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Ministério da Saúde Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães – CPqAM Departamento de Saúde Coletiva – NESC Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva A VIGILÂNCIA SANITÁRIA E O PROCESSO DE DESCENTRALIZAÇÃO NA CIDADE DO RECIFE: O CASO DAS FÁBRICAS DE GELO. Elzir Gomes de Arruda Filho Orientador: Carlos Antônio Alves Pontes Recife, 01 de Abril de 2002

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Ministério da Saúde

Fundação Oswaldo Cruz – FIOCRUZ

Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães – CPqAM

Departamento de Saúde Coletiva – NESC

Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva

A VIGILÂNCIA SANITÁRIA E O PROCESSO DE DESCENTRALIZ AÇÃO NA

CIDADE DO RECIFE: O CASO DAS FÁBRICAS DE GELO.

Elzir Gomes de Arruda Filho

Orientador: Carlos Antônio Alves Pontes

Recife, 01 de Abril de 2002

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Elzir Gomes de Arruda Filho

A VIGILÂNCIA SANITÁRIA E O PROCESSO DE DESCENTRALIZ AÇÃO NA

CIDADE DO RECIFE: O CASO DAS FÁBRICAS DE GELO.

Recife, 01 de Abril de 2002

Monografia apresentada como requisito

parcial à conclusão do Programa de

Residência Multiprofissional em Saúde

Coletiva do Departamento de Saúde

Coletiva/NESC/CPqAM/FIOCRUZ/MS,

sob orientação do Professor Carlos

Antônio Alves Pontes.

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Elzir Gomes de Arruda Filho

A VIGILÂNCIA SANITÁRIA E O PROCESSO DE DESCENTRALIZ AÇÃO NA

CIDADE DO RECIFE: O CASO DAS FÁBRICAS DE GELO.

Monografia aprovada como requisito parcial à conclusão do Programa de

Residência Multiprofissional em Saúde Coletiva, do Departamento de Saúde

Coletiva/CPqAM/FIOCRUZ/MS, pela Comissão formada por:

Orientador: ___________________________________________________

Prof. Carlos Antônio Alves Pontes – NESC/CPqAM/FIOCRUZ

Debatedora: __________________________________________________

Adeilza Gomes Ferraz – Diretora Executiva da Vigilância

Sanitária / Secretaria Municipal de Saúde do Recife

Recife, 01 de Abril de 2002

5

AGRADECIMENTOS

A todos que, de alguma forma, contribuíram para a elaboração deste

trabalho.

Agradeço em especial aos meus pais, sem os quais não estaria onde

estou. Agradeço pelo apoio amplo, irrestrito e, sobretudo, sincero e motivado por

um forte sentimento de amor em absolutamente todos os momentos de nossas

vidas.

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SUMÁRIO

Introdução

Objetivos

Capítulo 1 – Uma abordagem teórica da Vigilância Sa nitária

1.1. Vigilância à Saúde, um breve histórico

1.2. A Reforma Sanitária e o Sistema Único de Saúde

1.3. Descentralização das ações de saúde

1.4. A Vigilância Sanitária

Capítulo 2 – A Vigilância Sanitária no Recife

2.1. O Recife e o seu sistema de saúde

2.2. Estrutura da Vigilância Sanitária no Recife Capítulo 3 – A Vigilância Sanitária nas fábricas de gelo do Recife

3.1. A responsabilidade sanitária sobre as fábricas de gelo

3.2. A legislação

3.3. A situação das fábricas de gelo do Recife

3.3.1. Aspectos descritivos

3.3.2. Análise situacional

Considerações Finais

Bibliografia

Anexos

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INTRODUÇÃO

A descentralização das ações de saúde, particularmente da vigilância

sanitária, é um processo ainda em curso. Algo que vem sendo executado

paulatinamente, pois depende de um conjunto de requisitos por parte do

município.

A descentralização, aliás, é uma tendência que vem se fortalecendo

através dos anos. Alguns fatores têm a dificultado, enquanto que outros,

paralelamente, têm a favorecido.

Questões inerentes à descentralização como perda ou redução de poder,

favorecimentos devidos à concentração de poder, a dificuldade de alguns

gestores em lidar com uma forma de gestão mais democrática e participativa,

diminuição de benefícios financeiros para algumas esferas de governo, podem ser

apontados como dificultadores do processo.

Por outro lado, o respaldo legal, exemplos de casos bem sucedidos, a

possibilidade de concretização de uma gestão mais democrática e com maior

participação social, obtenção maiores de recursos e a possibilidade iminente de

melhoria do grau de resolutividade nas questões de saúde são fatores que

convergem favoravelmente à descentralização.

Rosas (1987) traça um diagnóstico do funcionamento da vigilância sanitária

no período anterior à elaboração da Constituição de 1988. Ele relata que havia

uma superposição, um conflito entre as ações de vários órgãos governamentais, o

que fragmentava e por vezes inviabilizava um trabalho eficiente.

O mesmo autor já aponta a necessidade de descentralizar e regionalizar as

ações da vigilância sanitária para os estados e municípios, desconcentrando do

nível federal. Ressalta também a descentralização da rede de laboratórios de

referência. Ele levanta a necessidade da incorporação por parte da vigilância

sanitária de atribuições outras além do controle de produtos. Estas seriam o

controle sobre serviços, o meio ambiente e saúde do trabalhador.

Em verdade, a descentralização das ações de saúde, por mais benéfica

que venha a ser, não deve se dar com ausência ou deficiência de um

planejamento cuidadoso.

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Uma condição básica para os municípios captarem novas atribuições e

operacionalizá-las é que sejam capazes de dar conta das diretrizes e princípios

do Sistema Único de Saúde – SUS (Silva, 1995). Não basta estar enquadrado em

uma das condições de gestão postas pela Norma Operacional Básica – NOB

01/96.

No que concerne à vigilância sanitária, para isso o município deverá dispor

de uma legislação própria, como um Código Municipal de Saúde, de uma política

de recursos humanos que supra as demandas, de apoio laboratorial e de uma

discussão prévia envolvendo as instâncias governamentais, servidores e

população (Silva, 1995).

Em suma, a descentralização das ações, além de apresentar vantagens ao

permitir intervenções num nível mais próximo da realidade local, possui respaldo

legal. Com isso vem se mostrando uma tendência irreversível na gestão da

saúde. Algo de fundamental para a consolidação do SUS.

Para a vigilância sanitária não é diferente. Uma das bases de sustentação

do Sistema Único de Saúde, ela tem posto em prática tal processo. Os municípios

vêm assumindo a responsabilidade sanitária sobre a sua população.

Porém, assumir determinadas atribuições não significa ser a solução para

os problemas. É preciso que se tenha uma estrutura adequada – recursos

humanos, financeiros e materiais – para dar conta da demanda, atingindo assim o

objetivo maior de proteção e defesa da saúde.

Neste trabalho procurou-se resgatar as discussões acerca do processo de

descentralização das ações no campo da saúde, em especial das ações da

vigilância sanitária. Visando ilustrar tal discussão, foram abordadas questões

relativas às fábricas de gelo do Recife, tomando por base sua situação até o mês

de fevereiro de 2002.

O debate sobre este tema torna-se relevante na medida em que as gestões

municipais vêm cada vez mais assumindo papéis de grande importância. A

otimização das ações a nível municipal passa, então, a ser fundamental para a

consolidação do Sistema Único de Saúde.

O primeiro capítulo desta monografia busca uma localização teórica do

tema proposto. Situa a trajetória da Vigilância à Saúde, passando pela Reforma

Sanitária e implementação do SUS, que, dentre outros princípios, engloba a

9

descentralização. Este capítulo encerra-se quando da discussão sobre a

vigilância sanitária, seus conceitos e seu papel perante a sociedade.

No segundo capítulo, buscou-se uma abordagem a respeito do sistema de

saúde do Recife, bem como a descrição da conformação da vigilância sanitária

neste município.

O terceiro e último capítulo busca aprofundar o debate sobre a questão das

fábricas de gelo do Recife, tratando desde a legislação a seu respeito até uma

avaliação situacional e da atuação da vigilância sanitária nestes

estabelecimentos.

Para consecução dos objetivos foi realizado um estudo exploratório,

visando aprofundar o tema em questão. Este trabalho poderá servir de base para

estudos posteriores. Uma revisão bibliográfica aliada à vivência no cotidiano do

serviço foram fatores preponderantes para o desenvolvimento deste trabalho.

10

OBJETIVOS

GERAL:

Analisar o processo de descentralização das ações da Vigilância Sanitária

no Recife.

ESPECÍFICOS:

Avaliar a situação sanitária das fábricas de gelo do Recife;

Avaliar o papel da Vigilância Sanitária no controle/monitoramento do

funcionamento das fábricas de gelo do Recife.

11

CAPÍTULO 1

UMA ABORDAGEM TEÓRICA DA VIGILÂNCIA SANITÁRIA

1.1. Vigilância à Saúde, um breve histórico

As ações de saúde pública ao longo do último século no Brasil foram

profundamente marcadas por ações de combate às grandes endemias que

assolavam o país.

Teixeira e colaboradores (1998) relatam que das estratégias de

erradicação, predominantes na primeira metade do século, passa-se a assimilar o

controle de algumas doenças e noções de vigilância epidemiológica por volta da

década de 1950. Porém, já nos anos 30 e 40 se discutia o conceito de risco. Nos

anos 60, com o avanço tecnológico, a Epidemiologia passa a ganhar mais

autonomia na produção de conhecimento. A partir da década de 1970 surgem as

primeiras propostas para implantação de sistemas de vigilância epidemiológica,

com o princípio da geração de informações como base para as ações.

O Sistema de Vigilância Epidemiológica, o Plano Nacional de Imunização e

o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária foram criados em meados da década

de 1970, visando reparar uma séria crise sanitária pela qual o país atravessava.

Disto resultou uma dissociação entre a vigilância epidemiológica e a vigilância

sanitária (SES – SP, 1998).

As ações de Vigilância no Brasil mostram-se historicamente

desmembradas, diferenciando-se vigilância epidemiológica de vigilância sanitária.

Isto ocorre apesar da Lei Orgânica da Saúde n° 8.080/90 trazer em suas

definições de vigilância epidemiológica e vigilância sanitária o caráter de

complementaridade e a necessidade de uma prática conjunta entre elas

(FUNASA, 2001).

A década de 1980 trouxe o debate sobre a integração das vigilâncias

epidemiológica e sanitária, mais precisamente quando da implantação do Sistema

Único e Descentralizado de Saúde – SUDS. Este debate persiste até os dias

atuais, onde temos o Sistema Único de Saúde – SUS com a proposta de

12

implementação do Sistema de Vigilância da Saúde (VIGISUS), que integra as

vigilâncias epidemiológica, sanitária e ambiental. O VIGISUS está fundamentado

nos princípios do SUS, que apontam para a descentralização das ações de

vigilância à saúde para os municípios (Teixeira e cols, 1998).

O processo de industrialização e urbanização acelerada e desordenada

tem trazido novos perfis epidemiológicos para as grandes cidades. Há uma

incorporação de novos agravos decorrentes do impacto ambiental deste

processo. Com isso, tem-se buscado desenvolver ações de cunho preventivo,

enfocando-se predominantemente os riscos de acontecimento de um evento não

desejável. Daí o surgimento do conceito de Vigilância Ambiental em Saúde

(FUNASA, 2001).

1.2. A Reforma Sanitária e o Sistema Único de Saúde

A Reforma Sanitária Brasileira foi um movimento surgido numa época de

transição democrática, na década de 1980, período da Nova República. Foi

apenas parte de um conjunto de mudanças cujas lutas vieram à tona neste

período. A VIII Conferência Nacional de Saúde, em 1986, foi um dos seus

maiores momentos.

A “Oitava”, como ficou conhecida, se destacou pela ampla participação da

sociedade nas discussões de temas como a saúde enquanto direito do cidadão e

responsabilidade do Estado, a necessidade de um novo sistema de saúde devido

à falência do modelo vigente e as formas de financiamento deste sistema. Seu

texto foi quase todo aprovado durante a Assembléia Nacional Constituinte.

Indubitavelmente, alcançou-se um grande avanço para a saúde do país. Os

ideais da Reforma apontavam para a criação de um sistema de saúde que tivesse

como doutrinas a universalidade, a equidade e a integralidade, e como princípios

organizacionais a descentralização, a regionalização e o controle social. Tudo isto

veio culminar com o surgimento do Sistema Único de Saúde, o SUS.

O texto da Constituição Federal de 1988 contemplou o resultado de lutas

de diversos setores da sociedade, chegando a ser chamada de “Constituição

Cidadã”. No capítulo que trata da Saúde, merece ênfase o Artigo 196 – “a saúde

13

é um direito de todos e dever do Estado” – que se transformou num marco de

conquista para este setor.

Esta Constituição veio consolidar a saúde em seu conceito mais amplo,

não mais como a simples ausência de doença, indo além da assistência médica,

abrangendo alimentação, trabalho, habitação, saneamento básico, salário,

educação, transporte, meio ambiente, lazer, terra. Resultante da interação de

fatores biopsicossociais dos mais diversos, tendo em vista a qualidade de vida.

Enfim, a saúde como um direito social, uma condição básica de cidadania.

No SUS a universalidade da atenção à saúde com equidade no

atendimento, isto é, ações e serviços de saúde que atinjam as necessidades da

população, além da integralidade das ações, englobam a promoção, a proteção e

a recuperação da saúde. A regionalização e hierarquização significam

organização dos serviços em níveis de complexidade crescente do atendimento,

com base no território e população de abrangência. Prevê ainda a

descentralização das ações e serviços de saúde, ou seja, uma redistribuição das

atribuições e competências para o nível de gerenciamento mais próximo possível

da população. A participação dos cidadãos na elaboração e na fiscalização da

aplicação das políticas de saúde é um outro princípio a ser destacado.

O Artigo 4º da Lei Orgânica da Saúde nº 8.080 (L.O.S.), de 19/09/1990,

afirma que “o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos de

instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e

indireta e das fundações mantidas pelo Poder Público, constitui o Sistema Único

de Saúde”.

Todavia, Reforma Sanitária e SUS não devem ser confundidos. A

implantação de um sistema único de saúde é parte de uma luta por um modelo

mais democrático, socialmente justo e com maior grau de resolutividade.

1.3. Descentralização das ações de saúde

Atualmente, no Brasil, ainda pode-se perceber a concomitância de ações

no campo da saúde que contemplam os modelos médico-assistencial privatista e

14

o assistencial sanitarista. O modelo médico-assistencial privatista teve seu

período hegemônico em meados do século XX, mais especificamente durante os

governos militares, sendo um modelo hospitalocêntrico mais voltado à demanda

espontânea e com grande poder do setor privado. O modelo assistencial

sanitarista tem como alicerces as campanhas, programas especiais de saúde

pública e ações de vigilância epidemiológica e sanitária (Teixeira e colaboradores,

1998).

Apesar disso, tem-se buscado a consolidação de modelos assistenciais

alternativos cujos princípios e diretrizes estão preconizados pela Constituição

Federal de 1988 e pelas Leis 8.080/90 e 8.142/90.

A descentralização passa, então, a ser um princípio básico e necessário

para efetivação dos demais e consecução de um modelo que atenda as reais

necessidades da população. No período de transição democrática, prévio à

elaboração da Constituição de 1988, a descentralização tornou-se a bola da vez

por permitir a quebra da concentração de poder na esfera federal e um maior

controle e participação social (Brasil, 1993).

A municipalização, enquanto estratégia de descentralização, é um

processo gradual, tendo que se levar em conta a heterogeneidade dos milhares

de municípios existentes no país, que embora iguais perante a lei, são bem

diferenciados quanto ao perfil epidemiológico e necessidades de saúde. É

imprescindível compreender a necessidade de se respeitar os princípios do SUS

quando da implementação da municipalização, do contrário ela tenderá a

significar simplesmente a “transferência de responsabilidade na prestação de

serviços ou mero repasse de recursos para as prefeituras” (Paim, 1991).

Segundo Paim (1999), o processo de municipalização das ações de saúde

tem se mostrado como simples desconcentração de serviços antes concentrados

nas mãos dos governos estaduais e federal, sendo repassados para a gestão

municipal. Esta avaliação é possível, apesar da elaboração das Normas

Operacionais Básicas (NOB´s) de 1993 e 1996, que estabeleceram normas e

procedimentos reguladores do processo de descentralização da gestão de saúde.

Descentralizar implica em aproximar, ao máximo, a gestão e as ações de

saúde de uma determinada população e suas peculiaridades. Isto remete a algo

além da municipalização. Sob este enfoque surge a distritalização.

15

A distritalização é um processo de reorientação política e organizacional do

sistema de saúde com base territorial definida segundo aspectos sócio-

econômicos e epidemiológicos. O distrito sanitário é a menor unidade

administrativa e operacional do sistema. A distritalização possibilita a implantação

de modelos assistenciais alternativos, além de permitir maior controle social e

resolubilidade dos problemas (Paim, 1999).

Para Mendes at al (1995) a concepção de distritalização foge à lógica da

demanda espontânea e busca desenvolver suas ações tendo por base os

problemas e as necessidades da população, daí a importância do conhecimento a

fundo da mesma. Antes de uma racionalização financeira e administrativa, o que

a distritalização pretende finalmente atingir é uma mudança das práticas

sanitárias de modo a impactar sobre as condições de saúde da população que ali

vive.

1.4. A Vigilância Sanitária

A vigilância sanitária é, sem dúvida, um dos alicerces do SUS. O Artigo 200

da Constituição, que define as competências e atribuições do sistema único de

saúde, ratifica esta afirmação na medida em que possui seis dos seus oito incisos

referindo-se às vigilâncias sanitária e epidemiológica.

A Lei nº 8.080/90 (L.O.S.), em seu Artigo 6º, define vigilância sanitária

como “um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à

saúde e de intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da

produção e circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde,

abrangendo: I - o controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se

relacionem com a saúde, compreendidas todas as etapas e processos, da

produção ao consumo; e II - o controle da prestação de serviços que se

relacionem direta ou indiretamente com a saúde”.

A atuação sobre fatores de risco à saúde é o que norteia a vigilância

sanitária. Porém, a sua prática não está fundamentada apenas no conceito de

risco, sendo este entendido como probabilidade de ocorrência de um efeito

16

adverso à saúde e da gravidade de tal efeito (Resolução nº 17, de 30/04/1999).

Há de se destacar, então, o seu papel de intervenção sobre o processo produtivo,

englobando questões de qualidade de produtos, de serviços, de ambientes e,

sobretudo, de vida (Costa, 1999).

O objetivo da vigilância sanitária está sintetizado na proteção e defesa da

saúde individual e coletiva, visando, por fim, promover qualidade de vida (Costa,

1999).

A vigilância sanitária atua com base em legislação específica, a qual é

essencial à sua prática. Por meio da fiscalização sanitária, o Estado exerce seu

poder. O exercício do poder público, ou poder de polícia, permite à vigilância

sanitária restringir os interesses individuais em favor dos interesses coletivos

(Costa, 1999).

Para Luchesi (1992), a vigilância sanitária é uma das funções típicas do

Estado, pelo fato de intervir no conflito entre interesses específicos de setores da

sociedade e o interesse coletivo. Ela atua sobre as ameaças decorrentes do

modo de vida contemporâneo, ligado ao consumo desenfreado de novos produtos

e tecnologias trazidos pelo desenvolvimento industrial. Isto implica no exercício de

um papel de importância sócio-econômica, que por vezes até atua inviabilizando

econômica e legalmente determinados projetos, sem perder de vista a proteção

da saúde coletiva.

Quando da fiscalização é verificado o cumprimento da legislação em todos

os seus aspectos, que envolvem produtos e serviços sob controle da saúde

(embalagens, condições de conservação, rotulagem, informação e propaganda,

condições gerais de produção, armazenagem, transporte, comercialização e

consumo), podendo ser aplicadas medidas preventivas ou repressivas (Costa,

1999).

Segundo Costa (1999), o laboratório exerce um papel de grande relevância

para a vigilância sanitária, servindo de apoio à fiscalização. Nele é verificada a

correspondência ou não dos produtos com as normas. As análises devem ser

feitas em laboratórios oficiais, que devem acompanhar o desenvolvimento

tecnológico e científico na área.

Existem análises fiscais e de controle, bem como as análises prévias. As

análises fiscais e de controle são realizadas em inspeções de rotina ou em

17

programas especiais de inspeção, devendo-se garantir ao interessado a

possibilidade de realizar análise de contra-prova (SES – PE, 1998). As análises

prévias servem de requisito para o registro de um produto ou substância (Costa,

1999).

O monitoramento é uma prática recente no campo da vigilância sanitária.

Significa controlar e avaliar mediante acompanhamento no intuito de identificar

riscos à garantia da qualidade de produtos, serviços e ambientes (Waldman,

1991, apud Costa, 1999).

Enfim, a qualidade de vida da população, condição tão almejada pela

vigilância sanitária, não depende apenas da simples oferta de serviços e

produtos. Faz-se necessário que sejam ofertados com qualidade e que se

promovam meios de acesso a eles, bem como a garantia de participação no

processo.

18

CAPÍTULO 2

A VIGILÂNCIA SANITÁRIA NO RECIFE

2.1. O Recife e o seu sistema de saúde

Capital do Estado de Pernambuco, cidade litorânea com 1.441.582

habitantes (IBGE – 1996) ocupando os seus 209 km2, Recife é marcada pela

presença de uma população bastante heterogênea distribuída em regiões sócio-

economicamente bem diferenciadas (Anexo 01).

O Recife possui 94 bairros, sendo agrupados em seis Regiões Político-

Administrativas (RPA´s) com base em aspectos geográficos e populacionais. As

RPA´s subdividem-se em três micro-regiões, perfazendo um total de 18 em toda a

cidade. As micro-regiões são compostas por bairros com características

semelhantes no que diz respeito às condições de vida.

A NOB-SUS 01/96 aponta duas condições de gestão municipal da saúde, a

Plena da Atenção Básica e a Plena do Sistema Municipal. Sua infra-estrutura

gerencial permite ao Recife exercer a Gestão Plena do Sistema Municipal, forma

mais complexa de gerenciamento do setor, na qual a Secretaria Municipal de

Saúde (SMS) é responsável por prover ações que vão além da atenção básica.

Quanto à atenção básica, merece destaque a cobertura oferecida pelo

Programa de Agentes Comunitários de Saúde (PACS), bem como pelo Programa

de Saúde da Família (PSF), cujas proporções vêm crescendo bastante.

O Recife vem mostrando avanços na estruturação do seu sistema de

saúde. Como exemplo disso tem-se a incorporação de novas atribuições,

implementação de programas como o de Saúde Ambiental, através dos Agentes

de Saúde Ambiental (ASA´s) e expressiva ampliação da atenção básica, através

do PSF e PACS.

A SMS presta ações de média complexidade na Atenção à Saúde através

dos Centros de Saúde e das Policlínicas. Ações de alta complexidade, como as

da rede hospitalar, ainda estão a cargo da gestão estadual. Inclusive, o Recife

19

concentra uma grande rede de hospitais, uma das maiores do país, atraindo o

público de municípios vizinhos, de uns mais afastados e até de outros estados.

Cada uma das RPA´s corresponde a um Distrito Sanitário (DS), unidade

que possui autonomia na gestão da saúde.

A estrutura organizacional atual dos seis Distritos Sanitários mostra-se

semelhante. Contam com uma Diretoria Geral, que coordena os Departamentos

de Vigilância à Saúde (DVS), de Atenção à Saúde (DAS), de Desenvolvimento

Comunitário (DDC), Administrativo e Financeiro (DAF) e de Recursos Humanos

(DRH). Há ainda os Serviços de Educação em Saúde e o de Apoio Administrativo

(Anexo 02).

Cada um dos departamentos possui estrutura própria e atribuições

definidas. Eles estão ligados às suas respectivas diretorias em seu nível central.

As diretorias, por sua vez, exercem um papel de controle sobre os

departamentos.

2.2. Estrutura da Vigilância Sanitária no Recife

Uma das diretorias da Secretaria Municipal de Saúde é a Diretoria de

Epidemiologia e Vigilância à Saúde (DIEVS). Ela é composta por três Diretorias

Executivas, a de Vigilância Sanitária, a de Epidemiologia, e a de Vigilância

Ambiental.

A Diretoria Executiva de Vigilância Sanitária (DEVISA) possui três

Departamentos com suas respectivas Divisões. O Departamento de Controle de

Saúde e Medicamentos, com a Div. de Medicamentos e Produtos Correlatos, Div.

de Engenharia e Arquitetura e a Div. de Controle de Serviços de Interesse à

Saúde; o Departamento de Controle de Alimentos e Ambiente de Trabalho, com a

Div. de Saúde do Trabalhador e a Div. de Controle de Alimentos; e o

Departamento de Processos Sanitários, com a Div. de Controle de Processos. A

DIEVS possui também o setor de Assessoria Jurídica (Anexo 03).

Cabem, no entanto, algumas ressalvas no tocante a estrutura

organizacional da DEVISA. A Divisão de Saúde do Trabalhador que, embora

apareça ligada ao Departamento de Controle de Alimentos e Ambiente de

20

Trabalho, em verdade presta uma assessoria a todos os departamentos sempre

que surgem demandas de sua competência. A técnica responsável pela referida

divisão é uma Engenheira em Segurança do Trabalho.

A equipe ligada ao Departamento de Controle de Alimentos e Ambiente de

Trabalho tem sob sua responsabilidade estabelecimentos como fábricas de gelo,

empresas de exploração e distribuição de água potável, empresas limpadoras de

fossa. A Divisão de Controle de Alimentos tem, entre outros papéis, o de

promover uma constante atualização acerca da legislação que trata da área de

alimentos, mantendo uma relação com os distritos sanitários de forma a difundir

tais informações. Uma outra atribuição do Departamento de Controle de

Alimentos e Ambiente de Trabalho é buscar articular-se com os distritos para

planejar e executar ações conjuntas, em especial nos períodos de eventos de

grande porte.

O Departamento de Controle de Saúde e Medicamentos acumula entre os

estabelecimentos de sua competência as clínicas sem internamento, consultórios

médicos, odontológicos, fisioterápicos e psicológicos, laboratórios de análises

clínicas, clínicas radiológicas, pousadas geriátricas, funerárias, lojas de produtos

veterinários, distribuidoras de materiais cirúrgicos e produtos químicos, etc.

O Departamento de Processos Sanitários é responsável pelas liberações

das licenças no que tange às questões burocráticas.

Nos distritos sanitários, a vigilância sanitária está inserida no Departamento

de Vigilância à Saúde, compondo uma de suas três Divisões, juntamente com a

de vigilância epidemiológica e a de vigilância ambiental. A Divisão de Vigilância

Sanitária não possui subdivisões.

As equipes da vigilância sanitária dos distritos possuem entre suas

atribuições, e de forma destacada, a fiscalização sobre estabelecimentos que

comercializam alimentos, bem como hotéis, motéis, pousadas, salões de beleza,

academias de ginástica, escolas, creches, entre outros.

A vigilância sanitária do Recife vem assimilando, pouco a pouco,

atribuições emanadas pelo nível estadual. As novas atribuições são,

normalmente, primeiro incorporadas pelo nível central municipal e só em seguida

são repassadas aos distritos.

21

Dentro dos grandes municípios como o Recife, em geral, há uma tendência

à distritalização das ações, justificada pela importância de uma intervenção em

um nível o mais próximo possível da realidade local. Acrescenta-se a este fator o

processo de consolidação dos princípios do SUS, dentre eles a própria

descentralização de ações.

22

CAPÍTULO 3

A VIGILÂNCIA SANITÁRIA NAS FÁBRICAS DE GELO DO RECI FE

3.1. A responsabilidade sanitária sobre as fábricas de gelo

As fábricas de gelo, como os demais estabelecimentos de interesse da

saúde, fazem por merecer rigoroso controle. Possuem, além da responsabilidade

para com a saúde da população, uma vasta legislação a ser cumprida.

O gelo é um produto de consumo em larga escala. São inúmeras as suas

formas de utilização. Entre elas estão a conservação de alimentos e de outros

produtos através do resfriamento, até o uso alimentar.

Comercializar um produto que ofereça o mínimo possível de risco à saúde

da população é um dever das fábricas de gelo. A Vigilância Sanitária é o órgão

competente do Estado para fiscalizar o cumprimento de todo o aparato legal em

prol do interesse coletivo.

Na vigilância sanitária do Recife, o setor responsável pelas inspeções é a

Divisão de Controle de Alimentos, do Departamento de Controle de Alimentos e

Ambiente de Trabalho da DEVISA, nível central do município. A referida Divisão é

chefiada por uma técnica de nível superior e é composta por dois técnicos de

nível médio, sendo um Técnico em Saneamento e o outro em Segurança do

Trabalho, além de dois estagiários, todos divididos em dois turnos.

As fiscalizações e o monitoramento da produção das fábricas de gelo são

de fundamental importância. Aspectos como condições gerais de infra-estrutura,

manutenção de equipamentos e reservatórios, controle de qualidade da água,

cuidados na manipulação, embalagem, armazenamento, transporte e

comercialização, interagem de forma a influenciar na oferta de um produto com

qualidade.

Todos os aspectos citados acima são alvo das inspeções realizadas para

liberação da licença sanitária. Além do parecer técnico do inspetor sanitário, faz-

se necessária a apresentação de uma documentação específica.

23

Nos casos de licença inicial de funcionamento, são exigidos o requerimento

padronizado da SMS – Vigilância Sanitária assinado pelo responsável ou

proprietário, o CGC, o contrato social ou registro de firma individual, a taxa paga

do alvará de localização, declaração de responsável técnico, certificado de

regularidade técnica emitido pelo Conselho Regional pertinente, relativo ao

profissional e certificado de regularidade técnica da empresa, planta baixa da

unidade de produção e laudos físico-químicos e microbiológicos emitidos por

laboratório oficial. Em se tratando da renovação da licença sanitária, os

documentos exigidos são praticamente os mesmos, com exceção da substituição

do alvará de localização pela taxa do Certificado de Inscrição Municipal (CIM), e

os quatro últimos laudos das análises microbiológicas trimestrais e o último laudo

físico-químico emitidos por laboratório oficial.

Entre as exigências feitas pela equipe da vigilância sanitária durante as

inspeções, tanto nos casos de licença inicial como nos de renovação, está o

enquadramento da água e do gelo dentro dos padrões postos pela legislação.

Para verificação desta questão é realizada coleta dos materiais para análise

laboratorial de forma rotineira.

De posse dos laudos, e estando eles indicando que os materiais estão de

acordo com a legislação, a fábrica de gelo terá cumprido uma exigência essencial

para o seu funcionamento. Caso contrário, a produção é paralisada pelos

inspetores até que se tomem as devidas providências para sanar o problema,

sejam elas limpeza e desinfecção dos reservatórios, mudança do fornecedor de

água potável, desde que seja cadastrado pela vigilância sanitária e apresente

laudos físico-químicos e bacteriológicos de sua água, entre outras que se fizerem

necessárias. Uma vez comprovada a resolução dos problemas, o estabelecimento

estará autorizado a retomar a produção.

Após a liberação da licença, seria oportuno um acompanhamento do

estabelecimento durante o período de validade da mesma através,

principalmente, do monitoramento da qualidade da água, matéria-prima para a

produção do gelo.

Com base na experiência acerca do controle sanitário das fábricas de gelo,

o Departamento de Controle de Alimentos e Ambiente de Trabalho vem

elaborando uma Norma Técnica Especial sobre as mesmas. Porém, esta norma

24

ainda não detém reconhecimento enquanto tal, devendo ainda ser finalizada e

passar por uma etapa de aprovação, para que, em seguida, possa ser aplicada

(Anexo 04).

3.2. A legislação

Todos os aspectos concernentes ao gelo estão inseridos na legislação que

trata de alimentos. A Resolução nº 12, da Comissão Nacional de Normas e

Padrões para Alimentos (CNNPA), de 24/07/1978 e a Norma Técnica Especial

sobre Alimentos (Portaria 49/95 – NTE 01/95, Artigo 15, XXXIV) definem o gelo

como “produto resultante do congelamento da água potável”.

Uma vez classificado como alimento que tem como matéria-prima a água

potável, ou seja, “aquela com qualidade adequada ao consumo humano” (Portaria

36/MS, de19/01/1990), tem-se uma elevação do grau de risco à saúde dos seus

consumidores, justificada pela suscetibilidade da água a contaminações.

O Código Sanitário do Estado de Pernambuco (Artigo 300, XVIII) afirma

que “o gelo utilizado em contato direto com alimentos ou superfícies que entrem

em contato direto com os mesmos não devem conter nenhuma substância que

possa ser perigosa para a saúde ou contaminar o alimento, obedecendo ao

padrão de água potável”.

A NTE 01/95, Artigo 191, traz três classificações diferentes para o gelo. Ele

será opaco quando obtido com agitação mecânica; claro ou semitransparente

quando em repouso; e cristalino quando utilizada água desionizada ou outras

isentas de ar.

As análises laboratoriais do gelo devem corresponder com as da água

potável quanto às suas características organolépticas (odor e sabor), físicas e

químicas. No que diz respeito às características microbiológicas coincide o

parâmetro estipulado para bactérias do grupo coliforme: ausência em 100ml do

produto degelado. No caso da análise do gelo, diferentemente da água, são

avaliadas as características microscópicas, devendo-se ter ausência de sujidades,

parasitos e larvas (Resolução nº 12-CNNPA, de 24/07/1978).

25

As fábricas de gelo devem dispor de sala de manipulação e seção de

venda e/ou expedição (NTE 01/95, Artigo 190). Elas deverão, também, ser

abastecidas de água potável (Código Sanitário do Estado de Pernambuco, Artigo

317).

3.3. A situação das fábricas de gelo do Recife

3.3.1. Aspectos descritivos

Chega a um total de trinta o número de fábricas de gelo cadastradas pela

vigilância sanitária no Recife. Entretanto, duas destas fábricas, que se tornaram

de conhecimento devido a denúncias, deverão ainda ser visitadas para

confirmação e inspeção e uma outra está em processo de repasse ao nível

estadual da vigilância sanitária. Além do mais, seis fábricas de gelo encerraram

em definitivo suas atividades.

Considerando-se as fábricas de gelo em funcionamento, pode-se constatar

a presença delas em quase todos os distritos sanitários. O DS VI é o que possui

uma maior quantidade, num total de nove, com destaque para o bairro da

Imbiribeira, que abriga cinco fábricas. Em seguida tem-se o DS III com cinco, o

DS V com quatro, o DS IV com duas e o DS II com uma no bairro de Água Fria. O

DS I não possui fábricas de gelo.

A “New Gelo” e a “King Gelo” são as fábricas que deverão ainda ser

visitadas para que se confirme ou não sua existência.

Por se tratar de uma indústria de alimentos, utilizando o coco como

matéria-prima de sua produção, a “Socoquinho” deverá ser repassada ao nível

estadual da vigilância sanitária, pois é dela a competência das inspeções a este

tipo de estabelecimento.

“Gelão”, “Free Gelo”, “Gelo Vip”, “Aki Gelo”, “Bom Gelo” e “Além das

Águas” foram as fábricas que puseram fim na sua produção, encerrando as

atividades. Vale ressaltar que a “El Gelo” encerrou suas atividades enquanto

fábrica de gelo, porém passou a funcionar como depósito de distribuição. A

“D´Gelo” também funciona como distribuidora das marcas “Du´Gelo” e “D´Koco”.

26

Uma fábrica, a “Pólo Norte Gelo”, encontra-se em processo desativação,

pois o proprietário deverá ainda se desfazer dos equipamentos. Fato este que

requer acompanhamento com vistas a coibir a permanência do funcionamento de

forma irregular.

A “Q Frio Gelo Seco” trata-se de uma distribuidora de gelo seco, portanto

as inspeções a este estabelecimento estão a cargo da Divisão de Medicamentos

e Produtos Correlatos, do Departamento de Controle de Saúde e Medicamentos.

A mesma encontra-se sob notificação.

Num universo de vinte fábricas de gelo/depósitos de distribuição

funcionando sob a responsabilidade do Departamento de Controle de Alimentos e

Ambiente de Trabalho, apenas três (15%) estão devidamente licenciadas. Uma

delas (5%) está em fase de encerramento de suas atividades.

Sete (35%) estão com processo em andamento, ou seja, possuem

pendências relativas a documentação, principalmente, quanto aos Certificados de

Regularidade Técnica emitido pelo Conselho Regional do técnico responsável

e/ou quanto à planta baixa (lay-out) da unidade de produção, sendo estes

aspectos burocráticos os empecilhos para a emissão da licença.

Nove estabelecimentos (45%) estão notificados, devendo regularizar-se

para recebimento da licença sanitária de funcionamento. Por meio das

notificações foi solicitado o comparecimento dos representantes destes

estabelecimentos à sede da vigilância sanitária para tratar de assuntos

pertinentes a sua regularização. O distrito sanitário VI possui cinco fábricas de

gelo notificadas, isto é, mais da metade dos seus estabelecimentos apresentam-

se irregulares.

O quadro a seguir traz uma melhor sistematização dos dados a respeito

das fábricas de gelo:

27

3.3.2. Análise situacional

Verifica-se um número bastante baixo de fábricas de gelo com licença

sanitária em dia. Este fato pode vir a ser um reflexo das dificuldades encontradas

pelos estabelecimentos para ajustarem suas condições de funcionamento às

normas.

A quantidade de fábricas com pendências relativas apenas à

documentação indica que boa parte delas deixa a desejar em aspectos

burocráticos, mas não nos que dizem respeito às questões higiênico-sanitárias.

Enquadrariam-se, contudo, entre as fábricas com dificuldade de ajuste às normas

como um todo, conforme mencionado acima.

Algumas fábricas possuem estrutura precária, inclusive funcionando em

espaços divididos com imóveis residenciais. Esta realidade justifica a quantidade

expressiva de estabelecimentos que encerraram suas atividades.

No quadro exposto acima, o não preenchimento total dos espaços

reservados para o nome da razão social dos estabelecimentos não tem grande

relevância, pois a ausência dos mesmos decorre de maior uso dos nomes de

fantasia por serem de mais fácil reconhecimento da equipe. Uma vez que se deu

entrada no processo sanitário, a fábrica de gelo necessariamente tem sua razão

social descrita no mesmo.

Quando das inspeções, diversos outros tipos de irregularidades têm

chamado a atenção da equipe. Entre elas, as ligadas aos funcionários têm se

mostrado bem presente. O uso inadequado ou ausência dos equipamentos de

proteção individual (EPI), bem como a ausência ou inadequação dos locais para

higiene pessoal.

O monitoramento das fábricas no decorrer do prazo de validade da licença

sanitária tem se mostrado inadequado. Os técnicos têm se deparado com fatores

que impõem limites à sua realização. A quantidade reduzida de técnicos lotados

no Departamento de Controle de Alimentos e Ambiente de Trabalho, somado ao

acúmulo de outras atribuições sobre a equipe deste setor e, por vezes, a ausência

de transporte, são os geradores das dificuldades para a realização de tal

atividade.

28

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A Lei Orgânica da Saúde, n° 8080/90, determina as atribuições das três

esferas de governo, significando que cada nível de gestão tem o seu espaço de

atuação e um papel a ser cumprido.

A clara possibilidade de intervenção por parte de um nível de gestão mais

próximo possível da realidade local e com maior resolutividade, decorrentes da

descentralização das ações de saúde, tem impulsionado tal processo.

Mesmo não desconsiderando as questões político-gerenciais, a infra-

estrutura do setor saúde no município exerce grande influência no

encaminhamento do processo de descentralização, podendo impor limites ou

potencialidades. Ou seja, além de vontade política é necessário também que o

nível municipal busque estruturar-se de modo a dar suporte às novas atribuições.

A descentralização das ações de vigilância sanitária vem se consolidando

na Cidade do Recife, constituindo-se num processo em curso. Este município vem

ao longo dos anos incorporando atribuições repassadas do nível estadual.

Dentro da sua estrutura interna, o Recife tem paulatinamente redistribuído

tais atribuições entre o nível central e os seus distritos sanitários, uma vez que há

a necessidade anterior de um ajuste estrutural nos distritos. Pois, assumir novos

papéis implica em atrair para si uma maior responsabilidade sobre a saúde da

população.

No que concerne às fábricas de gelo, a atuação da vigilância sanitária

através do controle de sua produção e comercialização é imprescindível. O gelo é

um produto classificado como alimento, cuja contaminação pode se dar

facilmente, o que eleva os riscos de ocasionar agravos à saúde.

Do total de fábricas de gelo conhecidas pela vigilância sanitária do Recife,

e com base na distribuição quantitativa por distritos sanitários, constata-se um

número reduzido delas em cada DS, conforme exposto no terceiro capítulo deste

trabalho. O distrito sanitário VI, apesar de ser o que mais possui fábricas de gelo,

não chega a abrigar sequer dez estabelecimentos, quantidade que vem a ser de

muito pouca significância em meio a centenas de outros estabelecimentos

envolvidos com alimentos.

29

Os distritos sanitários possuem sob sua responsabilidade um grande

universo de estabelecimentos que comercializam alimentos e um quadro técnico

bastante experiente e capacitado para as inspeções deste tipo.

O número de técnicos lotados no Departamento de Controle de Alimentos e

Ambiente de Trabalho, nível central, mostra-se insuficiente para oferecer um

acompanhamento mais rigoroso sobre as fábricas de todos os distritos juntos.

Além disso, tem-se nos distritos sanitários, proporcionalmente, uma maior

quantidade de técnicos para uma menor quantidade de fábricas.

O cenário exposto acima se apresenta favorável à distritalização das ações

de vigilância sanitária sobre as fábricas de gelo do Recife.

Uma vez distritalizadas, ter-se-ia sobre as fábricas um melhor controle de

sua produção e uma conseqüente redução dos riscos impostos pelo consumo de

um alimento bastante suscetível a contaminações.

Enfim, o Recife vem adquirindo novas atribuições do nível estadual e, na

medida em que isto vai ocorrendo, vão também sendo repassadas outras

competências aos distritos sanitários. O resultado de tudo isso é o aumento da

demanda de técnicos da vigilância sanitária em todo o município. Portanto, a

ampliação e o treinamento do quadro de inspetores sanitários são condições

básicas para dar suporte às novas competências.

30

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34

ANEXO 01

35

ANEXO 02

36

ANEXO 03

37

ANEXO 04