Alianças e Coalizões Internacionais do Governo Lula, o IBAS e o G2

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    Alianas e coalizes internacionais do governo Lula:o Ibas e o G-20

    Alliances and Coalitions in the Lula Administration:An analyisis of Ibsa and G20

    MARCELO FERNANDES DE OLIVEIRA*

    Introduo

    Nos ltimos anos, o ambiente internacional tornou-se mais turbulento etenso, inaugurando um perodo de transformaes nas orientaes polticas eeconmicas prevalecentes nos anos 90. Do lado poltico, aps a emergncia daadministrao G. W. Bush e dos atentados terroristas, os Estados Unidospassaram a acentuar o vis unilateral do exerccio da sua poltica externa.Evidenciaram, inclusive, a disposio em utilizar o ataque preventivo paraevitar qualquer ameaa supremacia poltico-militar global norte-americana.

    Na rbita econmica, a experincia da Argentina demonstrou aos pasesem desenvolvimento e PMDR Pases de Menor Desenvolvimento Relativo que a adeso ao discurso hegemnico liberal de integrao aos mercados globaispreconizado pelos pases desenvolvidos e pelos organismos internacionais, taiscomo FMI e Banco Mundial, no garante desenvolvimento econmico e social,nem apoio nos momentos de crise. Pelo contrrio, os prprios pases tendem aser responsabilizados por seguirem o receiturio neoliberal do mainstream

    internacional.Em suma, a agenda econmica dominante no fim do sculo passado estperdendo proeminncia vis--visa agenda da segurana, o que tornou invivela continuidade da estratgia de insero internacional baseada na premissa daautonomia pela integrao do governo Fernando Henrique Cardoso. Em outraspalavras, os novos constrangimentos sistmicos internacionais demandaram areformulao da estratgia de insero internacional do Brasil. Nessa direo,j quase no fim de seu mandato, a diplomacia do governo Cardoso intensificourelaes e estabeleceu coalizes na lgica da geometria varivel de poder com

    Rev. Bras. Polt. Int. 8 (2): 55-69 [2005]

    * Doutor em Cincia Poltica pela USP e Pesquisador do Centro de Estudos de Cultura Contempornea CEDEC ([email protected]).

    ARTIGO

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    pases em desenvolvimento na OMC Organizao Mundial de Comrcio,tais como ndia e frica do Sul durante o contencioso das patentes farmacuticascontra os Estados Unidos. Contudo, a derrota eleitoral da coalizo polticaliderada por Cardoso para Lula em 2002 no lhe permitiu colher os frutos

    dessa empreitada internacional, at ento relegada ao segundo plano duranteseus dois mandatos.

    A diplomacia brasileira sob o governo Lula aprofundou a correo de rotainiciada em fins do segundo mandato de Cardoso. Imediatamente aps suasposses, Lula e Amorim declararam ser necessrio reinterpretar as premissasclssicas da poltica externa brasileira, dando a elas um novo sentido. O objetivoseria garantir a sustentao de uma estratgia de insero internacional do pasdiferente daquela presente na maior parte do governo Cardoso e que fosse maisadequada s demandas das novas elites econmicas, das coalizes sociais e

    polticas no poder, da percepo do papel a ser ocupado pelo Estado brasileirono mundo e dos constrangimentos internacionais insero perifrica dospases em desenvolvimento.

    Nesta perspectiva, a diplomacia do governo Lula passou a considerar omultilateralismo como um movimento amplo de desconcentrao e de novasregulamentaes do poder no sistema internacional, de modo que fossem maisfavorveis aos pases em desenvolvimento. Estaria ocorrendo um (...) redesenhoda balana de poder global, a qual vem criando novas possibilidades e brechasde incluso de novos atores e projetos de reorganizao do sistema de Estadose dos valores no seio da comunidade internacional (Saraiva, 2005). Caberiaao pas voltar a desenvolver uma poltica externa mais heterodoxa,conceitualmente estruturada em torno dos temas do desenvolvimento comoum valor universal e o acesso das grandes massas populacionais do globo aospadres do bem estar e da cidadania (Saraiva, 2005).

    Em sntese, a poltica externa brasileira deve ser eficaz na defesa decondies mais adequadas aos pases em desenvolvimento, para que elaborempolticas pblicas que permitam gerar crescimento econmico, consolidar a

    democracia e, por conseqncia, combater a pobreza, a excluso social e afome. Enfim, caberia consolidar o consenso global de um multilateralismocompatvel com os objetivos de desenvolvimento. A diplomacia do governoLula vem recuperando, pelo menos em parte, as tradies da agenda da PolticaExterna Independente e, ainda que com modificaes significativas, a doPragmatismo Responsvel e Ecumnico do governo Geisel.

    Portanto, a origem do protagonismo internacional brasileiro na atualidadeparece ter sua inspirao nessa tradio da poltica externa brasileira,caracterizada como nacional-desenvolvimentista. Seus desdobramentos prticos

    esto consubstanciados na formao do Ibas Frum de Dilogo ndia, Brasile frica do Sul; na criao do G-20 Grupo de pases em desenvolvimentocriado na fase final de preparao da V Conferncia Ministerial da OMC; na

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    aproximao com pases africanos e rabes; na participao no G-4 Grupocomposto por Alemanha, Brasil, ndia e Japo em busca da reforma noConselho de Segurana da ONU e das suas respectivas admisses nele comomembros permanentes; na revalorizao da insero regional, inclusive ao se

    dispor a arcar com os custos do exerccio da sua liderana, especificamente, noMercosul Mercado Comum do Sul e na Amrica do Sul, alm de incentivarseus parceiros em desenvolvimento a tambm incorporarem a dinmica regionals suas respectivas poltica externa, visando consolidar seus papis de relevnciaregional. A misso de paz da ONU conduzida pelo Brasil no Haiti ilustrativadessa agenda poltica.

    Pode-se notar nesse protagonismo internacional do governo Lula a clarainteno de ressuscitar a questo do desenvolvimento e a recuperao da clivagemNorte/Sul na poltica internacional em benefcio das demandas dos pases em

    desenvolvimento. Com base nessa constatao cabe-nos indagar se as estratgiasinternacionais e o dilogo Sul-Sul presente na retrica e na ao da polticaexterna do governo Lula representam alianas duradouras ou coalizes efmerasnas relaes internacionais contemporneas entre os pases em desenvolvimento.

    Buscaremos responder essa questo mapeando o processo de construode alianas e coalizes entre o Brasil e seus parceiros emergentes, especificamenteo estabelecimento do Ibas como desdobramento do contencioso das patentescontra os Estados Unidos e da reunio do G-8 em Evian em 2003, e o papeldo G-20 em prol da liberalizao do comrcio agrcola internacional noscontenciosos do algodo contra os EUA e do acar contra a UE UnioEuropia e, particularmente, durante a V Conferncia de Cancun da OMC.

    O contencioso das patentes farmacuticas na OMC: a origem do Ibas

    Em 1997, a diplomacia comercial dos Estados Unidos havia buscadorevogar a legislao sul-africana Medicines and Related Substances Control ActAmendmentsque permitia o licenciamento compulsrio e a importao paralela

    de medicamentos mais baratos de terceiros pases, principalmente da ndia,sem a autorizao do detentor da patente (Rosenberg, 2001). Os EstadosUnidos ameaaram suspender a ajuda econmica e, em abril de 1999, inserirama frica do Sul na lista de observaes (watch list) da Special 301 (Love, 1999;Roffe, 2004).

    Essa posio s foi revista quando o candidato Al Gore passou a receberpresso de ONGs internacionais, bem como perdeu o apoio da comunidadede afro-descendentes norte-americana plataforma eleitoral democrata durantea campanha de 2000. Esta comunidade decidiu votar no candidato

    independente Ralph Nader porque ele foi favorvel ao licenciamentocompulsrio de patentes de remdios contra o HIV para a frica do Sul. Paraevitar maiores custos eleitorais, em dezembro de 1999, o governo dos Estados

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    Unidos retirou a frica do Sul da lista de observaes (watch list) da Special301 (Cepaluni, 2004).

    Essa atitude desagradou a indstria farmacutica que ampliou suas doaesde recursos para a campanha do republicano G. W. Bush (US$ 18,3 milhes

    69%) vis--vis campanha do democrata Al Gore (US$ 8,3 milhes 31%)(Center for Responsive Politics, 2000). Como gratido, G. W. Bush, logo noincio de seu mandato, questionou o artigo 68 da lei brasileira 9279/96, queprevia a possibilidade do uso de licena compulsria em casos de emergnciade sade pblica. Segundo o USTR, esse artigo no estava de acordo com oTRIPS. Logo, o Brasil foi inserido na Section 301 Watch List, acusado de serdesrespeitador de patentes (patent-miscreant).

    Em 30 de maio de 2000, os Estados Unidos entraram com pedido deconsultas junto ao governo brasileiro na OMC. No satisfeitos com a resposta

    brasileira, em janeiro de 2001, entraram com pedido de estabelecimento depanelno rgo de Soluo de Controvrsias da OMC, apresentando a mesmaqueixa e afirmando que as consultas no trouxeram os resultados esperados,tampouco a soluo para o conflito.

    A estratgia de defesa brasileira nesse contencioso foi mobilizar uma sriede atores internacionais relevantes para a configurao de climas de opiniopblica globais favorveis s demandas domsticas de pases emdesenvolvimento e Pases de Menor Desenvolvimento Relativo (PMDR). Desdeo incio, a diplomacia brasileira enfatizou que a questo era de grande relevnciasocial e econmica, pois o direito de override1 significava a possibilidade doaumento da disponibilidade de drogas genricas para o tratamento de doentesde Aids no Brasil. Os preos exorbitantes praticados pela indstria farmacuticanorte-americana estavam impossibilitando a continuao do atendimentogratuito aos portadores da doena no pas. O laboratrio Merck reduziu opreo do anti-retroviral efavirezn, bem como o laboratrio Roche tambm secomprometeu a baixar o preo do nelfinavirem 40%. Contudo, outras empresasrecusaram-se a negociar.

    Em contrapartida o governo brasileiro, em maro de 2001, alertou quepoderia fornecer licenas compulsrias para a produo local dos medicamentospelo Far-Manguinhos, caso as empresas no reduzissem ainda mais seus preos.Ao ser ignorado, o governo brasileiro declarou que a nica prioridade tanto dogoverno norte-americano quanto das suas empresas era garantir a manutenodos lucros, fazendo-os prevalecer sobre o bem-estar dos brasileiros, ou seja,sobre o direito universal sade garantida pela Constituio brasileira, assimcomo, do ponto de vista tico-moral, sobre a populao de outros pases pobres,

    1 Segundo essa premissa, o Brasil deveria ampliar o poder de controle sobre o seu destino e resolver seusproblemas atravs da adeso ativa elaborao das normas e das pautas de conduta da gesto da ordemmundial, buscando consolidar o multilateralismo na poltica internacional (Vigevani e Oliveira, 2003).

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    tais como a frica do Sul e seus vizinhos. Simultaneamente, para garantir quea ameaa fosse factvel, o governo brasileiro autorizou o Far-Manguinhos aimportar da ndia os princpios ativos para iniciar os testes e as pesquisasnecessrias viabilizao da produo local desses medicamentos.

    A ndia ainda est usufruindo as benesses da regra de transio quepossibilitou aos pases em desenvolvimento aderirem e implementarem osprincpios, normas, regras e procedimentos do Acordo TRIPS Acordo sobreAspectos de Direito de Propriedade Intelectual Relacionados ao Comrcio somente depois de 20052. At o momento, sua lei de propriedade intelectual Indian Patent Act garante a proteo de procedimentos, mas no da produode remdios. Essa condio permitiu a ndia desenvolver um plo industrialfarmacutico para a comercializao de medicamentos genricos anti-retroviraisessenciais no tratamento da Aids por meio de estratgias de engenharia reversa.

    Suas principais empresas a Cipla, a Ranbaxy, a Hetero, a Aurodindo e aCadila so capazes de concorrer com as grandes corporaes transnacionais,oferecendo produtos a preos reduzidos com qualidade semelhante.

    A Cipla, por exemplo, disponibilizou o coquetel anti-Aids (terapiatripla) a US$ 350 s ONGs de direitos humanos envolvidas com a prevenoe o tratamento dos doentes de HIV. A Hetero passou a comercializar o mesmoproduto por US$ 347. A Ranbaxy props vender o coquetel por US$ 295 sobas mesmas condies. Os preos praticados para os governos giravam em tornode US$ 600. Como conseqncia, o preo do tratamento foi reduzido em

    mais de 78% em pouco menos de dois anos (Guennif e Mfuka, 2004). Almdisso, essas empresas lucraram com a importao paralela de princpios ativospara a fabricao de certos medicamentos genricos contra a Aids, tornando andia um aliado essencial na coalizo dos pases em desenvolvimento.

    Os negociadores brasileiros, ao perceberem a potencialidade dessa coalizoe das oportunidades abertas pela lgica de geometria varivel de poder naOMC, reforaram sua argumentao ao elaborarem a premissa humanitria, oslogan de que o bem pblico deve prevalecer sobre o lucro. Dessa forma,legitimou a estratgia de defesa do pas, alm de obter simpatia internacional

    de Qunia, Moambique, Zimbbue, Ruanda, dentre outros, todosinteressados em transferncia de tecnologia e cooperao tcnica internacionaldo Brasil para o tratamento dos seus doentes de Aids, bem como de remdiosmais baratos da ndia. Alm, claro, da frica do Sul (pas que sofre comepidemia de HIV/Aids e, como o Brasil, no possui recursos financeiros paragarantir tratamento gratuito adequado a todos que necessitam) e da ndia(pas com tecnologia avanada na produo de genricos e medicamentos emgeral, ocupando papel importante no comrcio internacional de medicamentos,interessada em vender genricos), como vimos.

    2 Passar por cima da exclusividade de comercializao e/ou produo (market exclusivity) de medicamentosusados no tratamento de Aids.

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    O argumento brasileiro convenceu a opinio pblica internacional e ascomunidades epistmicas3, 4 (Haas, 1992), as quais tornaram-se essenciaispara a vitria da coalizo porque defenderam o direito do Brasil, dos pasesem desenvolvimento e dos PMDR ao acesso a medicamentos. Entre os atores

    principais, estavam ONGs comoMdecins Sans Frontirs, Health GAPe Oxfam,envolvidas com os temas de sade pblica e de direitos humanos, e at mesmoa ONU Organizao das Naes Unidas por meio do Unaids ProgramaConjunto das Naes Unidas sobre HIV/Aids e a OMS OrganizaoMundial da Sade (Oxfam, 2003). Parcelas considerveis da sociedade civilnorte-americana apoiaram a coalizo. Essas comunidades estavam convencidasde que o Brasil e seus parceiros deveriam ter o direito de fornecer medicamentos sua populao a despeito da reduo dos lucros da indstria farmacutica.Nessa direo, muitos desses atores adquiriam o coquetel anti-HIV na ndia, a

    preos bem menores, como vimos acima, e doavam aos governos africanosmais pobres.

    Os resultados dessas mobilizaes foram bastante positivos para os pasesem desenvolvimento. Os negociadores dos Estados Unidos optaram por retirara queixa, recuando na sua posio intransigente de defesa de direitos depropriedade intelectual, e decidiram negociar com o Brasil e seus aliados umasoluo para o problema que atendesse aos interesses de todos. Logo, podemosafirmar que essa experincia legou, pelo menos, dois frutos permanentes:a) aprendizado de como utilizar as estruturas globais de poder em prol dos

    interesses brasileiros e dos seus parceiros, auxiliando na construo de benspblicos globais, a serem utilizados por outros pases menos favorecidos contraas prticas comerciais desleais, sobretudo, dos pases desenvolvidos e b) serviucomo pano de fundo para o relanamento de alianas Sul-Sul na polticainternacional.

    Em suma, vale ressaltar que o contencioso das patentes serviu comomodelo, como um ensaio bem sucedido da potencialidade de coalizes Sul-Sul para a ampliao da participao unida dos pases em desenvolvimento edos PMDR nas grandes questes internacionais. Entretanto, a diplomacia

    brasileira do governo Cardoso nem buscou consolida-lo nem teve outrasiniciativas similares. Isso ocorreu somente mais tarde, j no governo Lula, nobojo dos debates da Cpula do G-8, em Evian, em junho de 2003.

    Nessa ocasio, G. W. Bush enfatizou a necessidade da cooperaointernacional nas questes relativas ao desenvolvimento e ao comrcio, pois,Em longo prazo, reforamos nossa segurana ao ajudar a disseminar a liberdade

    3 Vale ressaltar que h uma lei em tramitao na ndia adequando sua legislao de propriedade intelectualao TRIPS.4

    Comunidades epistmicas podem ser consideradas como (...) canais atravs dos quais novas idiascirculam de sociedades a governos, bem como de pas para pas (Haas, 1992:27). Ou ento, (...) uma redede profissionais com percia reconhecida e competncia em um domnio especfico e com pretenso oficial deconhecimentos relevantes a polticas dentro daquele domnio ou rea (Haas, 1992:3) (Traduo livre).

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    e aliviar o sofrimento. E isso estabelece uma ampla agenda para as naes dosdois lados do Atlntico (Bush, 2005). Bush estabeleceu prioridades globaispor meio da proposta Conta do Desafio do Milnio (MCA), a qual pretendia(...) recompensar as polticas econmicas que funcionam governana

    macroeconmica slida, um sistema de regulamentao eficiente, aberturacomercial e um ambiente saudvel para os investimentos (Wayne, 2005). Ainiciativa objetivava estimular o crescimento econmico, combater o terrorismo,impedir a proliferao de armas de destruio em massa e, principalmente,promover a prosperidade no mundo em desenvolvimento.

    Os pases desenvolvidos se comprometeram ainda em elaborar mecanismospara dar maiores oportunidades aos pases pobres no comrcio internacional.Passariam a promover programas e acordos comerciais preferenciais mais favorveisaos seus produtos, ampliar oportunidades de mercado e estimular integrao e

    o comrcio regional entre os pases em desenvolvimento. Alm disso, secomprometeram a retirar barreiras procedimentais que impedem a liberalizaocomercial multilateral de produtos agrcolas, conforme a agenda de Doha.

    A diplomacia brasileira aproveitou essa oportunidade para convocar umaReunio Trilateral de Chanceleres do Brasil, da frica do Sul e da ndia, quefoi realizada na cidade de Braslia, no dia 6 de junho de 2003. Nessa ocasio,diante das propostas do G-8, da experincia acumulada com o contenciosodas patentes e das suas similaridades e convergncias polticas em outros frunsinternacionais, foi assinada a Declarao de Braslia, a qual estabeleceu umaaliana permanente entre frica do Sul, ndia e Brasil: o Ibas.

    Entre outros propsitos, essa parceria visa a consolidar um bloco trilateralSul-Sul para o fortalecimento da capacidade poltica nas negociaes comerciaisinternacionais desses pases na OMC frente aos partnersdesenvolvidos. Aomesmo tempo, busca ainda uma reforma da ONU, que torne a instituiomais democrtica. O fator essencial nessa perspectiva a incorporao de novospases no Conselho de Segurana, os quais devem representar efetivamente amultiplicidade da comunidade global Brasil, ndia e frica do Sul se

    consideram como tais. Alm disso, a reduo da pobreza deve ser levada a sriocomo meio para aumentar a paz e a estabilidade internacional. Por fim, o Ibasvisa ainda a desenvolver e a intercambiar cooperao tcnica nas reas detransporte, energia, infra-estrutura, defesa e misses de paz, comrcio einvestimento, pequenas empresas e criao de emprego, cincia e tecnologiade informao, educao, sade (direitos de propriedade intelectual, medicinatradicional, pesquisas epidemiolgicas, vacinas, desenvolvimento de produtos),bem como a criao de um fundo para alvio da pobreza e da fome (Ibas,2005). Esses objetivos esto em convergncia com as decises tomadas durante

    a Cpula do G-8 em Evian. Apesar de ser um marco do retorno de estratgias e alianas Sul-Sul,debilitadas durante a discusso do Gatt Acordo Geral sobre Tarifas e Comrcio

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    , o Ibas possui debilidades, as quais devem ser corrigidas para que haja aconsolidao de uma aliana duradoura. A principal delas deriva da sua agendabastante ampla e ambiciosa, como vimos acima. Com o tempo, a ausncia deavanos e resultados concretos, tais como os obtidos no contencioso das patentes

    dos remdios anti-HIV, poder comprometer a credibilidade da iniciativa.Entre outros fatores, a proposta da Aliana Africana para a reforma da

    ONU praticamente inviabilizou os objetivos do G-4. Ela pode ser consideradaa primeira externalidade negativa do Ibas. Isso porque o fundo para o alvio dapobreza e da fome criado pelo Ibas direcionado ao continente africano noserviu aos propsitos de mitigar o receio dos pases da Aliana Africana de quea frica do Sul no se tornaria uma ameaa hegemnica regional no caso de sermembro permanente do Conselho de Segurana. As potencialidades e asoportunidades de fluxos comerciais entre os pases membros do Ibas tambm

    so reduzidas. H pouca complementaridade e sinergia entre eles, por umlado, e por outro, concorrncia em setores importantes para cada uma daseconomias no mercado mundial. Portanto, o Ibas, nesse momento, parece serbastante abstrato, ainda que tenha sua importncia poltica. Todavia, a mdioe em longo prazo, essa aliana pode se tornar relevante para o Brasil. Na medidaem que poder se constituir em porta de entrada dos produtos brasileiros na frica e, principalmente na sia.

    A questo dos subsdios agrcolas e a Conferncia de Cancn:o G-20 em ao

    A V Conferncia Ministerial da OMC em Cancn terminou sem consenso.Nas palavras do diplomata queniano George Ogwar A reunio entrou emcolapso (Velasco e Cruz, 2005). Isso ocorreu porque, por um lado, os pasesdesenvolvidos insistiram na necessidade de aprofundar as negociaes em tornodos temas de Cingapura. Por outro lado, os pases em desenvolvimento e osPMDR condicionaram esse aprofundamento eliminao dos subsdios e

    liberalizao do comrcio agrcola internacional.Segundo Zoelick (2003), a culpa do fracasso deveu-se ao do Brasil eseus aliados principalmente da ndia que preferiram adotar a retrica daresistncia como ttica contra os pases desenvolvidos na questo agrcola, paraencobrir suas barreiras comerciais nos temas de Cingapura (O Estado de SoPaulo, 2004; Folha de So Paulo, 2004-a).

    Diferentemente, para Amorim (2003), Cancn marca um ponto deinflexo na dinmica interna da [OMC] onde, tradicionalmente, o que eradecidido pelas grandes potncias comerciais era visto como o consenso inevitvel.

    (...) As postulaes da maior parte da humanidade no puderam ser ignoradas.[A partir de ento] as negociaes se processaro de maneira mais equilibradae menos unilateral. Isso ocorreu Graas a um esforo conjunto de 22 pases

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    em desenvolvimento, coordenados pelo Brasil, do qual participaram pasesgrandes e pequenos de trs continentes (Amorim, 2003).

    Em convergncia com Amorim (2003), Arun Jaitley, Ministro doComrcio e Indstria da ndia, declarou que India did not yield on any issue at

    Cancun and engaged pro-actively in the negotiations. The fact that we brought theconcerns of developing countries to the center stage reflects the success of Cancun(India Infoline News, 2003). Para Anand Mahindra, presidente da ConfederaoIndiana das Indstrias Cancun represents a turning point in trade negotiations.These will never be the same again. The developing countries are now a force toreckon with, India led by Commerce Minister Arun Jaitley was a major force inbringing together many countries on a common platform (Rediff, 2003). OMinistro da frica do Sul, presente na Conferncia de Cancn, salientou quens estamos muito bem preparados. Fizemos propostas muito concretas para

    a agricultura. Ns todos estamos muito impressionados em nossos pases pelacapacidade que temos. (...) Foi a primeira vez que ns pudemos sentar de igualpara igual com os pases desenvolvidos (O Estado de So Paulo, 2003).

    Essas declaraes indicam que a Conferncia de Cancn pode terrepresentado o momento inaugural da proposta do governo Lula deadensamento do dilogo e das parcerias Sul-Sul em busca de uma mudana dageografia comercial e poltica do mundo favorvel aos pases em desenvolvimentoe aos PMDR. A convergncia entre Brasil, ndia e China permitiu que essespases liderassem uma coalizo, a qual, mais tarde, ficou conhecida como

    G-20 e concentrou sua atuao em agricultura: tema central da Agenda deDesenvolvimento de Doha.

    A articulao do G-20 na Conferncia de Cancn parece ter garantidoum novo papel aos pases em desenvolvimento nas discusses sobre aliberalizao do comrcio internacional, especificamente o agrcola: o papel deserem uma ameaa de veto unificada e principalmente qualificada aodesempenhar um papel pr-ativo soluo da problemtica. Isso porquerepresentou uma aliana de pases de trs continentes, a qual abriga 60% dapopulao rural, 12% da produo agrcola, 26% das exportaes e 18% das

    importaes mundiais. Constituem os mais dinmicos produtores e os mercadosagrcolas mais promissores. O papel desempenhado pela liderana foiimportante, pois demonstrou sua capacidade em manter coesos interessesdiferentes, mas que convergiram diante da ameaa iminente de suas demandasno serem contempladas na V Conferncia. A ausncia de sinais de fratura e/ou defeco entre os lderes garantiu credibilidade ameaa de retaliao dogrupo e, simultaneamente, deixou evidentes as possibilidades de ganhosadvindas da aos pases menores. Outra prova da importncia do papel daliderana foi a participao do Brasil no encontro em Londres para a discusso

    dos rumos a serem tomados nas prximas negociaes comerciais.Mais importante foi o fato desses pases abandonarem a agenda de veto

    reativa que lhes desqualificavam constantemente durante as discusses e

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    apresentarem uma agenda pr-ativa, com capacidade tcnica substantivaalicerada em informaes apuradas e convincentes que lhes permitiram, maisdo que dizer no, oferecer e propor alternativas viveis ao impasse. Claramente,esses pases foram capazes de renovar suas estratgias ao combinarem a lgica

    das coalizes de bloco com coalizes temticas. Ou seja, ao invs de negociaremapenas em torno de fatores ideacionais e identitrios, como ocorria com ascoalizes de bloco do passado, tais como o movimento dos no-alinhados, oG-20 negociou tambm como uma coalizo temtica em torno de questesinstrumentais. Isso proporcionou a oportunidade da emergncia de coalizesde novo tipo, de terceira gerao, as quais tendem a permitir que pases emdesenvolvimento recuperem a clivagem Norte/Sul na poltica internacional,atuem como coalizo de bloco, mas, ao mesmo tempo, estabeleam coalizestemticas, apropriando-se instrumentalmente com grande capacidade tcnica

    da agenda pr-livre-comrcio dos pases desenvolvidos para abrir seus mercadosagrcolas. Em complemento, essa estratgia incorpora valores ticos e moraisque acabam se traduzindo em apoio efetivo de novos atores internacionais, taiscomo ONGs, os quais possuem a capacidade de moldar agendas globais einfluenciar efetivamente a opinio pblica. Segundo Held (2004), seria umaestratgia cosmopolita preocupada com questes de justia social, bem como ademocratizao da poltica internacional.

    Ao discursar para os representantes de pases do G-20, de acordo com aidia de configurar uma nova geografia do comrcio mundial, Lula (2004)aproveitou a oportunidade para afirmar que esse novo tipo de articulaodeveria inspirar novas aes tambm em outros tabuleiros, alm dos frunsinternacionais j consolidados como a OMC e a ONU, para ampliar (...) onosso intercmbio recproco, especialmente para a intensificao do comrcioSul-Sul (G-20, 2005).

    Segundo Veiga (2005), o G-20 pode gerar externalidades positivas associadasa iniciativas nem sempre comerciais entre pases em desenvolvimento. O (...)componente comercial das relaes bilaterais pode, inclusive, no desempenhar

    o papel central, embora a prpria iniciativa possa gerar externalidades positivaspara o pas em foros multilaterais (Veiga, 2005, p. 5) obtendo ganhos, aindaque parciais, relevantes para os interesses setoriais de pases que, at pouco tempo,tinham apenas a perder nas negociaes comerciais internacionais.

    Por exemplo, no campo do comrcio multilateral, as estratgias, as coalizese as alianas do Brasil e dos seus parceiros em desenvolvimento vm realizandoa defesa do livre-comrcio dos produtos e a reduo dos altos subsdios agrcolasque protegem os mercados dos pases desenvolvidos, de acordo com a demandadas elites econmicas nacionais desse setor. Segundo Veiga (2005, p. 7) (...)

    a estratgia governamental internalizou e deu prioridade s demandas deliberalizao dos mercados agrcolas, que traduzem essencialmente um processode transformao estrutural da economia brasileira expresso na emergncia de

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    um agribusiness voltado para a exportao e altamente competitivo. Oscontenciosos do algodo contra os EUA e do acar contra a UE na OMC sopartes dessa estratgia, pois podem significar um novo elemento na configuraodo regime de comrcio internacional. Eles podero ter impacto direto no

    ambiente internacional relacionado questo dos subsdios agrcolas, sendoamplamente favorvel sociedade brasileira e outros pases em desenvolvimentoe PMDR. Segundo o atual ministro da Agricultura do Brasil, RobertoRodrigues, a vitria brasileira Cria um novo padro em comrcio agrcola eabre espao para novas negociaes (Folha de So Paulo, 2004). Nessaperspectiva, a vitria do Brasil e seus aliados em desenvolvimento e PMDRnos contenciosos do algodo e do acar, de certo modo, pode ser interpretadacomo efeito retardado, externalidades positivas do impasse de Cancun geradopelo G-20. Entretanto, como veremos adiante, no pode ser ainda caracterizada

    como uma aliana permanente, mas sim como uma coalizo que ser testadana prxima Conferncia da OMC. Parece-nos que a tendncia ser se afirmarcomo aliana permanente, mesmo atingindo seu objetivo central: a liberalizaodo comrcio internacional agrcola.

    Consideraes finais

    Como vimos, no contencioso das patentes contra os Estados Unidos naOMC, durante o governo Cardoso, foi concedida ao Brasil possibilidade demanuteno da poltica pblica de tratamento dos doentes de Aids. Issosignificou que o protagonismo internacional brasileiro e dos seus aliadosconduziu os negociadores dos Estados Unidos a optarem por retirar a queixana OMC, recuando na sua posio intransigente de defesa de direitos depropriedade intelectual da indstria farmacutica norte-americana, e a negociaruma soluo para o problema. Houve ganhos concretos para todos. O Brasilmanteve sua poltica de sade com economia de recursos. A ndia ampliou seumercado de genricos ao fornecer os princpios ativos para a produo de

    medicamentos mais baratos. Enquanto a frica do Sul foi beneficiada porprogramas de cooperao tcnica internacionais oferecidos pelo Brasil para otratamento dos seus doentes de Aids.

    Vale ressaltar ainda que houve tambm ganhos de aprendizado acumuladopelos pases em contenciosos na OMC, permitindo, mais tarde, outros embates.Entretanto, foi apenas depois da posse do governo Lula e das mudanas deinterpretao do sentido do multilateralismo na poltica externa brasileira que,provavelmente, emergiu um dos principais aspectos positivos dessa experincia.Uma coalizo efmera na lgica da geometria varivel de poder prpria da

    OMC no governo Cardoso parece ter se transformado em uma aliana permanente o Ibas , durante o governo Lula, ainda que ela seja residual na questo depatentes, sem parecer oferecer grandes ganhos futuros no curto prazo.

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    J a ao do G-20 durante a V Conferncia de Cancun da OMC, no bojoda Rodada Doha, com externalidades positivas representadas pelas vitriasno contencioso do algodo contra os Estados Unidos e do acar contra a UE,podem desencadear o incio do fim do protecionismo agrcola dos pases

    desenvolvidos. O significado simblico dessa ao foi demonstrar que os pasesricos no podem mais continuar ficando na negativa absoluta nas negociaesagrcolas (Folha de So Paulo, 2004-b) em detrimento dos pases emdesenvolvimento e dos PMDR. Na prtica, a ao do G-20 e suas externalidadespositivas consolidariam jurisprudncia na OMC em favor dos pases emdesenvolvimento (Financial Times, 2004), podendo ser expandida para produtossemelhantes, como o arroz e o trigo em prol dos interesses dos PMDR (Leo, 2004).

    Como resultado, os produtores de bens agrcolas nos pases emdesenvolvimento e nos PMDR podem vir a ganhar maior competitividade

    internacional. Esta se traduziria em aumento das exportaes, diminuio dodesemprego e de suas conseqncias, dentre outros provveis benefcios, osquais permitiriam aos pases pobres como Benin, Chade, Mali e da ACP, osquais possuem boa parte de sua economia dependente da exportao de produtosagrcolas, recursos suficientes para o enfrentamento de graves problemas sociais.

    Caso as externalidades positivas geradas pela ao do Brasil e dos seusaliados no Ibas e no G-20 no se concretizem, certamente esses pases recusarodiscutir novas ondas de liberalizao comercial de setores que interessam ospases desenvolvidos, tais como servios, compras governamentais, propriedadeintelectual, etc. Para tanto, contaro com o apoio moral da comunidadeinternacional e de atores importantes da sociedade civil global, o que gerarum completo impasse nas discusses sobre liberalizao comercial global e nosacordos regionais, como ocorreu em Cancn, no bojo da Rodada Doha, nofinal de 2003.

    Em suma, ao derrotar os dois maiores pilares do protecionismo e dasubveno dos pases ricos contra a concorrncia agrcola do mundo emdesenvolvimento, o Brasil parece ter aberto o caminho para que as decises da

    Rodada Doha sejam mais ambiciosas no terreno agrcola. E, certamente, aoliderar o G-20, passou a figurar entre os grandes playersglobais nas discussessobre comrcio internacional no sculo XXI.

    No caso das patentes, o recuo dos Estados Unidos permitiu a flexibilizaodo regime internacional Trips para atender as demandas e as necessidades dospases em desenvolvimento e dos PMDR. J o movimento do G-20 e suasexternalidades positivas representadas pelas vitrias brasileiras nos contenciososagrcolas tm sido consideradas como indutoras do incio do fim dos subsdiosnesse setor, abrindo possibilidades de conquista de novos mercados para as

    commodities brasileiras, bem como de outros pases em desenvolvimento e dePMDR. Tornaram ainda os subsdios exportao de gneros agrcolas dospases desenvolvidos ilegais sob os termos de acordos de comrcio internacional

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    da OMC. Abriram a possibilidade da configurao de bens pblicos globaisessenciais para a defesa dos interesses da sociedade brasileira que afetam o cotidianode cada cidado, bem como para a comunidade internacional (Held, 2004).

    Por fim, vale ressaltar que essa dinmica interativa possibilitou a emergncia

    de novas alianas permanentes e coalizes de poder na poltica internacionalentre os pases em desenvolvimento e os PMDR. O primeiro caso representadopelo Ibas contencioso das patentes. O segundo pelo G-20 contenciosos doalgodo e do acar. Porm, os benefcios dessa aliana e dessa coalizo sobastante incertos no futuro, devido ausncia de poder relativo, principalmenteeconmico, dos seus membros para sustentar os custos da empreitada originalnas discusses sobre o papel do comrcio internacional.

    Isso permite-nos concluir que a manuteno e a reproduo da ao dessasalianas permanentes e, principalmente, das coalizes nas prximas rodadas

    de negociaes da OMC incerta. A convergncia s ocorreu devido percepode ameaa que a abertura comercial nos temas de Cingapura provoca ao mercadodomstico dos pases em desenvolvimento e dos PMDR. Alm disso, acapacidade dos pases desenvolvidos em desmobilizar coalizes de interessesdivergentes amplia-se quando eles utilizam a estratgia de barganhas cruzadasno tabuleiro comercial de geometria varivel, cooptando os pases menores emtroca de benefcios especficos e acenando aos maiores, tais como ndia, apossibilidade de juntos ganharem em outros setores, como servios. Portanto,a prxima reunio da OMC poder demonstrar se as celebradas alianaspermanentes advindas do dilogo Sul-Sul se transformaro ou no em coalizesresiduais rumo ao desaparecimento.

    Recebido em 9 de agosto de 2005Aprovado em 9 de novembro de 2005

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    Resumo

    O objetivo deste artigo demonstrar que o protagonismo internacional do governoLula busca ressuscitar a questo do desenvolvimento tendo como base tanto oregionalismo, quanto a recuperao da clivagem Norte/Sul na poltica internacional embenefcio das novas demandas dos pases em desenvolvimento. Baseado nessaconstatao, indagamos se as estratgias internacionais e o dilogo Sul-Sul presente naretrica e na ao da poltica externa do governo Lula representam alianas duradourasou coalizes efmeras nas relaes internacionais contemporneas entre os pases emdesenvolvimento e menor desenvolvidos.

    Abstract

    The objective of the article is to demonstrate that the international protagonism ofLulas government seeks to bring back to international politics the development issuebased, on one hand, on regionalism, and on the North / South clivage on the other

    hand, in order to advance the new demands of developing coutries. It is aked, based onthis assumption, if the international strategies and the South-South dialogue bothpresent on retoric and actions of Lulas government foreign policy represent enduringalliances or ephemeral coalitions among developing and least developing countries.

    Palavras-chave:Poltica Externa do Governo Lula; Relaes Sul-Sul; Alianas e CoalizesInternacionais; Ibas; G-20.Key words: Lulas Foreing Policy; South-South Relations; International Alliance andCoalitions; Ibsa; G-20.