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05/11/2014 Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra http://www.dgsi.pt/jtrc.nsf/8fe0e606d8f56b22802576c0005637dc/e812e8c8abda732e80257854005c8e22?OpenDocument 1/32 Acórdãos TRC Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra Processo: 2022/08.4TBFIG.C1 Nº Convencional: JTRC Relator: CARLOS QUERIDO Descritores: CONTRATO MISTO UNIÃO DE CONTRATOS ALTERAÇÃO DAS CIRCUNSTÂNCIAS ABUSO DE DIREITO Data do Acordão: 08-02-2011 Votação: UNANIMIDADE Tribunal Recurso: FIGUEIRA DA FOZ Texto Integral: S Meio Processual: APELAÇÃO Decisão: CONFIRMADA Legislação Nacional: ARTS.264 Nº3, 265 Nº3, 650 Nº2 F) CPC, 334, 406, 437 CC. Sumário: 1. – Dada a natureza instrumental e provisória da fase da condensação, a fixação dos factos assentes e a organização da base instrutória não têm eficácia preclusiva, não constituindo caso julgado formal, conforme doutrina do Assento do STJ nº 14/94 de 26 de Maio ( agora com valor de acórdão de uniformização ), sendo perfeitamente viável que o tribunal, no decurso da audiência final, proceda à respectiva ampliação, nos termos estabelecidos nos artigos 650.º, n.º 2 alínea f) e n.º 3 e 264.º CPC, com vista a tomar atendíveis, não apenas factos articulados que, por lapso (embora não reclamado) naquela não foram incluídos, como inclusivamente a atender a factos complementares ou concretizadores, não alegados oportunamente pela parte interessada, mas atendíveis nos termos estabelecidos no n.º 3 do art. 264. do CPC. 2. – Por não operar a preclusão, qualquer das partes pode, no recurso da decisão final, invocar omissões dos factos assentes e da base instrutória, ainda que não tenha apresentado prévia reclamação contra os factos assentes e a base instrutória. 3. - No contrato misto, os diversos elementos contratuais distintos integram-se num processo unitário e autónomo de composição de interesses, aferido com base em dois critérios essenciais: um centrado na unidade ou pluralidade da contraprestação; outro alicerçado na unidade ou pluralidade do esquema económico subjacente à contratação. 4. – Do contrato misto distingue-se a união ou coligação de contratos, em que cada um deles conserva a sua individualidade, configurando-se uma união extrínseca ( em que o único factor de ligação reside na circunstância de se celebrarem na mesma ocasião, constando por exemplo do mesmo escrito), uma união com dependência ( entre os contratos existe um vínculo traduzido no facto de a validade e vigência de um contrato depender da validade e vigência do

Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra 2001 União de contratos-Contratos mistos

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    Acrdos TRC Acrdo do Tribunal da Relao de CoimbraProcesso: 2022/08.4TBFIG.C1N Convencional: JTRCRelator: CARLOS QUERIDODescritores: CONTRATO MISTO

    UNIO DE CONTRATOSALTERAO DAS CIRCUNSTNCIASABUSO DE DIREITO

    Data do Acordo: 08-02-2011Votao: UNANIMIDADETribunal Recurso: FIGUEIRA DA FOZTexto Integral: SMeio Processual: APELAODeciso: CONFIRMADALegislao Nacional: ARTS.264 N3, 265 N3, 650 N2 F) CPC, 334, 406, 437 CC.Sumrio: 1. Dada a natureza instrumental e provisria da fase da

    condensao, a fixao dos factos assentes e a organizao dabase instrutria no tm eficcia preclusiva, no constituindocaso julgado formal, conforme doutrina do Assento do STJ n14/94 de 26 de Maio ( agora com valor de acrdo deuniformizao ), sendo perfeitamente vivel que o tribunal, nodecurso da audincia final, proceda respectiva ampliao,nos termos estabelecidos nos artigos 650., n. 2 alnea f) e n. 3e 264. CPC, com vista a tomar atendveis, no apenas factosarticulados que, por lapso (embora no reclamado) naquelano foram includos, como inclusivamente a atender a factoscomplementares ou concretizadores, no alegadosoportunamente pela parte interessada, mas atendveis nostermos estabelecidos no n. 3 do art. 264. do CPC.

    2. Por no operar a precluso, qualquer das partes pode, norecurso da deciso final, invocar omisses dos factos assentes eda base instrutria, ainda que no tenha apresentado prviareclamao contra os factos assentes e a base instrutria.

    3. - No contrato misto, os diversos elementos contratuaisdistintos integram-se num processo unitrio e autnomo decomposio de interesses, aferido com base em dois critriosessenciais: um centrado na unidade ou pluralidade dacontraprestao; outro alicerado na unidade ou pluralidadedo esquema econmico subjacente contratao.

    4. Do contrato misto distingue-se a unio ou coligao decontratos, em que cada um deles conserva a suaindividualidade, configurando-se uma unio extrnseca ( emque o nico factor de ligao reside na circunstncia de secelebrarem na mesma ocasio, constando por exemplo domesmo escrito), uma unio com dependncia ( entre oscontratos existe um vnculo traduzido no facto de a validade evigncia de um contrato depender da validade e vigncia do

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    outro ), uma unio alternativa ( so celebrados dois contratos,em termos tais que, conforme ocorra ou no certo evento,assim se considerar celebrado apenas um deles).

    5. - A modificao do contrato com fundamento na alteraodas circunstncias, prevista no artigo 437 do Cdigo Civil, no de conhecimento oficioso.

    6. O abuso de direito (art. 334 do Cdigo Civil) deconhecimento oficioso, desde que verificados os respectivospressupostos.

    7. Com base no abuso de direito, o lesado pode requerer oexerccio moderado, equilibrado, lgico, racional do direito quea lei confere contraparte, o que, uma vez verificados os seuspressupostos, legitima a modificao do contrato segundo osjuzos de equidade previstos no n. 2 do artigo 437. do CdigoCivil.

    Deciso Texto Integral: Acordam no Tribunal da Relao de Coimbra

    I. Relatrio

    C (), O (), E (), M () e mulher, L (), instauraram apresente aco declarativa, com processo ordinrio, contra J (),pedindo, a ttulo principal, que o ru seja condenado: a executar asobras referidas no artigo 18, da petio inicial, ou a pagar o custodas mesmas, pelo valor que se vier a apurar em execuo desentena; a pagar o montante de : 16.874,55, correspondente srendas vencidas e no pagas entre Janeiro de 2005 e Junho de 2007e respectiva indemnizao legal de 50%; a pagar o montante aliquidar no adequado incidente, correspondente ao que os autoresnormalmente receberiam pelo arrendamento do rs-do-cho, desdeJulho de 2007 at efectiva execuo das obras. Subsidiariamente,para a eventualidade da improcedncia do primeiro pedidoformulado a ttulo principal, pediram ainda a condenao do ru nopagamento do valor das rendas no pagas, face acordadarealizao de obras, no montante de : 16161,05, devidamenteactualizado pelos ndices (acumulados) de preos no consumidorpublicados pelo INE.Alegaram, para tanto, que, em 19 de Julho de 2000, a sua me(entretanto falecida, em 2.11.2006) e eles prprios, todos comoproprietrios e promitentes senhorios, e o ru, como promitentearrendatrio, outorgaram um contrato escrito, relativo a um prdiourbano, sito nas ..., freguesia de ..., deste concelho, quedenominaram de Contrato de Promessa de Arrendamento eContrato de Empreitada, segundo o qual, os primeiros prometiamdar de arrendamento ao ora ru todo o rs-do-cho desse prdio,outrora destinado a comrcio de mercearias e vinhos e a habitao,

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    bem como o respectivo logradouro (ptio com cerca de 120m),sendo que tal arrendamento seria pelo prazo de um ano,renovando-se por iguais e sucessivos perodos, com incio noprimeiro dia do ms seguinte ao da concluso das obras que o oraru, previamente, iria realizar no prdio, e que deveriam estarconcludas no dia 31 de Dezembro de 2000, destinando-se oarrendamento a habitao, escritrio, oficina e armazm demateriais de refrigerao e climatizao da indstria hoteleira,tendo ficado acordado que a renda a pagar pelo ora ru seria de60.000$00 mensais, no ano de 2001, 65.000$00 mensais, no ano de2002, 70.000$00 mensais, no ano de 2003, e 75.000$00 mensais,no ano de 2004, sendo actualizada, nos anos de 2005 e seguintes,pela aplicao dos coeficientes legais.Acrescentaram que, previamente, e com vista ao arrendamentoprometido, deveria o ora ru efectuar as obras elencadas naClusula 12, ou seja, as obras de restauro ou de adaptaonecessrias para que a Cmara Municipal, em vistoria prvia arealizar, emitisse a competente licena de utilizao para outorgado arrendamento, bem como proceder limpeza e pintura exteriorde todo o edifcio, i.e., no s do rs-do-cho objecto do contrato,mas tambm do 1 andar e restantes partes do prdio, quer das quedo para a Rua do Rancho Folclrico As Salineiras de ... e Ruados Barranhos, quer das que do para o interior do ptio, obras queforam, ao tempo, avaliadas pelas partes outorgantes,nomeadamente para efeitos do disposto na Clusula 6, em3.240.000$00 (equivalentes a 16161,05), ou seja, o valorcorrespondente s rendas dos quatro primeiros anos de vigncia docontrato e que o ora ru estaria dispensado de pagar.Mais, alegaram que, a despeito do que ficou acordado, o ruapenas efectuou uma pequena parte das obras acordadas e noprovidenciou pela devida vistoria e licenciamento camarrio (nemteria condies de licenciamento, atenta a incompletude das obrasfeitas e estado de devastao em que deixou o imvel), tendo-selogo instalado no locado, ali passando a exercer a sua actividadecomercial, em nome individual ou da sua empresa M...,aproveitando todas as utilidades que o dito rs-do-cho erasusceptvel de proporcionar, designadamente, utilizando oescritrio, a nica parte do acordado que executou em condies,sendo que, como tal, todo o rs-do-cho se encontra inutilizado einutilizvel, sem licena de utilizao e inapto para ser dado dearrendamento.Disseram, tambm, que o ru se manteve na posse do imvel atJunho de 2007, data em que entregou as chaves por meio de cartaregistada enviada ao autor C (), sem pagar as rendas que, a partirde 1 de Janeiro de 2005, eram devidas, pelo que se encontra emmora em relao ao respectivo pagamento, ao que acresce a

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    circunstncia de o rs-do-cho, tal como est, se mostrarinadequado para arrendamento, o que os impede de receber omontante mensal correspondente ao seu valor locativo, desde Julhode 2007 at efectivao das obras, valor que, de formarazoavelmente previsvel, receberiam e no esto a receber, peloque dele devem ser indemnizados.Regularmente citado, o ru apresentou contestao, na qual pugnoupela improcedncia da aco, e deduziu reconveno, pedindo quese declare o incumprimento do contrato junto aos autos por culpaexclusiva dos autores, os quais devero ser condenados narestituio da quantia de : 28.974,33, correspondente ao montanteque o ru investiu no prdio e corresponde sua valorizao, bemcomo no pagamento da quantia de : 19.400,00, a ttulo deindemnizao pelos danos sofridos com aquele incumprimento docontrato.Alegou, para tanto, que aps a assinatura do contrato e j depois deter iniciado as obras de limpeza e lavagem do edifcio, demolioda parede divisria entre as duas cozinhas existentes na habitao,instalao da rede elctrica na zona de comrcio e na cozinhaexistente no ptio, demolio das paredes interiores dos estbulosexistentes, constatou que as obras que tinham sido acordadas entreas partes careciam de um projecto aprovado pela CmaraMunicipal, sendo que, nessa sequncia constatou que o que estavano processo camarrio no correspondia construo existente nolocal, circunstncia que inviabilizava a apresentao e aprovaode qualquer projecto e tornava impossvel a legalizao dequalquer obra e consequentemente a emisso de licena deutilizao para celebrao do contrato de arrendamento.Acrescentou que, como entretanto necessitasse do espao para deimediato desenvolver a sua actividade comercial e os autores noapresentassem qualquer soluo para aquele problema e porque jtinha empatado dinheiro nas obras efectuadas, desde logo tratou deconcluir as obras na parte de escritrio e foi efectuando outrasobras que tinham sido acordadas, algumas inesperadas, que semostravam imperiosas em face da degradao do prdio, eposteriormente obras no definidas no contrato mas que foramefectuadas a pedido dos prprios autores, sem que outracontrapartida retirasse disso que no a ocupao do escritrio e autilizao do ptio para guarda dos veculos, sendo que na comprade materiais, servios e mo-de-obra para estas obras fez uminvestimento global que ascende a 28.974.33, montante esse emque, no mnimo, o prdio dos autores ficou valorizado e superiorquele que se tinha contratualmente obrigado a despender narealizao das obras e superior a este montante acrescido dasrendas que eventualmente tivesse que pagar no perodo de Janeirode 2005 a Junho de 2007, altura em que procedeu entrega das

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    chaves, sendo certo que se no foram efectuadas todas as obrasdefinidas no contrato celebrado, a verdade que o valor aliestipulado para as referidas obras foi largamente ultrapassado peloinvestimento efectuado, sendo inquestionvel que as partes aocontratar nos moldes que o fizeram tinham como objectivo que osmontantes que deveriam ser pagos a ttulo de renda nos anos de2001 a 2005 seriam canalizadas para a requalificao dos edifcios,sendo o valor das rendas a pagar nos anos atrs definidos o limitemximo do investimento do ru no referido prdio.Alegou, ainda, que o incumprimento do contrato se d por nica eexclusiva culpa dos autores, que ao contratarem consigo bemsabiam que o que estava implantado no terreno no coincidia deforma alguma com o que estava licenciado na Cmara Municipal eque para a realizao das obras seria necessrio apresentar umprojecto de alteraes e um projecto de licenciamento queimplicaria diversos e avultados custos, nomeadamente, comhonorrios do projectista e do tcnico responsvel peja obra, factosesses desconhecidos do ru, que na altura em que contratou com osautores era um jovem de 22 anos, sem qualquer experincia nestetipo de situaes, confiante que apenas teria que realizar as obras eposteriormente pedir as respectivas licenas, sendo que as obrasque vieram a revelar-se necessrias para requalificar o espaoultrapassavam largamente os custos estimados pelas partes, peloque, tambm por isso, o ru se sentiu desobrigado sua integralrealizao, tanto mais que ele prprio nunca pde usufruir doespao prometido arrendar, nunca tendo esperado que aps todosestes anos quase oito os autores viessem pretender querequalifique todo o espao com obras oradas em valor superior atrinta mil euros, o que configura um abuso de direito queexpressamente invocou.Mais alegou o ru, que, para alm do dinheiro que empatou narealizao das descritas obras, a situao em apreo lhe causouprejuzos de diversa monta, pois desde a data em que os autores lhedeveriam ter proporcionado o gozo do prdio at Dezembro de2006, foi obrigado a efectuar um gasto adicional no arrendamentoe posterior compra de habitao prpria e local de armazenagem,no inferior a : 200,00/ms, num total de : 14.000,00, a queacrescem os incmodos, gastos extraordinrios, perdas de tempocom deslocaes entre a sua habitao, estabelecimento comerciale local de armazenagem, a que globalmente atribuiu um valor noinferior a : 5.000,00.Os autores apresentaram rplica, na qual impugnaram os factosalegados pelo ru, pugnando pela improcedncia da reconveno,reiteraram a procedncia do pedido formulado nesta aco, nostermos referidos na petio inicial, e pediram a condenao do rucomo litigante de m f.

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    Admitida a reconveno e dispensada a realizao da AudinciaPreliminar, foi proferido despacho saneador, seguido da selecoda matria de facto, por meio da qual se alinharam os factosassentes e se organizou a base instrutria.Procedeu-se a julgamento, findo o qual, por despacho de fls. 282-301, o Tribunal proferiu a deciso sobre a matria de facto, queno foi alvo de reclamaes.Foi proferida sentena, na qual se decidiu:

    Nestes termos e com tais fundamentos, julgando a presente acoimprocedente, por no provada, este Tribunal decide absolver oru J () do pedido formulado pelos autores C (), O (), E (),M () e mulher, L ().

    Bem assim, julgando improcedente, por no provada, areconveno, este Tribunal decide absolver os reconvindos (),do pedido que nessa sede foi formulado pelo reconvinte J ().No se conformando, apelaram os autores, apresentando alegaes,onde formulam as seguintes concluses:

    A) o despacho, proferido no incio da audincia de discusso ejulgamento, em que, a requerimento do R., foram acrescentados ospontos 78-A e 78-B, viola, de forma patente, o princpio daprecluso e os arts. 511, n. 2, 153 e 145 CPC, pois que o momentoprocessual para reclamar da Base Instrutria era o prazo de 10 diasaps notificao da mesma;

    B) como tal, devem ser anulados os pontos 78-A e 78-B da BaseInstrutria e as respetivas respostas;

    C) ainda que assim no fosse sempre deveriam ter sidoconsiderados No Provados os factos constantes desses pontos78-A e 78-B, bem como do ponto 31 da Base Instrutria, pois queas nicas testemunhas indicadas a tal matria () - revelam nadasaber sobre a mesma, conforme excertos acima transcritos, outrosno havendo que, atenta a razo de cincia e o lapso temporal decontacto com o imvel (quanto ao ponto 31) ou com asnegociaes, pudessem conduzir s respostas dadas peloTribunal;

    D) tambm os pontos 54 e 55 deveriam ter sido considerados NoProvados, pois que, igualmente, nenhuma prova foi feita quantoao ponto 55 e, quanto ao ponto 54, resulta dos depoimentos que foio R. que, aquando do contrato, se deslocou ao imvel, determinouas obras a fazer e lhes atribuiu certo valor (e mostrou o contrato aadvogada e exigiu alteraes), sempre os AA. ausentes no Brasil;

    E) essas respostas colidem, alis, no s com o referido naconcluso anterior, mas, tambm, com a prova, feita nos autos, de

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    que o rs-do-cho em causa estivera arrendado, para minimercado,at fim de 1998 e com o facto de o R. ter permanecido no imvel,utilizando-o, at Junho de 2007, sem nunca de nada ter reclamadoou, sequer, comunicado aos AA.;

    F) tais respostas esto, alis, em contradio com as dadas aospontos 93 e 94 da BI;

    G) ainda os pontos 76 e 78 deveriam, ter merecido resposta deNo Provados ou, quando muito, resposta no sentido de que ostrabalhos feitos pelo R. - materiais e mo-de-obra ascenderam, apreos de 2000, a um valor mximo de 17.103,43, emconformidade com a percia, e tendo em conta as reservas damesma, o valor actual atribudo por ela e a taxa do IVA em 2000;

    H) assim, nesse sentido se impugnam todos os referidos pontos damatria de facto provada, nos termos do art. 685-B, n. 1 CPC;

    I) a douta sentena incorre em vrios equvocos ao considerar ocontrato dos autos como dois contratos, quando, na verdade, setrata de um nico contrato, informado por uma (duas) vontade(s)nica(s), em que as prestaes de ambas as partes se articulamestreitamente;

    J) na verdade, o no pagamento de rendas ao longo de quatro anosfuncionava, para o R., como a contrapartida do seu investimentoinicial e, para os AA., como o preo de no serem eles a investirdirectamente no seu imvel;

    K) assim, a promessa de arrendamento converter-se-ia,automaticamente, em arrendamento, a partir de 1 de Janeiro de2001, uma vez feitas as obras pelo R., at essa data, e por eleobtidas as licenas necessrias;

    L) a alterao das circunstncias, prevista no art. 437 do CdigoCivil, para alm de ser ulterior ao contrato, e no contemporneado mesmo, dever ser anormal, no sentido de grave, significativa,independente das partes;

    M) no patentemente o caso do R. que, porventura, ter estimadomal o valor das obras a efetuar, sendo que esse erro, a existir, contemporneo do contrato;

    N) o R. no invocou erro, nem requereu a anulao do contrato - e,de resto, tambm no invocou alterao anormal de circunstncias,nos termos e para os efeitos do art. 437 CC;

    O) s as nulidades, que no as anulabilidades so de conhecimentooficioso (arts. 286 e 287 CC);

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    P) nos termos do art. 406 do Cdigo Civil, os contratos devem serpontualmente cumpridos e s podem modificar-se ou extinguir-sepor mtuo consentimento dos contraentes ou nos casos admitidosna lei;

    Q) tinha, pois, o R. que cumprir o contrato nos seus exatos termos -e no alterando-o unilateralmente -, no constituindo qualquerabuso de direito a pretenso dos AA. do cumprimento do contrato;

    R) se abuso houvesse seria do R. (e com o acolhimento do tribunala quo) em querer obrigar os AA. a pagarem obras que nenhum oumuito reduzido valor acrescentaram ao seu prdio, deixando-oesventrado, sem condies para utilizar ou arrendar (e demandandoa concluso das obras, que o R. deveria ter feito, elevada soma);

    S) quando, por absurdo, assim se no considerasse e seequiparassem os valores gastos pelo R. e as rendas devidas,relativas aos anos de 2001 a 2004, sempre o R. deveria sercondenado a pagar as rendas e indemnizao legal relativas aoperodo de janeiro de 2005 a junho de 2007, ou seja, o pedido daalnea b) da ao;

    T) assim, a douta sentena recorrida violou, por m interpretaoou aplicao, entre outros, o disposto nos arts. 252, 287, 406 e 437do Cdigo Civil.O ru apresentou contra-alegaes, nas quais preconiza amanuteno do julgado.

    II. Do mrito do recurso1. Definio do objecto do recurso O objecto do recurso, delimitado pelas concluses das alegaes(artigo 684, n 3, e 690, ns 1 e 3, CPC), salvo questes doconhecimento oficioso (artigo 660, n 2, in fine), consubstancia-senas seguintes questes: 1) apreciao do invocado princpio daprecluso, relativamente integrao na base instrutria, dosartigos 78.-A e 78.-B; 2) apreciao da deciso da matria defacto, relativamente aos artigos 31., 78.-A, 78.-B, 54., 55., 76.e 78. base instrutria; 3) definio dos contratos celebrados entreas partes e apreciao dos pressupostos da alterao dascircunstncias invocado pelo ru e acolhido pelo tribunal nasentena sob censura.

    2. Apreciao do recurso da matria de facto.2.1. A invocada precluso da possibilidade de alterao da baseinstrutriaNa audincia de julgamento, conforme se encontra documentadona acta de fls. 254, o ru requereu o aditamento base instrutria,dos factos alegados no artigo 41. da contestao.

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    Tal aditamento foi deferido por despacho proferido em acta, quedeterminou a integrao da base instrutria dos artigos 78.-A e78.-B, com o seguinte teor:

    78-A. Ao celebrarem o acordo em causa nestes autos, as partespretenderam que os montantes que deveriam ser pagos nos anosde 2001 a 2005 fossem canalizados para a requalificao dosedifcios.

    78-B. E definiram como limite mximo do investimento do ru noreferido prdio o valor total das rendas a pagar nos anos de 2001a 2005.Na alnea A) das suas concluses, alegam os recorrentes que odespacho, proferido no incio da audincia de discusso ejulgamento, em que, a requerimento do R., foram acrescentados ospontos 78-A e 78-B, viola, de forma patente, o princpio daprecluso e os arts. 511, n. 2, 153 e 145 CPC, pois que o momentoprocessual para reclamar da Base Instrutria era o prazo de 10 diasaps notificao da mesma.Salvo o devido respeito, no assiste razo aos recorrentes sobreesta questo, como resulta, alis, da slida fundamentao dodespacho que admitiu o aditamento da base instrutria.Como refere Carlos Lopes do Rego[1], a organizao da baseinstrutria no tem eficcia preclusiva, sendo perfeitamente vivelque o tribunal, no decurso da audincia final, proceda respectivaampliao, nos termos estabelecidos nos arts. 650., n. 2 alnea f)e n. 3 e 264. - com vista a tomar atendveis, no apenas factosarticulados que, por lapso (embora no reclamado) naquela noforam includos, como inclusivamente a atender a factoscomplementares ou concretizadores, no oportunamente alegadospela parte interessada, mas atendveis nos termos estabelecidos non. 3 do art. 264., todos do Cdigo de Processo Civil. Mais refere o autor citado, que continua plenamente vlida adoutrina fixada no Assento do Supremo Tribunal de Justia, de 26de Maio de 1994, com o seguinte teor: No domnio de vignciados Cdigos de Processo Civil de 1939 e 1961 (), aespecificao, tenha ou no havido reclamaes, tenha ou nohavido impugnao do despacho que as decidiu, pode sempre seralterada, mesmo na ausncia de causas supervenientes, at aotrnsito em julgado da deciso final do litgio.A reforma do processo civil acentuou a natureza instrumental eprovisria da fase de condensao, como enfatiza o autor citado,orientando o processo com vista realizao do direito, traduzidano apuramento da verdade material (artigo 265/3 do CPC), o queseria incompatvel com a invocada precluso.No mesmo sentido, refere-se no acrdo do Supremo Tribunal de

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    Justia, de 4 de Fevereiro de 2010[2], que a questo sobre aformao do caso julgado formal relativo especificao e aoquestionrio, h muito debatida, fora resolvida, no sentidonegativo, com o Assento n 14/94, de 26 de Maio, hoje com o valorde acrdo de uniformizao de jurisprudncia, que se reportavaespecificamente especificao, no havendo razo, j na altura,para no aplicar tal doutrina ao questionrio, tese reforada com areviso do CPC, que veio realar a funo instrumental das normasprocessuais civis, para, em princpio, no prejudicarem acorrespondncia entre a deciso final e o direito substantivoadequado soluo do litgio[3].Conclui-se no referido acrdo do STJ, que qualquer das partestem toda a legitimidade para, no recurso da deciso final, fazernotar ao tribunal as omisses da especificao e do questionrio,mesmo que no tenha apresentado qualquer reclamao contra asreferidas peas processuais.Face ao exposto, bem decidiu o M. Juiz do tribunal a quo quandodeterminou o aditamento em causa base instrutria, nomerecendo tal despacho qualquer censura desta Relao,improcedendo, em consequncia, a argumentao expendida nasconcluses A) e B).

    2.2. A delimitao do recurso, feita pelos Apelantes nas suasconcluses.

    ()

    Improcede, face ao exposto, o recurso da deciso da matria defacto (concluses A) a H).

    3. Fundamentos de factoDe acordo com a deciso que antecede, so os seguintes os factosprovados nos autos:1. Em 19 de Julho de 2000, a me dos autores, (), e os prpriosautores homens, todos como proprietrios e promitentes senhorios,e o ru, como promitente arrendatrio, outorgaram um contratoescrito, relativo a um prdio urbano, sito nas ..., freguesia de ...,deste concelho, inscrito na respectiva matriz urbana sob o artigo..., a confrontar de norte com estrada (actualmente denominadaRua Rancho Folclrico As Salineiras de ...), sul com os prprios,nascente com ... e poente com estrada (actualmente denominadaRua dos Barranhos), que denominaram de Contrato de Promessade Arrendamento e Contrato de Empreitada - cf. documento defls. 27 a 31, cujo teor se d por integralmente reproduzido.2. Em 2 de Novembro de 2006, faleceu (), me dos autores, noestado de viva de () - cf. Documento de fls. 32 cujo teor se daqui por integralmente reproduzido.

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    3. Segundo as clusulas 1 e 2, do contrato mencionado em A),dos factos assentes, () e os seus filhos, C (), O (), E () eM (), prometiam dar de arrendamento ao ru, todo o rs-do-chodesse prdio, outrora destinado a comrcio de mercearias e vinhose a habitao, bem como o respectivo logradouro (ptio com cercade 120 m2), a que correspondem, como acessos, os nmeros depolcia 11 e 13 da Rua Rancho Folclrico As Salineiras de Lavase o nmero 50 da Rua dos Barranhos.4. O arrendamento referido em C), dos factos assentes, seria peloprazo de um ano, renovando-se por iguais e sucessivos perodos,com incio no primeiro dia do ms seguinte ao da concluso dasobras que o ora ru, previamente, iria realizar no prdio, e quedeveriam estar concludas no dia 31 de Dezembro de 2000, peloque o contrato de arrendamento teria inicio em 1 de Janeiro de2001. 5. O arrendamento destinava-se a habitao, escritrio, oficina earmazm de materiais de refrigerao e clima1izao da indstriahoteleira. 6. A renda a pagar pelo ora ru seria de 60.000$00 mensais no anode 2001, 65.000$00 mensais no ano de 2002, 70.000$00 mensaisno ano de 2003 e 75.000$00 mensais no ano de 2004, sendoactualizada, nos anos de 2005 e seguintes, pela aplicao doscoeficientes legais.7. Previamente, o ru obrigou-se a efectuar obras de restauro ouadaptao necessrias para que a Cmara Municipal, em vistoriaprvia a realizar, emitisse a competente licena de utilizao paraoutorga do contrato de arrendamento ficando como contrapartidadispensado de pagar as primeiras 48 (quarenta e oito) rendas,correspondentes ao perodo de 1 de Janeiro de 2001 a 31 deDezembro de 2004, no valor de Esc.: 3.240.000$00.8. Consta da clusula decima quarta do contrato supracitado emA), dos factos assentes, que o valor das obras a executar pelo ruse estima em Esc.: 3.240.000$00. 9. Os autores () ao tempo da celebrao do contrato referido emA) eram emigrantes no Brasil.-----10. As obras aludidas em G) constantes do contrato referido em A)so as seguintes: 1- construo de uma casa de banho numa dasactuais divises da habitao; 2- ampliao da parte destinada ahabitao, com construo de um novo quarto, com inerentereduo da parte destinada a comrcio; 3- construo de umescritrio sob as escadas de acesso ao 1 andar; 4- transformaode duas cozinhas numa s diviso (cozinha e sala); 5- demoliode todas as paredes interiores e telhados dos estbulos existentesno ptio; 6- nova pavimentao do ptio e sua nova cobertura emestrutura metlica; 7- construo de um canal de descargas degua na parede do fundo dos actuais estbulos e na parede do ptio

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    paralela Rua dos Barranhos; 8- aumentar, em altura, a entradaexistente pela Rua dos Barranhos, a que corresponde o nmero 50de polcia, e substituir o porto por um novo; 9- construo, noptio, de vestbulos, um balnerio e arrecadao e/ou pequenaoficina de montagens, desmontagens e ensaios de equipamentos;10- nova instalao elctrica; 11- nova instalao de gua; 12-nova rede de esgotos, nomeadamente para servir a casa de banho eo balnerio referidos, respectivamente, em 1 e 9; 13- construode uma parede nova, em tijolo, encostada existente no ptio, dolado nascente, para suporte e encaixe da estrutura base dacobertura metlica mencionada em 6; 14- construo de novasparedes em tijolo, encostadas s existentes no ptio, dos lados sul epoente ou picagem e reboco interior destas paredes; e, 15-eventual demolio da cozinha de forno existente no ptio, demolde a permitir o alargamento da entrada pela Rua dosBarranhos, nmero 50, ficando, assim, o novo porto (que pode serde correr) com o dobro da largura actual.11. Do contrato referido em A), consta ainda que o ru se obrigoua proceder limpeza e pintura exterior de todo o edifcio, isto ,no s do rs-do-cho objecto do contrato, mas tambm do 1andar e restantes partes do prdio, quer das que do para a Rua doRancho Folclrico As Salineiras de ... e Rua dos Barranhos, querdas que do para o interior do ptio - cf. clusula 13 do documentoconstante de fls. 27 a 31.12. O ru efectuou uma parte das obras acordadas e noprovidenciou pela vistoria e licenciamento camarrio.13. O ru procedeu construo de um escritrio sob as escadas deacesso ao 1. andar, conforme estipulado no contrato, ocupando-ocom o seu negcio.14. O ru derrubou as paredes divisria entre as duas cozinhas,mencionadas em J) (4).15. O ru retirou o porto da entrada existente na Rua dosBarranhos, a que corresponde o nmero 50 de polcia.16. O ru construiu a casa de banho mencionada em J) (1) e fez osesgotos para a servir.17. O ru procedeu construo de uma parede nova, em tijolo,encostada existente no ptio, do lado nascente.18. O ru manteve-se no imvel referido em A) at Junho de 2007,altura em que procedeu entrega das chaves por meio de cartaregistada ao autor C ().19. Todo o rs-do-cho do imvel encontra-se sem licena deutilizao, no podendo ser dado em arrendamento.20. O contrato mencionado em A) foi negociado entre umrepresentante dos autores e foi minutado por um advogado.21. Os autores C (), O (), E () e M () so os nicos filhosde ().

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    22. Depois de se ter instalado no local, o ru utilizou o escritrioreferido em N), e uma pequena sala a este anexa, onde guardavamercadorias do seu comrcio, bem como o espao do logradouropara estacionamento de viaturas.23. Das obras referidas em Q) ficou por colocar as loias de casade banho, o autoclismo e respectivas ligaes, deixando o ru essasloias e o autoclismo dentro de caixas, e ficou tambm a porcolocar torneiras.24. No foi efectuada a ampliao, mencionada em J) (2), da partedestinada a habitao, com construo de um novo quarto.25. O ru no efectuou nova pavimentao do ptio.26. Nem efectuou uma nova cobertura do ptio em estruturametlica.27. O ru no construiu um canal de descargas na parede do fundodos estbulos.28. O ru utilizou o porto mencionado em P) como taipal paravedar o acesso cozinha e no o substituiu por um novo.29. No procedeu construo, no ptio, de vestbulos, umbalnerio e arrecadao e/ou pequena oficina de montagens,desmontagens e ensaios de equipamentos.30. Ao nvel da instalao elctrica, o ru procedeu aplicao deum quadro elctrico e colocao de instalao elctrica noescritrio, tendo ainda aplicado um ramal de uma lmpadafluorescente na zona do comrcio, onde o contrato dearrendamento previa a execuo de um quarto.31. Para alm das infra-estruturas referidas em Q), o ru executouas infraestruturas de esgotos relativas a uma instalao sanitria deapoio ao escritrio.32. O ru no rebocou as paredes do ptio.33. Das paredes exteriores do edifcio, apenas se encontra porrebocar e pintar a nova parede do rs-do-cho que d para o ptio eserve de apoio laje da cobertura, em terrao, do ptio,encontrando-se por limpar e pintar a parede da empena, a partir dacobertura do prdio vizinho.34. Os autores ao contratarem nos termos constantes de A), O), F)e H) tinham em vista a reabilitao do prdio, para o darem dearrendamento, quer ao ru quer, findo o contrato com o mesmo, aterceiros.35. Os autores, para efectuar as obras que faltam fazer, pediram umoramento empresa ..., Lda., o qual monta em :36.848,92,acrescido de IVA.36. E outro a (), no valor de : 37.958,33, acrescido de IVA.37. O ru no pagou rendas a partir de 1 de Janeiro de 2005.38. Quando o ru iniciou as obras no locado, o seu interior estavadegradado, encontrando-se apodrecidas as janelas que o ru veio asubstituir.

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    39. Os anexos eram constitudos por estbulos abandonados, comrestos de estrume e pias.40. O advogado mencionado em U) foi contratado pelos autores.41. O ru, ao celebrar o contrato, desconhecia qual o verdadeiroestado do espao prometido arrendar, no sabendo, nomeadamente,que os interiores de algumas paredes, depois de tocados,rapidamente ruam, como veio a constatar posteriormente.42. O ru aps a assinatura do contrato iniciou as obras de limpezae lavagem do edifcio.43. E de demolio das paredes interiores dos estbulos existentes.44. Aps o referido em 32 a 34, da base instrutria, e O), dosfactos assentes, o ru foi alertado por terceiros para a necessidadede existncia de um projecto de alteraes na Cmara Municipal,bem como para a impossibilidade de licenciamento das obras e doprdio na sua falta.45. O ru tomou conhecimento de que o constante do processocamarrio no correspondia construo existente no local,existindo paredes e janelas que no estavam em conformidade comaquele processo.46. E que nem os estbulos existentes estavam legalizados, noexistindo qualquer processo de licenciamento dos mesmos.47. No existia qualquer projecto para alteraes e tal era doconhecimento dos autores.48. Sem projecto para alteraes e sem o licenciamento dosestbulos, as obras que tinham ficado estipuladas no poderiam serlicenciadas.49. Nos termos da clusula oitava do acordo referido em A), o ruficou autorizado a requerer o licenciamento das obras.50. Foi dado conhecimento do referido em 43, da base instrutria,ao representante dos autores.51. Tendo este por algumas vezes visitado o local.52. Os autores nunca apresentaram qualquer soluo, nemdemonstraram preocupao com o assunto.53. O ru concluiu as obras referidas em N) porque necessitava deespao para de imediato desenvolver a sua actividade comercial.54. E porque j tinha empatado dinheiro nas obras efectuadas.55. No escritrio o ru construiu uma parede interior, em gessocartonado (pladur), tendo revestido o cho de tal diviso aflutuante melanmico e pintado e seu interior.56. E j tinha efectuado a instalao elctrica.57. Ao longo dos tempos que permaneceu ocupando o escritrio, oru efectuou as obras acima referidas.58. Algumas dessas obras foram inesperadas e mostravam-seimperiosas em face da degradao do prdio.59. O ru efectuou, a pedido dos prprios autores, obras nodefinidas no contrato.

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    60. Quando se tentavam retirar as telhas do telhado que fazia partedos estbulos e da cozinha do forno existentes no ptio(logradouro), j com parte da parede interior construda, mais demetade dessa parede ruiu.61. Verificando-se ento que aquelas paredes no tinhamresistncia para suportar qualquer tipo de estrutura ou mesmoparedes interiores, devido ao seu estado de conservao.62. Como consequncia, o ru teve que retirar todo o entulhogerado e construir de raiz os alicerces e as trs paredes.63. Tais obras no estavam previstas mas eram necessrias emvirtude da degradao e fragilidade das paredes.64. Na parte de habitao, o ru constatou que as 4 (quatro) janelasde madeira e as portas interiores existentes se despegaram dosrespectivos aros aps a tentativa de serem abertas.65. O referido em 61, da base instrutria, originou que as paredestivessem que ser rebocadas para a assentar as novas janelas dealumnio.66. Ainda na habitao, o ru demoliu as paredes interiores earrancou o cho existente.67. O ru iniciou a construo de duas casas de banho, que nocompletou, e executou os respectivos esgotos.68. Aquando da ligao dos esgotos fossa existente, verificou-seque esta no oferecia bom escoamento.69. Pelo que foi necessrio abrir uma vala, construindo a respectivatubagem da casa at rua onde se encontra a caixa de limpeza, e,desta, para o colector camarrio.70. No espao destinado construo de mais um quarto existiaum poo.71. Atravs de um representante seu, os autores solicitaramtambm ao ru que procedesse demolio da escada que davaacesso do ptio ao 1 andar.72. Esta obra implicou, ainda, por razes de segurana, o reforoda parede, uma vez que era aquela escada que fazia a sustentaoda marquise do 1 andar.73. Como a parede mencionada em 70, da base instrutria, japresentava diversas fissuras foi necessrio fazer uma nova paredeno seguimento da parede lateral do quarto.74. Foi ainda necessrio construir uma placa de beto como tecto,servindo esta tambm de terrao marquise de 1 andar.75. Em 2006, o autor C () tomou conhecimento das obras atento realizadas.76. O ru executou a rede de esgotos e de guas para o primeiroandar.77. Na compra de materiais e servios para estas obras e nacontratao de mo-de-obra especializada, o ru despendeu25.802,96 [vinte e cinco mil, oitocentos e dois euros e noventa e

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    seis cntimos].78. Os duplicados das facturas referidas em 76, da baseinstrutria, foram entregues ao autor C (), enquantorepresentante dos autores.79. O montante indicado em 76, da base instrutria, nocontempla a mo-de-obra do ru e do seu pai, que acompanharamtodas as fases das obras efectuadas e nas quais empenharam o seutrabalho.80. Ao celebrarem o acordo em causa nestes autos, as partespretenderam que os montantes que deveriam ser pagos nos anos de2001 a 2005 fossem canalizados para a requalificao dosedifcios.81. E definiram como limite mximo do investimento do ru noreferido prdio o valor total das rendas a pagar nos anos de 2001 a2005.82. A elaborao de projectos de alteraes e de licenciamentoimplicaria custos no contemplados pelas partes aquando dacelebrao do acordo referido em A), dos factos assentes,nomeadamente, com honorrios do projectista e do tcnicoresponsvel pela obra.83. Na altura em que contratou com os autores, o ru era um jovemsem qualquer experincia neste tipo de situaes.84. O ru nunca usufruiu da parte que seria destinada a armazm eoficina do seu comrcio (estbulos) nem da habitao.85. Ao contratar com os autores da forma como o fez, o ru tinha aexpectativa de vir a estabelecer no mesmo local o seuestabelecimento comercial, respectivo armazm e o seu lar,evitando deslocaes entre uns e outros.86. A pessoa referida em U), dos factos assentes, que emrepresentao dos autores negociou o contrato, veio posteriormentea ser sogro do ru.87. E o advogado referido em U), dos factos assentes, limitou-se aescrever no contrato aquilo que lhe foi referido pelo ru e pelo seusogro, este como representante dos autores homens e sua me.88. O ru foi ao local antes de celebrar o contrato e viu o estado emque este aparentemente se encontrava.89. O ru sabia que a casa em questo era de construorelativamente antiga.

    4. Fundamentos de direito4.1. A autonomia dos contratos celebrados entre as partesAlegam os recorrentes, nas concluses I), J) e K), que a sentenarecorrida incorre no equvoco de considerar o contrato dos autoscomo dois contratos, quando, na verdade, se trata de um nicocontrato, j que o no pagamento de rendas ao longo de quatroanos funcionava, para o R., como a contrapartida do seu

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    investimento inicial e, para os AA., como o preo de no seremeles a investir directamente no seu imvel, convertendo-se apromessa de arrendamento, automaticamente, em arrendamento, apartir de 1 de Janeiro de 2001, uma vez feitas as obras pelo R., atessa data, e por ele obtidas as licenas necessrias.Afigura-se que no lhes assiste razo.Vejamos.De acordo com o ensinamento do Professor Inocncia GalvoTelles[4], os contratos mistos tm carcter unitrio, resultando dafuso de dois ou mais contratos ou de partes de contratos distintos,ou da participao num contrato de aspectos prprios de outro ououtros.[5] Em tal fuso, os elementos correspondentes a vrios tiposcontratuais agremiam-se em ordem realizao de funo socialunitria, por uma das seguintes vias: i) ou forma-se um acordo pelaconjugao de parte dos elementos de diversos contratos tpicos; ii)ou em certa espcie contratual insinuam-se ou incrustam-seelementos estranhos. Em qualquer das situaes descritas, ocorre a fuso e no o simplescmulo, sendo o contrato misto um contrato, composto pordiversos tipos contratuais.De acordo com o n. 2 do artigo 405. do Cdigo Civil, onde seconsagra a ampla autonomia da vontade contratual, os contraentespodem reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negcios.Para que os diversos elementos contratuais distintos faam parte deum nico contrato, necessrio que se integrem num processounitrio e autnomo de composio de interesses, o que dever seraferido com base em dois critrios essenciais: um centrado naunidade ou pluralidade da contraprestao, outro alicerado naunidade ou pluralidade do esquema econmico subjacente contratao.De acordo com os critrios enunciados, se s diversas prestaes acargo de uma das partes corresponde uma prestao nica dacontraparte, torna-se incontornvel a presuno de que quiseramcelebrar um s contrato. O mesmo ocorre quando na base das prestaes a que seencontram adstritas uma e outra parte, haja um esquema unitrio,um acerto de interesses, de tal modo que a parte obrigada a realizarvrias prestaes, as no queira negociar separadamente masapenas em conjunto.No que respeita s disposies legais que regem os contratosmistos, Inocncio Galvo Telles[6] refere duas teorias doutrinrias:a da absoro e a da combinao.De acordo com a primeira teoria enunciada, deve individualizar-seno contrato misto a parte preponderante, que lhe imprime carcter,

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    e enquadr-lo no tipo a que assim fundamentalmente pertence,salvas as modalidades diferenciais derivadas da presena deelementos estranhos. De acordo com a segunda, a regulamentao do contrato mistoresultar da combinada aplicao dos preceitos pertinentes aosvrios tipos em que o contrato se inspira. Prope o autor citado, a utilizao de uma ou outra teoria,casuisticamente.Vejamos agora, face ao breve enquadramento dogmtico docontrato misto, se o acordo celebrado entre as partes, emdiscusso nestes autos, se enquadra na figura doutrinria emapreo.Na situao a que se reportam os autos, como bem se refere nasentena recorrida, se os autores e o ru tivessem acordado nacedncia do gozo do imvel, a troco da realizao das obras, norestariam dvidas em qualificar o acordo, como contrato misto.Acontece, no entanto, que no caso sub judice, as partes nocelebraram um contrato de arrendamento (com adstrio dolocatrio realizao de obras no arrendado, com vista a adequ-loao fim do arrendamento), mas sim um contrato promessa dearrendamento, estipulando expressamente que o arrendamento teriao seu incio no primeiro dia seguinte ao da concluso das obras aefectuar pelo futuro locatrio.Do exposto se conclui que as partes celebraram dois contratosdistintos: um com vista realizao das obras no prdio prometidoarrendar; e outro, pressupondo a realizao dessas obras, destinado futura concesso do gozo desse imvel. As partes erigiram em condio do incio do prometidoarrendamento, a realizao das obras no local a arrendar, as quaisno foram concludas, no chegando sequer a iniciar-se oprometido contrato de arrendamento.Sem obras que viabilizassem a atribuio da licena camarria, ocontrato de arrendamento no se revelava possvel. o que resulta do (facto 19): Todo o rs-do-cho do imvel seencontra sem licena de utilizao, no podendo ser dado emarrendamento.A existncia de tal licena era condio indispensvel, nos termosdo artigo 9, do Regime do Arrendamento Urbano, aplicvel aestes autos atenta a data da celebrao do contrato que aqui sediscute (Decreto-Lei n 321-B/90 de 15 de Outubro), que dispe non. 1 do artigo 9.: S podem ser objecto de arrendamento urbanoos edifcios ou suas fraces cuja aptido para o fim pretendidopelo contrato seja atestado pela licena de utilizao, passadapela autoridade municipal competente, mediante a vistoriarealizada menos de oitos anos antes da celebrao do contrato.Como se referiu, para alm da promessa de arrendamento,

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    celebraram ainda autores e ru um outro acordo, por meio do qualo ru se obrigou a efectuar obras de restauro ou adaptaonecessrias para que a Cmara Municipal, em vistoria prvia arealizar, emitisse a competente licena de utilizao para outorgado contrato de arrendamento, ficando como contrapartidadispensado de pagar as primeiras 48 (quarenta e oito) rendas,correspondentes ao perodo de 1 de Janeiro de 2001 a 31 deDezembro de 2004, no valor de Esc.: 3.240.000$00, tendo ficadodiscriminadas no escrito onde tal acordo foi consignado.Ora, uma vez que se tratou de um acordo mediante o qual o ru seobrigou a realizar uma obra (restauro ou adaptao do imvelprometido arrendar necessrias para que a Cmara Municipal, emvistoria prvia a realizar, emitisse a competente licena deutilizao para outorga do contrato de arrendamento) mediante umpreo (a quantia de Esc.: 3.240.000$00), tal conveno pode serqualificada como um contrato de empreitada, de acordo com odisposto no artigo 1207, do Cdigo Civil.Temos assim dois contratos em presena: i) contrato deempreitada, mediante o qual o ru se obrigou a realizar uma obrade restauro ou adaptao do imvel prometido arrendar, para que aCmara Municipal, em vistoria prvia a realizar, emitisse acompetente licena de utilizao para outorga do futuro contrato dearrendamento; ii) contrato promessa de arrendamento, que seriacelebrado e vigoraria logo que realizadas as obras e emitida aindispensvel licena de utilizao.De acordo com a doutrina tradicional, os dois contratos em apreointegram o conceito de unio de contratos extrnseca.Como refere o Professor Inocncia Galvo Telles[7], dos contratosmistos, deve distinguir-se a unio de contratos, tambm chamadacoligao de contratos. No caso da unio de contratos, estes mantm-se diferenciados,conservando cada um a sua individualidade.Na expresso do autor citado, os contratos cumulam-se, no sefundem. Distingue a doutrina[8] trs espcies de unio de contratos: unioextrnseca; unio alternativa; e unio com dependncia Na unio extrnseca, o nico factor de ligao reside nacircunstncia de se celebrarem na mesma ocasio, constando porexemplo do mesmo escrito. Na unio com dependncia, h entre os contratos um vnculotraduzido no facto de a validade e vigncia de um contratodepender da validade e vigncia do outro[9]. Na unio alternativa, so celebrados dois contratos, em termos taisque, conforme ocorra ou no certo evento, assim se considerarcelebrado apenas um deles.

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    Na situao sub judice, estamos perante dois contratos distintos,verificando-se a unio extrnseca, na medida em que foramcelebrados entre as mesmas partes, na mesma ocasio econsignados no mesmo escrito.Improcedem as concluses I), J) e K).

    4.2. A inviabilidade da pretenso dos autores, face provaproduzida, equidade e aos limites decorrentes do abuso dedireito Nas concluses L) a R), alegam os recorrentes que no severificam os pressupostos da alterao das circunstncias, previstosno art. 437 do Cdigo Civil, que o recorrido no invocou erro, nemrequereu a anulao do contrato e s as nulidades, que no asanulabilidades so de conhecimento oficioso, e que de acordo como art. 406. do Cdigo Civil, os contratos devem ser pontualmentecumpridos, pelo que o recorrido o deveria ter cumprido nos seusexactos termos, no se verificando a limitao do abuso de direito.Vejamos.No que concerne ao contrato de empreitada celebrado entre aspartes, do mesmo emergem na esfera do dono da obra (autores) osseguintes direitos: obteno de um resultado, ou seja, o direito aque, no prazo acordado, lhe seja entregue uma obra; fiscalizao daobra, sem que, no entanto, exista qualquer subordinao jurdica doempreiteiro para com o dono da obra.Correspectivamente, impendem sobre o dono da obra os deveres deprestao do preo, obrigao principal do dono da obra, fazendo aretribuio parte da noo legal de empreitada; colaboraonecessria com o empreiteiro, a fim de que este possa executar aobra a que se obrigou; e aceitao da obra, desde que a mesmatenha sido executada sem defeitos e nos termos acordados.Em contrapartida, sobre o empreiteiro recaem os deveres derealizao da obra, em conformidade com o convencionado e semvcios; fornecimento de materiais e utenslios; conservao dacoisa; e entrega da coisa.Os sujeitos do contrato de empreitada sub iudice so os autores e oru, aqueles como donos da obra e este como empreiteiro, sendo aobra o resultado da actividade a que o ru se obrigou e queconsistiu na execuo dos trabalhos de restauro ou adaptao doimvel prometido arrendar necessrias para que a CmaraMunicipal, em vistoria prvia a realizar, emitisse a competentelicena de utilizao para outorga do contrato de arrendamento,sendo o preo o quantitativo pecunirio que foi acordado porautores e ru aquando da celebrao do contrato, a saber, Esc.3.240.000$00, que seria pago custa das primeiras 48 (quarenta eoito) rendas, correspondentes ao perodo de 1 de Janeiro de 2001 a31 de Dezembro de 2004.

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    De harmonia com o disposto no artigo 406, nmero 1, do CdigoCivil, invocado pelos recorrentes, os contratos devem serpontualmente cumpridos, sendo certo que o devedor cumpre aobrigao quando realiza a prestao a que est vinculado, nostermos do n. 1 do artigo 762 do Cdigo Civil.Resulta dos factos provados que o ru no realizou a totalidade dasobras a que se obrigou, mas apenas uma parte delas.Ora, nos termos do artigo 1208, do Cdigo Civil, o empreiteirodeve executar a obra em conformidade com o que foiconvencionado, e sem vcios que excluam ou reduzam o valor dela,ou a sua aptido para o uso ordinrio ou previsto no contrato.Decorre do citado normativo, que o cumprimento se ter pordefeituoso quando a obra tenha sido realizada com deformidadesou com vcios, impendendo sobre o empreiteiro o dever deexecutar uma obra isenta de defeitos. Sobre o empreiteiro, impende tambm a obrigao de eliminar osdefeitos de que a obra feita eventualmente padea, assentando talobrigao na responsabilidade contratual pelo no cumprimento oupelo cumprimento defeituoso do contrato.Tal responsabilidade do empreiteiro cessa, todavia, nos termos doartigo 1219, do Cdigo Civil, no caso de o dono da obra a teraceitado sem reserva, com conhecimento dos vcios, presumindo-se conhecidos os defeitos aparentes, tenha ou no havidoverificao da obra.No caso em apreo, o ru no provou que tenha havido aceitaoda obra, sem reserva.Alegou, todavia, o ru e ficou provado que, ao celebrar o contrato,desconhecia qual o verdadeiro estado do espao prometidoarrendar, no sabendo, nomeadamente, que os interiores dealgumas paredes, depois de tocados, rapidamente ruam, como veioa constatar posteriormente.Com relevncia nesta sede, provou-se que:

    38. Quando o ru iniciou as obras no locado, o seu interior estavadegradado, encontrando-se apodrecidas as janelas que o ru veio asubstituir.

    41. O ru, ao celebrar o contrato, desconhecia qual o verdadeiroestado do espao prometido arrendar, no sabendo, nomeadamente,que os interiores de algumas paredes, depois de tocados,rapidamente ruam, como veio a constatar posteriormente.

    44. Aps o referido em 32 a 34, da base instrutria, e O), dosfactos assentes, o ru foi alertado por terceiros para a necessidadede existncia de um projecto de alteraes na Cmara Municipal,bem como para a impossibilidade de licenciamento das obras e doprdio na sua falta.

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    45. O ru tomou conhecimento de que o constante do processocamarrio no correspondia construo existente no local,existindo paredes e janelas que no estavam em conformidade comaquele processo.

    46. E que nem os estbulos existentes estavam legalizados, noexistindo qualquer processo de licenciamento dos mesmos.

    47. No existia qualquer projecto para alteraes e tal era doconhecimento dos autores.

    48. Sem projecto para alteraes e sem o licenciamento dosestbulos, as obras que tinham ficado estipuladas no poderiam serlicenciadas.

    50. Foi dado conhecimento desse facto ao representante dosautores.

    51. Tendo este por algumas vezes visitado o local.

    52. Os autores nunca apresentaram qualquer soluo, nemdemonstraram preocupao com o assunto.

    58. Algumas dessas obras foram inesperadas e mostravam-seimperiosas em face da degradao do prdio.

    59. O ru efectuou, a pedido dos prprios autores, obras nodefinidas no contrato.

    60. Quando se tentavam retirar as telhas do telhado que fazia partedos estbulos e da cozinha do forno existentes no ptio(logradouro), j com parte da parede interior construda, mais demetade dessa parede ruiu.

    61. Verificando-se ento que aquelas paredes no tinhamresistncia para suportar qualquer tipo de estrutura ou mesmoparedes interiores, devido ao seu estado de conservao.

    62. Como consequncia, o ru teve que retirar todo o entulhogerado e construir de raiz os alicerces e as trs paredes.

    63. Tais obras no estavam previstas mas eram necessrias emvirtude da degradao e fragilidade das paredes.

    64. Na parte de habitao, o ru constatou que as 4 (quatro) janelasde madeira e as portas interiores existentes se despegaram dosrespectivos aros aps a tentativa de serem abertas.

    65. O referido em 61, da base instrutria, originou que as paredestivessem que ser rebocadas para a assentar as novas janelas dealumnio.

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    66. Ainda na habitao, o ru demoliu as paredes interiores earrancou o cho existente.

    67. O ru iniciou a construo de duas casas de banho, que nocompletou, e executou os respectivos esgotos.

    68. Aquando da ligao dos esgotos fossa existente, verificou-seque esta no oferecia bom escoamento.

    69. Pelo que foi necessrio abrir uma vala, construindo a respectivatubagem da casa at rua onde se encontra a caixa de limpeza, e,desta, para o colector camarrio.

    70. No espao destinado construo de mais um quarto existiaum poo.

    71. Atravs de um representante seu, os autores solicitaramtambm ao ru que procedesse demolio da escada que davaacesso do ptio ao 1 andar.

    72. Esta obra implicou, ainda, por razes de segurana, o reforoda parede, uma vez que era aquela escada que fazia a sustentaoda marquise do 1 andar.

    73. Como a parede mencionada em 70, da base instrutria, japresentava diversas fissuras foi necessrio fazer uma nova paredeno seguimento da parede lateral do quarto.

    74. Foi ainda necessrio construir uma placa de beto como tecto,servindo esta tambm de terrao marquise de 1 andar.

    75. Em 2006, o autor C () tomou conhecimento das obras atento realizadas.

    76. O ru executou a rede de esgotos e de guas para o primeiroandar.

    77. Na compra de materiais e servios para estas obras e nacontratao de mo-de-obra especializada, o ru despendeu25.802,96 [vinte e cinco mil, oitocentos e dois euros e noventa eseis cntimos].

    78. Os duplicados das facturas referidas em 76, da baseinstrutria, foram entregues ao autor C (), enquantorepresentante dos autores.

    79. O montante indicado em 76, da base instrutria, nocontempla a mo-de-obra do ru e do seu pai, que acompanharamtodas as fases das obras efectuadas e nas quais empenharam o seutrabalho.

    80. Ao celebrarem o acordo em causa nestes autos, as partes

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    pretenderam que os montantes que deveriam ser pagos nos anos de2001 a 2005 fossem canalizados para a requalificao dosedifcios.

    81. E definiram como limite mximo do investimento do ru noreferido prdio o valor total das rendas a pagar nos anos de 2001 a2005.

    82. A elaborao de projectos de alteraes e de licenciamentoimplicaria custos no contemplados pelas partes aquando dacelebrao do acordo referido em A), dos factos assentes,nomeadamente, com honorrios do projectista e do tcnicoresponsvel pela obra.

    83. Na altura em que contratou com os autores, o ru era um jovemsem qualquer experincia neste tipo de situaes.

    84. O ru nunca usufruiu da parte que seria destinada a armazm eoficina do seu comrcio (estbulos) nem da habitao.

    88. O ru foi ao local antes de celebrar o contrato e viu o estado emque este aparentemente se encontrava.

    89. O ru sabia que a casa em questo era de construorelativamente antiga.Como se refere na sentena recorrida, os factos provadosdemonstram, ainda, que o verdadeiro estado do locado e a extensodas obras de restauro que o mesmo reclamava eram desconhecidospor todos os contraentes, s assim se compreendendo, presumindo-se autores e ru de boa f, que tenham fixado na mdica quantia deEsc.: 3.240.000$00 (pouco mais de quinze mil euros) o valor dasobras a realizar pelo ru, concluso esta ancorada no facto de,como ficou provado, na compra de materiais e servios para asobras que efectuou no locado (e que ficaram aqum dascontratualmente previstas) e na contratao de mo-de-obraespecializada, o ru ter despendido 25.802,96 [vinte e cinco mil,oitocentos e dois euros e noventa e seis cntimos] e, bem assim, nacircunstncia de, como provado tambm ficou, para efectuar asobras que faltam fazer, os autores terem pedido um oramento empresa ..., Lda., o qual monta em : 36.848,92, acrescido de IVA,e outro a (), no valor de 37.958,33, acrescido de IVA.Ou seja, o valor efectivamente gasto pelo ru nas obras querealizou no locado (e que ficaram aqum das contratualmenteprevistas) e o valor que ser necessrio para terminar as obrasacordadas, nos termos previstos no contrato, mostramefectivamente que o estado do imvel a arrendar foi mal avaliadoaquando da celebrao do contrato, o que conduziu a umasubavaliao da extenso das obras necessrias e do seu valor -

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    artigo 349, do Cdigo Civil.Isto j para no falar do desconhecimento patenteado (uma vezmais se presumindo autores e ru de boa f) quanto aosprocedimentos a seguir com vista ao licenciamento das obrasacordadas, sendo certo que, como provado ficou, a elaborao deprojectos de alteraes e de licenciamento implicaria custos nocontemplados pelas partes aquando da celebrao do acordoreferido em A), dos factos assentes, nomeadamente, comhonorrios do projectista e de tcnico responsvel pela obra.Assim, tendo ficado provado que ao celebrarem o acordo em causanestes autos, as partes pretenderam que os montantes que deveriamser pagos nos anos de 2001 a 2005 fossem canalizados para arequalificao dos edifcios e definiram como limite mximo doinvestimento do ru no referido prdio o valor total das rendas apagar nos anos de 2001 a 2005, conclui-se na sentena recorrida,que o desconhecimento revelado sobre os elementos referidos, queconstituram a base do negcio, integra uma situao de erro.Ao referido erro aplicvel, nos termos do artigo 252, nmero 2,do Cdigo Civil, o disposto sobre a resoluo ou modificao docontrato por alterao das circunstncias vigentes no momento emque o negcio foi concludo.Contrariamente ao que os recorrentes alegam, a abordagem aoinstituto referido (alterao das circunstncias), no efectuada nasentena como fundamento legitimador da resoluo contratual,mas antes como fundamento de anulao do contrato, por expressaremisso do n. 2 do artigo 252. do CC.Ou seja, tendo-se provado a verificao dos pressupostos do erro-vcio, o contrato em causa poderia ser anulado, mas noresolvido[10].Com efeito, e como adverte Inocncio Galvo Telles[11], adisposio do artigo 252., n. 2, do Cdigo Civil no pode sertomada letra, na medida em que, ocupando-se do erro dodeclarante sobre as circunstncias que constituem a base donegcio, manda aplicar a esse erro o disposto [nos artigos 437. a439. do CC] sobre a resoluo ou modificao do contrato poralterao das circunstncias vigentes no momento em que onegcio foi concludo, sendo bvio no poder estender-se a umasituao de invalidade, como a gerada por erro, um regime quesupe a celebrao vlida de um contrato, limitando-se a regular asvicissitudes futuras que este poder sofrer merc da alterao dascircunstncias em cujo contexto tal celebrao ocorreu. Um negcio afectado por erro, vcio intrnseco, est sujeito aanulao e no a resoluo.Como se refere na douta sentena sob censura, da conjugao dosartigos 252., n. 2, e 437., do Cdigo Civil, resulta que arelevncia do erro invocado pelo ru, como causa de anulao, est

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    dependente de a exigncia das obrigaes assumidas pelas partesno contrato em apreo afectar gravemente os princpios da boa f eno estar coberta pelos riscos prprios do contrato.Atenta a disparidade dos valores previstos para a realizao dasobras acordadas, o valor que o ru efectivamente despendeu narealizao de apenas parte dessas obras e os montantes que semostram necessrios para as concluir, entendeu o Tribunal a quo,que a exigncia do cumprimento daquele contrato afecta grave eefectivamente os princpios da boa f e no est coberta pelosriscos prprios do contrato.Mais se entendeu na sentena sob recurso, que por essa razo, ocontrato poderia ser anulado, a tal no obstando o facto de terdecorrido mais de um ano sobre o conhecimento do erro, uma vezque o contrato em apreo ainda no foi integralmente cumprido[artigo 287./2 CC]. Todavia, no tendo o ru invocado expressamente tal anulabilidade(mas apenas a situao de erro que a determina), no pde amesma ser atendida na sentena sob censura, por no ser passvelde declarao ex officio [artigo 287./1CC].Em suma, contrariamente ao que alegam os recorrentes nasconcluses N) e O), o tribunal recorrido no conheceuoficiosamente da anulabilidade decorrente do erro, cujospressupostos fcticos se provaram.No o fez, nem o poderia ter feito.O caminho seguido pelo tribunal a quo, foi outro: considerou que,ao invs do que ocorre com a anulao, pode verificar-se a meramodificao do negcio segundo juzos de equidade, tal comodispe o artigo 437, do Cdigo Civil e, diversamente do queocorre com a anulao, esta modificao j no est dependente deexpressa invocao das partes, que apenas tero que carrear osuporte fctico necessrio ao preenchimento dos pressupostosprevistos nas normas acima citadas.Com o devido respeito, no podemos acolher nesta parte, aargumentao expendida na sentena recorrida.Com efeito, a modificao do contrato com fundamento naalterao das circunstncias, prevista no artigo 437. do CdigoCivil, tambm no susceptvel de conhecimento oficioso, notendo o ru invocado expressamente o instituto jurdico com causa.[12]Vejamos o percurso seguido na douta sentena recorrida.Traduzindo-se a equidade na justia do caso concreto, tendo emconta a vontade hipottica das partes e a boa f, conclui o tribunala quo, que de acordo com tal critrio, se as partes tivessem previstoo erro em que incorreram, agindo de boa f, teriam acordado emque fosse descontado nos montantes devidos a ttulo de rendas oude compensao pela ocupao do local prometido arrendar (no

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    caso de, como veio a suceder, no chegarem a reunir-se ascondies necessrias ao incio do arrendamento), o valor total dasobras ali realizadas pelo ru.Conclui-se na sentena, equacionando assim os valoresreciprocamente devidos, de acordo com o enunciado critrio deequidade e com as regras da boa f:1) Considerando os valores das rendas estipulados pelas partespara o prometido arrendamento (valor que, por o arrendamento seno ter efectivado, nos termos acima referidos, o tribunalconsiderar como compensao pela ocupao do local prometidoarrendar) e atendendo a que o ru esteve no local arrendado atJunho de 2007, aos autores seria devida, como compensao pelaocupao do espao prometido arrendar no mbito do contrato-promessa de arrendamento, a quantia global de : 27.410,75 (:16.161,05, correspondente ao perodo compreendido entre Janeirode 2001 e Dezembro de 2004 + :11.249,70, correspondente aoperodo compreendido entre Janeiro de 2005 e Junho de 2007).2) Esse valor mostra-se totalmente compensado pelos montantesdespendidos pelo ru nas obras que efectuou no local prometidoarrendar, uma vez que, ao valor gasto com materiais e mo-de-obraespecializada (: 25.802,96), haver que fazer acrescer o valor daprpria mo-de-obra do ru e do seu pai, mostrando-se justa eequitativa a atribuio, a esse ttulo, da quantia de : 1.607,79.Em suma, na perspectiva do tribunal recorrido, mostrando-se aexigncia do cumprimento do contrato em apreo, pretendida pelosautores com a presente aco, altamente ofensiva dos princpios daboa f e no compreendida pelos riscos prprios do contrato,operando-se a modificao daquele contrato segundo juzos deequidade, nos termos permitidos pelas disposies conjugadas dosartigos 252, nmero 2 e 437, do Cdigo Civil, chega-se concluso de que ao ru nada mais devido, no mbito do contratode empreitada celebrado, para alm dos montantes despendidos nasobras que realizou no local prometido arrendar.Da concluso enunciada, decorreria assim a improcedncia dopedido formulado pelos autores no sentido da condenao do runa realizao da totalidade das obras acordadas bem como nopagamento das rendas relativas ao perodo compreendido entreJaneiro de 2005 e Junho de 2007, e respectiva indemnizao, bemcomo, por maioria de razo, no pagamento das rendas que osautores normalmente receberiam entre Julho de 2007 at efectivaexecuo das obras (o pagamento da totalidade da compensaodevida pela ocupao naquele perodo foi alcanado custa dovalor das obras efectuadas no locado e que o deixaram beneficiadoem valor equivalente).Da mesma concluso decorreria igualmente improcedncia dopedido subsidirio, uma vez que, como se constatou, os montantes

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    efectivamente despendidos pelo ru nas obras que realizou no localprometido arrendar so suficientes para cobrir os montantes queaos autores seriam devidos como compensao pela ocupaodesse local.E mesma concluso chega a sentena recorrida, analisando apretenso dos autores sob o prisma do abuso do direito,expressamente invocado pelo ru na sua contestao.Acolhemos a soluo consignada na sentena recorrida, no que sereporta concluso a que chegou, baseada no instituto do abuso dodireito, rejeitando-a na parte em que alicera tal concluso,tambm na figura da modificao do contrato por alterao dascircunstncias, enunciada no artigo 334. do Cdigo Civil[13].Debrucemo-nos agora sobre o instituto do abuso de direito.Registe-se que constitui entendimento pacfico nos tribunaissuperiores, que, verificando-se os pressupostos do instituto doabuso de direito (art. 334. CC), ainda que o mesmo no tenha sidoinvocado pela parte que dele se pode prevalecer, por estar emcausa um interesse de ordem pblica, o mesmo de conhecimentooficioso[14].Como referem Pires de Lima e Antunes Varela[15], com base noabuso de direito, o lesado pode requerer o exerccio moderado,equilibrado, lgico, racional do direito que a lei confere a outrem.Referem ainda os mesmos autores[16], que A ilegitimidade doabuso de direito tem as consequncias de todo o acto legtimo:pode levar obrigao de indemnizar; nulidade, nos termosgerais do artigo 294.; legitimidade de oposio; ao alongamentode um prazo de prescrio ou de caducidade., no entanto, o Professor Almeida Costa[17] quem melhorenuncia as consequncias da verificao do abuso de direito,deixando a sua definio ao critrio do julgador, orientada pelaequidade (justia do caso concreto), e definida em funo daespecificidade da situao sob julgamento.Escreve o autor citado:

    E passemos s consequncias do abuso do direito. O legisladorno as indica. Somente declara ilegtimo, no art. 334., ocomportamento qualificado como tal. Verificar-se-o, emdecorrncia, os efeitos de qualquer acto ilegtimo.

    Conclui-se, sintetizando, que pertence ao juiz determinar, caso porcaso, segundo os referidos critrios, no apenas se existe um actoabusivo, mas ainda as consequncias sancionatrias que delederivam. Algumas vezes, haver lugar a restaurao natural,nomeadamente atravs da remoo do que se fez com abuso dedireito; ao passo que, outras vezes, ocorrer to-s indemnizaopecuniria dos danos. Alm desta responsabilidade civil, podero

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    verificar-se sanes de vria ordem, visando impedir que o autordo acto abusivo obtenha ou conserve as respectivas vantagens.Exemplifica-se: por um lado, com a nulidade, anu1abilidade,inoponibilidade ou resolubilidade, nos termos gerais,[18] doprprio acto ou negcio abusivo; por outro lado, com orestabelecimento de actos ou negcios conexionados, recusando-se a aco de anulao, concedendo-se a excepo de doloexceptio doli, etc.[19]Face ao apontamento doutrinrio transcrito, perante a verificaopelo julgador, dos pressupostos do instituto do abuso de direito,fica legitimada a modificao do contrato[20], a determinar deacordo com os juzos de equidade previstos, nomeadamente, no n.2 do artigo 437. do Cdigo Civil.Somos assim chegados mesma concluso, por dois caminhosdiferentes.Provou-se que: 41. O ru, ao celebrar o contrato, desconhecia qualo verdadeiro estado do espao prometido arrendar, no sabendo,nomeadamente, que os interiores de algumas paredes, depois detocados, rapidamente ruam, como veio a constatar posteriormente;44. o ru desconhecia e foi alertado por terceiros para anecessidade de existncia de um projecto de alteraes na CmaraMunicipal, bem como para a impossibilidade de licenciamento dasobras e do prdio na sua falta; 45. o ru tomou conhecimento deque o constante do processo camarrio no correspondia construo existente no local, existindo paredes e janelas que noestavam em conformidade com aquele processo; 47. a inexistnciade projecto para alteraes era apenas do conhecimento dosautores; 48. sem projecto para alteraes e sem o licenciamentodos estbulos, as obras que tinham ficado estipuladas no poderiamser licenciadas; 52. Os autores nunca apresentaram qualquersoluo, nem demonstraram preocupao com o assunto; 61. smais tarde o ru verificou que as paredes no tinham resistnciapara suportar qualquer tipo de estrutura ou mesmo paredesinteriores, devido ao seu estado de conservao; 82. a elaboraode projectos de alteraes e de licenciamento implicaria custos nocontemplados pelas partes aquando da celebrao do acordo; 83.Na altura em que contratou com os autores, o ru era um jovemsem qualquer experincia neste tipo de situaes.Perante esta factualidade, salvo o devido respeito, no se vislumbracomo poderia exigir-se ao ru a integral execuo das obras (quese provou serem inviveis face ausncia de projecto de alteraese de licenciamentos anteriores), sem que se excedessemanifestamente os limites impostos pela boa f, pelos bonscostumes ou pelo fim social e econmico do direito invocado.Perante a mesma factualidade, no se vislumbra tambm a

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    viabilidade de procedncia do pedido subsidirio, face equivalncia das prestaes (obras realizadas e rendas devidas),demonstrada supra.Como se conclui na douta sentena recorrida, no caso em apreo osalutar equilbrio dos interesses em jogo (de acordo com aequidade e a boa f), apenas se alcana, neutralizando a pretensodos autores de exigirem do ru a realizao de mais obras, paraalm daquelas que efectivamente efectuou no locado,considerando-se autores e rus inteiramente compensados com oque na execuo do contrato efectivamente prestaram e deixandona esfera de uns e outro o prejuzo que este contrato lhes veio acausar (quanto aos autores, o prejuzo de no terem ficado com oprdio inteiramente restaurado e com a necessria licena deutilizao; quanto ao ru, o prejuzo de no ter podido retirar dolocal prometido arrendar todas as suas virtualidades e, por certo,ningum de boa f dir que se no retirou do prdio tais utilidadesfoi porque no fez as obras acordadas, pois que se mostrainexigvel ao ru a realizao de quaisquer obras a partir domomento em que se constata a insuficincia do valor acordadopara garantir a realizao das obras estipuladas).Decorre do exposto o naufrgio da pretenso dos autores, orarecorrentes.Revela-se assim, salvo o devido respeito, claramente improcedenteo recurso, tambm quanto s concluses L) a T).

    III. DecisoCom fundamento no exposto, acordam os Juzes desta Relao emjulgar totalmente improcedente o recurso, ao qual se negaprovimento, confirmando assim a douta deciso recorrida.Custas do recurso pelos Apelantes. *

    Carlos Querido ( Relator )Pedro MartinsVirglio Mateus

    [1] Comentrios ao Cdigo de Processo Civil, Almedina, 2.edio, 2004, Volume I, pg. 446 e 447.[2] Proferido no Processo n. 155/04.5TBFAF.G1.S1, acessvel emhttp://www.dgsi.pt [3] No mesmo sentido - de que a elaborao da base instrutria noconstitui caso formal - veja-se o acrdo da Relao de Lisboa, de13.10.2009, proferido no Processo n. 9181/06-1, acessvel emhttp://www.dgsi.pt[4] Manual dos Contratos em Geral, Refundido e Actualizado,

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    Coimbra Editora, pgina 469.[5] Vide, sobre este tema, o acrdo do STJ, de 12.09.2009,proferido no Processo n. 09B0210, acessvel emhttp://www.dgsi.pt [6] Direito das Obrigaes, 7. edio, Coimbra Editora, pg. 86.[7] Manual dos Contratos em Geral, Refundido e Actualizado,Coimbra Editora, pgina 476.[8] Inocncio Galvo Telles, ob. cit., pg. 476.[9] o caso do arrendamento dependente do contrato de trabalho a entidade empregadora cede habitao ao trabalhador, enquantoeste mantiver o vnculo laboral. [10] Sendo certo tambm, que o ru pede que se declare oincumprimento do contrato junto aos autos e celebrado entre aspartes, por culpa exclusiva dos AA., no formulando o pedido deresoluo contratual baseado na alterao das circunstncias,previsto no art. 437/1 CC, o que s poderia ser feito mediantetransaco preventiva ou extrajudicial, em caso de acordo e nostermos dos artigos 1248. e seguintes do CC, ou em aco judicial Inocncio Galvo Telles, Manual dos Contratos em Geral,Coimbra Editora, pg. 345.[11] Manual dos Contratos em Geral, Refundido e Actualizado,Coimbra Editora, pgina 343.[12] No sentido de que a resoluo ou a modificao do contratocom base no instituto previsto no artigo 437. do Cdigo Civil temque ser requerida em juzo, no sendo de conhecimento ex officio,veja-se Mrio Jlio de Almeida Costa, Direito das Obrigaes, 4.edio, pg. 234.[13] Pela nica razo, j referida, da inviabilidade de apreciao exofficio da modificao do contrato por alterao das circunstncias.[14] Nesse sentido, vejam-se os seguintes acrdos: Ac. STJ, de 25de Novembro de 1999, CJ, Acs. STJ, Ano VII, Tomo 3, 1999, pg.124, e acrdo deste tribunal, de 22.01.2008, Proc. 665/1998.C1,acessvel em http://www.dgsi.pt.[15] Cdigo Civil Anotado, 4. edio, Volume 1., pg. 300[16] Ob. cit., pg. 299.[17] Mrio Jlio de Almeida Costa, Direito das Obrigaes, 4.edio, pg. 58.[18] Sublinhado nosso.[19] Almeida Costa cita Cunha de S, que por sua vez indicaoutras possveis consequncias do abuso de direito, tais como: opedido de omisso do exerccio abusivo do direito, a admisso delegtima defesa contra o acto abusivo, a atribuio ao devedor dafaculdade de requerer a fixao judicial de prazo, etc.

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    [20] O professor citado entende que pode justificar mesmo aresoluo.