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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
CURSO DE GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
HABILITAÇÃO: FORMAÇÃO DE PSICÓLOGO
RELATÓRIO FINAL DE ESTÁGIO SUPERVISIONADO EM PSICOLOGIA
SOCIAL, COM PRÁTICAS EM PSICOLOGIA COMUNITÁRIA
Pedro Felipe Moura de Araújo
Estagiário
Matrícula: 10623846
Dra. Maria de Fátima Pereira Alberto
Supervisora
CRP 13/3877
João Pessoa - PB
Julho de 2011
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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
COORDENAÇÃO DO ESTÁGIO SUPERVISIONADO
A PSICOLOGIA SOCIAL E O "TERCEIRO SETOR":
RELATOS DE UMA EXPERIÊNCIA DE ESTÁGIO
Relatório de atividades desenvolvidas no Estágio
Supervisionado em Psicologia Social, realizado
Projeto Beira da Linha, na Pia Sociedade Pe
Mazza, no Bairro Alto do Mateus na cidade de
João Pessoa - PB, nos períodos letivos de
2010.2 e 2011.1, pelo estagiário Pedro Felipe
Moura de Araújo, matrícula 10623846, sob
orientação da professora doutora Maria de
Fátima Pereira Alberto, como requisito final para
obtenção do título de psicóloga.
João Pessoa - PB
Julho de 2011
3
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAIBA
CENTRO DE CIENCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
DECLARAÇÃO
Declaro para os devidos fins de comprovação, junto à Universidade Federal da
Paraíba, que o estudante Pedro Felipe Moura de Araújo, matricula: 10623846, realizou
520 horas de estágio supervisionado na área de Psicologia Social, sob minha supervisão,
durante os períodos letivos, 2010.2 e 2011.1, tendo como local de realização o Projeto Beira
da Linha, na Pia Sociedade Pe Mazza, no Bairro Alto do Mateus na cidade de João Pessoa -
PB.
João Pessoa, 19 de julho de 2011
Maria de Fátima Pereira Alberto
Supervisora
CRP 13/3877
4
UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAIBA
CENTRO DE CIENCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA
PARECER
Considerando que Pedro Felipe Moura de Araújo, estudante regularmente
matriculada no curso de graduação em Psicologia – Habilitação: Formação de Psicólogo, da
Universidade Federal da Paraíba, sob a matrícula número: 10623846, realizou 520 horas de
estágio supervisionado na área de Psicologia Social, durante os períodos 2010.2 e 2011.1, no
Projeto Beira da Linha, na Pia Sociedade Pe Mazza, no Bairro Alto do Mateus na cidade de
João Pessoa - PB. Tendo cumprido os objetivos regimentais e acadêmicos, somos de parecer
favorável a sua obtenção do título de psicólogo.
João Pessoa, 19 de julho de 2011
Maria de Fátima Pereira Alberto
Supervisora
CRP 13/3877
5
Ilustríssimo (as) Senhor (as) membros da coordenação de estágio supervisionado do
curso de Psicologia da Universidade Federal da Paraíba – UFPB/ Campus I.
REQUERIMENTO
Eu, Pedro Felipe Moura de Araújo, aluno regularmente matriculado no curso de
graduação em Psicologia – Habilitação Formação de Psicólogo – da Universidade Federal da
Paraíba – UFPB, sob a matrícula número 10623846, venho respeitosamente solicitar de vossa
senhoria, a aprovação do estágio em Psicologia Social, referente à prática executada no Projeto
Beira da Linha, na Pia Sociedade Pe Mazza, no Bairro Alto do Mateus na cidade de João
Pessoa - PB, sob a supervisão da professora doutora Maria de Fátima Pereira Alberto,
perfazendo um total de 520 horas. Nestes termos, pede deferimento.
João Pessoa, 19 de julho de 2011
Pedro Felipe Moura de Araújo
Estagiário
Matricula: 10623846
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ÍNDICE
AGRADECIMENTOS....................................................................................................... ..7
1.INTRODUÇÃO...................................................................................................................9
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA.............................................................................11
2.1 DA RAIZ AOS "FRUTOS": NASCIMENTO E DESENVOLVIMENTO DA PSICOLOGIA
SOCIAL MODERNA...................................................................................................................11
2.2 PSICOLOGIA SÓCIO-HISTÓRICA E COMUNITÁRIA: EM BUSCA DA PRÁXIS E DO
COMPROMISSO SOCIAL ..........................................................................................................15
2.3 "A QUESTÃO DA GESTÃO SOCIAL TORNOU-SE CENTRAL": NEOLIBERALISMO,
EMERGÊNCIA DO "TERCEIRO SETOR" E ALGUMAS REFLEXÕES SOBRE A ATUAÇÃO
PROFISSIONAL EM PSICOLOGIA...........................................................................................19
3. CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTÁGIO..............................................................23
3.1 CONTEXTUALIZANDO O LÓCUS DE AÇÃO: PROJETO BEIRA DA LINHA..............23
3.2 CONTEXTUALIZANDO A PROPOSTA DE ESTÁGIO.....................................................24
4. ATIVIDADES REALIZADAS ...................................................................................26
4.1 TERRITORIALIZAÇÃO .......................................................................................................26
4.2 REUNIÕES DE FORMAÇÃO DE EDUCADORES.............................................................32
4.3 REUNIÕES DO GRUPO DE PROTAGONISMO ................................................................36
4.4 VISITAS DOMICILIARES....................................................................................................42
4.5 REUNIÕES DE SUPERVISÃO DE ESTÁGIO.....................................................................43
4.6 ATIVIDADES EXTRAS...................................................................................................... ..44
5. REFLEXÕES E PROBLEMATIZAÇÕES...........................................................46
6. CONSIDERAÇÕES..................................................................................................... ....51
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.....................................................................53
ANEXO ....................................................................................................................... .................55
CRONOGRAMA DE ATIVIDADES ..........................................................................................56
7
AGRADECIMENTOS
A meus pais, Lindemberg e Zezinha, e a meu irmão, Rodolfo, pelo carinho de berço, suporte
e respeito, afetividade consangüínea e amizade cotidiana, elementos imprescindíveis em
minha constituição e no meu presente caminhar.
A minha orientadora, Fátima Pereira, mestre-educadora humilde e generosa, pelo
compromisso, ensinamentos e questionamentos precisos.
A minha companheira de luta e de estágio, Cristiane, meu "Anjo psi", pela compreensão,
sorrisos, crescimento mútuo e aprendizado diário.
Aos profissionais do Projeto Beira da Linha, pela disponibilidade, compromisso e
experiências vividas durante o estágio.
A meus companheiros da Psi e do Coletivo Canto Geral, Roberta, Carlos, Leo, Rodrigo,
Baiano, Jéssica, Luana, Maíra, Shenia e Suzany, que em nossa fraternidade militante nos
reconhecemos na construção de uma psicologia implicada e problematizadora.
Aos professores(as) Angela Fernandes, Romero Venâncio e Eugênia Correia, mestres
incendiários que me tocaram com novidades radicais durante meu percurso acadêmico.
A meus outros companheiros de luta e de vivência, que durante toda essa caminhada, nos
movimentos ou nas festividades, acreditamos em outros possíveis, numa vida potente de
encontros.
A todos demais que tornaram este possível, em suas condições materiais e subjetivas.
8
"A mudança social não é produto de uma suposta elaboração
espontânea da realidade nem de mero avanço na esfera da consciência:
é preciso que a práxis se encadeie a uma consciência teórica e prática
voltada para a transformação radical da vida coletiva"
(Maria Helena Souza Patto)
9
1.INTRODUÇÃO
Este documento que começo a redigir busca sistematizar minhas experiências e
vivências no estágio supervisionado em Psicologia Social realizado no "Projeto Beira da
Linha", uma Organização Não Governamental (ONG) localizada no bairro Alto do Mateus,
na cidade de João Pessoa. O estágio supervisionado em Psicologia Social tem como objetivo
formar psicólogos sociais para atuarem fundamentados na compreensão da dimensão
subjetiva dos fenômenos sociais e coletivos, sob enfoques teóricos e metodológicos
específicos do campo em questão, como também problematizar e propor ações no âmbito
social. A partir da identificação e construção das demandas no lócus de atuação, desenvolver
práticas e atividades que visem a cooperação, emancipação e superação humana a partir das
condições materiais de existência, tentando articular com as políticas de assistência e a
efetivação dos direitos sociais.
O Projeto Beira da Linha faz parte da "Pia Sociedade de Padre Nicola Mazza", que
chegou ao Brasil em 1978 instalando-se na Paraíba. No início dos anos 90, após diagnóstico
das condições sociais das periferias da cidade João Pessoa, o projeto tem seu início no
intuito desenvolver e capacitar, no âmbito educativo, crianças e jovens do bairro do Alto do
Mateus. Em seus anos iniciais, foi desenvolvendo uma postura estratégica no sentido de
valorizar o princípio dos direitos e dos deveres de cidadania e passou de uma ação crítica e
paralela ao serviço público a uma ação de sensibilização e participação nas atividades
institucionais, comunitárias e individuais na área da educação. Atualmente o Projeto está
estruturado a partir de diferentes Centros de Formação que acompanham as progressivas
fases de desenvolvimentos dos jovens do bairro buscando uma formação ética, cidadã e
profissionalizante.
Nosso contato com o Projeto foi iniciado a partir do encontro de demandas advindas
do mesmo para o trabalho junto à UFPB no intuito de qualificar espaços de ação do Beira da
Linha, via contatos com a supervisora do estágio em questão. A demanda inicial do PBL era
o trabalho com os jovens do Projeto, no sentido de compreender o que ocorreu com aqueles
que "por lá passaram" e de certo modo qual tinha sido o significado do projeto para eles ou
qual a contribuição do projeto em suas vidas. Junto a esta demanda refletiu-se sobre a
necessidade de pensarmos as vias de atuação possíveis do psicólogo social no campo do
Terceiro Setor, das organizações sociais e dos movimentos sociais. Neste sentido, a priori,
10
nosso objetivo enquanto intervenção junto ao Projeto visou atuar junto as famílias, jovens,
crianças e educadores(as) acompanhados(as) pelo Beira da Linha.
Como parte inicial do relatório apresento uma fundamentação teórica a partir das
discussões e dos textos trabalhados nas supervisões de estágio, que se relacionam com o
nascimento e desenvolvimento da psicologia social moderna; com a situação de surgimento
das organizações sociais no país com o advento do regime democrático e o envolvimento
destas com novos modelos estatais; e com uma formação em Psicologia que tem como foco
o compromisso ético-político de sua atuação assim como dos efeitos produzidos no âmbito
das relações e contradições sociais.
Uma segunda parte relata as experiências e o desenvolvimento das atividades
ocorridas durante o estágio no Projeto. Há uma contextualização geral do estágio no que diz
respeito aos seus objetivos e as movimentações possíveis dentro dos limites de nossa
atuação, como uma explanação mais ampla do contexto e das condições de possibilidade da
ação do Projeto dentro do bairro.
A parte final do relatório consiste nas considerações finais frente à toda experiência
vivida e desenvolvida durante o tempo do estágio, bem como impressões análises e
avaliações dentro do contexto da ação e continuidade do Projeto e de minha formação em
Psicologia Social. Ao fim, apresentarei as referências bibliográficas que serviram de auxílio
para as fundamentações teórico-práticas do relatório em questão.
11
2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 Da raiz aos "frutos": nascimento e desenvolvimento da psicologia social moderna
De natureza recente, meados do século XIX, a ciência psicológica nasce da
confluência de diversos saberes. Partindo tanto de pressupostos filosóficos e sociológicos
como de ferramentas e metodologias das ciências naturais, surge a possibilidade de
compreensão dos fenômenos e comportamentos humanos em seu caráter racional e
universal. Em seu desenvolvimento, com a solidificação e legitimidade do conhecimento
produzido na área da psicologia, emergem diversas formas de apreensão dos componentes
humanos, métodos e teorias que se debruçam sobre comportamentos e relações, percepções
e sensações, consciência, sonhos e demais processos objetivos/subjetivos.
Com o advento da modernidade, junto ao crescimento das cidades e metamorfoses no
campo produtivo e relacional, a humanidade exige novos olhares e produz novos desafios
aos comprometidos com as ciências humanas. No campo da psicologia as ferramentas se
complexificam, as abordagens se confrontam e apontam direções para o desenvolvimento de
um campo em que a relação sujeito/objeto torna-se gênese e núcleo de contradições e
reflexões que movimentam as linhas de uma "costura sem fim". As relações culturais se
ampliam, gerindo modos de ser e agir que dizem respeito às perspectivas de um domínio
cada vez mais amplo do ser humano em relação à si e à natureza. Indivíduo e sociedade se
constituem mutuamente, produzindo dinâmicas, formas de expressão e processos
organizativos cada vez mais complexos.
A psicologia, não podendo ser diferente, buscou acompanhar estas mudanças em
suas abrangências, instaurando vertentes individuais e sociais, delimitando campos e
métodos, construindo lugares de poder em favor de certa ordem conjuntural. O auge deste
percurso encontra na II Guerra Mundial o ponto de virada de uma trilha guiada pelo ideário
da razão e do progresso, e alimentada pelo modo de produção capitalista, que na tentativa de
supremacia frente aos movimentos arredios das coisas, produziu miséria e sofrimento para
um mundo que esperava se libertar a partir da "luz da racionalidade". É nesse contexto pós II
Guerra que se gesta no, "campo psi", a era moderna da psicologia social.
Segundo Farr (2001), foi G.W. Allport, que em 1954, fincou as raízes da psicologia
social em solo norte-americano. O autor considera a existência de duas formas da disciplina:
a sociológica e a psicológica. Isso implica uma relação entre esses dois campos do
12
conhecimento, a psicologia e a sociologia, que nem sempre foram distintos. Partilhando
mesmas noções teóricas, sociólogos e psicólogos escreviam sobre o indivíduo, a sociedade e
suas culturas, diferenciando-se a partir de concepções, metodologias e abordagens próprias,
o que resultou na separação das disciplinas e no desenvolvimento de formas diferenciadas da
psicologia social, cada uma baseada nas premissas de uma das "disciplinas-mãe". Nos
Estados Unidos, a vertente psicológica torna-se mais relevante, tendo como característica
principal a individualização dos processos humanos e a metodologia experimental como
abordagem de pesquisa, que busca regular os indivíduos deixando de lado reflexões de
caráter social e crítico. Essa escolha diz muito sobre os valores culturais preconizados pela
sociedade americana e dos pressupostos epistemológicos de base cartesiana ali
disseminados, que por motivos ideológicos e contextuais, fez prevalecer uma forma sobre a
outra na história da psicologia social.
É também no Estados Unidos, mais precisamente na Escola de Chicago, que
poderemos perceber algumas das raízes da vertente sociológica da psicologia social. Nesta
instituição, o trabalho desenvolvido pelos sociólogos tiveram como uma das bases
fundamentais os estudos de G.H. Mead, que em sua crítica aos trabalhos de Watson,
desenvolvia um outro olhar sobre a psicologia social, menos positivista e mais processual. A
concepção de Mead foi denominada de "interacionismo simbólico" por Herbert Blumer,
precursor da psicologia social sociológica em Chicago. Em seu conjunto de estudos,
diferentemente da produção em psicologia no século XX, Mead colocava em questão às
dicotomizações existentes entre indivíduo-sociedade, mente-corpo e cultural-biológico,
como realidades últimas na compreensão do humano. Ele propôs uma "filosofia completa da
ação", colocando em evidência o papel da significação nos processos subjetivos, decorrentes
do ato social, não separando corpo e mente como substâncias distintas. Assim, a constituição
do sujeito emergiria como efeito da experiência prática, produzindo uma consciência dos
objetos ao tempo do aparecimento de uma consciência de si. É importante salientar que na
Escola de Chicago havia uma valorização da pesquisa empírica, do trabalho de campo e da
produção de novos materiais de pesquisa, fornecendo métodos inovadores para a sociologia
qualitativa, que abriam espaços para concepções "mais flexíveis" em relação aos fenômenos
sociais. Desde as temáticas de pesquisa, envolvendo questões sociais emergentes na cidade
de Chicago, às metodologias empregadas, como a observação-participante, propondo um
outro estatuto para as relações sujeito/objeto (Farr, 2001; Portugal, 2007).
13
Outro desenvolvimento da vertente da psicologia social sociológica emergiu na
França, com os estudos das representações sociais de Serge Moscovici. Constituindo-se
numa importante crítica à natureza individualista da psicologia social psicológica norte-
americana, tem como base os estudos sociológicos de Emile Durkheim sobre religiões e
cultura. Como enfatiza Farr (2001), o contraste entre as pesquisas francesa e americana são
índices da diferença entre as formas psicológica e sociológica de psicologia social, pois no
cenário americano, após a cisão entre psicologia e sociologia, não houve grande repercussão
da incorporação dos referenciais sociológicos à "história oficial" da psicologia social
moderna.
Pode-se constatar que apesar da hegemonia de uma cultura psicológica norte-
americana que busca explicar fenômenos sociais de maneira individualista, a partir de
metodologias neutras e experimentais, outros movimentos foram sendo produzidos por vias
diferenciadas. Veremos a seguir como outros pensadores e "escolas", ao longo do século
passado, produziram linhas teórico-práticas buscando diferentes caminhos de compreensão
das relações entre indivíduo e sociedade.
Nascida nos anos 20, a "Escola de Frankfurt", ou Teoria Crítica, foi um movimento
de idéias extremamente vigoroso e original, que uniu referenciais do marxismo e da
psicanálise na construção de uma "psicologia social marginal". Os principais expoentes
deste grupo de saberes foram o filósofo e sociólogo Theodor Adorno, o crítico literário e
ensaísta Walter Benjamin, o filósofo Herbert Marcuse e o psicólogo social, filósofo e
sociólogo Max Horkheimer, que juntos formavam o núcleo precursor desta Escola (Soares,
2007).
Na tentativa de desvelar a lógica de funcionamento do projeto de modernidade, a
Teoria Crítica buscou compreender a realidade em seu movimento, vivo e em constante
elaboração. Tal reflexão se dispõe dialeticamente à reconstrução, a partir da consideração do
"não-pensado", como possibilidade de alternativa para o futuro, ou - aproveitando o termo
popularizado por uma das figuras chaves desta escola, Theodor Adorno - o exercício da
"dialética negativa". Considerando a decadência do projeto da modernidade, percebendo nas
mazelas da II Guerra Mundial o símbolo mais adequado dessa "razão sem-razão", delineia
focos de crítica como via de resistência ao progresso e à lógica intensa de produção de bens
materiais: "a dialética da razão iluminista e a crítica da ciência; a dupla face da cultura e a
discussão da indústria cultural e a questão do Estado e suas formas de legitimação" (Freitag,
1986 apud Soares, 2007, p. 482)
14
Em meio a uma multiplicidade de referenciais, a teoria crítica buscou sustentar uma
relação entre o pensamento de Marx e o de Freud, visando não só compreender os processos
sociais em sua dinâmica macro, mas nos efeitos subjetivos decorrentes deste. Sem
dogmatismos, consideraram as teorias numa dimensão relacional, apropriando-se de maneira
muito peculiar à noção de crítica contida em ambas. Desta maneira, entendiam que a
exposição das contradições do modelo de produção capitalista, a partir de análises
marxianas, e o reconhecimento dos conflitos e contradições subjacentes aos fenômenos
psíquicos na relação entre desejo e razão, a partir da teoria freudiana - além de indissociáveis
- seriam ferramentas basais para a compreensão das ideologias e dos modos de ser numa
sociedade cindida e dominada pelos ditames da razão e do conformismo social.
Segundo Benevides (2007), é na emergência de um estado moderno, pautado nos
ideários de liberdade e igualdade, que surgirá um modo de ser construído sob a égide do
capitalismo liberal. O "modo-indivíduo", como denomina a autora, denuncia que "a
experiência subjetiva da e na modernidade instaura as condições de constituição de um
modo-padrão de experimentar as relações no mundo" (p.441). Nas trilhas destes movimentos
de idéias, formas de organização coletiva e movimentos de massa - que surgem de
inconformidades deste "estado de coisas" operador de políticas e medidas de controle das
populações - tornaram-se objetos sociais de reflexão. Os indivíduos, quando reunidos,
apresentam certas peculiaridades, ora vistas como distorções da natureza individual, ligadas
à irracionalidade, à impotência e à sujeição (os estudos de Le Bon, Freud, Reich e Tarde) ora
como força fundamental para a transformação em uma sociedade mais justa e plural (as
reflexões de Canetti, Deleuze, Guattari e suas leituras marxianas).
Desta maneira, o importante a ser ressaltado é que as massas e seus movimentos
podem, e devem, ser vistos como contraponto fundamental de resistência ao modo de
subjetivação dominante. Pois, se nos aliarmos às
análises teórico-políticas, em que o movimento das massas aparece menos como irracionalidade
e mais como deslocamento e provocação de fraturas na realidade constituída, podemos retomar a
importância de seu papel histórico de resistência aos processos de exploração e de
assujeitamento, estes típicos do capitalismo. (Benevides, 2007 p.458)
Até aqui percebemos que apesar do florescimento da psicologia social moderna, de
perspectiva puramente psicológica e individualizante, ter se consolidado num contexto
norte-americano, outros caminhos se ramificaram, extrapolando as fronteiras americanas e
criando outros campos produtivos (Alemanha, França, União Soviética e etc), produzindo
"frutos" que germinariam em defesa de percepções e concepções mais amplas, baseadas no
15
questionamento à pressupostos científicos rígidos, no diálogo com outras áreas das ciências
humanas e na busca de superação das dicotomias sociais.
2.2 Psicologia sócio-histórica e comunitária: em busca da práxis e do compromisso
social
Diante do visto, cabe à nós perguntar enfaticamente: que saberes psicológicos falam
a respeito do humano, em suas dimensões materiais e subjetivas, visando à transformação e
emancipação? Como nos constituímos, o que nos determina? Superar ou sucumbir? São
dilemas que nos colocam em tensão, à procura conhecimentos cada vez mais condizentes
com os contextos de atuação, em um diálogo direto com as relações superestruturais da
sociedade. Segundo Gonçalves (2003), a produção de conhecimento é um processo histórico
e social que expressa "a realidade concreta de um tempo e de um lugar, não de forma direta
e linear, mas de forma mediada e contraditória." (p.278). Neste sentido, a luta pela
transformação social no campo da psicologia pode ganhar espaços a partir da elaboração e
implementação de políticas sociais, produzindo uma possibilidade de atuação
transformadora, para uma psicologia voltada às necessidades da nossa sociedade, acessível à
todos, engajada e buscando a superação das desigualdades sociais.
Respondendo aos desafios teórico-metodológicos no enfrentamento aos dilemas
elencados, a psicologia sócio-histórica se apresenta como uma proposição coerente para a
construção de uma prática libertadora, tendo como eixo fundamental a noção de
historicidade, uma ferramenta imprescindível para o desenvolvimento de uma psicologia
crítica, dialógica e em permanente movimento. É com a compreensão da historicidade dos
processos humanos que pode-se aliar a ciência à transformação social.
A noção de transformação social, dentro desta perspectiva, torna-se possível com a
elevação do estatuto da razão à seu patamar fundamental, na relação direta com a ação, pois
"o homem racional é um homem ativo e que, mais do que a verificação da correspondência
entre Razão e Realidade, seria a prática, processo de relação ativa entre o sujeito e o objeto,
o caminho para o conhecimento" (Gonçalves, 2003, p.281).
Outro base fundamental da psicologia sócio-histórica se encontra no reconhecimento
do materialismo histórico-dialético como método de análise do real, pois este compreende o
movimento da realidade como resultado das contradições presentes no ser humano, e que
determinam as relações entre sujeito e objeto. Assim, o método não é apenas um olhar
neutro para a realidade, mas incorporado ao movimento de transformação.
16
A conjunção de todos esses elementos não pode ser meramente abstrata e gratuita.
Essas relações implicam no reconhecimento de uma contradição fundamental ao modo de
produção em que vivemos, sustentado por ideologias e mediações na realidade que se
afirmam em determinado tempo histórico. A contradição capital-trabalho, indica que a
atividade humana é subjugada a um mecanismo que por gênese é desigual e segregatório.
Nos tempos de hoje, as novas formas do capital reestruturam o olhar e o modo de ação do
trabalho, em decorrência do desenvolvimento tecnológico, da flexibilização e precarização
do trabalho, e pela fragmentação das percepções sobre o real. A partir de uma idéia de
racionalidade, a mesma passa a ser questionada e responsabilizada pelas dificuldades
contemporâneas de se encontrar respostas efetivas para os dilemas da humanidade.
A psicologia, consciente que é parte da produção ideológica da sociedade, encontra
na abordagem sócio-histórica a proposta de evidenciar as condições materiais da
constituição subjetiva, explicitando as mediações presentes neste processo. Desta maneira,
torna-se mister o resgate da razão em sua dimensão dialética, contraditória e material no
enfrentamento das "naturalizações", cada vez mais invocadas pela negação da historicidade
e pela dificuldade no estabelecimento da gênese material dos processos de subjetivação no
real (Gonçalves, 2003; Gonçalves & Bock 2009).
A partir desses pressupostos, o processo investigativo deve direcionar o olhar para o
individual identificando aí as mediações sociais, na articulação realizada pelo indivíduo
entre os significados sociais e os sentidos pessoais. Considerando o papel ativo do sujeito na
constituição de si, surge a capacidade de gerir processos emancipatórios desde que se
anuncie e denuncie o que se constitui. Trata-se de uma gestão de cunho coletivo a partir da
prática social, baseada nos preceitos da superação, cooperação e emancipação. Segundo
Delari Jr (2009)
as potencialidades humanas só se realizam e se ampliam no âmbito da ação coletiva e em aliança
com a alteridade, com os outros sociais, não sendo seu foco ético uma realização humana
apartada daquela se nossos semelhantes, o outro não é impeditivo de nossa liberdade e realização
pessoal, mas uma das suas principais condições de possibilidade (p.4).
Torna-se inevitável que este tipo de abordagem em psicologia dialogue com
propostas de atuação de cunho mais político, buscando vias de ação que valorizem a
dimensão do público como bandeira de compromisso social e possibilidade de mudança.
Numa perspectiva contra-hegemônica, a atuação profissional de base sócio-histórica
encontra na prática da psicologia comunitária um diálogo mais concreto com as demandas
advindas da população, entrando em contato com as mobilizações da sociedade civil.
17
Pensando num contexto brasileiro, não podemos falar em psicologia comunitária sem
resgatar a história política do país e da América Latina. Nos últimos cinqüenta anos
diferentes conjunturas políticas engendraram modos de organização por parte da sociedade
civil, sempre como contraponto e resistência à uma lógica baseada na implementação da
ordem estatal e do modelo capitalista. Os profissionais ganhavam um espaço de trabalho
junto às comunidades, com diferentes formas de perceber os processos de constituição dessa
realidade. Nas décadas de 40 e 50, houve uma mudança do modelo produtivo, demandando
do estado um trabalho de capacitação dos setores populares relacionados com o novo
modelo econômico. Em um clima desenvolvimentista, o trabalho comunitária possuía um
cunho paternalista e assistencialista. A partir do anos 60, com a implosão do regime militar,
instaurou-se uma época de confronto entre o estado e as forças capitalistas e as necessidades
básicas da população, fazendo emergir a participação da sociedade civil nas discussões
políticas e a conseqüente repressão aos movimentos de emancipação.
É nesse quadro de acontecimentos políticos que se dá a regulamentação da profissão
de psicólogo no Brasil, em 1962. Os materiais teórico metodológicos ministrados nessa
época eram importados de modelos dos Estados Unidos, tendo pouca participação européia.
As perspectivas de atuação foram se desenvolvendo a partir de práticas em consultórios,
organizações e ambientes educacionais. A partir desta época, também começa a se gestar
uma contra-corrente nesse processo, dando-se a inserção do psicólogo com o objetivo de
estar mais próximo da população, mais atenta e comprometida às demandas dos setores
menos privilegiados. Nasce o termo psicologia na comunidade. Nesta época, tratava-se de
um trabalho muito mais político. Os referenciais teóricos de outras aéreas, como
antropologia, assistência social, educação popular eram conhecidos e passados a integrar as
formas de reflexão deste trabalho. A ênfase era o compromisso político, mais do que o
desenvolvimento de técnicas e métodos bem delineados na psicologia (Freitas, 2009).
Entre as décadas de 70 e 80, com as reivindicações ganhando corpo na sociedade
civil organizada, vários profissionais liberais e intelectuais incorporam-se aos setores
populares num trabalho conjunto de luta e de pesquisa, analisando formas de organização,
de conscientização e da participação política da população. Segundo Freitas (2009) foi o
envolvimento e o compromisso do profissional de psicologia junto à esse setores, que deram
início a uma prática que se preocuparia com problemáticas diferentes das com que
tradicionalmente trabalhava, permitindo-se expandir limites de atuação e ocupar novos
lugares. Esses trabalhos não só advogavam a deselitização da psicologia, mas afirmavam um
18
envolvimento com os movimentos que se percebiam comprometidos com as demandas da
população. A partir de reuniões e discussões junto às comunidades, levantamentos das
condições de vida, participação em passeatas e manifestações, todas no intuito de denunciar
a reivindicar direitos e serviços básicos aos menos privilegiados, a psicologia comunitária ia
solidificando-se, debatendo e refletindo sobre essas ações. A produção de trabalhos na área
ganha sentido, explicitando uma prática da psicologia social, "anunciando seu compromisso
político e permitindo que as críticas feitas às teorias psicologizantes e a-históricas se
evidenciem." (p.66)
Com o inicio da década de 90, a partir da institucionalização das políticas públicas de
assistência, o trabalho dos psicólogos se expande junto aos diversos segmentos da
população. Apesar de se constituírem em trabalhos que buscam ampliar e democratizar o
fornecimento de serviços, há uma diversidade teórica, epistemológica e metodológica no seu
desenvolvimento. A psicologia comunitária utiliza-se do enquadre teórico da psicologia
social, privilegiando o trabalho com os grupos, colaborando na formação da consciência
crítica e para a construção de uma identidade social e individual orientadas por preceitos
eticamente humanos (Freitas, 2009). Apesar de uma maior aceitação do trabalho
desenvolvido, uma formação acadêmica incipiente e a falta do uso e da aplicação de
perspectivas teóricas e metodológicas que embasem tal atividade ainda são impeditivos na
solidificação de ferramentas e experiências práticas que afirmem a necessidade deste tipo de
vertente em nossa profissão. Essa problemática além de denunciar a cristalização dos
modelos acadêmicos alheios à realidade brasileira, distanciam o estudante de conhecer a
realidade em que vive. Ao mesmo tempo, alguns trabalhos em comunidades, partindo de
uma perspectiva crítica, buscam outros instrumentais na
tentativa de construção de um novo paradigma para a compreensão dos fenômenos psicossociais
que se materializam e adquirem sua significação, em uma perspectiva micro e macroestrutural,
através das relações travadas no cotidiano, e também um paradigma que se estende para o plano
da intervenção e da atuação deste profissional junto aos problemas concretos das pessoas
(Freitas, p.75).
2.3 "A questão da gestão social tornou-se central": neoliberalismo, emergência do
"terceiro setor" e algumas reflexões sobre a atuação profissional em psicologia
O economista Ladislau Dowbor (1999), em um artigo intitulado "Tendências da
gestão social", sentencia: "A questão da gestão social tornou-se central". O autor argumenta
que diante das insuficiências estruturais do modelo produtivo vigente nos últimos anos,
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sustentado estritamente em razão de uma "dimensão econômica" desumana, torna-se
necessário repensar os modelos econômicos e construir formas de gerir as novas esferas do
público. Nestes tempos, afirma o autor, a dimensão social do desenvolvimento deixa de ser
"uma dimensão humanitária de certa forma externa aos processos econômicos centrais, para
se tornar um dos componentes essenciais da transformação social que vivemos" (pag.7).
Torna-se necessária para o profissional em psicologia uma compreensão destes novas
dinâmicas de organização estatal e econômico e dos novos setores de representação política,
como também das dinâmicas de participação da sociedade civil organizada.
Com a crise estrutural do capitalismo nos anos 70, em decorrência, principalmente,
das baixas taxas de crescimento econômico, da explosão da inflação e de uma profunda
recessão, houve a necessidade de se repensar a economia, culminando posteriormente na
hegemonia da política neoliberal. O neoliberalismo é um modelo de sistema econômico que
tem como premissas fundamentais o estabelecimento do mercado como mediador e
regulador da economia e a política do "estado mínimo", em função da deslegitimação de um
estado econômico do "bem-estar social" a partir do modelo keynesiano. Tais
transformações, sempre em prol da manutenção do capitalismo, fizeram emergir novas
questões sociais: privatizações desastrosas a partir da liberdade de mercado, crescimento das
alianças entre o público e o privado, o fortalecimento do Estado penal e, conseqüentemente,
o aumento das desigualdades sociais (Wacquant, 2008)
As políticas neoliberais, com o estatuto do estado mínimo e o crescimento das
grandes multinacionais, gera desemprego e um aumento irreparável da pobreza e da
violência. As lutas de base e mobilizações populares são tidas como "datadas", não fazendo
mais sentido num contexto de "livre mercado" e "democracia participativa", onde o plano
institucional torna-se o lócus de confronto por aqueles que constroem o "social", seja como
negócio ou como busca de emancipação do modo de produção vigente (Gohn, 2004)
Neste modelo, as funções sociais que antes eram destinadas e garantidas pelo Estado
são repassadas para a sociedade civil organizada, que passa a fazer a execução das políticas
sociais. Esta conjuntura levanta questões e contradições históricas sobre as pautas dos
movimentos sociais, sobre as formas e modelos de organização e participação popular,
abrindo canais de diálogo e construção até então inexistentes.
Em modelos anteriores, o eixo fundamental das mobilizações populares era a noção
de autonomia, baseada na organização independente do Estado e possibilidade de afirmação
de um outro tipo de postura, longe do autoritarismo da política vigente. A busca por uma
20
contra-hegemonia mobilizou setores desfavorecidos no trabalho, na moradia, congregando
vários movimentos sociais que se identificavam a partir da reivindicação de mais liberdade e
justiça social. A partir da abertura política nos confins da ditadura, e dos processos de
redemocratização no país, se abriram canais de participação e representação política, onde os
movimentos sociais perderam progressivamente a centralidade dos discursos sobre a
participação da sociedade civil. A autonomia deixa de ser o eixo estruturante da construção
de uma sociedade democrática, pois com a saída dos militares do poder e o retorno dos
processos eleitorais no país, o poder passa a ser objeto de forças políticas organizadas. A
emergência de tais processos conferiram à noção de cidadania a mesma relevância que tinha
o conceito de autonomia nos anos 80. A cidadania surge como novo discurso das
mobilizações da sociedade civil, busca direitos e deveres, homogeneizando os atores sociais.
Um avanço enquanto reconhecimento dos novos atores sociais, porém com ressalvas para a
"omissão do Estado" na garantia de suas funções com as atividades destes grupos, que agem
a partir das negligencias do governo (Gohn, 2004)
Com o passar dos anos, houve uma "ampliação e uma pluralização dos grupos
organizados que redundaram na criação de movimentos, associações, instituições e
Organizações não governamentais (ONGs)" (Gohn, 2004 p.22). Segundo Lopes (2004), ao
argumentar sobre a situação das ONGs neste contexto, afirma que estas se articulam em
torno de interesses públicos, "mas regularmente se constituem em uma esfera privada,
visando gerir necessidade públicas específicas ou atuar sobre elas utilizando recursos
advindos geralmente da fonte pública" (p.60).
Assim, trata-se de uma política na qual o Estado é responsável "deixa de lado o papel
de executor, ou prestador direto de serviços, e passa a ter função de promotor e regulador"
(Gohn, 2004, p.27). Essas organizações além de receberem toda uma infra-estrutura que
servia como base para um órgão estatal, recebem recursos públicos, onde sua alocação não é
submetida aos ditames da execução orçamentária, diferente dos demais órgãos públicos
(Gohn, 2004).
Neste cenário de nova economia social, o terceiro setor de nível corporativista,
comumente de cunho assistencialista, aliado a grandes companhias empresariais, se
sobressaem frente as chamadas "ONGs cidadãs", que trabalham de forma processual,
visando a mobilização dos atores atuando em defesa da cidadania. Segundo Gohn (2004), o
novo perfil destas organizações, diferentemente das ONGs dos anos 80 com um perfil de
fortes características reivindicativas, participativas e militantes, desenham um tipo de
21
entidade mais voltada para "a prestação de serviços, atuando segundo projetos, dentro de
planejamentos estratégicos, buscando parcerias com o Estado e empresas da sociedade civil"
(pag.27).
Diante do discutido, percebe-se a emergência de ficarmos antenados nas complexas
metamorfoses sócio-políticas do nosso país, buscando articular forças e angariar espaços que
promovam autonomia e cidadania. A participação da sociedade civil na esfera pública não é
para substituir o Estado, mas para lutar para que este cumpra seu dever. Nossa participação
pode se resumir aos espaços das instituições que não visam um questionamento constante do
estado das coisas numa conjuntura política que desfavorece a mobilização dos atores sociais.
A participação cidadã deve emergir como garantia de fortalecimento dos laços entre os
espaços institucionais e as práticas coletivas das organizações populares. (Gohn, 2004)
Nesta perspectiva de contradições e novos desafios sociais, no avanço das políticas
públicas e na emergência das organizações sociais e não-governamentais - o chamado
"terceiro setor" - a inserção do psicólogo nestes espaços se apresenta como possibilidade de
atuação profissional. O que entra em questão é: Como nos inserimos? Que ferramentas
dispomos para os desafios deste campo? Quais estratégias possíveis no enfrentamento das
mazelas da questão social e qual seria a formação necessária para tal? Parece que a formação
acadêmica, como já mencionada, não acompanha as demandas do real, colocando o
profissional de psicologia à mercê da complexidade social e política de nosso país.
Segundo Yamamoto & Paiva (2010), a psicologia não pode fechar os olhos para as
mazelas da questão social do Brasil, já que estamos inseridos no campo do bem-estar. Tais
problemáticas, quando percebidas, são encaradas de maneira equivocada ou insuficiente. Os
processos de exclusão, inerentes ao capitalismo, sustentam a ordem social gerando
sofrimento dentro de uma lógica de "inclusão perversa" num sistema que ao tempo que
produz riqueza, gera dialeticamente a pobreza. Diante de tais condições, conjuntamente ao
enxugamento do papel do Estado, o chamado "terceiro setor" tem sido utilizado como
estratégia política de enfrentamento às mazelas da questão social, e tem se configurado
como amplo campo de atuação para o psicólogo.
Tal perspectiva possui um foco de trabalho e objetivos bem diferentes de uma prática
tradicional, necessitando de espaços de reflexão sobre as atuações e formação continuada,
para que não haja uma prática irrefletida ou pensada fora da materialidade das condições de
trabalho. A formação individualista do psicólogo, apesar de ter seu valor profissional, não é
eficaz no que diz respeito ao trabalho junto à comunidades, pois não produz ferramentas
22
condizentes com as demandas organizacionais das políticas de assistência. Nestes contextos
de atuação, deve-se pensar em intervenções psicossociais com um enfoque interdisciplinar,
que se sustentem "na prevenção e educação, na promoção e otimização, no fortalecimento
dos recursos e potencialidades dos grupos e coletivos sociais" (Yamamoto & Paiva, 2010,
pag.155)
O enfrentamento no campo profissional a partir destas premissas surge como um
intenso desafio cotidiano. Nossa cultura profissional, permeada por um ideário individualista
e de "psicologismos", nos leva a agir sobre a realidade de maneira homogênea, como se os
modelos subjetivos fossem universais. É preciso pensar em uma nova concepção
profissional, favorecendo o protagonismo, encarando os sujeitos em sua capacidade de ação
e proposição.
A transvaloração de uma prática tradicional e individualista emergirá a partir da
articulação de categorias que revitalizem as potências do ser humano, baseados na ética, na
participação conjunta e na multidisciplinaridade como modo de olhar para o real. Assim, o
papel na intervenção social pode ser considerado o núcleo da identidade social do psicólogo,
tendo como sua função a "desalienação das pessoas e grupos, eliminando mecanismos que
bloqueiam a consciência da identidade social" (Martín-Baró, 1996 apud Yamamoto & Paiva,
2010, pag.157)
O dilema do profissional em psicologia, comprometido socialmente em busca da
transformação social, é que a expectativa de mudança social entra de encontro com os
limites e fronteiras da própria atuação no contexto do capitalismo. Dessa maneira, torna-se
essencial perceber que
não é o psicólogo quem vai mudar o mundo, mas, evidentemente, uma ação comprometida,
contextualizada, política, articulada, que vise à emancipação dos sujeitos, poderá iniciar alguma
transformação(...) O conformismo social não é nada mais que a interiorização das relações de
dominação. Assumir que nada se pode fazer diante dos problemas sociais é naturalizar as
circunstâncias atuais, desconsiderando seu caráter histórico" (Yamamoto & Paiva, 2010, p.159)
23
3.CONTEXTUALIZAÇÃO DO ESTÁGIO
3.1 Contextualizando o lócus de ação: Projeto Beira da Linha
O Projeto Beira da Linha é uma Organização Não-Governamental (ONG) situada no
Alto do Mateus, bairro periférico da cidade João Pessoa localizado próximo às fronteiras
com o município de Bayeux. Trata-se de um programa da "Pia Sociedade de Padre Nicola
Mazza", congregação pastoral italiana que em 1978 chegou ao Brasil, instalando-se na
Paraíba para um trabalho junto às pastorais paroquiais na periferia de João Pessoa. Em 1989,
após amadurecimento das condições de estadia e ação, se organizou para a promoção de
uma intervenção "orgânica e de forte impacto social", a partir principalmente do trabalho no
âmbito educativo. Junto aos seus voluntários, diagnosticaram áreas de grande risco e
vulnerabilidade social, entendendo como mais urgentes frente à realização de ações sócio-
educativas. Em 1990 foi realizado uma pesquisa na comunidade da Beira da Linha, situada
no Alto do Mateus, para a construção de um perfil sócio-econômico, cultural e religioso da
população. Remetendo à história do bairro, a comunidade Beira da Linha foi a primeira
aglomeração habitacional à constituir o Alto do Mateus, situada às margens de uma linha
férrea. Em relação a negligencia com a qual esta parte da cidade conviveu desde sua
constituição, a Beira da Linha é mais uma marca da contradição do crescimento desigual
urbano de João Pessoa, que a história teima em recriar (Brito, 2007).
A partir de então, o projeto tem seu início no intuito desenvolver e capacitar crianças
e jovens do bairro do Alto do Mateus. Em seus anos iniciais, o Projeto foi desenvolvendo
uma postura estratégica no sentido de valorizar o princípio dos direitos e dos deveres de
cidadania e passou de uma ação crítica e paralela ao serviço público a uma ação de
sensibilização e participação nas atividades institucionais, comunitárias e individuais na área
da educação.
Enquanto elementos estratégicos de ação (visão / missão / princípios e valores), o
Projeto busca proporcionar a inserção social de crianças a adolescentes a partir da formação
e exercício de uma consciência crítica, do estímulo da capacidade criativa e voltada para a
promoção humana de maneira integral. Tudo isso referendado por autênticos valores
humanos baseados na formação espiritual, na cultura e na opção pelos pobres: ética,
respeito, compromisso social, responsabilidade e cooperação.
Atualmente o Projeto está estruturado a partir de diferentes Centros de Formação que
acompanham as progressivas fases (da I à IV, dos 4 aos 24 anos) de desenvolvimento dos
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jovens: o Centro Educativo Miramangue, o Centro Comunitário São Judas, o Centro
Esportivo "Chievo Verona" e o Centro de Formação Profissionalizante. Nos centros se
desenvolvem as seguintes atividades: letramento, recreação, arte, informática, música,
esporte, cursinho pré-vestibular, ação na perspectiva da educação profissional, processo de
formação e inserção dos adolescentes e jovens no mercado de trabalho buscando uma
formação ética, cidadã e profissionalizante.
O Projeto Beira da Linha mantêm articulações com organizações da sociedade
civil que desenvolvem ações educativas e com escolas públicas bairro. Também se articula
com políticas públicas em parceira com o estado, mantendo núcleos do PETI (Programa de
Erradicação do Trabalho Infantil) e do Pró-Jovem. Participa de Fóruns e Conselhos
municipais e estaduais que tratam de questões relacionadas à garantia e efetivação dos
direitos da criança e do adolescente. É financiado através de editais e projetos na área da
educação e cultura, como também recebe recursos advindos da Pia Sociedade.
3.2 Contextualizando a Proposta de Estágio
O estágio supervisionado em Psicologia Social em questão teve como "problema de
fundo" inicial buscar pensar como a relação capital/trabalho constitui e participa dos
processos subjetivos dos sujeitos no confronto/limite com as delimitações do Projeto.
Entendendo a atividade do psicólogo social como problematizadora das contradições
emergentes no social, também buscou-se identificar demandas e articular as redes possíveis
no contexto do bairro do Alto do Mateus a partir do Projeto.
Portanto, dentro dos objetivos específicos do estágio, se colocaram como fio
condutor de nossa ação:
Identificar, em parceria com o Projeto Beira da Linha, as necessidades vividas e
percebidas pela comunidade do Alto do Mateus;
Refletir com a Comunidade sobre as possibilidades de mudanças ao mesmo tempo em
que esta é que estabelece os caminhos e aponta as suas necessidades prementes;
Pensar nas intervenções focadas nas relações familiares, comunitária e institucionais;
Fornecer uma formação teórica e metodológica que possibilite ao profissional em
psicologia compreender a realidade social a partir de várias nuances bio-psico-social,
histórica, econômica e política;
Compreender os modos de subjetivação que favoreçam os processos simbólicos para a
constituição de diferentes modos de ser sujeito, vivenciando tanto o sofrimento quanto
25
os investimentos na mobilização e protagonismo como atores de suas histórias e de
mudanças sociais.
O que se desejava alcançar era a construção conjunta de canais e alternativas para
que a comunidade (representada pelo PBL, as crianças, famílias e educadores)
desenvolvessem relações solidárias, críticas, conscientes e éticas que viabilizem processos
de autonomia, protagonismo e conquista dos direitos e de cidadania. Para isso faríamos uso
de ferramentas para a intervenção que advém tanto do campo da investigação participante
como da própria psicologia: reuniões, escutas dos diversos atores sociais, coordenação,
visitas domiciliares, resgate de documentos, registro dos acontecimentos, observação
participante das atividades com educadores, crianças e adolescentes e famílias e
redimensionamento dessas demandas. Também se faz mister supervisões tanto com equipes
do PBL como com a professora coordenadora do estágio. Apesar do PBL não possuir um(a)
psicólogo(a) em seu quadro de funcionários, profissional comum dentro do campo do
Terceiro Setor, não pareceu ser impeditivo para nossa prática dentro do estágio.
Ao constatar a amplitude e o raio de ação do Projeto, que foi-se constituindo em mais
de 20 anos de atividades, delimitamos que o primeiro semestre do estágio (que corresponde
de Agosto à Dezembro de 2010) nos serviria mais como aproximação dos espaços e
atividades desenvolvidas do que intervenção propriamente dita. Entendemos entendendo que
não estaríamos aqui numa "zona de conforto" passiva, pois a abertura à experiência nos
colocaria atentos, sabendo intervir quando e se preciso, nesse tempo. Utilizamos a
metodologia da territorialização (presença/criação/movimento), isto é, movimento de
compreensão do território, para/com o Projeto, buscando o Dentro (Como é? Como funciona
internamente? Quais espaços formativos?) e o Fora (a comunidade, parceiros do PBL). A
idéia é "visualizar os outros" que vivem no território. A proposta era que a partir da
territorialização, do conhecimento dos espaços de atuação e das vivências junto ao PBL,
construíssemos a demanda e estabelecêssemos propostas e campos de intervenção mais
sólidos para o próximo semestre, com o intuito de nos aproximarmos dos objetivos
previamente estabelecidos com o Projeto.
26
4.ATIVIDADES REALIZADAS
Para uma melhor compreensão e detalhamento, as atividades serão descritas de
acordo com a seguinte divisão: Territorialização, Reuniões de Formação de Educadores,
Reuniões do Grupo de Protagonismo, Visitas Domiciliares, Reuniões de Estágio e
Atividades Extras.
4.1 Territorialização
No período correspondente à primeira parte do estágio, de Agosto à Dezembro de
2010, nos utilizamos da metodologia da territorialização no intuito de compreender os
movimentos dos espaços abrangidos pelo Projeto. Neste período realizamos diversas
atividades: conversas com alguns profissionais sobre as ações do Projeto; participação em
reuniões com famílias, com o grupo de protagonismo, com educadores e coordenadores nas
reuniões de avaliação e planejamento dos Centros Pedagógicos (Miramangue e Centro de
Formação) e em reuniões de formação geral (todos os centros); reuniões junto à rede do
Alto do Mateus; como também a realização de algumas visitas domiciliares. Abaixo
buscarei destrinchar os pontos mais relevantes de tais atividades para melhor vislumbrar
quais fatores nos levaram à nossa proposta interventiva seguinte.
As conversas com os profissionais sobre o Projeto ocorriam à todo momento, sendo
em situações formais, em reuniões de coordenação por exemplo, ou mais informais, na "hora
do café" ou nos momentos que antecediam as atividades marcadas. Eram conversas que
buscavam ir aos poucos entrando no mundo que comporta a extensão do Projeto, suas
questões, histórias, desafios e relevância para o bairro. Logo de inicio conhecemos uma
educadora "polivalente" dentro do PBL que ficava encarregada de fazer "elos" entre
instituição e comunidade, ao trabalhar com grupos (de jovens e famílias) como também
realizar visitas domiciliares. Sempre bastante solícita, foi com a ela que dividimos a maior
parte do tempo desses primeiros meses, ao realizar algumas visitas domiciliares com a
mesma, conversar sobre a relação com as famílias e sobre regulamentos e atividades do
Projeto na relação com a comunidade. Apesar de não parecer ter tanto espaço para "criar"
dentro do Projeto, pois seu trabalho parecia muito mais voltado à cumprir demandas
orientadas pela coordenação, era uma peça de fundamental e de silenciosa importância para
o decorrer de algumas ações do PBL.
27
A partir deste contato inicial, participamos de duas atividades específicas no Projeto:
um "encontrão" com as famílias do bairro contempladas pelo PBL, e uma reunião com os
jovens do grupo de protagonismo. Esse encontro com as famílias teve como temática a
questão da violência e das drogas, problemática recorrente e presente no cotidiano dos
moradores do Alto Mateus, e também serviu para apresentar a campanha anual do PBL,
intitulada "O Povo à Caminho da Paz". Foi apresentada a campanha e logo em seguida foi
realizada uma pequena palestra por uma das coordenadoras pedagógicas, ressaltando a
necessidade de uma vida saudável. Após esse momento, foram divididos grupos com
educadores do PBL presentes e as famílias e distribuídos textos-base que serviriam de
auxílio para as discussões sobre a temática. Participamos, eu e Cristiane, a outra estagiária,
separadamente. O texto era longo e o tempo dado foi curto, sendo mais proveitoso tentar
conversar um pouco com aqueles familiares, saber do seu envolvimento com a temática, do
que ler o “texto-manual” apresentado. Depois desse momento, os grupos apresentaram o
produto da discussão, realizando falas e questões que surgiram no momento anterior.
O grupo de protagonismo do Projeto já existia, e era coordenado pela educadora que
trabalhava com famílias e acompanhava os jovens. Buscando intervir junto aos integrantes
do grupo, participamos de um encontro com eles, no intuito de viabilizar possibilidades de
ação. Realizamos uma dinâmica inicial chamada “Homenagem à Magritte”, que busca
questionar os nomes e os objetos, seus usos e possibilidades. Participaram e se animaram
com aquele primeiro contato estabelecido. Depois, sentamos e conversamos com eles, sobre
o cotidiano, escola, sobre PBL, sobre gostos e etc. Em seguida, a educadora, que esteve
presente todo o tempo observando a atividade, apresentou, com o auxílio dos jovens, a
trajetória do grupo e dos espaços que tinham participado enquanto protagonistas e atores do
Projeto, em fóruns e conselhos municipais e estaduais de discussão sobre políticas para a
infância e adolescência. Como já nos encontrávamos perto do fim de 2010, foi o único
encontro com o grupo de protagonismo nesse semestre.
Participamos também de algumas das reuniões quinzenais de avaliação e
planejamento dos dois principais centros pedagógicos do PBL: o Miramangue e o Centro de
Formação Profissionalizante. Como estávamos no estágio eu e a Cristiane, nos dividimos,
para que cada um acompanhasse um dos Centros. Eu acompanhei o Centro de Formação
Profissionalizante, uma das principais referências do Projeto. Durante as reuniões, os
educadores colocavam a trajetória de suas aulas, levantando possíveis questionamentos,
dúvidas, casos específicos com os jovens, como também apresentando os resultados do
28
planejamento e avaliação de suas turmas. Minha presença nas reuniões, vez ou outra,
suscitava “brincadeiras” e demandas específicas segundo uma visão hegemônica na
psicologia, de “alunos-problema”, de buscar compreender e detectar formas de lidar com os
“mal-comportados”. Tais questões ampliavam seu nível de análise a partir de intervenções
da coordenadora do Centro, que por conhecer parte do contexto daqueles jovens, famílias e
casos peculiares, buscava mostrar que talvez fosse mais um “campo problemático” que
envolvia a responsabilidade de todos do que focar no “aluno-problema” e seu possível
“ajuste”. Nos momentos em que buscava responder os questionamentos que surgiam nas
reuniões, tentava encontrar formas de afirmar uma visão de psicologia que valoriza mais o
contexto, dentro de uma perspectiva sócio-histórica, que mesmo de maneira tímida parecia ir
encontrando algum lugar na reflexão dos educadores. Eram reuniões muito mais
encaminhativas do que problematizadores, visando dar conta dos conteúdos e dos
planejamentos. As avaliações dos educadores ocorriam a partir de questões objetivas e
subjetivas, se utilizando de formulários que possuíam conceitos nos quais os jovens do
Projeto eram pontuados. A coordenadora tentava, através de algumas falas que refletiam
sobre a “ideologia mazzeana” e a proposta educativa do Projeto, instigar os educadores a
pensarem sobre sua prática, ampliar seus posicionamentos frente aos jovens.
Outro espaço solidamente ocupado durante o período da territorialização foram as
reuniões gerais de formação dos educadores do PBL. Ocorriam quinzenalmente no Centro
Comunitário São Judas, com a participação de todos educadores do Projeto, inclusive de nós
dois estagiários de psicologia. A formação geral era facilitada pela coordenação pedagógica
do Projeto, que sistematizava a metodologia e as atividades das reuniões. Normalmente, as
reuniões eram divididas em duas etapas: na primeira metade havia a apresentação de algum
tema, ou algum educador/teórico, através de exposição oral ou vídeo; e na segunda etapa,
depois de um pequeno intervalo, havia o desenvolvimento de alguma atividade prática sobre
o tema, com a participação de todos os presentes. As temáticas apresentadas versavam sobre
posições pedagógicas e teórico-metodológicas que se entendiam como base para o Projeto:
perspectiva sócio-interacionista-construtivista; educação popular; e a apresentação de alguns
“teóricos da educação”, como Rubem Alves, Paulo Freire, Vigostki, e Emília Ferreiro. O
intuito era que os educadores se apropriassem daquelas discussões para repensar suas
práticas, buscando uma verdadeira práxis pedagógica para o Projeto. Este espaço, em outras
épocas do Projeto - como salientado pelos educadores - já fora mais “valorizado”, servindo
como formação de base e de quadros militantes para o PBL, com formações extensas que as
29
vezes aconteciam durante todo um fim de semana, por exemplo. No desenrolar das reuniões,
percebemos que a própria metodologia desenvolvida não parecia condizer com os
pressupostos apresentados, sendo mantida uma certa “roupagem escolar” ao processo, não
dando muitos espaços para a participação dos outros educadores, que eram poucas.
Percebíamos que a implicação por parte dos educadores era limitada, partindo sempre dos
“poucos e mesmos de sempre”, nos fazendo pensar de que maneira todos poderiam ser mais
ativos em um espaço tão importante quando este. Buscando participar mais diretamente das
reuniões, intervindo substancialmente neste espaço, nos propomos à facilitar uma atividade
que versaria sobre o psicólogo russo Vigotski, precursor de uma abordagem que trabalhamos
enquanto teoria/prática e temos contato mais próximo, a perspectiva sócio-histórica. Durante
esta oficina nos propomos à, teórico e praticamente, delinear os caminhos de compreensão
tanto da base contextual do pensamento vigotskiano como de nossa ação enquanto
estagiários de psicologia social, entendendo que espaços de formação como esse poderiam
fazer parte do repertório interventivo da Psicologia Social. Depois de uma apresentação
inicial da temática, percebemos que as discussões foram tomando “outro” caminho, onde
houveram percepções sobre a conjuntura pedagógica do Projeto, desencadeando reflexões
acerca dos desafios da prática e “desabafos” diante da situação de alguns educadores
(estavam num processo de mudanças, de saídas e desligamentos do PBL) e as relações entre
passado de militância e o presente de desmobilização, desafio para todos. Foi questionado o
Projeto Político Pedagógico do PBL e da dificuldade de sua implementação prática, da
distância existente entre o “ideal pedagógico” e o real do cotidiano das aulas. Neste
momento a ferramenta da “escuta” se mostrou uma forte aliada para que pudéssemos buscar,
junto com eles, desbravar impressões e afetos construídos a partir da relação de cada um
com o PBL. Foi nessa formação que sinalizou-se mais fortemente a importância de
acompanharmos as formações dos educadores, entendendo como um espaço essencial para a
partilha e construção dos projetos educacionais do PBL.
Nas conversas junto à coordenação e no conhecer do Projeto, nos deparamos com a
articulação existente entre instituições e serviços do bairro, as reuniões da rede do Alto do
Mateus. Tivemos a oportunidade de participar de duas dessas reuniões. Na primeira delas, as
entidades participantes da rede apresentariam seus projetos em relação à temática das drogas
e da violência, recorrentes nos trabalhos de todos. Dentre as propostas de escolas, de núcleos
do Pró-Jovem, do CRAS (Centro de Referência de Assistência Social), o Beira da Linha
apresentou sua campanha “O Povo à Caminho da Paz” como proposta de enfrentamento,
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convocando todos da rede na articulação e fortalecimento da mesma. Também foi discutida
a questão da imprensa no bairro, que só aparece para cobrir assassinatos, transmitindo uma
“imagem ruim” da região, e então, surgiu a vontade de propagandear essas campanhas junto
à mídia, mostrando outras alternativas à violência que acomete o Alto do Mateus.
Interessante perceber o “tom repressor” das propostas de “contenção da violência” das
entidades, não conseguindo ampliar a percepção sobre o tema. Também foi colocado por
todos a dificuldade que vinha sido enfrentada em relação à uma articulação mais próxima da
rede, diante da falta de tempo e das demandas específicas das partes. Na segunda reunião,
foi colocada a importância da rede para se conhecer melhor a realidade do bairro, se articular
mais. Novamente o “combate às drogas” foi tema, tendo a participação do CAPS (Centro de
Assistência Psicossocial) informando como funciona e afirmando a importância de se
ampliar as informações sobre os dispositivos do serviço. Também foi exposto a experiência
dos redutores de danos do “Consultório de Rua”, sobre o trabalho com jovens do centro da
cidade. Nesta reunião nenhum representante do Projeto foi, tendo apenas a minha presença
como mais próxima do PBL. A partir de então não presenciamos, ou não ficamos a par, de
mais nenhuma articulação do PBL junto à rede, apenas que as atividades relativas à
campanha estavam tentando ser articuladas mais com dificuldades de implementação, pouca
adesão dos atores.
Outra atividade acompanhada neste período de territorialização, e visada desde o
início do estágio como uma importante ferramenta de intervenção junto ao Projeto, foram as
visitas domiciliares. Desde a conversa com a educadora que acompanhava as famílias, sobre
a sistemática e as concepções das visitas domiciliares do PBL, fomos buscando articular
horários e dias específicos de visitas para acompanhá-la, visando conhecer um pouco
aquelas famílias e os caminhos da comunidade. As visitas sob orientação, a partir de
demandas dos coordenadores, e visitas de rotina. Também são realizadas visitas às escolas
para saber dos jovens do PBL, pergunta “Como tá? Se tiver problema, eu escuto”. Segundo
a educadora, há uma preocupação de preservar o “por quê?” nas famílias e respeitar à
liberdade da religião delas. As orientações são feitas de acordo com a necessidade
apresentada. Afirma a necessidade de sensibilidade nas abordagens às famílias, para não
ficar “técnico” demais. Diz não se tratar de um trabalho assistencialista, mas sim voltado
para a cidadania. No acompanhamento de algumas visitas, percebíamos intuitos e formas
específicas de seu modus operandi: mapear as famílias a partir de formulários e
questionários, nem sempre tão claros; inquirir sobre o “nível de satisfação” dos familiares
31
em relação às atividades do Projeto; e cobrar presença ou buscar resolver problemas
ocorridos com os jovens contemplados pelo PBL. Quando de um caso mais complexo que
nos deparamos numa das visitas, que envolviam outras instâncias do setor público, como a
relação com as políticas de assistência do bairro, vimos que não parecia ser de freqüente
hábito a preocupação de utilizar aquele espaço das visitas como ferramenta de mediação
entre os sujeitos e a busca de efetivação de seus direitos, seja pelo esclarecimento ou
encaminhamento aos serviços. Quando do final deste período de territorialização, sentamos
para uma conversa com a educadora que acompanhamos nas visitas, para discutirmos
questões e percepções dela sobre as famílias e nosso acompanhamento até então, como
também buscando afirmar concepções da psicologia social1 sobre essa ferramenta de
intervenção, problematizando suas possibilidades de ação. Foi entendido por ambas as partes
que só um trabalho mais aprofundado junto às famílias, traçando um planejamento de visitas
e reuniões, poderia ser efetivo para à mobilização e maior participação das mesmas junto ao
PBL.
Depois de participarmos de atividades dentro dos mais variados espaços de atuação
do Projeto, conhecendo alguns movimentos internos e estabelecendo vínculos, pudemos
pensar sobre as possibilidades de inserção e de nossa atuação junto ao PBL. Assim, após o
período de territorialização e de discussões junto a supervisora de estágio, delineamos três
eixos de intervenção para a segunda parte do estágio, que correspondeu do mês de Fevereiro
ao mês de Junho de 2011. Os três eixos foram: (1) formação de educadores; (2)
coordenar/facilitar as atividades do grupo de protagonismo das crianças e jovens atendidas
pelo projeto; e (3) acompanhar as famílias (se possível, a das crianças e jovens do grupo de
protagonismo).
Tais propostas foram levadas à uma reunião com a equipe coordenadora do Projeto
quando esta traçava o Plano Estratégico do PBL para 2011. Importante frisar que os eixos de
intervenção construídos a partir do estágio supervisionado entrariam no Plano Estratégico do
Projeto, como atividade a ser efetivada e levada à cabo por todos, estagiários e profissionais
envolvidos nas atividades, demandando participação, responsabilidade e implicação de
todos.
1 Importante frisar que trata-se aqui de uma perspectiva sócio-histórica, centrada nas possibilidades de ação dos
sujeitos sociais, onde valoriza-se a questão do contexto buscando reconfigurar problemáticas a partir de seu
campo produtivo, da produção social (Gonçalves, 2003 ; Gonçalves & Bock, 2009).
32
A seguir serão descritas tais atividades para uma melhor compreensão do seu
desenvolvimento, tomando como base inicial qual seria nosso intuito com cada eixo, para
depois versarmos sobre o ocorrido, seus obstáculos e possibilidades dentro dos limites do
Projeto.
4.2 Reuniões de Formação de Educadores
Proposta
As reuniões de formação com os educadores foram o primeiro eixo de intervenção
delineado para o estágio. Na primeira parte do estágio participávamos destas reuniões como
"ouvintes", percebendo como se dava a dinâmica e envolvimento de todos. Na segunda parte
do estágio, a partir de uma definição sólida de nossa intervenção junto à esse espaço, nosso
intuito era participar das formações, mediando o debate, visando a construção de outras
possibilidades de atuação e novos processos de subjetivação (forma de pensar e conceber o
homem, a sociedade, as relações, bem como de se posicionar no mundo). Tal demanda
também surgiu dentro da necessidade de consolidarmos o Projeto Político Pedagógico do
PBL, que por mais que possuísse uma estrutura ideal bem construída precisaria de uma
apropriação mais íntima por parte dos educadores (novos e antigos).
A proposta inicial seria de uma formação mensal e que seria proposto um teórico por
semestre, visando a formação continuada de todos. Durante todo o semestre, a formação
tomaria como foco a perspectiva de um só teórico (da educação, da psicologia, das ciências
sociais, etc), sempre se buscando em todas as formações fazer o exercício de relacionar a
formação com a prática de cada educador dentro do projeto, bem como com a proposta
educativa/social/espiritual do projeto. A formação pautaria a possibilidade de construção de
uma práxis (reflexão -> ação -> reflexão sobre esta ação -> nova ação ...) com os
educadores.
Ao final de cada formação, o educador sistematizará a relação entre a formação em
curso e a sua prática e apresentará, seja em texto escrito, ou na criação de uma peça, numa
poesia, cordel ou através de outros dispositivos com os quais o educador se sinta a vontade.
Isso não só possibilitará caminhos para a visualização da práxis, mas também poderá,
posteriormente, ser editado e organizado enquanto produção vivencial/prática do Beira da
Linha.
33
Desenvolvimento
De início, buscamos encontrar um primeiro teórico que fosse de comum acordo para
trabalharmos neste primeiro semestre da formação dos educadores, que servisse como base
filosófica e pedagógica para o Projeto. Resgatamos os teóricos vistos até aquele momento,
na idéia de aprofundarmos a partir de algum deles. Durante as formações, a figura de Paulo
Freire sempre aparecia como eixo central do trabalho com Educação Popular desenvolvido
pelo Projeto e nos trabalhos junto aos movimentos sociais. Os educadores também sentiram
a necessidade de conhecer melhor sua teoria, que muitos já conheciam mas apenas
superficialmente. Então ficou-se encaminhado que seria nosso teórico a ser abordado neste
primeiro semestre.
Neste primeiro encontro levamos o PPP do Beira da Linha que nos havia sido
enviado pela coordenação, depois de uma conversa que tivemos com a mesma sobre quais
rumos tomar para dar fundamento à nossa intervenção na formação de educadores.
Tentamos ler o documento junto com os educadores, para que também a partir dele
pudéssemos além de compreender melhor seu conteúdo, nortear nossas discussões. Neste
momento haviam alguns educadores novos no Projeto, que também nunca tinham tido
acesso ao documento. Apesar de tentarmos lê-lo, uma das educadores antigas do PBL nos
alertou que não se tratava do documento atual, que já estavam trabalhando numa nova
versão do mesmo. Mesmo assim lemos e pareceu importante para que alguns ficassem mais
a par do que se tratava. Esta mesma educadora, durante a discussão, fez um panorama do
processo educativo do PBL, convocando todos a pensar mais nas pessoas do que em
números, estatísticas e metas. Assistimos um documentário produzido pela Pia Sociedade
sobre o Projeto Beira da Linha, falando de sua história, atividades e espaços de atuação. Ao
final desta reunião combinamos como seria nossa próxima formação, já tendo como
temática principal o referencial de Paulo Freire. Como discutido anteriormente durante uma
supervisão de estágio, tínhamos pensado que o educador popular Alder Júlio, professor
aposentado da UFPB e militante junto aos movimentos sociais, poderia estar conosco e nos
ajudar nessa empreitada. Os educadores acharam uma boa idéia, inclusive ficando acordado
que a próxima formação ocorresse na própria universidade, possibilidade levantada pelo
próprio Alder e acatada pelo coletivo de educadores.
No segundo encontro, nos encontramos todos em uma sala da UFPB para a formação
inicial sobre Paulo Freire, sob a tutela do generoso Alder Júlio. Foi um momento mais
expositivo, onde Alder traçou os caminhos da trajetória freireana, desde de seu perfil bio-
34
bibliográfico à vigência de seu legado para a educação. Falou da importância da
transformação como lema do processo formativo e do diálogo como ferramenta essencial na
relação com o outro. Ao fim de sua exposição, alguns poucos educadores refletiram sobre o
dito, contextualizando a conjuntura política atual e da dificuldade de mobilização frente aos
desafios do processo educativo, na crença da mudança.
Combinamos que nos encontraríamos novamente em quinze dias, no PBL, para
darmos continuidade às reflexões sobre a teoria freireana e sua possibilidades dentro das
ações educativas do Projeto.
Para o próximo encontro algo já apareceu como obstáculo: a formação marcada foi
adiada, em favor dos preparativos do “Alto da Leitura”, atividade realizada pelo PBL que
estaria em sua sexta edição. A segunda-feira como único dia de “folga” de atividades dos
educadores fora utilizada para pensar a atividade já instituída pelo Projeto. Nos reuniríamos
novamente apenas um mês após o encontro Alder.
Quando do nosso reencontro no PBL para a formação, dividimos o grupo de
educadores em dois e nos reunimos em salas separadas, cada estagiário em um grupo
diferente. Foram sendo colocadas questões sobre a última formação, buscando
possibilidades de pensarmos no exposto em relação aos pressupostos do PPP e da prática
cotidiana dos educadores. Todos tinham gostado do espaço com o Alder, principalmente
porque alguns não tinham conhecimento sobre Paulo Freire. Colocaram a importância de se
diferenciar “professor” e “educador”, pois enquanto o primeiro só se preocupa em “fazer seu
trabalho” o educador aparece enquanto figura mais dialógica e atenta aos movimentos dos
educandos. Levantaram a questão da utopia junto ao processo educativo, para pensar de que
maneira pode-se motivar os meninos e meninas do PBL a participarem mais ativamente das
aulas e atividades dos centros de formação, estabelecer objetivos possíveis a partir das
demandas trazidas por eles. Falaram que o ambiente influencia na escolha dos jovens, e que
se faz necessário um trabalho mais amplo, envolvendo família, escola e o bairro no
processo. Durante a conversa discutimos sobre a importância da implicação de todos no
processo, lembrando da militância de tempos passados, enquanto exemplo e “força
histórica”2 dentro do PBL, colocando que o educador não pode trabalhar sozinho, já que o
público e o objetivo são os mesmos.
2 Aqui, história é entendida como uma ferramenta da práxis presente, forma de resgate do já vivido para
encontrar elementos para as novas lutas ou para encarar os novos desafios. Repensar o passado para
ressignificar a (nossa/deles) história (Benjamin, 1994).
35
Ao fim, na idéia de solidificar as reflexões realizadas nas últimas duas formações, foi
solicitada por nossa parte que os educadores realizassem uma tarefa para a próxima
formação: produzir um material que buscasse relacionar os aprendizados a partir da teoria
freireana com as possibilidades práticas de trabalho na sala de aula, podendo ser expresso na
modalidade de texto, cordel, poesia ou qualquer outra maneira que desejassem.
No encontro de formação seguinte nenhum dos educadores realizou a tarefa
combinada, alegando que haviam “esquecido completamente” devido às demandas do “Alto
da Leitura”, que ocorrera na semana anterior. Neste momento, intervimos buscando
problematizar o fato, afirmando que é preciso que todos se impliquem no desenvolvimento
das atividades. Colocamos em questão o valor daquele espaço para o PBL, da importância
de partilha e construção coletiva da práxis pedagógica. Procurando dar continuidade à
reunião, os educadores começaram aos poucos a colocar suas experiências individuais
dentro do Projeto, concepções sobre o processo educativo e desafios enfrentados. Foi
enfatizada a questão do Miramangue, centro de formação localizado na região da Beira da
Linha, conhecido como o “lugar de periculosidade” do bairro. Relataram sobre a baixa
“auto-estima” das crianças de lá, tentando fazer um paralelo com a dificuldade do
desenvolvimento de um trabalho sólido, que só seria possível a partir de momento que
entrarem “em pé de igualdade” com os jovens, buscando ser educador dentro e fora de sala
de aula. Novamente colocaram a necessidade do trabalho junto às famílias, onde a assistente
social recém-contratada expõe que ainda não conseguiu realizar nenhuma visita domiciliar,
em decorrência da quantidade de trabalho que tem que dar conta. Ainda coloca que os
educadores tem que participar dos encontros com as famílias, para que as mães e pais
saibam a quem estão “confiando” seus filhos. Alguns dizem da necessidade que os jovens
sentem de conversar, precisando os educadores se despojarem mais de certos modelos,
buscar outras formas de aproximação.
Ao final desta reunião, ficamos sabendo que só teríamos apenas mais uma formação
antes do recesso do Projeto, e que esta serviria para fazermos um encerramento das
atividades juntamente com uma devolutiva por nossa parte das reflexões desenvolvidas nesta
etapa do processo.
Em nosso último encontro de formação, nós estagiários buscamos resgatar as
propostas inicias da intervenção, como também os pontos mais relevantes dos encontros
anteriores, na tentativa de fazer ver quais seriam os desafios a serem enfrentados em diante.
Na devolutiva de fechamento, enfatizamos a importância do espaço de formação como
36
possibilidade de pensar a prática de forma conjunta, refletir sobre o Projeto e as questões
que emergem da dinâmica do bairro. Problematizamos a questão de se buscar referenciais
pedagógicos sólidos para o Projeto, da “atualização” prática de pensadores e teorias da
educação, viabilizando a sustentação do PPP no cotidiano. Em relação ao contato com os
jovens do Projeto, foi levantada a necessidade de gerar confiança junto aos mesmos, a partir
do diálogo e da horizontalidade. Em suas reflexões neste momento final de formação, os
educadores colocaram em pauta “questões de fundo” para o PBL, relacionando a própria
conjuntura do bairro com as mudanças ocorridas na Beira da Linha nos últimos anos:
mudanças estruturais, esvaziamento da região, cultivo de outros valores, a questão do tráfico
e da violência como “única” saída para os jovens, que se encontram cada vez mais
“perdidos”. Todos estes fatores foram colocados como impeditivos para a efetivação dos
ideais do Projeto, afirmando que todo o trabalho era “destruído” pelos “sábados, domingos e
segunda”, os dias em que os jovens do Projeto não estão sob a atenção das atividades do
PBL, mas sim nas relações constitutivas do lar, e daí a relação feita entre a “degradação” do
bairro e a dificuldade percebida na transformação junto aos jovens.
O espaço também serviu como avaliação dos educadores sobre nossa intervenção nas
reuniões de formação, situando-a como uma importante contribuição para o Projeto, no
auxílio a fazer-ver para todos certas problemáticas que envolviam suas práticas e repensar
modelos de atuação através do contato com novas propostas teóricas.
4.3 Reuniões do Grupo de Protagonismo
Proposta
Outro eixo de nossa proposta de intervenção foi o trabalho junto à alguns jovens do
Beira da Linha, através do Grupo de Protagonismo. O espaço já existia na instituição, porém
no período em estávamos nos situando no Projeto ele ficou "órfão", pelo fato da profissional
que acompanhava o grupo ter sido desligada do Projeto. A idéia de nosso trabalho seria na
facilitação de oficinas a partir de reuniões quinzenais com o grupo. Buscaríamos criar
dispositivos (jogos/dinâmicas do T.O – teatro do oprimido; rodas de conversa, teatro,
música, poesia, entre outros recursos da arte, etc) que facilitassem a troca de experiência
entre os meninos e meninas, o debate, a reflexão e os novos aprendizados e que
potencializassem suas percepções enquanto sujeitos de ação dentro do projeto, mas,
sobretudo, para além dele, construindo uma consciência de transformação social. Para tal,
37
essa reunião deveria entrar como atividade fixa do projeto, ocorrendo em um dia específico
da semana, que foi a quarta-feira. O intuito era que ao final de nossa intervenção fosse
produzido com este grupo algo para/sobre a comunidade (um jornal, um zine, uma
apresentação cultural, etc).
Desenvolvimento
Como mencionado anteriormente, durante o período de territorialização no Projeto,
vivenciamos um espaço junto ao grupo de protagonismo. A partir de então nossas
elaborações e reflexões passaram a apostar naquela atividade como um dos possíveis eixos
de nossa intervenção na segunda etapa estágio. Numa conversa junto à coordenação do PBL,
no estabelecimento de nossos eixos de intervenção, foi colocada a importância de construção
desse espaço, principalmente na idéia de buscar vias de expressão ao conceito de
protagonismo, como também trabalhar na construção de outros valores junto aos jovens
assistidos pelo Projeto. Nesta mesma conversa com a coordenação foram pensadas duas
linhas de ação do Projeto em relação ao protagonismo: (1) conselho estudantil - pensar que
esses jovens serão representantes do PBL nas redes sociais, fóruns, conselhos deliberativos;
e (2) um protagonismo à nível de bairro, com representante das escolas, formação de
grêmios, ciclo de palestras oficinas. Uma proposta ideal, que não necessariamente "daríamos
conta" com nossa intervenção pontual, mas começaríamos a fomentar a importância e a
solidificação do espaço na construção de vínculo com os jovens, tornando a atividade
significativa para os jovens.
Assim, marcamos uma conversa com a coordenadora pedagógica do Miramangue,
para pensarmos a sistemática dos encontros do grupo de protagonismo, estrutura,
participação e periodicidade. Colocou-se a possibilidade de haver dois grupos, um pela
manhã e outro pela tarde, com os adolescentes do Miramangue (entre 11 e 14 anos). Com a
contratação de uma assistente social para o PBL, seria ela que nos acompanharia nos grupos,
estabelecendo o compromisso direto do Projeto para com a atividade. Também haveria a
participação do educador em questão, que nos cederia seu horário de aula para a execução da
atividade, que seria quinzenal. Num outro dia, antes do início do grupo, nos sentamos junto
coordenadora pedagógica e a assistente social do Projeto para pensarmos juntos como seria a
construção do grupo de protagonismo nesta nova etapa. Primeiramente, foi colocado que o
grupo deveria ser temático, dinâmico e participativo, estimulando o envolvimento de todos
no processo. Estabelecemos a importância do envolvimento do Projeto nesse primeiro
38
contato, no auxílio à construção de vínculos, para podermos nos movimentar "todos juntos"
no decorrer da atividade. Durante a conversa foi aflorada a questão da família como uma
dimensão subjetiva importante na constituição dos jovens, onde buscaríamos compreender
as formas de relação com essa "instituição" e da parceria no processo. Algumas temáticas
foram previamente conversadas, como cidadania, drogas, violência, família, escola, mídia e
etc. Como ferramentas de intervenção e expressão junto ao grupo, pensamos em música,
filmes, "zines", troca de experiências. Colocamos que fora os planejamentos, o rumo dos
encontros seria construído principalmente a partir dos elementos advindos dos encontros
com esses jovens, das demandas que surgissem. Ao final da conversa, além de
estabelecermos o contato e o compromisso junto à assistente social quanto o envolvimento
no grupo, foi ressaltado pela coordenadora pedagógica a possibilidade de fortalecer a
campanha "O Povo à Caminho da Paz" junto aos jovens. No dia seguinte passamos em
ambos os turnos para sinalizar a proposta do grupo de protagonismo, nos apresentamos
diretamente aos jovens do Projeto, conhecendo e conversando sobre como seria a atividade,
combinando que na semana seguinte daríamos início. A idéia passada foi que não haveria
obrigatoriedade de participação nos grupos de protagonismo, que mesmo acontecendo de
início com toda a turma, só participaria quem tivesse vontade.
Para o primeiro encontro foi pensada uma mesma atividade para ambos os turnos: a
exibição do curta-metragem "Bilu e João", da coletânea "Crianças Invisíveis" (2001), e
conversar sobre as impressões que tiveram do mesmo. O filme busca revelar olhares sobre
os desafios e confrontos cotidianos de se constituir na invisibilidade das dinâmicas sociais.
Depois de assistirem atentamente, em meio à risadas e pequenas brincadeiras, se deu início à
discussão. Nos dois grupos, manhã e tarde, gerou uma boa conversa, onde colocaram, a
partir de experiências pessoais ou não, questões parecidas sobre o trabalho infantil, sobre a
rua, sobre escola, sobre dinheiro e etc. Depois da atividade, explicamos novamente a
proposta do grupo e que quinzenalmente nos reuniríamos para a atividade. Reforçamos a
importância de se "estar a fim" de participar e da não obrigatoriedade.
Na data combinada para o próximo encontro, ao chegarmos no Miramangue,
recebemos a noticia que os meninos tinham sido dispensados, pois estava faltando água no
Projeto. Quando chegamos, percebemos a cara dos educadores de "eita, esquecemos de
avisar a eles“, pois só quando chegamos é que soubemos do acontecido. Combinamos que
voltaríamos na próxima semana para dar continuidade ao grupo.
39
No encontro seguinte, com o grupo da manhã, tivemos uma surpresa: boa parte da
turma tinha sido dispensada para que um pequeno grupo pudesse ensaiar uma peça que seria
apresentada numa atividade do Projeto. O educador de artes, que cederia seu horário para o
grupo, perguntou se queríamos fazer o grupo com os jovens presentes, porém preferimos
não "interferir" na aula, acompanhando o ensaio para irmos também entrando aos poucos
naquela atividade. Cantamos juntos algumas canções da peça, e depois fomos para um
exercício bastante interessante proposto pelo educador, uma "contação" e encenação de
relatos/histórias pessoais. Nesse momento nos "misturamos" aos jovens, ouvindo e contando
histórias, conhecendo-os a partir de suas narrativas, suas visões de mundo e suas relações.
No grupo da tarde nos reunimos com boa parte da turma, que se dispôs a participar, para
começarmos nosso grupo construindo um "Acordo de Convivência", instrumento importante
nos estabelecimento de limites, responsabilidades e condições de possibilidade para o grupo,
construído junto com eles. De início foi difícil "manejar" o grupo, inquieto e disperso, onde
apenas alguns pareciam prestar atenção em nossa conversa. Entre idas e vindas de alguns na
sala, fomos construindo com eles o acordo, com a participação de todos relatando e
escrevendo o que desejam para o espaço. Pelo correr do tempo, não concluímos por
completo a atividade, combinando que para nosso próximo encontro eles iriam trazer temas
e coisas que gostariam de trabalhar no grupo. Ao final, conversamos mais proximamente
com um dos mais velhos do grupo, o Tiago, que desenha muito bem, prometendo trazer
mais desenhos seus num próximo encontro para nos mostrar. Aos poucos íamos conhecendo
esses jovens e suas realidades.
Com o grupo da manhã, no encontro seguinte, a sala foi dividida entre o grupo de
protagonismo e a aula de uma das educadoras que está há mais tempo no Projeto. Utilizamos
a metodologia do "Acordo de Convivência" para estabelecermos nosso contrato. Durante a
atividade, percebemos que a educadora liberou os outros jovens mais cedo, fazendo com que
alguns que estavam no grupo de protagonismo se "sentissem no direito" de também ir
embora da atividade. Também não obstruímos a saída, que levou a termos apenas 5 jovens
no grupo, dos 10, 12 anteriores. Por "coincidência" eram os mesmos que estavam presentes
no encontro passado, que participam da peça. Sentamos e fomos construindo o acordo, numa
atmosfera bastante descontraída, onde íamos conversando sobre o acordo e outros assuntos
que iam surgindo. Tanto, que chegou ao um ponto curioso de uma das meninas dizer não
entender o porque do tal "acordo", se todos que estavam lá "se conheciam e se davam bem".
Conversamos principalmente sobre as atividades deles quando não estavam no Projeto,
40
como estava a situação na escola, o que gostavam e faziam em casa, no tempo livre. A
maioria disse que pensa em continuar os estudos, querendo fazer vestibular para educação
física e teatro. Para o próximo encontro ficou combinado que eles iriam encenar a peça que
apresentaram no "Alto da Leitura", evento do PBL. No grupo da tarde, novamente, os jovens
pareciam mais agitados. De início, fizemos uma dinâmica de recreação, combinando que
depois sentaríamos para dar continuidade ao nosso acordo, onde eles colocariam o que
gostariam de trabalhar dentro do grupo. Alguns poucos participavam da atividade, enquanto
outros ficavam andando pela sala. Quando colocavam o que gostariam de trabalhar no grupo
alguns relacionavam à brincadeiras, presentes, comidas, coisas mais "recreativas", e outros
mencionavam assuntos como escola, violência do bairro e etc. Ao final do encontro,
propomos e combinamos com o grupo de conhecer o bairro junto com eles, para que nos
mostrassem os "em tornos" do Miramangue, fazendo com que eles nos conduzam na
atividade, buscando produzir andanças de reconhecimento do local, sair um pouco do
ambiente do Projeto também.
Aproveitando a conversa que tivemos com o grupo da manhã sobre seus cotidianos,
no encontro seguinte trouxemos o curta-metragem "Vida Maria" (2003), como dispositivos
inicial da discussão. Trata-se de uma animação que retrata o cotidiano de uma criança no
sertão, e de como a rotina vai marcando seu desenvolvimento sem grandes novidades. O
intuito era buscar problematizar junto com eles os afazeres diários, como lidavam com as
atividades que os marcavam e como produziam seus "tempos-livres", fora de instituições.
Quando chegamos, o educador de artes estava numa conversa com parte da turma, e a outra
parte estava dispersa. Sentei e acompanhei um pouco a conversa, que versava sobre
relacionamentos, questões específicas envolvendo as meninas da sala. Logo depois,
convidamos toda a turma para assistir o vídeo. Assistimos duas vezes, à pedido de toda
turma. O momento da discussão gerou pouca reflexão, alguns não "entenderam" o filme,
outros poucos se colocavam mas não pareciam ser "ouvidos" pelos outros, em decorrência
de barulhos e "conversas paralelas". Durante a conversa, a turma foi dispersando, e o grupo
foi se concentrando em apenas algumas pessoas que estavam participando. Pelo decorrer do
tempo, combinamos que no próximo encontro conversaríamos um pouco mais sobre
protagonismo, que ainda parecia uma idéia "confusa" para alguns. Uma das meninas, que já
participava do grupo antigamente, disse que traria umas anotações que tinha feito sobre
protagonismo, em um dos encontros de fóruns que participou. Como o Projeto já estaria
entrando em recesso na próxima semana, combinamos que seria o fechamento de nossa
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participação no grupo de protagonismo. Com o grupo da tarde, como combinado
anteriormente, nos organizamos para uma caminhada pelo bairro. A educadora se
encarregou de organizar junto com os jovens um percurso possível para fazermos, levando
em conta o tempo da atividade e a disposição de todos. A caminhada seguiu um percurso
que saía da Beira da Linha e ia até a praça central ("Praça da Mangueira") do bairro.
Interessante perceber que no caminho um ou outro ia contando pequenas histórias, fazendo
brincadeiras, e atentos às nossas pequenas indagações, que buscavam a partir do discurso
deles conhecer um pouco daquele lugar. Fato curioso aconteceu quando passamos em uma
rua chamada "Noel Rosa", e perguntamos se eles conheciam o nome, de quem se tratava.
Uns diziam que era um morador antigo que fundou a rua, e outros inventavam outros
histórias, até que um deles disse que se tratava de um "compositor ou algo do tipo". Os
caminhos eram traçados ali mesmo, com pequenas discussões de até onde iríamos, que rua
entrar, passar por onde, sendo organizado e manejado pela educadora e pelos jovens. Na
volta para o Miramangue, agradecemos a caminhada e combinamos que no próxima semana
nos encontraríamos para fazer o fechamento deste ciclo do grupo.
No nosso último encontro com os grupos de protagonismo, articulamos uma mesma
abordagem metodológica para ambos: como dispositivo inicial da atividade, traríamos uma
dinâmica advinda do Teatro do Oprimido intitulada "O contrário de Jackson", que de
maneira lúdica visa despertar os efeitos práticos da obediência e das automações de nosso
corpo. A idéia era que a partir do dispositivo discutíssemos a questão do protagonismo,
refletindo sobre o que fazemos, nossas obrigações, e da possibilidade de se fazer diferente.
No grupo da manhã, toda a turma foi convidada a participar da dinâmica, com apenas alguns
ficando de fora. Depois nos sentamos, começando a conversar sobre o que os jovens tinham
achado da atividade, o que sentiram. Alguns entraram na roda de conversa, outros ficaram
pelas periferias, observando, ou fazendo uma outra coisa. A partir de nossos
questionamentos inicias foram relatando situações de obediência, relações com pais, da
importância de respeitar os mais velhos ou da vontade de "bagunçar a casa" quando se tá
sozinho. Depois uma das meninas, que havia prometido trazer algumas anotações sobre
protagonismo, leu o que tinha trazido para todos, e fomos conversando, entendendo se
estava mais claro para eles o que poderia ser protagonismo, e de que maneira eles
visualizavam sua possibilidade. Levantaram a questão do teatro, de apresentar para a
comunidade uma peça sobre questões do bairro, que era um tipo de protagonismo. Ao fim da
conversa, levantamos a importância de valorizarem aquele espaço, que ele pudesse continuar
42
independente de nossa presença. Depois aproveitamos para brincar um pouco com eles, a
partir de brincadeiras que eles propuseram. No grupo da tarde, quando chegamos, estavam
ensaiando a quadrilha para as festividades juninas do Projeto. Esperamos um pouco, e logo
demos início à dinâmica proposta. Em relação ao grupo da manhã, houve uma adesão e
entusiasmo maior por parte do jovens, no momento da atividade. Após a dinâmica tentamos
conversar um pouco sobre o acontecido, porém a dispersão era grande, muitos brincavam e
não pareciam querer conversar. Depois de algumas tentativas de conversa, percebemos que
não aconteceria da maneira que pensamos. Em certo momento, percebemos que o educador
também não se encontrava mais na sala, o que realmente dificultou nossa intenção de
chamar a atenção deles para nossa atividade. Foi um encontro complicado, e a ausência do
educador na atividade demonstrou certo "desleixo" com o espaço, deixando ainda mais
difícil sua realização. Tentamos fazer um fechamento com os jovens e decidimos dá por
encerrada a atividade.
4.4 Visitas Domiciliares
Proposta
Como importante ferramenta de nossa prática, a intervenção junto às famílias do
Projeto através de visitas domiciliares nos possibilitaria construir com cada família sua
demanda e a partir disso: mediar processos de ressignificação acerca de suas formas de viver
e estar no mundo; potencializar a autonomia da família enquanto sujeitos no mundo (com
direitos e com a capacidade de buscar a efetivação destes através de sua compreensão e ação
sobre as contradições do mundo); potencializar a identidade das famílias com a comunidade
e a construção das ações coletivas entre os moradores; realizar encaminhamentos para
serviços de saúde, assistência social, instituições judiciais, a fim de articular a rede de
serviços; mediar as relações entre famílias e crianças, bem como entre família e a instituição
(o projeto Beira da Linha).
A idéia era que as visitas ocorressem semanalmente, e sempre acompanhada por um
profissional do Projeto. Construiríamos reuniões mensais com as famílias no intuito de
colocar me pauta discussões acerca de assuntos de interesse mútuo e das problemáticas
enfrentadas pelas mesmas.
43
Desenvolvimento
Esse foi o eixo de intervenção mais complicado durante o estágio. Apesar de ser uma
das atividades mais pensadas e planejadas por nós, não dependia apenas de nossas
articulações para que ocorressem. Durante o período da territorialização, realizamos algumas
visitas domiciliares com o auxílio da educadora que acompanhava famílias e jovens, para
nos habituarmos ao bairro e conhecer as famílias participantes do Projeto. Com o
desligamento da citada educadora, conjuntamente com contratação de uma assistente social
para o PBL, vivenciamos um período de transição nos trabalhos das visitas domiciliares. O
trabalho, nesta nova conjuntura, seria coordenado pela assistente social. Em nossa
intervenção, nessas condições, esperamos o auxílio da mesma para continuarmos o trabalho
junto às famílias a partir das visitas. Porém, surgiram inúmeras demandas que dificultaram o
recomeço das mesmas, inclusive a necessidade de mapear o bairro e reativar o processo a
partir do trabalho da assistente social. Assim, não foi possível realizar nenhuma visita
domiciliar durante o período da segunda etapa de nosso estágio, tornando inviável a
efetivação de nosso terceiro eixo de intervenção.
4.5 Reuniões de Supervisão de Estágio
De início, na primeira parte do estágio, as reuniões ocorriam quinzenalmente, e se
estruturavam em duas partes: (1) prioridade aos relatos das atividades desenvolvidas junto
ao PBL, e seus possíveis desdobramentos; (2) e a leitura e discussão dos textos junto com a
supervisora e a outra estagiária. Na segunda parte do estágio as reuniões tornaram-se
semanais, em virtudes das demandas do mesmo, que cresciam.
Os textos lidos durante as supervisões de estágio versavam sobre a formação do
psicólogo social, desde sua origem enquanto categoria teórica à reflexões da prática junto à
comunidades, a partir de uma perspectiva sócio-histórica; discussões sobre o trabalho no
Terceiro Setor e a inserção do profissional de psicologia neste campo, junto à análises de
conjunturas políticas dos últimos anos, incluindo o papel do Estado, o avanço do
neoliberalismo e os processos formativos em meio às contradições do modo de produção
vigente, contexto material e subjetivo. Tais leituras, além de servir de substrato teórico para
nossa prática, compuseram a fundamentação teórica do relatório em questão.
Questionamentos, problematizações e demandas eram recorrentes em um ambiente
de constante reflexão sobre o vivido, manejados pela supervisora conjuntamente com nossa
44
participação à procura de viabilizar encaminhamentos para nossa prática, sempre
desafiadora. Sempre houve uma preocupação de entendermos o que fazíamos ali, dos
entraves, sempre voltando à problemáticas que envolviam uma dimensão formativa, porém
também interventiva.
4.6 Atividades Extras
Durante nosso período de estágio, e pela maneira como nos colocamos nos espaços -
sempre dialogando e procurando estabelecer vínculos com o Projeto - acabamos por realizar
uma atividade extra, nova e "curiosa" para nós até então: participar da seleção de novos
profissionais para o PBL.
Dentre algumas mudanças ocorridas dentro do Projeto na virada do ano (2010/11),
tanto de apoios financeiros quanto de reciclagem de algumas práticas, houve a saída de
alguns profissionais, como também a necessidade de contratação de outros novos. Durante o
período entre Fevereiro e Março de 2011, fomos encarregados de assumir o processo de
seleção dos profissionais, com atividades que compreendiam desde a leitura de currículos
dos candidatos a entrevistas com os selecionados na primeira etapa.
Nosso papel, enquanto estagiários de psicologia, seria o de buscar durante este
processo encontrar qual profissional estaria mais de acordo com a proposta do Projeto e que
tivesse capacidade, competência e compromisso de fazer parte do quadro de funcionários do
PBL. O argumento utilizado pela instituição para nossa escolha dentro do processo era que
seríamos elementos imparciais, reclamando aqui à questão da polêmica "neutralidade psi", e
que àquela altura éramos pessoas de confiança do Projeto para realizar tal trabalho.
Inclusive, foi-nos oferecido pela instituição uma "ajuda de custo" como pagamento para a
atividade extra. Achamos mais justo, refletindo conjuntamente com a coordenadora do
estágio, não aceitar o dinheiro em função de nossa posição na situação, pois estávamos
vinculados à uma instituição pública (UFPB) e que a partir disso os acontecimentos faziam
parte de nosso processo formativo, não constituindo-se como um "trabalho por fora".
Em função da demanda, construímos, junto à supervisora de estágio, um roteiro para
as entrevistas, elencando questões que além de buscar compreender a chegada do
profissional àquela oportunidade, visavam colocar em questão especificidades do contexto
do Projeto dentro do bairro, problematizando as percepções e possíveis contribuições dos
candidatos para o PBL. Assim, nos deparamos com o desafio de realizar uma atividade
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inesperada, mas que se coloca como demanda legítima aos profissionais de psicologia,
fazendo parte de um repertório prático.
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5.REFLEXÕES E PROBLEMATIZAÇÕES
"E o que foi feito é preciso conhecer
Para melhor prosseguir"
(Milton Nascimento)
Nesta parte do relato, buscarei levantar algumas questões que atravessaram a prática
durante o estágio e que suscitaram reflexões em relação aos espaços do PBL, ao
desenvolvimento das atividades e à formação em psicologia social. Levando em conta que
toda avaliação deve ser processual, não chegamos à vereditos nem à conclusões definitivas,
mas sim à problematizações de elementos que devem sempre ser colocados em análise e
entendidos enquanto configurações de uma conjuntura, de um tempo histórico específico.
Desde o início do estágio, nas conversas com a coordenação, buscou-se uma aliança
com o Projeto: não estaríamos enquanto "aplicadores" de um saber instituído advindo da
academia, mas como parceiros com ferramentas provenientes do campo da psicologia social
que serviriam de auxílio na compreensão das dinâmicas do Projeto, procurando vias de
atuação a partir da cooperação com todos envolvidos na situação. Assim, a efetivação de
nosso trabalho dependeria, também, de um esforço coletivo que compreendesse nossa
chegada como "mais um" nessa caminhada, submetidos aos acontecimentos vivenciados.
No período de territorialização, percebemos uma fator importante para o andamento
do Projeto, a questão da comunicação. O Projeto compreende vários espaços de atuação,
com diversas demandas, necessitando que todos pudessem compreender para onde estavam
caminhando, quais relações que o trabalho de cada tinha com o dos outros dentro do PBL.
Nesse sentido, por mais que a figura da educadora que acompanhava jovens e famílias
buscasse viabilizar contatos, esbarrava na falta de lugar para suas observações e
constatações, estabelecendo pouco contato com os outros educadores sobre os jovens.
Assim, emerge a necessidade de não apenas trabalhar em rede com as outras instituições do
bairro, lócus essencial de articulação dos atores, mas também fortalecer as relações internas
contidas nos raios de ação do Projeto, no intuito de solidificar o compromisso e a identidade
do PBL.
Ainda durante a territorialização, nos espaços de formação dos educadores,
percebíamos que certas "idealizações pedagógicas" do Projeto, baseadas no construtivismo e
na educação popular, necessitariam, antes de estar no papel, de uma apropriação por partes
47
dos operadores práticos de tais perspectivas. As metodologias destes espaços, facilitadas
pela coordenação pedagógica do Projeto, não favoreciam nem pareciam solicitar a
implicação dos educadores para o andar das atividades, limitando-se à pequenos "cursos"
sobre teorias e teóricos caros aos ideais do PBL, parecendo não dialogar em pé de igualdade
com a "tecnologia" do educadores, que acabavam fazendo "o que já sabiam" no cotidiano
para dar conta dos acontecimentos.
Na segunda etapa do estágio, a partir de uma intervenção mais focada em alguns
espaços, percebemos que algumas sinalizações nossas sobre o Projeto, ainda que rarefeitas
pelo pouco conhecimento experenciado até então, foram esboçando-se mais complexas.
Outro fator essencial neste período tratava-se de processo de transição que o Projeto vinha
passando, em relação à financiamentos, institucionalização e direcionamentos, onde os
efeitos práticos puderam ser percebidos nesta conjuntura.
"Construir uma casa num terreno que você não conhece, difícil, perto de um
mangue. O que podemos fazer nesse terreno para que a construção seja viável, sem ter que
procurar um solo mais forte?" (educador do PBL)
Como viabilizar processos coletivos de formação consistentes? Tomando o Projeto
Político Pedagógico do PBL como norte para nossas ações junto ao espaços da formação,
percebemos o quanto ele ainda parecia "obscuro" para os educadores. Muitos desconheciam
seu conteúdo, ou não conseguiam compreender como efetivá-lo na prática. Durante as
formações que coordenamos, buscando instigar a participação de todos ao implicá-los no
desenrolar das atividades, nos deparamos com diferentes nivelamentos de percepção das
ações individuais e de uma visão mais geral sobre o Projeto. Havia certo saudosismo por
parte de alguns, lembrando épocas de militância compromissada nas veias do Projeto,
articulações com associações de bairro e movimentos sociais. Por parte de outros, certo
conformismo com o status quo da conjuntura atual de violência do bairro, pela negligencia
das ações políticas que não chegam nas periferias. Percebemos também uma dificuldade por
parte dos educadores de compreender e situar a ação do Projeto, enquanto entidade do
Terceiro Setor, em seu papel político mais amplo, num contexto de difícil mobilização das
organizações sociais e de certa descrença nas possibilidades de mudança. A partir de tal
perspectiva política mais abrangente, relativa aos enfrentamentos no campo pedagógico,
considerando a realidade enquanto processos imbuído de contradições e desafios, fosse
48
possível levantar mais elementos para o combate à práticas que acabam por culpabilizar o
jovem e seu contexto pela impossibilidade de se efetivar ideais de transformação e
autonomia.
"'Lá embaixo' [Miramangue] tem que ser assim, corpo à corpo com os educandos"
(educadora do PBL)
Nos encontros dos grupos de protagonismo, se apresentaram algumas questões que
complicaram o desenvolvimento das atividades. Ficava difícil perceber, desde o início, o
nível de participação e a implicação dos educadores envolvidos para com a atividade. Na
conversa com a coordenação pedagógica do Miramangue, onde firmamos a importância de
revitalizar aquele espaço no Projeto, principalmente como atividade de potencialização dos
jovens da Beira da Linha, expomos a necessidade de acompanhamento dos profissionais
tanto na construção do vínculo quanto na idéia de dar continuidade ao grupo, após o término
de nosso período de estágio. A assistente social se comprometeu a nos acompanhar.
Percebíamos que a atividade não estava em pé de igualdade com os outros espaços,
encontrando dificuldades de ser significada pelos profissionais e pelos próprios jovens. As
atividades eram "esquecidas" pelos profissionais, quando liberavam os jovens no nosso
horário por algum motivo maior sem nos avisar com antecedência, ou por iniciar atividades
outras antes de chegarmos. O tempo também se tornou um "atraso", pois pelo fato de
possuirmos apenas uma hora e trinta minutos com eles a cada quinze dias, e que sem o
acompanhamento e auxílio dos outros profissionais, facilitava para que o trabalho se
tornasse um "eterno recomeço".
As possibilidades deste grupo, enquanto lugares de criação e potência junto aos
jovens, se apresenta como imprescindível para o cultivo do protagonismo como bandeira de
luta e compreensão do contexto e dos desejos desses jovens, uma das razões de ser do
Projeto. Com a valorização desse lugar pelo Projeto e a articulação entre os profissionais,
jovens e familiares na garantia da atividade, pode-se levar à cabo este desafio de construção
conjunta.
Em relação à inexistência de atividades no eixo de intervenção das visitas
domiciliares pode-se refletir sobre alguns aspectos. Com o desligamento da antiga educadora
que acompanhava as famílias, o trabalho foi demandado para assistente social. Percebemos
que a partir de uma série de demandas institucionais, mais ligadas a "gestão social" no PBL
49
do que práticas interventivas, a questão das visitas não foi levada em conta como uma
demanda mais imediata. Como dar conta destas gestões, dados e mapeamentos, caros ao
trabalho da assistente social, sem perder de vista a iminente demanda de cada vez mais se
unir às famílias como potencializadores de um trabalho conjunto nas esferas do Projeto? A
assistente também disse encontrar dificuldades em conseguir parceiros no Projeto que
auxiliassem no começar das visitas, para a mesma se situar no bairro. Torna-se de suma
importância que se encontre vias de revitalizar esse contato com as famílias, onde a
ferramenta das visitas seja vista como possibilidade articuladora, e dialética, de contato e
mobilização junto à todas pessoas assistidas pelo Projeto.
"Se a educação não descer, a bala vai subir!" (antiga educadora do PBL)
A partir da fala de muitos educadores, percebemos que o contexto de violência e
pobreza torna-se um impeditivo da efetivação de certas práticas do PBL. Afirmam que a
comunidade do Beira da Linha, onde situa-se o Miramangue, encontra-se cada vez mais
deserta e desolada. Há pouca confiança quanto aos arredores do Projeto, sempre vistos com
certa precaução pelos profissionais. Esta percepção acaba por ressoar numa "visão total"
sobre os jovens, vistos como frutos de um "problema irremediável" e impotentes frente à sua
realidade. Nesta situação, parecem vigorar enfrentamentos de "contenção da violência" por
um movimento de negá-la como parte constituinte de uma dura realidade material, pouco
levada em conta na construção do imaginário frente à comunidade. Importante pensar em
articulações que elevem "problemas" à uma seara do "campo problemático", subvertendo
uma visão individual da questão, buscando envolver diferentes dimensões a partir de um
contato mais amplo com a realidade destes jovens e com outras instâncias de cuidado, como
a família e a escola.
Diante de diversas questões e "naturalizações" que nos deparávamos no contato com
os profissionais nos variados espaços, em relação à violência e as drogas, ao processo
educativo, aos jovens, às famílias e seu contexto, percebíamos que éramos reclamados a
partir de nossa "condição psi" a ajudar e sugerir fórmulas de tratamento para os problemas.
Percebíamos a dificuldade e o desafio de buscar, junto com todos, ampliar o espectro sobre
as percepções tanto das problemáticas quanto de nossos limites, enquanto propositores de
uma prática psicológica mais preocupada com o contexto do que com o individual,
50
entendendo este último como "máquina-síntese" de complexas questões materiais e
subjetivas não passíveis de explicações simplificadoras e deterministas.
Reafirmo que todos estes questionamentos levantados, provocados por uma prática
que buscou ser atenta e cuidadosa às reflexões e problemáticas produzidos a partir do
estágio, fazem parte de uma processo não de condenação ou fatalismo, pois, como
emergências de uma situação histórica, devem ser enfrentados no âmbito do esforço
cotidiano, percebendo que as práticas e concepções não são imutáveis e que precisam
respeitar e se responsabilizar pelos laços constituídos com a comunidade, por aqueles que
dão sentido e se constituem, também, a partir do trabalho do Projeto Beira da Linha.
51
6.CONSIDERAÇÕES
"Sei que nada será como está
Amanhã ou depois de amanhã
Resistindo na boca da noite um gosto de sol"
(Milton Nascimento)
Durante toda esta experiência de estágio, desde sua concepção nas conversas com a
supervisora até os meandros do vivenciar, as novidades e os desafios saltavam às nossas
vistas. Busca constante de uma práxis que marcasse um lugar de intervenção, de nossa
presença, mas sempre com a humildade e o cuidado de compreender os processos e limites
de um Projeto que há vinte anos vem desenvolvendo um trabalho junto ao bairro Alto do
Mateus.
Nos espaços que ocupamos, emergiam "nós" e processos dialéticos que a todo tempo
interrogavam: Como me identifico "psicólogo"? Como conseguir perceber a dimensão
prática da psicologia social no estágio? Que elementos trago de minha formação e o que
estágio me oferece? Quais os limites da intervenção? Questões que longe de possuírem
simples respostas, problematizavam reflexões e formas de lidar com a prática psicológica, de
busca por um caminho radical de alteridade, de encontro com outros. O desafio de lidar com
categorias e instituições pouco presentes nos vocabulários psicológicos, tais como
"movimentos sociais", "política", "ONG's", "sociedade civil", "Estado", à todo momento
forçando o olhar para a compreensão da realidade em sua dimensão dialética, se
apresentando enquanto forma/força, produto/processo, dominação/resistência, que a
psicologia, em suas vertentes mais globalizadas, prefere "deixar de lado".
Em conversas e atividades no estágio, "formais" ou informais, havia um desafio de
tentar elucidar uma perspectiva de trabalho que ia de encontro com as expectativas de
muitos, que entravam num certo "repertório hegemônico" da psicologia, transitando entre a
ajuda e o conselho, o rótulo e o ajustamento. Perspectiva e compromisso de trabalho
produzido a partir de uma multiplicidade de interlocutores, da psicologia sócio-histórica e
comunitária aos direitos humanos, de perspectivas marxianas à educação popular, visando
estabelecer uma rede teórico-prática que apontasse para o diálogo, a autonomia, a
52
emancipação, a cooperação, a coletividade, a superação de si, a liberdade. Mas, como
caminhar? Como resistir?
Durante minha formação universitária na UFPB, em um curso de psicologia ainda
muito aliado às expectativas hegemônicas supracitadas, fui percebendo justamente o que não
gostaria de ser, enquanto futuro profissional. Foi também nesse desejo de busca e de
mudança, e pelos bons encontros do caminho, que vivenciei espaços que feriram como
farpas, violência de ruptura entre o que "se tem" e o que "não se conhece": grupos de estudo
"marginais", extensão popular junto à políticas públicas de assistência, desenvolvimento de
oficinas ludo-pedagógicas numa escola pública, experiências com o movimento estudantil,
local e regional. De várias maneiras estes espaços, percebidos, experenciados, refletidos e
problematizados, me colocaram em contato com ferramentas, modos de ser e agir, que
mesmo não possuindo o aval de uma psicologia pretensamente neutra, - que cada vez mais
se perpetua em pesquisas descompromissadas com a função social das universidades
públicas - auxiliaram-me a não querer chegar à conclusões definitivas, à legitimar vereditos,
à fechar mundos e caminhos.
Este estágio, como experiência última de uma etapa, apresentou desafios de um
trabalho de psicologia social no terceiro setor, e dialeticamente inquire sobre que formação
acadêmica pensa por essas vias quando se compromete com nossa constituição enquanto
psicólogos. Trata-se de um trabalho cotidiano, de construção de vínculos, questionando
limites e combatendo sedutoras "naturalizações" do real ao continuar teimando pelo desejo
de mudança, de elogio ao negativo, em busca do potente "parar pra pensar". Nestas
condições, a afirmação de uma postura ética, política e compromissada de uma prática
psicológica se faz necessário, entendendo o sujeito e sua relação com a realidade numa
dimensão ampla, em vias de transformação, de si e do contexto que lhe possibilita.
Pelo trabalho desenvolvido, pelas vivências durante a formação e no estágio, pelo
esforço em construir uma psicologia social crítica e compromissada, pelos que ousam
questionar e produzir outros caminhos, compreendo que conhecimento só se produz num
mergulho com o outro, nos revoltos mares da contradição.
Pois bem, algumas considerações. Não finais, pois nunca são.
53
7.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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(Orgs.). História da Psicologia:rumos e percursos. PP. 463-473. Rio de Janeiro: Nau
WACQUANT, L. (2008) As Duas Faces do Gueto. São Paulo: Boitempo
55
ANEXO
56
CRONOGRAMA DE ATIVIDADES
I PARTE
Atividades
Carga Horária
Reuniões de Supervisão 62 h
Leitura de textos contidos na bibliografia do estágio 24 h
Atividades no Projeto Beira
da Linha
Planejadas 86 h
Extras 12 h
Reuniões com a Coordenação do Projeto Beira da Linha 10 h
Total de horas 196 h
II PARTE
Atividades
Carga Horária
Reuniões de Supervisão 58 h
Leitura de textos contidos na bibliografia do estágio 36 h
Atividades no Projeto Beira
da Linha
Planejadas 74 h
Extras 38 h
Reuniões com a Coordenação do Projeto Beira da Linha 10 h
Elaboração do relatório final do estágio 110 h
Total de horas 326 h
TOTAL GERAL DE HORAS 520 h