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Pró-Reitoria de Graduação Curso de Psicologia Trabalho de Conclusão de Curso UM OLHAR PROBLEMATIZADOR DIANTE DOS MOTIVOS PARA O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES Autor: Adriana Gomes Aguiar Orientador: Dr. Benedito Rodrigues dos Santos Brasília - DF 2012

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Pr-Reitoria de GraduaoCurso de PsicologiaTrabalho de Concluso de CursoUM OLHAR PROBLEMATIZADOR DIANTE DOS MOTIVOS PARA O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL DE CRIANAS E ADOLESCENTESAutor: Adriana Gomes Aguiar Orientador: Dr. Benedito Rodrigues dos SantosBraslia - DF2012

ADRIANA GOMES AGUIAR

UM OLHAR PROBLEMATIZADOR DIANTE DOS MOTIVOS PARA O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL DE CRIANAS E ADOLESCENTES

Monografia apresentada ao curso de graduao em Psicologia da Universidade Catlica de Braslia, como requisito parcial para obteno de Ttulo de Bacharel em Psicologia.

Orientador: Dr. Benedito Rodrigues dos Santos

Braslia2012

Monografia de autoria de Adriana Gomes Aguiar, intitulada UM OLHAR PROBLEMATIZADOR DIANTE DOS MOTIVOS PARA O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL DE CRIANAS E ADOLESCENTES, apresentada como requisito parcial para obteno de grau de Bacharel em Psicologia da Universidade Catlica de Braslia, em ___/____/________, defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:

____________________________________________________________Prof. Dr. Benedito Rodrigues dos SantosPsicologia Orientador

___________________________________________________________ Prof.(a) Sandra EniPsicologia UCB

Braslia2012

RESUMO

AGUIAR, Adriana Gomes. Um olhar problematizador diante dos motivos para o acolhimento institucional de crianas e adolescentes. 55 fls. Psicologia Universidade Catlica de Braslia, Taguatinga, 2012.

Este trabalho tem por objeto problematizar as explicaes sobre as causas e/ou os motivos do acolhimento institucional de crianas e adolescentes, particularmente por meio do exame da literatura tcnico-acadmica sobre a temtica. Para alcanar tal finalidade inicia-se traando um panorama da evoluo paradigmtica da assistncia social a crianas e adolescentes no Brasil que parte da ideia de recolhimento para a concepo de acolhimento. Analisam-se as polticas pblicas direcionadas garantia do direito fundamental destas a convivncia familiar e comunitria e chega-se a concluso que muitas aes so planejadas para evitar a recorrncia dessa realidade. Entretanto com a reviso da literatura sobre os motivos que resultam na medida de acolhimento institucional, surgem questionamentos e problematizaes que apontam para a baixa capacidade explanatria desses estudos por serem demasiado descritivos e pouco analticos ou reflexivos sobre o fenmeno em questo. Alm disso, a literatura evidencia a dificuldade das polticas no plano prtico da assistncia. Finaliza-se o trabalho abordando brevemente algumas hipteses sobre a vivncia afetiva nas famlias que possuem membros sob a medida protetiva em debate. Chega-se a concluso que urgente a necessidade de estudos mais qualitativos, holsticos e reflexivos sobre o acolhimento institucional de crianas e adolescentes a fim de melhor compreenso e atuao mais assertiva nesse contexto.

Palavras-chave: Assistncia social. Polticas pblicas. Convivncia familiar e comunitria. Motivos para o acolhimento institucional. Afeto.

ABSTRACT

SUMRIOINTRODUO1. DO RECOLHIMENTO AO ACOLHIMENTO: A EVOLUO PARADIGMTICA NA ASSISTNCIA S CRIANAS E AOS ADOLESCENTES EM SITUAO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL92. UM RETRATO DAS POLTICAS NACIONAIS DIRECIONADAS AO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL133. O DEBATE SOBRE OS MOTIVOS DO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NA LITERATURA ESPECIALIZADA164. OS PROBLEMAS EXPLANATRIOS DOS MOTIVOS PARA O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL DE CRIANAS E ADOLESCENTES NO BRASIL.204.1. A AUSNCIA DOS PAIS OU RESPONSVEIS204.2. ABANDONO OU ENTREGA VOLUNTRIA214.4. VIOLNCIAS234.5. EXPLORAO NO TRABALHO OU MENDICNCIA E EXPLORAO SEXUAL244.6. NEGLIGNCIA254.7. SITUAO DE RUA265. O PARADIGMA DA POBREZA E O LUGAR DO AFETO NAS FAMLIAS DE CRIANAS E ADOLESCENTES ACOLHIDOS28REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS33ANEXO 1 38ANEXO 240ANEXO 342

INTRODUO

Este trabalho tem por objeto problematizar as explicaes sobre as causas e/ou os motivos do acolhimento institucional de crianas e adolescentes, particularmente por meio do exame da literatura tcnico-acadmica sobre a temtica.De recolhimento, no Cdigo de 1927, a acolhimento institucional no Estatuto da Criana e do Adolescente a colocao de crianas em abrigos se transformou em um direito e uma medida de proteo de carter excepcional. O ECA terminante em determinar que pobreza no deve ser motivo de abrigamento. Obedecendo ou contrariando as normativas para o acolhimento institucional o Brasil possui hoje mais de 50 mil crianas/adolescentes em abrigos, desafiando o direito a convivncia familiar e comunitria. A literatura sobre acolhimento institucional baseada em evidencia vem aumentando consideravelmente nos ltimos anos. Dentre os exemplos mais destacados esto o levantamento realizado pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada IPEA (2004) em 589 abrigos da rede SAC espalhados pelo Brasil e a pesquisa Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome em andamento desde 2009, a qual j identificou 2.400 instituies no pas.Uma parte considervel dessa literatura est voltada a caracterizao do perfil da criana ou adolescente acolhido e das condies desse acolhimento a nvel municipal ou em instituies especficas. neste contexto que alguns estudos elencam os motivos de acolhimento institucional como, por exemplo Silva (2004), Serrano (2008), Brunetto (2011), Janczura (2008), Cavalcante, Magalhes e Pontes (2007). Esses estudos buscam discutir as causas dessa questo social e o fazem elencando uma gama variada de motivos individualizados na modalidade check list, de maneira descritiva, muito pouco dialtica ou pouco sistmica. No mostram a necessria articulao ou combinao entre eles que resultam na aplicao da medida de proteo. A simples problematizao desses motivos pode contribuir para subsidiar o seu potencial explicativo e para construir novos reagrupamentos de categorias explicativas, as quais por sua vez pode ser objeto de padronizao no modelo adotado pelo MDS da tipificao dos servios. Para possibilitar tal anlise, iniciamos o trabalho expondo a evoluo dos paradigmas que norteou a assistncia criana e ao adolescente ao longo da histria brasileira. Seguimos apresentando as principais polticas pblicas e programas sociais direcionados especificamente aos acolhidos institucionalmente, seus marcos-conceituais, princpios, diretrizes, entre outros. Na terceira seo trazemos um apanhado das pesquisas nacionais que buscaram traar o perfil de crianas e adolescentes nessa situao, tratando especialmente dos motivos inerentes ao acolhimento. na quarta seo que problematizamos os motivos apontados por dois levantamentos a nvel nacional, indagando, por exemplo: quais aes o Estado poderia ter realizado a fim de evitar o afastamento das famlias; questionando possveis preconceitos sociais por trs de termos subjetivos como negligncia; alm do papel da famlia e da rede social desses sujeitos. Finalizamos propondo uma reflexo a respeito do que chamamos de paradigma da pobreza. Nomeamos assim a tendncia de justificar socioeconomicamente o fato das famlias pobres serem os alvos por excelncia do acolhimento institucional.No satisfeitos com essa concepo de que a carncia material pode levar a desestruturao familiar, a fragilizao de vnculos, a fraca troca afetiva, ao enfraquecimento das funes de suporte entre outros, falamos sobre o lugar do afeto nessas famlias. Uma pergunta complexa se faz: o que diferencia essas famlias de milhes de outras que compartilham das mesmas condies socioeconmicas ou esto em situaes mais adversas e permanecem com seus filhos/dependentes ao seu lado?Acreditamos que a famlia instituio privilegiada para o desenvolvimento psicossocial de todo ser humano. Por isso, os motivos que levam ao acolhimento institucional devem ser cuidadosamente analisados, a fim de que o afastamento da famlia seja de fato a ltima medida direcionada proteo dos direitos de crianas e adolescentes. Para realizar tal anlise precisamos nos debruar sobre o que h de cultural, social e psicolgico neste fenmeno. Por muito tempo a psicologia negligenciou o social, emaranhada pelo setting clnico, pelo modelo mdico e por problemticas elitistas, demorou a estudar e trabalhar o que est alm do psi, mas que se interfluenciam enormemente. Hoje sabemos que a psicologia tem muito a contribuir com esse debate, pois trabalhar com o ser humano lidar com tudo que o constitui, com seu estar no mundo, produzindo e sendo produzido pela cultura, pelo social, pelos afetos.Debater polticas pblicas, especialmente, um desafio para quem atua na rea social, especialmente para o psiclogo. esse debate que trazemos ao problematizar os motivos para o acolhimento institucional. Ao faz-lo problematizamos as polticas pblicas, as aes do Estado, os preconceitos sociais at chegarmos ao contexto da famlia, suas trocas, seus afetos. E assim, contribumos para um olhar mais completo dessa realidade social multifacetada pelo cultural, social, econmico e psicolgico.

1. DO RECOLHIMENTO AO ACOLHIMENTO: A EVOLUO PARADIGMTICA NA ASSISTNCIA S CRIANAS E AOS ADOLESCENTES EM SITUAO DE ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL

Ao se pensar sobre as mudanas de paradigmas da assistncia do Estado brasileiro s crianas e adolescentes h que se fazer referncia aos Cdigos de Menores institudos no pas e que deixam claro sob qual prisma esses sujeitos eram vistos no decorrer da nossa histria. O primeiro cdigo (1927), j no seu primeiro artigo classifica menor como todo abandonado ou delinquente com menos de 18 anos de idade. Sendo que este menor o foco de proteo e assistncia por parte do Estado.Vale ressaltar que o Cdigo de 1927 fortemente marcado pela segregao e tipificao dos denominados menores. Fazem referencia aos ltimos por meio de alguns termos, como expostos, para os menores de 07 anos abandonados pela me e/ou responsveis e abrigadas em instituies; abandonados, denominao que inclua desde os sem habitao at aqueles cujos pais eram vistos sem condies de cumprir seus deveres por estarem entregues a atos contrrios moral e ao bom costume. J os vadios eram aqueles que se negavam a receber instruo ou a trabalhar, preferiam viver a vagar nas ruas com ocupaes imorais e proibidas; Os mendigos, por outro lado, eram aqueles que pediam esmolas, donativos e ficavam vendendo objetos nas ruas; enquanto que os libertinos eram aqueles que convidavam os outros para atos libertinos, especificamente a prostituio.Ao discorrer sobre o acolhimento desses menores, este cdigo estabelece que qualquer pessoa ou instituio que se propusesse a cuidar destes tinham que respeitar diversas exigncias que denotam seu carter moralista e higienista como: nmero reduzido de habitantes, ausncia de acusaes de negligencia, embriaguez, imoralidade, entre outros para os casos em que eram abrigadas por alguma pessoa/famlia (parental ou no). Em contexto institucional, por outro lado, abandonados e delinquentes ficavam em alas diferentes, que tambm eram divididas por sexo, idade e grau de perverso (Art. 190 e 191). A marca da concepo subjacente no Cdigo de 1927 a ideia do recolhimento, a qual revela o paradigma vigente poca em que mais do que garantir proteo a sujeitos cujos direitos eram ameaados ou violados, tinha-se como desejo maior propiciar um local em que os expostos, pudessem ser recolhidos e assim normatizados de acordo com a moral (mdica e cientfica) e os bons costumes para que no futuro no se tornassem delinquentes. O cdigo fortemente marcado pela concepo de que a delinquncia um produto do meio onde esto inseridos s crianas e adolescentes, que passivamente se influenciariam pela vadiagem, vcios, libertinagem e ambientes perniciosos. Neste contexto as crianas e adolescentes so vtimas do meio-ambiente em que vivem. Nessas situaes caberia ao Estado garantir a formao do carter, atravs do recolhimento (isolamento daqueles ambientes) para que pudessem ser adequadamente educados. Vale frisar que no decorrer da nossa histria tambm eram ou ainda so recolhidos os doentes mentais, os criminosos, os idosos tudo o que de alguma forma interfere na racionalidade vigente.Depois de meio sculo em vigor, o cdigo de 1927 substitudo pelo Cdigo de Menores de 1979. Este dispe sobre a assistncia, proteo e vigilncia dos menores de 18 anos que se encontravam em situao irregular expresso que o marca e apresentada logo no inciso I do seu artigo primeiro. Este termo estabelece uma cristalizao do foco que j era colocado no ambiente como produtor do que antes se chamava de expostos ou delinquentes. Estava em situao irregular, e por isso era foco das medidas desse cdigo, todo aquele: privado de condies essenciais de subsistncia, sade e instruo devido falta e omisso dos pais ou impossibilidade destes de prover suas necessidades; vtima de maus tratos ou castigos imoderados; em perigo moral por viver em ambiente contrrio aos bons costumes ou por ser explorados em atividades imorais; privado de representao legal; com desvio de conduta devido inadaptao familiar ou comunitria; ou autor de infrao penal. Logo, possvel identificar ticas que vo desde o menor abandonado, vtima ou infrator at a continuidade do carter moralista no novo cdigo. Essa tipificao de que h crianas e adolescentes em situao irregular gera uma ideia subjacente de que existem outras em situao regular. O que notrio, por outro lado, que as situaes apresentadas como irregulares pertencem ao universo da populao menos favorecida economicamente, deixando a regularidade a outras camadas socioeconmicas (modelos de ambiente sadios, de bons costumes e de moral).A partir de 1979 teoricamente algumas mudanas ocorreram como levar em conta o contexto socioeconmico e cultural do menor e dos seus pais ou responsveis, alm de indicar que seja realizado um estudo de caso por equipe especializada a fim de que os interesses do menor prevaleam sobre qualquer outro (Art. 5). Seguindo as diretrizes da Poltica Nacional do Bem-Estar do Menor, apresenta a expresso individualizao do tratamento, alm de profissionalizao e escolarizao daqueles que se encontrassem nas entidades de assistncia. Em todo o cdigo poucas referncias so feitas sobre as instituies de abrigo/ acolhimento. Muito se fala sobre as unidades de internao de menores em conflito com a lei, que deveriam visar o ajustamento ou integrao sociofamiliar dos assistidos. Enquanto ao que tange aos demais se focaliza na colocao em famlia substituta e nas regras para adoo.Comment by ADRIANA: Professor, chequei novamente o cdigo de 79 e no trata sobre as instituies de abrigo para c e adoles. Mas sobre internao no contexto infrator.Neste momento cabe apresentar a perspectiva de Valente (2008), quando discorre sobre o carter preconceituoso presente em relatrios, documentos e legislaes da poca que classificavam as famlias pobres como incapazes, desestruturadas e os menores, como vadios, mendigos e libertinos.Depois desse panorama, podemos adentrar no Estatuto da Criana e do Adolescente ECA que representa profunda mudana paradigmtica na ateno do Estado sobre crianas e adolescentes. Quando se supera com o paradigma de proteo integral a tipificao e a normatizao dos assistidos. O foco no o menor, o abandonado, o delinquente etc., mas toda e qualquer criana e adolescente que no deve ser objeto de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso (art.5), independentemente do seu nvel social.Ou seja, com o ECA, crianas e adolescentes passam a ser sujeitos de direitos civis, humanos e sociais como qualquer outro cidado (art. 15). Devido sua condio peculiar por estar em desenvolvimento e possurem capacidades limitadas para exercer sua liberdade e seus direitos, a garantia aos seus direitos tem carter prioritrio e para defende-los cria-se um sistema de garantia de direitos formado por promotores, defensores, delegacias especializadas, conselho tutelar, conselhos de direitos, varas da infncia e sociedade priorizando atuaes em rede, integradas e articuladas. Nesse momento a ideia de recolhimento d lugar ideia de acolhimento. O acolhimento deixar de ser fruto da ao caritativa e filantrpica para se tornar um direito da criana e do adolescente. Desta forma, a instituio de abrigamento e o abrigar, antes aprisionamento e meio corretivo, assumem carter protetivo. Como tal, o acolhimento institucional passa a ser excepcional e provisrio, pois a ele se recorre apenas quando as outras medidas no foram suficientes para a proteo e deve representar uma transio que deve resultar no retorno famlia de origem ou na colocao em famlia substituta. A fim de contribuir com o disposto no ECA, em 2009 sancionada a Lei n 12.010 (Lei Nacional da Adoo) que estabelece regras para fortalecer e preservar a integridade da famlia de origem e evitar ou abreviar ao mximo o acolhimento institucional com o retorno ao convvio familiar, ou na impossibilidade deste, a sua colocao em famlia substituta (por guarda, tutela ou adoo). Para cumprir esse papel prev reavaliaes peridicas no mximo, a cada seis meses (Art. 19, 1) da situao de crianas e adolescentes que se encontram sob a medida de acolhimento institucional ou familiar.Na perspectiva de prevenir/abreviar o acolhimento institucional, a nova lei da adoo, preconiza polticas pblicas intersetoriais e prev programas e servios de orientao, apoio e promoo social das famlias quando comprovada a necessidade, alm da manuteno da instituio/famlia de acolhimento prxima comunidade qual pertence o acolhido, como formas de potencializar a manuteno de vnculos afetivos e o retorno famlia de origem (art.101, 7).Embora essa legislao no apresente explicitamente os motivos que levam a colocao em unidade de acolhimento institucional, a vinculao destes motivos pobreza fica evidente desde o Cdigo de 27 at a terminante proibio pelo ECA de retirada da famlia por motivo de pobreza. Particularmente o ECA, por basear-se numa perspectiva de valorizar a convivncia familiar e comunitria, deixa evidente que a medida aqui tratada deve ser o ltimo recurso, aceitvel apenas quando todos os outros falharam em proteger as crianas e adolescentes sob ameaas ou violaes de direito.

2. UM RETRATO DAS POLTICAS NACIONAIS DIRECIONADAS AO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL

Coerente com Estatuto da Criana e do Adolescente ECA, algumas polticas nacionais foram criadas no sentido de garantir o direito convivncia familiar e comunitria. Dentre estas podemos citar o Plano Nacional de Promoo, Proteo e Defesa do Direito de Crianas e Adolescentes Convivncia Familiar e Comunitria, a Tipificao Nacional de Servios Socioassistenciais e Orientaes Tcnicas para os Servios de Acolhimento Institucional de Crianas e Adolescentes.Instrumento referncia no mbito do acolhimento institucional, o Plano Nacional de Promoo, Proteo e Defesa do Direito de Crianas e Adolescentes Convivncia Familiar e Comunitria (CONANDA, 2009), trata da formulao e implementao de polticas pblicas que assegurem a garantia dos direitos das crianas e adolescentes de forma integrada e articulada. Fundamentado no paradigma de proteo integral, o plano um marco na luta pelo rompimento com a cultura de institucionalizao de crianas e adolescentes. O plano fundamenta suas estratgias, objetivos e diretrizes na preveno ao rompimento dos vnculos familiares, alm de discorrer sobre a qualificao do atendimento dos servios de acolhimento e do investimento que deve ser feito para o retorno famlia de origem (ou encaminhamento para famlia substituta).Acreditando na importncia de vnculos afetivos e simblicos dentro das famlias e comunidades (sendo o conceito de famlia entendido com alm do modelo ideal apenas baseado em estrutura), defende que as redes de apoio e proteo dos direitos das crianas e dos adolescentes precisam reconhec-los, mobiliz-los e orient-los para fortalecer as famlias em situao de vulnerabilidade. Isso porque compartilha do entendimento da famlia enquanto contexto privilegiado de desenvolvimento e principal ncleo de socializao da criana quando oferece um contexto seguro, facilitador de autoconfiana e mediador da sua relao com o mundo.No podemos esquecer-nos da comunidade que, enquanto formadora de identidades, permite s crianas e aos adolescentes o convvio com o coletivo, com papis sociais, regras, leis, valores, cultura, crenas e religio, que s podem ser transmitidas de gerao a gerao e constituem recursos relevantes para seu pleno desenvolvimento (NASCIUTI, 1996, apud. CONANDA, 2009).Quando refere ao afastamento da criana ou do adolescente da famlia o plano determina que deva ser uma medida condicionada a deciso judicial e de recomendao tcnica a partir de estudo diagnstico preferencialmente interdisciplinar. Tal estudo deve incluir avaliao criteriosa dos riscos a que esto submetidas crianas e adolescentes e das condies da famlia para superao dessas situaes de risco a partir de possveis recursos e potencialidades da famlia nuclear, da extensa e da rede social que possam atuar como apoio para suplantar dificuldades momentneas e crises. Quando no for possvel, a famlia deve continuar como objeto de ateno a fim de se abreviar o mximo possvel a separao e promover a reintegrao familiar..Subdividido em eixos que abarcam aspectos desde o aprofundamento do conhecimento sobre as famlias e mapeamento e anlise das iniciativas de apoio sociofamiliar at estratgias de comunicao que possam mobilizar a sociedade e a mdia para o tema em questo, prope aes no sentido de possibilitar o alcance dos seus objetivos. As aes versam desde sobre problemticas bsicas como ateno especial s famlias quanto educao dos filhos, a outras mais especficas, como estratgias para lidar com possveis deficincias e transtornos mentais, dependncia qumica e para promover o contato daqueles cujos pais encontram-se privados de liberdade. Alm disso, reafirma a necessidade de garantir o disposto no art. 23 de ECA (pobreza no constituir motivo para acolhimento), incluindo famlias em situao de vulnerabilidade e violao de direitos em programas oficiais de auxlio. A Tipificao Nacional dos Servios Socioassistenciais (2009), por outro lado, coloca os servios de acolhimento - quais sejam: institucional, em repblica, famlia acolhedora e proteo em situao de calamidades pblicas e de emergncias no rol dos servios socioassistenciais de alta complexidade. Alm disso, preconiza que o servio prestado seja personalizado, em pequenos grupos, favorecedor do convvio familiar e comunitrio e em unidade inserida na comunidade com caractersticas residenciais e condies prximas a de um ambiente familiar. Discorrendo, especificamente sobre o acolhimento institucional de crianas e adolescentes, afirma que este pode existir em duas modalidades: em unidade residencial, em que uma pessoa ou casal cuida de grupos de at dez pessoas; e em unidade institucional, sendo que nessa modalidade os cuidadores/educadores cuidam de grupos de at 20 crianas e/ou adolescentes.Em Orientaes Tcnicas para os Servios de Acolhimento Institucional de Crianas e Adolescentes (CONANDA, 2008) alm de partilhar de princpios compatveis com os instrumentos j citados como centralidade da famlia, provisoriedade da medida, respeito s diferenas como de religiosidade, atendimento personalizado e a negativa da carncia material como razo para o acolhimento, especifica-se orientaes metodolgicas e parmetros de funcionamento a partir dos quais as instituies de acolhimento devem atuar.Metodologicamente, parte-se da premissa da obrigatoriedade de um estudo diagnstico e psicossocial (salvo em situaes emergenciais e urgentes), tal como estabelecido tambm no plano discutido acima. Alm disso, ressalta a necessidade de buscarem-se, na famlia extensa ou na comunidade, pessoas significativas que possam responsabilizar-se pelo cuidado antes de optar-se pelo acolhimento institucional. Para de fato preservar o convvio familiar, faz-se imperativa uma articulao intersetorial para o desenvolvimento de aes, capacitao profissional e trabalhos sociais com as famlias de origem. Para o breve retorno a esta ou colocao em famlia substituta. enriquecedor para a questo dos motivos perceber que as polticas citadas nos falam, indiretamente, sobre os motivos que levam ao acolhimento institucional de crianas e adolescentes no pas. Ao abordar aes fundamentadas no paradigma da proteo integral que busquem reverter tanto a carncia material enquanto motivador ainda recorrente quanto a falta de apoio do Estado no sentido de favorecer o desenvolvimento de estratgias e o empoderamento das famlias para lidar com situaes especificas e adversas (adoecimentos, violncias, negligncias, entre outros), indicam esforo em superar a histria discriminativa da assistncia a crianas e adolescentes e, concomitantemente, a dificuldade de super-la de fato.

3. O DEBATE SOBRE OS MOTIVOS DO ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL NA LITERATURA ESPECIALIZADA

Diversas pesquisas realizadas nos ltimos anos desde a consolidao do ECA buscaram traar o perfil sociodemogrfico do acolhimento institucional de crianas e adolescentes no Brasil. Algumas delas, levantaram os motivos que culminaram com a determinao para a colocao em instituio.Dentre as pesquisas referenciadas, podemos citar o Levantamento Nacional de Abrigos para Crianas e Adolescentes da Rede de Servios de Ao Continuada (SAC) realizado em 2004 pelo Instituto de Pesquisa Aplicada IPEA. O levantamento contou com a participao de 589 estabelecimentos que compem a rede de abrigos SAC e recebem recursos do Governo Federal. Apenas elencando os motivos, sem qualquer reflexo ou questionamento sobre os mesmos, a pesquisa obteve dados quantitativos por meio das respostas de dirigentes a questionrios autoaplicveis. Nestas, o principal motivo de abrigamento a carncia de recursos materiais da famlia (24,1%), seguido por abandono pelos pais ou responsveis (18,8%), violncia domstica (11,6%), dependncia qumica dos pais ou responsveis (11,3%), vivncia de rua (7%), orfandade (5,2%), priso dos pais ou responsveis (3,5%), abuso sexual praticado por pais ou responsveis (3,3%) e outros (15%) (SILVA, 2004). Outras pesquisas objetivando levantar o perfil dos acolhidos institucionalmente, foram realizadas pelo Ministrio Pblico do Rio de Janeiro. O primeiro Censo da Populao Infantojuvenil Acolhida no Estado do Rio de Janeiro realizado em 2008, mostrava que a negligncia (14,34%), a carncia de recursos materiais da famlia/responsveis (12,78%), abandono dos pais ou responsveis (11,68%), ao lado da violncia domstica (8,71%), da situao de rua (5,92%) e da dependncia qumica/alcoolismo dos pais ou responsveis (4,90%) versavam dentre os principais motivos para o deferimento da medida protetiva em questo.O ltimo Censo realizado naquele estado, em 2010, j no apresenta dentre os motivos o fator pobreza, diferente do ocorrido no primeiro censo. Entretanto, fenmenos da mesma forma comuns ao cenrio que est sendo traado reapareceram. Isso porque a negligncia est em primeiro lugar, com 25,83%. Logo em sequncia temos: abandono dos pais ou responsveis (16,63%), situao de rua (8,60%), abusos fsicos/psicolgicos (8,08%) e pais/responsveis dependentes qumicos/alcoolistas (5,3%).Analisando 545 pastas especiais, correspondentes a 1002 crianas e adolescentes, de acompanhamento da medida de acolhimento institucional em tramitao na 1 Vara da Infncia e da Juventude do Distrito Federal e Territrios no perodo de janeiro de 2007 a agosto de 2009, Penso (no publicado) encontrou nos relatrios tcnicos dos processos analisados motivos que esto em congruncia com aqueles apontados no panorama aqui levantado. Dentre os fatores que constam no relatrio da pesquisa que aturaram como determinantes para o afastamento das crianas e adolescentes de suas famlias esto: abandono pelos pais ou responsveis (13%) e falta de condies pessoais ou materiais (11%), abuso sexual suspeito ou confirmado e/ou explorao sexual (6%), violncia fsica/psicolgica/negligncia/ maus tratos (33%), vivncia de rua (13%), entrega voluntria no abrigo institucional (5%), pais ou responsveis dependentes qumicos/alcoolistas (5%), para adoo/solicitao de guarda (6%) e outros fatores (8%).A ltima pesquisa nacional que se tem noticia vem sendo realizada pelo Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome MDS desde 2009 . O levantamento ainda est em andamento, mas na primeira etapa, quantitativa, divulgada em 2011, identificou 2.400 abrigos institucionais (governamentais e no governamentais) e 54 mil crianas e adolescentes que se encontram sob medida protetiva em todo o Pas.Em relao aos motivos, a pesquisa do MDS analisou 32.621 casos e no aponta uma realidade muito diferente daquela mostrada pelo IPEA no que se refere modalidade institucional. Nesta, o principal motivo a negligncia na famlia (37,6%). Tal fenmeno no aparece na pesquisa do IPEA, o que instigador devido ao elevado ndice no levantamento do MDS. O segundo maior percentual representa pais ou responsveis dependentes qumicos/alcoolistas (20,1%), valor significativo e superior em comparao ao outro estudo (com 11,3%). Em terceiro lugar est abandono pelos pais ou responsveis (19%), seguido por violncia domstica fsica (10,8%), situao de rua (10,1%) e carncia de recursos materiais (9,7%), que aqui encontra-se em sexto lugar, no mais em primeiro.Vale citar outros motivos alegados para o acolhimento institucional na pesquisa realizada pelo MDS, cujos percentuais foram significativos nessa pesquisa: entrega voluntria pela famlia de origem (5,1%); pais/responsveis com transtorno mental (5,3%); violncia domstica sexual (5,5%) e violncia domstica psicolgica (5,1).Da literatura de teses, dissertaes e artigos, destaca-se a pesquisa realizada por Oliveira (2001) em registros de 14 autos processuais de trs Varas da Infncia e da Juventude na capital paulista, referentes a 31 crianas e adolescentes, cujos vnculos com a famlia estavam perdidos. Esta destacou dentre a maioria dos motivos que levaram ao acolhimento institucional o prprio pedido da famlia ou terceiros, que recorreram a tal medida por: falta ou precariedade de moradia, de alimentao e de trabalho, a sada do provedor da casa, exposio violncia, o uso de drogas, vivncia de rua, etc. Vale salientar que a entrega voluntria tambm aparece em outras pesquisas (SERRANO, 2008; BRUNETTO, 2011). Analisando documentos e entrevistando tcnicos do maior abrigo infantil em Belm - PA, Cavalcante, Magalhes e Pontes (2007), traaram o perfil das condies gerais em que 287 crianas foram acolhidas nessa instituio a fim de discutires como a institucionalizao precoce e prolongada pode interferir no desenvolvimento da criana. Nos resultados obtidos, 40,41% das crianas que deram entrada na instituio no perodo de maio de 2004 a maio de 2005, foram encaminhadas ao acolhimento institucional por um conjunto de fatores relacionados privao material e emocional, que segundo os autores so prprios do ambiente familiar do qual derivam (p. 7). Entre as crianas com apenas um motivo para tal encaminhamento, 60,23% delas tinha como motivo a negligncia familiar, seja a negligencia sob a forma de atitudes ou sob a forma de um ambiente familiar empobrecido sob diversos aspectos (emocional, material e moral). Mais uma vez vemos que esse um fenmeno confuso, subjetivo e perigoso, por poder respaldar-se num modelo idealizado de famlia e de condies sociais/materiais que nem sempre so possveis s famlias pobres especialmente.Realizando entrevistas semiestruturadas com os principais atores do Sistema de Garantia de Direitos, Janczura (2008) investigou como se efetiva no municpio de Santa Maria - RS, a garantia aos direitos sociais conforme est preconizado no ECA, especialmente a medida de proteo em debate. Caracterizando o perfil do pblico infanto-juvenil, acolhido naquela cidade, a autora traz dentre os principais motivadores para a tomada de deciso por esta medida mais uma vez o abandono (26,5%), ao lado de abuso e explorao sexual (26,5%). Em seguida reaparecem maus tratos (14,7%), pobreza (14,7%), alm de negligncia (8,8%) e drogas (5,8%). A autora lembra que os termos abuso, violncia, maus-tratos so muitas vezes usados como sinnimos na literatura e na fala dos 34 atores do sistema de garantias ouvidos na pesquisa. Alm disso, discute a ideia de famlia desestruturada comumente presente nos discursos dos pesquisados, refletindo o que tal termo costuma suscitar, ou seja, incapacidade e fracasso na obrigao de cuidar e proteger e a constante associao com as famlias pobres, que para serem atendidas precisam ser identificadas como desestruturadas.Outro estudo realizado na cidade de Ribeiro Preto, So Paulo, por Serrano (2008) objetivou delinear o contexto do abrigamento e caracterizar os perfis de crianas de zero a seis anos e suas famlias naquela cidade. Para tal, realizou-se anlises nos pronturios/pastas nos abrigos, no banco de dados do Frum de Ribeiro Preto e nos processos dos acolhidos na Vara da Infncia e Juventude do Tribunal de Justia correspondentes ao perodo de abril/2003 a abril/2005. Em congruncia com as pesquisas nacionais, a pobreza est dentre as principais motivaes para o acolhimento, sendo que a primeira delas a negligncia (41%), seguido pela falta temporria de condies (23,6%); abandono (21,3%), outros motivos (21,3%), vitimizao fsica (13,1%), entrega (6,2%), vitimizao sexual (3,1%), vitimizao psicolgica (1,9%) e devoluo por famlia substituta (1,5%). Nesta pesquisa, das 258 crianas pesquisadas que passaram pelos abrigos, houve a meno de 150 ocorrncias ligadas a situaes de extrema pobreza dos pais, algumas com descrio de falta de casa ou alimentao.Na mesma direo das pesquisas citadas, por meio de estudo exploratrio, Brunetto (2011) com a finalidade de analisar o acolhimento institucional na Associao Casa de Passagem de Sapucaia do Sul (ACAPASS) em So Leopoldo, RS, luz do ECA pesquisou 69 fichas de crianas e adolescentes que passaram por esta instituio no segundo semestre de 2007. Com relao aos motivos, a autora obteve os seguintes percentuais: famlia em situao de miserabilidade (15,9%), alcoolismo/uso de substncias (14,5%), violncia domstica e familiar (13%), situao de rua (13%), crianas sozinhas em casa (13%), medida de proteo/sem motivo (11,6%), procura espontnea (5,8%), criana com distrbio psiquitrico (1,4%), fuga de outra instituio (1,4%), no aguardo de deciso judicial (1,4%) e no consta (8,7%).Por meio da reviso da literatura produzida nos ltimos anos sobre o perfil de crianas e adolescentes em situao de acolhimento institucional, e das pesquisas de proporo nacional (IPEA, MDS), verificamos alta recorrncia de motivos para a assuno dessa medida de proteo[footnoteRef:1] e pouca reflexo e anlise sobre esse fenmeno. [1: Para uma viso geral dos dados quantitativos das pesquisas citadas nesta seo, o anexo 1 traz uma tabela descritiva dos percentuais dos motivos elencados pela reviso da literatura apresentada.]

4. OS PROBLEMAS EXPLANATRIOS DOS MOTIVOS PARA O ACOLHIMENTO INSTITUCIONAL DE CRIANAS E ADOLESCENTES NO BRASIL.

Refletindo sobre os motivos apontados na sesso anterior, diversas indagaes e inquietaes surgiram sobre o baixo potencial explicativo dos mesmos. Isso porque, os estudos encontrados na sua maioria apenas descritivos suscitam questionamentos como: o que foi feito para evitar-se a medida de acolhimento institucional? Como e por que uma doena justifica a retirada de crianas e adolescentes do convvio familiar e comunitrio? Para uma melhor anlise e compreenso, organizamos os motivos de natureza semelhante em blocos[footnoteRef:2] e tiramos a mdia representativa destes comparando os dois levantamentos nacionais abordados (IPEA e MDS). A seguir: [2: O anexo 2 constitui-se de tabela descritiva de cada bloco criado neste trabalho. E o anexo 3 traz os percentuais dos principais motivos elencados nas pesquisas do IPEA e MDS para melhor visualizao do leitor.]

4.1. A AUSNCIA DOS PAIS OU RESPONSVEIS

O primeiro deles fora denominado de ausncia dos pais ou responsveis. Este bloco composto pelos seguintes motivos: orfandade, ausncia dos pais ou responsveis por doena, ausncia dos pais/responsveis por priso. Esse bloco responsvel por em mdia 10,8% das justificativas para o acolhimento institucional.Neste primeiro bloco nos inquietam aspectos como se ambos os pais esto ausentes? Se no, porque a criana/adolescente no est sob os cuidados do outro? E a famlia extensa, qual o seu papel no cuidado quando os pais/responsveis no esto presentes seja por adoecimento, por falecimento e mesmo por priso? Lembrando que uma dos objetivos previstos pelo Plano de Convivncia Familiar e Comunitria refere-se a aes que incentivem o contato e a preservao dos vnculos familiares quando os genitores encontram-se privados de liberdade (2006, p. 97). No caso da orfandade, a guarda e a adoo dos rfos foi possibilitada a membros da famlia extensa antes do acolhimento, como prev o ECA? E o que impede a adoo dos mesmos?E a rede social dessa famlia, ela existe? Est fortalecida? Tal pergunta se faz relevante quando pensamos que uma rede social de apoio de fundamental importncia para o desenvolvimento do ser humano. Ainda mais quando nos referimos a sujeitos em situao de vulnerabilidade social que podem encontrar, na comunidade, meios para favorecer a insero social da famlia e fortalecer a vinculao afetiva dentro desta. Alm disso, se na famlia faltam figuras de proteo e identificao para essas crianas e adolescentes construrem suas identidades e alcanar a autonomia, na comunidade elas podem ser encontradas.A esse respeito, investigando a rede de apoio social e afetivo de adolescentes institucionalizados em sete abrigos na cidade de Porto Alegre - RS, Siqueira, Betts e Dellglio (2006) verificaram que os adolescentes mantm o menor nmero de contatos fora da famlia ou abrigo, indicando para os autores uma frgil interao da comunidade na vida desses adolescentes. Contrariando o que preconizado pelo Estatuto da Criana e do Adolescente (1990) e tambm pelo Plano Nacional de Convivncia Familiar e Comunitria (2009).

4.2. ABANDONO OU ENTREGA VOLUNTRIA

Este bloco composto por abandono dos pelos pais/responsveis e por Entrega voluntria da criana/adolescente pela famlia de origem (nuclear/extensa). O primeiro motivo aparece nas duas pesquisas e representa em mdia 18,9% dos motivos. J o segundo, elencado apenas na pesquisa do MDS e corresponde a 5,1% dos casos.Sobre o abandono, o que significa? Abandonaram onde, na rua, com um parente, sozinho em casa? Como o Estado atuou de tal forma a desenvolver a autonomia dessa famlia para que algum assumisse o cuidado e a proteo da criana ou adolescente, e assim no fosse necessrio o acolhimento institucional? A situao jurdica foi processada para que determinasse o abandono do ponto de vista legal? abandono jurdico ou social, ou ambos? Assim como o bloco anterior, este faz pensar sobre o lugar da famlia extensa nas vidas dessas crianas e adolescentes.Em relao famlia extensa, pesquisa com pais/responsveis notificados por negligncia nos conselhos tutelares de Ribeiro Preto SP, Bazon et al. (2010), encontraram uma significativa diferena em comparao com grupo controle no aspecto pessoas da famlia extensa com as quais aqueles pais ou responsveis poderiam contar. essa a realidade por trs da ausncia da famlia extensa no cuidado de crianas e adolescentes em situao de acolhimento?

4.3 FALTA DE CONDIES

O terceiro bloco, falta de condies, composta por duas subcategorias: falta de condies dos pais/responsveis e falta de condies da criana/adolescente. A primeira diz respeito aos motivos: pais ou responsveis dependentes qumicos/alcoolistas; com transtorno mental (problemas psiquitricos/psicolgicos); pais ou responsveis com deficincia e carncia de recursos materiais da famlia/responsvel. E corresponde a 36,65% dos motivos para o acolhimento encontrados pelos levantamentos referenciados.A segunda subcategoria formada por: pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/adolescente com condies de sade especficas; de cuidar de criana/ adolescente com cncer; dependente qumico; portador de HIV; portador de deficincia fsica; de deficincia mental; de adolescente gestante. Esta subcategoria representa uma mdia de 4,3% dos motivos. Assim, o bloco em questo corresponde a 40,95% das justificativas para a retirada do convvio familiar de crianas e adolescentes.Diante deste quadro, a primeira pergunta a surgir o que de fato significa o termo falta de condies, sendo este to subjetivo. Tais problemticas ocasionam falta de condies para cuidar de quais naturezas? Fsicas, materiais, emocionais?Sobre a falta de condies dos pais ou responsveis, perguntamo-nos se a doena, a dependncia qumica, o alcoolismo, o transtorno mental, a deficincia, por si s, justificaram o acolhimento? Como se configura de fato a ameaa ou a violao dos direitos da criana? Esses problemas especficos relacionados sade dos pais resultam em carncias materiais, por que no teriam trabalho, p.ex.? Se sim, qual a atuao do Estado no sentido de incluir essas famlias em programas federais de assistncia, tal como prev o Plano Nacional de Convivncia Familiar e Comunitria ao referir-se sobre qualificao profissional, transferncia e gerao de renda e incluso no mundo do trabalho (2009; p. 71)? E quanto ao motivo carncia de recursos materiais, sabemos que o ECA determina que este no constitua mais razo para a privao do convvio familiar. Mesmo assim, est sempre presente. O que ser que tal recorrncia significa? Falha do Estado em assistir tais famlias? Ou ser que este um motivo associado ou confundido com outros como negligncia? Na subcategoria alusiva s crianas e adolescentes, indagamo-nos alm do j feito anteriormente (sobre o papel da famlia extensa, p.ex.), se servios de ateno social bsica como o auxlio para pessoas deficientes, para inclui-las, realizar equiparao de oportunidades, desenvolver autonomia, etc. a fim de prevenir situaes de risco, a excluso e o isolamento - como previsto na Tipificao Nacional de Servios Socioassistenciais (2009) esto de fato sendo prestados. Estar o Estado oferecendo apoio a crianas e adolescentes deficientes fsicos, mentais, dependentes qumicos, portadores de HIV, com cncer e at mesmo de adolescentes gestantes e suas famlias, como estabelece o Plano Nacional de Convivncia Familiar e Comunitria?

4.4. VIOLNCIAS

O quarto bloco, denominado violncias, abarca violncia psicolgica; domstica fsica; abuso sexual intrafamiliar, abuso extrafamiliar (praticado por pessoa no pertencente famlia); e Ameaa de Morte. Este representa em mdia 19,7% dos motivos relatados nas instituies de acolhimento.Diante desse quadro questionamo-nos se ambos os pais so violentadores? Em seguida, sabendo que o art. 130 do ECA determina o afastamento do agressor da moradia comum - comprovada a hiptese de maus tratos, opresso ou abuso sexual impostos pelos pais ou responsveis - por que a criana ou o adolescente so afastados do convvio familiar e no o agressor? As famlias que violentam foram inseridas em programas de atendimento e acompanhamento (psicossocial, sade, p.ex.) a fim de receberem suporte e intervenes adequados para facilitar a superao dessas prticas e relaes violentas tal como prev o Plano Nacional de Convivncia Familiar e Comunitrio (p. 72)? E enfim, o que justifica o acolhimento quando o abuso ou violncia perpetrado no contexto extrafamiliar? E as crianas ameaadas de morte foram inseridas em servios - como o Programa de Proteo Criana e ao Adolescente Ameaados de Morte (PPCAAM) - que buscariam assegurar seu direito a preservar seus vnculos e gozar da convivncia familiar? A violncia domstica, enquanto fenmeno social, complexa por constituir-se multifacetadamente e provoca impactos negativos nas relaes familiares e no desenvolvimento fsico e psicolgicos sobre quem ela recai. Presente nos lares brasileiros, seja fsica, sexual ou psicolgica, a violncia est to enraizada na vida social de algumas famlias, que vista como normal (SACRAMENTO; REZENDE, 2006). E mesmo adquirindo a infncia maior importncia nos aspectos sociais, jurdicos e familiares, como salientam Weber et al. (2002), esta continua convivendo com a punio fsica que aceita como uma prtica educativa at mesmo recomendada. Neste sentido, pesquisa realizada pelos mesmos autores levantou o perfil de famlias que maltratam e encontrou um percentual de 56,4% de pais agressores dando como justificativa estar educando, corrigindo a criana ao utilizar a violncia fsica.J o abuso sexual intrafamiliar surge em contextos familiares fragilizados, nos quais o segredo que perpassa essa violncia funciona dando a iluso de unidade aos seus membros (PELISOLI; DELLAGLIO, 2008) que tardam a buscar ajuda e muitas vezes no conseguem retirar o abusador de dentro de casa, como determina o ECA. E assim, mais uma vez a criana ou adolescente violentado, ao ser privado da convivncia familiar.A violncia psicolgica, por sua vez, como afirma Romaro e Garcia (2007), permeia todos os tipos de violncia. Mas enquanto fenmeno individual dentre todas as formas de violncia a menos referida na literatura (ROMARO; GARCIA, 2007; WEBER et al, 2002; SACRAMENTO, REZENDE, 2006).

4.5. EXPLORAO NO TRABALHO OU MENDICNCIA E EXPLORAO SEXUAL

Os dois blocos, explorao no trabalho ou mendicncia e explorao sexual (prostituio, pornografia), representam, respectivamente, 2,35% e 1,05% na mdia nas duas pesquisas em questo.Sobre esses fenmenos cabem questionamentos como: so ambos os pais que submetem os filhos a essas formas de explorao? O papel da famlia extensa (que perpassa todas as indagaes levantadas)? Se, antes da medida de acolhimento, foram tentadas outras estratgias, como a responsabilizao dos pais, participao destes em trabalhos socioteraputicos para orientao e reflexo a fim de que possam cuidar dos seus filhos por meio da conscientizao dos seus direitos como cidados? salutar que as problemticas da explorao de crianas e adolescentes so fenmenos complexos, uma vez que, envolvem questes alm do indivduo, quais sejam socioeconmicas e culturais. Sobre tal enredamento, particularmente sobre a explorao no trabalho, para Ferreira (2001), o aspecto social do trabalho precoce visvel por este envolver crianas, na maioria pobre, sem oportunidades efetivas de desenvolvimento, habitante de cidades economicamente estagnadas (mas no apenas nessas) onde o poder pblico est estagnado, tornando os explorados e suas famlias vulnerveis socialmente. Para Campos e Alverga (2001), culturalmente, desde sempre o trabalho usualmente difere entre as classes sociais, uma vez que aos menos privilegiados caberiam os trabalhos fsicos, manuais (tidos como menos dignos e tambm instrumentos de controle social), enquanto que aos mais favorecidos economicamente, o trabalho intelectual. Na outra esfera, assumindo que a explorao sexual violao fundamental dos direitos de crianas e adolescentes, Librio (2005) ao estudar adolescentes em situao de prostituio a fim de compreender suas caractersticas, levantou dados que por si s falam das violncias que atravessam o fenmeno. Descobriu que, frequentemente, as adolescentes pesquisadas saiam de famlias pobres, moradoras de regies com srios problemas sociais, cujos vnculos familiares estavam rompidos ou fragilizados devido a violncias sofridas dentro de casa, alm de histricos de abandono e negligncia que culminavam com a troca da casa pelas ruas.Sendo um fenmeno resultado de um processo ininterrupto de violncias, violaes de direitos e vulnerabilizao desde tenra idade (LIBRIO. 2005, pp. 419), a explorao sexual de crianas e adolescentes requer medidas macro e microestruturais que possibilitem modificaes de valores culturais e sociais sobre gnero, classe social e etnia, que faam da criminalizao um fato, e que auxiliem aqueles que so explorados e suas famlias (sendo estas aliciadoras ou no da explorao) por meio de projetos que envolvam desde alternativas de gerao de renda at intervenes psicossociais para que reconheam seu lugar social, fortaleam seus vnculos tornando-os protetivos e potencializem a sada da prostituio.

4.6. NEGLIGNCIA

Esta categoria s encontrada na pesquisa realizada pelo MDS, e corresponde a 37,6% dos motivos apontados. Nos achados da pesquisa do IPEA, no aparece o termo negligncia, mas outros como abandono e falta de recursos materiais que podem ser confundidos com negligncia, uma vez que, dependendo do que se define como negligncia e do prisma de quem visualiza o fenmeno, a linha que os separa pode ser bastante tnue.Diante desse bloco, questionamo-nos se os pesquisadores partem de concepes subjetivas ou objetivas de negligncia? Dentre tantas formas de definir esse fenmeno qual a adotada pelas pesquisas em questo? A classe social e o grupo tnico aos quais pertencem essas famlias uma varivel que interfere na utilizao do termo negligncia pelos tcnicos ou juzes que a apontam como motivo para o acolhimento institucional? Isso porque tais termos, por demasiado subjetivo que so, podem abarcar diversas conotaes (GUERRA & LEME, 2001, apud SERRANO, 2008; WEBER, 2002; BAZON et. al, 2010; CALHEIROS; MONTEIRO, 2000; JANCZURA, 2008).Estudando o olhar do profissional da sade acerca da negligncia contra a criana, Beserra, Corra e Guimares (2002), verificaram que para os pesquisados a famlia vista positivamente quando segue o modelo tradicional que inclui cumprir com suas obrigaes, oferecer um ambiente de ordem, harmonia e disciplina no qual os pais educam, orientam e conduzem, alm de darem afeto. Para alm da idealizao de famlia que trazem, os profissionais da sade reafirmam a dificuldade de conceitualizar o termo negligncia, fenmeno segundo as autoras, carregados de ideologias, de preconceitos e de senso comum e tambm multifacetado. Para Bazon et al (2010), negligncia frequentemente confundida com a pobreza ou tida como consequncia dessa. Para eles estudar esse fenmeno um desafio pela complexidade daquilo que a constitui e por ser atravessado por fatores alm do indivduo, como o fato de sofrer forte influncia do entorno social no qual a famlia est inserida. Ainda sobre a definio e consequentemente identificao da negligncia, Calheiros e Monteiro (2000) afirmam que estas inscrevem-se numa rea indefinida cujas fronteiras tm vindo a variar em funo dos valores que regem os diferentes contextos em que o problema tem sido abordado (pp. 147).Estudando famlias notificadas por negligncia comparando-as com outras que no o foram, Bazon et al (2010) apresentaram resultados que assinalam para alm das precrias condies materiais, por falarem de famlias que contam com reduzido nmero de membros da famlia extensa aos quais pode pedir apoio, p.ex. Alm disso, outros autores afirmam que tais famlias contam com menos apoio de redes sociais sejam formais ou informais, por meio das quais alm de ajuda, fortaleceriam o sentimento de pertena e integrao com uma comunidade mais ampla (COHEN, UNDERWOOD E GOTTLIEB, 2000 apud Bazon et al. 2010).

4.7. SITUAO DE RUA

A ltima categoria trata de crianas e adolescentes abrigadas por terem sido encontradas em situao e rua. Apesar de no figurar entre os maiores percentuais, a condio de rua motivo frequente para o acolhimento. Nas pesquisas nacionais aqui analisadas, representam uma mdia de 8,55% dos casos levantados. Sendo significativamente maior no estudo do MDS, cuja porcentagem foi de 10,1%, enquanto que a do IPEA foi de 7%.Sobre esse assunto nos questionamos sobre as condies de vida da famlia para que essa criana/adolescente morasse na rua? Se em casa ele era vtima de algum tipo de violncia que impediam o seu convvio? De que forma pais ou famlia extensa ameaavam ou violavam seus direitos? Como o Estado atuou na defesa dos direitos dessas crianas/adolescentes antes de imputar a medida de acolhimento institucional?As indagaes acerca da famlia dessas crianas e adolescentes justificam-se na medida em que a literatura tem mostrado que, apesar de viver na rua, elas possuem famlia (PALUDO; KOLLER, 2008; SANTANA et al. 2005; MACIEL; BRITO; CAMINO, 1997; YUNES, et al., 2001). Estas, por outro lado, enfrentam problemas de cunho social, econmico e afetivos que apontam para a necessidade de priorizarem-se aes e polticas direcionadas a tais aspectos que antecedem a sada para rua e, concomitantemente, o acolhimento institucional.Por outro lado, a literatura tambm tem mostrado que motivadas por diversas formas de violncia (fsica, sexuais e psicolgicas) sofridas dentro de casa, crianas e adolescentes passam a viver nas ruas (YUNES, 2001; NUNES; ANDRADE, 2009). Exemplo, dessa afirmativa pesquisa de Nunes e Andrade (2009) com adolescentes em situao de rua e prostituio em Santo Andr, SP, que apontou que as adolescentes foram para as ruas devido a episdios de violncias dentro de casa. Este tambm consistia motivo para que no retornassem ao convvio familiar.Podemos concluir que o fenmeno situao ou vivncia de rua se intercruza com outros fenmenos j apontados como motivadores para o acolhimento institucional. Porquanto, alm da violncia, a busca de sustento financeiro e a explorao no trabalho infantil so tambm portas de entrada para esta condio (PALUDO; KOLLER, 2008; SANTOS e SILVA et al. 1998), que s vezes acompanha a evaso escolar (MACIEL; BRITO; CAMINO,1997).

5. O PARADIGMA DA POBREZA E O LUGAR DO AFETO NAS FAMLIAS DE CRIANAS E ADOLESCENTES ACOLHIDOS

possvel afirmar que, apesar de toda a sensibilizao que houve desde o ECA, as prticas de institucionalizao continuam reforando a concepo de incapacidade das famlias pobres de cuidar, sublinhando a necessidade de manter o afastamento dos filhos, via internao em instituio (AZR; VECTORE, 2008, p. 79). Uma comprovao desta afirmativa est no fato de que so poucos os trabalhos feitos pelas instituies de acolhimento para fortalecer o vnculo com a famlia de origem, conforme mostra a pesquisa realizada pelo IPEA (2004), a qual encontrou apenas 14,1% dos abrigos pesquisados fazendo trabalhos para a reestruturao familiar. O fator pobreza marcante, contrariando o disposto no Estatuto da Criana e do Adolescente que retira deste o poder de separar membros da famlia est significativamente presente na literatura (SILVA, 2004; SERRANO, 2008; BRUNETTO, 2011; JANCZURA, 2008). Sabemos que o olhar de quem toma a deciso por tal medida pode estar permeado de preconceitos e valores que, ao longo da histria da sociedade brasileira, desenvolveram-se associando tudo o que diz respeito pobreza a uma falta, deficincia. Seja a roupa maltrapilha, seja o modo de falar, de se portar socialmente, h sempre um olhar faltoso e uma ideia velada de que j que a famlia no d conta de normatizar, institucionaliza que o Estado o faz (Estado este que faltou no momento de assistir essa famlia).Comumente fenmenos como negligncia, abandono, violncias domsticas so associados condio socioeconmica das famlias. Silva (2009), por exemplo, afirma que a pobreza influencia no rompimento dos laos familiares, pois seus membros vivenciando privaes de direito acabam por descrer no ser humano e assim, ao perder o sentido do afeto, afastam-se e rompem os laos afetivos e familiares. A essa tendncia denominamos de paradigma da pobreza neste trabalho.Mas, e as famlias que mesmo compartilhando da mesma realidade mantm seus vnculos fortalecidos e no abrem mo do convvio familiar? Por que essa tendncia em afirmar que, por vivenciar dificuldades materiais, essas famlias so menos capazes de trocas afetivas e no reconhecem o sentido e a importncia do afeto? A preocupao com as necessidades bsicas para a subsistncia resulta na fragilizao dos vnculos afetivos entre seus membros? Enfim, o que est de fato perpassando as razes que levam ao acolhimento institucional?Levantamos a hiptese neste trabalho de que haveria aspectos a nvel afetivo atravessando a histria das famlias em questo. Para alm da carncia material, as carncias na troca de afeto e na vinculao entre seus membros culminariam num sentimento de incapacidade de cuidar daqueles que dependem de cuidados especiais. Disfuncionais em reconhecer o seu papel formador e protetivo, pais ou responsveis (cujas vidas muitas vezes foram marcadas por violaes de direito), lanam mo da violncia, em quaisquer das suas modalidades, na sua relao com seus filhos ou dependentes.Para falarmos de afeto, abordaremos duas correntes distintas que tratam do tema. So elas, a teoria do apego e as concepes da antropologia das emoes. A primeira delas, a teoria do apego, uma das linhas mais proeminentes de investigao cientfica acerca da formao e manuteno dos vnculos afetivos, bem como sobre as consequncias psicopatolgicas de ineficaz vinculao afetiva. Desenvolvida primordialmente por John Bowlby, afirma que muitas das intensas emoes humanas surgem durante a formao, manuteno, rompimento e renovao dos vnculos emocionais (BOWLBY, 1997). Por isso, aponta Bowlby, qualquer pessoa interessada na psicologia ou psicopatologia da emoo, seja em animais seja no homem, no tardar em deparar-se com problemas de vinculao afetiva (1997; p. 98).Para a teoria do apego, a capacidade de estabelecer vnculos afetivos to tpica como as capacidades de ver e ouvir, por exemplo. Isso porque afirma ser provvel que tal capacidade tenha valor de sobrevivncia, uma vez que a criana nasce com forte inclinao para aproximar-se de estmulos a ela familiares e a afastar-se daqueles que lhe so estranhos indicando que a funo da vinculao entre indivduos resida na proteo contra predadores. Dessa forma, o apego seria um mecanismo bsico nos seres humanos, cujo papel envolve o reconhecimento de uma figura de apego disponvel oferecendo respostas, possibilitando ao indivduo um sentimento de segurana que fortalece a referida relao (DALBEM & DELLAGLIO, 2005).Sobre essa figura de vinculao, Bowlby (1997) aponta para o modelo interno de apego, que seria um modelo representacional de si formado a partir do tipo de experincia de cuidado que uma pessoa tem, especialmente durante a infncia e teriam grande influncia sobre o fato de ela esperar ou no encontrar mais tarde uma base segura (figura de ligao) e tambm sobre o grau de competncia que possui para iniciar e manter relaes mutuamente gratificantes, quando h oportunidades. Um dos questionamentos que subsidiaram diversas pesquisas no campo da teoria do apego a forma como os indivduos reagem ao rompimento dos vnculos afetivos. Segundo Bowlby, muitos se tornam sujeitos inseguros, ansiosos e imaturos, especialmente quando estiveram expostos ao que ele denomina de parentalidade patognica (1997; p.180), que inclui ausncia de respostas do cuidador ao comportamento da criana realizado a fim de eliciar cuidados, ameaas no sentindo de deixar de amar, de abandonar, matar, induo de culpa por algo ruim ocorrido na famlia e, no menos importante, a descontinuidade da parentalidade, ou seja, longos perodos em hospitais e instituies afastadas do convvio familiar. Para Bowlby (1980) a angstia de separao, diante de situaes nas quais a criana no se encontra na presena da figura principal de apego, faz emergirem sentimentos como ansiedade e medo. J quando o assunto institucionalizao, uma ruptura precria de vnculos, acredita-se que esta resulte em sequelas na maneira como as crianas estabelecem vnculos com outras pessoas. Predominaria um apego inseguro, no qual a criana se tornaria exageradamente amigvel ou evitaria qualquer tipo de aproximao (BALLONE, 2003, apud. OLIVEIRA; PRCHNO, 2010) comum encontrar na literatura estudos sobre os efeitos do rompimento do contato com figuras de apego, em geral representadas pela me, devido institucionalizao (MOTA; MATOS, 2008; PINHEL;TORRES;MAIA, 2009; PEREIRA et al. 2010), outros referem-se a novas formas de apego contextualizadas nas instituies (ALEXANDRE;VIEIRA, 2004; VECTORE;CARVALHO, 2008; DECHANDT, 2006)[footnoteRef:3]. Alguns autores criticam as ideias de Bowlby, especialmente os conceitos de modelo de cuidado, figura do cuidador primrio e o valor dado etologia e por desconsidera a variedade cultural nas prticas de cuidado. (RIBAS & MOURA, 2004). [3: Indicamos, para aprofundar na teoria do apego, alm das referencias j citadas, os trabalhos de Pontes et al. (2007).]

buscando aliar a dimenso cultural, expressivamente diferenciada da teoria at agora abordada, que trazemos outra forma de ver o afeto ou as trocas afetivas/emocionais: a antropologia das emoes. Segundo Rezende (2002), esta tem como questo central a afirmativa das emoes enquanto construes sociais, vinculadas a determinadas sociedades e suas camadas sociais. Aliada a essa concepo do carter construdo das emoes, est a viso de pessoa como um construto tambm elaborado socialmente.Princpio basilar assevera que as experincias emocionais singulares, sentidas e vividas por um ator social especfico, so produtos relacionais entre os indivduos e a cultura e a sociedade (KOURY, 2005; p.239). Koury (2002, apud. KOURY, 2005) define a emoo como uma teia de sentimentos que so dirigidos a outros e causados pela interao em um contexto, situao social e cultural determinados. Assim, o objetivo da Antropologia das Emoes investigar os fatores sociais, culturais e psicolgicos que se expressam por sentimentos e emoes particulares, buscando compreender como esses sentimentos e emoes interagem e se relacionam com os repertrios culturais distintos em diferentes sociedades. O questionamento dessa teoria fundamenta-se na influncia dos fatores sociais na esfera emocional, como esta ocorre e at onde vai.Menezes (2002) chama a ateno para a dupla face do ser humano, organismo animal e sujeito scio-histrico - sendo que a sua raiz cultural enquanto fator complexo impede a universalidade de maneiras de ser, pensar e agir como caracterstica essencial para a existncia da sociedade, uma vez que na cultura, nas relaes estabelecidas com o outro, que a aparelhagem afetiva sofisticada (motivaes, afetos, sentimentos) se desenvolve, permitindo um viver humano-social. O mesmo autor aponta como decisiva para o viver em sociedade, a capacidade que o ser humano tem de compreender as experincias e aes de outra pessoa e reagir diante delas. Essa inter-relao do individual com o social primordial para o processo social e tambm suscita transformaes no prprio indivduo.Para a antropologia das emoes, a qualidade e amplitude das experincias emocionais do humano so ampliadas no meio social, pois estas ocorrem, na maioria das vezes, como reaes a aes de outrem (MENEZES, 2002). Assim, considera a expresso das emoes uma forma de linguagem, construda por cdigos a partir de materiais e modelos fornecidos pela cultura, que atuaria sobre o comportamento afetivo. Este valorizado nas sociedades por ser por meio da afetividade que os sujeitos entram em contato com os valores sociais e os incorporam sua conduta - criando crenas que ao serem compartilhadas mantero a ordem coletiva. , portanto, em meio a prticas especficas da vida social que emoes so expressas, controladas e normatizadas (CAMPOS, 2005).Partindo do pressuposto de que o afeto e suas formas de expresso so construdos socialmente, tal como defende a antropologia das emoes, Campos (2005) discorre sobre o amor materno que na sociedade ocidental contempornea tratado como algo natural, inato. Para a autora, esse sentimento resultado de processos sociais e simblicos que promovem significaes distintas, ao longo da histria, sobre a experincia da maternidade, ganhando significado atravs de representaes sociais (p.210). Assim posto, cabe pensamos sobre a realidade psquica e cultural das famlias nucleares ou extensas que diante de contextos compartilhadas por milhes de outras famlias (pobreza, adoecimentos, priso, deficincias, dependncias qumicas, etc.) acabam abrindo mo, sendo cerceadas ou impedidas de manter seus filhos sob seus cuidados (partindo-se do pressuposto que de fato elas violaram os direitos das suas crianas e adolescentes).Pensamos na teoria do apego de forma diferente da encontrada na literatura que trata deste conceito especialmente em crianas privadas de vnculos afetivos. Isso porque trazemos seus conceitos a fim de hipotetizar questes referentes histria familiar de crianas e adolescentes abrigados. Conjecturamos, por exemplo, que os membros dessas famlias no desenvolveram modelos internos de apego que lhes possibilitassem oferecer relaes seguras e gratificantes aos seus filhos/dependentes. Talvez, na prpria histria, pais ou responsveis sofreram com a ausncia de respostas do cuidador, abandonos e descontinuidade da parentalidade. Assim, tendo internalizado desconfiana e sentimentos de rejeio, essas famlias no reconhecem a necessidade ou a importncia de estabelecer vnculos afetivos, por no saberem como faz-lo.Ao mesmo tempo, questes sociais e culturais falharam ao no abrirem espao para que a emoo e a troca afetiva se desenvolvessem. Fatores sociais e aqui pode entrar o quesito econmico impediram que a dimenso dos afetos, motivaes e sentimentos se desenvolvesse. Pais, responsveis e famlia extensa no teriam apreendido a linguagem do afeto, conforme denomina Menezes (2002) e assim sendo, como poderiam vivenci-la ou compartilh-la.Diante do exposto, sugerimos estudos qualitativos que investiguem profundamente, para alm de perfis descritivos, os aspectos culturais, afetivos e socioeconmicos que atravessam a histria singular de cada sujeito das famlias em questo. Sugerimos igualmente estudos sobre os valores e crenas dos atores responsveis pela deciso de afastamento da famlia dessas crianas e adolescentes esta baseada em dados objetivos ou em preconceitos enraizados por discriminaes histricas?Entendemos serem essas modalidades de investigaes da realidade humana um desafio para os profissionais que atuam no mbito social. Sobretudo para os psiclogos, cuja jornada nessa rea relativamente nova, uma vez que sua expertise - ou seu domnio de conhecimentos e habilidades - h pouco tempo se voltou para a questo social, especialmente para polticas pblicas. Porm, por serem novos so temas que enriquecem profundamente nosso olhar sobre o humano e sobre o social onde ele est inserido. Social este que ele constri e por meio do qual construdo singularmente.

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ANEXO 1 Tabela descritiva dos percentuais dos principais motivos elencados pela reviso da literatura apresentadaPESQUISAS

MOTIVOS/ (%)IPEA/SILVA (2004)MDSSERRANO (2008)BRUNETTO (2011)1 CENSO RJ (2008)6 CENSO RJ (2010)JANCZURA (2008)PENSO (no publicado)

Carncia de recursos materiais da famlia (24,1%),Negligncia na famlia (37,6%) Negligncia (41%)Situao de miserabilidade (15,9%)Negligncia (14,34%) Negligncia (25,83%)Abandono (26,5%)Abandono pelos pais ou responsveis (13%)

Abandono pelos pais ou responsveis (18,8%)Dependentes qumicos/alcoolistas (20,1%)Alta temporria de condies (23,6%)Alcoolismo/uso de substncias (14,5%)Carncia de recursos materiais da famlia/responsveis (12,78%)Abandono dos pais ou responsveis (16,63%)Explorao sexual (26,5%) Falta de condies pessoais ou materiais (11%)

Violncia domstica (11,6%)Abandono pelos pais ou responsveis (19%)Abandono (21,3%)Violncia domstica e familiar (13%)Abandono dos pais ou responsveis (11,68%)Situao de rua (8,60%) Maus tratos (14,7%)Abuso sexual suspeito ou confirmado e/ou explorao sexual (6%)

Dependncia qumica dos pais ou responsveis (11,3%)Violncia domstica fsica (10,8%)Outros motivos (21,3%)Situao de rua (13%)Violncia domstica (8,71%) Abusos fsicos/psicolgicos (8,08%)pobreza (14,7%)Violncia fsica/psicolgica/negligncia/ maus tratos (33%)

Vivncia de rua (7%)Situao de rua (10,1%)Vitimizao fsica (13,1%)Crianas sozinhas em casa (13%)Dependncia qumica/alcoolismo dos pais ou responsveis (4,9%)Pais/responsveis dependentes qumicos/alcoolistas (5,3%)Negligncia (8,8%)Vivncia de rua (13%),

Orfandade (5,2%)Carncia de recursos materiais (9,7%)Entrega (6,2%)Medida de proteo/sem motivo (11,6%)Situao de rua (5,92%)Falta de creche ou escola e perodo integral (5,26%)Drogas (5,8%)Entrega voluntria no abrigo institucional (5%)

Priso dos pais ou responsveis (3,5%),Entrega voluntria pela famlia de origem (5,1%)Vitimizao sexual (3,1%)Procura espontnea (5,8%)Abuso sexual ou suspeita de abuso sexual (3,05%)Abusos fsicos/psicolgicos (4,65%)Pais ou responsveis dependentes qumicos/alcoolistas (5%)

Abuso sexual praticado por pais ou responsveis (3,3%) Pais/responsveis com transtorno mental (5,3%)Vitimizao psicolgica (1,9%)Criana com distrbio psiquitrico (1,4%)Transferncias (5,04%)Uso abusivo de alcool/dbrogas (3,78%) Para adoo/solicitao de guarda (6%)

Outros (15%)Violncia domstica sexual (5,5%)Devoluo por famlia substituta (1,5%) Fuga de outra instituio (1,4%)Orfandade (2,89%)Conflitos no ambiente familiar (3,50%)Outros fatores (8%)

Violncia domstica psicolgica (5,1)No aguardo de deciso judicial (1,4%)Risco de vida na comunidade (2,71%)Responsveis impossibilitados de cuidar por doena (3,42%)

Outros (10,75%)Devoluo por famlia substituta (3,71%)

No informado (12,78%)Carncia de recursos materiais (2,29%)

Orfandade (2,09%)

ANEXO 2 Discrio dos blocos criados neste trabalho e dos motivos que os constituem.

CATEGORIAMOTIVOS MDSMOTIVOS IPEA

Ausncia dos pais/responsveisAusncia dos pelos pais ou responsveis por priso; rfo; Ausncia dos pais ou responsveis por doena.Abandono pelos pais ou responsveis; Ausncia dos pais ou responsveis por doena; Ausncia dos pais ou responsveis por priso; rfo.

Abandono e Entrega voluntria da criana/adolescente pela famlia de origem (nuclear/extensa); Abandono dos pelos pais ou responsveis; Entrega voluntria da criana/adolescente pela famlia de origem(nuclear/extensa).Abandono pelos pais ou responsveis

Falta de condiesDOS PAIS: Pais ou responsveis dependentes qumicos/alcoolistas; Pais ou responsveis com deficincia; Pais ou responsveis com transtorno mental (problemas psiquitricos/psicolgicos);Carncia de recursos materiais da famlia/responsvel.Carncia de recursos materiais da famlia/responsvel (pobreza); Pais ou responsveis dependentes qumicos/alcoolistas; Pais ou responsveis com deficincia.

DAS CRIANAS/ADOLESCENTES: Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/adolescente com condies de sade especficas; Pais ou responsveis sem condies para cuidar de adolescente gestante.Pais ou responsveis sem condies para cuidar de adolescente gestante; Pais ou responsveis sem condies de cuidarde criana/ adolescente com cncer; Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/ adolescente dependente qumico; Pais ou Responsveis sem condies para cuidarde criana/ adolescente portador de HIV; Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/ adolescente portador de deficincia fsica; Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/ adolescente portador de deficinciamental.

ViolnciasViolncia domstica fsica; Violncia domstica sexual; Violncia domstica psicolgica; Violncia ou abuso extrafamiliar (praticado por pessoa no pertencente famlia); Ameaa de Morte.Violncia domstica; Abuso sexual praticado pelos pais ouresponsveis.

Explorao no trabalho ou mendicncia;Explorao no trabalho ou mendicncia;Explorao no trabalho, trfico e mendicncia.

Submetido explorao sexual (prostituio, pornografia);Submetido explorao sexual (prostituio, pornografia).Submetido explorao sexual (prostituio)

NeglignciaNegligncia na famlia.____

Situao de ruaSituao de ruaVivncia de rua

ANEXO 3 Percentual dos Motivos Apontados no Levantamento Nacional de Abrigos para Crianas e Adolescentes da Rede de Servios de Ao Continuada (SAC) realizado em 2004 pelo Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada IPEA e no Levantamento Nacional de Crianas e Adolescentes em Acolhimento Institucional e Familiar que est sendo realizado pelo Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome MDS.

MOTIVOSPesquisa IPEA com 20 mil casos (%)Pesquisa MDS em Unidades de acolhimento com 32621 casos (%)

Abandono pelos pais ou responsveis18,819

Ausncia dos pais ou responsveis por doena2,91,4

Ausncia dos pais ou responsveis por priso3,54,5

Carncia de recursos materiais da famlia/responsvel24,19,7

rfo (morte dos pais ou responsveis)5,24,1

Pais ou responsveis dependentes qumicos/alcoolistas11,320,1

Pais ou responsveis com deficincia2,10,7

Pais ou responsveis sem condies para cuidar de adolescente gestante0,20,2

Violncia domstica fsica11,610,8

Violncia domstica psicolgica5,1

Negligncia na famlia____37,6

Violncia domstica sexual3,35,5

Submetido explorao sexual (prostituio, pornografia)11,1

Submetido explorao no trabalho ou mendicncia1,82,9

Situao de rua710,1

Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/adolescente portador de deficincia fsica1,4___

Entrega voluntria da criana/adolescente pela famlia de origem (nuclear/extensa)___5,1

Pais ou responsveis com transtorno mental (problemas psiquitrico-psicolgicos)____5,3

Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/adolescente com condies de sade especficas____1,4

Violncia ou abuso extrafamiliar (praticado por pessoa no pertencente famlia)____1,5

Ameaa de Morte____1,6

Outros____12

No sabe0,41,8

Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/adolescente portador de deficincia mental2,2____

Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/adolescente portador de HIV1,3____

Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/adolescente dependente qumico1,2____

Pais ou responsveis sem condies para cuidar de criana/adolescente com cncer0,7____

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