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III Congresso Consad de Gestão Pública
A QUESTÃO METROPOLITANA: OS NOVOS TEMPOS IMPÕEM NOVOS DESAFIOS E EXIGEM
NOVAS CAPACIDADES PARA OS ATORES E A NOVA GOVERNANÇA
Paulo de Tarso de Oliveira Côrte
Painel 01/001 Articulação de governos municipais: áreas metropolitanas e consórcios públicos
A QUESTÃO METROPOLITANA: OS NOVOS TEMPOS IMPÕEM NOVOS DESAFIOS E
EXIGEM NOVAS CAPACIDADES PARA OS ATORES E A NOVA GOVERNANÇA
Paulo de Tarso de Oliveira Côrte
RESUMO O presente paper descreve as condições e apresenta a síntese de um trabalho acadêmico realizado durante o curso de Gestão de Políticas Públicas na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). Trata-se de um estudo de base sociológica, de caráter empírico-indutivo, ou interpretativo conforme o ensinamento de Fernandes (1976), que foi realizado a partir da atualização bibliográfica sobre a temática, com o objetivo de contribuir com o debate visando o aprimoramento institucional das relações intergovernamentais, particularmente no âmbito metropolitano. O estudo partiu do aprendizado adquirido durante o seminário “Retratos Metropolitanos: a Experiência do grande ABC em perspectiva comparada” que, em 2001, reuniu técnicos, especialistas, representantes da sociedade civil e gestores públicos para analisar a experiência brasileira em gestão de políticas metropolitanas. Além de apontar as questões decorrentes do sistema federativo brasileiro no que diz respeito à gestão de políticas metropolitanas, o seminário evidenciou que na atualidade, diferentes experiências estão em curso e que ainda existe uma lacuna institucional quando o assunto envolve as relações intergovernamentais no sistema federativo brasileiro que tem a peculiaridade de conferir status de ente autônomo aos municípios. A partir daí, o estudo desenvolvido procurou analisar duas questões que desafiam gestores, técnicos, órgãos governamentais e especialistas que tratam da questão metropolitana. Se a questão da coordenação intragovernamental ainda não foi suficientemente tratada no arranjo (pacto) federativo brasileiro e se há uma multiplicidade de experiências de formulação, implementação e gestão de políticas regionalizadas em curso, particularmente em contextos metropolitanos, quais são os limites e as potencialidades das experiências em curso para a adequada superação dessas lacunas de coordenação intragovernamental? Em que medida as experiências e as novas institucionalidades construídas pós-1988 nas principais regiões do país podem contribuir para superar esse quadro de fragmentação e de ausência de coordenação entre atores políticos subnacionais? Para encaminhar estas questões o estudo foi construído em duas partes. Nas duas primeiras, procurou estabelecer bases históricas e conceituais para situar o problema e atualizar o debate sobre a questão. Ainda na primeira parte, o estudo procurou investigar as condições e os principais argumentos apresentados no debate atual sobre a questão, identificando correntes de pensamento que apontam, de um lado, para a necessidade da criação de novos entes federativos no espaço territorial metropolitano, de outro, pela necessidade da instituição de novos modelos de administração regionalizada. Na segunda parte, o estudo procurou identificar as características das experiências de gestão metropolitana nas três mais importantes regiões do país – São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte –, que juntas abrigam
aproximadamente 20% da população brasileira e a base material produtiva responsável por significativa porção do produto interno bruto, procurando traçar um quadro de tipologias ideais desses modelos e apontar os limites institucionais dessas experiências. Finalmente, a partir dos debates atuais sobre os problemas da adequação institucional para a ação metropolitana, o estudo aponta a condição dos atores subnacionais para o debate e para a consolidação das experiências de gestão metropolitana, indicando a necessidade do desenvolvimento de novas capacidades para a construção de um novo patamar de governança nos contextos metropolitanos. A decisão de tratar deste tema se justifica pela importância da temática (atualmente, mais de 70 milhões de pessoas vivem em regiões metropolitanas institucionalizadas) e pela opinião unânime entre especialistas e gestores públicos da insuficiência do atual modelo institucional que delega aos estados membros a competência legislativa sobre a política metropolitana que sofre de vários entraves oriundos da própria experiência histórica e da cultura política do país que, de um lado, mantém as fortes as competências legislativas da União e de outro, indica maior grau de autonomia aos municípios para a gestão de políticas de seu interesse.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO........................................................................................................... 04
1 O PROBLEMA METROPOLITANO E AS RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS....................................................................................... 07
2 ATUALIZANDO O DEBATE.................................................................................... 12
3 A PERSPECTIVA DO PRESENTE ESTUDO......................................................... 15
4 A NECESSIDADE DE NOVAS CAPACIDADES PARA OS ATORES METROPOLITANOS.................................................................................................. 19
5 CONCLUSÕES....................................................................................................... 23
REFERÊNCIAS.......................................................................................................... 24
4
INTRODUÇÃO
Este paper é a síntese de um trabalho acadêmico que foi apresentado para
na disciplina Tendências e Inovações na Gestão Pública, ministrada pelo professor
doutor José Carlos Vaz, do curso de Gestão de Políticas Públicas da Escola de Artes,
Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP).
O estudo foi desenhado a partir do aprendizado adquirido no seminário
Retratos Metropolitanos: A experiência do Grande ABC em perspectiva comparada1,
promovido pelo Consórcio Intermunicipal do ABC, em Novembro de 2001, em
parceria com a Fudação Konrad Adenauer – Oficina Municipal, Câmara do Grande
ABC, Centro de Estudos da Cultura Contemporânea (CEDEC), Instituto Municipal de
Ensino Superior de São Caetano do Sul (IMES), Revista Livre Mercado e Diário do
Grande ABC. O evento contou com a participação de especialistas, professores
universitários e gestores públicos que durante dois dias debateram a experiência
organizativa e institucional acumulada pelas principais regiões metropolitanas
brasileiras nas últimas décadas, particularmente a partir do processo de
redemocratização do Estado e da promulgação da Constituição Cidadã de 1988,
enfatizando os aspectos diretamente relacionados à experiência na região do ABC
paulista que se constitui como importante referencial prático e teórico para o
planejamento e a gestão de políticas públicas de caráter regional com a participação
ativa de todos os segmentos sociais. O seminário abordou o tema das regiões
metropolitanas no Brasil através de cinco painéis que trataram especificamente (I)
da questão federativa e do problema metropolitano no contexto político; (II) da
experiência metropolitana no Estado de São Paulo; (III) da situação atual das
regiões metropolitanas brasileiras; (IV) dos desenhos institucionais das regiões
metropolitanas e (V) dos avanços, obstáculos e das perspectivas desvendadas a
partir da experiência da região do ABC.
1 O seminário Retratos Metropolitanos: A experiência do grande ABC em perspectiva comparada reuniu, entre outros, os prefeitos Celso Augusto Daniel, de Santo André; Maria Inês, de Ribeirão Pires, Oswaldo Dias, de Mauá; Ramon Velasquez, de Rio Grande da Serra, vereadores dos municípios do ABC, autoridades municipais e estaduais, representantes da sociedade civil, profissionais e gestores das esferas pública e privada, intelectuais e pesquisadores, entre os quais destacamos Fernando Abrucio, Virginia Guia, Ana Lúcia Brito, Celina Souza, Giuseppe Cocco e Jeroen Klink.
5
Nesse conjunto de assuntos, duas questões importantes ficaram
evidenciadas a todos que presenciaram os debates e aos que tiveram acesso aos
seus registros documentais. A primeira aponta que as questões relacionadas à
coordenação intragovernamental, particularmente no que se refere ao contexto
regional, não foram suficientemente equacionadas na Constituição de 1988 e que,
ainda hoje, permanecem sem adequado tratamento. A outra mostra que existe uma
diversidade de realidades, que são marcadas por diferenças fundamentais na
institucionalidade das principais regiões metropolitanas brasileiras, e que essas
diferenças acabam influenciando, também de forma diferenciada, as condições de
governança, as experiências e os resultados das práticas políticas supramunicipais
em cada uma dessas das regiões.
Se a questão da coordenação intragovernamental ainda não foi
suficientemente tratada no arranjo (pacto) federativo brasileiro e se há uma
multiplicidade de experiências de formulação, implementação e gestão de políticas
regionalizadas em curso, particularmente em contextos metropolitanos, quais são os
limites e as potencialidades das experiências em curso para a adequada superação
dessas lacunas de coordenação intragovernamental? Em que medida as
experiências e as novas institucionalidades construídas pós-1988 nas principais
regiões do país podem contribuir para superar esse quadro de fragmentação e de
ausência de coordenação entre atores políticos subnacionais?
O objetivo central do trabalho, além de buscar respostas para essas
questões, é o contribuir para o entendimento, debate e apontamento de novas
possibilidades para as relações intergovernamentais, especialmente no âmbito
metropolitano. Trata-se de um estudo de base sociológica, interpretativo, ou
empírico-indutivo conforme as definições de Fernandes (1978). Trata-se de uma
análise, de caráter explanatório, que foi realizada a partir da atualização bibliográfica
sobre a temática. O estudo se justifica pela existência de um consenso entre
pesquisadores, técnicos, gestores, partidos políticos e órgãos governamentais,
indicando que o estágio atual do arcabouço institucional e o quadro situacional das
relações intergovernamentais são limitados e insuficientes para o apontamento de
soluções inovadoras de compartilhamento de poderes e de soluções no espaço
territorial metropolitano.
6
O texto está dividido em cinco partes. Nas duas primeiras partes,
apresento, respectivamente, as bases conceituais assumidas para definir e situar o
problema metropolitano ao longo do tempo e uma síntese do debate acadêmico e
social sobre o assunto. Nas três últimas, faço uma apresentação da perspectiva
assumida durante o estudo que procurou analisar limites e potencialidades na
gestão das políticas regionais nas três maiores e mais importantes regiões
metropolitanas do país – São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte -, para apontar
a necessidade de ampliação e desenvolvimento de novas capacidades nos atores
envolvidos com a questão.
7
1 O PROBLEMA METROPOLITANO E AS RELAÇÕES INTERGOVERNAMENTAIS
Pensar o problema metropolitano, na atualidade, significa entender o
conjunto dos problemas tipicamente urbanos e das dinâmicas possíveis entre as
grandes cidades conurbadas; definir suas relações necessárias de coordenação
com outros entes federativos para garantir fontes estáveis de financiamento para
suas políticas e estabelecer melhores possibilidades de cooperação; e definir e
estruturar boas condições para inserção dessa região nos processos da economia
mundializada.
Enquanto fenômeno, segundo Coy (2003), a metropolização é uma
característica importante do processo de urbanização observado especialmente na
América Latina que, em curto período de tempo, passou a ter expressivas
aglomerações urbanas. São Paulo, Cidade do México, Rio de Janeiro e Buenos
Aires contam, cada uma delas, com mais de 10 milhões de habitantes e integram o
grupo das 10 maiores megacidades do mundo, por exemplo. Ainda que nos últimos
anos, o crescimento quantitativo do processo de urbanização tenha sido atenuado, é
possível observar o incontrolável crescimento dos problemas urbanos nessas
regiões, que conduz a um também acelerado quadro de fragmentação social e de
segregação na estrutura do espaço urbano nessas regiões.
Para ilustrar a questão, os estudos demográficos de Théry e Melo (2005)
apontam que população brasileira saltou de 30 milhões de habitantes em 1920, para
41 milhões em 1940, 70 milhões em 1960, 117 milhões em 1980 e quase 170
milhões em 2000. Nesse período, além do crescimento global, houve a reversão da
proporcionalidade entre população rural e urbana, com inflexão nos anos 60. Os
autores apontam que o cruzamento das curvas entre população urbana e rural
aconteceu em períodos diferentes em cada uma das regiões: nos anos 50 no
Sudeste; na década de 1960 no Sul e Centro-Oeste; nos anos 80 no Nordeste e,
finalmente, em 1999, na região Norte. Para os autores, a distribuição
significativamente irregular é fruto de um processo de crescimento desigual.
Para efeitos didáticos, pode-se dividir a trajetória das políticas
metropolitanas no Brasil, em três períodos distintos assim definidos:
8
(1o) Período de institucionalização (1960-70 até 1988): O período pode
ser sistematizado desde as primeiras discussões em torno do assunto
ainda no final dos anos 60, até o processo de redemocratização que tem
a promulgação da Constituição como marco. A característica fundamental
da política metropolitana nesse período é a centralização das decisões e
dos recursos na esfera federal e a transferência aos estados membros do
poder de controle político e de gestão das regiões metropolitanas. A
política foi proposta sem uma clara definição da institucionalidade
correspondente.
(2o) Período de desativação do modelo do regime militar e início de
novas experiências (1989 até 2000): É um período que se inicia com o
processo de redemocratização em curso a partir do final dos anos 70 e
especialmente nos anos 80 e se estende até o final do milênio. Souza
(2003) procurou entender por que as experiências iniciadas durante o
período militar foram desativadas total ou parcialmente após a
redemocratização do país e indentificou uma relação de incompatibilidade
entre os novos tempos de democracia política e o “modelo autoritário” de
gestão metropolitana. Segundo ela, houve um esforço grande dos
constituinte de 1988 orientado para romper com as práticas de
centralização que acabaram colaborando para o esfacelamento do
modelo iniciado nos anos 70. Este período também marca o início de uma
nova etapa no desenvolvimento das políticas regionais no país a partir da
decisão constitucional de atribuir aos estados membros a competência
para a criação de regiões metropolitanas e do aparecimento de novas e
significativas experiências de políticas regionalizadas entre as quais,
merece destaque, a experiência do Grande ABC cujo modelo está
baseado na combinação de Câmara Regional, Agência de
Desenvolvimento e Consórcio Intermunicipal, com planejamento regional
e participação ativa da sociedade civil. As novas experiências foram
possíveis graças ao novo ordenamento constitucional brasileiro. O
período também sofre impactos da conjuntura econômica mundial, da
globalização, da reestruturação produtiva e do ajuste macroeconômico
promovido internamente a partir do Plano Real, que provocaram
importantes modificações nas dinâmicas locais e novas bases no pacto
federativo.
9
(3o) Período de busca de novas adequações institucionais (De 2001
até os dias de hoje): A partir da instituição do Estatuto da Cidade (Lei
Federal no. 10.257, de 10 de julho de 2001); da criação do Ministério das
Cidades em Janeiro de 2003; da criação do Conselho das Cidades e da
realização de um conjunto de conferências municipais, metropolitanas,
estaduais e nacional das cidades, o movimento e a luta social de
enfrentamento dos problemas urbanos ganharam novo fôlego e,
conseqüentemente, foram revigorados os debates em torno da questão
metropolitana. O período coincide com as crises de descontinuidade e
com as dificuldades de sustentabilidade das experiências e dos modelos
iniciados a partir da Constituição Cidadã e sofre efeitos das medidas de
qualificação da gestão que são decorrentes dos processos de
modernização e de reforma do Estado e de novas formas de gestão
pública que estão sendo introduzidas nas várias esferas de governo.
Como já foi exposto, no Brasil, a questão metropolitana foi introduzida na
agenda política nacional entre os anos sessenta e setenta, no centro dos debates
relacionados aos dilemas apresentados a partir desse acelerado processo de
crescimento geral da população e de industrialização e urbanização desigualmente
distribuídas pelo território que acabavam por reproduzir, de certo modo, os mesmos
efeitos do processo de povoamento e colonização, marcados por forte oposição
entre regiões densamente povoadas e outras de ocupação rarefeita.
A Lei Complementar no 14, de 1973, instituiu as oito primeiras regiões
metropolitanas no Brasil, indicando que planejamento integrado do desenvolvimento
econômico e social; saneamento básico, especialmente os serviços de
abastecimento de água, esgotamento sanitário e limpeza pública; uso do solo
metropolitano; transportes e sistema viário; produção e distribuição de gás
combustível canalizado; aproveitamento dos recursos hídricos e controle das formas
de poluição; e outros eventuais serviços incluídos na área de competência do
Conselho Deliberativo instituído por lei federal foram os assuntos originalmente
considerados de interesse metropolitano2. A norma constitucional do período definia
a competência da União, mediante lei complementar, para a realização de serviços
2 Além da Lei Complementar no
14, de 1973, o governo militar também instituiu a Região Metropolitana do Rio de Janeiro através da Lei Complementar no
20, de 1974.
10
comuns e o estabelecimento de regiões metropolitanas constituídas por municípios
integrantes da mesma comunidade sócio-econômica, independentemente de sua
vinculação administrativa.
Alguns especialistas apontam a falta de clareza conceitual do modelo
proposto que atribuiu proeminência ao estado membro, assegurada a partir da
nomeação dos membros Conselho Deliberativo das regiões metropolitanas e
mediante a possibilidade de criação de entidades estaduais para gerir as regiões
criadas ou de empresas estaduais ou metropolitanas para a prestação de serviços
vinculados à política metropolitana.
Capobianco (2004) enfatiza que as regiões metropolitanas instituídas
naquele período, durante o regime militar, carregaram a marca de um modelo
autoritário que se orientava para assegurar maior controle político da União sobre as
regiões mais populosas e importantes do país, sendo que esse modelo centralizador
se traduzia em menor autonomia de estados e municípios.
Souza (op. cit.) ao estudar a influência do regime político e do sistema
federativo sobre as políticas metropolitanas aponta que o problema metropolitano foi
pensado do ponto de vista político, social, econômico durante o regime militar e que
as respostas governamentais propostas procuravam assegurar condições
institucionais, administrativas e financeiras para promover o planejamento integrado
e a prestação de serviços comuns de interesse metropolitano, sob comando do
Estado membro e sob financiamento Federal. Segundo ela, é preciso observar que
as entidades estaduais criadas para a gestão da política metropolitana acabaram
provocando o agravamento dos conflitos de competência entre as esferas de
governo e unidades da mesma esfera ampliando o número de entraves na tratativa
da questão.
A Constituição de 1988 também não tratou da questão com a devida
profundidade. Diz o art. 25, do Capítulo III (Dos Estados Federados) do Título III (Da
Organização do Estado) que os Estados poderão, mediante lei complementar,
instituir regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões constituídas
por aglomerações de municípios limítrofes com a finalidade de integrar a
organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum,
sem esclarecer suficientemente o que sejam regiões metropolitanas, aglomerações
11
urbanas ou microrregiões e sem explicitar as formas de associação ou de gestão
desses tipos de recentralização administrativa.
É certo que a temática metropolitana tem valor fundamental para definir
as condições futuras da vida urbana especialmente nos grandes centros, nas
chamadas megacidades ou cidades globais. Desde a instituição do Estatuto da
Cidade, a questão das competências e das relações intergovernamentais entre
entes federados para a execução de planos e políticas urbanas voltou à tona e
ocupa lugar de destaque na agenda política porque gestores, órgãos
governamentais, especialistas e a própria sociedade civil se deparam com a
realidade limitante do atual quadro institucional.
12
2 ATUALIZANDO O DEBATE
Muitos autores situam o atual debate em torno da questão metropolitana
no âmbito das relações federalistas, com ênfase nas suas dimensões política, fiscal
e administrativa. Abrucio (2001), em linhas gerais, assegura que não é possível
dissociar o problema metropolitano do entendimento da questão federativa. O
sistema federativo impõe condições especiais para a organização política dos
municípios, para os resultados das suas políticas públicas e para a produção de
políticas regionais. No caso brasileiro, segundo ele, isso é ainda mais acentuado
porque o nosso sistema federativo tem características peculiares que afetam ainda
mais significativamente a questão regional.
Sua definição de estado federativo explicita o valor que atribui ao sistema
na definição das condições de execução da política metropolitana. O estado
federativo é uma forma especial de organizar o poder, que aponta para a existência
de um poder central e de uma soberania a ser compartilhada entre vários outros
poderes subnacionais e, desta forma, a federação não pode ser explicada pela
separação entre diferentes níveis de governo e, sim, como uma dinâmica, ou um
pacto, para se lidar com as desigualdades. Os estados federativos se vêem na
condição de ter que construir uma unidade na diversidade ou, em outros termos, ter
que conjugar autonomia, interdependência e controles mútuos entre seus diferentes
níveis de governo.
Além disso, o autor aponta as condições históricas do desenvolvimento
do estado federativo no Brasil, que surgiu da heterogeneidade das elites políticas
locais e que se construiu ao longo do tempo, oscilando entre períodos de
centralização e descentralização política e fiscal onde, em alguns momentos, a
interdependência entre os entes federados significou centralizações autoritárias de
poder político e financeiro como no Estado Novo ou no regime militar.
Entendendo a questão desse ponto de vista é fácil verificar a importância
que as relações intergovernamentais assumem no equacionamento da questão
metropolitana. Se arranjo federativo é pacto, as condições de coordenação e
cooperação intergovernamental passam a ser aspectos centrais na definição de
condições para a execução de políticas regionais. O autor imbrica esses aspectos
com as dificuldades decorrentes da tradição municipalista no Brasil, de
13
municipalismo autárquico, e com o histórico peso político dos governadores a quem
chama de barões da federação (1994). Também salienta a fragilidade jurídica dos
arranjos metropolitanos propostos, que não definem fontes estáveis de
financiamento, não estabelecem mecanismos institucionais de apoio e incentivo à
cooperação nem garantem condições mínimas e adequadas para a coordenação
entre entes federativos, seja ela formal ou informal.
Após a Constituição de 1988, o Brasil se configurou como um caso
especial de federalismo no mundo moderno ao incluir os municípios como entes
constitutivos da federação. É um caso atípico de federalismo, uma vez que a teoria
não incorpora as esferas locais de poder, considerando apenas os estados, como
instâncias territoriais de poder onde se manifesta a diversidade, em oposição à
União, onde se configura a unidade.
...a divisão de poder territorial que caracteriza as federações se materializa na conciliação desses dois objetivos – unidade e diversidade -, que se transformam em espaços territoriais de análise na teoria do federalismo. Isso exclui da análise baseada nessa teoria a questão de um terceiro espaço territorial, tornando-os relativamente autônomos dos seus criadores na maioria das Federações, ou seja, os estados. (Souza, op cit).
A decisão de incluir os municípios como entes constitutivos da federação
evidencia o papel de destaque que os municípios assumem na cultura e na prática
política brasileira. A autora explica que isso decorre muito mais, não da existência de
arranjos políticos descentralizadores, mas, sim, do deslocamento municipal da
jurisdição estadual que também apontam para a maior complexidade das
articulações e dos mecanismos de cooperação entre as três esferas de governo. No
estudo, Souza demonstra que, independentemente dos debates teóricos e das
interpretações que possamos construir sobre o assunto, na observação da trajetória
brasileira é possível notar a presença marcante da União e, em especial, da sua
capacidade de legislar sobre temas comuns e de interesse dos demais entes
constitutivos, desde os anos 30. E disso conclui que o federalismo brasileiro tem
sido definido por arranjos políticos e territoriais, que se moveu do federalismo
chamado isolado dos primeiros anos republicanos, passando por períodos de
centralização autoritária até desaguar à atual configuração que se caracteriza por
uma relação mais equilibrada entre entes federativos, onde estados e municípios
passaram a contar relativamente com mais recursos e receitas.
14
Outras medidas para o fortalecimento dos governos subnacionais também
foram adotadas na Constituição de 1988. Entre elas, aponta a autora, destacam-se o
direito dos municípios de promulgar a própria Lei Orgânica e o deslocamento de
competência, da esfera federal para a esfera estadual, para a instituição de regiões
metropolitanas. Ao mesmo tempo, no entanto, a União manteve a tradição
observada pelo menos nos últimos 80 anos, de concentrar a competência legislativa
sobre a grande maioria dos assuntos de eventual interesse das esferas
subnacionais, limitando a capacidade dessas esferas de fundamentarem suas
próprias políticas.
Em estudo anterior a autora já havia apontado que o federalismo no Brasil
foi historicamente desenhado para amortecer as profundas desigualdades e
disparidades existentes entre as regiões do país, ou que estão presentes dentro de
uma mesma região, que acabam conferindo maior complexidade para as relações
intergovernamentiais. Destaca a autora que essas tensões não da natureza do
federalismo, mas demandam a solução de conflitos políticos mais amplos.
Ainda para efeitos de análise, o estudo procurou investigar as condições e
os principais argumentos apresentados no debate atual sobre a questão,
identificando correntes de pensamento que apontam, de um lado, para a
necessidade da criação de novos entes federativos no espaço territorial
metropolitano, de outro, pela necessidade da instituição de novos modelos de
administração regionalizada, como os existentes na Alemanha, chamados kreise,
que na pratica funcionam como distritos com autonomia financeira e administrativa,
que na prática atuam como associações de municípios para defender os seus
interesses comuns junto às outras esferas governamentais. Há também outras
correntes de pensamento que defendem o aprimoramento da formulas atuais que
envolvem o fortalecimento dos fóruns e das atividades consorciativas entre os
municípios. Foge aos propósitos deste trabalho investigar e documentar todos os
conteúdos teóricos e políticos dos debates que são travados no nível governamental
e acadêmico para a qualificação da ação no contexto metropolitano.
15
3 A PERSPECTIVA DO PRESENTE ESTUDO
Depois de estabelecidas as condições de análise, o presente estudo
procurou investigar a situação atual das principais regiões metropolitanas do país –
São Paulo, Rio de Janeiro e Belo Horizonte -, que juntas reúnem aproximadamente
20% da população total de Brasil e concentram a base material para a produção de
uma parte extremamente significativa do produto interno bruto brasileiro.
Todas elas foram criadas nos anos 70, com conformidade com o contexto
acima descrito e analisado, com a esfera federal concentrando os recursos
financeiros e o poder decisório para a definição de diretrizes de ação e formulação
de políticas.
A partir da Constituição Federal de 1988, que transfere a competência
legislativa sobre a questão metropolitana para os municípios que a situação começa
a se transformar. As análises empreendidas procuraram identificar a particularidade
dessas experiências a partir das Constituições estaduais que definiram novas
condições de gestão para essas regiões.
a) Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), Estado de Minas
Gerais:
A RMBH foi instituída a partir da vinculação compulsória de 33 municípios
e contava, no ano 2000, com aproximadamente 4,3 milhões de habitantes, sendo
que 2,24 milhões apenas na capital, Belo Horizonte. A região apresenta grandes
disparidades entre os municípios membros que podem ser classificados entre
pequenos municípios com população de baixa renda e cidades como Belo
Horizonte, Contagem, Betim, Vespasiano, Nova Lima, Pedro Leopoldo que
apresentam forte dinamismo econômico e industrial.
A partir da Constituição Estadual de 1989, foram instituídas a Assembléia
Metropolitana de Belo Horizonte (AMBEL) e o Fundo Metropolitano de
Desenvolvimento visando assegurar condições mais democráticas de gestão e de
financiamento para as políticas metropolitanas. A característica central da
experiência mineira nesse período é a valorização do papel do poder local municipal
na definição das políticas em detrimento do esvaziamento do poder político
característico do entre estadual durante o período anterior. A Assembléia passou a
ser constituída pelos prefeitos de todos os municípios e por um número proporcional
16
de representantes das Câmaras Legislativas Municipais, e se constituía em três
órgãos, Plenário, Mesa Diretora e Câmaras Técnicas Setorias, com poderes para a
definição de planos e políticas e gestão operacional.
b) Região Metropolitana do Rio de Janeiro (RMRJ), Estado do Rio de
Janeiro:
A RMRJ é integrada por 20 municípios com forte polarização política e
econômica da atual capital do Estado, Rio de Janeiro, e de Niterói, a antiga capital
estadual. A RMRJ foi instituída por Lei Complementar, em 1974, em conjunto com a
fusão do antigo Estado da Guanabara com o Rio de Janeiro nos moldes do modelo
centralizador autoritário e passou a operar sem nenhuma preocupação em garantir
identidade e condições de cooperação com os outros municípios, especialmente os
da Baixa Fluminense, pobres, com baixa capacidade técnica e dependente de
recursos de outras esferas governamentais. A forte polarização econômica, técnica
e política exercida pelo Município do Rio de Janeiro acabou se sobrepondo na
gestão das políticas metropolitanas.
c) Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), Estado de São Paulo:
A RMSP começou a ser instituída em 1967, por decisão estadual, que
estabelecia oficialmente a divisão do Estado em regiões de caráter administrativo.
O objetivo era definir diretrizes para a regionalização da administração visando
conferir racionalidade e maior efetividade à ação governamental. Posteriormente,
nos anos 70, a política centralizada levada a cabo pela União acabou se
sobrepondo aos interesses próprios do Estado na sua política de regionalização. A
RMSP é integrada por 39 municípios, além da Capital do Estado, São Paulo, e
concentra aproximadamente 50% da população residente no Estado, a maior parte
da arrecadação tributária e a maior parte dos postos no mercado de trabalho
oferecidos no Estado de São Paulo. A RMSP configura-se como uma gigantesca
fonte de poder e de concentração de dramas urbanos específicos, como segurança
pública, emprego, meio ambiente, habitação, mobilidade urbana e transporte
público urbano. A principal característica da gestão metropolitana no Estado de
São Paulo é o papel coordenador exercido pelo Estado de São Paulo, que mantém
uma secretaria específica para a implementação de políticas metropolitanas. Os
principais focos de ação deste modelo de gestão são o sistema viário e a política
de transporte metropolitano, o oferecimento de serviços de saneamento básico,
17
particularmente abastecimento de água e esgotamento sanitário por empresa
controlada pelo governo estadual, as políticas de uso do solo metropolitano para
assegurar a defesa das áreas de mananciais e a definição de outras políticas de
interesse metropolitano. No modelo, o Estado de São Paulo tem papel proeminente
na formulação, no financiamento e na execução das políticas de caráter
metropolitano. Há na experiência paulista, também, o desenvolvimento da
experiência do ABC que, como já foi demonstrado, foi possível a partir da nova
institucionalidade definida pela Constituição de 1988, e procura conjugar a ação de
uma Câmara Regional, Consórcio Intermunicipal e Agência de Desenvolvimento
que procuram atuar em conjunto com as prefeituras municipais a partir de um
planejamento regional participativo. A experiência do ABC surge, por si, como uma
resposta regionalizada aos limites da própria experiência metropolitana
coordenada pelo Governo Estadual, procurando ampliar o campo de ação das
estruturas supramunicipais e englobar aspectos de desenvolvimento econômico
regional e a interação do local com o global em ambiente fortemente industrializado
como a região metropolitana de São Paulo.
A perspectiva central do presente estudo, à luz dessas avaliações é
propor a necessidade de qualificar os atores envolvidos para o pleno
desenvolvimento das políticas regionalizadas, em particular nos contextos
metropolitanos. Todas as experiências acima descritas, que podem ser
configuradas em três tipos ideais de gestão metropolitana – Belo Horizonte, o
modelo democrático; Rio de Janeiro, o modelo da forte hegemonia política e
econômica e o de São Paulo, o modelo da coordenação estadual -; apresentam
graves problemas de operação e de funcionamento que acabam comprometendo o
conteúdo, a qualidade e o alcance das políticas metropolitanas geradas em cada
um dos contextos.
O modelo da Região de Belo Horizonte, que aponta para a hegemonia
dos entes locais acaba se inviabilizando na prática, devido a articulação política
praticada pelos municípios menores para assegurar o controle político nos órgãos
da gestão metropolitana e ao esvaziamento político provocado pelos municípios
de maior porte. A Região Metropolitana do Rio de Janeiro, fortemente controlada
por um único aponta para uma situação caótica, de total falta de coordenação e
de cooperação entre os entes metropolitanos, ampliando significativamente o
18
grau de fragmentação espacial e social e de dependência dos municípios de
baixa capacidade técnica, financeira e política, que acabam funcionando como
simples clientes de serviços de interesse comum, oferecidos por empresas da
instância estadual.
O modelo em São Paulo, de forte coordenação estadual também se
mostra limitado e não oferece respostas a diferentes aspectos e necessidades do
conjunto dos atores metropolitanos, sejam eles públicos ou privados.
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4 A NECESSIDADE DE NOVAS CAPACIDADES PARA OS ATORES
METROPOLITANOS
Claus Offe em um de seus escritos, numa observação de cunho
metodológico, afirma que os fenômenos sociais podem ser observados a partir de
várias perspectivas: de cima, de baixo e por dentro. A partir da análise do
funcionamento dos modelos de gestão metropolitana nas três mais importantes
regiões do país, tratamos de abordar a questão “por dentro”.
Uma rápida olhadela na literatura qualificada sobre o assunto é
suficiente para observar a predominância de abordagens e de debates que tratam
da questão na perspectiva “de cima”, olhando fundamentalmente para as
relações federativas. Outra perspectiva, “de baixo”, aborda a questão propondo
novos arranjos estruturais que envolvam os entes da ponta a se organizar par
enfrentar os dilemas urbanos comuns.
O presente estudo, em outra direção, procura abordar a questão,
enfatizando a necessidade de qualificação e desenvolvimento de novas
capacidades para os atores envolvidos na questão, a partir da crença apontada
pelos estudos organizacionais que indicam que a inovação está diretamente
relacionada mais com as capacidades do que com as estruturas ou com os
processos. Matus (1996, 2005) trata da subordinação da forma organizacional às
praticas de trabalho e destas às estruturas mentais que definem as práticas
arraigadas. Se quisermos reformar uma organização, diz o autor, não podemos
começar pelas conseqüências, já que em toda organização vigora o seguinte
processo causal:
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Matus indica que o conceito de macroorganização é adequado e aplicável
a qualquer contexto espacial ou político institucional que exija a ação de uma
autoridade sobre as demais organizações componentes, como é o caso da gestão
de políticas metropolitanas que envolve a participação de vários atores em atitude
do cooperação e de coordenação.
A metáfora do jogo é extremamente útil para que possamos entender os
problemas que envolvem uma organização em um jogo de cooperação e de conflito.
Macroorganização é um conjunto de sistemas microorganizacionais que operam em
um espaço político-institucional, de acordo com regras de direcionalidade, de
departamentalização e de responsabilidades, que são estabelecidas no pelo próprio
jogo, onde cada participante tem um grau relevante de autonomia e onde operam
vários poderes e vários governos. Relações de direcionalidade definem a
organização como adequada ou não em relação aos problemas ou à situação por
que passa o jogo; as de departamentalização criam o sistema diferenciado de
organizações que vai afetar a capacidade de responder as demandas apresentadas;
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regras de governabilidade é o que definem o sistema como centralizado ou
descentralizado, conforme o grau de autonomia e de liberdade de ação das
microorganizações e as regras de responsabilidade definem o grau de
responsabilidade conforme o sistema de cobrança e de prestação de contas
associado ao jogo.
Nesse contexto, as regras de governabilidade, que se exprimem no
controle de capacidades importantes, são aquelas que estabelecem o equilíbrio
entre as missões assumidas pela organização e as competências necessárias para
cumpri-las. São condições que definem o grau de centralização ou descentralização
do sistema organizacional estabelecido e que se expressam por meio de sistemas
de direção (para as definições estratégicas) e de gerencia (para a operacionalização
das políticas).
Os jogos, segundo Matus, possuem regras, acumulações e fluxos. As
regras envolvem as normas de formais e de fato; as acumulações se relacionam
com a capacidade de produção de jogadas, que envolve os sistemas organizativos,
os métodos de trabalho, o conhecimento disponível e a tecnologia utilizada; e os
fluxos envolvem os atos de comunicação, de fala e as ações. Regras num jogo
macroorganizacional funcionam quando são capazes de formalizar relações
paralelas entre organizações participantes. O autor é taxativo ao apontar que a
coordenação organizacional só pode ser realizada a partir de quatro tipo de relações
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que envolvem (a) relações paralelas; (b) relações de dependência hierárquica; (c)
relações de alta direção e; (d) relações de gerência.
Relações paralelas, ou de interação, são aquelas onde os participantes
coexistem de forma igual ou desigual, mas nunca em relações de dependência
hierárquica, onde se impõe a regra numa situação de obediência. A coordenação é
produzida quando, e somente quando, se produz a capacidade de emitir diretrizes
pela vontade de todos os participantes.
Feitas essas considerações, fica evidente o grau de correspondência que
existe em regras, acumulações e os fluxos que estão presentes em um jogo
macroorganizacional. As capacidades de produção que uma instituição/organização
acumula, facilitam e condicionam os fluxos da produção institucional e se constituem
como a sua fachada mais visível.
Garantir condições de operacionalidade a uma instituição em sua direção
consiste em repensar seus fluxos, estimar as deficiências de suas acumulações em
relação a novos fluxos e verificar a necessidade de mudar as regras vigentes para
torná-las consistentes com as acumulações requeridas. Haverá sempre uma relação
muito forte entre as regras de responsabilidade, os sistemas de cobrança e de
prestação de contas e a qualidade da gestão empreendida.
Uma organização apenas se realiza em suas práticas de trabalho e
apenas pode ser justificada pelos resultados obtidos a partir delas. A qualidade da
ação organizacional está diretamente relacionada com as práticas enraigadas, muito
mais do que com as regras formais estabelecidas. A quantidade e a qualidade da
produção de uma ação organizacional é o resultado de sua ação sobre os
problemas que pretende enfrentar (ou de suas missões específicas). Todas as
formas organizacionais (leis, regras, normas, organogramas etc) constituem-se
como uma base estrutural que condiciona as praticas de trabalho, mas as praticas
são muito mais sólidas que as formas organizacionais e são independentes dela.
Todas as praticas de trabalho são moldadas pela cultura institucional e
isso indica que é possível mudar as práticas de trabalho sem alterar suas formas
organizacionais. Por isso, o desenvolvimento de novas capacidades nos atores
passa a ser um ferramental importante na condução das políticas metropolitanas.
Todas as práticas de trabalho podem ser modificadas com métodos e sistemas
devidamente fundamentados de treinamento.
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5 CONCLUSÕES
O presente estudo foi construído para colaborar com o debate sobre a
adequação institucional vislumbrada por vários setores técnicos e políticos como a
solução mais adequada para o encaminhamento da problemática metropolitana no
Brasil.
Ao longo do estudo procuramos construir uma perspectiva histórica de
análise da questão, evidenciando os aspectos mais importantes, capazes de conferir
condições de interpretar o problema com mais propriedade. Ficou evidenciado que a
trajetória das políticas metropolitanas teve início durante um período de centralização
autoritária nos anos 70, o que essa condição acabou por definir condições de
resistência política à continuidade dessas experiências. Também evidenciamos que
após a Constituição de 1988, quando a questão metropolitana foi arremetida à esfera
de competência legislativa dos estados membros sem adequada formulação
conceitual, foram geradas novas experiências regionais que podem ser
sistematicamente analisadas em suas características básicas como diferentes
modelos institucionais.
Observamos também o conteúdo dos debates atuais sobre a problemática,
em curso nos ambientes político e acadêmico. Descortinamos que há vários enfoques
propostos para tratar da questão, ora apontando a necessidade de alterações no
sistema federativa brasileiro, ora indicando a necessidade de qualificação de outros
instrumentos já previstos na base institucional brasileira para o desenvolvimento de
novos modelos de ação intergovernamental no âmbito subnacional.
Investigamos o conteúdo das experiências de gestão metropolitana nas
três maiores e mais importantes regiões do país e indicamos que todas apresentam
limitações que acabam impactando na definição, no conteúdo e na qualidade de suas
políticas metropolitanas. Por fim, propusemos uma analise da questão “por dentro”
indicando a necessidade da qualificação e do desenvolvimento de novas capacidades
para os atores subnacionais, sustentando a argumentação nos estudos de Carlos
Matus, que indicam uma relação causal estabelecida entre estruturas mentais,
processos de trabalho e estruturas organizacionais, com ampla e definitiva
supremacia das estruturas mentais e da cultura arraigada. O desenvolvimento de
novas capacidades nos atores subnacionais poderá definir novas práticas de trabalho
e avançar para a configuração de novas e inovadoras condições de governança
metropolitana.
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6 REFERÊNCIAS
ABRUCIO, Fernando Luiz. Os Barões da Federação. São Paulo: CEDEC, Lua Nova. ______. A reconstrução das funções governamentais no federalismo brasileiro. In: HOFMEISTER, Wilhelm; BRASILIENSE CARNEIRO, José Mário (Orgs.). Federalismo na Alemanha e no Brasil. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2001. BRASIL. Constituição Federal. Legislação administrativa. São Paulo: Saraiva, 2007. CAPOBIANCO, Antonio Marcos. Relações intergovernamentais na metrópole: Adequação institucional para a ação. Disponível em: <www.iea.usp.br/artigos>. Acesso em: 20 jul. 2008. COY, Martin. Tendências atuais de fragmentação nas cidades latino-americanas e desafios para a política urbana e o planejamento urbano In: Iberoamericana, América Latina, España e Portugal – Ensayos sobre letras, historia y sociedad. Notas, resenãs iberoamericanas. Nueva época, n. 11, septiembre de 2003, Año III, pp. 111-128. FERNADES, Florestan. Fundamentos empíricos da explicação sociológica. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1978. HOFMEISTER, Wilhelm (editor). Retratos METROPOLITANOS: a experiência do ABC em perspectiva comparada – São Paulo: Fundação Konrad Adenauer : Edições Loyola, 2002. MATUS, Carlos. Trad. Luiz Felipe Rodriguez Del Riego. Adeus senhor presidente: governantes governados. São Paulo: FUNDAP, 1996. ______. Trad. Luiz Felipe Rodriguez Del Riego. Teoria do Jogo Social. São Paulo: FUNDAP, 2005. Souza, Celina. Regiões Metropolitanas: Condicionantes do regime político. Lua Nova, no 59. São Paulo: CEDEC, 2003.
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THÉRY, Hervé; MELO, Neli Aparecida de. Atlas do Brasil: disparidades e dinâmicas do território. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2005.
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AUTORIA
Paulo de Tarso de Oliveira Côrte – Graduando em Gestão de Políticas Públicas na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP). Diretor executivo do Instituto Henfil, atua como consultor sênior na área de planejamento estratégico situacional e gestão governamental pela C&Z Consultores Associados.
Endereço eletrônico: [email protected]