12
1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: conexões possíveis rumo ao pensamento pós-colonial Tiago Silva Alves Muniz 1 Barbara Cristina Pelacani 2 1 Analista Ambiental | Técnico em Arqueologia (IEPA) - Mestre em Arqueologia (UFRJ) e Licenciatura Plena em Ciências Biológicas (UFRuralRJ) [email protected] 2 Mestranda em Educação (UNIRIO) e Pesquisadora do GEASur [email protected] RESUMO A abordagem crítica no campo tanto da educação formal ou não-formal contribui para a formação humanitária dos educandos, fazendo-os reconhecer através de abordagens na educação ambiental e patrimonial o raciocínio crítico fundamental para autonomia rumo ao pensamento pós-colonial. De tal maneira, este trabalho visa refletir sobre a necessidade de contextualização de temas transversais e atuação do educador frente às relações hegemônicas de dependência, pobreza e visão de mundo. Palavras-chave: educação ambiental crítica, educação patrimonial, justiça socioambiental, racismo ambiental, práticas educativas. ABSTRACT The critical approach in the field of both formal and non-formal education contributes to the humanitarian formation of learners, making them recognize through critical approaches to environmental and heritage education the fundamental critical reasoning for autonomy towards the post-colonization of thought. Thus, this work aims to reflect on the need to contextualize cross - cutting themes and the educator 's performance in relation to hegemonic relations of dependence, poverty and worldview. Key-words: critical environmental education, patrimonial education, socio- environmental justice, environmental racism, educational pratices. Introdução A prática pedagógica como nos campos da educação ambiental e patrimonial e o envolvimento com temas transversais permite reconhecer e transformar a visão de mundo dos educandos baseados da proposição do pensamento crítico seguindo Freire (1969); Funari (2001); Loureiro (2007). A fim de emancipar o educando, a perspectiva crítica da educação ambienta-se em campo de disputa, com o olhar para a pós- colonialidade. O território demarcado pela colonização reflete aspectos históricos, sociais e econômicos de tal processo de apropriação. Destarte, as ações pedagógicas patrimoniais e ambientais seguindo uma perspectiva crítica (MORIN, 1973) devem evidenciar lacunas que foram produzidas com fins de alienação e dominação dos de tais comunidades. A compreensão da relação entre os povos e a natureza integram a educação ambiental e patrimonial numa perspectiva pós-colonial se distanciando da educação tradicional, permeada de um caráter elitista, tecnocrata e eurocêntrico. IX EPEA Encontro Pesquisa em Educação Ambiental Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

  • Upload
    others

  • View
    3

  • Download
    0

Embed Size (px)

Citation preview

Page 1: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

1

Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: conexões

possíveis rumo ao pensamento pós-colonial

Tiago Silva Alves Muniz 1

Barbara Cristina Pelacani 2

1 Analista Ambiental | Técnico em Arqueologia (IEPA) - Mestre em Arqueologia

(UFRJ) e Licenciatura Plena em Ciências Biológicas (UFRuralRJ) –

[email protected]

2 Mestranda em Educação (UNIRIO) e Pesquisadora do GEASur –

[email protected]

RESUMO

A abordagem crítica no campo tanto da educação formal ou não-formal contribui para a

formação humanitária dos educandos, fazendo-os reconhecer através de abordagens na

educação ambiental e patrimonial o raciocínio crítico fundamental para autonomia rumo

ao pensamento pós-colonial. De tal maneira, este trabalho visa refletir sobre a

necessidade de contextualização de temas transversais e atuação do educador frente às

relações hegemônicas de dependência, pobreza e visão de mundo.

Palavras-chave: educação ambiental crítica, educação patrimonial, justiça

socioambiental, racismo ambiental, práticas educativas.

ABSTRACT

The critical approach in the field of both formal and non-formal education contributes to

the humanitarian formation of learners, making them recognize through critical

approaches to environmental and heritage education the fundamental critical reasoning

for autonomy towards the post-colonization of thought. Thus, this work aims to reflect

on the need to contextualize cross - cutting themes and the educator 's performance in

relation to hegemonic relations of dependence, poverty and worldview.

Key-words: critical environmental education, patrimonial education, socio-

environmental justice, environmental racism, educational pratices.

Introdução

A prática pedagógica como nos campos da educação ambiental e patrimonial e o

envolvimento com temas transversais permite reconhecer e transformar a visão de

mundo dos educandos baseados da proposição do pensamento crítico seguindo Freire

(1969); Funari (2001); Loureiro (2007). A fim de emancipar o educando, a perspectiva

crítica da educação ambienta-se em campo de disputa, com o olhar para a pós-

colonialidade. O território demarcado pela colonização reflete aspectos históricos,

sociais e econômicos de tal processo de apropriação. Destarte, as ações pedagógicas

patrimoniais e ambientais seguindo uma perspectiva crítica (MORIN, 1973) devem

evidenciar lacunas que foram produzidas com fins de alienação e dominação dos de tais

comunidades. A compreensão da relação entre os povos e a natureza integram a

educação ambiental e patrimonial numa perspectiva pós-colonial se distanciando da

educação tradicional, permeada de um caráter elitista, tecnocrata e eurocêntrico.

IX EPEA Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 2: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

2

Para tal abordagem, aqui tratamos de temas transversais ou inter-multi-

transdisciplinaridade (WEIL, 1993) Interdisciplinaridade se aplica tanto a uma prática

multidisciplinar, colaboração de profissionais com diferentes formações disciplinares,

como ao diálogo de saberes que funciona em suas práticas, e que não conduz

diretamente à articulação de conhecimentos disciplinares. O disciplinar pode referir-se à

conjugação de diversas visões, habilidades, conhecimentos e saberes dentro de práticas

de educação, análise e gestão ambiental, que, de algum modo, implicam diversas

“disciplinas”– formas e modalidades de trabalho – , mas que não se esgotam em uma

relação entre disciplinas científicas, campo no qual originalmente se requer a

interdisciplinaridade para enfrentar o fracionamento e a superespecialização.

A educação se concretiza pela ação em pensamento e prática, pela práxis, em

interação com o outro no mundo. Trata-se de uma dinâmica que envolve a produção e

reprodução das relações sociais, reflexão e posicionamento ético na significação política

democrática dos códigos morais de convivência. Educar é ação conservadora ou

emancipatória (superadora das formas alienadas de existência); pode apenas reproduzir

ou também transformar-nos como seres pelas relações no mundo, redefinindo o modo

como nos organizamos em sociedade, como gerimos seus instrumentos e como damos

sentido à nossa vida. Isto não significa vê-la como o meio singular para a mudança de

valores individuais e de relações sociais na natureza e nem como dimensão descolada da

dinâmica societária total. É uma dimensão primordial para se alterar nossos padrões

organizativos, mas não deve ser pensada como “salvação”, ignorando-se as demais

determinações sociais nas quais estamos envolvidos. Este é um aspecto de grande

relevância a ser mencionado a cerca da educação.

Percebe-se que nas correntes hegemônicas de educação há uma tendência ao

pragmatismo funcional de base cientificista, instrumental e positivista em suas raízes,

que se manifesta com uma forte tendência pragmática, com uma visão fragmentada da

realidade e apontamentos para a eficiência produtiva de mercantilização da vida

inerente ao capitalismo. Logo, é importante a associação das iniciativas que trabalham

com as esferas afetivas e comportamentais à crítica política, num movimento de

mudança individual e coletiva pela práxis revolucionária, promovendo o

questionamento dos currículos, disciplinas, projetos político-pedagógicos e das relações

de poder nas escolas; a estrutura do sistema educcional brasileiro; além de

problematizar a realidade de vida de cada grupo social, na totalidade social, seja no

Estado, seja na sociedade civil.

Dialeticamente falando, para construirmos um novo patamar societário e de

existência integrada às demais espécies vivas e em comunhão entre nós, precisamos

superar as formas de expropriação que propiciam a dicotomia sociedade-natureza.

Remetendo, portanto, ao seguinte pressuposto: a educação ambiental não se refere

exclusivamente às relações vistas como naturais ou ecológicas como se as sociais

fossem a negação direta destas, recaindo no dualismo, mas sim a todas as relações que

nos situam no planeta e que se dão em sociedade – dimensão inerente à nossa condição

como espécie. Assim, o educar “ambientalmente” se define pela unicidade dos

processos que problematizam os atributos culturais relativos à vida – quando repensa os

valores e comportamentos dos grupos sociais; com os que agem nas esferas política e

econômica – quando propicia caminhos sustentáveis e sinaliza para novos padrões

societários.

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 3: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

3

A dita educação ambiental conservadora (LAYRARGUES, 2004), está centrada

no indivíduo, no alcançar a condição de ser humano integral e harmônico, pressupondo

a existência de finalidades previamente estabelecidas na natureza e de relações ideais

que fundamentam a pedagogia do consenso. Focaliza o ato educativo enquanto mudança

de comportamentos compatíveis a um determinado padrão idealizado de relações

corretas com a natureza, reproduzindo o dualismo natureza-cultura, com uma tendência

a aceitar a ordem social estabelecida como condição dada, sem crítica às suas origens

históricas. Esta vertente não pensa processos educativos que associem a mudança

pessoal à mudança societária como pólos indissociáveis na requalificação de nossa

inserção na natureza e na dialetização entre subjetividade e objetividade; mas sim

pensar a transcendência integradora, a transformação da pessoa pela ampliação da

consciência como caminho único para se obter a união com a natureza e para

reencontrar uma essência pura que ficou perdida em nossa objetivação na história.

A atuação em Educação Ambiental Crítica na perspectiva humanitária

A educação ambiental é um tema transversal e não uma disciplina, podendo ser

inter-multi-transdiciplinar (EVARISTO, 2010). As relações de poder que permeiam a

sociedade se estendem à geração de conhecimento, afetando a evolução científica, como

mantenedoras de paradigmas no ensino de biologia e ciências (KUHN, 1962; ERNST

MAYR, 2005; MUNIZ & BACHINSKI, 2012). A modo que, a prática de ensino neste

contexto de uma educação bancária reforça hierarquias, paradigmas, racismos,

sexismos, especismos (MUNIZ, 2016). A prática de ensino de ciências e respectivas

atividades de ensino-aprendizagem revelam como concepções de meio ambiente1

podem ser avaliadas durante processo pedagógico. Nesta perspectiva, o cotidiano

escolar atuando na formação do indivíduo, preenche e é preenchido de significados,

sendo as visões manifestadas dos educandos sobre a relação entre natureza, humanos e

outros animais foram materializadas na pesquisa de Muniz (2016), onde as concepções

de meio ambiente de Reigota (1991) foram utilizadas como sistema de interpretação e

avaliação de atividades.

A relação natureza vs. homem (ou humanos) vs. animais (ou outros animais), ou

ainda, vs. cultura promovem inúmeras abordagens a partir dos eixos transversais que

interligam tais pontos. Aqui será abordado o debate sobre cultura x natureza, que, na

antropologia surge desde a consolidação desta disciplina em meados dos séculos XIX

(NUERNBERG & ZANELLA, 2003). Para Lévi-Strauss (1982:41) “o homem é um ser

biológico ao mesmo tempo que social”, sendo essa distinção difícil de fazer, onde

ocorrem comportamentos naturais e sociais. Numa abordagem interpretativa, Clifford

Geertz resgata em Max Weber a ideia que o ser humano é “um animal amarrado a teias

de significados que ele mesmo teceu” (GEERTZ, 1991:4) sendo a cultura

essencialmente semiótica. Nesta abordagem interpretativa, Uexküll refuta o argumento

positivista criticando o ideal kantiano justo que, a premissa infundada de que física e

química revelariam a realidade, de um mundo das coisas-em-si, não seria possível

independente do observador humano, sendo para o autor, abordagens complementares e

não alternativas (UEXKÜLL, 2004:38).

1 REIGOTA (1991). Segundo o autor, as concepções de meio ambiente podem ser entendidas como: 1)

naturalista: meio ambiente como sinônimo de natureza intocada, evidencia-se somente os aspectos

naturais; 2) antropocêntrica: evidencia a utilidade dos recursos naturais para a sobrevivência do ser

humano; 3) globalizante: relações recíprocas entre natureza e sociedade.

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 4: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

4

Seguindo o debate na filosofia, Voltaire critica o pensamento reducionista

abordando a teoria de animal-machine, sobre a qual o atual método científico se embasa

(DESCARTES, 2005; MUNIZ & BACHINSKI, 2012). Para tal crítica o argumente

segue a partir da suposição que os homens tinham continuamente ideias, percepções,

concepções as quais decorriam naturalmente, enquanto os animais também as tinham,

justo que um cão de caça tem a noção de quem seria seu senhor, a quem obedece, assim

como da presa que lhe traz. Assim, pois, se o pensamento do homem fosse também a

essência de sua alma, o pensamento do cão seria também a essência da sua

(VOLTAIRE, 1978:301). Este paradigma dos animais como autômatos, cujas estruturas

internas seriam equiparáveis a de um relógio é o que fundamenta o método científico da

observação. Entretanto, esta abordagem ignora a visão relacional, onde entende-se que

as coisas e as pessoas estão intimamente emaranhadas e integradas.

De tal forma, as relações inter-intra-específicas apontam para uma “questão

ambiental” complexa, trans e interdisciplinar. Posto que nada se define em si, mas em

relações em contextos espaço-temporais, no que se refere a método, a tradição dialética

exposta no item anterior é, dentre as que buscam pensar o enredamento do ambiente, a

que se propõe a teorizar e agir em processos conexos e integrados, vinculando matéria e

pensamento, teoria e prática, corpo e mente, subjetividade e objetividade. A dialética é o

exercício totalizador que nos permite apreender a síntese das determinações múltiplas

que conformam a unidade na diversidade, a superação do contraditório pela síntese que

estabelece outras contradições, num contínuo movimento de transformação.

A realidade é a síntese entre sujeito e objeto e não algo externo cuja dinâmica é

independente de nossa inserção nesta; a verdade se explicita na aplicação prática da

teoria e na capacidade de atuarmos reflexivamente em sociedade; a transformação das

condições materiais é a norma para a transformação subjetiva – uma sem a outra

significa mudanças pontuais e não revoluções substantivas; o sentido da construção do

conhecimento e da atuação no mundo é propiciar a emancipação humana e a superação

das formas de dissociação sociedade/natureza.

Assim, a finalidade primordial de atuação no campo da educação ambiental é

revolucionar os indivíduos em suas subjetividades e práticas nas estruturas sociais-

naturais existentes. Ou seja, estabelecer processos educativos que favoreçam a

realização do movimento de constante construção do nosso ser na dinâmica da vida

como um todo e de modo emancipado. Em termos concretos, isso significa atuar

criticamente na superação das relações sociais vigentes, na conformação de uma ética

que possa se afirmar como “ecológica” e na objetivação de um patamar societário que

seja a expressão da ruptura com os padrões dominadores que caracterizam a

contemporaneidade. Assim posto, privilegiar somente um dos aspectos que formam a

nossa espécie (seja o ético, o estético, o sensível, o comportamental, o político ou o

econômico, enfim, separar o social do ecológico e o todo das partes) é reducionismo, o

que pouco contribui para uma visão da educação integradora e complexa de mundo.

É oportuno recordar também que a “questão ambiental” aqui chegou sob o signo

da ditadura militar, com os movimentos sociais esfacelados e a educação sob forte

repressão, de modo a se evitar a politização dos espaços educativos. O resultado foi, em

termos de educação ambiental, uma ação governamental que primava pela dissociação

entre o ambiental e o educativo/ político, favorecendo a proliferação dos discursos

ingênuos e naturalistas e a prática focada na sensibilização do “humano” perante o

“meio natural”, ambos focados em uma visão conservacionista e desvinculados dos

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 5: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

5

debates sobre modelos societários. Assim, a educação ambiental ganhou visibilidade

como instrumento de finalidade exclusivamente pragmática (em programas e projetos

voltados para a resolução de problemas enquadrados como ambientais) e como

mecanismo de adequação comportamental ao que genericamente chamou-se de

“ecologicamente correto”. É por isto, inclusive, que o senso comum muitas vezes acaba

vendo a, ainda hoje, como mero meio de apoio em projetos denominados “ambientais”,

e não como uma perspectiva paradigmática em educação, desqualificando sua potência.

O papel que assume a Educação Ambiental, portanto é o nome que

historicamente se convencionou dar às práticas educativas relacionadas à questão

ambiental. Assim, Educação Ambiental designa uma qualidade especial que define uma

classe de características que juntas, permitem o reconhecimento de sua identidade,

diante de uma Educação que antes não era ambiental (LAYRARGUES, 2004:7).

Educação ambiental crítica parte de uma visão sócio-histórica para a compreensão da

atual crise ambiental a partir das relações sociedade-natureza, para chegar à intervenção

sobre os conflitos ambientais. A educação ambiental não é neutra ela parte de um

pensamento epistemológico e filosófico bem demarcado, nem sempre visível quando

superficial, que vai gerar distintas práticas. No caso da educação ambiental crítica, este

é um posicionamento ético-político (CARVALHO, 2004).

A educação ambiental não se satisfaz com atitudes e mudanças individuais, tais

esforços partem de uma visão pragmática neoliberal de particularizar para enfraquecer e

culpar os sujeitos pelos danos ambientais, sendo estes então vigiados e punidos. A

educação ambiental se define como crítica em relação à educação ambiental

conservadora, que defende os interesses dominantes, agindo de acordo com a lógica do

capital, sendo mais um mecanismo de reprodução deste sistema é incapaz de

transformá-lo (GUIMARÃES, 2004:26). Limitados por uma compreensão de mundo

moldada pela racionalidade hegemônica, geram-se práticas incapazes de fazer diferente

do “caminho único” prescrito por essa racionalidade, efetivando-se a hegemonia.

Desta forma a Educação Ambiental Conservadora tende, refletindo os

paradigmas da sociedade moderna, a privilegiar ou promover: o

aspecto cognitivo do processo pedagógico, acreditando que

transmitindo o conhecimento correto fará com que o indivíduo

compreenda a problemática ambiental e que isso vá transformar seu

comportamento e a sociedade; o racionalismo sobre a emoção;

sobrepor a teoria à prática; o conhecimento desvinculado da

realidade; a disciplinaridade frente à transversalidade; o

individualismo diante da coletividade; o local descontextualizado do

global; a dimensão tecnicista frente à política; entre outros

(GUIMARÃES, 2004:27).

A educação ambiental crítica é uma contraposição da Conservadora em busca de

outros objetivos, partindo de outros princípios conceituais e referenciais teóricos,

segundo Guimarães (2004) esta é uma abordagem que intenta compreender e intervir na

realidade socioambiental através da complexidade mirando o conflito como ponto onde

as relações de poder são fundantes na estruturação e múltiplas determinações dos

sentidos e dos espaços.

Educação patrimonial: situando público, tempo e espaço

A Educação Patrimonial pode ser entendida como um processo permanente e

sistemático de trabalho educacional centrado no Patrimônio Cultural como fonte

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 6: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

6

primária de conhecimento e enriquecimento individual e coletivo. A partir da

experiência e do contato direto com as evidências e manifestações da cultura, em todos

os seus múltiplos aspectos, sentidos e significados o trabalho de Educação Patrimonial

busca levar as crianças e adultos a um processo ativo de conhecimento, apropriação e

valorização de sua herança cultural (HORTA, 1999:6). Trabalhar o patrimônio cultural

no ambiente escolar é desenvolver nos alunos a busca de sua identidade através da

herança cultural no qual o representa. A Educação Patrimonial promove um melhor

aprendizado para a memória cultural, despertando nos alunos o interesse de conhecer a

identidade local através dos traços do passado. (SOUZA, 2012:6).

Educação Patrimonial é uma proposta interdisciplinar de ensino voltada para

questões pertinentes ao patrimônio ambiental/cultural (Figura 01). Pode ser aplicada em

comunidades próximas a patrimônios reconhecidos, como sítios arqueológicos, assim

como em escolas com o objetivo de sensibilização sobre a importância do

reconhecimento, da valorização e da conservação do patrimônio da região. Grande parte

das comunidades desconhece a riqueza do patrimônio histórico e arqueológico de seus

territórios. De tal maneira, destaca a importância da educação patrimonial e suas

possibilidades como atividade para estimular a curiosidade científica sobre os

primórdios da cultura regional (PACHECO & VARGAS, 2009).

Figura 01: Esquemas de inserção sobre ambiente, patrimônio e suas respectivas

abordagens pedagógicas. Retirado de PACHECO & VARGAS (2009).

A escola também contribui para forjar identidades; além de ser, é claro, um

espaço de discussão sobre o tema. Muitas vezes os primeiros contatos da criança com

modos de ser e viver diferentes dos seus e da sua família ocorrem na sala de aula. O

grupo de convívio, as trocas de experiências são vivências que podem marcar por toda

vida a forma como ela verá os outros e a si mesma. (AQUINO, 2015). Assim, a escola,

para o aluno, aparece muitas vezes como um lugar distante, coercitivo e pouco atrativo

(ABRAMOVAY, 2002)

Funari & Pelegrini (2006) indicam que a ênfase no patrimônio brasileiro atinge o

seu ápice no período que vai de 1914 a 1945, quando as duas guerras mundiais eclodem

sob o impulso do nacionalismo que, associado ao imperialismo, seria superado com o

fim da Segunda Guerra Mundial, e a criação da Organização das Nações Unidas –

ONU.A ciência arqueológica tem contribuído de maneira imprescindível na

comprovação da riqueza do nosso patrimônio, que infelizmente continua sendo vítima

do descaso, do abandono, da falta de uma política de preservação, não só para proteger,

mas sobretudo para inserir este patrimônio numa gestão urbana que potencialize a sua

vitalidade através da busca de alternativas de atividades econômicas adequadas.Com

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 7: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

7

certeza, a arqueologia, entre outras ciências, cumpre o seu papel de aliada desta luta em

preservar e por que preservar. O conhecimento dos vestígios materiais remanescentes só

pode ser obtido através da arqueologia, ciência capaz de interpretar a realidade, a partir

dos restos da cultura material encontrados no ambiente. Os artefatos, abrigos,

edificações e todo o contexto construído pelo homem constituem o que denominamos

cultura material. Sua análise permite compreender as conquistas e mudanças que o

homem realizou, ao longo do tempo, em relação à inovação tecnológica e à apropriação

da natureza, bem como no tocante às interferências na paisagem.

Um tema abordado de maneira transversal no eixo da educação patrimonial é a

“descoberta do Brasil”. Assim, no contexto de conquista das Américas, as buscas

europeias por terras e recursos causou impactos devastadores sobre os habitantes destas

terras cobiçadas. A colonização foi responsável pela expropriação, expoliação e

desapropriação da cultura, do ambiente, das terras e conhecimentos do sul. O poder

econômico das grandes nações se construiu a partir de dutos encravados na América

Latina, que foram capazes de remover e comercializar os recursos minerais e agrícolas e

uma parte da humanidade que foi subjugada a essas mesmas regras (GALEANO, 2011).

A opressão sofrida pelos povos ancestrais é imposta até os tempos atuais, onde a relação

colonial tomou outros formatos, com novos projetos civilizatórios que envolvem a

dominação da educação, meio ambiente e cultura.

Como trata Aimé Césaire, referência nos estudos pós-coloniais, que a relação

entre colonizador e colonizado é de trabalho forçado; intimidação; pressão; policial;

tributária; furto; violação; imposição cultural; desprezo; desconfiança; necrotério;

presunção; grosseria; onde elites são exacerbadas e o povo aviltado. Inexistindo

perspectiva humanitária, em seu lugar impera dominação e submissão que transforma o

homem colonizado em instrumento de produção (CÉSAIRE, 2006:20).

O papel do colonizador, o que tem as certezas, as respostas e as perguntas, é

soberano em si mesmo. Define as regras do jogo e o jogo. Individualiza, particulariza,

oprime com seu poder para conquistar o território e recomeçar da própria fonte do

poder. Disputa as palavras, superficializa ou profundiza conceitos quando convém. O

conhecimento se transforma a partir da perspectiva do colonizador. A integração

colonizador-colonizado ocorre a partir da sucção do saber, ao expropriá-lo cria um novo

conhecimento de nível superior na hierarquia dos saberes, mesmo bebendo em fontes

locais, populares e ancestrais. A interlocução se dá em nome de um objetivo maior,

colonizar, impor uma nova cultura, uma dominação com interesses claros.

Mover o tempo e o espaço se torna necessário para colonizar, torná-los fluidos.

Esquecer a história local, os princípios e relações estabelecidas com a terra, garantindo a

falta de conhecimento. O novo conhecimento deve ser aprendido prontamente para que

um mundo melhor se estabeleça. A admiração do colonizado pelo colonizador, a entrega

– de corpo, alma e posses- àquele que olha de cima e daí fortalece sua posição,

recebendo e nada deixando. Extraindo e usurpando, em uma relação clássica do

oprimido e opressor, onde o que é desfavorecido possui uma idolatria cega por quem lhe

toma. Não um pensamento ingênuo, puro e selvagem, sim um pensamento alienado,

construído do topo, com esse objetivo.

O olhar do colonizador para o colonizado selvagem é de não-admiração, optando

por caracterizá-lo por sua “extraodinária deficiência”. Muitas vezes parece se

surpreender quando, com seu olhar de pena, observa no carente um comportamento

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 8: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

8

próximo ao seu, civilizado. Neste retrato, o colonizado nunca tem revelada uma imagem

positiva, se mantém como um negativo, como descrito por Memmi (1969).

Como haveria uma reação deste (colonizado), confrontado

constantemente com esta imagem de si mesmo, proposta, imposta tanto

nas instituições quanto em todo contato humano? Essa imagem não

pode deixá-lo indiferente como se estivesse em uma chapa com ela

desde o exterior, como se fosse um insulto que voa com o vento.

Termina por reconhecê-la, como se fosse um apelido aborrecido, mas

convertido em um signo familiar. A acusação o perturba, o inquieta,

tanto mais quanto admira e teme ao seu poderoso acusador. Não teria

esse um pouco de razão? Murmura. Não seremos a pesar de tudo, nós

um pouco culpados? Preguiçosos, posto que temos tantos

desocupados? Temerosos, posto que nos deixamos oprimir? Esse

retrato mítico e degradante, querido e difundido pelo colonizador,

termina por ser aceito e vivido em certa medida pelo colonizado.

Adquire deste modo certa realidade e contribui ao retrato real do

colonizado (MEMMI, 1969:98).

O colonizador retira o direito de liberdade do colonizado. Explora a natureza,

leva os seus patrimônios, não deixa quase nada, mantendo a relação histórica de

escravidão. Aos colonizados sobra sua vida, mas que vida? O quanto dela não é uma

influência direta desse pensamento colonizador? Sua cultura de resistência e a

compreensão de que é explorado são caminhos possíveis? Como um ato colonizador

influencia na cultura de um lado e de outro do jogo? A desumanização, do colonizador,

e a coisificação, do colonizado, se transformam em marcas deste processo. A

colonização suprime a possibilidade de participação diante das decisões que contribuem

para o destino do mundo e do seu próprio, toda responsabilidade histórica e social é

retirada do colonizado. Isto porque o mito colonial está apoiado por uma organização

real, administrativa e jurídica que apóiam as exigências históricas, econômicas e

culturais do colonizador, como os baixos salários, destruição de sua cultura e das leis

que o regem. (MEMMI, 1969).

Para Hodder (2012) os seres humanos dependem das coisas a fim de construir,

manter e justificar o poder, dependendo, portanto, das coisas para controlar os outros.

Assim, o poder faz uso dos fluxos de significados nas coisas, suas associações e

relacionamentos. A perspectiva fornecida pelo emaranhamento desses aspectos é que

tais relações de poder não são apenas sobre o controle dos meios de produção, ou o

controle das relações sociais ou ideologias sociais. De tal maneira, o papel do

colonizador na transformação de visões de mundo modifica a forma de enxergar o

outro. Assim, Pierre Clastres define a espiritualidade do etnocídio, como a ética do

humanismo (CLASTRES, 2004:57). Neste contexto, Hodder (2016:64-76) aborda que

as relações de emaranhamento constituídas no processo colonizador criam armadilhas,

sendo a pobreza um exemplo das armadilhas do emaranhamento.

De acordo com essa abordagem, os grupos subordinados estão presos em um

duplo vínculo, dominado por grupos poderosos e indivíduos aprisionados em numerosos

emaranhamentos sobrepostos, incluindo baixa renda, saúde precária, educação limitada

e barreiras burocráticas (HODDER, 2016). Assim, poder-se-ia interpretar relações de

dependência, pobreza e mesmo racismo ambiental2 como formas de representações de

2HERCULANO & PACHECO (2006:16) discursam sobre racismo ambiental e justiça socioambiental

como desigualdade e de injustiça que recai sobre etnias e comunidades locais.

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 9: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

9

materialismos, que revelam, seja, um objetivo colonizador ou uma rede de relações

atreladas às respectivas realidades e modos de vida. A discussão de Hodder (2016) traz

que em eras históricas este duplo aprisionamento do dominado é muitas vezes associada

a condições precárias e à pobreza. Assim, a noção de armadilhas da pobreza tem sido

amplamente discutida em relação às condições econômicas recentes e contemporâneas.

A armadilha da pobreza toma muitas formas, mas o termo é geralmente usado para

descrever alguma forma o mecanismo de espiralamento através do qual as pessoas não

podem sair da pobreza.

Assim, A pobreza não é o contrário da riqueza, o amor e empatia possuem a

nulidade de seu sentimento, não é necessário brotar o ódio para que não exista o amor.

Olhar o próximo como a si mesmo não cabe ao opressor, o opressor é também um

opressor de si mesmo, da natureza e da cultura, se transforma em ser inanimado,

alienado, em busca de um desenvolvimento que não lhe cabe, em busca de acumulações

que não lhe cabem. As transformações não param de acontecer em diversas direções, a

maioria delas caminha no mesmo sentido, se renovando e fortalecendo as bases

coloniais de onde vem. É necessário transver o mundo, com olhos mais curiosos,

radicais, epistemológicos, pedagógicos, ver o mundo de ponta cabeça do sul pra cima.

Não queremos viver uma sociedade morta. Desejamos isso para os

amantes do exotismo. Tampouco queremos prolongar a sociedade

colonial atual, a mais malvada que jamais se apodreceu debaixo do

sol. Precisamos criar uma sociedade nova, com a ajuda de todos os

nossos irmãos escravos, enriquecida por toda a potência produtiva

moderna, aquecida por toda fraternidade antiga (CÉSAIRE,

2006:25).

Há no colonizado um desejo pela reparação de sua situação, uma busca pelas

verdadeiras relações humanas, através da reestruturação das instituições, da abolição das

categorias colonizadoras.

O colonizado necessita suprimir a colonização para viver. Mas para

converter-se em homem necessita suprimir o colonizado que chegou a

ser. Se o europeu deve aniquilar em si o colonizador, o colonizado deve

superar o colonizado. A liquidação da colonização não é senão um

prelúdio da sua liberação completa: a sua autorreconquista. Para

libertar-se da colonização foi preciso partir de sua mesma opressão,

das carências de seu grupo. Para que sua libertação seja completa, é

necessário que se liberte dessas condições, certamente inevitáveis em

sua luta. (MEMMI, 1969. P.148).

Em tal processo de desalienação e de reconhecimento de seus conhecimentos

ancestrais, integrais, não disciplinarizados, os saberes da terra, das plantas e suas

propriedades, a valorização dos laços coletivos sociais, o trabalho com uma relação

justa com a natureza e o respeito à diversidade e a diferença devem ser valorizados. O

ato de colonizar impõe uma invasão que só pode ser negada pelo oprimido, a liberação

não será regalada pelos que detém o poder, pelo contrário, esses se utilizarão de

estratégias cordiais, tratados, leis e violência para não perderem seus tronos. Nesse

contexto colonial o oprimido tem cor, gênero e raça: são negros, mulheres, indígenas e

pobres os expoliados, desterritorializados e desapropriados. As comunidades

latinoamericanas e africanas colonizadas perdem suas raízes e direitos em nome de um

desenvolvimento para todos e com a sua luta estão os conhecimentos pós-coloniais que

devem ser apreendidos em busca da transformação social.

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 10: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

10

A Sociedade, ao contrário dos processos bioquímicos, não escapa à

influência humana. É pelo homem que a Sociedade chega ao ser. O

prognóstico está nas mãos daqueles que quiserem sacudir as raízes

contaminadas do edifício. (...) de uma vez por todas, a realidade exige

uma compreensão total. No plano objetivo como no plano subjetivo,

uma solução deve ser encontrada. E é inútil vir com ares de mea

culpa, proclamando que o que importa é salvar a alma. Só haverá

uma autêntica desalienação na medida em que as coisas, no sentido o

mais materialista, tenham tomado os seus devidos lugares (FANON,

2008:28-29)

Para se libertar do arsenal de complexos germinados no seio da situação colonial

tais reflexões apontam caminhos que educam para além dos limites impostos pela

sociedade, no reconhecimento da ciência europeia como promotora de formas de vida

que buscam uma unidade, uma globalização, suportando a desqualificando o outro.

Existe a partir daí uma construção de linguagem e território que coloca o colonizado à

margem. Assim sendo, “A liberdade de um relaciona-se com extrapolar a resistência do

outro, ir além se formar nesse processo e ter a autonomia como resposta para o que está

posto (Fanon, 2008:27). O conhecimento para a desalienação tem em sua base saberes

que promovam respeito a igualdade e a diversidade de gênero, de raça e social.

Considerações finais: confluências e perspectivas de atuação conjunta

Para a “questão ambiental”, o diálogo e a importância social garantem a

roupagem de desenvolvimento sustentável, sem clarear para qual direção seria o

desenvolvimento e para quem seria sustentável. Os colonizadores ditam a regra do jogo

através de políticas econômicas que partem das cúpulas mundiais e chegam através de

dados quantitativos impondo sobre os territórios as lógicas hegemônicas do capital. A

abordagem de Educação Patrimonial e da Educação Ambiental em suas perspectivas

críticas como recurso para a compreensão sócio-histórica das referências culturais e

socioambientais em todas as suas manifestações do saber, colabora para seu

reconhecimento, valorização e preservação. Considera-se, ainda, que os processos

educativos devem primar pela construção coletiva e democrática do conhecimento, por

meio da participação efetiva das comunidades detentoras e produtoras das referências

culturais e ambientais, onde convivem diversas noções de patrimônio cultural e

sustentabilidade com bases ambientais que podem promover a transformação social.

A difusão da cultura da preservação exige o contato sistemático dos cidadãos

com os bens culturais e naturais, dos estudantes com as atividades relacionadas a essa

questão, em particular, com as pesquisas efetuadas por historiadores, arqueólogo,

arquitetos, restauradores, geógrafos, ambientalistas, ecologistas e demais especialistas

que tratam o conhecimento de forma a promover a “alfabetização cultural” e educação

ambiental que instrumentalizam ao indivíduo fazer a leitura do mundo que o rodeia.

Se a perspectiva crítica no campo da educação ambiental, conforme aqui

exposto, revela através de práticas de ensino de ciências e biologia visões de mundo, a

atuação no eixo da educação patrimonial pode também revelar relações de

emaranhamento entre humanos-coisas, dependência, pobreza e por conseguinte, racismo

ambiental. A partir de um panorama de teias de emaranhamento os nódulos teias

sobrepostas revelam tessituras sobre aspectos que podem ser trabalhados sob a ótica de

debates em patrimônio cultural e educação ambiental, com características da trans e

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 11: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

11

interdisciplinares sócio-história-ambiental definidas a partir de relações espaço

temporais. Na busca de uma ciência pós-colonial que se proponha a romper com a

colonização do pensamento, tratando de se apropriar das conexões possíveis entre a

abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial rumo à transformação.

AGRADECIMENTOS

Agradecemos ao Programa de Pós-Graduação em Educação da UNIRIO que

proporcionou o encontro dos autores deste artigo através das aulas ministradas pelo

educador Celso Sanchez, que também revisou este texto e promoveu demais encontros e

discussões junto ao Grupo de Estudos em Educação Ambiental desde el Sur.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABRAMOVAY, Miriam. Violências na escola. Brasília: UNESCO, 2002. p. 281-291.

AQUINO, Cristiane Valdevino de. 2015. Educação Patrimonial na sala de aula: a escola

como patrimônio cultural. Educação Patrimonial: Diálogos entre escola, museu e

cidade. Caderno Temático 4. IPHAN: Casa do Patrimônio da Paraíba. P-25-31.

CARVALHO, Isabel Cristina de Moura. 2004. Educação ambiental crítica: nomes e

endereçamentos da educação. Identidade da educação ambiental brasileira. Brasília:

Ministério do Meio Ambiente. P 13-24.

CÉSAIRE, Aimé. 2006.Discurso sobre el colonialismo. Madrid: Akal.

CLASTRES, Pierre. 2004. Arqueología de la violencia. Fondo de Cultura Economica

USA.

DESCARTES, R. 2005. Discurso do Método. São Paulo: Escala.

EVARISTO, Jéssica Andrade. 2010. Um estudo sobre educação ambiental proposta no

pcn. Monografia de Pedagogia. Universidade Estadual de Londrina.

FANON, Frantz. 2008. Pele negra, máscaras brancas. Bahia: Editora Edufba.

FREIRE, Paulo. 1969. Pedagogia do Oprimido.

FUNARI, Pedro Paulo. 2001. Public archaeology from a Latin American perspective.

Public Archaeology. Vol. (1):239-243.

FUNARI, Pedro Paulo; PELEGRINI, Sandra C. A. 2006. Patrimônio histórico e

cultural. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed. 72 p.

GALEANO, Eduardo. 2011. As Veias Abertas da América Latina. Porto Alegre: L&PM

Pocket.

GEERTZ, C. 1991. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Guanabara/Koogan.

GUIMARÃES, Mauro. 2004.Educação Ambiental Crítica. Identidade da educação

ambiental brasileira. Brasília: Ministério do Meio Ambiente. P 25-34.

HERCULANO, S.; PACHECO, T. (Org.). 2006. Racismo Ambiental – I Seminário

Brasileiro contra o Racismo Ambiental. Rio de Janeiro: Fase. 331p.

HODDER, Ian. 2012. Entangled: An archaeology of the relationships between humans

and things. John Wiley & Sons.

____________. 2016. Studies in Human-Thing Entanglement. Open access book.

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental

Page 12: Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial: …epea.tmp.br/epea2017_anais/pdfs/plenary/0225.pdf · 2017. 12. 19. · 1 Abordagem crítica da educação ambiental e patrimonial:

12

HORTA, Maria de Lourdes Parreira; GRUNBERG, Evelina; MONTEIRO, Adriane

Queiroz. Guia básico de educação patrimonial. Brasília: IPHAN: Museu Imperial,

1999.

INGOLD, T. (1995). Humanidade e animalidade. Revista Brasileira de Ciências

Sociais, 28, 39-53.

KUHN, Thomas S. 1996. The structure of scientific revolutions, v. 3, 1962.

LAYRARGUES, Philippe, Pomier. 2004. Identidade da educação ambiental brasileira.

Ministério do Meio Ambiente / Diretoria de Educação Ambiental. Brasília: Ministério

do Meio Ambiente.

LÉVI-STRAUSS, Claude. 1982. Natureza e cultura. As estruturas elementares do

parentesco.

LOUREIRO, C. F. (org.)... [et al.]. 2007. A questão ambiental no pensamento crítico:

natureza, trabalho e educação. Rio de Janeiro: Quartet.

MAYR, Ernst. 2005. Biologia, ciência única. Editora Companhia das Letras.

MEMMI, Albert. 1969. Memmi Retrato del Colonizado. Buenos Aires. Ediciones de la

Flor.

MORIN, E. (1973). O paradigma perdido: A natureza humana. Lisboa: Publicações

Europa-América.

MUNIZ, Tiago Silva Alves & BACHINSKI, Rober. 2012. Da Coerção ao Uso de

Animais no Ensino e na Pesquisa. Revista Educação e Cidadania. v. 1, p. 82.

Disponível em:

<http://seer.uniritter.edu.br/index.php/educacaoecidadania/article/view/538> Acesso

em: 04/08/2016.

MUNIZ, Tiago Silva Alves. 2016. Pesquisa-Ação Em Uma Escola Sócio-

Construtivista: As Relações Humano-Natureza No Ensino De Ciências. Revista

Sustinere. Vol. 4 (2), p. 187-220. Disponível em: <http://www.e-

publicacoes.uerj.br/index.php/sustinere/article/view/24977> Acesso em: 02/02/2017.

NUERNBERG, Adriano Henrique & ZANELLA, Andréia Vieira. 2003. A relação

natureza e cultura: O debate antropológico e as contribuições de Vygotski. Interação em

Psicologia. 7(2). p. 81-89.

PACHECO, Ilza Alves & VARGAS, Icléia Albuquerque de. 2009. Educação

patrimonial: um recurso para alfabetização cultural no ensino fundamental. Ateliê

Geográfico. Goiânia-GO. V.3 N.1. Abril. P-92-106.

PELEGRINI, Sandra de Cássia Araújo. 2009. Patrimônio cultural: consciência e

preservação. Brasiliense, 2009.

REIGOTA, M. 1991. O que é educação ambiental. Brasiliense, São Paulo, Brasil.

SOUZA, Renilfran Cardoso de. 2012. “Guia básico de educação patrimonial”:

referência nos arquivos digitais. VI Colóquio Internacional: Educação e

Contemporaneidade. São Cristóvão-SE.

UEXKÜLL, Thure Von. 2004. A teoria de Umvelt de Jakob Von Uexküll. Galáxia. N7.

Abril. P-19-48.

VOLTAIRE, 1978. Dicionário filosófico. In: Cartas inglesas; Tratado de metafísica;

Dicionário filosófico; O filósofo ignorante. São Paulo: Abril. p. 297-328.

WEIL, Pierre. Rumo à nova transdisciplinaridade. Summus Editorial, 1993.

Juiz de Fora - MG 13 a 16 de agosto de 2017 Universidadre Federal de Juiz de Fora

IX EPEA -Encontro Pesquisa em Educação Ambiental