como também refletiu no

movimento de reforma urbana. O movimento de moradia exerceu um importante

papel no processo de aprovação dessa lei.

Segundo Mourad, “O reconhecimento do direito de posse, através da CDRU, tornou-

se um marco histórico para a luta dos favelados contra a remoção, garantindo o

direito da terra para quem nela mora”. 9

9 MOURAD, Laila Nazem.Democratização do Acesso à terra Urbana em Diadema.São Paulo: FAU.PUCCAMP, 2000, p.66

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A partir da década de 1990 o processo de crescimento econômico no país foi

interrompido, verificando-se uma profunda crise, com impactos negativos sobre a

produção, emprego, renda, resultantes das políticas econômicas de corte neoliberal

com o objetivo de estabilizar a economia e garantir a inserção do Brasil na nova

ordem internacional.

Na região do ABCDRMM, esses processos de reestruturação produtiva baseada em

políticas neoliberais atingiram duramente vários segmentos industriais que têm

primazia em Diadema, como o metal-mecânico, químico e plástico. Dados do Censo

Econômico e da Pesquisa Socioeconômica realizado em 1995 e 1996 identificam um

aumento da taxa de desemprego, principalmente com a redução do emprego

industrial e um relativo aumento nos setores ligados ao comércio e serviços, que

geram postos de trabalho de qualidade inferior, ou seja, menor rendimento e

relações de trabalho mais precárias.

Em 1994 acontece a revisão do Plano Diretor, em 1996 também é revisada a Lei de

Uso e Ocupação do Solo. Estes instrumentos reguladores do mercado fundiário

reconheceram a cidade real e priorizaram o atendimento às famílias de baixa renda.

O Plano Diretor estabeleceu objetivos e diretrizes para o meio ambiente, infra-

estrutura urbana, equipamentos e serviços comunitários. A Lei de Uso e Ocupação

do Solo consolidou diretrizes existentes no Plano Diretor referentes aos índices

urbanísticos, normas e padrões urbanísticos específicos para as Áreas Especiais de

Interesse Social, entre outros.

Em relação à política habitacional, o Plano Diretor criou e implantou através de Lei

Complementar nº. 25/1994, as Áreas Especiais de Interesse Social – AEIS-1,

compostas de áreas vazias, com o objetivo de criar uma reserva de terras

desocupadas para a produção de moradias de interesse social, proporcionando a

inversão da forma como a cidade foi apropriada pelos interesses especulativos, e as

Áreas Especiais de Interesse Social – AEIS- 2, compostas de áreas ocupadas por

núcleos de favelas, situadas em áreas públicas ou privadas.

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As AEIS vêm reforçar a política de urbanização e o processo de regularização-

CDRU. Essas AEIS são instrumentos da política urbana de Diadema, as quais têm

como objetivo garantir o princípio do uso social da terra e o direito à moradia.

A aprovação das AEIS representava um avanço do ponto de vista técnico e político,

discutido amplamente com os movimentos de moradia, que mais uma vez

desempenharam papel fundamental para sua aprovação, pois a concepção

embutida no Plano Diretor regulamentava o uso social da terra urbana,

reconhecimento da cidade real, e incorporação de outros instrumentos urbanísticos

reguladores do mercado imobiliário.

No Plano Diretor alguns artigos necessitavam ser regulamentados, como os

referentes ao atendimento da demanda para os empreendimentos habitacionais de

interesse social. A demanda a ser atendida em todos os programas habitacionais é

composta pela parcela da população que o mercado formal de produção

habitacional não incorpora como os setores de baixa renda, que compreendemos os

que recebem de 0 a 5 salários mínimo, que moram em favelas a urbanizar, em

conjuntos habitacionais ou bairros degradados, moradores de área de risco,

moradores de rua, idosos, moradores de aluguel. Esta demanda necessitava ser

identificada devido à intensidade do problema habitacional que a cidade

apresentava, no sentido de uma prestação de serviço mais qualificada, com

propostas e investimento neste setor, assim foi instituída (1994) a Lei de Cadastro.

Em 1991, foi criado o Fundo Municipal de Apoio à Habitação de Interesse Social –

FUMAPIS, tendo como principal função a discussão, aprovação e fiscalização da

política habitacional municipal e do orçamento da habitação. Esse Fundo tornou-se

importante para os movimentos de moradia, por intensificar a participação dos

movimentos em espaços institucionais.

Diadema, durante o período de 1982 a 2004, investiu na implantação de infra-

estrutura, na urbanização de favelas e na transformação de sua estratégia de

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regulação urbanística. Realizou a revisão do Plano Diretor, criando os instrumentos

urbanísticos, mencionados anteriormente, definindo a política habitacional com a

participação popular. Entendemos que houve avanços com relação aos problemas

urbanos e habitacionais, mais existem desafios a serem enfrentados pela

municipalidade, pelos movimentos sociais, em razão das transformações no mundo

do capital.

As mudanças do Estado brasileiro intensificadas a partir dos anos 90, em virtude de

todo um processo de reestruturação produtiva, da financeirização do capital, o que

provocou o aprofundamento de várias questões, como o desemprego estrutural, a

terceirização e a precarização do trabalho e a desmobilização do movimento

sindical. As reformas econômicas propostas pelo neoliberalismo, privilegiando o

mercado e propondo a política do Estado mínimo, acarretaram a fragmentação e

redução de recursos para as políticas sociais, a flexibilização dos direitos sociais.

Esses e outros fatores têm que ser levados em consideração para a compreensão

da realidade brasileira e das políticas econômicas e sociais a serem desenvolvidas

por este Estado. Como mostra Behring,

(..) uma reformulação das estratégias empresariais e dos países no âmbito do mercado mundial de mercadorias e capitais, que implica uma divisão do trabalho e uma relação centro /periferia diferenciados do período anterior (...), especialmente com um novo perfil das políticas econômicas e industriais desenvolvidas pelos Estados nacionais, bem como um novo padrão de relação Estado/ sociedade civil, com fortes implicações para o desenvolvimento de políticas públicas. 10

Dados coletados de várias fontes – a exemplo do Plano Diretor que foi revisado em

2002, após a aprovação do Estatuto da Cidade (2001), que teve como objetivo

aperfeiçoar a legislação vigente e avançar nas soluções dos problemas urbanos –

fez uma leitura atual da cidade, revelando a falta de terras vazias, um baixo padrão

construtivo das moradias e as remanescentes ocupações em áreas de proteção de

mananciais.

10 BEHRING, Elaine Rossetti. Brasil em Contra-Reforma: desestruturação do Estado e perda de direitos. São Paulo: Cortez, 2003, p.34.

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A cidade dispõe de apenas 3,5% do território livre, com desigual distribuição de

áreas verdes, uma cidade sem áreas verdes para lazer e recreação da população.

Diadema ainda mantém um perfil industrial de empresas de pequeno porte,

conferindo uma característica diferente das grandes plantas industriais da região. A

reestruturação produtiva, os planos de ajustes neoliberais e a “reforma” do Estado

contribuíram para um quadro no município de redução da oferta de emprego

industrial, gerando desemprego da população. Segundo dados da Pesquisa

Socioeconômica (1995), do total de população ocupada entre 1989 e 1995 há uma

redução de 17%, passando de 76.481 pessoas ocupadas para 65.342, gerando

ainda uma expansão no setor terciário, com acentuada informalização e

precarização do mercado de trabalho.

Segundo dados da Fundação João Pinheiro e do Ministério das Cidades (2004), o

déficit habitacional para o município, com base em dados de 2000, era de 8.716

moradias, incluindo coabitação familiar, domicílios improvisados e rústicos. Os dados

mostram também que a densidade demográfica é altíssima e que a maioria dos lotes

tem mais de uma família moradora, existindo uma alta taxa de ocupação do solo

urbano, com poucas áreas livres para a produção de moradias.

A política urbana de Diadema, através das administrações populares e da pressão

dos movimentos de moradia, caracterizou-se por construir mecanismos que

garantissem a função social da terra e o direito à moradia. Mas frente a esse

contexto de extrema heterogeneidade e desigualdade social, temos no município,

em decorrência de sua extensão territorial e ausência de áreas livres, baixíssima

capacidade de atendimento a uma crescente demanda pelo habitat.

A moradia não se reduz a um mero bem material, mas se articula com outros fatores

culturais, sociais que variam e se transformam com a própria dinâmica da sociedade.

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Temos que analisar a questão habitacional e sua interface com outras políticas

urbanas, com as de transporte, meio ambiente, saneamento, saúde, educação,

cultura, entre outras. Esses aspectos de interfaces devem ser considerados para

alteração deste quadro anteriormente exposto, pois nem sempre o investimento nos

programas de habitação é a única solução para garantir as melhores condições

habitacionais e de habitabilidade.

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Capítulo II

A MORADIA NO BRASIL

“A chamada crise da habitação, que ocupa hoje

um lugar tão destacado na imprensa, não consiste em que a

classe operária em geral viva em más habitações,

superpovoadas e insalubres. Esta crise de habitação não é

peculiar do momento presente; nem sequer é uma das

misérias próprias do proletariado moderno, diferentemente de

todas as classes oprimidas do passado. Ao contrário, afetou de

uma maneira quase igual todas as classes oprimidas de todos

os tempos. Para acabar com esta escassez de habitação não

existe senão um meio: abolir a exploração e a opressão da

classe operária pela classe dominante.” (Friedrich Engels,

Contribuição ao problema da habitação, 1872.)

2.1 – ALGUNS ELEMENTOS PARA A CONTEXTUALIZAÇÃO DA

MORADIA NO BRASIL

As cidades brasileiras vêm se caracterizando por grandes desigualdades nos

padrões de qualidade de vida. As contradições sociais impostas pelo

desenvolvimento do capital monopolista estão impressas na estrutura e na paisagem

urbana.

A carência habitacional está no centro do nosso problema urbano, isto porque

grande parte da população brasileira, por duas razões, não tem acesso à moradia.

Primeiro, pela profunda desigualdade de renda, e segundo pelas condições que

regem a produção capitalista de moradias. Segundo dados do Ministério das

Cidades (2004), há um déficit habitacional quantitativo de 6,6 milhões e um déficit

qualitativo de 15 milhões de moradias que são inadequadas. O crescimento deste

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déficit habitacional está relacionado à forma de inserção de parte da população na

cidade. A escassez e a dificuldade de acesso à moradia por parte das classes

trabalhadoras são problemas decorrentes do sistema capitalista e caracterizam a

desigualdade inerente a esse sistema.

No Brasil, as habitações precárias sempre existiram devido a vários fatores: a

propriedade privada da terra; o processo de acumulação do capital em detrimento da

reprodução da força de trabalho; o processo de industrialização / urbanização, as

migrações. Basta lembrar, no início da colonização brasileira, das senzalas, moradia

dos escravos, e depois a moradia dos trabalhadores assalariados nas vilas

operárias, cortiços e nas grandes favelas.

No dicionário a palavra moradia significa lugar onde se habita. Entendemos que a

moradia deve estar bem localizada no espaço urbano, servida de infra-estrutura

básica (água, esgoto, energia elétrica), com acesso ao transporte, trabalho, escolas,

postos de saúde, áreas de lazer, entre outros serviços que devem ser oferecidos

para a população. O conceito de moradia deve ser muito mais abrangente do que só

o lugar onde moramos.

Segundo Ribeiro e Pechman, três fatores marcam a urbanização brasileira: “As

péssimas condições habitacionais, o encarecimento do preço da moradia e a

segregação das classes e camadas sociais no espaço urbano”. 11

No Brasil, a partir de 1930, o processo crescente de industrialização já iniciado, de

modelo concentrador e hierarquizado, produz uma intensificação no processo de

urbanização, gerando crescimento rápido e intensivo da cidade, nesse caso

especifico aqui, da cidade de São Paulo, que, mesmo antes desse período, já

apresentava problemas com a questão habitacional. A falta de moradias para os

trabalhadores que vinham trabalhar na indústria fez com que ocorresse a expansão

dos loteamentos e a abertura de novos bairros, localizados em lugares distantes do 11 RIBEIRO, Luiz C. de Queiroz. Pechaman Robert M. O que é Questão da Moradia. São Paulo: Brasiliense, 1983, p.4.

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núcleo central da cidade, caracterizados como periferia urbana. Para Maricato, a

periferia urbana é assim caracterizada:

Espaço da residência da classe trabalhadora ou das camadas populares, espaço que se estende por vastas áreas ocupadas por pequenas casas em pequenos lotes, longe dos centros de comércio ou negócios, sem equipamento ou infra-estrutura urbano, onde o comércio e os serviços particulares também são insignificantes enquanto forma de uso do solo. 12

Com a expansão urbana da cidade de São Paulo em direção à periferia, e

posteriormente na direção aos municípios contíguos à capital, a questão da moradia

emerge marcada por grandes transformações econômicas, sociais e políticas. Nesse

processo de expansão, as empresas que antes investiam na moradia dos

trabalhadores – a vila operaria, transferem os gastos com moradia (aquisição ou

aluguel) para os trabalhadores, em razão da crescente mão-de-obra e dos preços

dos terrenos próximos às fabricas terem ficado muito alto.

Os trabalhadores, diante dos custos altos dos aluguéis, dos terrenos e

impossibilitados de adquiri-los, iniciaram em 1930 a sua concentração em áreas

periféricas, fazendo com que surgissem os bairros distantes, afastados dos locais de

trabalho, sem investimentos de infra-estrutura pelo poder público, e nem legislação

que definisse o zoneamento da cidade.

A falta de serviços de saúde, educação, transporte, moradia, lazer, entre outras

políticas, estabelece uma relação diferenciada no processo de produção e

distribuição de bens, expressando desigualdades, tornando visível a segregação

social e espacial das classes trabalhadoras.

Posteriormente, as reivindicações por esses serviços básicos tornam-se bandeira de

12MARICATO, Ermínia. A produção capitalista da casa (e da cidade) no Brasil industrial. São Paulo:

Editora Alfa - Omega, 1982, p.82.

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luta dos movimentos por moradia. A maioria dessas reivindicações não foi atendida

pelo poder público. Já no setor privado, algumas empresas investirão na produção

de moradias para a classe trabalhadora visando ao mercado, que são verdadeiros

cortiços alugados a preços exorbitantes, com o objetivo de obter lucros altos. Outros

promoviam para os funcionários de suas empresas, as vilas operárias. Alguns

fatores que levaram o investimento nesse setor foram: a crescente demanda por

moradia, a valorização fundiária e imobiliária e os incentivos fiscais.

A intervenção estatal aconteceu devido à forma como a produção do espaço urbano

ocorria. O setor imobiliário guardava imensas áreas mais próximas ao centro à

espera de valorização e criava loteamentos longínquos, indiscriminadamente, e

assim sucessivamente, remodelando sem nenhum critério o desenho urbano. Alguns

autores definem esse fenômeno de “retenção especulativa de terrenos”, que ocorre

tanto nas áreas periféricas como nas áreas centrais degradadas, como forma de

assegurar a valorização e a especulação dos terrenos, após essas áreas receberem

investimentos públicos. Segundo Kowarick,

No contexto explosivo do crescimento metropolitano, o poder público só se muniu tardiamente de instrumentos legais para tentar dar um mínimo de ordenação ao uso do solo. (...) a ação governamental restringiu-se, tanto agora como no passado, a seguir os núcleos de ocupação criados pelo setor privado, e os investimentos públicos vieram colocar-se a serviço da dinâmica de valorização-especulação do sistema imobiliário-construtor. 13

Desde os primórdios até os dias atuais a intervenção estatal aconteceu através de

legislações (Código Sanitário-1894; Lei do Inquilinato-1942) entre outras,

privilegiando concepções higienistas, privativas, atuando de forma repressiva contra

a moradia dos trabalhadores. Bonduki assinala que:

O poder público, entretanto, não foi um espectador passivo das condições de moradia dos pobres. Tanto assim que criou uma polícia para vigiá-los, examiná-los e inspecioná-los, e uma legislação para servir-lhes de padrão; porém, pouco fez para melhorar suas moradias, a

13 KOWARICK, Lúcio. A espoliação Urbana. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1993, p.35.

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não ser quando eram chocantes demais – demolindo-as. 14

O Estado brasileiro sempre tratou a questão social, que são expressões das

desigualdades sociais existentes na sociedade capitalista, de forma repressiva,

através de suas legislações, com aparato policial para controlar os trabalhadores e

defender as instituições. A questão social é transformada em caso de policia, ela

não é concebida como demandas a serem atendidas pelo Estado de forma

sistemática, uma vez que o Estado no capitalismo teria também o papel de garantir a

redistribuição dos bens socialmente produzidos, para manutenção e reprodução da

força de trabalho. O Estado no capitalismo monopolista sofreu uma ampliação de

suas funções. Segundo Netto:

(...) a intervenção estatal incide na organização e na dinâmica econômicas desde dentro, e de forma contínua e sistemática. Mais exatamente, no capitalismo monopolista, as funções políticas do Estado imbricam-se organicamente com as suas funções econômicas. 15

O autor ainda ressalta as várias funções diretas e indiretas que o Estado assume:

O elenco de suas funções econômicas diretas é larguíssimo. Possuem especial relevo a sua inserção como empresário nos setores básicos não rentáveis (nomeadamente aqueles que fornecem aos monopólios, a baixo custo, energia e matérias-primas fundamentais), a assunção do controle de empresas capitalistas em dificuldades (trata-se, aqui, da socialização das perdas, a que freqüentemente se segue, quando superadas as dificuldades, a reprivatização), a entrega aos monopólios de complexos construídos com fundos públicos, os subsídios imediatos aos monopólios e a garantia explícita de lucro pelo Estado. As indiretas não são menos significativas; as mais importantes estão relacionadas às encomendas/compras do Estado aos grupos monopolistas, assegurando aos capitais excedentes possibilidades de valorização; não se esgotam aí, no entanto – recordem-se os subsídios indiretos, a preparação institucional da força de trabalho requerida pelos monopólios e, com saliência peculiar, os gastos com investigação e pesquisa. A intervenção estatal macroscópica em função dos monopólios é mais expressiva, contudo, no terreno estratégico, onde se fundem atribuições diretas e indiretas do Estado: trata-se das linhas da direção do desenvolvimento, através de planos e projetos de médio e longo prazos; aqui, sinalizando investimentos e objetivos, o Estado atua como um instrumento de organização da economia, operando notadamente como um administrador dos ciclos de crise. 16 (grifo nosso)

Em razão dessa perspectiva de o Estado administra de acordo como os interesses

14 BONDUKI, Nabil.Origens da habitação social no Brasil. São Paulo: Estação Liberdade: FAPESP, 1998, p.43. 15 NETTO, José Paulo. Capitalismo Monopolista e Serviço Social. São Paulo: Cortez, 2005, p.25. 16 NETTO, 2005:26.

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das classes dominantes, é que intervém nas seqüelas da questão social, mediante

políticas sociais, procurando atender e administrar as demandas oriundas da classe

trabalhadora, ou seja, opera no sentido de possibilitar condições necessárias à

acumulação e à valorização do capital monopolista.

Assim, a partir da década de 1960 ocorre um crescimento da indústria

automobilística, da construção naval, da mecânica pesada, do cimento, do papel e

celulose, aumentando a capacidade de produção siderúrgica. Ao final da década de

1970, temos no país a maior estrutura produtiva, com alto padrão de complexidade e

estruturação da América Latina. Esse processo de crescimento industrial interfere de

tal forma, modificando contundentemente o modelo urbano, contribuindo para uma

maior concentração de renda e um aumento na exploração do trabalho.

O Estado brasileiro assume o programa de financiamento de infra-estrutura para

instalação do parque industrial, em detrimento do atendimento das necessidades da

reprodução da força de trabalho.

As cidades se constituem em importantes mecanismos de reprodução e acumulação

do capital, considerando que a forma de apropriação dessa cidade pelos seus

moradores ocorre de maneira diferenciada. A cidade que deveria ser o lugar, por

excelência, de materialização de direitos coletivos, vê esses direitos transformarem-

se em mercadorias, às quais uma parcela considerável da população não tem

acesso. Vieira aponta uma das conseqüências da fase neoliberal do capitalismo que

é:

(...) a transformação dos serviços sociais que eram direitos sociais e representavam e asseguravam as mínimas condições de vida para as pessoas. Tais direitos transformaram-se em mercadorias, em serviços vendidos no mercado. 17

Enfatizamos que a problemática habitacional está relacionada às questões de ordem

econômica, social e política. Entender a habitação como uma política social

17

VIEIRA, Evaldo. Os direitos e a política social. São Paulo: Cortez. 2004, p.107.

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demanda compreender que esse problema envolve vários agentes, investimentos

públicos, e que o preço da terra urbana constitui fator fundamental para a produção

de moradias para os trabalhadores. A moradia popular sempre foi tratada como uma

mercadoria de difícil acesso para os trabalhadores, pois está relacionada as suas

precárias condições salariais.

Devemos ainda considerar que a moradia subsidiada foi sempre uma reivindicação

dos trabalhadores, embora tenha recebido atenção diferenciada do Estado brasileiro

dependendo da conjuntura econômica, social e política. O não atendimento do

subsídio à moradia por parte do Estado leva os trabalhadores a buscar soluções, na

maioria das vezes precárias, como, por exemplo, as ocupações em áreas de risco, a

autoconstrução de moradias inadequadas, predominando a formação de favelas e

loteamentos irregulares.

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2.2 – A POLÍTICA HABITACIONAL BRASILEIRA

A política habitacional no país tem uma trajetória marcada por mudanças na

concepção e no modelo de intervenção do poder público, como podemos verificar a

seguir.

Até os anos de 1930, as soluções para o problema habitacional eram conduzidas

exclusivamente pela iniciativa privada, que produzia para atender uma demanda

crescente de trabalhadores que se deslocavam no processo de imigração e

migração. Essas moradias, como vimos anteriormente, eram em forma de cortiços,

destinadas para aluguel, e as vilas operárias promovidas pela indústria consistiam

em alternativas construídas para classe trabalhadora.

A forma como era tratada a questão da moradia sofre mudanças provenientes de

vários fatores: primeiro, aos problemas de saúde decorrentes tanto de moradias

insalubres, como da falta de saneamento básico, para atender essa população que

residia próximo ao local de trabalho. A classe dominante, detentora do capital tinha

medo da propagação de doenças infecto-contagiosas. Segundo, a intensificação do

modelo de industrialização que se modernizava, trazendo necessidade de novas

instalações das indústrias nas áreas melhor servidas por serviços e infra-estrutura,

faz com que muitos cortiços sejam demolidos para dar espaço a rodovias, ferrovias,

fábricas. As empresas deixaram de construir as vilas operárias, porque

necessitavam investir seu capital na produção, transferindo para o trabalhador o

custo de sua moradia. Essas mudanças interferem na forma de urbanização da

cidade, passando dos aluguéis nos cortiços, das vilas operárias para a periferização

da cidade.

A partir de 1930, a questão da moradia assume papel preponderante na agenda do

Estado brasileiro e dos empresários, pois era fundamental alterar o modelo de

produção e provisão de moradia para o desenvolvimento da indústria. O custo com

da moradia influía nos salários, no modo de vida e na formação ideológica das

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classes trabalhadoras. Com o agravamento da questão habitacional devido ao

modelo de desenvolvimento econômico adotado, a redução da produção de

moradias pelo setor privado e os altos custos dos terrenos em regiões periféricas

contribuem para o crescimento das favelas, que começaram a ser vistas como foco

de resistência dos trabalhadores. As favelas tornaram-se um elemento estrutural da

cidade, criando impacto no espaço urbano, levando o Estado a intervir na moradia

popular, instituindo um programa de remoção.

Nos anos 30, a política para habitação se deu por meio da criação das Carteiras

Prediais, dos Institutos de Aposentadoria e Pensões, incutindo no trabalhador o

ideário de proprietário de um bem: a casa própria. Essa política não conseguiu

atender o crescimento da demanda, porque grande parte dos recursos foi para

atender faixas de renda alta e aos grupos da estrutura corporativa dos Institutos.

Os governos populistas, que têm inicio a partir do fim da ditadura do governo de

Vargas perdurando até 1964, apostam na idéia de que a sua política habitacional

garantiria os interesses da indústria, controlaria as pressões sobre o salário e

reafirmaria seus compromissos com o trabalhador, difundindo que o Estado estava

promovendo a distribuição da riqueza produzida pelo desenvolvimento econômico.

Os trabalhadores deixariam de ser uma ameaça à ordem capitalista instituída, em

contraposição às idéias socialistas e comunistas. Segundo Vieira “(...) a partir de

1930, o governo brasileiro exerceu seu forte domínio não somente no âmbito da

política econômica, como também no campo da política social, alargando cada vez

mais seus recursos para operar nestas áreas”. 18 A intervenção do poder público

nesse momento demonstrava a possibilidade de formular uma política habitacional

para o país.

No período compreendido entre os anos de 1946 e 1960, a política habitacional

sofre processos de descontinuidade, demonstrando seu caráter contraditório,

influenciada pela política econômica baseada no liberalismo econômico, onde o

Estado não intervém na economia, mas controla e reprime o trabalhador. Assim, a

18

VIEIRA, Evaldo. Estado e Miséria Social no Brasil: de Getúlio a Geisel. São Paulo: Cortez, 1987, p.12.

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sucessiva intervenção estatal para atender as reivindicações por moradia torna-se

ineficaz.

Em 1946, no governo Dutra, foi criado o primeiro órgão de âmbito nacional para

gestão da política de habitação social, a Fundação da Casa Popular (FCP). Este

órgão nasceu mutilado, pois na sua aprovação foi retirado elementos primordiais

para o desenvolvimento de uma política, a exemplo: as fontes permanentes de

recursos para o financiamento de moradias, o prazo de resgate dos empréstimos era

superior a 30 anos. Visava articular a política urbana com a política de moradia e a

centralização da política habitacional. Mas durante sua existência desenvolveu

ações de caráter clientelista, populista, pontuais, tendo pouco poder e recursos para

desenvolver a política de habitação. Posteriormente houve a tentativa de transformar

a FCP em banco hipotecário, porque como banco a política habitacional poderia

tornar-se auto-sustentável, mas esta idéia não foi adiante e a construção de moradia

continuou dependendo dos institutos de pensão e aposentadoria.

Com a intensa urbanização nas décadas de 1950, 1960 até 1970, o cenário da

cidade sofre grandes transformações, com ampliações das áreas centrais, aberturas

de grandes avenidas, construções de edifícios, paralelamente vai haver a falta de

moradias para os trabalhadores. Estes não acessam ao mercado formal de moradia,

e passaram a morar em favelas ou em loteamentos na periferia da cidade, longe dos

serviços básicos e do trabalho.

Em 1956 é criado mais um órgão, o Serviço Especial de Recuperação de Favelas e

Habitações Anti-Higiênicas (SERFHA), no governo de Juscelino,

com o objetivo de urbanizar as favelas, ampliando sua política junto aos cortiços.

A FCP e o SERFHA desde a sua criação até sua extinção não deu conta da política

urbana / habitação, uma vez que o processo de urbanização exigia políticas sociais

que atendessem à demanda que estava chegando à metrópole. A política adotada

pelo Estado foi a de não assumir o controle sobre a produção do espaço urbano,

ignorando a expansão dos loteamentos periféricos, irregulares, precários. Outros

mecanismos dessa política o não-financiamento, através de subsídios aos

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trabalhadores para construção de sua moradia, passando estes a construírem sua

casa por autoconstrução, ou seja, sem orientação técnica e sem financiamento, pois

o orçamento público destinado à habitação sofre contenção. Enquanto isso, o

orçamento público para construção do parque industrial era incentivado.

Nesse cenário, as políticas sociais ocuparam o segundo plano na agenda dos

governantes. O processo de industrialização no país era intensificado com grandes

investimentos do capital estrangeiro, e investimentos públicos subsidiando o capital

estrangeiro e nacional, através das obras de infra-estrutura para implantação das

indústrias estrangeiras e nacional.

A criação de um banco da habitação retorna à cena política no governo de Jânio

Quadros. Nesse período, as bandeiras por reformas nas políticas sociais ganharam

corpo empolgando setores mais amplos das camadas populares. Esse governo

construiu documento propondo a criação do Instituto Brasileiro de Habitação (IBH) e

realizou empréstimo junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) na

ordem de 80 milhões de dólares. A meta era a construção de 100 mil casas;

planejou a construção de conjuntos habitacionais simples, de chão de concreto, sem

revestimento, sem portas internas. Mas essas metas propostas pelo governo não

foram cumpridas.

No plano trienal do governo Goulart a política habitacional volta a ser contemplada,

com investimento previsto para formação de capital fixo, destinando 12,4% do total

de 373 bilhões de cruzeiros orçado para a construção de residências. Em 1963, o

governo propôs ao Congresso uma reforma urbana, ou seja, uma legislação que

regulasse o desordenado crescimento urbano e que facilitasse o acesso da classe

trabalhadora à moradia. Segundo Vieira,

(...) a política social dos dois governos se reduziu a uma série de decisões dominantemente setoriais, particularizando a ação pública na Educação, na Saúde Pública, na Habitação Popular, na Previdência e na Assistência Social. Não houve alteração de essência na política

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49

social, onde, ao contrário, predominaram o urgente e o atenuante. 19

O modelo da política habitacional implementado a partir de 1964 tinha que enfrentar

o problema do crescimento populacional urbano e o problema do baixo poder

aquisitivo dos trabalhadores. Os ideólogos dessa política necessitavam de

legitimação social junto à população, dessa forma, vislumbraram que na construção

da política habitacional, quando o trabalhador tornasse proprietário de sua casa, não

iria perturbar a ordem estabelecida e nem depredar a propriedade de outrem. Além

de gerar novos empregos dinamizando os setores da indústria de material de

construção e da construção civil.

O governo militar expressa essa política na Lei 4.380/64, que instituía o Plano

Nacional de Habitação, Banco Nacional de Habitação - BNH e Serviço Federal de

Habitação e Urbanismo. O Banco Nacional de Habitação - BNH, órgão central da

política de habitação e saneamento, baseava-se na gestão de uma política

centralizada, sua receita provinha de 1% da folha de pagamento dos salários de

todos os empregados com regime da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), da

aquisição de letras imobiliárias, de dotações orçamentárias e doação de terrenos

pela União. Os dirigentes do regime militar optaram pela construção de grandes

conjuntos habitacionais, construídos distantes e sem infra-estrutura, com programas

de remoções de favelas. O BNH foi criado para atender prioritariamente à população

de renda mais baixa, mas propunha correção monetária dos contratos de interesse

social, mostrando assim sua contradição uma vez que se vivenciava um contexto de

arrocho salarial e um crescimento do exército de reserva. De cunho autoritário e

excludente, quando do não-atendimento a uma grande parcela dos trabalhadores,

que não dispunha de renda mínima para garantir o pagamento do financiamento.

Em 1966 foi criado Fundo Garantia de Tempo de Serviço (FGTS), que estabeleceu a

constituição de um fundo, administrado pelo BNH, com arrecadação compulsória

mensal, através da folha de pagamento, de 8% das remunerações pagas aos

empregados. Em contrapartida pelo uso do fundo no financiamento da construção

19

VIEIRA, 1987, p.184.

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civil, sobre a conta do trabalhador seriam acrescidos juros e correção monetária.

Nesse período, foi implantado também o Sistema Brasileiro de Poupança e

Empréstimo (SBPE), órgão que tinha como objetivo a captação de recursos junto a

cadernetas de poupança e venda de letras imobiliárias. Estas duas formas de

arrecadação trazem momentaneamente um aquecimento para o BNH. Durante sua

existência como órgão responsável pela política habitacional, vários problemas

foram apontados e mudanças foram realizadas, sem trazer resultados significativos,

pois o balanço final da atuação do banco durante o regime militar é de financiamento

de 4,3 milhões de moradias, número inferior ao déficit habitacional diagnosticado em

1964, que era de 7 milhões, pelo então governo de Castelo Branco. Entretanto, este

não conseguiu superar a crise do Sistema Financeiro de Habitação - SFH, que

acabou extinto em 1986.

Segundo Bonduki, este modelo de política econômica do regime militar estava

centrado na idéia que ele denomina “central-desenvolvimentista”. Adotou o autor

esta denominação, por apresentar um conjunto de características que deixaram

marcas importantes na estrutura institucional e na concepção da política de

habitação no país, assim definidas:

(...) autoritarismo na concepção das políticas e nas intervenções; centralização da gestão e ausência de participação - a qualquer nível –dos usuários e da sociedade em geral; desrespeito ao meio ambiente e ao patrimônio cultural numa lógica em que predominou o mito da modernidade; priorização do transporte individual; preferência pelas grandes obras, muitas vezes canalizando recursos públicos para empreiteiras e, finalmente, priorização, nos financiamentos habitacionais, para os setores de renda média. 20

Durante todo o período da ditadura militar (1964-1985), o quadro da política

habitacional foi marcado por medidas que visavam à legitimação do governo militar.

Inicialmente a diretriz dessa política apontava para o atendimento às classes

trabalhadoras, mudando de foco em razão da necessidade de atendimento à classe

média e alta, visto que as exigências dos programas para acessar a moradia só

beneficiavam estas duas classes. Os programas de remoções de favelas desse

governo são vistos como repressão política, pois as favelas eram vistas pelos

20 BONDUKI, 1998, p.319

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militares como foco de resistência, de rebeldia.

Os reflexos econômicos dessa política habitacional nos programas de habitação,

nas atividades econômicas geraram a criação de novos empregos na área da

construção civil, possibilitando a expansão da mão-de-obra e, conseqüentemente, a

ampliação do consumo. Mas as políticas sociais implantadas durante o regime militar

contribuíram muito pouco para a expansão de benefícios e serviços, não alterando o

quadro de desigualdades socioeconômicas, mais reforçando o processo fortemente

concentrador da distribuição de renda e a perpetuação de práticas políticas

atrasadas e conservadoras. Soares afirma que as políticas sociais “(..) no período

compreendido de 1964 a meados da década de 70 sofreu transformações radicais

no seu arcabouço institucional e financeiro (...)”. 21

Segundo ainda sua análise, essas políticas sociais tomam como base os seguintes

princípios: “(...) 1. extrema centralização política e financeira no nível federal das ações sociais do

governo; 2. fragmentação institucional; 3.exclusão da participação social e política da população nos

processos decisórios; 4. autofinanciamento do investimento social; 5.privatização.”22

Ao final desse período da ditadura militar, inicialmente duas questões vão interferir

no formato das políticas sociais da década de 1980: o aprofundamento da crise

econômica, incidindo sobre o financiamento e o gasto social; e o reordenamento das

políticas sociais, no processo de transição democrática com a organização de vários

movimentos sociais, combatendo a política econômica desenvolvida e reivindicando

direitos: saúde, educação, transporte, emprego, salários; e o direito à moradia. Os

movimentos ligados à questão urbana, voltam à cena política reivindicando o direito

à moradia, sendo esta a principal bandeira de luta desse movimento, que tem

grande aceitação da população residente em favelas, palafitas e assentamentos

subnormais que cresceram muito durante esse quadro de crise econômica, social e

política do país.

21 SOARES. Laura Tavares Ribeiro, Ajuste neoliberal e desajuste social na América Latina. Petrópolis, RJ: Editora Vozes, 2001, p.209. 22 Ibid. p.209.

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Na década de 1980, o país passa por um quadro de crise estrutural e histórica que

configura o esgotamento do modelo do “Estado Desenvolvimentista”23 e a crise

financeira do Estado decorrente do processo de endividamento interno e externo. A

política econômica adotada no período de 1980 é de cunho recessivo com cortes

nos gastos sociais, de determinações externas, recomendadas pelo Banco Mundial

e Fundo Monetário Internacional. Outro aspecto nesse período é a ocorrência de

grandes mobilizações das classes trabalhadoras, no sentido da retomada de sua

presença no cenário político do país e de suas ações interferirem na agenda política,

a exemplo da Constituinte de 1988 que foi um processo de disputa de projetos

antagônicos, de mobilização e organização do movimento operário e popular, que

apresentou várias emendas. O texto constitucional expressa esta disputa pela

hegemonia, pois manteve traços conservadores e formulou avanços, principalmente

no capitulo referente aos direitos sociais. No momento dessa crise econômica e

política ocorre um avanço do movimento sindical e popular.

No Brasil, a estrutura industrial montada no período do crescimento econômico

apresentava sinais de esgotamento, o mercado de trabalho na indústria sofreu

redução com fechamento de postos de trabalho. Os processos de trabalho que têm

início induzem à flexibilização e precarização da estrutura ocupacional, produzindo

um contingente cada vez maior de trabalhadores no mercado informal, com total

ausência de proteção social.

Esses fatores estruturais, econômicos e políticos são responsáveis pelo

agravamento das questões sociais, e pela redução nos gastos sociais gerando a

idéia de enxugamento do Estado. Nesse contexto, há também uma tendência

apontada de redução do ritmo do crescimento urbano, embora já tivesse havendo

concentração progressiva da população nas metrópoles.

O BNH criado (1964) como gestor da política habitacional, ao longo dos anos

transformou-se em um banco financiador da política habitacional, e, ainda que não

23 Sobre Estado desenvolvimentista, vê Soares em Ajuste neoliberal e desajuste social na América Latina, obra já citada nesta dissertação.

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atendesse à demanda de interesse social, delegou responsabilidade para a

execução dessa política habitacional à iniciativa privada, consolidando o modelo

baseado na lucratividade.

Com o Sistema Financeiro de Habitação também não foi diferente. Sua política não

garantiu a redistribuição de bens como preconizava, pois os critérios de

atendimento, juros, forma de pagamentos, entre outros critérios adotados, não

permitiram o acesso das famílias com poder aquisitivo de zero a três salários

mínimos à moradia. Esse órgão passou a apoiar a iniciativa privada através de

financiamento para a construção civil, com grandes investimentos para moradia da

classe média e alta, que garantisse lucratividade.

A política habitacional da chamada “Nova Republica” (1985/ 1989) parte do

diagnóstico acima apresentado, concluindo que a política desenvolvida

anteriormente pelo Estado tinha proporcionado um distanciamento entre seus

objetivos iniciais de atendimento à população de baixa renda e um sistema de auto-

sustentação financeiro falido. Nesse sentido, foram propostas reformulações no

SFH e no BNH e a criação do Ministério do Desenvolvimento Urbano para coordenar

a política habitacional e de saneamento.

Nesse período acima referido foi marcado por vários programas habitacionais que

propõem a permanência das famílias em áreas ocupadas através da urbanização

das favelas, com participação popular; a erradicação das submoradias, sendo tais

programas direcionados para a população de baixa renda. A política habitacional

que era anunciada como resgate da dívida social com a população, mais uma vez se

mostrou incapaz de produzir moradias para a classe trabalhadora.

A crise do Sistema Financeiro de Habitação - SFH e a extinção do Banco Nacional

de Habitação - BNH criaram um período de instabilidade na política habitacional,

tanto pela fragmentação institucional e a redução significativa dos recursos

disponibilizados para investimento na área, quanto pela andança da pasta

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responsável pela política de habitação pelos vários ministérios, desde 1985.

Todo esse período de fim de regime militar é marcado do ponto de vista econômico,

inicialmente pela recessão, aumento de inflação, crise da dívida externa e,

posteriormente, por uma política de crescimento econômico associado à inflação,

traçada nos vários planos econômicos de estabilização de linhas ortodoxa ou

heterodoxa.

Esses fatores da crise da política econômica da Nova República têm conseqüências

diretas na população brasileira, com uma crescente onda de pauperização,

visualizada nas mudanças no mercado de trabalho com o crescimento do trabalho

informal, a terceirização de serviços industriais, o aumento da participação das

mulheres no trabalho em ocupações de baixa qualificação. A perda do

assalariamento e a redução automática de trabalhadores vinculados à Previdência

Social, e, conseqüentemente, a redução de sindicalização. No caso da habitação, a

falência desse modelo econômico e da política econômica da ditadura militar

contribuíram para o grande crescimento das favelas, dos loteamentos clandestinos,

o que denunciava a ausência de uma política habitacional voltada para a população

de baixa renda.

A partir do final dos anos 70 ocorrem enormes avanços organizativos e políticos dos

trabalhadores brasileiros, como as grandes mobilizações pela Anistia, o Movimento

contra a Carestia, Movimento dos Desempregados, as greves do ABC, reconstrução

da União Nacional dos Estudantes (UNE), a criação da Central Única dos

Trabalhadores (CUT), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) e a

criação ou legalização dos partidos de esquerda.

Vieira escreve que no período de redemocratização do país,

(...) os movimentos de base, de natureza civil, formados por associações de moradores de bairro, sociedades de amigos de bairro, associação de favelados e de outro tipo, lutaram por melhores condições de vida. A população precisava de habitação, de rede de esgotos e de

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água, de escolas, de coleta de lixo, de limpeza de ruas, de iluminação, de asfaltamento e de creches (...) 24.

O processo de redemocratização contribuiu para a renovação de novos atores

sociais, impulsionando o reaparecimento do movimento organizado de moradia,

articulando a construção deste com base nacional. Algumas das suas principais

reivindicações, como: a posse da terra, a urbanização das áreas ocupadas,

contrariando a remoção das favelas, foram apresentadas à sociedade e aos

governantes, através de passeatas, documentos reivindicativos e de novas

ocupações em áreas públicas e particulares. O objetivo era reivindicar proporcionar

moradias para os trabalhadores e suas famílias, para um futuro atendimento pelo

Estado.

Este e outros fatores já citados anteriormente contribuíram para o crescimento de

áreas ocupadas por famílias dos trabalhadores.

É, nesse contexto de democratização e de organização do movimento nacional de

reforma urbana, que o tema da reforma urbana é retomado com uma articulação

popular, envolvendo setores da sociedade brasileira como os movimentos sociais e

profissionais que trabalhavam com a questão urbana. Em 1985, é criado o

Movimento Nacional da Reforma Urbana-MNRU, com o objetivo de intervir na

reformulação da Constituição Brasileira, propondo princípios para a construção de

uma política urbana e habitacional comprometida com a democratização da gestão,

garantindo a eqüidade e justiça social.

Como resultado dessa mobilização, a Constituição Federal de 1988 pela primeira

vez instituiu um capítulo específico, título VII, capítulo II, artigos. 182 e 183,

referentes à política urbana, os quais definem três eixos fundamentais para nortear

essa política, que são: a função social da propriedade e da cidade, que significa o

uso socialmente justo e equilibrado do espaço urbano; a gestão democrática da

cidade significa o controle e a participação da sociedade de forma direta e 24

Vieira, Evaldo. Brasil: do golpe de 1964 à redemocratização. In: Viagem incompleta. A experiência brasileira (1500-2000): a grande transação. São Paulo: Editora SENAC, 2000, p.210.

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representativa, fortalecimento e autonomia das organizações populares e

administrações públicas; e o direito à cidade e à cidadania; afirma o direito de

acesso aos bens e serviços que garantam condições de vida urbana, mas também

como direito dos cidadãos à informação e à participação política na produção dos

destinos da cidade. Aqui, no momento de intervir politicamente e organizadamente,

os segmentos populares atuaram como sujeitos coletivos, passando a ser atores

ativos no processo de construção da política de habitação de interesse social.

Posteriormente, foi constituído o Fórum Nacional da Reforma Urbana, que tem na

sua composição diferentes movimentos sociais, associações, sindicatos,

organizações não-governamentais, com o objetivo de construção de uma agenda de

luta unificada, inserindo diversas formas de iniciativas populares.

Assim, o Movimento Nacional de Reforma Urbana com a intenção de enfretamento

das políticas habitacionais produzidas pelo Estado, caracterizadas pela

desarticulação institucional, tenta traduzir para o plano institucional uma política de

habitação construída a partir dos movimentos populares, através da emenda popular

de reforma urbana, que procura articular três aspectos básicos: o acesso a posse da

terra; a necessidade de instrumentos que democratizassem o uso do solo urbano e

as formas de gestão democrática da cidade. Esses princípios já estão em parte

incorporados na Constituição Federal de 1988.

Esta Constituição redefiniu as competências das esferas federativas, o que contribui

para o processo de descentralização Essas alterações fazem os municípios

assumirem uma co-responsabilidade, possibilitando o aparecimento de experiências

que traduzem modificações profundas na política habitacional e na forma de

ocupação da terra, com grande participação das comunidades.

A aprovação do capítulo II, título VII da Constituição Federal de 1988, no que tange

ao conteúdo da política urbana foi marcada por embates e pressões, entre o

Movimento Nacional pela Reforma Urbana versus os segmentos da sociedade

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comprometidos com o capital imobiliário. Ocorreram avanços, mas a lei aprovada

dependia de regulamentação.

Em 2001, o governo federal aprova 11 anos depois o Estatuto da Cidade - Lei

10.257/01, que regulamenta os instrumentos urbanísticos, tornando obrigatória a

construção de Planos Diretores que incorporem os princípios constitucionais em

municípios com mais de 20.000 habitantes.

O Movimento Nacional de Moradia, através do Fórum de Reforma Urbana

encaminha uma proposta de projeto de lei de iniciativa popular (1992), subscrito por

1 milhão de eleitores, ao Congresso Nacional para criação do Fundo Nacional para

Moradia, que diante de muitas pressões realizadas pelos movimentos transformou-

se no Projeto de Lei 2710/92. Este projeto aponta na perspectiva de se contrapor ao

projeto neoliberal que se articulava num desmonte ao fundo público, caminhando

para a privatização das políticas sociais. Esse fundo público acima prevê a criação

de fundos estaduais e municipais, a criação dos Conselhos da Cidade nos três

níveis de governo, e que estes sejam espaços democráticos de discussão e

proposição da política de habitação. Estabelece ainda a construção de planos de

habitação como forma de explicitar a política de habitação e de acessar os recursos

dos fundos, como também as Conferências da Cidade.

Nos anos 1990 o cenário brasileiro é caracterizado pelas conseqüências da

reestruturação produtiva, desmonte do parque industrial, precarização das relações

de trabalho, desemprego, fracassos dos sucessivos planos econômicos que visavam

combater a inflação, cortes nos gastos públicos, pelo programa de privatizações,

abertura unilateral do mercado brasileiro e a redução das tarifas aduaneiras. Behring

ressalta que esse cenário é construído na década anterior, de 1980, mas

consolidou-se precisamente em 1989, quando da realização do seminário que

culmina com o conhecido conjunto de ações para América Latina, denominado

Consenso de Washington.

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Nesse contexto, o governo Collor tenta seguir o acordado com mais um plano

econômico de combate à infração, mas sem sustentação; fez uma reforma

administrativa sem precedentes com desmonte de vários órgãos públicos;

proporcionou reformas no Estado orientando suas ações para o mercado, fazendo

parte da chamada modernização. Para a política de habitação foi formulado o Plano

de Ação Imediata para Habitação (PAIH), sem nenhum impacto na problemática

habitacional. O principal recurso financiador – FGTS- da política de habitação foi

dilapidado, resultando mais uma vez o descaso com a política habitacional.

A questão social nesse governo foi de cunho clientelista, no caso específico da

política de habitação não ocorreu nenhum avanço.

No governo Itamar houve um compromisso com a destinação de recursos para a

conclusão de obras, lançou os programas: Habitar Brasil e Morar Município, cujos

recursos seriam oriundos do Orçamento e do Imposto Provisório sobre

Movimentações Financeiras-IPMF.

No governo Fernando Henrique Cardoso as reformas do Estado também se

articulam com o processo de mundialização do capital, com a mediação dos

interesses da elite econômico-financeira brasileira e do poder do próprio Estado.

O Plano Real (1994) que tinha como meta a estabilização financeira do país,

abaixando a inflação, o que significaria a retomada do desenvolvimento e a inserção

do país na economia internacional, garantia de acesso ao “primeiro mundo”. Em

torno dessa proposta foi realizada uma aliança de classes, com grande apoio da

mídia, que levou à vitória eleitoral de centro-direita, com o objetivo exclusivo de

concretizar o acordo firmado internacionalmente, como já citado anteriormente – o

Consenso de Washington - que tinha como solução reformas neoliberais

apresentadas como propostas modernizadoras, contra o anacronismo das estruturas

econômicas e políticas do país.

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A relação deste governo com os movimentos sociais organizados tinha como ideário

o combate direto aos sindicatos, aos movimentos sociais, através do não-

atendimento das reivindicações dos trabalhadores, e uma campanha de

desmoralização dos servidores públicos. Segundo Oliveira, no governo de FHC a

tática utilizada para enfrentar os sindicatos e movimentos foi o de “desmoralização

da fala, do discurso (...) e através dela a destruição da política, a fabricação de um

consenso imposto, ao modo das ditaduras”. 25

No governo de Fernando Henrique Cardoso, a política de habitação não teve

diretrizes nacionais, a Secretaria Nacional de Habitação foi subordinada ao

Ministério de Planejamento e Orçamento. Posteriormente foi criado um outro órgão,

a Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano, vinculado à Presidência da

Republica, que se responsabilizou pelas instituições ligadas à política habitacional

até 2003. Nesse governo, foi criado o Conselho Nacional de Política Urbana que não

chegou a ser implantado por total falta de interesse.

Como já exposto anteriormente, foi neste governo aprovado o principal instrumento

de regulação urbana, o Estatuto da Cidade, que traduz no seu conteúdo o

reconhecimento da função social da cidade e da propriedade imobiliária, oferecendo

oportunidades para os governos locais, passando a combater a espoliação urbana

através dos instrumentos contidos nessa legislação. O Plano Diretor é o instrumento

básico da política urbana e habitacional, que deve garantir a todos os moradores do

município um lugar adequado para viver com dignidade, com acesso à moradia,

saneamento, transporte, trânsito seguro e serviços urbanos, devendo envolver na

discussão todos os segmentos da sociedade.

Essa instabilidade e a “falta” de planos e programas de moradia popular nesses

governos revelam o compromisso com outras prioridades, isto é, com as classes

dominantes externa e interna, ligadas principalmente ao capital financeiro e ao

pagamento da dívida externa. Como exemplo cabal desse cenário, foi criado em

25 OLIVEIRA, Francisco de. Os sentidos da democracia: Políticas do dissenso e Hegemonia Global. Petrópolis: RJ, 2000, p.80.

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1995 o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema

Financeiro (PROER), para atendimento a bancos privados, através de recursos

públicos.

Este projeto neoliberal implantado no país propõe ainda o encolhimento do setor

público e a ampliação do privado, justificando a necessidade de corte nos gastos

sociais, da realização de reformas sociais, chamando a sociedade civil para assumir

acordos de cooperação, de solidariedade, através do voluntariado e de organizações

não-governamentais, que visem ao atendimento das necessidades dos “excluídos”.

Essa é a lógica de como deve se comportar o Estado no modelo neoliberal, segundo

a qual se decreta a falência do Estado, visto como incapaz de formular política

macroeconômica e identifica a necessidade do equilíbrio das finanças públicas como

indispensável ao combate à inflação. A necessidade de redução de gastos públicos,

os serviços sociais são transformados em mercadoria e o trabalhador em mero

consumidor, temos aqui o Estado Mínimo.

O ex-embaixador do Brasil Paulo Nogueira Batista escreveu um texto onde

apresenta uma radiografia da articulação feita em 1989, denominada Consenso de

Washington onde faz uma analise da proposta de Estado mínimo proposto no

documento:

Fala-se em emagrecer o Estado para torná-lo mais eficiente. Mas o que parece se pretender, na verdade, é reduzi-lo a níveis tão ínfimos que desorganizariam a máquina estatal e podem comprometer até a sua missão clássica de provedor de segurança contra ameaças internas à ordem pública ou externas à integralidade territorial. 26

A tendência dessa política neoliberal é a prevalência da lógica do mercado sobre

interesses do capital internacional, seguindo as imposições dos vários acordos

firmados com o Fundo Monetário Internacional-FMI, o que implica redução de gastos

com a política social e a flexibilização de direitos conquistados. A conseqüência

26 BATISTA, Paulo Nogueira. O Consenso de Washington: A visão neoliberal dos problemas latino-americanos. São Paulo: Gráfica e Editora Peres Ltda, 1994, p.29.

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dessa política econômica e social é a inacessibilidade desses serviços pela classe

trabalhadora, empobrecida devido ao aumento do desemprego, privatização dos

serviços e a perda da capacidade de empregabilidade.

Dentro desse quadro de mudanças estruturais, aconteceram profundas

transformações nas condições e na dinâmica das classes trabalhadoras, nas suas

organizações sindicais e nos movimentos sociais, que vinham se fortalecendo no

período anterior.

Em 2003 a política econômica de contenção dos gastos públicos continua em vigor,

essa política, além de reduzir a capacidade de o Estado investir, é um instrumento

de concentração de renda. O Brasil apresenta grandes desigualdades do ponto de

vista regional, da renda, do acesso a terra, às políticas sociais, aos bens

socialmente produzidos, esta é uma divida social que mais aumenta. Segundo o

Instituto de Estudos Socioeconômicos (INESC), dados de 2004, esta divida estava

“em torno de 7,2 trilhões, ou seja, quase 10 vezes a atual dívida financeira pública”. 27

A continuidade da política econômica desenvolvida por governos anteriores, no

governo Lula (2003), torna-se um cenário preocupante com relação ao atendimento

à dívida social para com os trabalhadores brasileiros. Como podemos diagnosticar é

que as metas de inflação e de superávit primário e a elevada taxa de juros indicam o

comprometimento da política econômica com a financeirização da riqueza do país e

a concentração da renda.

Pochmann, em seu artigo “Finanças contra o povo”, publicado em novembro de

2005, escreve que “Em 2004, a área social gerou um superávit em suas contas que

permitiu financiar 56,5% do superávit total da contas públicas“. 28

27 Publicação do Instituto de Estudos Socioeconômicos. INESC. Junho/2005. 28 POCHMANN, Marcio. Finanças contra o povo. Revista Fórum, São Paulo: Publisher Brasil, nº. 32, 2005, p.13.

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Com percebemos, é desproporcional o montante de recurso que retorna aos

serviços públicos prestados e o que é consumido com a rolagem e amortização da

dívida pública. Essa transferência aprofunda a distribuição de renda do país e

contribui para o aumento da dívida social, pois drena os recursos orçamentários que

deveriam ser investidos em políticas de combate às desigualdades e à pobreza.

Esse dado mostra que é fundamental exigir do poder público, através dos

movimentos sociais, a necessidade que os governantes façam uma inversão de

prioridades, pois cerca de 20 milhões de pessoas têm renda muito baixa, não têm

onde morar ou moram em condições precárias, não têm acesso a várias políticas

sociais, reproduzindo historicamente uma fissura social e espacial.

Deve-se compreender que a política urbana é uma política social, e que a

construção desta traz à tona primeiramente o enfrentamento do direito à propriedade

fundiária, altamente concentrada no Brasil. Segundo, que o núcleo dessa política

social está relacionado ao consumo de bens e serviços coletivos, necessários tanto

ao processo produtivo, como à reprodução da força de trabalho e da sociedade de

classes.

A política social consiste em estratégia governamental e normalmente se exibe em forma de relações jurídicas e políticas, não podendo se compreendida por si mesma. (...) a política social é uma maneira de expressar as relações sociais, cujas raízes se localizam no mundo da produção. Portanto, os planos, os projetos, os programas, os documentos referentes em certo momento à educação, à habitação popular, às condições de trabalho e de lazer, à saúde pública, à Previdência Social e até à Assistência Social não se colocam como totalidades absolutas.29

Em sua maioria as ações, os planos, os projetos e os programas desenvolvidos

nessa área da política habitacional foram desarticulados, centralizados e

descontínuos, apresentando incapacidade de atender à população de baixa renda.

A análise da política urbana e habitacional realizada pelo governo Lula constatou

que a ineficiência ou a ausência de uma política urbana e de habitação, o déficit

habitacional quantitativo e qualitativo, a falta de subsídios para financiamento de

29 VIEIRA, 2004, p.142/143.

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moradias, por mais de 20 anos, levaram a criação do Ministério das Cidades, órgão

destinado à gestão pela Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, responsável

pelas políticas de habitação, saneamento e meio-ambiente, transporte e mobilidade

urbana, antiga reivindicação dos movimentos sociais que lutam por um espaço de

interlocução com o poder público, com o objetivo discutir e aprovar uma política de

desenvolvimento urbano para o Brasil, incorporando e articulando com as demais

políticas sociais.

Em 2003, o Ministério das Cidades convocou a I Conferência Nacional das Cidades,

que foram antecedidas de Conferências Municipais e Estaduais. Estas conferências

possibilitaram uma discussão nacional das políticas de habitação, saneamento e

meio ambiente, transporte e mobilidade urbana no sentido de fornecer diretrizes

para a construção de uma política nacional com a participação da sociedade. Nessa

Conferência foi eleito o Conselho Nacional das Cidades que tem na sua composição

representantes governamentais, do movimento de moradia, agentes financeiros,

agentes imobiliários.

Outro importante instrumento criado recentemente foi a Lei 11.124, de 16/06/2005,

que teve como base o primeiro projeto de lei do Fundo Nacional para Moradia

Popular, que, por causa das grandes mobilizações, recebeu uma emenda

substitutiva decorrente de vários acordos entre o Governo Federal, Fórum Nacional

de Reforma Urbana e a Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara de

Deputados.

Essa Lei dispõe sobre o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social, Fundo

e o Conselho Gestor Nacional de Habitação de Interesse Social. O Sistema Nacional

de Habitação de Interesse Social, novo marco regulatório da política de habitação,

divide-se em dois subsistemas. São eles: o Sistema Nacional de Mercado, sendo

composto por uma rede de agentes públicos e privados de produção e de

financiamento imobiliário, e o Sistema Nacional de Habitação de Interesse Social –

SNHIS, que tem como meta articular as ações de promoção de moradia digna,

buscando garantir a ampliação dos recursos para a faixa de renda de 0 a 5 salários

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mínimos, e que tais recursos sejam de acesso de forma descentralizada, devendo

ainda estabelecer prioridades melhorando o planejamento para reduzir o déficit

habitacional, numa gestão nos três níveis de governo,

Convém ainda ressaltar que toda abordagem sobre a questão urbana, o processo de

urbanização e o modelo de desenvolvimento econômico, político e social do Brasil

torna-se fundamental para refletir sobre a Política Nacional de Habitação-PNH,

aprovada em 2004, que descreve inicialmente a concepção de desenvolvimento

urbano integrado: “(...) habitação não se restringe à casa, incorpora o direito à infra-

estrutura, saneamento ambiental, mobilidade e transporte coletivo, equipamentos e

serviços urbanos e sociais, buscando garantir o direito à cidade". 30

Essa compreensão da moradia e cidades integradas, do campo e cidade, é

importante para estabelecer uma relação entre as políticas sociais que propiciem

uma efetiva descentralização e democratização da gestão, efetivando-se uma

verdadeira reforma urbana no país. Nesse sentido, o direito à cidade deve ser o eixo

articulador fundamental de qualquer política na área de habitação.

A questão fundiária também aparece na Política Nacional de Habitação, do governo

Lula o que nos remete a pontuar que a regularização do terreno – imóvel - é um

direito básico para a garantia de moradia com dignidade e qualidade de vida. A

política fundiária deve estar articulada com a política habitacional.

Anterior à aprovação da política de habitação a situação do Brasil, no que se refere

à moradia, entre 1991 e 2000 houve um aumento de 22,5% do número de favelas.

Enquanto os domicílios cresceram 1,01% em todo o país, os domicílios em favelas

cresceram 4,18% 31. Nesse período, a aplicação dos recursos sob gestão federal

estava fortalecendo a concentração da renda no país, pois a maior parte era dirigida

para as faixas de renda acima de 5 s.m, enquanto que 92% do déficit habitacional

está abaixo dessa faixa. 30 MINISTÉRIO DAS CIDADES. Política Nacional de Habitação. Brasília, 2004, p. 12 31 Conforme dados do IBGE.

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Ressaltamos a importância da aprovação da Política Nacional de Habitação em

2004 que trouxe uma mudança de paradigma que condiz com a linha de

pensamento que durante anos o movimento da reforma urbana defendeu e defende.

Mas, diante do exposto anteriormente sobre a política econômica de superávit

primário, segundo o qual o governo passa a ter como objetivo arrecadar mais do que

gasta, visando fundamentalmente o pagamento da dívida externa. Essa política

econômica de orientação do FMI, adotada desde 1999 e de continuidade no governo

Lula, dificulta a mudança da situação da moradia anteriormente citada.

Segundo dados do Fórum Brasil do Orçamento ”(...) em 2004, o governo Lula se

comprometeu com uma meta de superávit de 4,5% do PIB, mais alta do que a

requerida pelo FMI (3,75%) e realizou um superávit de 4,61%”. 32 Na medida em

que se prioriza o pagamento da dívida, tem deixado de investir em programas e

ações sociais essenciais para a população. Mais ainda, segundo a mesma fonte, o

superávit previsto para 2005, das esferas federal, estadual e municipal, é de R$ 82

bilhões. Esta política econômica incide sobre todo o orçamento da União.

Os recentes cortes no orçamento do Ministério das Cidades, numa política de

contingenciamento de recursos na ordem de 7,9 bilhões, dados de 2004

(SIAFI/STN), com acúmulo de gastos a ser realizado no último mês do ano,

demonstrando que, do valor autorizado de 788.744,168, só foram gastos

489.399.562, isto significa que 62,05% do autorizado não foram gastos na política de

habitação. Estes dados indicam que, para efetivação de uma política habitacional

que seja consistente e constante, deve-se ter um percentual do orçamento federal,

estadual e municipal destinado para essa política. Mesmo sabendo que os

percentuais do orçamento destinado à educação e saúde têm caído ano a ano,

devido ao descumprimento da legislação por parte do governo, faz-se necessário a

defesa desse percentual para habitação.

32 Fórum Brasil do Orçamento. Brasília. Ars Ventura Imagem & Comunicação, 2005, p.10.

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Outros problemas constatados na política de habitação são em relação, primeiro, ao

papel do Estado nos subsídios à moradia, verificando-se a incerteza quanto aos

recursos não onerosos para atender a essa demanda, o que dificulta a garantia do

princípio da universalização do acesso à moradia pelas famílias de baixa renda.

Segundo, no gerenciamento dos recursos do Fundo pela Caixa Econômica Federal,

órgão que tem ligação com o sistema financeiro, que dificulta o atendimento de

demandas de 0 a 5 salários mínimos, através dos critérios estabelecidos, a exemplo

dos programas Crédito Solidário, Programa de Arrendamento Residencial (PAR).

E terceiro, na falta de articulação das políticas setoriais, de transporte e mobilidade

urbana, saneamento e meio ambiente, apesar dos esforços na construção do

Sistema Nacional de Saneamento e de Transporte, para articulação das ações

dessas políticas. O atendimento integral é de fundamental importância na garantia

do acesso a esses e outros serviços à população de baixa renda, de tal forma que

possibilite modificar seu padrão de vida, para recuperação do quadro

socioeconômico apresentado pelas famílias no momento de aquisição da moradia.

As conseqüências dessa política econômica do governo Lula, entre tantas, é o

aumento da carga tributária, pois a população de menor renda, por gastar todo ou a

maior parte de seu salário em consumo de bens básicos, paga, proporcionalmente,

mais tributos do que os ricos, que podem poupar parte de sua renda, ficando fora

dessa tributação.

Outra conseqüência da política neoliberal diz respeito à redução dos gastos

públicos, os quais inibem a atividade econômica, ou seja, se não são realizadas

obras públicas, tais como: escolas, hospitais, saneamento básico, habitação, obras

de alto potencial empregador que gerem postos de trabalho, acarretará um baixo

crescimento econômico e alto índice de desemprego.

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Tudo isso leva a considerar que os impactos das políticas neoliberais sobre as

cidades, determinando limites de investimento do Estado nas políticas socais,

favorecem o desmonte dos serviços públicos, trazendo, conseqüentemente, a

privatização destes, contribuiu para o agravamento do quadro de desigualdade

social, política e espacial existentes nas cidades. O social tem de ser a essência do

desenvolvimento econômico, e não um apêndice ou um suposto resultado natural do

crescimento, isto implica uma ruptura com as tendências históricas do

desenvolvimento brasileiro altamente concentrador de renda e da riqueza, gerador

de exclusão social.

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2.3 – A POLÍTICA HABITACIONAL EM DIADEMA: 1994/2004

Aqui será feito um breve histórico da política de habitação em Diadema, dos anos

anteriores a 1994, pois o destaque será para política habitacional a partir da

aprovação das Áreas Especiais de Interesse Social (AEIS), em janeiro de 1994.

Ao final da década de 1940, as moradias existentes em Diadema eram chácaras,

ocupadas por famílias de renda muito alta, que as utilizavam para lazer, descanso.

O sexto censo demográfico (1950) realizado apresenta o número de 3.023

habitantes no município.

A primeira ocupação de favela (1966) ocorre no Jardim Inamar. Dados de 1968

mostram que no município existiam 02 favelas. No ano de 1971 ocorrem mais seis

ocupações aumentando o número de favelas. Em 1977, Diadema tinha uma

população de 12.741 habitantes morando em 31 favelas. Durante a década 1970,

mais novas ocupações ocorrem, em 1979, acontece o maior número de ocupações,

totalizando nove.

Em 1990 uma área ocupada por sem-teto, conhecida como Vila Socialista, sofre

uma reintegração de posse, com ação militar, resultando em 2 mortos e muitos

feridos. Maiores ocupações vão ocorrer agora no ano de 1997, num total de 10,

realizadas pelo Movimento de Moradia.

No município de Diadema, a partir de 1970 ocorre um crescimento urbano

desordenado - populacional e territorial- várias áreas impróprias são ocupadas para

moradia, formando um número expressivo de favelas. O cenário da cidade foi

modificando-se nos aspectos econômicos, político e social, acompanhando todo um

processo acelerado de desenvolvimento econômico e de urbanização da região do

ABCD.

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No município antes dos anos de 1980, a política habitacional era inexistente ou

existiam apenas programas em que predominavam as ações de remoção das

favelas, para áreas distantes e sem infra-estrutura básica; o atendimento de defesa

civil às áreas de risco eram ações caracterizadas como assistenciais para a

população residente em favelas, sendo desenvolvidas pela Secretaria de Promoção

Humana, como poderemos constatar no capitulo III desta dissertação. Essa era a

política adotada pelos governantes, para uma cidade que apresentava altos índices

de criminalidade, doenças, mortalidade infantil, falta de moradia, resultado das

péssimas condições de vida a que estava submetida a maioria dos seus habitantes.

Em 1980, no município de Diadema existiam 128 favelas com uma população de

79.271 habitantes, e uma alta taxa de urbanização, revelando uma distribuição

desigual dos recursos de infra-estrutura no seu território. O objetivo da política

urbana e habitacional era claro nesse período, ou seja, proporcionar que as terras

melhor localizadas fossem para a construção de parques industriais e de residências

para as classes alta e média. As diretrizes da política nacional refletiam nesse

município: a favela era considerada um problema de déficit habitacional e não

decorrente de um processo de urbanização.

Na década de 1980, os problemas relacionados à falta de moradia, saúde, educação

e saneamento proporcionaram um forte crescimento dos movimentos sociais e o

surgimento do movimento de favela.

Em Diadema, os movimentos de moradia criam a Comissão Municipal de Favelados

de Diadema ligada ao Movimento de Defesa dos Direitos dos Favelados (MDDF). A

principal bandeira de luta desses movimentos era a urbanização de favelas,

juntamente com a questão da legalização da posse da terra. Outra reivindicação era

a abertura de canais de participação, com o objetivo de servir de interlocução da

população com o poder público nas decisões da política de habitação, o que levou o

movimento a uma forte organização, resultando num processo de mobilização social

na cidade.

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Exemplos desse processo organizativo foram: a unificação em torno da luta pela

municipalização da rede de água e esgoto na cidade, com manifestações frente à

concessionária estadual SABESP e ao Palácio do Governo, que resultou na

conquista da empresa pública municipal Companhia de Saneamento de Diadema

(SANED); o movimento pela preservação da represa Billings, e, posteriormente, a

formação de organizações do movimento por regionais (norte, sul, oeste e leste) na

cidade, como forma de uma melhor articulação entre as várias comissões ou

associação de moradores. O movimento de moradia e de reforma urbana durante

sua trajetória de luta tem se empenhado na formulação de propostas e projetos para

alterar a política urbana e de habitação.

A forma de ocupação do território também foi modificada, anteriormente acontecia

através dos loteamentos clandestinos, em razão de a terra ser mais barata, quando

aumentou o valor da terra, o acesso pelos trabalhadores tornou-se mais difícil, esse

e outros fatores contribuíram para que os movimentos de moradia promovessem

ocupações em áreas vazias públicas e particulares, aumentando o número de

favelas no município.

Para relatar a política de habitação no município de Diadema nos períodos

compreendidos entre 1994 a 2004, é fundamental um resgate do Partido dos

Trabalhadores-PT na administração e gestão dessa política.

A partir de 1983, com o acúmulo de várias lutas na cidade, com o fortalecimento do

movimento sindical e social na região, chega à administração municipal da cidade o

Partido dos Trabalhadores, com três mandatos consecutivos: Gilson Meneses

(1983/88); José Augusto (89/92); José de Filippi Jr. (93/96). A ascensão do PT

marca um fato novo no cenário político brasileiro, o projeto de gestão tem um caráter

democrático e popular, e seus grandes desafios eram: a democratização da

administração municipal, construindo vários canais de participação da sociedade;

inversão de prioridades, com ações e recursos destinados a políticas sociais, saúde,

habitação, educação, lazer. Em períodos posteriores assume a gestão da prefeitura

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Gilson Meneses, do Partido Socialista Brasileiro-PSB (1997/2000), logo em seguida

mais dois mandatos do PT, com José de Filippi Jr. (2001/2004) e (2005/2008).

Em 1983, o Programa de Urbanização foi a prioridade inicial, com o reconhecimento

da existência de favela no município, pelo direito de morar, propondo sua

urbanização, sem remoção forçada dos moradores. A urbanização das favelas

existente no município era entendida pelo governo como forma de diminuir a

segregação social e espacial existente na cidade, contribuindo para a inserção das

favelas na malha urbana, através de obras de infra-estrutura, saneamento básico, da

regularização fundiária. Esse programa era o espaço a ser construído entre o

governo e o movimento de moradia para efetivar a proposta de participação popular.

Durante todos os governos do PT a participação popular foi o mote das ações de

todos os programas e projetos estabelecidos na cidade.

Em face dos avanços com a implementação da política de habitação, foram

delineados alguns programas:

• Programa de Urbanização de Favelas – reconhecimento da cidade real e de

fixação da população na área com melhoria na qualidade de vida;

• Regularização Fundiária – garantia efetiva do direito à posse da terra;

• Construção da Moradia – participação direta dos moradores na construção de

novas unidades habitacionais pelo processo de mutirão e de autogestão.

O primeiro instrumento construído (1985) nesta gestão para garantir o acesso à terra

urbana às famílias que tinham ocupado as áreas públicas foi a Concessão de Direito

Real de Uso - CDRU. Este instrumento concede o direito de a família permanecer na

área ocupada por 90 anos, podendo transferir-la para os seus dependentes. Para

receber a titulação, a área deve estar urbanizada. A lei que cria o CDRU também

incentiva a organização da população através de criação de comissões de

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moradores, com o objetivo de discutir todo o processo de urbanização e

regularização da área.

Segundo Mourad, “a discussão sobre a Concessão do Direito Real de Uso-CDRU

vinha sendo debatida pelo MDDF desde 1982, como uma estratégia nacional de luta

pelo direito a terra” 33 , acrescentando “(...) a aplicação das CDRU foi de fundamental

importância para a elaboração e aplicação das AEIS”. 34

Desde a implantação da Concessão do Direito Real de Uso em 1985, até 2006

foram concedidos títulos em 124 núcleos habitacionais, chegando a beneficiar 12 mil

famílias. 35

Dados (2006) da situação fundiária dos Núcleos Habitacionais no município de

Diadema.

N° Unidade

habitacional

Área m² N°

Núcleos

Moradores

Núcleos em Áreas 11.670 749468,0 149 49.014

33 MOURAD, 2000, p.66 34 Ibid, p.66 35 Prefeitura Municipal de Diadema. Secretaria de Habitação, Departamento de Regularização fundiária. 2002.

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73

Públicas 0

Núcleos em Áreas

Particulares

5.505 403138,0

0

34 23.121

Núcleos em Áreas Mistas 6.847 291387,0

0

24 28.069

Total de Núcleos 24.022 1443993,

00

207 100.204

Fonte: SEHAB/Dept. Regularização Fundiária

A continuidade da gestão do PT garantiu a expansão do programa de urbanização e

o aprofundamento de discussões envolvendo outros instrumentos legais

urbanísticos.

Em 1990, foi aprovado o Fundo Municipal de Apoio à Habitação de Interesse Social

(FUMAPIS), que tem um conselho gestor composto por membros do poder público e

do movimento de moradia. O objetivo do fundo é construir a política de habitação

com a participação da sociedade, definindo os recursos e prioridades de

investimentos.

O conselho é espaço de disputa de interesses diferentes, sendo necessário aos

conselheiros, principalmente, aos representantes dos movimentos de moradia

apropriarem-se da política de habitação a ser aplicada no município, como também

de constituírem uma representatividade junto aos seus pares, pois o conselho é

quem delibera e acompanha toda política habitacional.

Esses e outros fatores criaram nos representantes do movimento e no próprio

movimento de moradia uma necessidade de formação política – conhecimento sobre

política habitacional, seu financiamento, funcionamento dos órgãos responsáveis por

desenvolver a política de habitação nas instâncias municipal, estadual e federal,

mostrando a necessidade de articulação estadual e nacional com os movimentos de

moradia na defesa de seus interesses.

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No contexto sociopolítico e econômico de grandes transformações, em 1993, foi

realizado o I Encontro Municipal de Habitação, que tinha como objetivo construir

diretrizes para um plano de governo na área de habitação, em conjunto com a

população. Segundo documento base desse encontro, teria também o objetivo de

“consolidar e aprimorar o trabalho já desenvolvido, com ampliação dos recursos

municipal, visando melhoria na condição de habitabilidade da população

trabalhadora, garantindo a participação popular na gestão da política”. 36

Vários outros programas foram criados, alguns com parcerias com associação de

moradores, no sentido de viabilizar a política de habitação, como: plano de

pavimentação comunitária; programa de assessoria à autogestão; programa de

prevenção das áreas de risco; pós-urbanização; regularização fundiária;

autoconstrução (planta popular); convênio com a associação de compras

comunitárias de materiais de construção de Diadema. Conforme Hereda ”o resultado

desse trabalho é 16,1 mil famílias atendidas durante 93/96, de um total de 22.015

que ocupam os núcleos habitacionais da cidade”. 37

Até o ano de 1993, as favelas urbanizadas estavam localizadas em áreas públicas,

sendo necessário melhorar o programa de urbanização de forma a integrá-lo à

política urbana, ou seja, não é só possibilitar o acesso ao saneamento básico,

energia elétrica, pavimentação, saúde, educação, é necessário também discutir o

reconhecimento do direito à cidade que se firma através da valorização das ações

coletivas.

Essa política habitacional adotada pelo governo municipal de Diadema, além de ter

trazido melhorias à população, foi o diferencial para alteração do Plano Diretor, que

acontece em 1994. Tal plano foi um mecanismo político fundamental para definir a

política urbana, garantindo a função social da propriedade, proposta que alterava

36 PREFEITURA DE DIADEMA. SEHB. Documento Base: I Encontro Municipal de Habitação. 1993, p.8 37 HEREDA, Jorge. ALONSO, Emilio. Política urbana e melhoria da qualidade de vida em Diadema. São Paulo: Studio Nobel, 1996, p.132.

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visivelmente a lógica do mercado. A sua revisão e aprovação envolveu grande

mobilização popular, acontecendo embates e debates com os setores envolvidos,

como empresários, movimentos sociais, Câmara de Vereadores. Essa modificação

na legislação não foi pacífica entre esses setores, pois se tratava de instrumentos

urbanísticos que seriam incluídos no Plano Diretor, que definia a função social da

cidade e da propriedade, dando autonomia ao poder público municipal para fazer

cumprir a legislação aprovada.

Aprovado o marco regulatório para a cidade, as AEIS possibilitavam a ampliação do

acesso à terra e à moradia pela população trabalhadora, que não tem acesso ao

mercado formal, através das AEIS (Áreas Especiais de Interesse Social). O Plano

Diretor aprovado designa dois tipos de AEIS. As AEIS I, conforme descrita no Plano

Diretor são: áreas vazias, terrenos privados não edificados, subutilizados ou não

utilizados, destinados à implantação de Empreendimentos Habitacionais de

Interesse Social, e com reserva de áreas para equipamentos comunitários. As AEIS

II (ocupadas) são as áreas destinadas à reurbanização e regularização fundiária de

assentamentos subnormais, as favelas. Dentro das áreas ocupadas existiam dois

tipos: as públicas ocupadas com CDRU e as particulares ocupadas com processo de

reintegração de posse ou em negociação com o proprietário, a aprovação das AEIS

fortalece o papel das associações nas negociações, com a participação da prefeitura

como mediadora entre as partes.

A implantação das AEIS produziu um grande significado para a população de baixa

renda de Diadema e o seu movimento por moradia e também para o poder público,

pois, ao designar áreas desocupadas no município para projetos de habitação de

interesse social, ampliou a oferta de terra urbanizada no mercado de baixa renda.

As AEIS ainda possibilitaram criar também uma reserva de terras atendendo a

novos empreendimentos, complementando a urbanização de algumas favelas que,

sendo adensadas, necessitam de remoção de famílias para concluir sua

urbanização. Dados da Secretaria de Habitação (2005) mostram que, desde a

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criação das AEIS II em 1994, os 40 empreendimentos habitacionais de interesse

social no município de Diadema produziram 8.862 unidades habitacionais.

Ainda foi criada a Lei nº1. 357/94 de Cadastramento, que estabelece critérios

definindo qual a demanda a ser atendida nos empreendimentos de interesse social,

ficando estabelecido no artigo 3º que somente poderão ser cadastradas as famílias:

que não sejam proprietárias de imóvel, residir no município e tenham renda mensal

de até 10 salários mínimos.

O cadastro socioeconômico das famílias contribuiu para definir o perfil da demanda

e subsidiar a discussão de implementação de políticas sociais, além de definir

parâmetros para o atendimento. O cadastro foi instituído tanto para o poder público,

como também para as associações de moradia que devem seguir a lei no

atendimento aos programas habitacionais de interesse social.

.A Lei de Uso de Ocupação do Solo, que detalha normas e padrões urbanísticos

para construção dos empreendimentos de interesse social, foi modificada em 1996,

contribuindo para implantação das AEIS.

Conforme relatório de avaliação produzido pelo Observatório dos Direitos do

Cidadão (2004), referente às áreas de AEIS no município de Diadema, descreve que

a experiência de Diadema teve pontos positivos e negativos, como poderemos

observar:

(...) que não basta apenas ter instrumentos e ferramentas para combater a exclusão territorial, se não existirem canais de participação38 (...) e apresenta alguns pontos positivos, como: aumentou a oferta de moradia de baixa renda, atendimento pela prefeitura de 65% da demanda de favelas 39 (...) e os pontos negativos, como: apropriação de parte dos benefícios do instrumento pelo mercado imobiliário, sem atender a demanda de baixa renda, não resolveu o problema habitacional da cidade e esgotou o estoque de terra desocupadas. 40

38 Observatório dos Direitos do Cidadão, Observatório das Metrópoles, Projeto Rede Habitat. Estudo de Caso: As áreas especiais de interesse social – AEIS em Diadema. Relatório Final. 2004, p.41 39Ibid.2004, p. 42 40Ibid 2004, p. 42

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Os resultados com a implantação das AEIS foram possíveis porque houve

organização popular, que se apropriou deste instrumental urbanístico e de outros,

tornando-se interlocutores permanentes da política urbana no município.

Diadema investiu na implantação de infra-estrutura para urbanização de favelas, na

regularização das áreas, reformulou o Plano Diretor, que propõe a articulação entre

a política habitacional e urbana, através das Áreas de Especial Interesse Social –

AEIS.

A cidade de Diadema enfrentou também vários desafios na implementação da

política urbana e habitacional, pois muitos dos instrumentos jurídicos existentes hoje

não existiam ao longo da década de 1980. Esta experiência no município possibilitou

avanços na política de habitação e contribuiu para realização de um pacto territorial

estruturado entre os agentes produtores da cidade, prefeitura, movimento de

moradia e agentes imobiliários.

Na entrada do século XXI, novos e velhos desafios estão colocados, como o

adensamento populacional, principalmente nos núcleos habitacionais que chegam a

677 habitantes/hectare, significando 14m²/habitante; todas as áreas indicadas como

AEIS no Plano Diretor foram ocupadas, não existindo mais espaços livres

destinados à produção de moradias; as condições de habitabilidade e o padrão das

moradias são precárias, já que estas foram construídas por autoconstrução sendo

que a maioria dos lotes tem mais de uma família moradora.

Com relação ao atendimento de 1.098 famílias residentes em áreas de mananciais

que depende de legislação estadual específica para intervenção, o município fez

intervenções pontuais através do plano emergencial. Diante de tudo isto é

fundamental serem repensados o sentido e a forma de intervenção do poder público

na cidade, no que se refere à política urbana e de habitação.

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Foi realizado (2001) o III Encontro Municipal de Política Urbana e Habitacional de

Diadema, com grande participação dos moradores e movimentos sociais. Ao final

do encontro definiram por uma política habitacional que compreende um conjunto de

ações que extrapole a moradia, mas que vise assegurar a moradia digna;

propuseram a elaboração de projetos que considerem as condições do meio físico e

o perfil socioeconômico da população, coexistindo uma maior articulação entre as

políticas sociais.

Atualmente (2005), existem no município 207 núcleos habitacionais, 77,78% já estão

urbanizados, com infra-estrutura básica (redes de água e esgoto, drenagem e

energia elétrica), parcelamento demarcado e sistema viário definido (ruas, travessas

e passagens), na sua maioria com pavimentação já concluída e alguns com

certificados de Concessão Direito Real de Uso – CDRU.

3,86%2,90%15,46%

77,78%

Urbanizados 161Em urbanização 32Com intervenções pontuais 6Remoção 8TOTAL 207

Núcleos Habitacionais

Urbanização de Núcleos - Situação Atual

A projeção populacional estimada para a cidade de Diadema pelo censo IBGE

(2005) de 389.503 de habitantes significa que o município vem crescendo em ritmo

menor, 6.000 habitantes a cada ano, se o crescimento for comparado à última

década. Esta população correspondendo a 15,30% da população total do Grande

ABCDRMM. Desta população, cerca de 110.000 pessoas residem em núcleos

habitacionais e loteamentos de interesse social.

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O processo de urbanização, regularização fundiária e o investimento em infra-

estrutura foram fatores determinantes para a melhoria das condições de vida da

população. No município de Diadema podemos constatar esse impacto através de

dois indicadores: na área da saúde houve a redução da taxa de mortalidade infantil

(1983), que era de 83 óbitos por mil nascidos vivos, caindo para aproximadamente,

15 óbitos por mil nascidos vivos em 2004. Na área da educação as escolas infantis

atendiam 15% da demanda, em 2004 atendem 90% da demanda.

Ressaltamos que a segregação territorial, aqui entendida como a apropriação social

diferenciada da cidade, ainda persiste no município, pois a sua superação depende

da superação da divisão social do trabalho.

Diante dessa realidade é importante considerar que o direito à moradia continua

sendo a principal demanda da população, mas que o exercício desse direito tem

como essencial o acesso ao solo urbano, compreendido como um bem de caráter

social.

A política urbana e habitacional brasileira deverá enfrentar os desafios da grande

metropolização das cidades brasileiras, onde os conflitos se tornam mais agudos e

os problemas são estruturais. O problema do desemprego, de violência, da

acessibilidade à moradia, ao saneamento, à saúde, à educação, ao transporte, a

precarização dos serviços públicos e a mercantilização destes, cujas tarifas passam

a ser proibitivas para grande parte da população, todas essas questões devem ser

enfrentados pelo Estado, que há muito vem tentando uma “conciliação de classes”,

como mostra Vieira sobre a sociedade brasileira:

As “conciliações” ou “transações”, como se queira, têm composto a base dos continuísmos e da

inércia de cada momento da vida política e social do Brasil, encobertos pela voragem das “reformas

necessárias” e das “modernizações obrigatórias”, que à custa de enorme sacrifício da maioria da

população mudam substancialmente muito pouco ou quase nada (...)”, 41 em decorrência deste

fato só acontecerá transformações significativas para os trabalhadores a partir de 41 VIEIRA, 2000, p. 215

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uma mobilização social que pressione para a ruptura do pacto com as forças

conservadoras que governam este país e o abandono às políticas neoliberais.

Segundo Mészáros na conferência de abertura do III Fórum Mundial de Educação,

em Porto Alegre/2004;

(...) Alternativas reais precisam ser criadas para que as pessoas possam tomar decisões por si mesmas, e não por imposição, seja da política, seja das estruturas econômicas. E continua, (...) Passos radicais podem ser tomados, mas a mudança contínua, essa revolução social, leva vários anos e não poucos dias. 42

42 MÉSZÁROS, Istvan,O problemas são estruturais. Revista Fórum, São Paulo: Editor Publisher Brasil, nº. 20, 2004, p.31.

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81

Capítulo III

O TRABALHO DO ASSISTENTE SOCIAL NA POLÌTICA DE

HABITAÇÃO NO MUNICÍPIO DE DIADEMA.

(...) não existe pensamento sem u-topia, sem exploração do

possível, do alhures; não existe pensamento sem referência a

uma prática (aqui, a do habitar e do uso; mas que prática é

possível se o habitante e o usuário permanecem mudos?).

(Lefebvre, Henri. A Revolução Urbana)

3.1. O ASSISTENTE SOCIAL43 E A POLÍTICA DE HABITAÇÃO: UMA

EXPRESSÃO DA “QUESTÃO SOCIAL”

Partimos do princípio de que para tratar do trabalho do assistente social na política de

habitação, é necessário contextualizar a cidade no processo de urbanização e

industrialização, como demonstramos nos capítulos anteriores.

Neste capítulo será privilegiada a intervenção do assistente social na política de

habitação em Diadema. A metodologia da pesquisa consistiu na análise de

documentos produzidos pelo Serviço Social da Secretaria de Habitação, no período

entre 1994/2004, e de entrevistas realizadas com profissionais e representantes do

movimento de moradia.

A cidade brasileira é um retrato perfeito da sociedade que se construiu e se reproduziu

sobre a exploração dos trabalhadores, pois na configuração estão suas contradições

sociais, econômicas e políticas.

43

Todo o trabalho desenvolvido pelos assistentes sociais na política de habitação implica na discussão de gênero.

Tanto em relação à demanda atendida no serviço, quanto aos profissionais, uma vez que a profissão de Serviço

Social é majoritariamente feminina.

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O resultado desse modelo neoliberal de desenvolvimento econômico adotado pelo

Brasil gera cotidianamente o agravamento da questão social, sobretudo nas grandes

metrópoles. Os trabalhadores nesse contexto se tornam em desempregados,

subempregados, restritos a alguns espaços da cidade, sem acesso aos serviços

sociais, como educação, saúde, saneamento básico, transportes, habitação, lazer e

cultura. A importância dos serviços sociais para a classe trabalhadora é que estes são

ainda insuficientes mas necessários à sua sobrevivência. Iamamoto ressalta que:

No Brasil, os direitos sociais que dão substrato à noção de cidadão começam a se expandir para as classes trabalhadoras à medida que o Estado passa a assumir progressivamente os encargos sociais em face da sociedade, respondendo às lutas da classe operária, quando esta marca presença no cenário político da sociedade no contexto do aprofundamento do processo de industrialização. 44

Segundo Netto, “A ‘questão social ‘ está elementarmente determinada pelo traço

próprio e peculiar da relação capital/trabalho - a exploração” 45, e suas expressões se

apresentam reformuladas, redesenhadas nos diferentes estágios do capitalismo.

A “questão social” tem nas políticas sociais desenvolvidas pelo Estado a forma de seu

enfrentamento. Pastorini lembra que:

(...) uma vez que a “questão social” começa a tomar estado público, as medidas utilizadas para enfrentá-la já não podem ser pensadas estritamente como mecanismos que contribuem para a acumulação do capital, pelo contrário, devem ser vistas como uma relação, uma mediação entre a sociedade civil e o Estado, que reflete sua dupla característica de coerção e de consenso, de concessão e de conquista. 46

O reconhecimento institucional do Serviço Social se dar através da “questão social”,

pois a partir do momento em que o Estado passa a intervir com políticas sociais,

prestando serviços sociais à população, traz a necessidade da ação profissional do

assistente social, como elaborador, executor e avaliador de programas sociais.

44

IAMAMOTO, Marilda Villela. Renovação e conservadorismo no serviço social: ensaios críticos. São Paulo: Cortez, 2000, p.99. 45 NETTO, José Paulo. Cinco notas a propósito da “questão Social”. Temporalis.Brasilia:ABEPSS,Gráfica Odisséia,2004, p.45. 46 PASTORINI, Alejandra. A categoria “questão social” em debate. São Paulo: Cortez, 2004, p.111.

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Para Iamamoto, “A matéria-prima do trabalho do assistente social encontra-se nas

múltiplas manifestações da questão social (...) que contribui para delimitar o ‘campo’

ou objeto do trabalho profissional”47 Para o assistente social apresenta-se o desafio

de entender que as “questões sociais” são decorrentes das relações sociais

estabelecidas na sociedade capitalista, e expressam-se no cotidiano profissional de

várias formas: nas desigualdades sociais, no desemprego, na perda de direitos, e

nas suas expressões específicas como, gênero, trabalho infantil, violência, etnia. E

esses problemas decorrentes do capitalismo na sua fase monopolista se

apresentam também na atitude dos trabalhadores, ou seja, nas suas formas de

resistência quando colocam em cena suas reivindicações.

Yazbek destaca que para o Serviço Social:

(...) seu significado social, suas demandas, tarefas e atribuições devem ser buscados dentro da trama das relações que constituem a vida social e, particularmente, nas respostas que a sociedade e o Estado constroem, frente às necessidades sociais dos homens, em suas dimensões materiais e culturais. 48

Ao construir socialmente seu significado vinculado aos mecanismos institucionais, os

assistentes sociais ingressam no mundo do trabalho na esfera pública e privada

para enfrentar a questão social, por intermédio das políticas sociais. Esse

profissional necessita vender sua força de trabalho para os que detêm os recursos e

os instrumentos que organizam e operacionalizam sua atividade. Segundo

Iamamoto: “É no limite dessas condições que se materializa a autonomia do

profissional na condução de suas ações”. 49 Essa sua autonomia se dá na da

execução de seu trabalho, quando da prestação de serviços, na administração e

repasse de recursos, na execução de projetos e programas viabilizando o acesso à

população e na definição de prioridades.

47 IAMAMOTO, Marilda V.O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional São Paulo: Cortez.2004, p.100. 48

YAZBERK, Maria Carmelita. O serviço social e o movimento histórico da sociedade brasileira. São Paulo: Fonte Design. 2004, p.13. 49 IAMAMOTO, Marilda V. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional São Paulo: Cortez. 2004, p.97.

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84

Para estudar o serviço social na habitação no período compreendido entre

1994/2004, é necessário compreender as transformações societárias que ocorreram

na sociedade brasileira. É importante ressaltar o agravamento das condições sociais

nos anos de 1990, com a implantação das políticas econômicas de cunho neoliberal,

impactando diretamente nas políticas sociais. A “questão social” nesse contexto

ganha dimensões alarmantes, com o desemprego estrutural, a deterioração das

relações de trabalho, que geram uma insegurança e vulnerabilidade nos

trabalhadores e a pauperização da maioria da população. Nesse quadro, a questão

social configura-se para o assistente social como expressões cujos traços

particulares vão possibilitar o redesenho das ações sociais e das políticas sociais.

É nesse espaço sócio-ocupacional que está inserido o trabalhador de Serviço Social,

desenvolvendo seu trabalho nas políticas sociais.

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3.2. A PESQUISA E A METODOLOGIA UTILIZADA: DOCUMENTOS E

ENTREVISTAS

Para aprofundar nosso estudo, foi realizado um levantamento de fonte primária,

documentos que tratam de ações desenvolvidas pelo Serviço Social, na Secretaria

de Promoção Humana, na Secretaria de Habitação, gestoras do programa de

urbanização de favelas. Foram realizadas entrevistas com dois profissionais e com

dois representantes do movimento de moradia do município de Diadema. A escolha

dos profissionais se deu por terem trabalhado desde a implantação do Serviço

Social na política de habitação. Já a escolha dos representantes do movimento foi

em razão de pertencerem a organizações e a área diferentes, com questão fundiária

também diferente: a área é de loteamento de interesse social; e a outra, uma

ocupação em área pública.

Da Secretaria de Habitação, entrevistamos dois técnicos:

Marta Cirera: assistente social, Cress 20.591, Diretora do Departamento de

Planejamento do Trabalho Social, atuando na política habitacional desde 1991;

Mirian Aranda Silva: assistente social, Cress 24.637, trabalhou no período de

1993/1996 na política de habitação, transferindo-se para a saúde no período de

1996/2005, retornando para a habitação em 2006.

Dos representantes do Movimento por Moradia, de Diadema:

Antonio Osório Monteiro participa do movimento desde 1989, ex.metalúrgico,

assessor parlamentar, membro da Associação de Moradores do Jardim Gazuza,

área pública ocupada em 1989, na região leste da cidade, urbanizada, com

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Concessão Direito Real de Uso-CDRU, onde atualmente (2005) residem 1.500

famílias.

Ronaldo José Lacerda participa do movimento desde 1993, militante da Associação

da Regional Leste, associação que congrega outras associações da região. Mora no

loteamento Jardim das Praias, Área Especial de Interesse Social-AEIS I, localizada

na região leste da cidade, foi comprado em 1996, mediante uma parceria dos

movimentos de moradia com a prefeitura. Residem nessa área 340 famílias (2005).

Essa área recebeu recursos do Programa de Subsídio Habitacional, quitando o

financiamento do terreno, estando agora no processo de regularização fundiária.

O roteiro das questões realizadas foi direcionado para a política habitacional de

Diadema verificando a intervenção do profissional assistente social nessa política.

Foram elaboradas questões abertas com este conteúdo, conforme transcrição

abaixo:

1- Dados de identificação: nome completo, formação, atividade atual e se

participa de algum movimento.

2- Como você avalia a política de habitação do município após a aprovação

das AEIS, em 1994?

3- Qual o papel do assistente social na política de habitação?

Para as assistentes sociais foi solicitado fazer um breve histórico do trabalho que

teve início em 1983 até a sua implantação em 1991, junto aos programas de

urbanização.

4- Houve registro da prática profissional durante todo esse período?

5- Quais os momentos marcantes da experiência do trabalho social na

SEHB?

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Os dados coletados nos documentos, as entrevistas realizadas com os

assistentes sociais, com os representantes do movimento de moradia enfocaram o

trabalho desse profissional na Secretaria de Habitação e são utilizados no decorrer

deste estudo.

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3.3. O CONTEXTO HISTÓRICO DA IMPLANTAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NA

POLÍTICA DE HABITAÇÃO

O início da década de 1980 foi palco de grandes mobilizações dos trabalhadores

brasileiros, principalmente na região do ABCD paulista. Esse movimento sindical, em

conjunto com outros movimentos sociais, influenciou na vida econômica, política e

social do país, contribuindo de forma decisiva para o processo de redemocratização,

com lutas por melhores condições de vida, de trabalho, pela liberdade de imprensa,

de organização, sendo construídos, nesse período, partidos políticos com grande

expressão nos movimentos sociais.

Esse cenário contribuiu na organização, nas experiências e produções profissionais,

de vários setores, particularmente da categoria dos assistentes sociais. Conforme

ressalta Iamamoto, a existência:

(...) de um movimento crítico desde meados dos anos 60 (...) que hoje adquire novo patamar e expressa um processo coletivo de maturação intelectual e sociopolítica dos atores profissionais (...). Novos rumos vêm se descortinando ao Serviço Social no país, como resultado do enfrentamento dos dilemas postos à sociedade e à profissão, pela crise da ditadura e seus desdobramentos. 50

O Serviço Social nos anos de 1980 converge para a ruptura com o histórico

conservadorismo na sua matriz teórico-metodológica, buscando uma ação

profissional comprometida com os interesses e as necessidades dos usuários das

políticas sociais, e esse referencial teórico vai refletir na formação profissional e nos

espaços de trabalho. Yazbek (2000), ao fazer referência a Iamamoto por ocasião do

lançamento do livro Relações sociais e serviço social no Brasil (1982) afirma que:

“aqui a teoria de Marx inicia sua efetiva interlocução com a profissão”, cujo

pensamento é “apreender o ser social a partir de mediações”. 51 Este referencial,

conforme citado anteriormente, permeará as ações profissionais, e, segundo Netto,

50 IAMAMOTO, Marilda Villela. Renovação e conservadorismo no Serviço Social: ensaios críticos. São Paulo: Cortez, 2000, p.13. 51 YAZBEK, Maria Carmelita. Os fundamentos do Serviço Social na contemporaneidade. Brasília: Unb, 2000, p.26

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”trata-se dos parâmetros ídeo-politicos e teórico-culturais de mais forte presença no

campo profissional”, o que não significa que: “essa ruptura com o conservadorismo foi

superado no interior da categoria profissional; significa, apenas, que (...) posicionamentos ideológicos

e políticos de natureza crítica e/contestadora em face da ordem burguesa conquistaram legitimidade

para se expressarem abertamente”. 52

Cabe lembrar que nesse momento vários fatos importantes ocorreram com a

participação dos assistentes sociais, como: a reforma curricular dos cursos de

Serviço Social; a organização sindical da categoria (Associação Nacional dos

Assistentes Sociais-ANAS); no momento da elaboração da Constituição Federal em

1988, a participação em conselhos e fóruns, vinculados às políticas sociais; o

Estatuto da Criança e do Adolescente (1990); as discussões sobre o código de ética,

que se concretiza com o novo Código de Ética em 1993; a Lei de Regulamentação

da Profissão de 1993; a elaboração e a implementação da Lei Orgânica da

Assistência Social (1993).

Essas tendências são relevantes para a construção e a conformação de um novo

projeto profissional, com bases em princípios fundamentais: a autonomia, a

emancipação, a defesa da liberdade e da eqüidade, a socialização da política e da

riqueza socialmente produzida e o pleno desenvolvimento dos indivíduos sociais. No

entanto, a direção de uma prática voltada para esses princípios pressupõe

competências no campo ético-político, teórico, metodológico e operativo.

No município de Diadema, o trabalho do assistente social anterior a 1983, no

Programa de Urbanização de Favelas, consistia de ações em que predominavam as

remoções das favelas para áreas distantes e sem infra-estrutura básica; no

atendimento de defesa civil às áreas de risco, no caso das enchentes,

desmoronamento de moradias. Esta política tinha como base as diretrizes da

Política Nacional de Habitação, conforme visto no capitulo II.

52

NETTO, José Paulo. Transformações societárias e Serviço Social. Rev. SS e Sociedade. São Paulo: Cortez, 1996, p. 111.

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Em 1983, o Programa de Urbanização de Favelas sofre alterações, em decorrência

do novo quadro político instalado no município de Diadema, referente às eleições

para prefeitura e a grande organização do movimento por moradia. A política de

habitação do município começava a ser desenvolvida, destinava-se à população

residente em favelas e consistia na sua recuperação e melhoria; na remoção e

construção de moradias populares, promovendo o reordenamento físico,

possibilitando o acesso das famílias aos serviços urbanos através da implantação de

infra-estrutura básica (saneamento básico, esgoto, água, energia elétrica, iluminação

pública, aberturas de vielas, denominação e numeração das moradias), estendendo-

se à regularização fundiária.

Iniciou-se, no Departamento de Planejamento da prefeitura de Diadema, o programa

que previa a urbanização das favelas. Na sua implantação não existia o profissional

de Serviço Social, sua equipe era composta por arquitetos, engenheiros e

estagiários de arquitetura. Ocorreu uma reforma na administração municipal, o

Departamento de Planejamento unificou suas ações com o Departamento de

Promoção Humana, pois o administrador municipal entendia ser necessária a

integração do profissional de Serviço Social no programa de urbanização de favelas.

O Departamento de Promoção Humana estava estruturado por divisões, as quais

desenvolviam os programas relacionados às políticas de habitação, de assistência,

saúde, recursos humanos - trabalho junto aos funcionários-, assistência judiciária e

educação.

O Serviço Social na Prefeitura de Diadema remonta ao Departamento da Promoção

Humana, que era o único gestor das políticas de assistência social do município. Os

programas desenvolvidos pelos profissionais assistentes sociais eram de creche,

assistência e urbanização de favelas.

Suas ações estavam relacionadas ao levantamento socioeconômico e ao

cadastramento da população das favelas. Esses cadastros auxiliavam na construção

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e na organização de atividades, tais como: remoções; mobilização da população

com o intuito de viabilizar ações comunitárias, mutirões, grupo de ajuda mútua e

grupos de compras, incentivando a participação da população nos diversos espaços

da comunidade.

A conseqüência inicial da mudança do Departamento de Planejamento para o

Departamento de Promoção Humana, foi marcada pela resistência da equipe que

atuava no Programa de Urbanização de Favelas, formada por arquitetos e

engenheiros, pois entendiam que as ações a serem desenvolvidas pelos assistentes

sociais no programa de urbanização de favelas teriam um caráter clientelista,

assistencialista: “A integração com o Departamento de Promoção Humana não

ocorreu de fato, encontrando dificuldades e resistência de ambas as partes (...)

basicamente, a atuação do departamento de Promoção Humana no trabalho com favelas deu-se no

atendimento às situações emergenciais, desmoronamentos, enchentes, etc. ou pelo trabalho de

conscientização política desenvolvido de forma isolada por uns poucos profissionais”. 53

Essa visão dos técnicos que compunha a equipe tem seu fundamento na herança

conservadora da profissão no momento de inserção no mundo do trabalho, estando

também diretamente relacionada com a concepção de assistência social. Segundo

Iamamoto, “(...) o Serviço Social emerge como uma atividade com bases mais doutrinárias que

cientificas no bojo de um movimento de cunho reformista-conservador”. 54

Mas, também, podemos constatar através da entrevista com o assistente social, esta

afirmação refletindo sobre o trabalho que realizava junto ao Programa de

Urbanização nesse período: “(...) na área da assistência nós acompanhávamos por

um bom período, a gente teve uma ação mais assistencial (...)”.

Com relação ao trabalho do assistente social no Programa de Urbanização de

Favelas, no período compreendido entre 1983 a 1988, observamos que, no 53 ALMEIDA, Marco A. Plácido de Urbanização de favelas no período de 1983 a 1988. Dissertação (mestrado) Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995, p.32 54 IAMAMOTO, Marilda V. Renovação e conservadorismo no Serviço Social: ensaios críticos. São Paulo: Cortez, 2000, p.21.

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momento de sua implantação, foi direcionado para situações emergenciais, com

pouca participação na discussão da política habitacional do município, como

também no seu trabalho junto ao movimento de moradia e da população

demandataria desta política. Ao final de 1988, o Programa de Urbanização de

Favelas retorna para o Departamento de Planejamento. Estavam colocadas para o

Serviço Social grandes mudanças diante das demandas que exigiam a alteração do

paradigma, de modo que possibilitasse uma prática mais coerente com a realidade.

Com a revisão da Constituição em 1988 e o debate e a aprovação da Lei Orgânica

da Assistência – LOAS (1993), o governo municipal da Prefeitura de Diadema –

gestão 1989/92– propõe uma reforma administrativa. Os profissionais de Serviço

Social participam ativamente desse momento, dessa proposta, reivindicando a

descentralização das ações sociais.

Em junho de 1989, o Departamento de Promoção Social realiza o 1º Seminário

Interno com o objetivo de discutir a política da assistência social, conforme consta no

documento que serviu de base para a discussão, que propõe “refletir os diferentes

aspectos deste trabalho, tentando esclarecer seu papel e destinos. Esperamos também, com ele,

contribuir par o avanço da mobilização popular em torno da busca de soluções para os seus mais

graves problemas sociais”.

Na década de 1980 para os profissionais de Serviço Social e para os trabalhadores,

de uma forma geral, foi um período de luta por direitos sociais, marcado pelo

envolvimento destes em discussões e ações, o que fez com que a sociedade

atingisse uma direção mais democrática. Para as entrevistadas, esse momento foi

de mudanças. Marta afirma que:

(...) Na época da constituinte discutimos todo o processo da política de

assistência, da LOAS no município (...);

Já Miriam afirma:

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(...) Acredito que a gente estava represado, a barreira rompeu e tudo que a

gente tinha de bom, acontece mudanças, foi difícil (...).

As transformações estavam acontecendo no país. No âmbito do município, a

proposta de descentralização das ações da assistência ganhava força. O Serviço

Social rediscutiu suas ações e diretrizes junto ao Departamento da Promoção Social,

contribuindo para a elaboração de uma proposta enfatizando o atendimento das

ações de assistência nas várias Secretarias e Departamentos, que desenvolviam

projetos e programas junto à população. As mudanças ocorreram, trazendo várias

conseqüências para o desenvolvimento do trabalho dos assistentes sociais, como

relata Marta:

(...) na descentralização ninguém foi obrigado a mudar de Secretaria, a

maioria dos profissionais foram para área da saúde, só eu vim para o

Departamento de Habitação, já havia uma divisão de habitação ligada à

Secretaria de Planejamento, (...) foi extinta a Secretaria de Promoção Social e

as ações aconteciam de forma pulverizada, durante todo este período, nas

demais Secretarias, até ser criada novamente em 1993 a Secretaria de

Assistência e Cidadania.

Conforme documento (1989) elaborado pelos profissionais assistentes sociais, o

objetivo era “(...) discorrer sobre os avanços e dificuldades enfrentados pelos profissionais nos

departamentos (...) e a (...) assistência como um direito do cidadão, pensada com propostas, projetos

e principalmente definições de recursos”. 55

Marta reforça a importância do grupo e do documento elaborado pelos assistentes

sociais, fazendo uma avaliação da prática e do processo de descentralização, com

proposta de intervenção do Serviço Social nos Departamentos.

55 Prefeitura Municipal de Diadema. Assistência Social. Diadema, 1989, p.1- 12.

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(...) o grupo {assistentes sociais} que tinha se constituído anteriormente

montou um documento onde falava da situação das Secretarias, seu trabalho,

seu papel na Secretaria, que culminou com a mudança de governo, falando

do trabalho descentralizado, e propondo a criação da Coordenadoria de

Assistência, com o objetivo de dar suporte aos profissionais. (...) o

documento, o relatório... colocando o assistente social, principalmente, a

história que o assistente social é o detentor de atendimento de ações do

emergencial, mas não é o detentor de dada definição de ações, ficando a

reboque de outros profissionais, que colocam o parecer em cima do seu

parecer, favorável ou não ao seu atendimento. Os outros profissionais

deliberavam em cima de seu parecer, este não devia ser o seu papel, seu

papel não deveria estar limitado a isto, mas deveria ser discutir as propostas

de ações, definir prioridade de intervenção na área de urbanização...

tínhamos de participar da proposta de habitação, de participar da discussão

de prioridade... isto até o momento não estávamos fazendo, isto não era uma

determinação do governo, mais por uma visão que as pessoas tinham do

papel do profissional, daí a partir deste momento teve mudança de governo

que resultou na reforma administrativa, houve um respaldo grande do

secretário na mudança de governo, diante do documento em que

colocávamos isto. Diante disto, criou-se um momento de discussão que

culminou na criação da Secretaria de Habitação e da Divisão do Trabalho

Social (...).

Esta proposta de um Departamento de Divisão do Trabalho Social, na Secretaria de

Habitação da prefeitura de Diadema é colocada em prática em 1991, dando início ao

trabalho social na Divisão de Planejamento Urbano e Habitação, no Programa de

Urbanização de Favelas. A criação da Divisão do Trabalho Social, coordenada por

uma assistente social, possibilitou realmente a implantação e ampliação das ações

sociais dentro dos programas e projetos de urbanização. Nesse período, também

aconteceu a abertura para campo de estágio de Serviço Social. Marta avalia a

importância da criação da referida Divisão para o desenvolvimento do trabalho

social:

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(...) avançamos, acho que trabalhamos correto na linha de ganhar espaço na

questão do trabalho social, quando na reforma criamos a Divisão do Trabalho Social

para dar linha para outros programas da área social, e a divisão do físico dar a linha

mais para os programas de obras. Acho que a gente ainda está dentro desta

estrutura, acho que é falta de um avanço, temos que mudar, mas acho que ainda

não é hora, necessitamos de espaço para esta discussão, mas, avaliando,

ganhamos bastante espaço, o trabalho social hoje é visto como articulador das

discussões com a população, tem um espaço importante na definição de prioridades,

ações, espaço importante na discussão da organização da cidade, tem um...

O mesmo documento enfocava o trabalho do assistente social a ser realizado na

Divisão de Habitação, que consistia de dois eixos centrais: situações emergenciais,

que consistiam no “atendimento conjunto com a Defesa Civil às famílias de extremo

risco, trabalho preventivo com outros técnicos no sentido de diminuir estes risco;

ajudará a estabelecer prioridade, gerenciar os recursos existentes – cobertores,

alimentação, entre outros”. O outro enfoque é o trabalho de organização junto aos

moradores de favelas, com objetivo de: “Acompanhamento no processo de

urbanização das áreas ajudando no fortalecimento da organização; trabalho junto

aos Centros Comunitários atendendo expectativas visando trabalho integrado com

outros departamentos, saúde, educação, assistência jurídica, numa proposta de

projetos integrados; Ajudar no fortalecimento das associações regionais tendo a

preocupação da discussão da questão da habitação num sentido amplo, objetivando

maior aproximação das associações aos movimentos existentes (associação de

construção, associação comunitária); encaminhando para discussão e intervenção

junto à Política Nacional e Estadual de habitação, levando em conta a dificuldade no

que se refere às verbas para esta área; acompanhamento da Associação de

Construção Comunitária de Diadema, Associação de Compras, atendendo dois

aspectos: a relação direta da Prefeitura com estes movimentos; e a ajuda técnica na

discussão interna desses movimentos”.

Como podemos identificar, esses dois enfoques mencionados anteriormente que

norteavam o trabalho do assistente social e pelos problemas apresentados no

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Programa de Urbanização, as favelas, as atividades desenvolvidas na sua maioria

eram emergenciais e de organização junto à população favelada, e, segundo Marta,

a descentralização do trabalho apontava com propostas, como no relato acima, para

uma ampliação do trabalho do assistente social, o que trouxe:

(...) no início foi bastante complicado, não por conta da receptividade das

pessoas, mas diante da visão que as pessoas tinham do trabalho social,

então quando se inseriram na equipe de habitação, era um período bastante

complicado na cidade, devido à topografia do terreno da cidade, bastante

acidentada, deslizamento, enchentes, com grande trabalho para a habitação.

Nosso trabalho era dar respaldo à situação de defesa civil das famílias, vista

como suporte às ações, às atividades de caráter mais emergencial, suporte

às ações emergenciais.

Essas ações, pela sua imediaticidade conjuntural, atendiam às necessidades da

população e do movimento. Ou seja, segundo Sposati:

(...) a prestação de serviços assistenciais não é o elemento revelador da prática

assistencialista (...) o caráter assistencialista, quando presente na prática do

assistente social, não é decorrência simples e direta da tarefa, da atividade que

cumpre, mas sim da direção que imprime às mesmas”. 56

Assim, vale ressaltar que a assistência era compreendida não só pelas questões

emergenciais, mas também como uma política de direito do cidadão, e o

desenvolvimento de suas ações, responsabilidade do Estado.

Outra questão que deve ser abordada referente aos eixos centrais que norteavam a

ação profissional, diz respeito ao ponto fundamental da ação do assistente social

56 SPOSATI, Aldaíza de Oliveira, et al. Assistência na trajetória das políticas sociais brasileiras. São Paulo: Cortez, 1985, p.64.

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que estava direcionada para a organização dos moradores de favelas. Esta

organização se desenvolve através de processos educativos, tendo no assistente

social o papel de formador, desenvolvendo a função sócio-educativa, comprometida

com a participação e a organização da população.

Para os representantes das associações de moradores, o papel do assistente social

está direcionado a uma ação pedagógica com um trabalho voltado para a

conscientização da população:

Segundo Antonio representante da Associação do Jardim Gazuza:

(...) o assistente social contribui muito, conversando com as pessoas,

orientando as pessoas como morar, o papel do assistente social está inserido

na comunidade, ele é muito importante. Todas as dificuldades que a gente

tem, eles têm que estar juntos para orientar;

Na Opinião de Ronaldo representante da Regional Leste:

(...) a participação do assistente social nas discussões dos projetos vendo a

qualidade de vida das pessoas, o lado humano das pessoas, o cotidiano das

pessoas, o lazer, o assistente social incentiva, mostra aquela determinada

coisa que a pessoa pode ir buscar, faz a conscientização das pessoas.

O Serviço Social passa a construir, no Programa de Urbanização de Favelas, um

trabalho que tem como princípio o estímulo à participação direta da população em

todas as etapas do processo de construção e operacionalização de sua moradia,

contribuindo, dessa maneira, para as discussões sobre a política de habitação do

município. Outro fator que vai ser incorporado aos programas, projetos e ações é a

participação popular nos conselhos de defesa e de direitos das políticas sociais.

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A pulverização das favelas na cidade fez com que logo, no início, a cidade de

Diadema fosse divida por regiões, para facilitar o trabalho dos profissionais,

conformando-se da seguinte maneira: região sul com 39 favelas, região oeste com

45, região leste com 33, e norte com 75. (SEHAB 1996). A Divisão de Habitação

formou equipes por região para desenvolver os programas e projetos articulados.

A organização da equipe de trabalho interdisciplinar, com os profissionais de Serviço

Social, Arquitetura e Engenharia, foi a tentativa de ação integrada nos programas e

projetos de urbanização. A assistente social Mirian mostra que não basta juntar os

profissionais, isso pode transformar-se em puro ativismo:

Entrei na habitação (1993) para trabalhar em uma equipe multiprofissional,

coordenada por uma assistente social, com engenheiros, arquiteto

aprendendo a fazer ações interdisciplinares. Na época tinha uma demanda

grande do município, que era a urbanização de favelas, e o Serviço Social na

minha época ia a reboque do que era prioridade, era a intervenção de obras.

As equipes de trabalho vêm tentando durante vários anos construir esse trabalho

interdisciplinar, o que muitas vezes não é fácil, em razão de toda uma formação

acadêmica dos técnicos envolvidos nos programas e projetos. Existe um empenho

por parte dos profissionais na participação do trabalho em todas as suas fases:

desde a definição de prioridades, da definição de projeto de engenharia, do trabalho

de campo que envolve toda discussão do projeto de urbanização, da organização e

participação com a população e a execução do projeto. Essas etapas são

caracterizadas pelo debate, pois reconhecemos as diferenças e especificidades de

cada sujeito envolvido, o que contribui para uma prática em que há a colaboração

dos vários especialistas. Mirian ressalta que existem avanços neste trabalho:

(...) teve avanços no trabalho interdisciplinar, era o físico e o social discutindo

cada projeto, fazendo um levantamento da realidade de cada núcleo, tinha

organização popular...

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A necessidade de uma ação interdisciplinar fundamentada numa concepção

articulada dos conhecimentos deve estabelecer mecanismos e estratégias para sua

efetivação.

Em 1993 ocorreu o I Encontro de Habitação cujo objetivo foi construir diretrizes para

a política habitacional. Nesse encontro, os assistentes sociais participaram da sua

organização, tendo sido iniciada a discussão das áreas de interesse social, do

Fundo Nacional de Moradia.

Em 1994 foi revisado o Plano Diretor do município, que instituiu as Áreas de

Interesse Social, para a construção de empreendimentos de interesse social, um

novo marco na política habitacional de Diadema, já apresentado no capitulo anterior.

A política de habitação modificou-se, interferindo no desenho da cidade, contribuiu

para a ampliação dos programas e da equipe técnica. Todos os entrevistados fazem

referência à aprovação das AEIS como um novo eixo norteador para a política de

habitação, o que proporcionou a discussão do direito à cidade, o acesso a serviços,

possibilitando moradia popular para a população de baixa renda.

Segundo Marta,

Foi um momento bastante importante para o movimento de moradia aqui de

Diadema, pois participou de forma organizada. Já vínhamos discutindo as

AEIS anteriormente, para entendê-la como um todo, já se vinha discutindo

com o movimento, desde 1991 quando foi criado o FUMAPIS. Foi uma luta

intensa com o movimento da cidade como um todo, era bastante

representativo, já existiam as 4 regionais na cidade, já tinha um pano de

fundo do trabalho de organização. Esse movimento já tinha participado de

vários encontros da Central de Movimentos Populares, da União Movimento

de Moradia Nacional, bastante ida para Brasília para a criação do Fundo

Nacional de Habitação. Diadema já tinha um pouco este histórico de construir

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uma política de habitação, com a participação, para melhorar a qualidade de

vida das pessoas. Naquele momento tinha sido realizado um encontro de

habitação em l993, onde se colocou como prioridade para habitação intervir

em áreas com bastante família, tinha naquele momento sobrado para

habitação intervir em grandes áreas de risco, que para haver urbanização

necessitavam de remoção das famílias, isto culminou para discutir e construir

um diagnóstico que ajudou na elaboração do Plano Diretor, pois, a partir daí,

foi muito discutido com o movimento todo, avaliando o que era viável, o que

não era. Nas regiões norte, sul, leste, oeste, fizemos uma bateria de

discussão com o movimento... a aprovação do plano foi decisivo para

diminuir o déficit habitacional do município, como também fazer uma política

de habitação com um leque mais ampliado.

Já Mirian, assistente social afirma:

(...) neste período houve o surgimento das associações regionais, que

passaram a se organizar para discutir a política municipal de habitação,

Plano Diretor, neste período de 93 a 95, o direito real de uso -CDRU, houve

alguns avanços nestes sentidos, tanto que o nosso trabalho culmina com a

premiação e apresentação em Istambul.

Para os representantes do movimento de moradia, a proposta de criação da AEIS foi

fundamental para a política de habitação e para o movimento. Assim se expressa,

na entrevista, um dos representantes:

A criação das AEIS, este instrumento que começou a nortear a política de

habitação, foi importante instrumento para a política habitacional no

município. Foi organizado um grupo para comprar a área da Sanko, a primeira

área de AEIS, foi uma experiência que envolveu todo o corpo do movimento e

outras associações para um projeto interessante. Foi feita toda uma

articulação por todo um conjunto que criou e pensou as AEIS, envolvendo

vários setores da sociedade, a área da Sanko foi um exemplo do início da

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política de habitação, uma forma diferente de fazer a política de habitação,

pois até então tínhamos feito ocupações em áreas vazias à beira de córrego,

áreas de riscos, áreas públicas, que era para serem urbanizadas. A

aprovação das AEIS foi mudando um pouco a forma de fazer a política

habitacional na cidade e um conceito novo de fazer o movimento. ... Foi muito

importante para o movimento a criação das AEIS, como também a articulação

que foi feita com todas as associações para compra desta área, envolvendo

vários setores da sociedade, prefeitura, associações, envolveu o FUMAPIS;

Antonio, representante da Associação do Jardim Gazuza, opina que:

(...) como as demais {política de urbanização, CDRU} ajudaram muito o déficit

habitacional do município, porque eu lembro muito bem que naquela época

era uma dificuldade enorme conseguir uma casa para alugar e hoje temos

mais facilidade com o aluguel. Sabemos que não atendeu ainda à

necessidade do município, que é enorme, a gente sabe disso, mas contribui

bastante.

O trabalho social que vem sendo desenvolvido ao longo dos anos pelos assistentes

sociais reflete nesse momento decisivo para cidade, destacando a participação da

população em todos os espaços de discussões e decisões dessa política. Os

assistentes sociais tiveram um papel de destaque na abertura e no fortalecimento de

canais entre os vários setores da sociedade. Marta relata na entrevista como se deu

a intervenção dos assistentes sociais nesse processo para aprovação das AEIS

junto à população:

(...) e o trabalho social montou toda uma dinâmica de levar a discussão no

município, de abrir a possibilidade, com os movimentos, saiu discutindo na

cidade toda, fizemos mais de 30 reuniões, discutindo neste momento a

ampliação das AEIS, discutindo a questão da forma de acessar as AEIS,

como faria o acesso e o percentual de AEIS, o assistente social teve um

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importante papel, muito importante no processo todo, de abrir toda

discussão... o município teve um papel importante de aceitar as propostas dos

movimentos, das negociações feitas neste processo. Na criação das AEIS

também, discutimos com o movimento como priorizar o atendimento às AEIS,

a demanda do município, discutimos a lei de cadastramento, o trabalho social

discutiu também quais os critérios, qual a forma de controle, qual o

acompanhamento para uma política. O papel do movimento é importante

para o acompanhamento das AEIS. A Secretaria tinha criado uma estrutura

para acompanhar, infelizmente a mudança de governo contribuiu para o não-

acompanhamento desta política, através do acompanhamento... desde

procura das áreas livres, o valor da terra para as negociações para não ter

especulação, a compra da terra, até a demanda a ser atendida, acompanhar

o atendimento, mas mostrou-se insuficiente, pois as pessoas não se

apropriaram... ocorreram desvios e o movimento não teve este controle. O

município de Diadema naquele momento foi um dos primeiros municípios a

criar as áreas de AEIS e o trabalho social teve um papel decisivo neste

processo todo.

Destaca-se ainda nas entrevista a importância do movimento e da organização

destes para os avanços na política urbana e habitacional do município. As

assistentes sociais reforçam essa importância nas várias etapas de lutas na cidade,

que envolvem as questões ligadas à cidade e à moradia:

Mirian aponta na entrevista qual a importância do movimento por moradia neste

processo:

Na discussão da política, na elaboração, na discussão dos projetos, na

identificação dos problemas, foi sempre junto com a população, mesmo que

quisesse ser diferente tinha uma população muito ativa, participante, tinha

clareza, discutia conosco o projeto da área, se era desta forma se não era,

defendia, pleiteava... aprendendo com eles, ensinando, lutando;

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Marta na entrevista reforça a idéia da participação:

(...) fizemos uma bateria de discussão com o movimento que foi muito

interessante. Na construção e criação das AEIS, o movimento teve um papel

importante... a discussão da terra não conseguimos levar para o movimento a

importância de controle, acho que o movimento ajudaria muito no controle da

terra, a não aumentar seu valor.

Os representantes dos movimentos reafirmam a importância da população participar

dos espaços institucionais e do movimento:

Ronaldo, na entrevista declara a importância da participação no conselho de

habitação:

O FUMAPIS é importante para definir toda a política de habitação, onde

realmente se toma decisões para mudar o rumo da política;

Já Antonio afirma:

Quanto à participação dos moradores nos centros comunitários, existe, mas

ela não é muito expressiva. Os moradores no geral precisam participar mais,

a gente tem uma minoria que vai lá, eles participam mais no Orçamento

Participativo, que é onde necessitam mais {no orçamento se discuti a política

para a cidade de Diadema}. O povo precisa participar mais.

A experiência do trabalho do assistente social foi marcada por várias mudanças: de

conjuntura, como a redução dos gastos públicos para as políticas sociais; os

processos eleitorais na cidade; um refluxo nos movimentos sociais, especialmente o

de moradia; mudança no organograma da SEHAB, entre tantos outros. Mas os

princípios que norteavam as ações do trabalho do assistente social estavam

diretamente ligados ao direito à habitação como um direito básico do cidadão,

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ressaltando a importância da organização popular. Mirian, na sua entrevista, reforça

os pressupostos que o trabalho social adotava, na direção de uma prática que

extrapolava o caráter só pedagógico, envolvendo-se na organização da população:

(...) começamos com o trabalho de organização da comunidade. A população

tinha grandes demandas, necessidades, básicas, à beira córregos, sem água,

sem luz, sem pavimentação, sem saneamento, a grande maioria em barraco

de madeira, área de risco, e a própria população que vinha pleiteando obras...

então começamos a fazer um trabalho junto à população, não só na

execução de obras através de mutirões, mas também passamos a fazer

discussões sobre a política de habitação.

O trabalho do assistente social também era visto na perspectiva de contribuir para a

organização da população em seu movimento por moradia.

O representante da Associação regional leste, no seu depoimento, atesta essa idéia:

(...) no meu ponto de vista, o trabalho social junto ao movimento a gente

sempre viu como de grande importância... em Diadema a gente viu com

mais freqüência esta participação do técnico do social, em todos os processos

na formação de política da pessoa, .dessa conscientização....acho que se não

tivesse o trabalho social à frente disso não teria intervenção em muitas áreas

para estar fomentando a organização ...

Historicamente a moradia é tratada como uma mercadoria, o acesso a este bem por

parte da maioria da população é cada vez mais difícil, devido ao não-interesse

capitalista, em produzir um bem que esta população não tem poder aquisitivo para

adquiri-lo, muito menos o Estado de política neoliberal se propõe a financiá-lo.

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Outra questão que deve ser considerada diz respeito ao processo de ocupação do

solo urbano, que acontece de forma desigual. Isto é, a cidade é apropriada de

maneira diferenciada pelos diversos grupos sociais. O acesso ao solo urbano deve

ser compreendido como um bem social.

Na aquisição tanto da terra como da moradia, o poder público deveria ter um papel

fundamental. No caso de Diadema, esse poder interferiu por meio de sua política

urbana e habitacional da cidade: com a aprovação das AEIS; nos dispositivos legais:

como a Lei Orgânica do Município, no capítulo que trata das diretrizes da política

urbana e habitacional; no Plano Diretor; na Lei de Uso e Ocupação do Solo, na Lei

de Cadastramento, que prioriza a demanda a ser atendida. O poder público

municipal em Diadema, conforme podemos verificar através das entrevistas, exerceu

um papel relevante. Segundo alguns entrevistados, como podemos observar na

afirmação da Marta, a assistente social da prefeitura de Diadema:

(...) o controle da terra já esteve muito presente na discussão da Secretaria de

Habitação em outro momento.

Para o representante do movimento de moradia da regional leste:

(...) a prefeitura negociou e comprou a terra e repassou para o movimento, que

funcionou com uma política de habitação coerente... a importância do poder público

de incentivar as associações de moradores a tá se organizando, a ocupar os

espaços público.

A questão habitacional expressa uma questão social permeada por contradições, na

qual intervêm os assistentes sociais. Estes, ao trabalharem as contradições da

relação capital/trabalho, contribuem com sua prática para a superação de

necessidades materiais e sociais dos usuários, essenciais para sua sobrevivência.

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Nas ações desenvolvidas pelos assistentes sociais, destaca-se a função de

mediador entre o poder público e a população. Este fato pode ser constatado na

entrevista do representante da Associação Regional Leste, Ronaldo, quando fala do

papel do assistente social na política de habitação:

(...) o trabalho social na Secretaria de Habitação tinha o papel de mediador de

conflito, muitas vezes isto é uma coisa muito importante... os problemas mais

graves... quando as coisas estavam acontecendo nas áreas em vez de

mandarem um técnico do físico, eles mandavam sempre um assistente social

na frente, se tinha uma briga mandavam o assistente social. Todo tipo de

problema que existia sempre aparecia primeiro na área o assistente social...

problema de toda natureza... que não tinha nada a ver com vocês...

conflitos... para nós que temos uma visão que o técnico de Serviço Social é

muito importante, tem uma participação importante na mudança de valores aí

junto à comunidade, para o trabalho nos projetos, para fazer as pessoas

entenderem o valor das coisas.

Em outra parte da entrevista, Ronaldo reforça a importância da participação

do assistente social na política de habitação:

(...) às vezes vocês ficam em situações complicadas porque são as primeiras

a tá chegando, tentando amenizar a situação de conflito,... acho que este não

é o papel do assistente social, mas acabam tendo que assumir esta tarefa,

para nós, temos uma visão que vocês às vezes dão muito palpite para o

movimento ...mas estas opiniões que temos de vocês vão ficando para

traz,quando vocês mostraram que o trabalho não era para quererem intervir

no movimento, mas para contribuir para somar, para mostrar um novo

caminho que às vezes não estamos percebendo. Ainda tem alguns conflitos,

mas o movimento cresceu e compreendeu melhor o papel do assistente

social, no cotidiano do processo da política de habitação. E o trabalho está

ainda acontecendo hoje, o apoio nas áreas... é muito importante no papel de

formador, organizando as comissões.

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Segundo Fernandes, é conferido ao assistente social a “condição de ator social

capaz de interferir na reprodução da força de trabalho e na reprodução ideológica

das relações sociais”. 57 Ou seja, do ponto de vista material, mediante suas ações

incidem na formação de novos valores e formas de pensar. As ações de sua prática

profissional devem estar pautadas num caráter essencialmente democrático,

exigindo um profissional com qualificação teórico-crítica e prático-operativo.

Os eixos anteriormente mencionados (situações emergenciais, trabalho de

organização) para o desenvolvimento do trabalho do assistente social na Secretaria

de Habitação foram revisitados pelos assistentes sociais, para dar lugar a um

referencial mais elaborado, e isto só foi possível pela ampliação do quadro de

assistentes sociais, pela retomada da divisão do trabalho social, e, principalmente,

tendo como base os princípios fundamentais contidos no Código de Ética e na Lei

de Regulamentação da Profissão, e, mais atualmente (2001), no Estatuto da Cidade.

Em faces dessas considerações, os princípios norteadores da prática de intervenção

do assistente social estão baseados na participação popular, na democratização do

acesso a bens e serviços e na transparência das informações. O trabalho social da

Secretaria de Habitação – SEHAB passou a ter os seguintes pressupostos teóricos:

♦ Estimular a participação popular e privilegiar o envolvimento coletivo;

A participação popular deve ser entendida como a participação direta dos cidadãos

nos processos decisórios da política de habitação.

57 FERNANDES, Lenise Lima. Trabalho social e habitação para população de baixa renda: desafios a uma ação profissional democrática no início do século XXI. In: Política de habitação popular e trabalho social. Rio de Janeiro: DP&A, 2005, p.219.

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♦ Desenvolver trabalho de caráter interdisciplinar, considerando os variados

aspectos sociais, físicos e jurídicos;

Atualmente, com a discussão da regularização fundiária, há necessidade da inclusão

do profissional da área jurídica no trabalho de habitação. Reafirmou-se a importância

de uma contribuição múltipla e complementar para a efetivação de prática

interdisciplinar.

♦ Garantir a transparência nas ações através da socialização da

informação;

Sabemos que informação é poder, diante disso temos duas tarefas: a primeira, de

conhecimento da normatização e legislação da instituição em que trabalhamos, é

condição para socializar as informações na ótica dos direitos; a segunda é a

instrumentalização dos usuários para se apropriarem do saber institucional.

♦ Privilegiar os espaços coletivos de discussão, contribuindo, desse modo,

para a organização da população.

Uma prática articulada com os movimentos sociais e com outras instituições é

necessária para o desenvolvimento de ações voltadas para o fortalecimento do

coletivo.

Esses pressupostos teóricos fazem parte da trajetória construída pelos profissionais

de Serviço Social com atuação na Secretaria de Habitação, que vê na sua ação a

possibilidade de serem viabilizados direitos sociais, através da política de habitação.

Vários são os desafios, dificuldades e limites encontrados pelos profissionais de

Serviço Social que trabalham com políticas sociais no âmbito do poder público

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municipal, como: a falta de recursos para viabilizar os programas de moradia; alta

densidade demográfica do município; o número reduzido de profissionais;

terceirização da mão-de-obra; os processos eleitorais; a falta de autonomia para

gerenciar os projetos. A seguir as declarações de um entrevistada:

A gente tem limites sim. A gente cria um ideal no campo profissional, e quando a

gente tá na instituição tem alguns entraves e com certeza alguns conseguimos

transpor e outros não, que são da própria instituição. O poder público é bastante

lento, diferentes... mas também a gente tem alguns facilitadores a respeito de

alguns referentes com relação aos governos, tem uma linha política, que nem

sempre compartilhamos ou adotamos ... temos a prática de criticá-la. E o Serviço

Social, principalmente na nossa área, a habitação, é uma área muito visada

politicamente, é uma área que dá muito retorno, voto, então às vezes vemos

algumas ações na linha de massificar, de cooptar lideranças, seja uma de outra.

Situação, do ponto de vista daquilo que a gente tem como um ideal, eu acho...;

(...) mas o limite é o excesso de trabalho na área da habitação. Uma ação muito

grande do ponto de vista de acompanhamento de obras, articulação de mutirão e

acho que a gente peca naquilo que é responsabilidade da gente: de apoio à

população, de uma gestão mais democrática, de garantir de fato a participação... a

gente tenta fazer, mas não é sempre que a gente consegue... então acho que somos

poucos profissionais, 12 ou13 aqui na Secretaria. Já trabalhamos com movimentos

em outro período e mesmo hoje para trabalhar com esses é um número pequeno

{de assistentes sociais}, isso é um limitador... às vezes queremos fazer algo muito

grande, não damos conta do dia- a -dia;

A outra entrevistada identifica os limites:

É importante identificar os limites, às vezes a gente esbarra nele e não conseguimos

identificar. No caso, a realidade da cidade de Diadema é de uma cidade pequena,

com uma alta densidade demográfica. É inegável que o processo de eleição está

sempre presente, mudam projetos, ingerência nos programas, redestinar recursos,

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isto é inegável... é trabalhar a realidade sem negar a realidade, isto é uma grande

utopia, este é.um desafio.

O facilitador para o desenvolvimento da prática do assistente social, segundo as

profissionais:

(..) eu acho que a gente pode minimizar esses estragos, temos um papel, temos

uma profissão que é bastante propositiva, em outros lugares não tem esse espaço,

mas mesmo assim tem algumas questões que a gente tem que engolir.... por outro

lado; em Diadema temos a felicidade de ter uma gestão democrática de esquerda,

melhor forma de trabalhar um pouco melhor, tivemos espaço para a gente, no

decorrer dessas gestões tivemos a inserção junto às lideranças, movimentos ....

No que tange à questão dos limites os representantes dos movimentos por moradia

percebem que esses existem dentro da prática do assistente social:

(...) sabemos que há limitações, limites no trabalho do assistente social. O assistente

social sabe que existe, a gente faz o que pode, mas sabe que a população não

entende assim, acha que vocês podem resolver o problema dela.

Cabe destacar do ponto de vista dos assistentes sociais entrevistados, quais os

avanços vistos por eles na política habitacional e no seu trabalho. No trabalho social

os avanços estão ligados à superação das dificuldades. O primeiro avanço foi no

início da implantação do trabalho social no Programa de Urbanização de Favelas,

definindo qual é o papel do assistente social nessa equipe. O outro momento de

avanço foi a consolidação do trabalho social na equipe, com a criação do

Departamento da Divisão do Trabalho Social. Como recorda Marta, foi essa criação

uma ação importante da prefeitura para o fortalecimento do trabalho do assistente

social:

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O primeiro momento foi de fazer a avaliação, que eu estava sozinha e ainda

tive que elaborar um documento, avaliando o papel do assistente social, o que

envolvia fazer uma crítica ao serviço, que causou crise, critica ao caráter

emergencial das ações, da descentralização. Foi um processo rico, mas tive

que identificar o papel do assistente social na urbanização de favelas.

Ainda, segundo Marta,

Outro momento foi o da reforma administrativa para criação da divisão do

trabalho social, momento em que a gente já tinha avançado... todo trabalho

montado, uma longa linha de trabalho social na habitação, que se teve uma

resistência muito grande, por parte dos profissionais, foi outro momento difícil,

por parte da equipe do trabalho social. Tem algum momento em que somos

muito frágeis, quanto organização nossa, acho que foi um momento

marcante, mas não teve compreensão da nossa proposta, dizendo que a

nossa proposta é corporativa, e aí fica fácil dizer que a nossa é corporativa,

que a deles {departamento do físico} não, que queremos criar caso. É status

do ponto de vista do Serviço Social;

Para a assistente social Mirian, a existência da equipe de Serviço Social e o fato de

a Secretaria de Habitação ser campo de estágio reforçam o trabalho do assistente

social, contribuindo para uma renovação constante deste profissional, para ela um

primeiro avanço,

(...) é que a gente existe enquanto equipe hoje, temos a prática de discutir o

Serviço Social e não apenas obras {os projetos de engenharia e arquitetura

para urbanização das favelas}. Acredito que naquela época para romper a

barreira.... a gente era tragado pela demanda, também a gente não tinha

muito tempo para reflexão, para discutir a nossa prática, para mensurar sobre

sua efetividade... sinto que hoje temos esta oportunidade, temos tempo para

avaliar, temos recursos para registrar, para avaliar de forma diferente (...)

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Continua Mirian valorizando o campo de estágios, que é a Secretaria de Habitação

de Diadema, oferece para os estudantes de Serviço Social, ao afirmar que:

(...) houve avanços no trabalho do assistente social na Secretaria da

Habitação com uma parceria com os estagiários, foi outro grande avanço para

o Serviço Social a chegada de estagiários... foi poder contar com o

estagiário... trazendo o novo, o repensar, questionando nossa prática, pois

acho que gente tem que ser questionada (...).

No âmbito da política de habitação, os avanços apontados por esses profissionais

dizem respeito à aprovação da AEIS e à existência de programas e projetos que

tratam da questão da habitabilidade, da regularização dos imóveis, que é a outra

face da política urbana. Nesse sentido, assim se expressa um profissional do

Serviço Social:

Do ponto de vista da política, foi no momento da criação das AEIS, da

reformulação do Plano Diretor que ampliou bastante a discussão de política

para a cidade, apropriando o movimento como um todo da cidade a ocupar os

espaços enquanto território... a discussão do Plano Diretor de 1994...

Na opinião de outro entrevistado sobre a política de habitação, quanto à ampliação

dos projetos e programas da Secretaria de Habitação afirma:

Senti que no Serviço Social avançamos, hoje temos vários programas. Como

Tá Bonito, Auxilio Moradia {esses são alguns dos programas desenvolvidos}...

hoje temos idéia do que foi realizado, concluído, com relação às áreas... as

equipes continuam super-integradas com a comunidade.

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Em relação ao registro da experiência de Serviço Social, pouco se tem realizado, e

isto foi um dos fatores relevantes que dificultou a pesquisa documental: poucos

documentos têm referências claras, identificação, data. O trabalho social aparece

nos documentos da SEHAB como uma ação que viabiliza a política de habitação no

município. A experiência dos assistentes sociais foi apresentada na I Mostra Paulista

de Trabalho Profissional em Serviço Social, com o título “Trabalho Social na

Secretaria de Habitação de Diadema”, organizado pelo Conselho Regional de

Serviço Social- 9º região- São Paulo, e no XI Congresso Brasileiro de Assistentes

Sociais, com o título “Da cidade invisível à cidade visível”, ambos realizados em

2004. Estes duas apresentações foram importantes para projetar na equipe a

necessidade do registro, de publicizar o trabalho que vem desenvolvendo há anos.

Assim fala uma entrevistada:

O material existente de registro está relacionado mais à política de habitação

do município, tem cartilhas, cadernos que nós ajudamos a construir... cartilhas

sobre participação da população, agora, do ponto de vista do Serviço Social,

nós somos muito frágeis, não construímos muito material, do trabalho do

Serviço Social;

Outra profissional acrescenta que, relatar sua vivência; reflexão sobre a pratica

profissional na maioria das vezes é,

(...) difícil registrar, mensurar, contar nossa prática, é difícil avaliar nossa

prática.

Os registros, a pesquisa, dentre outros instrumentais no exercício profissional

tornam-se presentes no cotidiano dos assistentes sociais, possibilitando objetivarem

sua intencionalidade em respostas as demandas profissionais.

Para realizar uma análise do trabalho social desenvolvido implica, segundo

Iamamoto:

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(...) compreender a prática profissional na sua dimensão histórica, como uma prática em processo, em constante renovação, fato este derivado, fundamentalmente, das modificações verificadas nas formas de expressão e no aprofundamento das contradições que peculiarizam o desenvolvimento de nossa sociedade. À medida que novas situações históricas se apresentam, a prática profissional – enquanto componente destas – é obrigada a se redefinir. As constantes redefinições conformam mais uma ‘passagem da prática’ do que uma prática cristalizada (...).

O trabalho do assistente social propõe-se a desenvolver um trabalho profissional

tendo como parâmetro a autonomia, a emancipação e a plena expansão dos

indivíduos sociais, reforçando princípios e práticas democráticas no atendimento da

política urbana e de habitação, aos trabalhadores segregados nos espaços urbanos,

nas favelas, nos mananciais, nos cortiços e nos conjuntos habitacionais, entre outros

espaços.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste estudo, realizamos uma reflexão sobre a experiência do Serviço Social na

Secretaria de Habitação do município de Diadema. Nesse sentido, procuramos

pontuar momentos e aspectos da luta e organização do movimento popular por

moradia em que o profissional do Serviço Social esteve presente e atuante.

É preciso ressaltar, no entanto, que a freqüência do trabalho desse profissional se

dá desde o início de 1991, no Programa de Urbanização de Favelas. Trabalho este

fundamentado em referencial teórico que possibilita a esse profissional uma visão

mais abrangente e crítica dos problemas sociais, uma vez que no período escolhido

para análise (1994 a 2004), a política econômica neoliberal está em pleno vigor no

país.

Neste estudo, verificamos que vários autores com uma formação teórico –crítica em

relação ao capitalismo embasaram a nossa reflexão. O espaço da cidade é

caracterizado pelo lugar onde se defrontam interesses diferenciados e antagônicos:

por um lado, grupos econômicos ligados ao processo de reprodução e ampliação do

capital; por outro, um grande contingente popular que vive, desde a sua origem, a

enorme desigualdade social brasileira, caracterizada pelo desemprego estrutural e

conjuntural e pelas precárias condições materiais e culturais de vida.

Com base nessa fundamentação teórica, a cidade e seus problemas são vistos no

contexto das relações de produção e das relações sociais caracterizadas pelas

contradições geradas por esse sistema de produção conseqüentes da fase do

capitalismo monopolista e sua política econômica. Para ressaltar esta idéia, citamos

Lefebvre: “A contradição principal se desloca e se situa no interior do fenômeno

urbano: entre a centralidade do poder e as outras formas de centralidade, entre o

centro ‘riqueza-poder’ e as periferias, entre a integração e a segregação”. 58

58 LEFEBVRE, Henri. A revolução urbana. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 1999, p. 155.

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Neste estudo, enfocamos o problema do acesso à posse da terra e da moradia em

Diadema, cidade formada majoritariamente de trabalhadores assalariados, que

sofrem, pela sua condição social, todos os males da política econômica neoliberal.

Tendo a compreensão que habitar deve ser entendido como um direito básico de

cidadania, e o exercício desse tem como pressuposto fundamental a possibilidade

de acesso ao solo urbano. O direito à moradia está contemplado nas diversas

legislações, como na Declaração Universal de Direitos Humanos (1948), na

Constituição Federal de 1988, e reafirmado recentemente (1996) na Declaração de

Istambul sobre Assentamentos Humanos, Conferência em que Diadema esteve

presente apresentando sua experiência na área habitacional. A Emenda

Constitucional nº. 26/2000 altera a redação do artigo 6º da Constituição Federal de

1988, garantindo o direito à moradia como um dos direitos sociais.

A história do desenvolvimento da cidade de Diadema e seu processo acelerado de

urbanização produziram uma legislação urbanística - Plano Diretor, AEIS, CDRU –

que, aliados à luta e organização do movimento popular por moradia e impulsionada

por uma gestão democrática na cidade, visavam garantir o direito e a função social

da cidade. A política habitacional de Diadema criou novas formas de ler a realidade,

reescrevendo o discurso público junto à população de núcleos de favelas e de

loteamentos de interesse social.

É nesse contexto que, em Diadema, os assistentes sociais desenvolvem ações no

sentido de enfrentar os desafios tanto do ponto de vista institucional, quanto das

mudanças que ocorrem no mundo do trabalho, pois todos perpassam pelo desafio

de decifrar a lógica do capitalismo atual.

Este estudo possibilitou realizar o histórico do trabalho do assistente social, no

período de 1994-2004, na Secretaria de Habitação em Diadema, sua prática

profissional consiste na construção e implementação de programas e projetos, como

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o de urbanização de favelas, de pós-urbanização, de regularização fundiária e de

qualificação das moradias, desenvolvendo atribuições no âmbito da elaboração,

execução e avaliação.

Ao se relacionar a política habitacional de Diadema com o desenvolvimento do

trabalho social, fica claro que, embora o trabalho do assistente social não tenha

nascido conjuntamente com essa política, o mesmo tem se consolidado no âmbito

dessa, contribuindo para que sua implementação ocorra de forma mais democrática

e participativa, reforçando a importância da organização da população.

A intervenção do assistente social deve resgatar os princípios da autonomia, da

emancipação, da defesa da liberdade e da eqüidade, da socialização da riqueza

socialmente produzida para o pleno desenvolvimento dos indivíduos sociais. Dessa

forma, a prática profissional pressupõe competências no campo ético-político,

teórico, metodológico e operativo.

Para zerar o déficit habitacional na cidade de Diadema são necessários programas

sociais consolidados, que contribuam na estruturação das famílias de baixa renda.

Isto só será possível com uma política social articulada nas três esferas de governo,

nacional, estadual e municipal, a poder de muita pressão dos movimentos sociais,

com os quais é importante a articulação e atuação do assistente social.

Por fim, sabemos que o trabalho do assistente social representa uma parte

importante da construção de uma democracia participativa, mas ainda há muito a

caminhar, no sentido de alcançar um maior aprofundamento teórico na análise da

prática profissional e da política habitacional, para de fato construirmos propostas

práticas melhores do que as existentes.

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