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Encontro da Associao Nacional de Pesquisa e Ps-Graduao em Arquitetura e Urbanismo
Porto Alegre, 25 a 29 de Julho de 2016
A RESTAURAO ARQUITETNICA EM REVISTA: A CONSTITUIO DE UM NOVO CAMPO DE ATUAO NAS
REVISTAS DE ARQUITETURA E URBANISMO BRASILEIROS NA DCADA DE 1960
SESSO TEMTICA: PALAVRAS E IMAGENS IMPRESSAS: AS PUBLICAES PERIDICAS ESPECIALIZADAS E SUA CONTRIBUIO PARA A PESQUISA EM
ARQUITETURA E URBANISMO
Ana Lcia Cervolo UNICEP So Carlos
Dayane Carolina Leite UNICEP So Carlos
A RESTAURAO ARQUITETNICA EM REVISTA:A CONSTITUIO DE UM NOVO CAMPO DE ATUAO NAS
REVISTAS DE ARQUITETURA E URBANISMO BRASILEIROS NA DCADA DE 1960
RESUMO As primeiras experincias no campo da restaurao arquitetnica remontam criao do Servio do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional (SPHAN, hoje IPHAN), em 1937. No entanto, somente na dcada de 1960, identificam-se os primeiros projetos no realizados por arquitetos vinculados ao corpo tcnico do SPHAN; tambm, nesse momento, verifica-se a ao de outras instituies e rgos na preservao do patrimnio cultural brasileiro.
Para a compreenso desse universo, recorreu-se s revistas de arquitetura e urbanismo, que se mostram veculos privilegiados, pois expressam o pensamento de seu tempo. Das principais revistas que circularam no perodo, destaca-se a Revista Arquitetura, produzida pelo Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), nela o tema do patrimnio e sua preservao tratado de maneira sistemtica e regular, e reflete o interesse sobre o tema fora do SPHAN.
Pretende-se, assim, que o artigo colabore com o esforo de reviso historiogrfica no campo da Arquitetura e do Urbanismo. Auxilie tambm na avaliao da participao institucional do IAB e outros rgos, evidenciando a penetrao de teorias de restaurao de abrangncia internacional, como identificar os impactos e eventuais mudanas de posturas nos projetos de restaurao, aps a elaborao da Carta de Veneza, em 1964.
Palavras-chave: Arquitetura e urbanismo no Brasil. Patrimnio Cultural. Revistas de arquitetura e urbanismonacionais.
THE ARCHITECTURAL RESTORATION IN REVIEW: THE CONSTITUTION OF A NEW PRACTICE FIELD IN MAGAZINES OF
ARCHITECTURE AND URBAN PLANNING IN BRAZILIAN DECADE OF 1960 ABSTRACT
The first experiments in the field of architectural restoration date back to the creation of the Historical Heritage Service and National Artistic (SPHAN, today IPHAN) in 1937. However, only in the 1960s, are identified early unrealized projects by architects linked to technical body SPHAN; also at that time, there is the action of other institutions and bodies in the preservation of Brazilian cultural heritage; and, above all, there has been the creation of a new professional field for architects.
For the understanding of this universe, he used the magazines of architecture and urbanism, which show privileged vehicles, they express the thought of his time. Major magazines that circulated in the period, there is the magazine Architecture, produced by the Brazil Institute of Architects (IAB), the theme of heritage and its preservation is handled in a systematic and regular manner, and reflects the interest in the subject out the SPHAN.
It is intended, therefore, that Article collaborate with the effort of historiographical revision in the field of Architecture and Urbanism. Assist in the evaluation of institutional participation of the IAB and other organs, showing not only the performance of SPHAN and a few architects. Finally, it is the work aimed to evaluate the penetration of international scope restoration theories, how to identify the impacts and possible changes in attitudes in restoration projects after the establishment of the Charter of Venice, in 1964.
Keywords: Architecture and urbanism in Brazil. Cultural heritage. Architecture magazines.
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1. A CONSTITUIO DE UMA CULTURA DE INTERVENO E RESTAURAO NO BRASIL: PREMBULO HISTRICO, 1930-60
Para considerar a repercusso e difuso do patrimnio nas revistas especializadas em
arquitetura e urbanismo preciso compreender como os arquitetos brasileiros se
debruaram sobre a preservao de edifcios e conjuntos urbansticos histricos. Mesmo
que no tenhamos teorias escritas, acreditamos que as obras empreendidas explicitam suas
posturas, os critrios de interveno que utilizaram e documentos de referncia.
As primeiras experincias no campo da restaurao arquitetnica remontam criao do
SPHAN, em 1937. No entanto, somente na dcada de 1960, identificam-se os primeiros
projetos no realizados por arquitetos vinculados ao corpo tcnico do SPHAN; tambm,
nesse momento, verifica-se a ao de outras instituies e rgos na preservao do
patrimnio cultural brasileiro; e, sobretudo, constata-se a constituio de um novo campo de
atuao profissional para os arquitetos.
No SPHAN, a viso sobre o passado, a histria brasileira e o nosso patrimnio define os
eixos prioritrios do trabalho do rgo, em sua fase inicial, no intuito de defender e preservar
o patrimnio cultural do pas, identificar uma cultura nacional articulada histria e arte
no apenas reproduo de modelos importados, mas gerando conhecimentos e formas de
difuso desse patrimnio.
Alm do tempo e do espao, o antigo SPHAN se pautava por concepes especficas
sobre a histria, a memria e a identidade nacionais. Bens materiais e imateriais
deixados por outras geraes eram testemunhos da civilizao brasileira, que se
nutria, assim, de uma tradio prpria e singular. (VELOSO, 1996, In Revista PHAN,
1996, p. 159)
O tema das intervenes e restauraes , certamente, um desafio para os arquitetos do
patrimnio. Nesse aspecto, Lcio Costa, um dos membros da primeira gerao do SPHAN,
ter uma participao decisiva na definio das metodologias e critrios de interveno
utilizados pelo rgo.
O primeiro desafio de Lcio Costa como arquiteto no campo da interveno se d ainda em
1937, uma visita rea das Misses Jesuticas, no Rio Grande do Sul. O relatrio de
Costa (1937, In: PESSA, 2005, p. 22) extenso e detalhado. Especifica os vestgios
encontrados em cada um dos antigos povos e indica as medidas necessrias para a
conservao das runas de So Miguel e a preservao dos fragmentos das outras misses,
que segundo ele, encontram-se no mais completo abandono.
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Indica a necessidade de escavaes em S. Joo, S. Miguel, S. Loureno e S. Nicolau;
limpeza de todo o terreno ocupado pelas Misses em S. Miguel; levantamento da
implantao de S. Miguel; consolidao das runas de S. Miguel; construo do museu e da
casa do zelador, em S. Miguel; e remoo para S. Miguel do material encontrado nos outros
povos. (COSTA, op. cit., 2005, p. 37)
Lcio Costa (2005, op. cit., p. 38-9) orienta ainda as obras que devem ser feitas para
estabilizao e conservao das runas de So Miguel, conforme aponta Altamiro Cardoso,
demonstrando conhecer as recomendaes internacionais presentes na Carta de Atenas do
Restauro (1931, item VI - Tcnica da conservao), que orienta:
Quando se trata de runas, uma conservao escrupulosa se impe, com a
recolocao em seus lugares dos elementos originais encontrados (anastilose), cada
vez que o caso o permita; os materiais novos necessrios a esse trabalho devero ser
sempre reconhecveis. Quando for impossvel a conservao de runas descobertas
durante uma escavao, aconselhvel sepult-las de novo depois de haver sido feito
um estudo minucioso.
Costa prope duas solues, que partem do princpio de reutilizao de material do prprio
local, e da reconstituio das dimenses originais da praa. Embora o arquiteto esteja
preocupado com a questo formal, seu problema principal garantir que as novas
construes denunciem seu tempo, mas no destoem do conjunto. Assim, devem ser
contemporneas mas harmonizadas1 ao conjunto.
Figura 1: Na imagem da esquerda, vemos o Conjunto das Misses de So Miguel, RS. Na parte superior (1), situa-se a igreja de So Miguel e as runas do assentamento jesutico. Abaixo (2), o Museu das Misses e a casa 1 Palavra utilizada por Costa em diversos pareceres, que sugere seu conhecimento e interpretao da Carta de Atenas do Restauro, 1931, que orienta respeitar o carcter e a fisionomia das cidades na construo de edifcios, (...) sobretudo na vizinhana de monumentos antigos, cuja proximidade deve ser objeto de cuidados especiais (1931, item III a vaorizao dos monumentos). E recomenda tambm o uso de materiais e tcnicas de construo modernas para a consolidao de edificaes, que devem ser dissimulados, (...), a fim de no alterar o aspecto e o carter do edifcio a ser restaurado (1931, item IV - Os materiais do restauro).
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do caseiro, projetado por Lcio Costa (1937-40). direita, em primeiro plano o Museu e, ao fundo, as runas da Igreja de So Miguel. Fotos de Ricardo Rocha. Fonte: IPHAN/RS
No entanto, a primeira grande polmica sobre as intervenes em stios histricos envolve a
construo do Grande Hotel de Ouro Preto2, em 1940, envolvendo o projeto de Carlos Leo
e Oscar Niemeyer, onde as duas cartas de Atenas, a do Restauro (1931) e a do CIAM
(1933), so aplicadas e discutidas no interior do SPHAN.
Figura 2: Grande Hotel de Ouro Preto. Da esquerda para a direta, projeto de Carlos Leo, Oscar Niemeyer e Oscar Niemeyer com as alteraes propostas por Lcio Costa, 1938-9. Fonte: Cavalcanti, 2000.
Lcio Costa indica explicitamente sua dupla filiao, primeiro, de arquiteto vinculado ao
CIAM e responsvel pela organizao do grupo do Rio e, segundo, de funcionrio do