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1 A REVOLUÇÃO DE 1930, OS TRABALHADORES BRASILEIROS E SEUS GANHOS MATERIAIS SILVA, Michelle Oliveira 1 Universidade Salgado de Oliveira Resumo: A Revolução de 1930 trouxe mudanças na relação trabalhador e trabalho, uma vez que no período anterior esse trabalhador não tinha direitos e não podia construir uma identidade positiva do trabalho. Os anos subsequentes confirmaram essas mudanças, levando a uma valorização do trabalhador brasileiro a partir da legislação trabalhista de, 1943, com a CLT Consolidação das Leis do Trabalho. O objetivo deste artigo é discutir os ganhos materiais desse trabalhador e a construção da sua relação com o governo getulista, de 1930 a 1945. Palavras-chave: A revolução de 1930. Trabalhador Brasileiro. CLT. Getúlio Vargas. 1. INTRODUÇÃO: Os anos de 1930-1945, na história do Brasil, são chamados de a Era Vargas, momento histórico em que Getúlio Vargas chegou ao poder e permaneceu na presidência da República. Este período é dividido entre: Governo Provisório (1930-1934), Governo Constitucional (1934-1937) e o Estado Novo (1937-1945). Para entendermos a relação construída entre o governo getulista e o trabalhador brasileiro, precisamos inicialmente buscar compreender a identidade do trabalhador na Primeira República, ou seja, quem era esse trabalhador e como ele era visto dentro da sociedade. Para Michelle Macedo 2 , os trabalhadores lutavam pela construção de uma identidade positiva do trabalho, uma vez que no mesmo período restringiam-se os direitos civis às elites. E esse trabalhador buscava ter direito à cidadania. Uma vez que embora algumas leis do trabalho 1 Graduada em História, pela Universidade Castelo Branco, sob orientação do Profº Dr. Almir Marques Junior, Pós-graduada em História e Cultura do Brasil, pela Estácio de Sá e Mestranda em História no Programa de Pós- Graduação em História (PPHG), pela Universidade Salgado de Oliveira, sob orientação da Profª Dr. Marly Vianna. Lattes:https://wwws.cnpq.br/cvlattesweb/PKG_MENU.menu?f_cod=0E5F82CCF372F11BFAA9A8216F58857 3 2 MACEDO, Michelle. O movimento queremista e a democratização de 1945. FAPERJ. 7Letras, 2013, p.60.

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1

A REVOLUÇÃO DE 1930, OS TRABALHADORES BRASILEIROS E

SEUS GANHOS MATERIAIS

SILVA, Michelle Oliveira1

Universidade Salgado de Oliveira

Resumo: A Revolução de 1930 trouxe mudanças na relação trabalhador e trabalho, uma vez que no

período anterior esse trabalhador não tinha direitos e não podia construir uma identidade positiva do

trabalho. Os anos subsequentes confirmaram essas mudanças, levando a uma valorização do trabalhador brasileiro a partir da legislação trabalhista de, 1943, com a CLT – Consolidação das Leis do Trabalho.

O objetivo deste artigo é discutir os ganhos materiais desse trabalhador e a construção da sua relação

com o governo getulista, de 1930 a 1945.

Palavras-chave: A revolução de 1930. Trabalhador Brasileiro. CLT. Getúlio Vargas.

1. INTRODUÇÃO:

Os anos de 1930-1945, na história do Brasil, são chamados de a “Era Vargas”,

momento histórico em que Getúlio Vargas chegou ao poder e permaneceu na presidência da

República. Este período é dividido entre: Governo Provisório (1930-1934), Governo

Constitucional (1934-1937) e o Estado Novo (1937-1945).

Para entendermos a relação construída entre o governo getulista e o trabalhador

brasileiro, precisamos inicialmente buscar compreender a identidade do trabalhador na Primeira

República, ou seja, quem era esse trabalhador e como ele era visto dentro da sociedade. Para

Michelle Macedo2, os trabalhadores lutavam pela construção de uma identidade positiva do

trabalho, uma vez que no mesmo período restringiam-se os direitos civis às elites. E esse

trabalhador buscava ter direito à cidadania. Uma vez que embora algumas leis do trabalho

1 Graduada em História, pela Universidade Castelo Branco, sob orientação do Profº Dr. Almir Marques Junior,

Pós-graduada em História e Cultura do Brasil, pela Estácio de Sá e Mestranda em História no Programa de Pós-

Graduação em História (PPHG), pela Universidade Salgado de Oliveira, sob orientação da Profª Dr. Marly Vianna.

Lattes:https://wwws.cnpq.br/cvlattesweb/PKG_MENU.menu?f_cod=0E5F82CCF372F11BFAA9A8216F58857

3 2 MACEDO, Michelle. O movimento queremista e a democratização de 1945. FAPERJ. 7Letras, 2013, p.60.

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fossem votadas, como a lei de férias de 1925, na prática elas não eram levadas a sério pelos

industriais.

O trabalhador brasileiro só buscava ter seus direitos civis e políticos garantidos, como

lutava por melhores condições de trabalho. Essas mudanças passaram a ocorrer a partir de

novembro de 1930, por meio da revolução iniciada em outubro. Neste momento Getúlio Vargas

assumiu o Governo Provisório e foram estabelecidas leis de proteção ao trabalhador3. A partir

de então observamos uma relação entre o trabalhador brasileiro e o governo getulista sendo

construída. E são justamente essa relação e os ganhos materiais para o trabalhador, obtidos por

meio dela, que quero destacar numa análise que compreenderá os anos de 1930 a 1945, sendo

esta última data o fim do período do Estado Novo.

2. O GOVERNO PROVISÓRIO E O GOVERNO CONSTITUCIONAL – PRIMEIRAS

MEDIDAS:

A Revolução de 1930, foi um marco histórico na vida política brasileira, uma vez que

pôs fim a Primeira República. A Primeira República foi conturbada, marcada por crises

econômicas e financeiras, estado de sítio, de revoltas da Armada, que ocorreram duas vezes

nesse período, assim como a Revolução Federalista (Revolta da Degola)4.

Ou seja, este foi um período de agitação e descontentamento da população em virtude

da instabilidade política – crises econômicas e financeiras, do estado de sítio e das revoltas.

Somado a esses fatores, entre 1889 – 1930, temos um período chamado de República

Oligárquica, que correspondeu a fase em que o país passou a ser governado por SP e MG,

ficando conhecida como - política do café com leite5.

3 PANDOLFI, Dulce. “Os anos 30: as incertezas do regime”. DELGADO, Lucília; FERREIRA, Jorge (Org). O

Brasil Republicano (Volume 2). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p.2. 4 A Revolta da Degola foi utilizada pelos republicanos e pelos federalistas, durante a Revolução Federalista. Foi

marcada pela extrema violência aplicada por ambos os lados, com saldo estimado de 10 mil mortos. A prática da

degola dos prisioneiros não foi rara nos dois lados que estavam na disputa. 5 Na verdade era café – café, pois tanto SP quanto MG produziam café.

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O período da Primeira República, que ficou conhecido por República Oligárquica

(1894-1930), trouxe o controle do poder para os estados: SP e MG, representados

respectivamente pelos partidos: Partido Republicano Paulista – PRP e Partido Republicano

Mineiro – PRM. Foi elaborada uma forma de controle que visava a manutenção e perpetuação

de ambos no poder, forma que ficou conhecida como: “voto de cabresto”, sistema que envolvia

troca de favores6, entre o coronel – chefe local e o candidato apoiado por ele. Este coronel tinha

a função de pressionar os eleitores da região, para que votassem no seu candidato.

Desta forma o voto de cabresto, assim como os movimentos sociais dos operários, suas

lutas e os movimentos sociais urbanos ( e aqui mencionamos: a Revolta da Vacina, a Revolta

da Chibata, os movimentos sociais rurais: (Canudos, a Guerra do Contestado, o Cangaço e o

Padre Cícero); somadas às transformações ocorridas na década de 1920, ( ressaltamos a Semana

de Arte Moderna); caracterizam um momento histórico conturbado, repleto de agitações e

tensões políticas, com o número de desempregados crescente e a miséria, sendo então neste

cenário que a Primeira República tem o seu fim e a Revolução de 1930 ocorre.

Nos anos finais da República “Velha”, notamos a aparição de dois partidos: o Partido

Democrático – 1926 (SP), e o Partido Libertador – 1928 (RS). Júlio Prestes foi lançado como

candidato por Washington Luís e Getúlio Vargas pela Aliança Liberal. Em 1930, foi realizada

a eleição em que Júlio Prestes ganhou, mas, não assumiu em virtude do golpe de estado; exilou-

se junto com Washington Luís e Getúlio Vargas assumiu o poder instaurando o Governo

Provisório.

Sobre a Revolução de 1930, afirma Michelle Macedo7 que foi a partir dela, que foi

construído um Estado efetivamente regulador das relações entre capital e trabalho, uma vez

que, leis sociais não foram só aprovadas como também foram garantidas pela Justiça do

Trabalho, demandas essas que já estavam em pauta de reivindicação por parte dos trabalhadores

antes de 1930. Ao assumir o poder, Vargas tomou medidas que já anunciavam uma nova

maneira de encarar o desenvolvimento do país dentro da ordem, responsabilizando-se pela

6 LEAL, Victor. Coronelismo, Enxada e Voto. Companhia das Letras, 2012. 7 MACEDO, Michelle. O movimento queremista e a democratização de 1945. FAPERJ. 7Letras, 2013, p.60-61.

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formulação de novas leis referentes ao mundo do trabalho e pela fiscalização da observância

das que já existiam8.

Foram promovidas mudanças na relação trabalhador e trabalho, sendo criados o

Ministério do Trabalho Indústria e Comércio, chamado Ministério da Revolução e o Ministério

da Educação e Saúde Pública. Entre 1931-1934, foram promulgados decretos e leis de proteção

ao trabalhador9, que foram formalizadas e reafirmadas a partir da Constituição de 1934, em que

estavam inseridas as conquistas já obtidas no Código Eleitoral de 1932, (que incluía o voto

secreto, voto feminino justiça eleitoral e representação classista), e somados a estes foi

incorporado, o ensino primário gratuito, a justiça do trabalho, a instituição da previdência

social, o salário mínimo, a jornada de trabalho de 8 horas diárias, as férias anuais remuneradas,

a proibição de trabalho de menores de 14 anos, entre outras medidas.

Diante disso percebemos uma valorização da noção de trabalho e, por conseguinte

desse trabalhador, que antes não tinha acesso a esses direitos e muito menos a garantia do seu

cumprimento. Entretanto, não podemos negar que, embora o governo provisório tenha sido

marcado por diversas agitações, como destaca José Murilo de Carvalho10, a ocorrência de cerca

de 50 movimentos militares; incluindo revoltas, protestos, conspirações e turbulências, e as

eleições foram realizadas em 1934, para a Assembleia Nacional Constituinte. Houve conflitos

no Pará, Maranhão, Rio Grande do Norte, Santa Catarina e Rio de Janeiro11. Apesar deste ser

um momento turbulento, ainda assim não podemos negar que houve uma notória aproximação

entre o trabalhador brasileiro e o governo nesta fase.

O governo Constitucional não foi diferente, também foi marcado pelo caráter

efervescente e tumultuado, quando integralistas e aliancistas, com ideologias diferentes,

dividiram as opiniões da população. Os integralistas faziam parte de um movimento de extrema

direita, fundado com o nome – Ação Integralista Brasileira (AIB), em 1932, quando o jornalista

8 CAPELATO, Maria. “O Estado Novo: o que trouxe de novo? ”. DELGADO, Lucilia; FERREIRA, Jorge (Org).

O Brasil Republicano (Volume 2). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p.115. 9 PANDOLFI, Dulce. “Os anos 30: as incertezas do regime”. DELGADO, Lucilia; FERREIRA, Jorge (Org). O

Brasil Republicano (Volume 2). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p.2. 10 CARVALHO, José Murilo de. Forças armadas e política. 1930-1945. In: A Revolução de 30. Seminário

Internacional. Brasília, Ed. UnB, 1988, p.113. 11 LEVINE, Robert. O regime de Vargas, 1934-1938: os anos críticos. Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1980, p.

75-88.

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Plínio Salgado lançou o Manifesto de Outubro. A Aliança Nacional Libertadora (ANL),

presidida pelo comandante da Marinha Ercolino Cascardo (Luís Carlos Prestes foi seu

presidente de honra), fundada em 1935, foi criada para fazer oposição aos integralistas. Os

aliancistas defendiam o não pagamento da dívida externa brasileira, a nacionalização das

empresas estrangeiras, a reforma agrária e a ampliação das liberdades políticas.

O governo reprimiu os aliancistas, os quais se articularam e fomentaram o que ficou

conhecido por – Levante Comunista, rapidamente reprimida pelo governo, Getúlio Vargas.

Após esse episódio endureceu ainda mais o regime, afirmando que o perigo comunista rondava

o país. Declarou estado de sítio, e, mais tarde estado de guerra que foi prorrogado até 1937.

Notamos que o início dos anos 1930, trouxe ao trabalhador ganhos materiais claros,

inegáveis e não obtidos antes deste período. A partir de então uma relação começou a ser

construída entre Estado e trabalhador, relação essa que terá o seu ápice com o Estado Novo, em

que foi realizado, segundo a autora Ângela de Castro Gomes o pacto direto com o povo12.

3. ESTADO NOVO E CIDADANIA SOCIAL – OUTRAS MEDIDAS:

Num clima em que havia uma suposta ameaça comunista, o Plano Cohen apareceu nos

jornais em setembro de 1937. No dia 10 de novembro, com a decretação do Estado Novo – que

o plano preparara – o Congresso Nacional foi cercado por tropas da Polícia Militar e de acordo

com Dulce Pandolfi13, o regime mudou. Vargas manteve-se como chefe no Executivo, e foi

colocado em prática segundo Maria Helena Capelato14, o projeto que preconizava o Estado

como agente da política econômica. O Golpe de 1937, iniciou o período conhecido na história

brasileira como – Estado Novo.

O novo regime, período compreendido entre 1937-1945, foi marcado pelo caráter

autoritário e intervencionista do Estado, caracterizado pelas significativas mudanças

12 GOMES, Ângela de Castro. 1988. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Vértice/Iuperj. 13 PANDOLFI, Dulce. “Os anos 30: as incertezas do regime”. DELGADO, Lucília; FERREIRA, Jorge (Org). O

Brasil Republicano (Volume 2). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p.6. 14 CAPELATO, Maria. “O Estado Novo: o que trouxe de novo? ”. DELGADO, Lucília; FERREIRA, Jorge (Org).

O Brasil Republicano (Volume 2). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p.118-119.

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promovidas pelo governo, que ocorreram em vários níveis, sendo eles: a reorganização do

Estado, o reordenamento da economia, o novo direcionamento das esferas pública e privada, a

nova relação do Estado com a sociedade, do poder com a cultura, das classes sociais com o

poder, do líder com as massas15. Nesse contexto, Vargas tinha como meta principal superar

atrasos e transformar o Brasil em um país desenvolvido.

É interessante notar no período estado-novista a Constituição de 1937, redigida por

Francisco Campos, destacava que Vargas seria capaz de conduzir o país de maneira correta e

ordeira. Francisco Campos interpretou o regime instaurado como uma decorrência histórica e

necessária da Revolução de 1930. Segundo ele o Estado Novo suscitara no país uma consciência

nacional, unificando uma nação dividida, colocando um ponto final às lutas econômicas e

impondo silêncio aos partidos empenhados em quebrar a unidade do Estado e, por conseguinte

a unidade do povo16.

Sobre essa consciência nacional, embora as liberdades civis tenham sido suspensas, os

direitos sociais foram mantidos. Fortaleceu-se o caráter nacionalista do Estado, cultuando-se os

símbolos como: bandeiras, hinos, escudos, brasões. De acordo com Maria Helena Capelato17,

após o golpe, apenas a bandeira do Brasil, passou a existir, para demonstrar que o sistema

federativo havia sido derrotado. Realizou-se então no Rio de Janeiro a cerimônia cívica de

queima das bandeiras estaduais para marcar a vitória do poder central sobre os estados.

A construção da consciência nacional era uma das metas do Estado Novo. E essa

proposta aproximou ainda mais os trabalhadores e o Estado, a partir da criação de eventos que

antes não tinham sido vistos ou vividos no seu cotidiano. Acerca desses eventos festivos Ângela

de Castro Gomes18, menciona uma série de comemorações promovidas pelo Estado Novo, que

envolviam a população. Três comemorações faziam parte desse tempo festivo: o aniversário do

15 CAPELATO, Maria. “O Estado Novo: o que trouxe de novo? ”. DELGADO, Lucília; FERREIRA, Jorge (Org).

O Brasil Republicano (Volume 2). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p.113. 16 CAPELATO, Maria. “O Estado Novo: o que trouxe de novo? ”. DELGADO, Lucilia; FERREIRA, Jorge (Org).

O Brasil Republicano (Volume 2). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p.117. 17 CAPELATO, Maria. “O Estado Novo: o que trouxe de novo? ”. DELGADO, Lucilia; FERREIRA, Jorge (Org).

O Brasil Republicano (Volume 2). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2003, p.117-119. 18 GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Vértice/Iuperj, 1988, p.217.

Page 7: A REVOLUÇÃO DE 1930, OS TRABALHADORES BRASILEIROS E …€¦ · Trabalhador Brasileiro. CLT. Getúlio Vargas. 1. INTRODUÇÃO: Os anos de 1930-1945, na história do Brasil, são

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presidente (21 de abril), o Dia do Trabalho (1º de maio) e o aniversário do Estado Novo (10 de

novembro).

Em 1938, aconteceu pela primeira vez na história do Brasil a comemoração do Dia do

Trabalho e também foi comemorado o aniversário do Estado Novo, ocorrendo cerimônias

públicas e inaugurações. Neste momento o vocativo: “Trabalhadores do Brasil!”, levava à ideia

de uma maior proximidade entre o presidente e os trabalhadores. Acrescenta a autora que essas

comemorações estruturaram uma aproximação significativa e personalizada entre a autoridade

e o público trabalhador. Todas essas iniciativas representaram para os trabalhadores brasileiros

ganhos materiais e melhorias, pois aumentavam as possibilidades de emprego, valorizavam o

produto nacional e os aproximava das autoridades, ou seja, do Estado, do governante19.

Ainda nesse período foi criado o – Departamento de Imprensa e Propaganda – DIP

(1939). Em 1943, Vargas era seu personagem central, em festividades, cartazes, fotografias,

artigos, livros, concursos escolares, iniciativas realizadas em louvor do chefe do Estado Novo20.

Os trabalhadores, estavam cada vez mais próximos do seu governante, e, essa proximidade não

se explica apenas pelo fato da propaganda desempenhar importante papel. Sobre essa questão

diz Jorge Ferreira21 que não há propaganda que transforme um personagem em líder político,

em figura legendária, sem realizações que afetem a vida material e simbólica dos homens e

mulheres que o reverenciam. Ou seja, a propaganda política por si só, por mais eficaz e

sofisticada que seja, não sustenta um mito político duradouro, antes é preciso que haja

realizações, materiais e simbólicas, que afetem o cotidiano da sociedade22.

Ainda sobre o Estado Novo, Ângela de Castro Gomes23 incorpora outras medidas

estabelecidas por ele, destacando ganhos materiais obtidos por esse trabalhador como: a Lei

dos Dois Terços, que obrigava as empresas a manterem este percentual de empregados

brasileiros, como também a questão da valorização do trabalho manual. Não obstante aos

ganhos materiais citados acima, agrega-se também a estas conquistas o estabelecimento da

Consolidação das Leis de Trabalho – CLT, de1943, que dentre as garantias apontadas acima

19 GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Vértice/Iuperj, 1988. 20 GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Vértice/Iuperj, 1988, p. 220-223. 21 FERREIRA, Jorge. Trabalhadores do Brasil. O imaginário popular. Rio de Janeiro: FGV, 1997. 22 MACEDO, Michelle. O movimento queremista e a democratização de 1945. FAPERJ. 7Letras, 2013, p.62. 23 GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Vértice/Iuperj, 1988, p.223.

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assegurava também a igualdade salarial de homens e mulheres. Entretanto, greves e qualquer

espécie de reivindicação trabalhista contra o governo vigente foram proibidas.

Para Ângela de Castro Gomes24 o Estado Novo propôs um pacto direto com o povo,

em que Getúlio Vargas concedeu leis ao trabalhador porque considerava o seu dever de assim

o fazer, a fim de manter a harmonia social. Nesse contexto, o trabalhador conquistava a sua

cidadania social (o exercício dos direitos e deveres civis, políticos e sociais estabelecidos na

Constituição do país). Somado a isso observamos que esses trabalhadores, relacionaram a

imagem de Vargas ao trabalho e aos ganhos materiais obtidos, uma vez que o Estado, como

doador de benefícios sociais, comprometia-se a satisfazer as demandas do povo, que, por sua

vez, retribuiria com gratidão e reconhecimento25.

Como um exemplo dessa relação podemos observar, o movimento queremista ou o

“queremos Vargas”, que surgiu em 1945, que defendia continuação do presidente,

independentemente da convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte. Desta forma

observamos que o trabalhador se vinculava aos direitos sociais, à cidadania social, às leis

trabalhistas e no momento em que Vargas foi afastado, esses trabalhadores vão para as ruas se

manifestar a favor dele.

Notamos que o governo getulista correspondeu aos anseios dos trabalhadores e foi

estabelecido um pacto entre o trabalhador e Vargas, uma adesão por parte dos trabalhadores ao

getulismo. Sobre isso, Ângela de Castro Gomes26 diz que houve uma dupla lógica para esta

adesão, que pode ser explicada pelo viés material pois, havia interesses nos benefícios trazidos

pelo direito trabalhista; como também pode ser entendida pela lógica simbólica, uma vez que

muitos trabalhadores se sentiam gratos a Vargas pelas benesses recebidas através da nova

política trabalhista e viam em Vargas uma figura paternal 27.

Em tudo isso observamos que embora o Estado Novo tenha sido autoritário e

intervencionista, e a Constituição “Polaca” seja exemplo desse caráter, ainda assim, foi

estabelecido e construído uma relação enquanto ganhos, no sentido de conquistas, entre o

24 GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Vértice/Iuperj, 1988. 25 MACEDO, Michelle. O movimento queremista e a democratização de 1945. FAPERJ. 7Letras, 2013. 26 GOMES, Ângela de Castro. A invenção do trabalhismo. Rio de Janeiro: Vértice/Iuperj, 1988, p.327. 27 FERREIRA, Jorge. Trabalhadores do Brasil. O imaginário popular. Rio de Janeiro: FGV, 1997.

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governo getulista e os trabalhadores brasileiros, em que percebemos a ascensão e a valorização

desse trabalhador, assim como a construção de uma reciprocidade entre o Estado Nacional

Getulista e o operariado urbano.

O que representava democracia para esse trabalhador brasileiro era ter direitos sociais,

amparo e a garantia do cumprimento daquilo que se encontrava na legislação trabalhista. Nesse

sentido Getúlio Vargas foi a figura definidora no processo de transição para a democracia 28.

CONSIDERAÇÕES FINAIS:

Observamos até aqui a construção da relação entre o governo getulista e o trabalhador

brasileiro, a partir da revolução de 1930. Notamos ainda em seus dois primeiros governos –

provisório e constitucional que ganhos materiais foram concedidos a esse trabalhador.

O governo getulista atendeu às reivindicações dos trabalhadores por melhores

condições de trabalho e pelo cumprimento das leis trabalhistas. E nesse contexto a Constituição

de 1934 pode ser considerada como um divisor de águas no quesito direitos trabalhistas, pois

reafirmou as conquistas já obtidas a partir do código eleitoral de 1932, como também incluiu

outros aspectos que valorizaram ainda mais esse trabalhador.

Trabalhador que, como vimos, obteve ganhos materiais no Estado Novo como os já

mencionados: a Lei dos Dois Terços, a valorização do trabalho manual, a maior aproximação

entre os trabalhadores e as autoridades. E tal proximidade, reitero, não pode ser explicada

isoladamente pelo viés da propaganda. Ao contrário, deve enquadrar-se numa análise que tem

o seu início desde a Revolução de 1930, pois, essa relação foi sendo construída desde o Governo

Provisório tendo o seu ápice durante o período do Estado Novo.

Contudo percebemos a necessidade de compreender os fatos históricos respeitando

seus marcos temporais e não de forma isolada. Só conseguimos entender a relação forjada entre

o governo getulista e o trabalhador brasileiro, se recorrermos aos antecedentes da Revolução de

1930, a revolução que perpassa os governos provisório e constitucional, chegando ao Estado

28 MACEDO, Michelle. O movimento queremista e a democratização de 1945. FAPERJ. 7Letras, 2013, p.27.

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Novo, o queremismo e o posterior retorno de Vargas nas eleições de 1950. Ou seja, só

conseguimos compreender essa relação a partir do momento que nos dispomos a estudar todos

os períodos, suas especificidades e suas continuidades.

Por fim, a partir desta pesquisa compreendemos que os ganhos materiais, fomentaram

a relação governo e trabalhador desde o início em 1930, como também percebemos que ainda

durante o Estado Novo, além da maior aproximação entre governo e povo, houve também

ganhos materiais, nesse sentido, a propaganda política por si só, não explica esse fenômeno. E

o movimento queremista, que sucedeu o Estado Novo, mostra isso.

Termino reiterando a importância de observar e não negar a relevância dos ganhos

materiais conquistados pelo trabalhador brasileiro, os quais, estimularam a construção de uma

relação notável e antes não vista no cenário brasileiro, entre governo e povo, durante a Era

Vargas.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

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