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Elisângela Fernandes Semedo
Tema:
A URZELA E A SUA IMPORTANCIA NA ECONOMIA DAS ILHAS DE
CABO VERDE (séc. XVIII-XIX)
Trabalho Científico do Fim do Curso Apresentado ao ISE para a Obtenção de
Grau de Licenciatura em Ensino História, sob a orientação do Mestre Arlindo
Mendes
3
Aprovação
O Júri
_____________________________________________
_____________________________________________
_____________________________________________
Praia __/__/_
4
Dedicatória
Dedico este trabalho a memória dos meus pais, Manuel Semedo e Inês Silva Fernandes.
5
Agradecimentos
Os meus agradecimentos vão:
▪ Para o meu orientador Mestre Arlindo Mendes que me deu muito apoio, força e também
muito ânimo durante a realização do trabalho.
▪ Á minha família de uma forma geral e em particular aos meus queridos irmãos, cunhada,
sobrinhas e sobrinhos que sempre mostraram disponível em me ajudar durante a realização do
trabalho e também pelo encorajamento, carinho e amor que todos têm por mim.
▪ Á todos os meus professores que me transmitiu conhecimentos valiosos ao longo desses
anos.
▪ Á todos os meus colegas que me incentivou durante o curso e durante este trabalho e
também ao professor que me fez a correcção da escrita do trabalho.
6
Pensamento do dia
“Aqueles que não se conseguem lembrar do passado estão condenados a repeti-
lo”.
George Santayana
7
Abreviaturas
AHN – Arquivo Histórico Nacional
B. O. – Boletim Oficial
Cf. – Confrontar
Coord. – Coordenação, coordenador, coordenado
Cx. – Caixa
P. – Página
N.º – Número
IPC – Instituto de Promoção cultural
IICT/INIC – Instituto de Investigação Científica Tropical/Instituto Instituto Nacional de
Investigação Científica.
IN – Imprensa Nacional
8
Índice
Introdução__________________________________________________ 8
I – Enquadramento histórico e geográfico Cabo Verde______________ 10
II - Conceito de Urzela_________________________________________ 13
2.1 – Importância na economia_____________________________ 14
2.2– Processo de exploração da urzela_______________________14
2.2.1 – Arrendamento garantido por cartas régias______ 17
2.2.2 – Administração directa pela fazenda real__________ 27
2.2.3 – Regime de comércio livre______________________ 30
III – Apanha e Comercialização da Urzela________________________ 31
3.1– Exportação da urzela__________________________________ 31
IV – Contratos de arrendamento________________________________ 38
V – Decadência da exploração da urzela__________________________ 41
Conclusão___________________________________________________ 41
Bibliografia__________________________________________________ 45
Anexos______________________________________________________ 47
9
INTRODUÇÃO
Este trabalho foi realizado com objectivo de obter o grau de Licenciatura em Ensino
de História, proposto pelo Instituto Superior de Educação de Educação.
Deste modo, o tema que ora propomos abordar é – A urzela e a sua importância na
vida económica das ilhas de Cabo Verde.
Com esta abordagem, pretendemos não só conhecer e dar a conhecer os diversos
contornos que envolvem o processo da exploração da urzela mas também, compreender a
importância económica de que teve este produto, em articulação com outras mercadorias
nomeadamente, sal, anil e purgueira, na vida do povo das ilhas de Cabo Verde, entre os finais
do XVIII e os meados do século XIX.
Trata-se de um trabalho de investigação cuja abordagem se enquadra numa perspectiva
original e inovadora.
Pelo que se sebe, durante um certo período da nossa história, as companhias
monopolistas tinham estabelecidos intensas relações comerciais com Cabo Verde, durante o
qual tendo monopolizado todo o sistema do arrendamento. A urzela, ao que nos parece,
desempenhava um papel preponderante neste contexto, porquanto fazia parte da lista dos
produtos procurados naquela época, como matéria-prima utilizada na indústria têxtil.
Para uma correcta materialização deste propósito, vamos adoptar a metodologia que
nos permite atingir um conhecimento objectivo quanto possível, tendo em conta os
paradigmas preconizados pela metodologia de investigação de História.
Deste modo, o presente trabalho basear-se-á essencialmente numa pesquisa
bibliográfica que abarque a identificação, recolha e tratamento de dados nos diversos
arquivos, nas bibliotecas públicas e privadas. Iremos proceder à consulta ainda de outros
documentos avulsos referentes ao tema em questão. Por últimos, iremos proceder ao processo
de redacção sempre em confronto e cruzamento entre os dados cuidadosa e
10
metodologicamente seleccionados, de acordo com as normas recomendadas pela investigação
científica.
Para além das preocupações que se prendem com a introdução e conclusão,
estruturalmente, a presente monografia encontra-se organizada em vários itens ou capítulos
cujo conteúdo se distribui de seguinte forma:
No primeiro capítulo, iremos considerar o enquadramento histórico e geográfico de
Cabo Verde com vista a poder facilitar a conhecimento do contexto em que o comércio da
urzela se inseriu no período em estudo.
No capítulo seguinte, ocupar-nos-emos do nome ou conceito científico com o qual se
identifica a urzela, da técnica da sua extracção e transformação e dos contornos da exploração
e problemática da sua comercialização e, se possível, a sua utilidade.
No terceiro ponto, analisar-se-á o processo de arrendamento e a criação do sistema de
monopólio utilizado.
No quarto momento pretendemos abordar o papel de que se revestem companhias do
comércio na comercialização da urzela.
No quinto parágrafo, procuraremos compreender os principais motivos que estiveram
na origem da decadência de exploração de urzela em Cabo Verde no período em questão.
Eventualmente, poderemos incluir no final deste trabalho, alguns elementos
subsidiários que entendemos ser importantes, como anexos, na sua compreensão do presente
trabalho mais clara e objectiva possível.
Trata-se de um trabalho carácter investigativo que cuja abordagem enquadra-se numa
perspectiva original e inovadora
11
I – ENQUADRAMENTO HISTÓRICO E GEOGRÁFICO DE CABO
VERDE
A descoberta das ilhas de Cabo Verde, é muito discutida pelos historiadores nacionais
e estrangeiros. “Embora os Portugueses reclamem para si, a “descoberta” das ilhas, na
opinião de muitos Historiadores, estas já eram conhecidas das populações do continente
Africano e até mesmo dos gregos e dos geógrafos árabes”1.
“Segundo a Tese Oficial as ilhas de Cabo Verde foram descobertas por navegadores
Portugueses entre 1460 e 1462, em duas viagens sucessivas, primeiramente foi descoberta as
ilhas do grupo oriental (Santiago, fogo, Maio, Boa Vista e Sal) deu – se em 1460, ainda em
vida do Infante D. Henrique (13 de Novembro de 1460), D. Afonso V doou as ilhas ao Infante
D. Fernando por carta régia de 3 de Dezembro do mesmo ano” 2.
As ilhas do grupo ocidental (S. Nicolau, S. Vicente, S. Antão, Santa Luzia, Brava, os
ilhéus Raso e Branco) foram descobertas mais tarde por Diogo Afonso, escudeiro do Infante
D. Fernando. O nome daquele escudeiro foi descobridor, numa Carta Régia de doação de 29
de Outubro de 1462. “O grupo das ilhas ocidental foi descoberto num Inverno, conclusão esta
que pode seguramente deduzir – se das festividades do calendário litúrgico com que foram
baptizados para a história. A ilha de S. Nicolau (6 de Dezembro), ilha de Santa Luzia (13 de
Dezembro), ilha de Santo Antão (17 de Janeiro), ilha de S. Vicente (22 de Janeiro) ” 3.
1 ANDADE, Elisa, As ilhas de Cabo Verde da “Descoberta” á independência nacional (1460 – 1975), edição,
L` Harmattan, Paris, 1996, p.32. 2 CARREIRA, António, Cabo Verde -Formação e Extinção de uma Sociedade Escravocrata (1460 – 1878), 3ª
edição, Instituto de Promoção Cultural – Praia, pp. 31 – 32. 3 BRÁSIO, Padre António, Descobrimento, Povoamento, Evangelização do Arquipélago de Cabo Verde, Revista
Semestral, nº 10, Julho 1962, Lisboa, p.56.
12
O processo de povoamento iniciou-se dois anos após a sua descoberta. Este não foi
feito em simultâneo. As primeiras ilhas a serem povoadas foram as de Santiago e Fogo, por
apresentar melhores condições para prática da agricultura e criação de gado, actividades
económicas prioritários, naquela altura para Cabo Verde.
O grupo barlavento foi povoado mais tarde, pois, o número de negros era muito
reduzido. É de se referir ainda que no seu povoamento foram utilizados mestiços provenientes
das outras ilhas já povoadas e os colonos vindos da metrópole pertencentes a diversas classes
sociais.
O povoamento de Cabo Verde foi a princípio difícil, por várias razões, as quais
passamos a referir algumas: Cabo Verde não tinha condições que pudessem atrair a fixação
dos moradores, o clima era quente e seco, não produziam vegetais que seriam o hábito de
dieta do povoador Europeu como: trigo, cevada, vinha azeitona de entre outras e ainda a
comunicação era difícil por ser longe do reino.
Para ultrapassar o impasse do povoamento de Cabo Verde a coroa emitiu: A Carta de
1466 que concedia “As liberdades e franquezas consistem no essencial, na permissão, ou
melhor, na despenalização dos fixados em Santiago, de comerciarem com as sociedades
ribeirinhas do continente fronteiro e com as da Europa” 4.
Por conseguinte Santiago, conseguiu atrair algumas pessoas para o seu povoamento e
um pólo de imigração, porque o comércio entre África e a Europa era uma fonte de grande
rendimento económico, o que lhes permitia um rápido enriquecimento. Pois a Carta Régia de
1466, além de outorgar direitos legais aos moradores de Santiago para efectuaram o comércio
entre a África e a Europa, também concedia lhes isenções fiscais, nas suas trocas comercias.
“Passando três anos dois sevilhanos obtinham o monopólio da urzela. Em 12 de
Março de 1471 D. Afonso V nomeava para Santiago o seu primeiro almoxarife na pessoa de
Diogo Lopes, criado de Diogo da Silveira” 5.
“ Outro diploma da chancelaria afonsina, de 30 de Setembro de 1481, investia um
inquiridor dos mais altos poderes fiscais e judiciais, a quem os mesmos Capitães – mores
deviam a obediência e cooperação leal, sob perda de cargo. Referem – se os diplomas apenas
á ilha de Santiago, á qual chamam simplesmente “a ilha de Cabo Verde”, ou porque era já
então a mais importante delas todas, ou por ser a única povoada” 6.
4 SILVA, António Leão Correia e, Histórias de um Sahel insular, 2ª edição, Praia, 1996, p.20.
5 BRÁSIO, Padre António, op. cit., p.78.
6 BRÁSIO, Padre António, op. cit., p.78.
13
Foram concedidos muitos privilégios e incentivos pela coroa às pessoas que quisessem
fixar em Cabo Verde, em 1462, começando pela ilha de Santiago, seguindo as restantes,
lentamente, já que foi preciso criar tudo.
“Os produtos que mais atraíam os povoadores eram a urzela, sal de S. Pedro e Porto
Grande, o gado vacum entre outras” 7, dos quais pretendemos abordar a urzela.
Cabo Verde é um estado insular da África ocidental, constituído pelo arquipélago do
mesmo nome, situado no Oceano atlântico, a cerca de 500Km da Costa do Senegal.
“O arquipélago de Cabo Verde é constituído por 14 ilhas, das quais 10 são principais
e quatro são menores. As mais importantes são a de Santiago, onde se encontra a capital,
Santo Antão, São Vicente, Santa Luzia, São Nicolau, Sal, Boa Vista, Maio, Fogo e Brava” 8.
A maior parte das ilhas é de relevo montanhoso e de origem vulcânica, que culmina no
vulcão do pico na ilha do Fogo com (2829m), ainda em actividade.
Os cursos fluviais são curtas e pouco numerosos, mas possuem uma grande
importância, pois favorecem o desenvolvimento de algumas florestas tropicais nas suas
margens.
O clima é quente, com cerca de 25ºc de temperatura média ao nível do mar, mas muito
seco, pois as precipitações não ultrapassam, geralmente, os 200mm anuais. Esta extrema
secura condiciona em grande parte o desenvolvimento da agricultura e actividade agro-
pecuárias que se limita á cultura de produtos de subsistência, como o milho, a mandioca,
feijão e a batata. “As culturas destinadas á exportação (banana, café, noz de coco) não estão
demasiado disseminadas. Uma actividade importante é a pesca, que se destina tanto ao
consumo interno como ao mercado externo. Há também a destacar a obtenção de sal; nos
últimos anos está – se a desenvolver o turismo especialmente o de luxo. O país depende, no
entanto, da ajuda internacional. A excessiva pressão demográfica e o rápido crescimento da
população agravam ainda mais os problemas do país” 9.
“Etnicamente, predominam os mulatos (70%), seguidos dos negros (28%) e de
brancos, que só representam 2%”.10
7 BRÁSIO, Padre António, op. cit., p.83.
8 PACHECO, Rui et al SABATINA, Guia de formação escolar, Marina editores, Setúbal, 1997, p.294.
9 PACHECO, Rui et al SABATINA – op. cit., p.294.
10PACHECO, Rui et al – op., cit.p.294.
14
II – CONCEITO DA URZELA
Urzela – é uma espécie de líquen ou musgo, que nasce espontâneamente nos rochedos
vizinhos ao mar, em todas as ilhas de Cabo Verde com mais frequência em barlavento. Este
líquen é fruticosa, fibrosa, macia, roliça, flexível, de cor cinzenta, sem folhas e dividida em
ramos, é aproveitado ou empregado na tinturaria na Europa para tingimento do pano de seda e
de algodão.
2.1 - A importância da urzela
A urzela teve uma grande importância para a economia Caboverdiana desde a época
do povoamento até princípio do séc. XIX. É impossível falar-se da economia das ilhas, desde
o seu povoamento até o final do séc. XIX sem se referir a urzela.
Nos primeiros anos após o descobrimento em que o povoamento se encontrava ainda
muito incipiente o Infante D. Fernando, então donatário do arquipélago, fez “ (...) trato da
urzela das suas ilhas de Cabo Verde com João de Lugo e Pêro de Lugo Castelhanos
mercadores e moradores em Sevilha”. Mais de qualquer outra espécie a urzela evidencia pela
sua importância económica e passa a ser alvo de arrendamentos e contratos”11
. Com isso
efectuou-se rapidamente o povoamento das ilhas, caso contrário seria muito difícil. A urzela
11
SILVA, António Correia e, “Espaço, Ecológico e Economia interna”, in História Geral de Cabo Verde, vol. I,
2ª edição I.I.C.T/INIC., Praia/Lisboa, 2002.p. 226.
15
era também muito importante porque deixava lucro ao Estado e também para as pessoas que a
apanhava. Este género é um dos melhores ingredientes que entra na composição de tintas,
tanto panos como para algodão e seda; “Era com a riqueza da urzela que se fazia o equilíbrio
do orçamento. Na previsão das receitas de 1838, num total de 82 contos concorria com 24; e
no orçamento de 1842 – 1843, para uma receita total de pouco mais de 95 contos, 45 saiam do
rendimento líquido deste musgo”12
.
Paralelamente ao comércio de escravo que constitui uma das principais fontes de
rendimento económico, haviam ainda diversas actividades de carácter económico realizadas
no arquipélago.
A exploração da urzela, neste contexto desempenhava um papel de grande relevo dado
que este líquen servia como matéria-prima utilizada na preparação de corantes naturais
aplicados no tingimento dos tecidos. Pois ainda não se tinha descoberta técnicas na
preparação química das tintas. Pois, muito cedo a indústria têxtil revelou-se muito antes da
chamada Revolução Industrial.
2.2 - Processo de exploração da urzela
A urzela foi a primeira planta espontânea a ser explorada em regime de monopólio,
pouco tempo depois do descobrimento das ilhas. O maior problema da exploração estava na
sua apanha, uma vez que ela nasce nos lugares de difícil acesso, como nos rochedos vizinhos
ao mar. Em todas as ilhas de Cabo Verde há urzela, mas sempre nos rochedos e costa do mar.
A sua apanha não só é difícil mas também é perigosa. Normalmente quem a apanhava eram os
rapazes por serem fisicamente mais leves e também por terem mais coragem.
Segundo a crónica de José J. Cabral houve muitos óbitos decorrente da sua apanha,
que nem sempre recompensava. A sua colheita era sobretudo nas ilhas de Santa Luzia,
S.Vicente, S. Nicolau, Santo Antão, Brava e Tarrafal de Santiago.
12
Cf. CARREIRA, António, A urzela e o pano de vestir, dois produtos de exportação, Separata da Revista do
Centro de Estudos de Cabo Verde, série de Ciências Humanas, Vol. I – n.º 1, Praia, 1973, pág.12.
16
A apanha da urzela foi irregular até ao séc. XVIII, apesar de ter um grande valor
económico, a exploração da mesma era feita através de contratos de arrendamento
estabelecidos entre a coroa e os particulares.
O primeiro contrato para e exploração desse líquen em Cabo Verde que se tem
conhecimento foi firmado em 1469 com os irmãos João de Pêro e Lugo, Castelhanos, que se
ocupavam da mesma actividade nas ilhas Canárias, depois desse contrato há conhecimento
de foram efectuadas mais de 13 novos contratos incluindo o da Companhia do Grão Pará e
do Maranhão. Só esta empresa extraiu das ilhas 1.858 toneladas de urzela, cujo custo na
origem foi de 250.530 mil réis, tendo em lucro cerca de 210 contos de réis. Houve um outro
contrato da venda da urzela em 12 de Novembro de 1836 entre João António Martins e os
Franceses. “Em 27 de Março de 1837 desembarcou – se do brigue dois amigos, de Manuel
António Martins, na alfandega de goré, 87 sacos de urzela” 13
.
“Em toda a ilha onde se apanha ou colhe a urzela há um comprador privado, essa
pessoa é o feitor da fazenda real e ao mesmo tempo comandante militar, este tomava a urzela
dos urzeleiros não lhes pagavam em dinheiro, mas sim em géneros. Ele vai fazer as
embarcações para os países externos, a maior parte dos lucros é para o comprador não para
as pessoas que apanhavam” 14
.
As pessoas que apanhavam aperiguavam a sua vida para fazer a recolha, e os
compradores privados compravam a um preço que não compensavam as canseiras, e as vezes
eram pagas em géneros alimentícios.
“O modo de comprar, pesar e pagar é a única causa da pouca urzela que se colhe, é
certo que o preço de 25rs.que se paga por cada libra é ténue, atendendo ao risco e trabalho,
que há com aquela colheita”15
. Isto é a sua principal causa da sua diminuta quantidade.
Para melhorar o rendimento da exploração da urzela e facilitar a sua apanha deviam
tomar as seguintes providências, António Carreira entende que: Deve haver em cada ilha um
comprador privativo por ser este género do contrato real, devem porém existir pesos públicos
com pesador jurado, deve fazer – se pagamento pronto, e em metal, devem fixar – se dois dias
inalteráveis em cada semana para a compra da urzela, devem – se aumentar o preço da urzela
a 30rs.
13
BARCELOS, Cristiano José de Senna, Subsídios para História de Cabo Verde e Guiné, parte I, Memórias
apresentadas a Academia Real das Ciências, Lisboa, 1910, p.161. 14
CARREIRA, António, As companhias pombalinas de Grão – Pará e Maranhão e Pernambuco e Paraíba,
editorial presença, Lisboa, 1992, p. 199. 15
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p.9.
17
De libra, devem assistir a esta compra o escrivão e o meirinho da real fazenda, o
primeiro para lançamento em livro rubricado não só das quantidades da compra, mas do nome
do vendedor, e o segundo para servir de pesador, de entre outras providencias citados por
António Carreira, deve haver barcos que levassem os urzeleiros a colher a urzela e depois
teriam que juntar todo o líquen numa ilha não precisava os barcos sair de uma ilha para outra,
encontrar numa ilha que seria mais fácil.
“ Em 1740, o Concelho Ultramarino mandou que fosse arrematada a exploração da
urzela, concorreram Filipe Balesty e Mateus Dutra., o primeiro propôs – se arrendá – la por
seis (6) anos mediante o preço global de 60.000 cruzados, e o segundo ofereceu por doze (12)
anos a quantia de 1200$de réis anuais. O governo optou pelo primeiro e 8 de Novembro de
1740 foi assinado o contrato”16
. O novo contrato foi assinado em 1751, pois o contrato com o
Balesty terminou em 1746.
Em 1751 o contrato foi realizado com José Gomes da Silva o candeias durante o
período de 3 anos. “ Esse contrato consentia a exploração da urzela em Cabo Verde, nos
açores e na madeira, mediante a renda de 23000 cruzados$” 17
. Esse contrato vai durar 7
anos, com o seu término houve um novo contrato que se refere ao de arrendamento da urzela
de Cabo Verde, Açores, Madeira, Peniche e Cascais, pela companhia de Grão Pará e do
Maranhão. “Esta empresa negociou em urzela de 1758 a 1781 ou sejam 24 anos”18
.
Terminando o contrato com a Companhia de Grão Pará e Maranhão, esta ainda
comprou e exportou urzela em regime livre e durante vários anos depois a exploração ter
passado para a “sociedade exclusiva, esta foi ainda a mais desastrosa para a empresa,
causando prejuízos aos habitantes das ilhas e as pessoas da real fazenda, com a sua desastrosa
gerência, o governo arrendou a outra pessoa a exploração da urzela. “Este contrato efectuou –
se em 1778, num período de 6 anos a Domingos da Costa e Manuel Elentério”19
.
O contrato acima referido não teve muito êxito, porque a coroa na indecisão quanto ao
sistema de exploração, levou a aumentar cada vez mais a rede clandestina do produto a
estrangeiros.
16
CARREIRA, António, A urzela e o pano de vestir dois produtos de exportações, das ilhas de Cabo Verde,
p.11.
17
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p.11. 18
CARREIRA, António, A urzela e o pano de vestir dois produtos de exportações, das ilhas de Cabo Verde, p.
11. 19
CARREIRA, António, A urzela e o pano de vestir dois produtos de exportações, das ilhas de Cabo Verde.,
p.12.
18
Posto isso, o governo colonial optou por novos sistemas de exploração,
designadamente, arrendamentos do conjunto de ilhas, garantidos por cartas régias e contratos;
administração directa pela fazenda real e através do regime de comércio livre.
A prática de exploração clandestina prejudicou o erário público porque, não se
controlava a quantidade da sua apanha como impedia a entrada das receitas nos cofres
públicos.
2.2.1 – Arrendamento garantido por Cartas Régias
O êxito da exploração da urzela em Cabo Verde só foi possível, graças á garantia
dadas pela concessão da Carta Régia em que a Coroa outorgava o seu comércio e a sua
exploração, á iniciativa privada.
Segundo António Carreira, historiador que melhor estudou esta temática os contratos
da exploração, respeitantes a Cabo Verde, realizados entre a Coroa e os particulares, previam
uma série de direitos, obrigações, privilégios e isenções, com vista a estabelecer, de uma
forma clara, as regras de procedimentos a fim de evitar eventuais conflitos entre as partes
contratantes.
Para ilustrar esta afirmação passamos a citar os seguintes extractos do referido
contrato:
“1º Comprar toda a urzela apresentada pelos urzeleiros e outros “apanhadores”, e
pequenos negociantes, umas vezes a preço estabelecidos (raramente), outros segundo ás
cotações do mercado do mercado interno;
2º Pagar ao “erário real a importância do contrato em quartéis” (prestações)
trimestrais ou semestrais, para o que teria de aceitar letras e, em um ou outro caso, ainda, o
pagamento de um adicional de 1% sobre o preço da arrematação “ para obras pias, segundo
a prática estabelecida pala lei de todos os rendimentos do estado”;
19
3º Fazer a exportação do líquen “para a praça de Lisboa e em navios portugueses” ou
para praças estrangeiros quando isso fosse determinado pala fazenda real”20
.
As obrigações acima mencionadas explicitam, de uma forma inequívoca, que todos os
que quisessem dedicar-se ao comércio deste produto, teriam que seguir as normas já referidas,
evitando assim, práticas das vendas clandestinas da urzela.
Por outro lado, a imposição destas regras veria contribuir para disciplinar e controlar o
processo da sua exploração, o que tornou mais fácil a fiscalização da quantidade de
mercadorias recolhidas a fim de se poder aplicar as quais as taxas devidas, garantindo assim
uma arrecadação das receitas para o cofre público.
Deste modo, um comprador fixo era obrigado a pagar os impostos, contribuindo assim
para que o estado pudesse arrecadar algumas receitas decorrentes deste tipo exploração. Por
outro lado, os próprios compradores podiam ter acesso a garantido ao mercado da mesma.
No que concerne à questão de aplicação dos direitos, privilégios e isenção ficaria
previsto, segundo Carreira, o seguinte:
“1º O exclusivo da compra e da exportação da urzela, umas vezes de
modo expresso, outras apenas subentendido; 2º O benefício da isenção
de direitos de exportação (por exemplo, na renovação de direito de
exportação de 1828 e 1838 – 1840); o da armazenagem (em Lisboa)
como “gozam todos os mais contratadores das rendas públicas”, e o
“gozo de todos os privilégios têm em géneros do estanque real” 21
.
Em face dos conteúdos deste documento, como já nos referimos os compradores da
urzela encontravam-se munidos de direitos, privilégios e isenções, isso conduzia à uma via
que proporcionasse maiores rendimentos para pessoas ligadas a estas actividades económicas,
principalmente as que estiveram directamente ligadas a todo o processo de exportação e
comercialização deste produto.
Quanto ao regime do contrato de arrendamento da exploração desta importante
matéria-prima para indústria têxtil, pode-se verificar que esta prática contou com o
20
CARREIRA, António, Estudos da Economia Cabo-verdiana, p.25. 21
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p. 26.
20
envolvimento de muitas pessoas. Houve um forte vínculo entre os contratadores e os seus
empregados. Estes devem trabalhar no sentido de obterem os melhores resultados na sua
exploração. Pois um trabalho profícuo e sério acabava por beneficiar todas as partes
envolvidas no processo de exploração.
Cada parte era obrigada a cumprir as suas tarefas. Qualquer incumprimento por parte
de um dos parceiros podia implicar perturbações nos lucros. Daí todos se sentiam na
obrigação de dar o seu melhor.
Nesta perspectiva, “O contratador tinha de organizar o apanho, e os transportes, o
acondicionamento, a pesagem, a sacaria, etc. e ao mesmo tempo recrutar os seus agentes
directos (conhecidos por administradores – subalternos) e os intermediários nas diferentes
ilhas”22
.
Esses agentes teriam ainda que se preocupar com a condição da exportação do produto
em questão, desde do porto do embarque até ao país de destino.
Fazem parte ainda das suas responsabilidades os contactos inter-ilhas para evitar
eventuais possibilidades de paralisação da exportação, caso contrário todos sairiam
prejudicados.
Durante os anos 1800 houve diversas formas de contratos de arrendamento da urzela
firmados em Cabo Verde entre a coroa os comerciantes particulares. O sistema de contrato era
o processo normal que se utilizava para se outorgar, oficialmente, a exploração do comércio
deste produto entre os representantes do Rei e os particulares.
“A situação era preocupante, em particular a partir de 1811, em consequência do
recaldo das invasões francesas, e dos problemas suscitados pela ida da corte para Brasil. A
entrada em vigor do tratado luso – britânico de 1815 que proibiu o tráfico de escravos a
norte do equador, e, implicitamente, reduziu os réditos da coroa, impedindo o financiamento
para a compra e exportação urzela (…)” 23
.
No período em questão, Cabo Verde encontrava-se economicamente, bastante frágil
devido às circunstâncias decorrentes da Revolução francesa. Neste sentido o senhor Manuel
Martins, compreendendo a difícil situação financeira por que passam as ilhas, decidiu pedir a
concessão da exploração da urzela à corte que se encontrava sedeada no Rio de Janeiro. Com
a permissão da corte, datada à “ (...) 18 de Setembro de 1818 foi passado um alvará régia pelo
22
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p. 26. 23
CARREIRA, António, Estudos da Economia Cabo-verdiana, p. 29.
21
qual ele [Martins] era nomeado o administrador – do real contrato da urzela nas ilhas de
cabo verde”24
; com as seguintes condições: “ (…) de se obrigar a comprar toda a porção que
aparecesse, a condicional – a e suprir com toda saccadura, fretar navios pelos preços mais
commodos, segurar as carregações, saccar lettras da importância das mesmas sobre as
pessoas a que fossem consignados e pagar sobre – lhe 6% sobre o produto da sua venda” 25
.
O contrato com Manuel António Martins foi renovado sucessivamente durante muito
tempo, ou seja desde 1818 até 1836, o que perfaz um total de 18 anos.
Durante a vigência do referido contrato, houve pessoas que manifestaram o interesse
nesse tipo de negócio, mas ninguém iria concorrer com o Martins, uma vez que ele tinha
adquirido uma vasta experiência neste domínio.
António Carreira, a este respeito, diz que, para além da exploração da urzela, este
arrematante se dedicava ainda a outras actividades comerciais, também não menos lucrativas,
designadamente, “ (…) o tráfico de escravos, o comércio de tecidos, quinquilharias, géneros
alimentícios, etc. disseminado pelas ilhas de Boa vista e do Sal; explorava as salinas nas
mesmas ilhas e negociava em sal com os salineiros do Maio”26
, a exploração da urzela era
considerada para Martins actividade complementar, que significa que os outros sectores do
comércio aos quais estavam ligados eram mais lucrativos.
O Manuel António Martins gozava de uma certa vantagem relativamente às
actividades comerciais dado que dispunha de uma boa “ posição financeira, com o monopólio
da urzela aumentou ainda mais a sua riqueza, além de um grande prestígio social, foi feitor,
sargento – mór, coronel de milícia, prefeito, comendador” 27
, pois, ele tinha um regime de
administração dos seus negócios, quase autónomo. Era ele que se encarregava directamente
de contratar os urzeleiros, custear todas as despesas decorrentes da exploração.
Em 1819, António Pusich, fiscal da Fazenda Real, determinou que os todos os navios
carregados da urzela, com o destino ao exterior, fizessem obrigatoriamente, a escala na vila da
Praia, a fim de ali se proceder ao despacho das mercadorias respectivas. Só depois de cumprir
estas formalidades é que deveriam seguir para Lisboa e outros países do destino. Esta medida
foi reclamada pelo Administrador-geral, afirmando que a maior porção da urzela encontra –
24
BARCELOS, Cristiano José de Senna, op. cit., (Parte IV – VI) p. 236. 25
BARCELOS, Cristiano José de Senna, op. cit., (Parte IV - VI) p. 236. 26
CARREIRA, António, Estudos de Economia Caboverdiana, p. 32. 27
CARREIRA, António, Estudos de Economia Caboverdiana, p.33.
22
se em barlavento, o que não faziam qualquer sentindo dado ao custo acrescido que esta
decisão acarreta.
Este pedido foi atendido, e do Rio de Janeiro, António Pusich, “ (…) recebeu o ofício
de 15 de Dezembro de 1819, a ordenar a anulação daquela medida e, ao mesmo tempo, “ a
impor” ao Administrador – Geral a obrigação de comunicar ao governador, de antemão”28
.
Houve muitas promulgações no que diz respeito à urzela. A despeito desta decisão
concreta, apareceu o Decreto de 16 de Junho de 1822 a determinar que fosse efectuado o
arrendamento da exploração da urzela em hasta pública.
Apesar das diversas decisões tomadas pela corte para disciplinar o comércio e a
exploração de urzela, podemos constatar que nem sempre essas determinações foram
seguidas, com as devidas e merecida consideração.
A respeito desta questão, Sena Barcelos entende que o contrato da exploração da
urzela “ (…) deverá o contrato dura por tempo de seis anos e não de três, como os outros
contratos, atendendo as despesas que eram obrigados a fazer os contratadores em casas
armazéns, lancha se outras.
Igualmente, vimos ainda que os contratadores eram obrigados “(…) a comprar toda a
urzela que lhes oferecida pelos habitantes, pagá – la pelo preço estabelecido de 40 réis o
arrátel, em dinheiro metálico, e pesá – la em pesos públicos de concha; Ficará proibido
debaixo de apenas já estabelecidas pelas leis, a todo e qualquer outro indivíduo, a compra da
urzela aos habitantes daquelas ilhas, nem vendê – la a outros que não sejam aos agentes dos
contratadores, os quais poderão fazer apreensão em toda aquela que seja extraída,
denunciando ás respectivas autoridades os réus, ou descaminhadores, para receberem aquele
castigo que a lei ordena; São obrigadas as autoridades militares a destinar um corpo militar
para guardas dos armazéns do depósito da urzela” 29
.
Daí uma das evidências impostas pela coroa era no sentido de todos os materiais
necessários a construção de armazéns, ou casas para os expedientes relacionados com outra
cláusula das referidas condições diz ainda que “(…) o pagamento da arrematação deverá ser
feito por quantias que principiarão a ter feito no primeiro quartel do segundo ano e findar no
fim do sétimo ano do final pagamento, para cujo fim poderão já passar letras, ou escritos de
28
CARREIRA, António, Estudos de Economia Caboverdiana, pp.36/37.
29
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p. 26.
23
todo o importe segundo os seus rendimentos, para deste modo o tesouro se servir deles no
caso de precisar (…)” 30
.
Aliás, os próprios contratadores “serão obrigados a conservar naquelas ilhas cordas
de linho, de duas ou duas e meia polegadas, para as venderem aos urzeleiros que delas
precisarem pelo preço do seu custo e com pagamento a prazo, devendo, porém, as ditas
cordas ser livres de direitos de entrada e saída” 31
.
Em face das novas normas foram estabelecidas que doravante todos os contratadores
envolvidos no processo de comércio da urzela ficaram sujeitos á arrematação da mesma
mediante o pagamento do montante de 50.000$000 réis anuais ao administrador actual pelo
custo e despesa.
Estas e outras medidas foram tomadas pela corte com vista a controlar o comércio
da urzela de Cabo Verde. Assim, ficou decido que em “ 1821, sob a proposta do governo
local, fixar o preço de da compra aos colectores, na base de 40 réis o arrátel” 32
, o qual foi
aceite desde que a urzela apresentasse em bom estado, ou seja limpa, apurada de tudo o que
pudesse aumentar o seu peso real.
O preço acima mencionado era um preço teórico, na verdade vendia se a urzela “ pelo
menos entre 1800 e 1816, a 25 arrátel”33
.
A subida do preço da urzela provocou o descontentamento da população e do próprio
Administrador-geral que, sob protesto desta subida, decidiu renunciar o cargo, uma vez que
estava convicto que a junta não possuía as condições financeiras e organizativas para assumir
a compra, a conservação e a exportação deste líquen.
Esta renúncia correspondia a um golpe do Administrador-geral, mas este falhou
porque a Corte reconsiderou a sua posição e decidiu reconsiderar preço anterior que era de 40
arrátel.
Pouco tempo depois, o cofre do Estado entrou em falência, pois, já não havia dinheiro
nem para pagar os funcionários. Face a esta situação a Junta Geral da Fazenda decidiu pedir
ao Administrador geral que baixasse o preço para 30 contos de réis a fim de poder garantir o
30
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p. 26.
31
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p. 26.
32
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p. 37. 33
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana, p. 38.
24
escoamento do produto e arrecadar alguma receita da venda deste líquen, para puder fazer
face as despesas inadiáveis.
Nessa altura Cabo Verde estava a passar por uma situação bastante complicada devido
a uma tremenda fome provocada pela estiagem que se prolongava desde 1824” 34
. Perante
este facto, a Junta da Fazenda lançou numa forte campanha para angariar dinheiro e ao
mesmo tempo que intensificou o comércio da urzela a fim de arrecadar algum dinheiro para
fazer face às despesas correntes dado que o país estava á beira de uma catástrofe.
É nestas circunstâncias que se procurou estabelecer contactos com os diferentes
compradores: uns da terra outros estrangeiros que aportarem às ilhas em viagens de negócios
ou em demanda da própria urzela.
Assim, “a situação do país melhorou – se, passando anos depois o Tesouro Nacional
mandou que fosse arrematada a exploração da urzela das ilhas de Cabo Verde pelo prazo de
3 anos onde teria o seu início em Janeiro de 1830 e a terminar em Dezembro de 1832”35
.
Não havendo mais pessoas interessadas em a arrematar o líquen, este ficou nas mãos
de Senhor Manuel António Martins. Ele continuou com a sua actividade, já que se tratava de
uma pessoa muito experiente em negócios. Porém, Martins teve série dificuldades enquanto
arrematador da urzela, dado que foi acusado por várias razões, inclusive de ser responsável
pela fome que fustigava a população em Cabo Verde.
No ano de 1833, houve também uma campanha bastante forte contra Manuel António
Martins. A Junta da Fazenda enviou à Câmara da Boa Vista em ofício contendo requisitos
sobre a actuação do Administrador – Geral da urzela.
A relação entre a Junta e o arrematante Manuel A. Martins estava difícil. A própria
Junta mandou levantar uma série de questionários para todas as ilhas onde o Martins fazia
arrematação da urzela, os questionários foram as seguintes: Saber qual era a porção anual que
pode haver de urzela nessas ilhas; Se o mesmo Martins ou seus caixeiros tem comprado e
compram toda a urzela que se lhes oferece á venda. Examinar o preço por que a pagam; A
qualidade do género por que é pago, se é por dinheiro corrente ou por géneros, a qualidade
deles, por que preço o paga aos urzeleiros, e se neste pagamento que fazem resulta interesse
34
CARREIRA, António, Estudos da Economia Caboverdiana op. cit., p. 42 35
CARREIRA, António – Urzela e Pano de vestir – Dois produtos de exportação das ilhas de Cabo Verde,
p.13.
25
ou prejuízo á fazenda e aos urzeleiros; Qual tem sido o seu cumprimento no que diz respeito a
esta administração 36
.
Além desses questionários, houve ainda outras reclamações por parte da população
que se queixava de Martins e dos seus agentes por causa dos abusos cometidos, dos vexames
de várias ordens que provocava nas populações das ilhas. Por causa destas e de outras
queixas, António Martins ele foi preso e “deportada” para Lisboa. Porém, acabou por ficar
livre dentro de pouco tempo.
Durante a gestão de Administração de Manuel António Martins, o negócio da urzela
caminhou relativamente bem e mostrou-se próspero. Daí que o “saldo a favor da
administração de 1819 – 1836 é francamente positivo: uma exportação global de 2415903
quilos, ou seja á média de 134217 – não ultrapassada em qualquer outro período de
exploração” 37
.
Com o término do contrato, a “17 Janeiro de 1837, publicado em decreto, dizendo que
a exportação da urzela de qualquer ponto do território português (Angola, S.Tomé e Príncipe,
Moçambique, Cabo Verde) era livre. Houve decadência da exploração da urzela devido à
concorrência da urzela de outros países supracitados, mas é certo que outras razões tiveram
muito peso, citaremos um deles que foi o surto dos corantes industrias, a baixo preço e que dá
menos trabalho na preparação do que a urzela.
Com a retoma de um novo contrato ao “2 de Janeiro de 1838 foi lavrado no cartório do
tesouro público, em Lisboa, o seguinte contrato em que interveio como arrematantes da
exploração da urzela nas ilhas de Cabo Verde, José Ignácio Seixas, por si e como procurador
bastante de Manuel António Martins, João Gomes de Oliveira e Silva, e Jerónimo de Almeida
Brandão e Sousa.
A arrematação em questão será feita pelos três anos de 1838 a 1840 contados do dia em
que aos arrematantes ou seus agentes se der posse do dito contrato. O seu preço é inteiramente
livre para a Fazenda Nacional e será pago em Lisboa aos semestres adiantados, prestando para
esse fim os arrematantes fiança idónea.
No que tange ao pagamento, constata-se que o preço deste deve seguir o que consta
neste contrato. As partes contratantes aceitaram dos arrematantes as letras pagáveis à ordem
do Tesouro Nacional. Assim, deste “contrato ficam obrigados os arrematantes a entregar nos
36
Cf. BARCELOS, Sena, op. cit., (Parte II), p.387. 37
CARREIRA, António, Estudos de Economia Cabo-verdiana, p.35.
26
cofres da Fazenda daquelas ilhas, durante o tempo do seu contrato, a quantia de 2 contos de
réis mensalmente para ocorrer ás despesas públicas das mesmas ilhas”. Os contratadores
“serão obrigados dentro do prazo de 3 meses, depois de findo o tempo deste contrato de dar
destino a toda a urzela que lhes pertence, sob pena de se proceder á sua apreensão palas
autoridades fiscais das mesmas ilhas como pertencente á Fazenda Nacional.
O mesmo contrato prevê que toda a urzela colhida até à data da posse do presente
contrato, fica inteiramente sobre o cuidado do governador das ilhas de Cabo Verde.
Os arrematantes obrigam-se a renunciar “ (…) todos os casos fortuitos, ordinários ou
extraordinários, sólidos ou insólitos, cogitados ou não cogitados, e que em todos, e cada um
deles ficarão sempre obrigados, sem eles se poderem valer, nem os poderem alegar em tempo
algum, e para algum efeito qualquer que seja, ficando sempre obrigados ao pronto
pagamento do preço estipulado”38
.
Nesta mesma altura, efectuaram – se muitos contrabandos da urzela. No meio de tudo
isso havia quem tentasse escapar ao fisco, aliás, houve mesmo embarcações que conseguiram
escapar á fiscalização das alfândegas.
Nos finais de ano de 1839 chegou a Cabo Verde um representante “da sociedade
arrendatária, José Alexandrino Fortuna, veio vigiar o arrendamento do negócio, e reagiu de
imediato os problemas mais pertinentes encontrados relacionados com o cumprimento do
contrato onde destaquemos os mais relevantes” 39
.
Apesar das precauções tomadas pelas autoridades locais, os constantes actos de
piratarias continuam a praticar-se, provocando graves e enormes prejuízos na continuação do
apanho de outros musgos, que não seja a urzela.
Aliás, a apanha dos musgos estrelinhas e copê infelizmente não tem cessado porque
ainda há muito poucos dias várias embarcações costeiras fizeram mais de suas viagens
conduzindo musgos a seu bordo e vão para onde querem. A espantosa desproporção
comparada com as quantidades que se deviam receber e que era costume quando a urzela
era por conta da Fazenda..., pois no momento existiam na ilha do Maio apenas 13 arrobas de
urzela, na de Santiago 17 arrobas, na do Fogo apenas 69.
38
Cf. CARREIRA, António, Estudos de Economia Cabo-verdiana, pp.60/61.
39
CARREIRA, António, Estudos de Economia Cabo-verdiana, p. 72.
27
Segundo as declarações dos agentes destacados em cada ilha, a situação era um pouco
complicada devida à falta de braços para se dedicaram aos trabalhos. Contratadores terem já
por providência mandado que os compradores paguem a mais de 40 réis, o arrátel de urzela, e
dar – lhe aos urzeleiros aguardente ou alguma outra gratificação àqueles que mais se
distinguissem concorrendo com maior quantidade de urzela; e nada disto teve efeito”40
.
Esta sociedade não teve muito êxito na arrematação da urzela das ilhas, porque nesta
época houve muita venda clandestina do líquen.
O contrato de arrendamento firmado em 21 de Abril de 1841 indicia o fracasso dos
outros contratos anteriormente estabelecidos. Nesta óptica, houve mais uma tentativa de
contrato em 1841 com vista a encontra-se uma solução que fosse viável para a operação da
urzela.
Houve alguns interessados na exploração do líquen nesse ano. Dente eles, ficou
contemplado o grande proprietário, Francisco Cardoso de Melo, radicado há muito tempo no
país. Este assinou o contrato com as seguintes cláusulas a destacar:
“1- Duração de um ano; 2- Obrigação de comprar com o seu dinheiro toda a
urzela que se colher nas ilhas...pelo preço de 50 réis cada arrátel e fazer as
despesas do costume; 3- Receber toda a urzela (á data) se achar comprada
pelos Recebedores – particulares de todas as ilhas... entrando com o valor do
seu primeiro custo na Tesouraria – Geral, em dinheiro contado, pagando aos
mesmos recebedores...a comissão;4 – O governo fica obrigado a dar ao
mesmo Cardoso, pelo prémio de adiantamento do seu dinheiro para a compra,
e mais despesas... até ao embarque, 5% do produto da venda grossa de
qualquer carga ou porção vendida no mercado de Lisboa, ou mesmo em países
estrangeiros” 41
.
Um novo contrato foi assinado no ano de 1848, desta vez realizou – se a 17 de Março
do mesmo ano, em que “comunica – se a todos as ilhas haver sido adjudicado a António
Monteiro Silva, pelo prazo de um ano, a compra de toda a que for colhida, e ao mesmo tempo
40
Cf. CARREIRA, António, Estudos de economia Cabo-verdiana, pp.73/74. 41
CARREIRA, António, A Urzela e Pano de vestir, dois produtos de exportação das ilhas de Cabo Verde, p.19.
28
ordena – se inventariação de todo o musgo armazenado nas instalações dos herdeiros do
antigo contratador Fernando Burnay” 42
.
O sistema de exploração adoptado que é o arrendamento do conjunto de ilhas,
garantido por Cartas Régias e contrato em suma podemos dizer que a urzela das ilhas de Cabo
Verde teve um bom encaminhamento nesses anos, ou seja é a partir dessa data 1848 que a
urzela começou – se a decair.
Houve momento em que o comércio deste líquen se desenvolveu muito, sobretudo
durante a vigência do arrematante António Martins, cujos lucros atingiram o seu ponto
máximo. Com os outros arrematantes aconteceu a mesmo coisa.
2.2.2 - Administração directa pela Fazenda Real
Com o término da antiga forma da administração da urzela das ilhas de Cabo Verde
(arrendamentos do conjunto das ilhas garantidos por Cartas Régias e Contratos), podemos
dizer uma sociedade exclusiva onde se fazia o arrendamento da urzela por uma determinada
pessoa, esta foi substituída pela administração directa da Fazenda Real, esta forma de gestão
foi desenvolvida por particulares, ou seja pelos operadores privados que dispunham dos seus
recursos financeiros, humanos, materiais, para obter a urzela e depois exportá-la, para isso
utilizaram os seguintes procedimentos: Organizaram o apanho utilizando os seus próprios
escravos e os urzeleiros para tantos recrutados; Interessaram na colheita e na compra os
pequenos negociantes estabelecidos nos povoados espalhados pelas ilhas. Estes, por sua vez,
concediam ao povo ou aos urzeleiros profissionais empréstimos em género alimentícios, em
ferramentas e, mais raramente, em dinheiro, com a obrigação de serem liquidados em urzela;
quando não fazendo esses negociantes directamente o apanho pelos seus escravos para depois
vender a urzela à Fazenda Real; Adquiriram o líquen por intermédio dos seus agentes, em
especial os chamados recebedores – particulares (recebedores de fazenda), com os fundos
disponíveis nos cofres públicos.
42
CARREIRA, António, Estudos da economia cabo-verdiana, p. 87.
29
Neste caso o recebedor tinha direito à percepção de uma comissão (que evolui no
tempo), calculada na base do valor das compras e das despesas de ensaque, carreto, embarque.
Mas entre todos os agentes da Fazenda, destacam-se na fase inicial, os Feitores (que as mais
das vezes exerciam cumulativamente o cargo de comandantes militares), “os sargentos-mores
e outros categorizados elementos oficiais; Receber os impostos, taxas, foros, dízimas, multas
e coimas em urzela”43
.
Todas as despesas estariam a cargo da Fazenda Real (armazenagem, fretes das
embarcações inter-ilhas e até chegar o país do destino, alimentação das pessoas que
apanhavam o líquen, das pessoas que faziam limpeza, etc.).
43
Cf. CARREIRA, António, A Urzela e Pano de vestir, dois produtos de exportação das ilhas de Cabo Verde,
p. 88.
30
Gráfico nº 1
Exportacão da Urzela em Barlavento
0
500
1000
1500
2000
2500
1958
1959
1960
1961
1962
1963
1964
1965
1966
1967
1968
1969
1970
1971
1972
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
Anos
Valo
res e
m a
rráte
l
Quintal Arroba Arrátel
Fonte: CARREIRA, António, As companhias pombalinas de Grão – Pará e Maranhão e Pernambuco e paraíba,
Cap. II, editorial presença Lda., 1992, p.181.
Nessa época houve muita procura da urzela com mais realce no ano 1861.
Gráfico nº 2
Exportação da Urzela em Sotavento
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
1758
1759
1760
1761
1762
1763
1764
1765
1766
1767
1768
1769
1770
1771
1772
1773
1774
1775
1776
1777
1778
1779
1780
1781
Anos
Valo
res e
m a
rráte
l
Quintal Arroba Arrátel
Fonte: CARREIRA, António, As companhias pombalinas de Grão – Pará e Maranhão e Pernambuco e paraíba,
Cap. II, editorial presença Lda., 1992, p.181.
31
Como já tínhamos dito anteriormente encontramos maior quantidade da urzela em
barlavento, e podemos ver no gráfico acima que barlavento ofereceu maior percentagem da
urzela em detrimento do de Sotavento.
2.2.3 -Regime de comércio livre
Com o término do regime de exploração acima referidas, a coroa optou se por novo
regime: regime de comércio livre, em que o governo central, se limitava a recolher e arrecadar
os impostos.
“ (...) A carta de lei de 6 de Julho de 1849 declara livre a apanha, a comercialização e a
exportação da urzela para quaisquer portos, mediante o pagamento de direitos”44
. Essa sentia
obrigada a elaborar uma série de medidas para que as pessoas que apanhavam o líquen no
sentido de não estragar. Passado algum tempo, a “ 23 de Fevereiro de 1850, foi fixada pala
província a taxa de direitos de exportação para a urzela de 1$400 réis quintal, para portos
estrangeiros e a 700 réis o quintal para portos nacionais”45
.
A coroa compreendeu que o poder públicos não era bom comerciante, por isso decidiu
abater-se da intervenção directa na exploração da urzela. Os avanços e recuos permanentes da
coroa, no que respeita a questão da exploração económica, demonstram que tanta a
exploração directa como o sistema de monopólio se revelou ineficazes. No que tange ao
comércio livre, as autoridades não conseguiam controlar as transacções e, por conseguinte a
cobrança dos impostos, e no sistema monopólio nenhum tostão entravam como imposto nos
cofres do estado.
44
CARREIRA, António, A Urzela e Pano de vestir, dois produtos de exportação das ilhas de Cabo Verde, p.21. 45
CARREIRA, António, A Urzela e Pano de vestir, dois produtos de exportação das ilhas de Cabo Verde, p.22.
32
III – APANHA E COMERCIALIZAÇÃO DA URZELA
Como já referimos, o maior problema da urzela estava na sua apanha, uma vez que esta
nascia nos lugares de difícil acesso, geralmente quem fazia a colheita do musgo eram os
rapazes.
A sua comercialização depende muito da moeda em circulação, se há muita moeda em
circulação haverá maior compra e a um preço muito elevado, caso contrário haverá pouca
procura do musgo.
3.1 - Exportação da urzela
A exportação da urzela foi desde sempre cheio de altos e baixos, começando pelo seu
apanho até a sua exportação. Desde há muito esta actividade económica constituía problema
para quem a apanha e também para as pessoas que faziam a sua exportação, sobretudo com a
deficiência nas embarcações inter-ilhas até os países de destino designadamente “Portugal,
Holanda, França, Itália, Espanha, Inglaterra, Londres, Antuérpia, Nova Iorque, Goréa,
Amsterdão, Marselha, Génova (...)”46
.
Em 6 de Julho de 1849 foi declarada o direito de exportação da urzela para qualquer
porto.
46
Cf. FEIJÓ, João da Silva, Ensaios e Memórias económicas sobre as ilhas de Cabo Verde (séc. XVIII), Lisboa,
1986, pp.35/39.
33
“Segundo a portaria de 20 de Julho último, nº 1848.O Governador-geral determina
que em toda as alfândegas desta província se dê despacho a toda a urzela que se apresentar
para ser exportado na conformidade da carta de lei de 6 do mesmo mês de Julho”47
. “Os
chefes devem cobrar mil, quatrocentos e seis por quintal, quando for exportado para país
estrangeiro e de setecentos réis quando for para os portos nacionais”48
.
O governo fixou essa lei e distribui-a para todas as autoridades da Província, que
cumprissem e fizessem cumprir, uma vez que com isso o cofre do estado conseguia arrecadar
alguns fundos para as despesas mensais.
A despeito da lei anunciada posteriormente, constatamos que houve reclamações por
parte de muitas pessoas, como exemplo a Rainha de Portugal e do Algarve, onde propuseram
o seguinte:
“Que fica abolido em todas as províncias Ultramarinas o exclusivo da venda da
urzela. A colheita da urzela será inteiramente livre para os apanhadores, e o seu comércio
permitido para quaisquer portos nacionais ou estrangeiros, a todas as pessoas, mediante um
direito de exportação em navios legalmente admitidos nos portos das províncias único: o
governo fará expedir os regulamentos necessários para se efectuar a colheita da urzela nos
tempos próprios afim de que esse produto não seja distribuído; O direito de exportação no
artigo antecedente, será provisoriamente estabelecido em concelho de Governo-geral da
província, e depois de aprovado pelo poder executivo, submetido ao conhecimento das
cortes; A urzela que sair para os portos Portuguesas pagará somente metade do direito que
se estabelecer; O disposto na presente Lei não revoga o que está em vigor quanto á
navegação entre os diversos portos nacionais. Fica revogada a legislação em contrário”49
.
O apanho da urzela e a venda da mesma era a principal fonte de sobrevivência de
muitas pessoas pobres das ilhas. Com essas leis as pessoas passaram a sofrer um pouco e a
situação económica do país não ficaria boa, pois, o senhor Francisco de Mello, fez uma
proposta de comprar a urzela a 50 réis o arrátel e que pedia 5% de lucros, e isso ajudava lucro
para as pessoas que a apanhavam e também ao estado.
Inicialmente, a urzela era exportada das ilhas de Cabo Verde para Itália, Inglaterra e
outros países da Europa onde vai ser preparada, para o comércio geral na Europa. Por
47
B. O. nº 212, Imprensa Nacional, Praia, Ano 1849. 48
Cf. BARCELOS, Cristiano José de d Senna, Subsídios para História de Cabo Verde e Guiné, parte V, p.139. 49
Cf. B. O, nº 212, Imprensa Nacional, Praia, 1849.
34
exemplo, das ilhas de Cabo Verde exportou-se uma grande quantidade de urzela, sem vexação
alguma dos seus habitantes. A exportação da urzela terminou em 1916.
Citaremos exemplos da urzela exportada para alguns países da Europa como:
Amsterdão, Marselha, Génova, e Londres.
Gráfico nº3
Urzela exportada para Amesterdão
0
10000
20000
30000
40000
50000
60000
1760
1761
1762
1763
1764
1765
1766
1767
1768
1769
1770
1771
1772
1773
1774
1775
1776
1777
1778
1779
1780
1781
Anos
Valo
r d
a U
rzela
Valor da venda
Fonte: CARREIRA, António, As companhias pombalinas de Grão – Pará e Maranhão e Pernambuco e paraíba,
Cap. II, editorial presença Lda., 1992, p.188.
No gráfico nº 3 podemos dizer que quase todos os anos houve a exportação da urzela,
exceptuando alguns anos como podemos constatar no gráfico.
35
Gráfico nº4
urzela exportada para Londres no Sec. XVIII
0
10000
20000
30000
40000
50000
60000
1760
1761
1762
1763
1764
1765
1766
1767
1768
1769
1770
1771
1772
1773
1774
1775
1776
1777
1778
1779
1780
1781
Anos
Valo
r d
a V
en
da e
m $
Valor da venda
Fonte: CARREIRA, António, As companhias pombalinas de Grão – Pará e Maranhão e Pernambuco e paraíba,
Cap. II, editorial presença Lda., 1992, p.188.
Nesse país houve exportação de um nº muito elevado da urzela, foi um dos melhores
mercados consumidores.
Gráfico nº5
Urzela Exportada para Génova
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1760
1761
1762
1763
1764
1765
1766
1767
1768
1769
1770
1771
1772
1773
1774
1775
1776
1777
1778
1779
1780
1781
Anos
Valo
r d
a U
rzela
em
$
Valor da venda
Fonte: CARREIRA, António, As companhias pombalinas de Grão – Pará e Maranhão e Pernambuco e paraíba,
Cap. II, editorial presença Lda., 1992, p.188.
36
Gráfico nº6
Urzela Exportada para Marselha
0
500
1000
1500
2000
2500
3000
3500
4000
4500
5000
1760
1761
1762
1763
1764
1765
1766
1767
1768
1769
1770
1771
1772
1773
1774
1775
1776
1777
1778
1779
1780
1781
Anos
Valo
r d
a u
rzela
em
$
Valor da venda
Fonte: CARREIRA, António, As companhias pombalinas de Grão – Pará e Maranhão e Pernambuco e paraíba,
Cap. II, editorial presença Lda., 1992, p.188.
Podemos dizer que de acordo com os gráficos, os dois grandes mercados foram os de
Londres e de Amesterdão, sendo Marselha e Génova os menos importantes.
Como se viu a pobreza do solo de Cabo Verde não estimulava a fixação de Europeus,
bem como quaisquer investimento ou exploração económica por parte dos portugueses que
vinham com a intuição de um enriquecimento rápido.
Daí que se tenha apartado sobretudo na sua vantagem geográfica, ou seja no
aproveitamento da sua localização geográfica, uma vez que servia como placa giratória de
todas as embarcações que cruzam o atlântico. A ligação entre os três continentes, Europa,
África e América esteve garantida durante algum tempo devido ao excelente situação
geográfica de que Cabo Verde dispunha.
Naquele contexto histórico, os metais preciosos, designadamente, o ouro e a prata,
encontravam-se na mira dos portugueses. É evidente que essas mercadorias tiveram uma
importância acrescida no quadro da necessidade que se fazia sentir quanto ao comércio das
especiarias com a Índia.
Por conseguinte, os moradores de Santiago, como não podiam ficar de braços cruzados
perante a realidade existente, em Cabo Verde, decidiram lançar mãos em tudo o que lhes
puderam proporcionar rendimento que lhes permitissem um enriquecimento rápido.
37
O comércio de escravo foi uma das principais actividades económicas lucrativas
desenvolvidas pelos Europeus em Cabo Verde. Daí o primeiro contrato de arrendamento da
compra e tráfico de escravos teve o seu início em 1462, tendo em conta que, segundo reza a
História, as ilhas de Cabo Verde foram encontradas descobertas. Por conseguinte, quaisquer
empreendimentos de carácter económico teriam que passar necessariamente pelo seu
povoamento para se poder garantir a mão-de-obra necessária, a criação de riqueza para poder
viabilizar Cabo Verde.
Paralelamente ao comércio de escravos os moradores de Santiago, passaram a dedicar-
se a uma série de actividades, quer seja no domínio da agricultura, actividades agro –
pecuárias, artesanais, sobretudo na esfera do comércio com a costa da Guiné.
Assim, durante o processo da colonização, a coroa portuguesa esteve sempre presente,
quer através da intervenção directa, quer por meio de legislação que lhe permitisse as acções
comerciais e outras.
Houve caso em que a coroa decretou, o sistema de monopólio, em certos produtos em
determinada zona geográfica.
Independentemente do êxito ou não da exploração económica levada a cabo pela coroa
em outros sectores, designadamente a exploração do sal, da agricultura da purgueira no
fabrico de pano, a criação de gado, o comércio em geral, constituía preocupação em analisar
os contratos da exploração da urzela, começando pelo seu apanho, transporte e a sua
comercialização.
De todos os produtos comercializados em Cabo Verde durante os longos períodos
coloniais, a urzela “que foi explorado durante cerca de 450 anos”50
. Pelo que podemos
verificar, a exploração da urzela em Cabo Verde com a chegada dos Europeus e prolongou até
aos nossos dias.
A coroa portuguesa, enquanto estado mercador, optou por intervir neste e outros tipos
de comércio, utilizando para isso diversos processos nomeadamente, o sistema de
arrendamento, de administração directa e da prática de comércio livre.
Essas interferências, na nossa óptica, perturbaram as transacções comerciais, dado que
o estado entrava e saia de uma forma disprogramada e imprevisível. Podemos dizer que
faltava á coroa uma visão estratégica, clara e uma política consistente relativamente a
exploração das terras descobertas, concretamente no que tange a exploração da urzela.
50
CARREIRA, António, Migrações nas ilhas de Cabo Verde, 2ª edição, Mira Sintra, Mem Martins, ICL, 1983,
p., 29.
38
Assim, as Cartas Régias regulavam e regulamentavam a intervenção do estado. Daí o
“ sistema de arrendamento garantido por cartas régias e contratos continua ou
intermitentemente de 1469 a 1785; de 1819 a 1841; de 1847 a 1849”51
.
Os frequentes contratos firmados, de uma forma intermitente, demonstram uma certa
fragilidade no que concerne á aplicação das políticas correctas de exploração da urzela.
Daí, novamente, a coroa viu-se obrigada a substituir o sistema de arrendamento pela
administração directa em que a fazenda real passou a controlar a arrecadação das receitas
decorrentes da exploração deste líquen.
De novo, assistimos o ziguezague da coroa relativamente ao processo de consolidação
desta opção. Por conseguinte o Rei se fez representar, através da sua fazenda, nos períodos de
“1790 a 1818; de 1842 a 1846”52
.
A última tentativa da coroa, quanto á exploração da urzela, ocorreu durante o sistema
do comércio livre. Isto começou a partir dos meados do século XIX, mais concretamente em
1850 e estendeu – se até ao primeiro quartel do século XX.
Todas essas técnicas de exploração não passavam de tentativas, houve um interesse
por parte da coroa, no sentido de controlar directamente este processo ou, acompanhar de
perto a evolução da sua quantidade de apanho a fim de puder aplicar os respectivos imposto,
arrecadando assim as receitas para os cofres do estado.
Do mesmo ponto de vista, as diversas técnicas utilizadas pela coroa na exploração dos
recursos das suas colónias demonstraram que o próprio estado não se encontrava em
condições de administrar, de uma forma eficaz, as suas acções e nem as dos seus parceiros
comerciais, uma vez que a exploração da urzela não se limitava apenas a Cabo Verde, mas
abrangia as outras partes do território nomeadamente Açores, Madeira, S.Tomé e Príncipe,
Angola e Moçambique.
Por outro lado, os próprios parceiros do Rei não estavam a altura de proceder á uma
exploração eficaz deste recurso, pois parceiros eram constituídos normalmente por entidades
privadas, singulares ou por pequenas associações financeiras, as pessoas de capital suficiente
para uma exploração efectiva.
Com a excepção de um pequeno período dos últimos anos do século XIX e dos
primeiros anos do século XX, toda a mão-de-obra utilizada na sua apanha era escrava. Como
se deve saber, a exploração escravocrata de qualquer empreendimento pouco ou nenhum lucro
dá.
51
CARREIRA, António, Migrações nas ilhas de Cabo Verde, p., 29. 52
CARREIRA, António, Migrações nas ilhas de Cabo Verde, p. 29
39
IV – CONTRATO DE ARRENDAMENTO DA URZELA
A urzela era conhecida desde os primórdios do povoamento de Cabo Verde. Teve uma
exploração muito irregular e aleatório até o séc. XVIII, mesmo sabendo da sua importância na
vida económica do país, a partir do séc. XVIII, começou-se o interesse na exploração e
administração da urzela, de forma a melhorar a economia do país.
“O interesse suscitado pela urzela e o seu grande valor comercial levam a que de
imediato se pense na melhor forma de garantir uma boa arrecadação de receitas”53
.
Dado ao grande valor comercial que esta planta teve na altura surgiu o contrato de
arrendamento entre as autoridades locais e os investidores particulares, a fim de ter uma
boa administração. “Os primeiros contratos para a exploração da urzela foi firmado em
1460 com os irmãos João e Perô de Lugo Castelhanos, que se ocupavam da mesma
actividade nas ilhas das Canárias” 54
.
No ano 1731, processou-se um novo contrato de exploração da urzela em todas as
ilhas do barlavento entre o capitão-mor de Santo Antão, Cláudio Roquete da Silva e João
Baptista Sevillon um castelhano por um período de um ano. Este contrato não teve muito
êxito porque o capitão não tinha a competência legal, o mesmo estava cheia de
irregularidade. Nesta mesma época colocou-se na praça pública um novo arrendamento da
urzela, desta vez em cinco ilhas do barlavento, por um período de seis meses, foi o mesmo
castelhano que conseguiu arrebatá-lo por valor de 260$000 réis.
53
BOLENO, Ilídio, “Reconversão do comércio externo em tempo de crise e o impacto da companhia do
Grão Pará e Maranhão”, in História Geral de Cabo Verde, Vol. III, 2ª edição (Luís Albuquerque e Maria
Medeiros Santos (Coord.), IICT/INIC, Praia/Lisboa, 2002, p.189.
54
BALENO, Ilídio, op. cit., p.189.
40
Depois dos contratos acima referidos, efectuaram muitos contratos de arrendamento
do musgo, onde inclui-se também as companhias do Grão Pará e Maranhão “ (…) por
carta régia de 16 de Janeiro de 1527, foi concedida a Vasco e Foios, em exclusivo, a
apanha e a comercialização da urzela da ilha de Santiago por um período de seis anos,
com o privilégio de exportá-la para onde ele bem entendesse” 55
.
Os jesuítas que passaram por Cabo Verde, sabendo do valor comercial da urzela na
Europa chamava-lhe hervinha seca, pediram a apanha exclusivo da mesma, a autoridade
local não autorizou, dizendo que já havia sido dado a concessão da apanha e exportação,
um período de seis meses, mediante uma renda a sevilhano João Baptista Sevellon.
A partir desta data houve uma grande aderência deste musgo por parte dos outros
países onde entraram clandestinamente e com muita frequência para a recolha do musgo,
onde iria dar um grande contributo na indústria têxtil em quase toda a Europa. Temos
exemplos de alguns países que entraram clandestinamente para o apanho do musgo, os
Ingleses beneficiaram deste produto durante seis ou sete meses, tomaram dos moradores
das ilhas, que correm muito risco ao apanhar a planta.
Com esta vaga da invasão sobre a apanha da urzela Dr. João da Costa Ribeiro,
Ouvidor geral, fez arbitrariamente o arrendamento da colheita da urzela, por um espaço de
três anos ao castelhano D. João Enes Inglês.
A coroa não tinha conhecimento desta concessão, mandou indemnizar todas as
despesas feitas por ele. Neste mesmo ano foi proibida a apanha da urzela, quer para os
nativo quer para os estrangeiros, e isso vai dificultar a vida da população, esta juntou e
mostrou o seu desagrado a respeito do assunto. Muitos começaram a fazer contrabando dos
produtos, houve ameaça por parte do Ouvidor, onde este mandou informar em Lisboa o
que estava a passar principalmente em Santo Antão, Santa Luzia, Sal e Ilhéus branco e
raso. A autoridade mandou intimar o povo, mandando os oficiais de justiça prender os
indivíduos que estavam a vender a urzela aos estrangeiros.
“As coisas continuaram do mesmo jeito até que em 1740, o Concelho Ultramarino,
mandou que fosse arrematada a exploração da urzela. O primeiro (Filipe Balesty e
Mateus Dutra) propôs-se arrendá-la por seis anos, por um preço global de 60.0000
cruzados. A partir desta data foram realizadas muitos contratos de arrendamento do
musgo”56
.
55
CARREIRA, António, A urzela e o pano de vestir, dois produtos de exportação, p. 10 56
CARREIRA, António, A urzela e o pano de vestir, dois produtos de exportação, p.11
41
É de salientar, que mesmo com os contratos de arrendamentos, houve sempre
contrabando, com isso o contratador exigiu sanções severas aos que transgrediram a lei,
para melhor controlar o contrabando proibiu-se a venda a estranhos de toda e qualquer
quantidade da urzela.
“Em 8 de Junho de 1751, fez o contrato de arrendamento com o Gomes da Silva,
pelo período de três anos, a contar da data da chegada á Cabo Verde. Este contrato
consistia na exploração da urzela em cabo verde, nos açores e na madeira mediante a
renda de 23.000 cruzados” 57
.
O contrato com Gomes da Silva veio a terminar em 1957. “Nesse mesmo ano, a 14
de Novembro, a exploração da urzela em Cabo Verde, Açores, Madeira, Peniche e
Cascais passou-se para a companhia de Grão Pará e Maranhão, esta empresa fez um
negócio em urzela de 1758 a 1781, durante este 24 anos de contratos, exportou muitas
toneladas de urzela para diversos países. Tomamos como exemplo a exportação para a
Inglaterra, Holanda, França e Itália foi de 1900 toneladas, pelo um valor de 374 contos e
as vendas para os países internos teve um rendimento aproximada de 103 contos”58
.
Ao terminar o prazo de contrato com a Companhia do Grão Pará, a mesma fez a
exportação da urzela em regime livre, depois de alguns anos de exploração, passou para a “
sociedade exclusiva”. Esta não teve uma boa administração, o governo em 1778, arrendou
a outrem a exploração da urzela, fez um contrato de seis anos a Domingos da Costa e
Manuel Elentério.
A partir do último contrato acima referido, a exploração da urzela passou a ser feita
em regime de administração, quase autónoma, por um negociante e proprietário na ilha de
Boa vista e Sal, António Martins, que era um dos mais empreendedores colonos de Cabo
Verde. Este contrato era por um período de três anos, renováveis sucessivamente.
57
Cf. António Carreira, A urzela e o pano de vestir, dois produtos de exportação, p.11
58
Cf. CARREIRA, António, A urzela e o pano de vestir, dois produtos de exportação, p.11
42
V – DECADÊNCIA EXPLORAÇÃO DA URZELA
Desde que o comércio da urzela passou a ser administrado directamente pelo
governo da província de Cabo Verde a falta de mão-de-obra para garantir a sua colheita em
Cabo Verde contribuíram para a sua decadência.
A exploração da urzela nas outras colónias portuguesas nomeadamente em S. Tomé e
Príncipe, Angola e Moçambique onde, segundo Senna Barcelos, cuja apanha não constituía
perigo para ninguém, veio a agravar ainda mais a difícil questão de exploração económica de
urzela em Cabo Verde, embora se saiba que destas ilhas apresentava uma qualidade superior a
das colónias já referidas. Porém, a urzela daquelas colónias apresentavam alguma vantagem
comparativa dado que era colhida em maior quantidade em relação a Cabo Verde59
, o que
favorecia a chamada economia de escala.
O aparecimento da técnica tintureira aplicada à indústria têxtil, em que se utilizavam
corantes em quantidade cada vez maior, a utilização de tintas através do processo natural
revelou-se insuficiente e ineficaz. Daí a razão pela qual se tornou necessário produzir,
quimicamente, esta matéria-prima, o que vira garantir a quantidade e a regularidade no
enriquecimento do mercado.
Os corantes obtidos por meio dos processos químicos exigiam um trabalho mais
sistematizado e com um melhor controlo de qualidade, e se calhar a um preço mais
conveniente, tendo em conta que as características e a contingência da apanha e preparação,
segundo os moldes tradicionais, eram bastante aleatórios, o que não compadecia com as
exigências do desenvolvimento da indústria neste sector.
Por outro lado, a evidente falta de incentivo por parte das autoridades locais e
metropolitanas, uma vez que com o aparecimento da urzela em outros lugares da África,
59
Cf. BARCELOS, Cristiano José de Senna, Subsídios para História de Cabo Verde e Guiné, parte V, Lisboa,
1910, p.14, Circular, nº 113 de 5 de Março, B.O. nº 120, Imprensa Nacional, Praia, 1853.
43
provocou o desvio de atenção de quem de direito para essas colónias, relegando a exploração
da urzela Cabo-verdiano para o segundo plano.
A apanha era extremamente difícil uma vez que localizava em lugares de difícil
acesso. Mas devido à falta de recursos por parte da população, esta actividade serviu-lhes de
ganha-pão, durante o período da sua exploração.
Como sabemos a maior produção da urzela se encontrava em barlavento, mas no
entanto teriam que fazer a fiscalização nas alfândegas da Praia e só depois seguia a viagem
para a Europa e o transporte utilizado nesses transações eram muito deficitária.
Por sua vez, a população começava a fazer a apanha do musgo e a vender de forma
clandestina aos barcos estrangeiros, originando assim pequenos contrabandos.
44
Conclusão
A economia de Cabo Verde caracteriza-se desde os primórdios da sua ocupação como
sendo uma economia bastante frágil.
As principais actividades económicas baseavam-se essencialmente na agricultura de
subsistência, na criação de gado e nas actividades agro-pecuárias, de modo que aquilo que se
produzia não era suficiente para satisfazer as reais necessidades da população, ao longo de
quase toda a sua história
Devido à insuficiência e desarticulação registada nos sectores já referidos e atendendo
que o povo das ilhas tinha enorme preocupação para garantir a sua sobrevivência, tornou-se
imprescindível começar lançar-se mãos a outros meios de ganhar a vida. Daí que a extracção
dos produtos espontâneos, como a urzela se tinha convertido numa iniciativa rentável nos
séculos XVIII e XIX, com espacial destaque para as ilhas de Barlavento, onde este líquen
abundava. Porém, convém relevar que apesar do ponto alto da sua exploração, nos séculos
referidos, a urzela começou a ser explorada desde o início da descoberta de Cabo Verde.
A exploração de urzela não constituía o monopólio de Cabo Verde, uma vez que já
vinha sendo explorado nas outras ilhas atlânticas designadamente, nos Açores e na Madeira.
A partir das experiências capitalizadas tornou-se possível a sua implementação em Cabo
Verde. A sua apanha e comercialização têm revelou-se muito difícil porque o seu crescimento
espontâneo localiza-se nos rochas íngremes e de difícil acesso, o que tem condicionava, de
sobremaneira, a sua apanha, com os reflexos notórios na fixação dos preços. Pois, só os
rapazes se revelaram, fisicamente, capazes de executar este tipo de tarefa, uma vez que eles
arriscavam a própria vida, descendo por meio de cordas nas rochas altas das ilhas, de cota de
600 a 1000 metros de altitude, baixo do efeito dos contra alísios.
45
Esta tarefa revelou bastante dramática para os apanhadores deste produto, uma que se
registou um elevado número de óbitos.
Enquanto planta tintureira, a urzela constituía uma matéria-prima estratégica a partir
do século XV, sobretudo nos dois primeiros arquipélagos, já mencionados.
É por causa deste grande valor comercial, uma vez que era utilizada no fabrico de
tintas para a indústria de tinturaria do algodão de seda e panos, que levou a coroa a intervir
directamente na sua exploração, concorrendo, por vezes, com os próprios armadores
particulares
Como referido, esta planta encontrava-se em todas as ilhas de Cabo Verde, com maior
expressão em barlavento, há quem diga que a urzela da Boa Vista, Santiago, Fogo e Brava era
sempre considerada de melhor qualidade do que das outras zonas, em consequência disso as
suas cotações foram circunstancialmente mais elevada.
Em todas as ilhas onde se colhia a urzela, havia um feitor da fazenda real que se
ocupava da sua compra e ao mesmo tempo que se dedicava a outras funções. Este pesava a
urzela com seu próprio peso e como bem entendesse.
Convém referir ainda que os feitores, propositadamente, demoravam dias para pesar o
produto a fim de dar tempo para a urzela secasse para poder perder o peso. Porém, na hora do
ensacamento para fazer a exportação molhavam o musgo antes da pesagem para aumentar o
peso e consequentemente avolumar os lucros.
O comércio da urzela proporcionava grandes lucros ao estado e garantia o sustento de
pessoas andavam ligadas ao seu apanho.
46
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Repertório numérico simples do fundo arquivístico, urzelas, C. 11/ CX. 465
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B. O., n.º 12, Praia, IN, Ano 1853
B. O., N.º 67, Praia, IN, Ano 1844
48
Anexos
49
Elisângela Fernandes Semedo
Tema:
A urzela e a sua importância na Economia das ilhas de Cabo
Verde (séc. XVIII e XIX)
Licenciatura em Ensino de História
Praia, ISE, Setembro de 2005
50