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outubro de 2014 Universidade do Minho Escola de Engenharia Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro UMinho|2014 Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro PARAMETRIZAÇÃO E UNIFORMIZAÇÃO DAS MAIS-VALIAS PARAMETRIZAÇÃO E UNIFORMIZAÇÃO DAS MAIS-VALIAS

Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

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outubro de 2014

Universidade do MinhoEscola de Engenharia

Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro

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Dissertação de Mestrado Integrado em Engenharia Civil Perfil de Construções

Trabalho efetuado sob a orientação doProfessor Doutor Dinis Miguel Campos Leitão

outubro de 2014

Universidade do MinhoEscola de Engenharia

Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro

PARAMETRIZAÇÃO E UNIFORMIZAÇÃO DAS MAIS-VALIAS

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DECLARAÇÃO

Nome: Alexandre Miguel Rodrigues ferreira da Silva carneiro

Endereço electrónico: [email protected]

Número do Bilhete de Identidade: 12552147

Título dissertação:

Parametrização e uniformização das mais-valias

Orientador: Professor Doutor Dinis Miguel Campos Leitão

Ano de conclusão: 2014

Designação do Mestrado: Mestrado Integrado em Engenharia Civil

É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA DISSERTAÇÃO APENAS PARA EFEITOS DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE COMPROMETE;

Universidade do Minho, / /2014 Assinatura: ________________________________________________

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AGRADECIMENTOS

Está tese só foi possível devido a todas as pessoas que contribuíram para a realização

deste trabalho, pelo carinho, paciência, dedicação e ajuda. A todos eles, um sincero

agradecimento.

Mas um especial agradecimento ao Professor Doutor Dinis Miguel Campos Leitão, por

me aceitar como orientando e demonstrar sempre disponibilidade no melhoramento deste

estudo. Sendo a sua maneira de ser exemplar e o seu pragmatismo, decisivos para

elaboração da mesma.

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RESUMO

O desenvolvimento de um município precisa, pois, de ser refletido como um todo

composto por muitas partes, que se articula(m), simultaneamente, em lógicas quer de

proximidade e adjacência, quer de rede aberta num contexto que não depende da distância

física mas da capacidade de integrar sistemas alargados de produção. Necessário será

encontrar o sentido próprio de cada sítio, de cada zona; reconhecer as suas

potencialidades, valorizá-las no sentido que lhe permita desempenhar o papel mais

próprio e adequado na estrutura e no conjunto que incorpora e nos contextos que pretende

vir a integrar.

Foi o contrário o que aconteceu. A maioria dos municípios em Portugal tem crescido de

forma casuística, ao sabor de um interesse frequentemente vinculado a interesses

particulares, sem que a administração afirmasse a lógica do interesse público. Fruto deste

crescimento, pautado por pequenas e grandes urbanizações que não se reveem como

partes de um todo estruturado, e determinado por agentes desinteressados pelos valores

do coletivo citadino, atualmente os municípios encontram-se desmembrada e

desarticulada. O espaço público reflete-o. Está desconexo, vazio de coerência.

Com a revisão da Lei de Bases do Solo (LBPOTU) houve a possibilidade de se integrar

medidas que podiam realmente contrariar a situação atual e corrigi-las. Mas a LBPOTU

ora aprovada, mais não é do que o alicerce de uma operação que, embora pugne pela

reabilitação e regeneração contidas, opta por renovar o direito do ordenamento do

território e do urbanismo que temos vindo a aplicar, através de um Fundo Municipal de

Sustentabilidade Ambiental e Urbanística.

Com esta Dissertação pretende-se que o contributo para esta problemática consista,

especificamente, na redefinição do Fundo Municipal de Sustentabilidade Ambiental e

Urbanística, para que, ao parametrizar as mais-valias simples, o valor destas, fossem

canalizadas para esse Fundo mas com o objetivo de reduzir o valor dos terrenos nas zonas

periurbanas e urbanas, de maneira aproximar a uma uniformização de valores. Dando

liberdade financeira ao investidor, pois aliviava-o da sobrevalorização dos terrenos dessas

zonas e canalizando mais investimento para o imóvel.

Palavras-chaves: Sustentabilidade, Solo, Mais-valias, Parametrização, Especulação.

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ABSTRACT

The development of a municipality needs to be reflected, as a whole composed of many

parts, which articulate(s), simultaneously in proximity and adjacency, either in an open

network context, that doesn’t depend on physical distance but the ability to integrate

extensive production systems. Will be necessary to find the proper meaning of each site,

each zone; recognize their potential value them in order to allow it to play the most proper

and appropriate role in the structure and assembly that incorporates the contexts and

which it seeks to integrate.

It was the opposite that happened. Most municipalities in Portugal has grown out of ad

hoc basis, at the mercy of a concern often tied to particular interests, without which the

administration claimed the logic of public interest. The result of this growth, marked by

small and large housing developments that do not identify themselves as part of a

structured whole, and agents determined by the values of disinterested city collective,

currently the counties are dismembered and disjointed. The public space reflects you. Is

disconnected, empty of consistency.

With the revision of the Basic Law of the Land (LBPOTU) there was the possibility of

integrating measures that could actually counteract the current situation and correct them.

But LBPOTU hereby approved, is no more than the foundation of an operation, whilst

supporting the rehabilitation and regeneration contained, chooses to renew the right of

land use planning and urban planning that have been applied through a Municipal Fund

Environmental and Urban sustainability.

With this dissertation is intended that this contribution consists specifically in redefining

the Municipal Fund for Environmental and Urban Sustainability, way to parameterize the

simple gains, the value of these, were channeled into this fund but with the objective of

reduce the value of land in peri-urban and urban areas, so closer to a uniformity of values.

Giving financial freedom to investors, because it relieved the overvaluation of these land

areas and channeling more investment into the property.

Keywords: Sustainability, Location, Windfall gain, Property tax, Speculation.

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ÍNDICE GERAL

Capitulo 1 – ENQUADRAMENTO .................................................................... 1

1.1. Introdução ............................................................................................................ 1

1.2. Objetivos ............................................................................................................... 3

1.3. Estrutura da dissertação ..................................................................................... 6

1.4. Metodologia .......................................................................................................... 7

Capitulo 2 – ESTADO DA ARTE ....................................................................... 1

2.1. Enquadramento ................................................................................................... 1

2.2. Sustentabilidade ................................................................................................... 3

2.2.1. Dimensão sócio habitacional ........................................................................... 7

2.2.2. Dimensão socioeconómica ............................................................................ 10

2.2.3. Dimensão ambiental ...................................................................................... 16

2.3. A sustentabilidade fiscal (terrenos e edifícios) ................................................ 19

2.3.1. Tributação do valor do solo ........................................................................... 20

2.3.2. Alteração da base tributária ........................................................................... 21

2.3.3. Exceções e isenções ...................................................................................... 25

2.3.4. Características de um "bom" imposto ........................................................... 26

2.4. Conceitos económicos no ordenamento ........................................................... 29

2.4.1. Teorias económicas no mercado imobiliário ................................................ 32

2.4.2. Mais-valias e o ciclo imobiliário ................................................................... 35

2.4.3. Isenção das mais-valias e crescimento urbano excessivo ............................. 37

2.5. Instrumentos de planeamento ........................................................................... 38

2.5.1. Processos de expropriação urbanística .......................................................... 39

2.5.2. Venda forçada ............................................................................................... 43

2.5.3. Regeneração urbana sustentável.................................................................... 46

2.5.4. Regime de reabilitação urbana ...................................................................... 49

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2.5.5. Recuperação das mais-valias e intervenção pública ..................................... 51

2.6. Análise comparativa entre países europeus ..................................................... 52

2.6.1. Função social e estatuto da propriedade do solo ........................................... 52

2.6.2. Execução urbanística ..................................................................................... 58

2.6.3. Intervenção da administração pública no mercado de solos ......................... 66

2.6.4. Tributação...................................................................................................... 73

2.7. Lei de bases ......................................................................................................... 77

2.8. Uso sustentável dos rendimentos da tributação sobre a propriedade ........... 81

Capitulo 3 – ANÁLISE DE PROCEDIMENTOS URBANIZÁVEIS ........... 83

3.1. Enquadramento ................................................................................................. 83

3.2. Procedimentos legislativos de tributação ......................................................... 85

3.2.1. Decreto-lei n.º 152/82 ................................................................................... 85

3.2.2. Decreto-lei n.º 43/98 ..................................................................................... 86

3.3. Valorização do solo e do imóvel ........................................................................ 88

3.4. Áreas prioritárias ............................................................................................... 90

Capitulo 4 – NOVA METODOLOGIA DE PARAMETRIZAÇÃO DAS

MAIS-VALIAS ................................................................................................... 93

4.1. Enquadramento ................................................................................................. 93

4.2. Âmbito da proposta ........................................................................................... 95

4.3. Fundamentação da proposta de alteração ....................................................... 99

4.3.1. Sistema de taxas .......................................................................................... 104

4.3.2. Procedimento administrativo e urbanístico ................................................. 107

4.4. Principais limitações ........................................................................................ 109

4.5. Aplicação ........................................................................................................... 111

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Capitulo 5 – CONCLUSÃO ............................................................................. 115

5.1. Conclusões ........................................................................................................ 115

5.2. Perspetivas futuras .......................................................................................... 118

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................... 119

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ÍNDICE DE FIGURAS

Figura 1 – Sinopse dos objetivos da presente dissertação ................................................ 5

Figura 2 – Metodologia do trabalho proposto .................................................................. 9

Figura 3 – Circulo virtuoso da gestão urbanística ............................................................ 2

Figura 4 – Dimensões do desenvolvimento sustentável ................................................. 3

Figura 5 – Crescimento anual da população mundial (1950-2050) ................................. 5

Figura 6 – Crescimento da população mundial (1950-2050) ........................................... 5

Figura 7 – Evolução de vários componentes da despesa pública em percentagem do PIB

(1972-2012) ...................................................................................................................... 8

Figura 8 – Fogos construídos para habitação, segundo o setor de promoção (1950-2012)

.......................................................................................................................................... 9

Figura 9 – Alojamentos familiares clássicos de residência habitual segundo os Censos:

total, por ocupantes proprietários e inquilinos (1960-2011)........................................... 12

Figura 10 – Alojamentos familiares clássicos segundo a forma de ocupação (1960-2011)

........................................................................................................................................ 13

Figura 11 – Peso da dívida no rendimento disponível das famílias (1995-2013) .......... 14

Figura 12 – Rácio do crédito vencido das famílias (2009-2013) ................................... 15

Figura 13 – Caminho para a renovação urbana sustentável ........................................... 49

Figura 14 – Organigrama do modelo dinâmico para os procedimentos urbanísticos .... 97

Figura.15.–.Classificação e retenção das mais-valias consoante o nível de

sustentabilidade das localizações.................................................................................... 98

Figura 16 – Organização dos solos numa cidade ........................................................... 99

Figura 17 – Processo da distribuição das mais-valias .................................................. 102

Figura 18 – Ação da introdução de um imposto de forma geral .................................. 105

Figura 19 – Exemplo da redução do Valor de Compra ................................................ 106

Figura 20 – Caso de uma localização valorizada com uma obra pública ..................... 111

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ÍNDICE DE TABELAS

Tabela 1 – Metas Europa 2020 ......................................................................................... 6

Tabela 2 – Transições de uso e ocupação do solo entre 1980 e 2010 ............................ 19

Tabela 3 – Classificação e qualificação do solo nos Instrumentos de Gestão Territorial

........................................................................................................................................ 40

Tabela 4 – Classificação dos solos no Código das Expropriações ................................. 40

Tabela 5 – Sistema ou Instrumento de Execução ........................................................... 42

Tabela 6 – 10 Compromissos de Aalborg ...................................................................... 47

Tabela 7 – Recomendações da Carta de Leipzig sobre as Cidades Sustentáveis ........... 48

Tabela 8 – Indicadores, parâmetros e categorias da dimensão económica do MARUS 93

ÍNDICE DE GRÁFICOS

Gráfico 1 – Distribuição da população mundial (2007-2050) .......................................... 4

Gráfico 2 – Uso e ocupação do solo em Portugal Continental ....................................... 18

Gráfico 3 – Exemplo da valorização real ....................................................................... 23

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NOMENCLATURA

ACP – Áreas de construção prioritário

ADUP – Áreas de desenvolvimento urbanístico prioritário

CNADS – Conselho nacional do ambiente e do desenvolvimento sustentável

CREL – Circular regional exterior de Lisboa

CRIL – Circular regional interior de Lisboa

CREP – Circular regional exterior do Porto

CRIP – Circular regional interior do Porto

EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável

FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

IRC – Imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas

IRS – Imposto sobre o rendimento das pessoas singulares

IVA – Imposto sobre o valor acrescentado

LBPOTU – Lei de bases gerais

MARUS – Manual de apoio a regeneração urbana sustentável

PDM – Plano diretor municipal

PER – Programa especial de realojamento

PGU – Plano geral de urbanização

PP – Plano de pormenor

PU – Plano de urbanização

PI – Pontos de interesse

RJIGT – Regime jurídico dos instrumentos de gestão territorial

RJUE – Regime jurídico da urbanização e da edificação

TVS – Tributação do valor do solo

UE – União europeia

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Capitulo 1 – ENQUADRAMENTO

1.1. Introdução

A cidade é, antes de mais, um bem coletivo. Afirma-se como espaço onde uma complexa

vida ocorre, intensa, como plataforma onde a individualidade se declara e o coletivo se

constrói numa dinâmica nem sempre pacífica, porém enriquecedora do tecido social. É

este jogo de tensões em que a cidade se faz e refaz ao longo do tempo, que requer ser

verificado, avaliado e supervisionado – uma supervisão que envolve ponderada

negociação com múltiplas entidades, públicas e privadas, cujos interesses frequentemente

são diferentes, até mesmo contraditórios. Mas o objetivo dessa negociação deve, sempre,

ser o Bem Público, o bem dos habitantes, o bem do cidadão comum. Para isso se faz o

Planeamento. Por isso o Planeamento é realizado no âmbito de uma instituição eleita, que

representa os cidadãos que nela confiaram. Por isso Planear é uma missão pública.

Esse modelo deve considerar a política de solos, a organização urbanística, o justo

equilíbrio entre áreas de construção e de reserva patrimonial, ambiental e ecológica, a

mobilidade e a circulação, os transportes municipais e demais transportes públicos, a

relação harmoniosa entre cidade e sua periferia, os incentivos económicos e a política

fiscal municipal. Neste modelo, a prioridade deve ser a de contribuir poderosamente, nos

limites das suas competências, para combater a crise económica e as suas consequências

sobre a população. Nesse sentido, o município tem de incentivar uma política de solos

que dinamize o aproveitamento racional de recursos, através do desenvolvimento

sustentável da cidade.

Tal índice de desenvolvimento exige o recurso à definição de uma estratégia sustentada

por um desenho urbano que, dentro da incerteza que as contingências do tempo e do

mercado naturalmente implicam, assegurasse a flexibilidade necessária ao

desenvolvimento de uma cidade equilibrada, aglutinada em torno de um espaço público

adequado. Exigiam-se ações que tivessem em vista a construção de uma cidade que

oferecesse bem-estar coletivo.

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Rever os critérios gerais para a avaliação do solo devem ter em consideração, o bem-estar

coletivo e não atender apenas ao valor de mercado. Por isso, o estado e os municípios não

podem imigrar das suas responsabilidades de urbanizar para entidades privadas.

É fundamental este espírito de construção de um desígnio urbano claro e percetível. É

essencial para o cidadão o domínio do espaço e a compreensão dos modos de

funcionamento do território que habita: que seja capaz de o discutir, que o idealize, que o

projete para o futuro, que o exija no presente. Para isso, é exigido um modelo de

desenvolvimento assente em 3 parâmetros:

• Económico

• Social

• Ambiental

Pensar a cidade assim, leva a questão da classificação e reclassificação do solo, passando

a ser o processo chave na correção das anomalias, designadamente com “planos abertos”

desenvolvidos em permanência e respondendo em tempo real às necessidades e desafios

sócio territoriais. Onde, o objetivo é dinamizar a revitalização e regeneração das áreas

interiores do perímetro das cidades e colmatar os solos urbanos vazios.

A Lei dos Solos de 1976 que vigorou até 2014 e que deveria colmatar as anomalias,

permitiu, que fossem os especuladores a ditarem o desenvolvimento da cidade, que estava

muito ligada à necessidade de a expandir, devido à excessiva procura de habitação na

altura. Atualmente, esta encontra-se completamente desfasada da realidade e contraria a

exigência de densificar e delimitar as zonas urbanas/rústicas, retirando a pressão

especulativa das zonas agrícolas e florestais.

Em consequência, a total desarticulação entre os diferentes diplomas que intervêm nesta

matéria, nomeadamente o RJIGT, o Código das Expropriações e o Código sobre o

Imposto Municipal sobre Imóveis, para além da legislação dispersa e de pouca ou nula

aplicabilidade efetiva, como a relativa à associação de administração com os particulares,

às áreas de desenvolvimento urbano prioritário e às áreas de construção prioritária,

promovendo a sua disponibilização para fins públicos, criar mecanismos que permitam

ultrapassar a retenção dos solos com fins especulativos.

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Ao adotar os regulamentos é necessário criar condições espaciais, que permitam a sua

real aplicação. Sendo o espaço limitado, dever-se-ia ter acautelado a disciplina de

parametrização e distribuição das respetivas mais-valias, enquadrando essa distribuição

em qualquer plano urbanístico, de modo a garantir a sustentabilidade do mesmo.

Esta medida, assim simplista, escamoteou a questão das mais-valias e, na prática,

concedeu de facto aos proprietários dos terrenos contemplados nas manchas urbanizáveis

o direito de urbanizar e todas as vantagens económicas daí decorrentes, sem regras e sem

disciplina urbanística (Pardal, 2007).

1.2. Objetivos

A crise económica pôs a nu os desequilíbrios de um modelo de cidade e município

“sempre a crescer”. A especulação imobiliária desestruturou o território e criou o impasse

presente de um centro histórico que necessita urgentemente de ser regenerado e

revitalizado, bem como criou a “periferia”, como se lhe chama, revelando a discriminação

negativa de que é alvo, sem qualquer preocupação de ideia de cidade, formando-se e

conformando-se refém da lógica da máxima exploração fundiária e do máximo lucro.

Este é o objetivo geral, para o qual o presente trabalho pretende ser um contributo. O

combate à especulação e articulação entre as diferentes zonas da cidade para incentivar o

investimento no desenvolvimento sustentável das cidades.

Para isso acontecer, deve-se estabelecer duas prioridades nos objetivos. A necessidade de

conseguir articular os diferentes processos de planeamento que se encontram atualmente

dispersos, e que nunca foram pensados como um todo e a necessidade de parametrizar as

mais-valias de forma a gerar uma forma sustentável de dinamizar as localizações.

Nesse sentido, é necessário perceber que para se atingir estes objetivos, tem-se de

repensar o processo como ele atualmente funciona. Os sistemas atuais que atuam nos

procedimentos de planeamento, têm de ser simplificados para que não seja preciso utilizar

ferramentas complexas e demorosas de concluir como as expropriações. Com o que aqui

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se propõe, passa a ser possível um processo justo que retira a necessidade de ações

judiciais – devido a expropriações – que muito comprometem ações imediatas e futuras.

Ao articular os diferentes mecanismos, deve-se pensar um processo fiscal que seja

compensatório e célere, tanto para o proprietário do terreno, como para a entidade pública,

cabendo ao serviço público legislar para garantir a justa redistribuição dos encargos

fiscais e criar fluidez nas transações. Assim, é preciso capacitar o sistema fiscal com a

parametrização das mais-valias de forma a dotar o sistema fiscal, com uma ferramenta

capaz de intervir diretamente, como estimulo a oferta e a procura das localizações.

Com a parametrização das mais-valias, pode-se continuar a criar planos de

desenvolvimento da cidade criando interesse por parte dos investidores de uma

determinada localização, para dinamizarem um projeto, ou pode-se criar um mecanismo

que crie um planeamento dinâmico que incentive o investidor a desenvolver projetos que

sejam do interesse público. Ao estipular localizações por critérios de sustentabilidade, é

possível reverter a tendência esporádica e descontrolado do alargamento das cidades,

tendo um uso racional dos recursos.

Ao conseguir desenvolver uma metodologia que englobe estes objetivos, gera-se uma

estabilidade nos investimentos, direcionando os recursos para produtos diretamente

produtivos, e não, diretamente improdutivos como acontece com a Lei de base dos solos

de 1976. Este processo permite assim a estabilização dos mercados dos solos.

Apesar dos objetivos tenderem e necessitarem do desenvolvimento de uma metodologia

de avaliação da sustentabilidade das localizações urbanas, o objetivo desta dissertação

não passa por conceber um algoritmo para esse fim. Passa sim, por elucidar para a

necessidade do mesmo como ferramenta para a escolha de localizações prioritárias.

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Resumindo, os objetivos deste trabalho são os que constam da Figura 1 que a seguir se

apresenta.

Figura 1 – Sinopse dos objetivos da presente dissertação

OB

JETI

VO

S

Novo procedimento de parametrização das mais-

valias

Simplificar

Introduzir conceitos de sustentabilidade

Desenvolver um planeamento dinâmico

Transações rápidas e eficientes de solos

Reverter a tendência de alargamento

Uso racional dos recursos

Estabilizar o mercado imobiliário

Articulação dos procedimentos de

planeamento

Simplificar

Evitar a necessidade de expropriações

Adequar as necessidades atuais e futuras

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1.3. Estrutura da dissertação

A dissertação é dividida em 5 capítulos distintos, que por sua vez estão subdividos num

total de 60 subcapítulos. A abordagem efetuada corresponde ao seguinte:

- O Capítulo 1, apresenta o âmbito desta dissertação, onde é feita a introdução ao tema e

apresentadas a metodologia a seguir, com a apresentação de objetivos claros do que se

pretende implementar.

- No Capítulo 2, é apresentado o estado da arte. Nos diferentes subcapítulos em que se

encontra organizado, estabelece-se um enquadramento sobre a necessidade de criar um

círculo virtuoso na gestão urbanística. Neste sentido, são abordados os princípios da

sustentabilidade e a sua contextualização internacional e nacional, orientando este

conceito, para a sustentabilidade fiscal do imóvel e da localização. Para tal, é necessário

dilucidar através de conceitos económicos o papel fundamental que as mais-valias tem

para o sistema fiscal e os mecanismos possíveis de utilizar, de forma a exercer o

planeamento, conseguido compará-los entre seis países europeus, abordando de seguida,

uma análise, à nova Lei de Bases do Solo. No último subcapítulo é abordado o uso

sustentável dos rendimentos da tributação sobre a propriedade.

- No Capítulo 3, apresentam-se os fundamentos da metodologia a adotar. É abordada a

legislação concebida para combater a especulação. É também definida a diferenciação

entre o imóvel e uma localização, no sentido de perceber onde e como investir, e

apontando a necessidade de analisar áreas prioritárias para realizar a melhor gestão dos

recursos.

- No Capítulo 4, enuncia-se a necessidade de uma nova metodologia de avaliação

sustentável de localizações, em articulação com o plano de pormenor, para obter

classificações em áreas prioritárias. Analisa-se o sistema fiscal e o seu comportamento,

introduzindo alterações ao Fundo Municipal de Sustentabilidade Ambiental e Urbanística

(FMSAU), de forma adotar a uniformização de valores nas áreas prioritárias.

- No Capítulo 5, são apresentadas as principais conclusões no sentido dos objetivos

propostos, estabelecendo uma reflexão sobre a estabilização do mercado imobiliário. São

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apresentadas neste capítulo final algumas perspetivas futuras de desenvolvimento para o

tema, com vista à prossecução de investigação nesta temática, cada vez mais pertinente

no domínio das operações urbanísticas em Portugal.

1.4. Metodologia

Tendo em conta o trabalho desenvolvido nesta dissertação é necessário estipular um

conjunto de tarefas ordenadas e coerentes, que vão ao encontro dos objetivos propostos,

mas cientes das limitações que existem no âmbito do conhecimento do direito, economia,

arquitetura e engenharia civil. Neste contexto, a multiplicidade de diferentes tipos de

conhecimento presentes e que em alguns dos casos ainda podem ramificar de acordo com

as políticas regionais ou municipais, explicam a dificuldade em coligar e sistematizar a

informação.

De acordo com a metodologia proposta, será realizado um trabalho exaustivo de pesquisa

documental acerca dos melhores procedimentos e sistemas sustentáveis que existem em

diferentes regiões (nacionais e internacionais). O objetivo consiste em perceber qual a

área prioritária aplicar e nomeadamente como são aplicados ou executados. Para isso,

estabeleceram-se cinco etapas de acordo com os objetivos identificados:

1ª Etapa – Fazer a análise da atual bibliografia sobre o estudo da nova Lei de Base do

Solo (LBPOTU), recolhendo e compilando os estudos de enquadramento para a

preparação da Nova Lei do Solo. Através da recolha de diferentes bibliografias, será

possível perceber os diferentes objetivos que cada autor propôs na alteração da Lei de

Base do Solo. Com esta recolha é possível estabelecer um intervalo de objetivos, e é

possível perceber o que é a especulação e como atua. Estabelecida esta análise serão

delineados parâmetros possíveis a utilizar sem por em causa o direito a propriedade,

salvaguardando ao mesmo tempo o interesse da sociedade.

2ª Etapa – Nesta etapa realiza-se a recolha de legislação que poderá contribuir e servir de

base para a dissertação, de forma a entender se é possível a parametrização das mais-

valias e taxar apenas, áreas que sejam prioritárias para o interesse público.

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8

3ª Etapa – Estabelecido os objetivos, propõe‐se a necessidade de se aplicar para situações

de especulação o uso de uma metodologia de avaliação sustentável que englobe o imóvel

e a localização, ou existe a necessidade de separar essa metodologia de forma atuar sobre

a especulação sem por em causa o investimento.

4ª Etapa – Realizar uma observação com o que a LBPOTU propõe, e combater a

especulação e sem por em causa o investimento que possibilite o desenvolvimento

sustentável da cidade.

5ª Etapa – Desenvolver uma proposta, enquadrando-a, no que foi enunciado antes.

Garantindo que essa proposta seja viável e analisar as novas formas de taxar as mais-

valias da LBPOTU, contrariando a atual situação de sobrevalorização de determinadas

localizações.

Incorporando os parâmetros da LBPOTU e atendendo à proposta da dissertação, a

metodologia assenta nos passos identificadores na Figura 2.

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9

Figura 2 – Metodologia do trabalho proposto

Metodologia

Caraterização detalhada a nivel social, economica e ambiental em Portugal

Identificação e analise de conceitos económicos

Compilação de instrumentos de planeamento

Analise comparativa entre sistemas europeus

Analise da nova Lei de Base do Solo (LBSOTU)

Identificação de legislação anti-especulativa

Refinamento dos procedimentos propostos

Definição final e conclusão dos resultados obtidos

Page 30: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

10

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1

Capitulo 2 – ESTADO DA ARTE

2.1. Enquadramento

As palavras muitas vezes citadas de Jean-Baptiste Colbert, (pelo menos nos círculos de

tributação da propriedade), que era o ministro das Finanças de Luís XIV: “A arte da

tributação consiste em depenar o ganso, obtendo o maior número possível de penas, com

a menor quantidade possível de assobios”.

Como McCluskey e Plimmer (2010) destacam:

Continuando a metáfora, “é importante que o "ganso" permaneça saudável e idealmente,

melhore a sua saúde” de modo que a quantidade de 'penas' aumentem de ano para ano.

Assim, pode-se argumentar que um mercado imobiliário ativo, transparente e saudável,

onde os serviços locais contribuem para o valor das propriedades, garante ou melhora o

valor tributável dos imóveis. É certamente importante assegurar que com o processo não

se danifique o “ganso”. “... Também é importante que o processo não seja tão doloroso,

que o 'ganso' tente morder, a pessoa que arranca as penas”.

Por isso, argumentam que, para ser sustentável, um imposto de propriedade deve

contribuir positivamente para o valor tributável dos terrenos e edifícios e incentive a

melhor utilização, manutenção e melhorias dos terrenos e edifícios.

Para atingir os conceitos de sustentabilidade dentro das caraterísticas da tributação de

imóveis, é importante desenvolver um círculo virtuoso no imposto sobre a propriedade,

onde o rendimento gerado do imposto sobre a propriedade, aumenta o valor do objeto

tributado e, portanto, a avaliação do mesmo garante aumento da receita, para ser gasta na

melhoria dos serviços públicos (Figura 3). Desta forma, um imposto sobre a propriedade

sustentável tem o potencial de fazer uma contribuição significativa e positiva no sentido

de desenvolver comunidades sustentáveis.

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2

Figura 3 – Circulo virtuoso da gestão urbanística

Só através de um equilíbrio entre os proprietários e a administração pública, é possível

desenvolver um círculo virtuoso que permita atingir um caminho sustentável.

Desta forma, se o objetivo de uma sociedade é o caminho sustentável, é preciso garantir

uma articulação entre os diferentes regulamentos que estabeleçam a ordem e disposição

construtiva da cidade, o interesse da sociedade em adquirir localizações e alcançar a

melhoria dos serviços, graças a uma tributação justa e equitativa. Algo que não tem

acontecido na atualidade, muito devido a sobreposição dos interesses privados, em

deferimento dos interesses públicos, o que levou ao desequilíbrio do mercado imobiliário

e financeiro.

Contudo, a crise não afetou de igual modo todos os países (apesar de uns terem sido

afetados de forma direta e outros de forma indireta), por isso, é preciso analisar a nível

local, nacional e internacional o que levou a este ponto, e retirar ilações do que podia e

pode ser feito. Para isso, é preciso fazer um estudo de diferentes artigos e analises sobre

este assunto, de modo, a conseguir-se, orientar o tema em estudo. Consegue-se assim,

traçar um caminho e perceber a falha no desenvolvimento sustentável que estava traçado

para 2020.

Imovel acresce

valor

Aumento do imposto

Aumento das receitas

municipais

Melhoria dos serviços

publicos

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3

2.2. Sustentabilidade

Dados os custos (ambientais, económicos e sociais) na construção de edifícios e outras

estruturas, é preciso garantir que estes são construídos, geridos, utilizados e reutilizados

de forma sustentável, e que existe responsabilidade por parte de quem faz o seu

planeamento. É necessário garantir que os responsáveis por tais ativos - os proprietários

e ocupantes - estão conscientes da enorme importância da eficiência energética, gestão de

resíduos, bem como a saúde e segurança dos utilizadores dos edifícios; garantindo que

eles tem as melhores ferramentas e conselhos disponíveis, para que façam a sua parte e

alcancem um ambiente cada vez mais sustentável, para as gerações atuais e futuras

(Plimmer & Mccluskey, 2011).

Os programas de requalificação, revitalização e reabilitação implementados nos últimos

anos atestam o carácter ineficiente desta estratégia no combate à degradação dos centros

das cidades. É necessário abandonar a ideia de que a cidade constitui um território onde

ocorrem problemas distintos, autónomos e, por conseguinte, investir numa análise que

considera o forte grau de interação entre os diversos problemas (Carvalho, 2008).

De acordo com a Comissão

Brundtland, a consecução

do desenvolvimento

sustentável exige que se

assegure o desenvolvimento

de três pilares de

sustentabilidade: a

sustentabilidade ambiental,

a económica e a social, sob

a premissa de que os

sistemas económicos e sociais não podem desligar-se da capacidade de impacto no meio

ambiente, tal como se pode observar na Figura 4. O desejo de crescimento e bem-estar

social deve conciliar-se com a necessidade de preservar os recursos ambientais para as

gerações futuras (Edwards, 2005).

Os recursos consumidos por uma cidade podem ser medidos em termos da sua “pegada

ecológica”, a qual corresponde a uma área, espalhada por todo o mundo e muito maior do

Figura 4 – Dimensões do desenvolvimento sustentável [adaptado de Edwards, 2005]

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4

que as suas fronteiras físicas, da qual a cidade depende. À medida que novas cidades

consumidoras se expandem, também cresce a competição por esses recursos e aumentam

essas pegadas (Rogers & Gumuchdjian, 2001). Para que a sociedade seja sustentável, a

“pegada ecológica” terá de ser inferior à biocapacidade do planeta ou região (Marques,

2009), pelo que as pegadas ecológicas urbanas devem ser dramaticamente reduzidas e

circunscritas (Rogers & Gumuchdjian, 2001).

As cidades ocupam atualmente 4% da superfície terrestre, cerca de quatro vezes mais do

que os ecossistemas de água doce e é, justamente, nas cidades que vive a maior parte da

população mundial, numa tendência crescente (Falcón, 2007).

Assim, as cidades têm de ser pensadas de forma a conter essa expansão, dando mais

condições as zonas rurais, onde se estima que a partir de 2007 a população mundial vai

expandir as zonas urbanas cerca de 70% até 2050. Entre 2007 e 2050, a população que

vive em áreas urbanas é projetada para ganhar 3,1 mil milhões, passando de 3,3 mil

milhões em 2007 para 6,4 mil milhões em 2050. Devido a isto, vai haver um crescimento

quase linear da população urbana menos e mais desenvolvida, como se pode ver no

acumulado no gráfico da Figura 5. Isto é possível ver no gráfico da Figura 6, onde entre

2020 e 2050, existe um decréscimo devido a migração das populações de zonas rurais

para zonas urbanas. Perceber de forma mais simples no Gráfico 1.

Gráfico 1 – Distribuição da população mundial (2007-2050)2

49%

51%

2007

População Urbana(3.293 milhões)População Rural(3.377 milhões)

57%43%

2025

População Urbana(4.584 milhões)População Rural(3.426 milhões)

70%

30%

2050

População Urbana(6.398 milhões)

População Rural(2.792 milhões)

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5

Figura 5 – Crescimento anual da população mundial (1950-2050)1

Figura 6 – Crescimento da população mundial (1950-2050)2

1 Fonte: http://www.un.org/esa/population/publications/wup2007/2007_urban_rural_chart.pdf 2 Fonte: http://www.un.org/esa/population/publications/wup2007/2007_urban_rural_chart.pdf

Page 36: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

6

No sentido de contrariar o desenvolvimento desregulado, uma das estratégias

internacionais adotadas para o desenvolvimento sustentável, foi a Europa 2020, que

designa o crescimento para a União Europeia (UE) entre 2010 e 2020. Outro propósito é

o de promover uma maior articulação entre as políticas nacionais dos Estados-membros

e as políticas europeias. Mas a falta articulação fiscal e equidade entre os diferentes países

europeus, tem levado a uma fuga de impostos, que não permite atingir as diferentes metas,

principalmente nas economias semiperiféricos, como se pode constatar na Tabela 1.

Tabela 1 – Metas Europa 2020

Dados de Portugal em 2011

Metas para Portugal

Previsões UE Grandes objetivos

da UE

Taxa de emprego (em %)

69.1% 75% 73.7-74% 75%

I&D em % do PIB

1.5% 2.7-3.3% 2.65-2.72% 3%

Metas de redução das emissões de

CO2 - 1%

-20 % (em comparação com os níveis de

1990)

-20 % (em comparação com os níveis de

1990)

Energias renováveis

24.9% 31% 20% 20%

Eficiência energética – redução do consumo de

energia em Mtep

2.26 6.00 206.9

Aumento de 20 % da eficiência energética,

equivalente a 368 Mtep

Abandono escolar

precoce em %

23.2% 10% 10,30-10,50 % 10%

Ensino superior em

% 26.1% 40% 37.50-38.0% 40%

Redução da população em risco de pobreza ou de

exclusão social

84 000 200 000

Impossível de calcular devido a

diferenças nas metodologias

nacionais

20 000 000

Fonte: INE e Comissão Europeia3

3 Fonte: ec.europa.eu/europe2020/index_pt.htm

Page 37: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

7

Como a sustentabilidade fiscal influência os atuais e futuros aspetos econômicos,

ambientais e sociais, é através dos impostos sobre a propriedade, que todos os 3

parâmetros vão influenciar a dimensão política local. Os impostos sobre a propriedade,

geralmente vão financiar serviços que são prestados a nível local e que afetam diretamente

a qualidade do ambiente físico e económico e, portanto, a vida social das comunidades.

Logo, é possível definir e desenvolver impostos sobre a propriedade para alcançar

resultados sustentáveis em cada jurisdição (Plimmer & Mccluskey, 2011).

2.2.1. Dimensão sócio habitacional

As políticas sociais de habitação são compostas por medidas de apoio que visam a

valorização da qualidade de vida da população. O incentivo às políticas sociais de

habitação permitiu nivelar os padrões de consumo aos do centro da Europa, mas, por

outro lado, contribuiu igualmente para o crescimento do mercado privado de habitação,

sobretudo ao favorecer soluções individualizadas no quadro da provisão de bens e

serviços essenciais (Observatório, 2014).

A ideia de substituir o Estado Providência pela iniciativa privada, produziu habitações de

qualidade inferior, que conduziu o ordenamento das cidades à criação de cidades/bairros

dormitórios com uma qualidade de vida reduzida, pois limitou-se a criar localizações para

repousar. A iniciativa privada, apenas procurou a obtenção do lucro e não teve como

objetivo – como acontece com o Estado Providência – um correto desenvolvimento

sustentável da sociedade.

Com a falta de planeamento estratégico, em fornecer determinadas zonas com uma rede

de pontos de interesse (PI), não permitiu um fluxo de pessoas para determinadas

localizações. Esta falta de aposta em PI, que pode enriquecer a qualidade de vida da

região, como também, a construção tardia do Estado Providência em Portugal, levou à

criação de periferias sociais e à criação de zonas sociais, com baixa diversidade social, o

que retirou o efeito de a habitação se ter afirmado como uma área de pleno direito da

política social, mostrando as fragilidades do Estado Providência, talvez com maior

saliência, no setor da habitação. Isto permitiu a desvalorização das localizações e a

segregação social.

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8

Em França a habitação social está associada ao conceito de habitação de renda moderada

e estima-se que o arrendamento social represente, 19% dos fogos usados como primeira

residência, o que permite, a estabilidade das famílias de rendimentos médios, médios-

baixos e baixos4.

Até aos anos noventa, a provisão da habitação em Portugal reflete, de modo

particularmente expressivo, este quadro geral (Figura 7) de insuficiência do Estado e das

políticas públicas, bem como a incipiência relativa do setor mercantil, só compensadas

pelas capacidades da sociedade civil na resposta e supressão das necessidades

habitacionais (Serra, 2002).

Figura 7 – Evolução de vários componentes da despesa pública em percentagem do

PIB (1972-2012)

Fonte: DGO/MF e INE/BP

Em simultâneo, começa igualmente a articular-se a política de habitação com a política

de desenvolvimento económico e social, tendo em vista a promoção do bem-estar social

entendido como satisfação de necessidades sociais básicas nos domínios da educação,

saúde, segurança social e habitação (Observatório, 2014).

4 Fonte: http://www.portaldahabitacao.pt/opencms/export/sites/ihru/pt/ihru/docs/hru/Politicas_Franxa.pdf

Page 39: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

9

A grande mudança, em termos de política habitacional, à escala do Estado Central,

traduzir-se-ia, como veremos adiante, na transição do paradigma de “apoio à pedra”

(promoção pública direta de alojamentos) para o paradigma do “apoio à pessoa” (Serra,

2002). Isto é, no realinhamento progressivo da intervenção estatal na esfera da habitação

através do estímulo à aquisição de casa própria (sendo o acesso ao crédito incentivado

por benefícios fiscais, por bonificação dos empréstimos e por um desenho do sistema

financeiro favorável à expansão deste mecanismo de provisão habitacional)

(Observatório, 2014).

A análise do peso relativo dos agentes envolvidos nas diferentes modalidades de

promoção direta de habitação em Portugal revela não só a escassa participação do Estado

mas também, e concomitantemente, a significativa importância da promoção privada,

como se pode constatar no gráfico da Figura 8.

Figura 8 – Fogos construídos para habitação, segundo o setor de promoção (1950-

2012)

Fonte: INE, Estatísticas das Obras Concluídas

O PER é o programa de habitação mais emblemático dos últimos vinte anos, sendo

particularmente exemplar quanto à circunscrição da política habitacional, em termos de

promoção direta, às situações mais expressivas de carência de alojamento, constitui uma

espécie de “canto do cisne” das políticas de promoção habitacional direta promovidas

Page 40: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

10

pelo Estado Central. Na medida em que revelou a persistência de um modelo de promoção

habitacional direta, ultrapassada, assente na construção de bairros isolados de habitação

social concentrada, periféricos à malha urbana consolidada e, em muitos casos, situados

em zonas desqualificadas e desprovidas de infraestruturas (Observatório, 2014).

Contudo, e tal como as políticas de reabilitação, o PER ilustra igualmente bem a

instabilidade, volatilidade e natureza fragmentada das políticas de habitação em Portugal,

tanto em termos de linhas de orientação, como em termos de definição dos instrumentos

e dos quadros institucionais que os enformam (Observatório, 2014).

Finalmente, devem ainda ser relembrados, nesta relação de concorrência entre o mercado

de arrendamento e da aquisição de habitação própria, os incentivos fiscais do Estado à

aquisição de habitação própria permanente que contrastam com os muito tímidos apoios

públicos ao arrendamento, tanto no parque habitacional público como no privado, e que

se dirigiram sobretudo aos jovens (Observatório, 2014).

2.2.2. Dimensão socioeconómica

Henry George, em 1879, na obra “Progress and Poverty”, constatou que o Léon Walras

concluiu por via da modelação matemática, que o preço da propriedade privada do solo

tenderia para o infinito (Lobo, 2011).

Nessa época, os Estados Unidos não dispunham de quaisquer instrumentos de

ordenamento do território nem de impostos sobre o rendimento, no entanto, este autor

preocupou-se com o facto de a “terra livre” começar a escassear, o que poderia gerar

tensões fortíssimas entre os interesses públicos e os interesses privados. Henry George

estava essencialmente preocupado com o facto da escassez de terra originar graves

desequilíbrios ao nível da igualdade de oportunidade económica que gerariam

inevitavelmente confrontações sociais (Lobo, 2011).

O solo em Portugal, enquanto objeto comercial dinamizou o volume de produção do

mercado residencial, de tal modo, que o mercado imobiliário se caracteriza hoje por uma

oferta excessiva face à população residente. Ou seja, considera-se que se trata, de facto,

de um processo de financeirização da economia e da sociedade portuguesa que não pode,

Page 41: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

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como aliás sucede em qualquer outra realidade histórica, ser desligado do papel central

que o Estado desempenha na sua condução, nem da posição e inserção internacional da

economia portuguesa (Observatório, 2014).

O mercado imobiliário foi um canal para a transferência de capitais financeiros da

economia produtiva para agentes não-produtivos dedicados à arbitragem pura dos valores

do solo e suas benfeitorias edificadas: em 2008, aproximadamente 68% do total da dívida

privada portuguesa resulta do crédito imobiliário a famílias e empresas5, sendo

presumivelmente dois terços desse montante devidos a pagamentos do valor do solo

urbanizável. Segundo os dados do Boletim Estatístico do Banco de Portugal, em 2008 o

saldo de crédito atribuído ao agregado CONSTRUÇÃO + ACTIVIDADES

IMOBILIÁRIAS + HABITAÇÃO somava 168.701 milhões de euros, somando o crédito

atribuído ao agregado AGRICULTURA + PESCA + INDÚSTRIA transformadora

apenas 16.455 milhões de euros. O crédito total aplicado em Portugal nesse ano

representava 248.389 milhões de euros. O PIB português em 2008 rondava os 180.000

milhões de euros (Bingre, 2011).

O volume de créditos hipotecários em Portugal cresceu de 5 mil milhões de euros em

1990 para 104 mil milhões de euros em 2008. Um aumento superior a 2.000 % nos gastos

nacionais2 com o imobiliário durante menos de um vinténio no qual o crescimento

acumulado do PIB per capita não alcançou os 40% e a densidade demográfica aumentou

menos de 10%6. Ora, tal escalada dos preços do imobiliário não pode ser explicada por

um aumento dos custos de construção, já que estes se mantiveram relativamente estáveis

ao longo das últimas duas décadas: esta subida dos preços da habitação foi provocada

sobretudo pelo aumento dos preços do solo, o qual foi exacerbado por fenómenos de

monopolização especulativa de dezenas de milhar de edifícios mantidos devolutos para

que posterior “passe” com encaixe de mais-valias (Bingre, 2011).

O número de alojamentos familiares cresceu intensamente ao longo das quatro últimas

décadas, duplicando o seu valor, registando uma variação global de cerca de 117%7. A

5 Fontes: Plano Estratégico de Habitação 2008/2013, IHRU; Boletim Estatístico do Banco de Portugal – Março 2009 6 Fonte: Luciano Amaral: New Series for GDP per capita, per worker, and per worker-hour in Portugal, 1950-2007. Faculdade de

Economia, Universidade Nova de Lisboa 7 Fonte: http://www.ine.pt/ngt_server/attachfileu.jsp?look_parentBoui=149381305&att_display=n&att

_download=y

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este crescimento de alojamentos familiares correspondeu por sua vez, como já referido,

um aumento do número de proprietários relativamente aos inquilinos (Figura 9), e um

aumento do número de alojamentos de segunda residência e de fogos devolutos (Figura

10), que denota, ainda que de modo aparente, a supressão das necessidades de alojamento

das famílias portuguesas (Observatório, 2014).

Figura 9 – Alojamentos familiares clássicos de residência habitual segundo os

Censos: total, por ocupantes proprietários e inquilinos (1960-2011)

Fonte: INE

A evolução do mercado de arrendamento português é marcada por um gradual declínio

desde os anos 70, com o setor a perder progressivamente peso para o mercado imobiliário

(Figura 11) (Observatório, 2014).

Com efeito, os últimos dados do recenseamento da população portuguesa mostram que

mais de 50% dos alojamentos com valores de renda inferiores a 20 euros correspondiam,

em 2011, a contratos celebrados antes de 1975. Por outro lado, mais de 80% dos

alojamentos com valores de renda superiores ou iguais a 650 euros correspondiam a

contratos de arrendamento celebrados entre 2006 e 20117.

Ou seja, os incentivos legais e financeiros à aquisição de habitação própria acabaram por

limitar, de forma não negligenciável, o potencial de dinamização do mercado de

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arrendamento que resultaria da supressão dos constrangimentos legais existentes até aos

anos 90 (Observatório, 2014).

Figura 10 – Alojamentos familiares clássicos segundo a forma de ocupação (1960-

2011)

Fonte: INE, Pordata

Finalmente, importa vincar o papel das políticas públicas na promoção do endividamento

hipotecário. Como vimos anteriormente, num quadro de inexistência de um mercado

dinâmico de arrendamento e de uma inércia política em atacar as suas causas históricas,

o enorme peso dos empréstimos à habitação na dívida das famílias (Figura 11) é o

resultado de uma política pública habitacional concentrada na promoção da compra de

casa própria, por via de incentivos fiscais (créditos bonificados, regimes fiscais

promotores de contas poupança habitação, etc.) e da redução gradual da provisão direta

por parte do Estado, confinada essencialmente à ação autárquica na gestão dos bairros

sociais (Observatório, 2014).

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Figura 11 – Peso da dívida no rendimento disponível das famílias (1995-2013)

Fonte: Eurostat

Em 2012, apenas 7% das famílias com hipotecas suportavam uma carga excessiva das

despesas com a habitação (isto é, superior a 40% do rendimento disponível do agregado

familiar), sendo este valor de 36% para as famílias que arrendavam a residência do

agregado familiar8 (Observatório, 2014).

A taxa de incumprimento do crédito ao consumo e relativa a outros fins foi a que registou

o maior crescimento, passando de cerca de 6,7% em 2009, para 12,7,% em 2013. Sendo

certo que a taxa de incumprimento do crédito à habitação também tem vindo a aumentar,

a verdade é que continua relativamente contida, tendo passado de 1,6% para 2,4% no

mesmo período (Figura 12) (Observatório, 2014).

O perfil de endividamento das famílias portuguesas, que assenta quase exclusivamente

no imobiliário, é similar ao perfil registado em países periféricos e semiperiféricos, nos

quais o endividamento se encontra, também, concentrado nos estratos sociais mais

elevados (Santos e Teles, 2013). No entanto, em Portugal, e ao contrário do que ocorre

nestes países, o custo real desta dívida foi historicamente baixo, o que explica o

crescimento ininterrupto do endividamento, mesmo durante o período de estabilidade dos

8 Fonte: http://appsso.eurostat.ec.europa.eu/nui/submitViewTableAction.do;jsessionid=9ea7d07d30d6856d59f18bfb40d7b025a0eb

260 41fff.e34OaN8PchaTby0Lc3aNchuNa3iPe0

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preços da habitação da década de 2000, o que constitui um caso quase único a nível

internacional (Observatório, 2014).

Figura 12 – Rácio do crédito vencido das famílias (2009-2013)

Fonte: Banco de Portugal

Quatro décadas depois, a economia portuguesa mantem características de uma economia

semiperiférica “atrasada no sistema produtivo, moderna no sistema de consumo, atrasada

na proteção social, moderna nas expectativas de vida” (Louçã, 2011).

Esta relativa capacidade de resistência do mercado imobiliário à crise que se instala no

setor da construção é de algum modo visível na evolução dos preços da habitação depois

de 2001, não se verificando uma queda abrupta dos seus valores, como seria de esperar

tendo em conta o excesso de oferta. Esta capacidade de resistência do mercado imobiliário

explica-se, em parte, pela descida das taxas de juro entre 2001 e 2006, que permitiu

manter “uma procura de fogos para especulação, os quais deveriam ser mantidos

desocupados para maximizar a rapidez das transações” (Bingre, 2011).

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2.2.3. Dimensão ambiental

Apesar de, desde os anos 70, existirem na legislação portuguesa algumas salvaguardas

para as questões ambientais, só a partir de 1986, com a adesão à Comunidade Económica

Europeia e por força da transposição das Diretivas Comunitárias, é que se encontra na

legislação subsequente uma preocupação efetiva com as questões ambientais. Numa

primeira fase, estas questões incidiam mais sobre o controlo da poluição, com o princípio

do poluidor-pagador, passando numa fase posterior a incidir na prevenção (Leitão, 2011).

Com a expansão da construção nova a que se assistiu, não existiram significativas

preocupações com a componente ambiental. A falta de sustentabilidade das soluções e

dos materiais, aliada à má construção vão obrigar a intervenções que acarretam prejuízos

significativos para o ambiente (Leitão, 2011).

Mesmo considerando a referida exceção e outras quantas medidas dispersas nos diplomas

legais nacionais, conclui-se rapidamente o âmbito restrito das mesmas: à poupança

energética, à gestão de resíduos, ao conforto, à saúde e à redução de consumos de

recursos, com reduzido impacto na política global de sustentabilidade ambiental (Mateus,

2009).

É precisamente em alturas de crise, que existe uma tendência para colocar em segundo

plano, a dimensão ambiental. Mas, se até há algum tempo atrás o trabalho desenvolvido

na chamada área da sustentabilidade era escasso e de fraca qualidade, em grande parte

devido ao facto dos mesmos serem extremamente focados na capacidade de tecnologias

básicas de produzir energia a partir de desperdícios, atualmente já existem, novos

modelos e processos de intervenção, quer por metodologias, quer ao nível legislativo, que

permitam reduzir as emissões de carbono que um tipo de habitação pode produzir na sua

fase de construção ou de utilização.

Existem hoje metodologias de avaliação da sustentabilidade, tais como: a Sustainable

Building Tool (SBTool), destacando-se o caso particular da SBToolPT-H para os

edifícios residenciais (Mateus, 2009), o LiderA (Pinheiro, 2006), o Leadership in Energy

& Environmental Design (LEED) (Kibert, 2005), o Building Research Establishment

Environmental Assessment Method (BREEAM) (BREEAM, 2009), o Environmental

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17

Assessment and Classification System for Residential, Office and Retail Buildings

(PromisE) (Häkkinen, 2007), entre outros, que têm vindo a ser desenvolvidas e aplicadas

a casos concretos reais para aferir a sua aplicabilidade prática, faltando apenas a decisão

sobre qual ou quais as metodologias que melhor conciliam as diferentes dimensões do

conceito de sustentabilidade (Leitão,2011).

A nível legislativo, o sistema de certificação energética em Portugal foi uma das primeiras

medidas efetivas, criada com o intuito de racionalizar consumos de energia e de limitar

as emissões de carbono. Porém, a evolução da legislação nesta área, ainda não está

orientada no sentido de permitir o desenvolvimento sério, de políticas ambientais no

sector da construção, possibilitando a existência e a aplicação efetiva de Mecanismos de

Desenvolvimento Limpo.

Outro fator que, no caso de Portugal, poderá travar ainda mais a aproximação do País às

metas estabelecidas no que se refere à sustentabilidade das medidas conducentes à

redução das emissões de carbono, caso tal seja ignorado, é a realidade do tipo, da

quantidade e da qualidade da construção de edifícios novos, em detrimento das operações

de reabilitação, que caracterizou o país nas duas últimas décadas (Leitão, 2011).

Depois de um período de grande expansão da construção nova, feita a um ritmo muito

apressado, passou-se agora para um período que começa a ser caracterizado por uma

crescente preocupação relativa à qualidade funcional e à sustentabilidade dos edifícios

(Leitão, 2011).

Pode-se ainda constatar que a perda de qualidade da construção em Portugal se deveu à

falta de captura das mais-valias urbanísticas das urbanizações-fantasma e a construção

das cidades dormitório que hoje recobrem Portugal e irão ser pagas três vezes: devido a

perda de qualidade ambiental, pelas hipotecas que se assumiram, e pelos impostos que se

investiram (Bingre, 2011).

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18

No parecer do CNADS acerca da Política de Solos e Revisão da Lei do Solo, datado de

Fevereiro de 2009, o Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do

Desenvolvimento Regional considerou serem as finalidades daqueles instrumentos:

Assegurar a oferta programada de solo urbano indispensável à adequada

satisfação das procuras resultantes da evolução demográfica e desenvolvimento

económico, contribuindo (...) para o funcionamento eficiente do mercado

imobiliário.

Salvaguardando o solo vivo como recurso ambiental e produtivo escasso e não

renovável

No caso de Portugal Continental assistiu-se nas últimas três décadas ao aumento de solos

ocupados por florestas, incultos, artificializados e corpos de água, e à redução de área nos

solos dedicados à agricultura e nos solos agroflorestais (Gráfico 2). Nas zonas húmidas

não se verificou alterações significativas de área.

Gráfico 2 – Uso e ocupação do solo em Portugal Continental

Fonte: DGT

Nas transições do uso e ocupação do solo destas três décadas (Tabela 2) sobressaem as

perdas que ocorreram nos solos agrícolas, agroflorestais e incultos para floresta. O

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aumento de área dos solos artificializados devido à transição que ocorreu essencialmente

nos solos agrícolas e florestais.

Tabela 2 – Transições de uso e ocupação do solo entre 1980 e 2010

Fonte: DGT

Com esta crescente consciência da necessidade da existência de uma responsabilização

coletiva, importa que sejam revistos os instrumentos e as ferramentas que permitam a

concretização deste conceito, além de estabelecer um conjunto de indicadores que de

forma progressiva fossem sendo completados e permitissem a sua comparação numa

lógica de benchmarking (Leitão, 2011). Com este contexto de organização e objetivos

sustentáveis no sistema de impostos e taxas associadas, é possível, a transição do atual

sistema fiscal, para um sistema com sustentabilidade fiscal.

2.3. A sustentabilidade fiscal (terrenos e edifícios)

A tributação é uma conhecida estratégia governamental que influencia o comportamento

(bem como o aumento da receita) e a utilização de impostos sobre a propriedade para esse

fim, é uma estratégia comum. Assim, a forma como um imposto sobre a propriedade é

estruturado e implementado, pode ter consequências deliberadas, bem como,

imprevisíveis. Em qualquer caso, os impostos sobre a propriedade devem ter em

consideração, como vão afetar a sustentabilidade, na sua tributação (ou não tributação)

através do uso que se dá aos terrenos e imóveis, valorizado pelos contribuintes, em

resultado do seu impacto mais ou menos amplo na sociedade (Plimmer & Mccluskey,

2011).

2010 Agro Corpos Zonas

1980 florestais de água húmidas

Agrícolas 2885894 21180 91897 13093 321463 223855 269 3557650

Agroflorestais 60721 682141 2380 8099 127417 10310 0 891068

Artificializados 2732 0 264252 290 1927 1720 0 270920

Corpos de água 807 15 258 76010 676 2274 41 80080

Florestas 76455 74348 53833 4563 2319742 272369 285 2801594

Incultos 87093 3832 28407 2961 309405 844273 681 1276651

Zonas húmidas 0 0 123 0 11 321 18714 19170

TOTAL (ha) 3113702 781517 441150 105016 3080640 1355121 19988 8897135

TOTAL (ha)Agrícolas Artificializados Florestas Incultos

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20

Este capítulo fornece uma série de exemplos de como diferentes características de

impostos sobre a propriedade afetam a sustentabilidade do setor imobiliário - o objeto

passivo -, bem como seus impactos no mercado e na comunidade em geral. Há uma

discussão sobre a forma como tais resultados são sustentáveis, dentro do que é cada vez

mais reconhecida, como as caraterísticas desejáveis de uma comunidade sustentável.

2.3.1. Tributação do valor do solo

A Tributação do Valor do Solo (TVS) procura incentivar a utilização ótima do solo,

através da taxação do mesmo, assumindo que o solo está disponível para a prática mais

eficiente e proveitosa de acordo com as políticas de ordenamento em vigor. Um dos

objetivos declarado da TVS é "modelação ou promoção de uma política de solos

(Lichfield e Connellan, 2000). Reconhece-se, que a TVS, com base na "prática mais

eficiente e proveitosa" irá incentivar o desenvolvimento na altura certa e no lugar certo,

por exemplo, penalizando os proprietários de terrenos de vagos, que não estão a usar por

razões meramente especulativas (Plimmer & Mccluskey, 2011).

Portanto, a TVS pode ser considerado como "sustentável" porque incentiva, através do

sistema fiscal, o uso mais vantajoso do solo; (embora, seja mais exato dizer que a TVS

desencoraja quem não tem o uso ótimo do solo).

Assim, é dentro do foco de incentivar a melhor utilização de solos urbanizáveis e/ou

agrícolas (que é geralmente o que esta coberto por os planos de planeamento das

autoridades locais), é onde a TVS, realmente ganha a sua matriz de sustentabilidade. Por

exemplo, a TVS promove a reutilização de terrenos que tenham sido usados

anteriormente, mas subutilizado (em particular abandonados e locais vagos), desencoraja

construções inadequadas e é utilizada em locais que deveriam estar a atrair mais valor e

um uso mais adequado, etc.; e incentiva a intensificação do uso das infraestruturas

existentes, em vez de aumentar os recursos gastos em, transporte, etc. (Connellan 2004;

Almy et al, 2008:. 186; McClean, 2006; McCluskey e Franzsen, 2005) (Plimmer &

Mccluskey, 2011).

Neste tipo de artigos sobre a TVS, raramente existe o reconhecimento da natureza

caracteristicamente insustentável, devido à constante pressão que a TVS exerce sobre o

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desenvolvimento da localização. Levando a que seja melhor reconstruir em locais

subutilizados ou vazios no interior das cidades, aliviando assim o desenvolvimento em

zonas verdes, bem como a otimização do uso da infraestrutura existente, que implica o

desenvolvimento urbano (Plimmer & Mccluskey, 2011).

No entanto, os processos de demolição e construção são bem conhecidos por gerar altos

níveis de resíduos (BRE 2006) e de emissões de carbono, que leva ao crescente

esgotamento dos nossos finitos recursos naturais. Assim, ao utilizar-se o sistema fiscal

como ferramenta para colocar pressão sobre os proprietários e manter a garantia que o

seu uso atual corresponde ao exigido pela sua autoridade local de ordenamento, graças a

um sistema de TVS, esta pode ser ambientalmente insustentável, apesar de ser um bom

incentivo para o emprego na indústria da construção (Plimmer & Mccluskey, 2011).

Lembrando que, é a partir do planeamento político que se consegue impulsionar a prática

mais eficiente e proveitosa, como o incentivo para reutilizar, que cria uma abordagem de

ordenamento diferente, ao que reflete a necessidade de se ter uma maior utilização de

edifícios existentes, através do incentivo a reutilização e recuperação, em vez da

demolição e reconstrução, bem como, proporciona uma maior flexibilidade para ser

projetado em novos edifícios, e pode ser visto como uma forma aceitável para se obter

um nível mais eficiente a longo prazo, levando a sustentabilidade dos edifícios, por a TVS

(Plimmer & Mccluskey, 2011).

2.3.2. Alteração da base tributária

"Igualdade" e equidade são geralmente reconhecidos como elementos essenciais para um

imposto sobre a propriedade.

No entanto, "justiça" é um conceito muito subjetivo e pode variar tendo em conta os

divergentes pontos de vista dos diferentes proprietários. Por exemplo, é geralmente aceite

que as propriedades com atributos similares em locais similares devem ter os mesmos

valores tributáveis (equidade horizontal); de modo a quem contribuiu, esteja a pagar uma

quantia semelhante, para desfrutar substancialmente das mesmas comodidades. Isso

normalmente é interpretado como a garantia de que as propriedades com valores de

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mercado similares têm autos de infração semelhantes e, portanto, passivos fiscais

semelhantes (Plimmer & Mccluskey, 2011).

Na Califórnia, em 1978, a "revolta do contribuinte" garantiu uma mudança do valor de

mercado para o valor de aquisição como a base de tributação para as habitações. O valor

de avaliação é, portanto, fixada no preço do imóvel (mais 2% todos os ano devido a

inflação) de compra. Assim, um contribuinte que comprasse uma habitação em 1980,

poderia pagar um imposto baseado no valor de compra desse ano, enquanto um vizinho

que comprou uma propriedade idêntica no ano passado, estaria a pagar um imposto

baseado no valor de compra do ano passado - e, portanto, um valor acumulado de mais

2% em relação ao ano posterior (Plimmer & Mccluskey, 2011).

Com um sistema de avaliação fixado por PREÇO DO IMÓVEL + 2% do valor da

habitação (valor tal que fica sujeito a parâmetros pessoais de avaliadores), levava a uma

desvalorização real, caso o valor da inflação fosse superior a 2% - por exemplo, se

tivermos uma inflação média de 3% ao ano, como se pode exemplificar no Gráfico 3 com

a “Habitação 2”, em comparação com a “Habitação 1” que obedece a base de tributação

de 1978, concluiu-se, que no final do 4º ano, estava a ter uma desvalorização real de 4%

do valor base. Ora, além de ter um sistema de avaliação da habitação, sujeito a parâmetros

pessoais – avaliadores –, logo subjetiva, criava uma tendência de não investir na

habitação, pois, a mesma ia perder valor real e nunca ia valorizar.

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Gráfico 3 – Exemplo da valorização real

A revolta do contribuinte foi desencadeada por um escândalo envolvendo assessores

fiscais. Numa altura em que a confiança nos avaliadores é baixa, um custo de aquisição

base é preferível porque remove qualquer subjetividade a partir do valor da avaliação e

pode, portanto, ser visto como uma figura tributável mais precisa e objetiva. "... nenhum

avaliador, nem mesmo um com meios ilimitados, poderia definir uma avaliação da

propriedade que fosse estritamente atual e precisa em todos os aspetos." (California

Taxpayers’ Association, 1993, citando o The State Board of Equalization, antes para a

introdução de Proposition 13) (Plimmer & Mccluskey, 2011).

Esta base de valor de aquisição, a chamada “Proposition 13”, foi julgado "mais justo"

pelo Poder Judiciário do Estado, porque, tal base tributária incentiva proprietários

residentes a não vender sua propriedade (e, assim, perder o patamar atrativo do imposto

a pagar) e isso contribui para preservação bairro, continuidade e estabilidade que,

argumenta-se, são resultados altamente desejáveis e sustentáveis (por exemplo,

Beaumont, de 1994; Picker, 2005). Essa base de imposto também oferece um alto grau

de previsibilidade sobre fatura fiscal do próximo ano. Pesquisa (Beaumont, 1994) mostra

que o valor de aquisição é percebida como mais inovadora do que uma base ad valorem

e que os grupos de renda idosos e baixos foram os mais beneficiados com a mudança -

também um resultado sustentável e útil, pode-se argumentar (Plimmer & Mccluskey,

2011).

94%

96%

98%

100%

102%

104%

106%

108%

110%

112%

114%

Ano 0 Ano 1 Ano 2 Ano 3 Áno 4

Valor Real da Habitação

Habitação 1 Habitação 2

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Beaumont (1994) fornece uma nova justificação, citando a partir do caso “Amador Vale

Joint Union High School vs. State Board of Equalization” (1978). Assim:

“Proposition 13” não discrimina contra os proprietários que adquiriram a sua propriedade

após 1975, pois estes são avaliados e tributados, exatamente da mesma maneira, que

aqueles que compraram em 1975, ou seja, o valor base é previsto a partir do preço de

compra do proprietário.

Argumenta-se (California Taxpayers Association, 1993) que "os donos dos imóveis na

Califórnia provavelmente não pagam nenhuma penalidade fiscal real sob a “Proposition

13”, porque as avaliações diferenciais são capitalizadas no preço de compra." No entanto,

na venda de uma habitação, qualquer “valor de reserva” – valor que se acumulou 2% ao

ano – tem de ser construída novamente na compra e subsequente ocupação de uma nova

habitação. Isto teve um impacto negativo sobre o mercado imobiliário.

No entanto, o resultado inevitável da “Proposition 13” foi uma grave perda de receita, nos

ganhos das autoridades, bem como uma perda de equidade horizontal e vertical

(Beaumont, 1994). Existe evidências (Beaumont, 1994) dos proprietários investirem nas

suas casas, quando comparado, com outros tipos de oportunidades de investimento de

capital. Isto levou a que menos (e insuficiente) habitações novas fossem construídas e

transformando o incentivo no sistema fiscal, num estímulo a que os proprietários não

vendessem. Isto significa que os custos de aquisição de imóveis residenciais fossem

particularmente elevados e que o mercado seja ineficiente na redistribuição da oferta em

relação as novas exigências para moradias, deixando em desvantagem os proprietários

mais jovens e as empresas mais recentes.

Também houve uma redução significativa no rendimento do imposto sobre a propriedade,

o que forçou os municípios a confiar mais em outras formas de rendimento (por exemplo

o imposto sobre vendas locais) e também a serem inovadores e criativos com outras

oportunidades de aumentar a receita com taxas e remuneração de serviços

(especificamente fontes não-fiscais). De acordo com Beaumont (1994) tais encargos e

taxas “...têm características positivas no seu potencial de receita e eficiência na alocação

de recursos."

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25

No entanto, isso resultou em municípios a competirem uns contra os outros para

incentivar os contribuintes comerciais sob a sua jurisdição (“Proposition 13” só se aplica

a imóvel residencial). Como Beaumont (1994) diz: "A Califórnia tem um excesso de

centros comerciais”.

2.3.3. Exceções e isenções

As isenções e abatimentos permitidos pela legislação também afetam a maneira como as

pessoas usam os seus bens e quaisquer concessões feitas, devem garantir resultados

sustentáveis.

A fim de alcançar uma base adequada de receita, (que é um fator importante tanto para a

equidade e para o rendimento - referem-se, por exemplo Lyons, 2007), e para alcançar o

máximo de participação de potenciais contribuintes na jurisdição, isenções e abatimentos

devem ser mantidos a um mínimo.

Tem-se argumentado que qualquer isenção ou redução da carga tributária deve ser feita

dentro dos chamados relevos do sol, ou seja, relevos que são concedidas por um período

limitado de tempo, por exemplo, 5 anos e que são revistos no final do prazo para

estabelecer se as circunstâncias continuam a justificar a concessão (IAAO, 2010). Isso

impede que aqueles que favorecem de tal benefício fiscal, considerem-no um “direito

legítimo”, tornando-se assim politicamente e socialmente mais difícil de remover o

benefício, quando o mesmo já não pode ser justificado.

No entanto, isto nem sempre é o caso. Por exemplo, em Inglaterra, onde o Imposto

Municipal é imposto sobre propriedade doméstica, existe um alívio de 25% do imposto,

se for garantido a ocupação por apenas uma pessoa (tributável) na habitação.

Tal concessão, incentiva de forma muito tangível (muitas vezes significativa em termos

monetários), um único ocupante a permanecer no local, em habitação de grandes

dimensões. Ao fazer isso, a concessão reduz a pressão para “down size” na habitação,

negando assim as famílias que precisam de alojamento a oportunidade de comprar e fazer

pleno uso de tais bens. Isso afeta negativamente a eficiência do mercado para redistribuir

a oferta, assim como também a exercer pressão sobre o setor imobiliário para fornecer

Page 56: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

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mais casas de maiores dimensões para atender a demanda, com todas as consequências

insustentáveis de desenvolvimento adicional indicado acima.

Princípios de sustentabilidade precisam de garantir que as habitações são integralmente

utilizados, e assim, em vez de encorajar uma única ocupação, as reduções fiscais do

município devem ser revertida para desencorajar especificamente, algo senão a melhor

utilização possível (e, portanto, a sustentabilidade) da propriedade.

2.3.4. Características de um "bom" imposto

Imposto sobre a propriedade é reconhecido como tendo uma série de características

básicas e positivas. Assim, um imposto sobre a propriedade está claramente relacionado

com o valor de terrenos e edifícios e tem uma forte dimensão local, portanto, uma relação

inerente entre o que é tributado, aqueles que pagam e aqueles que gastam, supondo que

esse dinheiro é pago para prestação de serviços para a comunidade local.

Há uma ligação clara e demonstrável entre o que é pago e o que é recebido pela forma de

serviços, porque a receita obtidas dentro de uma comunidade local é gasta naquela

comunidade. É, portanto, reflete e reforça a aposta que os moradores têm na sua

comunidade, sua prosperidade e o seu estilo de vida, que têm impacto sobre a

conveniência (valor) (ou não) de propriedade nessa área (Lyons, 2007).

A propriedade (terrenos e edifícios) é um sinal muito determinante de "riqueza", fácil de

valorizar e, portanto, um alvo legítimo para a tributação. Como fonte de investimento,

representa um de uma série de alvos para os fundos e, portanto, sua tributação é necessária

para um sistema tributário equilibrado (Muellbauer, 2005; IAAO, 2010).

A um imposto sobre a propriedade é difícil fugir, porque os terrenos e edifícios são

visíveis, não se transacionam de jurisdições e é difícil de esconder. O nível do imposto

sobre a propriedade é geralmente definido a nível do governo local, havendo uma forte

ligação entre aqueles que pagam e os que votam nos representantes locais, permitindo a

responsabilidade pública do imposto sobre o imóvel e o processo de gastos.

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Existem várias fontes que discutem o que é um “bom” imposto sobre a propriedade (por

exemplo, Almy et al, 2008;. Bird e Slack, 2004; Youngman e Malme, 1994), embora

poucas, se é que algumas, reconhecem explicitamente a possibilidade da sua

sustentabilidade. Assim, um imposto sobre a propriedade tem o potencial de fornecer as

seguintes características positivas:

- As avaliações são normalmente disponíveis para escrutínio público e, portanto, o

valor pago é transparente e aberto que incentiva altos níveis de cobrança;

- O desafio contra a avaliação é normalmente disponível numa forma razoavelmente

barata, rápida e informal, permitindo assim que os contribuintes se assegurem que

estão a ser tratados equitativamente dentro da lei;

- A avaliação é menos suscetível a flutuações econômicas de curto prazo e, portanto,

fornece uma fonte de receita estável, confiável e previsível;

- A nível da administração local, o imposto tem de ser eficaz e eficiente, tanto em

termos financeiros, de tempo, bem como o uso de recursos (humanos e técnicos),

especialmente quando assistido por tecnologias modernas;

- Promove a autonomia local e da responsabilidade democrática local;

- Deve quase sempre ser exclusiva para o governo local e, portanto, administrado

localmente, o que permite variações locais para atender às necessidades dos cidadãos

locais;

- Ter dados necessários para administrar o imposto (incluindo o necessário para

avaliações) devendo ser barato e fácil de coletar, armazenar e manter, incluindo a

garantia de níveis adequados de privacidade do contribuinte;

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- As disposições legislativas podem ser abrangentes, claras, exigindo interpretação

judicial mínima e argumentação jurídica com valor, para garantir o esclarecimento.

Deve ser possível fazer alterações em tal legislação com rapidez e eficiência para

refletir quaisquer alterações necessárias em resposta à evolução das circunstâncias, e,

a fim de melhorar a sustentabilidade do imposto;

- Aumentar os custos do governo possibilitando setores da comunidade que não podem

contribuir para a sua realização;

- Envolver minimamente na privacidade do contribuinte e dos assuntos do

contribuinte;

- Ficar sujeito a reavaliações regulares e frequentes, onde as avaliações podem manter

o ritmo com o aumento da renda, custos, inflação e novidades, atingem a flutuabilidade

ou elasticidade da renda;

- Facilitar a coleta, permitindo uma variedade de métodos de pagamento e medidas de

execução.

Os terrenos e edifícios representam um grande investimento de capital e, para muitas

pessoas, é o maior investimento financeiro que elas fazem, e em muitas jurisdições,

terrenos e edifícios representam direitos a uma renda - realizada pessoalmente ou

corporativamente. No entanto, é claro que o imposto é pago sobre a renda do não capital

e, portanto, a "justiça" de um imposto sobre o capital foi aumentada. Reconhecendo isso,

o IAAO (2010) afirma:

"... um só tem que observar a disponibilidade de empréstimos que utilizam bens ou

patrimônio como garanti colateral, reconhecendo a sua ligação com a riqueza e, em última

instância, a renda continua a existir … isenções, quebra de ciclos, abatimentos fiscais,

classificações, impostos e medidas de limitação de valor, reavaliações frequentes e

regulares, e relações públicas têm sido usados para aliviar a preocupação pública com o

imposto sobre a propriedade."

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Assim, enquanto a capacidade de pagamento é muitas vezes apresentada como uma

grande desvantagem para um imposto sobre a propriedade, há oportunidades dentro do

sistema fiscal para a construção de salvaguardas, de forma a proteger os mais vulneráveis

e aliviar as dificuldades.

Nós como espécie, precisamos de terrenos e edifícios para a nossa sobrevivência - para

viver, trabalhar, lazer e para todas as outras atividades em que estamos envolvidos ou que

exigimos para o nosso abrigo, conforto e bem-estar. Nós não temos nenhuma mercadoria

alternativa - impostos sobre a propriedade são, portanto, incidir sobre uma necessidade

da vida - na verdade, é isso mesmo o que torna ainda mais importante para alcançar os

benefícios do "valor" e da sustentabilidade dentro do imposto sobre a propriedade.

2.4. Conceitos económicos no ordenamento

A Lei do Solo assume um papel fundamental no ordenamento jurídico do Estado. Da

mesma forma, a sua dimensão económica é evidente. Constituindo o solo um recurso raro,

o seu modelo de atribuição e exploração a interessados concorrentes integra o cerne da

decisão económica (Lobo, 2011).

Deste modo, o solo constitui um recurso fundamental para o progresso de um País e, a

sua utilização eficiente, uma ferramenta para o desenvolvimento de uma qualquer

atividade económica. Poder-se-ia pensar que às entidades públicas ficariam, neste campo,

com uma mera função arbitral na delimitação da circunscrição do direito de propriedade

e gestão dos interesses privados em presença. Tudo o resto, para além da função de

administração da justiça e da proteção da propriedade privada, poderia ser deixado ao

mercado que, nos termos da mão invisível, comporia os interesses em presença de uma

forma eficiente num ambiente de concorrência perfeita (Lobo, 2011).

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30

Porém, um mercado só será plenamente concorrencial quando se encontrem reunidos três

pressupostos essenciais 9:

(1) Atomicidade, ou seja, a presença no mercado de uma multiplicidade de agentes

quer do lado da procura quer do lado da oferta, de forma que seja vedado a qualquer

deles determinar individualmente os termos fundamentais que conformam as

transações, máxime, o seu preço;

(2) Fluidez, que consiste na existência de mecanismos que propiciem transações

rápidas e eficientes de produtos homogéneos assentes em decisões económicas

tomadas na posse de plena informação, estando os agentes totalmente esclarecidos

quanto aos termos das opções presentes e das consequências destas num momento

futuro;

(3) Existência de liberdade de entrada e de saída, não sentindo os agentes

quaisquer entraves excessivos quer à entrada no mercado (inexistência de custos de

transação) quer à saída (inexistência de custos irrecuperáveis).

Ora, perante estes requisitos conclui-se rapidamente que o mercado fundiário não é um

mercado plenamente concorrencial10. De facto, o solo não é um bem económico típico. A

sua natureza (única, não reprodutível11) e a organização dos mercados fundiários (falta de

atomicidade, falta de transparência e existência de elementos de monopólio12 (Lobo,

2011).

Ao contrário do que se passa nos mercados de produtos fungíveis, o estudo do valor e

preço do solo não pode ser feito por via da análise dos custos marginais da produção desse

bem dado que não há produtores de solo, mas apenas proprietários e revendedores

(Bingre, 2011).

9 Cfr. Carlos Baptista Lobo, “Tributação do Urbanismo”, in XV Aniversário da Reforma Fiscal, Almedina 10 Cfr., e.g., Denise DiPasquale e William Wheaton, Urban Economics and Real Estate Markets, Prentice Hall, 1996; John

McDonald e Daniel McMillen, Urban Economics and Real Estate, Theory and Practice, Blackwell, 2008- 11 Pelo menos a valores sustentáveis de mercado. 12 Note-se, no entanto, que são estes elementos que fundamentam a criação de cidades, atento efeito que decorre da existência de uma

densidade mais elevada em termos económicos para a organização espacial da propriedade.

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31

Podemos perceber com isto, que o solo é um bem essencial, mas escasso, infungível e de

oferta inelástica. Compreendendo que as suas caraterísticas económicas, se dividem em:

Mesológicas: Valorização segundo as suas propriedades minerais e hídrica,

sendo reconhecidas, por setor primário (agricultura, silvicultura, etc.);

Topológicas: Valorização segundo o espaço físico, sendo reconhecidas, por o

setor secundário (indústria) e terciário (serviços).

O preço do solo enquanto valor topológico depende da sua localização, do seu contexto

histórico e socioeconómico, sendo este último uma variável exógena pouco ou nada

determinada pelo proprietário. Quando uma cidade se expande e com ela a procura de

habitação, o valor dos solos agrícolas em seu redor eleva-se por motivos extrínsecos aos

prédios rústicos propriamente ditos. O valor de um solo é parcialmente dado pelo seu

conteúdo mesológico, mas sobretudo pelas suas circunstâncias topológicas às quais o

proprietário é alheio. Daqui resulta que não exista propriamente um único mercado de

solos, mas sim uma multiplicidade de mercados de solo dispersos por localizações com

diferentes usos e expectativas (Bingre, 2011).

O solo assume então, uma parcela de um bem localizado – uma localização – que

adquirimos ou arrendamos, devido a nossa necessidade de ocupar um espaço. Sendo essa

localização limitada e sem fluidez, obtém-se um proprietário com o monopólio de uma

dada localização, não podendo haver, duas propriedades numa única localização.

Dado o facto de, no limite, cada artigo imobiliário ser único e irrepetível em localização

e características intrínsecas, não existe a possibilidade de se estabelecer uma concorrência

perfeita do modo que se verifica, por exemplo, no mercado de commodities (Bingre,

2011).

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32

2.4.1. Teorias económicas no mercado imobiliário

No Feudalismo, as economias centravam-se nas casas senhoriais agrícolas onde os

terratenentes - a nobreza medieval - viviam de rendas fundiárias. Nessa época, ser

proprietário de uma parcela de terreno, significava ter um determinado status social, que

os permitia capitalizar toda a riqueza, sem nunca necessitar de investir. Viviam

unicamente das rendas - rentismo fundiário. Entre o século XVIII e início do século XX

a teoria econômica clássica ditou os rumos do processo produtivo, dando foco a modelos

capazes de equacionar a dinâmica dos processos produtivos, a definição apriorística das

variáveis da equação necessariamente condiciona de modo preconceituoso a interpretação

dos resultados. Variáveis destas equações como o custo, o preço e o valor resultam do

cômputo de outras variáveis por seu turno irredutíveis, às quais se atribui a designação de

fatores de produção.

Os economistas da escola clássica, onde pontificaram Adam Smith (1723-1790) e David

Ricardo (1772-1823), reconhecem a existência de três fatores de produção (Bingre,

2011):

Terra, fator que inclui não somente o solo no sentidos mesológico e topológico do

termo, mas também outros bens ou serviços escassos oferecidos pela natureza e que

possuam valor de mercado, como os minerais, os cursos de água, etc. Aos rendimentos

obtidos pela mera posse da terra são designados pela escola clássica de rendas13, e a

sua captura pode ser classificada como uma atividade económica diretamente

improdutiva;

Trabalho, fator que consiste no contributo intelectual e físico do indivíduo humano

para a produção de um bem ou serviço, cuja recompensa consiste no salário. Trata-se

de uma atividade económica diretamente produtiva;

13 Segundo David Ricardo, a renda de um terreno é igual à máxima vantagem económica que se pode obter por mantê-lo em uso,

subtraída dos custos de capital e trabalho necessários à sua exploração. O preço tende a resultar do valor de capitalização à perpetuidade das rendas esperadas. Fenómenos especulativos podem, naturalmente, fazer crer ao mercado que as rendas esperadas no

futuro serão muito maiores do que as do momento presente; nesse caso, a subida de preços representa uma capitalização antecipada

dessas expectativas.

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Capital, fator que consiste nos meios de produção resultantes do trabalho humano,

seja sob a forma de capital imobilizado (bens de equipamento) como líquido. As

benfeitorias realizadas sobre um determinado solo constituem capital, mas não

integram o valor da terra no sentido estrito. O retorno da utilização deste fator é o juro,

o qual pode ser considerado a compensação de uma atividade económica

indiretamente produtiva.

Outro autor da escola clássica, Jean-Baptiste Say (1767-1832), identificou um quarto

fator de produção — o empreendedorismo, atividade económica diretamente produtiva,

distinta do capital e do trabalho assalariado — cuja recompensa seria o lucro. A John

Stuart Mill (1802-1873), outro autor da mesma escola, devemos a clarificação do papel

da fator terra como instrumento passível de ser utilizado para a captura de rendimentos

imerecidos, se for dada aos terratenentes a faculdade de especular com os solos onde o

capital e o trabalho se encontram em fase de aumento de produtividade; por isso propôs

a retenção estatal de acréscimos nos valores das rendas, sempre que estes resultarem do

progresso do contexto económico alheio aos esforços do proprietário (Bingre, 2011).

A escola neoclássica diferenciou-se da escola clássica, no que se refere ao tratamento do

fator terra, sobretudo a partir dos trabalhos de Alfred Marshall (1842-1924). Este autor

considerou a terra uma variedade de capital, na medida em que as bem-feitorias realizadas

a longo prazo sobre um terreno propiciam, no seu entender, “quasi-rendas” que oferecem

uma solução de continuidade entre a renda fundiária e o juro sobre o capital, tornando-os

na prática rendimentos indistinguíveis. Na esteira desse mesmo raciocínio chegou a uma

conclusão contraditória com a teoria neoclássica de formação dos preços dos bens em

geral, ao indicar que “o valor do solo é ordinariamente expresso pela capitalização das

rendas num dado número de anos”. Não deixa de ser surpreendente que, mesmo

admitindo tal facto — uma negativa implícita do axioma neoclássico segundo o que os

mercados livres tendem a produzir equilíbrios de preços que otimizem a produção — os

seguidores de Marshall continuem a insistir na “liberalização” dos mercados imobiliários

(Bingre, 2011).

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Outro autor neoclássico, León Walras (1834-1910), reconhecendo que semelhante

incorporação de rendas futuras no preço presente do valor do solo poderia colocar

entraves ao progresso económico por reconduzir o capitalismo à condição de rentismo,

propôs a nacionalização das rendas fundiárias14. A preocupação deste autor era não tanto

de ordem social, mas sim liberal: considerava desejável a realização de um capitalismo

puro, e via na apropriação privada das rendas fundiárias um dos seus principais

impeditivos (Bingre, 2011).

Pesem embora as dissertações de Walras, o pensamento neoclássico encaminhou-se no

sentido inverso ao da defesa da nacionalização das rendas. Partindo do princípio que uma

renda é uma recompensa pela mera posse de um recurso natural escasso — vários autores

quiseram equiparar as rendas fundiárias àqueles rendimentos extraordinários obtidos por

indivíduos dotados de talentos inatos raros, reduzindo ao absurdo por via dessa

equivalência a ideia de nacionalização de rendas. Outros, ignorando o papel da

especulação nos mercados imobiliários modernos, consideraram que as transações de

imóveis são demasiado fluidas para permitirem o rentismo fundiário, excluindo por

consequência a formação de bolhas imobiliárias das análises dos ciclos económicos

(Bingre, 2011).

Desde a fundação da escola neoclássica de economia até aos nossos dias, já sob a forma

da chamada escola de Chicago, o papel específico da renda fundiária no funcionamento

dos mercados afastou-se progressivamente do centro do debate académico, a ponto de na

prática se ter eclipsado como tópico de estudo nas licenciaturas em ciência económica:

uma breve consulta aos programas letivos e aos índices dos principais manuais

universitários da área basta para constatá-lo. Por seu turno os principais livros de texto

das áreas científicas do Direito, ao tratarem da Economia Imobiliária, também abraçaram

os conceitos neoclássicos ao equiparar rendas e juros, legitimando implicitamente o

tratamento do imobiliário como um ativo financeiro. Este tratamento equivocado do tema

fez desaparecer do debate político e por consequência da produção legislativa a

necessidade de regular o mercado imobiliário em função das especificidades que o

distinguem dos demais mercados (Bingre, 2011).

14 Cfr. Léon Walras, Théorie Mathématique du Prix des Terres et the leur rachat par l´État, 17 de novembre 1880.

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2.4.2. Mais-valias e o ciclo imobiliário

Os autores clássicos acreditavam que, os mercados concorrenciais e a propriedade privada

gerariam eficiência e produtividade, remunerando os produtores quando fossem de

encontro aos interesses dos consumidores. No entanto, o fator de produção terra tinha um

comportamento peculiar dado que independentemente do aumento da procura a sua oferta

não poderia aumentar. Sendo a capacidade da oferta limitada, a existência de um mercado

plenamente concorrencial estava, à partida, afastada (Lobo, 2011).

Face às incapacidades de se criar um mercado concorrencial, no mercado da propriedade

imobiliária, a ação reguladora do Estado é, mais do que justificada.

Numa das áreas mais sensíveis do governo público – a gestão da “polis” – a “política” no

seu sentido mais profundo, que deverá atuar numa ótica de produção de utilidades – o

planeamento e a construção de infraestruturas urbanas – e de redistribuição – distribuição

eficiente dos custos de infraestruturação e de manutenção bem como dos ganhos

decorrentes das opções de planeamento. De facto, e num modelo ótimo, o promotor (o

proprietário ou o investidor) deverá alcançar a margem de lucro unicamente por via da

eficiente aplicação de recursos produtivos na construção e não pela simples obtenção de

uma benesse de ultrapassagem de bloqueio monopolista – o licenciamento (Lobo, 2011).

O solo é espaço e não capital. O capital ocupa o espaço, mas não se confunde com ele.

Capital fixo ou imobilizado não representa solo. O capital pode ser amortizado; o solo

nunca é amortizado, na medida em não comporta custos de produção mas apenas despesas

de garantia dos direitos reais imobiliários, designadamente aquelas associadas à

manutenção de um aparelho jurídico-administrativo do Estado e sua defesa da

propriedade privada (Bingre, 2011). Foi devido a falta de intervenção por parte do Estado,

que se proporcionaram movimentos especulativos, que impediram a formulação de

decisões económicas ótimas.

Existem dois exemplos finais deste estado de coisas: o primeiro, mais estrondoso, decorre

precisamente da crise financeira de 2008, originada pelo rebentamento da “bolha

imobiliária”, insuflada artificialmente por via de uma prática de titularização desregulada,

que assentando no pressuposto (clássico) de valorização infinita do imobiliário, o aplicou

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de forma desadequada ao mundo da micro-finança, nomeadamente ao crédito hipotecário

de alto risco; o segundo, de base mais estrutural, resulta da tentativa hodierna de captura

de renda monopolísticas decorrentes do não desenvolvimento imobiliário dos centros

históricos tomando com base a expectativa especulativa de obtenção de ganhos

excedentários por via da transação onerosa da capacidade construtiva (Lobo, 2011).

No seguimento do segundo exemplo, assistiu-se passivamente nestas duas últimas

décadas, à captura da maior parte do investimento imobiliário por operações especulativas

sobre o solo, deixando relativamente pouco capital para o investimento na qualidade de

construção e na remuneração da mão-de-obra. Pelo contrário, o mercado fundiário das

décadas de cinquenta e sessenta estava fortemente tutelado por políticas de solos que

impediam a apropriação privada de mais-valias urbanísticas, foi maior a percentagem do

investimento imobiliário efetivamente dedicada a suportar custos de construção e

portanto a estimular a criação de empregos nesse sector (Bingre, 2011).

As mais-valias (windfall gains) beneficiam proprietários individualmente considerados,

embora os investimentos públicos tivessem sido efetuados à custa de toda a comunidade,

justificando-se, pois, uma socialização desses ganhos (socialização das exterioridades

positivas), por via da imposição de contribuições especiais (Lobo, 2011).

Em sentido inverso, quando os agentes privados causem custos reflexos em outros

agentes devido ao seu comportamento torna-se essencial a sua interiorização, de forma

que o custo privado marginal se equipare ao custo social marginal, eliminando-se

consequentemente a exterioridade negativa15. Tal justificaria, na ótica urbanística, que

um imóvel degradado sustentasse uma mais carga tributária mais elevada pois constitui

um fator de desvalorização na área em redor à da sua localização (Lobo, 2011).

Adicionalmente, agentes com acesso a informação privilegiada ou com influência nos

processos de decisão urbanística poderão atuar como “rent-seekers”, originando modelos

ineficientes de desenvolvimento urbano, onde o ganho económico resulta unicamente de

uma atividade especulativa sem conteúdo material para além da angariação da licença a

edificar (um ganho monopolista decorrente da ultrapassagem com sucesso da

15 Cfr. quanto às exterioridades ambientais cfr. Carlos Baptista Lobo, “Impostos Ambientais. Análise Jurídico Financeira” in Revista

Jurídica do Ambiente e Urbanismo, n..ºs 2 e 3, Almedina, 1994.

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regulamentação legal) ou do desenvolvimento artificial – mas rentável – de atuações de

simples expectativa especulativa, originando situações de enorme degradação nas zonas

históricas tradicionais (Lobo, 2011).

2.4.3. Isenção das mais-valias e crescimento urbano excessivo

Com a isenção das mais-valias, a expansão da malha edificada vai ocupando solos

periurbanos, a alça dos preços dos terrenos tende a expandir-se para zonas rurais. Nos

países onde não haja retenção pública de mais-valias urbanísticas, as expectativas de

revalorização da habitação são canalizadas para o mercado de solos rústicos, passando

estes a serem transacionados a preços que já incorporam eventuais ganhos “windfall

gains” resultantes de alterações aos planos de ordenamento do território (Bingre, 2011).

A administração pública tende a aumentar a sua despesa com encargos de urbanização,

gozando de empréstimos facilitados. Os decisores políticos acolhem com otimismo os

encargos inerentes à infraestruturação de novas urbanizações, sobretudo graças à descida

entretanto verificada nas taxas de juro dos empréstimos concedidos à administração

pública. No caso português, tal fenómeno permitiu às autarquias compensar por via do

crédito os défices causados pela insuficiente taxação dos encargos de urbanização

coletados aos promotores de novos empreendimentos (Bingre, 2011).

Instala-se a “ilusão dos promotores”, na qual os empresários da construção associam

equivocadamente o aumento do preço dos solos urbanizáveis a um eventual aumento dos

preços dos edifícios que neles podem ser construídos. Isto sucede porque a mera compra

feita ao loteador pelo promotor — o “passe de solo” permite o encaixe de mais-valias

urbanísticas, dando a este última a ilusão de que irá ele próprio lograr ganhos semelhantes

ao dar o “passe de edifícios”. Quando tal sucede durante a fase de crescimento da bolha

imobiliária, então de facto o construtor irá somar aos lucros próprios da construção

algumas mais-valias “windfall gains” (Bingre, 2011).

Instala-se a “ilusão dos remodeladores de imobiliário”. Um número crescente de

investidores amadores começa a dedicar-se ao negócio de comprar habitações, remodelá-

las, e revendê-las com encaixe de mais-valias, ignorando o facto de a maior percentagem

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dos ganhos assim conquistados resultaram da mera descida das taxas de juro e não de

serviços de remodelação (Bingre, 2011).

O aumento do número de remodeladores e especuladores, nenhum dos quais procura

efetivamente residência para si ou para arrendatários, faz desligar a procura de imóveis

dos seus fundamentos demográficos a longo prazo, e estimula a sobreprodução de novos

edifícios (Bingre, 2011).

A expectativa de encaixar mais-valias graças a alvarás de loteamento faz disparar os

pedidos de licenciamento dos mesmos, independentemente da racionalidade ambiental,

urbanística ou demográfica dessas intenções. O mercado de solos rústico passa a

incorporar as expectativas de valorização urbanística, cotando-se a preços inacessíveis

aos empresários agrícolas (Bingre, 2011). Desta forma a crise imobiliária é convertida em

crise financeira.

2.5. Instrumentos de planeamento

A ausência de um pensamento rigoroso, abrangente e sistematizador tem sido dissimulado

por somatórios de intervenções vistosas, muitas vezes desenquadradas, de discutível

qualidade urbanística e arquitetónica e reduzida competência construtiva.

O planeamento como um instrumento de organizacional, que se caracterizava pelas

metodologias do urbanismo e desenho urbano na gestão e uso do solo e por uma fortíssima

intervenção política, contribuí como peso na balança, de forma a garantir um equilíbrio

inerente entre as diferentes forças.

Caso a tendência de agravamento destes desequilíbrios a que se tem assistido não seja

travada é de se esperar a agudização da insatisfação generalizada das populações, mesmo

nos países em que os cenários de crise ainda não se fizeram sentir (Leitão, 2011).

Torna-se assim imperioso perceber os mecanismos atuais, que administração pública tem

para intervir no meio público, no sentido de promover a sustentabilidade nas zonas já

urbanizadas e nas futuras construções, dando resposta aos problemas a nível do ambiente,

social e económico.

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2.5.1. Processos de expropriação urbanística

Um dos instrumentos típicos de aquisição e disponibilização dos solos à Administração

e, por isso, um instrumento característico de política fundiária, são as expropriações por

utilidade pública. Para além do mais, as expropriações por utilidade pública são, entre

nós, de há muito, objeto de tratamento sistemático em códigos das expropriações, o que

diminui grandemente a importância do seu tratamento no âmbito de uma lei dos solos

(Oliveira, 2011).

Apesar do atual Código das Expropriações date, como o Regime Jurídico dos

Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), de 1999, estes dois diplomas legais não se

encontram articulados entre si, o que não deixa de ser um entrave a uma política de

ordenamento do território e de urbanismo que se pretenda eficaz (Oliveira, 2011).

O RJIGT, na parte dedicada à execução dos planos, sistemas de execução e mecanismos

de perequação compensatória, tenha criado condições que permitam, de certa forma,

contrariar o fenómeno da retenção dos solos com fins especulativos e promover a sua

disponibilização para fins públicos, este objetivos esbarram, na prática, com alguma

desarticulação com o Código das Expropriações a vários propósitos em que as

expropriações se relacionam com o fenómeno planificador (Oliveira, 2011).

Essa desarticulação ocorre em matéria de classificação dos solos, sendo diferente aquela

que vale para efeitos de planeamento da que tem relevo para efeitos do cálculo de

indemnização quando os mesmos solos são objeto de expropriação para a execução das

disposições dos planos, não existindo uma uniformidade de critérios a este propósito

(Oliveira, 2011).

Assim, de acordo com o RJIGT, os solos são classificados (Tabela 3), para efeitos da

definição do regime de uso dos solos, em urbanos e rurais, cada um deles integrando

diversas categorias. Já para efeitos do cálculo da indemnização por expropriação o Código

das Expropriações (Tabela 4) classifica-os em solo apto para construção e solo para outros

fins (Oliveira, 2011).

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Tabela 3 – Classificação e qualificação do solo nos Instrumentos de Gestão

Territorial

Classificação

(Artº 72º DL 380/99)

Solo …

… rural … urbano

Qualificação

(Artº 73 º DL

380/99)

Espaços …

… agrícolas

… florestais de produção

… florestais de conservação

… de exploração mineira

… de agroindústrias

… de indústrias silvícolas

… de indústrias de valorização de

produtos minerais

… naturais

… para infraestruturas não urbanas

… rurais de usos múltiplos

… urbanizados

… de urbanização

programada

… de estrutura ecológica

urbana

Fonte: Fernanda Oliveira, 2011

Tabela 4 – Classificação dos solos no Código das Expropriações

Classificação dos

solos para efeitos

de indemnização

por

expropriação

Solos aptos para construção Solos

para

outros

fins

- Solos dotados de certas infraestruturas urbanísticas

- Solos integrados em núcleo urbano

- Solo qualificado como área destinada a edificação e

urbanização em plano municipal de ordenamento do território

- Solo abrangido por alvará de loteamento ou de licença de

construção em vigor no momento da declaração da utilidade

pública, desde que o processo respetivo se tenha iniciado antes

da data da notificação da resolução de expropriar referida no

artigo 10.º do Código das Expropriações

Os

restantes

Fonte: Fernanda Oliveira, 2011.

Pode também suceder que um município, na sua tarefa de planeamento territorial, decida

destinar para zona verde e de lazer solos que, por natureza, isto é, dadas as suas

características objetivas, estão mais vocacionados para esses fins. Assim, sendo certo que

em causa poderão estar solos “afetos à estrutura ecológica necessários ao equilíbrio do

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sistema urbano”, o RJIGT, têm a qualificação de urbanos, desempenhando uma função

de melhoria da qualidade urbana da cidade em que se integram, não poderá, na avaliação

que deles for feita para efeitos indemnizatórios, deixar de se ter em consideração as suas

especiais características (designadamente a sua natural inaptidão edificatória) (Oliveira,

2011).

Denota-se, a necessidade de se proceder a uma revisão da legislação envolvida, de forma

a uniformizar conceitos em matéria de classificação de solos. É igualmente visível a falta

de articulação do Código das Expropriações com o RJIGT a outros propósitos que se

prendem, todos, com a avaliação dos terrenos para efeitos do cálculo da indemnização

por expropriação (Oliveira, 2011).

Igualmente óbvia é a falta de consideração, por parte do Código das Expropriações, sobre

a forma como deve ser feita a avaliação dos solos quando a expropriação funciona como

um instrumento de execução dos planos sempre não seja possível contar com a

colaboração dos proprietários ou quando os proprietários a possam exigir como única

forma de os seus terrenos serem disponibilizados para a execução de planos,

nomeadamente para concretização do reparcelamento preconizado em planos de

pormenor. De facto de uma leitura atenta do Código das Expropriadores fica-se com a

perceção de que o respetivo legislador desconhece toda a realidade do planeamento ⎯ isto

é, da sua execução, da perequação de benefícios e encargos, das expropriações do plano,

etc. ⎯ operando à margem de todas essas realidades (Oliveira, 2011).

Ou seja, não obstante exista uma inequívoca relação entre sistemas de execução e

expropriações, com a necessidade de se proceder à determinação de valores de avaliação

dos prédios em muitas das situações geradas pela execução programada e compensatória

de benefícios e encargos dos processos de urbanização, o RJIGT limita-se a formular uma

remissão genérica para o Código das Expropriações (Tabela 5), cujas disposições, por sua

vez, parecem não conhecer esta realidade, definindo regras que necessitam das “devidas

adaptações” nunca devidamente explicitadas. O que não poderá deixar de funcionar como

um entrave à eficaz execução dos planos municipais.

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Tabela 5 – Sistema ou Instrumento de Execução

Sistema ou Instrumento de

Execução Expropriação

Avaliação

(critérios)

Sistema de compensação

• Valorização prévia dos prédios

• Valorização final dos prédios

------------------

------------------

Sim (CE, com adaptações)

Sim (CE ou outros)

Sistema de cooperação Talvez Idem

Sistema de imposição administrativa Talvez/Sim Idem

Direito de preferência ------------------ Sim (CE, com adaptações)

Demolição de edifícios ------------------ Talvez

Expropriação Sim Sim (CE)

Reestruturação fundiária É possível Sim (CE)

Direito à expropriação

(regularização de estremas)

É possível Sim (CE)

Reparcelamento

• de iniciativa dos proprietários

• de iniciativa da Câmara Municipal

------------------

É possível

Sim (CE ou outros)

Sim (CE)

Dever de indemnização "Equivalente a" Sim (CE)

Fonte: Fernanda Oliveira, 2011.

Esta desarticulação, em especial no que concerne às diferentes formas de determinação

do valor dos prédios, pode ter como consequência, por exemplo, que o valor de um prédio

determinado pelo Código de Expropriações numa unidade de execução estabelecida em

plano municipal de ordenamento do território possa ser radicalmente diferente do valor

determinado em função dos mecanismos perequativos resultantes da ação planificadora

e, por maioria de razão, do valor estabelecido para efeitos fiscais (Oliveira, 2011).

Pode, porém, caber à Lei dos Solos um papel importante na articulação e harmonização

das várias classificações dos solos que valem para fins distintos: para efeitos do regime

dos solos a definir pelos planos; para fins de cálculo da indemnização por expropriação;

para efeitos fiscais e, até, para efeitos registais a que a maioria das operações de

intervenção no território devem estar sujeitas. Esta importante tarefa pode ser levada a

cabo em articulação com aquela outra, a que a Lei dos Solos deve proceder: de definição

do estatuto jurídico dos solos urbanos e rurais onde se integra a definição do conteúdo do

direito da propriedade do solo (Oliveira, 2011).

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Principalmente nos solos de urbanização programada, os planos municipais de

ordenamento do território, podem encontrar-se prédios rústicos, enquanto, em solos rurais

é possível encontrar prédios urbanos ou mistos (desde que neles tenha sido realizada uma

edificação admitida pelo plano).

Em todo o caso, se é certo que esta caracterização é distinta daquela que anima a temática

dos planos, não é indiferente a afetação que estes façam de um determinado terreno,

alterando as possibilidades da sua utilização, já que esta pode determinar uma alteração

não só da configuração como do estatuto dos prédios para efeitos registrais e mesmo

fiscais. Assim, caso num prédio rústico seja admitida, de acordo com as normas jus-

urbanísticas, a construção de um prédio com dois pisos, tal significa a transmutação da

natureza do mesmo que, de rústico, passará a urbano, com as consequentes alterações em

termos de registo (Oliveira, 2011).

Assim, a Lei dos Solos pode (deve) definir os princípios e os critérios (coordenadas) de

valoração dos solos aplicáveis em todas as situações (operações) em que tal valoração se

mostre necessária, designadamente (Oliveira, 2011):

I. Em matéria perequação compensatória e situações de determinação do valor dos

solos no quadro da execução do planeamento territorial;

II. No que concerne à fixação da justa indemnização nos casos de expropriação por

utilidade pública, qualquer que seja a respetiva finalidade (execução de planos ou

outra);

III. Na fixação do preço a pagar ao proprietário nos casos em que a lei venha a permitir,

como sucede no regime jurídico da reabilitação urbana, a venda forçada.

2.5.2. Venda forçada

A venda forçada é um ato sancionatório sobre “proprietários de prédios urbanos que não

cumpram os ónus e deveres” inerentes ao estatuto da propriedade. Esta figura da venda

forçada nada tem a ver com a expropriação por utilidade pública (Pardal, 2014).

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O desligamento absoluto entre a venda forçada e a expropriação é fundamental sob pena

do ónus da medida acabar por onerar o erário público. Na venda forçada, ao proprietário

assiste o direito de receber integralmente o valor realizado em hasta pública (Pardal,

2014).

O adquirente de prédios em hasta pública em venda forçada deve ter um prazo para

normalizar a situação do prédio sob pena de haver lugar a nova venda forçada, devendo

aqui o proprietário penalizado numa percentagem, não inferior a 20% do preço da

transação em nova venda forçada. Isto só será possível em articulação com o Código das

Expropriações sob pena de ter de envolver uma revisão constitucional (Pardal, 2014).

A venda forçada é menos lesiva da propriedade e mais resolvida do que o arrendamento

forçado. Em qualquer dos casos, está-se perante um ato sancionatório que deve ser

desligado da expropriação, a qual não é um ato sancionatório, pelo contrário, é um dos

alicerces da defesa e salvaguarda da propriedade privada. A Constituição, na sua versão

atual, não dá enquadramento à venda forçada nem ao arrendamento forçado, pelo que a

aplicação destes regimes sancionatórios acaba por remeter para a expropriação,

estabelecendo uma contradição onde prevalece o direito à expropriação com elevado risco

para a entidade pública que recorra à venda forçada. A confusão é grande e arriscada para

os Municípios e outras entidades públicas que se venham a confrontar com a obrigação

de pagar a justa indemnização determinada judicialmente, num processo de expropriação

(Pardal, 2014).

Para haver lugar à venda forçada terá, também, de ser definido o conceito de valor

correspondente – valor de venda forçada – de modo a salvaguardar condições que

garantam que o preço da transação se posicione numa banda aceitável. Seria muito grave

que a venda forçada viesse a provocar fenómenos deflacionistas nos valores de mercado.

Há que ter, sempre aqui, em consideração um valor justo (Pardal, 2014).

O conceito de expropriação vigente no Direito português pressupõe sempre a utilidade

pública, em nome da qual se vai sacrificar a propriedade privada, compensando o

proprietário com uma justa indemnização (Pardal, 2014).

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45

A venda forçada não tem que invocar o interesse público, na medida em que a utilização

física do prédio em causa se confronta, de forma irresolúvel, com a propriedade privada,

convocando por isso o direito à justa indemnização. A venda forçada justifica-se tão-só

pelo facto do prédio em causa se encontrar num estado de degradação e de abandono,

gerador de externalidades negativas que prejudicam os vizinhos e a imagem urbana, e não

respeitam a função social e o sentido útil da propriedade imobiliária. Estamos perante um

ato de desleixo que justifica uma intervenção do Estado no sentido de normalizar um

comportamento de correto tratamento de um bem que, sendo privado, tem de respeitar

relações de enquadramento, de segurança e de racionalidade do sistema socioterritorial

(Pardal, 2014).

Enquanto a expropriação é um direito que assiste à propriedade, como garante de

salvaguarda das suas prerrogativas, a venda forçada, pelo contrário, configura-se como

um ato sancionatório sobre proprietários incumpridores (Pardal, 2014).

A venda forçada só pode ser assumida como um ato sancionatório sobre proprietários

incumpridores e deve explicitar que na sua primeira aplicação a um determinado prédio

(1.ª venda forçada), o montante realizado em hasta pública é razoável que seja

integralmente entregue ao proprietário incumpridor (Pardal, 2014).

No caso de não cumprir as obras de reabilitação dentro desses prazos, proceder-se-ia a

uma segunda venda forçada em hasta pública havendo, aqui, razão para uma penalização

que consistiria em este proprietário receber apenas uma parte do montante, revertendo a

outra parte a favor do Município (Pardal, 2014).

Colocar o direito à expropriação como complemento da venda forçada, mais que uma

contradição, é um absurdo, na medida em que se começa por um ato sancionatório que

culmina na atribuição de um prémio de justa indemnização (Pardal, 2014).

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46

A título especulativo, poderia o legislador desdobrar o conceito de expropriação em dois

vetores:

I. Expropriação por utilidade pública — Nesta sede, deveria ser claramente

explicitado que o direito de urbanizar não é uma prerrogativa da propriedade privada

e, consequentemente, que os proprietários de terrenos rústicos eventualmente

urbanizáveis não beneficiem das mais-valias simples, em sede de expropriação. Para

que tal seja instituído de uma forma justa, a urbanização deveria passar a ser uma

competência exclusivamente pública, à semelhança do que vigorou entre 1934 e 1965.

II. Expropriação por incumprimento dos deveres do proprietário em matéria de

normal conservação objetivamente comprovado pelo estado de degradação do

prédio — neste caso, a lei deveria confinar o procedimento à venda forçada em hasta

pública, explicitando que o proprietário em causa apenas tem direito ao montante

realizado nessa hasta pública. Deveriam aqui ser ponderadas e contextualizadas as

diferenças de responsabilidade entre o proprietário da primeira venda forçada e as

responsabilidades de proprietários de posteriores vendas forçadas sobre o mesmo

prédio, considerando que nas segundas vendas forçadas os proprietários devem ser

confrontados com um acréscimo de responsabilidades, assumidas no ato da licitação e

aquisição em hasta pública de venda forçada. Obviamente que aqui a lei deve ser

perentória a dizer que não há lugar a qualquer recurso ou indemnização.

2.5.3. Regeneração urbana sustentável

O desenvolvimento sustentável não deve ser apresentado como um slogan político ou

uma alavanca para garantir contrapartidas. Pelo contrário, o desenvolvimento social e

humano como capacidade de suporte ambiental deverá constituir uma prioridade para as

cidades. É, nesta medida, fundamental encontrar soluções alternativas que permitam gerar

o equilíbrio na forma de habitar das populações e desenvolver uma gestão de recursos

mais eficiente.

A análise das necessidades atuais aponta para uma linha de intervenção que passe não

pela construção de grandes infraestruturas, mas, ao invés, pela reabilitação das já

existentes, sob o propósito de melhorar a sua eficiência, dar-lhes novos usos e delinear

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47

um caminho (mais) sustentável a nível ambiental, social e económico (Construção

Sustentável, 2012).

No âmbito do desenvolvimento de políticas multidimensionais, importa promover os três

pilares de forma consentânea, tendo em conta que não existem uns mais importantes do

que outros. Ao invés, existem tão-só medidas em cada pilar que têm pesos diferentes.

Percebendo que os pilares se conjugam em três principais postulados:

Não existe economia sem recursos;

Boa gestão de recursos sem justiça social;

Sociedade sem economia.

No âmbito da Agenda 21, a Comissão Europeia publicou, em 2001, a Estratégia da UE para

o Desenvolvimento Sustentável (EDS), propondo medidas para diminuir as diferenças

sociais, atenuar as alterações climáticas e promover ambientes mais saudáveis. Portugal

definiu, em 2002, a sua Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável (ENDS),

baseada nos objetivos da EDS, e muito semelhante aos da Estratégia de Lisboa, de 2000. Os

objetivos da Estratégia de Lisboa consistiam na ampliação da visão de sustentabilidade,

juntamente com a prosperidade económica, justiça e coesão social, proteção ambiental e

promoção da responsabilidade a nível internacional (Castanheira, 2013).

Durante a reunião das Autoridades Locais Europeias na Conferência “Inspirando o Futuro

– Aalborg+10”, de 2004, confirmou-se a perspetiva comum de um futuro sustentável para

as comunidades, através dos Compromissos de Aalborg (Tabela 6). As autoridades

compreenderam o seu papel fulcral em assegurar o desenvolvimento sustentável,

exigindo a adoção de abordagens mais enérgicas e integradas nas políticas locais,

compatibilizando os objetivos ambientais, sociais e económicos (Castanheira, 2013).

Tabela 6 – 10 Compromissos de Aalborg (UE, 2004) Os Compromissos de Aalborg

1. Governança 6. Melhor Mobilidade, Menos Tráfego

2. Gestão Local para a Sustentabilidade 7. Ação Local para a Saúde

3. Bens Comuns Naturais 8. Economia Local Dinâmica e Sustentável

4. Consumo Responsável e Opções de Estilo

de Vida

9. Equidade e Justiça Social

5. Planeamento e Desenho Urbano 10. Do Local para o Global

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48

Mais recentemente, em 2007, é elaborada a Carta de Leipzig sobre as Cidades Sustentáveis.

Nesta carta, os Estados Membros da UE definiram, pela primeira vez, que o modelo ideal de

cidade para a Europa do século XXI é o modelo sustentável, reconhecendo, também, o valioso

contributo dos compromissos de Aalborg para uma ação estratégica a nível local. No

documento são acordadas recomendações (Tabela 7) para elaboração de estratégias comuns

para uma política urbana direcionada para o desenvolvimento sustentável (Rocha, 2009).

Tabela 7 – Recomendações da Carta de Leipzig sobre as Cidades

Sustentáveis (UE, 2007)

Recomendações

1. Maior recurso a abordagens de políticas de desenvolvimento urbano integrado - elaboração

de programas de desenvolvimento urbano integrado para as cidades no seu conjunto.

Criação e preservação de espaços públicos de qualidade;

Modernização das redes de infraestruturas e melhoria da eficiência energética;

Políticas ativas em matéria de inovação e educação.

2. Atenção particular aos bairros carenciados no contexto da cidade - coesão social e integração

nas cidades e nas zonas urbanas.

Prosseguir estratégias para melhorar o ambiente físico;

Reforçar a economia local e a política local de mercado de trabalho;

Adotar políticas ativas em matéria de educação e de formação de crianças e jovens;

Promover transportes urbanos eficientes e a preços razoáveis

Nesta medida, é indubitável que o desenvolvimento sustentável começa a exercer uma

importância significativa no desenvolvimento urbanístico. Os inúmeros documentos

inframencionados demonstram a preocupação das autoridades mundiais com a promoção

do desenvolvimento sustentável. Deste modo, a regeneração urbana de cidades

portuguesas e as suas estratégias de intervenção devem ir de encontro aos conceitos do

desenvolvimento sustentável, devendo também seguir os passos do planeamento urbano

sustentável (Castanheira, 2013).

Para chegar as soluções ideais, haverá um processo de iteração (Figura 5), que pretende

direcionar para soluções ou estratégias mais pragmáticas, que sejam capazes de

concretizar os três pilares em simultâneo. Atingindo assim, uma regeneração urbana

sustentável.

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Figura 13 – Caminho para a renovação urbana sustentável (H.W. Zheng et al.,

2013)

2.5.4. Regime de reabilitação urbana

Uma política de solos que permita uma qualificação de uma determinada localização,

pode ter ainda, um importante relevo na definição do modelo de gestão urbanística a

adotar.

A gestão urbanística corresponde, grosso modo, ao conjunto das atividades relacionadas

com a concreta ocupação, uso e transformação dos solos, quer sejam realizadas

diretamente pela Administração Pública, quer pelos particulares sob a direção, promoção,

coordenação ou controlo daquela (Correia, 2012).

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50

Os mais relevantes atos que se reconduzem a este tipo de gestão (atos administrativos de

gestão urbanística) são os que se encontram regulados no Regime Jurídico de

Urbanização e Edificação (RJUE). Também aí, se enquadram atos relativos a operações

em que a iniciativa pertence a entidades públicas, designadamente, aos municípios, já

que, por vezes, a intervenção urbanística nos solos é promovida pela própria

Administração mediante a realização de obras de urbanização, construção de

equipamentos coletivos, construção de habitação social e económica, etc., necessitando,

para o efeito, de desencadear os competentes procedimentos de apreciação prévia dos

respetivos projetos (Oliveira, 2011).

Uma lógica mais recente de gestão urbanística, a que já fizemos referência, aponta para

um papel mais ativo dos municípios, que passam a programar e a coordenar as várias

intervenções no território, assumindo a este propósito especial relevância as formas

referidas de execução sistemática dos planos por intermédio da delimitação de unidades

de execução (Oliveira, 2011).

É necessário escolher, uma programação pública das intervenções a efetuar, para a

delimitação de áreas que apontem para intervenções integradas. Deste modo, a

reabilitação urbana, posiciona-se também como uma via para contrariar o modelo de

desenvolvimento urbanístico assente na expansão urbana permitindo a consolidação e

ocupação do já edificado integradamente com a intervenção em espaços expectantes

dentro das cidades (Oliveira, 2011).

Assim, muito embora o RJIGT e o RJUE tenham sido elaborados em simultâneo, parecem

desarticulados entre si quanto ao modelo de gestão urbanística para que apontam,

permitindo o RJUE, um tipo de gestão assistemática, que o RJIGT parece impedir, ao

impor como forma de execução dos planos e operações urbanísticas a execução

sistemática (Oliveira, 2011).

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51

Esta articulação deve, a nosso ver, ser feita estabelecendo uma relação entre o modelo de

gestão a mobilizar e as categorias do solo urbano que estão em causa ⎯ devendo, por isso,

esta questão ser tratada a propósito do estatuto jurídico dos distintos tipos de solo ⎯ a qual

pode ser feita nos seguintes termos:

Solos urbanizados (bem) consolidados;

Solos urbanizados a consolidar (colmatar);

Solos urbanizados (mal ou deficientemente) consolidados;

Zonas (solos) de urbanização programada (zonas urbanizáveis).

2.5.5. Recuperação das mais-valias e intervenção pública

Outro dos temas centrais do direito dos solos prende-se com as questões das mais-valias

decorrentes dos processos de planeamento e ordenamento do território e com os

mecanismos de intervenção da Administração no mercado dos solos. A desigualdade é

inerente ao planeamento, faz parte da sua essência: os planos atribulem diferentes

capacidades de utilização a terrenos com condições similares criando, deste modo, fortes

desigualdades no que respeita à evolução das respetivas rendas fundiárias (Oliveira,

2011).

O RJIGT, ao determinar que um dos objetivos da perequação é a “redistribuição das mais-

valias atribuídas pelo plano aos particulares”, parece admitir que os proprietários têm o

direito a “encaixar” nos seus patrimónios, todas as mais-valias geradas pelos processos

de ordenamento do território e urbanismo (Oliveira, 2011).

Ora, um sistema de gestão territorial que se pretenda eficaz não se poderá ficar por aqui:

numa ótica de financiamento da cidade e de equidade social, deve determinar que uma

parte da renda fundiária gerada pela decisão pública deve ser apropriada (adquirida) pela

Administração, apenas a restante renda fundiária deverá ser distribuída entre os

proprietários por intermédio dos mecanismos de perequação (Oliveira, 2011).

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Por isso, se afirma, que uma eficaz política de ordenamento do território depende da

existência de instrumentos de política fundiária que permitam a recuperação das mais-

valias geradas pela atuação pública (Oliveira, 2011).

2.6. Análise comparativa entre países europeus

Este subcapítulo, contém a recolha e a identificação das soluções normativas de direito

de solo em vigor em 6 países europeus. O atual subcapítulo é uma síntese do relatório da

Análise comparativa das Leis de Solos de Países Europeus, que foi elaborado no âmbito

do projeto de preparação da Lei do Solo. Devido a extensão do mesmo e se tratar de uma

pesquisa de direito comparado, o atual subcapítulo vai ser constituído e organizado em 4

temas:

Função Social e estatuto da propriedade do solo

Execução urbanística

Intervenção da Administração Pública no mercado de solos

Tributação

2.6.1. Função social e estatuto da propriedade do solo

2.6.1.1. Função social e natureza do estatuto da propriedade

Em todos os ordenamentos jurídicos analisados o direito de propriedade não se assume

como um direito absoluto, um direito sem limites, outrossim encontra-se sujeito a limites

funcionalizados para atender ao interesse público. Em todos os casos, a função social da

propriedade assenta no reconhecimento de que o interesse geral da coletividade se

sobrepõe ao do proprietário do solo, impondo limitações ao pleno exercício do direito de

propriedade, sem que, por um lado, de tal decorra para o particular o direito a ser

indemnizado e obrigando, por outro, à partilha das mais-valias urbanísticas com a

coletividade.

Não obstante, o exato alcance e amplitude da função social do direito de propriedade é

variável e radica substancialmente nas especificidades geográficas (Holanda), históricas

ou culturais (Inglaterra) de cada ordenamento. Em Itália esta é uma questão sensível,

sobretudo no que concerne às decorrências da função social da propriedade como

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fundamento de redução do valor indemnizatório, bem como da imposição de

condicionantes ao direito de propriedade que não devam ser ressarcidas. Na Alemanha,

a possibilidade da Administração emitir injunções destinadas a garantir a execução pelos

particulares das prescrições do plano assume-se também como uma expressão da função

social da propriedade.

Constata-se, ainda, que o direito de propriedade, sendo tradicionalmente de natureza civil,

encontra-se enquadrado e o seu exercício limitado pelo direito administrativo.

2.6.1.2. Oneração da propriedade por motivos de interesse público e direito à

indemnização

Em todos os ordenamentos analisados se verifica a existência de condicionantes que

oneram a propriedade privada por motivos de interesse público, como expressão da

função social da propriedade, contemplando-se como regra geral a obrigação de

indemnizar quando as limitações forem excessivas, designadamente quando existam

direitos adquiridos ou o sacrifício exceda as limitações inerentes à função social da

propriedade ou resulte em preterição do princípio da igualdade perante os encargos

públicos (dano especial e anormal).

Em França, o valor da indemnização é calculado nos termos gerais devendo ser subtraída

a mais-valia de que os imóveis beneficiem por execução do instrumento de planeamento.

Na Itália, só as medidas que não devam ser suportadas pelo proprietário no contexto da

função social da sua propriedade devem ser objeto de indemnização, mas quando esta

existe deve garantir um serio ristauro. A indemnização por sacrifício resultante do

planeamento urbanístico deve ser proporcional ao dano efetivamente produzido e o seu

modo de cálculo deve constar do próprio plano.

Na Holanda, o valor da indemnização integra o dano patrimonial de capital (redução do

valor da propriedade) e o dano com a cessação de rendimento, suportando o lesado uma

“franquia” de 2% do rendimento que deixou de auferir por ocorrência do dano ou do valor

de depreciação da propriedade. De realçar que não existe lugar à indemnização se a

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compensação for atribuída de outro modo, facultando a utilização de procedimentos

perequativos.

Na Espanha, a privação do direito de edificar pode dar azo a indemnização

(indemnização pelo sacrifício) nas circunstâncias previstas na lei e desde que não seja

possível compensar o particular através dos mecanismos de perequação.

Na Alemanha a indemnização pelos danos sofridos em consequência das opções do plano

encontra-se expressamente prevista, tendo o particular direito a indemnização face à

afetação do solo para usos públicos bem como quando seja alterado o zonamento previsto

em plano, sempre que tal se traduza na alteração de zonamento de uso privado para uso

público. Neste caso, a indemnização corresponde à diferença entre o valor de uso

permitido e o novo valor decorrente do uso público do solo.

Por outro lado, quando o plano proceda à alteração de uso privado para um uso público,

se o particular não tiver concretizado o uso inicial, ainda que não tenha decorrido este

período de 7 anos, a indemnização não é substancialmente reduzida, sendo usual a

aquisição do bem pelo município.

Em Inglaterra, as limitações ao direito de propriedade decorrem do interesse público

concreto, como é o caso da realização de obras públicas, suscetíveis de indemnização.

Neste caso a indemnização resulta da redução do valor do terreno causada pela atividade

de construção das obras ou pelo uso subsequente à execução de tais obras, especificando

a lei os fatores físicos que podem depreciar a propriedade e dar azo a indemnização (ruído,

vibração, emissão de gases etc.).

Também pode existir indemnização por revogação ou alteração do planning permission,

a determinar em função dos custos tidos com os trabalhos, perdas e danos diretamente

resultantes de tal decisão, e indemnização por depreciação do valor do terreno resultante

de decisões de planeamento que afetem direitos de particulares.

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55

2.6.1.3. Sistemas de compensações ambientais

A análise efetuada permitiu apurar a existência de sistemas perequativos à escala local e

à escala alargada, como expressão do princípio da equidade e coesão social, bem como

alguns sistemas de compensação decorrentes de ações tendentes à proteção ambiental.

Na Itália, no caso concreto da Região da Lombardia, o Plano Territorial Regional

determina as formas de compensação económico-financeiras a favor das entidades locais

sujeitas a limitações de desenvolvimento bem como modalidades de compensação

ambiental e energética pelas intervenções que determinam impactos relevantes no

território.

Na Holanda, onde as questões ambientais assumem uma maior acuidade atenta a sua

situação geográfica, merece destaque o fenómeno das compensações red-for-green, no

contexto das quais se compensa a cedência de solo para fins ambientais mediante a

atribuição de terrenos edificáveis aos proprietários lesados ou pela qualificação de certos

terrenos como tal.

Por outro lado a legislação relativa à utilização do solo para fins agrícolas, prevê no que

concerne à requalificação da propriedade agrária, a existência de cedências e permutas

destinadas a compensar os proprietários pela delimitação de corredores ecológicos, bem

como para efeitos de reparcelamento da propriedade agrária em geral.

Na Alemanha a lei prevê a existência de mecanismos de perequação compensatória

relativa à conservação da natureza e da paisagem, nomeadamente o regime do Ökokonto

(conta ecológica), que simplifica o regime das compensações ecológicas a que se deva

proceder.

2.6.1.4. Forma e efeitos da classificação do solo, competência, nível de discricionariedade

Com exceção do caso de Espanha, nos demais ordenamentos analisados, a situação de

base do solo não influencia o estatuto jurídico-económico do direito de propriedade. Em

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56

todos os casos, os usos abstratamente admissíveis resultam do zonamento e/ou da

qualificação do solo.

Em todos os sistemas existe um sistema de planeamento com vários níveis, em função da

organização territorial de cada país, que inclui planos de carácter estratégico e planos de

maior densificação, vinculativos para os particulares. Realce merece o caso de Inglaterra

onde, o direito do solo assenta em fontes diversas e os planos têm carácter meramente

orientador.

Na França não existe distinção entre classificação e qualificação do solo - a zonage

réglementaire identifica os usos urbanos admissíveis no âmbito de operações

urbanísticas, estando em regra proibida a construção nas demais zonas. Os Schema de

Coherence Territoriale (SCOT), que não definem a classificação do solo mas são

importantes instrumentos de conceção e de planeamento estratégico municipal ou

intermunicipal, referenciais para as diferentes políticas sectoriais municipais e que têm

um prazo de vigência de 10 anos.

Na Itália, a definição formal do estatuto subjetivo da propriedade não existe. A

competência para a aprovação destes planos é municipal mas a Região pode, a título

excecional e em substituição do município que por inércia não aprove instrumentos de

planeamento, assumir ela própria essa tarefa.

No sistema italiano, cada região trata a qualificação do solo de forma diversa,

constatando-se significativas diferenças entre elas. Na Toscana o Piani Regolatore

Generale tem um prazo de validade de 5 anos, findo o qual caduca.

Na Holanda, onde as urbanizações de iniciativa privada são uma realidade recente, a

classificação dos solos destina-se apenas a disciplinar a sua utilização, não produzindo

quaisquer efeitos ao nível do regime jurídico da propriedade. Atentas as condições

geográficas deste país e a prática de agricultura intensiva que aí ocorre, existe um regime

especial para o solo rural, sendo de realçar que historicamente se chegou a registar uma

diferença muito pequena entre o valor dos terrenos destinados à agricultura e dos terrenos

urbanos. Compete aos municípios regulamentar o uso e qualificação do solo, mediante a

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aprovação de planos, bem como regulamentar a gestão do solo nas áreas que não são

objeto de instrumentos de planeamento.

Em Espanha, a classificação de solo rural e solo urbanizado é determinante para a

definição do regime jurídico fundiário, desde logo porquanto envolve um regime de

utilização próprio para cada classe de solo, bem como a aplicação de regras específicas

para a valoração de cada um. O solo urbanizado implica a existência de urbanização

concluída ou a sua integração de forma real e efetiva na rede urbana, dotado dos

correspondentes serviços. As demais situações integram o solo rural.

Subsiste no ordenamento espanhol a distinção do solo em urbano, urbanizável e não

urbanizável mas esta distinção não produz efeitos autónomos uma vez que é através da

classificação de base do solo (ora denominada situação de base do solo, por razões de

prudência legislativa que se prendem com a repartição de competências entre o Estado e

as Comunidades Autónomas,) que se determina os usos possíveis, dentro dos limites do

seu estatuto, bem como a intensidade de usos e a tipologia de construção.

Compete aos municípios proceder à classificação e qualificação do solo. De acordo com

a Lei do Solo a transformação do solo deve ser efetuada em função da ponderação dos

interesses económicos, sociais e ambientais subjacentes e só pode reclassificar-se como

urbano o solo necessário. O restante solo rural deve ser preservado, principio que

enquadra o grau de flexibilidade na classificação do solo.

Na Alemanha a classificação do solo tem efeitos no jus aedificandi apenas na medida em

que limita e condiciona o seu exercício, integrando três categorias: solo abrangido por

plano municipal vinculativo (Bebauungsplan - BbP), solo urbano sem tal plano e solo

rural. O grau de densificação da legislação urbanística alemã impõe múltiplas

condicionantes à elaboração dos planos, encontrando-se já definidos no Regulamento

Federal de Construção (BauNVO), com grande detalhe, os usos admissíveis e os não

admissíveis bem como os limites à intensidade de uso, regras que consubstanciam o

estatuto jurídico objetivo dos terrenos, por efeitos da sua classificação no plano

municipal, ou mesmo na sua ausência, por aplicação direta do direito da construção.

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Na Inglaterra não existe uma classificação do solo que defina o estatuto subjetivo da

propriedade. A noção de regra urbanística oponível a terceiros é substituída pelo conceito

de development, desenvolvendo-se a atividade urbanística em torno das pretensões de

development do solo e do uso que nele vinha sendo exercido, que culmina com o planning

permission.

O sistema inglês apresenta um elevado grau de centralização no Governo e nas Regiões,

em matéria urbanística. Estes poderes serão substancialmente reduzidos, se for aprovada

a Localism Bill, proposta de lei ainda em análise, que introduz também novas formas de

planeamento assentes no âmbito local.

2.6.2. Execução urbanística

2.6.2.1. Programação e iniciativa da execução

O papel que a Administração Pública assume enquanto agente no desenvolvimento

urbano e os modos de participação e iniciativa dos particulares na execução urbanística

são aspetos determinantes em cada sistema de gestão territorial para a caracterização dos

níveis de programação, dos tipos de instrumentos e dos modos de relacionamento e

contratualização entre os agentes públicos e privados.

O sistema francês contém dois instrumentos centrais de execução urbanística, que se

distinguem tanto no que respeita à iniciativa, como ao âmbito e conteúdo da atuação: a

Zone d’Aménagemente Concerté (ZAC) e o lotissement.

A ZAC tem como objetivo infraestruturar e equipar uma determinada área,

compreendendo o zonamento e normas urbanísticas de detalhe, o programa de

equipamentos públicos e o balanço financeiro da operação.

O lotissement constitui o instrumento de execução de iniciativa privada, limitando a sua

esfera de atuação à divisão fundiária e à infraestruturação mínima necessária para a

viabilização da edificação nos lotes a constituir.

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Relativamente aos loteamentos, a lei estabelece algumas garantias gerais para a sua

adequada execução, nomeadamente, e para além da possibilidade de caducidade da

licença por incumprimento das obrigações, a interdição de transações de lotes antes da

execução completa da infraestruturação e da verificação das prescrições impostas pela

Administração, exceto quando existam garantias financeiras para conclusão dos

trabalhos. A Administração Pública pode, decorridos 5 anos após a conclusão da

operação, alterar as regras de edificabilidade fixadas na operação de loteamento,

dispositivo que lhe permite manter um desejável nível de discricionariedade para o futuro

e, simultaneamente, incentivar o adquirente do lote à imediata construção.

Em Itália, a Administração deve atuar como agente impulsionador do desenvolvimento

urbano mediante a elaboração dos seus programas plurianuais de atuação que, com uma

vigência entre 3 e 5 anos, estabelecem a programação municipal da urbanização e de

coordenação das operações no território, definindo as prioridades de execução das

grandes infraestruturas e a execução temporal do desenvolvimento urbano.

Os instrumentos de planeamento da execução por iniciativa privada são os lottizzazione,

sujeitos à aprovação municipal, sobre os quais são instituídas convenzione edilizia,

contratos entre as entidades pública e privada nos quais se definem as cedências, os custos

assumidos pelos particulares nas obras de infraestruturação e equipamentos e eventuais

compensações perequativas.

Os promotores não proprietários podem ainda promover a execução e vir a beneficiar das

expropriações que a Administração Pública fará a seu favor, sendo que nestes casos

suportam os custos da expropriação, realizada com recurso ao valor de mercado, a menos

que se fundamente diretamente na prossecução da função social da propriedade, o que

justifica a redução do valor da expropriação, pese embora a Europeu dos Direitos do

Homem a esta prática oposição reiterada do Tribunal.

Os projetos de loteamento devem ser executados num prazo máximo de 10 anos, sob pena

de caducarem e o incumprimento das obrigações determinadas pela convenzione ediliza

poderá ser merecedora de sanções penais, administrativas ou outras acessórias.

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60

Na Holanda historicamente a programação e a execução urbanística foram conduzidas

exclusivamente pelo município, que procedia à elaboração do plano de pormenor (o

Bestemmingsplan, único plano municipal vinculativo no ordenamento holandês), à

compra dos terrenos aos proprietários, à sua infraestruturação e posterior venda ou

concessão das parcelas, com particular destaque para as associações de habitação com

vista à prossecução das políticas sociais de habitação (atualmente maioritariamente

privatizadas). Na sequência do 4.º Relatório Extra de Planeamento Nacional de 1990,

reforçado pela revisão da Lei do Planeamento Territorial em 2008, a execução urbanística

foi amplamente aberta à iniciativa particular e os municípios passaram a recorrer cada

vez mais à colaboração dos particulares, mediante parcerias público-privadas suportadas

por contratos de desenvolvimento fundiário.

Entre as alternativas de colaboração com os privados, conta-se a concessão integral das

tarefas de urbanização aos privados, a participação destes com os municípios numa

empresa de capital misto, ou a concessão dos edifícios após a sua construção pelos

municípios aos privados. Ainda, se pode recorrer a um mecanismo de permuta de solo

por direitos de construção, através do qual o proprietário vende o solo ao município em

troca de um valor pecuniário (frequentemente abaixo do valor pelo qual o adquiriu)

acrescido de direitos de edificação e sob obrigação de aquisição de lotes após a conclusão

da urbanização realizada pelo município.

Em Espanha, a regulamentação da programação e da execução dos planos é competência

autonómica, pelo que pode variar de acordo com a legislação de ordenamento do território

e urbanismo de cada comunidade autónoma.

Relativamente à execução urbanística, a Administração Pública pode assumir distintos

papéis, mediante um conjunto diversificado de sistemas de execução. O município pode

expropriar ou utilizar os seus próprios terrenos para, sujeitar a execução a concurso

público para seleção do agente urbanizador privado para executar a infraestruturação e a

edificação. Neste sistema, compete aos proprietários suportar os encargos da urbanização,

designadamente mediante a consignação de parcelas urbanizadas após o reparcelamento

dos terrenos afetados. De forma direta, o município pode efetuar a gestão do seu

património público de solo para a prossecução de determinados fins sociais.

Page 91: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

61

A definição de prazos e regimes de caducidade e de condições para a execução urbanística

tem sido robustecida na regulamentação autonómica, bem como o recurso a mecanismos

de expropriação e venda forçosa dos terrenos que não tenham sido objeto de atempada

urbanização, com a admissão de terceiros não proprietários para conclusão da execução.

Estes mecanismos reportam aliás, não apenas à urbanização, como também à edificação,

porquanto no ordenamento espanhol emana a noção de integração destas duas tarefas na

programação e execução urbanística, dissociadas no direito de propriedade dos solos.

Em Inglaterra, a Administração Pública atua predominantemente como entidade

reguladora numa execução urbanística promovida essencialmente pelos particulares.

Cada proposta de desenvolvimento urbanístico é analisada pelo seu mérito concreto, com

base em instrumentos e orientações não vinculativas e sem recurso a parâmetros fixos

estabelecidos. A autoridade de planeamento negoceia com o particular e contratualiza as

obrigações de interesse público e de vizinhança que o mesmo deve cumprir na execução

da operação (planning obligations). As obrigações de vizinhança prendem-se com as

características e especificidades próprias do bairro em que se insere o development em

questão, nomeadamente a nível da respetiva tipologia, ou a traços arquitetónicos

específicos. A Administração pode ainda atuar como impulsionadora da execução,

mediante a adoção de instrumentos especiais, tais como as enterprise zone schemes ou as

simplified zone schemes, que conformam vantagens incentivadoras para a promoção

privada.

As licenças obtidas pelos particulares têm um prazo geral de validade de 3 anos, que pode

ser superior ou inferior, sendo distinto consoante se tratem de outros instrumentos, tais

como as enterprise zone schemes.

Na Alemanha, o sistema de planeamento urbanístico integra dois tipos de planos: o

Fachennutzungsplan (FP), plano estratégico e não vinculativo dos particulares, que

abrange a totalidade do município e enquadra a programação urbanística e o

Bebauungsplan (BdP), vinculativo e diretamente oponível aos particulares, que se ancora

no anterior e estabelece as especificações relativas à execução urbanística para partes

delimitadas do território municipal.

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62

O sistema alemão distingue claramente a execução das infraestruturas urbanísticas, da

exclusiva responsabilidade pública, da promoção das restantes operações urbanísticas, de

natureza eminentemente privada. Toda a infraestruturação e dotação de equipamentos

públicos deve ser enquadrada em BdP eficaz ou em plano específico de projetos e

infraestruturas, o Vorhaben und Erchließungsplan (VE-plan), pelo que a promoção

privada se quedará limitada a área abrangidas por BdP ou em áreas que, não o estando,

sejam providas das infraestruturas públicas necessárias e que suportem a sobrecarga

prevista e desde que o projeto se enquadre nos usos e tipologias dominantes da área.

Como referido, o principal agente da execução dos planos é a Administração Pública, na

medida em que ela é responsável pela execução das infraestruturas públicas, limitando-

se os privados à produção da edificação privada sob o controlo da Administração. Pode

esta no entanto celebrar com os proprietários um contrato de desenvolvimento para a

elaboração e execução do BdP e com promotores contrato para construção de

infraestruturas e equipamentos no âmbito de um VE-plan.

Numa área que passe a estar abrangida por um BdP, o particular dispõe de 7 anos para

promover as operações urbanísticas permitidas, sendo que findo tal período, o imóvel

ficará adstrito ao seu uso atual e o município poderá livremente alterar as regras

urbanísticas sem que haja direito a indemnização, desde que o uso previsto seja

compatível com o existente. No âmbito de operações de reabilitação urbana, o município

pode ainda substituir o proprietário na execução das medidas de edificação previstas.

2.6.2.2. Financiamento da urbanização

Nos sistemas analisados, vigora o princípio pelo qual a urbanização não deve acarretar

encargos para o município e de que os custos devem ser repercutidos nos beneficiários da

mesma, sendo comum o recurso à negociação e a contratualização dos deveres e encargos

com os particulares em acordos que enquadram o licenciamento para a execução

urbanística. No entanto, o ressarcimento direto dos custos por execução de iniciativa

pública configura-se mais difícil, tanto no imediato como no longo prazo, ressalvando-se

as soluções encontradas nos sistemas espanhol e holandês para ultrapassar esta questão.

Em França deve ter-se presente a distinção entre a infraestrutura básica necessária à

viabilização da edificação nos lotes constituídos, integrada no conceito de voirie et

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réseaux divers (VRD), que o agente loteador deve assegurar e suportar integralmente, e

a dotação mais complexa e exigente de infraestruturas, equipamentos coletivos e

habitação social, sob o conceito integrador de aménagement, a que uma ZAC pretende

dar resposta.

No âmbito das ZAC, a execução direta pela Administração determina que esta suportará

o financiamento, sendo ressarcida por via indireta mediante taxas e mecanismos de

política fiscal. Os custos são limitados ao montante necessário para a satisfação das

finalidades da operação urbanística, sem prejuízo de poder haver lugar a participação do

concedente nos custos. O financiamento dos equipamentos públicos pode ainda ser

assegurado de modo indireto, através do instituto de taxas urbanísticas ou mediante a

participação direta com a contrapartida de apropriação da mais-valias derivada da

valorização da área por via regulamentar no que reporta à capacidade edificatória.

Salienta-se, como mecanismos perequativo e anti especulativo, a definição do Plafond

Legal de Densité definido pelo Plan Local d’Urbanisme, que determina o volume

máximo de edificação permitido, a partir do qual o proprietário tem o dever de prestar

uma contribuição compensatória ao município pelo excesso de edificação pelo valor do

terreno que tivesse de adquirir para que esse limite não fosse excedido.

Salienta-se ainda a existência de diversos fundos, nomeadamente os Fonds

d’Aménagement Urbain, que apoiam a prossecução de políticas sociais de habitação e

urbanização a nível local e procedem a uma perequação entre coletividades territoriais.

Em Itália, o município impõe encargos consideráveis aos particulares para ser ressarcido

dos custos não amortizáveis tidos com infraestruturas e equipamentos. No âmbito de um

piano de lottizassione os gastos derivados da urbanização primária (infraestruturação

básica) e parte dos gastos com a urbanização secundária (equipamentos) estão a cargo

dos particulares, sendo os primeiros realizados à entrada, aquando da licença e os

segundos pagos tendo em consideração a localização da parcela e as características do

seu aproveitamento.

Não obstante, em qualquer situação de nova construção, aumento da área edificada,

alteração de uso ou aumento do número de unidades imobiliárias pode ser devida taxa,

Page 94: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

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calculada com base em dois valores: custo médio da construção definido por região e

encargos tidos com a urbanização, sempre que não tenha sido antecedida por convenzione

edilizia.

Na Holanda, a empresa municipal, de capitais mistos ou privada responsável pela

execução urbanística financia a operação (quando a mesma não seja executada pelo

município diretamente) e cobre os custos de urbanização através do posterior rendimento

obtido pela venda ou concessão de parcelas edificáveis. Os municípios podem cobrir

parcialmente os seus custos de entrada através de um fundo para a habitação constituído

pelo Estado, bem como da facilitação do acesso ao crédito mediante a concessão de

garantias estaduais. Se o desenvolvimento de uma determinada área vier a dar prejuízo, o

lucro obtido de outras áreas na mesma urbanização ou em diversa deverá compensar e

equilibrar o seu financiamento.

Relativamente à promoção por iniciativa privada, as contribuições do proprietário devem

abranger os custos públicos, mas ter em consideração o diferencial entre o valor inicial

de aquisição do solo e o seu futuro valor com base na capacidade de edificação e usos

após conclusão do desenvolvimento urbano. Deste modo, o proprietário de um solo

destinado a habitação social pagará menos do que caso ele se destinasse a habitação em

mercado livre. Os custos públicos reportam não apenas à construção das infraestruturas e

equipamentos na área de intervenção, mas incluem nomeadamente os associados ao

planeamento da área, descontaminação do solo e compensações por perda de valores

ecológicos.

Em Espanha, para além dos custos de urbanização e cedência obrigatória e gratuita de

terrenos por parte dos promotores, é devido imposto sobre construções, instalações e

obras, que variam entre 4% e 5% do seu custo, para emissão da licenças e outras taxas

municipais. Salienta-se ainda a particularidade de obrigatoriedade de cedência à

Administração de uma percentagem, que pode variar entre 5% e 15%, e excecionalmente

atingir 20%, do aproveitamento urbanístico correspondente à edificabilidade média da

unidade de execução para integração no património público do solo, que poderá

eventualmente ser substituída pela cedência de solo destinado à habitação sob o regime

de proteção pública. Este património público do solo permite, através de uma afetação

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específica das receitas resultantes da sua exploração, fazer face aos encargos não

recuperáveis de modo direto nas urbanizações de iniciativa municipal.

Em Inglaterra, os custos da urbanização são acometidos e cobrados em sede de

licenciamento e em resultado do processo de negociação e contratualização com o

privado. No entanto, este sistema tem-se revelado insuficiente para assegurar a integral

recuperação dos custos. Sobre os novos projetos de edificação é cobrada uma taxa, a

Community Infrastructure Levy, que visa financiar a construção ou reforço das

infraestruturas cujo financiamento não esteja coberto por outros meios, sob o limite de

que se mantenha assegurada a viabilidade económica do empreendimento. A Localism

Bill¸ projeto-lei atualmente em discussão imporá que parte dessas receitas seja consignada

ao efetivo melhoramento das infraestruturas do “bairro” onde foram coletadas.

Na Alemanha, a Administração Pública procede à construção das infraestruturas e

equipamentos públicos, repercutindo posteriormente esses custos nos particulares

mediante a cobrança de contribuições pelo desenvolvimento, que englobam os custos da

construção, bem como as necessárias aquisições de terreno para esse efeito. Existe neste

âmbito a possibilidade de garantir, por perequação compensatória, a atribuição de direitos

reais aos particulares afetados por zonamentos de uso público e a transferência de direitos

de edificabilidade entre proprietários.

2.6.2.3. Infraestruturas e espaços e equipamentos de utilização coletiva

Regra geral, os espaços destinados a infraestruturas e espaços e equipamentos de

utilização coletiva chegam à posse da Administração Pública mediante cedências

definidas em sede dos acordos e licenças que enquadram a execução urbanística privada

ou mediante expropriação, coerciva ou acordada ou ainda mediante o exercício do direito

de preferência.

Em França, tais espaços no âmbito da execução urbanística vêm à posse da

Administração na sequência da execução de uma ZAC e da licença de uma operação de

loteamento ou de construção. As cedências no âmbito da execução privada da urbanização

e edificação não podem ultrapassar 10% da superfície do terreno e não podem ser exigidas

quando se tratar de licença para edifício agrícola não habitacional.

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66

Em Itália, existe a possibilidade de substituição das cedências no âmbito da execução

urbanística, por contributi ou cedência de outros terrenos em alternativa parcial ou total

às cedências, sob o limite da proporcionalidade com os encargos comprovadamente a

suportar pelo município no equipamento e infraestruturação da área.

Na Holanda, destaca-se no âmbito dos projetos red-for-green e da regulamentação da

requalificação da propriedade agrária para fins de delimitação e execução de corredores

ecológicos, a possibilidade de haver lugar a cedências e permutas negociadas entre os

particulares e as entidades públicas.

Em Inglaterra, o particular pode socorrer-se do mecanismo de inverse compulsory

purchase, através do qual a autoridade pública fica obrigada a adquirir o solo antes ainda

da aprovação do seu scheme, desde que o uso previsto o afete a serviços públicos e haja

interesse atendível do proprietário, especificamente qualificando-se ele como

proprietário-ocupante.

Na Alemanha, a obtenção dos solos necessários para a instalação de infraestruturas,

equipamentos e espaços de utilização coletiva enquadra-se na aquisição de solos para fins

de interesse público urbanísticos e deve ser precedida da afetação do seu uso a certo fim

de interesse público no âmbito do BdeP ou do VE-plan. A Administração poderá recorrer

à compra, venda voluntária, a direito de preferência ou expropriação, sendo que a

cedência gratuita de terrenos é praticamente limitada a operações de reparcelamento. Os

encargos com esta aquisição são posteriormente repercutidos nas contribuições pelo

desenvolvimento urbanístico a pagar pelos particulares.

2.6.3. Intervenção da administração pública no mercado de solos

2.6.3.1. Aquisição de direitos sobre a propriedade do solo

Nos seis ordenamentos jurídicos sobre os quais a análise incidiu verifica-se que, com

maior ou menor intensidade, a Administração Pública intervém no mercado de solos

como um qualquer agente privado, comprando e vendendo, e como agente regulador

dotado de poderes de autoridade que justificam o recurso a mecanismos impositivos.

Page 97: Alexandre Miguel Rodrigues Ferreira da Silva Carneiro · EDS – Estratégia da EU para um desenvolvimento sustentável FMSAU – Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística

67

Na França as formas de aquisição pública de solos incluem, para além da compra nos

termos gerais de direito, o exercício do direito de preferência, a expropriação, as

cedências no âmbito de operações urbanísticas e a permuta de terrenos (formalmente

tratada como compensação por cedência gratuita de solo). A aquisição por recurso ao

exercício do direito de preferência (droit de préemption) e à expropriação é comum no

sistema francês.

Na Itália o recurso à expropriação constitui a regra geral, incluindo a expropriação

amigável. Para além disso, a administração garante solo público: (a) através da imposição

de cedências para o domínio público no âmbito de operações urbanísticas; (b) por

permuta; mediante compensação através da atribuição de direitos edificatórios ao

particular; (c) através do exercício de direito de preferência (frequente na venda de bens

catalogados como bens culturais); (d) e por fim, e mais raro, através da aquisição nos

termos gerais.

No processo expropriativo existe uma fase de declaração de utilidade pública e de fixação

de um valor provisório de indemnização que, se for aceite pelo particular, faculta a

imediata celebração de um acordo de cessão.

A Holanda assenta num paradigma diametralmente oposto aos casos supra analisados,

porquanto a obtenção de solo mediante compra através de negociação direta, constitui a

regra geral. O recurso à expropriação é tradicionalmente raro (embora a tendência esteja

a mudar) e tem de ser autorizado pela Coroa. Caso seja esta a via a seguida, o valor da

indemnização, que integra o dano patrimonial de capital (valor do imóvel) e o dano com

a cessação de rendimentos, é acordado com o particular e, na ausência de acordo,

determinado mediante peritagem.

O sistema holandês prevê, ainda, a figura do direito de preferência que é sobretudo

exercido nos casos de expansão urbanística e no planeamento para promoção da

reabilitação urbana. Já o regime de cedência não se encontra diretamente regulado na

legislação urbanística nem é um mecanismo comum. Não obstante, tem sido usado no

âmbito dos projetos red-for-green, no âmbito dos quais existem cedências de terrenos

privados para fins ambientais. Nesses casos, o município compensa o particular

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atribuindo-lhe terrenos edificáveis (permuta) ou qualifica como tal determinados terrenos

(compensação).

Na Espanha, ao invés do que sucede na Holanda, a compra direta a privados assume

carácter residual. É a cessão obrigatória e gratuita no âmbito de operações urbanísticas

que constitui a regra geral, embora a expropriação seja também um mecanismo frequente.

No âmbito de um processo expropriativo é possível celebrar um acordo com o privado

onde se fixem aspetos essenciais do processo, nomeadamente, que o pagamento seja

efetuado através da atribuição de direitos de aproveitamento urbanístico, em vez de

pagamento em numerário.

O direito espanhol faculta, ainda, o recurso ao direito de preferência.

Na Alemanha a aquisição da propriedade por motivos de interesse público urbanístico

processa-se através da compra e venda voluntária, por recurso à expropriação, através do

exercício do direito de preferência e, mais residualmente, mediante cessão gratuita de

terrenos.

O recurso à expropriação, embora de uso corrente, surge como último reduto negocial,

uma vez esgotadas as tentativas de aquisição direta. O valor base a considerar é o valor

de mercado do bem, no qual não é contabilizável, entre outros fatores, qualquer aumento

de valor do terreno que resulte de uma antecipação da alteração do uso permitido, quando

tal alteração não seja vislumbrável num futuro próximo. A indemnização por

expropriação pode ser paga em numerário, em espécie (mediante a permuta de terrenos)

ou através da atribuição de outros direitos reais ao particular afetado, ou ainda de forma

combinada.

As cedências ocorrem no âmbito de operações de reparcelamento, destinando-se a

infraestruturas públicas, parqueamento e espaços verdes.

Na Inglaterra as formas de aquisição de solos públicos comportam algumas

especificidades em relação às que são tradicionalmente utilizadas nos demais países, uma

vez que adicionalmente se prevê o ingresso de terrenos no património público decorrente

de mecanismos de salvaguarda acionados pelos particulares.

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Embora a compra livre a privados constitua um referencial, o sistema incorpora a

possibilidade da Administração lançar mão da figura da compra forçada (compulsory

purchase), que é comparável grosso modo á expropriação. Neste caso, as autoridades

locais têm de desencadear um procedimento específico onde devem demonstrar a

necessidade de recurso à compra forçada, em função dos objetivos prosseguidos

(melhoria do bem-estar económico, social e ambiental, por motivo de planeamento).

No outro Pólo, encontramos a figura da notificação para compra (inverse compulsory

purchase), que corresponde ao direito do privado requerer que a Administração adquira

o seu terreno quando exista uma decisão urbanística adversa, bem como a blight notice,

que também é um mecanismo de que o particular se pode socorrer perante a proposta de

sujeição do solo a usos específicos que impeçam o privado de vender a propriedade em

mercado livre.

A permuta também é juridicamente admissível, designadamente para permitir a criação

do perímetro verde que deve circunscrever os aglomerados urbanos.

2.6.3.2. Mecanismos para combater / impedir a especulação e a retenção do solo

Na generalidade dos ordenamentos analisados o combate à especulação imobiliária

constitui uma preocupação dos Estados, no contexto da regulação fundiária, com

expressão legislativa. Os mecanismos previstos para desincentivar a retenção do solo por

parte de privados, na expectativa do aproveitamento gerado através do processo de

planeamento ou decorrente de decisões assumidas no âmbito da gestão urbanística,

variam em função das especificidades de cada ordenamento e do grau de intervenção da

Administração no mercado de solos.

Na França é essencialmente através da política fiscal que se desincentiva a especulação

imobiliária, combatendo a manutenção de terrenos não edificados e de imóveis não

utilizados com o propósito de gerar mais-valias. As penalizações fiscais são

complementadas com limitações administrativas "anti-especulação" que preveem um

plafond legal de densidade, imposto nos planos de urbanização, a partir do qual o

proprietário deve prestar uma compensação ao município pelo excesso de edificação,

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compensação essa que corresponde ao valor do terreno que o construtor teria de adquirir

para que não fosse excedido tal plafond.

Para além disso, existe uma forte intervenção pública no mercado fundiário no âmbito da

política de habitação a custos controlados, bem como a possibilidade de promoção

imobiliária realizada por atores públicos.

Na Espanha, a lei prevê vários mecanismos que garantem a função social da propriedade

e combatem a especulação imobiliária. A Administração pode, designadamente, socorrer-

se da expropriação e da venda ou substituição forçada, quando o proprietário não cumpra

a obrigação de edificar ou de renovar o imóvel. Mas é, sobretudo, através da constituição

do património público do solo que se procura conter os impulsos especulativos. Os

municípios encontram-se obrigados a efetuar um planeamento e uma gestão financeira

adequadas à constituição e ampliação dos patrimónios públicos do solo, os quais se

encontram adstritos à construção de habitação de sob regime de “proteção pública” (que

engloba a habitação social ou a custos controlados) e a outros usos de interesse social.

Para a constituição destes patrimónios são exigidas cedências gratuitas, no âmbito de

operações urbanísticas de iniciativa privada.

Na Alemanha, a temporalidade associada ao uso previsto no plano municipal oponível

aos particulares (BbP) funciona como importante elemento dissuasor da retenção

improdutiva do solo, uma vez que se o particular não proceder no prazo de 7 anos ao

desenvolvimento urbanístico ali previsto, pode ser sancionado com uma perda substancial

do direito à indemnização em caso de modificação do planeamento que altere o uso

previsto para outro uso privado. Por outro lado, a faculdade de emitir injunções, que tanto

podem visar a demolição como a edificação forçada, habilita a Administração com um

instrumento de cariz executório que combate a tendência especulativa.

Na Inglaterra os mecanismos de combate à especulação são de cariz administrativo e

traduzem-se, designadamente, na aplicação de injunções e de consequentes

contraordenações (em caso de incumprimento das injunções) para obstar à degradação

dos edifícios e seu abandono.

Na Holanda, como ficou expresso, a expansão urbana e a construção de habitações têm

sido assumidas, tradicionalmente, como tarefas municipais, sendo as urbanizações de

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iniciativa privada uma realidade recente. O agente tradicional de execução dos planos era

o município, que adquiria os terrenos aos privados, executava as infraestruturas

necessárias e depois concedia ou vendia o terreno edificável a promotores, sob a condição

destes posteriormente venderem os imóveis a preços controlados para fins de habitação

social. Desta forma todo o processo de transformação fundiária era controlado pelos

poderes públicos, não existindo grande margem para movimentos especulativos.

Contudo, este paradigma tem vindo a mudar com o aumento do preço dos terrenos,

constatando-se o crescente recurso por parte dos municípios a parcerias público-privadas

para execução das urbanizações.

2.6.3.3. Suporte de política da habitação

As opções estratégicas que cada Estado assume no contexto da política fundiária têm

reflexos em domínios específicos variados, atenta a sua transversalidade e influencia no

meio urbano. Neste pressuposto, o modelo e âmbito de intervenção pública na promoção

da habitação assume relevância.

Na França a promoção da miscigenação social é bandeira nacional, com expressão

legislativa, pelo que a política de habitação merece particular relevo no planeamento e

execução dos instrumentos territoriais. Os municípios com uma certa dimensão devem

adotar um Plano Local de Urbanismo e garantirem que pelo menos 20% dos fogos

existentes no seu território sejam habitações a custos controlados. Existem reservas

fundiárias que são utilizadas com especial incidência no domínio do alojamento social

bem como vários fundos destinados a auxiliar a prossecução da política social de

habitação e de urbanização a nível local. Para além da promoção direta pelos municípios

o sistema francês permite e fomenta a intervenção de entidades produtoras de habitação

a custos moderados.

Na Itália devem ser elaborados planos estratégicos (regional, provincial, municipal ou

intermunicipal) para execução da política social de habitação. Todos os municípios

devem garantir uma quota de alojamento social para o seu território e os maiores devem

aprovar planos específicos com áreas destinadas a habitações sociais, espelhando de 40 a

70% das necessidades habitacionais estimadas para os 10 anos seguintes. A promoção da

habitação social é municipal, admitindo-se contudo a constituição de entidades públicas

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ou privadas, organizadas em cooperativa ou não, participadas pelo Estado, pelas regiões

ou pelos municípios, cuja missão específica é a construção e gestão da habitação social.

Por exemplo, na Toscana os municípios recorrem, ainda, à construção convencionada,

impondo aos promotores imobiliários, em sede de acordo celebrado em momento prévio

á operação de loteamento, que determinado número de imóveis ou fogos, construídos ou

reabilitados, sejam vendidos a preço mais baixo. Em termos de financiamento a lei prevê

um fundo para construção de habitação pública, a distribuir por regiões, as quais podem

também instituir fundos para apoiar a execução de políticas habitacionais públicas, em

sentido lato, nas quais se inclui o apoio à aquisição de casa própria ou ao alojamento.

Na Holanda a política social de habitação assenta na contratualização entre o estado e as

associações de habitação. Os municípios avaliam as carências habitacionais, planeiam a

construção de fogos e, por vezes, procedem á urbanização do solo. As associações de

habitação atuam como agentes ativos, procedendo à construção de habitação social em

solo adquirido ou concessionado pelos municípios, estando também encarregues da

gestão do parque habitacional. Este modelo, que passa pelo financiamento e gestão

autónoma do parque social por associações privadas, tem-se demonstrado

financeiramente sustentável e com resultados satisfatórios, porquanto todo o cidadão

holandês tem acesso ao arrendamento destes fogos, embora tenha prioridade o segmento

mais baixo.

Em Espanha a politica social de habitação socorre-se da fixação de quotas em operações

de urbanização privadas, exigindo-se uma reserva de terrenos correspondente a, pelo

menos, 30% de edificabilidade residencial, que será destinada a alojamentos sociais.

Excecionalmente esta quota pode ser inferior, por deliberação dos municípios, desde que

se mantenha a reserva de 30% em todo o território municipal. Para além desta quota,

existe o regime de cedências obrigatórias de terrenos que vão integrar os patrimónios

públicos do solo e que são maioritariamente destinados à construção de habitação social.

Na Alemanha podem ser aprovadas por resolução do conselho municipal medidas de

política, adicionais às constantes dos instrumentos de planeamento, aplicáveis a áreas

desfavorecidas, que padecem de problemas sociais e que careçam de uma particular

intervenção urbanística. Por outro lado, embora não se configure, por si só, uma medida

de cariz social, a faculdade concedida à Administração de obrigar o particular proprietário

a construir habitação, tendo em conta a afetação, em sede de plano, de determinados

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terrenos à construção de determinada tipologia de habitação, fundamentada na escassez

de alojamento ou por imperiosas razões urbanísticas, assume-se como instrumento

essencial para efetivar o intuito “social” previsto aquando da zonificação do local em

questão.

Na Inglaterra a habitação social mereceu a atenção do legislador e do Governo enquanto

definidor da policy aplicável ao sector, que não só definiram os objetivos estratégicos a

adotar em Inglaterra como também os parâmetros normativos aplicáveis aos planos e às

planning permissions, recomendando às autoridades locais que garantam uma

determinada percentagem de habitação a custos controlados, de forma a promover a

miscigenação social. Uma das condições impostas com frequência pelas autoridades

locais nos instrumentos de planeamento simplificado (planning conditions) é a do

requerente providenciar uma dada quantidade de habitações a custos controlados, a

suportar pelo promotor. Em matéria de habitação social existe ainda um mecanismo de

arrendamento com direito de opção de compra por parte do particular beneficiário.

2.6.4. Tributação

2.6.4.1. Valoração e tributação do património imobiliário

Regra geral, nos países analisados a valoração do património imobiliário para efeitos

fiscais pretende corresponder ao valor de mercado do bem, sem que haja necessária

correspondência, exceto na Holanda, com os critérios de valoração definidos para efeitos

de expropriação. Em França e na Holanda, para alguns efeitos, ela é estabelecida a partir

do valor locativo do imóvel.

Em Inglaterra, não obstante as valorizações para efeitos fiscais e expropriatórios

partirem ambas do valor de mercado, não existe uma verdadeira uniformidade de

critérios, não se garantindo, nomeadamente através do recurso ao cadastro, uma

uniformização formal das valorizações urbanística e fiscal. Na Alemanha, o Supremo

Tribunal Federal já defendeu que o regulamento federal que desenvolver as regras

relativas à avaliação dos bens imóveis para determinação do valor de mercado não se

deve limitar aos efeitos urbanísticos e expropriatórios, mas deve servir também como guia

para toda a avaliação imobiliária, incluindo assim os efeitos fiscais.

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Na Holanda, fruto da existência de um cadastro com informação muito detalhada e

informatizado, que permite um cruzamento eficaz de dados, esse valor é determinando

anualmente pelos municípios com base nas flutuações de mercado analisadas pela

Waarderingskamer, o conselho nacional de avaliação imobiliária, a partir de informação

obtida sobre o valor de venda de habitações ou de arrendamentos de imóveis para fins

não residenciais.

A propriedade imobiliária em Itália, em França e nos municípios holandeses que assim

o escolham é tributada através de imposto municipal, havendo, regra geral, uma

diferenciação positiva ou mesmo isenção para situações de proprietário-residente. O

mesmo imposto é devido em Inglaterra, mas estritamente em relação aos imóveis com

funções residenciais. Na Alemanha, esse imposto, de âmbito municipal, é distinto

consoante se trate de propriedade com uso agrícola ou com uso comercial ou residencial.

Em França, a propriedade imobiliária é ainda contabilizada para efeitos de imposto de

solidariedade sobre a fortuna, tributável em relação aos sujeitos passivos com um

património superior a um determinado valor (em 2009, 790.000 €) com uma taxa

progressiva de 0,55% até 1,8%.

Em França e em Espanha, as propriedades imobiliárias detidas por estrangeiros ou não

residentes, em determinadas condições, podem ainda ser acrescidas de uma tributação a

3% sobre o valor de mercado ou sobre o valor cadastral.

O rendimento resultante da exploração económica do património imobiliário é tido em

consideração para efeitos de tributação do rendimento.

Na Holanda, Itália e em certos municípios de França pertencentes a aglomerações

urbanas com mais de vinte mil habitantes, salienta-se como medida de desincentivo à

inutilização de imóveis por razões especulativas, a presunção do rendimento da sua

exploração para efeitos tributários, com base na capacidade locativa do imóvel, no

rendimento equivalente ao valor de uma hipotética renda que seria paga caso a

propriedade fosse arrendada, havendo em França o agravamento tributário anual até ao

terceiro ano. Para além destes mecanismos, em França existe ainda a previsão de

agravamento de tributação para propriedades infraestruturadas por construir. Em

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75

Inglaterra, o combate ao abandono e à degradação dos edifícios é realizada através de

mecanismos administrativos e não tributários, nomeadamente contraordenacionais.

2.6.4.2. Tributação da transmissão de imóveis

À transmissão de propriedade imobiliária são devidos tributos em todos os países

analisados e, com a exceção da Itália, diferenciam-se consoante ela seja onerosa ou

mediante doação ou sucessão.

Na tributação da doação ou sucessão de bem imóvel, aplicam-se as regras específicas do

regime geral de tributação das doações e sucessões ou a variação da taxa aplicável e

regimes de isenções associados à natureza da relação entre transmitente e beneficiário.

Relativamente à transmissão onerosa de bens imóveis, o valor da tributação é determinado

por proporção, variável ou não, do valor da propriedade. A máxima proporção, na ordem

dos 6% e 7%, é aplicada em Espanha e na Holanda, enquanto nos demais países o

intervalo, situa-se no espectro variável de 1% a 5%.

Em Inglaterra, a tributação sobre a transmissão onerosa de imóveis pode incidir

enquanto Capital Gains Tax, aplicável para os lucros obtidos na venda de quaisquer bens

imóveis ou móveis e enquanto tributação específica sobre a transmissão dos imóveis com

funções residenciais. É de assinalar a isenção a habitações transacionadas abaixo de um

determinado valor e, durante dois anos, abaixo de um valor ainda superior caso se trate

de primeiro comprador de habitação.

Também em Itália, a aquisição da primeira habitação é descriminada positivamente,

sendo tributada por valores fixos muito baixos.

Nos diversos países, a aquisição de património imobiliário por curtos períodos de tempo

é penalizada em sede de tributação como medida de desincentivo à especulação e de

captação das mais-valias puras geradas.

Em Espanha é de assinalar a existência de um imposto municipal sobre as mais-valias

imobiliárias - Impuesto sobre el Incremento del Valor de los Terrenos - somente aplicável

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76

às transmissões da propriedade ou à constituição ou transmissão de direito real de gozo,

quando tenham sido geradas mais-valias sobre o terreno em causa, com aplicação de

regressividade associada ao número de anos em que a propriedade esteve detida pelo

alienante.

Em França, Itália e Inglaterra, o lucro realizado com a venda do património imobiliário

é tributado enquanto rendimento, com aplicação de regressividade ou isenção associada

ao número de anos em que a propriedade esteve detida pelo alienante num mínimo de

cinco anos, exceto em Inglaterra onde se aplica um mínimo de 2 anos.

Na Holanda, quando esteja em causa uma venda de terreno agrícola, que posteriormente

venha a ser urbanizado dentro dos 6 anos seguintes à data da venda, o Estado recupera

45% das mais-valias realizadas.

Na Alemanha, o lucro proveniente de venda é sujeito a imposto sobre o rendimento caso

o lapso temporal entre a compra e a sua venda seja inferior a 10 anos. Caso tenha ocorrido

a venda de mais de 3 propriedades num espaço inferior a 5 anos e caso o vendedor seja

proprietário de cada uma por menos de 5 anos, a venda é considerada de natureza

comercial, sendo antes devido imposto sobre o comércio.

Em França existe ainda a possibilidade recente dos municípios ou entidades de

cooperação intermunicipal cobrarem taxas específicas sobre a cessão a título oneroso de

terrenos não infraestruturados que hajam sido classificados pelo plano como zona

urbanizável, de modo a captar as mais-valias puras realizadas, a denominada taxe

communale forfaitaire sur les cessions à titre oneéreux de terrains nus devenus

construible.

2.6.4.3. Mecanismos fiscais especiais de tributação das mais-valias

Nos diversos países existe a previsão de instituição de mecanismos tributários especiais

de captação das mais-valias por melhoramentos urbanísticos.

A Alemanha é o único país que utiliza de modo sistemático este tipo de mecanismos,

através da cobrança de contribuições especiais pelo desenvolvimento aos proprietários de

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77

uma determinada área na sequência da realização por iniciativa pública das obras gerais

de infraestruturação. Este recurso sistemático deriva do facto do modelo alemão de

atuação urbanística se fundar numa distinção clara entre as esferas de atuação pública

(infraestruturação e equipamentos) e privada (edificação para fins privados), sem prejuízo

da possibilidade de opção por formas contratuais semelhantes às utilizadas nos demais

países analisados.

Em Itália, os municípios podem aplicar um imposto local - imposto di scopo - para a

recuperação de parte dos custos tidos com obras públicas na proporção das mais-valias

daí resultantes para os proprietários da área em questão, ou das áreas confinantes.

Na Holanda, os municípios também podem recorrer a um imposto semelhante –

baatbelasting – mas, devido à especial complexidade da sua aprovação, trata-se de um

mecanismo pouco utilizado, sendo os custos antes tendencialmente recuperados através

dos lucros obtidos pela alienação das parcelas infraestruturadas ou dos acordos de

desenvolvimento fundiário celebrados com os particulares no âmbito de parcerias

público-privadas para o desenvolvimento urbanístico.

Em Inglaterra, houve uma recente tentativa de introduzir um tributo desta natureza no

âmbito do planning permission sob a forma de suplemento às contrapartidas negociadas,

mas após severa contestação pública, a iniciativa foi abandonada, tendo sido substituído

pelo Community Infrastructure Levy, que visa cobrar a ampliação ou reforço de

infraestruturas sempre que esse custo não possa ser cobrado de outro modo.

2.7. Lei de bases

Com a publicação da nova Lei de Bases Gerais da Política Pública de Solos, de

Ordenamento do Território e de Urbanismo (Lei n.º 31/2014, de 30 de Maio - “Lei de

Bases”), que revoga a Lei de Bases de 1976, justificada pela necessidade de atualização

das normas legais então em vigor sobre o território, devido ao anterior, ter um sistema de

gestão territorial complexo e pouco flexível, pela vontade de criar políticas estáveis que

propiciem o investimento e pelos objetivos de reforçar a integração de políticas no

território e a ideia de valorização e/ou reabilitação/regeneração.

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78

A elaboração de uma nova Lei de Solos deve ter como referência uma visão ordenada do

território, os princípios de demarcação dos usos do solo observando as suas diferenças e

especificidades, o regime para cada um dos usos do solo e os critérios de localização e de

relação das utilizações. Conceptualmente, é importante esclarecer e consensualizar os

significados de ocupação, uso, utilização e função aplicados aos espaços territoriais.

Esta reflexão critica sobre a proposta de Lei n.º 183/XII, que foi promulgada como o

Decreto- Lei n.º 31/2014, necessita da exposição de motivos, que avancem na sua

reformulação. Como se trata de uma figura de cariz bastante complexo, este subcapítulo,

vai ser orientado por o “COMENTÁRIOS À PROPOSTA DA LEI N.º 183/XII - Política

Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo” do Professor Doutor

Sidónio Pardal.

Sidónio Pardal começa por explicar que este modelo está ultrapassado, sendo altura de se

criar um novo conceito de planeamento dinâmico, apoiado em “desdobramentos”,

designação que se sugere como sinónimo de “planos abertos” desenvolvidos em

permanência e respondendo em tempo real às necessidades e desafios sócio-territoriais.

A “política de ordenamento do território e de urbanismo” acolhe “uma visão integrada

da gestão do território” aberta a um trabalho interdisciplinar, atendendo à dimensão

sistémica da relação da sociedade com a sua base territorial.

A proposta de lei visa “definir instrumentos que permitam disciplinar” (...) ”a correta

distribuição do solo rústico e urbano” (…) “evitando o aumento excessivo e irracional

dos perímetros urbanos”. O controlo da expansão urbana prende-se com o conceito de

“áreas urbanizáveis” e da especificação e constituição do direito de urbanizar e do direito

de construir.

A questão da classificação e reclassificação do solo requer um aprofundamento lógico e

taxonómico sob pena de se tornar confuso e incontrolável o tratamento desta questão na

lei e na prática do planeamento.

O objetivo de disciplinar os processos de criação de solo urbano associado à aquisição de

faculdades urbanísticas pede, à partida, um esclarecimento sobre quem tem a

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responsabilidade e a competência para decidir e conduzir a expansão urbana,

nomeadamente quando a uma alteração do uso do solo de rústico para urbano.

O regime que vigora desde 1965 dá origem a situações caricatas como a que a seguir se

descreve:

I. O promotor da urbanização, proprietário do solo rústico, apresenta uma pretensão

com estudo de loteamento à Câmara Municipal;

II. A Câmara Municipal viabiliza a pretensão do promotor;

III. O promotor desenvolve a apresenta o processo de loteamento e os projetos de

infraestruturas;

IV. A Câmara Municipal aprova os projetos e firma um contrato de urbanização com

o respetivo alvará e emite as licenças para as obras de infraestruturação contra o

pagamento de taxas e a apresentação de garantias;

V. O promotor procede de imediato ao registo provisório dos lotes na conservatória e

nas finanças e pode efetuar a venda dos mesmos (os compradores de lotes, de edifícios

ou de frações em urbanizações inacabadas não se apercebem de que a propriedade

urbana que estão a adquirir tem um registo provisório;

VI. Os proprietários dos lotes podem apresentar projetos de edifícios à Câmara

Municipal, a qual pode licenciar as obras sem a urbanização estar completada (há casos

em que se chegou a passar licenças de utilização para os edifícios em urbanizações

cujas infraestruturas não estão ainda rececionadas);

VII. O promotor pode abandonar a urbanização inconcluída, fugindo às suas

responsabilidades e deixando a Câmara Municipal em confronto com os proprietários

dos lotes e dos edifícios com famílias e empresas residentes, tendo por suporte as

garantias bancárias geralmente insuficientes;

VIII. Formalmente, o alvará e a licença de urbanização caducam, ficando sem se

perceber bem quais as consequências desta situação sobre terceiros: proprietários dos

lotes, dos edifícios, de frações ou inquilinos.

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80

É correto o propósito de reforçar o papel do Plano Diretor Municipal (PDM) mas é errado

pretender integrar no PDM conteúdos que só são possíveis de equacionar, conceber e

regular em sede de Plano de Pormenor, daí não ser aceitável que os PDM transcendam o

seu papel de regulamento administrativo, apenas vinculativo da administração pública,

para passarem a ser “vinculativos dos particulares”, alimentando a famigerada figura dos

“direitos adquiridos”.

O PDM deve manter-se como regulamento administrativo não vinculativo dos

particulares sob pena de criar direitos de urbanização e de construção nas áreas

classificadas como urbanizáveis e com os parâmetros estabelecidos no regulamento.

É correto que o PDM seja o único plano de classificação e afetação do uso do solo, sendo

nele plasmados os conteúdos determinísticos dos diversos planos de nível nacional e

regional, mas isso não pode levar a assumir que “o cidadão apenas estará obrigado a

consultar um único plano para conhecer com segurança o que lhe é permitido fazer em

termos de operações urbanísticas”. A ser assim está-se a legitimar direitos de urbanizar a

partir do PDM, o que é um gravíssimo erro. O direito de urbanizar não deve ficar na esfera

jurídica dos particulares, titulares do direito de propriedade de solos urbanizáveis. Esta

interpretação de pretensos “direitos adquiridos” a partir de planos territoriais está na

origem do desordenamento do território e de grandes conflitualidades, nomeadamente no

sector financeiro.

O PDM não é, portanto, o nível de planeamento apropriado para definir operações

urbanísticas, tal compete ao Plano de Pormenor (faz falta a figura do plano geral de

urbanização, PGU) e, por maioria de razão, este princípio ganha acrescido sentido quando

se pretende “erradicar o denominado solo urbanizável”.

A proposta de lei entra em contradição quando quer vincular os particulares aos conteúdos

vagos do PDM, conferindo-lhes aí direitos para depois vir dizer que pretende desenvolver

mecanismos de execução “sempre que as condições de realização da operação urbanística

se encontrem suficientemente definidas, tendo por contrapartida o reforço dos

mecanismos de responsabilização e de controlo sucessivo”.

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81

É necessário e urgente estabelecer “mecanismos de regularização de operações

urbanísticas, permitindo desbloquear situações de impasse cuja manutenção se revelava

negativa para o interesse público urbanístico e ambiental e desproporcionadamente

gravosa para os particulares”.

Assim, com o objetivo fundamental do reconhecimento do direito das populações

residentes ao território, a uma habitação condigna e a espaços de trabalho confortáveis,

seguros e funcionais, devidamente adaptados às atividades económicas neles instaladas,

os comentários de Sidónio Pardal sobre a atual Lei de Bases, analisam e argumentam

sobre a normatividade de artigos que ficaram aquém do que era suposto e/ou que

permitem ou não, mudança na politica geral de solos.

2.8. Uso sustentável dos rendimentos da tributação sobre a propriedade

O resultado do imposto sobre a propriedade também deve ter um aspeto da

sustentabilidade e isso significa que o imposto sobre a propriedade deve produzir receitas

suficientes para fornecer fundos para todos os serviços necessários a um nível adequado,

para que a autoridade fiscal (assumindo que vai para os municípios) é responsável - a

adequação do nível de serviços a ser determinado pelos cidadãos que também são

contribuintes. Isto significa, naturalmente, que um aspeto da sustentabilidade do imposto

sobre a propriedade diz respeito ao número, natureza e qualidade dos serviços que se

esperam financiar e as necessidades da comunidade.

Além disso, também é importante para as suas credenciais de sustentabilidade que o

rendimento deve ser gasto na obtenção de resultados sustentáveis para a comunidade. É

comum o imposto sobre a propriedade financiar os serviços municipais e é neste contexto

que se discute a prestação financiada pelo imposto sobre a propriedade.

Dado que a fonte de financiamento é o valor (ou algum substituto) de imóveis e (no

espírito de "gansos" e "assobios" mencionado no ponto 2.1.), deve-se prever que uma

conquista significativa do rendimento fiscal deve ser a manutenção e, potencialmente, a

melhoria do valor ou atração do solo e do imóvel. Ao adicionar valor aos terrenos e

edifícios (os objetos tributáveis), através de prestação de serviços, a base sobre a qual o

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imposto é cobrado é reforçada, a flutuabilidade de resultados de rendimento, e assim

como a conveniência de atributos do local. Desta forma, o imposto sobre a propriedade

assume uma forma cíclica, um círculo virtuoso, de benefícios para ambos os ativos e

estilos de vida individuais e comunitários.

Assim, a tributação imobiliária deve financiar os serviços que ajudam a alcançar e manter

o valor e, levando, a sustentabilidade dos terrenos e edifícios e também de suas

comunidades. Serviços que melhoram as características da comunidade local e, portanto,

o valor individual e coletivo do ambiente construído devem ser priorizadas.

Estes podem incluir a reciclagem e compostagem eficaz e eficiente (se nas portas das

casas ou em convenientes pontos centrais), e que minimizam coleta e eliminação de

resíduos, bem como a pressão sobre aterros, serviços sociais para apoiar os mais

vulneráveis (como os idosos), como também a educação da comunidade, aperfeiçoamento

pessoal e serviços de aconselhamento aos cidadãos a esse respeito, por exemplo, como as

pessoas podem se envolver em melhorar os aspetos da comunidade. Os recursos

financeiros também podem ser estendido para o financiamento de melhorias nos imóveis,

por exemplo, para melhorar a eficiência energética.

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83

Capitulo 3 – ANÁLISE DE PROCEDIMENTOS URBANIZÁVEIS

3.1. Enquadramento

Atualmente existe uma grande discussão pública sobre a necessidade de taxar as mais-

valias, reduzindo assim, a especulação imobiliária e contrariar a atual crise imobiliária.

Para isso acontecer, é preciso fazer uma análise crítica do que aconteceu nos últimos 50

anos no planeamento do território, e perceber que a atual situação teve início a partir de

1965, quando deixou de haver parametrização e retenção de mais-valias simples, o que

permitiu grandes operações especulativas.

Justifica-se uma reflexão jurídica com perspetiva histórica, consciencializando memórias,

saberes e experiências que abarquem o Plano da Baixa Pombalina como primeiro

exercício de reparcelamento perequativo, a Lei de João Crisóstomo de 1864 que, na

altura, instituiu a venda forçada e a sua procedimentalização, o “Projeto de Lei de

Fomento Rural” de Oliveira Martins (1887), a Lei do Regime Florestal de 1900 e 1901,

a legislação urbanística de Duarte Pacheco 1934 e a sua revisão de 1944, a liberalização

dos loteamentos de 1965 e toda a legislação produzida depois da Lei de Solos de 1976

(Pardal, 2014).

O carácter ideologicamente ruralista do Estado Novo e a consequente baixa dinâmica

urbana conduziram a um grande défice de solo urbano e de habitação. É este défice que

justifica a legislação que, desde 1965, permitiu a liberalização do processo de obtenção

de solo urbano. A legislação de 1965 – Decreto-Lei n.º 46673 – vem retirar competências

urbanísticas aos municípios e incentivando à promoção privada, através das operações de

loteamento. Importa reter que os municípios, então, exerciam um papel de interligação

com o Poder Central.

A importância dos Planos de Urbanização para a definição de parâmetros urbanísticos

passa a ser residual, a própria realização de Planos de Urbanização cai em desuso e as

urbanizações passam a ser negociadas entre privados e serviços do aparelho central. As

mais-valias da passagem do solo rústico a urbano passam a enriquecer os promotores

imobiliários.

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As mais-valias decorrentes deste processo eram, como afirmava Duarte Pacheco, um

“bem trazido pelo vento” e como tal não deviam servir ao enriquecimento dos

proprietários do solo transformado em urbano.

Com a revisão da Lei dos Solos de 1976, houve uma necessidade de perceber a realidade

e reavaliar os conceitos. Foi através da falta de regulamentação na Lei dos Solos, que se

permitiu, a liberalização dos loteamentos e a forma como se estabelecem condicionantes

e restrições de utilidade pública gerando perversidades que inquinam o funcionamento do

mercado imobiliário, tornando-o viscoso, obscuro, arriscado e especulativo. O que levou,

segundo Pardal, “a carga fiscal e o custo dos encargos urbanísticos, envolvendo taxas e

licenças de urbanização e construção, que geraram um extraordinário agravamento dos

custos finais do imobiliário”.

A legislação posterior e até à atualidade, mesmo afirmando uma ou outra preocupação

residual com a regulamentação do mercado e a retenção parcial das mais-valias, tem

vindo sempre no sentido de agilizar a aprovação de loteamentos e dificultar a aprovação

de planos.

Como resultado das políticas anteriormente seguidas, são definidos perímetros urbanos

muito acima das necessidades decorrentes do crescimento demográfico e do previsível

serviço à atividade económica. Ao mesmo tempo que os centros históricos e os núcleos

antigos são abandonados devido a geração de menores mais-valias do que as produzidas

na transformação de solo no periférico – em especial das áreas metropolitanas e nas

principais cidades da rede urbana nacional – há um crescimento desmesurado através de

um modelo extensivo e fragmentado, que dificulta o estabelecimento das redes de

mobilidade e de serviços à população.

É neste quadro histórico e porque o solo é um bem finito e imprescindível para o futuro

que, criaram-se alguns Decretos-Lei para combater a especulação de determinadas

localizações – como exemplo o Decreto-Lei n.º 43/98, que tributa a valorização de uma

área beneficiada com os investimentos públicos em determinados concelhos ou o

Decreto-Lei n.º 152/82, aplica uma especial tributação a quem recuse urbanizar e

construir ou não coloquem as localizações à disposição das câmaras municipais –

procurando um equilíbrio que acautele, o uso físico e temporalmente do solo.

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Nesse sentido, deve-se legislar, procurando institucionalizar um novo paradigma que

conduza a um modelo territorial onde o crescimento urbano se faça na medida do

necessário para responder às expectativas de um crescimento sustentável. Um modelo

territorial onde a fragmentação urbana e o abandono de importantes parcelas da urbe dê

lugar à densificação regulada e à reabilitação, atendendo naturalmente à dimensão

humana e às características naturais e históricas das zonas.

3.2. Procedimentos legislativos de tributação

É fundamental a criação de regulamentação específica e geral, que vise a regulação do

mercado de solo, tendo em vista a “prevenção da especulação fundiária e a regulação do

respetivo valor”.

Estes assuntos fulcrais, não têm aqui, infelizmente, qualquer tratamento consequente.

Objetivamente, a proposta de Lei dos Solos mantém o mercado como ele sempre esteve,

não apresentando qualquer contributo substantivo. A especulação fundiária é um

fenómeno complexo onde muitos ganharam e muitos perderam e, em parte, está na origem

da crise financeira de 2008. A proposta de lei não mostra nenhuma perceção do que,

efetivamente, aconteceu, nem propõe medidas de regulação do mercado dos solos (Pardal,

2014).

Neste quadro, o Decreto-Lei n.º 152/82 e o Decreto-Lei n.º 43/98, que foram concebidos

com a especificidade de reduzir a especulação imobiliária, mas tiveram uma aplicação

negligenciável por parte dos responsáveis nesse domínio. No que diz respeito a um ponto

de vista mais geral, a Lei dos Solos permitiu que as mais-valias fundiárias e imobiliárias

decorrentes do processo de planificação e urbanização não fossem recuperadas pelas

coletividades ou municípios, que por sua vez, poderia e pode ser um sistema anti

especulativo fundamental. Criando assim, a necessidade de os analisar.

3.2.1. Decreto-lei n.º 152/82

A legislação promulgada e alterada por o Decreto-Lei n.º 210/83 tinha como objetivo, o

desenvolvimento das áreas urbanas prioritárias e de construção prioritária

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fundamentalmente com o objetivo de facultar uma abundante produção de solos

urbanizados e a sua utilização para novas habitações. Evitando assim, a utilização quase

sistemática para fins habitacionais de áreas urbanisticamente desaconselháveis e o não

aproveitamento das localizações previstos para esse fim nos estudos e planos de

urbanização.

É importante referir como exemplo o Decreto-Lei n.º 152/82, de 3 de Maio, que cria as

ADUP (Áreas de Desenvolvimento Urbanístico Prioritário) e ACP (Áreas de Construção

Prioritária) o qual refere, no artigo 12.º, que o valor dos terrenos rústicos colocados à

disposição dos Municípios para urbanizar deve corresponder a 7% do valor final da área

edificável (Pardal, 2014).

Os proprietários que se recusem a urbanizar e construir ou não coloquem as localizações

à disposição das câmaras municipais, com o respetivo decreto-lei, é-lhes aplicada uma

tributação especial destinada a fazê-los suportar os custos da sua conduta. Estabelecendo

medidas que visam uma contenção de práticas especulativas, privilegiando os

construtores que se proponham fornecer habitação a preços mais baixos. Caso contrário,

ao não disponibilizarem a disposição das câmaras municipais, existe uma perda do valor

real, pois a inflação muito dificilmente superará os 7%.

Por tanto, sem ofender o direito de propriedade privada, é possível contrariar a subida de

preços na aquisição de localizações, que contribui para uma distorcida formação de

núcleos urbanos, e constitui forte entrave à construção de novas habitações segundo um

ritmo desejável.

Em simultâneo, o processo de delimitação das áreas, garante uma correta planificação no

âmbito do ordenamento do território e assegura a preservação das localizações com

potencialidade e uso agrícola, a conservação de maciços arbóreos, a salvaguarda de

valores culturais e a defesa das áreas que sirvam de drenagem natural às águas pluviais.

3.2.2. Decreto-lei n.º 43/98

Na decorrência de importantes investimentos públicos, os imóveis ou localizações nas

áreas envolventes, geram diretamente, uma substancial valorização.

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No caso dos investimentos públicos, efetuados ou a efetuar para a realização da CRIL,

CREL, CRIP, CREP e respetivos acessos e da travessia ferroviária do Tejo, troços

ferroviários complementares, bem como as extensões do metropolitano de Lisboa e a

concretização de sistemas ferroviários ligeiros, valorizam, substancialmente, os prédios

rústicos e as localizações para construção envolventes.

Tal valorização justifica a criação de uma contribuição especial, nos termos já adotados,

em caso de obras públicas de elevados custos, nas zonas beneficiadas com o respetivo

empreendimento.

Com o propósito de evitar sobreposição de tributação sobre as áreas abrangidas pela

contribuição ora criada, consagra-se a exclusão de incidência de qualquer encargo de

mais-valia ou de outra contribuição especial.

Devido a este reconhecimento sobre o efeito das obras públicas e os interesses

especulativos envolvidos, o Decreto-Lei n.º 43/98 criou uma contribuição especial de

30% sobre a valorização de localizações pelas circulares rodoviárias nas regiões de

Lisboa e Porto (CRIL, CREL, CRIP e CREP), que já vigorava nas zonas de influência da

ponte Vasco da Gama e da Expo 98 (DL n.º 51/95 e DL n.º 54/95).

Originalmente aprovado com o intuito de reduzir a especulação decorrente da construção

da nova ponte sobre o rio Tejo (Decreto-Lei n.º51/95), sendo retificado (com o Decreto-

Lei n.º 54/95), de forma abranger as áreas da freguesia de Marvila, do município de

Lisboa, e das freguesias da Portela de Sacavém e de Sacavém, do município de Loures.

Nesse sentido, o Decreto-Lei n.º 54/95 foi substituído por o Decreto-Lei n.º 43/98, de

forma a poder neutralizar os efeitos da referida alteração, em 19 autarquias que

detivessem investimentos públicos de relevo nacional.

Apesar de apenas focalizar em obras públicas pontuais e não ter generalizado – hospitais,

centros culturais, institutos de ensino publico, etc. – entre 2003 e 2007, as três renderam

ao Estado mais de 26,4 milhões de euros, dos quais 11,7 milhões foram entregues a 19

autarquias e à Parque Expo 98. O imposto incide sobre a diferença entre o valor das

localizações na data do requerimento de licença de construção ou de obra e o seu valor

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em 1 de Janeiro de 1992 (zonas da Ponte Vasco da Gama e da Expo) e de 1994 (circulares

de Lisboa e Porto)16.

3.3. Valorização do solo e do imóvel

No contexto atual as mais-valias são misturadas com os lucros, o que não é saudável.

Acresce que sem uma parametrização das mais-valias não é possível ab initio um controlo

da segmentação do mercado fundiário e da formação do preço do imobiliário em geral.

Com as mais-valias descontroladas e ocultas fomenta-se uma especulação generalizada,

onde o proprietário é tentado a uma apropriação passiva do solo, sonegando-o à sua

função social, o que explica a desmesurada quantidade de prédios rústicos e urbanos

abandonados no território nacional (Pardal, 2006).

Segundo isto, para conseguir desde o começo controlar o mercado fundiário é preciso

controlar as mais-valias, para que o investimento no imóvel não seja prejudicado.

Na perspetiva de atuar contra a especulação e incentivar ao processo de regeneração das

cidades ou reabilitação de determinados imoveis, é preciso separar as mais-valias devido

ao investimento num imóvel e as mais-valias geradas por monopolização de uma

localização.

Mais-valias fundiária – São geradas por caraterísticas topológicas. O

investimento efetuadas por estas são diretamente improdutivas e são formadas

por acumulação de localizações, presumindo que haja uma elevação dos preços.

Mais-valias do imóvel – São geradas por a sua capacidade em produzir algo.

O investimento efetuado e são diretamente produtivo. Só geram lucro a partir

da aplicação de capital em meios de produção, visando o aumento da

capacidade produtiva.

Advém que, por exemplo, o investimento na criação de um filme faz com que o investidor

especule que vai ter um certo rendimento de retorno. Logo, ao investir capital num

16 Fonte: http://www.jn.pt/paginainicial/interior.aspx?content_id=1053110&page=-1

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produto (cultural), vai recompensar o investidor com o lucro. Daqui resulta um

investimento diretamente produtivo. No caso do investimento fundiário é diretamente

improdutivo. Pois, quando se faz um investimento fundiário (devido as suas caraterísticas

topológicas), faz-se especulando que a mesma vai valorizar – gerar mais-valias – se

houver a instalação de um investimento de interesse público na imediações ou o

crescimento da cidade nesse sentido, etc.. Como não é possível fazer investimentos

diretos para valorizar a nossa localização, acresce a isto, o bloqueio da função social

devido a não execução da construção do imóvel num determinado período tempo.

Assim, a defesa da economia produtiva, passa por medidas específicas que garantam que

o investimento fundiário tem uma orientação na defesa da economia real e é feito como

um passo intermedio, para se investir no imóvel e gerar mais-valias.

Como foi referido anteriormente no Estado da Arte, existe em Portugal, uma clara

distinção entre a oferta potencial de solos urbanos – que corresponde à oferta do Plano de

Pormenor – e a oferta real. Esta diferença permite alavancar as tensões especulativas. Ao

contrário do que acontece na Alemanha, que o carácter imperativo da urbanização torna

esta diferença entre oferta potencial e oferta real inexistente. Esta situação é possível na

Alemanha, pois a expropriação para viabilizar a concretização do Plano de Pormenor,

implica uma indemnização pelo valor do uso existente. Em Portugal, é praticamente

impossível a expropriação por utilidade publica – estabelecido no Código da

Expropriações – já que na forma de cálculo das indemnizações17 estabelece claramente

que existem dois tipos de solos (Tabela 3), aptos para construção e para outros fins, e que

o valor do solo apto para construção se calcula por “referência à construção que nele seria

possível efetuar se não tivesse sido sujeito a expropriação”.

Uma intervenção por parte do poder local é essencial para desenvolver ações contra a

especulação e racionalizar os recursos existentes. Pensar assim, permite priorizar as

localizações onde intervir. Onde os seus intervenientes locais tem de ser os responsáveis

por exercer um papel de supervisão da sobrevalorização das localizações – especulação

– e permitir a correta função social dos investimentos imobiliários.

17 Título III («Do conteúdo da indemnização»), art. 23º e seguintes, Lei n.º 167/99 de 18 de Setembro de 1999.

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90

3.4. Áreas prioritárias

Ao promulgar o Decreto-Lei n.º 152/82, de 3 de Maio, que cria as ADUP (Áreas de

Desenvolvimento Urbanístico Prioritário) e ACP (Áreas de Construção Prioritária),

afirma a importância da utilização quase sistemática para fins habitacionais de áreas

urbanisticamente desaconselháveis e o não aproveitamento das localizações previstos

para esse fim nos estudos e planos de urbanização.

Seria conveniente que a câmara municipal — com base em estudos urbanísticos (ainda

que não formalizados em Plano de Pormenor eficaz) — pudesse receber para o domínio

privado do município áreas com possibilidade construtiva em excesso ou que, na situação

inversa, pudesse coordenar e assegurar o direito a adequada compensação (Pardal, 2006).

É através do artigo 18º da Lei 48/98 (LBPOTU), que é pela primeira vez introduzido o

princípio da equidade na política de ordenamento do território e de urbanismo. Este

princípio visa assegurar a justa repartição dos benefícios e encargos que decorrem da

aplicação dos instrumentos de gestão territorial. É neste contexto que surge a perequação

compensatória, como um instrumento que tem como objetivo assegurar a redistribuição

entre os proprietários e encargos decorrentes da execução de um plano.

O facto dos mecanismos de perequação compensatória só poderem ser aplicados com

base em planos de pormenor e em unidades de execução deixa de fora todo o processo de

gestão urbanística feito com base em operações de loteamento avulsas, sem plano de

pormenor. Assim, cada urbanista é obrigado a cumprir, dentro da sua parcela de cadastro

rústico, todos os parâmetros urbanísticos impropriamente estabelecidos no PDM (Pardal,

2006).

A gestão perequativa deveria ser explicitada ao nível de regulamentos municipais.

Observe-se, contudo, que a sua aplicação efetiva depende de uma articulação com o

Código das Expropriações e implica o desenvolvimento de uma doutrina e de técnicas

relativas às avaliações dos imóveis (Pardal, 2006).

Deste modo, para que o processo perequativo seja executado é necessário considerar

separadamente os preços do solo e do imóvel que vão configurar plano de pormenor. O

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91

preço do solo é determinados pelo mercado e o preço do imóvel é determinado pela

iniciativa do proprietário. No caso do preço do solo, é um segmento de mercado que está

orientado segundo os planos territoriais, podendo ter uma ideia de regulamentação, que

pode ser mais interventiva ou mais liberal. Seja qual for a sua orientação, o mercado

cumpre um planeamento disciplinar que tem de assegurar uma oferta de espaços que

responda às necessidades da procura numa perspetiva social.

É através da ideia de fazer uma avaliação sustentável separada entre o imóvel e o solo,

que permite classificar as áreas prioritárias. Para tal, é preciso desenvolver um plano de

avaliação sustentável que permita configurar e identificar os parâmetros que fazem

valorizar do ponto de vista económico, social e ambiental de uma localização. Assim, é

possível adotar medidas que promovam o bem-estar de uma forma geral, determinando

quais as áreas prioritárias para desenvolver urbanizações, investimentos de interesse

publico, garantir acesso de parques próximos das urbanizações, etc.. Mas, ressaltando a

importância na categoria de economia, esteja incluído um parâmetro da sobrevalorização

das localizações. Parâmetro que identifica as zonas especulativas.

Este plano de avaliação de localizações sustentáveis deve permitir a transformação do

plano de pormenor num plano mais articulado, por exemplo, com Manual de Apoio a

Regeneração Urbana Sustentável (MARUS), proposto por Guilherme Castanheira. Os

indicadores, os parâmetros e categorias deste manual encontram-se na Tabela 8.

Sendo os respetivos parâmetros da sustentabilidade, representados na Tabela 8:

Ambiental (Verde)

Social (Vermelho)

Economico (Azul)

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Tabela 8 – Indicadores, parâmetros e categorias da dimensão económica do MARUS18

18 Fonte: Castanheira, 2013

Categorias Indicadores Parâmetros

1. Uso do solo e

infraestruturas

1. Reutilização de solo urbano 1. Percentagem de solo reutilizado e

descontaminado

2. Reabilitação do edificado 2. Percentagem de estruturas existentes

reutilizadas e reabilitadas

2. Ecologia e

biodiversidade

3. Distribuição de espaços verdes

3. Percentagem de espaços verdes existentes

4. Uso de vegetação autóctone 4. Percentagem de áreas destinadas as

espécies autóctones

3. Energia

5. Eficiência energética 5. Eficiência energética da instalação

6. Energias renováveis

6. Percentagem de energia consumida proveniente de energias renováveis produzidas localmente

4. Água

7. Consumo de água potável 7. Percentagem de água tratada

8. Índice de reutilização de água

8. Gestão de efluentes 9. Percentagem de solo permeável 10. Índice de gestão de efluentes

5. Materiais e

resíduos

9. Resíduos de construção e demolição

11. Percentagem de RCD utilizados

10. Gestão de resíduos sólidos urbanos

12. Potencial de gestão de resíduos sólidos urbanos

6. Conforto exterior

11. Conforto térmico exterior

13. Percentagem de área em planta com refletância superior a 60%

7. Segurança 12. Segurança nas ruas 14. Índice de segurança nas ruas

8. Amenidades

13. Proximidade a serviços 15. Índice de acessibilidade a serviços

14. Produção Local de Alimentos

16. Índice de estruturas existentes para produção local de alimentos

9. Mobilidade

15. Transporte público

17. Índice da qualidade e frequência dos transportes públicos

16. Acessibilidade pedestre

18. Índice de acessibilidade de pedestres

17. Rede de ciclovias

19. Índice de qualidade da rede de ciclovias

10. Identidade local e cultural

18. Espaços urbanos públicos

20. Índice de disponibilidade de espaços urbanos públicos por habitante e/ou Percentagem de espaços urbanos públicos

19. Valorização do património 21. Índice de valorização do património cultural e natural

20. Integração e inclusão social

22. Índice de participação da população

23. Índice de habitações destinadas a integração e inclusão social

11. Emprego e

desenvolvimento

económico

21. Empregabilidade 24. Percentagem de emprego no local face à população prevista

25. Índice de empregabilidade

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93

Capitulo 4 – NOVA METODOLOGIA DE PARAMETRIZAÇÃO DAS

MAIS-VALIAS

4.1. Enquadramento

De acordo com o que foi referido nos capítulos anteriores, pretende-se apresentar uma

metodologia que aborde a aplicação de taxas, de forma a obter uma parametrização das

mais-valias incluída numa política de planeamento urbanístico sustentável.

Para que a aplicação de taxas possa ser justa, é preciso que o planeamento urbanístico

permita aplicação de parâmetros sustentáveis, de forma a determinar quais as localizações

que detêm o maior interesse para a sociedade. Com efeito, não é por ser técnica e

juridicamente possível construir numa determinada localização que esta deva ser

colocada no mercado para esse efeito. A retenção de localizações é um comportamento

especulativo “natural” dos proprietários, que julgam que o valor das suas localizações vai

aumentar a médio ou a longo prazo, optando por esperar para poderem maximizar as suas

mais-valias. O facto de a fiscalidade fundiária não «encorajar» a disponibilização das

localizações em função da vontade coletiva - supostamente expressa nos planos

urbanísticos - estimula este tipo de comportamentos.

O ideal seria que o Município, ou em casos excecionais o Estado, assumisse as operações

de urbanização como aconteceu na Expo 98, criando também assim as condições mais

favoráveis para a iniciativa privada poder realizar os seus empreendimentos de construção

com regras transparentes, seguras e com condições financeiras altamente favoráveis,

particularmente no que diz respeito ao preço do solo urbanizado e à qualidade urbanística

(Pardal, 2014).

Em Portugal, do ponto de vista do modelo de controlo do desenvolvimento urbano, a

situação é semelhante à alemã. Tal como no caso alemão, o controlo do desenvolvimento

urbano não envolve a posse do solo. No entanto as semelhanças acabam aí.

Contrariamente ao caso português, o sistema de planeamento alemão dá respostas claras

a questões como a parametrização do preço do imobiliário, o controlo das mais-valias e

a firme repressão de práticas especulativas. O sistema revela-se eficaz a controlar o

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desenvolvimento urbano e a evitar o aparecimento de fenómenos especulativos e de

segregação espacial das populações (Guinote, 2008).

Um modelo de desenvolvimento alternativo necessita de estimular a “moralização” dos

preços praticados nas transações entre particulares, seja por aproximar os valores

declarados para efeitos fiscais dos efetivamente praticados, seja por inibir valores

especulativos por receio de intervenção pública.

Esse modelo deve considerar a política de solos, a organização urbanística, o justo

equilíbrio entre áreas de construção e de reserva patrimonial, ambiental e ecológica, a

mobilidade e a circulação, a relação harmoniosa entre cidade e sua periferia, os incentivos

económicos e a política fiscal municipal.

Neste modelo, o direito de preferência na escolha de localizações de interesse público,

deve ser realizado através de um instrumento muito mais flexível e operacional na

aquisição de solos do que a expropriação.

Rever o sistema de planeamento urbanístico é essencial. Sem a segmentação do mercado

de solos e sem o controlo das mais-valias pela Administração Publica não há forma de

impedir a pressão urbana sobre as localizações rústicas, florestais ou agrícolas. Se

existiam dúvidas sobre esta matéria, aí está a realidade a dissipá-las O uso urbano deve

ser confinado aos perímetros urbanos, e aí, o Sistema de Planeamento deve garantir uma

resposta qualificada para todas as necessidades e não apenas para quem tem o maior poder

aquisitivo. A proteção dos usos agrícolas e florestais, da pressão urbana, é uma condição

sine qua non para garantir um adequado ordenamento do território.

Pensar o planeamento como um instrumento que seja dinâmico, onde o município é o

interveniente ativo na execução de medidas preventivas, estimulando a regeneração

urbana, restringido a demolição e reabilitando imóveis com significado urbano, quer em

termos da necessidade de habitação social, quer em termos da criação de pontos de

interesse públicos – hospitais, universidades, acessos rodoviários, etc. – não tem que ter

em conta as mais-valias expectáveis, mas assentar na sua vinculação situacional de facto.

Será essencial uma nova maneira de intervir, evitando o planeamento dogmático,

negativo e proibicionista que domina na administração do território desde os anos 70 e

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95

que levou ao desordenamento urbano atual. Esta é a razão de fundo que deve levar a que

os municípios detenham poderes na delimitação de uma área crítica de recuperação e

reconversão urbanística, e não o seu valor no mercado imobiliário. Para que isso seja uma

prioridade não se pode limitar os municípios apenas ao recurso às expropriações como o

instrumento mais utilizado.

4.2. Âmbito da proposta

Entender o contexto e os fundamentos expressos nos capítulos anteriores torna claro e

percetível o âmbito desta metodologia. Isto é, perceber porque é que durante quase 40

anos foi possível desenvolver uma política de sobreprodução habitacional. Significa que,

durante este período, os municípios não estavam dotados de instrumentos eficazes ou de

regulamentação capaz de contrariar a procura de localizações rústicos integrados no

perímetro urbano e classificados como urbanizáveis. Isto significa que a intenção de

comprar localizações não era sempre com a vontade de urbanizar, mas sim de encontrar

localizações baratas para adquirir o direito a urbanizar e de gerar uma mais-valia ao

proprietário. Este processo “roleta de casino” permitiu a acumulação de riqueza aos

proprietários – que no seu grosso eram entidades que detinham um elevado poder

financeiro, como bancos, seguradoras, imobiliárias – conduzindo fundamentalmente à

acumulação das mais-valias em detrimento do desenvolvimento sustentável da cidade.

Caso o município pretendesse intervir em nome do interesse público, necessitava de

expropriá-las, restituindo o valor da localização, não pelo uso existente antes da

aprovação do Plano, mas com as mais-valias que este gerou. Em consequência, o

proprietário, sem fazer nada, mais tarde ou mais cedo, podia colher as mais-valias geradas

pela Administração. Agravando a situação, o governo aprovou uma quarta alteração ao

Código das Expropriações com o Decreto-lei n.º 56/2008,de 4 de Setembro, que assegura

que as mais-valias são integralmente capturadas pelos privados.

Por outro lado, um dos catalisadores na criação de mais-valias de uma localização são os

investimentos públicos. Grandes investimentos – hospitais, universidades, vias

rodoviárias, instalações de eletricidade, gás, água, etc. – permitiam valorizar as áreas

envolventes. Se estes investimentos vêm de fundos maioritariamente públicos, e se os

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proprietários das localizações vão usufruir desses investimentos, torna-se necessário

contribuir para esse desenvolvimento. Torna-se justo que as mais-valias sejam taxadas

consoante uma determinada avaliação que os investimentos públicos geraram naquela

área, garantindo uma parametrização geral. Daqui decorre a redução do valor da

localização, facilitando aos interessados em adquirir o imóvel uma maior liberdade

financeira em investir no mesmo com processos de reabilitação que o valorizem de uma

forma real.

Em Portugal, esta questão é completamente omissa no sistema de planeamento

urbanístico. A singularidade deste sistema é feita destas omissões e traduz-se na adoção

de um modelo perequativo19 em que se assume que as mais-valias são integralmente

apropriadas pelos particulares e se opta por tributar as mais-valias urbanísticas em sede

de IRC (imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas) e de IRS (imposto sobre o

rendimento das pessoas singulares), associando-as a ganhos de capital. Estamos perante

uma confusão entre lucros de uma atividade normal de promoção imobiliária e ganhos

resultantes exclusivamente de decisões da Administração, a qual é reveladora de que, por

via dos Planos Municipais de Ordenamento do Território e de declarações de interesse

público, a Administração Pública gera mais-valias simples que o mercado reconhece, mas

permite que sejam os privados a capturá-las na sua totalidade, revelando-se incapaz de as

recuperar em favor da comunidade (Guinote, 2008).

Na perspetiva de atuar contra a especulação, é preciso definir medidas específicas que

garantam que o uso do solo tem uma orientação na defesa de uma cidade sustentável, e

que o investimento feito na compra da localização é um passo intermedio no investimento

para se conseguir mais-valias no imóvel. Isto inclui a adoção de uma divisão entre o bem

económico e o bem natural, por diferenciação da avaliação do imóvel e pela localização.

Logo, é preciso um processo iterativo entre uma metodologia de avaliação sustentável e

o plano de pormenor, de forma a conseguir uma classificação.

Para isso acontecer, é preciso um algoritmo que classifique as áreas reforçando o plano

de pormenor, transformando-o num dinamizador e não num plano de fiscalização.

Adotando uma iteração, como por exemplo, o MARUS e o plano de pormenor, é possível

19 Decreto-Lei n.º 380/99 de 22 de Setembro, revisto pelo Decreto-Lei n.º 310/203 de 10 de Dezembro; «Princípios da perequação

compensatória dos benefícios e encargos», art. 135º e seguintes.

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97

ter uma base de classificação das localizações para poder realizar a retenção das mais-

valias, de forma a criar uma relação de uniformização das mais-valias consoante a

avaliação.

Este processo não tende a servir de base a uma política tecnocrática, mas exatamente o

oposto. O MARUS tem de servir como instrumento de apoio a orientação política, na

implementação dos pontos de interesse público e no combate à especulação fundiária.

Como se pode ver na Figura 14, o processo tem como objetivo as medidas sustentáveis

da cidade com o intuito de valorizarem, de forma classificativa, determinadas áreas. Deste

modo, com a avaliação sustentável da localização é possível a criação da parametrização

das mais-valias, o que permite, a quem investir no imóvel, ter capital para fazer

investimentos significativos no domínio da reabilitação energética ou uma construção de

domínio social/ambiental.

Figura 14 – Organigrama do modelo dinâmico para os procedimentos urbanísticos

Pelo que foi referido, propõe-se a revisão do atual modelo de seleção de localizações em

Portugal, atribuindo a obrigatoriedade fiscal como fator decisor na escolha da localização

Medidas Sustentáveis

Iteração

Reformulação

Estudo Prévio

MARUS Plano de

Pormenor Apoio Técnico

Decisão

Política

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98

pelos agentes promotores que tenham intenções de realizar operações urbanísticas. No

final da obra deve ser entregue um comprovativo com a classificação do nível de

sustentabilidade da localização, sob a forma de certificado de sustentabilidade, que

poderá servir de base no parâmetro ocupação do solo, no cálculo do IMI20, de acordo com

a Figura 15.

Figura 15 – Classificação e retenção das mais-valias consoante o nível de

sustentabilidade das localizações

Para o nível A+ é atribuído um valor de retenção total das mais-valias por se tratar de

uma localização de interesse local demasiado importante. Com esta retenção permite-se

evitar a expropriação e facilitar a aquisição das localizações por parte do poder local. Os

restantes valores devem ser atribuídos em intervalos constantes, sem nunca exceder o

valor das mais-valias líquidas.

No caso do cálculo do nível de sustentabilidade, existem precedentes a nível nacional que

podem servir de base para o que aqui se propõe. Desta forma, e como referido

anteriormente, é possível, com trabalhos a nível de sustentabilidade no plano de pormenor

e da classificação das localizações a partir do MARUS, efetuar intervalos quantitativos

que permitam agravar ou desagravar a retenção das mais-valias, em que os parâmetros de

avaliação devem ser elaborados e definidos nacionalmente, não promovendo uma falsa

competitividade sustentável, de modo a não criar um caminho de “quem oferece menos

condições”.

20 Fonte: “Taxas e Procedimentos Sustentáveis em Operações Urbanísticas” de Dinis Leitão (2011), que sugere a alteração do atual

IMI por um IMI sustentável.

Maior retenção Total

Menor retenção

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99

4.3. Fundamentação da proposta de alteração

As cidades têm que ter uma harmonia no seu ordenamento. Não é possível haver uma

desorganização entre classificação de solos e ter uma cidade com desenvolvimento

sustentável.

A ideia de ordenamento do território permite a gestão da interação Homem/espaço

natural. Consiste no planeamento das ocupações, no potenciar do aproveitamento das

infraestruturas existentes e no assegurar da preservação de recursos limitados.

Numa urbe, geram-se funções com características próprias de forma a estruturar a sua

utilidade e otimizar cada localização. Desta forma, a malha urbana é o reflexo dessa forma

de organizar o espaço e deve estar ordenada como ilustra a Figura 8.

Figura 16 – Organização dos solos numa cidade

Assim, a malha urbana é delimitada até à zona periurbana da cidade, no sentido de libertar

superfícies para as atividades agrícolas, agroflorestais, florestais e outras. A área

periurbana está localizada para além dos subúrbios de uma cidade. Corresponde a um

espaço onde as atividades rurais e urbanas se misturam, dificultando a determinação dos

limites físicos e sociais do espaço urbano e do rural. Esta resulta da implantação dispersa

do povoamento urbano em meio rural. Aqui, o tecido urbano surge de forma descontínua,

a atividade agrícola é instável, e assiste-se à implantação de indústrias e de alguns

serviços. A generalidade das áreas periurbanas é onde a especulação é mais apetecível,

devido à facilidade em adquirir mais-valias através do licenciamento urbano.

Florestal | Rural | Periurbana | Urbana

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100

As zonas periurbanas são onde a freguesia contempla, pelo menos, um dos seguintes

requisitos 21:

1) O maior valor da média entre o peso da população residente na população total

da freguesia e o peso da área na área total da freguesia corresponde a espaço

urbano, sendo que o peso da área em espaço de ocupação predominantemente

rural não ultrapassa 50% da área total da freguesia;

2) A freguesia integra a sede da Câmara Municipal e tem uma população

residente superior a 5.000 habitantes;

3) A freguesia integra total ou parcialmente um lugar com população residente

igual ou superior a 5 000 habitantes, sendo que o peso da população do lugar

no total da população residente na freguesia ou no total da população residente

no lugar, é igual ou superior a 50%.

Um estudo muito recente, desenvolvido no quadro da cooperação entre os Estados-

Membros da União Europeia em matéria de ordenamento do território e desenvolvimento

urbano, veio evidenciar que a ocupação dispersa das áreas periurbanas e intersticiais é um

fenómeno generalizado no âmbito europeu, que a defesa de padrões de desenvolvimento

urbano mais compacto por parte dos profissionais e das entidades públicas não tem

conseguido contrariar eficazmente (DGOTDU, 2009).

Nesse sentido, é preciso conseguir delimitar a malha urbana até ao perímetro periurbano

para obter uma determinada densidade. Só a partir de uma determinada densificação na

zona urbana e periurbana é que é possível ter transportes, ensino, zonas culturais, etc.,

sustentáveis. Torna-se impossível conseguir uma densidade sustentável se as zonas, na

malha urbana, mantiverem localizações sem utilização ou abandonadas, devido à procura

especulativa. Muito menos lógica teria alargar o perímetro periurbano que diminuiu a

densidade. Desse modo, esta proposta apenas vai incidir no perímetro urbano e

periurbano, com o sentido de capacitar a procura de quem pretende desenvolver a

construção, reconstrução, reabilitação e entidades públicas que pretendam regenerar a

cidade ou reconverter áreas abandonadas em zonas públicas.

21 Fonte: INE, através da deliberação n.º 2717/2009, DR 188, SÉRIE II de 2009-09-28 - 8.ª (2008) deliberação da Secção Permanente

de Coordenação Estatística relativa à tipologia de áreas urbanas

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101

Apesar de as zonas agrícolas e florestais também sofrerem vários ataques especulativos,

esta metodologia não vai abordar as questões da sustentabilidade de zonas agrícolas e

florestais, devido à forte complexidade que envolve questões económicas e ambientais

nacionais e europeias, como também teria que se englobar questões jurídicas, como o

arrendamento forçado ou o banco de terras. Nesse sentido, os únicos pontos que se

referenciam na metodologia, são como tornar possível uniformizar os valores dos solos –

englobando diretamente os solos urbanos e periurbanos e indiretamente os solos florestais

e agrícolas – para que não haja uma migração dos fundos especulativos entre zonas,

conseguindo a densificação através da oferta de condições, levando a uma migração da

população em urbanizações das zonas rurais para as zonas urbanas e periurbanas, devido

ao aumento de qualidade nessas zonas.

No LBPOTU, o resultado da valorização das localizações ficará, em parte, para os

municípios. Ou seja, se uma propriedade rural passa a urbana por ter sido englobada num

plano de pormenor, haverá, quando for alienada, uma taxa adicional sobre o lucro, além

do imposto sobre o rendimento que já incide sobre as mais-valias na venda de imóveis. O

valor em causa irá para um Fundo Municipal de Sustentabilidade Ambiental e

Urbanística, destinado a financiar ações nesta área do concelho. Em estudo está também

a possibilidade de uma fração se destinar a um fundo semelhante, de âmbito nacional,

com o objetivo de compensar, por exemplo, os custos da proteção ambiental em concelhos

com grandes parcelas de áreas naturais classificadas.

O valor suscetível de ser taxado será a mais-valia “pura”, ou seja, aquela que resulta de

um simples ato administrativo, como a aprovação de um plano de pormenor. A

valorização devida a investimentos e construção de infraestruturas não entra no cálculo.

- Fundo municipal de sustentabilidade ambiental e urbanística (n.º 4 do art.º 62.º):

Os municípios devem constituir um fundo municipal de sustentabilidade ambiental e

urbanística, ao qual são afetas receitas resultantes da redistribuição de mais -valias, com

vista a promover a reabilitação urbana, a sustentabilidade dos ecossistemas e a prestação

de serviços ambientais, sem prejuízo do município poder afetar outras receitas

urbanísticas a este fundo, com vista a promover a criação, manutenção e reforço de

infraestruturas, equipamentos ou áreas de uso público.

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102

Apesar de a Lei dos Solos de 1976 prever um fundo como uma mera faculdade, não sendo

este utilizado pelos municípios, pois era um fundo autónomo e não derivado

especificamente de um imposto ou de uma taxa. O novo quadro legislativo vai no sentido

de não fazer uma separação entre os justos lucros do investimento privado ou dos seus

eventuais prejuízos desligando-os das mais-valias. Nestas circunstâncias, o processo pode

resvalar para a criação de mais impostos ou taxas, a pretexto de “tributar mais-valias” e

assim agravar ainda mais o preço do solo.

Para que seja possível uma uniformização de preços é necessário parametrizar as mais-

valias a um nível percentual, de forma a colmatar a diferença de valor do solo entre as

classificações da metodologia. Desta forma, a criação de um fundo, que colete uma parte

maioritária das mais-valias geradas, permite futuramente amortizar parte do valor da

localização especulada, aliviando os encargos financeiros de quem pretende reabilitar ou

regenerar (Figura 17).

Figura 17 – Processo da distribuição das mais-valias

Ao diferenciar as mais-valias geradas no valor de compra, é possível atuar apenas nas

mesmas, de forma a parametrizar a renda do solo através de uma percentagem nas mais-

valias. Ao criar uma percentagem das mais-valias, o proprietário vai continuar a procurar

o valor de venda máximo, o que não acontece caso a caracterização fosse por um limite

monetário. Isso é mais vantajoso, pois quanto maior for o valor de venda, maior é o

contributo para o fundo.

Valor

Reduzido

Valor de

Compra

Mais

Valias

Valor de

Base

Mais -Valias

Impostos Fundo

Preç

o d

e V

end

a

Amortização

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103

De forma mais simples, este fundo permite a substituição do uso de expropriações, que

muitas vezes prejudicam o proprietário da localização e conduz a que muitas das decisões

que o município toma sejam resolvidas judicialmente. No caso das expropriações, como

o valor é tabelado, o proprietário pode ficar a perder em relação ao valor de compra.

Daqui advém que seja necessária uma defesa do direito de propriedade, por aplicação

apenas de taxas nas mais-valias, estabelecendo que o Valor de Base deve incluir:

Preço de compra da localização;

Um ajuste segundo a inflação entre o preço de compra e de venda;

Gastos na manutenção da localização;

Dedução de taxas, multas ou impostos.

Esta medida escamoteia a questão da justa remuneração, pois garante que o proprietário

não seja prejudicado. Ao criar uma separação entre o valor de base e as mais-valias é

possível criar um sistema mais justo do que as expropriações. Isto faz com que haja a

possibilidade de só taxar as mais-valias, definindo os parâmetros acima mencionados

como o Preço de Base e considerando tudo o resto de mais-valias. Para isso, é preciso que

o Valor de Compra da localização tenha uma valorização segundo a inflação, o que

impede a sua desvalorização. Só através do Valor de Compra inicial, com o ajuste da

inflação, é possível ter um Valor de Compra real qualquer que seja o ano. Para assegurar

que existe uma boa gestão do terreno, é preciso cobrir os gastos que o proprietário teve

com a limpeza ou outros, garantindo um incentivo à boa gestão do terreno, utilizando o

Valor de Base para deduções de taxas ou impostos que não foram regularizados ou

execução de multas por desleixo com o terreno.

A fluidez entre a compra e a venda das localizações por interesse municipal pode

aumentar se houver uma alteração no sentido de alargar o conceito de venda forçada,

como a referida no subcapítulo 2.5.2. por Sidónio Pardal. Acelerando o processo de

uniformização do valor dos solos, contrariando a sobrevalorização das localizações

especuladas e reduzindo as oscilações de preços.

Ao especificar as áreas prioritárias que a especulação afeta, e ao admitir uma legislação

que atua de forma similar ao Decreto-Lei n.º 152/82, exercendo uma carga tributária que,

de forma exponencial, desincentiva a especulação e regulariza os preços ao fim de um

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período de tempo. Assim, é possível combater a especulação de uma forma mais

cirúrgica, evitando uma tendência atual de taxar de forma generalizada o Preço de Venda,

o que gera mais encargos às empresas e aos proprietários que pretendam atuar de uma

forma produtiva.

4.3.1. Sistema de taxas

Sendo parcos os recursos disponíveis e enormes os problemas a resolver, importa apelar

à imaginação para produzir novos métodos sustentáveis de gestão dos recursos

disponíveis.

Atualmente, os métodos de gestão dos municípios incidem basicamente em taxar as

propriedades ou proceder à expropriação. Na nova Lei de Base dos Solos a ideia continua

a ser a de taxar de forma geral e não especificar parâmetros sobre quando é que uma

localização está a ser especulativo. Apenas cria uma relação em que, a partir de um

determinado intervalo de tempo, depois da compra da localização, este passa a ser

especulativo. É preciso perceber mais a ideia de especulação.

No XVII Governo Constitucional de Portugal, procedeu-se à descida do IVA de 21% para

5% nos ginásios. Isto levou a que houvesse um aumento no valor da mensalidade dos

ginásios de 16%, sendo esta diferença paga pelos utilizadores. Se taxarmos as mais-valias

dos solos entre 20% e 40% como tem vindo a ser noticiado, esta medida vai levar a uma

subida no valor de venda dos terrenos – de forma direta em pequenos valores de venda e

em percentagens indiretas nas mais altas, o que vai conduzir a um entrave na compra,

conforme pode ser observado na Figura 18.

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105

Figura 18 – Ação da introdução de um imposto de forma geral

Taxar de uma forma geral as mais-valias é simplesmente agravar mais o preço do solo. A

visão de associar o valor total ao lucro dá lugar a uma possível criação de políticas que

desincentivem a reabilitação ou regeneração, devido à criação de mais taxas ou impostos

sobre uma propriedade.

Com taxas elevadas sobre as operações exclusivamente em terrenos, está-se a contribuir

para o alavancar do valor desses terrenos, ou solos rústicos, com consequências diretas

no agravamento do preço dos lotes criados ou dos imóveis para o cliente final, devido ao

elevado preço a que o solo passa a ter que ser comercializado (Leitão, 2011).

Se atualmente o problema no mercado de solos é a sobrevalorização de algumas

localizações prioritários, é necessário tentar aproximar os valores de localizações

prioritárias da uniformização, o mais possível. Só a partir da uniformização de valores é

possível contrariar a tendência de construir na zona periurbana e incentivar ao

investimento na zona urbana.

Preço de

Compra

Preço de

Compra

Mais

Valias

Preço de

Compra

Mais-Valias

Impostos

Mais-Valias

+

Impostos

Preç

o d

e V

end

a

No

vo

Preço

de V

end

a

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106

Para proceder à uniformização é necessário proceder à parametrização, tal como

acontecia entre 1948 e 1965.

Lei n.º 2030, de 2 de junho de 1948 - Artigo 17.º - encargo de mais-valia

1 - Os prédios rústicos não expropriados quando, por virtude de obras de urbanização

ou abertura de grandes vias de comunicação, aumentem consideravelmente de valor

pela possibilidade da sua aplicação como terrenos de construção urbana ficam sujeitos

a encargo de mais-valia, nos termos dos números seguintes. (…)

4 – O encargo da mais valia é de 50% da importância fixada e será pago à entidade

pública que fizer as obras.

Este encargo foi concebido no sentido da justa redistribuição de encargos entre as

entidades públicas e privadas, sendo depois retirado para dinamizar a construção, o que

levou à sobrevalorização dos terrenos na zona urbana. Se atualmente a intenção é

aproximar valores entre estas duas zonas, é necessário que o fundo capte mais de 50% do

valor líquido das mais-valias para cobrir os custos das áreas prioritárias. Caso seja inferior

a 50%, não é possível cobrir os gastos para a uniformização, pois não estaríamos a

proceder a uma descida significativa num período de tempo médio (Figura 19).

Figura 19 – Exemplo da redução do Valor de Compra

Valor

Reduzido

Valor

de

Compra

40%

Valor

de

Compra

60%

60%

Imposto

s

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107

No LBPOTU não está definido o valor da percentagem ficando a sua estipulação sujeita

ao critério intermunicipal e municipal.

Artigo 64.º - redistribuição de benefícios e encargos

6 — (…), os planos territoriais de âmbito intermunicipal ou municipal fundamentam o

processo de formação das mais–valias fundiárias e definem os critérios para a sua

parametrização e redistribuição.

Esta medida, que permite a falsa ideia de competitividade entre municípios, leva a uma

tendência de redução da percentagem de retenção das mais-valias para atrair mais

investimento, levando à subida do Valor de Venda e não atuando na especulação das áreas

prioritárias, razões pelas quais o critério de parametrização deve ser definido a nível

nacional.

Com o intuito de uniformizar o valor das localizações em relação às restantes propõe-se

que o valor deduzido das mais-valias seja colmatado em sede de IRS ou IRC. Sem esta

ação, o proprietário pode ser levado a tentar estabelecer um acordo com o investidor para

capturar esse fundo, como tem acontecido com alguns incentivos à reabilitação,

permitindo ao proprietário uma ação para não disponibilizar a sua localização.

4.3.2. Procedimento administrativo e urbanístico

A LBPOTU introduziu várias novidades que estão agora a ser regulamentadas. Deixa de

existir a figura dos terrenos “urbanizáveis”, que muitos Planos Diretores Municipais

(PDM) previram em exagero, de modo a garantir hipotéticas expansões urbanas.

Atualmente, as propriedades são apenas rústicas ou urbanas.

Porém, os PDM terão maior flexibilidade podendo ser revistos por planos de urbanização

e de pormenor. Qualquer nova operação urbanística terá, no entanto, de provar que é

necessária e economicamente viável.

Outra alteração passa pelo fim do licenciamento prévio para construções, reconstruções

e obras de reabilitação, caso todas as normas urbanísticas estejam já definidas nos planos

municipais. A fiscalização do cumprimento de tais normas será feita durante e depois da

obra, e não antes, como acontecia até à atualidade. O promotor da obra necessita apenas

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108

de apresentar o projeto junto da autarquia e, em oito dias, se não houver oposição, pode

começar a obra.

O fim do licenciamento prévio consta do novo regime jurídico de urbanização e

edificação aprovado em Conselho de Ministros no final de Maio. Outra alteração benéfica

no diploma é o facto de os alvarás de loteamento passarem a estar limitados a um prazo

de dez anos. Ou seja, não será possível ter a posse eterna de um alvará, deixando o terreno

abandonado.

Sendo óbvio que os planos regionais de ordenamento do território (PROT) não devem

definir ou de algum modo regular os perímetros urbanos, a sua expansão ou muito menos

a sua parametrização e disciplina de desdobramento de usos e utilizações, pode sustentar-

se que a planificação do espaço urbano deve ter uma regulamentação preliminar em sede

de Plano Diretor Municipal (PDM), a qual não prescinde de trabalhos de fundamentação

ao nível de estudos urbanísticos de pormenor. Deste modo, o regulamento do PDM pode

ser induzido a partir de estudos de detalhe, o que não deixa de ser problemático quando

dessa forma se estabelecem índices urbanísticos aplicados a manchas, os quais, por sua

vez, servem para legitimar urbanizações confinadas e condicionadas pelos polígonos dos

prédios aos quais se aplicam os índices da mancha, o que é qualitativamente diferente da

aplicação à mancha na sua totalidade, como área globalmente disponível para um

tratamento global de desenho e composição urbana (Pardal, 2006).

O PDM é abusivamente utilizado como uma espécie de sucedâneo do planeamento

urbanístico. Este problema só pode ser resolvido através de um reforço substancial dos

gabinetes de planeamento urbanístico das câmaras municipais, habilitando-os a

desempenhar as principais tarefas de coordenação, conceção e implementação dos planos,

e impondo o primado de um urbanismo conceptual, onde a arte de bem arquitetar, projetar

e construir marque o rumo substantivo dos planos territoriais, sem desprezar a

importância da gestão fundiária e da regulação do mercado imobiliário em geral (Pardal,

2006).

A alteração estrutural do LBPOTU, apesar de confusa, é uma alteração muito positiva.

Contudo, devia assumir um plano partilhado entre o Governo e o Município, o que

exigiria uma estreita cooperação e interação política, administrativa e técnica. Só com

uma estrutura interrelacionada é possível a otimização das áreas a intervir. Para isso, é

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necessário ter em conta o interesse público, valorizando as zonas de maior interesse com

políticas dinâmicas, como foram referidas anteriormente.

Isto significa uma oportunidade para dinamizar a regeneração urbana e, por sua vez, a

reabilitação através da escolha de pontos-chave. Daí a necessidade de um algoritmo que

reforce o plano de pormenor, transformando-o num dinamizador e não num fiscalizador,

servindo de orientação política para a implementação dos PI, de forma a valorizarem a

zona, sob o ponto de vista sustentável.

O objetivo desta dissertação não é conceber esse algoritmo, mas sim elucidar para a

necessidade do mesmo. A instrumentação do MARUS, como ferramenta para articular a

política de habitação com a política de desenvolvimento económico e social, tendo em

vista a promoção do bem-estar social - entendido como satisfação de necessidades sociais

básicas nos domínios da educação, saúde, segurança social e habitação - tem de ser levada

em consideração para evitar acontecimentos de gentrificação.

Emerge aqui a questão do controlo do poder e a alteração dos usos de terrenos com fins

sociais, matéria que tem sido renegada, o que constituiu uma falha fatal em todo o sistema

de planeamento. Este é um dos exemplos que cria conflito entre o planeamento nacional

e municipal.

4.4. Principais limitações

Por se tratar de uma proposta muito teórica, seria necessário desenvolver uma recolha de

dados sobre as diferentes localizações a nível nacional, de forma a criar uma relação que

estabeleça a percentagem com que cada classificação da localização precisa de contribuir

para o fundo, para conseguir que as zonas interiores sejam reduzidas, de modo a justificar

que os cálculos da proposta se baseiem, de uma forma geral, em informações objetivas

quando relacionadas com os custos.

Neste sentido, seria também necessário analisar as menos-valias que uma localização

pode ter, contemplando ainda que a proposta não prejudicasse os proprietários.

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110

Por outro lado, uma das limitações é cingir-se apenas a zonas urbanas e periurbanas,

deixando de fora as zonas agrícolas, agroflorestais e florestais, que também estão sujeitas

a especulação. O prejuízo poderá afetar os municípios que necessitem de um processo de

alargamento.

É ainda importante clarificar a afetação da metodologia de avaliação sustentável das

localizações, pois só esta permite consolidar e relacionar a otimização da área prioritária

com o objeto da intervenção. Devido a este fator, o desenvolvimento da metodologia

condiciona a proposta para aplicação da análise que efetua ao sistema do fundo de

uniformização do valor da localização. Podendo ter diferentes resultados, consoante a

metodologia aplicada.

A omissão de intervir do processo de venda forçada ou de um limite de tempo durante o

qual um proprietário pode ter a licença de urbanizar, sem construir ou sem o rentabilizar

por meio de arrendamento a outros diminui a fluidez. Estes processos tem de ser revistos,

para contrariar a estagnação dos terrenos especulados, para um período razoável de

tempo.

Uma limitação importante à boa implementação de um sistema de cálculo como o que

aqui se desenvolve tem que ver com a inexistência de uma política nacional eficaz, de

estratégia para a gestão e para a utilização do solo. É fundamental que a Lei dos Solos,

atualmente em revisão, possa ser concebida como instrumento específico para ser

aplicado numa realidade social, geográfica e política, observando a estrutura da

propriedade e do povoamento, o comportamento do mercado fundiário e as políticas a

adotar para o sector agroflorestal e para o sistema urbano (Pardal, 2009).

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111

4.5. Aplicação

Importa agora estudar o impacto da aplicação prática da mesma, de forma a explanar o

processo. Desta forma, vai-se desenvolver um exemplo hipotético da proposta na

localização representada na Figura 20. Este caso, realça a importância da implementação

de obras públicas que valorizam as localizações circundantes. É um caso exemplar nos

principais tipos de operações urbanísticas que são efetuadas em Portugal. É importante

perceber também, quais são as consequências e as mais‐ valias da alteração proposta.

Assim, esta localização teve uma mais-valia com a edificação de um campus universitário

nas suas proximidades. Ao implementar o campus, fez com que houvesse uma

valorização dos terrenos nas suas imediações, o que levou a ganhos por parte dos

proprietários sem qualquer tipo de investimento. Nesse sentido, este capítulo vai

demonstrar a coerência dos valores obtidos com a nova expressão de cálculo e para que

seja possível obter e discutir resultados comparáveis, será utilizado o mesmo caso, a

formulação da Lei de Bases do solo de 1976, a aplicação da LBPOTU (com uma

parametrização de 40%) e a proposta da dissertação.

Figura 20 – Caso de uma localização valorizada com uma obra pública

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112

Caso se trata de um caso hipotético, estipula-se que o terreno foi adquirido em 1981 e tem

as seguintes caraterísticas:

Preço de compra da localização: 150 000€

Um ajuste segundo a inflação22: 253.19%

Gastos na manutenção da localização: 76 655€

Dedução de taxas, multas ou impostos: 43 560€

Ir-se-á obter um Valor de Base: 500 000€.

Sabendo que o terreno tem 10 hectares e cada hectare naquela zona ronda os

aproximadamente os 500 000€, logo, tem-se como Valor Global (Valor de Base + Mais-

valias) de 5 500 000€.

No caso da aplicação da Lei de Base do solo de 1976, o proprietário ao vender antes da

LBPOTU ser aplicada, consegue recolher o valor total das mais-valias, já que não possível

parametrizar as mais-valias. Por isso, o proprietário ao vender antes que o processo da

parametrização seja aplicado, consegue adquirir 5 000 000€ das mais-valias. Neste caso,

se vender antes de a LBPOTU entrar em vigor, consegue recolher todas as mais-valias.

Caso a LBPOTU fosse aplicada, o proprietário teria de pagar uma importância fixada, à

entidade pública. Sendo o seu valor de 5 500 000€ e a parametrização das mais-valias

fosse 40%, teria de pagar 2 200 000€ para o Fundo Municipal de Sustentabilidade

Ambiental e Urbanística, tendo:

Valor de Base: 500 000€

Mais-valias para o FMSAU: 2 200 000€

Mais-valias retidas por o proprietário: 3 300 000€

Ao deduzir os gastos do valor base, obtém-se um valor de 2 800 000€

22 Fonte: http://www.pordata.pt/Portugal/Taxa+de+Inflacao+(Taxa+de+Variacao+++Indice+de+Precos+ no+Consumidor)-138

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113

Caso fosse aplicada a proposta da dissertação e a localização em questão tivesse uma

classificação que a condicionava, em taxar as mais-valias simples em 40% para o Fundo

Municipal de Sustentabilidade Ambiental e Urbanística, obter-se-ia:

Valor Base: 500 000€

Impostos (20%): 1 000 000€

Mais-valias liquidas: 4 000 000€

Parametrização das mais-valias (40%): 1 600 000€

Mais-valias líquidas do proprietário: 2 400 000€

Se considerar estes dados como reais, podemos extrapolar que para o proprietário, a

aplicação da proposta não faz com o proprietário saia prejudicado. Em comparação com

os resultados, a proposta da dissertação, apenas taxa mais 10% das mais-valias líquidas

do que no caso da taxação geral que a LBPOTU.

Apesar de não haver diferença no FMSAU da LBPOTU, qual é percentagem revertida

para financiar os gastos públicos, através dos impostos, e qual a quantidade que vai ser

canalizada para o investimento projetos reabilitação e regeneração, não é possível

comparar a quantidade de verba, que é direcionada para estas atividades ou se a verba

disponibilizada por a LBPOTU, consoante o valor do imóvel. Valor esse que pode

aumentar devido a taxação geral das mais-valias segundo a LBPOTU.

No caso da proposta da dissertação, é possível diminuir a discrepância de valores entre as

diferentes zonas (gerando uma homogeneidade de valores entre as diferentes zonas).

Assim, facilita que o investidor tenha folga nos encargos e garante equidade entre

projetos, pois os objetivos já estão estabelecidos segundo os critérios de classificação.

Permitindo a ideia de construir onde tem mais interesses e não onde o terreno é mais

barato.

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115

Capitulo 5 – CONCLUSÃO

5.1. Conclusões

Construir um outro modelo de desenvolvimento do município torna-se imperioso. É

indispensável aproveitar a capacidade instalada, a partir de várias realidades singulares.

Um modelo de desenvolvimento alternativo, construído a partir de políticas participadas

e dinâmicas, em interface interinstitucional, deve constituir uma outra linha de rumo.

Tem-se assistido a um modelo de ampliação de cidade a que não se reconhece coerência

ou articulação urbanística, que surge como um somatório de operações imobiliárias

avulsas em que se evidencia um desenho que não procura “fazer cidade”, antes tirar o

maior partido da rendibilidade especulativa do terreno, favorecendo alguns cidadãos em

detrimento de todos os outros. Esse tipo de gestão e (des)controlo tem feito com que a

cidade cresça em perda de carácter urbano, contrapondo-se ao hipervalorizado centro

histórico uma “periferia” progressivamente mais desqualificada e votada ao

esquecimento. Mas acontece que a “periferia” também é cidade de pleno direito. À

administração compete não negligenciar sectores da cidade no seu sentido lato, mas

pensá-los de uma forma equitativa e articulada, como uma estrutura multipolar em que

todas as partes contribuem para a valorização da urbanidade comum.

O PDM, a que todos os municípios estão obrigados por lei, deveria conter linhas

estratégicas e traduzir no território os seus ideais e a sua fundamentação, não o fez.

Limitou-se a ser um mero instrumento de gestão que tem servido para operacionalizar

ações específicas de iniciativa do Estado e, principalmente para, sem justificação aparente

que não a da mera especulação imobiliária, reclassificar áreas de solo rural em solo

urbano, dando origem a um parque habitacional excessivo, devoluto e em franca

deterioração. Estas têm sido ações que não só não trazem vantagens para o interesse

público como o delapidam, porque obrigam a uma rede infraestrutural que se revela

desmesurada e despesista e, sobretudo, invadem injustificadamente um território que se

poderia manter não edificado. Estas são ações de destruição de património ambiental.

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116

É necessário criar condições espaciais que acolham e promovam um desenvolvimento

integrado socioeconómico no processo de urbanização, o que permita a regulação do

mercado e a retenção de mais-valias. Sem acautelar a disciplina de parametrização e

distribuição das respetivas mais-valias não é possível acautelar um desenvolvimento

sustentável da sociedade.

Por isso, para combater a especulação fundiária, é preciso criar uma divisão entre a

propriedade produtiva e a propriedade improdutiva, isto significa, uma divisão entre a

atuação nas mais-valias do imóvel ou nas mais-valias da localização. Isto não significa,

não taxar um imóvel, antes significa, perceber se queremos um desenvolvimento centrado

em rendas fundiárias ou um desenvolvimento que assenta no desenvolvimento de

qualidade dos nossos imóveis.

Com esta formulação, pode-se combater a especulação e incentivar o investimento dos

imóveis ao mesmo tempo.

A ideia que ressalta no LBPOTU de taxar de forma geral as mais-valias, canalizando para

um fundo de investimento geral, sem delinear áreas prioritárias, é desperdiçar recursos.

Não é investir massivamente em reabilitação e regeneração da cidade que permite um

caminho sustentável. Isto leva a um massacrar a estrutura central da cidade com

intervenções frequentemente superficiais e inadequadas. Estas operações traduzem-se

num desvario de dinheiros públicos e na perda de uma grande oportunidade para regenerar

efetivamente os centros urbanos, pensando-o não apenas como uma atraente cenografia

mas como infraestrutura essencial à cidade.

Por conseguinte, a uniformização dos valores das localizações concede liberdade ao

investidor para dinamizar as zonas urbanas e periurbanas, sendo os municípios em

articulação com as entidades admirativas e técnicas nacionais a promoverem essa

iniciativa.

Nesse sentido, esta dissertação pretende ser um contributo no combate à especulação,

através de uma nova metodologia na parametrização das mais-valias. Com esta nova

metodologia é possível alcançar um processo que dispensasse o uso de mecanismos que

podiam ser demorosos e complexos, simplificando o processo de compensação para um

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117

sistema que articula uma compensação justa e não discriminatória. Esta simplificação,

evita com que o proprietário tenha a necessidade de ações judiciais, pois a localização e

os seus investimentos não perdem valor real.

Com a utilização do processo de parametrização proposto com este trabalho, fica

garantida a justa redistribuição dos encargos fiscais e a criação de fluidez nas transações.

Assim, dota o sistema fiscal, com uma ferramenta capaz de intervir diretamente, como

estimulo a oferta e a procura de áreas prioritárias que são capazes de uma forma

sustentável, dinamizar a cidade. Áreas estas que permitem reverter a tendência esporádica

e descontrolado do alargamento das cidades, fazendo um uso racional dos recursos.

Sendo possível constatar no caso prático, que a diferença de capital taxado entre a

metodologia simples do LBPOTU e a metodologia proposta não difere muito. Essa

diferença é devida a separação entre imóvel e localização, pois o LBPOTU taxa as mais-

valias englobando localização mais imóvel, enquanto a metodologia proposta, faz essa

separação, o que permite, que o imóvel não seja desvalorizado ou afetado, canalizando a

taxação nos ganhos da localização e nunca no imóvel ou nos gastos que o proprietário

teve, garantindo que não será taxado quando teve menos-valias. Canalizando assim, uma

percentagem das mais-valias para a reduzir o preço de localizações sobrevalorizadas.

Isto garante que o desenvolvimento da cidade é cumprido devido a um planeamento

dinâmico que incentive o investidor a desenvolver projetos que sejam do interesse

público.

Só através desta iniciativa e com objetivos definidos, é possível que o investidor tenha

liberdade para realizar um investimento no imóvel sem por em causa o cariz social e

ambiental. De outro modo o crescimento casuístico, ao sabor de um interesse

frequentemente vinculado a interesses particulares, sem que a administração afirmasse a

lógica do interesse público, poderá retomar ao ciclo de sobrevalorização/sobreprodução,

por sua vez, crise imobiliária/financeira.

Concluindo que a boa gestão de incentivos e/ou investimentos devem ter uma bússola

moral no sentido da estabilidade, para não se perpetuar a espada de Dâmocles.

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118

5.2. Perspetivas futuras

A presente dissertação resultou de um estudo que incide sobre a uniformização do valor

das localizações para incentivar o desenvolvimento de políticas promotoras da

reabilitação e da regeneração das cidades.

Para que seja possível esta promoção é necessário um dinamismo de novos

conhecimentos, abrangendo a criação de legislação na avaliação sustentável de

localizações. O desenvolvimento de um algoritmo que possibilita a classificação de áreas

prioritárias é fundamental para incidir sobre as áreas de menor desenvolvimento

sustentável, capacitando os municípios com ferramentas que conjugam aspetos tão

díspares como transportes, áreas verdes por zona, densidade populacional, distribuição de

habitações sociais, etc.. Ao nível legislativo, o desafio é bastante elevado, devido a novos

mecanismos para produção de zonamentos municipais ou intermunicipais, mas,

assumindo-se como uma ferramenta de apoio ao amplo domínio do urbanismo.

Considerar uma metodologia de avaliação sustentável nacional, aplicada por os

municípios, que apenas incide sobre as localizações – distinguindo entre localizações e

imóveis – permite rever o atual urbanismo que manifesta uma progressiva ordem

disfuncional e anacrónico.

A sua implementação deverá ser simulada para o crescimento e amadurecimento de ideias

com vista à eficiência de recursos, necessitará de um novo fluxo de informação, para levar

a uma melhoria da parametrização do coeficiente afeto à localização dos imóveis. Assim,

é fundamental o desenvolvimento de uma relação de valores, entre as localizações a

normalizar. Para isso, é necessário uma recolha de dados de diferentes municípios, de

forma a estabelecer uma relação, entre o proprietário que é taxado na mais-valia e o

investidor que tem uma dedução fiscal no valor da localização, dando a possibilidade, de

adquirir a localização por um valor que não retire investimento no imóvel. Esse estudo,

pode servir também, como meio de comparação entre a nova Lei de Bases do Solo e a

anterior, de forma a saber se a parametrização das mais-valias trouxe benefícios, como

por exemplo, o aumento da fluidez na transação dos solos.

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119

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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Disponível em: http://www.agenda21local.info/index.php?option=com_content&view=

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