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A Química dos Sentidos – Uma Proposta Metodológica QUÍMICA NOVA NA ESCOLA 182 Vol. 35, N° 1, p. 182-188, AGOSTO 2013 Recebido em 28/09/2012, aceito em 19/04/2013 Ruth Maria Bonfim Vidal e Rute Claudino Melo A química dos sentidos olfato, paladar e visão, como tema estruturador, atende às propostas dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino Médio (PCNEM) em relação à contextualização e interdisciplinaridade, pois é assunto presente na vida do aluno. A exploração do tema é realizada com métodos de contextualização e interdisciplinaridade, por meio de seminários e dinâmicas, na tentativa de promover um interesse pela disciplina de química e facilitar o processo de aprendizagem. O trabalho se desenvolve com a participação de 30 alunos do ensino médio da Escola Estadual de Ensino Médio e Fundamental General Eudoro Corrêa. Um questionário foi o instrumento de avaliação utilizado e foi aplicado antes e após a realização do trabalho no intuito de aprimorar a avaliação dos resultados. Os alunos demonstraram grande aceitação em todos os aspectos avaliados quando se refere ao tipo de aula ministrada, resultando em um nível maior de interesse pela disciplina de química. química, contextualização, ensino A Química dos Sentidos – Uma Proposta Metodológica O presente trabalho se embasa na tentativa de reforçar a proposta pedagógica para o ensino de química, aliando teoria e prática e trazendo uma abordagem contextualizada e interdisciplinar. Assim, optou-se em explorar a química que explica os sentidos (paladar, olfato e visão), tema bastante rico em conceitos fundamentais de química e que pode ser trabalhado com alunos do ensino médio. N os dias atuais, têm-se questionado com frequência as práticas pedagógicas vigentes no intuito de trazer melhorias no sistema de ensino. O papel do professor é um dos assuntos em foco nesse contexto, tema que tem gerado discussão principalmente nos métodos que o professor utiliza para repassar o conteúdo curricular. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) sugerem que a disciplina de química seja ministrada a partir de uma abor- dagem contextualizada, baseando a prática de ensino em temas estruturadores vinculados ao cotidiano social para uma compreensão significativa do conteúdo abordado. Para tanto, o professor deve atuar como um problematizador, fornecendo meios para a construção do conhecimento a partir do próprio aluno. O presente trabalho se embasa na tentativa de reforçar a proposta pedagógica para o ensino de química, aliando teoria e prática e trazendo uma abordagem contextualizada e interdisciplinar. Assim, optou-se em explorar a química que explica os sentidos (paladar, olfato e visão), tema bastante rico em conceitos fundamentais de química e que pode ser trabalhado com alunos do ensino médio. O tema foi abordado em forma de seminários e dinâmicas com um grupo amostral de 30 alunos do ensino médio que demonstra- vam desinteresse e dificuldades em aprender a disciplina de quí- mica. Por meio de um questio- nário avaliativo, pesquisaram-se vários fatores que possivelmente levariam esses alunos ao desinte- resse e à falta de aprendizagem do conteúdo de química e se esses fatores estão associados aos métodos de ensino. Explicar os sentidos do corpo humano colocando a disci- plina de química como eixo central é trazer uma importância a essa ciência, pois o conhecimento que explica os sentidos não é puramente biológico e se expande aos conhecimentos de química, física e outras áreas do conhecimento. Explorar a química do cotidiano traz significância à disciplina e, para o aluno, torna-se mais fácil entender os fenômenos químicos RELATOS DE SALA DE AULA

A Química dos Sentidos – Uma Proposta Metodológica · paladar por meio de forças eletrostáticas, e as substâncias que provocam o sabor azedo, assim como o doce, interagem mediante

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A Química dos Sentidos – Uma Proposta MetodológicaQUÍMICA NOVA NA ESCOLA

182

Vol. 35, N° 1, p. 182-188, AGOSTO 2013

Recebido em 28/09/2012, aceito em 19/04/2013

Ruth Maria Bonfim Vidal e Rute Claudino Melo

A química dos sentidos olfato, paladar e visão, como tema estruturador, atende às propostas dos Parâmetros Curriculares Nacionais para o ensino Médio (PCNEM) em relação à contextualização e interdisciplinaridade, pois é assunto presente na vida do aluno. A exploração do tema é realizada com métodos de contextualização e interdisciplinaridade, por meio de seminários e dinâmicas, na tentativa de promover um interesse pela disciplina de química e facilitar o processo de aprendizagem. O trabalho se desenvolve com a participação de 30 alunos do ensino médio da Escola Estadual de Ensino Médio e Fundamental General Eudoro Corrêa. Um questionário foi o instrumento de avaliação utilizado e foi aplicado antes e após a realização do trabalho no intuito de aprimorar a avaliação dos resultados. Os alunos demonstraram grande aceitação em todos os aspectos avaliados quando se refere ao tipo de aula ministrada, resultando em um nível maior de interesse pela disciplina de química.

química, contextualização, ensino

A Química dos Sentidos – Uma Proposta Metodológica

O presente trabalho se embasa na tentativa de reforçar a proposta pedagógica

para o ensino de química, aliando teoria e prática e trazendo uma abordagem

contextualizada e interdisciplinar. Assim, optou-se em explorar a química que explica os sentidos (paladar, olfato e

visão), tema bastante rico em conceitos fundamentais de química e que pode ser trabalhado com alunos do ensino médio.

Nos dias atuais, têm-se questionado com frequência as práticas pedagógicas vigentes no intuito de trazer melhorias no sistema de

ensino. O papel do professor é um dos assuntos em foco nesse contexto, tema que tem gerado discussão principalmente nos métodos que o professor utiliza para repassar o conteúdo curr icular. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio (PCNEM) sugerem que a disciplina de química seja ministrada a partir de uma abor-dagem contextualizada, baseando a prática de ensino em temas estruturadores vinculados ao cotidiano social para uma compreensão significativa do conteúdo abordado. Para tanto, o professor deve atuar como um problematizador, fornecendo meios para a construção do conhecimento a partir do próprio aluno.

O presente trabalho se embasa na tentativa de reforçar a proposta pedagógica para o ensino de química, aliando teoria e prática e trazendo uma abordagem contextualizada e interdisciplinar. Assim, optou-se em explorar a química que

explica os sentidos (paladar, olfato e visão), tema bastante rico em conceitos fundamentais de química e que pode ser

trabalhado com alunos do ensino médio.

O tema foi abordado em forma de seminários e dinâmicas com um grupo amostral de 30 alunos do ensino médio que demonstra-vam desinteresse e dificuldades em aprender a disciplina de quí-mica. Por meio de um questio-nário avaliativo, pesquisaram-se vários fatores que possivelmente levariam esses alunos ao desinte-resse e à falta de aprendizagem do

conteúdo de química e se esses fatores estão associados aos métodos de ensino.

Explicar os sentidos do corpo humano colocando a disci-plina de química como eixo central é trazer uma importância a essa ciência, pois o conhecimento que explica os sentidos não é puramente biológico e se expande aos conhecimentos de química, física e outras áreas do conhecimento. Explorar a química do cotidiano traz significância à disciplina e, para o aluno, torna-se mais fácil entender os fenômenos químicos

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quando são explicadas as situações que ocorrem à sua volta. Sendo assim, ele percebe a importância de estudar química e a sua reação diante dessa disciplina passa a ser de interesse e de aprendizagem.

Interdisciplinarizar e contextualizar para dar significado

A interdisciplinaridade aliada à contextualização promo-ve no ensino uma expansão do conhecimento e da apren-dizagem. O conteúdo de química não se restringe apenas à própria disciplina, mas interage com as outras ciências, explicando fenômenos biológicos, físicos, históricos etc. Segundo Abreu (2001), nos PCNEM, a interdisciplinari-dade é defendida pela afirmação de que existem limites frágeis e pouco nítidos entre as disciplinas, os quais poderiam favorecer o diálogo e a interação entre elas.

Ensinar com contextualiza-ção e interdisciplinaridade não é citar exemplos de eventos no cotidiano, mas sim vincular esses eventos ao conhecimento científico de forma a facilitar a aprendizagem e atrair o aprendiz às reflexões sobre o assunto em debate. Também é criar um cli-ma de discussão em sala, dando significância ao papel do aluno, de que ele é capaz de pensar, de formular teorias e de se sentir bem na escola e fora dela, é incentivar o aluno a se tornar importante, fazendo com que surja dentro dele interesse pelo conhecimento.

No intuito de promover um desenvolvimento no grau de aprendizagem dos alunos, tanto quanto uma conscien-tização dos direitos e deveres do cidadão, a prática de um ensino voltado para as realidades social, ambiental, política e econômica se faz necessária. De acordo com a Matriz de referência para o ENEM 2009, ampliar e interligar as áreas de ensino é uma proposta recorrente no sistema educacional do nosso país.

A química e o nosso corpo

Estudar o ser humano é sempre desafiador, ainda mais quando se trata de algo tão subjetivo quanto às sensações. Elas fazem parte da nossa vida e nos tornam seres particular-mente únicos. Esse assunto se torna mais desafiador quando se tenta inseri-lo no ensino da disciplina de química para o ensino médio, pois os alunos ainda não têm conhecimento adquirido sobre os diversos tipos e as funções das substân-cias químicas.

Segundo Retondo (2010), o estudo dos sentidos não se restringe apenas a sentir, mas se expande às percepções que são individuais ao ser humano. Os sentidos estão interliga-dos: por exemplo, a audição permitiu ao homem desenvolver

todo um processo de vocalização. A visão atua como um fator de motivação, orientação e controle dos movimentos e das ações.

A sensação de sabor está associada à nossa cultura e ao ambiente onde vivemos. Para nós, brasileiros, é comum criarmos um cachorro para nos fazer companhia, já para alguns orientais, isso é muito estranho, pois eles saboreiam o cachorro em sua diversificada culinária. Comer um escor-pião seria algo desafiador e assustador para nós, mas eles o fazem com naturalidade. Diante disso, percebe-se que o paladar está intimamente ligado às percepções, assim como também os outros sentidos (Retondo, 2010).

O paladar está associado ao sentido da visão e também do olfato. Analisar um alimento pela visão e pelo odor diz se este é aceitável ao paladar ou não. Essa análise é importante como uma forma de defesa do organismo para verificar se o alimento está es-tragado ou não. Myers (2012) cita a pesquisadora Linda Bartoshuck que, sobre a gustação, constata que as respostas emocionais ao paladar são pré-fabricadas, visto que as reações faciais de um bebê, com relação a uma substância doce ou amarga posta sobre a língua são semelhantes às de um adulto.

O sentido do paladar é tido como sentido químico, pois de-

pende fortemente de substâncias químicas que vão interagir com os receptores presentes nas papilas gustativas, locali-zadas na língua. A distinção das sensações dos principais sabores: doce, amargo, azedo, salgado e umami são obtidos pelas diferentes características físico-químicas presentes nas moléculas que os constituem.

No sentido do paladar, as principais propriedades físico--químicas envolvidas são a solubilidade e as interações inter-moleculares entre as moléculas do alimento e os receptores.

O ser humano é capaz de identificar uma variedade de aromas, porém só é capaz de identificar cinco sabores: o doce, o amargo, o azedo, o salgado e o umami. Para cada sabor, a forma de identificação é diferente. Os receptores presentes na língua possuem moléculas que interagem com as moléculas do alimento, e essa interação é interpretada pelo cérebro em diferentes sabores. A interação mais conhecida é a ligação hidrogênio que ocorre entre molé-culas que causam sabor doce. A interação entre moléculas estimula os receptores, causando um envio de mensagem ao cérebro que, por sua vez, interpreta-a como sabor doce (Retondo, 2010).

A saliva, além de fazer parte do processo digestivo, tem um papel importante na percepção dos sabores, pois solu-biliza o alimento, facilitando o contato das moléculas do alimento com os receptores gustativos da língua (Nishida, 2007).

Ensinar com contextualização e interdisciplinaridade não é citar exemplos de eventos no cotidiano, mas sim vincular esses eventos ao conhecimento científico

de forma a facilitar a aprendizagem e atrair o aprendiz às reflexões sobre o assunto em debate. Também é criar um clima de discussão em sala, dando significância ao papel do aluno, de que ele é capaz de

pensar, de formular teorias e de se sentir bem na escola e fora dela, é incentivar

o aluno a se tornar importante, fazendo com que surja dentro dele interesse pelo

conhecimento.

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A diferença entre as moléculas que evocam o sabor doce e o amargo são muito sutis e depende do arranjo espacial das moléculas.

O sabor salgado se deve aos sais, principalmente ao cloreto de sódio. Já o sabor azedo se deve aos ácidos orgâ-nicos e inorgânicos. Os sais interagem com os receptores do paladar por meio de forças eletrostáticas, e as substâncias que provocam o sabor azedo, assim como o doce, interagem mediante a ligação hidrogênio (Retondo, 2010).

O umami é o quinto gosto básico e, de acordo com Reyes (2011), esse gosto é notado quando o glutamato monossódico se encontra nos alimentos em sua forma livre.

O olfato está intimamente interligado ao paladar, e isso é comprovado quando alguém fica resfriado e não consegue sentir o gosto dos alimentos. Na ver-dade, os sabores são detectados sem nenhum problema, mas a sensação de gosto é afetada. Isso acontece porque metade do sabor é dependente do cheiro, já que, ao expirar, as moléculas odoríferas presentes no alimento são transportadas pelo fluxo de ar até a câmara olfativa, onde o cérebro reúne as informações do olfato com as das papilas gustativas, resultando no paladar (Oliveira, 1988).

Outro fenômeno que possibilita a detecção do cheiro das substâncias pelo olfato é chamado de transporte de massa, ou seja, as moléculas têm que percorrer um caminho até chegar ao nosso nariz. Esse fenômeno físico é chamado de difusão e acontece quando há diferença de concentração de certa substância em um meio.

Para que moléculas presentes na superfície de uma substância se desprendam e alcancem o nosso nariz, é ne-cessário que a substância em questão apresente volatilidade, uma propriedade que está diretamente ligada às interações moleculares das substâncias, pois é dessas interações que depende a possibilidade da passagem do estado sólido ou líquido para o gasoso, possibilitando seu transporte pelo ar até nossos receptores olfativos.

Para sentir o cheiro de um perfume, as moléculas pre-cisam se desprender do líquido (mudando de estado físico: de líquido para gasoso). O importante é que o líquido não entrou em ebulição para que a mudança de estado ocorresse. Esse fenômeno se deve principalmente à diferença de concentração que existe no frasco de perfume em relação ao meio.

Em seguida, as moléculas, ao serem transportadas, atra-vés do ambiente em que se encontram, alcançam o nariz. Tais moléculas precisam apresentar certas propriedades (solubili-dade em água, pressão de vapor considerável, lipofilicidade, entre outras) a fim de serem percebidas sensorialmente e, solubilizando-se no muco nasal, entrar em contato com o quimiorreceptor específico (Nishida, 2007).

Por último, os quimiorreceptores olfativos se comunicam com o cérebro, onde o odor é interpretado e transformado em uma percepção. Segundo Retondo (2010), existem cerca de 50 milhões de quimiorreceptores no eptélio olfativo, que estão sempre sendo repostos.

Para enxergar o mundo colorido, necessitamos de luz, que incide sobre as superfícies dos objetos, promovendo fenômenos físicos, como absorção e reflexão da luz, e tam-bém fenômenos químicos, como as excitações eletrônicas, nas quais os elétrons, ao serem excitados em um nível maior

de energia, absorvem algumas faixas de frequência da radiação luminosa incidente que é depois refletida na forma de cor.

A energia luminosa atinge o nosso sistema ocular promovendo uma série de reações mecânicas nas estruturas que constituem o olho. Segundo Myers (2012), cada estrutura tem uma função específica. Entre elas, podemos citar: a córnea protege o olho e curva a luz; a pupila e a íris são responsáveis pelo controle da

entrada de luz e regula sua intensidade; o cristalino ajusta o foco; e por último, a retina se responsabiliza pelas reações químicas por meio da atuação de células especializadas chamadas de cones e bastonetes.

Segundo Solomons (2012), são nos cones e nos bastone-tes que se processa a principal reação química que gera sinais que o cérebro posteriormente interpretará como fenômenos visuais. A reação fotoquímica que ocorre é chamada de in-terconversão de isômeros cis-trans, ou seja, a molécula de cis-retinal se converte em seu isômero trans-retinal. É por meio dessa reação que o sinal é enviado ao cérebro.

A melanina é uma proteína de fundamental importância na proteção da nossa pele. Ela é capaz de absorver todos os comprimentos de onda na faixa do visível e também na região do ultravioleta. Ela também está presente no olho. Na retina, ela atua absorvendo os comprimentos de onda que os receptores não absorveram, não permitindo, dessa forma, uma visão difusa. Isso explica o fato de pessoas albinas não enxergarem direito (Retondo, 2010). Os sentidos se com-pletam a fim de melhor percebermos o ambiente à nossa volta e, para isso, eles contam com uma infinita variedade de substâncias químicas que, sem elas, não seria possível sentir a indescritível variedade de sensações e sentimentos que todos os seres vivos possuem.

Metodologia

O tema química das sensações é muito vasto e, devido a esse fato, não foi possível uma abordagem completa de todos os cinco sentidos. Então, optou-se desenvolver três deles: a visão, o olfato e o paladar. Essa escolha não ocorreu aleatoriamente, pois o conteúdo científico que explica os

Para enxergar o mundo colorido, necessitamos de luz, que incide sobre

as superfícies dos objetos, promovendo fenômenos físicos, como absorção e reflexão da luz, e também fenômenos

químicos, como as excitações eletrônicas, nas quais os elétrons, ao serem excitados em um nível maior de energia, absorvem algumas faixas de frequência da radiação luminosa incidente que é depois refletida

na forma de cor.

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sentidos é mais significativo nos sentidos da visão, do olfato e do paladar e, ainda, esses dois últimos serem chamados de sentidos químicos devido à sua explicação ser puramente química.

Na Tabela 1, encontra-se a descrição do conteúdo de química e sua distribuição por sentido. Ela expressa um resumo selecionado do conteúdo científico que pode ser explorado com os alunos do ensino médio. O conteúdo de química que explica esses sentidos não se restringe apenas ao que está descrito na tabela abaixo, pois a outra parte do conteúdo só é vista no ensino superior, sendo, portanto, inapropriado abordá-lo.

A experiência aqui relatada foi aplicada a um grupo de 30 alunos do ensino médio da Escola Estadual de Ensino Médio e Fundamental General Eudoro Corrêa (Fortaleza - Ceará).

A realização do trabalho ocorreu com a apresentação de seminário com os seguintes temas: a química da visão, a química do paladar e a química do olfato. A apresentação foi feita em PowerPoint com o uso de um aparelho multimídia. Os temas foram trabalhados de forma a facilitar a com-preensão dos conceitos químicos por meio de ilustrações, exemplos vinculados ao cotidiano e, durante a apresentação, houve debates, questionamentos e situações-problema. Além da execução de dinâmicas que consistiram em experiências envolvendo as percepções e as sensações com o intuito de vincular os fatos ocorridos na vida real com o conteúdo científico, estas foram intercaladas com a apresentação do seminário para que este não se tornasse cansativo. Como instrumento de avaliação desse trabalho, foi utilizado um questionário contendo 12 perguntas que teve por objeti-vo diagnosticar se uma aula dinâmica e contextualizada

favorece ao interesse pela disciplina de química e se facilita a aprendizagem.

O mesmo questionário foi aplicado no início e ao tér-mino do trabalho. Esse procedimento facilitou na análise dos resultados.

Experiência do paladar

Essa experiência teve como objetivo investigar a impor-tância da solubilidade na sensação do sabor e verificar as regiões sensitivas dos sabores doce, azedo, amargo e salgado presentes na língua.

Materiais e procedimentosPara a realização dessa experiência, foram necessários

os seguintes materiais e substâncias (ver Figura 1): sal de cozinha; água mineral; lenço de papel; açúcar; conta gotas; suco de limão; e chá de boldo.

Foram preparadas soluções com o sal de cozinha e com o açúcar. Em seguida, com o uso do conta gotas, pingou-se um pouco da solução de sal na região da língua que sente o sabor salgado, observou-se o resultado. O mesmo procedi-mento foi feito com a solução de açúcar, com o chá de boldo e o suco de limão.

Experiência do olfato

Essa experiência teve como objetivo reconhecer os diversos odores emitidos por produtos manuseados no dia a dia e conhecer algumas das substâncias que provocam esses odores.

Materiais e procedimentosNessa experiência, foi necessário o uso dos seguintes

materiais (ver Figura 2): óleo de citronela; óleo de pinho; óleo de eucalipto; óleo de hortelã; alho; limão; essência de baunilha; e fitas de papel.

Nas fitas de papel, foram aplicados os seguintes produtos

Figura 1: Materiais usados na experiência do paladar.

Tabela 1: Conteúdo inserido no estudo dos sentidos do paladar, do olfato e da visão.

SENTIDOS CONTEÚDO QUÍMICO

PALADAR

- estrutura das moléculas;- geometria molecular;- forças intermoleculares (ligação hidrogênio, forças dipolo-dipolo e Van der Waalls);- funções inorgânicas (ácidos e sais);- eletronegatividade;- solubilidade.

OLFATO

- solubilidade;- volatilidade das substâncias; - difusão;- pressão de vapor;- interações intermoleculares;- concentração;- mudanças de estado físico da matéria.

VISÃO

- ondas eletromagnéticas (espectro eletromag-nético);- comprimento de onda;- cores;- isômeros;- cinética;- reação de isomerização.

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comerciais: óleo de pinho, óleo de hortelã, essência de bau-nilha, óleo de eucalipto, alho e casca de limão macerados. Esses óleos são constituídos por uma complexa mistura de substâncias e apresentam odor característico, permitindo--nos diferenciá-los por meio do olfato. Nos versos das fitas, foram representadas as fórmulas estruturais das substâncias características de cada um dos odores.

As fitas foram enumeradas e entregues aos alunos para descobrirem o odor dos produtos utilizados. Quando o odor era desvendado, era associado à estrutura química represen-tada no verso da fita.

A Tabela 2 apresenta as principais substâncias que cons-tituem os produtos comerciais utilizados e a enumeração utilizada nas fitas de papel.

Experiência da visão

Essa experiência teve como objetivo verificar a relação entre a cor observada (cor complementar) e a cor absorvida pelos objetos quando iluminados pela luz visível do espectro eletromagnético.

Materiais e procedimentosNessa experiência, foi necessário o uso dos seguintes

materiais (ver Figura 3): soluções de corantes usados para

tingir tecidos nas cores laranja, verde, azul e vermelho; frasco transparente; estilete; CD; fita adesiva dupla face; e lanterna.

Na lateral menor da caixa, foram feitos dois cortes para-lelos com a ajuda de um estilete. Fixou-se o CD no interior da caixa com a parte gravável voltada para os cortes.

Inicialmente, para que o aluno pudesse distinguir as cores do espectro eletromagnético que seriam absorvidas pelo corante, incidiu-se e observou-se a luz branca no CD antes da introdução da solução de corante na caixa. Em seguida, colocou-se a citada solução dentro da caixa, entre os cortes e o CD. Acoplou-se a lanterna próxima ao corte inferior, fazendo com que a luz branca incidisse sobre a solução em questão (ver Figura 4). A caixa esteve fechada e o ambiente externo com pouca iluminação (Silva, 2008).

No segundo momento, não mais se observou a cor complementar, já que esta foi absorvida pela solução do corante.

Resultados

Aqui destacamos as questões propostas no questionário de avaliação e que tratam do aprendizado e interesse pela

Figura 2: Materiais usados na experiência do olfato.

Tabela 2: Produtos comerciais e suas principais substâncias.

Enumeração Produtos comerciais Substância

1 Óleo de citronela Alfa-terpinol

2 Óleo de hortelã Carvona

3 Óleo de eucalipto Eucaliptol

4 Óleo de citronela Citronelal

5 Alho Dissulfeto de dialila

6 Limão Limoneno

7 Baunilha Vanilina

8 Óleo de banana Acetato de amila

Figura 4: Luz branca incidindo sobre solução.

Figura 3: Materiais usados na experiência da visão.

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Figura 6: Aprender química seria mais fácil se as aulas fossem voltadas para o meu dia a dia?

Figura 7: Você consegue perceber a química no seu dia a dia?

disciplina de química. Sendo assim, podemos verificar um re-sultado positivo com relação ao grau de interesse pela citada disciplina, já que esse interesse aumentou substancialmente depois da metodologia aplicada (ver Figura 5)

No que diz respeito ao aprendizado, houve um aumento no número de alunos que concordam que o aprendizado da disciplina seria mais efetivo se os conceitos fossem aborda-dos com contextualização (ver Figura 6).

Outra questão que queremos ressaltar diz respeito à percepção pelos alunos de química como parte das nossas vidas. Essa percepção também passou a ser maior depois da metodologia aplicada (ver Figura 7).

Considerações finais

Apesar das propostas pedagógicas sugeridas nos docu-mentos DCNEM, PCNEM, PCN+ e dos projetos educacio-nais que tentam desenvolver uma mudança na metodologia do processo ensino-aprendizagem, ainda se podem perceber as marcas de um ensino que privilegia apenas os aspectos cognitivos e o cumprimento do programa da disciplina e do calendário escolar, relata Lima (2004) em seu texto O saber--fazer do professor. Repassar o conteúdo de química sem a pretensão que esse conhecimento saia do papel nunca vai conseguir atingir o objetivo de se ensinar química.

Perceber a química na vida vai muito além de saber que a água é uma substância formada por um átomo de oxigênio e dois de hidrogênio. É compreender que a química que envolve a molécula de água é fundamental para a existência dos seres vivos. Estudar a água envolve aspectos ambien-tais, sociais, políticos etc., e é um tema rico que pode ser trabalhado com métodos e recursos didáticos apropriados para os alunos, proporcionando um aprendizado para a vida.

A química que estuda os sentidos é, de fato, um tema que promove interesse e motivação na aprendizagem. O conhecimento científico contido nesse tema abrange áreas de ensino que se comunicam no intuito de explicar os processos sensitivos que constituem a visão, o olfato e o paladar. Além dos conhecimentos de química, biologia, física e matemática, que compõe a área Ciências da Natureza, Matemática e suas Tecnologias, tem-se a participação dos conhecimentos de história, geografia e filosofia. Vinculou-se à ação integradora das disciplinas ao método pedagógico da contextualização e interdisciplinaridade, atendendo, dessa forma, as recomen-dações dos PCNEM.

Os resultados baseados nas respostas dos alunos apre-sentados nos questionários e nas reações/comportamentos expressos por eles comprovaram que uma aula em que há uma inter-relação dinâmica entre teoria e prática com uma abordagem interdisciplinar e contextualizada suscita inte-resse e facilita no processo de aprendizagem.

Ficou comprovado que o ensino de química não pode se restringir ao uso de papel e caneta. É necessária uma inter-venção de recursos didáticos que facilitem no processo de aprendizagem, tanto quanto uma conscientização, por parte do docente, em relação aos métodos de ensino. No conjunto universo que representa o ensino de química, não existem apenas três elementos: o aluno, o livro didático e o professor, mas uma infinidade de oportunidades e meios pelos quais o professor pode utilizar para dinamizar, aperfeiçoar e facilitar o processo de ensino-aprendizagem.

Ruth Maria Bonfim Vidal ([email protected]), bacharel em Química Indus-trial e licenciada em Química pela Universidade Federal do Ceará (UFC), mestre em Geociências pela Universidade Federal Fluminense e doutora em Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, é professora adjunta da UFC. Fortaleza, Ceará – BR. Rute Claudino Melo ([email protected]), bacharel em Química Industrial pela UFC, licenciada em Química pela Universidade Estadual do Ceará, é especialista em Ensino em Química pela UFC. Fortaleza, Ceará – BR.

Figura 5: Grau de interesse pela disciplina de química antes e depois da metodologia aplicada.

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Abstract: The Chemical Senses – A Metodology Proposal. The chemical senses of smell, taste and vision, as theme, meets the National Curricular Parameters for the high school (PCNEM) proposals, regarding contextualization and interdisciplinarity, because this issue is part of student’s life. The exploration of the theme is carried out with methods of contextualization and interdisciplinarity through seminars and dynamics, in an attempt to promote an interest in the discipline of chemistry and facilitate the learning process. The work is developed with the participation of thirty high school students from the State School General Eudoro Correa. A questionnaire was used as assessment instrument that was applied before and after the completion of this work in order to improve the evaluation of results. Students showed great acceptance in all aspects evaluated when referring to the type of class taught, resulting in a higher level of interest in the discipline of chemistry.Keywords: Chemistry, Context, Teaching.

IV Seminário Iberoamericano CTSVIII Seminário CTSFORMAÇÃO DE DOCENTES EM EDUCAÇÃO CTS

O IV Seminário Ibero-Americano CTS, VII Seminário CTS, a ser realizado em Bogotá (Colômbia) de 7 a 9 de julho 2014, está organizado com o objetivo de dar continuidade às discussões realizadas a cada dois anos, desde o ano 2000, quando ocorreu o I Seminário Ibérico CTS em Ensino de Ciências em Aveiro (Portugal). Esta oitava versão como Seminário CTS, apresenta um tema fundamental para avan-çar na melhoria da educação em Ciências nos nossos países: a Formação de Professores em Educação CTS, que contemple a formação inicial e continuada, assim como os estudos de pós-graduação e a formação de professores universitários.

A complexidade das atividades de formação e de inves-tigação no campo das relações entre ciência, tecnologia, sociedade, sugerem a necessidade de promover o intercâmbio científico e criar espaços para a socialização das inovações que, no campo da educação em ciências, permita promover a alfabetização científica e tecnológica para a cidadania.

Datas Importantes:Recebimento dos resumos dos trabalhos, simpósios e pôster • 16 de Agosto a 12 de novembro de 2013

Avaliação dos Resumos pelo comitê Científico • 13 de Novembro a 16 de Dezembro de 2013

Comunicação de trabalhos aceito • 18 a 20 de Dezembro de 2013

Recebimento dos trabalhos completos: comunicações, sim-pósios e pôsteres para publicação • Até 03 de Março de 2014

Maiores informaçõeshttp://www.pedagogica.edu.co/proyectos/admin/agendape-dagogica/docs/notas/seminario_iberoamericano_ctsfinal.pdfhttp://www.pedagogica.edu.co/proyectos/formularios/Sem_iberoamericano_cts/