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ADRIANA SOARES LOBO
DAFA (DIA TÍPICO DE ATIVIDADES FÍSICAS E ALIMENTAÇÃ O): REPRODUTIBILIDADE E VALIDADE CONCORRENTE RELATIVAS AO
CONSUMO ALIMENTAR
Orientadora: Profª. Dra. Maria Alice Altenburg de Assis
FLORIANÓPOLIS (SC) 2003
ADRIANA SOARES LOBO
DAFA (DIA TÍPICO DE ATIVIDADES FÍSICAS E ALIMENTAÇÃ O): REPRODUTIBILIDADE E VALIDADE CONCORRENTE RELATIVAS AO
CONSUMO ALIMENTAR Dissertação Apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Nutrição da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) como requisito parcial à obtenção do Título de Mestre em Nutrição Orientadora: Profª. Dra. Maria Alice Altenburg de Assis
FLORIANÓPOLIS (SC) 2003
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM NUTRIÇÃO ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: METABOLISMO E DIETÉTICA
A Dissertação DAFA (DIA TÍPICO DE ATIVIDADES FÍSICAS E ALIMENTAÇÃO): REPRODUTIBILIDADE E VALIDADE CONCORRENTE RELATIVAS AO CONSUMO ALIMENTAR
elaborada por ADRIANA SOARES LOBO
e aprovada por todos os membros da Banca Examinadora, foi aceita pelo Curso de Pós-Graduação em Nutrição da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), como requisito parcial à obtenção do título de
MESTRE EM NUTRIÇÃO Florianópolis, 10 de Dezembro de 2003.
______________________________________ Prof ª. Dra. Emília Addison Machado Moreira
Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Nutrição
Banca Examinadora: ______________________________________
Prof. Dr. Sérgio Fernando Torres de Freitas (Presidente)
______________________________________
Prof ª. Dra. Regina Mara Fisberg (Membro)
______________________________________
Prof. Dr. Francisco de Assis Guedes Vasconcelos (Membro)
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer a todos que contribuíram para a concretização deste
trabalho e a realização de um sonho, mas especialmente:
À Professora Maria Alice Altenburg de Assis, pela orientação e constante
incentivo para que eu fizesse um bom trabalho;
Aos Professores Regina Mara Fisberg, Sérgio F. T. de Freitas e Francisco A.
G. de Vasconcelos, por terem aceito participar da banca examinadora e pela
valorosa contribuição a este trabalho;
Aos diretores, coordenadores e escolares da E. D. João Francisco Gearcez,
da E. D. Praia de Fora e dos Colégios Ilha Tendência, Marco Inicial e Santa Mônica,
por gentilmente terem aceito participar do estudo;
À estagiárias Lara, Heide, Cristhiane, Ticiane, Caroline e Natália, não só
pela imprescindível ajuda na coleta de dados, mas também pela amizade;
À Professora Maria Cristina e, novamente, ao Professor Sérgio, pelo
paciente auxílio na análise estatística;
Ao Professor Mauro V. G. Barros, pela colaboração nos cálculos do
“PABAK”;
Aos professores do curso de Pós-Graduação em Nutrição desta
Universidade, por terem contribuído na minha formação como Mestre;
Aos colegas de Mestrado Cláudia, Neiva, Bethânia, Louise, Paulo, Ivan e
Nilo, por terem dividido comigo as alegrias e as aflições desta caminhada;
Com especial carinho, a João Marcelo, pelo afeto, confiança e paciência
demonstrados durante todo esse período;
Aos meus pais, Ivo e Emília, e aos meus irmãos, Alexandre e Giovanni, pelo
apoio incondicional em todos os momentos;
A Deus, pela minha existência.
RESUMO
DAFA (DIA TÍPICO DE ATIVIDADES FÍSICAS E ALIMENTAÇÃ O): REPRODUTIBILIDADE E VALIDADE CONCORRENTE RELATIVAS AO CONSUMO ALIMENTAR Adriana Soares Lobo Orientadora: Profa. Dra. Maria Alice Altenburg de Assis
O questionário "Dia Típico de Atividades Físicas e de Alimentação" (DAFA) foi delineado para avaliar as escolhas de atividades físicas e de consumo alimentar de crianças de sete a dez anos de idade participantes de um estudo epidemiológico que avaliou a prevalência de sobrepeso e obesidade e fatores associados em Florianópolis (SC). Este estudo teve por objetivo verificar a reprodutibilidade e a validade concorrente do DAFA relativas ao consumo alimentar. Participaram do estudo 355 escolares de 1ª a 4ª série de cinco escolas (duas públicas e três privadas) do município de Florianópolis. O DAFA foi aplicado em sala de aula como um exercício supervisionado duas vezes na semana (terça-feira e sexta-feira) por um pesquisador treinado, seguindo um protocolo padronizado. Os escolares foram observados em seu lanche escolar durante cinco dias de uma semana típica. Considerou-se como habitual a observação do consumo de um alimento ou bebida durante três ou mais dias da semana. Os dados foram comparados item a item entre as duas aplicações do DAFA (reprodutibilidade) e entre o DAFA e a observação (validade concorrente) a fim de determinar concordância relativa (%), coeficiente kappa e o kappa ajustado (PABAK). As médias de PABAK em cada refeição e por alimento foram comparadas entre as redes de ensino (pública x privada) e séries (1ª e 2ª x 3ª e 4a séries) através de análise de variância. De modo geral, os valores de concordância relativa na análise da reprodutibilidade variaram de 69,3% a 96,3%, sendo que os PABAKs variaram de fracos (0,21<k<0,40) a substancias (k<0,61). Os valores médios de PABAK foram significativamente maiores (p<0,001) na rede privada e nas séries mais avançadas (terceira e quarta séries). No tocante a validade concorrente, as concordâncias relativas variaram de 57,7% a 94,1% e os valores de PABAK também variaram de fracos a substanciais. Os alimentos que obtiveram PABAKs mais elevados foram aqueles que menos foram consumidos pelos escolares, independente do tipo de escola. A comparação das médias de PABAK entre as escolas demonstrou diferenças significativas (p<0,05) a favor da escola privada, o que poderia estar relacionado às diferenças no tipo de lanche escolar consumido nas diferentes redes de ensino. Sugere-se a modificação de alguns grupos alimentares, como o do pão, a fim de facilitar o entendimento pelos escolares e o refinamento do protocolo de aplicação com vistas a minimizar os problemas detectados neste estudo.
Palavras-chave: DAFA, consumo alimentar, escolares, validade, reprodutibilidade.
ABSTRACT
DAFA (TYPICAL DAY OF PHYSICAL ACTIVITIES AND FOOD I NTAKE): REPRODUCIBILITY AND VALIDITY RELATED TO FOOD INTAKE Author: Adriana Soares Lobo Advisor: Profa. Dra. Maria Alice Altenburg de Assis
The questionnaire "Typical Day of Physical Activities and Food Intake" (DAFA) was delineated to evaluate the choices of physical activities and food intake of children aged 7 to 10 years old participating in an epidemiologic study that evaluated the prevalence of overweight and obesity and associated factors in children of Florianópolis (SC). The purpose of this study was to assess the reproducibility and the validity of the DAFA related to food intake. The sample consisted of 355 first to fourth grader students from five schools (two public and three private) of Florianópolis city. The DAFA was applied in the classroom as a supervised exercise twice in a week (tuesday and friday) by a trained researcher, following a standardized protocol. The school-break was observed during five days of a typical week. It was considered as habitual the observed consuption of a food or beverage during three or more days of the week. The data were compared between the two applications of the DAFA (reproducibility) and between the DAFA and the researcher’s observation (validity) in order to determine relative agreement (%), kappa and kappa adjusted (PABAK) coefficients. The averages of PABAK in each meal and for food were compared between the school types (public versus private) and grades (1st and 2nd versus 3th and 4th grades) by variance analysis. In general, the values of relative agreement in the analysis of the reproducibility had varied of 69.3% to 96.3%, being that the PABAKs had varied of weak (0,21<k<0,40) to substantial (k<0,61). The average values of PABAK had been significantly higher (p<0,001) in the private school and most advanced grades (3th and 4th grades). Regarding validity, the relative agreements had varied of 57.7% to 94.1% and the values of PABAK had also varied of weak to substantial. The higher PABAKs had been those less consumed by the children, independent of the school type. The comparison of the averages of PABAK between the schools demonstrated significant differences (p<0,05) in favor of the private school, what could be related to the differences in the type of foods. Modification of some food groups is suggested, as of the bread, in order to facilitate the understanding, and refine the protocol of application with sights to minimize the problems detected in this study. Key Words: DAFA, food intake, school children, validity, reproducibility.
1 INTRODUÇÃO
1.1 O PROBLEMA
As doenças crônicas não transmissíveis, representadas principalmente pelas
doenças cardiovasculares, pela diabetes mellitus e pelas neoplasias, têm sido
apontadas como as principais causas de mortalidade nos países desenvolvidos e em
desenvolvimento (BARRETO & CARMO, 1998).
Uma série de fatores estão associados ao desenvolvimento destas doenças
e, alguns deles, parecem estar presentes em crianças. Tal como em adultos, a
obesidade em crianças, por exemplo, ocorre com outros fatores de risco para
doenças cardiovasculares, como aumento da pressão sanguínea, alterações
adversas nas lipoproteínas séricas e hiperinsulinemia (BERENSON et al.,1998).
Como o desenvolvimento de algumas doenças crônicas parece repousar na
infância, tem ocorrido no meio científico um crescente interesse sobre os
comportamentos de saúde que podem predispor ou protegê-las de doenças no
futuro.
Dentre esses comportamentos de saúde, a dieta e a atividade física atraem
particular interesse uma vez que estão inseridas no contexto das atividades diárias
(BARANOWSKI & SIMONS-MORTON, 1991).
Evidências científicas têm sugerido que o estilo de vida na infância pode
exercer um efeito importante sobre o risco de muitas doenças crônicas como
obesidade, doença arterial coronariana, hipertensão arterial, diabetes e certos tipos
de câncer (BERENSON et al.,1998; MCGIL, 1997; MUST, 1996; DIETZ, 1994).
Alguns fatores dietéticos na infância que poderiam predispor a doenças
futuras incluem a ingestão excessiva de gordura saturada e de sal e o baixo
consumo de cálcio. Por exemplo, o acúmulo de cálcio ósseo durante a infância e a
adolescência será o principal determinante do risco de osteoporose mais tarde na
vida. Similarmente, uma ingestão elevada de gordura saturada durante a infância
pode promover o processo de aterosclerose em pessoas com predisposição
genética, com isso acelerando as manifestações clínicas de doença arterial
coronariana no adulto (CABALLERO, 2001).
Com relação às atividades físicas, BOREHAM & RIDDOCH (2001) relatam
existir pouca evidência direta associando sedentarismo com saúde na infância. No
entanto, alguns benefícios da prática destas atividades na infância têm sidos
postulados. Crianças mais ativas fisicamente geralmente apresentam perfis
cardiovasculares mais saudáveis, são mais magras e desenvolvem pico de massa
óssea mais alto do que as menos ativas. Além disso, crianças ativas durante a
infância apresentam maior chance de serem ativas durante a vida adulta.
Neste contexto, torna-se imperativo a implementação de medidas de saúde
pública que visem a promoção de hábitos alimentares e de estilo de vida mais
saudáveis desde a infância. Esta ação ganha mais importância ao se analisar o
relato de HURSTI (1999). Segundo o autor, apesar dos hábitos alimentares não
serem estáveis e imutáveis, a base para a formação de hábitos saudáveis são
criados na infância.
Sobre o assunto, LIVINGSTONE & ROBSON (2000) comentam que os
hábitos formados no início da vida em resposta a necessidades fisiológicas e
pressões psicossociais podem ter, a longo prazo, um impacto considerável na
saúde.
No entanto, pesquisas a respeito do comportamento humano que poderiam
melhor elucidar as relações entre características do estilo de vida e saúde e, a partir
da aí, estabelecer estratégias educativas eficientes, são complexas. O consumo
alimentar, por exemplo, pode ser estudado em relação aos alimentos consumidos no
dia anterior ou habitualmente, à contribuição dos nutrientes nas refeições ou
lanches, à freqüência de refeições e intervalo entre elas, à velocidade das refeições
e em relação à muitas outras características. Da mesma forma, o nível de atividade
física, os tipos de atividades físicas, intensidade, duração e freqüência podem ter
diferentes implicações na saúde de indivíduos (BARANOWSKI & SIMONS-
MORTON, 1991).
Assim sendo, a obtenção de medidas precisas do consumo alimentar e de
atividade física é um desafio para o melhor entendimento da relação entre hábitos
saudáveis e a diminuição do risco de doenças crônicas no adulto.
Entretanto, a obtenção de dados sobre ingestão alimentar, tanto em adultos
quanto em crianças, apresenta problemas metodológicos relacionados à precisão
dos instrumentos de medida.
De acordo com LOPES et al. (2003), a obtenção de dados válidos e
confiáveis em estudos epidemiológicos nutricionais é tarefa difícil, uma vez que não
existe um método ouro para a avaliação da ingestão de alimentos e nutrientes.
Em crianças, estes problemas têm como agravante sua limitação cognitiva
para relatar a ingestão de alimentos, incluindo um inadequado desenvolvimento do
conceito de tempo, memória e atenção insuficientes e o desconhecimento do nome
dos alimentos e das preparações (LIVINGSTONE & ROBSON, 2000).
Visando avaliar a prevalência de sobrepeso e de obesidade e sua relação
com o estilo de vida em escolares do município de Florianópolis (SC), no ano de
2002 foi desenvolvido um estudo por VASCONCELOS et al. (2002). O estudo foi
delineado a partir de um protocolo de pesquisa utilizado por 15 países da
comunidade européia, com o intuito de facilitar a comparação dos dados sobre o
estado nutricional das crianças de sete a dez anos entre estes países. A publicação
de critérios internacionais de definição de obesidade no ano 2000 veio impulsionar a
realização de estudos transversais multicêntricos, possibilitando avaliação mais
precisa sobre a evolução da prevalência da obesidade em crianças e de seus
fatores determinantes, o que aumenta as possibilidades de intervenções mais
eficazes (COLE et al., 2000 ).
A inexistência no Brasil de dados populacionais sobre o estilo de vida de
escolares, conduziu os coordenadores da pesquisa a incrementar o protocolo
europeu, incluindo um instrumento de coleta de dados para identificar possíveis
fatores do estilo de vida associados ao estado nutricional. Foram escolhidos dois
indicadores do estilo de vida: a atividade física e o consumo alimentar. Para tal,
desenvolveu-se um instrumento de coleta de dados que preenchesse os requisitos
de aplicabilidade numa amostra populacional das crianças participantes do projeto.
A revisão da literatura fundamentou algumas premissas para o desenvolvimento do
instrumento, considerando as propriedades cognitivas das crianças desta faixa etária
e a difícil tarefa de se contar com pais de aproximadamente 4500 escolares para
realizarem um inquérito alimentar quantitativo para estimar a ingestão calórica, de
macro e micronutrientes.
O instrumento “Dia Típico de Atividades Físicas e de Alimentação” (DAFA)
é um questionário estruturado, desenvolvido com o objetivo de obter informações
sobre os hábitos de atividade física e de consumo alimentar representativos de um
dia habitual, típico de semana (BARROS et al., 2003).
O instrumento é original, mas baseou-se em questionários aplicados em
pesquisas americanas e européias, que empregavam representações gráficas para
identificação do tipo de exercício físico e dos alimentos e bebidas consumidos
(BARROS et al., 2003).
O questionário foi então submetido a pré-testes para aprimorar o
entendimento das crianças e a testes de reprodutibilidade, demonstrando ser um
método promissor para avaliar tipo e intensidade de atividade física e de consumo
de frutas e verduras. No entanto, necessita de outros estudos de validação para
demonstrar o grau em que o instrumento é apropriado para medir o verdadeiro valor
daquilo que se pretende medir, observar ou interpretar.
Diante do exposto, pretendeu-se com este estudo verificar a
reprodutibilidade e a validade concorrente do instrumento de coleta de dados DAFA
na obtenção de medidas de consumo alimentar de escolares de primeira a quarta
séries de escolas públicas e privadas do município de Florianópolis.
1.2 JUSTIFICATIVA
Conforme descrito anteriormente, evidências científicas têm sugerido que o
desenvolvimento de algumas doenças crônicas tem seu início na infância, causando
no meio científico um crescente interesse sobre os fatores comportamentais, mais
especificamente sobre a dieta e a atividade física, que podem predispor à doenças
no futuro.
Sobre o assunto, CINTRA et al. (1997) destacam que é através de medidas
de ingestão alimentar que se torna possível identificar grupos populacionais de alto
risco, elaborar programas de intervenção nutricional e monitorar o sucesso da
relação custo-benefício desses programas. Além disso, dados sobre ingestão
alimentar são necessários para predizer a adequação dos suprimentos alimentares e
determinar grupos que estariam de acordo com os padrões dietéticos.
No entanto, a obtenção de dados sobre ingestão alimentar, tanto em adultos
quanto em crianças, apresenta problemas metodológicos relacionados à precisão
dos instrumentos de medida. Conforme relatam CINTRA et al. (1997), muito embora
tenha ocorrido importantes avanços no campo da epidemiologia da nutrição, uma
das dificuldades que ainda persistem para estudar a relação entre dieta e um
determinado estado de saúde é a falta de instrumentos com validade e
reprodutibilidade que possibilitem sua aferição com suficiente confiança e precisão.
A escolha do método de avaliação da dieta em crianças deve levar em
consideração não somente os objetivos do estudo e a capacidade da criança ou dos
pais em responder o inquérito, mas também deve incluir medidas que avaliem a
qualidade do relato (LIVINGSTONE & ROBSON, 2000).
Assim sendo, este estudo permitirá conhecer a aplicabilidade do instrumento
no estabelecimento de relações entre o estilo de vida de crianças e o
desenvolvimento de doenças como a obesidade.
1.3 OBJETIVOS
1.3.1 Geral
Verificar a reprodutibilidade e a validade concorrente do instrumento DAFA
na obtenção de medidas de consumo alimentar de escolares de primeira a quarta
séries de escolas públicas e privadas do município de Florianópolis.
1.3.2 Específicos
� Avaliar a reprodutibilidade do instrumento DAFA relativa a seção de
consumo alimentar;
� Comparar a reprodutibilidade do DAFA relativa ao consumo alimentar entre
os diferentes tipos de escolas (pública versus privada) e entre as diferentes séries
(primeira e segunda séries versus terceira e quarta séries);
� Avaliar a validade concorrente do instrumento DAFA relativa a seção
consumo alimentar, na refeição do lanche escolar (manhã ou tarde);
� Comparar a validade concorrente do DAFA relativa ao consumo alimentar
na refeição do lanche escolar entre os diferentes tipos de escolas (pública versus
privada) e entre as diferentes séries (primeira e segunda séries versus terceira e
quarta séries).
1.4 HIPÓTESES
� O DAFA é um instrumento que apresenta boa reprodutibilidade e validade
concorrente relativas ao consumo alimentar;
� Existe diferença na performance do DAFA entre os escolares da rede
pública e da rede privada;
� Existe diferença na performance do DAFA entre os escolares das
diferentes séries.
1.5 DEFINIÇÃO DE TERMOS
Instrumento DAFA (Dia Típico de Atividades Físicas e de Alimentação):
Questionário estruturado desenvolvido com o objetivo de obter informações sobre os
hábitos de atividade física e de consumo alimentar representativos de um dia
habitual, típico de semana (BARROS et al., 2003). Neste estudo, a avaliação de sua
reprodutibilidade e validade concorrente diz respeito somente a seção relativa ao
consumo alimentar.
Registro Alimentar: Instrumento de coleta de dados de consumo alimentar
que consiste na anotação em formulário próprio de todos os alimentos consumidos
ao longo do dia pelo indivíduo avaliado ou seu representante (mãe, quando é
criança ou o responsável pelo cuidado, quando incapacitado) (CINTRA et al., 1997).
Recordatório Alimentar de 24 horas: Tipo de inquérito dietético que tem por
objetivo obter informação completa sobre os alimentos ingeridos durante um período
de 24 horas. Este período pode ser o dia anterior, desde o desjejum até a ceia
(forma mais freqüentemente utilizada), ou nas 24 horas precedentes à entrevista
(CINTRA et al., 1997).
Questionário de Freqüência Alimentar: Instrumento que avalia quanto certos
alimentos ou grupo de alimentos são consumidos durante um determinado período
de tempo (dia, semana ou mês) (CINTRA et al., 1997).
Método de Observação do Consumo Alimenmtar: Método de registrar a
ingestão alimentar, onde o avaliador observa o consumo do avaliado, não
necessitando de auto-relato de ingestão (EDMUNDS & ZIEBLAND, 2002).
Validade: Grau em que um instrumento é apropriado para medir o verdadeiro
valor daquilo que é medido, observado ou interpretado. A validade informa se os
resultados representam a “verdade” ou o quanto se afastam dela (PEREIRA, 1999).
Validade concorrente (ou simultânea): Tipo de validade que refere-se a
quanto, em termos quantitativos, um teste é útil para diagnosticar um evento
(PEREIRA, 1999).
Reprodutibilidade: É a consistência dos resultados quando um exame ou
medição se repete (PEREIRA, 1999).
1.6 ESTRUTURA DO TRABALHO
Colocado o problema, definidos os objetivos e levantadas as hipóteses na
Introdução, o presente estudo organizou-se, nos capítulos subseqüentes, da
seguinte maneira:
� Revisão de Literatura: incluiu os temas que embasaram a formulação
do problema e as discussões existentes relativas ao tema;
� Metodologia: capítulo onde são detalhados os procedimentos utilizados
na coleta e análise dos dados;
� Resultados e Discussão: onde são apresentados os dados referentes a
validade e a reprodutibilidade do DAFA, nos diferentes tipos de escolas e séries, e
discutidos em relação à literatura específica;
� Conclusões e Recomendações: onde são apresentados os principais
achados deste estudo e, a partir daí, feitas as recomendações para minimizar
eventuais problemas do instrumento e orientar futuros estudos.
Na seqüência, apresentam-se as Referências Bibliográficas, que aparecem
na forma do Index Médicus, e os Anexos.
3 METODOLOGIA
3.1 ÂMBITO DO ESTUDO
Este é o terceiro de uma série de estudos que visam avaliar a
reprodutibilidade e a validade do questionário Dia Típico de Atividades Físicas e de
Alimentação (DAFA). O foco desta pesquisa direciona-se ao estudo da validade
concorrente e da reprodutibilidade da seção de consumo alimentar.
Os dados do presente estudo foram coletados entre os meses de março e
junho de 2003.
3.2 TIPO DE PESQUISA
Em virtude de suas características, o estudo se caracteriza como do tipo
descritivo transversal (RÚDIO, 1986; PEREIRA, 1999).
3.3 ASPECTOS ÉTICOS
O presente estudo integra as atividades do projeto “Sobrepeso e Obesidade
e sua Relação com o Estilo de Vida em Escolares de 7 a 10 anos no município de
Florianópolis, SC” (VASCONCELOS et al., 2002), cujo protocolo da pesquisa foi
submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da
Universidade Federal de Santa Catarina (Anexo 1).
O projeto de pesquisa foi previamente apresentado aos diretores das
escolas selecionadas, para a obtenção de uma autorização para a sua realização.
Foram realizadas reuniões com a equipe pedagógica destas escolas, com o objetivo
de discutir a proposta de pesquisa, assegurar a adesão e participação dos
professores e determinar um cronograma de atividades, de modo que as atividades
pedagógicas não inviabilizassem a realização da pesquisa (por exemplo realização
de atividades pedagógicas fora da escola, feriados, atividades festivas). Nesta
ocasião foi exposto que, como forma de retribuição pela participação na pesquisa, a
equipe pedagógica, os alunos e os pais receberiam, após o término do estudo, uma
análise nutricional qualitativa do consumo alimentar informado pelas crianças. Um
termo de consentimento livre e esclarecido foi enviado aos pais dos alunos com uma
semana de antecedência da aplicação da pesquisa nas escolas (Anexo 2).
3.4 AMOSTRAGEM
3.4.1 Escolas
Foram selecionadas duas escolas públicas e três escolas privadas do ensino
fundamental, no município de Florianópolis (SC), que não participaram do estudo de
base populacional de VASCONCELOS et al. (2002), onde houve a aplicação do
DAFA. Tratou-se, portanto, de uma amostra intencional de escolas, selecionadas
para garantir a presença de variáveis importantes para o estudo: presença de
escolares da rede pública e da rede privada, com diferentes níveis sócio-
econômicos.
Para garantir procedimentos adequados no método de observação das
crianças durante o período do lanche, foram escolhidas escolas com apenas uma
classe da primeira a quarta série, e com um limite de até 30 alunos por série. Além
disso, teve-se o cuidado de escolher escolas onde as séries das crianças mais
novas faziam o lanche escolar em horários não coincidentes aos das séries de
crianças mais velhas.
Nas escolas da rede pública os escolares recebiam o lanche da escola
através do Programa de Alimentação Escolar, não sendo permitido levar qualquer
tipo de alimento de casa. O cardápio, elaborado por nutricionistas, era quinzenal,
incluindo alimentos como bolachas, achocolatados, frutas e pratos salgados (arroz,
feijão, carnes, sopas, etc.). Já nas escolas privadas os escolares traziam de casa ou
compravam seus lanches nas cantinas. Apesar de leis (Lei n.º 5853/2001 e Lei n.º
12.061/2001) proibirem a venda de alimentos com baixo valor nutricional nas
cantinas, os escolares podiam trazer qualquer tipo de alimento de casa, incluindo
sucos artificiais, chips, pastelarias, refrigerantes, bolachas recheadas, entre outros.
3.4.2 Escolares
Escolares e pais de alunos de primeira a quarta série das cinco instituições
de ensino selecionadas foram convidados a participar deste estudo.
Do total de 389 alunos convidados, 378 tiveram o consentimento dos pais
para participarem do estudo. Destes, 355 participaram do estudo de validação,
sendo que para isso era necessário não ter faltado mais de que um dia de aula
durante a semana de observação.
3.5 ESTUDO PILOTO
Um estudo piloto foi conduzido com 21 escolares, de ambos os sexos, da
primeira série do ensino fundamental de uma escola pública da rede municipal de
ensino público, para testar a aplicabilidade dos instrumentos, verificar a melhor
técnica de observação a ser empregada e realizar treinamento dos entrevistadores e
observadores. Com base neste estudo, realizaram-se ajustes nos instrumentos de
coleta de dados e um protocolo de aplicação do DAFA e de observação dos lanches
dos escolares foi elaborado. Estudantes do Curso de Nutrição da Universidade
Federal de Santa Catarina foram treinadas durante a realização deste estudo.
Dois métodos de observação foram testados no estudo piloto. No primeiro
método, cada pesquisador observava exclusivamente cinco a seis crianças durante
o lanche escolar identificadas com um crachá contendo o nome e a série. No
segundo método, os pesquisadores distribuíam-se pelo pátio da escola observando
o maior número possível de crianças. Neste caso, os pesquisadores portavam
planilhas com o nome de cada criança, identificadas através de um crachá com o
número de chamada.
No primeiro método identificou-se dificuldades de se empregar
adequadamente a técnica de observação, devido ao deslocamento dos escolares
para diferentes locais durante o lanche escolar. O segundo método apresentou-se
como o mais adequado, pois parecia desviar a atenção das crianças para o fato de
estarem sendo observadas.
3.6 INSTRUMENTOS
3.6.1 Questionário Dia Típico de Atividades Físicas e de Alimentação (DAFA)
O questionário Dia Típico de Atividades Físicas e Alimentação (DAFA)
(Anexo 3) foi um dos instrumentos de coleta de dados utilizado na pesquisa
“Sobrepeso e Obesidade e sua Relação com o Estilo de Vida em Escolares de 7 a
10 Anos no Município de Florianópolis, SC”, estudo epidemiológico de corte
transversal, cuja coleta de dados foi realizada entre os meses de setembro e
dezembro de 2002.
O DAFA é um questionário ilustrado e estruturado desenvolvido por
BARROS et al. (2003), delineado com o objetivo de obter informações sobre os
hábitos de atividade física e de consumo alimentar representativos de um dia
habitual numa semana típica. O instrumento foi desenvolvido para as crianças de
sete a dez anos de idade, da primeira a quarta série do ensino fundamental. O termo
dia típico ou habitual se refere aos tipos de atividades físicas, de refeições, grupos
de alimentos e itens alimentares escolhidos pelas crianças como representativos de
um dia típico de semana. Como requisitos importantes na formatação do DAFA,
foram levados em consideração: a fase curricular e cognitiva das crianças na faixa
etária considerada; a viabilidade de aplicação ao conjunto de alunos em sala de
aula; a padronização de um único instrumento aos alunos das primeiras às quartas
séries, a apresentação atraente e a facilidade de aplicação em sala de aula, por
pessoal treinado e com a supervisão do professor; a clareza das informações
requeridas e o baixo custo.
O delineamento do questionário foi realizado a partir da realização de
estudos de grupos focais, conduzidos com a participação de profissionais das áreas
de educação física, nutrição e pedagogia. Para a inclusão dos alimentos e grupos de
alimentos foram consideradas as recomendações alimentares para as crianças
desta faixa etária, os dados de pesquisas sobre os hábitos alimentares de crianças e
os alimentos oferecidos pela merenda escolar nas escolas municipais de
Florianópolis. A criação dos símbolos e desenhos foi realizada por uma empresa de
design gráfico (BARROS et al., 2003).
A primeira versão do instrumento foi testada em estudo piloto, conduzido
junto a um grupo de escolares da primeira à quarta série do ensino fundamental de
uma escola da rede pública federal de Florianópolis, para avaliar a sua
reprodutibilidade e validade. As evidências da validade do instrumento foram
determinadas através da comparação entre os dados obtidos através do DAFA e de
um questionário respondido por pais e professores (para obtenção de medidas de
atividades físicas) e em relação aos dados obtidos com a aplicação de um
recordatório de 24 horas, para as medidas de consumo alimentar (BARROS et al.,
2003). O instrumento foi refinado a partir deste estudo piloto e a estrutura da versão
final do DAFA ficou distribuída em seis páginas, com cerca de 50 ilustrações
coloridas. As três primeiras páginas do instrumento dizem respeito às medidas de
atividades físicas e as três últimas ao aspecto alimentar.
Na primeira seção (atividades físicas), há quatro tipos de medidas que
podem ser derivadas das informações fornecidas pelos alunos (BARROS et al.,
2003): 1- Atitude (gosto) em relação às atividades físicas; 2- Tipo de transporte de
casa para a escola; 3- Intensidade das atividades físicas e 4- Nível geral de
atividades físicas.
Na segunda parte do instrumento, as informações relativas ao consumo
alimentar permitem obter informações sobre as escolhas de cinco refeições e 16
grupos de alimentos e itens alimentares em um dia típico. Esta seção inclui também
uma avaliação da atitude (gosto, preferência) dos sujeitos em relação a quatro tipos
de alimentos: dois de sabor doce (refrigerantes e frutas) e outros dois de sabor
neutro (verduras e feijão com arroz). O gosto ou preferência é avaliado através de
uma escala hedônica de cinco categorias de expressões faciais (detesta, não gosta,
indiferente, gosta, gosta muito).
3.6.2 Questionário dos pais
O questionário dos pais (Anexo 4) foi delineado com base num dos
instrumentos de coleta de dados da pesquisa “Sobrepeso e Obesidade e sua
Relação com o Estilo de Vida em Escolares de 7 a 10 Anos no Município de
Florianópolis, SC” (VASCONCELOS et al., 2002). Para os objetivos do presente
estudo foram incluídas questões estruturadas sobre a idade, profissão e renda
familiar, além de questões que permitissem a classificação econômica através do
Critério de Classificação Econômica do Brasil (ANEP, 2002) (Anexo 5). Este critério
tem a função de estimar o poder de compra de pessoas e famílias urbanas, sem
pretensão de classificação da população em termos de classes sociais.
Considerando alguns itens de consumo, grau de instrução do chefe da família e
presença de empregada mensalista, obtém-se uma pontuação que permite a
classificação econômica. Este critério permite estabelecer um parâmetro mais
confiável de renda familiar em cada classe, em termos de média e faixa de renda, do
que a indagação direta.
Também foram incluídas questões sobre a alimentação dos filhos e, para
avaliação do nível de conhecimento sobre o assunto, foram introduzidas questões
acerca das refeições que realizavam habitualmente com os filhos, quais os alimentos
que achavam que seus filhos habitualmente comiam no lanche escolar e quais os
itens que a criança comia habitualmente no jantar. Estas questões foram inseridas
para testar a hipótese de que o jantar seria a refeição que os pais estariam mais
freqüentemente com seus filhos, e neste caso então utilizar esta medida como
referência para testar a validade do DAFA frente às informações dos pais. No
entanto, estes dados não foram analisados no presente estudo.
3.7 DETERMINAÇÃO DO ESTADO NUTRICIONAL
O Índice de Massa Corporal (IMC), computado através da massa corporal em
quilogramas (Kg) dividido pela estatura em metros quadrados (m2), foi utilizado para
a classificação das crianças em baixo peso, sobrepeso (incluindo obesidade) ou
obesidade.
Para obtenção da massa corporal e da estatura seguiu-se o protocolo de
GORDON et al. (1991). As medidas de massa corporal foram realizadas através de
balança digital da marca Filizola, com escalas de 100 gramas. Os escolares foram
mensurados descalços, usando roupas leves.
Para mensuração da altura, utilizou-se uma fita métrica milimetrada, aderida
à parede, com o ponto zero da fita aderida ao nível do solo. Procurou-se fixá-la em
uma parede aparentemente sem inclinação e com solo regular. A medida foi feita
com o avaliado descalço, em pé, com as superfícies posteriores dos calcanhares, a
cintura pélvica, a cintura escapular e a região occipital em contato com a parede. A
cabeça estava orientada no plano horizontal de Frankfurt, paralelo ao solo. A estatura
foi medida em apnéia, após uma inspiração máxima.
Duas referências de IMC foram utilizadas para a classificação do estado
nutricional das crianças: (1) as referências propostas pela International Obesity Task
Force (IOTF), baseadas em dados de seis países, inclusive do Brasil (COLE et al.,
2000) para a classificação de sobrepeso e obesidade; e (2) as referências
recomendadas pela Organização Mundial de Saúde e publicadas por MUST et al.
(1991) para a classificação de baixo peso.
A Tabela 1 apresenta os respectivos valores de percentis do IMC,
correntemente usados como pontos de corte para definir obesidade, sobrepeso e
baixo peso, de acordo com as três referências.
TABELA 1- VALORES DE PONTOS DE CORTE DE IMC USADOS PARA DEFINIR OBESIDADE, SOBREPESO E BAIXO PESO EM DIFERENTES IDADES EM MENINAS E MENINOS, DE ACORDO
COM AS REFERÊNCIAS IOTF E MUST et al. (ADAPTADO DE ROLLAND CACHERA et al.,2002) Meninas Meninos Idade 6 7 8 9 10 6 7 8 9 10 Classificação Obesidade (C30a) 20,08 21,01 22,18 23,46 24,77 20,23 21,09 22,17 23,39 24,57 Sobrepeso incluindo obesidade (C25b)
17,53
18,03
18,69
19,45
20,29
17,71
18,16
18,76
19,46
20,20
Baixo peso (5ªpercentil) 16,14 17,16 18,19 19,21 20,23 16,52 17,31 18,10 18,88 19,67 aValores de pontos de corte definidos para passar através do IMC de 30kg/m2 na idade de 18 anos. b Valores de pontos de corte definidos para passar através do IMC de 25kg/m2 na idade de 18 anos.
Cinco idades foram definidas: 6 anos (6,0-6,9 anos), 7 anos (7,0-7,9 anos), 8
anos (8,0-8,9), 9 anos (9,0-9,9) e 10 anos (10,0 a 10,9 anos). Os pontos de corte
selecionados para cada referência foram os correspondentes ao valor da metade do
ano, por exemplo, o ponto de corte de 7,5 anos para a idade de 7 anos. Em função
do pequeno número de escolares com idade igual ou superior a 11 anos, estes não
entraram na avaliação do estado nutricional.
3.8 AVALIAÇÃO DA REPRODUTIBILIDADE E VALIDADE
3.8.1 Medida de Reprodutibilidade (teste-reteste)
A consistência das medidas de alimentação obtidas através do DAFA foi
testada em duas aplicações (T1 e T2) do instrumento ao mesmo grupo de escolares.
O intervalo entre as aplicações foi de três dias, realizadas na terça e sexta-feira, pelo
mesmo aplicador.
3.8.1.1 Protocolo de aplicação do instrumento
A aplicação do instrumento foi feita na sua totalidade, incluindo a seção
relativa às atividades físicas, com o intuito de desviar a atenção das crianças sobre o
interesse dos pesquisadores, exclusivamente sobre o consumo alimentar.
O instrumento foi aplicado em sala de aula pelo pesquisador com o auxílio
de mais dois estudantes de nutrição treinados para a realização das medidas e do
professor da classe, sempre antes do horário do lanche escolar.
Após a distribuição do questionário DAFA às crianças, o pesquisador
explicava, com linguajar apropriado, que o objetivo da pesquisa era saber quais
atividades físicas eram habitualmente realizadas pelas crianças e o que elas
costumavam comer na maioria dos dias de uma semana típica. Também era
informado às crianças que as mesmas seriam observadas, pesadas e medidas
naquela semana. Com o auxílio de um questionário DAFA em formato de pôster, o
pesquisador orientava o seu preenchimento, enquanto os demais auxiliares
circulavam pela classe para responder a eventuais dúvidas e encorajar a resposta
das crianças.
Após preencherem os dados de identificação (nome, escola, série e turno), o
pesquisador orientava sobre o significado e exemplos de algumas atividades físicas.
Na seção sobre atitude (gosto, preferência) em relação a atividades físicas, eram
estimuladas a circularem a expressão facial que melhor representasse a sua
sensação a respeito. Era possível circular mais de uma alternativa.
Em seguida, o pesquisador esclarecia o que representava cada desenho
gráfico na seção sobre os meios de locomoção para a escola, estimulando a escolha
das crianças de acordo com o tipo de transporte habitualmente utilizado para se
deslocarem de casa à escola. Na sessão sobre tipos e intensidade de atividades
físicas, o pesquisador perguntava às crianças sobre o significado de cada uma das
atividades e em seguida solicitava que, caso elas realizassem habitualmente durante
a semana cada atividade física representada, deveriam circular o desenho que
melhor representasse a sua intensidade (devagar, rápido e muito rápido). O
pesquisador lembrava que, se as crianças não costumassem fazer estas atividades,
mesmo gostando de realizá-las, nada deveria ser circulado. Estas observações
foram feitas para cada uma das onze atividades incluídas no questionário, uma de
cada vez. Havia a possibilidade de marcar mais de uma alternativa de intensidade.
Terminada a sessão das atividades físicas, o pesquisador informava que
começaria uma nova seção sobre consumo alimentar. Primeiramente, o pesquisador
perguntava o que significava cada alimento ou grupo de alimento representado
graficamente no questionário. Apesar de alguns alimentos não estarem
representados nos grupos ou itens alimentares, as crianças foram instruídas sobre a
sua inclusão num dos grupos, tal como apresentado no quadro abaixo (Quadro 5).
QUADRO 5- ALIMENTOS E GRUPOS DE ALIMENTOS PRESENTES NO DAFA E ALTERNATIVAS
DE INCLUSÃO NAS RESPOSTAS DAS CRIANÇAS Alimentos representados graficamente
Alimentos que poderiam ser considerados
Feijão Feijão, lentilha e ervilha Iogurte Iogurtes, leites fermentados, danoninhos Achocolatados Achocolatados: tudo quanto é tipo de leite misturado com chocolate,
como Nescau, Todinho, Chocoleite Leite e Queijo Leite, queijos, requeijão, polenguinho Bolacha recheada, pirulito, sorvete, bolo
Bolachas recheada, com cobertura e waffer, bolos, tortas, sobremesas (mousses, gelatinas, etc), pirulitos, balas, chicletes, sorvetes e picolés.
Batata frita Batata frita, salgadinhos tipo chips e salgados fritos (coxinha, risóles, etc)
Frutas Todos os tipos de frutas Pizza, hamburguer Pizza, hamburguer, cachorro quente, sanduíches como x-salada, x-
galinha e outros, salgados assados (calzone, empanados, esfiha) Arroz Arroz Pães, macarrão e bolacha salgada
Pão de todos os tipos (de forma, francês, integral, de queijo, de batata), bolacha sem recheio e sem cobertura, macarrão
Ovos Ovos Carne de vaca e frango Carnes de vaca, frango e porco, presunto, salames Verduras Verduras cruas e cozidas Refrigerante e sucos artificiais
Refrigerante e sucos artificiais em pó, latinha, garrafinha e caixinha
Suco de fruta Todos os sucos de fruta naturais Peixe e camarão Peixe, camarão e frutos do mar como marisco, berbigão, ostra
Em seguida, o pesquisador esclarecia o que representava a primeira
refeição (café da manhã) e as crianças eram encorajadas a circularem os alimentos
habitualmente consumidos nesta refeição em uma semana típica. O pesquisador
lembrava que mesmo que as crianças gostassem dos alimentos, elas somente
deveriam marcar os itens realmente consumidos. Caso consumissem um alimento
que tivessem dúvida em como enquadrá-lo, deveria levantar a sua mão e perguntar.
Preparações como sopas e sanduíches naturais poderiam ser marcados de acordo
com os alimentos presentes em de cada um deles. Este procedimento foi realizado
em cada uma das refeições.
Por fim, na parte relativa às sensações sobre grupos de alimentos, as
crianças foram orientadas a circular a expressão facial que melhor representasse as
suas sensações sobre o consumo de frutas e sucos naturais, arroz e feijão,
refrigerantes e sucos artificiais e verduras, podendo escolher mais de uma
alternativa.
Após o término do preenchimento por todos os escolares da sala, os
questionário eram recolhidos e o pesquisador agradecia a participação de todas as
crianças. No reteste, seguiu-se o mesmo protocolo de aplicação.
3.8.2 Medida de Validade Concorrente
As evidências da validade do instrumento para obtenção de medidas de
consumo alimentar foram determinadas através da comparação dos dados obtidos
no DAFA (sessão de lanche escolar) aos obtidos com o método de observação
direta dos alimentos e bebidas consumidas pelas crianças no período do lanche,
durante cinco dias consecutivos.
O método de observação tem sido citado como uma medida mais objetiva e
precisa, quando comparado às medidas de aproximação (informações das crianças,
pais ou responsáveis), pois é independente da memória para o auto-relato do
consumo alimentar. Na ausência de um padrão ouro aplicável e preciso, pode ser
utilizado como método de comparação na validação de outros instrumentos, não
necessitando de auto-relato de ingestão (EDMUNDS & ZIEBLAND, 2002).
3.8.2.1 Protocolo de observação
Como o instrumento tem por objetivo avaliar o consumo habitual das
crianças nos dias de semana, as observações do lanche escolar foram feitas durante
cinco dias de uma semana típica, ou seja, sem feriado, sem atividades extra-classe
e distante de datas comemorativas que pudessem acarretar alterações do consumo
alimentar das crianças.
Cinco estudantes de nutrição treinados distribuíam-se pelo pátio da escola
durante o lanche escolar portando planilhas com nome e número de cada criança
(Anexo 6) e observavam o maior número possível de crianças. Estas foram
identificadas através de um crachá colorido constando seu respectivo número.
Todos os tipos de alimentos e bebidas consumidos pelos escolares e observados
pelos pesquisadores eram anotados.
Este método apresentou-se no estudo piloto como o mais adequado, pois
parecia desviar a atenção das crianças para o fato de estarem sendo observadas.
Em todas as escolas as crianças foram informadas que seriam observadas
durante o período de recreio, mas não sabiam que os pesquisadores estavam
observando especialmente o consumo alimentar.
Apesar da dificuldade na identificação do conteúdo do lanche em recipientes
fechados, os pesquisadores evitavam questionar as crianças a respeito destes
lanches.
3.9 ANÁLISE DE DADOS
A distribuição da população segundo as variáveis demográficas e o estado
nutricional foi apresentada através de estatística descritiva, sendo os dados
apresentados em tabelas de distribuição de freqüência.
As médias de massa corporal, estatura e IMC foram comparadas entre
gêneros através do teste t. Por meio do teste do χ2 verificou-se associações entre
freqüências de sobrepeso, obesidade e baixo peso e as variáveis gênero e rede de
ensino. Adotou-se como significância valores de p<0,05.
Para a análise da reprodutibilidade e validade concorrente os dados foram
comparados item a item, de modo geral e por rede de ensino (público e privado) e
séries (primeira e segunda séries e terceira e quarta séries), a fim de determinar
índices de concordância absoluta, relativa (%) e o coeficiente kappa (k). Devido às
assimetrias na distribuição dos dados na tabela de contingência que comprometem a
interpretação e cálculo de índices kappa, recorreu-se à determinação de um índice
kappa ajustado (também denominado PABAK), conforme sugerido na literatura
(BYRT et al., 1993). O índice kappa, assim como o PABAK, diferencia-se da
concordância relativa em virtude de ser um índice ajustado à chance estatística de
concordância devida ao acaso.
Em geral os valores de k variam de zero (0=ausência de concordância) a um
(1= concordância perfeita), mas valores negativos são possíveis. A determinação de
k foi utilizada tanto na avaliação da consistência de medidas (reprodutibilidade)
quanto da convergência das medidas obtidas através do DAFA e do método de
referência (validade observação). Conforme sugerido na literatura (PETRIE &
SABIN, 2000), foram adotados os seguintes critérios na interpretação dos valores de
k: pobre (k≤0,20); fraco (0,21≤k≤0,4); moderado (0,41≤k≤0,6); e, substancial (k>0,6).
Como o instrumento DAFA pretende avaliar o consumo habitual de
alimentos que represente um dia de semana tipico, determinou-se como habitual o
consumo observado três ou mais vezes na semana. No entanto, a observação de
um ou mais dias também foi comparada ao auto-relato dos escolares no DAFA para
verificar qual critério apresentava melhores resultados e em função da observação
de que, nas escolas públicas, alguns alimentos eram fornecidos por meio do lanche
escolar apenas uma vez por semana.
Foram calculadas as médias e os desvios padrões de PABAK obtidos para
cada um dos 16 alimentos do DAFA e para cada uma das cinco refeições na análise
da reprodutibilidade e da refeição do lanche escolar na análise da validade
concorrente.
Posteriormente testou-se a diferença entre as médias dos grupos (primeira
e segunda versus terceira e quarta séries; rede pública versus privada), através de
análise de variância (ANOVA dois critérios), adotando-se com significância p<0,05.
Análises foram realizadas utilizando o programa SPSS e uma planilha
eletrônica desenvolvida por MACKINNON (2000), para análise da concordância de
medidas em escala nominal.
Dois estudantes de nutrição treinados, sob a supervisão do pesquisador,
foram responsáveis pela codificação e digitação dos dados, num programa
desenvolvido em EPI INFO 6.0. Procedimentos de controle dos erros de digitação
foram também efetuados através da conferência de 15% dos dados digitados.
3.10 LIMITAÇÕES DO ESTUDO
O estudo apresentou algumas limitações que podem dificultar a extrapolação
dos resultados obtidos, tais como:
• o uso do método de observação como padrão, o que pode vir a
interferir no consumo alimentar de crianças, além de ser difícil a observação do
conteúdo presente em recipientes fechados;
• o número de dias observados, o que prejudicou a análise do consumo
habitual nas escolas da rede pública, já que a variabilidade do lanche escolar é
maior em função de seguir um cardápio quinzenal;
• a escolha intencional das escolas.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
Este é o terceiro de uma série de estudos que visam avaliar a
reprodutibilidade e a validade do DAFA.
O primeiro estudo foi realizado no mês de agosto de 2002, com o objetivo de
testar a validade de face do instrumento, através da aplicação de um teste piloto em
crianças da primeira à quarta série do ensino fundamental de uma escola da rede
pública federal de Florianópolis, o que permitiu a realização de ajustes gráficos, bem
como a padronização do questionário e do protocolo de aplicação para a pesquisa
populacional (BARROS et al., 2003). O segundo foi efetuado nos meses de outubro
e novembro de 2002, com a finalidade de realizar testes de comparação entre as
respostas obtidas pelas crianças e seus pais, através da administração do DAFA
(dados não publicados).
O foco desta pesquisa direcionou-se ao estudo da validade concorrente
(relativa ao lanche escolar) e da reprodutibilidade da seção de consumo alimentar.
4.1 CARACTERIZAÇÃO DA POPULAÇÃO DO ESTUDO
Na Tabela 2 apresenta-se o número total de escolares que participaram do
estudo em cada escola e rede de ensino, de acordo com o gênero, a faixa etária e a
série.
TABELA 2- NÚMERO DE PARTICIPANTES POR GÊNERO, IDADE E SÉRIE DAS ESCOLAS PÚBLICAS E PRIVADAS - FLORIANÓPOLIS, 2003
Rede de ensino
Público Privado Geral (%)
Escolas A B Total C D E Total Gênero
Feminino Masculino
39 64
44 33
83 97
33 30
29 33
24 26
86 89
169 (47,6) 186 (52,4)
Idade 6 anos 7 anos 8 anos 9 anos
10 anos 11 anos 12 anos
12 19 26 20 17 5 4
9 22 27 8 9 2 0
21 41 53 28 26 7 4
3 15 24 12 9 0 0
2 12 17 16 13 1 1
8 19 10 8 5 0 0
13 46 51 36 27 1 1
34 (9,6) 87 (24,5) 104 (29,3) 64 (18,0) 53 (14,9) 8 (2,3) 5 (1,4)
Série 1ª série 2ª série 3ª série 4ª série
24 25 22 32
19 24 21 13
43 49 43 45
14 21 13 15
11 16 14 21
15 18 10 7
40 55 37 43
83 (23,4) 104 (29,3) 80 (22,5) 88 (24,8)
Geral (%) 103 77 180 (50,7) 63 62 50 175 (49,3) 355
Como a seleção não foi feita pela idade, mas sim a partir das séries
(primeira a quarta série), a amostra acabou englobando crianças com idade superior
a dez anos. No entanto, pelo seu número reduzido (3,7%), as mesmas foram
incluídas apenas no estudo de validação.
A Tabela 3 apresenta o número de alunos por faixa etária nas primeiras e
segundas séries e nas terceiras e quartas séries nas escolas da rede publica e
privada. Este agrupamento foi feito em função das análises que tiveram por objetivo
testar a hipótese de que o instrumento exibiria melhor performance nas terceiras e
quartas séries e nas escolas privadas. Nas primeiras e segundas séries, 97,8% dos
escolares das escolas públicas e 94,7% dos escolares das escolas privadas
encontravam-se entre a faixa etária de 6 a 8 anos de idade. Nas terceiras e quartas
séries, todos os escolares da rede privada e 98,9% dos escolares da rede pública
apresentavam mais de oito anos de idade. Na No geral, apenas 13 escolares (3,7%)
apresentavam mais de 10 anos nas terceiras e quartas séries.
TABELA 3- NÚMERO DE ALUNOS POR IDADE NAS PRIMEIRAS E SEGUNDAS SÉRIES E NAS TERCEIRAS E QUARTAS SÉRIES NAS REDES DE ENSINO PÚBLICO E PRIVADO -
FLORIANÓPOLIS, 2003 Rede de ensino Público Privado Geral
Séries 1a e 2 a 3a e 4a 1a e 2ª 3a e 4 a 1a e 2ª 3a e 4a Idade
6 anos 7 anos 8 anos 9 anos
10 anos 11 anos 12 anos
21 40 29 1 1 0 0
0 1 24 27 25 7 4
13 46 31 2 3 0 0
0 0 20 34 24 1 1
34 86 60 3 4 0 0
0 1 44 61 49 8 5
Total 92 88 95 80 187 168
4.2 INFORMAÇÕES SOBRE OS PAIS E CLASSIFICAÇÃO ECONÔMICA
Com objetivo de realizar a caracterização sócio-econômica dos escolares do
estudo, foi enviado aos pais um questionário contendo questões estruturadas,
incluindo tópicos a respeito de idade, profissão e renda familiar, entre outros. Outras
questões incluídas neste instrumento gerarão dados que serão objeto de estudos a
serem realizados posteriormente. Dos 378 questionários enviados, 296 (78,3%)
retornaram, sendo que a maioria destes foi respondida pela mãe dos escolares,
tanto nas escolas públicas (69,5%) quanto nas privadas (77,9%), conforme
apresenta-se na Tabela 4.
TABELA 4- PARENTESCO DAS PESSOAS QUE RESPONDERAM OS QUESTIONÁRIOS ENVIADOS AOS PAIS DOS ESCOLARES NAS DIFERENTES REDES DE ENSINO -
FLORIANÓPOLIS, 2003 Rede de ensino Público (n=151)
% Privado (n=145)
% Geral (n=296)
% Pai 19,2 17,2 18,2 Mãe 69,5 77,9 73,6 Outro 3,3 2,1 2,7 Não informou 7,9 2,8 5,5
Na tabela 5 são apresentadas a faixa etária, a situação de emprego e o grau
de instrução dos pais dos escolares do estudo segundo a rede de ensino.
TABELA 5- FAIXA ETÁRIA, SITUAÇÃO DE EMPREGO E GRAU DE INSTRUÇÃO DOS PAIS DOS ESCOLARES DAS DIFERENTES REDES DE ENSINO - FLORIANÓPOLIS, 2003
Rede de ensino Público (n=151) Privado (n=145) Parentesco Mãe
% Pai %
Mãe %
Pai %
Faixa etária 20-29 anos 30-39 anos 40-49 anos
>50 anos Não informou
19,9 55,6 19,9 2,0 2,6
10,6 45,0 35,1 5,3 4,0
17,9 54,5 23,4 0,7 3,4
8,3 42,8 35,2 6,9 4,0
Empregado Sim Não Não informou
67,6 27,1 5,3
79,5 13,2 7,3
66,2 27,6 6,2
85,5 6,2 8,3
Grau de instrução Primário Ginásio Colegial Superior Não informou
16,6 33,8 33,8 9,9 6,0
19,9 29,1 27,8 11,2 11,9
0,0 5,5 31,7 51,7 11,0
0,7 5,5 18,6 61,3 13,8
Na Tabela 5, pode-se observar que, com relação a idade dos pais e das
mães, a maioria se encontrava na faixa etária dos 30 a 30,9 anos, seguida pela dos
40 a 40,9 anos. A maioria dos pais encontrava-se empregado. Relativo ao grau de
instrução destes pais, percebe-se que, na rede pública, aproximadamente 84% das
mães e 75% dos pais relataram não possuir ensino superior. Por sua vez, a maioria
dos pais das crianças da rede particular relatou possuir ensino superior (51,7% das
mães e 61,3% dos pais).
Rendas mais elevadas também foram encontradas nas famílias cujos filhos
estudavam nas escolas particulares, conforme mostrado na Tabela 6. Enquanto
mais de 75% das famílias das escolas públicas relataram possuir renda inferior a mil
reais, 80% das famílias das escolas particulares relataram ter renda familiar superior
a este valor.
TABELA 6- FAIXA DE RENDA DAS FAMÍLIAS DOS ESCOLARES DAS DIFERENTES REDES DE ENSINO - FLORIANÓPOLIS, 2003
Rede de ensino Público (n=151) %
Privado (n=145) %
Geral (n=296) %
Menos de 200 reais 2,0 0,0 1,1 200-500 29,1 1,4 15,5 500-1000 45,7 13,1 29,7 1000-2000 14,6 22,1 18,2 2000-5000 4,6 43,4 23,7 + 5000 0,7 14,5 7,4 Não informou 3,3 5,5 4,4
A distribuição das famílias dos escolares com relação a classificação
econômica obtida através do Critério de Classificação Econômica Brasil da
Associação Nacional de Empresas de Pesquisa (ANEP) é apresentada na Tabela 7.
TABELA 7- CLASSIFICAÇÃO ECONÔMICA DAS FAMÍLIAS DOS ESCOLARES DAS DIFERENTES REDES DE ENSINO SEGUNDO A ANEP - FLORIANÓPOLIS, 2003
Rede de ensino Classe (Renda familiar média em R$)
Público (n=151) %
Privada (n=145) %
Geral (n=296) %
A1 (7.793 R$) 0,0 4,1 2,0 A2 (4.648 R$) 2,0 27,6 14,5 B1 (2.804 R$) 4,6 33,8 18,9 B2 (1.669 R$) 24,5 21,4 23,0 C (927 R$) 45,0 11,7 28,7 D (424 R$) 23,2 0,0 11,8 E (207 R$) 0,7 0,0 0,3 Dados incompletos 0,0 1,4 0,7
Enquanto que nas escolas públicas as maiores freqüências foram
observadas nas classes econômicas C (45,0%), e B2 (24,5%), nas particulares as
classes B1 (33,8%) e A2 (27,6) englobaram o maior número de famílias.
4.3 CARACTERÍSTICAS ANTROPOMÉTRICAS E CLASSIFICAÇÃO DO ESTADO
NUTRICIONAL
As características antropométricas (estatura, massa corporal e Índice de
Massa Corporal) dos escolares são apresentadas de acordo com o gênero e a idade
na Tabela 8. Como a seleção das crianças foi feita a partir das séries (primeira a
quarta série) e não pela idade, a amostra incluiu crianças com 11 e 12 anos (n=13).
No entanto, para estas não foram computadas as médias e os desvios padrões dos
dados antropométricos devido ao pequeno número de escolares nestas faixas
etárias.
TABELA 8- VALORES MÉDIOS (X) E DE DESVIOS PADRÕES (S) POR GÊNERO E FAIXA ETÁRIA DAS MEDIDAS ANTROPOMÉTRICAS DOS ESCOLARES - FLORIANÓPOLIS, 2003
Gênero Feminino Masculino Idade*
n 6
(19) 7
(38) 8
(50) 9
(36) 10
(23) 6
(15) 7
(49) 8
(54) 9
(28) 10
(30) Massa Corporal (Kg)
X s
23,0 3,4
26,1 4,7
29,6 5,5
31,8 7,5
36,3 9,2
22,9 2,6
27,6 6,5
28,0 4,9
35,0 8,0
36,1 8,1
Estatura (m) X s
119,4 5,3
125,1 4,2
132,2 5,2
135,4 6,7
140,2 8,7
122,0 4,9
126,7 5,9
130,4 5,3
138,8 5,9
141,9 8,6
IMC (Kg/m2) X s
16,14 1,93
16,55 2,11
16,87 2,57
17,19 3,25
18,17 2,98
15,38 1,33
17,08 2,92
16,41 2,11
18,02 3,03
17,78 3,01
As médias de massa corporal e estatura aumentam regularmente por idade
em ambos os sexos, o mesmo não ocorrendo tão claramente para os valores de
IMC, especialmente entre os escolares do sexo masculino. Comparações das
médias realizadas através do teste “t” mostraram diferença estatisticamente
significativa (p<0,05) entre os sexos somente no que diz respeito a variável estatura
aos nove anos de idade (Anexo 7).
As freqüências de obesidade e sobrepeso (incluindo obesidade), foram
realizadas de acordo com a definição do International Obesity Task Force (IOTF),
proposta pelo Childhood Obesity Working Group que utiliza pontos de corte de IMC
para sexo e idade específicos para a classificação de sobrepeso (COLE et al., 2000).
Além de ter sido desenvolvida com base em dados de muitas nações, incluindo o
Brasil, o uso desta referência apresenta como vantagem o fato dos pontos de corte
estarem relacionados com os pontos de corte de sobrepeso e de obesidade em
adultos, que são bons indicadores de risco de fatores adversos à saúde (WHO,
1995). As freqüências de baixo peso foram determinadas segundo a definição da
Organização Mundial de Saúde, cujos pontos de corte foram propostos por MUST et
al. (1991).
As freqüências de baixo peso, eutrofia, sobrepeso incluindo obesidade e
obesidade, segundo o tipo de escola e o gênero nos escolares de sete a dez anos
de idade, são apresentadas na Tabela 9. Na Figura 1 são mostradas as freqüências
gerais obtidas de acordo com o gênero.
TABELA 9- FREQÜÊNCIAS DE OBESIDADE, SOBREPESO (INCLUINDO OBESIDADE), EUTROFIA E BAIXO PESO EM ESCOLARES DOS DIFERENTES GÊNEROS E REDE DE ENSINO -
FLORIANÓPOLIS, 2003 Gênero Feminino Masculino Geral
Rede de ensino Público n= 80
Privado n= 86
Total n= 166
Público n= 89
Privado n= 87
Total n=176
n=342
Baixo peso 3,8 3,5 3,6 5,6 3,4 4,5 4,1 Eutrofia 75,0 76,7 75,9 82,0 73,6 77,8 76,9 Sobrepeso (incluindo obesidade)
21,2 19,8 20,5 12,4 23,0 17,6 19,0
Obesidade 5,0 2,3 3,6 3,4 9,2 6,2 5,0 Os pontos de corte utilizados para definição de sobrepeso e baixo peso estão apresentados na Tabela 1.
Não foram observadas associações entre as prevalências de obesidade,
sobrepeso e baixo peso com gênero e rede de ensino quando utilizado o teste de χ2
(Anexo 8).
FIGURA 1- FREQÜÊNCIA DE OBESIDADE, SOBREPESO, EUTROFIA E BAIXO PESO EM 342 ESCOLARES DE 7 A 10 ANOS DOS DIFERENTES GÊNEROS - FLORIANÓPOLIS, 2003
Os dados encontrados neste estudo revelam uma prevalência de sobrepeso
incluindo obesidade baseada no IOTF em escolares de seis a dez anos (19%) menor
3,6 4,5 4,1
75,9 77,8 76,9
16,9 11,4 14,0
3,6 5,06,2
0%
20%
40%
60%
80%
100%
Femin ino M ascu lino G eral
O besidade
Sobrepeso
Eutrofia
Ba ixo peso
do que a encontrada no estudo populacional conduzido no ano de 2002 em
escolares de sete a nove anos do município de Florianópolis (23,6%) por DE ASSIS
et al.(2003). Num estudo nacional, conduzido em 1997, envolvendo crianças de seis
a nove anos das regiões do nordeste e sudeste brasileiro WANG et al. (2002)
relataram uma prevalência de 17,4% de sobrepeso, incluindo obesidade. Relativo a
freqüência de obesidade, no estudo de Florianópolis foi encontrada uma prevalência
de 6,0% (DE ASSIS et al.,2003), superior a encontrada no presente estudo (5,0%).
A freqüência de baixo peso foi de 4,1%, inferior a do estudo nacional (6,1%)
(WANG et al., 2002), porém um pouco superior a encontrada no estudo realizado no
município de Florianópolis (2,9%).
Embora a prevalência de sobrepeso (incluindo obesidade) tenha sido menor
do que a encontrada por DE ASSIS et al. (2003) no município de Florianópolis, ainda
assim ela é expressiva. De cada 100 crianças, quase 20 apresentam algum grau de
sobrepeso.
Neste sentido, cabe lembrar que o aumento do peso nesta fase de vida
indica presságios de uma aceleração da obesidade na idade adulta (ROLLAND
CACHERA & BELLISLE, 1986; ROLLAND CACHERA et al., 1996). De acordo com
FREEDMAN et al. (1999), crianças e adolescentes com sobrepeso têm um risco
elevado de apresentar níveis adversos de vários fatores de risco para doenças
cardiovasculares.
Segundo POPKIN (2001), apesar do conhecimento do componente genético
na etiologia da obesidade, as alterações nas características alimentares e de
atividade física relacionadas as mudanças sócio-econômicas e demográficas têm
sido apontadas como responsáveis pelo aumento da sua prevalência.
Em países como o Brasil, estas mudanças vêm refletindo na redução
progressiva da desnutrição e no aumento da obesidade, conforme relatam
MONTEIRO et al. (1995).
No entanto, parece existir uma dificuldade em se estabelecer relações entre
componentes da dieta e até mesmo da atividade física que expliquem o
desenvolvimento da obesidade infantil. Sob a ótica de ROLLAND-CACHERA (2002),
isto pode explicar o por quê de estudos de intervenção que visam reduzir a
prevalência de obesidade não apresentam resultados satisfatórios.
Desta forma, para melhor elucidar as relações entre aspectos nutricionais e
o desenvolvimento de doenças como a obesidade, um dos requisitos necessários é
a existência de métodos válidos de coleta de dados de consumo alimentar que
possam ser aplicados em crianças, respeitando suas limitações cognitivas.
O questionário “Dia típico de Atividades Físicas e de Alimentação” (DAFA)
foi delineado para avaliar as escolhas de atividades físicas e de consumo alimentar
de crianças levando em consideração a sua faixa etária. Além de possuir uma
apresentação atraente e ser de fácil aplicação e preenchimento, existe a viabilidade
de aplicação em conjunto. Ademais, o DAFA apresenta como vantagem a clareza
das informações requeridas e o baixo custo (BARROS et al., 2003).
4.4 TESTE DE REPRODUTIBILIDADE DO INSTRUMENTO DAFA
A reprodutibilidade das medidas de consumo de alimentos do DAFA foi
testada em duas aplicações do instrumento (teste - T1; reteste - T2). Os percentuais
de consumo de alimentos relatados em cada uma das cinco refeições em T1 e T2, a
diferença com o intervalo de confiança, as concordâncias absolutas e relativas entre
as duas aplicações, os valores de kappa (k) e do kappa ajustado (PABAK) obtidos
de modo geral e nos diferentes tipos de escola (pública, privada) e séries (primeira e
segunda séries; terceira e quarta séries) são apresentados no Anexo 9.
De modo geral, os valores de concordância relativa variaram de 69,3% (pão
no lanche da tarde) a 96,3% (arroz no café da manhã).
Quando os dados são analisados em relação a rede de ensino, para o
conjunto de alunos das primeiras às quartas séries, observa-se que a concordância
relativa na escola pública variou de 63,9% (frutas e iogurte no lanche da tarde) a
95,6% (verduras no café da manhã), enquanto que na escola privada a variação foi
de 72% (ovo no almoço) a 99,4% (feijão e arroz no lanche da manhã).
Na análise dos dados considerando-se as séries, observou-se que os
valores de concordância relativa para as primeiras e segundas séries variaram de
54,3% (iogurte no lanche da tarde) a 95,7% (frutos do mar no café da manhã) na
rede de ensino público e de 66,3% (pão no lanche da tarde) a 98,9% (feijão e arroz
no lanche da manhã) na rede privada. Já na terceira e na quarta séries, a rede
publica apresentou uma concordância relativa variando entre 61,4% (achocolatado
no lanche da tarde) e 98,9% (feijão no café da manhã). Nas mesmas séries da
escola privada, muitos alimentos obtiveram 100% de concordância no relato (feijão
no café da manhã e lanches da manhã e da tarde, batata frita no café da manhã,
arroz na café da manhã e lanche da manhã, carne no lanche da manhã e frutos do
mar no jantar), e a menor concordância relativa foi de 72,5% (pão no almoço). Os
alimentos com maiores concordâncias relativas são aqueles que geralmente não são
consumidos pelas crianças em um determinada refeição (exemplo: feijão no café da
manhã).
Os valores do kappa indicaram concordâncias pobres (k<0,20) a
substanciais (k >0,61) entre as duas aplicações do instrumento.
Na rede pública, dos 80 itens do DAFA (16 em cada uma das cinco
refeições), somente em dois (arroz e feijão no lanche da manhã) o kappa foi
substancial (k > 0,61). Na rede privada, valores de kappa que indicam concordância
pobre também foram encontrados, porém em menor número. Também houve um
maior número de itens alimentares com concordância substancial (sete itens).
Todavia, quando os valores do kappa são ajustados às assimetrias das
tabelas de contigência através do cálculo do PABAK, observam-se valores de
concordância mais elevados. Somente os alimentos carne e refrigerante na refeição
do jantar apresentam PABAK fracos (0,21 < k < 0,40).
Na rede de ensino pública os valores de PABAK passam a variar de fracos a
substanciais, enquanto que na rede privada de moderados (0,41 < k < 0,60) a
substanciais, quando todas as séries são consideradas. Cabe ressaltar que quando
se consideram as séries, ainda exibem-se valores de PABAK pobres na escola
pública e fracos na privada, principalmente nas séries iniciais (primeira e segunda
séries).
O Anexo 10 apresenta a distribuição dos alimentos de acordo com a
classificação do PABAK em cada uma das cinco refeições. Somente as primeiras e
segundas séries da escola pública obtiveram alimentos com valores pobres de
PABAK (<0,21). Valores de PABAKs moderados e substanciais foram encontrados
em maior número na rede privada, especialmente nas séries mais avançadas.
A Tabela 10 mostra o número de itens alimentares que obtiveram valores
substanciais de PABAK em cada refeição, nas diferentes redes de ensino e séries.
TABELA 10- QUANTIDADE DE ITENS ALIMENTARES EM CADA REFEIÇÃO QUE OBTIVERAM VALORES DE PABAK SUBSTANCIAIS (> 0,60) NA ANÁLISE DA REPRODUTIBILIDADE DE ACORDO COM AS DIFERENTES REDES DE ENSINO E SÉRIES - FLORIANÓPOLIS, 2003
Rede de ensino Público Privado Geral Séries
Refeição 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral
Café da manhã
9 12 10 11 15 12 11
Lanche da manhã
7 6 9 10 15 12 11
Almoço 5 8 5 6 13 10 7 Lanche da tarde
4 8 7 10 14 11 9
Jantar 4 5 3 7 11 8 6 Total 29 (36,3%) 39 (48,8%) 34 (42,5%) 44 (55%) 68 (85%) 53 (66,3%) 44 (55%)
Dos 80 itens de alimentos contidos no DAFA (16 em cada uma das cinco
refeições), observa-se que, de modo geral, a maioria deles (55%) apresentou
PABAK substancial. Uma maior quantidade de itens com PABAKs substanciais foi
encontrada na rede privada, principalmente na terceira e na quarta séries (85%).
Apenas 36,3% dos itens apresentaram PABAKs acima de 0,60 na rede pública.
Os valores médios de PABAK por alimento (média das cinco refeições do
DAFA) são apresentados na Tabela 11.
TABELA 11- VALORES MÉDIOS E DESVIOS PADRÕES DE PABAK POR ALIMENTO OBTIDOS ENTRE AS DUAS APLICAÇÕES DO DAFA NAS DIFERENTES REDES DE ENSINO
E SÉRIES - FLORIANÓPOLIS, 2003 Rede de
ensino Público Privado Geral
Alimento 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral Feijão 0,56+0,25 0,74+0,22 0,65+0,15 0,81+0,20 0,86+0,19 0,83+0,19 0,74+0,15 Iogurte 0,46+0,24 0,66+0,26 0,56+0,23 0,68+0,16 0,77+0,11 0,72+0,13 0,69+0,13 Achocolatado 0,62+0,15 0,69+0,28 0,65+0,17 0,66+0,18 0,74+0,11 0,70+0,14 0,64+0,17 Leite 0,65+0,22 0,71+0,16 0,68+0,17 0,65+0,17 0,77+0,16 0,71+0,16 0,69+0,15 Doces 0,42+0,15 0,63+0,13 0,52+0,10 0,54+0,10 0,66+0,10 0,59+0,08 0,56+0,06 Batata frita 0,63+0,16 0,65+0,20 0,64+0,16 0,69+0,12 0,86+0,12 0,77+0,12 0,70+0,14 Frutas 0,49+0,14 0,41+0,09 0,45+0,11 0,63+0,14 0,70+0,11 0,66+0,05 0,55+0,07 Pizza 0,63+0,15 0,71+0,16 0,67+0,10 0,62+0,15 0,76+0,11 0,68+0,12 0,68+0,10 Arroz 0,57+0,24 0,73+0,17 0,65+0,14 0,79+0,24 0,87+0,15 0,82+0,20 0,74+0,15 Pão 0,33+0,09 0,47+0,10 0,40+0,08 0,41+0,07 0,56+0,07 0,48+0,04 0,44+ 0,06 Carne 0,63+0,13 0,55+0,19 0,59+0,14 0,72+0,15 0,84+0,16 0,78+0,14 0,68+0,12 Ovo 0,54+0,24 0,68+0,23 0,61+0,13 0,65+0,23 0,80+0,18 0,72+0,20 0,66+0,14 Verduras 0,67+0,19 0,57+0,29 0,62+0,19 0,75+0,20 0,84+0,17 0,79+0,19 0,71+0,18 Refrigerante 0,38+0,11 0,61+0,14 0,49+0,12 0,57+0,14 0,66+0,11 0,61+0,13 0,55+0,12 Suco natural 0,43+0,11 0,42+0,13 0,42+0,08 0,54+0,06 0,64+0,07 0,58+0,02 0,50+0,05 Frutos mar 0,67+0,19 0,68+0,22 0,68+0,15 0,79+0,21 0,87+0,16 0,82+0,18 0,75+0,16
Os valores da estatística PABAK para os alimentos variaram de moderado a
substanciais. Nenhum alimento obteve valor de PABAK maior do que 0,80, valor
este classificado como ótimo (LANDIS & KOCH, citados por PEREIRA, 1999).
Na escola pública, os valores de PABAK variaram de fraco a substancial,
enquanto que na privada variaram de moderado a substancial, sendo que três
alimentos (feijão, arroz e frutos do mar) foram classificados com ótimo PABAK.
O grupo de alimentos representados pelo achocolatado, pela batata frita,
pela pizza e pelos frutos do mar obtiveram médias de PABAK substanciais em
ambas as redes de ensino e grupo de séries. O grupo do pão obteve média de
PABAK inferior a 0,6 em todos as séries e rede de ensino.
Dos 16 itens alimentares representados no DAFA, houve uma
predominância de valores de PABAK considerados substanciais (68,8%), como pode
ser visualizado na Tabela 12. Somente na escola pública ocorreram valores de
PABAK que indicam concordância fraca.
TABELA 12- DISTRIBUIÇÃO DOS 16 ITENS ALIMENTARES DE ACORDO COM A CLASSIFICAÇÃO DO PABAK NA ANÁLISE DA REPRODUTIBILIDADE NAS DIFERENTES
REDES DE ENSINO E SÉRIES - FLORIANÓPOLIS, 2003 Rede de ensino Público Privado Geral
PABAK
1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral
Fraco (0,21 a 0,4) 2 0 1 0 0 0 0 (0%) Moderado (0,41 a 0,6) 7 5 6 4 1 3 5 (31,2%) Substancial (>0,6) 7 11 9 12 15 13 11 (68,8%)
A Tabela 13 apresenta os valores médios de PABAK obtidos em cada
refeição (média dos 16 alimentos presentes em cada refeição), de acordo com a
rede de ensino e séries.
TABELA 13- VALORES MÉDIOS E DESVIOS PADRÕES DE PABAK OBTIDOS EM CADA REFEIÇÃO NA ANÁLISE DA REPRODUTIBILIDADE, DE ACORDO COM A REDE DE ENSINO E
SÉRIE - FLORIANÓPOLIS, 2003 Rede de
ensino Público Privado Geral
Refeição 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral Café da manhã
0,62+0,21 0,74+0,17 0,68+0,18 0,70+0,15 0,83+0,15 0,76+0,15 0,72+0,17a
Lanche da manhã
0,61+0,17 0,59+0,22 0,60+0,13 0,70+0,20 0,83+0,14 0,76+0,17 0,68+0,17
Almoço
0,54+0,16 0,60+0,19 0,57+0,15 0,62+0,18 0,70+0,13 0,65+0,15 0,61+0,16
Lanche da tarde
0,44+0,22 0,61+0,24 0,52+0,16 0,69+0,21 0,79+0,17 0,74+0,18 0,63+0,20
Jantar
0,50+0,14 0,56+0,17 0,53+0,13 0,56+0,12 0,66+0,10 0,61+0,10 0,57+0,12 b
Geral 0,54+0,19 0,62+0,20 0,58+0,16 a 0,66+0,18 0,76+0,15 0,70+0,16b 0,64+0,17 a,b: letras diferentes entre linhas e colunas indicam diferenças estatisticamente significativas (p<0,05)
As médias de PABAK foram comparadas por meio de Análise de Variância
(Anexo 11). Na comparação entre as refeições, observou-se que a média do café da
manhã apresentou-se significativamente maior que a do jantar (p<0,01). Diferença
significativa também foi observada entre os tipos de escolas (p<0,001), sendo que a
concordância da escola pública (0,58+0,16) foi menor que a da privada (0,70+0,16).
No entanto, na interação entre estas duas variáveis (refeição e tipo de escola) não
foram verificadas diferenças estatísticas.
Quando consideram-se as séries, observam-se as maiores concordâncias,
através dos valores do PABAK nas séries mais avançadas (terceira e quarta séries),
em relação às primeiras e segundas séries (p<0,001). Na análise da interação entre
as duas variáveis (tipo de escola e séries), as séries mais avançadas das escolas
privadas apresentaram PABAKs mais elevados do que as primeiras e segunda
séries do mesmo tipo de escola (p<0,01), primeira e segunda séries da escola
pública (p<0,001) e terceira e quarta séries da escola pública (p<0,001). O PABAK
das primeira e segunda séries da escola privada também se mostrou superior ao das
mesmas séries da escola pública (p<0,01).
Os valores médios de PABAK em cada refeição variaram de moderado a
substancial. O café da manhã apresentou valores substanciais de PABAK em todas
as escolas e séries. Na escola privada, somente o jantar das primeiras e segundas
séries não apresentou média de PABAK acima de 0,6. Valores moderados de
PABAK foram obtidos em todas as séries da escola pública nas refeições do almoço
e jantar.
Apesar de ser difícil comparar resultados de estudos de reprodutibilidade em
função do tipo de variável avaliada e dos diferentes métodos empregados, é
possível que algumas considerações sejam conduzidas. Torna-se importante
ressaltar que a maioria dos estudos encontrados na literatura pesquisada foram
conduzidos com crianças mais velhas, freqüentando séries mais avançadas do que
a primeira e segunda séries. Além disso, não foram encontrados na literatura
pesquisada estudos de reprodutibilidade e de validação de instrumentos de coleta
de dados de consumo alimentar que comparassem dados obtidos em escolas
publicas e privadas.
Neste estudo, crianças das séries mais avançadas (terceira e quarta séries)
forneceram melhores medidas de reprodutibilidade do que as das séries iniciais
(primeira e segunda séries).
No estudo conduzido por FIELD et al. (1999), as medidas de
reprodutibilidade de um questionário de freqüência de alimentos foram menores
entre escolares de quarta e quinta séries do que entre os de sexta e sétima séries.
De acordo com os autores, as crianças mais jovens do estudo apresentavam
dificuldade em completar o questionário, o que poderia estar relacionado com a
dificuldade de abstrair conceitos de médias de ingestão em função do estágio de
desenvolvimento cognitivo em que as mesmas se encontravam.
De acordo com LIVINGSTONE & ROBSON (2000), a idade parece ser um
fator que claramente afeta a qualidade do relato do consumo alimentar. Dentre as
habilidades cognitivas requeridas para o auto-relato da ingestão alimentar, os
autores citam um adequado desenvolvimento do conceito de tempo, boa memória,
atenção e conhecimento do nome dos alimentos. Apesar de haver um rápido
desenvolvimento a partir dos oito anos de idade na habilidade de reportarem a
ingestão alimentar, algumas dessas características ainda não estão totalmente
desenvolvidas em crianças.
Conforme descrito anteriormente, houve uma predominância de itens
alimentares do DAFA com valores de kappa substanciais.
SMITH et al. (2001) avaliaram a reprodutibilidade de um instrumento
denominado CATH Food Checklist (CFC), delineado para obter dados à respeito da
ingestão de gorduras e sódio de crianças. O CFC consiste de 40 itens de alimentos
e grupos de alimentos, onde os avaliados indicam se os consumiram ou não no dia
anterior, servindo como uma alternativa de recordatório de 24 horas. Valores de
kappa encontrados pelos autores variaram de 0,66 a 0,94.
Cabe ressaltar que o CFC é um instrumento que tem por objetivo obter
dados sobre o consumo alimentar de crianças no dia anterior a sua aplicação,
minimizando o problema de memória. Por sua vez, o objetivo do DAFA é obter
informações acerca do consumo habitual, o que parece ser uma tarefa cognitiva um
pouco mais trabalhosa.
4.5 TESTE DE VALIDADE CONCORRENTE DO INSTRUMENTO DAFA
Para o teste de validade concorrente utilizou-se como método padrão a
observação direta do lanche dos escolares. Este método tem sido utilizado em
muitos estudos de validação (LYTLE et al.,1998; EDMUNDS & ZIEBLAND, 2002;
BAXTER et al., 2002; BAXTER et al.,2003), apresentando a vantagem de utilizar um
método comparativo que seja independente do auto-relato da ingestão alimentar das
crianças, tais como os métodos do inquérito recordatorio ou de freqûência alimentar.
O auto-relato dos escolares de seus consumos alimentares no lanche
escolar (lanche da manhã para os escolares do turno matutino e lanche da tarde
para os escolares do período vespertino) obtido através da aplicação do DAFA foi
comparado à observação do lanche escolar por examinadores treinados durante
cinco dias de uma semana típica a fim de verificar sua validade concorrente.
Como o instrumento DAFA pretende avaliar o consumo habitual de
alimentos que represente um dia de semana tipico, determinou-se como habitual os
alimentos que eram observados serem consumidos três ou mais vezes na semana
em que o estudo foi conduzido. No entanto, a observação de um ou mais dias
também foi comparada ao auto-relato dos escolares no instrumento DAFA. Em
ambos os casos, as analises foram conduzidas com os resultados do teste e do
reteste.
Os valores médios de PABAK obtidos através da comparação do auto-relato
(no teste e no reteste) com a observação (três ou mais dias e um ou mais dias) nas
diferentes redes de ensinos e séries são mostrados na Tabela 14.
TABELA 14- VALORES MÉDIOS DE PABAK POR ALIMENTO OBTIDOS NA COMPARAÇÃO ENTRE O DAFA (TESTE E RETESTE) E A OBSERVAÇÃO (UM OU MAIS DIAS; TRÊS OU MAIS
DIAS) NAS DIFERENTES REDES DE ENSINO E SÉRIES - FLORIANÓPOLIS, 2003 Rede de ensino Público Privado Geral
Nº dias considerados
1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral
Teste Um ou mais
Três ou mais
0,30+0,29 0,43+0,29
0,43+0,35 0,45+0,38
0,36+0,31 0,42+0,34
0,49+0,34 0,65+0,29
0,64+0,30 0,69+0,31
0,56+0,31 0,67+0,29
0,45+0,19 0,54+0,22
Reteste Um ou mais
Três ou mais
0,38+0,30 0,53+0,31
0,46+0,31 0,46+0,36
0,41+0,29 0,45+0,35
0,51+0,32 0,62+0,28
0,59+0,33 0,67+0,31
0,54+0,32 0,65+0,28
0,47+0,21 0,53+0,21
De modo geral, quando o consumo de três ou mais dias foi considerado
habitual, os valores médios de PABAK mostraram-se ligeiramente superiores em
relação ao consumo de um ou mais dias, tanto no teste quanto no reteste. No
entanto, em ambas as situações os valores de PABAK foram moderados.
Somente na rede privada, quando considerou-se como habitual o consumo
durante três ou mais dias, a média de PABAK foi substancial, tanto no teste quanto
no reteste. Quando considerou-se o consumo de um dia ou mais, os valores
variaram de fraco a moderado na escola pública, tanto no teste quanto no reteste.
Na privada, com exceção das séries avançadas que obteve PABAK substancial no
teste, os valores foram todos moderados.
Como o critério de freqüência que considera como habitual três ou mais dias
fornece melhores medidas de concordância e, por sua vez, o objetivo do DAFA é
obter medidas de consumo habitual, as demais análises foram feitas a partir desta
freqüência.
No teste, a comparação das médias de PABAK entre as escolas através da
Análise de Variância demonstrou diferenças significativas a favor da escola privada
(p=0,036) (Anexo 12). No entanto, entre as séries não foram observadas diferenças
estatisticamente significativas. Quando consideram-se as médias obtidas no reteste,
as diferenças entre os tipos de escola deixam de existir. Dessa forma, o reteste
apresenta a vantagem de eliminar as diferenças entre os tipos de escola.
O percentual de consumo dos alimentos no lanche escolar (no teste) e que
foram observados consumindo (3 ou mais vezes), a diferença com o intervalo de
confiança, as concordâncias absolutas e relativas entre os dois métodos, os valores
de kappa (k) e do kappa ajustado (PABAK) obtidos de modo geral e nas diferentes
redes de ensino e grupo de séries são apresentadas no Anexo 13.
De modo geral, a concordância relativa variou de 57,7% (pão) a 94,1%
(batata frita). Na rede pública a variação ficou entre 44,6% (iogurte na primeira e
segunda séries) e 100% (pizza na terceira e quarta séries). Na escola privada, a
menor concordância foi 58,9% (suco natural na primeira e segunda séries). Na
privada, alguns alimentos obtiveram 100% de concordância, incluindo o feijão e
peixe em todas as séries e o arroz e as verduras nas séries mais avançadas.
Na Tabela 15 são apresentados os valores de PABAK obtidos para cada
alimento nas diferentes redes de ensino e séries.
TABELA 15- VALORES DE PABAK OBTIDOS PARA CADA ALIMENTO NA COMPARAÇÃO
DO DAFA (TESTE) COM A OBSERVAÇÃO (TRÊS OU MAIS DIAS) NAS DIFERENTES REDES DE ENSINO E SÉRIES - FLORIANÓPOLIS, 2003
Rede de ensino Público Privado Geral Alimento 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral Feijão 0,13 -0,25 -0,06 1,00 1,00 1,00 0,46 Iogurte 0,74 0,98 0,86 0,60 0,40 0,51 0,68 Achocolatado -0,11 0,07 -0,02 0,37 0,75 0,54 0,26 Leite 0,74 0,93 0,83 0,81 0,78 0,79 0,81 Doces 0,50 0,77 0,63 0,37 0,18 0,28 0,46 Batata frita 0,87 0,89 0,88 0,89 0,88 0,89 0,88 Frutas 0,17 0,34 0,26 0,45 0,63 0,53 0,39 Pizza 0,91 1,00 0,96 0,56 0,50 0,53 0,75 Arroz 0,13 0,05 0,09 0,98 1,00 0,99 0,53 Pão 0,04 -0,07 -0,01 0,35 0,30 0,33 0,15 Carne 0,54 0,39 0,47 0,96 0,98 0,97 0,71 Ovo 0,28 0,11 0,20 0,68 0,98 0,82 0,50 Verduras 0,46 0,07 0,27 0,98 1,00 0,99 0,62 Refrigerante 0,57 0,84 0,70 0,28 0,20 0,25 0,48 Suco natural 0,22 -0,05 0,09 0,18 0,40 0,28 0,18 Frutos mar 0,43 0,41 0,42 1,00 1,00 1,00 0,71
Os valores de PABAK variaram de fraco a substancial. Observa-se que
existe uma diferença nos valores do PABAK entre as redes de ensino, ou seja,
alimentos com PABAKs elevados na rede pública necessariamente não
apresentaram PABAKs elevados na privada, e vice-versa.
A Tabela 16 apresenta a distribuição dos alimentos do lanche escolar de
acordo com a classificação do PABAK. Ao contrário do teste de reprodutibilidade,
muitos itens apresentaram valores de PABAK pobres, principalmente na escola
pública.
TABELA 16- DISTRIBUIÇÃO DOS ITENS ALIMENTARES DE ACORDO COM A CLASSIFICAÇÃO DO PABAK OBTIDO NA ANÁLISE DA VALIDADE CONCORRENTE NAS DIFERENTES REDES DE
ENSINO E SÉRIES - FLORIANÓPOLIS, 2003 Rede de ensino Pública Privada Geral
Séries PABAKs
1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral 1ª e 2ª 3ª e 4ª Geral
Pobre 5 6 6 1 2 0 2 Fraco 2 3 2 4 3 4 2 Moderado 5 1 2 3 1 4 5 Substancial 4 6 6 8 10 8 7
Na escola pública, iogurte, feijão, arroz, pão, ovo, suco natural, peixe, frutas
e verduras foram os alimentos que obtiveram PABAKs pobres. Já na rede privada,
onde a quantidade de concordâncias pobres foram menores, os alimentos que aí se
enquadram foram apenas os doces e o refrigerante nas terceira e quarta séries e o
suco natural nas primeira e segunda. Assim sendo, alimentos que obtiveram
PABAKs mais elevados foram aqueles que menos são consumidos pelos escolares,
independente do tipo de escola.
Conforme relatado anteriormente, é tarefa complicada comparar resultados
de estudos de validação e reprodutibilidade de diferentes instrumentos, em função
do tipo de variável avaliada e dos diferentes métodos de validação empregados.
Parece claro, no entanto, que em função das limitações cognitivas
apresentadas por crianças para responder a inquéritos alimentares, não se pode
considerar que os métodos utilizados para coletar dados de ingestão alimentar em
adultos (recordatórios, registros e questionário de freqüência de alimentos) sejam
apropriados para a população infantil (LIVINGSTONE & ROBSON, 2000).
BAXTER et al. (2002) investigaram a acurácia do relato dos alimentos
consumidos na escola obtido através da aplicação de um recordatório alimentar de
24 horas seguindo um protocolo de múltiplos passos com 104 escolares de quarta
série comparando-o com método de observação. Os níveis de omissão (item
observado mas não relatado) e intrusão (item relatado mas não observado) foram de
51% e 39%, respectivamente. Deste modo, os autores concluíram que os relatos
alimentares obtidos de crianças parecem apresentar baixa acurácia e baixa
consistência.
Num estudo subsequente, BAXTER et al. (2003) avaliaram a aplicação do
recordatório obtido por entrevista pessoal ou por telefone com 69 escolares de 4a
série, também utilizando um protocolo de múltiplos passos, comparando com o
método de observação. Neste estudo, os autores verificaram que apenas 67% dos
itens observados foram relatados, enquanto que 17% dos itens ralatados não foram
observados.
A avaliação do uso de um registro alimentar de oito dias conduzido por
CHAMPAGNE et al.(1998) em 118 escolares divididas em grupos com diferentes
tipos corporais demonstrou que a ingestão calórica era subestimada entre 17 a 33%
em relação ao gasto energético obtido pela água duplamente marcada, ocorrendo
subestimativa em todos os grupos estudados.
A validade de um questionário de freqüência de alimentos, o Youth-
Adolescence Food-Frequency Questionnaire (YAQ) foi estudada por PERKS et
al.(2000) em uma amostra de 50 crianças e adolescentes de oito anos e seis meses
a 16,2 anos de idade. Em seu estudo, os autores concluíram que o YAQ é capaz de
oferecer uma boa estimativa da média de ingestão calórica de crianças e
adolescentes. Por outro lado, o instrumento mostrou uma variabilidade individual
significante.
Os resultados aqui apresentados apontam para a obtenção de melhores
medidas de reprodutibilidade e de validade do instrumento DAFA entre os escolares
da rede de ensino privada. No entanto, não foram encontrados estudos tratando da
diferença na qualidade do relato do consumo alimentar entre escolares de diferentes
redes de ensino.
Interpretações a respeito do assunto devem ser cuidadosamente realizadas,
principalmente no que tange ao teste de validade concorrente. Antes de assumir que
diferenças no nível de ensino sejam responsáveis pela superioridade das escolas de
ensino privado, é de fundamental importância considerar as diferenças nas
características do lanche escolar nos diferentes tipos de escola.
Nas escolas privadas os escolares trazem de casa o seu lanche ou então o
compram nas cantinas. Embora uma lei municipal (Lei n.º 5853/2001) e uma
estadual (Lei n.º 12.061/2001) proíbam a venda de alimentos com baixo valor
nutricional nas cantinas das escolas, os escolares podem comer qualquer tipo de
alimento, incluindo sucos artificiais, chips, pastelarias, refrigerantes, bolachas
recheadas, entre outros alimentos, uma vez que é permitido trazê-los de casa.
Assim sendo, nas escolas privadas, os escolares costumam consumir com
maior freqüência no lanche alimentos como os dos grupos dos doces, pão e
refrigerante. Por outro lado, alimentos como os dos grupos do feijão, verduras, arroz,
carnes ovos e peixe não fazem parte do lanche desses escolares. Isto pode ser
observado através do percentual de consumo observado (Anexo 13).
Estes alimentos que realmente não fazem parte do lanche dos escolares das
escolas privadas foram aqueles que obtiveram melhores medidas de validade
(diferença entre o percentual relatado e observado, concordâncias absoluta e
relativas, kappa e PABAK). O peixe e o feijão, por exemplo, apresentaram
concordâncias máximas entre os dois métodos (DAFA e observação), ou seja, todos
os 175 escolares não relataram o consumo no DAFA e, de fato, não o consumiram
em nenhum dos cinco dias observados. Os outros alimentos (arroz, carnes e
verduras) também obtiveram concordâncias superiores a 95%, variando em função
das diferentes séries. Assim sendo, reforça-se o achado de que o DAFA parece ser
um bom instrumento para detectar os alimentos que não são habitualmente
consumidos.
Entretanto, o grupo dos doces, refrigerantes e sucos naturais obtiveram
baixos valores de concordância na escola privada, inclusive valores de PABAK
pobres, dependendo das séries consideradas. Estes, juntamente com o grupo dos
pães, foram os alimentos que mais foram observados serem consumidos pelos
escolares (Anexo13), implicando, portanto, numa baixa validade do instrumento para
detectar o consumo de alimentos habitualmente consumidos.
Já na escola pública, os escolares recebem o lanche da escola através do
Programa de Alimentação Escolar. Além disso, as escolas que fizeram parte da
amostra não permitiam que os escolares levassem qualquer tipo de alimento de
casa. O cardápio, elaborado por nutricionistas, é quinzenal e garante uma
alimentação bem variada, que inclui alimentos como bolachas, achocolatados, frutas
e pratos salgados (arroz, feijão, carnes, sopas, etc.).
Alimentos dos grupos do feijão, arroz, peixe, massas (grupo do pão no
DAFA), carnes e ovos, de acordo com o cardápio da escola, aparecem pelo menos
uma vez por semana, assim como achocolatados e pães. Frutas e verduras
aparecem com maior freqüência. Em função da variabilidade muito grande do lanche
escolar da rede pública, o que se pode inferir é que isto possa ter aumentado a
dificuldade do relato do que é habitualmente consumido por elas nesta refeição.
Concordâncias pobres foram observadas para alguns destes grupos que são
consumidos pelo menos uma vez por semana nas escolas públicas, como o feijão,
achocolatados, arroz, pães e sucos naturais.
Quando se considera como concordante ao DAFA a observação de pelo
menos um dia de consumo, algumas concordâncias têm seu valor aumentado
(feijão, frutas, pão e arroz) em relação à observação de três ou mais dias (Anexo
13). No entanto, outras acabam diminuindo, como é o caso das verduras, peixe,
ovos e carnes.
Assim como aconteceu na escola privada, na rede pública os alimentos que
não fazem parte do lanche dos escolares (como os dos grupos dos doces,
refrigerantes, pizzas e batatas fritas) apresentaram elevados valores de
concordância.
Diante disso, não se pode inferir que o DAFA não é um bom instrumento
para coletar informações acerca do consumo habitual de alimentos de escolares da
rede pública de ensino ou que estes escolares apresentaram limitações no
preenchimento do instrumento. Talvez o número de dias de observação não tenha
sido suficiente para contemplar as diferenças existentes entre os tipos de escolas e
detectar a variabilidade do lanche das escolas públicas, o que representaria uma
limitação do estudo.
Conforme relatado anteriormente, as medidas de reprodutibilidade
apresentadas pelas crianças da escola pública se apresentaram mais baixas. A
menos que análises do consumo alimentar das outras refeições sejam realizadas,
este tipo de argumento que justifica a inferioridade das medidas de validade na
escola pública parece não ser válido para as medidas de consistência
(reprodutibilidade), uma vez que englobaram todas as cinco refeições do DAFA.
Algumas considerações ainda podem ser feitas sobre alimentos em
particular. O pão obteve PABAK de 0,15 na avaliação de sua validade concorrente.
Além disso, na avaliação de sua reprodutibilidade, em todos as séries e tipos de
escolas os valores de PABAK não ultrapassaram 0,60.
Num estudo preliminar da validade e da reprodutibilidade do DAFA
conduzido por BARROS et al. (2003), este alimento também apresentou medidas de
convergência baixas. Segundo os autores, parte disso poderia ser explicado pelo
fato das crianças tenderem a consumir este tipo de alimento na forma de
sanduíches (representado graficamente no DAFA no grupo de pizza e pastelarias).
Apesar de que na aplicação do instrumento esta questão seja enfatizada, algumas
crianças ainda podem apresentar problemas de interpretação. Além disso, este
grupo é representado por uma variedade de alimentos (Quadro 5), incluindo todos
os tipos de pães e massas, o que pode se tornar um desafio para a criança caso não
seja bem explicado na aplicação do instrumento. Diante disso, parece existir a
necessidade de reformulação gráfica deste alimento a fim de torná-lo mais
compreensível, além de garantir na aplicação do DAFA a explicação de todas as
possibilidades cabíveis a este grupo de alimentos.
Outros grupos de alimentos que merecem destaque são os dos sucos
naturais e refrigerantes (que incluem também os sucos artificiais).
Os baixos valores de concordância obtidos entre o relato e a observação do
consumo de sucos naturais e refrigerantes parecem estar relacionados com a
dificuldade de definir que tipo de bebida está sendo realmente consumida. Sobre o
assunto, EDMUNDS & ZIEBLAND (2002) chamam a atenção para o fato de que
crianças têm dificuldade em dizer se o consumido foi um suco natural ou artificial, da
mesma forma que é difícil para o observador verificar o que foi consumido, o que
poderia ter sido responsável pelos baixos valores de concordância.
Apesar destes problemas, cabe ressaltar que dos 16 itens de alimentos,
houve uma predominância de valores de PABAK considerados substanciais (nove
na escola pública e 13 na privada) na análise da reprodutibilidade do instrumento.
No que diz respeito ao teste de validade, pelo menos nas escolas privadas a maioria
dos alimentos se apresentou com PABAks moderados ou substanciais.
Ainda no que tange o teste de validade, cabe ressaltar que reteste eliminou
as diferenças entre os tipos de escolas, permitindo inferir que o instrumento se torna
mais compreensível quando os escolares da rede pública já estão mais
familiarizados com o mesmo.
A validação do DAFA pode ser comparada a validação de outros
instrumentos de seleção de alimentos, apesar das peculiaridades de cada um
desses estudos.
No estudo de KOEHLER et al.(2000), a validade de um instrumento de
seleção de alimentos denominado Yesterday’s Food Choice (YFC) contendo 33
questões sobre alimentos consumidos no dia anterior foi avaliada em uma amostra
de 120 escolares de quinta a sétima séries envolvidas em um programa de
prevenção de câncer. Usando um recordatório de 24 horas como método de
validação, os autores observaram um baixo percentual de concordância entre os
dois métodos. Apenas cinco itens apresentaram valores de kappa moderados ou
substanciais. Segundo os autores, este fato justifica-se uma vez que foram
comparados grupos de alimentos com alimentos específicos, além do
desconhecimento do nome dos alimentos e das preparações por parte das crianças,
que também superestimam a ingestão de alimentos atrativos.
SMITH et al. (2001) avaliaram a validade dos escores de um checklist
(CATH Food Checklist - CFC) à respeito da ingestão de gorduras e sódio em uma
amostra de 365 estudantes de sétima série de escolas nos estados da Califórnia,
Lousiana, Minnesota e do Texas (USA). O instrumento consiste de 40 itens de
alimentos e grupos de alimentos, onde os avaliados indicam se os consumiram ou
não no dia anterior, servindo como uma alternativa de recordatório de 24 horas de
fácil administração. Todos os itens avaliados (sódio, gordura total e gordura
saturada) apresentaram correlações significativas (p<0,001) com os dados do
método padrão (recordatório de 24 horas).
Apesar dos bons valores de reprodutibilidade e de validade do CFC
encontrados por SMITH et al. (2001), é digno de nota que este é um instrumento que
avalia apenas o consumo do dia anterior de determinados alimentos, sendo menos
preciso do que o tradicional recordatório de 24 horas, como relatam os autores.
Ademais, o CFC não mede o consumo de alimentos como frutas e verduras,
alimentos alvos em estudos de intervenção nutricional.
EDMUND & ZIEBLAND (2002) desenvolveram e testaram a validade e a
reprodutibilidade de um questionário (The Day in theLife Questionaire- DILQ) para
avaliar o consumo de frutas e verduras de escolares de sete a nove anos em
escolas de Oxford, Inglaterra, utilizando como referência o método de observação. O
instrumento foi construído para ser aplicado na forma de exercício em classe e
continha palavras e desenhos que estimulavam as crianças a recordarem e
descreverem uma série de atividades do dia anterior, inclusive sua ingestão
alimentar. O relato da ingestão pelas crianças apresentou um percentual de
concordância de 70% com relação à observação dos pesquisadores.
Contudo, parece que todos os instrumentos de coleta de dados sobre o
consumo alimentar de crianças apresentam problemas relacionados à sua validade.
O DAFA, desenvolvido para medir o consumo habitual de escolares, também
apresentou problemas. Reformulações gráficas parecem ser necessárias, ao mesmo
tempo que é fundamental refinar o protocolo de aplicação. Destaca-se ainda que,
ao contrário de alguns estudos aqui apresentados, o estudo de validação do DAFA
foi feita utilizando-se um método independente do auto-relato das crianças, o que lhe
confere maior credibilidade, apesar das limitações apresentadas.
5 CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
• A seção relativa ao consumo alimentar apresenta uma reprodutibilidade
razoável, sendo que os 16 itens alimentares apresentaram valores de PABAK
variando de moderados a substanciais;
• A seção relativa ao consumo alimentar responde melhor à reprodutibilidade
entre escolares das séries mais avançadas (terceira e quarta séries) do ensino
básico;
• A seção relativa ao consumo alimentar responde melhor à reprodutibilidade
entre os escolares da rede de ensino privado;
• O item pão apresentou os mais baixos valores de PABAK no teste de
reprodutibilidade em todos as séries e tipos de escolas;
• A seção relativa ao lanche escolar (matutino ou vespertino) apresenta
validade concorrente razoável, sendo que os itens alimentares apresentaram valores
de PABAK variando de fracos a substanciais;
• A seção relativa ao lanche escolar (matutino ou vespertino) responde
melhor à validade entre os escolares da rede de ensino privado, o que poderia estar
associado às diferenças no tipo de lanche escolar;
• A seção relativa ao lanche escolar é mais válida para detectar quais
alimentos não são habitualmente consumidos pelos escolares.
A partir das conclusões levantadas recomenda-se:
• A modificação de alguns grupos alimentares, como o do pão, a fim de
facilitar o entendimento pelos escolares;
• Como o reteste eliminou as diferenças entre as escolas, nas públicas a
aplicação do DAFA poderia ser feita duas vezes, usando sempre o reteste como
padrão;
• O refinamento do protocolo de aplicação do instrumento com vistas a
minimizar os problemas detectados neste estudo de validação;
• Novos estudos de validação que contemplem as outras refeições do DAFA;
• Estudos que comparem a validade do DAFA entre escolares com
sobrepeso e eutróficos.
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