296
CARLOS ANTONIO TEIXEIRA A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DO JORNAL DA PAULISTA (1987-2003): UMA APROXIMAÇÃO À DIVULGAÇÃO CIENTÍFICA Tese apresentada à Universidade Federal de São Paulo Escola Paulista de Medicina para obtenção do Título de Mestre em Ciências. Orientador: Prof. Dr. Dante Marcello Claramonte Gallian Co-Orientadora: Profª. Drª. Márcia Regina Barros da Silva SÃO PAULO 2007

A TRAJETÓRIA HISTÓRICA DO JORNAL DA PAULISTA (1987 … · Sou grato também pelas horas empreendidas na leitura do texto e pelo desafio da problematização que proporcionou a reflexão

  • Upload
    hacong

  • View
    253

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

  • CARLOS ANTONIO TEIXEIRA

    A TRAJETRIA HISTRICA DO JORNAL DA PAULISTA (1987-2003):

    UMA APROXIMAO DIVULGAO CIENTFICA

    Tese apresentada Universidade

    Federal de So Paulo Escola Paulista

    de Medicina para obteno do Ttulo de

    Mestre em Cincias.

    Orientador: Prof. Dr. Dante Marcello Claramonte Gallian

    Co-Orientadora: Prof. Dr. Mrcia Regina Barros da Silva

    SO PAULO

    2007

  • Teixeira, Carlos Antonio

    A trajetria histrica do jornal da paulista (1987-2003): uma aproximao divulgao cientfica/ Carlos Antonio Teixeira. So Paulo, 2007.

    xix, 215f. Tese (Mestrado) Universidade Federal de So Paulo. Escola Paulista

    de Medicina. Programa de Ps-graduao em: Ensino em Cincias da Sade.

    Ttulo em ingls: The historical track of the Jornal da Paulista (1987-2003): an approach to the public communication of science.

    1. Jornal universitrio. 2. Cultura cientfica. 3. Divulgao cientfica.

    4. Comunicao pblica das cincias da sade. 5. Jornalismo Cientfico.

  • iii

    UNIVERSIDADE FEDERAL DE SO PAULO

    ESCOLA PAULISTA DE MEDICNA

    CENTRO DE DESENVOLVIMENTO DO ENSINO SUPERIOR EM SADE

    MESTRADO ACADMICO

    A TRAJETRIA HISTRICA DO JORNAL DA PAULISTA (1987-2003):

    UMA APROXIMAO DIVULGAO CIENTFICA

    Diretora do CEDESS

    Profa. Dra. Maria Ceclia Sonzogno

    Coordenador do Curso de Ps-Graduao

    Prof. Dr. Nildo Alves Batista

    http://www.unifesp.br/centros/cedess/http://www.unifesp.br/centros/cedess/

  • iv

    CARLOS ANTONIO TEIXEIRA

    A TRAJETRIA HISTRICA DO JORNAL DA PAULISTA (1987-2003):

    UMA APROXIMAO DIVULGAO CIENTFICA

    Presidente da Banca: Prof. Dr. Dante Marcello Claramonte Gallian

    BANCA EXAMINADORA

    Profa. Dra. Maria Ceclia Leite de Moraes__________________________________

    Profa. Dra. Maria Ceclia Sonzogno _______________________________________

    Prof. Dr. Paulo Rogrio Gallo____________________________________________

    Aprovada em: 28 de maio de 2007

  • v

    DEDICATRIA

    Dedico este estudo a todos aqueles que estiveram envolvidos com o Jornal da

    Paulista (JP). queles que fizeram parte da equipe de redao e queles que

    passaram pelo jornal e deixaram a sua colaborao ainda que espordica. Amplio

    esta minha dedicatria grande equipe que fez parte do Departamento de

    Comunicao da UNIFESP/EPM durante a trajetria do JP e que tambm

    colaboraram direta ou indiretamente com a produo do jornal. Homens e mulheres

    de viso que trataram o conhecimento cientfico produzido na universidade como um

    bem pblico. Incluo nesta dedicatria todos os especialistas que possibilitaram a

    divulgao cientfica de suas pesquisas pelas pginas do JP.

    In memorian de Dona Laly e Din, me e irm.

  • vi

    AGRADECIMENTOS

    A Deus por Suas misericrdias que se renovam a cada manh e que oportunizam novas possibilidades de aprendizagem e de vida; Ao Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior em Sade CEDESS, que me recebeu como mestrando. Espero que este estudo possa unir-se aos trabalhos que bem representam o nome deste Centro; Ao Professor Doutor Dante Marcello Claramonte Gallian, meu orientador, pelas cobranas sempre necessrias, aprendizado acadmico, importante referencial de pesquisador e pela liberdade de trabalho; Doutora Mrcia Regina Barros da Silva, minha co-orientadora, pelas fundamentais sugestes, pacincia, pertinentes correes e gentileza em disponibilizar o acervo do JP na Biblioteca do Centro de Histria e Filosofia das Cincias da Sade (CeHFi); Aos componentes que integraram meu exame de qualificao, Professor Doutor Dante Marcello Claramonte Gallian, Professora Doutora Maria Ceclia Leite de Moraes e a Professora Doutora Mrcia Regina Barros da Silva pelas importantes contribuies para elaborao final deste trabalho; Aos estimados Professores componentes da banca de exame de mestrado, Professor Doutor Dante Marcello Claramonte Gallian, Professora Doutora Maria Ceclia Leite de Moraes e a Professora Doutora Maria Ceclia Sonzogno e Professor Doutor Paulo Rogrio Gallo; amiga, Professora Dra. Mrcia Dbora dos Santos agradeo as sugestes por ocasio da elaborao da proposta do projeto primrio de mestrado. amiga, Professora Mestre Janne Maria Batista Silva Erickson pela expresso de sua concepo educacional em acreditar que este trabalho poderia ser concludo. Sou grato tambm pelas horas empreendidas na leitura do texto e pelo desafio da problematizao que proporcionou a reflexo e possibilitou o encontro do caminho no momento de fechamento do texto final; Aos Professores e Professoras do Programa de Ps-Graduao Mestrado Ensino em Cincias da Sade, pela contribuio na minha formao acadmica; Aos colegas de Mestrado, pelo apoio e convvio; Aos funcionrios do CEDESS, especialmente a secretria do programa de Mestrado, Suely Pedroso, pelo apoio, pacincia, gentileza e amizade, to imprescindveis finalizao deste trabalho; Ao corpo administrativo e acadmico Centro Universitrio Adventista de So Paulo (UNASP). Aos coordenadores dos cursos, particularmente ao Professor Hlvio Carvalho de Araujo, pelo apoio, compreenso e concesses;

  • vii

    minha famlia, pela compreenso da minha ausncia; especialmente minha irm Cida Teixeira, pelos conselhos como jornalista; Aos Professores Doutores Martin Bauer da London School of Economics, Svein Kyvik da Norwegian Institute for Studies in Research and Education e Bruce V. Lewenstein da Cornell University, pela troca de correspondncia e envio de material.

  • viii

    No mundo em que vivemos hoje, a universidade tem no s o dever mas tambm a responsabilidade social de produzir sua pesquisa, de forma aberta, a toda a sociedade. No se justifica mais uma produo cientfica enclausurada em arquivos e prateleiras, com restrito acesso de uma minoria privilegiada. preciso democratizar a universidade. Um servio de comunicao o melhor caminho para a abertura de novos canais de dilogo e a democracia dentro e fora da universidade. Esta uma misso inadivel da universidade (KUNSCH, 1991).

  • ix

    RESUMO

    Este estudo teve como objetivo descrever e analisar a trajetria histrica do Jornal

    da Paulista (JP), jornal da Universidade Federal de So Paulo (UNIFESP/EPM), que

    circulou entre os anos de 1987 a 2003, de modo a identific-lo como um instrumento

    de divulgao cientfica das cincias da sade. Para tal, utilizou-se como referencial

    terico, dentre outros, a proposio de Eric Landowiski de se estudar o jornal como

    um sujeito semitico. O estudo do JP contextualizou-se dentro de um panorama

    global do desenvolvimento da divulgao cientfica a partir da II Guerra Mundial,

    bem com dentro do cenrio brasileiro a partir do perodo da dcada de 1980 que

    sucedeu ditadura militar. Tambm se procurou contextualizar o estudo do JP a

    partir das implicaes sociais, intelectuais e educacionais decorrentes da dcada de

    1980. Considerando que a histria do JP foi recente, esta pesquisa fundamentou-se

    na tcnica da Histria Oral, tendo sido realizadas entrevistas com as principais

    pessoas que fizeram parte da histria do jornal. A trajetria do JP foi dividida em trs

    fases, sendo que na primeira a sua identificao esteve mais prxima de um jornal

    que respondia necessidade de comunicao interna da ento Escola Paulista de

    Medicina e a uma forte vinculao como instrumento de divulgao institucional.

    Com o incio de sua segunda fase, o JP foi se configurando cada vez como um

    instrumento de divulgao cientfica, embora essa caracterstica j se encontrasse

    incipiente em sua primeira fase. Finalmente na sua terceira fase, principalmente com

    o envolvimento da universidade com um movimento pr-divulgao cientfica, o JP

    alcanou a sua identificao plena com a divulgao cientfica das cincias da

    sade. No entanto, no auge de sua veiculao como instrumento de divulgao

    cientfica o JP deixou de ser publicado em dezembro de 2003, quando entrava no

    seu 17 ano de circulao.

    Palavras Chaves: Jornal universitrio; Cultura cientfica; Divulgao cientfica;

    Comunicao pblica das cincias da sade; Jornalismo Cientfico.

  • x

    ABSTRACT

    The present study aims at describing and analyzing the historical track performed by

    the Jornal da Paulista (JP), the newspaper issued by the Universidade Federal de

    So Paulo (UNIFESP/EPM), which was put forth in the period between 1987 and

    2003. The idea is to identify it as a tool for public communication in the health

    science in the health science area. With this purpose, the theoretical referential

    assumed was, among others, the proposal by Eric Landowiski, suggesting the

    newspaper to be studied as a semiotic subject. The analysis considered JP in the

    context of a global panorama of the scientific communication development from

    World War II on, as well as the Brazilian setting starting at the 80s, the decade

    following the military dictatorship. The study also intended to place JP in the context

    of the social, intellectual and educational implications arising from de 80s. Once JPs

    history is quite recent, the present research was also based on the Oral History

    technique, with a number of interviews with the most remarkable characters in that

    history. JPs historical track was divided into three phases, the first one identified

    more closely to a newspaper meant to fulfill the need of internal communication of

    the Escola Paulista de Medicina (EPM), as it was known at the time the

    UNIFESP/EPM, along with a strong institutional approach. Starting at the second

    phase, JP increasingly became an instrument for public communication of science,

    although such feature could also be slightly identified in the previous phase. Finally,

    at the third phase, counting basically on the involvement of the university in a

    movement in favor of scientific communication toward to the society, JP reached its

    full identification with public communication in the health science area. Nevertheless,

    as of December 2003, about to start its 17th year of existence and at its best moment

    as an instrument of public communication of science, JP editorial project was

    discontinued.

    Key-Words: University newspaper; Scientific Culture; Scientific Divulgation; Public

    Communication of Science; Scientific journalism.

  • xi

    LISTA DE ABREVIATURA E SIGLAS

    AAAS - American Association for the Advancement of Science

    ABSW - Association of British Science Writers

    ANVISA - Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria

    BIREME - Centro Latinoamericano e do Caribe de Informao em Cincias da

    Sade

    CAPB Centro Acadmico Pereira Barreto

    CAPES Coordenao de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

    CNPq - Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico

    CPDOC - Centro de Pesquisa e Documentao de Histria Contempornea

    FDA Food and Drug Administration

    FINEP Financiadora de Estudos e Projetos Brasileira

    HSP Hospital So Paulo

    IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatstica

    INRA - Institut National de la Recherche Agronomique

    ISI - Scientific Information Institute

    JCR Journal Citation Report

    LABJOR Laboratrio de Jornalismo Cientfico UNICAMP

    LILACS - Literatura Latino-americana em Cincias da Sade

    LDB Lei de Diretrizes e Bases da Educao Nacional

    MEC Ministrio da Educao e Cultura

    NASW - National Association of Science Writers

    NAT Teste de cido Nuclico

    NJR Ncleo Jos Reis de Divulgao Cientfica ECA/USP

    OMS - Organizao Mundial da Sade

    OPAS - Organizao Pan-americana da Sade

    PCLA Pensamento Comunicacional Latino Americano

    PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios

    SciELO Scientific Eletronic Library Online

    UNESCO - United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization

  • xii

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 - As dez universidades que mais concederam doutorados no Brasil e nos Estados Unidos em 2003............................................................... 54 Quadro 2 - Fases do JP....................................................................................... 71

    Quadro 3 - Edies do JP por nmero de pginas........................................... 72 Quadro 4 - Entrevistas Tcnica Histria Oral.................................................... 75

    Quadro 5 - Expediente......................................................................................... 76 Quadro 6 - Sntese dos Editoriais do JP............................................................ 93

    Quadro 7 - Colunas JP: Segunda Fase.............................................................. 119 Quadro 8 - Divulgao de Pesquisa................................................................... 121

    Quadro 9 - Textos de Divulgao Cientfica Categoria "Pesquisa"................ 122 Quadro 10 - Coluna Debate................................................................................. 132

    Quadro 11 - Coluna Entrevistas......................................................................... 138 Quadro 12 - Colunas da 2 Fase que Circularam na 3 Fase do ..................... 154

    Quadro 13 - JP 3 Fase: Novas Colunas............................................................ 155 Quadro 14 - Coluna Comunicao..................................................................... 158

  • xiii

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 - Mapa Conceitual: Divulgao Cientfica.......................................... 11

    Figura 2 - A Hora do Recreio 1........................................................................... 112 Figura 3 - A Hora do Recreio 2........................................................................... 113

    Figura 4 - A Hora do Recreio 3........................................................................... 113 Figura 5 - Seo Lavao.................................................................................... 113

    Figura 6 - Cartun 1: Seo Vibrio..................................................................... 114 Figura 7 - Cartun 2: Coluna Saudvel................................................................ 114 Figura 8 - Dez Dicas para Divulgar Cincia....................................................... 127 Figura 9 - Cincia a golpes de vontade............................................................. 140

    Figura 10 - Prs e contras do NAT.................................................................... 179

  • xiv

    ANEXOS

    Anexo 1

    Quadro H.Q. e Cartuns ...................................................................................... 203

    Anexo 2

    Quadro PubMed ................................................................................................. 205

    Anexo 3

    Quadro Coluna Reportagens ............................................................................ 208

    Anexo 4 Quadro Colunas / Sees do JP ....................................................................... 211

    Anexo 5

    Textos de Divulgao Cientfica (Sinttico) .................................................... 213

    Anexo 6

    JP 115, janeiro de 1998, p. 5 ............................................................................. 214

  • xv

    SUMRIO

    1. APRESENTAO ................................................................................................. 1

    1.1 Objeto de Estudo .............................................................................................. 1

    1.2 Justificativa da Pesquisa ................................................................................... 3

    1.3 Problematizao do Estudo .............................................................................. 4

    1.4 Objetivo ............................................................................................................. 4

    1.5 Hiptese ............................................................................................................ 5

    1.6 Trajetria do JP .................................................................................................. 5

    2. FUNDAMENTOS TERICOS/METODOLGICOS ............................................... 8

    2.1 Referencial Terico ........................................................................................... 8

    2.2 Cultura Cientfica ............................................................................................. 12

    2.3 Comunidade Cientfica .................................................................................... 14

    2.4 Campo Cientfico ............................................................................................. 16

    2.5 Comunicao Cientfica .................................................................................. 17

    2.6 Difuso, Disseminao e Divulgao Cientfica .............................................. 24

    2.7 Jornalismo Cientfico ....................................................................................... 27

    2.8 Delineamento Metodolgico da Pesquisa ....................................................... 28

    3. CONTEXTUALIZAO DO ESTUDO ................................................................. 32

    3.1 A Cincia e a Divulgao Cientfica Ps-Segunda Guerra Mundial ................ 32

    3.2 Implicaes da Ditadura Militar Brasileira na Cincia e Divulgao Cientfica . 34

    3.3 A Dcada de 1980 no Brasil ............................................................................ 36

    3.4 A Legislao do Ensino Superior e o JP ......................................................... 39

    3.4.1 A Constituio de 1824 ......................................................................... 40

    3.4.2 A Constituio de 1891 ......................................................................... 40

    3.4.3 A Constituio de 1934 ......................................................................... 41

    3.4.4 A Constituio de 1937 ......................................................................... 42

  • xvi

    3.4.5 A Constituio de 1946 ......................................................................... 43

    3.4.6 A Constituio de 1967 ......................................................................... 43

    3.4.7 A Constituio de 1988 ......................................................................... 44

    3.4.8 A Lei de Diretrizes e Bases de 1961 ..................................................... 47

    3.4.9 A Lei de Diretrizes e Bases de 1971 ..................................................... 48

    3.4.10 A Lei de Diretrizes e Bases de 1996 ................................................... 49

    3.5 Exemplos da Produo Cientfica Brasileira: A Contribuio da Universidade e

    a Divulgao Cientfica .......................................................................................... 52

    3.6 Discusso Histrica da Divulgao Cientfica na PubMed .............................. 56

    3.7 O JP Enquanto Elemento Contributivo para o Empoderamento em Sade .... 58

    3.8 O JP e os Jornais das Universidades Pblicas do Estado de So Paulo ........ 59

    3.9 Jornal Universitrio, o JUSP e o JP ............................................................... 61

    3.10 O Jornal Universitrio Discutido por Intelectuais ................................................. 63

    3.11 A Comunicao Pblica por Parte de Professores Universitrios e as

    Diferenas entre Cientistas e Jornalistas .............................................................. 65

    4. CARACTERSTICAS DO JP ................................................................................ 70

    4.1 Precursores do JP ............................................................................................ 77

    5. DESCRIO E CARACTERIZAO DA PRIMEIRA FASE DO JP - (NOV/1987 A

    JUL/AGO/1994) ........................................................................................................ 81

    5.1 Escritrio Representativo da EPM em Braslia ................................................ 88

    5.2 Evidncias Textuais de Divulgao Institucional e de Veculo de Comunicao

    Interna ................................................................................................................... 92

    5.3 Evidncias a Partir dos Editoriais da Primeira Fase do JP .............................. 92

    5.4 Primeiro Editorial ............................................................................................. 94

    5.5 Divulgao Cientfica na Edio Nmero Um ................................................. 97

    5.5.1 Prmio Nobel de Medicina .................................................................... 98

    5.5.2 Michel Prize ........................................................................................ 100

    5.5.3 Tudo sobre a Radiao ....................................................................... 104

  • xvii

    5.6 Informaes Adicionais da Primeira Fase do JP ........................................... 109

    5.7 Histrias em Quadrinhos (H.Q.) e Cartuns como exemplos de Divulgao

    Cientfica e de Empoderamento .......................................................................... 111

    6. DESCRIO E CARACTERIZAO DA SEGUNDA FASE DO JP -

    (SETEMBRO DE 1994 A MAIO DE 1999) .............................................................. 117

    6.1 Coluna Pesquisa ........................................................................................... 119

    6.2 Coluna Debate .............................................................................................. 129

    6.3 Coluna Entrevista . ......................................................................................... 136

    6.3.1 Cincia a Golpes de Vontade ............................................................. 139

    6.3.2 Diviso de Poder no Consultrio ......................................................... 142

    7. DESCRIO E CARACTERIZAO DA TERCEIRA FASE DO JP - (JUNHO DE

    1999 A NOVEMBRO/DEZEMBRO DE 2003) ......................................................... 150

    7.1 Colunas 3a Fase do JP .................................................................................. 153

    7.2 Coluna Comunio ........................................................................................ 156

    7.3 Coluna Reportagens ..................................................................................... 176

    7.4 O Fim do JP .................................................................................................. 180

    7.4.1 Descontinuidade das Aes ................................................................ 180

    7.4.2 Possibilidade de Continuidade das Aes: Algumas Reflexes ......... 184

    8. CONSIDERAES FINAIS ............................................................................... 187

    9. REFERNCIAS ................................................................................................... 196

    10. ANEXOS .......................................................................................................... 203

    11. APNDICE

  • CAPTULO 1 - APRESENTAO

    No ano de 1999 iniciei minhas atividades como professor do Centro

    Universitrio Adventista de So Paulo (UNASP), instituio da qual fora aluno do

    Seminrio Latino-Americano de Teologia. As caractersticas do bairro do Capo

    Redondo onde est localizado o Unasp mudou muito desde o ano de 1915 quando a

    instituio foi ali estabelecida. O bairro do Capo Redondo, juntamente com os bairros

    do Campo Limpo e Vila Andrade compem o contingente de 500 mil habitantes

    (MORATO et al, 2005) sob administrao da Sub-Prefeitura do Campo Limpo. Foi

    pensando em como estender a esta populao o conhecimento cientfico que permeia

    o UNASP, utilizando os jornais de bairro e as rdios comunitrias, que passei a me

    interessar pela divulgao cientfica, e isto me levou ao curso de Especializao em

    Divulgao Cientfica do Ncleo Jos Reis (ECA-USP). Como o UNASP tem uma longa

    tradio na formao de profissionais da sade, veio da meu interesse em estudar a

    divulgao cientfica no mbito das cincias da sade, o que me encaminhou ao

    programa do mestrado oferecido pelo Centro de Desenvolvimento do Ensino Superior

    em Sade (CEDESS). Minha passagem como aluno pela Faculdade de Educao da

    USP (FEUSP), que se orienta pela doutrina do conhecimento como um bem pblico

    tambm subsidia meu interesse pela democratizao do conhecimento.

    1.1 OBJETO DE ESTUDO: O JP

    Em 1987, na Escola Paulista de Medicina (EPM), foi criado o Departamento de

    Comunicao, cujo primeiro produto institucional foi um jornal universitrio o Jornal

    da Paulista (JP) com publicao a partir de novembro do mesmo ano.

    O JP circulou em forma impressa at o ms de dezembro de 2003. Durante o

    perodo de 16 anos de circulao, sete anos como jornal da EPM e nove anos como

    jornal da UNIFESP/EPM, foram publicadas 185 edies mensais, compondo um total

    de 2.554 pginas de material informativo.

    Por tratar-se de uma publicao ligada UNIFESP/EPM, o JP foi o nico jornal

    universitrio dedicado veiculao de informaes cientficas especficas no campo

  • 2

    das cincias da sade, caracterizando-o como um meio de divulgao cientfica deste

    campo do conhecimento.

    Pelas caractersticas particulares da UNIFESP/EPM, de ser uma universidade

    voltada, no perodo abrangido pela circulao do JP, exclusivamente para a rea das

    cincias da sade, o JP foi o nico jornal universitrio dedicado veiculao de

    informaes e divulgao cientfica, relacionadas tambm exclusivamente rea das

    cincias da sade, majoritariamente no campo da medicina.

    Em 1987 quando foi iniciada a publicao do JP, a EPM oferecia quatro cursos

    de graduao, a saber, Medicina, Cincias Biolgicas modalidade mdica,

    Enfermagem e Fonoaudiologia. Em 1997, j como universidade, passou tambm a

    oferecer o curso de Tecnologia Oftlmica. A universidade oferece atualmente 43

    programas de ps-graduao (40 de mestrado, 38 de doutorado e oito de mestrado

    profissionalizante), que em sua maioria foram credenciados entre 1973 e 1984. A

    produo cientfica gerada pelos cursos de graduao, ps-graduao e por

    pesquisadores docentes era a mais importante fonte de informao para as matrias

    veiculadas pelo JP.

    semelhana dos jornais convencionais, ou da grande mdia, que apresentam

    as novidades do dia, circularam pelas pginas do JP informaes sobre as ltimas

    novidades na rea da medicina e sade. Os mais recentes tratamentos, novos

    procedimentos e tcnicas, cirurgias inovadoras bem-sucedidas, entre outras, foram

    objeto de divulgao pelo JP. Divulgao esta, particularmente, mas no

    necessariamente restrita, do conhecimento cientfico que era elaborado nas bancadas

    de pesquisa dentro do campus universitrio.

    Ao mesmo tempo em que o JP registrava as ltimas notcias na rea das

    cincias da sade, por suas pginas circulavam tambm informaes acerca da

    memria da instituio.

    A trajetria do JP, descrita e analisada sob a perspectiva de se um instrumento

    de divulgao cientfica, foi o objetivo que circunscreveu o resgate de sua histria. Este

    resgate permitiu compreender a identidade do jornal e suas caractersticas principais,

    bem como identificar os principais atores envolvidos em sua gnese e trajetria e a

    contribuio dos mesmos para a constituio do jornal.

  • 3

    1.2 JUSTIFICATIVA DA PESQUISA

    Os jornais universitrios tm sido pouco explorados como documentos

    depositrios de informaes acerca da produo cientfica nacional, que

    majoritariamente desenvolvida dentro das universidades pblicas. Trazer a lume a

    histria do JP representa uma contribuio aos estudos da comunicao cientfica pelo

    vis da divulgao cientfica, sendo que esta, em territrio nacional apenas em anos

    recentes tem se tornado mais efetivamente objeto de reflexes e aes regulares

    visando democratizao do conhecimento e a participao popular.

    Durante o perodo de reviso bibliogrfica, foram analisados trabalhos que

    apresentavam os resultados de pesquisas de mestrado e doutorado e que discutiam a

    comunicao cientfica, tendo sido particularmente considerados aqueles que tratavam

    da comunicao pblica de cincia ou divulgao cientfica. Alguns desses trabalhos

    analisavam produtos comunicacionais como jornais e revistas. No entanto, s foi

    localizado um trabalho que discutia especificamente o jornal universitrio, no caso, a

    tese de doutorado de autoria de Laurindo Leal Filho1, A Universidade no Jornal,

    defendida no ano de 1990, que apresentava o resultado do estudo que tinha como

    objeto o Jornal da USP. Como a histria dos jornais universitrios relativamente

    recente, isso talvez explique a falta de estudos especficos sobre os mesmos.

    A importncia de estudar o jornal universitrio sob a perspectiva da

    comunicao pblica ou divulgao cientfica pode ser constada a partir das

    concluses de trabalhos como o de Santos (1999), cuja dissertao de mestrado, ao

    estudar as assessorias de imprensa/comunicao das universidades USP, UNICAMP e

    UNESP, apontou falhas no processo de comunicao que prejudicavam a divulgao

    da produo cientfica daquelas instituies. Mendes (2002) constatou, em sua

    dissertao de mestrado, que a Faculdade de Cincias Agrrias (FAAG) da

    Universidade Vale do Rio Doce (UNIVALE) no possua uma poltica de divulgao

    cientfica. Carneiro (2004), ao fazer o diagnstico do processo de comunicao e das

    aes de divulgao cientfica da Universidade Federal de Uberlndia (UFU), em sua

    dissertao de mestrado, apontou lacunas no processo comunicacional daquela

    universidade. Por sua vez, Carvalho (2003) discutiu, em sua tese de doutorado, a

    1 Por sua participao na elaborao do projeto inicial do JP, Leal Filho integra o rol das personalidades

    que foram entrevistadas para melhor elucidao da histria do JP.

  • 4

    adoo de estratgias de marketing da cincia por parte de instituies de pesquisa

    brasileiras que misturavam propaganda institucional e divulgao cientfica.

    Esses estudos indicam a necessidade da discusso de uma poltica

    universitria de comunicao, da qual o jornal universitrio parte integrante.

    Como o JP deixou de circular no final de 2003, esta pesquisa tem tambm a

    sua relevncia no apenas quanto ao resgate da histria de sucesso deste jornal, mas

    oferece ao mesmo tempo um convite para a reflexo sobre a descontinuidade de aes

    que vinham sendo desenvolvidas dentro da universidade, reveladas nas comunicaes

    feitas nas pginas do jornal, que estavam pioneiramente promovendo aquilo que passa

    a ser cada vez mais requisitado globalmente nas sociedades do conhecimento: o

    compartilhamento do conhecimento cientfico com a sociedade visando a sua

    participao decisria sobre os rumos da cincia moderna.

    Em conformidade com o que ser constatado neste trabalho, entre as muitas

    contribuies do JP, a principal foi, sem dvida, a de ter-se ocupado com a divulgao

    do conhecimento cientfico das cincias da sade, comunicado numa linguagem

    acessvel ao leitor do jornal, que pertencia comunidade local bem como

    comunidade amploiada. O aval para esta comunicao advinha da UNIFESP/EPM,

    uma instituio de notrio reconhecimento cientfico e educacional.

    1.3 PROBLEMATIZAO DO ESTUDO

    Este estudo pretende responder ao seguinte problema: em que medida o JP,

    em sua gnese e desenvolvimento (trajetria), enquanto veculo de comunicao

    pblica das cincias da sade constituiu-se como um instrumento de divulgao

    cientfica.

    1.4 OBJETIVO

    Esta pesquisa teve como objetivo descrever e analisar a trajetria histrica do

    JP enquanto instrumento de divulgao cientfica, tendo como elementos norteadores

    para atingir esse objetivo as seguintes questes: qual era a identidade do JP?; quais

  • 5

    eram as suas principais caractersticas?; quais foram os principais atores envolvidos na

    sua trajetria?; como se deu a comunicao pblica de cincias da sade durante a

    sua trajetria no perodo de novembro de 1987 a novembro/dezembro de 2003?

    1.5 HIPTESE

    A principal hiptese que norteou este estudo a de que, embora o JP em sua

    origem tivesse a caracterstica de um veculo de comunicao interna, com uma

    substancial nfase na veiculao de notcias referentes instituio e com um objetivo

    de divulgao da prpria instituio, desde a sua gnese era um veculo de divulgao

    cientfica, cuja identidade de divulgador cientfico se constituiu e consolidou ao longo de

    sua trajetria.

    1.6 TRAJETRIA DO JP

    Para melhor compreender a trajetria do JP, este trabalho foi dividido em

    captulos, como segue:

    No captulo dois, apresentamos os fundamentos tericos/metodolgicos que

    nortearam este estudo, a justificativa do estudo e seus objetivos. Inclumos neste

    captulo os conceitos, as definies e a reviso bibliogrfica.

    O captulo trs procura contextualizar o estudo do JP dentro de uma

    perspectiva histrica, social, poltica, econmica e educacional.

    As caractersticas gerais do JP so apresentadas no captulo quatro. Essas

    caractersticas so discutidas com mais detalhes nos captulos cinco, seis e sete, nos

    quais discorremos acerca das trs fases em que dividimos a anlise do JP, a saber:

    gnese e desenvolvimento inicial do jornal; fase intermediria, na qual o JP est

    intensificando sua identidade como veculo de divulgao cientfica; e fase final,

    quando o jornal se consolida como um instrumento de divulgao cientfica. Na

    primeira fase gnese e desenvolvimento inicial do jornal , discorrida no captulo

    cinco, analisamos as caractersticas primrias e a identidade inicial do JP. Tambm

    identificamos os principais atores envolvidos no processo de criao e desenvolvimento

  • 6

    do jornal. Esta fase abrangeu o perodo compreendedido entre a publicao das

    edies nmero 1 77 (novembro de 1987 a julho/agosto de 1994). Nesse perodo,

    calcado em evidncias internas apoiadas por depoimentos orais, entendemos que

    prevaleceu uma concepo de jornal com nfase na divulgao institucional e no

    atendimento s necessidades de comunicao interna. Conquanto ainda que de forma

    incipiente, pudemos constatar, nessa fase, a perspectiva do jornal como um

    instrumento de divulgao cientfica.

    A seguir, no captulo seis descrevemos a trajetria histrica do JP na sua

    segunda fase, compreendida entre as edies de nmero 78 130 (setembro de 1994

    a maio de 1999). Identificamos trs episdios pontuais para caracterizar esta fase: a

    introduo, nas edies 78, 114 e 118 das colunas Pesquisa, Debate e Entrevista,

    respectivamente. Com estas colunas, o JP passou a se ocupar mais efetivamente da

    comunicao pblica das cincias da sade. Nesta fase, que consideramos como

    intermediria, identificamos um jornal que est desvelando sua identidade de

    instrumento de divulgao cientfica em cincias da sade.

    O ciclo de caracterizao e identificao do JP encerra-se com a apresentao

    do stimo captulo, no qual descrevemos a trajetria histrica do jornal em sua terceira

    e ltima fase, cujo incio deu-se com a publicao da edio nmero 131 e foi

    encerrada com a ltima edio impressa do JP, a de nmero 185 (junho de 1999 a

    novembro/dezembro de 2003). Nessa fase, destacamos a criao do Jornal da Paulista

    Informa (JPInforma ou JPI), que circulou pela primeira vez no ms de junho de 1999, e

    que tomamos como referncia para o incio da terceira fase do JP, isto porque o

    JPInforma, criado para ser um jornal interno (house-organ) da Instituio, permitiu que

    o JP se dedicasse totalmente comunicao pblica de cincias da sade.

    Quando o JP adentrava em sua terceira fase, a equipe de Comunicao da

    universidade trouxe para dentro da instituio, discusses, workshops e pelo menos

    um curso documentado sobre a divulgao cientfica de cincias da sade, eventos

    esses direcionados para profissionais da sade e para jornalistas e divulgadores

    cientficos. Nesse captulo encerramos a discusso da caracterizao das fases do JP,

    tentando comprovar a identidade do jornal como instrumento de divulgao cientfica

    de cincias da sade.

    Na concluso, apresentamos as consideraes finais acerca da trajetria do

    JP, incluindo suas limitaes bem como sugestes para novos estudos a partir do que

    foi possvel identificar, constatar e analisar.

  • 7

    Hoje, como nunca aconteceu em toda a histria, fala-se em comunicao cientfica e tecnolgica; hoje, como nunca, h governos nacionais ou regionais que apiam a criao e as atividades no campo da cultura cientfica e tecnolgica; e hoje, como nunca, as prprias instituies cientficas e as universidades consideram que a divulgao no uma desonra, mas faz parte de sua obrigao. Os meios de comunicao de massa j no tm medo de tratar da atualidade das cincias e das tecnologias e recorrem a essas para esclarecer a atualidade em geral. Nunca como neste momento a investigao e o desenvolvimento das cincias e das tecnologias exerceram to grande influncia no nosso modo de vida e de trabalho, nas nossas concepes de espao e tempo, nas nossas capacidades de intercmbio e de comunicao em todo o planeta (VOGT, 2006, p. 19).

  • 8

    CAPTULO 2 - FUNDAMENTOS TERICOS/METODOLGICOS

    Neste captulo so apresentados os fundamentos tericos/metodolgicos que

    nortearam este estudo, a justificativa do estudo e seus objetivos, comeando com sua

    problematizao.

    2.1 REFERENCIAL TERICO

    Levando em considerao o problema deste estudo e a hiptese estabelecida,

    a demanda pela busca em conhecer a identidade do JP em sua trajetria e suas

    caractersticas essenciais conduziu a pesquisa para as discusses propostas pelo

    semilogo Eric Landowiski, em seus estudos com os jornais Le Monde e Libration, a

    partir dos quais discorre acerca da identidade de um jornal.

    Landowiski (1992), ao estudar teoricamente o veculo de comunicao jornal,

    inicia suas proposies questionando a objetividade na fabricao e na difuso da

    informao por parte das diferentes modalidades do que chama de grande mdia na

    prtica da comunicao social, pela constatao da dificuldade primria quanto a uma

    definio clara de objetividade. Apesar disso, prope que seja possvel avanar na

    compreenso do que um jornal, admitindo que o discurso da mdia realmente

    informa. Restando, contudo, um outro questionamento: aquilo que est escrito pode

    no ser necessariamente e sempre verdadeiro. Ainda assim, Landowiski entende que o

    discurso da mdia imprime uma forma maneira como concebemos e vivemos o

    presente.

    Apesar de sofrer a concorrncia de outros canais de comunicao, Landowiski

    considera que o jornal preserva sua caracterstica de in-formar acerca de tudo e

    dessa forma saturar todas as dimenses da presena humana no mundo. Assim, o

    jornal caracteriza-se como um poderoso instrumento integrador dos mltiplos universos

    de referncia que toma como objeto.

    Conquanto o jornal tenha um discurso plural, prestando-se a uma variada

    diversidade de abordagens, pode ser recortado por diferentes rubricas pela opo

    particular de cada leitor. Landowiski sugere a identificao do jornal enquanto

  • 9

    totalidade de significao, que est associada considerao de tempo, espao e

    pessoa.

    A originalidade de sua proposta est em considerar o jornal como pessoa

    uma verdadeira pessoa, moral , que diferente da personalidade jurdica que todo

    jornal tem. O jornal constri uma imagem de marca que est relacionada

    episodicidade de sua narrativa e periodicidade de seu discurso. Esta marca o

    identifica no plano da comunicao social. Todo jornal recebe um ttulo, sendo que por

    detrs dele toma corpo uma entidade figurativamente reconhecvel que se afirma

    socialmente no que Landowiski chama de sujeito semitico.

    O jornal, enquanto sujeito semitico detentor de estilo, tom e perfil. Estas

    caractersticas o definem e fazem dele uma figura social que pode gerar atrao ou

    repulsa. No entanto, Landowiski declara que diferentemente do imperativo social pela

    variao, a exemplo da indumentria e cardpio, com o jornal ocorre uma compulso

    inversa, a do favorecimento do hbito. A eleio de um jornal e a fidelidade a ele

    corresponde a permanecer fiel a si mesmo.

    O jornal, afirma Landowiski, tem duas faces complementares a episodicidade

    e a periodicidade associadas, respectivamente, narrativa e ao discurso. Ao

    desenvolver uma relao com o seu pblico, este, enquanto leitor, tambm se constri

    nessa relao. O jornal possui ainda duas dimenses: a de proclamar o que h de novo

    hoje no mundo e a de ocupar-se com o cotidiano, ao aqui e agora.

    Landowiski encerra suas consideraes questionando se os jornais, de resto

    os mais numerosos, que no pertencem nem imprensa de prestgio nem de

    vanguarda, tambm podem ser tratados com os critrios que propomos (p. 124). Ele

    mesmo responde acreditar que sim.

    A anlise do JP luz dessas proposies permitiu a anuncia com Landowiski,

    como pode ser constatado ao longo deste estudo.

    Alguns conceitos e definies de ancoragem que subsidiam a compreenso da

    comunicao pblica das cincias da sade so apresentados e discutidos na

    seqncia a partir de um modelo que foi elaborado utilizando o recurso grfico dos

    mapas conceituais2, que so representaes grficas semelhantes a diagramas que

    2 Mapas conceituais uma tcnica para estabelecer relaes entre conceitos e sistematizar

    conhecimento significativo. Foi desenvolvida pelo Prof. Joseph D. Novak, na Universidade de Cornell, na dcada de 60. Seu trabalho foi fundamentado a partir da teoria de David Ausubel que destacou a importncia da aprendizagem significativa decorrente da assimilao de novos conceitos e proposies atravs de estruturas cognitivas j existentes. Esta abordagem est embasada tambm na teoria

  • 10

    indicam relaes entre conceitos (palavras) atravs de setas descritivas. Seu contedo

    parte de uma estrutura que vai desde os conceitos mais abrangentes at os mais

    especficos. Podem contemplar as diversas reas do conhecimento. So utilizados

    para auxiliar a ordenao hierarquizada (OKADA et al., 2005, p. 79).

    construtivista. O sujeito constri seu conhecimento e significado a partir das relaes entre diversos elementos. Tais relaes facilitam a sistematizao de conceitos novos em contedo significativo para o aprendiz (Okada et al., 2005, p. 79).

  • 11

    Figura 1 Mapa Conceitual Divulgao Cientfica

  • 12

    Conforme se observa no mapa conceitual, so apresentados os referenciais

    tericos e definies que associamos ao contexto da discusso da hiptese deste

    estudo de que o JP foi, desde o seu incio, um instrumento de divulgao cientfica das

    cincias da sade.

    Cada um dos conceitos constantes no mapa conceitual, e empregados ao longo

    deste estudo poderia ser estudado isoladamente como um objeto especfico de

    pesquisa, o que no , contudo, intencionado neste estudo. O propsito aqui de

    deixar o mais claro possvel os significados dos mesmos de modo que possibilite

    compreender como o JP inseria-se no contexto em que os conceitos do mapa

    referencial so empregados, levando em considerao para isso a contribuio de

    alguns estudiosos do assunto.

    2.2 CULTURA CIENTFICA

    Este estudo delimita a discusso de cultura ao mbito da cultura cientfica.

    Embora no se tenha objetivado discutir propriamente a cultura, que em seu sentido

    amplo aqui compreendida como um sistema de valores e normas de comportamento

    que orientam a prtica humana (SETTON, 2005, p. 336), uma aproximao ao

    contexto de cultura perpassa pela compreenso de que a cada momento histrico

    corresponde certa abordagem do conceito de cultura, com repercusses no campo

    sociopoltico e, em decorrncia, educacional (FISCHMANN, 2000, p. 12). Levando isto

    em considerao, o momento presente no qual se insere a trajetria do JP o de

    uma sociedade reconhecida como do conhecimento, na qual a cultura cientfica

    desempenha um papel preponderante.

    O conceito de cultura cientfica adotado neste estudo apia-se na proposio

    da UNESCO, exemplificada no livro Cultura cientfica: um direito de todos (MACEDO,

    org. 2003). Embora este livro esteja focado ao carter formal da educao cientfica no

    ensino secundrio, compreendida como uma importante contribuio para o

    estabelecimento de uma cultura cientfica, Jorge Werthein3 ao prefaciar o volume,

    amplia o escopo da cultura cientfica, estendendo-a a todos os membros da sociedade:

    3 Representante da UNESCO no Brasil.

  • 13

    Paradoxalmente, em meio s novas tecnologias, ensinar cincias se torna processo desafiador para os educadores. Como ento interessar crianas, adolescentes, jovens e adultos num mundo fascinante, porm ainda escondido por trs de uma casca de erudio e estranheza, como se no fosse atinente ao dia de hoje e ao momento de agora? (WERTHEIN in: Cultura Cientfica: um direito de todos, 2003, p. 8).

    De maneira particular, o livro objetiva alcanar os pases emergentes

    caracterizados pela democratizao e imersos numa diversidade social e cultural,

    ressaltando, neste contexto, uma importante implicao da cultura cientfica que

    abrange a concepo de educao cientfica como um meio de educar cidados

    conscientes, preocupados com a preservao ambiental e com o desenvolvimento

    sustentvel (Idem, p. 11), uma necessidade premente desses pases.

    Em semelhante linha de interesse quanto a uma educao cientfica, a

    Organizao dos Estados Iberoamericanos para a Cincia e a Cultura (OEI4), promove,

    h cerca de 30 anos, estudos sobre Cincia, Tecnologia e Sociedade (CTS5), um

    campo de estudo que discute a regulao democrtica da cincia e da tecnologia, e

    objetiva, entre outras coisas, a promoo da alfabetizao cientfica6 como parte

    integrante da cultura geral, procurando tambm diminuir a distncia entre a cultura

    humanstica e a cultura cientfico-tecnolgica.

    Cultura cientfica insere-se no contexto da busca por uma equanimidade social

    e as aes efetivas para seu estabelecimento contribuem para responder ao desafio de

    Calvo Hernando7: se queremos realmente uma sociedade democrtica, preciso que

    todos entendam a cincia. Para este conceituado divulgador de cincia e jornalista

    cientfico, a resposta encontra-se naquilo que est abrangido pela cultura cientfica:

    [...] o ponto-chave a divulgao para todos. Depois, preciso criar uma conscincia pblica sobre o valor da cincia. As pessoas sabem muito pouco [...] h uma falta de conscincia cientfica na sociedade [...] A cultura cientfica deveria fazer parte da cultura popular (CALVO HERNANDO, 2005, p. 18).

    4 Entre os dias 14 a 18 de novembro de 2005 participei como bolsista da OEI do II Seminrio de

    formacin: Cultura cientfica, participacin social e desarrollo, realizado na cidade de Lima, Peru. Na fundamentao deste Seminrio estava a preocupao com as dimenses emergentes da cincia e da tecnologia, e, em vista disso, a necessidade de promover uma cultura de cincia socialmente apropriada e de faz-la acessvel aos cidados. O seminrio objetivava a discusso de cultura cientfica no mbito de pases iberoamericanos, bem como a busca de uma definio regional para cultura cientfica. 5 O portal da OEI fornece maiores informaes sobre os estudos CTS: Disponvel em

    www.oei.es/cts.htm. 6 Por alfabetizao cientfica, entendemos o conjunto de conhecimentos que facilitariam aos homens e

    mulheres fazer uma leitura do mundo onde vivem (CHASSOT, 2000, p. 19). 7 Manuel Calvo Hernando. Jornalista espanhol. Atua h cinco dcadas como divulgador cientfico.

    Representa um dos cones do jornalismo cientfico na Amrica Latina.

  • 14

    A discusso acerca do conceito de cultura cientfica concludo com a

    concepo apresentada por Carlos Vogt no seminrio Estratgias para a Divulgao

    Cientfica na Sociedade do Conhecimento8 e que integra ainda o livro, Cultura

    Cientfica: Desafios, especialmente preparado para aquele seminrio:

    Melhor do que alfabetizao cientfica (traduo para scientific literacy), popularizao/vulgarizao da cincia (traduo para popularization/vulgarization de la science), percepo/compreenso pblica de cincia (traduo para public understanding/awareness of science), a expresso cultura cientfica tem a vantagem de englobar tudo isso e conter ainda, em seu campo de significaes, a idia de que o processo que envolve o desenvolvimento cientfico um processo cultural, quer seja ele considerado do ponto de vista de sua produo, de sua difuso entre pares ou na dinmica social do ensino e da educao, ou ainda, do ponto de vista de sua divulgao na sociedade, como um todo, para o estabelecimento das relaes crticas necessrias entre o cidado e os valores culturais de seu tempo e de sua histria (VOGT, 2006, p. 25)

    Assim, diante do que foi apresentado e do que ser ainda exposto acerca do

    JP, entende-se aqui que esse jornal representou uma importante contribuio em prol

    do estabelecimento de uma cultura cientfica pelo vis da comunicao pblica de

    cincias da sade.

    2.3 COMUNIDADE CIENTFICA

    Um dos conceitos presente no mapa conceitual o de comunidade cientfica.

    Diferente da comunidade geral, composta pelo grande contingente de cidados que

    desempenham papis sociais diversos, a comunidade cientfica constituda pelos

    cientistas. A comunidade geral e a comunidade dos cientistas conjugam-se na

    composio da sociedade.

    Dados de um estudo comparativo acerca da concepo de Robert Merton e

    Thomas Kuhn sobre a natureza social da cincia feito por Kropf e Lima (1999), trazem

    subsdios para melhor compreender o significado de comunidade de cientistas.

    Quando Merton e Kuhn discutem o ethos cientfico e o paradigma/cincia

    normal, respectivamente, conferem uma centralidade noo de comunidade

    8 O seminrio Estratgias para a Divulgao Cientfica na Sociedade do Conhecimento foi realizado

    entre os dias 19 e 20 de outubro de 2006, na Faculdade de Medicina Veterinria e Zootecnia da Universidade de So Paulo (FMVZ-USP), com apoio institucional da Fundao de Amparo Pesquisa do Estado de So Paulo (FAPESP) e do Centro Franco-Brasileiro de Divulgao Tcnica e Cientfica (CenDoTec).

  • 15

    cientfica. Para Kropf e Lima, na anlise que Merton e Kuhn fazem da cincia, esta

    vista como prtica que se define e processa a partir de um conjunto de crenas,

    princpios e normas compartilhados por uma determinada coletividade (KROPF e

    LIMA, 1999, p. 567).

    Esta coletividade de cientistas, ou comunidade cientfica, segundo as autoras

    entendida por Merton da seguinte maneira:

    [...] como uma coletividade social dotada de um sistema de valores prprio e relativamente autnoma... que no se define pela concentrao geogrfica de grupos locais de pesquisa reunidos em torno de alguma especialidade ou tema de pesquisa, mas sim pela adeso a normas e valores comuns. O que une os cientistas numa comunidade o fato de que, "embora estejam afastados espacialmente, respondem, em grande medida, s mesmas foras sociais e intelectuais que sobre eles incidem". essa coletividade que fornece os critrios e mecanismos de validao social do trabalho cientfico, atravs de um sistema de controle institucionalizado (p. 568).

    Quando discutem Khun e a sua concepo de comunidade cientfica, as

    autoras entendem haver uma proximidade com a concepo de Merton, conforme pode

    ser constatado:

    A comunidade cientfica, enquanto unidade produtora e legitimadora do conhecimento cientfico, a noo que permite conferir operacionalidade tanto ao conceito de paradigma quanto ao de cincia normal... Ser membro da comunidade cientfica, ter sido formado e estar inserido numa slida e estvel rede de compromissos compartilhados, compromissos que envolvem tanto aspectos cognitivos quanto valores e crenas sociais... a comunidade cientfica o grupo dos indivduos reunidos por elementos comuns em sua educao e aprendizado e caracterizados pela relativa plenitude de sua comunicao profissional e relativa unanimidade de seu julgamento profissional. Portanto, as comunidades cientficas devem ser empiricamente identificadas no pela adeso a certos temas da pesquisa, mas, sobretudo, pelo exame dos padres de educao e comunicao atravs dos quais se constri e se sustenta um sistema de convenes norteador de uma determinada maneira comum de perceber e praticar a cincia (p. 569).

    A implicao do conceito de comunidade cientfica no estudo do JP decorre do

    produto gerado pela atividade da comunidade cientfica que o conhecimento cientfico

    e a sua difuso. O conhecimento cientfico gera uma informao, e esta, por sua vez,

    elaborada na forma de uma comunicao cientfica, cujo conceito a seguir discutido.

    Antes, porm, faz-se necessrio discorrer acerca do campo cientfico.

  • 16

    2.4 CAMPO CIENTFICO

    Este estudo est inserido dentro de um contexto no qual as relaes cincia e

    sociedade, as formas de organizao, o investimento em tecnologia de ponta, a

    delimitao de grupos de especialistas, a produo modular, a informao, a gerao

    de servios e a produo e transmisso da informao, so caractersticas da

    sociedade que se moderniza a partir da dcada de 1950 (CARVALHO e KANISKI,

    2000, p. 34) e ganha ttulos como sociedade ps-moderna, sociedade da informao e

    sociedade do conhecimento.

    Embora a sociedade do conhecimento possa ser caracterizada pela difuso do

    conhecimento e aqui o JP insere-se como instrumento de divulgao cientfica , a

    cincia especializa-se cada vez mais em subnveis de reas do conhecimento,

    tornando o campo cientfico cada vez mais restrito e especializado, e convertendo o

    cdigo de linguagem em algo cada vez mais hermtico, cognoscvel apenas aos pares

    pertencentes ao mesmo campo. Como em qualquer outra rea de atuao humana, o

    campo cientfico tambm envolve questes de manuteno do controle e do poder, e

    compreensvel o enfrentamento de dificuldades para a comunicao pblica da cincia

    e tecnologia.

    Vasconcellos (2002, p. 82, 83), ao discorrer sobre a obra de Pierre Bourdieu,

    lembra que foi esse socilogo que introduziu a noo de campo social, no artigo Le

    march ds biens savants (1971), no qual propunha a anlise do campo da produo,

    distinguindo entre uma produo erudita e restrita de uma produo destinada ao

    pblico em geral. Em 1975, no artigo La spcificit du champ scientifique et les

    conditions sociais du propre de la raison, Bourdieu introduziu os conceitos de campo

    cientfico e capital cientfico, mostrando que a mesma lgica de mercado, presente em

    todo tipo de produo, tambm se encontra presente no campo cientfico. No ano de

    1980, lembra Vasconcellos, Bourdieu discorreu sobre o campo universitrio, o campo

    do jornalismo e o campo literrio, sempre no contexto da noo de campo como um

    espao social de dominao e de conflitos, onde cada campo possui certa autonomia e

    regras prprias de organizao e de hierarquia social.

    Em 1997, Bordieu proferiu, no Institut National de la Recherche Agronomique

    (INRA), a conferncia intitulada Os usos sociais da cincia, na qual retoma os

    conceitos de campo e campo cientfico. Destacamos a assertiva que Bourdieu faz,

    particularmente acerca do grau de autonomia de um campo ou subcampo cientfico:

  • 17

    O campo cientfico um mundo social e, como tal, faz imposies, solicitaes etc., que so, no entanto, relativamente independentes das presses do mundo social global que o envolve. De fato, as presses externas, sejam de que natureza forem, s se exercem por intermdio do campo, so mediatizadas pela lgica do campo. Uma das manifestaes mais visveis da autonomia do campo sua capacidade de refratar, retraduzindo sob uma forma mais especfica as presses ou as demandas externas (BOURDIEU, 2004, p. 21 e 22).

    Ao correlacionar essas colocaes de Bourdieu com a demanda social pela

    divulgao cientfica, consideramos que no foi de pouca relevncia o que significou a

    produo do JP dentro de uma universidade que se dedicava exclusivamente s

    cincias da sade, com inmeros campos cientficos e, ainda assim ter conseguido a

    adeso dos seus diferentes especialistas. Este estudo no objetivou discutir as

    particularidades dos campos cientficos das cincias da sade, nem tampouco as

    especificidades da UNIFESP/EPM enquanto campo universitrio com os seus vrios

    departamentos e disciplinas, que conforme estabelecido por Bourdieu tem o

    envolvimento de questes de dominao, poder e lutas. No entanto, a partir do

    pensamento desse socilogo, reforamos a opinio de que as aes do Departamento

    de Comunicao da UNIFESP/EPM, como reveladas na anlise do JP, representaram

    uma importante conquista, um vez que se desenvolveram num ambiente bastante

    cooperativo.

    2.5 COMUNICAO CIENTFICA

    A fonte de referncia para discutir a comunicao cientfica pautada pelos

    escritos do fsico e socilogo ingls John Ziman.

    No livro A fora do conhecimento (1981), Ziman dedica um captulo inteiro para

    discutir a comunicao cientfica. Ele inicia sua discusso abordando que os cientistas

    agregam-se no apenas numa comunidade cientfica, mas formam uma comunidade

    intelectual independente de uma instituio. Essa comunidade sem instalaes cria

    elos entre seus membros por meio da comunicao de informaes e conhecimentos.

    Essa comunidade intelectual tambm conhecida pelo nome de Colgio

    Invisvel, conceito que Derek J. C. Price (1973) reelaborou a partir da expresso Novos

    Colgios Invisveis, que foi empregada por Robert Boyle, ainda no sculo 17, para

    descrever um grupo de pesquisadores, que viriam formar a Royal Society of London e

  • 18

    que, embora trabalhassem em diferentes instituies, mantinham contato entre si

    (MUELLER, 1994, p. 310).

    Ziman assevera que a Cincia depende da palavra impressa, essencial tanto

    para o registro de resultados que sero referncias para os membros do Colgio

    Invisvel, quanto necessria por oferecer uma oportunidade crtica, refutao e ao

    aperfeioamento do dado cientfico.

    A cincia, de acordo com esse autor, por natureza um conjunto de

    conhecimentos pblicos no qual o pesquisador acrescenta a sua contribuio pessoal a

    uma atividade que coletiva, e que em suas palavras significa colaborao

    competitiva com contemporneos (ZIMAN, 1981, p. 105).

    A comunicao cientfica compreendida por Ziman como vital para a prpria

    cincia dada a sua relevncia no prprio mago cientfico, j que acompanha o avano

    cientfico foi primeiramente realizada por meio da troca de cartas entre colegas

    cientistas.

    Na pgina 106 de A fora do conhecimento, Ziman ilustra esses primeiros

    exemplos de comunicao cientfica com a cpia da carta de Isaac Newton relatando

    os progressos obtidos com seu telescpio enviada para Henry Oldenburg, datada de

    16 de maro de 1671.

    Posteriormente, e at a Revoluo Cientfica do sculo XVII, segundo Ziman,

    os livros eram a nica maneira de tornar pblicas as novas idias cientficas, at que, a

    partir do final do mesmo sculo, surgiram os peridicos especializados9.

    Os peridicos especializados possibilitaram uma agilidade no trfico das idias,

    imprescindvel para a Cincia moderna, que ao mesmo tempo altamente cooperativa

    e competitiva. Ziman entende que os membros do Colgio Invisvel so devedores

    tanto a seus predecessores quanto a seus contemporneos, e isso devido circulao

    da informao cientfica possibilitada pela utilizao de meios geis como os peridicos

    especializados.

    Dentro do mbito da comunicao cientfica, Ziman aborda ainda dois outros

    subtemas que tem uma aproximao direta no contexto do estudo do JP. Um destes

    9 Segundo Poblacin et al. (2003, p. 498), as publicaes especializadas tiveram incio h quatro

    sculos, quando, em 1655, foi criada a Royal Society of London, que deu incio primeira publicao cientfica: Philosophical Transactions of the Royal Society of London. Dias (1999, pp. 269-277), no artigo Hipertexto: evoluo histrica e efeitos sociais faz uma exposio cronolgica dos avanos tecnolgicos que permearam a histria da escrita, do papiro ao hipertexto, possibilitando a comunicao da informao e, conseqentemente, a comunicao cientfica.

  • 19

    subtemas a comunicao informal. O conhecimento cientfico comunicado por

    escrito e pela palavra falada. A comunicao cientfica realizada informalmente por

    meio de seminrios, palestras e congneres. Ziman cita o exemplo das reunies para a

    leitura de uma comunicao cientfica, que acontecem h 300 anos, todas as quintas-

    feiras, depois do ch das 16h30 na Royal Society of London. Modernamente, a

    comunicao informal acontece tambm na forma de intercmbios. As idias se

    difundem por intermdio das pessoas, declara Ziman (ibid, p. 123).

    Finalmente, Ziman discorre sobre a comunicao cientfica na forma de

    popularizao da cincia, que ele entende como o problema das comunicaes dentro

    da comunidade cientfica [...] trazer o conhecimento cientfico ao grande pblico (p.

    127).

    Possibilitar o alcance do conhecimento cientfico para o grande pblico,

    segundo Ziman, no tarefa banal, tampouco nova. No banal porque a cincia tem

    uma implicao relevante na sociedade. No nova porque os livros de cincia popular

    j circulavam no final do sculo XIX. Antes mesmo da ascenso dos livros de cincia

    popular, o Instituto Real em Londres fundado em 1799, pelo fsico Benjamin Thompson,

    conde de Rumford, apresentava conferncias cientficas populares (ibid, p. 124).

    Quase na concluso do captulo Comunicao Cientfica, Ziman aborda outra

    forma de comunicao cientfica: o jornalismo cientfico que, embora compartilhe da

    mesma fonte dos outros meios que constituem a comunicao cientfica cartas, livros,

    peridicos especializados e comunicao informal , difere quanto ao destinatrio, que,

    ao contrrio da intencionalidade primria da comunicao na comunidade cientfica,

    pretende atingir o cidado comum.

    O jornalismo cientfico, para Ziman, uma decorrncia do fato de que os

    cientistas, particularmente os de alto prestgio, encontram-se por demais

    [...] absorvidos em seus assuntos especficos, muito envolvidos competitivamente, demasiado ocupados com assuntos referentes a administrao, viagens, etc., para se

    empenharem em interpretar suas descobertas para o grande pblico (ibid, p. 133).

    Dessa forma, essa responsabilidade passada s mos de jornalistas

    cientficos, escritores de livros populares e produtores de TV, aos quais Ziman chama

    de grupo de profissionais da comunicao e peritos de comunicao. Quanto a este

    particular consideramos que a divulgao cientfica tambm realizada por outros

    profissionais no mencionados por Ziman. A experincia do JP, por exemplo, revela

  • 20

    que alm dos jornalistas que se especializaram na divulgao cientfica, profissionais

    da sade da prpria UNIFESP/EPM que receberam treinamento para utilizar os meios

    de comunicao tambm faziam divulgao cientfica.

    Ziman tambm discorre acerca de outro tipo de publicao que faz

    comunicao pblica de cincia, mas no necessariamente para toda a sociedade, e

    que, em nossa opinio, tem uma relao indireta com o JP. Ele se refere s revistas do

    gnero da Scientific American que, embora exponham os trabalhos cientficos mais

    recentes, numa linguagem no especializada, so consideradas, por ele, como

    peridicos especializados e, portanto, portadoras de uma Cincia popular de alto

    nvel [...] algo elevada para o cidado comum (ibid, p.133).

    A pesquisa desenvolvida Tatiana Scalco Silveira (2000), que estudou a Cincia

    Hoje (CH) em sua pesquisa de mestrado, empregada aqui como um exemplo daquilo

    que apontado acima por Ziman. Em seu estudo Silveira se reportou ao carter

    erudito da divulgao cientfica, com informaes no necessariamente direcionadas

    populao em geral, contido nas matrias publicas pela CH, revista editada pela

    Sociedade Brasileira Progresso da Cincia (SBPC).

    Silveira observa que a revista CH, durante o perodo estudado (19821998),

    cumpriu os trs objetivos bsicos da atividade de popularizao da cincia:

    educacional, informacional e de mobilizao popular. Confirmou ainda sua hiptese de

    utilizao do espao da CH como ferramenta de ao poltica da comunidade cientfica,

    identificou, contudo que a linguagem da revista no era uma linguagem totalmente

    acessvel:

    [...] rudos de comunicao foram fortalecidos e a revista (teve) dificuldades em atingir seu pblico-alvo. Ao manter uma linguagem difcil, como disseram alguns entrevistados, a CH contribuiu para manter a imagem clssica, e mtica, da Cincia (SILVEIRA, 2000 p. 140 e 141).

    Tendo por base o que est acima exposto, conjecturamos que a linguagem

    utilizada para a divulgao cientfica em revistas do gnero da Cincia Hoje e nas

    pginas de cincia dos grandes jornais no de todo cognoscvel para o pblico em

    geral, e sim para uma populao mais escolarizada que a mdia dos cidados, ou com

    interesses mais especficos.

  • 21

    Contudo, ressaltamos aqui um elo entre divulgao e comunidade cientfica,

    como representado no mapa conceitual, defendendo a idia de que a divulgao

    cientfica importante tambm para a comunidade cientfica.

    A afirmao de Ziman de que a cincia popular de alto nvel inestimvel

    como leitura de base para o prprio cientista em atividade (p. 133) permite uma

    aproximao com o estudo acerca do JP, que era lido por especialistas e

    pesquisadores da rea da sade, que representavam, por sua vez, um significativo

    segmento de leitores do jornal.

    Ziman fala de uma atividade comum a todo pesquisador que a tarefa de

    manter-se a par da literatura relativa s pesquisas no campo de cada especialidade, e

    que esta atividade vai-se transformando [...] num trabalho de tempo integral (p.133). A

    atualizao sistemtica algo muito importante para todo pesquisador. Em vista disso,

    embora o JP no pudesse ser considerado como uma literatura cientfica popular de

    alto nvel, ainda assim, entendemos que, ao veicular os resultados das mais recentes

    pesquisas na rea das cincias da sade, como fazia, e ao publicar regularmente uma

    lista de todas as teses de mestrado e doutorado defendidas na UNIFESP/EPM no ms

    anterior da edio vigente, entendemos que ele representou um importante

    instrumento de consulta mesmo para os especialistas.

    Um exemplo de que esse tipo de literatura pode funcionar como uma fonte de

    divulgao cientfica vem do prprio JP, edio 165, maro de 2002.

    Em entrevista10 concedida ao jornalista Rodrigo Pena Majela, o oncologista

    Chris Williams11, editor-chefe do Grupo de Oncologia da Colaborao Cochrane

    Seo Oxford (Reino Unido), entidade que desenvolve pesquisas sobre a medicina

    baseada em evidncias, deu o seguinte depoimento:

    Uma importante fonte de atualizao para os mdicos pode estar na sala de espera do prprio consultrio pacientes que lem tudo sobre a doena que possuem (WILLIAMS, 2002, p. 165).

    Mais adiante, no artigo em questo, Williams continua:

    10

    O objetivo principal da matria era ressaltar a relevncia da Colaborao Cochrane que ao realizar e divulgar revises sistemticas de pesquisas mdicas de todo o mundo fornece subsdios para uma medicina baseada em evidncias. 11

    Esta entrevista pode ser lida na ntegra na pgina da Internet do JP que continua disponvel no portal da UNIFESP/EPM. Disponvel em http://www.unifesp.br/comunicacao/jpta/ed165/entrev.htm

  • 22

    [...] muitos profissionais tm tomado decises inspiradas apenas na interpretao pessoal de uma ou duas pesquisas. Lem um artigo numa publicao respeitada e pensam: Saiu nesta revista, deve ser verdade. Vamos ignorar as experincias que apontaram outros resultados (WILLIAMS, 2002, p. 165).

    Na linha do raciocnio de Williams abstrai-se a idia de que a divulgao

    cientfica em cincias da sade, no contexto de uma medicina baseada em evidncias,

    pode ser mais um elemento a contribuir para a conduta mais adequada no atendimento

    ao paciente.

    Como o JP era um jornal publicado sob o patrocnio e o conselho de uma

    universidade altamente especializada na pesquisa cientfica na rea das cincias da

    sade, consideramos que os profissionais da rea podiam acessar pelas pginas do

    jornal informaes cientficas j revisadas por especialistas. Essas informaes,

    seguindo o ritual da publicao cientfica levariam um tempo considervel para serem

    veiculadas em peridicos cientficos. Embora tais informaes fossem veiculadas como

    matrias que empregavam uma linguagem mais direcionada ao grande pblico e

    dessa forma o JP cumpria seu papel de divulgador cientfico sugerimos que ainda

    assim, representavam uma importante contribuio para a comunidade especializada

    dos profissionais da sade.

    H outra informao trazida das pginas do JP, que mostra uma importante

    contribuio da equipe de comunicao, que, segundo entendemos, colocava a

    UNIFESP/EPM como um centro de referncia tambm para a comunicao de cincia

    popular de alto nvel. Fazemos referncia informao noticiada na edio 153, de

    maro de 2001, sobre o lanamento da revista Sade Paulista.12

    Para encerrar a discusso sobre o conceito de comunicao cientfica,

    resgatamos o pensamento de Ziman sobre o problema da comunicao na

    popularizao da cincia, entendida aqui como divulgao cientfica e neste estudo

    particularizada rea das cincias da sade. Primeiramente pelo fato de que

    [...] a linguagem na qual a maior parte das idias cientficas modernas expressa e explicadas leva anos para ser aprendida, no podendo ser parafraseada com vistas a uma compreenso mais fcil. (ibid, p.133)

    12 A revista Sade Paulista produzida pelo Departamento de Comunicao da UNIFESP/EPM, destinava-se a atingir um publicado especfico, o dos profissionais da sade. Esta revista juntava-se aos produtos comunicacionais da universidade, a saber, ao prprio JP, ao Jornal da Paulista Informa (JPInforma ou JPI), ao Manual Corra que a imprensa vem a, ao site Sade Brasil (este ficou mais como um projeto do que como uma ao efetiva) e s palestras, workshops e pelo menos um curso que discutiam a divulgao cientfica em cincias da sade.

  • 23

    Num outro aspecto a dificuldade est na falta de instruo:

    virtualmente impossvel discorrer sobre as novas descobertas mais elementares, para gente que nem sequer possui os rudimentos dos conhecimentos anteriores acerca do assunto (p. 133).

    Como solucionar esta grande dificuldade com relao comunicao pblica

    de Cincia? Propomos que o estudo do JP apresenta uma possvel resposta13.

    Nesse sentido, no decorrer da anlise do jornal, o quadro Coluna

    Comunicao14 criado com informaes extradas de matrias que foram veiculadas

    na coluna Comunicao do JP, publicada da edio 131, de maio de 1999, at a

    edio 157, de julho de 2002, discutido a seguir, indica como no nosso entender,

    buscava-se na UNIFESP/EPM a diminuio da distncia entre pesquisadores e

    divulgadores cientficos visando uma comunicao mais efetiva entre a universidade

    produtora do conhecimento cientfico e a populao.

    A equipe de comunicao da UNIFESP/EPM, assessorada por especialistas da

    sade, passou a promover na universidade, encontros, workshops e em pelo menos

    um curso (documentado) de aperfeioamento em sade, para jornalistas, divulgadores

    cientficos e para os especialistas da rea da sade. Essas aes objetivavam diminuir

    distncias, tratadas por Ziman como incompatibilidade de gnios entre o pesquisador

    e o jornalista (p. 134).

    Essas aes que nos planos da equipe de comunicao da universidade

    deveriam perdurar, mas que acabaram ao mesmo tempo em que o JP deixou de

    circular promoveriam encontros regulares com pesquisadores da sade e divulgadores

    cientficos, melhorando o dilogo entre ambos, e principalmente fornecendo subsdios

    cientficos para os no-especialistas da rea da sade que se propunham a divulgar a

    informao cientfica gerada na universidade, com garantias de que no incorreriam em

    erros que pudessem prejudicar aqueles que lessem as informaes divulgadas.

    A assessoria especializada esteve presente tambm no quadro da equipe

    direta do JP, como pode ser verificado no Expediente do jornal que trouxe por muitas

    edies o nome do mdico Cludio Csillag, como editor de texto do jornal.

    13

    Retomamos o assunto ao discutir a terceira fase do JP, no capitulo 7 deste estudo. 14

    Melhor explicao quando, neste estudo, discuto a terceira fase do JP.

  • 24

    O JP pode ser entendido como um veculo de comunicao cientfica que,

    pelas informaes acima discutidas atendia s prerrogativas de uma divulgao

    cientfica feita com acurcia.

    Na seqncia apresentada a discusso sobre os conceitos presentes no

    mapa conceitual de difuso do conhecimento, disseminao cientfica e divulgao

    cientfica, com vistas a atender hiptese inicial deste estudo acerca da considerao

    do JP como um instrumento de divulgao cientfica.

    2.6 DIFUSO, DISSEMINAO E DIVULGAO CIENTFICA

    O JP, em seu sentido amplo de veculo de comunicao, a exemplo de outros

    jornais, era um instrumento de difuso de informaes. Pelo fato de ser um jornal

    universitrio, lidava com a especificidade das informaes cientficas, e, consoante s

    caractersticas da UNIFESP/EPM no perodo correspondente sua trajetria, tais

    informaes circunscreviam-se rea das cincias da sade. Pelo teor do projeto

    editorial do jornal, a informao cientfica veiculada em suas pginas no era publicada

    com o mesmo cdigo de linguagem utilizado pelos pesquisadores e cientistas em suas

    comunicaes oficiais e sim utilizando a linguagem da divulgao cientfica.

    Quando pesquisadores e cientistas comunicam os resultados de suas

    pesquisas a seus pares, empregam uma terminologia lingstica exclusiva. Com

    relao ao JP, contudo, os jornalistas coletavam essas mesmas informaes, advindas

    da comunidade cientfica e, de volta editoria do jornal, reelaboravam o material

    coletado formatando-o em textos jornalsticos jornalismo de divulgao , utilizando

    uma linguagem acessvel ao pblico leigo, constituindo assim as matrias para

    publicao no jornal. Exemplos desses textos, enquanto produtos dessa elaborao

    jornalstica podem ser verificados nas cpias de pginas do jornal que constam nos

    anexos e apndices deste trabalho.

    Depois de impresso, o jornal difundia informaes que em primeira instncia

    destinavam-se disseminao para a comunidade cientfica, e que no formato de

    textos jornalsticos possibilitavam a apreenso pela comunidade ampliada porque

    constituiam-se como material de divulgao cientfica.

    Difuso, disseminao e divulgao so [termos], muitas vezes, utilizados sem

    rigor conceitual declara Hernndez Caadas (1987, p. 25). Por isso, para estabelecer

  • 25

    melhor qual conceito cada uma dessas palavras carrega neste trabalho, este estudo

    apoia-se nas definies propostas por Wilson da Costa Bueno, um dos primeiros

    tericos da divulgao cientfica no Brasil, particularmente do Jornalismo Cientfico, que

    referenda muitos dos trabalhos pesquisados durante o processo de estudo do JP,

    dentre esses o de Massarani (1998), Silveira (2000), Pietri (2003), Carneiro (2004) e

    Aldifoni (2005).

    Bueno, que defendeu sua tese de doutorado, Jornalismo Cientfico no Brasil:

    os compromissos de uma prtica dependente, no ano de 1985, em entrevista

    concedida revista Pensamento Comunicacional Latino Americano (PCLA), lembra

    que no existia, no Brasil, nenhum especialista em jornalismo cientfico que pudesse

    orientar sua pesquisa, mas que seu orientador aceitou o desafio tornando-se este,

    posteriormente, tambm um especialista na rea (BALDO, 2002 s/data). Essa

    entrevista revela o seu pioneirismo na rea.

    No mesmo ano da defesa de seu doutorado, Bueno escreveu um texto que,

    entendemos poder ser considerado um clssico, que utilizado na maioria dos

    trabalhos consultados por ocasio da reviso bibliogrfica deste estudo, e que

    procuram, por sua vez, definir os termos difuso, disseminao e divulgao. Desse

    texto em questo so apresentados a seguir os conceitos-chave deste estudo.

    DIFUSO:

    O conceito de difuso tem limites bastante amplos. Na prtica, faz referncia a todo e qualquer processo ou recurso utilizado para a veiculao de informaes cientficas e tecnolgicas. A extenso do conceito permite abranger os peridicos especializados, os bancos de dados, os sistemas de informao acoplados aos institutos e centros de pesquisa, os servios de alerta das bibliotecas, as reunies cientficas (congressos, simpsios e seminrios), as aes especializadas das publicaes de carter geral, as pginas de cincia e tecnologia dos jornais e revistas, os programas de rdio e televiso dedicados cincia e tecnologia, o cinema dito cientfico e at mesmo os chamados colgios invisveis (BUENO, 1985, p. 1420).

    DISSEMINAO:

    O processo de disseminao da cincia e da tecnologia pressupe a transferncia de informaes cientficas e tecnolgicas, transcritas em cdigos especializados, a um pblico seleto, formado por especialistas (BUENO, 1985, p. 1421).

  • 26

    DIVULGAO:

    A divulgao cientfica pressupe um processo de recodificao, isto , a transposio de uma linguagem especializada para uma linguagem no especializada, com objetivo de tornar o contedo acessvel a uma vasta audincia [...] compreende a utilizao de recursos, tcnicas e processos para a veiculao de informaes cientficas e tecnolgicas ao pblico em geral (BUENO, 1985, p. 1422).

    Bueno no foi necessariamente original no esclarecimento dos termos em

    questo porque segundo Massarani baseou-se em Pasquali15, (MASSARANI, 1998, p.

    18).

    Pasquali (1978) atribui a seguinte conceituao aos termos:

    DIFUSO:

    o envio de mensagens elaboradas em cdigos ou linguagens universalmente compreensveis para a totalidade das pessoas.

    DISSEMINAO:

    o envio de mensagens elaboradas em linguagens especializadas, ou seja, transcritas em cdigos especializados, a receptores selecionados e restritos, formado por especialistas. Pode ser feita intrapares (especialistas da mesma rea) ou extrapares (especialistas de reas diferentes).

    DIVULGAO:

    o envio de mensagens elaboradas mediante a transcodificao de linguagens, transformando-as em linguagens acessveis, para a totalidade do universo receptor.

    Uma ressalva pessoal enquanto pesquisador, neste estudo do JP, feita

    quanto conceituao de disseminao elaborada por Pasquali, que fala de uma

    disseminao extrapares, significando a comunicao cientfica dirigida a especialistas

    de reas diferentes da fonte original da informao. No mapa conceitual propomos que

    este aspecto particular da conceituao de Pasquali pode ser entendida como uma

    forma de divulgao cientfica, diferenciada da divulgao cientfica dirigida para o

    15

    O Venezuelano Antonio Pasquali foi pioneiro a partir da dcada de 1960 na formao do pensamento e estudo latino-americano de comunicao (CARVALHO, 2000. PCLA, vol. 1, n. 2, jan-mar, 2000).

  • 27

    grande pblico. A revista Sade Paulista, tomada como exemplo. Ela no era uma

    revista de disseminao cientfica, estrito senso, mas sim, segundo seus editores, uma

    publicao voltada principalmente para um pblico interessado por questes da rea

    de sade: mdicos, enfermeiros, alm de professores e alunos universitrios (JP,

    2001:153, p. 2). Entendemos que a revista Sade Paulista era uma revista de

    divulgao cientfica destinada a especialistas, escrita numa linguagem um pouco mais

    sofisticada que a do JP, mas que no empregava como norma de escrita a linguagem

    cientfica oficial.

    2.7 JORNALISMO CIEntfico

    Concluindo esta sesso de definies dos termos16 constantes no mapa

    conceitual preparado para sintetizar a referncia ao JP como um instrumento de

    divulgao cientfica, cabe ainda conceituar Jornalismo Cientfico, que feito a partir do

    referencial de Marques de Melo, que foi o orientador da tese de doutorado de Bueno.

    Para Marques de Melo o jornalismo cientfico:

    Deve ser uma atividade principalmente educativa. Deve ser dirigido grande massa da nossa populao e no apenas sua elite. Deve promover a popularizao do conhecimento que est sendo produzido nas nossas universidades e centros de pesquisa, de modo a contribuir para a superao dos muitos problemas que o povo enfrenta. Deve utilizar uma linguagem capaz de permitir o entendimento das informaes pelo cidado comum. Deve gerar o desejo do conhecimento permanente, despertando interesse pelos processos cientficos e no pelos fatos isolados e seus personagens. Deve discutir a poltica cientfica, conscientizando a populao que paga impostos para participar das decises sobre a alocao de recursos que significam o estabelecimento de prioridades na produo do saber. Deve realizar um trabalho de iniciao dos jovens ao mundo do conhecimento e de educao continuada dos adultos ( MARQUES DE MELO, 1982, p. 21).

    16

    Do mapa conceitual foram conceituados apenas os termos que tm uma relao direta ao objeto deste estudo e que fornecem subsdios para responder hiptese original do JP ter sido um instrumento de comunicao cientfica em cincias da sade, difusor de informaes articuladas como divulgao cientfica em cincias da sade.

  • 28

    2.8 DELINEAMENTO METODOLGICO DA PESQUISA

    Esta tese foi organizada de modo a responder questo central acerca da

    identidade do JP ao longo de sua trajetria. De acordo com o que Rey (1993, p. 21)

    preconiza como pesquisa, este estudo props-se a investigar de forma sistematizada e

    minuciosa o JP com a finalidade de descobrir e estabelecer fatos e princpios relativos

    hiptese central proposta e ao seu objetivo precpuo. A busca deste estudo para

    definir a identidade, as caractersticas e o que representou o JP coadunam-se com o

    que Gil (2002, p. 17) estabelece como intencionalidades da atividade de pesquisa que

    procura, por meio de procedimentos racionais e sistemticos, oferecer respostas a

    problemas previamente propostos.

    Devido sua prpria natureza, o objeto de estudo foi analisado sob a

    perspectiva da pesquisa qualitativa que, segundo Minayo (1998),

    [...] incorpora a questo do significado e da intencionalidade como inerentes aos atos, s relaes, e s estruturas sociais [e] trabalha com um universo de significados, motivos, aspiraes, crenas, valores e atitudes, o que corresponde a um espao mais profundo das relaes, dos processos e dos fenmenos que no podem ser reduzidos operacionalizao de variveis (p. 21).

    Godoy (1995, p. 62) e Serapioni (2000, p. 191), por sua vez, entendem que a

    pesquisa qualitativa caracteriza-se pela anlise exploratria, descritiva e indutiva.

    Este estudo enquanto pesquisa qualitativa, possibilitou desvelar o JP e sua

    contribuio como veculo democrtico de comunicao pblica de cincias da sade,

    mas, acima de tudo, revelou sua contribuio na divulgao cientfica da rea de

    sade.

    A pesquisa qualitativa pode apresentar dificuldades maiores do que a pesquisa

    quantitativa, como ressaltam Falco17 (2003) e Oliveira18 (2004). Isso porque, na

    pesquisa qualitativa, a organizao e a anlise do material coletado demandam um

    determinado tempo para criar uma sistematizao de anlise dos dados coletados, o

    que coloca em risco a consecuo desta tarefa.

    17 FALCO, M.T.C. Pesquisa Qualitativa: Potencialidades e Limites. Trabalho apresentado no Frum Regional de Pesquisa em Enfermagem: Novas abordagens terico-metodolgicas e respectivos resultados. Escola de Enfermagem - Universidade de So Paulo/ 15 e 16 abril 2003 (slide 15). 18 OLIVEIRA, F. A. de. Metodologia Cientfica em Ateno Primria Sade no Brasil. Trabalho apresentado no 6 Congresso Brasileiro de Medicina de Famlia e Comunidade Rio de Janeiro, RJ - abril de 2004 (slide 19).

  • 29

    Lakatos e Marconi (2001, p. 175) discorrem sobre a possibilidade de diferentes

    tcnicas serem empregadas pela cincia para buscar seus propsitos pr-

    estabelecidos, e Godoy (1995, p. 21) discute trs diferentes abordagens da pesquisa

    qualitativa: a pesquisa documental, o estudo de caso e a etnografia.

    Embora esta pesquisa no tenha adotado exclusivamente uma nica tcnica,

    sendo a sua nfase associada anlise histrica da trajetria do JP, ela foi orientada

    pelos princpios fundamentais da pesquisa documental. Para Gil (2002, p. 45-47),

    embora haja semelhanas entre pesquisa documental e bibliogrfica, na essncia a

    diferena entre ambas est na natureza das fontes,

    [...] enquanto a pesquisa bibliogrfica se utiliza fundamentalmente das contribuies dos diversos autores sobre determinado assunto, a pesquisa documental vale-se de materiais que no receberam ainda um tratamento analtico... (p. 45).

    A anlise documental do JP representava em si uma grande tarefa, levando em

    considerao que o jornal circulou durante 16 anos e foram impressas 185 edies

    mensais, configurando um total de 2.554 pginas de informaes a serem analisadas.

    Devido sua natureza de divulgao cientfica inserida tanto no contexto universitrio

    quanto no de democratizao do conhecimento e de empoderamento19 em sade, o

    estudo do JP de