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A viagem ao Higgs No segundo número que a actual equipa da Gazeta de Física editou, o artigo de João Varela “O LHC vem aí” fez a capa 1 . Abria-se então uma era nova na física de partículas. Quatro anos depois, ficou demonstrado que o LHC não só veio, como veio para ficar. Este número da Gazeta de Física assinala agora isso mesmo. Marcamos o momento único da grande descoberta no LHC, com um novo artigo de João Varela — que nos conta o epílogo da história começada em 2008, e nos anuncia o novo prefácio à história que se segue. O ano de 2012 foi Olímpico nos desportos e na Física. Duas colaborações do CERN, CMS e ATLAS, anunciaram a descoberta de uma partícula nova de 125 GeV de massa. A investigação que vai agora ter lugar sobre o detalhe das suas outras propriedades vai finalmente poder consagrar o paradigma actual da Física, simbolicamente conhecido por Modelo Padrão — ou, abalá-lo, quem sabe? traçando a linha fronteira da sua validade. O que o LHC permitiu fazer foi uma viagem à fronteira do muito, mesmo muito, longinquamente pequeno, que é equivalente, em muitos aspectos, à viagem à Lua realizada em 1969. Primeiro, a Lua está a centenas de milhões de metros de distância da terra. A partícula agora descoberta também só é acessível a distâncias bem afastadas da escala hu- mana, mais de centenas de bilião de vezes inferiores ao metro. Segundo, ambas as viagens resultam de tecnologia levada aos limites em perícia e engenho. Numa conferência internacional sobre problemas de fronteira em que participei este verão, o detector CMS foi descrito como o dispositivo de física de estado sólido mais poderoso jamais construído pelo homem — para conseguir processar e separar os diferentes resultados de colisões feitas a uma taxa de um bilião de colisões por segundo. Terceiro, tanto a viagem à lua como a descoberta feita no LHC só se tornaram possí- veis pela coordenação exemplar de equipas muito grandes em número e muito variadas em conhecimentos. A viagem ao Higgs e a viagem à lua correspondem ao que de único, e melhor, é possível obter através da chamada Big Science — ciência focada na execução de um objectivo só atingível pelo trabalho, em grupos e sub-grupos, de grandes equipas fortemente organizadas, cuja primeira edição foi o projecto Manhattan em Los Alamos conducente à bomba atómica. A colaboração CMS envolve cerca de 3500 pessoas. Nestes universos tão vastos de pessoas que são as colaborações de CMS e ATLAS, Portugal participou com lideranças de sucesso, como a de João Varela em CMS, e Amélia Maio em ATLAS. A diferença entre a viagem à Lua e o projecto Manhattan, por um lado, e o LHC, por outro, é que agora a equipa e o desígnio são bem transnacionais. A partícula descoberta no CERN, o ansiado Higgs... ou outra partícula, levanta expectativas imensas para o nosso conhecimento da estrutura do espaço, melhor, do vazio — sempre o tão historicamente, problemático, inacessível vazio. O que se seguirá vai certamente alargar a nossa pers- pectiva do cosmos, da textura e da evolução do espaço e do tempo, das interacções e origens da massa que se criam e aniquilam nele. De onde vimos, para onde vamos, é a grande pergunta da ciência, faltando ainda muitos detalhes no filme que vamos fazendo sobre a evolução do universo. E é uma pergunta que interessa a todos, cientistas e não cientistas, como ficou demonstrado no enorme impacto que teve nos media a grande descoberta do LHC em 2012. Par- tícula de Deus não será, mas partícula para não dizermos adeus à física, isso é, com toda a certeza… Teresa Peña Editorial editorial VOL. 30 - n.2/3 editorial VOL. 35 - n. 1 1 Ficha Técnica Propriedade Sociedade Portuguesa de Física Av. da República, 45 – 3º Esq. 1050-187 Lisboa Telefone: 217 993 665 Equipa Teresa Peña (Directora Editorial) Gonçalo Figueira (Director Editorial Adjunto) Carlos Herdeiro (Editor) Filipe Moura (Editor) Secretariado Maria José Couceiro - [email protected] Colunistas e Colaboradores regulares Ana Simões, Carlos Fiolhais, Constança Providência, Jim Al-Khalili Colaboraram também neste número Albino Pinto, Carlos Fiolhais, Carlos Saraiva, Conceição Abreu, Filipe Moura, Gonçalo Figueira, João Varela, Luís Peralta, Maria do Anjo Albuquerque, Teresa Peña Design / Produção Gráfica Dossier, Comunicação e Imagem www.dossier.com.pt NIPC 501094628 Registo ICS 110856 ISSN 0396-3561 Depósito Legal 51419/91 Tiragem 1.800 Ex. Publicação Trimestral Subsidiada As opiniões dos autores não representam necessariamente posições da SPF. Preço N.º Avulso 5,00 (inclui I.V.A.) Assinatura Anual 15,00 (inclui I.V.A.) Assinaturas Grátis aos Sócios da SPF. Para os físicos e amigos da física. www.gazetadefisica.spf.pt 1 Gazeta de Física 31, núm. 1/2 (2008).

A Viagem Ao Higgs

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  • A viagem ao Higgs

    No segundo nmero que a actual equipa da Gazeta de Fsica editou, o artigo de Joo Varela O LHC vem a fez a capa1. Abria-se ento uma era nova na fsica de partculas. Quatro anos depois, ficou demonstrado que o LHC no s veio, como veio para ficar. Este nmero da Gazeta de Fsica assinala agora isso mesmo. Marcamos o momento nico da grande descoberta no LHC, com um novo artigo de Joo Varela que nos conta o eplogo da histria comeada em 2008, e nos anuncia o novo prefcio histria que se segue.

    O ano de 2012 foi Olmpico nos desportos e na Fsica. Duas colaboraes do CERN, CMS e ATLAS, anunciaram a descoberta de uma partcula nova de 125 GeV de massa. A investigao que vai agora ter lugar sobre o detalhe das suas outras propriedades vai finalmente poder consagrar o paradigma actual da Fsica, simbolicamente conhecido por Modelo Padro ou, abal-lo, quem sabe? traando a linha fronteira da sua validade.

    O que o LHC permitiu fazer foi uma viagem fronteira do muito, mesmo muito, longinquamente pequeno, que equivalente, em muitos aspectos, viagem Lua realizada em 1969. Primeiro, a Lua est a centenas de milhes de metros de distncia da terra. A partcula agora descoberta tambm s acessvel a distncias bem afastadas da escala hu-mana, mais de centenas de bilio de vezes inferiores ao metro. Segundo, ambas as viagens resultam de tecnologia levada aos limites em percia e engenho. Numa conferncia internacional sobre problemas de fronteira em que participei este vero, o detector CMS foi descrito como o dispositivo de fsica de estado slido mais poderoso jamais construdo pelo homem para conseguir processar e separar os

    diferentes resultados de colises feitas a uma taxa de um bilio de colises por segundo. Terceiro, tanto a viagem lua como a descoberta feita no LHC s se tornaram poss-veis pela coordenao exemplar de equipas muito grandes em nmero e muito variadas em conhecimentos. A viagem ao Higgs e a viagem lua correspondem ao que de nico, e melhor, possvel obter atravs da chamada Big Science cincia focada na execuo de um objectivo s atingvel pelo trabalho, em grupos e sub-grupos, de grandes equipas fortemente organizadas, cuja primeira edio foi o projecto Manhattan em Los Alamos conducente bomba atmica. A colaborao CMS envolve cerca de 3500 pessoas. Nestes universos to vastos de pessoas que so as colaboraes de CMS e ATLAS, Portugal participou com lideranas de sucesso, como a de Joo Varela em CMS, e Amlia Maio em ATLAS. A diferena entre a viagem Lua e o projecto Manhattan, por um lado, e o LHC, por outro, que agora a equipa e o desgnio so bem transnacionais.

    A partcula descoberta no CERN, o ansiado Higgs... ou outra partcula, levanta expectativas imensas para o nosso conhecimento da estrutura do espao, melhor, do vazio sempre o to historicamente, problemtico, inacessvel vazio. O que se seguir vai certamente alargar a nossa pers-pectiva do cosmos, da textura e da evoluo do espao e do tempo, das interaces e origens da massa que se criam e aniquilam nele. De onde vimos, para onde vamos, a grande pergunta da cincia, faltando ainda muitos detalhes no filme que vamos fazendo sobre a evoluo do universo. E uma pergunta que interessa a todos, cientistas e no cientistas, como ficou demonstrado no enorme impacto que teve nos media a grande descoberta do LHC em 2012. Par-tcula de Deus no ser, mas partcula para no dizermos adeus fsica, isso , com toda a certeza

    Teresa Pea

    Editorial editorial V O L . 3 0 - n . 2 / 3

    editorial V O L . 3 5 - n . 1

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    EquipaTeresa Pea (Directora Editorial)Gonalo Figueira (Director Editorial Adjunto)Carlos Herdeiro (Editor)Filipe Moura (Editor)

    SecretariadoMaria Jos Couceiro - [email protected]

    Colunistas e Colaboradores regularesAna Simes, Carlos Fiolhais, Constana Providncia, Jim Al-Khalili

    Colaboraram tambm neste nmero Albino Pinto, Carlos Fiolhais, Carlos Saraiva, Conceio Abreu, Filipe Moura, Gonalo Figueira, Joo Varela, Lus Peralta, Maria do Anjo Albuquerque, Teresa Pea

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    Tiragem 1.800 Ex.

    Publicao Trimestral SubsidiadaAs opinies dos autores no representam necessariamente posies da SPF.

    Preo N. Avulso 5,00 (inclui I.V.A.)

    Assinatura Anual 15,00 (inclui I.V.A.)Assinaturas Grtis aos Scios da SPF.

    Para os fsicos e amigos da fsica. w w w. g a z e ta d e f i s i c a . s p f. p t

    1 Gazeta de Fsica 31, nm. 1/2 (2008).