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A tecnologia industrial básica (TIB) como condicionante do desenvolvimento industrial na América Latina Profesor Dr. Afonso Fleury Santiago de Chile, diciembre de 2007

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A tecnologia industrial básica (TIB) como condicionante do desenvolvimento industrial na América Latina Profesor Dr. Afonso Fleury

Santiago de Chile, diciembre de 2007

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Las opiniones expresadas en este documento, que no ha sido sometido a revisión editorial, son de exclusiva responsabilidad del autor y pueden no coincidir con las de la Organización. Este documento fue preparado por Dr. Afonso Fleury en el marco del Programa CEPAL-GTZ Modernización del estado, desarrollo productivo y uso sostenible de los recursos naturales.

Las opiniones expresadas en este documento, que no ha sido sometido a revisión editorial, son de exclusiva responsabilidad de los autores y pueden no coincidir con las de la Organización. La autorización para reproducir total o parcialmente esta obra debe solicitarse al Secretario de la Junta de Publicaciones, Sede de las Naciones Unidas, Nueva York, N. Y. 10017, Estados Unidos. Los Estados miembros y sus instituciones gubernamentales pueden reproducir esta obra sin autorización previa. Sólo se les solicita que mencionen la fuente e informen a las Naciones Unidas de tal reproducción.

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A tecnologia industrial básica (TIB) como condicionante do desenvolvimento industrial na América Latina

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Índice

I. Apresentação .............................................................................5 II. A relevância da TIB para o desenvolvimento industrial .7 III. TIB e políticas públicas ...........................................................9 IV. Uma nova abordagem para a TIB nos países em

desenvolvimento .....................................................................13 V. A estrutura dos sistemas de TIB.........................................15 VI. A substituição das barreiras tarifárias pelas barreiras

técnicas......................................................................................17 VII. A evolução da Ciência da Medição e a criação de

“barreiras científicas” ......................................................19 VIII. Normalização e Avaliação de Conformidade ..................21 IX. As normas técnicas ...............................................................23 X. Os regulamentos técnicos....................................................25 XI. Avaliação de conformidade.................................................27 XII. Normas sociais ou do trabalho ...........................................29

1. Educação e defesa do consumidor........................................30 XIII. Aspectos de TIB e políticas públicas na

América Latina 1. Brasil ....................................................................................31 2. Argentina ..............................................................................32 3. México..................................................................................33

XIV. Instituições de integração de TIB na América Latina...35 XV. Propriedade intelectual..........................................................37 XVI. Comentários finais ................................................................. 39

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Referências ................................................................................................................................... 41 Anexos ................................................................................................................................... 43

Anexo A .................................................................................................................................... 45 Pessoas entrevistadas Outras pessoas entrevistadas

Anexo B .................................................................................................................................... 45 Sites visitados

Índice de cuadros

Cuadro 1 ........................................................................................................................................ 8

Índice de figuras

Figura 1 esquematiza o novo triângulo econômico mundiAl...................................................... 10 Figura 2 ...................................................................................................................................... 14 Figura 3 estrutura dos sistemas de TIB ....................................................................................... 15 Figura 4 Indice de Propriedade Intelectual (SAIE, 2001) ........................................................... 38

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A tecnologia industrial básica (TIB) como condicionante do desenvolvimento industrial na América Latina

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I. Apresentação

O termo Tecnologia Industrial Básica–TIB foi concebido pela extinta Secretaria de Tecnologia Industrial–STI, do antigo Ministério dá Industria e do Comércio–MIC, no final da década de 70, para expressar em um conceito único as funções básicas do SINMETRO–Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, às quais se agregou a Gestão da Qualidade. Os alemães denominaram a TIB de MNPQ–Messen, Normen, Priifen, Qualitat (explicitando o encadeamento das funções relativas a Medidas, Normas, Ensaios e Qualidade). Nos EUA usa-se o termo Infrastructural Technologies.

Ainda no caso brasileiro, mais recentemente passou-se a considerar a Propriedade Industrial e também as Tecnologias de Gestão como componentes da TIB.

Como será explicitado posteriormente, a TIB tem um papel de crescente importância no comércio internacional, com impactos cada vez mais relevantes na diferenciação entre países industrialmente avançados e países retardatários. As barreiras técnicas para a exportação e a crescente capacitação científica que passa a ser exigida de um país para que este possa vir a ser aceito como participante nos processos de formulação das normas técnicas estabelecem um novo sistema de barreiras no comércio internacional, provendo legitimidade a novos jogos de poder que resultam na inclusão ou exclusão de países e regiões.

A problemática da TIB é de particular relevância para os países latino-americanos na medida em que decorre e potencializa o hiato tecnológico (technological gap) que caracteriza as relações com os países mais avançados.

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Neste sentido, são os seguintes os objetivos do estudo ora proposto:

• mapear a evolução e o estado atual da TIB no Brasil e na América Latina

• avaliar os impactos e consequências sobre o desenvolvimento industrial dos países, considerando-se comparativamente à evolução dos países mais avançados

• analisar a aplicação de TIB em termos de políticas públicas e o aperfeiçoamento industrial

• fazer recomendações sobre possíveis estratégias e políticas públicas relacionadas à TIB

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II. A relevância da TIB para o desenvolvimento industrial

Algumas referências podem contribuir para a compreensão da importância da TIB para o desenvolvimento industrial e para o desenvolvimento econômico em geral.

• Paralelamente à queda nas barreiras tarifárias, surgiram nos últimos anos regras cada vez mais rigorosa em relação à qualidade e especificações de produtos, com o objetivo de preservar a saúde, a segurança dos cidadãos e o meio ambiente (Mariante, 2003).

• Os mercados estão cada vez mais exigentes quanto a produtos, exigindo a sua certificação por entidades credenciadas e com base em ensaios realizados por laboratórios credenciados e conduzidos segundo normas (campo voluntário) e regulamentos técnicos (campo compulsório). Sem o mútuo reconhecimento desses sistemas entre os países, o preço de um produto será acrescido do custo de tantas certificações diferentes quanto forem os mercados de destino;1

1 Por exemplo, Watanabe (1993) analisa o significativo impacto em custos quando as empresas japonesas tiveram que se certificar

pelas normas ISO para poder continuar exportando para a Europa. Estes custos adicionais foram impostos pelas regras de comércio e não por necessidades técnicas, já que o chamado Sistema Japonês de Gestão de Produção teria requisitos muito mais severos do que essas normas (Fleury e Fleury, 1995)

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• Além da certificação de produtos e serviços cresce significativamente a exigência da certificação de sistemas (da qualidade, de gestão ambiental, de saúde ocupacional e segurança industrial) como condição para que as empresas exportem para outros mercados;

• O BIPM-Bureau International de Poids et Mesures estima que atividades relacionadas a medições são responsáveis por cerca de 3 a 6% do PIB dos países industrializados;

• Nos EUA, segundo fontes do governo Norte-Americano, as atividades regulatórias em metrologia, com vistas a minimizar erros de medidas na indústria e no comércio impactam diretamente 52,8% do PIB; isto se deve basicamente ao alto valor agregado da pauta americana;

• A disseminação das funções de TIB, incluindo as modernas técnicas de gestão podem contribuir para um crescimento médio da produtividade industrial em cerca de 6% ao ano, ao longo da próxima década, conforme expectativa da CNI (no período de 91-96, esse crescimento foi da ordem de 8% ao ano, segundo dados da mesma fonte).2

Além das normas técnicas, associadas à questão da qualidade de produtos e sistemas, as chamadas normas sociais, que dizem respeito às condições de trabalho, especialmente ao uso de trabalho infantil e de trabalho escravo, e as normas ambientais vem apresentando crescente importância.

O Quadro abaixo, extraído de Nadvi e Wältring (2002:11), apresenta uma tipologia das normas que atualmente influenciam a produção e o comércio, assim como as dimensões que as caracterizam.

Cuadro 1

Finalidade Formas Cobertura Forças motrizes para a difusão internacional

Processo de Certificação Aplicação

Qualidade Meio Ambient Saúde Trabalho Social Ética

Código de Conduta Selo Norma Regula mento

Especifico de empresa Especifico de setor ou indústria Específico de cadeia produtiva Genérico

Negócios Internacionais ONGs Internacionais Sindicatos Internacionais Organizações Internacionais

Primeiro partido (o produtor) Segundo partido (o cliente) Terceiro partido (auditor externo

Legal (compulsório) Requisito de competição de mercados Voluntário

Fonte:

As questões que irão ser tratadas neste texto, devido à escassez de tempo, dizem respeito essencialmente à abordagem tradicional de TIB: metrologia, normalização e qualidade industrial. Alguns comentários sobre Propriedade Industrial e o desenvolvimento e aplicação de normas sociais serão feitos no decorrer do texto.

O trabalho de pesquisa envolveu a análise de literatura (livros, journals, revistas de ampla circulação e mesmo jornais), visitas e entrevistas com pessoas de renomada experiência no campo da Tecnologia Industrial Básica. A relação de visitas e entrevistas se encontra no Anexo A.

2 MCT (2002)

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III. TIB e políticas públicas

Uma revisão da literatura nas áreas de Economia Industrial, Economia da Tecnologia e Gestão de Tecnologia revela uma total desconsideração das questões que dizem respeito à Tecnologia Industrial Básica. Não é de se estranhar, então, que praticamente não existam estudos sobre TIB e Políticas Públicas em geral e no Brasil em particular.

Em nosso entender, o trabalho mais relevante para o entendimento do impacto de Tecnologia Industrial Básica sobre o processo de formulação de políticas públicas em países em desenvolvimento é devido a Messner (2002). Esse autor reporta uma pesquisa que envolveu análise comparativa entre países cujas indústrias estão inseridas em diferentes tipos de cadeias produtivas globais, para avançar na discussão sobre Global Governance versus Local Governance: “The study discusses how local networks that include locational actors who work together to strengthen their region’s competitiveness are influenced in their action capacities by the interaction between local and global governance. ... Its point of departure is the idea that regions are tied into specific global market segments and global governance systems that significantly influence the options of local actors and the demands placed on their efficiency and strategic capabilities” (p.3)

Sintetizando os resultados, Messner (2002) propõe que o entendimento dos espaços de formulação de política local deve partir daquilo que ele denomina como o novo “triângulo econômico internacional”: “ the concept of world economic triangle emerges in the process of interaction between local industrial locations, global value chains, and global networks dedicated to setting standards”.

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Figura 1 ESQUEMATIZA O NOVO TRIÂNGULO ECONÔMICO MUNDIAL.

Fonte:

A proposta desse modelo destaca a ação das grandes empresas multinacionais, sua atuação no comando das grandes cadeias globais de formação de valor (Gereffi, 1994) e influência sobre os mecanismos de formulação de políticas públicas locais. Há um grande destaque para a questão das normas técnicas (de produtos e, especialmente, de sistemas) o que coloca a TIB como um componente chave nos novos sistemas de governança global.

“Local industrial locations are increasingly tied into two dimensions of global governance that are ignored by the established discourses on the world economy. These two global governance structures are instrumental in shaping the development dynamics and scopes of action. First, regions are increasingly integrated in global value chains often marked by networks and other forms of private governance. Second, global technical, social, and ecological standards are becoming increasingly important in world trade” (Messner, 2002, p.5)

Assim, sob o “guarda chuva” das instituições de regulação global, especialmente da OMC, as grandes empresas globais estariam influenciando fortemente instâncias de definição de políticas para normas e padrões, de alcance global como a ISO-International Standards Organisation, ou de caráter setorial, como a ITU-International Telecommunications Union. Com isso estariam criando formas legítimas, indiscutíveis, de governance sobre as redes globais de formação de valor e influenciando os processos de formulação de políticas públicas a nível regional e local.

Os objetivos das empresas globais para exercer essa atuação seriam, entre outros:

• impor uma determinada escolha tecnológica como padrão global, estabelecendo condições de acesso aos mercados em geral (por exemplo, a atual disputa entre os sistemas CDMA-Qualcomm-EUA versus GSM europeu para estabelecer o padrão global em Telecomunicações);

• Os atores globais intervém “in situ”

•Proliferação de normas especial- mente em indústrias intensivas

Sistemas locais de formulação de políticas

• Normas globais

podem reduzir o custoEmpresas

líderes

Redes globais para a definição de políticas normas e padrões

• Normas sociais para

facilitar a cooperação local

• Influenciar o acesso aos mercados

• Limitar o avanço local

• Criar entre a governance

da cadeia e os espaçosde ação local

• Normas globais como “pedágio” para acesso as cadeias

em trabalho e em recursos

Arquitetura Comercial e Financeira (WTO e IMF)

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• criar um espaço reservado para as suas “core competences”, protegendo-as de possíveis avanços locais em suas operações internacionais pelo estabelecimento de pedágios, ou seja, o estabelecimento de padrões de qualidade para serem atendidos pelos fornecedores; (como coloca Christensen (1998), em casos como esses o overshooting não é funcional)

• criar normas ambientais e sociais que favoreçam a sua integração nos espaços locais.

Em nosso estudo, partimos desse modelo, procurando enriquecê-lo e ampliá-lo. O trabalho de pesquisa que realizamos possibilitou incorporar novas dimensões. Permitiu entender os papéis que jogam os governos tanto dos países desenvolvidos quanto dos países em desenvolvimento. Viabilizou, também, a consideração de outras dimensões de TIB: a metrologia, a avaliação de conformidade e a propriedade intelectual.

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IV. Uma nova abordagem para a TIB nos países em desenvolvimento

Na realidade, a questão da TIB é extraordinariamente ampla, sendo difícil traçar suas fronteiras. Se quiséssemos estabelecer uma analogia, a gênese da TIB estaria na própria Ciência Básica, na criação de conhecimentos que sustentam o avanço tecnológico. Assim, a TIB guarda uma profunda relação com as Políticas de Ciência e Tecnologia, com as Políticas de Educação de um país, e pode vir a se manifestar em Política de Comércio Exterior, que é o que se verifica nos dias de hoje.

Na literatura específica de TIB encontramos autores que tem um enfoque essencialmente técnico-operacional no qual a TIB é vista como “a cozinha da produção”: trata-se dos pesos e medidas que tem que ser utilizados para a consecução do produto conforme. Num outro extremo, trata-se de reconhecer que o que está em jogo é algo muito maior, mais complexo, a saber o uso objetivado do conhecimento científico e tecnológico para ganhar vantagens competitivas nas diferentes arenas na qual se jogam os jogos de poder, desde o militar até a própria cozinha propriamente dita.

Figura 2, abaixo, apresenta a nossa perspectiva, um quadro dos fatores que influenciam a TIB e seu papel na nova economia globalizada. De certa maneira, o quadro contém, mas expande a proposta de Messner, antes apresentada.

Em relação ao modelo de Messner, o nosso entendimento é o de que existe sim um sistema de governance das atividades do comércio mundial que é exercido pelas grandes empresas globais a partir da criação de requisitos técnicos baseados em normas com validade global. Mas isso é apenas parte do quadro.

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Figura 2

Fonte:

A forma como os governos dos países desenvolvidos atuam no sentido de estabelecer as Políticas de Comércio Exterior também é um fator que requer uma análise mais detalhada. Mas, antes, é importante apresentarmos uma visão geral do funcionamento da TIB.

Países Países em Desenvolvimento AvaçCiência Avanços

Tecnologia

Políticas e Estratégicas Nacionais

Grandes Empresas

TN

Política Industrial e de

Comércio Exterior

Barreiras Científicas

Barreiras Técnicas

CapacitaçãoCientífica

Capacitação MetrologiaCientífica

PolíticaIndustriale de ComercioExterior

Sistema Nacional de TIB

Governo

Alerta CapacitaçãoTecnológica Empresarial

Capacitaçãopara Normas

Empresas Nacionais

Propriedade Intelectual Barreiras Setoriais

ou de cadeias

WTO IMF

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V. A estrutura dos sistemas de TIB

A Figura 3 abaixo, esquematiza a estrutura dos sistemas de TIB.

Figura 3

ESTRUTURA DOS SISTEMAS DE TIB

Fonte: Reinaldo Ferraz (MCT)

Como vários outros fenômenos, a incorporação dessas atividades e o seu uso de maneira mais ou menos estratégica pelas empresas e pelo governos ocorreu “de jusante para montante”, ou seja, uma primeira explanação sobre a figura precisa ser feita da direita para a esquerda.

Metrologia

Norma Técnicas

Público (Metrologia

Legal)

Regulamento Técnico

Governo

OMC

Inspeções

Ensaios

Acreditação

Declaração.Proc.

Qualidade

Certificação

TQC

Conformidad

O. C. C

Acreditação

Q

Industrial

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A lógica que orienta esse processo é a seguinte: se o que importa nas transações comerciais é a qualidade de produtos e serviços requerida por mercados educados e exigentes (a letra Q, à direita da Figura) há para isso o aparato de avaliação e certificação da conformidade, com base nos laboratórios de ensaios. Essa estrutura fundamenta-se em normas e regulamentos técnicos que, por sua vez, fundamentam-se na metrologia.

Nos próximos itens veremos esses conceitos em maior detalhe

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VI. A substituição das barreiras tarifárias pelas barreiras técnicas

É consenso geral a idéia que, no comércio internacional, houve a substituição de barreiras tarifárias por barreiras técnicas. O que seriam barreiras técnicas?

A partir das regras estipuladas pela OMC, o INMETRO-Instituto Nacional de Metrologia define barreiras técnicas do seguinte modo: “Barreiras técnicas às exportações são barreiras comerciais derivadas da utilização de normas ou regulamentos técnicos não transparentes ou que não se baseiem em normas internacionalmente aceitas, ou ainda, decorrentes da adoção de procedimentos de avaliação da conformidade não transparentes e/ou demasiadamente dispendiosos, bem como de inspeções excessivamente rigorosas.”

Essa definição transmite uma idéia clara das sutilezas e da complexidade do assunto.

O primeiro acordo internacional sobre barreiras técnicas, o Standards Code, foi assinado, ainda no âmbito do GATT, em 1979. Ao estabelecerem a OMC, os países negociaram um novo acordo sobre barreiras técnicas, o TBT-Agreement on Technical Barriers to Trade. A adesão de um país à OMC torna obrigatória a sua aceitação da TBT.

Como seria de se esperar, as disposições do TBT definem que órgãos governamentais e não governamentais não devem produzir normas e regulamentos técnicos que se configurem em obstáculos para o comércio internacional, o mesmo se aplicando às exigências em termos de testes para avaliação da conformidade.

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Mas as coisas não são tão simples. Rodolfo Long, Presidente do LATU-Uruguai escreve o seguinte: “As barreiras técnicas são um conjunto de disposições de ordem distinta, administrada por diferentes organismos e que abarcam aspectos tão diversos como a qualidade dos produtos, os aspectos sanitários, a saúde, a segurança, as condições do meio ambiente em que são produzidos, as condições de trabalho dos operários que os produzem etc. Para um produtor médio de qualquer país, em especial se o país está em vias de desenvolvimento, essas condições se erguem como uma muralha aparentemente intransponível, como um código de difícil compreensão que parece cumprir uma das Leis de Murphy: ‘se não podes convencer uma pessoa, então trata de confundi –la’. Como se não fora pouco, são barreiras móveis e cambiantes. Não somente mudam valores exigidos, como também os tipos de exigências. Mais ainda, sempre pode aparecer exigências totalmente novas e sem precedentes. ” (Long, 2003, p.393)

Um outro objetivo da TBT seria o da harmonização das normas técnicas, dos regulamentos técnicos e dos procedimentos de avaliação de conformidade entre todos os países membros, através dos Acordos de Reconhecimento Mútuo (MRAs). Estes constituir-se-iam em um dos instrumentos para evitar o estabelecimento de barreiras técnicas. Acordos bilaterais ou multilaterais permitiriam que os resultados da avaliação de conformidade realizada num país fossem aceitos pelos outros países, e com isto os custos e o tempo envolvido em transações comerciais seria reduzido.

É fácil inferir que esse é um processo marcado por inúmeras dificuldades, uma vez que por trás de todo esse esforço trata-se de modificar hábitos e culturas há muito arraigados no comércio e no consumidor.

Voltaremos a tratar das barreiras técnicas no decorrer deste texto.

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VII. A evolução da Ciência da Medição e a criação de “barreiras científicas”

A Metrologia é definida como a Ciência da Medição e tem como foco principal prover confiabilidade, credibilidade, universalidade e qualidade às medidas.

Nos dias atuais, os sistemas de produção não podem operar sem medições sofisticadas e precisas; medições imprecisas levam ao desperdício, altos custos e baixa qualidade. Não há como controlar se não for possível medir.

Assim, “metrology as the science of measurement, is the backbone of technological infrastructure for a nation-wide integrated quality system” (UNIDO, 2001, p.8). Para se ter uma idéia do alcance de decisões tomadas nessas áreas, basta imaginarmos que a exigência de um aumento na exatidão (diminuição do nível de incerteza) das medições por parte de um país comprador (ditadas por razões técnicas ou mesmo políticas) pode alijar um país fornecedor da competição por esse mercado.

A Metrologia tem três vertentes: a Metrologia Científica é o núcleo, alimentando as aplicações no campo industrial e legal. Neste último plano se localizam as questões relativas aos regulamentos técnicos e à fiscalização do cumprimento desses regulamentos, sob a responsabilidade dos governos.

Na área industrial, um primeiro ponto a destacar é o porquê de se correlacionar qualidade com metrologia. Entre as razões para se

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entender a base metrológica da qualidade, a primeira deve-se ao fato de que a medida, sua exatidão, repetitibilidade e rastreabilidade, é uma das formas de percepção do cidadão em relação à qualidade, uma vez que se manifesta na relação comercial cotidiana. Outra, é porque a certificação de Sistemas de Garantia da Qualidade hoje passa a ter forte base metrológica e essa base em diversas grandezas não se refere mais a padrões materializados, mas naqueles resultantes da realização de experimentos fundamentais em Física e Química. Isto porque a evolução da Ciência da Medição levou a uma profunda mudança no funcionamento do sistema metrológico mundial. Atualmente, no sistema primário, não há mais a comparação e a calibração de padrões físicos. O que se compara são os padrões realizados, ou seja, a capacidade de cada país de realizar, em condições de laboratório, o padrão metrológico.

Assim, o acelerado desenvolvimento científico e tecnológico demanda que cada país tenha um Instituto Nacional de Metrologia que “disponha de competências e condições para promover, permanente e intensamente, pesquisa científica e tecnológica de ponta. Essa é condição essencial para manter a instituição na fronteira do conhecimento e para ter credibilidade e respeitabilidade nacional e internacional” (CBM, 2003, p.11)

Apenas para fins de comparação, a declaração do instituto nacional de metrologia da Alemanha é a seguinte: “Somente as atividades de pesquisa fundamental, executadas pelo próprio PTB, usando as tecnologias mais recentes, serão capazes de assegurar, a longo prazo, sua competência metrológica reconhecida a nível internacional” (CBM, 2003, p.12).

Na prática, a função desses institutos pode ser ainda mais complexa. Por exemplo, o NIST–National Institute for Science and Technology, ligado ao Ministério do Comércio dos Estados Unidos, que antes era o National Bureau of Stantards, tem uma relação muito forte com as empresas industriais, promove serviços e transferência de alta tecnologia à indústria, oferece financiamento e subsídios para P&D de tecnologia avançada nas empresas, especialmente as pequenas e médias. Conta com cerca de 850 pesquisadores em seus laboratórios e está relacionado com um ministério forte, o que lhe dá poder de barganha na busca de recursos orçamentários.

Assim, os acordos de reconhecimento mútuo somente serão viáveis se os países em desenvolvimento puderem dispor de capacitação científica e tecnológica similar à dos países desenvolvidos no campo da Metrologia. Os países que não contarem com essa capacitação terão que comprar serviços dos países que a tem.

Mas, no sistema de metrologia, os institutos nacionais de metrologia constituem apenas “a ponta do iceberg”, o nó central de uma rede de laboratórios que devem estar localizados mais próximos da indústria, tanto em termos geográficos quanto em termos organizacionais: os sistemas de metrologia, em praticamente todo o mundo, tem na sua base operacional um conjunto de laboratórios de calibração e de ensaios credenciados pelo organismo de credenciamento nacionalmente reconhecido. No Brasil, existem duas redes formadas por laboratórios credenciados pelo Inmetro: a Rede Brasileira de Calibração e a Rede Brasileira de Laboratórios de Ensaio.

Os referidos laboratórios credenciados estabelecem vínculos com o Sistema Internacional de Unidades através da utilização de padrões de referência metrológica rastreáveis aos padrões nacionais que, por sua vez, são intercomparados aos padrões internacionais.

Atualmente, dois novos campos de atuação estão sendo desbravados para a Metrologia: a Metrologia Química e a Metrologia Biológica.

Assim, a função do sistema de medição de um país em termos de apoio ao comércio internacional passa a depender do reconhecimento internacional da capacitação científica e tecnológica de seu instituto nacional de metrologia. Na prática, coma a capacitação e o ritmo de evolução dos países desenvolvidos em termos de científicos e tecnológicos é significativamente maior, a TIB pode vir a funcionar como um instrumento de pressão unilateral.

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VIII. Normalização e Avaliação de Conformidade

A redução de barreiras tarifárias ao comércio vem se dando de maneira contínua: se tomada a média de aplicação a bens, ela passa de cerca de 40% em 1947, ano da criação do GATT para cerca de 5% ao final da rodada do Uruguai e criação da OMC. A tendência é ela se consolidar próximo a zero para um número expressivo de setores. A tendência protecionista, porém, foi mantida através de medidas não tarifárias, dentre as quais as chamadas barreiras técnicas.

“In the new context of the liberalized world economy, technical barriers to trade (non-tariff barriers) have become one of the biggest impedments for the access to world markets. Technical barriers can be identified in technical standards, technical regulations, quality requirements, as well as conformity assessment. Such barriers are as a rule not identified by the authorities but by the economic market players” (UNIDO, 2001)

A problemática das normas (standards) envolve três dimensões distintas:

• as normas técnicas, cuja aceitação é voluntária, que diz respeito a produtos, processos e sistemas, e que podem ser promulgadas no âmbito público ou privado;

• os regulamentos técnicos, uma norma cuja aceitação é obrigatória, por ser promulgada no âmbito dos governos, e que diz respeito produtos ou sistemas relacionados a questões de saúde, segurança e ambiente;

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• finalmente, os processos e as instituições de avaliação de conformidade, que dizem respeito a como e quem pode atestar a conformidade a uma norma ou regulamento técnico.

No texto que se segue, procuraremos fazer uma certa distinção entre essas três dimensões. Não obstante, é importante deixar registrado que as fronteiras entre normas e regulamentos, e mesmo a distinção entre público e privado, ficam cada vez mais tênues à medida em que o público, o privado e as instituições do terceiro setor passam a atuar em conjunto.

Meissner (2002, p.5) observa que “These standards [global technical, social, and ecological standards] are developed, set, monitored, certified, and sanctioned mainly in and by transnational networks that brings together firms, NGOs, labour unions, and sometimes international organisations as well”.

A colocação abaixo, do Policy Briefing do Institute of Development Studies (18 May 2003) complementa essa observação ao comentar que: “Civil society organisations now work with business and public bodies in formulating private and public-private environmental, labour and social standards. But the agenda remains essentially Northern driven. Recent initiatives emphasise alliances of public and private stakeholders at local and global levels. These highlight Southern concerns and point to the developmental possibilities of global standards”.

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IX. As normas técnicas

As normas técnicas podem dizer respeito a produtos, processos ou sistemas. Aquela que teve maior impacto sobre o comércio internacional foi, sem dúvida, a Norma ISO 9000.

“No ano de criação do GATT era inexpressiva a prática de certificação de produtos, exceto para finalidades militares. A edição das normas ISO 9000 deu-se em 1987 e a ISO 14000 em 1993 [ambas para a certificação de sistemas], havendo hoje, no primeiro caso, cerca de 500.000 certificados emitidos no mundo e cerca de 40.000 para o segundo. Além disso, crescem sobremaneira as certificações de produtos (para se ter uma idéia, nos EUA, Europa e Japão, 100% dos produtos elétricos de baixa tensão são certificados)3” (MCT, 2002)

Além do sensível aumento do número e da importância das normas técnicas, há uma crescente participação do setor privado na elaboração de normas, tanto no âmbito global quanto no âmbito específico dos sistemas de produção. O Presidente do LATU–Laboratório de Tecnologia do Uruguai coloca o seguinte: “Durante muito tempo, estas regulamentações vieram de organismos estatais ou para-estatais de caráter oficial, portanto eram até certo ponto negociáveis entre os distintos países. Desde há uma década, no entanto, registra-se, e com crescimento acelerado, a aparição de normas e disposições que tem sua origem basicamente no plano privado” (Long, 2003, p.391)

3 Por exemplo, na parede do fundo de computadores, printers, etvc. há várias etiquetas relacionads a processos de certificação de

produto e de componentes.

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Uma norma técnica tem diversas facetas, mas a mais importante é que ela significa consolidação de conhecimento e direcionamento de ações. Por exemplo, a Norma ISO 9000 tem sua origem em normas de operação de usinas nucleares que foram adotadas por algumas empresas. Os resultados positivos dessa adoção passaram a se difundir, até se tornarem padrões de uma organização de âmbito global como é a ISO: International Standards Organisation.

Um dos entrevistados comentou que a ISO está em processo de estruturar normas que dizem respeito à indústria do petróleo. A tendência é trabalhar sobre as normas que foram desenvolvidas pelas empresas americanas que são as mais avançadas nesse campo. Aliás, essa é a tendência geral: no desenvolvimento de normas globais parte-se daquelas que são consideradas as mais avançadas. Evidentemente, os países menos desenvolvidos passam a ter que lidar com um gap tecnológico cada vez maior.

Num plano mais micro, observa-se a utilização cada vez mais intensa das normas técnicas como uma ferramenta na organização de redes e cadeias de empresas, especialmente nas chamadas cadeias globais de valor, as chamadas global value chains, como já foi mencionado no início do texto.

O exemplo clássico é o da indústria automobilística. No início da década de 1990 as Big Three (GM, Ford e Chrysler) se uniram para criar normas a serem aplicadas ao processo de fornecimento de partes e componentes. Surgiu assim a QS 9000. Imediatamente os outros grupos de interesse passaram a criar o seu conjunto de normas. Na indústria brasileira houve um tempo no qual os fornecedores tinham que atuar de acordo com a QS 9000, de acordo com as normas Volkswagen e de acordo com as normas da FIAT. Hoje está se observando a tendência de uma consolidação dessas diversas normas para uma única norma global na indústria automobilística.

Mas não só na indústria automobilística mas também em outros setores como telecomunicações, eletroeletrônicos, etc para não falar da indústria alimentícia que tem um conjunto de normas definido a partir de circuitos institucionais específicos e consolidadas no Codex Alimentaris.4

O que é novo, como já mencionamos, é a emergência de normas em indústrias baseadas em como a Biologia e Química.

4 A infraestrutura que as empresas fornecedoras precisaram criar para atender às questões de certificação a partir de diferentes normas

representa custos adicionais. A CVRD mantém um setor com cerca de 120 pessoas apenas para atender às necessidades de certificação e recertificação.

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X. Os regulamentos técnicos

Os governos tem a função de garantir que certos produtos sejam seguros e não causem danos à saúde aos seus usuários e nem danifiquem o meio ambiente.

“Tradicionalmente entende-se por regulamentação a publicação, na Imprensa Oficial, de normas obrigatórias quanto às características técnicas que devem ser cumpridas pelos produtos para que estes possam ser comercializados. A regulamentação deve também definir formas de controle dos produtos para verificar esse cumprimento”. (Macroplan, 1997, p.92)

Em geral, ao promulgar um regulamento técnico, o governo se baseia em normas técnicas em uso. Após a promulgação, qualquer norma técnica tem, necessariamente, que se submeter ao regulamento. Mas isso não quer dizer que não pode haver diferentes normas técnicas que atendem a um mesmo regulamento. O exemplo clássico é o das tomadas elétricas.

Atualmente, duas questões tem prioridade na discussão sobre regulamentos técnicos. O primeiro decorre dos processos de desregulamentação e privatização e da criação das agências reguladoras. O segundo está associado à bio-segurança.

“O conceito de desregulamentação tem sido mal compreendido. Não é apenas uma questão de desburocratização, nem a saída do Estado da economia. Trata-se de modernizar a intervenção necessária do Estado, no que concerne à TIB, para a garantia de condições de segurança, saúde, proteção do meio ambiente e defesa do consumidor e outras questões que caibam, de fato, ao poder público assegurar e zelar pelo seu cumprimento, para o bem e para o interesse da sociedade” (Macroplan, 1997, p.93)

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Temos, assim, uma nova dimensão da problemática da TIB nos dias de hoje. Com a saída do Estado, através de suas empresas estatais, da produção de bens e serviços, acentuou-se a necessidade de regulamentação para a produção privada desses mesmos bens e serviços ditos públicos, através de agências reguladoras. É o caso de Telecomunicações, Energia Elétrica, Abastecimento de Água, Saúde, entre outros.

Em geral, essa mudança não se dá sem conflito na medida em que a regulamentação, que antes era definida em âmbito de Ministérios, passa a ser definida por agências cujas características são essencialmente público-privadas.

No caso da bio-segurança, a ilustração mais recente diz respeito à recente promulgação, nos EUA, da Public Health Security and Bioterrorism Preparedness Act of 2002 (Lei do Bioterrorismo). “Esta lei aumentou dramaticamente o poder normativo da FDA-Food and Drug Administration sobre a importação, distribuição, transporte e manutenção dos registros de alimentos destinados ao consumo nos Estados Unidos, sendo a FDA responsável pela emissão das normas necessárias à implementação da Lei do Bioterrorismo. A FDA emitiu, em janeiro e maio de 2003, quatro normas de grande abrangência, três das quais terão impacto imediato e significativo na forma como as empresas brasileiras [e dos outros países que exportam alimentos para os EUA] que industrializam, processam, armazenam, exportam e transportam alimentos conduzem seus negócios e administram registros e informações.” (B. England, no Jornal Valor, 12/09/03, p. A11).

Recolocando a questão em termos de barreiras técnicas vale destacar que, segundo as regras da OMC pressupõe-se que regulamentos técnicos editados com base em normas técnicas internacionais não constituem barreiras, o que move o foco da estratégia empresarial para a atenção maior à produção de normas técnicas internacionais. A empresa ausente deste processo será levada a ser mera seguidora de padrões tecnológicos ditados pelos atores mais ativos no contexto da normalização internacional que tendem a ser os líderes do esforço de desenvolvimento tecnológico.5

5 É ilustrativo comentar que, nos comitês internacionais de normalização do café a Nestlé e a Sara Lee são participantes de grande

influência.

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XI. Avaliação de conformidade

Mas, o campo de disputa não se restringe à questão da qualidade, quantidade e finalidade das normas e regulamentos. Ele envolve também o campo da acreditação6 ou avaliação de conformidade: quem tem credibilidade para avaliar se o produto ou sistema está conforme as normas?

Como vimos no início, há três formas de certificação de um produto, processo ou sistema: a de primeira parte, onde o próprio produtor se auto-avalia de acordo com alguma norma, a de segundo parte, na qual o cliente avalia o produtor e o terceiro, o mais utilizado, exige uma terceira parte, um auditor, que pode ser privado, que pode ser uma instituição governamental ou uma outra instituição como uma ONG.

As exigências de certificação significaram a criação de uma nova área de negócios, um novo business, com altas cifras envolvidas. Uma estimativa muito preliminar sobre o mercado relacionado à certificação das Normas ISO no Brasil (um por cento do total mundial) chega a oito milhões de dólares/ano.

As primeiras empresas a se expandirem nesse novo mercado foram as antigas empresas de certificação nuclear e naval. Com o processo de globalização a questão passou a ser quem avalia o avaliador ou quem certifica o certificador?

6 A palavra acreditação, tradução literal do termo accreditation, está sendo adotada para o processo de certificação dos certificadores

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A resposta a essa pergunta se encontrava nos Institutos Nacionais de Metrologia. Em primeira instância, são estes os responsáveis por certificar as entidades certificadoras, as chamadas O.C.Cs.– Organismos de Ceritficação Credenciados. Assim, no Brasil, o Inmetro é o O.C.– Organismo Credenciador, no México é o CENAM, e assim por diante. As O.Cs. estão articuladas através do IAF Inc. – International Accreditation Forum.

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XII. Normas sociais ou do trabalho

Inicialmente, cada país adotava normas próprias para regulamentar as relações de trabalho, assim como as condições e a segurança no trabalho. Essas normas podiam se apoiar mais ou menos nas normas internacionais promulgadas pela ILO–International Labour Office.

Com a globalização, as normas da ILO passaram a ter uma outra conotação, sendo em alguns casos utilizadas como fator de negociação, como requisito básico para um país poder manter relações comerciais com outro, que impunha a norma. Na maioria dos casos isso está relacionado à questão do trabalho infantil e do trabalho escravo.

Ao mesmo tempo, começam a atuar ONGs cuja preocupação está essencialmente ligada ao trabalho. Como exemplo, podemos citar a Social Accountability International cujo lema é “setting standards for a just world: SAI works to improve workplaces and combat sweatshops through the expansion and further development of the international workplace standard, SA8000, and the associated SA8000 verification system” (www.sa8000.org)

Essa ONG atua em 36 países, em 32 tipos de indústria. No seu Steering Board encontram-se outras ONGs como o National Child Labor Committee (EUA), a Union Network International, a ABRINQ (Brasil), a CARE International e o International Textile, Garment and Leather Workers Federation (Bélgica), além de empresas como Dole Food Company, Chiquita Brands International, Toys R’Us e Bureau Veritas.

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Criam-se, assim, sistemas paralelos, mas ao mesmo tempo fortes e relevantes, que procuram estabelecer critérios de inclusão e exclusão no comércio internacional, de acordo com distintas visões de mundo, centradas na questão do trabalho.

1. Educação e defesa do consumidor

Um último comentário sobre a questão da Educação e da Defesa do Consumidor. É evidente que a questão de TIB é tão mais importante quanto mais educado for o consumidor e quanto mais eficazes forem os mecanismos de alerta e de defesa.

Desde Ralph Nader nos EUA, na década de 1970, o tema da defesa do consumidor teve uma enorme evolução, passando a envolver um complexo sistema de alertas, desde empresas e mídia que testam e comparam produtos e publicam os resultados até questões de responsabilidade civil que podem envolver complexas tramas jurídicas.

Atualmente, um grande número de instituições para-oficiais e privadas atuam na defesa do consumidor.

No plano da educação, existem iniciativas esparsas, entre as quais se pode mencionar a iniciativa da Rede Globo de incluir em seu programa dominical uma seção dedicada a alertat o consumidor sobre a qualidade de produtos. Uma outra iniciativa é da Fundação Akatu, ligada à Fundação Abrinq, para a educação para o consumo ecologicamente responsável.

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XIII. Aspectos de TIB e políticas públicas na América Latina

1. Brasil

O Brasil foi o primeiro país da América Latina a estabelecer um Sistema Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial.

O órgão máximo do SIMETRO é o CONMETRO–Conselho Nacional de Metrologia, Normalização e Qualidade Industrial, que é presidido pelo Ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Nas entrevistas que realizamos, observamos uma opinião consensual de que esse é um órgão que tem tido pouca força política, servindo muito mais para repassar ao SINMETRO as preocupações advindas de decisões de outras áreas econômicas.

As avaliações sobre o desempenho do SINMETRO tem grande variação, dependendo do avaliador. Assumimos a posição apresentada no Livro Verde da Ciência e Tecnologia (MCT, 2001) que conclui: “Na situação de relativa escassez de recursos, o INMETRO teria que aproveitar ao máximo a capacidade de pesquisa já instalada no País, para coordenar projetos nacionais integrados em metrologia científica. A infra estrutura ora existente é bastante boa no que tange a prédios e instalações, onde já se realizam trabalhos de alto valor científico e tecnológico, mas muito aquém do necessário”

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No que diz respeito às redes de laboratório credenciadas, além da Rede Brasileira de Calibração e da Rede Brasileira de Laboratórios de Ensaio, existem outros laboratórios vinculados a redes e instituições metrológicas que são avaliados por critérios formais, a exemplo da Rede Brasileira de Laboratórios Analíticos em Saúde e algumas redes metrológicas estaduais. Há ainda, laboratórios atuando isoladamente.

“Baseados em dados cadastrais, pode-se estimar que existem no Brasil, atualmente, cerca de 8.000 laboratórios prestando serviços metrológicos em ensaio e calibração. Desses, o número de credenciados pelo Inmetro é de pouco mais de 300 e talvez outros tantos disponham de rastreabilidade e Sistema de Qualidade implementado, em condições de prestar serviços metrológicos qualificados. De qualquer forma, existe a impressão, baseada em amostragem, de que a maior parte desses cerca de 8.000 laboratórios não tenha a mínima condição de atender à demanda, com rastreabilidade ou comparabilidade” (MCT, 2001, p.30)

Quanto à área de normalização, em que pesem os avanços que o País vem experimentando nessa área, ainda é criticamente diminuto o número de produtos sujeitos à certificação compulsória e voluntária no Brasil o que significa uma vulnerabilidade frente aos competidores e aos mercados, tanto no que diz respeito às relações econômicas e de consumo internas, quanto no que se refere à exportação e importação de produtos. Ou seja, as empresas brasileiras dão pouco valor ao uso da TIB como arma competitiva.

Dois exemplos são bastante reveladores. Apesar de ser um grande exportador de carne e um tradicional exportador de café, os Comitês Brasileiros de Normalização relativos a esses dois produtos só vieram a ser instalados em Agosto de 2002 e Julho de 2003, respectivamente. No café, o que havia anteriormente era um Selo de Qualidade estabelecido a partir de um acordo entre grandes empresas produtoras locais. Recentemente uma dessas empresas foi vendida a uma grande multinacional que rejeitou esse Selo de Qualidade, por não estar relacionado às normas internacionais.

Assim, aparentemente, a sensibilidade do empresariado local para os impactos advindos do uso de normas internacionais para a regulação do comércio internacional só mais recentemente tem sido despertada. Um recente estudo elaborado pela FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP, 2002), visando promover o crescimento sustentado da competitividade da indústria lista a Tecnologia TIB, ao lado de quatro outros fatores: Mercado, Capital, Tecnologia da Inovação e Trabalho. O interessante capítulo relativo a TIB exibe uma análise comparativa de difusão de normas (especialmente ISO) e o envolvimento das diferentes indústrias na ABNT–Associação Brasileira de Normas Técnicas. Mas o estudo não dá o destaque que nos parece ser devido a como as normas estão realmente sendo utilizadas como arma competitiva e elaborando uma agenda de temas a serem tratados no plano privado-público que nos pareceu não refletir a urgência que o problema requer.

2. Argentina

A Argentina só mais recentemente passou a buscar uma integração sistêmica entre as instituições que atuam em TIB.

O INTI –Instituto Nacional de Tecnologia Industrial é o similar ao Inmetro no Brasil. Trata-se de uma instituição de natureza pública dedicada à metrologia e à certificação. Sob sua tutela encontra-se a rede laboratorial argentina.

O IRAM –Instituto Argentino de Normalización seria o equivalente à ABNT. Como esta, é uma associação civil sem fins lucrativos. É interessante observar que, para as atividades de certificação, o IRAM é acreditado pelo Inmetro.

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Tanto INTI como IRAM são instituições que tem atividades de certificação. Seguindo uma nova tendência no equacionamento das questões público-privado, a Argentina criou, em 1995, a OAA–Organización Argentina de Acreditación, como uma instituição privada.

3. México

O caso do México é interessante no sentido de exemplificar mudanças recentes.

De acordo com um dos entrevistados, o México, no início da década de 1990 tinha uma estrutura de TIB muito pouco articulada, ficando a cargo de cada um dos diferentes ministérios a atuação sobre áreas específicas.

A partir da entrada do México no NAFTA houve uma completa reestruturação e altos investimentos para dotar a indústria mexicana de recursos para dialogar com seus parceiros.

Isto resultou num sistema moderno e integrado, articulado em torno do CENAM–Centro Nacional de Metrologia.

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XIV. Instituições de integração de TIB na América Latina

Há muito já se abandonou a idéia de unificação dos sistemas, reconhecendo que há diferenças entre os modelos em uso nos diversos países que transcendem a questão puramente técnica. A tônica hoje é a harmonização dos sistemas de metrologia, normalização e avaliação da conformidade, tomando-se em conta as peculiaridades de cada modelo organizacional dessas atividades. Nesse sentido, trabalha-se ativamente no plano internacional no estabelecimento dos Acordos de Reconhecimento Mútuo, os MRA. Por outro lado, há que se considerar também que a norma é uma fotografia da tecnologia estando, portanto, em constante evolução.

Com efeito, os países, os blocos econômicos e suas organizações nacionais, sub-regionais, regionais e internacionais (por exemplo: ABNT –Associação Brasileira de Normas Técnicas; CMN –Comitê MERCOSUL de Normalização; COPANT –Comissão Panamericana de Normas Técnicas; e ISO –Intemational Organization for Standardization, respectivamente) têm se preocupado com temas como o reconhecimento mútuo dos sistemas de normas e avaliação de conformidade, sem o que poderá haver um brutal travamento do fluxo de comércio.

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XV. Propriedade intelectual

Esta dimensão, considerada crítica no novo contexto de Sociedade da Informação e Economia de Conhecimento, será considerada de maneira muito breve.

Num estudo resultante do trabalho patrocinado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (SAIE, 2001), o especialista em propriedade intelectual Robert Sherwood elaborou um índice constituído por oito medidas do ambiente para a propriedade intelectual no país. Os principais pontos deste índice figuram na tabela abaixo. As medidas e os seus respectivos pesos nos índices são dados no topo de cada coluna vertical. A ultima coluna vertical mostra o número total de pontos subtraídos da melhor nota de 100, de tal forma que o país com o menor número de pontos subtraídos é considerado como o que oferece o melhor ambiente para a propriedade intelectual. O Brasil, com 52 pontos subtraídos cai dessa forma na classificação média dos países incluídos na comparação, e.g. melhor do que a Argentina (61 pontos subtraídos), mas pior do que o Chile (39 pontos subtraídos).

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Figura 4 INDICE DE PROPRIEDADE INTELECTUAL (SAIE, 2001)

100 = Fiscali zação (25)

Adminis tração (10)

Copy right (12)

Patentes (17)

Marcas (9)

Setores Industriais

(15)

Biotec Nologia

(6)

Tratados (6)

Pontos Subtraíd

os

Argentina 21 3 4 13 0 13 4 3 -61 Brasil 13 8 4 10 1 11 5 0 -52 Chile 9 5 2 5 1 10 5 2 -39 Costa Rica 9 0 0 16 3 12 4 2 -46 Equador 20 7 5 9 3 7 3 4 -58 El Salvador

21 8 5 1 7 10 3 2 -57

Guatemala 25 8 10 14 7 12 6 5 -87 Índia 12 3 5 11 4 8 6 5 -54 México 19 2 7 1 0 3 1 0 -33 Nicarágua 19 5 10 13 7 13 6 4 -77 Paquistão 9 6 8 14 5 1 2 6 -51 Panamá 17 5 3 7 8 12 6 6 -64 Paraguai 21 5 10 15 7 12 6 6 -78 Peru 14 1 3* 9* 1* 7 3* 2 -40 Coréia do Sul

7 2* 3* 6* 1 5* 2 2 -28

Uruguai 7 2 8 14 5 10 4 2 -52

TRIPS 18 3 4 10 0 3 4 4 -46

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XVI. Comentários finais

As estratégias de participação de um país no comércio internacional tem que, necessariamente, tomar em conta a infra-estrutura de serviços tecnológicos disponível em termos de metrologia, normalização e avaliação da conformidade.

Em realidade, a consideração da TIB como um fator determinante do desenvolvimento industrial de um país requer uma nova perspectiva sobre a organização e sobre investimentos.

Sob o ponto de vista da organização, há uma questão de repensar as estruturas organizacionais dos Governos no sentido de harmonizar os enfoques e os tratamentos que são dados pelos distintos Ministérios às suas áreas de jurisdição específicas. Há, também, uma nova demanda de se pensar a estrutura das relações público-privadas em termos de se construir os sistemas nacionais de TIB.

Nesse contexto, podem ser importantes os arranjos sub-regionais de modo a permitir que dois ou mais países compartilhem recursos de infra-estrutura tecnológica, especialmente em áreas como a Metrologia Científica onde os investimentos requeridos em laboratórios, equipamentos e formação de pessoal em nível de doutorado são muito elevado.

A iniciativa do setor produtivo é fundamental na questão das normas de produtos sendo pensada como uma arma estratégica na competição internacional.

Mas, o mais relevante é que o correto entendimento do alinhamento estratégico entre o Sistema Nacional de TIB e a Política Industrial no plano dos países é o que determina a eficácia das

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decisões e dos investimentos. O portfolio de alternativas e o campo de decisões sobre TIB é tão vasto que não há possibilidade de haver eficácia se não houver estratégias de ação claramente definidas. Fazendo uma analogia de cores fortes, as decisões sobre TIB num país exporta são distintas daquelas necessárias num país que pretenda se lançar em mercados de alta tecnologia. Talvez o único denominador comum seja o desenvolvimento de capacitação em Metrologia Científica.

Ao mesmo tempo, tomando um ponto levantado por Messner (2002, p.3), para uma análise mais acurada da eficácia da estrutura e dos recursos existentes para TIB seria necessário entender “a qualidade das relações” entre os atores que participam dos diferentes subsistemas de TIB. A partir das informações coletadas e apresentadas, fica evidente que há uma complexa rede de interrelações entre as instituições nos planos macro de países, meso de instituições e micro de empresas. Não obstante, uma avaliação da qualidade dos vínculos exige uma investigação muito mais profunda.

Faz-se necessário equacionar o comportamento sistêmico dos participantes. De pouco adianta a criação de capacitação em Metrologia se o sistema produtivo não tem capacidade para absorver e aplicar esse conhecimento. Um dos entrevistados comentou o caso do Japão que foi mencionado no rodapé da primeira página deste texto. Para ele, o Japão foi o país que mais opôs resistência à plena difusão das normas ISO. Ao compreender que essa passava a ser uma regra básica para o comércio internacional, o Japão passou a construir competências na área de TIB, tornando-se hoje, junto aos Estados Unidos e Alemanha, um centro de excelência e influência global.

Finalmente, no que diz respeito à relação TIB- Políticas Públicas constatamos que:

• ao nível da retórica, há um certo consenso sobre a importância estratégica de TIB para o desenvolvimento econômico e o comércio internacional

• ao nível do concreto, é possível elaborar fotografias dos modelos que estão sendo adotados por países e empresas, não obstante haja uma crescente complexificação dos atores e das redes de relacionamento que se estabelecem entre eles

• ao nível dos processos de decisão em políticas públicas, é muito mais difícil identificar padrões na medida em que a prioridade relativa da TIB frente aos outros critérios associados às decisões de política pública é muito variável; a TIB não tem um caráter estratégico; de maneira geral, as informações sobre TIB são incorporadas aos processos decisórios como aspectos operacionais.

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A tecnologia industrial básica (TIB) como condicionante do desenvolvimento industrial na América Latina

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Anexos

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Anexo A Pessoas entrevistadas

• Consultor permanente: Arnaldo Pereira Ribeiro – Ex diretor presidente do INMETRO

Outras pessoas entrevistadas • Carlos Santos Amorim Júnior – Diretor de Relações Externas da ABNT

• Guilherme Ary Plonski – Superintendente do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas

• Melvin Cymbalista – Diretor de Qualidade e Certificação da Fundação Vanzolini

• Milton Campanário – Diretor do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas

• Reinaldo Ferraz - Ministério de Ciência e Tecnologia

• Vera Maria Lopes Ponçano – Diretora do Centro de Metrologia em Química do IPT

Anexo B Sites visitados

• www. inmetro. gov.br

• www. abnt.com.br

• www.inti.gov.ar

• www.iram.org.ar

• www.cenam.mx