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Técnicas comportamentais são ferramentas disponíveis para a intervenção no comporta‑ mento humano visando, de algum modo, modificá‑lo. A tradição comportamentalista, na psicologia aplicada a problemas clínicos, produziu um grande número de técnicas a partir de diferentes proposições teóricas e me‑ todológicas. Como o título deste capítulo su‑ gere, não é nosso objetivo abordar o panora‑ ma atual da análise do comportamento no âmbito clínico. Apresentaremos aqui as técni‑ cas historicamente mais utilizadas na clínica comportamental, desde a fundação do beha‑ viorismo por J. B. Watson, em 1913, até o advento da clínica analítico‑comportamental, na década de 1990. Muitas dessas técnicas se baseiam no paradigma do comportamento respondente (S‑R), como a técnica de exposição, utilizada para fobias e transtornos de ansiedade em ge‑ ral. Outras se originaram nos modelos me‑ diacionais, enfocando variáveis intervenien‑ tes – como é o caso do modelo fisiológico adotado por Joseph Wolpe – e da teoria da aprendizagem social de Albert Bandura. Um pouco mais recentemente, a clínica analítico‑comportamental, baseada no beha‑ viorismo radical e na análise experimental do comportamento, tem se desenvolvido enfo‑ cando a análise das relações funcionais entre o organismo e as variáveis ambientais, com‑ preendendo os estados subjetivos (sentimen‑ tos, emoções e pensamentos) como um modo de relação da pessoa com seu contexto am‑ biental e não como variáveis mediacionais. 3 A heterogeneidade teórico‑filosófica que marca o surgimento do arsenal técnico da clínica comportamentalista ao longo de mais de 80 anos de história requer, por parte dos clínicos, uma reflexão crítica quanto a quais técnicas utilizar, em que momento e de Algumas técnicas tradicionalmente utilizadas na clínica comportamental Thiago P. de A. Sampaio 1 Ana Cristina Kuhn Pletsch Roncati 2 1 Psicólogo colaborador do AMBAN‑IPq‑HC‑FMUSP, professor do curso de psicologia da Universidade Anhembi Morumbi (UAM) e supervisor de estágio clí‑ nico em terapia comportamental do curso de psicologia da Universidade São Judas Tadeu (USJT). 2 Professora e coordenadora do curso de psicologia da Universidade Anhembi Morumbi (UAM). Professora e supervisora de estágio clínico em terapia comportamen‑ tal do curso de psicologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie. 3 Para um aprofundamento sobre a compreensão analítico‑comportamental da subjetividade e dos even‑ tos privados ver: Tourinho, E, Z. Subjetividade e Rela‑ ções Comportamentais. Paradigma: Núcleo de Análise do Comportamento, 2009. 212 p. Uma boa discussão sobre as consequências dessa visão na clínica e das diferenças em relação aos modelos mediacionais encontra‑se em: Costa, N. Terapia analítico‑comportamental: dos fundamentos filosóficos à relação com o modelo cognitivista. Santo André: ESE‑ Tec Editores Associados, 2002, p.79.

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Técnicas comportamentais são ferramentas disponíveis para a intervenção no comporta‑mento humano visando, de algum modo, modificá ‑lo. A tradição comportamentalista, na psicologia aplicada a problemas clínicos, produziu um grande número de técnicas a partir de diferentes proposições teóricas e me‑todológicas. Como o título deste capítulo su‑gere, não é nosso objetivo abordar o panora‑ma atual da análise do comportamento no âmbito clínico. Apresentaremos aqui as técni‑cas historicamente mais utilizadas na clínica comportamental, desde a fundação do beha‑viorismo por J. B. Watson, em 1913, até o advento da clínica analítico ‑comportamental, na década de 1990.

Muitas dessas técnicas se baseiam no paradigma do comportamento respondente (S ‑R), como a técnica de exposição, utilizada para fobias e transtornos de ansiedade em ge‑ral. Outras se originaram nos modelos me‑

diacionais, enfocando variáveis intervenien‑tes – como é o caso do modelo fisiológico adotado por Joseph Wolpe – e da teoria da aprendizagem social de Albert Bandura.

Um pouco mais recentemente, a clínica analítico ‑comportamental, baseada no beha‑viorismo radical e na análise experimental do comportamento, tem se desenvolvido enfo‑cando a análise das relações funcionais entre o organismo e as variáveis ambientais, com‑preendendo os estados subjetivos (sentimen‑tos, emoções e pensamentos) como um modo de relação da pessoa com seu contexto am‑biental e não como variáveis mediacionais.3

A heterogeneidade teórico ‑filosófica que marca o surgimento do arsenal técnico da clínica comportamentalista ao longo de mais de 80 anos de história requer, por parte dos clínicos, uma reflexão crítica quanto a quais técnicas utilizar, em que momento e de

Algumas técnicas tradicionalmente utilizadas na clínica comportamental

Thiago P. de A. Sampaio1 Ana Cristina Kuhn Pletsch Roncati2

1 Psicólogo colaborador do AMBAN ‑IPq ‑HC ‑FMUSP, professor do curso de psicologia da Universidade Anhembi Morumbi (UAM) e supervisor de estágio clí‑nico em terapia comportamental do curso de psicologia da Universidade São Judas Tadeu (USJT).2 Professora e coordenadora do curso de psicologia da Universidade Anhembi Morumbi (UAM). Professora e supervisora de estágio clínico em terapia comportamen‑tal do curso de psicologia da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

3 Para um aprofundamento sobre a compreensão analítico ‑comportamental da subjetividade e dos even‑tos privados ver: Tourinho, E, Z. Subjetividade e Rela‑ções Comportamentais. Paradigma: Núcleo de Análise do Comportamento, 2009. 212 p.

Uma boa discussão sobre as consequências dessa visão na clínica e das diferenças em relação aos modelos mediacionais encontra ‑se em: Costa, N. Terapia analítico ‑comportamental: dos fundamentos filosóficos à relação com o modelo cognitivista. Santo André: ESE‑Tec Editores Associados, 2002, p.79.

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2 Borges, Cassas & Cols.

SAMPAIO, T. P. de A.; RONCATI, A.C.K.P. Algumas técnicas tradicionalmente utilizadas na clínica comportamental. In: BORGES, N.B; CASSAS, F.A. Clínica analítico-comportamental: aspectos teóricos e práticos. Porto Alegre : Artmed, 2012.

que forma fazê ‑lo. Ter clareza da função que a aplicação de uma técnica terá no processo te‑rapêutico, traçado a partir da abordagem que estabelece as referências para sua conduta, é condição necessária para o trabalho do clíni‑co, sob pena de incorrer em uma prática eclé‑tica inconsistente e ineficiente. Nesse sentido, a clínica analítico ‑comportamental estabelece a avaliação funcional do comportamento, e não o diagnóstico nosográfico, como elemen‑to base para a intervenção técnica. Nesse sen‑tido, cabe aqui o alerta de Banaco (2001) so‑bre a utilização de técnicas na clínica analítico‑‑comportamental:

As técnicas comportamentais são boas, são vá‑lidas, são úteis. Mas precisam ser empregadas num contexto terapêutico, e seu emprego ser decorrente da análise funcional [leia ‑se avalia‑ção funcional], formulada por um profissional habilitado para isso. (Banaco, 2001, p. 81)

Apresentaremos, a seguir, as origens de algumas das técnicas tradicionalmente mais utilizadas por clínicos de orientação compor‑tamentalista, procurando, mais do que forne‑cer os subsídios práticos elementares para a aplicação destas, explicitar os pressupostos e teorias a elas subjacentes. Para quem busca o passo a passo dos procedimentos aqui apre‑sentados, fazemos algumas sugestões de leitu‑ra no final do capítulo.

> As origens dAs técnicAs comportAmentAis

Podemos considerar que as intervenções clí‑nicas baseadas em teorias comportamentais tiveram início na década de 1920, com o fa‑moso estudo de Mary Cover Jones, conheci‑do como o caso do “Pequeno Peter” (Jones, 1924). Esse foi o primeiro trabalho utilizan‑do princípios baseados no condicionamento clássico (pavloviano) para o tratamento das fobias. Jones utilizou a associação de estímu‑

los com funções respondentes opostas, a fim de eliminar um condicionamento aversivo anterior que, presumivelmente, deflagrara o quadro fóbico de Peter (um garoto de 8 anos com fobia de coelhos). As sessões, que eram diárias e ocorreram durante dois meses, en‑volviam a aproximação gradativa do coelho (estímulo fóbico) associado a estímulos que eliciavam respostas prazerosas, como alimen‑to e brinquedos. No final do tratamento Pe‑ter conseguiu se aproximar e tocar o coelho, não apresentando nenhum sintoma de medo ou ansiedade.

O princípio de contracondicionamento pavloviano ou inibição recíproca foi utilizado por Jones para explicar a eliminação da res‑posta de medo. Defendendo a necessidade de pareamento com um estímulo eliciador de resposta oposta ao medo, Jones chegou a afir‑mar que a apresentação repetida do objeto te‑mido, sem qualquer tentativa auxiliar de eli‑minar o temor, seria provavelmente mais ca‑paz de produzir um efeito de “somação” do que uma adaptação4. Curiosamente, a pri‑meira proposta formal mais estruturada de utilização clínica dos princípios de contra‑condicionamento para o tratamento das fo‑bias surgiu somente no final da década de 1950, na África do Sul, com o trabalho do psiquiatra Joseph Wolpe em Psicology by reci‑procal inhibition (Wolpe, 1954; 1958). Se‑gundo o próprio autor:

A explicação para isso é que a terapia moderna é uma ciência aplicada; e a terapia comporta‑mental não poderia entrar no mundo das ciên‑cias antes que tivesse embasamento suficiente nos estudos básicos de laboratório experimen‑tal. (Wolpe, 1978, p. 17)

4 A crença na necessidade da utilização de estímulos pra‑zerosos associados ao estímulo fóbico para que as sessões de exposição produzissem a eliminação da fobia através do processo de contracondicionamento foi desafiada por trabalhos empíricos, 50 anos depois do experimento de Jones, conforme apresentado mais adiante no texto.

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Clínica analítico ‑comportamental 3

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Wolpe conceitualizou e descreveu os procedimentos da técnica de Dessensibiliza‑ção Sistemática (DS). A técnica demonstrou bons resultados no tratamento das fobias e passou a ser estudada em ensaios clínicos con‑trolados e utilizada em larga escala a partir da década de 1960.

Concomitantemente ao desenvolvi‑mento da DS e de outras técnicas baseadas no paradigma respondente, a abordagem com‑portamental também se desenvolvia rapida‑mente em contextos institucionais como es‑colas, asilos e hospitais, utilizando operações e processos comportamentais operantes como o reforço, a punição, a extinção e o controle de estímulos, visando a eliminação de com‑portamentos socialmente indesejáveis e a am‑pliação de um repertório que produzisse mais reforçadores sociais a curto, médio e longo prazos, em indivíduos institucionalizados. Surge, assim, uma nova área da clínica com‑portamental, caracterizada pela utilização de técnicas operantes, que ficou conhecida como Análise Aplicada do Comportamento (am‑plamente reconhecida como Modificação do Comportamento). Segundo Alvaréz (1996), os principais procedimentos técnicos desen‑volvidos nessa área foram:

1. procedimentos de aquisição e aumento de frequência de comportamentos;

2. procedimentos de redução ou extinção de comportamentos;

3. procedimentos de autocontrole; além de técnicas de biofeedback e de condiciona‑mento encoberto.

Nessa mesma época, outra influência importante no surgimento de novas técnicas na clínica comportamental foi a teoria da aprendizagem social de Albert Bandura (1961; 1973/2009). Baseado em evidências experimentais de que a observação de mode‑los poderia influenciar a conduta humana, Bandura usou os conceitos de aprendizagem

vicariante e modelação5, para se referir à ca‑pacidade de aprendizado de novos comporta‑mentos através da observação.

Serão apresentadas, a seguir, algumas das técnicas comportamentais mais utilizadas na clínica, enfocando os processos comporta‑mentais nelas envolvidos e separando ‑as de acordo com seus paradigmas de origem. Apre‑sentaremos técnicas baseadas no paradigma respondente (Dessensibilização Sistemática, Exposição com e sem Prevenção de Resposta e Inundação); no paradigma operante (Modela‑gem e Economia de Fichas); e na teoria da aprendizagem social (modelação). Incluímos também a Resolução de Problemas e o Treino de Habilidades Sociais, que envolvem recursos técnicos oriundos dos diferentes paradigmas.

> técnicAs AplicAdAs A clientes com problemAs relAcionAdos à AnsiedAde: dessensibilizAção sistemáticA, exposição, prevenção de respostA e inundAção.

dessensibilização sistemática

A técnica de Dessensibilização Sistemática (DS) consiste basicamente em apresentar o estímulo fóbico (na imaginação ou ao vivo) em um contexto de relaxamento (geralmente induzido pela técnica do relaxamento muscu‑lar progressivo, ver Jacobson, 1938 citado em Wolpe, 1978). Segundo Wolpe (1958), a ati‑

5 Os termos “vicário” e“vicariante” são utilizados na me‑dicina para designar o órgão que por meio de seu pró‑prio funcionamento supre a insuficiência funcional de outro. É no sentido de ser um aprendizado pela experi‑ência do outro que Bandura adota esses termos para se referir à aprendizagem por observação ou modelação (Bandura, 1979).

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4 Borges, Cassas & Cols.

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vação parassimpática, produzida pelo exercí‑cio de relaxamento, produz uma inibição das respostas autônomas eliciadas pelo estímulo fóbico. Esse processo fisiológico chamado “Inibição Recíproca” fora descrito por Sher‑rington (1906) e, posteriormente, adotado por Wolpe como explicação neurofisiológica da DS:

Se é possível produzir uma resposta antagôni‑ca à ansiedade na presença de seus estímulos eliciadores, de modo que seja acompanhada por uma completa ou parcial supressão das respostas de ansiedade, a conexão entre esses estímulos e as respostas por eles eliciadas será debilitada. (Wolpe, 1958, p. 71)

Descrita de maneira sintética por Tur‑ner (1996), a estrutura dos procedimentos da técnica de DS contém quatro passos princi‑pais:

1. Treinamento no emprego da escala de uni‑dade subjetiva de desconforto “SUDS”.

2. Uma completa análise comportamental, e o desenvolvimento de uma hierarquia de medos.

3. Treinamento de relaxamento. 4. Exposição na imaginação durante estado

de relaxamento.

Elemento fundamental para a constru‑ção da hierarquia de exposição à escala SUDS, desenvolvida por Wolpe (1958) como um meio de transformar a magnitude da resposta ansiosa do paciente em algo que pudesse ser subjetivamente mensurado, consiste em uma escala contínua de 0 a 100, na qual os pontos extremos da ansiedade mais intensa (100) até a situação mais tranquila e segura para o indi‑víduo (0) são estabelecidos como referências para a avaliação de todas as situações a serem abordadas. Organiza ‑se, a partir disso, uma hierarquia para que a exposição seja realizada sempre de forma gradativa, da situação me‑nos para a mais geradora de desconforto. A

DS foi desenvolvida primeiramente utilizan‑do a exposição do paciente a cenas imagina‑das, mas a exposição direta às situações “ao vivo” passou logo a ser utilizada com maior frequência, mostrando bons resultados.

exposição e prevenção de resposta

Atualmente, é possível dizer que a DS foi, de certa forma, substituída por outra técnica. Diversos estudos na década de 1970 demons‑traram ser o treino em relaxamento um as‑pecto irrelevante da intervenção na DS, sen‑do a exposição duradoura e sistemática (de preferência ao vivo) o único fator essencial para a redução da resposta ansiosa (Delprato, 1973; Kazdin e Wilcoxon, 1976; Lader e Matthew, 1968; Marks, 1981; Waters, McDonald e Koreska, 1972; Watts, 1979 ci‑tado em Turner, 1999).

Esses trabalhos demonstraram que a ex‑posição prolongada produzia, por si só, a ex‑tinção ou habituação6 da resposta de medo ou ansiedade, questionando de maneira deci‑siva a proposta de Jones e Wolpe de que o processo comportamental e o substrato neu‑rofisiológico do tratamento das fobias fos‑sem, respectivamente, o contracondiciona‑mento e a inibição recíproca.

As indicações e procedimentos para a aplicação da técnica de exposição são os mes‑mos da DS. Entretanto, na Técnica de Expo‑sição não é realizado relaxamento durante as sessões, procurando ‑se manter o paciente ex‑posto ao estímulo eliciador de desconforto, enquanto toda e qualquer resposta de fuga ou

6 O termo habituação é mais amplamente utilizado por clínicos, sem discriminar a natureza condicionada ou incondicionada do estímulo fóbico. Entretanto, é im‑portante ressaltar que o processo de habituação ocorre quando há atenuação da resposta emocional diante de um estímulo eliciador incondicionado. Quando o estí‑mulo é condicionado, o processo envolvido é o de extin‑ção respondente.

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Clínica analítico ‑comportamental 5

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esquiva (abertos ou encobertos) são impedi‑das, até que a resposta emocional seja signifi‑cativamente atenuada.

A Prevenção de Resposta, nome dado aos procedimentos de bloqueio da fuga/es‑quiva durante a exposição, é muito utilizada em casos de transtorno obsessivo ‑compulsivo (TOC). Nesses casos, as respostas a serem im‑pedidas durante a exposição são as compul‑sões (operantes que aliviam o desconforto produzido pela situação). Esse procedimento é importante porque, durante uma sessão de exposição, o único fator responsável pela re‑dução da resposta emocional deve ser o tem‑po de exposição. Os exercícios são feitos siste‑maticamente (de preferência todos os dias), até que aquela situação não gere mais descon‑forto e se possa avançar ao próximo item da hierarquia.

É importante ressaltar que a técnica de exposição deve ser utilizada com muito cui‑dado e parcimônia, podendo até agravar o quadro clínico que pretende tratar, caso seja mal conduzida. Sem uma avaliação profissio‑nal cuidadosa do contexto, das funções dos comportamentos envolvidos no problema, do repertório comportamental da pessoa e dos prejuízos trazidos pelos sintomas, essa in‑tervenção técnica pode, além de ser ineficaz, acarretar em sentimentos indesejáveis, prejuí‑zos na relação terapêutica e na adesão ao pro‑cesso clínico.

inundação ou terapia implosiva

Considerada, na prática, uma variação da téc‑nica de exposição, a Inundação (ou terapia implosiva) parece ter sido desenvolvida empi‑ricamente, diretamente na clínica, o que tor‑na controversa a literatura sobre suas origens teóricas. Rourke e Levis (1996) citam O. H. Mowrer, com sua teoria dos dois fatores do aprendizado de evitação, como embasamento teórico da Inundação. Entretanto, em Zoell‑ner e colaboradores (2003) encontramos a te‑

oria do processamento emocional de Rach‑man, a proposta baseada na interferência re‑troativa de Bouton e a teoria da autoeficácia de Bandura como as três principais proposi‑ções teóricas que explicam a técnica. A des‑peito das divergências em relação a suas ori‑gens teóricas, a eficácia da técnica de Inunda‑ção em diversos transtornos de ansiedade está bem documentada (Zoellner et. al., 2003)

Na Inundação não há hierarquização de situações e a exposição é feita diretamente a estímulos geradores de um alto grau de ansie‑dade ou medo. A utilização dessa técnica é muito questionada e relativamente pouco utilizada, principalmente por ser ainda mais aversiva que a exposição gradativa. Geral‑mente, sua utilização é justificada pela impos‑sibilidade em encontrar situações intermediá‑rias que produziriam uma resposta emocional de menor magnitude, impedindo uma abor‑dagem gradual.

> técnicAs operAntes: modelAgem e economiA de FichAs

modelagem

O condicionamento operante consiste no au‑mento da probabilidade de uma resposta ser emitida quando a mesma é seguida por determinada(s) consequência(s), as quais re‑ceberão o nome de reforçadores por produzi‑rem tal efeito. Considerando que uma respos‑ta que não é emitida não pode ser reforçada, em alguns casos, antes de pensarmos em um programa de reforço, temos que criar condi‑ções para que a resposta ocorra. Nessas situa‑ções, podemos empregar a modelagem, nome dado ao procedimento de reforço diferencial de aproximações sucessivas.

Uma vez definida a resposta ‑alvo, aque‑la que não é emitida pelo indivíduo, o proce‑dimento da modelagem consiste em reforçar

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6 Borges, Cassas & Cols.

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diferencialmente (diferenciação) respostas que se aproximem cada vez mais dessa resposta ‑alvo (aproximação sucessiva). Se‑gundo Skinner (2003), reforçando uma série de aproximações sucessivas podemos conse‑guir uma alta probabilidade de uma resposta rara ou que não existia no repertório do indi‑víduo.

Na utilização da modelagem, devemos considerar uma escala de respostas que serão diferencialmente reforçadas, isso significa que, em estágios sucessivos, algumas respos‑tas serão reforçadas e outras não. Começamos por respostas mais distantes, aquelas que ape‑sar de se parecerem menos com a resposta‑‑alvo já se encontram presentes no repertório do indivíduo. Aos poucos, deixamos de reforçá ‑las e passamos a reforçar alguma ou‑tra resposta, que se pareça um pouco mais com a resposta ‑alvo, assim sucessivamente, até que o indivíduo emita a resposta ‑alvo, possibilitando que a mesma seja reforçada.

Embora a descrição do procedimento seja bastante simples, não podemos subesti‑mar os cuidados na sua execução. A possibili‑dade de sucesso em alcançar a resposta ‑alvo está relacionada com a precisão na seleção e no reforço das respostas que dela se aproxi‑mam sucessivamente.

O procedimento de modelagem é utili‑zado informalmente em várias situações do dia ‑dia. Toda criança tem seu repertório ver‑bal modelado por aqueles que convivem com ela. A comunidade verbal da criança, mesmo sem saber, realiza um procedimento de refor‑ço diferencial de aproximações sucessivas (modelagem). Um exemplo disso é quando os pais de uma criança de 3 anos começam a exigir que ela diga “Quero um copo d´água, por favor” para que seja reforçada, colocando em extinção as outras respostas que, até aque‑le momento, produziam o copo d’água para a criança, como um simples “Qué ága!” ou “Tô com sede!”. Vale destacar que a modelagem é a grande responsável pelo refinamento de ha‑

bilidades em um repertório operante. Se o re‑forço não fosse diferencial, qualquer topogra‑fia, e não só a mais refinada, seria suficiente para a obtenção do reforço, e a criança de nosso exemplo provavelmente continuaria a falar como antes. Isso ocorreria por período indefinido até que outros ambientes (p.ex., escola, amigos, casa dos avós, trabalho) res‑tringissem essa classe funcional a uma menor diversidade de respostas.

A modelagem é utilizada em muitas si‑tuações clínicas, com especial destaque para a relação terapêutica (ver Kohlemberg e Tsai, 2001), a clínica infantil, a orientação de pais, o treino em habilidades sociais e os métodos de ampliação de repertório operante de crian‑ças com desenvolvimento atípico (Thurkow e Cain, 2009).

economia de FichasA Economia de Fichas (EF) foi desenvolvida por Ayllon e Azrin, por volta de 1968, em trabalhos realizados com pacientes interna‑dos em instituições psiquiátricas e, desde en‑tão, tem sido utilizada em inúmeros contex‑tos e se revelado uma técnica útil na modifi‑cação de comportamentos de pessoas ou grupos (Patterson, 1996).

A EF se baseia em pressupostos do con‑dicionamento operante e consiste, basica‑mente, na apresentação de fichas como refor‑çadores imediatos que serão trocadas por ou‑tros reforçadores posteriormente.

A diversidade de aplicações da EF é muito grande. Na clínica, é bastante utilizada com crianças7, mas também é útil em am‑bientes hospitalares, enfermarias, asilos e até empresas8, além de creches e escolas.

7 Uma ilustração interessante da utilização de economia de fichas com crianças, utilizando quadros e escalas, pode ser encontrada em vários episódios da série de TV “Super Nanny”.8 Um bom exemplo de utilização da EF pode ser encon‑trado em Borges (2004).

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Clínica analítico ‑comportamental 7

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Cartões carimbados em restaurantes e selos retirados da tampa das embalagens de pizzas delivery são bons exemplos da utiliza‑ção comercial dos princípios da economia de fichas. Essa estratégia de controle do comportamento do consumidor visa au‑mentar a frequência com que o cliente esco‑lhe um determinado produto, serviço ou es‑tabelecimento comercial. Após algumas emissões da resposta (geralmente 10 vezes, nos exemplos citados), o cliente pode trocar as “fichas” (selos retirados da tampa ou ca‑rimbos em um cartão) por uma refeição ou uma pizza grátis. Podemos considerar, de maneira informal, que a própria dissemina‑ção dessa prática em restaurantes por quilo e pizzarias é um bom indício da efetividade desse procedimento, utilizado quando não é possível ou desejável reforçar diretamente todas as emissões de um operante com o es‑tímulo reforçador que originalmente o con‑trola.

A aplicação clínica da EF deve contem‑plar alguns pontos, tais como

1. a identificação precisa dos comportamen‑tos a serem modificados ou instalados;

2. a definição dos reforçadores disponíveis no ambiente;

3. o estabelecimento das fichas como refor‑çadores condicionados;

4. o conjunto de regras que estabelecem as inter ‑relações entre os comportamentos específicos que obtém as fichas e os refor‑çadores pelos quais as fichas poderão ser trocadas (Kazdim e Bootzin, 1972; Patter‑son, 1996).

Os programas devem ser delineados considerando as características dos indivídu‑os ou grupos aos quais serão aplicados e, por essa razão, podem variar em diferentes deta‑lhes, por exemplo, na forma de apresentação do reforçador condicionado (fichas, quadros e escalas).

> umA técnicA bAseAdA nA teoriA dA AprendizAgem sociAl: modelAção

modelaçãoO uso da modelação como técnica para mo‑dificação do comportamento se iniciou no fi‑nal da década de 1950 e início da de 1960, baseada na premissa de que os seres humanos podem aprender novos comportamentos por meio da observação e imitação (Naugle e Sherrie, 2003). Albert Bandura (1961) de‑monstrou experimentalmente que crianças que eram expostas a modelos adultos agressi‑vos apresentavam mais comportamentos agressivos do que as que observavam modelos não agressivos ou não observavam nenhum modelo. A partir de então, surgiram muitos estudos baseados na teoria da aprendizagem social, buscando compreender o aprendizado de novas topografias (incluindo respostas emocionais) por observação. Os processos envolvidos nesse tipo de aprendizagem são chamados vicários e dão sustentação teórica e metodológica à técnica de modelação.

Uma das funções da modelação na clí‑nica é facilitar a aquisição de comportamen‑tos, envolvendo, pelo menos, o comporta‑mento de um modelo e o comportamento de um observador. A tarefa do modelo é de‑monstrar o comportamento ‑alvo. Essa de‑monstração pode ocorrer em uma situação real no ambiente natural da pessoa, ao vivo na sessão terapêutica ou por meio de recursos áudio ‑visuais como vídeos e livros. O proce‑dimento envolve etapas como avaliação dos déficits comportamentais e identificação dos comportamentos ‑alvo, apresentação do mo‑delo, feedback e reforço do comportamento‑‑alvo.

A modelação tem sido utilizada para treinar habilidades de comunicação e habili‑dades cotidianas, assertividade e solução de problemas, entre outros comportamentos,

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8 Borges, Cassas & Cols.

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em diferentes populações (Naugle e Sherrie, 2003).

> procedimentos que envolvem recursos técnicos oriundos de diFerentes pArAdigmAs: resolução de problemAs e treino em hAbilidAdes sociAis

resolução de problemas

Segundo Lombardo e colaboradores (2005), os objetivos gerais da RP incluem:

1. diminuição do impacto “negativo” (estres‑se emocional) relacionado à experiência de eventos vitais e problemas de diferentes magnitudes (desde a perda de uma cartei‑ra até um divórcio ou uma doença crôni‑ca);

2. aumentar a habilidade de lidar com esses problemas; e

3. minimizar a probabilidade de problemas similares no futuro.

A Resolução de Problemas (RP) pode ser utilizada em qualquer caso que se identifi‑que dificuldades em lidar com situações “pro‑blemáticas”, principalmente quando essas são fontes de estresse significativo para o indiví‑duo. Diversas estratégias podem ser aplicadas para que os objetivos da RP sejam alcança‑dos:

1. Treinamento em orientação ao problema: Algumas das técnicas utilizadas para favo‑recer comportamentos de enfrentamento dos problemas são: o role play (desempe‑nho de papéis – o clínico pode trabalhar com a troca dos papéis a serem representa‑dos de acordo com o objetivo específico da

intervenção, podendo assumir uma postu‑ra pessimista, por exemplo, favorecendo a identificação do cliente com seu padrão de comportamento frente aos problemas da vida); a Avaliação de Regras que partici‑pam do controle dos comportamentos ine‑ficazes; a Visualização (o paciente fecha os olhos e se imagina resolvendo um proble‑ma com sucesso); a Identificação do Pro‑blema quando ele aparece.

2. Treinamento em definição e formulação do problema: O primeiro passo em um algo‑ritmo para a solução de qualquer proble‑ma, seja uma questão da prova de física ou a perda de um compromisso importante, é sua adequada formulação. No próprio trabalho clínico, quando um clínico ela‑bora um plano de intervenção para seu cliente, ele precisa, primeiramente, de uma boa formulação do(s) compor ta men‑to(s) clinicamente relevante(s), para que sua intervenção seja efetiva. O mesmo vale, por exemplo, para um estudante de psicologia que escolhe como tema de seu trabalho de conclusão de curso a “terapia comportamental”. Se ele não tiver um problema bem formulado sobre esse tema, não há pesquisa, no sentido de que não se sabe qual é exatamente a questão a ser re‑solvida pela pesquisa.

3. Treino na geração de alternativas (brains‑torm): Técnica muito utilizada nas agên‑cias de publicidade, a “tempestade de ideias” consiste em gerar ideias, sem censurá ‑las, para depois, em um segundo momento, avaliar a validade de cada uma para a solução daquele problema específi‑co. Quanto mais ideias aparecerem maior a chance de encontrar uma que solucione a questão.

4. Treino na tomada de decisões (TD): O ob‑jetivo é que a decisão seja mais racional e ponderada, e menos impulsiva. A partir da lista gerada na “tempestade de ideias”, conduz ‑se uma avaliação de custo e bene‑

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Clínica analítico ‑comportamental 9

SAMPAIO, T. P. de A.; RONCATI, A.C.K.P. Algumas técnicas tradicionalmente utilizadas na clínica comportamental. In: BORGES, N.B; CASSAS, F.A. Clínica analítico-comportamental: aspectos teóricos e práticos. Porto Alegre : Artmed, 2012.

fício de cada alternativa levantada. Solicita‑‑se ao indivíduo que elabore uma tabela enumerando os prós e contras de cada al‑ternativa, seguida da atribuição de valores que representem a importância de cada consequência (normalmente se utiliza uma escala simples de 0 a 10). Somam ‑se os prós e contras de cada alternativa e compara ‑se a diferença entre as médias obtidas em cada alternativa, chegando as‑sim àquela cujos prós foram considerados maiores que os contras.

5. Treino em solução, implementação e verifi‑cação: Etapa final da solução de um pro‑blema, após a formulação e a preparação de um plano, consiste na realização deste e posterior avaliação dos resultados. Pode ser usada a mesma tabela de tomada de decisão para avaliar efetivamente quais fo‑ram as consequências boas e as ruins da es‑tratégia adotada.

treino em habilidades sociais

Amplamente utilizado em condições clínicas diversas (transtornos de ansiedade social, es‑quizofrenia, problemas conjugais e proble‑mas de relacionamento em geral), o objetivo do THS é promover a ampliação do repertó‑rio operante necessário para a obtenção de re‑forçadores no contexto social do indivíduo. Para isso, é fundamental que o clínico faça uma análise acurada do contexto social em que o cliente está inserido, para identificar quais os conjuntos de habilidades que propi‑ciarão um desempenho social efetivo.

Uma definição genérica de comporta‑mento socialmente habilidoso é oferecida por Caballo (1986, p. 365):

O comportamento socialmente habilidoso é esse conjunto de comportamentos emitidos por um indivíduo em um contexto interpesso‑al que expressa os sentimentos, a atitude, os desejos, as opiniões ou os direitos desse indiví‑

duo, de um modo adequado à situação, respei‑tando esses comportamentos nos demais, e que geralmente resolve o problema imediato da situação, enquanto minimiza a probabili‑dade de futuros problemas.

Entretanto, não existe um padrão topo‑gráfico específico para o comportamento que via de regra é chamado socialmente habilido‑so. O que é adequado em um contexto pode não produzir muitos reforçadores em outros (p.ex., a postura e o linguajar despojado com os quais um adolescente interage adequada‑mente com seus amigos, pode não produzir muitos reforçadores no almoço em que está conhecendo os pais de sua nova namorada).

Segundo Linehan (1984), o comporta‑mento socialmente habilidoso é definido fun‑cionalmente, devendo produzir três consequ‑ências:

1. o reforçador específico para aquela respos‑ta (p.ex., se meu objetivo é ser atendido por um garçom em um restaurante, o comportamento socialmente habilidoso deverá produzir a vinda do garçom até a mesa);

2. reações públicas e privadas nas pessoas com as quais interage, que melhorem ou mante‑nham uma boa relação com elas (p.ex., conseguir um garçom sem ofendê ‑lo e sem constranger as outras pessoas à mesa);

3. sentimentos de autoestima e autorrespeito no próprio indivíduo.

Del Prette e Del Prette (1999) destacam ainda, como uma consequência do compor‑tamento socialmente habilidoso, a manuten‑ção ou ampliação dos direitos humanos so‑cialmente estabelecidos, ressaltando também que o peso relativo atribuído a cada uma des‑sas consequências não está consensualmente estabelecido entre pesquisadores e profissio‑nais da área. Na clínica, é importante a indi‑cação e validação do cliente de quais são as consequências mais relevantes para ele. Para

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10 Borges, Cassas & Cols.

SAMPAIO, T. P. de A.; RONCATI, A.C.K.P. Algumas técnicas tradicionalmente utilizadas na clínica comportamental. In: BORGES, N.B; CASSAS, F.A. Clínica analítico-comportamental: aspectos teóricos e práticos. Porto Alegre : Artmed, 2012.

isso ele deve ser capaz de descrever o que es‑pera de suas relações interpessoais.

Um termo amplamente utilizado para se referir ao componente básico do compor‑tamento socialmente habilidoso, cunhado por Wolpe e Lazarus (1966, citado em Del Prette, 1999), é assertividade. Um dos ele‑mentos principais do THS é o treino asserti‑vo, que visa o desenvolvimento de um reper‑tório capaz de produzir as consequências des‑critas anteriormente como definidoras de comportamento socialmente habilidoso, em diferentes contextos sociais.

De maneira geral, conforme descrito por Duckworth (2003), o THS dispõe de um conjunto de técnicas utilizadas visando o de‑senvolvimento de um repertório social que inclua9:

1 Assertividade: definição e discriminação de padrões de comportamento passivo, as‑sertivo e agressivo; a “racional” para o uso do comportamento assertivo e utilização do role ‑play.

2 Aspectos molares: iniciar e manter con‑versação, controle de estímulos (adequa‑ção da ação ao contexto).

3 Aspectos moleculares: olhar (onde, como, por quanto tempo), expressão facial (har‑monia com a mensagem), gestos, postura, orientação, distância e contato físico, vo‑lume e entonação da voz, fluência, tempo de fala e conteúdo.

Existem muitas outras técnicas tradicio‑nalmente utilizadas na clínica comportamen‑tal. O escopo geral do capítulo exigiu uma se‑leção baseada em critérios, como a experiên‑cia clínica dos autores e a alta frequência de utilização dessas técnicas pelos clínicos de orientação comportamentalista em geral, que

não deixa de ser uma eleição pessoal e, até certo ponto, arbitrária. Entretanto, espera‑mos que, a partir dessa leitura, seja possível obter um panorama de algumas das princi‑pais técnicas comportamentais, estimulando o leitor na busca, a partir do próprio texto e das sugestões de leitura, por referências mais específicas, para um maior aprofundamento e para uma descrição mais minuciosa das técni‑cas apresentadas.

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Clínica analítico ‑comportamental 11

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