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AÇÕES PÚBLICAS LOCAIS DE ABASTECIMENTO ALIMENTAR Renato S. Maluf &&Introdução~~ Este texto aborda experiências significativas de abastecimento alimentar através de políticas e ações públicas em nível local, implementadas por iniciativa de administrações municipais, de órgãos públicos estaduais ou de organizações da sociedade civil. Tais iniciativas foram apresentadas e debatidas durante o Painel sobre Experiências Significativas de Ação Local de Abastecimento Alimentar, realizado em São Paulo, em abril de 1999 (ver Anexos 1 e 2). O painel e esse texto guardam uma relação de continuidade com a análise anterior sobre ações voltadas para o estímulo e apoio à produção agro-alimentar, que foi objeto de outra publicação nesta mesma série (PÓLIS Papers, 4). Ambos os textos são componentes de um projeto voltado ao delineamento de políticas municipais de segurança alimentar e nutricional sustentável . Tratar do abastecimento alimentar implica conferir destaque aos aspectos relacionados com o acesso aos alimentos pelos diversos segmentos da população, tendo presente sua conexão com a disponibilidade dos alimentos, vale dizer, com a sua produção e comercialização. Como se verá, iniciativas em âmbito local tendem a valorizar os vínculos do abastecimento com a produção agro- alimentar, especialmente em se tratando de municípios de pequeno e médio portes. Essa perspectiva não está ausente nas cidades de grande porte localizadas em regiões metropolitanas, embora nestas últimas se coloquem outras possibilidades de desenvolvimento de ações públicas no que se refere às formas de acesso da população aos alimentos. O painel procurou dar conta das principais dimensões da problemática do abastecimento antes mencionadas. Ficou de fora a interface do abastecimento com as questões ligadas ao consumo dos alimentos, porque esse tema é objeto da próxima etapa do projeto em curso. Este texto está dividido em três seções. Na primeira delas, apresenta-se uma síntese das principais dimensões da questão do abastecimento alimentar, buscando estabelecer seus vínculos com o objetivo da segurança alimentar. A segunda seção destaca os aspectos mais relevantes das experiências apresentadas no painel. Na última seção são feitas observações gerais sobre os principais fatores que intervém nas experiências analisadas, e suas implicações. O conteúdo do texto se beneficiou, em todas as suas partes, das contribuições ao debate aportadas pelos participantes presentes no painel. &&I. Abastecimento e Segurança Alimentar ~~ O abastecimento alimentar é, em geral, abordado em termos da estrutura que disponibiliza os produtos alimentares, isto é, as formas pelas quais os alimentos são produzidos e distribuídos para a população. Nessa perspectiva, descrevem-se os fluxos seguidos pelos bens através de encadeamentos que ‘se iniciam’ (sic) na etapa agrícola, passando pela intermediação mercantil e o processamento agroindustrial, até o comércio varejista. No entanto, as estruturas de abastecimento também fazem parte dos elementos que determinam as condições em que a população acessa os alimentos. Dispor de renda monetária regular é, sem dúvida, a condição primeira de acesso aos alimentos, contudo essa renda terá que se materializar numa cesta de consumo, cujo custo, composição e qualidade dos bens que a integram são, em boa medida, definidos pelos agentes econômicos que detém alguma capacidade de controle sobre os referidos encadeamentos. Além disso, deve-se levar em conta a articulação cada vez mais estreita entre as etapas produtivas e a esfera da distribuição e consumo dos alimentos. Essa articulação se faz, por um lado, através do já mencionado poder que as estruturas produtivas e comerciais têm de determinar as condições em que os produtos são ofertados e consumidos. Por outro lado, e em sentido inverso, o nível e o perfil da demanda efetiva de alimentos influenciam os rumos da produção desses bens (inclusive a etapa

AÇÕES PÚBLICAS LOCAIS DE ABASTECIMENTO ALIMENTARpolis.org.br/uploads/845/845.pdf · ações de abastecimento podem contribuir para promover a produção e a distribuição dos

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AÇÕES PÚBLICAS LOCAIS DE ABASTECIMENTO ALIMENTAR

Renato S. Maluf

&&Introdução~~Este texto aborda experiências significativas de abastecimento alimentar através de políticas e

ações públicas em nível local, implementadas por iniciativa de administrações municipais, de órgãos públicos estaduais ou de organizações da sociedade civil. Tais iniciativas foram apresentadas e debatidas durante o Painel sobre Experiências Significativas de Ação Local de Abastecimento Alimentar, realizado em São Paulo, em abril de 1999 (ver Anexos 1 e 2). O painel e esse texto guardam uma relação de continuidade com a análise anterior sobre ações voltadas para o estímulo e apoio à produção agro-alimentar, que foi objeto de outra publicação nesta mesma série (PÓLIS Papers, 4). Ambos os textos são componentes de um projeto voltado ao delineamento de políticas

municipais de segurança alimentar e nutricional sustentável .

Tratar do abastecimento alimentar implica conferir destaque aos aspectos relacionados com o acesso aos alimentos pelos diversos segmentos da população, tendo presente sua conexão com a disponibilidade dos alimentos, vale dizer, com a sua produção e comercialização. Como se verá, iniciativas em âmbito local tendem a valorizar os vínculos do abastecimento com a produção agro-alimentar, especialmente em se tratando de municípios de pequeno e médio portes. Essa perspectiva não está ausente nas cidades de grande porte localizadas em regiões metropolitanas, embora nestas últimas se coloquem outras possibilidades de desenvolvimento de ações públicas no que se refere às formas de acesso da população aos alimentos.

O painel procurou dar conta das principais dimensões da problemática do abastecimento antes mencionadas. Ficou de fora a interface do abastecimento com as questões ligadas ao consumo dos alimentos, porque esse tema é objeto da próxima etapa do projeto em curso.

Este texto está dividido em três seções. Na primeira delas, apresenta-se uma síntese das principais dimensões da questão do abastecimento alimentar, buscando estabelecer seus vínculos com o objetivo da segurança alimentar. A segunda seção destaca os aspectos mais relevantes das experiências apresentadas no painel. Na última seção são feitas observações gerais sobre os principais fatores que intervém nas experiências analisadas, e suas implicações. O conteúdo do texto se beneficiou, em todas as suas partes, das contribuições ao debate aportadas pelos participantes presentes no painel.

&&I. Abastecimento e Segurança Alimentar ~~O abastecimento alimentar é, em geral, abordado em termos da estrutura que disponibiliza os

produtos alimentares, isto é, as formas pelas quais os alimentos são produzidos e distribuídos para a população. Nessa perspectiva, descrevem-se os fluxos seguidos pelos bens através de encadeamentos que ‘se iniciam’ (sic) na etapa agrícola, passando pela intermediação mercantil e o processamento agroindustrial, até o comércio varejista. No entanto, as estruturas de abastecimento também fazem parte dos elementos que determinam as condições em que a população acessa os alimentos. Dispor de renda monetária regular é, sem dúvida, a condição primeira de acesso aos alimentos, contudo essa renda terá que se materializar numa cesta de consumo, cujo custo, composição e qualidade dos bens que a integram são, em boa medida, definidos pelos agentes econômicos que detém alguma capacidade de controle sobre os referidos encadeamentos.

Além disso, deve-se levar em conta a articulação cada vez mais estreita entre as etapas produtivas e a esfera da distribuição e consumo dos alimentos. Essa articulação se faz, por um lado, através do já mencionado poder que as estruturas produtivas e comerciais têm de determinar as condições em que os produtos são ofertados e consumidos. Por outro lado, e em sentido inverso, o nível e o perfil da demanda efetiva de alimentos influenciam os rumos da produção desses bens (inclusive a etapa

agrícola), na medida em que a produção se orienta cada vez mais pela evolução dos padrões de consumo e suas repercussões nos mercados de produtos alimentares. Esta afirmação não significa admitir a alegada supremacia do mercado. Mais do que isso, a própria noção de mercado precisa ser qualificada como, por exemplo, se fará nas observações a seguir sobre o mercado de alimentos no Brasil.

Em países como o Brasil, a análise do consumo e dos mercados de alimentos não pode prescindir de considerar, em primeiro lugar, o grau de heterogeneidade social resultante principalmente das desigualdades de renda. Um elevado índice de desigualdade, como o de nosso País, implica na exclusão de uma parcela expressiva da população da possibilidade de consumo regular e satisfatório de alimentos, e na ocorrência da fome. Ressalte-se que nas conjunturas onde há alguma recuperação da renda real dos segmentos mais pobres, as necessidades alimentares não satisfeitas convertem-se em expressivo aumento na demanda efetiva de alimentos.

A heterogeneidade social leva também à coexistência de carências de bens de consumo pouco elaborados e de baixo preço, com a proliferação de produtos com maior valor agregado e produtos destinados a atender à crescente segmentação que caracteriza o mercado de alimentos. Os aspectos relativos ao padrão de consumo aí implicados serão objeto de análise mais detalhada na etapa seguinte desse projeto, apesar de não ser possível dissociá-los inteiramente das questões aqui tratadas. Já em termos da estrutura produtiva e de distribuição dos alimentos, os processos de segmentação dos mercados e de diferenciação de produtos criam novas possibilidades como, por exemplo, os produtos artesanais, os orgânicos e os com denominação de origem. Eles podem também fechar espaços existentes em segmentos tradicionais como os das carnes e dos derivados lácteos, em virtude da maior demanda de qualidade, dos requisitos de logística comercial, da combinação produção em escala-diferenciação de produtos, etc. Nesse caso, tais processos podem ter resultados negativos ou serem promotores de exclusão de pequenos e médios empreendimentos agrícolas, industriais e comerciais, contribuindo assim para acentuar as iniqüidades presentes em nosso padrão de desenvolvimento. A ausência de ações públicas (governamentais ou não) e de mecanismos de regulação pública dessas atividades acentua essa tendência.

Vejamos, agora, como abordar a dupla inserção do tema do abastecimento sob a ótica da implementação de políticas de segurança alimentar. Em primeiro lugar, há que considerar como as ações de abastecimento podem contribuir para promover a produção e a distribuição dos alimentos sob formas sociais mais eqüitativas, dada a importância dessa iniciativa em si mesma e para a oferta de alimentos. A título de ilustração: apoiar pequenos e médios empreendimentos rurais e urbanos dedicados ao cultivo, transformação e comercialização de produtos agro-alimentares significa promover atividades econômicas geradoras de trabalho e de renda sob formas que, simultaneamente, promovem uma maior equidade social. Ao mesmo tempo, esse é um caminho que possibilita ampliar a disponibilidade de alimentos de qualidade de um modo menos custoso, valorizando a diversidade nos hábitos de cultivo e de consumo.

Nesse ponto, cabe uma referência ao desafio da ‘construção de mercados’ que se coloca, principalmente, para os agricultores de pequeno e médio portes - a chamada agricultura de base familiar - e também para a pequena indústria agro-alimentar e o varejo tradicional. Esse enfoque distingue-se daqueles nos quais os mercados existem e a questão se resume em capacitar-se para o negócio e ocupá-los, o que seria talvez válido para indivíduos mas é quase sempre ilusório enquanto perspectiva para grupos sociais como o dos agricultores antes referidos. A construção de mercados é um processo que engloba, ademais da capacitação do agente produtivo, relações sociais (muitas vezes pessoais) e elementos institucionais que conformam a atividade mercantil. Tais relações e elementos são especialmente visíveis no âmbito dos espaços locais e regionais. As ações públicas desde a ótica do abastecimento são um dos principais mecanismos de colagem da ‘construção de mercados’ com a questão do acesso aos alimentos.

Em segundo lugar, é preciso considerar como as ações de abastecimento podem contribuir para o acesso aos alimentos por todos os segmentos da população, em condições apropriadas em termos da quantidade, preço e qualidade dos alimentos, e da composição da cesta de consumo. À parte as iniciativas voltadas ao enfrentamento da insuficiência de renda, que aflige importantes segmentos da população e cujo tratamento ultrapassa os objetivos desse texto, enquadram-se nesse campo de

preocupação as ações nas esferas da intermediação mercantil e do comércio de varejo, no consumo de alimentos preparados (refeições prontas e outras formas), na organização de compras comunitárias e na implementação de programas de distribuição de alimentos.

Destaque especial deve ser feito ao chamado mercado institucional, que engloba as compras governamentais de alimentos para serem utilizados em programas e organismos públicos (alimentação escolar, hospitais, presídios, distribuição de cestas básicas, etc.). As prefeituras municipais passaram a gerenciar uma parcela importante desses programas e das compras correspondentes. Alguns deles, como a alimentação escolar, têm papel central no acesso aos alimentos por uma parcela vulnerável e numericamente expressiva da população.

&&II. Aspectos Relevantes das Experiências~~A maioria dos aspectos mencionados na seção anterior podem ser alvo de ações gestadas

localmente ou em parceria com organismos estaduais e nacionais, e implementadas pelas administrações municipais ou por organizações da sociedade civil. As experiências apresentadas a seguir conformam um painel bastante representativo dessas possibilidades de atuação frente ao abastecimento alimentar.

A organização das sessões do painel teve como critério inicial diferenciar as questões segundo a dimensão populacional das localidades, de modo a poder abordar, inicialmente, os intentos de estabelecer ou estimular as conexões entre o abastecimento alimentar e a produção local. Nos municípios com núcleos urbanos de pequeno e mesmo de médio portes, essa é a perspectiva dominante em relação a um leque de produtos agro-alimentares produzidos no próprio município ou em áreas contíguas. Isto se dá em razão da crença na possibilidade e conveniência de eliminar estruturas custosas de intermediação mercantil através da “aproximação” entre produtores e consumidores, e também para valorizar a atividade econômica local e gerar oportunidades de ganho à população rural, que tende a ser expressiva nesses municípios. As conexões com a produção agro-alimentar tornam-se mais remotas na medida em que se caminha para centros urbanos maiores, embora possam haver iniciativas nessa direção mesmo nesses casos.

Outro critério foi o de tratar de experiências de gestão de equipamentos públicos de abastecimento nas esferas do atacado e do varejo, em cidades de médio e grande portes. As políticas adotadas em algumas capitais localizadas em regiões metropolitanas de grande porte foram alvo de tratamento à parte, sobretudo pelo vulto assumido por algumas dessas políticas e pelos fenômenos que adquirem maior importância nesses centros, como é o caso das refeições fora do domicílio.

Assim, os aspectos relevantes destacados nessa seção com base nas experiências apresentadas no painel são os seguintes:

a) produção local e abastecimento em cidades de porte pequeno e médiob) gestão de equipamentos públicos nas esferas do atacado e do varejoc) políticas públicas de abastecimento em grandes capitaisd) mercado institucional como instrumento de apoio à pequena e média produção agro-alimentare) compras comunitárias e os mercados solidários

&&Apoio à Comercialização e Abastecimento Local~~Há no Brasil um grande número de organizações não-governamentais que oferecem suporte a

associações de pequenos agricultores na comercialização dos seus produtos, quase sempre com a perspectiva de melhorar o resultado econômico (a renda auferida) das atividades produtivas e, desse modo, contribuir para a construção de um modelo de desenvolvimento rural eqüitativo e sustentável. Essas iniciativas têm repercussões no abastecimento alimentar das regiões em que os agricultores se localizam, e também das localidades mais distantes para onde os produtos são destinados. Não é freqüente, porém, adotar-se um tal enfoque no desenho ou na avaliação das experiências de apoio à comercialização, ficando o tema do abastecimento apenas como um desdobramento do objetivo produtivo. A importância crescente de se identificar os mercados que podem ser atingidos pela pequena produção agrícola tem trazido à tona questões típicas de abastecimento alimentar.

A experiência da Associação de Apoio às Comunidades do Campo do Rio Grande do Norte (AACC), com sede em Natal, contém interessantes indicações de como aspectos relativos ao abastecimento local e regional poderiam vir a se articular com iniciativas focalizadas na comercialização agrícola em geral. Não se pretende desconsiderar o fato de as ações se darem junto a comunidades da zona rural da região Nordeste - sabidamente detentora dos mais elevados índices de pobreza do País- e de elas estarem dirigidas a assentamentos rurais, o que torna importante em si mesmo o objetivo de melhorar o nível da renda do trabalho agrícola auferida pelas famílias envolvidas, qualquer que seja o mercado a ser explorado com esse fim. Há aí um evidente caso de insegurança alimentar. Entretanto, interessa-nos ressaltar as possíveis conexões com o abastecimento local, de fato, uma das formas de se abordar a questão da ‘construção de mercados’ como mencionado antes.

Atuando numa área que engloba cerca de 5.600 famílias em assentamentos localizados em Baraúna, S. Miguel de Touros e Serra do Mel, a AACC viu-se obrigada a reduzir o escopo do seu trabalho, hoje voltado para três assentamentos com cerca de mil famílias; os casos apresentados no painel foram os dos assentamentos de Touros e Riachuelo. Essa organização atribui-se como principal missão a de educar para o desenvolvimento sustentável do meio rural do Nordeste, com ênfase na participação das mulheres e dos jovens.

As iniciativas de comercialização para mercados locais ou de âmbito regional refletem a multiplicidade dos vínculos que a agricultura familiar mantém com os mercados, em termos dos tipos de produtos e da amplitude das áreas de comercialização dos mesmos. Neste caso, destaca-se uma cultura (abacaxi) com grande expressão econômica na região e que é destinada ao mercado nacional; há que mencionar também as vendas de castanha de caju à Suíça. Porém, é bastante diverso o leque dos produtos oriundos dos dois assentamentos e que são comercializados pela cooperativa apoiada pela AACC, aliás, como é próprio da agricultura de base familiar. Entre eles estão: farinha de mandioca, inhame, frutas irrigadas, leite, queijos típicos, aguardente e bagaço de cana-de-açúcar.

O gradualismo é considerado como método-chave na atuação da AACC. Um primeiro componente básico do plano de produção adotado nos assentamentos é o de construir competências no próprio assentamento no sentido de dispor de infra-estrutura para a obtenção de água que possibilite a convivência com a seca. Como os projetos se encontram em estágio ainda inicial, há uma forte preocupação de viabilizar a produção de subsistência de modo a assegurar o abastecimento alimentar das famílias assentadas. A esta etapa segue-se o que denominam de “processo de incubadora”, voltado para a constituição de sistemas de produção baseados em um modelo agro-silvo-pastoril que promova a diversificação produtiva.

Um fundo rotativo é utilizado para financiar lavouras iniciais de pequena extensão, com aprimoramento gradativo à medida em que “aprendem como fazer”. A integração horizontal é buscada desde logo por seu efeito sinérgico na produção como um todo, enquanto que a integração vertical é gradual valendo-se dos recursos do Programa de Apoio ao Pequeno Produtor (PAPP) para a implementação de pequenas agroindústrias. Quanto à verticalização da produção, registre-se a ampliação e o aprimoramento da fábrica de farinha, chegando ao empacotamento com a utilização de código de barras. Porém, fez parte dessa experiência um episódio de perda de mercado devido à baixa qualidade da farinha que a cooperativa foi obrigada a comprar de terceiros para cumprir com compromisso de entrega, durante um período em que os associados não dispunham de produção suficiente.

A cooperativa defrontava-se com a situação bastante comum de entregar a produção a intermediários que buscavam os produtos nos próprios assentamentos. A comercialização do abacaxi deu origem a um momento de inflexão importante no processo de inserção mercantil dessas comunidades, com a experiência desastrosa da venda direta para um agente que atuava na CEAGESP, e que resultou na perda de 15 caminhões de fruta por “quebra de contrato”. A ela seguiram-se algumas tentativas de venda direta aos supermercados da região. Estas tentativas se defrontaram com um tipo recorrente de problema identificado como de “corrupção”. Numa das tentativas, o gerente de compras do supermercado (com quatro boxes no entreposto local) os orientou a vender a um atacadista que por sua vez entregava o produto ao supermercado. De fato, o

caminhão ia direto ‘da roça’ à loja, sem sequer passar pelo entreposto. A posterior procura do superior hierárquico criou também obstáculos já que ele próprio era um proprietário de fazenda interessado em adquirir subprodutos do assentamento. A empresa em questão convidou a cooperativa a ter um box próprio no entreposto a partir do qual atendia, irregularmente, a outros supermercados.

Algumas iniciativas buscam vincular a produção dos assentamentos com o chamado mercado institucional, analisado a seguir. Uma delas é o fornecimento para o programa estadual de distribuição de leite, possível apenas por terem adquirido uma indústria de laticínios que já dispunha de uma cota. Tentou-se, sem êxito, junto ao Governo do Estado, que fosse incluída na alimentação escolar uma cocada embalada desenvolvida por um produtor de um dos assentamentos. Há outros exemplos igualmente não-exitosos que revelam a dificuldade de superar as barreiras burocráticas e demais formas de controle do mercado das compras governamentais.

Foi registrada que uma articulação (ainda inexistente) entre as diversas iniciativas ligadas à comercialização e ao abastecimento no Rio Grande do Norte traria sem dúvida uma contribuição importante a cada uma delas. Além do que, a administração pública nos níveis local e estadual joga um papel decisivo na associação entre o apoio à comercialização e o abastecimento alimentar. Ao adotar ações voltadas ao abastecimento dos núcleos urbanos - no âmbito dos equipamentos de varejo, na gestão de programas como o da alimentação escolar, etc. - pode-se ampliar as oportunidades colocadas para o desenvolvimento das comunidades rurais em questão.

&&Gestão de Equipamentos Públicos de Abastecimento~~A gestão de equipamentos públicos que abrigam o comércio varejista de alimentos constitui-se na

mais comum e significativa ação de abastecimento em nível local, em particular nos centros urbanos de médio e grande portes. As três experiências abordadas a seguir contemplam os principais tipos de equipamentos: varejões (Piracicaba), sacolões (S. André) e feiras-livres (Guarulhos). O fato de serem feitas referências apenas tópicas aos mercados municipais deve-se à pouca expressividade das iniciativas eventualmente feitas junto a um equipamento que, na maioria das cidades, teve bastante descaracterizada sua atuação como instrumento de abastecimento. O ‘viés paulista’ da amostra relativa a equipamentos de varejo - que, de fato, não compromete a maioria das observações feitas - será parcial mente compensado nas sessões seguintes onde a questão do varejo será retomada considerando outras regiões do País.

Concebidos, prioritariamente, como instrumentos de regularização do varejo dos então chamados produtos hortifrutigranjeiros, esta foi uma área onde ocorreram iniciativas importantes voltadas a ampliar o controle público sobre os preços, a quantidade e a qualidade dos produtos comercializados tanto nesses equipamentos como, indiretamente, nas estruturas privadas de comércio. Essas iniciativas buscam assegurar o sentido público dos equipamentos ao explorar as possibilidades oferecidas pelo fato de eles serem uma interface entre as esferas de produção e atacado com a do consumo. Elas têm a pretensão de ir além da mera concessão de espaços públicos a agentes privados na medida em que está presente a preocupação com os impactos dos mesmos no abastecimento alimentar. Em muitos casos incorporou-se também a perspectiva de reduzir ou mesmo eliminar a intermediação mercantil oferecendo-se espaços para que se dê o ‘contato direto’ entre produtores e consumidores, ao mesmo tempo em que se estaria estimulando a produção agrícola local ou regional.

&&Os varejões em Piracicaba~~Piracicaba, município de porte médio localizado no interior do Estado de São Paulo, conta com

uma das mais antigas e duradouras experiências de varejões municipais. Os varejões foram introduzidos em 1981 com o objetivo principal de enfrentar os preços abusivos então praticados no varejo de produtos agro-alimentares, ao mesmo tempo em que carregava a perspectiva de estimular a produção local. É possível relacionar essa iniciativa aos problemas derivados da constituição de núcleos urbanos mais complexos e das transformações em sua área rural, no mesmo período em que é criada uma Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento (1984), em substituição à de Obras e Serviços Rurais. A propósito da dimensão político-institucional, a longevidade dos varejões

significa que o programa tem sido capaz de se manter ao longo de várias e distintas gestões municipais.

A evolução dos varejões nessa cidade acabou colocando-os como equipamentos alternativos principalmente em relação ao mercado municipal e às feiras-livres. O mercado municipal, criado em 1887, atende hoje a região central da cidade, e a diversificação das atividades em seu interior fez com que ele perdesse muito de sua importância como equipamento de abastecimento alimentar. Já as feiras livres, oficializadas em 1953, existem em número de dezesseis e passam por um processo gradativo de decadência, reforçado pela opção preferencial da administração municipal pelos varejões (pelo componente de estímulo à produção). Os equipamentos públicos inserem-se numa estrutura comercial que conta com 91 supermercados (6 de grande porte), 165 sacolões privados e quitandas, 594 armazéns e 57 cerealistas.

Os varejões constituem, hoje, uma rede de 11 equipamentos fixos, localizados um na região central e os demais nos diversos bairros da cidade, e mais nove varejões móveis (comboios). Cada um deles funciona apenas uma vez por semana em galpões de comercialização que nos demais dias são utilizados para outras finalidades. A administração municipal tem controle sobre a quantidade, preço e qualidade dos produtos comercializados pelos permissionários. A fixação dos preços tem como referência os preços praticados na CEASA regional de Campinas e no atacado local, ficando sempre pelo menos 20% abaixo do preço cobrado pelos demais agentes de varejo da cidade, sobre os quais a realização dos varejões exerce razoável impacto. Analogamente, os comboios funcionam como regulador de preços nos bairros onde se instalam.

Observou-se, ao longo dos anos, uma redução no percentual de agricultores no conjunto dos permissionários que neles atuam: no universo atual de 145 permissionários, 48% deles são produtores agrícolas e 52% são apenas comerciantes, geralmente atacadistas do entreposto local. Os produtores gozam do benefício especial de isenção de todas as taxas cobradas pelo uso do equipamento. Não é de estranhar a presença de comerciantes em um equipamento que tinha entre seus objetivos ‘aproximar’ produtores e consumidores, se tivermos em conta os limites à comercialização direta de produtos por seus próprios produtores, base da existência da intermediação mercantil nesse e em outros setores. A presença crescente de comerciantes pode ser explicada também pelo fato de que razões de concorrência levaram a que fossem incluídos nos varejões produtos outros que não os hortifrutigranjeiros, tornando o equipamento mais atrativo para os consumidores. Cerca de 45 mil pessoas circulam mensalmente pelos varejões.

O volume anual de produtos agro-alimentares comercializados nos varejões, que no início foi de 721t (1982), atingiu um pico de 8.088t em 1988, oscilando posteriormente entre 6 mil e 7,5 mil toneladas ao ano. Em 1998, nas duas rubricas principais, foram comercializadas 3.540t de frutas e 2.050t de verduras e legumes, representando 56% da frutas e 32% das verduras e legumes comercializados na cidade (além de 8% dos cereais). Num município marcado pela monocultura canavieira, os produtos hortifrutícolas originam-se de um pequeno contingente de produtores do ‘cinturão verde’ da cidade, de 148 hortas urbanas estimuladas por lei municipal e, principalmente, de outras regiões através do entreposto local e da CEASA regional de Campinas, onde também se abastece o grande varejo local. O município ‘importa’ 97% dos produtos agro-alimentares que consome, os 3% restantes sendo verduras e folhas. Cabe ressaltar, por fim, um aspecto pouco destacado nas avaliações das estruturas de abastecimento que é o volume de empregos gerados por elas; no caso dos varejões de Piracicaba, toda a cadeia gera oportunidades de trabalho para mais de duas mil pessoas entre agricultores locais e seus ajudantes, comerciantes e ajudantes diretos dos permissionários nos varejões.

&&Os sacolões em Santo André~~O município de Santo André, localizado na Região Metropolitana da Grande São Paulo, dispõe de

uma empresa pública municipal de abastecimento municipal, a CRAISA - Companhia Regional de Abastecimento de Santo André, responsável pelo programa de alimentação escolar, pela CEASA local, pelo programa de sacolões e pela supervisão das feiras-livres e do comércio ambulante. Está em vias de ser criado, por força de lei, um Conselho Municipal de Abastecimento. A

implementação do chamado Orçamento Municipal Participativo tem sido outra fonte de propostas referentes ao abastecimento alimentar.

O programa de sacolões completou 10 anos em 1998. Há que notar, desde logo, que este é mais um programa de abastecimento que se manteve apesar da alternância de poder na administração municipal. O programa conta com três unidades, todas utilizando a denominação “Sacolão CRAISA”, vendendo entre 40 e 50 produtos a R$ 0,79/kg. Os sacolões têm exercido também o papel de instrumento regulador dos preços desses produtos no varejo local. A maior das três unidades - onde são comercializadas 8.600t de produtos por ano - gera, no total, 141 empregos diretos (entre celetistas e empresas familiares) e R$ 1,5 milhão anuais de renda, cumprindo com mais outro objetivo além dos dois tradicionais que são o de facilitar o escoamento da produção e beneficiar os consumidores.

O estabelecimento de vínculos com pequenos produtores agrícolas da região - do chamado cinturão verde - e de outras regiões do estado vem sendo tentado através da criação de rede de compra junto a esses produtores e mediante convênios com prefeituras que implementam programas de verticalização da produção agrícola. As dificuldades nessa direção são grandes no caso de um município como S. André: após um ano e meio de esforços, passaram a ter entre 20 e 25 produtores comercializando diretamente na CRAISA. Aqui foi também feita uma nova referência ao risco do produtor abandonar a produção ao se dedicar à comercialização; detectou-se, mesmo, caso de produtor que comprou produtos na CEAGESP para revender. Está sendo implementado o programa Cortando Caminho, que pretende colocar-se como elo de ligação entre o cinturão verde e o mercado consumidor da região metropolitana. Uma feira da reforma agrária será organizada para a comercialização de produtos de assentamentos localizados no Estado de S. Paulo, rotulados com a marca “Sabor do Campo”.

Menção especial deve ser feita ao combate ao desperdício, efetuado através de um Banco de Alimentos que capta os produtos que eram considerados sobras dos três sacolões e do mercado atacadista, e que são distribuídos a 70 entidades assistenciais cadastradas na CRAISA. Em 1998, essa distribuição atingiu o montante de 500 toneladas.

&&As feiras-livres em Osasco~~As feiras-livres são um dos mais antigos equipamentos de varejo com presença generalizada no

País, que continua a desempenhar um papel importante na venda principalmente de produtos hortícolas (verduras, legumes e frutas) na maioria dos centros urbanos. Um projeto de regulamentação das feiras-livres foi implementado na cidade de Guarulhos num universo de 45 feiras semanais com 550 permissionários e uma população diretamente envolvida de cerca de 12 mil pessoas. A esse universo deve-se acrescentar 38 feiras clandestinas com 600 famílias, número que tende a aumentar nas conjunturas econômicas desfavoráveis. Trata-se de um município que também integra a Região Metropolitana da Grande São Paulo, com 1 milhão de habitantes e grande crescimento populacional (4,3% a.a.); parte desse crescimento se deve à migração de população carente da Zona Leste da cidade de São Paulo.

O diagnóstico que fundamentou o projeto identificou, de um lado, a falta de compromisso do feirante com o equipamento, acentuada pela pouca convivência entre eles em função do rodízio de feirantes conforme o dia da semana. O anterior dá origem, entre outros, ao excesso ou à falta de permissionários num dado ramo, conforme o local em que se realiza a feira. Ao lado de feirantes que são, quase todos, comerciantes profissionalizados (sob a forma de micro-empresas), encontram-se as chamadas “pontas de feira” que são, mais propriamente, expressões de comércio ambulante (que se tornou perene, e não provisório, como está no espirito da lei). Ressente-se, ainda, da ausência de estudos sobre o perfil sócio-econômico e de comportamento dos feirantes, uma categoria sujeita a uma vida intensiva em termos de exigência física e de capacidade de barganha. A falta de profissionalismo não estaria impedindo a sobrevivência das feiras-livres, o que se explicaria, segundo esse diagnóstico, pela agilidade das feiras em termos de ajuste de preços e de quantidade, como ilustrado no fato de as feiras-livres não terem um “preço pronto” (veja-se a diferença de preços entre o inicio e o fim da feira).

De outro lado, notou-se a inexistência de critérios técnicos que regulamentem esse tipo de equipamento, além do fato de a maioria dos municípios regulamentar as feiras-livres nos seus códigos de postura, que para serem mudados demandam maioria legislativa nem sempre possível de ser obtida nesse assunto. Os feirantes ainda são tratados à semelhança das bancas de revistas: a maioria dos municípios cobra deles taxa de ocupação e uso do solo, e cobra de todos igualmente, independente do tipo de atividade e do faturamento do feirante. Ressaltou-se que a atuação do poder público é tão mais importante quando se constata que ela tem sido decisiva para que a feira-livre continue cumprindo um papel importante no abastecimento dos produtos antes referidos; onde esse equipamento foi abandonado, a tendência foi ele se degradar e acabar. Prejudiciais são, também, as interrupções em face da rotatividade na chefia do departamento correspondente.

O projeto em Guarulhos teve uma primeira etapa na qual foi enfrentado um conjunto de questões referentes à forma de organização da administração municipal, sem a participação dos feirantes. Num segundo momento, foram geradas proposições de legislação debatidas com a participação do sindicato dos feirantes. As feiras-livres foram classificadas em cinco tipos, conforme o nível de poder aquisitivo e a densidade populacional das regiões onde elas se realizam, com a padronização do aspecto visual da feira, layout, etc. Estabeleceu-se o critério de que nenhum feirante entra na feira de tipo A sem antes ter passado pelas de tipo inferior. O estimulo para que o mesmo grupo de feirantes participe do mesmo equipamento permitiu constatar que onde se conseguiu criar grupos homogêneos os preços e a qualidade dos produtos são melhores, fato que tem como causa provável a maior especialização dos feirantes. Duas das feiras livres de padrão A foram recentemente transformadas em “varejão”. Como os padrões das feiras livres e dos varejões eram mais ou menos iguais, apenas foi mudada a logomarca e implantado o controle de preços próprio dos varejões. Um “varejão a céu aberto” foi organizado com a participação dos feirantes, que se cotizaram para custear a adequação do terreno (iluminação, cerca, asfaltamento, etc.)

Segundo seus organizadores, o principal problema do projeto deu-se com os fiscais municipais, o que os levou a utilizarem “orientadores de mercado” em substituição aos “funcionários de carreira”. Um outro problema localiza-se no comércio de licenças ou matrículas, sobre o qual o poder público não pode ser omisso pois são permissões em caráter precário que não devem gerar a criação do chamado “ponto comercial”. Já com relação às feiras-livres clandestinas, a mera aplicação da legislação levaria à inviabilização de todas elas, sendo preferível uma legislação mais branda, como por exemplo permitir a utilização de gelo, em lugar da frigorificação, no comércio de carnes.

&&Descentralização de Entrepostos de Abastecimento~~É parte obrigatória de uma avaliação do abastecimento alimentar abordar a esfera do atacado.

Entre os vários componentes do comércio atacadista de alimentos, deve ser dado um destaque especial à estrutura de entrepostos de abastecimento, originada em sua quase totalidade do antigo Sistema CEASA. Essa estrutura foi proposta como um dos pilares em que se assentaria a ação regulatória pública no atacado, pois contribuiria para ordenar o fluxo de bens, conferir transparência à formação de preços, e exercer os controles fiscal e da qualidade dos produtos. No entanto, há pelo menos uma década ela vem passando por mudanças fundamentais, resultantes das transformações na estrutura de produção e distribuição dos alimentos que lhe retiraram parte do seu antigo papel, e do recuo do Estado diante das funções reguladoras da atividade econômica em geral, e do abastecimento alimentar em particular, que tornou aquele sistema um conjunto de empresas descentralizadas (muitas privatizadas) que apenas prestam serviços de comercialização.

A proposta em desenvolvimento na CEASA-RS também se orienta pela perspectiva de descentralizar a gestão das estruturas públicas voltadas para o mercado atacadista de alimentos, porém, buscando recuperar sua condição de instrumento para “ocupar o espaço da regulação de mercado com vistas a favorecer os consumidores e os produtores”. Note-se que a atuação no mercado atacadista de alimentos se dá no contexto de um processo de internalização do objetivo da segurança alimentar na ação do governo estadual e da CEASA-RS, na perspectiva de construir a cidadania alimentar. Entre os pressupostos de uma política de segurança alimentar, conferem destaque à criação de indicadores de segurança alimentar, à sensibilização e mobilização dos atores sociais, e à inserção desse objetivo nos diferentes órgãos de governo. A atual gestão estadual

propõe-se a criar um Conselho Estadual de Segurança Alimentar, à semelhança do processo em curso em outros estados do País, com a participação de várias secretarias de estado e de representantes da sociedade civil.

A descentralização regional das unidades da CEASA-RS foi iniciada há 16 anos, ainda dentro do Sistema Nacional de Abastecimento Alimentar. O primeiro entreposto localizou-se no município de Caxias do Sul, mantendo-se até hoje como o mais viável dos que estão fora de Porto Alegre. Das demais unidades, duas caracterizam-se por oferecer algum potencial mas carecem de infra-estrutura (Santa Maria e Passo Fundo), e as restantes têm seu funcionamento comprometido seja pela configuração agrícola, seja pela pressão de atacadistas locais (Pelotas). Os critérios de instalação das unidades regionais foram mais políticos do que técnicos, na falsa expectativa de que a construção das instalações fortaleceria e fomentaria a produção de hortifrutigranjeiros, mesmo em regiões onde, por exemplo, o trigo e a soja constituíam a atividade predominante. Essa constatação sugere que a implantação de entrepostos regionais não se constitui em instrumento suficiente para viabilizar ou estimular a ampliação de uma base produtiva pouca expressiva, bem como a própria viabilização dos entrepostos estaria condicionada pela existência dessa base num determinado raio de ação, exceto quando a localização do equipamento junto aos grandes centros de consumo os converte em ordenadores do fluxo de mercadorias destinadas a esses centros.

O entreposto de Porto Alegre representa, hoje, 43% do volume total de hortigranjeiros comercializado no estado, percentual que já foi superior a 50% no passado. Há 5 mil produtores cadastrados nessa unidade, mas participam efetivamente apenas 600 a 800 deles, muitos dos quais, inclusive, compram de terceiros parte da produção que comercializam no entreposto. Do total comercializado no Estado, apenas 15 municípios (basicamente duas regiões) respondem por mais da metade. A proposta de descentralização atual implica em não ampliar esse percentual como forma de viabilizar a unidade instalada na capital.

O principal fator que afetou a evolução recente da estrutura de entrepostos no País foi a grande concentração ocorrida na esfera do varejo em geral, e dos alimentos em particular, com a ascensão das redes de supermercados à condição de principal local de compra da maioria dos produtos alimentares. Os supermercados não adquirem na CEASA os produtos que vendem, mas atuam com agentes que são grandes atacadistas e produtores de maior porte (mais eficientes), estando em situação melhor aqueles que combinam essas duas condições. O entreposto da CEASA enquanto mercado atacadista não é essencial para esses agentes, que se valem daquelas instalações porque lhes é mais conveniente. Segundo os gestores do entreposto, a verticalização da produção, com a venda direta aos supermercados sem que a produção passe por dentro da CEASA, não significou uma melhoria da renda apropriada pelos agricultores. Adicione-se o fato de os supermercados trabalharem com perda zero, já que todos os ônus e riscos são repassados aos produtores através do mecanismo da compra em consignação de seus produtos.

Assim, o projeto em curso na CEASA-RS não vê sentido em construir parcerias com os supermercados, mas sim em trabalhar com pequenos e médios empreendedores para que, dentre outros objetivos, consigam se organizar e efetuar compras em escala e adquiram competitividade frente aos supermercados, contribuindo desse modo para a desconcentração da renda gerada na comercialização dos produtos agro-alimentares. Esta opção não prejudicaria a agricultura familiar, já que este tipo de produtor não estaria dentro das redes de supermercados. Dados os limites para a comercialização direta do agricultor para a população (volume, regularidade e diversidade), e tendo em conta as várias formas (feiras-livres, varejões, sacolões, etc.) pelas quais os alimentos chegam aos consumidores, os entrepostos com produtores vinculados a eles deveriam ser geridos com os objetivos de reduzir a intermediação mercantil e dar transparência e condições de igualdade ao se

efetuarem as transações. Deve ser sua função, também, controlar e gerar informações sobre os

fluxos comercializados, inclusive em face da deficiência dos dados estatísticos das secretarias de estado devida à isenção de ICMS.

A proposta de descentralização tem por objetivo estabelecer parcerias com os municípios onde estão os beneficiários diretos da atuação da CEASA-RS, apostando fortemente nas modificações em nível regional e local. A começar pelo repasse em comodato da administração dos entrepostos

distribuídos pelo estado para consórcios de municípios. Elementos de organização social da produção serão introduzidos através da proposta de planejar a produção com base em estudos sobre o “fluxo alimentar” definido a partir de uma lógica da demanda-consumo, em esforço conjunto da CEASA-RS e EMATER-RS. Há alguns limites e constrangimentos legais que se interpõem à ação municipal voltada aos pequenos e médios agricultores e que têm requerido iniciativas de modificação na legislação. Um exemplo se refere à legislação relativa ao processamento agroindustrial de produtos agrícolas, pensada em termos de grandes empreendimentos. Outro exemplo diz respeito aos intentos por equiparar o serviço de inspeção municipal ao estadual (como já ocorre em Santa Catarina).

Identifica-se, ainda, a possibilidade de realizar avanços em questões importantes. Está em processo de definição a adoção de um selo de qualidade da CEASA-RS, num programa que envolverá a análise dos níveis de agrotóxicos, a normatização de embalagens, etc. Pretende-se também abrir um espaço para que a Cooperativa Colméia instale um entreposto dos produtos agro-ecológicos que comercializa. Cabe mencionar o problema associado aos resíduos gerados na comercialização: os gastos atuais para despejar resíduos orgânicos ricos no aterro sanitário chegam a atingir até R$ 150 mil mensais. A perspectiva é adotar procedimentos (em articulação com o Departamento de Limpeza Urbana de Porto Alegre e com a Fundação Internacional “Zeri” que trabalha com uma metodologia de “Resíduo Zero”) que levem a eliminar inteiramente o desperdício associado a esses resíduos. Por fim, o tema dos mercados institucionais encontra-se em fase de discussão com organizações não-governamentais de quatro regiões fundamentais por terem base de produção familiar organizada ou com um potencial muito grande e com agricultura ecológica já bem desenvolvida (Passo Fundo, região da Serra e Litoral Norte e região de Pelotas), valendo-se de lei que permite o ingresso dessas organizações para trabalhar as questões da segurança alimentar, pobreza, desenvolvimento sustentável, etc. em parceria com o governo estadual.

&&Políticas Municipais de Abastecimento em Grandes Capitais~~Nessa seção serão abordadas as políticas de abastecimento implementadas em três grandes

capitais brasileiras que são Belo Horizonte, Curitiba e Salvador. Para tanto, valemo-nos da

apresentação de informações colhidas em pesquisa recente sobre essas cidades e daquelas prestadas por representantes das secretarias municipais respectivas convidados para o painel. As duas primeiras cidades são reconhecidas pela atenção dada à problemática do abastecimento, sendo que o desenho e implementação de políticas municipais de abastecimento em Belo Horizonte data de poucos anos enquanto que em Curitiba elas têm um longo período de maturação. Já no caso de Salvador, a ação mais significativa é parte integrante de um programa de âmbito estadual. Referência tópica será feita ao caso do Rio de Janeiro como um ‘contra exemplo’.

A classificação das políticas sugerida pela pesquisa mencionada contribui para uma melhor compreensão da natureza das mesmas. Assim, as políticas são classificadas como regulatórias (utilização de espaços públicos envolvendo parcerias com comerciantes e produtores), regulatório-competitivas (entre comerciantes), compensatórias (distribuição gratuita ou subsidiada para o combate à fome e à desnutrição) e emergenciais. Interessa também destacar as diferentes formas de articulação com a sociedade civil requeridas (parcerias com agentes privados, articulação inter-institucional com ONG’s, etc.), o grau de descentralização e a abrangência dos programas.

&&Belo Horizonte~~A Secretaria Municipal de Abastecimento de Belo Horizonte foi criada apenas em 1993, contando

com os departamentos de produção (programas para diminuir a distância produtor-consumidor: ‘direto da roça’ e hortas comunitárias), de defesa e promoção do consumo alimentar (cesta básica, restaurante popular e alimentação escolar), e de gerenciamento (programas Abastecer, Comboio do Trabalhador e Cestão Popular, e o mercado municipal). A Secretaria conta com um pequeno percentual (1,2%) do orçamento municipal total, sendo que 43% desse montante origina-se de fundos federais de alimentação escolar.

O contexto inflacionário e as disparidades de preços explicam a importância assumida pelas políticas de abastecimento com natureza regulatória nessa cidade. Os dois principais programas municipais com esse perfil (Comboio e Abastecer) destacam-se pela amplitude - atendem cerca de 102 mil famílias, movimentando um volume equivalente a 4% do total de hortigranjeiros produzidos em Minas Gerais que entram para comercialização na CEASA de Belo Horizonte - e por conseguirem oferecer alimentos pela metade dos preços vigentes no varejo convencional, sem envolver a concessão de subsídios. O Abastecer vale-se de 28 equipamentos fixos que funcionam como ‘sacolões’, enquanto que o Comboio é composto de cinco unidades instaladas no centro da cidade cujos permissionários são obrigados a atender dois bairros periféricos por final de semana.

Quando os programas foram introduzidos, logrou-se uma expressiva diferença entre as margens aplicadas sobre os preços de atacado no Abastecer (50%) e no Comboio (60%) em relação à média praticada pelo comércio privado (161%). Tais índices permitem, ademais, constatar que as secretarias municipais de abastecimento oferecem uma elevada relação benefício-custo, pois a economia feita pela população ao comprar nos equipamentos públicos (multiplicando-se o referido diferencial de preços pelo número de pessoas atendidas nesses equipamentos) é equivalente ao valor da parcela do orçamento da Secretaria que é de responsabilidade da Prefeitura Municipal de Belo Horizonte. Apesar do diferencial de preços entre o atacado e o varejo ter se tornado decrescente pela estabilização da moeda e pela ação dos equipamentos públicos, a sobrevida desses programas regulatórios pode ser explicada pelo seu baixo custo, capilaridade e economias de escala.

Bastante distinto é o programa denominado “Cestão Popular”, que conta com pessoal terceirizado e incorre em elevados subsídios indireto e direto, o que o fez já nascer deficitário. Trata-se de um equipamento no qual o permissionário tem o compromisso de vender pelo menos 20 produtos a um preço único de R$ 0,35/kilo - à semelhança dos sacolões - sendo permitidas margens de comercialização maiores nos demais produtos. O programa atende apenas a famílias cadastradas e que tenham renda de até três salários-mínimos mensais; posteriormente, passou a adotar uma cota mensal de compra por família. Os custos do programa elevaram-se bastante no item gastos com pessoal, ao mesmo tempo em que verificou-se uma redução do número de atendimentos (pela queda nos gastos com alimentos) e do grau de atendimento (número de atendimentos, dividido por número de cadastrados, multiplicado por duas compras no mês, vezes doze meses). O programa é avaliado como sendo de difícil gestão e com pequena possibilidade de se autofinanciar, especialmente porque todas as compras são efetuadas diretamente pelo poder público. Identificou-se, ainda, a necessidade de uma maior focalização em termos dos beneficiários.

Por último, a instituição de um restaurante popular na zona central da cidade consistiu em uma iniciativa também de caráter compensatório, mas que pela qualidade e baixo preço das refeições nele servidas teve grande impacto no tocante às chamadas ‘refeições fora do domicílio’ realizadas naquela zona. O número de refeições (mais de 3.100 refeições-dia) ultrapassa a capacidade instalada, de modo que após 1996 elas passam a receber subsídios crescentes pois o preço cobrado por refeição (R$ 1,00) foi mantido constante, ao passo que o custo da refeição já atinge R$ 1,40 em virtude da perda dos ganhos de escala (aumento de pessoal com escala fixa). Contudo, comparando-se o restaurante popular com o ‘cestão popular’, neste último houve um aumento exorbitante de pessoal, redução do atendimento e de receita, e aumento do subsídio. Há aqui um importante tema de discussão sobre o fato de os subsídios serem apenas parcialmente repassados aos consumidores, ficando parte deles para as atividades-meio

&&Curitiba~~Com experiência há bastante tempo na área do abastecimento alimentar, a Prefeitura Municipal de

Curitiba conta com uma Secretaria Municipal que, embora seja de Agricultura e Abastecimento, está quase que inteiramente voltada a esse último. Ela é considerada uma secretaria-fim, embora englobe atividades-meio como a compra de alimentos para todas as demais atividades da Prefeitura. A queda na participação no orçamento municipal para 0,67% foi compensada pela criação de um fundo rotativo com recursos tomados junto ao BNDES. Por esse instrumento, com base em parecer de tribunal, a Secretaria pode fazer compras de um mesmo fornecedor sem estar atrelada à Lei 8.666, em volumes que chegam a superar os dos grandes supermercados. Com receitas que

atingiram R$ 5 milhões em 1998, o fundo permite realizar as compras e alguns investimentos, só não sendo utilizado para pagamento de pessoal, que é a contrapartida da Prefeitura. O crescimento desse fundo abre a possibilidade de assegurar a auto-sustentação dos programas da Secretaria.

Adotando a visão de um sistema integrado de abastecimento alimentar, desenvolvem ações de produção agrícola, distribuição (comercialização) de alimentos, orientação ao consumidor e orientação educacional. A pequena parcela dedicada à produção lida com um universo composto por apenas cerca de 400 estabelecimentos rurais classificados pela EMATER como mini-produtores, a metade dos quais são chácaras de fim-de-semana, 25% são agricultores comerciais e 25% têm cultivos de subsistência. A produção comunitária em áreas de vazio urbano é estimulada para evitar invasões e o acúmulo de lixo; há, também, o programa “Nosso Quintal” dirigido a escolas e proprietários imobiliários com o intuito de estimular hortas caseiras.

Os programas na área da comercialização de alimentos constituem-se no carro-chefe da Secretaria, com o ‘Mercadão Popular’ e o ‘Armazém da Família’. O ‘Mercadão Popular’ vale-se de ônibus adaptados que percorrem 67 pontos móveis espalhados pela periferia de Curitiba, vendendo um conjunto de gêneros de primeira necessidade e produtos de higiene e limpeza a preços em média 30% a 35% mais baratos que o valor de mercado formal. O “Armazém da Família” constitui-se de 17 unidades fixas localizadas preferencialmente em terminais de ônibus que vendem a mesma pauta de produtos do Mercadão Popular. Esses dois programas abrangem quase 100 mil famílias cadastradas, das quais 35 mil compram regularmente, gerando um total de 65 mil atendimentos-mês. Como em outros casos abordados nesse texto, os alimentos não são as únicas mercadorias neles ofertadas, correspondendo a 40 itens num total de 70 produtos, com uma venda total de 13.700t-ano e receitas crescentes nos últimos anos.

Cabe notar que houve uma queda no número de atendimentos acompanhada da elevação da quantidade comprada - portanto, aumentou a quantidade média por compra - sendo esta uma ocorrência paradoxal num contexto de estabilidade da moeda. O grau de atendimento desses programas (Armazém da Família e Mercadão Popular) em relação ao número de famílias cadastradas elevou-se de 7% em 1995 para 14% em 1997. As famílias podem ser atendidas até três vezes por mês nos Armazéns da Família e até duas vezes por semana nos Mercadões Populares.

Das demais atividades da Secretaria, cabe destacar a área de educação ambiental com um curso de aproveitamento integral dos alimentos. O programa ‘Câmbio Verde’ permite a troca de lixo reciclável por produtos hortigranjeiros, e é auto-sustentado. O restaurante popular existente na cidade foi concebido pela própria Secretaria, mas sua operação foi terceirizada. As refeições têm o preço de R$ 1,00, sendo que o lucro do permissionário vem da venda de sucos junto à refeição.

&&Salvador~~As ações públicas de abastecimento alimentar em Salvador são implementadas basicamente por

uma empresa estadual, a Empresa Baiana de Alimentação (EBAL), que maneja sete programas, seis dos quais com caráter compensatório e apenas um de tipo regulatório. Por se tratar de empresa mista, a EBAL não precisa seguir a lei das licitações, e faz compras em escala nacional sem preocupação com a produção local, à exceção da farinha de mandioca que é comprada localmente. Cerca de 80% das despesas fixas são cobertas mediante repasse do governo estadual, constatando-se um nível de subsídios de 24% do valor do faturamento em 1998, apenas parcialmente repassados para o consumidor final.

Sua principal ação constitui-se nos ‘Armazéns da EBAL’, um programa estadual sem cadastramento dos beneficiários que atende a cerca de 1 milhão de famílias numa rede de 409 unidades espalhadas pelo estado (69 na grande Salvador e 345 no interior). Todos os funcionários públicos podem comprar nessas unidades e suas despesas são cobradas na folha de pagamentos. A média de compras por família é alta (quatro vezes ao mês), porém, são compras de baixo valor. Verificou-se uma queda no número total de atendimentos, com aumento no faturamento (exceto em 1998), sendo que a razão provável para essa queda está no menor diferencial de preços em relação ao comércio privado; detalhe importante, esse diferencial é pouco significativo nos produtos básicos. A análise dos preços praticados pela EBAL revelou que a política de preços praticada não adota a perspectiva de que o equipamento atue como amortecedor das flutuações de preços, já que

estes tendem a cair mais que os do varejo privado nas conjunturas de baixa e a elevar-se mais nas conjunturas de alta.

A EBAL vende alimentos para outros órgãos do governo estadual, a exemplo da alimentação escolar, o que representa apenas 2% do total das vendas da empresa. Registra-se, ainda o programa ‘Nossa Sopa’, numa unidade vizinha à CEASA-BA onde são preparados 2.560 pratos e 300 latas de sopa por dia.

&&Rio de Janeiro~~O município do Rio de Janeiro destaca-se como um ‘contra-exemplo’ entre as capitais abordadas

por não contar com programas de abastecimento geridos por uma Secretaria Municipal dedicada a esta área, mas que dados estatísticos obtidos em fontes secundárias revelam ter sido uma das regiões metropolitanas onde a estabilização da moeda trouxe mais impactos no acesso da população aos alimentos. Dispõe de programas alimentares com natureza compensatória, implementados pela Secretaria de Desenvolvimento Social com grande articulação com organizações não-governamentais. Um deles é o programa “bolsa-escola”, implementado através de uma relação inter-institucional com o Comunidade Solidária. Na verdade, são cestas de alimentos onde foram incluídos mais produtos do que a cesta da CONAB (maior quantidade de arroz, sardinha, etc.). A Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social cobre 61% do valor da cesta - o custo unitário está em R$ 23,98 - e a União arca com os 39% restantes.

Outro programa consiste em fornecer uma “bolsa de alimentação” - cestas básicas da CONAB - para um público que não é estratificado apenas pelo nível de renda, como os tuberculosos, HIV positivos, famílias moradoras de rua, portadoras de deficiência, etc. São cerca de 20 mil cestas distribuídas mensalmente com base numa grande relação inter-institucional com organizações não-governamentais. Em 1997, a Secretaria destinou R$ 4,7 milhões (7,8% do total) do seu orçamento para a aquisição de gêneros alimentícios.

&&Mercado Institucional e Produção Local~~O chamado mercado institucional é composto das compras de alimentos realizadas pelas diversas

esferas de governo para atender às necessidades dos programas especiais (como a alimentação escolar, a distribuição de alimentos a populações carentes, etc.) e dos serviços públicos regulares (como a alimentação nos hospitais e presídios). Mecanismo importante de acesso aos alimentos no caso da população infantil com acesso à escola, as compras públicas constituem parcela significativa da demanda de produtos alimentares e têm sido geridas, tradicionalmente, de modo a favorecer a participação de médios e grandes fornecedores capazes de preencher as condições requeridas nos processos licitatórios e de concorrência. A descentralização que vem sendo implantada em vários programas públicos criou a possibilidade de redirecionar tais compras de modo não apenas a facilitar a participação de pequenos e médios fornecedores - como as associações de pequenos produtores agrícolas - mas também introduzir elementos de diversidade regional em cardápios com importância não desprezível na formação dos hábitos alimentares. Veremos que vontade e decisão políticas constituem uma condição necessária para que essas possibilidades se concretizem, assim como lograr-se um grau mínimo de organização dos agricultores a serem envolvidos.

O pequeno município de Hulha Negra (RS), com curta história de autonomia, fornece uma experiência significativa nesse sentido, a partir de iniciativas tomadas na gestão 1997/2000. Trata-se de município localizado na região da Campanha Gaúcha, na fronteira Sudoeste do Rio Grande do Sul, com cerca de 5.300 habitantes, 60% deles residindo na zona rural. Tradicional área de latifúndios, novas comunidades se formaram a partir da década de 1960, sendo que sucessivas ocupações de terra desde o final dos anos 70 deram origem a assentamentos rurais, sendo que cada um deles envolve entre 100 e 130 famílias.

O desenvolvimento de Hulha Negra, de acordo com a formulação da administração municipal, deve fundamentar-se em quatro alicerces: economia familiar; valor biológico e ambiental; processo agro-industrial (indústria caseira); cooperação e associativismo. O “projeto de desenvolvimento e inclusão social” formulado para o município tem como programa central a “agro-industrialização

popular” - com a marca “Prove da Hulha”- ao qual se articulam quatro outros programas voltados à: introdução da horticultura; melhoria da pecuária leiteira; empreendimentos alternativos em suínos, floricultura e ovinos; e implantação de distrito industrial para pequenas indústrias. Mencionou-se também um “projeto de divisão racional de terras para assentamento”.

O programa de verticalização da produção agrícola através da agro-industrialização prevê apoio à organização e atividades de capacitação dos agricultores, pesquisa e monitoramento. Ele conta ainda com um fundo rotativo municipal de crédito para a pequena agro-indústria criado por lei e regulamentado por um Conselho Municipal de Desenvolvimento Rural. O conselho, que possui poder deliberativo, libera financiamentos de até R$ 3 mil para os projetos aprovados, com um ano de carência e um ano para serem quitados. Os recursos do fundo correspondem a 2,6% da receita total do município, distribuídos em 0,8% para o FRAPEI (Fundo Rotativo de Apoio ao Pequeno Estabelecimento Industrial) e 1,8% para o FRAPER (Fundo Rotativo de Apoio ao Pequeno Estabelecimento Rural). A Prefeitura de Hulha Negra arrecada entre R$ 150-160 mil/mês, destinando cerca de 50% para pagamento de pessoal, e cerca de 19% para investimento.

O programa definiu cinco tipos possíveis de mercados para os produtos dele originados. O primeiro deles é um mercado fixo representado pela feira local, considerada como um pequeno nicho. Haverá um segundo mercado volante ainda não colocado em prática dada a restrição legal de não disporem de registro no SISPOA, mas já foi criado um serviço municipal de inspeção sanitária no início dessa gestão. O terceiro mercado a ser atingido é ocasional: são festas e eventos locais e em outros municípios da região. Uma quarta possibilidade é a central de comercialização construída na beira da rodovia federal que corta o município, incluindo câmara fria, espaço de exposição e serviços de café, sendo a forma encontrada para atingir consumidores de outras localidades sem necessidade do registro estadual dos produtos.

O quinto tipo de mercado, que nos interessa mais de perto, foi denominado de “alternativo”, constituindo-se no fornecimento para o programa de alimentação escolar do município que atende a mais de 1.300 alunos com duas refeições diárias em média, podendo chegar a quatro nos casos que vêm de mais longe da zona rural. A denominação ‘alternativo’ deve-se a que o programa não reproduz o padrão anterior de aquisições, de modo que a participação de grandes empresas está restrita a pequena fatia (2%) do total.

Para viabilizar a participação da produção familiar local criou-se uma associação com caráter comercial, a Associação dos Produtores Coloniais de Hulha Negra (APROCOHN), na qual estão representadas todas as comunidades rurais desse município. Em paralelo, a administração municipal adotou um enfoque cultural na composição das refeições oferecidas aos alunos, valorizando produtos locais ou que preservem características típicas dos hábitos daquela população, como por exemplo a chimia (um tipo de doce), cuca (um tipo de bolo), iogurte, ovos caipiras, etc. A elaboração do cardápio envolve a participação social, inclusive dos agricultores, no Conselho da Merenda Escolar. As especificações dos produtos a serem adquiridos são explicitadas nos procedimentos de compra do programa, fazendo menção à procedência da chamada produção colonial, ao valor biológico, etc. Segundo os idealizadores dessa iniciativa, a presença da chamada “colônia” garante o oferecimento de produto de boa qualidade e a agregação de valor por parte do próprio agricultor.

Ambos os procedimentos permitem que os produtores estejam legalmente habilitados para participar do processo licitatório de compras através da associação e, naturalmente, em condições de oferecer os produtos com as especificações pedidas. Mais difícil, devido a impedimentos legais, é o pretendido estabelecimento de um convênio de fornecimento entre a Prefeitura Municipal e a referida associação.

Importa registrar que esse processo tem levado à ocorrência de alguma especialização entre os agricultores para certos produtos, como são os casos dos ovos, do frango e dos ovinos em que há apenas um fornecedor para cada um deles. Nos produtos de “distribuição massiva”, há produção de queijo em todas as regiões do município, enquanto que há dois produtores de salame, porém, “localizados estrategicamente” e que entregam nas escolas. No caso dos ovinos, há um único abatedouro com capacidade produtiva superior à demanda, para o qual tentam obter registro no

SISPOA. A especialização produtiva entre os fornecedores deverá requerer mecanismos de coordenação entre os associados em face da diferenciação que pode vir a ser gerada entre eles.

A administração tem logrado reduzir o custo unitário das refeições escolares, que foi de R$ 0,22 em 1996, R$ 0,12 em 1997 e R$ 0,14 em 1998, ao mesmo tempo em que melhorou a qualidade das mesmas. Observe-se o esforço de combater o desperdício através do melhor aproveitamento dos alimentos pelas merendeiras, e de reduzir as perdas através da extensão rural junto aos produtores (via extensão). O repasse de recursos federais previstos na municipalização do programa tem sido decrescente - R$ 29 mil (1996), R$ 27 mil (1997) e R$ 24 mil (1998) - cabendo à Prefeitura complementar o montante necessário. Em 1998, os gastos totais somaram R$ 31 mil, sendo que a Prefeitura arcou com os R$ 7 mil faltantes para a compra de alimentos, fora os custos administrativos. Do total gasto nesse ano, R$ 21 mil ficaram com a APROCOM. O município também tem um custo com alimentação referente a 14 leitos do hospital municipal.

&&Compra Comunitária e Mercados Solidários~~A organização de consumidores para efetuar a compra conjunta de alimentos é freqüentemente

mencionada como parte integrante do que se considera ações públicas em âmbito local voltadas ao abastecimento alimentar. Sua existência e amplitude resultam não apenas de avanços organizativos no interior da sociedade - comunidades por local de moradia e agrupamentos por categoria social - como também de conjunturas econômicas particulares - inflação elevada, disponibilidade física insuficiente e carestia. Essa característica torna os grupos de compra de alimentos um fenômeno com presença inconstante.

A experiência relatada a seguir é a do Centro de Cooperação e Atividades Populares (CCAP), uma organização sem fins lucrativos que atua em favelas do Rio de Janeiro. Ela teve origem numa experiência de auto-abastecimento iniciada em 1985 motivada pela ausência de supermercados ou outros agentes que oferecessem bens de primeira necessidade a preços acessíveis nas proximidades dessas favelas, circunstância que acarretava um aumento do custo da alimentação dos moradores. A luta contra a fome era a principal motivação do trabalho. Contudo, a proposta do CCAP pretendeu ir além ao procurar estabelecer vínculos com a esfera produtiva a partir de noções de solidariedade com a produção agrícola de base familiar.

A proposta almejava desenvolver um sistema de comercialização alternativo valendo-se de um trabalho em parceria com padres da Igreja Católica e contando com apoio financeiro externo. No período inicial, o projeto de “comercialização direta e solidaria” chegou a envolver cerca de 300 famílias organizadas em 60 grupos de consumidores e quatro pontos de venda, no esquema do Programa de Alimentação Popular (PAP) da COBAL, que oferecia a comunidades carentes cadastradas a opção de compra de 12 produtos a preços tabelados. Os grupos solicitavam a lista de mercadorias oferecidas e faziam seus pedidos, cabendo ao CCAP responsabilizar-se pela compra e distribuição desses pedidos. O objetivo específico de fortalecer a rede de grupos de consumidores (e de intervir na cultura alimentar) foi afetado pelo fato de se valerem de grupos organizados na comunidade com objetivos de natureza cultural, artística, etc., para os quais o abastecimento popular não era prioritário. Esses grupos nutriam, ademais, a expectativa de que a margem de 5% obtida na venda dos alimentos lhes propiciasse uma renda para financiar as diversas despesas do grupo, possibilidade que dependia do volume comercializado por eles. Essa constatação levou a que fosse tentada a constituição de grupos especificamente de abastecimento. Dos grupos de consumidores criados por iniciativa do projeto, apenas dois continuaram funcionando autonomamente em relação ao mesmo.

A experiência iniciou-se com a compra direta de feijão de uma associação de agricultores do Sudoeste do Paraná, com a expectativa de poderem juntar as duas pontas (produção e consumo). Desde logo revelou-se um problema por não terem uma demanda garantida e, portanto, não poderem atingir uma escala mínima de venda. De fato, as dificuldades derivavam do desconhecimento de como funciona o mercado de grãos, da falta de capital de giro e da pouca informação sobre a existência de outros grupos de produtores. Vale mencionar que ao se colocarem a perspectiva de não trabalhar com apenas uma associação de produtores mas experimentar diferentes associações, defrontaram-se com o epíteto de “estrangeiros interessados apenas na

comercialização” em lugar de apoiar o aprofundamento do associativismo na produção. Outro elemento importante foram as diferenças socioculturais entre os produtores e os consumidores que resultaram na pouca confiabilidade das relações entre eles. Como principais pontos positivos destacam-se o não uso de produtos químicos na estocagem do feijão, e um ganho de 20% pelas famílias participantes dos grupos de compra.

Vínculos mais estreitos foram estabelecidos posteriormente pelo CCAP com a Associação Regional dos Trabalhadores Rurais da Zona da Mata (ARTR), localizada na Zona da Mata mineira, e com a Associação de Produtores Orgânicos de Bonfim, Nova Friburgo (RJ). A atuação comercial do CCAP se faz pela venda aos grupos de consumidores dos produtos adquiridos junto às duas associações. A partir dessas relações comerciais foram sendo geradas relações de outro tipo entre as entidades, que se reuniram para avaliá-las com a perspectiva de definir um processo gradativo de construção de um mercado solidário - trata-se de construir uma “economia popular de solidariedade” - tendo em conta os fatores internos (de gestão e outros) e externos às entidades, a constituição de redes, etc. À questão da consciência do produtor tratada pela ARTR e pela Associação de Produtores Orgânicos de Bonfim, somou-se a contribuição do CCAP no que se refere ao tema do mercado, perfil do consumidor, etc. A propósito, em face das novas exigências de mercado em termos de qualidade, marca, tradição e padrão regular das mercadorias, ressalta-se a importância do trabalho de introdução de uma marca com denominação controlada pela ARTR (Produtos ‘Sítio de Minas’). Segundo o CCAP, os consumidores atingidos comportam-se como os “da elite”, buscando comprar produtos de qualidade em menor tempo e com menos dinheiro.

Essa experiência de comercialização direta chegou a beneficiar cerca de 8 mil famílias de consumidores e 125 famílias de produtores rurais. Os benefícios em termos de preços (para novembro de 1997) representaram uma redução de 19,7% para os consumidores e uma elevação de 26,5% para os produtores. Contudo, no desenrolar da sua experiência, o CCAP viu-se obrigado a recorrer ao ‘mercado normal’ para a aquisição da maioria dos produtos comercializados. Houve, aí, uma dificuldade adicional para participarem nesse mercado pelo fato de serem uma organização sem fins lucrativos. Esse impedimento colocou-se inclusive no acesso ao CEASA-RJ. Segundo os dirigentes do CCAP, a definição legal das entidades sem fins lucrativos contém uma visão “filantrópica paternalista” que as impede de avançar em trabalhos como o aqui apresentado.

Outro aspecto importante derivado da experiência do CCAP é a conclusão de seus dirigentes de que a continuidade da comercialização direta e solidária depende da possibilidade de ampliar o volume comercializado, para o que pensam em utilizar o conjunto de micro-comerciantes que atuam nas favelas e em fornecer cestas-básicas a empresas. Segundo essa visão, o pequeno comerciante da favela é tão excluído quanto o assalariado, parecendo-lhes mais fácil trabalhar com uma rede de micro-comerciantes do que apenas com grupos de consumidores. Esta é também uma forma de redirecionar renda do grande varejo para o pequeno comércio.

No tocante aos aspectos da organização da entidade, seus dirigentes afirmam que, junto com os objetivos sociais maiores (como o do combate à fome), sempre buscaram a sustentabilidade e o “ponto de equilíbrio” da organização, cabendo ressaltar que o CCAP trabalha apenas com famílias que dispõem de alguma renda. Os recursos por ela gerados estão submetidos a uma gestão “popular-participativa”. A proposta é criar uma “associação em bases solidárias” que supere os atuais entraves do associativismo e do cooperativismo. Chegaram a definir um estatuto para a “cooperação livre” - uma “cooperativa mista” - mas recuaram pela percepção de que estariam forçando uma forma jurídica que ainda não era o que buscavam. De fato, ressentem-se de uma melhor discussão sobre a natureza da organização. Por fim, é de se notar que a inexistência de uma Secretaria Municipal de Abastecimento no Rio de Janeiro - fato significativo em si mesmo, como destacado em outra seção - é entendido por essas entidades como uma dificuldade, já que não dispõem de um órgão específico com quem dialogar no poder público municipal com vistas à obtenção de apoio e à implementação de parcerias.

&&III. Possibilidades e Condicionantes das Ações Locais de Abastecimento~~Nessa parte serão destacados os pontos de ordem geral extraídos das experiências apresentadas e

dos debates havidos durante o painel. São pontos considerados importantes para o objetivo do

presente projeto, qual seja, o de contribuir para o desenho e implementação de políticas e ações públicas de abastecimento alimentar em âmbito local, com um enfoque de segurança alimentar como apresentado na primeira parte do texto.

1. O primeiro ponto a chamar a atenção refere-se à adoção ainda pouco significativa da noção de segurança alimentar como objetivo nucleador dessas políticas e ações, embora ela esteja presente em casos expressivos. Trata-se de um objetivo que vai além de uma área específica de atuação dos governos e que possui conexões com diferentes aspectos da vida humana. Portanto, faz-se necessária uma compreensão abrangente da segurança alimentar, cuja efetividade depende i) da criação dos espaços institucionais adequados à articulação de iniciativas em áreas bastante diversas, e ii) da subordinação a um objetivo de natureza social das políticas e programas que o afetam direta ou indiretamente, em especial no campo econômico. Essas dificuldades são bastante evidentes no plano local (municipal ou sub-regional). Pode não ser o caso de reproduzir, em nível municipal, a institucionalidade proposta pelo Fórum Brasileiro de Segurança Alimentar e Nutricional para os planos estadual e nacional, que é a constituição de conselhos inter-setoriais de segurança alimentar nos moldes do extinto Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA). Nas localidades de menor porte, a criação de um novo conselho especificamente para o tema da segurança alimentar, provavelmente, viria a se sobrepor ao já elevado número de conselhos constituídos ou sendo propostos em outras áreas (educação, saúde, desenvolvimento rural, etc.).

2. Os órgãos públicos municipais voltados para o abastecimento alimentar, à semelhança dos estaduais, tendem a ser o local de difusão do tema da segurança alimentar no interior da administração, enquanto referência das ações voltadas para grupos sociais ou para toda a coletividade, ao lado do enfoque no estado nutricional dos indivíduos próprio dos órgãos ligados à saúde. Esse fato se explica pela centralidade da questão do abastecimento alimentar, principalmente quando ela é tomada com a amplitude sugerida na Parte I desse texto. Ocorre que, como já visto, a atribuição ao abastecimento do estatuto de objeto prioritário da ação pública é algo ainda por construir num bom número de municípios brasileiros, mesmo em vários dos mais populosos. Uma urbanização que resultou na proliferação de núcleos complexos e de grande porte deveria contribuir na direção dessa priorização, porém, aqui se reflete a orientação hegemônica no País de atribuir ao mercado (leia-se aos agentes privados) o papel de regular o abastecimento da população.

Os debates deixaram evidente a importância de haver uma Secretaria Municipal (ou Departamento) dedicada ao abastecimento alimentar. Quando tal função existe, é bastante comum encontrá-la junto à Secretaria de Agricultura, caso em que se coloca a necessidade de suplantar a concepção tradicional que entende o abastecimento com sendo principalmente um problema de ‘escoamento da produção agrícola’. Claro que tal concepção restringe o campo de ação e a possibilidade de avançar rumo à adoção da concepção de segurança alimentar referida na primeira seção desse texto. Ainda no âmbito institucional, constatou-se a necessidade de avançar na constituição de um aparato legal para as ações e programas de abastecimento que assegurem a clara definição dos objetivos e dos beneficiários, uma gestão transparente, e a sustentabilidade das mesmas.

3. A descontinuidade administrativa é particularmente sentida nos programas de abastecimento, comprometendo a efetivação dos objetivos com médio e longo prazos de maturação - via de regra, os mais relevantes - e o desejado avanço em termos da participação popular e da construção de parcerias nesses programas. Na verdade, a experiência revela que a construção de parcerias com associações, agentes privados e instituições, e o apoio popular é que têm sido um dos pilares de sustentação de projetos e programas em face da descontinuidade que resulta de mudanças periódicas de orientação na administração pública.

4. A sustentabilidade dos programas públicos de abastecimento diz respeito, também, ao aspecto do seu financiamento. Tem sido bastante valorizada a perspectiva de buscar a auto-sustentabilidade dos programas, basicamente através de mecanismos que assegurem o autofinanciamento de modo a

reduzir a dependência para com o orçamento municipal. Isto contribuiria, inclusive, para a viabilização econômica e política de uma Secretaria de Abastecimento. Embora correta e possível para alguns programas, essa perspectiva não implica negar, por principio, a concessão de subsídios públicos (como nos casos da alimentação escolar e dos restaurantes populares), cuidando para que os gastos não se destinem ao custeio de estruturas administrativas pesadas. A atual tendência em direção à maior focalização dos programas específicos em termos dos seus beneficiários também contribui para evitar a dispersão de recursos. Mesmo em termos estritamente monetários, vale reafirmar a constatação da elevada relação benefício-custo dos organismos de abastecimento quando seus custos são comparados com o ganho propiciado à população pelos impactos dos programas e equipamentos públicos sobre os preços (e a qualidade) dos alimentos neles comercializados.

5. A conexão comumente estabelecida entre o abastecimento e a produção agro-alimentar, quando traduzida para o plano da ação local, carrega um primeiro objetivo que é o de ampliar a participação da produção local no abastecimento de pequenos e médios municípios, num elenco de produtos que depende do perfil produtivo de cada localidade. Esta perspectiva pode aparecer como um componente de programas propriamente de abastecimento, e também como parte integrante dos programas prioritariamente voltados à promoção do desenvolvimento rural. Note-se que a busca de estreitar os vínculos com a produção pode estar presente também em administrações localizadas nas regiões metropolitanas, mas elas envolvem naturalmente atuar com produtores localizados em outros municípios no entorno ou em regiões mais distantes, podendo mesmo dar origem a formas de cooperação entre esses municípios.

A ênfase desses programas está colocada na criação de oportunidades de trabalho e na ampliação da renda dos agricultores e de suas famílias, ao lado da valorização dos produtos regionais diferenciados e dos ganhos com custos de transporte. Trata-se de apoiar os circuitos regionais de produção e distribuição em face dos mercados integrados nacionalmente e sob forte influência de agentes comerciais e industriais de médio e grande portes.

6. O objetivo de gerar renda na produção agrícola familiar incorporou, de forma generalizada, a perspectiva de agregar valor aos produtos dela oriundos, através do processamento agroindustrial e da incorporação de serviços a esses bens, com base em empreendimentos de pequena e média escalas. Constata-se, também, a generalização da adoção de marcas ou de selos de qualidade com vários apelos (produtos coloniais, “da roça”, da agricultura orgânica ou agro-ecológios, etc.). A maioria dos projetos nessa direção têm sido gestados localmente, embora possam (e requeiram) contar com o apoio de outras instâncias.

7. Os programas de abastecimento podem dar importante e decisiva contribuição na viabilização desses projetos, em articulação com outros instrumentos de apoio técnico e de organização, e de fiscalização. Deve-se conferir destaque especial à gestão do chamado mercado institucional, isto é, das compras governamentais, onde se constata um número crescente de iniciativas voltadas a favorecer a participação de pequenos e médios fornecedores - notadamente as associações de produtores agrícolas familiares - nos programas públicos de alimentação, dos quais sempre estiveram excluídos. Em nível municipal, são fundamentais as modificações promovidas na sistemática de compras dos programa de alimentação escolar, a exemplo do que acontece em Hulha Negra.

8. Quanto ao apoio técnico-organizativo, a ‘municipalização da agricultura’ (das estruturas de suporte a essa atividade) defronta-se com um limite dado pelo fato de os técnicos das agências públicas - como as EMATER’s, Casas de Agricultura e Secretarias Municipais de Agricultura - terem em geral uma competência restrita aos aspectos técnicos da produção agrícola e, em menor grau, da etapa de processamento. Pouco dominam sobre questões de mercado e menos ainda sobre o abastecimento. As peculiaridades do processo organizativo também não são devidamente tratadas. A participação de organizações não-governamentais é especialmente importante nesses casos.

9. Ligada à questão da qualidade dos alimentos, e refletindo um processo em curso no País de revisão da estrutura e competência dos serviços de inspeção sanitária, destacou-se que a criação de serviços municipais de inspeção contribuiria para o fortalecimento das secretarias de agricultura e poderia repercutir na constituição de secretarias de abastecimento. Há que registrar a controvérsia acerca da compreensão vigente de que a defesa sanitária é (deve ser) uma competência do Governo do Estado. Argumentou-se que a municipalização do serviço de inspeção - desde que disponha obviamente das condições para operar - e sua equiparação ao serviço estadual quanto à validade dos certificados emitidos, resultaria num serviço mais qualificado e numa estrutura menor e mais ágil em relação à atual.

10. A conexão entre o abastecimento e a produção agro-alimentar reflete também uma estratégia de “juntar as duas pontas”, quais sejam, os produtores agrícolas e os consumidores. Apesar dos ganhos que ambos podem auferir com a venda direta do produtor ao consumidor, nas oportunidades em que ela pode se realizar, é de notar o crescente reconhecimento do papel que cumpre a intermediação comercial, em particular, para dar regularidade às compras dos produtos dos agricultores e à oferta desses bens aos consumidores. Mais notável ainda é a preocupação manifestada de evitar que produtores agrícolas se tornem comerciantes. Naturalmente coloca-se a questão de como a intermediação desempenha aquele papel e quais instrumentos regulatórios devem estar disponíveis para evitar que os interesses comerciais se sobreponham aos de produtores e consumidores.

11. Cabe uma referência à esfera do atacado, em particular, a um tradicional instrumento das

políticas de abastecimento que são os entrepostos originários do antigo Sistema CEASA. Há um quase consenso quanto à ‘falência’ (para alguns irreversível) desses equipamentos, principalmente por eles não terem ido muito além da condição de meros espaços físicos administrados pelo poder público, e em face da diminuição de seu peso como resultado das transformações havidas nas cadeias agro-alimentares e da ascensão das grandes redes de supermercados. A preservação dos entrepostos como instrumento de monitoramento do fluxo de mercadorias e mesmo de regulação do comércio atacadista supõe que os requisitos de eficiência e de descentralização administrativa e regional não se resumam à introdução de gestões privadas preocupadas apenas com a racionalização e redução dos custos do equipamento em si, e não com suas repercussões no abastecimento. Uma aproximação entre a gestão dos entrepostos e os organismos municipais de abastecimento seria inevitável, tanto individualmente nos casos dos municípios de maior porte, como na promoção de articulações regionais e estaduais.

12. Em quase todos os pontos abordados anteriormente há uma questão subjacente que se refere ao papel atribuído ao mercado no abastecimento alimentar, tema pouco discutido fora do enfoque liberalizante convencional. A ótica aqui adotada supõe que o funcionamento do mercado de produtos agro-alimentares deve ser objeto de regulação pública, e sugere que o poder público invista no fortalecimento dos pequenos e médios empreendimentos - chamados por alguns de ‘empreendedores sociais’ - com vistas a promover um modelo de desenvolvimento socialmente justo. A perspectiva de estabelecer parcerias com o pequeno comércio de alimentos em suas várias formas está presente em programas e ações locais de abastecimento - por exemplo, nos equipamentos públicos como varejões, sacolões e feiras-livres, e em grupos de compras comunitárias. Chama a atenção o papel dos serviços de abastecimento, de gerar ocupação para um número considerável de pessoas.

13. Nesse texto tratou-se de formas e instrumentos em que a regulação pública pode ser posta em prática nos mercados locais, mesmo reconhecendo os limites das ações regulatórias nesse nível. Como se sabe, os agentes comerciais e industriais de médio e grande porte organizados em redes ou cadeias integradas têm peso crescente e dominante no abastecimento de boa parte dos produtos alimentares. Os atores sociais aqui considerados - administrações municipais e ONG’s - pouco

podem fazer diretamente sobre essas cadeias produtivo-comerciais, sendo que, em certas circunstâncias, assiste-se a um embate entre o poder regulatório público e o privado. No entanto, foram mencionados vários casos que comprovam a existência de impactos reais dos equipamentos públicos sobre o varejo privado, como nos preços dos produtos hortifrutícolas praticados pelas redes de supermercados.

14. Os espaços institucionais em que são construídas as formas de regulação dos mercados e de concertação social no tocante ao abastecimento alimentar (e à segurança alimentar) em nível local são necessariamente múltiplos, porém nem sempre bem delineados. A regulação pública se faz com a participação decisiva mas não exclusiva dos organismos governamentais. As iniciativas nessa direção podem ter origem tanto em órgãos de governo como em organizações da sociedade civil ligadas principalmente aos produtores agrícolas e ao pequeno comércio (permissionários de equipamentos públicos); em menor grau participam os consumidores (cuja aglutinação é mais difícil) e os beneficiários de programas como a alimentação escolar (conselhos escolares) e restaurantes populares (associação de usuários).

15. As políticas e ações públicas de abastecimento em tempos de crise econômica e em sociedades com elevada heterogenidade social como a brasileira apresentam certas características peculiares. Elas requerem uma atenção especial à capacidade de acesso aos alimentos por um significativo segmento da população afetado pela precarização das condições (das relações) de trabalho e pela insuficiência de renda. A adoção de programas compensatórios tende a ganhar importância e contém o risco de se limitarem a essa função, ao lado de outras políticas que atendem os que estão minimamente integrados ao mercado. A perspectiva de incluir, organizadamente, os atuais excluídos requer a maior focalização das políticas e a adoção, entre outros, do instrumento do cadastramento como forma de envolvimento dos beneficiários nos próprios programas.

16. Por fim, os debates reafirmaram a importância de que as políticas de abastecimento, mesmo

em nível municipal, pautem-se pelo enfoque de um sistema integrado de abastecimento, tão mais diversificado quanto mais complexa a constituição do município em questão. Essa compreensão vem sendo prejudicada pela falta de debate sobre o tema do abastecimento alimentar no Brasil. A ausência de fóruns permanentes de discussão e intercâmbio é mais sentida num contexto em que, apesar da conjuntura desfavorável no País, reconhece-se que a área de abastecimento alimentar tem apresentado avanços tanto conceituais quanto em termos de resultados gerados.

&&ANEXO 2 ~~&&FICHAS­RESUMO DAS EXPERIÊNCIAS APRESENTADAS~~

&&1. PROGRAMA DE ABASTECIMENTO DO MUNCÍPIO DE HULHA NEGRA – RS ­ Conexão entre a produção local e o abastecimento para merenda escolar~~

Experiência apresentada por Fernando Campani, prefeito de Hulha Negra­RS.

&&Introdução~~O município de Hulha Negra está situado na região sudoeste do Rio Grande do Sul, possui uma

área de aproximadamente 1.000 quilômetros quadrados e 5 mil habitantes (IBGE).O município não acompanhou o mesmo modelo de desenvolvimento de outras cidades da região,

tais como Bagé, Dom Pedrito, Lavras do Sul, Candiota e Piratini. Esta característica se deve à história da colonização durante o século XIX restrita numa região às ocupações principalmente de povos portugueses e espanhóis que ocupavam e exploravam extensivamente os campos da região nas chamadas fazendas e estâncias. No início do século XX, porém, migraram para a região, que hoje se constitui o município de Hulha Negra, centenas de alemães oriundos de outras regiões do

Rio Grande, e migrantes de outros países da Europa. Esta ocupação se desenvolveu de tempos em tempos nas décadas de 30, 60, 70, 80 e, por último, no ano de 1997, quando 120 famílias de agricultores sem-terra foram assentados numa fazenda improdutiva com 3 mil hectares que havia sido desapropriada pelo INCRA. Forma-se então um mosaico sociocultural no município, estabelecendo uma matriz econômica baseada na produção agropecuária de pequenas propriedades e potencializando a multiplicação de experiências agro-industriais de pequeno porte e, mais especificamente, a indústria caseira colonial.

1.1.  Origem do programaA administração municipal de Hulha Negra, após diagnosticar este potencial produtivo e

mercadológico, desencadeou um programa central para incrementar e qualificar a produção agropecuária da pequena propriedade, o processamento industrial (caseiro) e a inserção competitiva em diferentes nichos do mercado regional. A estratégia do programa se alicerçou em três eixos: a) capacitação e organização; b) crédito e extensão rural; c) mercado.

O programa de merenda escolar está inserido neste propósito de dinamização do comércio local e regional.

1.2.  Objetivos e ações previstas e realizadasAs ações do programa obedeceram inicialmente a um cronograma que priorizou o primeiro eixo

fundamental: treinar e organizar o público-piloto. Foram desenvolvidos vários cursos de aperfeiçoamento do processo industrial e, simultaneamente, o apoio às iniciativas associativas dos pequenos agricultores, bem como criação de organizações competentes para viabilizar as relações de cooperação e garantia de negócios em vista.

Foi iniciada em 1998 a viabilização de micro-créditos às iniciativas agro-industriais de pequeno porte.

O público a ser contemplado prioritariamente com crédito são as organizações associativas incluídas nos programas de capacitação e treinamento. Começamos a tratar o programa como um plano de negócio para nossos pequenos empresários. Acreditamos na possibilidade de fixar os produtos no imaginário do consumidor e, para isso, criamos a marca “Da Hulha”, que passará a expressar e representar todas as virtudes dos nossos produtos sem esquecer o enfoque na cidade de Hulha Negra.

Dedicamos um profissional para fazer a assistência técnica da “porteira para fora”, orientando os produtores a trabalhar o produto nos pontos de venda, sob vários aspectos, tais como apresentação do produto, embalagens, higiene, apresentação pessoal, garantindo, entre outras ações, a fixação da marca “Da Hulha” no mercado.

Ainda no que se refere aos serviços de apoio, chamamos atenção para o Serviço de Inspeção Municipal (SIM) que realiza a inspeção sanitária dos produtos de origem animal. Este procedimento gera uma demanda significativa uma vez que o trabalho é realizado pelo técnico responsável, que vai de casa em casa.

O terceiro eixo fundamental do programa denominamos “Ações Integrais para o Mercado”. Assim o entendemos pois desencadeamos várias frentes que possibilitam o escoamento do produto. São elas:

a) Feira Fixa: é uma experiência que procura garantir a circulação interna da produção, funcionando uma vez por semana na avenida principal da cidade de Hulha Negra.b) Feiras Eventuais: ocorrem nas principais festividades culturais da região, tais como exposições, festas populares e outras.c) Feira Móvel: a idéia baseia-se na montagem de um ônibus para circular nas principais cidades da região, levando a marca “Da Hulha” junto aos diversos produtos da colônia hulhanegrense. É a meta para o ano de 1999.

d) Central de Comercialização “Da Hulha”: é um grande ponto de venda às margens da BR293, construída para abocanhar os consumidores em trânsito na direção sul/sudoeste do estado do Rio Grande do Sul.e) Merenda Escolar: a estratégia do abastecimento alimentar para as escolas do município se desenvolveu a partir da organização de uma associação de produtores incluídos no programa de agro-industrialização, a APROCOHN (Associação dos Produtores Coloniais de Hulha Negra). Esta entidade possui um caráter comercial e os seus associados trabalham em diferentes localidades do município elaborando diversos produtos. Alguns produtores são especialistas num determinado alimento, como é o caso da rapadura-de-leite, cucas e ovos. Para os demais produtores, a distribuição é dividida levando em conta principalmente a proximidade geográfica entre produtores e as escolas.

1.3. Marco InstitucionalO Trabalho é executado pela Prefeitura Municipal, em colaboração com a EMATER (Empresa

Estadual de Assistência Técnica e Extensão Rural), Serviço Inspeção Sanitária Municipal (SIM) e empresas de assistência técnica comercial privadas. A extensão rural (EMATER), o Serviço de Inspeção Sanitária (SIM) e a extensão comercial (assistência técnica) são organizações integradas com enfoques diferenciados, porém com objetivos comuns. Estas operam sistematicamente para viabilizar o abastecimento local e regional com os produtos da marca “Da Hulha”.

1.4. Previsão e Execução OrçamentáriaOs recursos vêm do orçamento municipal. A prefeitura utiliza 19% do orçamento para

investimento.

1.5. Avaliação dos ResultadosOs programas são recentes, tendo sido iniciados em 1998, quando a atual administração municipal

assumiu, imprimindo um governo democrático e popular, através da organização de conselhos municipais de base.

No que tange especificamente ao programa de merenda escolar, trata-se de um mercado alternativo que iniciamos em 1998 que já apresenta uma repercussão qualitativa expressiva. Além de representar uma alternativa de mercado para os produtores do programa, garantimos o consumo de alimentos da própria localidade. Destacamos este aspecto porque ainda é convencional, na maioria dos municípios brasileiros, o fornecimento de enlatados de origem distante do consumo.

&&2. PROGRAMA DE MERCADOS E FEIRAS DE PRODUTOR – Companhia Regional de Abastecimento Integrado de Santo André­SP (CRAISA)~~

Experiência apresentada por Elidil Einstein, José Lourenço Pechtoll e Temístocles Cristófaro 

2.1.  Origem do ProgramaEm 1972, teve início, em Santo André-SP, a construção do mercado atacadista localizado na

Avenida Estados Unidos, 2.195, considerado na época como um “elefante branco”.Em 1984, através de comodato, a Companhia Brasileira de Alimentação (COBAL) assumiu a

administração e a operacionalização do empreendimento, inaugurando, em novembro de 1985, a CEASA Santo André, mercado atacadista.

Em 1988, foi revogado o comodato e a administração da CEASA voltou às mãos da Prefeitura Municipal de Santo André. Até então, as atividades da COBAL compreendiam apenas o mercado atacadista e o varejão ao lado da CEASA.

Em 1989 foi criada a Coordenadoria de Abastecimento.Em 1990, através de Lei Municipal, foi criada a empresa pública de abastecimento, CRAISA.

Com a transformação da CRAISA em empresa pública, outros setores municipais passaram a fazer parte das atividades, como a merenda escolar, as feiras livres, etc.

2.2  Objetivos e Ações Previstas e Realizadas2.2.1 Supervisão de Mercado

O mercado atacadista da CRAISA funciona desde novembro de 1985, com aproximadamente 3.500 metros quadrados. Possui 70 permissionários, sendo que 12 são produtores e, destes, oito são verdureiros. No total, são comercializadas em média, 140 mil toneladas de hortifrutigranjeiros ao ano. Com estes números, o mercado atacadista em Santo André está classificado entre as principais CEASAS do País, em produtividade e volume de comercialização por metro quadrado. Em quantidade total comercializada no Estado, é superada apenas pela CEAGESP, CEASA de Campinas e CEASA de Ribeirão Preto.

Os locais de origem dos produtos são, nesta ordem: CEAGESP – ETSP, Cantareira, Cinturão Verde (Mogi, Suzano, Biritiba-Mirim, etc.), interior do estado e outros estados.

2.2.2 Supervisão de Merenda EscolarA Supervisão de Merenda Escolar vem desenvolvendo um trabalho de distribuição de merenda

para 92 escolas estaduais, 41 municipais, 12 creches, 25 entidades assistenciais e duas EMIAs (Escola Municipal de Iniciação Artística). Mensalmente são servidas mais de dois milhões de merendas, com entrada de mais de 435 toneladas de produtos não industrializados, sendo mais de 340 toneladas de hortifruti.

Há nutricionistas que acompanham os trabalhos, desde a elaboração do cardápio até o preparo e distribuição nas escolas.

2.2.3 Supervisão de RestaurantesA Supervisão de Restaurantes é responsável por mais de 87 mil refeições, servidas mensalmente

em três restaurantes e dois refeitórios, ou através de sistema de marmitex ou a granel. O consumo mensal de produtos não industrializados por parte da Supervisão é de aproximadamente 110 toneladas.

Todo o preparo é acompanhado por nutricionistas e funcionários especializados.

2.2.4 Supervisão de AbastecimentoA Supervisão de Abastecimento é responsável pelas áreas:

a) Comércio de Ambulantes: com aproximadamente 1.195 ambulantes cadastrados;b) Feiras Livres: com 62 feiras livres semanais, com aproximadamente 1.165 feirantes;c) Coordenadoria de Programas: com três sacolões públicos (comercialização total média semanal

de mais de 320 mil quilos, sendo mais de 288 mil quilos de hortifruti), um sacolão volante e Campanhas Temporárias alocadas nos espaços públicos.

2.3 Marco Institucional

2.4 Previsão e Execução Orçamentária

2.5 Avaliação dos ResultadosA CRAISA gerencia três sacolões públicos em Santo André, que comercializam, juntos, 320.371

quilos por semana. Dentre as funções dos sacolões/CRAISA, uma das que mais se destaca é a de regulador de preço do comércio local.

&&3. PROGRAMA DE APOIO À COMERCIALIZAÇÃO E ABASTECIMENTO LOCAL – desenvolvido pela Associação de Apoio às Comunidades do Campo (AACC), de Natal­RN ~~

Experiência apresentada por César José de Oliveira, Eng. Agrônomo da AACC

IntroduçãoA Associação de Apoio às Comunidades do Campo (AACC) é uma organização não governamental, sem fins lucrativos que tem a missão institucional de contribuir para o desenvolvimento sustentável do meio rural do Nordeste do Brasil, fomentando a ação dos atores sociais locais na busca de viver dignamente todas as dimensões da cidadania: ética, social, cultural, econômica, institucional, política, produtiva e ambiental. Sua atuação prioritária se dá em assentamentos rurais do estado do Rio Grande do Norte.

3.1  Origem do Programa

3.2  Objetivos e ações previstas e realizadasA atuação da AACC se dá em três momentos diferenciados: a) o primeiro momento busca

viabilizar a infra-estrutura de convivência com a seca (água para consumo humano e animal, e posteriormente para irrigação; viabilização da produção de alimentos para subsistência – auto-consumo); b) no segundo momento, além da produção de subsistência, a assessoria técnica procura adicionar o “processo de incubadora”, que significa a introdução de outras culturas de valor comercial não tradicionais na região (abacaxi, cajueiro anão precoce e outras frutas irrigadas); c) o terceiro momento tenta avançar na construção do sistema produtivo de duas maneiras: uma delas introduzindo o elemento “produção animal” no sistema; a outra procura integrar verticalmente a produção de diversos produtos (farinha, leite pasteurizado, queijo, castanha de caju, aguardente e derivados do processamento da cana, etc.).

A comercialização se dá em supermercados locais, mercado institucional local (governo do Estado) e também através de intermediários.(Quadros 1 e 2).

3.3 Marco Institucional

3.4 Previsão e Execução Orçamentária

3.5 Avaliação dos ResultadosA cooperativa dos assentados entregava a produção para intermediários levarem aos CEASA

(RN) e CEAGESP. Esta experiência foi frustrada no momento em que foram perdidos 15 caminhões de abacaxi comercializados na CEAGESP através de um intermediário que não honrou o pagamento de um cheque pré-datado.

Atualmente, possuem um box na CEASA (RN) onde há várias lojas.Recentemente a cooperativa perdeu a concorrência na comercialização da farinha para o

supermercado, por fornecer farinha comprada de terceiros sem o devido controle de qualidade.

&&4. PLANO DE DESCENTRALIZAÇÃO DOS ENTREPOSTOS DE ABASTECIMENTO ­ CEASA/RS~~

Experiência apresentada por Silvio Porto, diretor da CEASA/RS

IntroduçãoO Plano de Descentralização dos Entrepostos de Abastecimento é um dos eixos de ação do

Programa Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional do Rio Grande do Sul. Os pressupostos desse programa são: a) criar indicadores de segurança alimentar que possibilitem avaliar as condições da população

urbana e rural, como por exemplo, a avaliação da condição nutricional da população do Rio Grande do Sul;

b) sensibilizar e mobilizar os diferentes atores sociais, buscando promover uma gestão participativa do referido programa;

c) garantir a participação dos diferentes órgãos de governo que poderão facilitar a implementação das ações nessa área, tais como: Saúde, Educação, Trabalho, Segurança Pública, Administração, Secretaria de Governo e Escritório da Primeira Dama;

d) criar o Conselho Estadual de Segurança Alimentar e Nutricional para viabilizar a implementação do programa.

A CEASA é um dos poucos instrumentos que restaram do processo de desmonte da estrutura pública brasileira e gaúcha nos últimos 15 anos. Há muito este equipamento de abastecimento se resume à ação imobiliária, não cumprindo seu papel estratégico no mercado de alimentos, principalmente no que se refere aos hortigranjeiros.

4.1 Origem do ProgramaO Programa teve duas origens: a primeira com a CEASA Caxias do Sul, há 16 anos, quando o

sistema era gerido pela antiga COBAL. A segunda origem foi nos anos de 1991 a 1994, iniciando por Passo Fundo (a pedido do prefeito municipal), Santo Ângelo e Ijuí, a pedido dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento (COREDES). O entreposto de Santa Maria justificou-se pela sua localização central no estado e Pelotas pela concentração populacional.

4. 2 Objetivos e  AçõesO objetivo principal era regionalizar as ações de abastecimento, como parte de um Plano

integrado com Macrozoneamento Agro-ecológico e Econômico (1994), além de solidificar os Programas de Produção Programada. Para tanto, foi realizado um Censo da Produção e Varejo em todo o Estado, já em 1995 e 1996.

4. 3 Marco InstitucionalAs obras foram concluídas em 1995 e até 1998 entregues aos Condomínios Regionais (composto

pelos municípios próximos às sedes, exceto Pelotas, onde a experiência fracassou em poucos meses).

4.4 Previsão e Execução OrçamentáriaNão há.

4. 5 Avaliação de Resultadosa) Caxias do Sul: apesar da proximidade com Porto Alegre, a CEASA Regional está cumprindo

sua função como abastecedora, necessitando com urgência sua duplicação (hoje com 3.700 metros

quadrados de área construída). Falta de estacionamento. Notou-se um extraordinário

desenvolvimento na área produtiva que, além de abastecer a região, participa com 10% do abastecimento do Estado. Exporta também para outros estados.

b) Passo Fundo: é uma região de produção de grãos onde a CEASA não consegue se solidificar. O prédio virou depósito dos atacadistas que comercializam na cidade. Praticamente não há participação de produtores. É uma região com grandes cooperativas, principalmente de trigo e soja, de atacadistas fortes e berço de uma das maiores redes de supermercados do Rio Grande do Sul.

c) Ijuí: a unidade de abastecimento encontra-se fechada. Também pertence à zona produtora de grãos, de forte cooperativismo. Está situada muito próxima à CEASA de Santo Ângelo e de poucos consumidores. Entre as duas, somente uma se viabilizaria.

d) Santo Ângelo: situada em região também produtora de grãos, com presença de forte cooperativismo, de densidade demográfica média e atacadistas muito fortes. Devido à proximidade com Santa Rosa e a participação dos produtores das duas regiões (Ijuí), ela tende a se viabilizar. Três fatores têm afetado o andamento da mesma. O primeiro é o pequeno mix de produtos; o segundo é a falta de fiscalização do mercado paralelo e a pressão dos atacadistas tradicionais para que ela não vingue. Esta última observação também serve para as demais unidades, exceto Caxias do Sul.

e) Santa Maria: É uma região mista de criação de gado e agricultura. Tem grande potencial, principalmente pela localização geográfica (centro do Estado), mas sofre os mesmos problemas de Santo Ângelo.

f) Pelotas: A tentativa feita em 1991 e 1992 foi frustrada também em função da pressão atacadista e má localização do prédio. Pelotas, juntamente com Rio Grande, viabilizariam uma CEASA em termos de consumidores além de serem grandes produtores, juntamente com vários municípios vizinhos como Canguçu, Morro Redondo, São Lourenço e São José do Norte.

Ressaltamos alguns fatores que influenciaram na comercialização das CEASAS: globalização; facilidade de comunicação entre as regiões produtoras e atacadistas; relação preço do frete e o preço da mercadoria; substituição dos canais existentes com vantagens; forte influência dos supermercados no abastecimento do Rio Grande do Sul (acima de 80%); falta de política agrícola e agrária.

&&5. PROGRAMA DE VAREJÕES MUNICIPAIS DE PIRACICABA­SP~~

Experiência apresentada por Francisco E. Guastali, Diretor do Departamento de Abastecimento da Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento – SEMA. Ficha­resumo elaborada por José Otávio Machado 

Menten (Secretário Muncipal de Agricultura e Abastecimento de Piracicaba) e Francisco E. Guastali.

5.1  Origem do ProgramaAs ações da Prefeitura do Município de Piracicaba-SP no abastecimento de gêneros alimentícios

da população foram iniciados em 1887, com a implantação do Mercado Municipal. Em 1923 foram criadas as Feiras Livres. Estes equipamentos já tinham por objetivo o escoamento da produção agrícola do município e o fornecimento de gêneros alimentícios e de primeira necessidade à população. Apenas em 1953 é que as Feiras Livres foram regulamentadas (lei 385/53).

Em 1981 foram implantados os varejões que já funcionavam no Município de São Paulo.As principais razões desta decisão foram: Mercado Municipal com limitação física, feiras livres

apresentando sinais de decadência, preços abusivos no mercado privado e produção local de verduras necessitando de espaço para distribuição. Os varejões foram regulamentados em 1983 com a implantação do Plano Municipal de Abastecimento.

O maior envolvimento do Poder Público Municipal com a comercialização de gêneros alimentícios levou à transformação, em 1984, da SEMOSER (Secretaria Municipal de Obras e Serviços Rurais) em SEMA (Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento). Em 1985 foi criado o Departamento de Abastecimento na SEMA, estruturando melhor os serviços executados.

Na última reformulação da legislação, que disciplina as atribuições da SEMA, realizada em 1991, através do Decreto 5592/91, constam como relevantes: formulação da política de abastecimento municipal, administração e fiscalização dos equipamentos e fornecimento de informações sobre preços e produtos. Desta forma, a SEMA tem, atualmente, como atribuições básicas, além do abastecimento, o aperfeiçoamento e manutenção de infra-estrutura rural e o desenvolvimento rural.

5.2  Objetivos e ações previstas e realizadas

Os varejões Municipais, criados em Piracicaba em 1981, têm três objetivos básicos: criar espaço para a comercialização direta dos produtos dos produtores rurais, aperfeiçoar a distribuição à população e mudar hábitos alimentares para incentivar o consumo de diversos gêneros alimentícios e promover uma ação reguladora (preço e qualidade) no mercado. A atividade é disciplinada através de um regulamento, que estabelece os direitos e deveres da Prefeitura Municipal e dos permissionários. No início, 80% dos permissionários eram produtores rurais e apenas 20% comerciantes.

Para atender a demanda (atendimento de aproximadamente 45 mil pessoas), existem 20 varejões municipais, dentre eles, 11 são classificados como “fixos” (funcionam em galpão e existe mais que uma banca de cada produto). Estão distribuídos por toda a zona urbana do município, privilegiando

a periferia. Participam dos varejões 130 permissionários, sendo que 30% são produtores, especialmente de hortaliças de folhas (verduras) e 16% são produtores e comerciantes (em Piracicaba existem cerca de 70 hortas comerciais). Os demais 54% dos permissionários são comerciantes, obtendo seus produtos nos CEASA de Piracicaba e Campinas, mercado atacadista regional ou diretamente de grandes produtores (produtos da época). Estima-se que sejam produzidos em Piracicaba apenas 3% dos gêneros alimentícios comercializados nos varejões (principalmente verduras).

Os permissionários dos varejões municipais não contribuem com qualquer taxa à prefeitura. Os que são comerciantes têm que arcar com as taxas normais (ICMS, SIMPLES, taxa de Poder de Polícia e INSS). Os permissionários são representados pela APEVAP (Associação dos Permissionários dos Varejões de Piracicaba).

O usuários dos varejões municipais são principalmente das faixas etárias 40-59 anos (41%) e 20-39 anos (39%), que pertencem às famílias com quatro pessoas (55%) distribuídas por todas as classes sociais.

É objetivo atual da prefeitura do município de Piracicaba aumentar a produção de hortifrutigranjeiros na região. Para isto, estão sendo realizadas ações para ampliar, tecnificar e diversificar a atividade dos atuais produtores e incluir novos proprietários no sistema. As ações incluem a educação rural, cursos de qualificação e re-qualificação, disponibilidade da Patrulha Agrícola Municipal a preços subsidiados, busca de financiamentos agrícolas com juros subsidiados, etc.

5.3 Marco InstitucionalO Programa é executado pela Secretaria Municipal de Agricultura e Abastecimento de Piracicaba,

através do Departamento de Abastecimento.

5.4 Previsão e Execução Orçamentária

5.5 Avaliação dos ResultadosDurante seus 17 anos de existência, os varejões municipais sofreram diversas oscilações e

modificações. A quantidade comercializada em 1982 foi de 721 toneladas, atingindo um máximo, em 1988, de 8.088 toneladas. De 1988 em diante, vem oscilando entre 7.458 e 5.086 toneladas/ano. As razões incluem as condições de mercado e maiores investimentos da iniciativa privada (supermercados, a partir de 1989 e sacolões varejões particulares, a partir de 1992). Os varejões também se modificaram, oferecendo maior diversidade de produtos aos consumidores, incorporando bancas de carnes bovinas e de aves, peixes, pães, salgados e doces artesanais, utilidades domésticas, flores e hortaliças minimamente processadas.

Entretanto, os varejões municipais continuam cumprindo o seu papel de colocar à disposição da população principalmente frutas (56%), verduras e legumes (32%), cereais e tubérculos (8%), com qualidade e preços fiscalizados (até 20% abaixo do praticado no comércio privado), estimulando mudanças positivas nos hábitos alimentares. Atualmente os varejões fazem parte de um complexa rede de comercialização, envolvendo 91 supermercados e hipermercados, 165 sacolões quitandas e frutarias, 594 mercearias e empórios e 57 cerealistas, além de 170 hortas urbanas e cerca de 800 ambulantes de produtos alimentícios. Estimulando-se o consumo médio de 300g/pessoa/dia de frutas, verduras, legumes, cereais e tubérculos, em Piracicaba se consome cerca de 33 mil toneladas/ano. Como nos varejões se comercializa cerca de 6 mil toneladas/ano, estes representam 18% de consumo municipal, indicando que cerca de 45 mil cidadãos piracicabanos obtêm seus gêneros alimentícios nos varejões municipais.

&&6. PROJETO DE MODERNIZAÇÃO DAS FEIRAS LIVRES ~~

Experiência apresentada por José Roberto Escórcio, engenheiro Agrônomo (consultor).

Introdução Define-se Feira Livre como “um equipamento de instalação provisória em vias e logradouros

públicos, com periodicidade determinada, operado pela iniciativa privada, sob permissão pública e destinado à venda de gêneros alimentícios e utilidades de uso pessoal e doméstico, em conjuntos de bancas, barracas, ou ainda, dependendo do produto comercializado, em veículos motorizados”.

A Feira Livre, apesar de ser um equipamento precário do ponto de vista sanitário e ineficiente do ponto de vista econômico-financeiro, se comparado aos equipamentos contemporâneos (varejão, sacolão, etc.), continua sendo o principal equipamento público de comercialização varejista, pois está enraizado no hábito cotidiano da população.

Consciente da importância sócio-econômica desse equipamento no abastecimento para a população dos municípios, desenvolvemos o “Projeto de Modernização das Feiras Livres” com o objetivo de aumentar sua eficiência através da introdução de modernos métodos de gestão pública, resgatando assim o papel normalizador e disciplinador do município para as atividades econômicas desenvolvidas sob permissão pública.

6.1 Origem do ProgramaEsta proposta está baseada em experiências por mim vivenciadas, em trabalhos de consultoria

realizados junto a diversas Administrações Municipais e especialmente no Município de Guarulhos.A grande maioria das Feiras Livres existentes nos municípios não contaram com nenhum

planejamento, por ocasião de sua implantação.A inexistência de critérios técnicos favorece a consolidação de um conjunto de características que

limitam o cumprimento do papel das feiras livres enquanto equipamento público de comercialização varejista. Destacam-se:

- Falta de compromisso dos permissionários com o equipamento.- Excesso ou falta de permissionários por feira.- Monopólio da exploração de determinados ramos de atividade e de tipo de feira.- Inadequação dos equipamentos utilizados (números de tabuleiros, tamanho das bancas, veículos,

frigorificação, etc.).- Falta de padronização da comunicação visual e layout inadequado.- Não uso de uniformes.- Não cumprimento dos critérios higiênicos e sanitários.- Reação corporativa dos permissionários, contrários a quaisquer mudanças, mesmo àquelas

aceitas pelas suas lideranças, provocada pela inexistência de mecanismos formais de relacionamento com o poder público.

- Ineficiência da intervenção pública, quanto ao gerenciamento e fiscalização, devido às deficiências de legislação e infra-estrutura.

Diante desta diversidade de problemas normalmente encontrados, elegemos um conjunto de ações que merecem encaminhamento prioritário.

6.2 Objetivos e Ações Previstas e Realizadas6.2.1 Reformulação da LegislaçãoJustificativa

A maioria da legislação municipal que disciplina este tipo de equipamento apresenta um conjunto de limitações.

Considerando as características distintas existentes no espaço geográfico municipal, tais como poder aquisitivo da população e densidade demográfica, as quais determinam as escalas de comercialização, torna-se necessário o estabelecimento de novos critérios, tanto para classificação dos pontos de atendimento, como para seleção e lotação dos permissionários.

Os parâmetros, no que se refere ao disciplinamento dos aspectos de ocupação física do equipamento, tais como layout, dimensão e padronização das bancas, barracas e veículos são precários.

Estas deficiências provocam uma ocupação física aleatória das vias e logradouros públicos, causando problemas aos usuários do equipamento e ao comércio e residências existentes no entorno do ponto de atendimento, além de proporcionar um aspecto visual desconfortável, provocando a “favelização” do espaço público.

Tendo em vista que as atividades do equipamento exigem não só fiscalização, mas também orientação técnica, há necessidade de uma equipe técnica específica para o desenvolvimento desse tipo de mercado, com ênfase à divisão técnica de trabalho.

Há dois conjuntos de ações que são objeto de reformulação: a) relativo aps aspectos da gestão pública do abastecimento;b) relativo ao disciplinamento e normatização das atividades do equipamento.Através de um amplo processo de consulta e participação da maioria dos segmentos envolvidos

com o equipamento, tanto os órgãos do poder público quanto da sociedade civil, especialmente aqueles que representam os interesses dos permissionários, deve ser produzido um conjunto de subsídios para a elaboração de um Projeto de Lei.

Com tal iniciativa, buscar-se-á compatibilizar os interesses dos vários segmentos envolvidos, minimizando os possíveis enfrentamentos políticos de caráter corporativo que se darão no Poder Legislativo Municipal, por ocasião da discussão do referido Projeto de Lei. Após a sua aprovação, haverá necessidade de regulamentá-la através de Decreto.

Ações Propostas:Há um conjunto de normas e procedimentos que necessitarão ser contemplados por ocasião da

regulamentação da lei. Destaque especial aos seguintes:- Reclassificação das feiras por categorias, de acordo com a densidade populacional e poder

aquisitivo da população residente em seu entorno.- Constituição de agrupamentos homogêneos de permissionários para atuar por categorias de

feiras.

6.2.2 Distribuição e Estratificação GeográficaJustificativa

Normalmente, não há nenhum critério técnico para a eleição dos locais de realização das feiras. A grande maioria dos atuais locais foram ocupados de maneira espontânea e aleatória, cabendo à administração municipal apenas a sua regularização meramente burocrática.

Desta forma, há por um lado, a concentração de pontos em determinadas regiões da cidade, gerando concorrência entre os mesmos, e por outro, há regiões carentes desse equipamento.

Além disso, não há agrupamentos homogêneos de permissionários, isto é, um determinado permissionário faz parte de diversos agrupamentos durante a semana, de acordo com os pontos que exploram. Este comportamento dificulta a consolidação de uma identidade própria para cada agrupamento de permissionários, condição básica para um efetivo conhecimento do comportamento da demanda e oferta de cada ponto, a fim de promover o desenvolvimento do mercado e a conseqüente melhoria dos produtos e serviços ofertados à população.

Considerando que não há tradição de planificação municipal para esse equipamento, medidas que visem ordenar este tipo de entrave, contam com grande resistência por parte dos permissionários, mesmo àqueles conscientes de sua necessidade, pois exige mudanças de rotinas e melhoria dos serviços prestados. O não-enfrentamento desses entraves, limita significativamente a eficácia das outras medidas de disciplinamento, e o conseqüente aumento de sua capacidade competitiva junto aos demais equipamentos convencionais.

Ações Propostas- Elaboração de estudo sócio-econômico com base em indicadores de renda familiar e

concentração demográfica, afim de oferecer parâmetros mais racionais para a localização geográfica dos equipamentos;

- Eleição dos pontos de atendimento, divididos em duas categorias distintas (Região Central e Bairros);

- Compatibilização da demanda dos futuros pontos, com o número atual de permissionários; - Elaboração de parâmetros para reclassificação dos permissionários;- Elaboração de minuta de decreto para regulamentar a nova legislação;- Estudo de rotinas administrativas para implementação das novas propostas.

6.2.3 Mudança do layout e padronização visual Justificativa

A nova legislação deverá oferecer parâmetros objetivos para a mudança do layout dos equipamentos, que atualmente estão com uma imagem bastante deteriorada.

As ações deverão ser implantadas de forma gradual, para criar uma identidade própria para esse beneficio administrado pelo poder público municipal.

Ações Propostas- Elaboração de estudo de comunicação visual para o equipamento;- Elaboração de estudo de setorização dos ramos de atividade, com ênfase à agregação das

atividades similares e sucedâneas por categoria de feiras.- Elaboração de proposta de redimensionamento do tamanho das bancas e barracas, bem como o

número de permissionários por ramo de atividade.- Negociação junto à iniciativa privada, de espaços institucionais junto ao equipamento para

exploração de marketing e propaganda, com o objetivo de subsidiar financeiramente as medidas de padronização da comunicação visual.

6.2.4 Transformação de Feiras Livres em VarejõesJustificativa

O número de permissionários existentes é significativamente superior à capacidade de demanda dos pontos de feiras livres existentes, gerando uma economia de escala por permissionário, abaixo do mínimo necessário para sua reprodução econômica.

Por outro lado, o progressivo aumento da participação do preço dos alimentos no custo de vida, está exigindo da administração municipal a ampliação de equipamentos públicos de comercialização varejista com preços controlados e/ou administrados, com o objetivo de oferecer novos referenciais comparativos de preços à população, e contribuir para a regularização do mercado.Ações Propostas

- Com base nos estudos sócio-econômicos já citados, eleger-se-ão alguns pontos de feiras, para transformá-los em varejões.

- Elaboração de decreto e edital, estabelecendo as feiras que serão transformadas em varejões, contendo cronograma, prazos para inscrição dos interessados, número de permissionários para cada ramo de atividade, critérios de seleção, etc. Esta iniciativa se dará em conjunto com a proposta de nova distribuição e estratificação geográfica do equipamento.

6.2.5 Orientadores de MercadoJustificativa

O conjunto de medidas já citadas exigirá uma mudança nas formas e métodos de ação. O papel do “fiscal”, que atualmente é meramente Punitivo, deverá ser transformado em Educativo

e Orientador. Para tanto deverá ser iniciado um processo de capacitação e treinamento para esses servidores públicos, a fim de transformá-los gradualmente em “Orientadores de Mercado”, sem perder a autoridade de fiscalização, que será exercida como medida de contingência, quando ocorrer desrespeito à legislação e normas estabelecidas.

Ações Propostas- Viabilização de espaço físico comum, que servirá de base de operações para todos os

Orientadores de Mercado;

- Elaboração de Normas e Procedimentos.- Elaboração do perfil de cada servidor, através de entrevistas individuais;- Elaboração da programação dos cursos de Capacitação e Treinamento.

6.2.6 Orientação e Fiscalização da Qualidade Sanitária dos ProdutosJustificativa

As Feiras Livres, por ser um equipamento público, oferece condições objetivas para uma prática eficiente de orientação e fiscalização sanitária, permitindo que esse serviço prestado junto ao projeto, se torne referencial aos demais equipamentos privados convencionais.

Considerando que, após a aprovação da nova legislação, espera-se que o conjunto de atividades afins ao projeto tenha coordenação única, através de um órgão afim, havendo necessidade de tornar este serviço parte integrante da rotina cotidiana do equipamento. Ações Propostas

- Elaboração de projeto de readequação dos equipamentos à legislação sanitária vigente.- Elaboração de cursos de capacitação e treinamento sobre manipulação de alimentos, dirigidos

aos permissionários do equipamento.

6.2.7 Infra­estrutura para a Intervenção PúblicaJustificativa

A ausência de uma Política Municipal de Abastecimento Alimentar tem como conseqüência a pulverização da coordenação dos diversos produtos e serviços afins ao abastecimento popular e assistência alimentar, junto aos diversos órgãos da administração municipal.

O fato de as Feiras Livres normalmente não contar com um quadro próprio de servidores para atuar na totalidade do conjunto das atividades demandadas pelo equipamento, com uma mínima capacitação na área de abastecimento alimentar, não proporciona o aprimoramento e melhoria de desempenho dos serviços prestados.

Da mesma forma, a inexistência de uma mínima infra-estrutura específica de apoio, tais como meios de transporte, recursos administrativos e financeiros, tende a agravar a capacidade de intervenção da administração municipal.

Nesse sentido, é necessário conceber uma infra-estrutura mínima para o projeto, com características de versatilidade e dinâmica próprias.

Ações Propostas- Implantação de metodologia de administração e acompanhamento de projeto baseado na forma

de organização “Matricial”, através da readequação da atual estrutura organizacional da CRAISA, definindo suas características e competências;

- Elaboração de minuta de regulamentação das atribuições do órgão responsável por esse equipamento;

- Redimensionamento dos recursos administrativos, financeiros, materiais e humanos para a nova proposta;

- Negociação junto as outras Unidades Funcionais que compõem o órgão, para o repasse de parte desses recursos.

- Elaboração de custos operacionais, tendo como parâmetro, metragem linear do permissionário, desempenho operacional, quantidade de permissionários por feira, com a finalidade de viabilizar um número adequado de agentes e produtos, condicionados à região em que atuam.

- Elaboração de projeto de divulgação do equipamento, através dos meios de comunicação de massa ou através de veículos de comunicação dirigida, de informações sobre: os dias e localidades de realização das feiras, preços “referência”, possíveis promoções dos produtos em época de safra, receitas e valores nutritivos dos principais produtos consumidos pela população, etc.

- Reorganização de todas as estruturas organizacionais intermediárias do órgão, que são atividades-meio para o projeto;

- Elaboração de projetos de captação de recursos financeiros para negociação junto aos outros níveis de governo;

- Após a conclusão da elaboração da Política Municipal de Segurança Alimentar, será necessária uma readaptação final da infra-estrutura, afim de convergi-la ao cumprimento integral das diretrizes eleitas.

6.3 Marco InstitucionalNão se aplica.

6.4 Previsão e Execução OrçamentáriaNão se aplica.

6.5 Avaliação dos ResultadosNão se aplica.

&&7. PROGRAMA DE ABASTECIMENTO ALIMENTAR DE BELO HORIZONTE~~

Experiência apresentada por Moisés Machado

7.1  Origem do Programa

7.2  Objetivos e Ações Previstas e RealizadasOs objetivos e ações distribuem-se em três departamentos da Secretaria Municipal de

Abastecimento.

7.2.1 Consumo O objetivo é a administração da merenda escolar da rede pública municipal, assim como a

promoção e suplementação alimentar, buscando atender às necessidades nutricionais de crianças, adolescentes, gestantes, nutrizes e idosos carentes. Os principais projetos são Alimentação Escolar, Restaurante Popular, Prevenção e Combate à Desnutrição (distribuição de farinha enriquecida), Alimentação de Meninos de Rua, Alimentação dos Centros de Apoio Comunitário, Alimentação de Portadores de Deficiência, Alimentação de Entidades Infanto-Juvenis, Alimentação de Portadores de Deficiência, Alimentação Projeto Dente de Leite.

Público Alvo: estudantes da Rede Pública Municipal de Ensino e creches comunitárias conveniadas das áreas e regiões mais carentes da capital. Previsão e combate à desnutrição da população em situação que impedem que se ganhe a vida por conta própria (crianças, adolescentes, nutrizes e idosos carentes.

7.2.2 Regulação de Mercado/comercialização O objetivo é induzir a concorrência num mercado predominantemente oligopolizado, através da

diversificação da rede de comercialização de produtos alimentícios e da aproximação entre produtor (especialmente o pequeno) e o consumidor final. Os principais projetos são Comboio do Trabalhador, Abastecer, Feiras Livres, Cestão Popular, Feiras Modelo e Mercados Distritais.

Público Alvo: população em geral, mais especificamente as famílias com renda familiar até 4 salários mínimos, residentes nos bairros e aglomerados mais carentes de Belo Horizonte.

7.2.3. Produção Busca incentivar a produção de alimentos e sua comercialização direta por parte dos produtores,

visando o aumento da oferta de alimentos e a redução dos preços, dentro de altos padrões de qualidade, incentivando também a auto-produção urbana. Os principais projetos são Armazém da Roça, Campanha da Safra, Direto da Roça, Central de Abastecimento Municipal e Hortas Escolares e Comunitárias.

Público Alvo: público consumidor em geral, principalmente as camadas mais carentes, que podem comprar produtos hortifrutigranjeiros, inclusive manufaturados – doces, conservas, farinhas,

temperos, mel, entre outros – cerca de 50% mais baratos em relação aos equipamentos privados; e público de pequenos produtores.

7.3 Marco InstitucionalTodos os projetos são executados pela Secretaria Municipal de Abastecimento, através de três

órgãos: a) Departamento de Defesa e Promoção do Consumo Alimentar (DDPCAB);

b) Departamento de Gerenciamento do Sistema de Abastecimento (DGSAAB); c) Departamento de Incentivo à Produção de Alimentos Básicos (DIPAB).

7.4 Previsão e Execução OrçamentáriaInformação não fornecida.

7.5 Avaliação dos Resultadosa) Projetos relacionados com o Consumo, executados pelo DDPCAB: Foram beneficiadas a

média de 200.000 pessoas/mês no ano de 1998.b) Projetos relacionados com a regulação de Mercado e Comercialização, executados pelo

DGSAAB: Cerca de 140.000 famílias foram atendidas pelo Comboio do Trabalhador, Abastecer e Cestão Popular no decorrer do ano de 1998. Esses projetos comercializam gêneros alimentícios – hortifrutigranjeiros, cereais, biscoitos, etc. – em média 50% mais baratos que o preço de mercado.

c) Projetos relacionados com o estímulo à Produção, executados pelo DIPAB: O Departamento registrou, através dos projetos Direto da Roça, Armazém da Roça e Campanha da Safra, cerca de 930 mil atos de compra no decorrer do ano de 1998. Ao mesmo tempo, tem estimulado os pequenos produtores a venderem diretamente ao consumidor, melhorando a remuneração do seu trabalho no campo.

&&8. PROGRAMA DE ABASTECIMENTO da Secretaria Municipal de Abastecimento de Curitiba (SMAB)~~

Experiência apresentada por Delmo de Almeida Filho (Secretário de Abastecimento)

IntroduçãoA SMAB desenvolve ações voltadas para o abastecimento alimentar da população e para tanto

tem levado à comunidade curitibana diversos projetos para atender as necessidades. Tais projetos são dirigidos a toda população, em suas diversas faixas de renda, dando cobertura total à cidade de Curitiba.

Algumas destas ações são notadamente de interesse social, atingindo a parcela mais desfavorecida da população, tais como, Mercadão Popular, Armazém da Família, Câmbio Verde, Nutrição, Lavoura, Nosso Quintal, Central de Produção de Alimentos, Nutrisoja, Vale Vovó, Coopnutri, Cesta Metropolitana, Armazém da Solidariedade, Sacolão Curitibano e Refeição Solidária.

São desenvolvidos também projetos bastante tradicionais de comercialização através de permissionários, como as Feiras Livres, Mercado Municipal, Varejões e Feiras Especiais.

Para dar suporte a estas ações, são realizadas atividades de apoio, tais como pesquisas comparativas, divulgação e planejamento, além da compra de produtos alimentícios para toda a Prefeitura Municipal de Curitiba e fornecimento de refeições para servidores.

Nessa ótica, a SMAB visa cumprir a função constitucional do município, primando pelo abastecimento em Curitiba.

8.1  Origem do ProgramaInformação não fornecida.

8.2  Objetivos e Ações Previstas e Realizadas

O objetivo geral da SMAB é desenvolver ações municipais voltadas ao abastecimento alimentar da população, visando garantir à população da grande Curitiba o acesso à alimentação saudável. Possui a missão de estabelecer um sistema de abastecimento integrado, com ações nas áreas de produção e distribuição de alimentos, orientação ao consumidor e educação alimentar, priorizando a população de baixa renda. Sendo assim, a SMAB espera alcançar os seguintes resultados: estímulo a hábitos saudáveis; melhoria na qualidade de vida; envolvimento da comunidade em temas de abastecimento alimentar; divulgação dos Projetos da SMAB. A população potencial para atendimento nos Programas Comunitários é de 541.764 pessoas.

Descrição dos ProgramasArmazém da Família: proporciona o acesso a gêneros de primeira necessidade e produtos de higiene e limpeza a população de baixa renda por meio de 17 pontos fixos, com preços em média 30% mais baratos.Número médio de atendimentos 45.614/mêsVolume médio comercializado: 1.528.384 kg/mês.

Mercadão Popular: proporciona o acesso a gêneros de primeira necessidade e produtos de higiene e limpeza à população de baixa renda, por meio de pontos móveis, com preços em média 30% mais baratos.Pontos de atendimento: 5.363/mêsVolume médio comercializado: 155.300 kg/mês.

Armazém da Solidariedade: oportuniza a aquisição de gêneros de primeira necessidade a 31 entidades sociais já cadastradas.Volume médio comercializado: 78.074 kg/mês

Projeto Lavoura: incentiva e apoia o cultivo de lavouras de subsistência em vazios urbanos e áreas ociosas.Locais de cultivo: 17Área cultivada: 213 haPessoas beneficiadas: 3.400/mêsProdução: 331 t

Projeto Nosso Quintal: estimula e apoia a produção de hortaliças.Locais de cultivo: 52Número de Hortas: 287Área cultivada: 33.081 m2Beneficiados: 2.360 pessoas e 14.641 alunos/mês.

Projeto Ponte: possibilita o acesso dos servidores municipais de menor salário aos equipamentos de Armazém da Família e Mercadão Popular com desconto em folha.Número médio de servidores beneficiados: 1.532/mês.

Central de Produção de Alimentos: dedica-se à produção, pesquisa e desenvolvimento de alimentos derivados de soja, bem como à elaboração de lanches distribuídos em ações sociais do município.Lanches produzidos: 75.860Leite de Soja: 31.200 (pet 200 ml)Soja frita: 136.276 pctPão Nosso: 99.020

Câmbio Verde: programa de troca de lixo reciclável por hortifrutigranjeiros.Pontos de troca de lixo: 60Lixo coletado na troca: 297.464 kg/mês

Número médio de pessoas atendidas: 16.504/mêsProdutos entregues: 104.540 kg/mês

Coopnutri: proporciona a doação de hortifrutigranjeiros fora de padrão de comercialização, porém ainda adequados ao consumo para entidades sociais.Entidades beneficiadas: 119Pessoas beneficiadas: 18.300/mêsVolume de doações: 60.086 kg/mês de hortifrutigranjeiros

Vale Vovó: fornece à FAS cestas de alimentos que serão repassados a idosos carentes.Cestas entregues: 2.065/mês

Serviço de Controle de Qualidade Alimentar: testa os produtos comercializados nos armazéns e mercadões, bem como os consumidos pelas secretarias sociais do município.Número médio de testes: 196/mêsNúmero médio de supervisões: 27/mês

Nutrição: realiza cursos teóricos e práticos de educação alimentar.Número de cursos: 4/mêsNúmero de participantes: 96/mês

Nutrisoja: realiza cursos teóricos e práticos para promover o consumo de proteína de soja como alternativa alimentar nutritiva e de baixo custo.Número de cursos: 3/mêsNúmero de participantes: 51/mês

Feiras Especiais: oferecem alternativa para aquisição de produtos de época, facilitam o escoamento da produção e realizam feiras comemorativas – feira, do pescado, feira do litoral, feiras do mel e derivados, feira noturna, feira gastronômica, feira do natal, feira da páscoa.Número de pontos: 15/mêsVolume comercializado: 151.372 kg/mês

Feiras Livres: oferecem principalmente hortifrutigranjeiros à população em geral.Número de pontos: 39/mêsVolume comercializado: 667/mês

Feira Verde: comercializa exclusivamente hortifrutigranjeiros produzidos organicamente.Número de pontos: 02/mês.Volume comercializado: 14.800 kg/mês

Direto da Roça e do Mar: equipamento no qual agricultores comercializam diretamente sua produção com o consumidor final, em barracas.Pontos de atendimento: 39Comercialização: 130.127 kg/mês de hortigranjeiros e pescados

Mercado Municipal: espaço de comercialização de hortifrutigranjeiros, especiarias, artesanatos e importados.Volume comercializado: varejo, 67 t/mês; atacado, 182 t/mês.

Varejões: espaços de comercialização de hortifrutigranjeiros a preços controlados. Os permissionários são prioritariamente pequenos produtores rurais.Número de pontos: 02Volume comercializado: Capão da Imbuia, 107 t/mês; Capão Raso, 128,5 t/mês.

Cesta Metropolitana: programa que comercializa uma cesta de hortifrutigranjeiros elaborada e ofertada diretamente por agricultores e um preço em média 30% inferior ao preço de mercado local.Número de pontos: 39Cestas comercializadas: 5.608/mêsVolume comercializado 47.149 kg/mês

Sacolão Curitibano: espaço de comercialização de frutas e verduras a um preço único por quilograma.Pontos de venda: 24Volume comercializado 121.119 kg/mês.

Disque Economia: serviço telefônico de orientação ao consumidor, informando o menor preço praticado entre 12 supermercados de Curitiba.Consultas: 237/mês

Fornecimento de Refeições aos Servidores Municipais: proporciona refeição diária (almoço), elaborada pelas cozinhas da PMC, dos servidores de até determinada renda, com desconto de 1% do salário.Refeições produzidas: 114.494/mês.

8.3 Marco InstitucionalA SMAB opera com 557 funcionários e desenvolve 26 projetos.

8.4 Previsão e Execução Orçamentária

Valor orçado final em (R$) %Prefeitura 859.760.000 100SMAB 6.499.100 0,75

Valor patrimonial do Fundo de Abastecimento Alimentar de Curitiba – FAAC em dezembro de 1998: R$ 4,42 milhões.8.5. Avaliação dos Resultados

Dos programas desenvolvidos pela SMAB, os que apresentaram evoluções mais significativas no ano de 1998, em relação ao anterior foram: Armazém da Família, Sacolão Curitibano, Disque Economia e Cesta Metropolitana.

O Projeto Armazém da Família em Curitiba ampliou em 12% o número total de atendimentos e em 15% o volume comercializado. Enquanto manteve o preço médio praticado em torno de 32,36% inferior ao mercado formal. O índice de economia familiar que compara os valores totais gastos nas compras dos consumidores com o que seria gasto no mercado formal, representou uma economia média de R$ 12,08 para cada atendimento do Armazém e Mercadão Popular. Este índice elevou-se em 8,2% em relação ao ano de 1997, quando foi de 11,16%, demonstrando eficiência da Secretaria na compra dos produtos e na definição de preços aos consumidores.

Os armazéns e mercadões se destacaram ainda pela concretização de sua integração na região metropolitana, tendo sido implantados dois armazéns e seis mercadões nos municípios vizinhos, por meio de um decisivo apoio da SMAB.

Os programas Sacolão e Cesta Metropolitana apresentaram crescimentos de 15% e 20% no volume de vendas, respectivamente, em virtude de ofertarem hortifrutigranjeiros a preços extremamente compensadores e terem uma atuação bastante recente, de maneira que ainda estão sendo descobertos pelos consumidores.

O Programa Disque Economia elevou em 21% o número de consultas de consumidores à sua pesquisa diária de preços, demonstrando a preocupação crescente do consumidor com a economia doméstica.

De uma maneira geral as feiras e varejões reduziram sua participação na comercialização de hortifrutigranjeiros, provavelmente em função da crescente disputa pelo mercado consumidor, representado pela concorrência dos supermercados. O Mercado Municipal, por sua vez, apresentou pequeno incremento na comercialização dos hortigranjeiros no varejo.

&&9. EXPERIÊNCIAS DE COMPRAS COMUNITÁRIAS E COMÉRCIO SOLIDÁRIO do Centro de Cooperação e atividades populares – CCAP~~

Experiência apresentada por José Leonídio Madureira de Sousa Santos, Diretor Executivo do CCAP.

9.1 Origem do ProgramaA estrutura do abastecimento na cidade do Rio de Janeiro caracteriza-se pela ausência de

supermercados nas proximidades das favelas. O que, por sua vez, faz aumentar o custo da alimentação para os moradores empobrecidos, devido às despesas com transporte e frete, além da perda de tempo e do desconforto das filas.

O mercado atacadista de produtos industrializados - cereais, enlatados, laticínios - é altamente concentrado, sendo dominado por grandes grupos e pela Bolsa de Gêneros Alimentícios. Já o de hortifrutigranjeiros é dominado por intermediários e os preços são formados nas CEASAs pela ação destes intermediários. Há enorme diferença entre os preços pagos aos produtores rurais e os preços de venda aos consumidores finais.

O mercado varejista de gêneros alimentícios, apesar de disperso em diversas formas de comercialização (feiras, supermercados, mercearias, barracas, etc.) e com estabelecimentos de todo tamanho é altamente concentrado em poucos grupos supermercadistas, principalmente para produtos industrializados. O grande volume comercializado pelos supermercados permite negociar produtos a preços menores do que os conseguidos pelos estabelecimentos de menor porte.

Além da carestia nos alimentos básicos, os preços dos gêneros de primeira necessidade eram manipulados especulativamente. Assim sendo, a fome e a miséria aumentavam drasticamente. No campo jurídico, mesmo com a favorável lei de defesa do consumidor, nas favelas, tinha-se um quadro de falta de cidadania.

A expectativa de que era possível reduzir a fome e miséria em favelas do Rio de Janeiro motivou um grupo de populares de várias favelas e técnicos a intervir nessa realidade, a partir de um projeto de auto-abastecimento, denominado “Sistema de Comercialização Alternativa”.

9.2 Objetivos e ações previstas e realizadasApós reflexão sobre a possibilidade concreta de reduzir a carestia nos alimentos básicos e

aumentar a renda de famílias de pequenos produtores rurais, o grupo decidiu experimentar o Sistema de Comercialização Alternativa. Para desenvolver esta experiência, durante o ano 1985, contaram com reduzida estrutura, trabalho voluntário, direção colegiada, transparência administrativa/financeira e apoio de pequenos agricultores de hortigranjeiros de Friburgo e implantaram as seguintes atividades:

Feiras Comunitárias – Adquirindo mercadorias junto aos pequenos agricultores de Friburgo e no CEASA, com pagamento em cheque pré-datado de 7 dias e vendendo aos consumidores somente aos sábados e domingos.

Compras Coletivas de Alimentos Básicos - A COBAL oferecia através do PAP - Programa de Alimentação Popular - 12 produtos, com preços de venda aos consumidores tabelados. As equipes das comunidades, divulgavam no meio da semana a lista de produtos/preços oferecidos pelo programa, recolhiam-se os pedidos e o valor total da compra, unificando a demanda das quatro comunidades. Com o dinheiro recolhido, as compras eram realizadas no PAP e distribuídas para as famílias aos sábados.

A partir da experimentação, a principal constatação foi a necessidade de constituição do CCAP, que ocorreu em fevereiro de 1986, para prestar serviços relativos à comercialização e à elaboração do projeto (Sistema de Comercialização Alternativa) de auto-abastecimento de alimentos básicos nas quatro comunidades. O projeto previu subsídio gradual para cobertura dos custos operacionais da Feira Comunitária e da venda de seis mil cestas mensais, com 12 itens nas Compras Coletivas, aos sábados e domingos. Neste caso a família adiantaria apenas 25% do valor total enquanto garantia do pedido.

O Sistema apresentava as seguintes finalidades: minimizar a carestia nos produtos comercializados, aprofundar o relacionamento com pequenos agricultores organizados, refletir a sociedade de consumo terceiro-mundista, o valor nutritivo dos alimentos e resgatar e difundir o conhecimento popular sobre as plantas e ervas medicinais.

A proposta do projeto foi apoiada pela CEBEMO, com recursos financeiros na ordem de 37 mil dólares, e deu-se início, em 1987, à implantação do sistema de comercialização alternativa do CCAP, funcionando até os dias de hoje com várias alterações.

A avaliação de janeiro de 1991, mostrou que não se havia alcançado plenamente a auto-sustentação, entretanto, passos significativos foram dados. Os coordenadores decidiram adotar medidas de austeridade, aumentar a profissionalização, melhorar o atendimento às solicitações das famílias consumidoras (ampliando o número de produtos ofertados e ampliando o funcionamento de segunda a sábado) e, também, pela definição mais precisa dos objetivos políticos e educativos do Sistema de Comercialização Alternativa do CCAP. Estas posições foram tomadas a partir da análise de que o Sistema seria capaz de gerar um crescimento de produtividade. Era possível crescer dentro das quatro comunidades participantes e atender a demanda de outras favelas, a partir da experiência da comercialização direta de feijão (safra 89/90), que incorporou seis novas comunidades.

Em relação aos objetivos educativos e políticos, o Sistema deveria manter as seguintes metas: a) aprofundar o relacionamento político e econômico com os pequenos agricultores; b) lutar contra a fome, entendendo que era um problema da baixa renda familiar dos trabalhadores

urbanos e não da produção rural, por isso deveria ser dever do Estado garantir alimentação básica para famílias em situação de estrema pobreza; e

c) estimular as pessoas a conhecerem e exercitarem seus direitos enquanto consumidores.Com o funcionamento do Sistema, nos anos de 1988 a 1991, foram realizadas entre uma a duas

compras diretas, por ano, de feijão junto a Associações de Pequenos Produtores Rurais do Sudoeste do Paraná, articuladas pela ASSESOAR (Associação de Estudos, Orientação e Assistência Rural). As principais dificuldades constatadas, foram: o pouco conhecimento dos agricultores e dos consumidores sobre a estrutura e funcionamento do mercado de grãos no País; os enormes entraves de ordem jurídica para comercialização com o poder público; com apenas uma ou duas comercializações diretas por ano não era possível estimular e fortalecer os grupos de consumidores; faltava de capital de giro e havia pouca informação sobre outros grupos de agricultores; distância sociocultural entre os consumidores residentes em favelas no Rio de Janeiro e os pequenos agricultores no Sudoeste do Paraná.

Já os principais aspectos positivos, foram: consumo do feijão sem defensivos químicos no processo de estocagem do produto; as famílias consumidoras conseguiram economizar 20%, enquanto os agricultores ganharam 25%, gerando redirecionamento de renda do atravessador/supermercadista para o consumidor final/agricultor; avanço na relação sociocultural entre produtor e consumidor e na autogestão popular. Constatou-se ainda que com a simplicidade operacional, foi possível aos participantes acompanhar e opinar sobre a comercialização, o que contribuiu para o crescimento da participação de organização, conseguindo fazer crescer a força do consumidor e do agricultor pobre e isolado.

Com a experiência anterior, elaborou-se projeto “Comercialização Direta e Solidária”, recebendo apoio de CESVI/Itália e da União Européia, iniciando em meados de 1994, reforçando o Sistema de Comercialização Alternativa. O objetivo global proposto era melhorar a qualidade de vida de consumidores empobrecidos residentes em favelas da cidade do Rio de Janeiro e de famílias de produtores rurais a partir da comercialização direta e solidária. Projetou-se envolver cerca de 60 grupos de consumidores, com média de 300 famílias, funcionando com a seguinte metodologia: o

grupo divulga tabela (relação produtos básicos alimentação, higiene e limpeza, com respectivos preços), recebe pedido das famílias, unifica pedidos e encaminha ao CCAP, recebe mercadorias, distribui pedidos e recebe o valor total dos pedidos das famílias.

Com os objetivos específicos pretendia-se: fortalecer a rede de grupo de consumidores empobrecidos residentes em favelas do Rio de Janeiro; estruturar a organização para comercialização direta e solidária, capacitando os grupos envolvidos diretamente; documentar e divulgar; armazenar e beneficiar; reforçar o transporte; reforçar a administração; fortalecer a organização jurídica; e fortalecer as Associações de pequenos agricultores.

O projeto foi administrado por uma direção colegiada de seis coordenadores (compras, abastecimento, educação, jurídico, beneficiamento e administração), com autonomia administrativa da diretoria do CCAP e realizou parcerias com a CAPINA, ARTR e CTA. Vale mencionar que todos os coordenadores residem em favelas, o coordenador jurídico, inclusive, morava em uma ocupação. Não houve a presença do poder público nem de universidades em todo o transcorrer do projeto.

Para desenvolvimento do projeto foram investidos recursos financeiros de CESVI (ONG Italiana) e da União Européia, durante três anos, em: obras civis US$ 39 mil, transporte US$ 97 mil, pessoal US$ 86 mil, formação US$ 10 mil, documentação e divulgação US$ 11 mil, comercialização US$ 18 mil, beneficiamento US$ 19 mil, administrativa US$ 2 mil, assessoria e acompanhamento US$ 64 mil, e capital de giro US$ 65 mil.

De um modo geral, nos três anos do projeto, foram realizadas as ações previstas para viabilizar o alcance dos objetivos específicos, conforme poderemos observar mais adiante.

Percebendo a dificuldade em manter a Comercialização Direta e Solidária com grupos de produção rural, a partir da compra de um ou dois produtos, ampliou-se o número de itens comercializados. Construiu-se, em conjunto com as organizações rurais (CIAPA e ARTR), um cronograma com informações sobre: padrão, qualidade, apresentação, quantidade disponível para comercialização e quantidade assumida pelo CCAP. Esta estratégia viabilizou a compra semanal de uma carga fracionada de até 25 produtos da ARTR da Zona da Mata/MG (feijão preto, feijão roxinho, feijão mulatinho, café, rapadura pura, rapadura com mamão, rapadura com amendoim, rapadura com abóbora, cebola, lingüiça de porco, laranja seleta, laranja pêra, maracujá, doce de leite, queijo frescal, manteiga, mel, iogurte, inhame, milho de canjica, tomate, abobrinha, pimentão, pepino e jiló) e de mais de 12 produtos, sem defensivos químicos, de Bonfim, região de Petrópolis-RJ: alface, acelga, agrião, beterraba, brócolis, cenoura, cheiro verde, chicória, espinafre, etc.

A comercialização proporcionou, em novembro de 1997, às famílias consumidoras empobrecidas da área urbana do Rio de Janeiro benefício de 19,7%, enquanto a produção agrícola familiar teve ganhos de 26,5%, em relação ao preço praticado no mercado local de produção.

O projeto envolveu cerca de 8 mil famílias consumidoras e, aproximadamente, 125 famílias de produtores rurais, no ano de 1997. O valor das vendas anuais, nos anos de 1995, 1996 e 1997, foram, respectivamente, R$ 647.505,24; R$ 943.298,87 e R$ 1.028.674,06.

Com a competição cada vez mais acirrada no mercado varejista, o critério de qualidade, tradição da marca, aparência e preço ameaça a viabilidade de muitos pequenos projetos produtivos agro-industriais e fabris urbanos. Assim sendo, o trabalho de Marketing desenvolvido pela ARTR (Associação Regional dos Trabalhadores Rurais da Zona da Mata de Minas Gerais), a partir do selo de garantia da qualidade dos produtos da produção familiar merece destaque e um melhor aprofundamento. O trabalho de penetração da marca “Sítio Mineiro” no mercado, estava acoplado às condições concretas de manutenção do padrão e demais condições de identificação pelo consumidor final.

Com a realização das compras diretas, foram feitos serviços de limpeza, padronização e empacotamento para os seguintes produtos: feijão preto, feijão carioquinha, feijão mulatinho e feijão roxinho. Realizou-se ainda os serviços de limpeza e empacotamento de milho amarelo em grão e empacotados arroz e milho branco de canjica. Negativamente, os custos do serviço de beneficiamento não foram totalmente mensurados, devido às dificuldades para a efetiva determinação de custos deste serviço, como o consumo de energia elétrica.

Destaca-se positivamente a troca de informações entre CCAP e Grupos de Produção rural, principalmente, com a ARTR, para o alcance do padrão do mercado consumidor urbano do Rio de Janeiro para determinados produtos. Exemplificando: O pó de café “Sitio Mineiro”, no início da comercialização o pó era empacotado em embalagem plástica de baixa densidade perdendo o sabor rapidamente, era muito moído e o grau de torrefação estava sempre variando. O processo evoluiu até a utilização de pacotes aluminizados e aumento da granulagem. Como não existe tecnologia para pequena produção, era impossível que os grãos fossem torrados com mesmo teor de umidade e num determinado tempo e temperatura constante.

A ampliação da renda das famílias de pequenos agricultores foi possível com a comercialização de itens não negociados em escala, como manteiga, queijo, lingüiça, doces e algumas frutas e também pela experimentação das compras coletivas pelos agricultores de produtos químicos (cloreto de potássio, sal grosso e fino, entre outros), ração para gado, recipientes de 200 litros para armazenar grãos e alimentos industrializados.

Com a comercialização dos produtos de origem “doméstica” da pequena propriedade rural, beneficiou, também, os consumidores pobres, pois gerou aumento da economia obtida pelas famílias consumidoras.

A gestão participativa, transparente e democrática, proposta e praticada acarretou mais trabalho e enfrentou maiores dificuldades do que as geralmente encontradas nas usuais relações capital / trabalho. Trabalhar coletivamente é ainda mais difícil. A prática da gestão participativa mobiliza, naturalmente, mais recursos e requer maior capacitação. Em se tratando de um trabalho envolvendo favelas e comunidades empobrecidas da área rural, a gestão da atividade de articulação social envolveu os quadros do projeto em atividades sociais, sobrecarregando e dificultando o desenvolvimento das tarefas especificas da Comercialização Direta e Solidária.

No transcorrer do projeto, foram envolvidas 33 comunidades, e, aproximadamente 8 mil familias em 1997. As dificuldades encontradas nos próprios grupos inibiram a ampliação do abastecimento popular, devido a:

a) A não-priorização do trabalho de abastecimento por alguns grupos envolvidos. Como uma das finalidades do projeto também era a de fortalecer a organização popular dos grupos envolvidos na comercialização direta e solidária (culturais, associações de moradores, creches, grupos de igreja entre outros), ocorreu que esses grupos tinham como finalidade principal os seus próprios objetivos, relegando para um plano inferior o trabalho de abastecimento popular na comunidade não mantendo uma rotina operacional necessária ao trabalho no comercio.

b) Falsa expectativa de ganhos financeiros. Alguns grupos de consumidores apostaram que com a venda dos produtos da comercialização direta e solidária poderiam cobrir despesas com pagamento de pessoal para atuar na própria entidade, não avaliando corretamente que o seu ganho estava condicionado diretamente ao volume de vendas realizadas, ou seja, de que receberiam apenas 5% das suas próprias vendas.

c) Interesses divergentes dos objetivos globais do projeto. Outro grande motivo para o reduzido número de grupos de abastecimento refere-se aos interesses político-pessoais de dirigentes de entidades e até mesmo a pouca confiabilidade de outros dirigentes, devido, em grande medida, à tradição política “de que é dando que se recebe” e da corrupção institucionalizada.

d) Atraso no cronograma de compra direta das mercadorias junto aos pequenos agricultores, provocado, principalmente, pelo retardamento da construção do galpão e, conseqüentemente, da instalação da máquina de beneficiamento; pela necessidade de reorganizar a área de compras do projeto, em maio de 1996.

e) A não-padronização do produto dentro das normas estabelecidas pelo mercado consumidor urbano do Rio de Janeiro e a pouca regularidade no fornecimento pelos pequenos agricultores, inibindo a participação de alguns grupos de consumidores na comercialização direta e solidária.

Foram realizadas diversas ações (intercâmbios, cursos e palestras) e produzidos documentos (cartilhas e folhetos) para desenvolver um processo educativo, principalmente, junto às famílias consumidoras residentes em favelas e bairros pobres da baixada fluminense.

Dentre os folhetos, que eram utilizados para divulgar produtos e preços promocionais, destacavam-se os textos referentes à utilização dos alimentos (mel, legumes, frutas, hortaliças, etc.),

para alimentação balanceada e nutritiva; e consumo de hortifrutigranjeiros sem adição de substâncias nocivas à saúde (produção de Bonfim/Petrópolis e de alguns produtos comercializados com a ARTR). Assim, o processo educativo contribuiu para intervir na cultura alimentar dessas famílias, apontando alternativas mais nutritivas, saudáveis e com menores preços.

Para manutenção da comercialização direta e solidária, dentro da legislação atual e para ampliar o patamar de vendas, constituiu-se uma cooperativa mista, ainda a ser legalizada. Com esta alternativa, pode-se viabilizar o incremento do fornecimento de cestas básicas a empresas urbanas e reduzir o custo operacional, principalmente do imposto de circulação. O CCAP possui personalidade jurídica enquanto associação sem fins lucrativos.

9.3 Marco InstitucionalNão se aplica (já incluso no relato da experiência).

9.4 Previsão e Execução OrçamentáriaNão se aplica (já incluso no relato da experiência).

9.5. Avaliação dos ResultadosA cultura cooperativista no Brasil é marcada pelo atrelamento às estruturas do Estado, trazendo

sérias implicações, principalmente quanto ao patrimônio e ao caráter cooperativado da gestão institucional. A legislação atual é complexa e defeituosa.

A denominação de associação sem fins lucrativos, da forma com que aparece na lei, encarna uma concepção filantrópica, baseada numa cultura paternalista, que impede o acesso ao desenvolvimento da maioria da população empobrecida.

Para construir um desenvolvimento comunitário, com base na autogestão, não se requer a instituição da filantropia. Deve-se, ao contrario, buscar a manutenção do empreendimento, a partir da obtenção de margens de ganho que cubram seus custos e permitam a remuneração do trabalho, promovendo a socialização dos benefícios adquiridos no exercício das atividades. Os direitos sociais e trabalhistas, neste contexto, aparecem enquanto resultado da construção de uma experiência de dignificação e valorização do trabalho. De acordo com esta visão, portanto, as entidades devem ser vistas como sem o fim de acumulação de lucro.

A proposta de trabalho solidário defendida não se caracteriza pela exploração da força de trabalho, pois não existe um proprietário de um determinado meio de produção. Nestas iniciativas prepondera a autogestão das atividades geradoras de renda e trabalho, através da organização autônoma dos próprios trabalhadores. As garantias, vantagens e benefícios são adequados à realidade do contexto da atuação, garantindo a estabilidade da proposta de trabalho. Portanto, não se concebe qualquer vinculação empregatícia nos termos formais atuais. A previdência social assegura aos trabalhadores “autônomos” o benefício de sua assistência, mediante contribuição própria deles. O Fundo de Garantia por Tempo de Serviço pode ser substituído por um Fundo de Reserva Solidária, administrado pela própria organização, segundo critérios previamente definidos.

Entretanto são necessárias novas legislações que regulamentem a proposta de Coletivo dos Trabalhadores Livres e Solidários Associados, ou de outra nomenclatura, capaz de assegurar novos moldes para as relações já existentes entre as organizações, os trabalhadores, o capital e o Estado, e que superem, inclusive, o associativismo e o cooperativismo até hoje praticados. Neste sentido, esta proposta pretende garantir que uma associação que não visa o acúmulo do lucro, possa ter os mesmos direitos de uma empresa de capital, diferenciando-se apenas em razão de sua finalidade social. Além de uma nova regulamentação trabalhista, este processo envolve ainda a discussão sobre um conjunto de aspectos jurídicos e tributários vinculados.

Desafios e Dificuldades EncontradasAs principais dificuldades encontradas para viabilizar a comercialização com grupos de produção

familiar foi a dispersão espacial e as especificidades de cada grupo/região rural trabalhada nos estados de São Paulo, Minas Gerais, Paraná, Espirito Santo e Rio de Janeiro. Esta situação

demonstra claramente que o trabalho realizado junto à área rural pelas organizações de apoio e de assessoria (associativismo, produção e política), ainda carece de maior atuação na área da comercialização. O desafio colocado foi o de desenvolver uma relação comercial com os pequenos agricultores garantindo a viabilidade política e econômica deste processo.

Constatamos hoje, depois da experiência acumulada, a necessidade de as associações, sindicatos e grupos de agricultores de produção familiar aprofundar o conhecimento sobre como se processa o abastecimento nos centro urbanos para fortalecimento da comercialização direta e solidária.

Resultados não Previstos Os principais resultados não previstos beneficiaram a Asben Transportadora Ltda; o Centro de

Educação Pré-escolar Tia Zilda; o Vídeo Cultura/Telejornalismo comunitário; a Participação no Movimento Nacional de Direitos Humanos; o Fundo Financeiro de Ajuda-Mútua (caixinha); e a Construção do processo de Desenvolvimento Socialmente Justo em Favelas do Rio de Janeiro.

O principal resultado negativo foi o Sinistro com carga da ASBEN Transportadora, em março de 1997, em São Paulo. Para nossa surpresa, a Cia Paulista de Seguros, aprovou num primeiro momento o pagamento no valor de R$ 136.513,77 mas, posteriormente, negou este pagamento. Ajuizou-se ação de cobrança cumulativa com danos contra a seguradora. Como o Sistema de Comercialização Alternativa emprestou R$ 30.000,00 para a transportadora, e este não retornou, agravou a crise financeira na comercialização.

Mercado SolidárioFoi definida a estratégia de privilegiar a construção do mercado solidário com três regiões

(CIAPA/SW PR; ARTR/Zona da Mata MG; e região de Bonfim/Petrópolis-RJ) e foi desenvolvido com características próprias, marcada por negociações transparentes; relações éticas; e valorização da vida e do trabalho. As ações implementadas para garantir estas características foram o intercâmbio cultural; socialização de informações; e negociação conjunta entre produtores e consumidores. Isto, concretamente, conferiu ânimo aos participantes em demonstrar à sociedade, que a utopia pode ser real, que a vida cidadã pode, e deve, obedecer aos critérios de justiça, solidariedade e eqüidade. Aspectos estes, que estão bem delineados na construção do Mercado Solidário e podemos afirmar que são os conceitos norteadores das ações.

A Comercialização Direta e Solidária/Mercado Solidário abriu novas alternativas, estimulando o surgimento de iniciativas práticas como, o Armazém da Roça em Belo Horizonte, criado pela ARTR (Associação Regional dos Trabalhadores Rurais da Zona da Mata de Minas Gerais), em parceria com governo municipal; a formação do Fórum Estadual de Cooperativismo Popular, que realizou em l996 o 1° Encontro Estadual de Cooperativismo Popular.

Os principais desafios para crescimento do mercado solidário situam-se na:1-ampliação do intercâmbio; 2- socialização das informações; 3-capacitação; 4-maior divulgação; 5- interferir e propor políticas públicas; 6- fomentar a comercialização de produtos diversificados (garantia e segurança do produtor); 7- adotar como critérios de mercado: qualidade e preço.Coloca-se em pauta a seguinte questão: Quais os passos que devem ser dados para a construção de

uma economia popular de solidariedade. Entendemos que este processo de reflexão é bastante lento, pois os grupos de produção rural, grupos de serviços e de produção urbana estejam diretamente envolvidos nesta construção.

ContinuidadePara viabilizar a comercialização direta e solidária, enquanto uma proposta que beneficia

consumidores empobrecidos e a produção agro-alimentar familiar, torna-se indispensável ampliar o volume negociado, não devendo ficar restrito à demanda dos grupos de consumidores organizados.

Desta forma, deve-se abastecer com produtos do mercado solidário uma rede de micro comerciantes e implementar a linha de cesta básica para as empresas fornecerem aos seus trabalhadores.

A proposta junto aos micro-comerciantes merece um pouco mais de reflexão, entretanto, poderá significar uma alternativa concreta e durável, principalmente, se for pensado enquanto alternativa para o escoamento de hortifrutigranjeiros e da produção caseira, como manteiga, doces entre outros produtos.