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ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 5042 Requerente: Governador do Estado de Rondônia Requerida: Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia Relator: Ministro Marco Aurélio Administrativo. Dispositivos da Emenda à Constituição estadual na 84/13 e da Lei estadual na 3.138/13. que versam sobre a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia - EMATERlRD. Recepção de empregados contratados sem concurso público. Violação ao artigo 37. inciso IJ, da Constituição. Fixação de prazo para o Poder Executivo desempenhar seu poder de iniciativa legislativa. Afronta ao princípio da separação dos Poderes. Constitucionalidade dos dispositivos que preveem a criação do Estatuto da empresa e a instituição do Plano de Carreiras, Remuneração e Beneficios dos seus empregados mediante decreto. Desnecessidade de lei em sentido formal para di:;por sobre tais temas. Manffestação pela procedência parcial do pedido. Egrégio Supremo Tribunal Federal, O Advogado-Geral da União, tendo em vista o disposto no artigo 103, § 3°, da Constituição da República, bem como na Lei nO 9.868/99, vem, respeitosamente, manifestar-se quanto à presente ação direta de inconstitucionalidade.

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 5042 · ... Governador do Estado de Rondônia ... O Estatuto da EMATERlRO será aprovado por decreto do Poder ... dos Deputados. do Senado

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ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE N° 5042

Requerente: Governador do Estado de Rondônia

Requerida: Assembleia Legislativa do Estado de Rondônia

Relator: Ministro Marco Aurélio

Administrativo. Dispositivos da Emenda à Constituição estadual na 84/13 e da Lei estadual na 3.138/13. que versam sobre a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia ­EMATERlRD. Recepção de empregados contratados sem concurso público. Violação ao artigo 37. inciso IJ, da Constituição. Fixação de prazo para o Poder Executivo desempenhar seu poder de iniciativa legislativa. Afronta ao princípio da separação dos Poderes. Constitucionalidade dos dispositivos que preveem a criação do Estatuto da empresa e a instituição do Plano de Carreiras, Remuneração e Beneficios dos seus empregados mediante decreto. Desnecessidade de lei em sentido formal para di:;por sobre tais temas. Manffestação pela procedência parcial do pedido.

Egrégio Supremo Tribunal Federal,

O Advogado-Geral da União, tendo em vista o disposto no artigo

103, § 3°, da Constituição da República, bem como na Lei nO 9.868/99, vem,

respeitosamente, manifestar-se quanto à presente ação direta de

inconstitucionalidade.

I - DA AÇÃO DIRETA

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de

liminar, proposta pelo Governador do Estado de Rondônia, tendo por objeto o

artigo 3° da Emenda à Constituição estadual n° 84, de 24 de abril de 2013; o § 6°

do artigo 161 da Carta estadual, na redação conferida pelo artigo 2° da emenda

constitucional referida; bem como os artigos 5°, 7°, 8°, 9°, 13 e 14 da Lei estadual

n° 3.138, de 05 de julho de 2013, que "dispõe sobre a regularização do órgão

oficial estadual de ATER como empresa de prestação de serviços públicos, com

a denominação de Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado

de Rondônia - EMA TERlRO n. Transcreve-se, a seguir, o teor dos dispositivos

impugnados:

Emenda Constitucional n° 84/13:

"Art. r. Ficam acrescidos os §§ 5° e 6° ao artigo 161 de Constituição Estadual com a seguinte redação:

'Art. 161 .

(...)

§ 6°. O Poder Executivo Estadual terá o prazo de até 1° de janeiro de 20/4 para definir e implantar através de lei estadual a estrutura, orçamento, quadro de pessoal, plano de cargo, salários e beneficios da Empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia - EMA TER -RO '

Art. ]0. As disposições Constitucionais Transitórias passam a vigorar acrescidas do artigo 47, com a seguinte redação:

'Art, 47. Os servidores pertencentes ao quadro funcional da EMATER-RO, referida na parte inicial do § ]0 do art. 161 da Constituição Estadual, serão recepcionados pela empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia. da seguinte forma: 1 - os servidores contratados até o dia 28 de setembro de 1989. permanecem na empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia. no seu quadro efetivo, em cargos idênticos e atribuições semelhantes as que, atualmente se encontram, sobre o regime jurídico único, sem prejuízo das

A DI n° j().J2. ReI. Min. Marco Aurélio 2

vantagens, beneficios e direitos a eles auferidos pelo Plano de Cargos, Salários e Beneficios - PCSB vigente; e Il- os servidores contratados a partir de 29 de setembro de /989 até julho de 20/2, passam a compor O quadro em extinção da Empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia, sob o regime celetista, por serem os trabalhos de Assistência Técnica e Extensão Rural múnus público de natureza essencial, que não pode sofrer solução de continuidade. '"

Lei n° 3.138/13:

"Ar!. 5°. O Estatuto da EMATERlRO será aprovado por decreto do Poder Executivo, mediante proposta do Conselho de Administração, até o dia 3/ dejaneiro de 20/4.

Parágrafo único. O Estatuto de que trata o caput disporá. além dos objetivos. do capital e dos recursos financeiros. na forma disposta nesta Lei, sobre a composição dos órgãos de administração e de fiscalização da EMA TERlRO, as respectivas atribuições, as competências de seus dirigentes e demais condições legais pertinentes.

(...)

Art. r o Plano de Carreiras, Remunerações e Beneficios - fCRB dos Empregados da EMATERlRO, contendo o Quadro de Empregos e de cargos e funções de confiança. será instituído por decreto do Poder Executivo, mediante proposta do Conselho de Administração, até o primeiro trimestre de 2014.

§ /0, Os empregados da EMATERlRO serão regidos pelas disposições da Consolidação das Leis do Trabalho.

§ r. Até que seja instituído o fCRB previsto no caput, os empregados de que trata o artigo 47 das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Estadual continuarão a perceber a remuneração mensal vigente na data da publicação desta Lei.

Art. 8~ Os empregados do órgão oficial estadual de assistência técnica e extensão rural permanecerão nos quadros da EMATER/RO, em conformidade com o artigo 47 das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Estadual.

§ /0. Os servidores da Administração Direta do Estado poderão ser colocados à disposição da EMA TERlRO, conservando o regime jurídico a que estiverem sujeitos e serão considerados como em efetivo exercício do respectivo cargo, para todos os efeitos legais.

ADI n° 5()-J]. ReI. ,v/in. tv/arco Aurélio 3

§ ]O, Os empregados referidos no artigo 47 das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Estadual poderão ser cedidos para órgãos públicos federais, estaduais ou municipais. sem ónus para o órgão de origem, sendo considerados como em efetivo exercício do respectivo cargo, para todos os efeitos legais,

Art, 9~ A administração do órgão oficial estadual de ATER promoverá a devida regularização do acervo físico. técnico e administrativo e saldos bancários existentes até o dia 31 de dezembro de 2013,

(...)

Ar/. 13. Ficam convalidados por esta Lei todos os atos de administração praticados para a efetiva prestação dos serviços de assistência técnica e extensão rural, em cumprimento às disposições do artigo 161 da Constituição Estadual.

Art. 14. O órgão oficial estadual de assistência técníca e extensão rural passará a operar como empresa pública a partir de 10 de janeiro de 2014.

Parágrafo UI1ICO. A estrutura de administração do órgão oficial estadual de ATER vigente na data da publicação desta Lei será mantida até 31 de dezembro e 2013. .,

o requerente alega que o at1igo 3° da Emenda Constitucional n°

84113 afrontaria o disposto no at1igo 37, inciso lI, da Constituição Federal' ao

permitir o aproveitamento de empregados contratados independentemente de

prévio concurso público no quadro funcional da Empresa Estadual de Assistência

Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia.

Ademais, o autor assevera que o § 6° do artigo 161 da Constituição

estadual violaria o princípio da separação dos Poderes (at1igo 2° da Lei Maior2)

por fixar prazo para o início dos trabalhos da empresa pública referida. Em seu

I "Art. J 7. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade. impessoalidade, moralidade. publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: ( ... )

11- a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso públíco de provas ou de provas e tílulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, naforma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração: ..

~ ·'Art. ]O São Poderes da União. independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário. o'

ADI nO 50.J2, Rei. ivlin. ,V/arco Aurélio 4

entendimento, "cabe ao Poder Executivo administrar o Estado, criando ou não

pessoas jurídicas de direito público e privado, nos termos da proposta de lei,

sendo inconstitucionais emendas parlamentares que visem aumentar as despesas

previstas na proposta de lei de iniciativa privativa do Governador, bem como

fixar prazo para início do labor. São situações que cabem apenas ao chefe do

Poder Executivo dispor. "(fi. 13 da petição inicial).

Por fim, o requerente sustenta que o artigo 7° da Lei estadual n°

3.138/13, ao prever a possibilidade de instituição de plano de carreira,

remuneração e benefícios por meio de decreto, ofenderia o artigo 61, § 1°, inciso

lI, alíneas "a" e "c", da Carta da República3.

Diante disso, o autor pede o reconhecimento da

inconstitucionalidade dos dispositivos atacados, não sem antes pleitear o

deferimento de medida cautelar para suspender sua eficácia.

o feito foi distribuído ao Ministro Relator Marco Aurélio, que, nos

termos do rito previsto pelo artigo 12 da Lei n° 9.868/99, solicitou informações à

requerida, bem como determinou a oitiva do Advogado-Geral da União e do

Procurador-Geral da República.

, "Arl. 61. A iniciativa das leis complementares e ordinárias cabe a qualquer membro ou Comissão da Câmara dos Deputados. do Senado Federal ou do Congresso Nacional. ao Presidente da República. ao Supremo Tribunal Federal. aos hibunais Superiores. ao Procurador-Ceral da República e aos cidadãos. na forma e nos casos previstos nesta lonstituição. § 10

- São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que­( ... ) /I - disponham sobre. a) criação de cargos. funções ou empregos públicos na adminislração direta e autárquica ou aumenlO de sua remuneração: (_ .. ) c) servidores públicos da União e Territórios. seu regime juridico. provimento de cargos. estabilidade e aposenlaJoria "

ADI n° 5().J2. ReI ivlin Marco Aurélio 5

Em atendimento à solicitação, a Assembleia Legislativa do Estado

de Rondônia defendeu a constitucionalidade dos dispositivos questionados.

Aduziu, nesse sentido, que, "em relação aos empregados contratados no período

de 06 de outubro de 1988 a 31 de julho de 2012 - data da liminar expedida pelo

juizo da 10 VFP de Porto Velho - os contratos de trabalho seriam válidos, não

havendo necessidade de os empregados se submeterem a concurso público por

duas razões: a) Pela naturezajuridica da EMATER-RO - Associação civil, que

dispensa concurso para admissão de pessoal; b) Pela decisão prolatada pelo

Superior Tribunal do Trabalho, que nos autos de uma Ação Civil Pública, movida

pelo Ministério Público do Trabalho, entendeu ser despiciendo a realização de

concurso público pela EMA TER-R O, para contratação de pessoal (...)." (tl 03

das infonnações da requerida).

Ademais, a requerida afinnou que se aplicariam ao caso o princípio

da continuidade das relações de trabalho, previsto nos artigos 10 e 448 da

Consolidação das Leis do Trabalho - CLr (Decreto-Lei nO 5.452/43). Sustentou,

por fim, que, "se não houve criação de um ente público, mas transformação de

um ente privado em público, para cujo resultado os empregados em nada

contribuíram, não podem estes ter os seus contratos de trabalho, por mais esta

razão, declarados nulos, com fundamento no art. 37, JJ da Constituição Federal,

vez que não estão sendo admitidos no novo ente - caso em que se aplicaria o

artigo da Carta Magna alhure citado -, mas conduzidos a bordo de uma completa

estrutura fisica e de pessoal, para cumprirem as mesmas finalidades/objetivos

institucionais, recepcionadas pelo Estado de Rondônia. " (fi. 07 das infonnações

da requerida).

4 "Al'I. 10 - Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados.

( ... )

Art. .J.J8 - A mudança na propriedade ou na estruturajuridica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados."

.4 DI nO 50-12. ReI. Min Marco Aurélio 6

Na sequência, vieram os autos para manifestação do Advogado­

Geral da União.

lI-MÉRITO

Como visto, o requerente pretende a declaração da

inconstitucionalidade de normas que versam sobre a Empresa de Assistência

Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia - EMATERlRO.

o autor afirma, inicialmente, que o artigo 3° da Emenda

Constitucional n° 84/13 possibilitaria que empregados contratados

independentemente de prévio concurso público fossem mantidos no quadro

funcional da empresa pública referida, o que seria incompatível com o artigo 37,

inciso 11, da Constituição.

A respeito do assunto, cumpre ressaltar, inicialmente, que a Carta da

República de 1988 foi expressa ao estabelecer a regra do concurso público para a

investidura em cargos e empregos públicos, conforme se depreende dos

dispositivos transcritos a seguir:

"Art. 37, A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União. dos Estados. do Distrito Federal e dos Municipios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade. publicidade e eficiência e. também, ao seguinte: (... ) 11 - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos. de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração.

( ...)

AD! nO 5()-12, Rel lvtin /vtan'o Aurélio 7

,)\ ]O - A não observância do disposlo nos incisos IJ e IJI implicará a nulidade do ato e a punição da autoridade re,~ponsável. nos termos da lei." (grifou-se).

De acordo com Celso Antônio Bandeira de Mell05, a regra do

concurso como condição de acesso aos cargos e empregos públicos não se limita

à primeira investidura; proíbe, de igual modo, o aproveitamento do servidor em

cargo ou emprego de natureza e grau de complexidade diversos daquele em que

se deu o ingresso no serviço público. Veja-se:

"O que a Lei Magna visou com os principios da acessibilidade e do concurso públicofoi. de um lado. ensejar a todos iguais oportunidades de disputar cargos ou empregos na Administração direta e indireta De outro lado, propôs-se a impedir tanto o ingresso sem concurso, ressalvadas as exceções previstas na Constituição, quanto obstar a que o servidor habilitado por concurso para cargo ou emprego de determinada natureza viesse depois a ser agraciado com cargo ou emprego permanente de outra natureza. pois esta seria umaforma de fraudar a razão de ser do concurso público."

No mesmo sentido, confira-se a interpretação conferida por essa

Corte Suprema ao inciso II do artigo 37 da Carta da República:

"Ação direta de inconstitucionalidade. Ascensão ou acesso. transferência e aproveitamento no tocante a cargos ou empregos públicos. - O critério do mérito aferível por concurso público de provas ou de provas e títulos é, no atual sistema constitucional, ressalvados os cargos em comissão declarados em lei de livre nomeação e exoneração. indispensável para cargo ou emprego público isolado ou em carreira. Para o isolado. em qualquer hipótese; para o em carreira. para o ingresso nela, que só sefará na classe inicial e pelo concurso público de provas ou de provas títulos, não o sendo, porém, para os cargos subsequentes que nela se escalonam até ofinal dela. pois. para estes, a investidura se fará pela forma de provimento que é a 'promoção '. Estão, pois, banidas das formas de investidura admitidas pela Constituição a ascensão e a transferência, que sãoformas de ingresso em carreira diversa daquela para a qual o servidor público ingressou por concurso, e que não são, por isso mesmo, ínsitas ao sistema de provimento em carreira, ao contrário do que sucede com a promoção, sem a qual obviamente não haverá carreira, mas, sim, uma sucessão ascendente de cargos isolados. - O inciso 11 do artigo 37 da Constituição Federal também não permite o 'aproveitamento', uma

5 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 21" ed. São Paulo: Malheiros. 2006. p. 266; grifou-se.

A DI n° 5042, Rei. Afin. Marco Aurélio 8

vez que, nesse caso, há igualmente o ingresso em outra carreira sem o concurso exigido pelo mencionado dispositivo. Ação direta de inconstitucionalidade que se julga procedente para declarar inconstitucionais os artigos 77 e 80 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias do Estado do Rio de Janeiro. ,. (ADI nO 231, Relator: Ministro Moreira Alves, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 05/0811992, Publicação em 13/11/1992; grifou-se).

°entendimento acolhido em tal julgado encontra-se consolidado no

âmbito dajurisprudência desse Supremo Tribunal Federal, conforme se depreende

do teor da Súmula nO 685, in verbis:

"É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido."

Ocorre que, na espécie, o artigo 3° da Emenda Constitucional n°

84113 e o artigo 8°, caput e § 2°, da Lei estadual n° 3.138113 preveem que os

empregados remanescentes da EMATERlRO, entidade que se revestia da

natureza de associação civil sem fins lucrativos6, passam a ocupar empregos

públicos na Empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado

de Rondônia, independentemente de prévia aprovação em concurso público. Veja­

se, novamente, o teor dos dispositivos referidos:

Emenda Constitucional nO 84/13:

"Art. ]0. As disposições Constitucionais Transitórias passam a vigorar acrescidas do artigo 47, com a seguinte redação:

'Art, 47. Os servidores pertencentes ao quadro funcional da EMATER-RO, referida na parte inicial do § ]0 do ar!. 161 da Constituição Estadual, serão recepcionados pela empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia, da seguinte forma: J - os servidores contratados até o dia 28 de setembro de 1989, permanecem na empresa Estadual de Assistência Técnica e

6 Nesse sentido, confira-se o sítio eletrônico da EMATERJRO, em que se informa que "a Associação de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia - EMATER-RO é uma Associação Civil. com personalidade jurídica de direito privado. de fins não econômicos". Disponível em: <h/lp:/'lvww.emater­ro.com. brlemater.php?get= I>. Acesso em: 07 mar. 2013.

A DI nO 50-/2. Rei. ivlin. ivlarco Aurélio 9

Extensão Rural do Estado de Rondônia, no seu quadro efetivo, em cargos idênticos e atribuições semelhantes as que, atualmente se encontram, sobre o regime jurídico único, sem prejuízo das vantagens. beneficios e direitos a eles auferidos pelo Plano de Cargos, Salários e Beneficios - PCSB vigente; e II - os servidores contratados a partir de 29 de setembro de 1989 até julho de 2012, passam a compor o quadro em extinção da Empresa Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia. sob o regime celetista, por serem os trabalhos de Assistência Técnica e Extensão Rural múnus público de natureza essencial, que não pode sofrer solução de continuidade. ".

Lei n° 3.138/13:

"Art. 8°. Os empregados do órgão oficial estadual de asslstencia técnica e extensão rural permanecerão nos quadros da EMA TER/R 0, em conformidade com o artigo 47 das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Estadual.

("0)

§ ]O, Os empregados referidos no artigo 47 das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Estadual poderão ser cedidos para órgãos públicos federais, estaduais ou municipais. sem ônus para o órgão de origem, sendo considerados como em efetivo exercício do respectivo cargo, para todos os efeitos legais"

Percebe-se, aSSIm, que as normas transcritas ofendem a regra do

concurso público ao possibilitarem a recepção de empregados de associação civil

nos quadros de empresa pública estadual.

Essa conclusão é confirmada pela exposição de motivos relativa ao

projeto que originou a Lei n° 3.138/137, em que o Governador do Estado de

Rondônia explicita a pretensão de aplicar aos empregados contratados pela

EMATERlRO até o dia 28 de setembro de 1989 a disciplina prevista pelo artigo

19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Carta Federal, o qual

garante estabilidade aos servidores públicos civis da administração pública direta,

7 Documentos comprobatórios 4, em anexo à petição inicial.

AD/ n° 50n. Rei Min lv/arco Auré/io 10

autárquica e fundacional que, na data da promulgação da Constituição 1988,

estavam em exercício há pelo menos cinco anos continuados. Veja-se:

"Art. 19. Os servidores públicos civis da União, dos Estados. do Distrito Federal e dos Municípios. da administração direta, autárquica e das fundações públicas, em exercicio na data da promulgação da Constituição, há pelo menos cinco anos continuados, e que não tenham sido admitidos na .forma regulada no art. 37. da Constituição, são considerados estáveis no serviço público. "

Entretanto, confonne decidido por esse Supremo Tribunal Federal, o

artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias não se aplica aos

empregados celetistas de entidades privadas integrantes da administração pública

indireta. Confira-se:

"DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO, AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO ARr. 6° DOATO DAS DISPOSIÇ()ES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DO AMAZONAS. ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTS. 25, 37, 11. 41, 42 E 173, § JO, DA PARTE PERMANENTE DA CONSTITUIÇA-O FEDERAL, ASSIM COMO AOS ARTS. 11. 25 E 19 DO A.D.C.r. ESTABILIDADE. SERVIDOR PÚBLICO. MEDIDA CAUTELAR. 1. O art. 6 do A.D.C.r. da Constituição do Estado do Amazonas estabelece: 'Art. 6°. Os servidores públicos civis do Estado e dos Municípios, da administração direta e indireta, em exercício na data da promulgação da Constituição da República, há, pelo menos. cinco anos continuados. e que não tenham sido admitidos na forma regulada no artigo 109, desta Constituição, são considerados estáveis no serviço público, contando­se o respectivo tempo de serviço como título quando se submeterem a concurso para fins de efetivação, na forma da lei. ' 2. A um primeiro exame, o dispositivo impugnado parece violar os artigos da e.F./88 e de seu A.D.e. T., apontados na inicial, pois acaba permitindo que sejam estabilizados, sem concurso público, até 'servidores' das sociedades de economia mista, das empresas públicas e das demais entidades de direito privado sob o controle direto ou indireto do Estado e Municípios, inclusive sob aforma de participação acionária, em.face do que conjugadamente dispõe o ar/. 105, parágrafo 1, incisos JI, JII e V. da mesma Constituição estadual. 3. Está, portanto. satisfeito o requisito da plausibilidade jurídica da A. D.l. (fumus boni iuris). ". Assim, também, o do 'periculum in mora', este avaliado. não só em razão de possível demora no processo e julgamento, mas. igualmente em.face do alto interesse da Administração Pública do Estado em que ela se realize com observância da Constituição Federal. 5. lvfedida

ADI nO 5{).J2. Rei /(,tin Marco Aurélio II

cautelar deferida, para suspensão, 'ex-tunc', da eficácia da norma impugnada, até o julgamento .final da Ação. 6. Essa suspensão não impede que, no Estado do Amazonas, seja cumprido o art. 19 do A.D.e. T. da Constituição Federal de 1988. 7. Maioria de votos. ., (ADI n° 1808 Me, Relator: Ministro Sydney Sanches, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 01/02/1999, Publicação em 01/06/2001 ; gri fou-se);

"Dispensa imolivada de empregado de sociedade de economia mista, admitido sob o regime do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço. Estabilidade outorgada por lei municipal, no período proscrito pelo art. 18 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias de 1988. Não se aplica, aos empregados de sociedades de economia mista e empresas públicas, a estabilidade excepcional outorgada pelo art. 19, também do ADCT. Recurso extraordinário provido, para julgar improcedente a reclamação trabalhista. " (RE n° 208.046, Relator: Ministro Octavio Gallotti, Órgão Julgador: Primeira Turma, Julgamento em 03/02/1998, Publicação em 24/04/1998; grifou-se).

"Absorção pela administração direta estadual dos empregados de sociedade de economia mista em liquidação: plausibilidade da alegação de ají-onta ao princípio constitucional do concurso público (CF. art. 37, 11): precedentes. O Supremo Tribunal julgou ser o concurso público pressuposto de validez da admissão de pessoal não apenas pela administração direta e pelos entes públicos da administração indireta - ou seja dos seguimentos alcançados pelo regime jurídico único - mas também pelas empresas públicas e sociedades de economia mista, não obstante, por força do art. 173, CF, a sua relação com os respectivos empregados se submeta ao Direito do Trabalho (MS 21.322, Brossard, RTJ 149/139). 2. Suspensão de liminar cujo cumprimento e previsível extensão a outros servidores pode acarretar grave lesão às finanças e à ordem administrativa do Estado. 3. Suspensão mantida. " (SS n° 837 AgR, Relator: Ministro Sepúlveda Pertence, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 09/05/1997, Publicação em 13/06/1997; grifou-se).

Desse modo, verifica-se a inconstitucionalidade do artigo 3° da

Emenda à Constituição estadual n° 84/13 e do artigo 8°, caput e § 2°, da Lei

estadual n° 3.138/13, nos termos da jurisprudência dessa Suprema Corte.

Por conseguinte, deve ser reconhecida, pela via do arrastamento, a

invalidade do § 2° do artigo 7° do diploma legal mencionado, que define a

remuneração mensal devida aos empregados recepcionados pela Empresa

ADt nO 50-/2. Rel Min iv/arco Aurélio 12

Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Rondônia

enquanto não for instituído o respectivo Plano de Carreiras, Remunerações e

Benefícios - PCRB.

Por sua vez, o § 6° do artigo 161 da Carta do Estado de Rondônia, na

redação conferida pelo artigo 2° da emenda constitucional referida, fixara o prazo

de até 1° de janeiro de 2014 para que o Poder Executivo estadual definisse e

implantasse, mediante lei, a estrutura, orçamento, quadro de pessoal, plano de

cargo, salários e benefícios da Empresa Estadual de Assistência Técnica e

Extensão Rural do Estado de Rondônia.

Entretanto, a jurisprudência dessa Corte Suprema é assente no

sentido da invalidade de emenda constitucional estadual que imponha ao Poder

Executivo prazo para o encaminhamento de projeto de lei relativo a matéria

reservada à sua iniciativa. Veja-se:

"DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. REGIME JURÍDICO DE SERVIDOR MILITAR. PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES PROJETO DE LEI: INICIATIVA. AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE DO PARAGRAFO 9° DO ARTIGO 63 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE ALAGOAS. ACRESCENTADO PELA EMENDA CONSTITUCIONAL N° 22, DE 26.12.2000. COM ESTE TEOR: '§ 9°. O Chefe do Poder Executivo Estadual, encaminhará à Assembleia Legislativa de Alagoas. no prazo de 45 (quarenta e cinco) dias, da aprovação desta Emenda. para .fins de deliberação pelos seus Deputados. de Projeto de Lei que defina, na forma prescrita pela parte final do inciso LXI do ar/. 5° da Constituição Federal. as transgressões militares a que estão sujeitos os servidores públicos militares do estado de Alagoas '. 1. A norma questionada contém vício de inconstitucionalidade formal pois impõe ao Chefe do Poder Executivo, e em prazo determinado, o encaminhamento de projeto de lei, que, segundo a Constituição Federal depende exclusivamente de sua própria iniciativa, por tratar de regime jurídico de servidor público (art. 61, § 10, letra 'c'). 2. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente. Plenário. Decisão unânime. (AOI nO 2393, Relator: Ministro Sydney Sanches, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 13/02/2003, Publicação em 28/03/2003; grifou-se);

A D/ nO 5()n. Rei. Min iv/arco Aurélio 13

"Ação direta de inconstitucionalidade. Arts. 4° e 5° da Lei nO 9.265, de 13 de junho de 1991, do Estado do Rio Grande do Sul. - Tratando-se de projeto de lei de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, não pode o Poder Legislativo assinar-lhe prazo para o exercício dessa prerrogativa sua. - Não havendo aumento de despesa, o Poder Legislativo pode emendar projeto de iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo, mas esse poder não é ilimitado, não se estendendo ele a emendas que não guardem estreita pertinência com o objeto do projeto encaminhado ao Legislativo pelo Executivo e que digam respeito a matéria que também é da iniciativa privativa daquela autoridade, Ação julgada procedente para declarar a inconstitucionalidade dos artigos 4° e 5° da Lei nO 9. 265, de 13 de junho de 1991, do Estado do Rio Grande do Sul." (ADI nO 546, Relator: Ministro Moreira Alves, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em I 1/03/1999, Publicação em 14/04/2000; gri fou-se).

Sendo assim, constata-se a inconstitucionalidade do § 6° do artigo

161 da Constituição do Estado de Rondônia, na redação conferida pelo artigo 2°

da Emenda Constitucional nO 84113.

Por fim, revelam-se insubsistentes as alegações no sentido de que os

artigos 5°; 7°, caput e § l°; 8°, § l°; 9°; 13 e 14 da Lei estadual n° 3.138113 seriam

incompatíveis com o Texto Constitucional.

Com efeito, os artigos 5° e 7°, caput e § l°, da Lei nO 3.138113

preveem que o Estatuto da EMATER/RO e o Plano de Carreiras, Remunerações

e Beneficios - PCRB de seus empregados devem ser instituídos mediante decretos

do Poder Executivo.

A respeito do tema, Maria Sylvia Zanella di Pietr08 salienta que as

empresas estatais correspondem a "todas as sociedades, civis ou comerciais, de

que o Estado tenha o controle acionário, abrangendo a empresa pública, a

sociedade de economia mista e outras empresas que não tenham essa natureza".

8 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 15. ed. São Paulo: Atlas, p. 381.

ADI nO 5()-/2, Rei t'vlin. Marco Aurélio 14

Trata-se de pessoas jurídicas compreendidas na Administração

Pública indireta, que, em razão de sua natureza jurídica privada, possibilitam ao

Estado o exercício de atividades econômicas com maior versatilidade, celeridade

e eficiência9.

Assim, ao criarem tais empresas, os entes federados utilizam-se de

técnica organizacional típica do direito privado, que, diante de sua maior

flexibilidade e por não se sujeitar às diversas restrições burocráticas impostas aos

órgãos e entidades públicos, permite a adequada consecução das finalidades

públicas relacionadas à exploração de atividades econômicas em sentido amplo.

Com efeito, além do desempenho de atividades submetidas a regime

jurídico de direito público, também compete à administração pública intervir

diretamente no domínio econômico, o que ocorre, geralmente, por meio das

empresas estatais. Neste caso, o Estado opera em confonnidade com os princípios

constitucionais ordenadores da atividade econômica e financeira, submetendo-se

à disciplina própria das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e

obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários 10. A propósito, confira-se o

teor do artigo 173, § 1°, inciso lI, da Lei Maior:

'Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição. a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.

§ 10 A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços. dispondo sobre: ( ...)

9 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, p. 491.

10 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 15. ed. São Paulo: Atlas, p. 60.

ADI nO j().J]. Rel /vlin. Marco Aurélio 15

li - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;" (grifou-se).

Conforme observa Celso Antônio Bandeira de Mello 11, o traço

característico das empresas públicas reside na circunstância de serem entidades

privadas coadjuvantes de misteres estatais. Assim, por constituírem instrumentos

da ação do Estado, o regime de direito privado ao qual se submetem é

parcialmente modificado por princípios e regras de direito público, que incidem

"naqueles aspectos ligados ao controle administrativo resultante de sua

vinculação à pessoa federativa" 12.

Sendo assim, as empresas estatais sujeitam-se, a princípio, ao regime

de direito privado, a não ser quanto aos aspectos em que haja disposição

constitucional ou legal em sentido diverso.

A partir das premissas expostas, constata-se que, embora as estatais

estejam submetidas ao exercício do controle administrativo, não cabe ao Poder

Legislativo dispor sobre o quadro de empregos dessas entidades.

Com efeito, a Carta da República somente prevê a edição de lei

acerca da criação de empregos públicos na administração direta e autárquica

(artigo 61, § 1°, inciso II, alínea "a", da Lei Maior)'3, mas não contém disposição

II MELLO. Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros. 7" ed., p. 101.

12 CARVALHO FILHO. José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, p. 497.

13 "Arl 61 (... ) § r -São de iniciativa privativa do Presidente da República as leis que: ( ... ) /I - disponham sobre: a) criação de cargos. funções ou empregos públicos na administração direta e autárquica ou aumento de sua remunera(,:ão:" (gri fou-se).

ADI n° 5()-I2. Rei iv/in. Marco Aurélio 16

semelhante em relação às entidades estatais de natureza privada. Nesse sentido,

José dos Santos Carvalho Filho aduz o seguinte:

"Avulta notar que os empregos públicos da Administração Direta, autarquias e fundações de direito público também exigem sua criação por lei, sendo esta de iniciativa do Chefe do Executivo (art. 61, § 10, 11. a, CF). Já os empregos públicos de pessoas privadas da Administração (empresas públicas e sociedades de economia mista), quer os denominados 'cargos efetivos', quer os chamados 'cargos em comissão' ou 'de confiança' (na verdade, 'empregos efetivos' ou 'empregos em comissão', como vimos) podem ser criados através dos atos de organização funcional dessas entidades. ,,14

Ademais, a Constituição Federal confere privativamente ao Chefe do

Poder Executivo o exercício da direção superior da Administração (artigo 84,

inciso, lI, do Texto Constitucional '5), de modo que o desempenho do controle

administrativo sobre as empresas estatais vinculadas a esse Poder não pode sofrer

ingerência normativa advinda do Legislativo.

A respeito do tema, essa Suprema Corte entende que é vedado ao

Poder Legislativo intervir normativamente em matérias sujeitas à exclusiva

competência administrativa do Poder Executivo, em observância ao princípio da

reserva de administração, que constitui decorrência do conteúdo nuclear do

princípio da separação de Poderes (artigo 2° da Carta Federal '6). Confira-se:

"RECURSO EXTRAORDINARIO - EMBARGOS DE DECLARAÇio RECEBIDOS COMO RECURSO DE AGRA VO - DECISio QUE SE AJUSTA A JURISPRUDÊNCIA PREVALECENTE NO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL - CONSEQÜENTE INVIABILIDADE DO RECURSO QUE A IMPUGNA SUBSISTÊNCIA DOS FUNDAMENTOS QUE Dio SUPORTE A DECISio RECORRIDA ­RECURSO DE AGRA VO IMPROVIDO - O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder

14 CARVALHO FI LHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, p. 612.

15 "Art. 8-1. Compete privativamente ao Presidente da República. ( ... ) II - exercer. com O auxílio dos Ministros de Estado. a direção superior da administração federal;"

16 "Arl ]O São Poderes da União. independentes e harmônicos entre si. o Legislativo. o Executivo e o Judiciário. ,.

ADI nO 50.J2. ReI iv/in Marco Aurélio 17

Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. É que, em tais matérias, o Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes. Não cabe. desse modo, ao Poder Legislativo. sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação de poderes. desconstituir, por lei. atos de caráter administrativo que tenham sido editados pelo Poder Executivo, no estrito desempenho de suas privativas atribuições institucionais. Essa prática legislativa, quando efetivada, subverte afunção primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder, representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação 'ultra vires' do Poder Legislativo, que não pode, em sua atuação político-jurídica, exorbitar dos limites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais." (RE nO 427574 EO, Relator: Ministro Celso de Mello, Órgão Julgador: Segunda Turma, Julgamento em 13/12/2011, Publicação em 13/02/2012; grifou-se);

"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - LEI ESTADUAL. DE INICIATIVA PARLAMENTAR. QUE INTERVÉM NO REGIME JURÍDICO DE SERVIDORES PÚBLICOS VINCULADOS AO PODER EXECUTIVO - USURPAÇÃO DO PODER DE INICIATIVA RESERVADO AO GOVERNADOR DO ESTADO INCONSTITUCIONALIDADE CONTEÚDO MATERIAL DO DIPLOMA LEGISLATIVO IMPUGNADO (LEI N° 6.I6I/2000, ART 70) QUE TORNA SEM EFEITO ATOS ADMINISTRATIVOS EDITADOS PELO GOVERNADOR DO ESTADO IMPOSSIBILIDADE - OFENSA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO - MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA. COM EFICAcIA EX TUNC. PROCESSO LEGISLATIVO E INICIATIVA RESERVADA DAS LEIS. (...) RESERVA DE ADMINISTRAÇÃO E SEPARAÇÃO DE PODERES. - O princípio constitucional da reserva de administração impede a ingerência normativa do Poder Legislativo em matérias sujeitas à exclusiva competência administrativa do Poder Executivo. É que, em tais matérias, o Legislativo não se qualifica como instância de revisão dos atos administrativos emanados do Poder Executivo. Precedentes. Não cabe, desse modo, ao Poder Legislativo, sob pena de grave desrespeito ao postulado da separação de poderes, desconstituir. por lei, atos de caráter administrativo que tenham sido editados pelo Poder Executivo. no estrito desempenho de suas privativas atribuições institucionais. Essa prática legislativa, quando efetivada. subverte afunção primária da lei, transgride o princípio da divisão funcional do poder. representa comportamento heterodoxo da instituição parlamentar e importa em atuação ultra vires do Poder Legislativo. que não pode. em sua atuação pofítico-jurídica. exorbitar dos fímites que definem o exercício de suas prerrogativas institucionais." (AOI nO 2364 MC, Relator: Ministro Celso de Mello, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 01/08/200 I, Publicação em 14/12/2001; grifou-se).

ADI n° 50./2. Rei A4in Marco Aurélio 18

De modo semelhante, essa Suprema Corte julgou inconstitucional

norma contida na Carta do Estado de Minas Gerais que permitia a intromissão do

Poder Legislativo em matéria inserida no âmbito do regime estrutural das

empresas estatais desse ente federado. Veja-se:

"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. ALÍNEA 'd' DO INCISO XXIII DO ARTIGO 62 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DE MINAS GERAIS. APROVAÇÃO DO PROVIMENTO, PELO EXECUTIVO, DOS CARGOS DE PRESIDENTE DAS ENTIDADES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA ESTADUAL PELA ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA, ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DO DISPOSTO NO ARTIGO 173. DA CONSTITUIÇÃO DO BRASIL. DISTINÇÃO ENTRE EMPRESAS ESTATAIS PRESTADORAS DE SERVIÇO PÚBLICO E EMPRESAS ESTATAIS QUE DESENVOLVEM ATIVIDADE ECONÔMICA EM SENTIDO ESTRITO REGIME JURÍDICO ESTRUTURAL E REGIME JURÍDICO FUNCIONAL DAS EMPRESAS ESTATAIS. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL. INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO I. Esta Corte em oportunidades anteriores definiu que a aprovação. pelo Legislativo, da indicação dos Presidentes das entidades da Administração Pública Indireta restringe-se às autarquias e fundações públicas. dela excluídas as sociedades de economia mista e as empresas públicas, Precedentes, 2, As sociedades de economia mista e as empresas públicas que explorem atividade econômica em sentido estrito estão sujeitas, nos termos do disposto no § 10 do artigo 173 da Constituição do Brasil, ao regime jurídico próprio das empresas privadas. 3. Distinção entre empresas estalais que prestam serviço público e empresas estatais que empreendem atividade econômica em sentido estrito 4. O § IOdo artigo 173 da Constituição do Brasil não se aplica às empresas públicas, sociedades de economia mista e entidades (estatais) que prestam serviço público. 5. A intromissão do Poder Legislativo no processo de provimento das diretorias das empresas estatais colide com o princípio da harmonia e interdependência entre os poderes. A escolha dos dirigentes dessas empresas é matéria inserida no âmbito do regime estrutural de cada uma delas. 6. Pedido julgado parcialmente procedente para dar interpretação conforme à Constituição à alínea 'd' do inciso XXIll do artigo 62 da Constituição do Estado de Minas Gerais, para restringir sua aplicação às autarquias e jimdações públicas. dela excluídas as empresas estatais. todas elas." (ADI nO 1642, Relator: Ministro Eros Grau, Órgão Julgador: Tribunal Pleno, Julgamento em 03/04/2008, Publicação em 19/09/2008; grifou­se).

Desse modo, as normas legais referidas são constitucionais por

preverem que a aprovação do Estatuto da EMATERlRü, bem como a instituição

AD/ nO 5()-I2, Rel iv/in !vfarco Aurélio 19

do Plano de Carreiras, Remunerações e Beneficios - PCRB de seus empregados

competem ao próprio Poder Executivo.

Dessa fonna, verifica-se a constitucionalidade dos artigos 5°; 7°,

capute § l°; 8°, § l°; 9°; 13 e 14 da Lei estadual n° 3.138/13.

Cumpre destacar, por derradeiro, que o posicionamento externado na

presente manifestação encontra-se em consonância com o entendimento

consolidado dessa Suprema Corte - e reafinnado no julgamento da questão de

ordem na Ação Direta de Inconstitucionalidade nO 3.916/DF, Relator Ministro

Eros Grau, Dl de 19.10.2009 - no que diz respeito à autonomia do Advogado­

Geral da União contrapor-se à constitucionalidade das normas submetidas ao seu

exame, na jurisdição concentrada de constitucionalidade, notadamente quando

houver precedente no mesmo sentido.

IH - CONCLUSÃO

Ante o exposto, o Advogado-Geral da União manifesta-se pela

procedência parcial do pedido veiculado pelo requerente, devendo ser declarada

a inconstitucionalidade, tão somente, do artigo 3° da Emenda à Constituição

estadual nO 84, de 24 de abril de 2013; do § 6° do artigo 161 da Carta estadual, na

redação conferida pelo artigo 2° da emenda constitucional referida; bem como dos

artigos 7, § 2°; e 8°, caput e § 2°, da Lei nO 3.138, de 05 de julho de 2013, do

Estado de Rondônia.

São essas, Excelentíssimo Senhor Relator, as considerações que se

tem a fazer em face do artigo 103, § 3°, da Constituição Federal, cuja juntada aos

autos ora se requer, e tendo em vista a orientação fixada na interpretação do

referido dispositivo nas ADI(s) nO 1.616/PE e 2.101/MS, ReI. Min. Maurício

ADI nO 50.12, ReI. Min. Marco Aurélio 20

(

Corrêa, Dl de 24.08.2001 e 15.10.2001, respectivamente, e na ADI/QO nO

3.916/DF, Relator Ministro Eros Grau, Dl de 19.10.2009.

Brasília,1ede méJ-

GRACE MARIA F ES MENDONÇA Secretária-Ge ai de Contencioso

A DI nO 50./2, ReI. Min. Marco Aurélio 21