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Com Ciência Ambiental 57 56 Com Ciência Ambiental CADERNO ESPECIAL Este caderno é uma das ações do Projeto PCRD (Pro- moção da Cultura de Riscos de Desastres), promovido pela SEDEC (Secretaria Na- cional de Defesa Civil), em cooperação técnica com o CEPED (Centro Universitá- rio de Estudos e Pesquisas sobre Desastres) da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), e em par- ceria com a revista Com Ciência Ambiental. Iniciado em maio de 2010 e com previsão de circula- ção até agosto de 2011, o caderno tem como objetivo principal promover e am- pliar a troca de conheci- mento, impressões, opiniões e ideias entre os diversos atores sociais sobre os temas relacionados à defesa civil, com foco na promoção da cultura de risco de desastres. Sem a pretensão de esgo- tar o debate e as respostas à problemática dos riscos, o Ca- derno Percebendo Riscos, Re- duzindo Perdas é um espaço à divulgação de conhecimento, fruto dos esforços da comuni- dade científica, dos gestores públicos, dos técnicos, espe- cialistas, das lideranças polí- ticas e comunitárias, do meio empresarial, enfim, de todos os setores sociais, capaz de fomentar uma gestão de ris- cos efetivamente integrada, humanitária e democrática. PROMOçãO DA CULTURA DE RISCOS DE DESASTRES - PCRD Percebendo Riscos, Reduzindo Perdas CADERNO ESPECIAL CADERNO ESPECIAL Amb ental COM CIÊNCIA Ministério da Integração Nacional

Amb ental - ceped.ufsc.br · O desafio de responder aos desastres ... de emergência incluem autoridades de defesa civil, corpos de bombeiro, organizações poli-ciais, serviços

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Com Ciência Ambiental 5756Com Ciência Ambiental

CADERNO ESPECIAL

Este caderno é uma das

ações do Projeto PCRD (Pro-

moção da Cultura de Riscos

de Desastres), promovido

pela SEDEC (Secretaria Na-

cional de Defesa Civil), em

cooperação técnica com o

CEPED (Centro Universitá-

rio de Estudos e Pesquisas

sobre Desastres) da UFSC

(Universidade Federal de

Santa Catarina), e em par-

ceria com a revista Com

Ciência Ambiental.

Iniciado em maio de 2010

e com previsão de circula-

ção até agosto de 2011, o

caderno tem como objetivo

principal promover e am-

pliar a troca de conheci-

mento, impressões, opiniões

e ideias entre os diversos

atores sociais sobre os temas

relacionados à defesa civil,

com foco na promoção da

cultura de risco de desastres.

Sem a pretensão de esgo-

tar o debate e as respostas à

problemática dos riscos, o Ca-

derno Percebendo Riscos, Re-

duzindo Perdas é um espaço à

divulgação de conhecimento,

fruto dos esforços da comuni-

dade científica, dos gestores

públicos, dos técnicos, espe-

cialistas, das lideranças polí-

ticas e comunitárias, do meio

empresarial, enfim, de todos

os setores sociais, capaz de

fomentar uma gestão de ris-

cos efetivamente integrada,

humanitária e democrática.

PROmOçãO DA CuLtuRA DE RISCOS DE DESAStRES - PCRD

Percebendo Riscos, Reduzindo Perdas

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Amb entalCOM CIÊNCIA

ministério da Integração Nacional

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terra, incêndios florestais e outros eventos adversos que geram grandes padecimentos humanos e debilitantes perdas econô-micas”. E, além da pobreza, a crescente densidade populacional, a degradação ambiental e o aquecimento global estão fazendo com que o impacto das ameaças naturais piore ainda mais.

Teoricamente, todos são afetados por essas ameaças naturais, entretanto, na prática, elas afetam proporcionalmente mais as populações pobres, em função de que elas, em sua maioria, vivem em zonas de maior densidade populacional, em re-sidências mal construídas e em terrenos mais expostos ao risco.

Infelizmente, apesar de muitos conhe-cerem a miséria humana e as paralisantes perdas econômicas resultantes dos desastres, o que poucos se dão conta é que essa devas-tação pode ser prevenida mediante iniciativas para a redução de riscos de desastres.

Alinhando conceitos

De acordo com a nova terminologia da Estratégia Internacional para a Redução de Desastres (UN/ISDR, 2009, p.13-14), o termo desastre é definido como “uma séria interrupção no funcionamento de uma comunidade ou sociedade que ocasiona uma grande quantidade de mortes e igual perda e impactos materiais, econômicos e ambientais que excedem a capacidade de uma comunidade ou a sociedade afetada para fazer frente à situação mediante o uso de seus próprios recursos”.

Essa mesma terminologia (UN/ISDR, 2009, p.27) afirma que a redução de desas-tres concentra-se no conceito e na prática

de: “reduzir o risco de desastres mediante esforços sistemáticos dirigidos à análise e à gestão dos fatores causadores dos desastres, o que inclui a redução do grau de exposi-ção às ameaças (perigos), a diminuição da vulnerabilidade das populações e suas pro-priedades, uma gestão prudente dos solos e do meio ambiente e o melhoramento da preparação diante dos eventos adversos”.

Entretanto, durante muito tempo, o trabalho de enfrentamento dos desastres concentrou-se unicamente nas ações de resposta desenvolvidas após o impacto do evento adverso, envolvendo o socorro, a assistência às pessoas atingidas e a reabili-tação inicial do cenário do desastre2. Nesse modelo tradicional, a caracterização dos desastres privilegia a tomada de medidas pós-desastre. Estas são orientadas para o restabelecimento do panorama anterior ao evento destrutivo, diminuindo a responsa-bilidade dos responsáveis pela redução dos riscos de desastres.

Atualmente, torna-se imperioso que tal paradigma seja substituído pela ideia da con-cepção social do desastre, na qual os desastres são os produtos de uma combinação particular entre ameaças e vulnerabilidades da socieda-de. Isso significa que, na maioria dos casos, são as condições sociais de existência de uma população que determinam fortemente o nível de destruição ou de interrupção de serviços essenciais numa sociedade.

Nesta nova perspectiva, os desastres são o produto de processos de transformação e crescimento da sociedade que não garan-tem uma adequada relação com o ambiente natural e o construído que lhe dá sustento.

Tal postura fortalece a ideia de uma ges-tão integral de risco3, que se desenvolve num

O Marco de Ação de Hyogo1, respaldado pelas Nações Unidas, estabeleceu um enfoque integral para a redução de riscos de desastres. Esse Marco, adotado por 168 países a partir de janeiro de 2005, objetiva uma considerável redução das perdas ocasionadas por desastres, sejam elas humanas, de bens sociais, econômi-cas ou ambientais.

O Marco de Ação de Hyogo estabeleceu cinco áreas prioritárias de ação, a saber:

•Alcançar que a redução de risco de desastres seja uma prioridade

Garantir que a redução de risco de desastres seja uma prioridade nacional e local com uma sólida base institucional para sua implementação.• Conhecer o risco e tomar medidas Identificar, avaliar e observar de perto

os riscos de desastres e melhorar os sistemas de monitoramento, alerta e alarme antecipados.•Desenvolver uma maior compreensão e

conscientização Utilizar o conhecimento, a inovação e

a educação para criar uma cultura de segurança e resiliência em todos os níveis.•Reduzirorisco Reduzir os fatores fundamentais de

risco.• Estar preparado e pronto para atuar Fortalecer a preparação em desastres

para uma resposta eficaz em todos os níveis.

De forma complementar, a Estratégia Internacional para a Redução de Desastres, das Organizações das Nações Unidas (EIRD/ONU), oferece um meio de cooperação e as-sistência entre governos, organizações e ato-res da sociedade civil para a implementação do Marco. Trata-se de uma maneira de fazer com que as nações e comunidades possam se tornar mais resistentes às ameaças que põem em risco os benefícios do desenvolvimento.

Para melhor compreensão do problema, de acordo com dados da EIRD/ONU (2005), “todos os anos, mais de duzentos milhões de pessoas são afetadas por inundações, secas, tormentas, terremotos, deslizamentos de

A consolidação do SCO como ferramenta de gestão para resposta aos desastres no Brasil

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continuum, intimamente ligada a uma visão de desenvolvimento sustentável da sociedade. Essa ideia não foca na atuação em fases dis-tintas, senão em uma sequência complexa de fases integradas horizontalmente (prevenção, mitigação, preparação, resposta e recons-trução). Legitima-se, portanto, que o que é executado em uma etapa do processo pode representar severas repercussões, positivas ou negativas, numa etapa seguinte.

O desafio de responder aos desastres

Percebe-se que o grande desafio das pesso-as e das instituições que lidam com o gerencia-mento dos desastres concentra-se na redução dos seus riscos. Como identificar e minimizar fatores de risco a fim de reduzir a frequência e a magnitude de eventos adversos e também a vulnerabilidade das comunidades expostas?

Entretanto, em que pese a importância dos esforços para a redução de desastres, vale constatar que a ocorrência destes é uma pos-sibilidade sempre real. Por isso, a capacidade de prevenir, monitorar e intervir de forma rápida e eficiente em desastres tem sido um objetivo perseguido de forma sistemática e continuada, recebendo investimentos con-sideráveis no desenvolvimento de estudos e planos, na alocação de recursos humanos e materiais, bem como no desenvolvimento de atividades de capacitação e treinamento.

No Brasil, a temática da resposta aos de-sastres encontra-se ainda intimamente ligada aos serviços de emergência, representados pelo conjunto de organizações especializadas com responsabilidade e objetivos específicos de proteger a população e seus bens em situ-ações emergenciais. De forma geral, serviços

de emergência incluem autoridades de defesa civil, corpos de bombeiro, organizações poli-ciais, serviços médicos de emergência, forças armadas e unidades especializadas em emer-gência nas áreas de eletricidade, abastecimento de água, transporte, comunicações etc.

A experiência, no entanto, tem demons-trado que entre os vários problemas encon-trados na implantação das ações de resposta aos desastres, independente de quem os responde, questões relacionadas ao comando e controle das operações constituem-se ainda num ponto altamente relevante, que quase sempre se configura como o elo fraco de muitas intervenções.

Isto decorre da complexidade que acom-panha a resposta aos desastres, devido ao envolvimento de múltiplas organizações, com diferentes jurisdições e competências, a imprevisibilidade sobre quem implantará as primeiras ações e o envolvimento obri-gatório do poder político no atendimento. Tudo isso agrega ao conjunto da operação uma complexidade natural que geralmente é decorrente da falta de uma linguagem única e de objetivos, procedimentos e ca-nais de comando e comunicação comuns às organizações em operação.

Os resultados disso podem ser terríveis: estrutura de coordenação e níveis de autori-dade indefinidos; comunicação inadequada com os elementos internos e externos às operações; fluxo de informações inadequado; falta de controle sobre os recursos, utiliza-ção inadequada de recursos especializados; relacionamento precário com a imprensa; e, o mais importante, dificuldade para reduzir efetivamente danos e prejuízos para pessoas, bens e o meio ambiente (GOMES Jr., 2009).

Um aspecto relevante para a redução

desses problemas é a adoção de um siste-ma de comando e controle padronizado para o gerenciamento do desastre. Um sistema previamente definido, conhecido e treinado pelas pessoas e organizações envolvidas, que seja aplicável a vários tipos de emergências e que seja capaz de ordenar o fluxo de comando e controle de informações, as decisões e uso dos recursos de forma integrada, eficiente e eficaz.

Iniciado nos Estados Unidos na década de 1970 para coordenar operações de controle e extinção de incêndios florestais, o Incident Command System foi sendo progressivamente utilizado para outras situações emergenciais. Aos poucos, consolidou-se como modelo único para resposta à emergências maiores, sendo padronizado em 2004 pela Federal Emergency Management Agency e pela Ho-meland Security como obrigatório para o uso em desastres, terrorismo, emergências com produtos perigosos e eventos planejados de maior complexidade.

Duas iniciativas relativas à capacitação de pessoal nessa temática merecem registro. A primeira, por conta da Secretaria Nacional de Segurança Pública (SENASP), que desde 2008, sob a tutela do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONAS-CI), realizou a sensibilização e capacitação de profissionais de segurança pública em vários Estados da Federação. Capacitação que ocor-reu por meio de cursos presenciais e na moda-lidade à distância sobre Sistema de Comando em Incidentes – SCI (baseado no padrão do Incident Command System - ICS utilizado pela Unidet States Coast Guard4 - USCG).

A segunda representa o fruto de uma parceria celebrada pelo Ministério da Inte-gração Nacional (MI), por meio da Secretaria

Nacional de Defesa Civil (SEDEC), com a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), por meio do Centro de Estudos e Pesquisas sobre Desastres (CEPED/UFSC). A parceria resultou na publicação, em 2010, do Manual de Gerenciamento de Desastres, com base no Sistema de Comando em Ope-rações - SCO (adaptação do inglês, Incident Command System/ICS-100), desenvolvido pelo Instituto de Gerenciamento de Emer-gência (Emergency Management Institute), da Agência Federal de Gerenciamento de Emergências dos Estados Unidos (Federal Emergency Management Agency/FEMA).

No Brasil, várias outras experiências foram desenvolvidas a partir do Incident Command System ou ICS norte-americano. Algumas delas se encontram bem desen-volvidas em alguns Estados da Federação, normalmente sob a coordenação das Orga-nizações de Segurança Pública locais, de onde se destacam:

a) O Sistema de Coordenação de Opera-ções de Emergência - SICOE (baseado no padrão do Sistema de Comando em Incêndios, em uso no Corpo de Bom-beiros da Polícia Militar do Estado de São Paulo);

b) O Sistema Integrado de Comando e Operações em Emergência – SICOE, da Coordenadoria Estadual de Defesa Civil do Estado do Paraná;

c) O Sistema de Comando em Incidentes – SCI (baseado no Padrão OFDA--USAID, em franca utilização no Esta-do do Rio de Janeiro e Distrito Federal);

d) O Sistema de Comando em Incidentes (baseado no padrão NIIWS, dissemina-do pelo Ministério da Meio Ambiente);

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e) O Sistema de Comando em Ope-rações (baseado nas Diretrizes da Federal Emergency Management Agency (FEMA) e do Standardized Emergency Management System (SEMS), da Califórnia, Estados Unidos, disseminado pela Defesa Civil do Estado de Santa Catarina e apoiado pelo CEPED/UFSC, também em uso pelo Corpo de Bombeiros Militar do Estado do Espírito Santo, Minas Gerais, Pará e Santa Catarina).

No entanto, obser vando-se a grade curricular e o conteúdo dos treinamentos oferecidos e em curso no Brasil é percep-tível que todos utilizam o ICS como base conceitual. Variam entre si minimamente em aspectos específicos, decorrentes pos-sivelmente da diferença de fontes e de as-pectos de tradução ou ainda de adaptações à realidade local de cada Estado.

Finalmente, merece destaque a iniciativa da Secretaria Nacional de Defesa Civil (SE-DEC), que recentemente instituiu o Grupo de Apoio a Desastres (GADE)5, sob coorde-nação do Centro Nacional de Gerenciamento de Riscos e Desastres (CENAD). O GADE tem a missão de atuar como elo da estrutura Federal de Defesa Civil e promover apoio e assessoria nas ações estaduais e municipais de resposta à desastres. Pretende-se, assim, reduzir a ocorrência de danos e prejuízos, com vistas à segurança, à saúde e à assistên-cia social da população afetada, assim como o restabelecimento das atividades essenciais no cenário do desastre.

No período de 6 a 10 de dezembro de 2010, cerca de 30 especialistas e técnicos em

Defesa Civil estiveram reunidos em Brasília para participar do programa de formação continuada do GADE e discutir seu funcio-namento e implantação com base no Sistema de Comando em Operações.

O Sistema de Comando em Operações (SCO)

O SCO não é algo novo e experimental, pois sua estruturação é garantida por uma ampla fundamentação teórica, de longa data e aliada à experiência de inúmeros eventos em vários diferentes países, espe-cialmente nos Estados Unidos.

Utilizando-se das melhores práticas de administração, o SCO ajuda a garantir:

•O estabelecimento de uma estruturaformal de comando;

•O alcance de prioridades e objetivoscom base na consolidação de planos de ação comuns e sucessivos adaptados às contingências do desastre;

•O uso eficiente e eficaz dos recursos(humanos, materiais, financeiros, tec-nológicos e de informação) disponíveis de forma integrada; e

•Maior segurançaàsequipesde res-posta e aos demais envolvidos no desastre.

Sua correta utilização permite que pes-soas de diferentes organizações se integrem rapidamente em uma estrutura de gerencia-mento comum, facilitando a integração das comunicações e os fluxos de informações e melhorando os trabalhos de inteligência e de planejamento. O SCO representa uma ferramenta gerencial (modelo), de con-

cepção sistêmica e contingencial, que pa-droniza as ações de resposta em situações críticas de qualquer natureza ou tamanho.

De acordo com Gomes Jr. e Alves (2004, p.41), o Sistema de Comando em Operações pode ser definido como: “uma ferramenta ge-rencial para comandar, controlar e coordenar as operações de resposta em situações críticas, fornecendo um meio de articular os esforços de agências individuais quando elas atuam com o objetivo comum de estabilizar uma situação crítica e proteger vidas, propriedades e o meio ambiente”.

Assim, o SCO permite que seus usuários adotem uma estrutura organizacional integrada e democrática para enfrentar as demandas e complexidades de um desastre, sem prejuízo de suas competências e limites jurisdicionais.

O SCO baseia seu emprego em três prin-cípios fundamentais:

a) Concepção sistêmica (estabelece pro-cedimentos para organizar a maneira como os recursos necessários - huma-nos, materiais, de informação e tecno-lógicos - são mobilizados, cadastrados e empregados na operação e a forma como as operações são planejadas, organizadas, lideradas e controladas mediante a formulação de planos de ação em ciclos sucessivos);

b) Concepção contingencial (emprega uma estrutura organizacional modu-lar e flexível de comando, controle e comunicação que se adapta às de-mandas e limitações contingenciais do ambiente onde o desastre ocorre);

c) Concepção para todos os riscos e si-tuações (modelo universal, utilizável

em desastres de qualquer natureza, independentemente de sua causa, ta-manho, configuração, localização ou complexidade).

Esses princípios se desdobram em quinze características básicas, a saber: Emprego de terminologia comum; uso de formulários padronizados; estabelecimento e transferência formal de comando; cadeia e unidade de comando; comando único ou unificado; organização modular e flexível; administração por objetivos; uso de planos de ação; adequada amplitude de controle; instalações e áreas padronizadas; gerencia-mento integrado de recursos; gerenciamento integrado das comunicações; gerenciamento integrado de informações e inteligência; controle de pessoal, controle da mobilização e da desmobilização.

Embora o SCO possa ser empregado nas mais diversas situações, independentemente de sua causa, tamanho, configuração, loca-lização ou complexidade, faz-se necessário que o sistema seja implementado a partir de um roteiro básico. Dessa forma, assim que a emergência ou o desastre é percebido, um conjunto de medidas previamente esta-belecidas deve ser iniciado. A começar com o acionamento dos organismos de resposta, por meio de seus recursos operacionais, de forma que possam deslocar-se até o local da emergência e iniciar os primeiros trabalhos de avaliação e controle da situação (OLI-VEIRA, 2010).

Mesmo não havendo uma sequência linear obrigatória aplicável a todos os casos, a doutrina do SCO sugere a divisão dos trabalhos a partir de três etapas distintas: a etapa de resposta imediata, a etapa de elaboração do plano de

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NOTAS 1. A Conferência Mundial sobre Redução de Desastres (WCDR), realizada em 2005, em Kobe, Hyogo, Japão, representou um

ponto de inflexão dentro da agenda mundial em torno da redução de riscos de desastres (RRD), com a adoção do Marco

de Ação de Hyogo 2005-2015: Aumento da resiliência das Nações e das Comunidades ante aos desastres, um plano de 10

anos para alcançar um mundo mais seguro contra os riscos de desastres.

2. Esse enfoque representa o modelo de Hewitt (1997), no qual os desastres são eventos extremos da natureza, imprevisíveis

e inevitáveis, nos quais a sociedade tem papel de dependência.

3. A Gestão Integral de Risco é aquela que considera, de maneira sistêmica, todos os fatores e atores que, de uma maneira

ou de outra, incidem na geração dos riscos (também chamada de gestão integrada de risco).

4. A Guarda Costeira dos Estados Unidos (do inglês, Unidet States Coast Guard ou, simplesmente, USCG) oferece um serviço

militar, marítimo, de múltiplas missões, que se reporta ao Departamento de Defesa e representa uma das cinco forças

armadas norte-americanas.

5. O GADE foi instituído por meio do Decreto n° 7.257, de 4 de agosto de 2010, § 5°, do art. 5°.

REFERÊNCIAS

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Integrada em Defesa Civil. Brasília: 2010.

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Lição 2 – Gestão e Liderança, 2010. Disponível em: < http://training.fema.gov>. Acesso em: 10 nov. 2010.

ESTEVES JR., Hamilton Santos et al. Curso de Sistema de Comando de Incidentes. Programa Nacional de Segurança Pública

com Cidadania. Brasília: SENASP, 2008. 144p.

Estrategia Internacional para Reducción de Desastres de las Naciones Unidas (UN/ISDR). La gestión del riesgo de desastres

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Estrategia Internacional para Reducción de Desastres de las Naciones Unidas (UN/ISDR). Terminología sobre reducción del

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GOMES Jr., Carlos Alberto de Araújo; ALVES, Márcio Luiz. Curso de Capacitação em Defesa Civil: Sistema de Comando em

Operações. Guia do estudante. Capacitação à distância. Florianópolis: Lagoa Editora/CEPED/UFSC, 2004.

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Universidade Federal de Santa Catarina (CEPED/UFSC), 2009.

HEWITT, Kenneth. Regions of risk: a geographical introduction to disasters. Harlow: Longman, 1997. 389p. 

LAVELL, Allan. Desastres y Desarrollo: hacia un Entendimiento de las Formas de Construcción Social de un Desastre: El Caso

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OLIVEIRA, Marcos de. Manual Gerenciamento de Desastres - Sistema de Comando de Operações. Florianópolis: Ministério da

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U.S. Department of Homeland Security. National Incident Management System. Washington: DHS/FEMA, 2004. Disponível

em: <http://www.fema.gov/emergency/nims/>. Acesso em: 13 nov. 2010.

Sobre os autoresMARCOS DE OLIVEIRA - Coronel do Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina, Especialista em Gestão e Administração

em Defesa Civil e Mestre em Engenharia Civil, consultor do CEPED/UFSC, instrutor e facilitador do GADE.

ANTONIO EDESIO JUNGLES – Diretor Geral do CEPED UFSC, possui doutorado em Engenharia de Produção pela Universidade

Federal de Santa Catarina (1994) e pós-doutorado pela University of Alberta (2000). É Professor Adjunto da Universidade

Federal de Santa Catarina.

CARLOS ALBERTO DE ARAUJO GOMES JÚNIOR – Major da Polícia Militar de Santa Catarina, consultor do CEPED/UFSC,

instrutor e facilitador do GADE.

ação e a etapa final de desmobilização e retorno à situação de normalidade.

Resumidamente, pode-se afirmar que:

•OqueéoSCO?Ummodelocon-sistente e padronizado de gerencia-mento que estrutura formalmente um comando com abrangência em toda a operação.

•ParaqueserveoSCO?Parapermi-tir que esferas de governo federal, estadual e municipal atuem de for-ma integrada com o setor privado e organizações não-governamentais.

•Como funciona o SCO? Comoferramenta gerencial para planejar, organizar, dirigir e controlar de forma integrada todos os recursos operacionais e logísticos empregados na resposta ao desastre, indepen-dentemente de sua causa, tamanho, configuração, localização ou comple-xidade.

•PorqueoSCOéimportante?Por-que seu correto emprego aumenta a eficiência e eficácia dos trabalhos de comando, amplia a segurança dos envolvidos e reduz a perda de vidas e bens e também possíveis danos ambientais.

Considerações finais

Mais do que estar preparado para mudar a forma como se responde às situ-ações críticas nos desastres (ainda numa visão muito prescritiva baseada no uso de planos de contingência), deve-se estar preparado para conceber um modelo dou-

trinário único, alicerçado nos princípios da concepção sistêmica, contingencial e para todos os tipos de riscos e operações. É preciso torná-lo padronizado, conhe-cido, aceito e utilizado por todos aqueles que atuam em resposta aos desastres.

Com base nas recomendações da Estratégia Internacional para a Redução dos Desastres e também em função da própria experiência adquirida pelas orga-nizações de segurança pública e de defesa civil brasileira ao longo dos últimos anos, percebe-se que se faz necessária e urgente a formulação de diretrizes doutrinárias. Tais diretrizes devem ser capazes de reali-zar a administração de desastres por meio do emprego de uma ferramenta gerencial sistêmica que padronize, nacionalmente, as ações de resposta às emergências.

Além disso, cabe ainda o desenvol-vimento de estratégias de promoção do Sistema de Comando em Operações como padrão para o gerenciamento de desastres. Atualmente, essa ação está só garantida pelo Sistema Nacional de De-fesa Civil (SINDEC), sob a coordenação da Secretaria Nacional de Defesa Civil (SEDEC), do Ministério da Integração Nacional, de acordo com o Decreto nº 7.257, de 4 de agosto de 2010, e Lei nº 12.340, de 1 de dezembro de 2010 (BRA-SIL, 2010).

Finalmente, é preciso que em paralelo ao trabalho de padronização, mediante sensibilização e amplas ações de capacita-ção, seja institucionalizado um processo nacional para acompanhamento e avalia-ção do modelo SCO que permita a sua melhoria constante por meio da divulga-ção de boas práticas e lições aprendidas.

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ambiental, por meio de parcerias com órgãos governamentais, como a Agência Estadual de Planejamento e Pesquisas de Pernambuco (Condepe/Fidem), o governo do Estado de Pernambuco e os municípios da Região Metropolitana do Recife, e não-governamentais, como o Save The Children.

O propósito é estimular o protago-nismo juvenil e a reflexão do jovem para o despertar da consciência de si e do seu papel contributivo para melhoria do con-texto socioambiental no qual está inserido, partindo do princípio da construção de significados na realidade, enquanto sujeito individual e sujeito social.

Os jovens são mobilizados e se arti-culam para atuar em colaboração com a defesa civil e a escola, a quem cabe apoiá-los no desenvolvimento de ações socioeducativas e preventivas de riscos de desastres.

A partir de atividades didáticas, o jovem passa a observar, analisar e inte-ragir no seu espaço comunitário, con-tribuindo para a mitigação ou solução dos problemas identificados no mapa de risco socioambiental da comunidade.

A partir da comunicação de risco, as ações educativas realizadas propi-ciam o despertar para a comunidade, na perspectiva da apropriação do co-nhecimento de si e do espaço físico e social que ocupa. Com isso, o interesse e a necessidade de coadunar intenção e gesto para a multidisciplinaridade são fomentados, promovendo a cooperação e a solidariedade e reunindo esforços para um trabalho integrado, atuante e efetivo na mobilização de atores sociais

críticos, propositivos e corresponsáveis pelo espaço em que vivem.

O jovem representa um elo com a escola e a comunidade. Ele é possui-dor de um importante potencial que deve ser valorizado e sinalizado para a perspectiva de melhoria da condição de vida na comunidade, a partir de práticas do cotidiano voltadas à preservação do meio ambiente e à prevenção e redução de riscos socioambientais.

A mudança de atitudes para uma rela-ção menos agressiva com o meio ambiente é importante e merece ser aprofundada a partir de iniciativas educativas, envol-vendo e sensibilizando a juventude para uma reflexão dos seus comportamentos e reconstrução de atitudes que possibilitem a sustentabilidade planetária.

Estabelecer redes de relações entre os jovens e a comunidade abre uma perspec-tiva bastante proveitosa em relação a outros cidadãos que necessitam ser mobilizados, sensibilizados e envolvidos nessa relação processual de reconstrução da realidade.

O projeto Nudec Jovem traz o dife-rencial social, pois está dentro da escola, contribuindo para atuar de uma forma transversal, considerando os conhecimen-tos, informações, conteúdos e saberes de-senvolvidos na escola regular e propiciando a interface com a vivência comunitária, adquirida pelo jovem na escola da vida.

Desta forma, entende-se que a partir dos temas transversais trabalhados na escola seja possível atuar de maneira contextualizada com a possibilidade de redução de riscos e de desastres nas áreas suscetíveis a deslizamentos e inunda-ções. Por meio das relações com a escola,

Os problemas enfrentados pelas comu-nidades localizadas em áreas suscetíveis a deslizamentos e inundações são frequentes no cenário brasileiro. Esse quadro se agrava em decorrência das ações antrópicas que contribuem para a degradação ambiental.

Essa degradação ambiental, por sua vez, é resultante do processo de ocupação desordenada, que influi na ocorrência de desastres no contexto local, e da escassez de políticas públicas intersetorializadas que fortaleçam ações conjuntas para a minimização dos efeitos danosos ao meio ambiente e contribuam para a organização social nos assentamentos humanos.

Esse cenário tem gerado grande pre-ocupação à gestão de defesa civil, consi-derando a urgência de estabelecer novos paradigmas concernentes às mudanças de hábitos no contexto local.

Assim, atuar no incentivo de práticas socioeducativas, principalmente com os jovens, representa a possibilidade de criar espaços democráticos capazes de estimular a participação de todos que fazem parte da comunidade. Neste sentido, caminha-remos no intuito de fortalecer a formação

de cidadãos comprometidos com a preser-vação ambiental e a redução de desastres nos assentamentos humanos precários.

Para construir atitudes eficazes em relação aos riscos e aos desastres que têm influenciado nas condições de habitabi-lidade da comunidade, é fundamental fomentar ações socioeducativas e estimar o desenvolvimento de cidadãos críticos e predispostos a tornarem-se protagonistas de suas histórias, promovendo mudanças graduais e exitosas no contexto socioam-biental em que estão inseridos.

As mudanças comportamentais refletem nas atitudes corretas em relação ao meio ambiente, à escolha do representante, ao simples gesto pessoal de convidar um vizi-nho a participar de uma reunião do Nudec (Núcleo Comunitário de Defesa Civil) e a não tomar atitudes que possam gerar riscos aos que lhe rodeiam e a si próprio.

Na tentativa de sensibilizar jovens para o compromisso colet ivo com a comunidade nos municípios da Região Metropolitana do Recife, tem sido de-senvolvido o Projeto Nudec Jovem1 nas escolas situadas em áreas de risco socio-

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Protagonismo Juvenil: contribuindo para a prevenção de riscos de desastres

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que está no eixo da comunidade, será potencializada a participação efetiva dos atores sociais na formação de novas posturas frente aos riscos existentes na paisagem do lugar.

Estimular a participação juvenil significa promover atividades organizadas favoráveis à expressão das suas potencialidades e vivências. Nesta perspectiva, o trabalho envolvendo a escola aumenta as possibilidades de manutenção e continuidade das ações preventivas.

A participação do segmento social em questão nos trabalhos realizados na escola, nas atividades de campo e no diagnóstico realizado na comunidade suscita o forta-lecimento do protagonismo juvenil, no momento em que o jovem está no centro da formulação de propostas para a construção de ações educativas voltadas à prevenção de riscos no cenário local.

Nos trabalhos realizados em grupo, os jovens refletem e analisam o meio ambiente local, interagindo para a construção de propostas contemplativas à realidade em que vivem. Ao considerarem o olhar sobre essa realidade, despertam a compreensão de que o processo de degradação ambiental é acirrado em decorrência de hábitos e atitudes humanas negativas.

A partir dessas ações, os jovens percebem as mudanças significativas na relação com a comunidade, sobretudo, quanto às mudanças de comportamento, principalmente aquelas que provocam riscos e desastres que afetam direta e cotidianamente as suas vidas.

A Experiência de Formação de Nudec Jovem na Região Metropolitana do Recife

O projeto de formação de cinco Núcleos Comunitários de Defesa Civil Jovem foi desenvolvido a partir da mobilização e sensibilização de jovens de escolas municipais localizadas em áreas de vulnerabilidade socioambiental.

A partir de dinâmicas de integração, trabalhos em grupo e atividades de campo, foram trabalhados conteúdos pertinentes às temáticas de preservação socioambiental e riscos de desastres na realidade local e global.

Nas oficinas, foram trabalhados o conceito e os seguintes objetivos do Nudec Jovem: Direitos da criança e do adolescente em situação de normalidade e em situação de emergência; Prevenção de riscos e de desastres; A problemática da degradação ambiental; Fatores de risco; Percepção e comunicação de risco; Identi-ficação, análise e mapeamento de risco; Medidas de prevenção e controle de risco de escorregamentos ou de enchentes.

Ao considerar o olhar sob o meio ambiente local, o jovem sentiu-se estimulado

a perceber e compreender o processo de degradação ambiental a partir dos hábitos e

atitudes desenvolvidas no cotidiano local. Nesse contexto, buscou-se estabelecer inter-

faces, analisando como os seres humanos podem contribuir para os riscos e desastres

ocorridos no meio em vivem.

Com base nessas dimensões, foi realizada a sensibilização do jovem para alcan-

çar o seu despertar sobre a realidade local e a consciência ambiental, favorecendo o

pensar, o agir e a imaginação. Ao considerar essa contextualização, o jovem passou

a levantar as causas, a prever as consequências, a visualizar possíveis mudanças de

comportamento e a relacionar as questões da degradação ambiental e dos desastres

com a perspectiva individual e coletiva.

Desse modo, o eixo do processo pedagógico partiu do cotidiano, trazendo para

o desenvolvimento das atividades educativas a percepção que favorece a emoti-

vidade, as experiências, os sentimentos e pensamentos criativos como forma de

contextualizar a significação da realidade.

Desenvolvimento dos Trabalhos

As atividades previstas na Programação das Aulas2 foram desenvolvidas por meio de aulas teóricas expositivas e apoiadas em material didático. Assim, estimulou-se a discussão e os exercícios práticos sobre as temáticas exploradas com os participantes organizados em grupo, que percorreram as áreas munidos de cartografia do local, de mapa geológico, roteiro, ficha de campo e de quadros auxiliares para aplicação dos conceitos e descrição das situações de risco. Como resultado, foi apresentado um Plano de Ação Preventivo a ser aplicado na comunidade pelos jovens das escolas.

Construindo o exercício da prevenção

Possibilidades para o desenvolvimento do protagonismo juvenil

IntegraçãoNo primeiro momento, o objetivo foi favorecer o processo de conhecimento e

integração do grupo, dando aos participantes a oportunidade de verbalizar as suas características pessoais, anseios e expectativas em relação ao curso.

Os participantes foram convidados a formar um círculo. Com o material em mãos, os jovens, individualmente, puderam expor, por meio de símbolos ou desenhos, um autor-retrato. Em seguida, pediu-se aos jovens que explicitassem, por meio de frases, quais as expectativas em relação a sua inclusão no projeto e o que estavam esperando da capacitação.

No momento seguinte, cada jovem pôde expressar suas produções, expondo ao grupo o que colocaram no papel. E para fechar, foi trabalhado o conhecimento prévio que possuíam acerca do que seria necessário para um grupo ter um bom relacionamento durante o período estabelecido para o término das atividades. Os participantes, voluntariamente, expuseram os seus conceitos e opiniões para a constituição do acordo de convivência.

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ções). Por meio da troca de informações com os participantes, levantou-se os fatores que contribuem para os escorregamentos de encostas, como o descarte de lixo, o plantio de árvores de grande porte e os cortes irregulares da barreira. Após essa compreensão, as causas de deslizamentos, erosões e inundações fo-ram introduzidas à turma com mais facilidade. A aula expositiva, por meio de textos e ilustrações (fotografias e desenhos), possibilitou a interação durante as discussões.

Nessa etapa, percebeu-se que os participantes já possuíam noções sobre os fatores que contribuem para o deslizamento ou para a erosão de encostas. Muitos falaram da questão do lixo e da plantação de bananeiras. Com essa ativi-dade, houve a possibilidade de esclarecer os motivos de se evitar certas práticas inadequadas nas áreas de morros e alagados. Por meio da atividade prática de campo, percebeu-se que essa oficina foi bem absorvida pelos participantes.

Conceitos básicos de risco, processos de identificação, análise e mapeamento de risco

Transmitiu-se aos jovens a problemática dos riscos de deslizamento e erosão, para que soubessem identificar uma situação de perigo.

Essa atividade foi desenvolvida por meio de aula expositiva, na qual apresentou-se situações para identificação e análise do risco, e de aula prática de campo, para realização de um mapeamento de área piloto. Na atividade em sala de aula, foram exibidas fotografias de situações reais e figuras com casos hipotéticos, de modo que os participantes pudessem perceber o risco a partir de práticas obser vadas na comunidade.

Na atividade de campo, os participantes foram divididos em grupos e acompanhados por agentes da Defesa Civil. Cada grupo preencheu uma ficha de avaliação de risco de uma área piloto, na qual puderam assinalar os fatores que contribuem para a situação de risco. Ao considerarem o mapa da área, os jovens puderam traçar setores com situações de riscos diferenciados (baixo e alto, por exemplo). Essa etapa foi importante para que eles pudes-sem perceber como priorizar áreas que necessitam de inter venção do poder público para redução de riscos.

No trabalho em sala de aula e no campo, percebeu-se que os jovens conseguiram identificar situações de risco por meio de fotografias dos casos hipotéticos apresentados e da atividade prática de campo.

No trabalho de campo, percebeu-se que as situações de risco, como bar-reiras cortadas na vertical e com altura superior a da casa, concentração de bananeiras, ár vores inclinadas e vazamentos de tubulações de água, fatores que agravam a probabilidade de um desastre, chamaram a atenção dos jovens.

O grupo foi disposto em círculo, com o objetivo de suscitar nos presentes a in-tegração e o sentimento de acolhimento muito importante num contato inicial entre pessoas que estão começando a formar um grupo. A perspectiva era facilitar o envol-vimento e a participação voluntária nas atividades a serem propostas, pois um elo de confiabilidade começou a se formar entre os jovens.

Geralmente, o autorretrato é uma vivência que permite ao indivíduo refletir um pouco sobre suas qualidades e, com isso, falar um pouco de si ao grupo. Essa vivência fez com que cada jovem pudesse perceber não só em si, mas também nos colegas, qua-lidades que foram valorizadas, com o intuito de fazê-los refletir sobre a importância de cada um na formação do grupo.

Nesse momento, evidenciou-se que cada um dos jovens presentes tem qualidades fundamentais para a construção do Nudec Jovem. Nessa perspectiva, fortaleceu-se a possibilidade de manter as ações do projeto Nudec Jovem na escola e na comunidade.

Oficinas Temáticas sobre Participação, Solidariedade, Cooperação, Responsabilidade e Transformação Social – O sentido do voluntariado

As oficinas foram desenvolvidas com o objetivo de estimular o grupo a refletir sobre a importância da participação social na construção de uma consciência cidadã.

Procurou-se contextualizar os conteúdos sobre cooperação, solidariedade, respon-sabilidade e transformação social a partir de exemplos da realidade local.

O tema foi trabalhado por meio de atividades práticas, nas quais solicitou-se aos jovens a construção de painéis ilustrativos, representando o sentimento do grupo em relação à temática em debate. Foram utilizados os textos do manual do aluno e cenas do filme Procurando Nemo, como exemplo de solidariedade.

Após a construção dos painéis nos subgrupos, foram realizadas exposições nas quais cada equipe apresentou os trabalhos produzidos, apontando horizontes possíveis de serem realizados, considerando o fortalecimento da ação solidária e da amizade.

Estimulou-se a interação entre os subgrupos, proporcionando o debate acerca do que havia sido percebido de positivo por todos em relação à cooperação, à solidariedade, à participação e à necessidade do jovem de agir para o processo de transformação social.

Oficina sobre os Processos de Degradação Ambiental - Escorregamentos, erosões e inundações

A oficina foi trabalhada com o propósito de proporcionar aos jovens a com-preensão dos processos que degradam o meio ambiente e de discutir sobre as más ações que contribuem para essa degradação e as suas consequências à comunidade.

Inicialmente, foram apresentados os três principais processos de degradação ambiental nas encostas urbanas (deslizamento e erosão) e na planície (inunda-

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Formando um Nudec Jovem

Essa etapa representou o momento de fortalecimento do grupo, cons-truindo a partir do que foi vivenciado durante o curso o perfil que o Nudec Jovem deve ter e como ele deve atuar.

Durante os trabalhos em equipe, os jovens debateram e tomaram deci-sões quanto à importância de se formar um grupo sintonizado com a ideia de transformar a comunidade em um ambiente mais seguro e melhor para se viver.

Além disso, os jovens perceberam com as explicações e o debate a importância de estabelecer acordos de convivência significativos para a continuidade do projeto e a permanência do grupo.

Os resultados foram expostos em painéis, ressaltando sempre a impor-tância da ação solidária e da responsabilidade de cada cidadão em contribuir para a melhoria das condições de habitabilidade na comunidade.

Direitos humanos em situação de emergência

Essa etapa do trabalho foi desenvolvida com o propósito de propor-cionar aos jovens a compreensão do processo histórico vivenciado pela humanidade, que culminou com o registro documental que garantiu a consolidação dos direitos humanos e dos benefícios que possibilitaram o seu desenvolvimento.

Inicialmente, por meio de conversas motivacionais com a turma, foi estimulada e apurada a sua compreensão acerca da noção de direitos huma-nos. Com base no que se levantou, houve interação a partir da realidade e da história. Desse modo, trabalhou-se a aplicação, classificação e vivência prática dos direitos humanos na realidade global, nacional e local.

Essa temática foi trabalhada em consonância com as noções de deveres para o exercício pleno da cidadania.

Na atividade em grupo, consolidou-se os conhecimentos prévios sobre Direitos Humanos. As atividades para o desenvolvimento da temática foram realizadas por meio de textos, colagens, desenhos e elaboração de frases de efeito. Os trabalhos foram confeccionados em um cartaz que, transformado em uma dobradura, previamente orientada aos jovens, deu origem à bandeira do Brasil.

Concluída essa primeira etapa dos trabalhos em grupo, que suscitou nos jovens um desempenho reflexivo e lúdico, cada grupo apresentou sua produção com noções de direitos e deveres, objetivando o papel do cidadão no processo da construção de uma sociedade mais justa e menos excludente.

Medidas de Prevenção e Controle de Risco de Escorregamentos e de Enchentes

Nesse momento, buscou-se possibilitar o conhecimento de algumas medidas pre-ventivas para situações de risco: medidas estruturais (engenharia) e não estruturais (ação da Defesa Civil, Nudec Jovem).

Foram utilizadas apresentações em slides sobre os tipos de obras de engenharia e sobre como a defesa civil, juntamente com o Nudec Jovem e a comunidade, pode fazer para que a obra tenha uma boa durabilidade e a comunidade possa se apropriar do seu espaço de maneira a cuidar e conservar as benfeitorias realizadas no seu ambiente local.

Essa oficina representa o fechamento das etapas anteriores, destacando-se que prevenir e controlar os riscos depende das ações da comunidade e dos costumes pra-ticados no ambiente individual e coletivo. Percebeu-se que houve a compreensão dos participantes acerca da importância de se mudar os hábitos para evitar os riscos e os desastres.

Para a redução dos riscos, observou-se que os jovens juntos com a defesa civil podem fazer um trabalho de orientação da população, contribuindo com a melhoria do ambiente local.

Oficina Temática sobre Núcleo Comunitário de Defesa Civil - objetivos e atribuições

Nesse momento, trabalhou-se o entendimento da formação do Núcleo Comunitário de Defesa Civil Jovem, fazendo um elo com o trabalho desenvolvido pela Defesa Civil.

Deu-se destaque às quatro frentes de ação da Defesa Civil, prevenção, preparação, resposta e reconstrução, ressaltando que a sua atuação não se dá apenas nas situações de emergência.

Nesse momento, reforçou-se que o jovem pode estar inserido nas ações que en-volvem prevenção contra os riscos, desenvolvendo, principalmente, o sentimento de ajuda mútua e humanitária na comunidade.

Após explicações, com apresentação de imagens sobre o funcionamento da Defesa Civil e como o jovem pode estar envolvido para contribuir com a melhoria das con-dições de vida da comunidade, foi solicitado ao grupo a sua subdivisão, momento em que cada equipe ficou com a tarefa de representar, por meio de uma encenação, as quatro fases da administração de desastres.

Cada subgrupo apresentou uma encenação com base nas vivências e observações presentes no cotidiano da comunidade.

Após as encenações, alguns jovens relataram já terem vivido situações de desastres: desabamento de casa, deslizamento de barreiras ou inundações, destacando o quanto essas situações causam trauma na vida de cada pessoa.

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Planejamento de ações do Nudec Jovem

Na etapa de planejamento das ações do Nudec Jovem, traba-lhou-se a orientação dos jovens para construir o planejamento do NUDEC a partir da observação da realidade, dos problemas diagnosticados no exercício de mapeamento de risco, inter-rela-cionando-os com os conteúdos trabalhados nas aulas expositivas e trabalhos de grupo.

A partir da exposição de um vídeo, foi debatida com os jovens a importância do planejamento para a construção de um projeto social. Com enfoque no planejamento do Nudec Jovem, o facili-tador das atividades parte do princípio de qual caminho o grupo quer tomar para obter o desejado, ou seja, conseguir chegar aos objetivos traçados.

Assim, foi explicado que sendo o diagnóstico o momento em que se conhece a realidade, em que são levantados os problemas, é preciso estar com as informações referentes à realidade para planejarmos juntos as atividades e ações do Nudec Jovem.

Utilizou-se um painel contendo um quadro com os passos para a elaboração do planejamento, no qual o grupo foi levantando os pontos imprescindíveis que deveriam constar no planejamento do Nudec Jovem.

A partir disso, cada grupo construiu seu planejamento com base nas especificidades diagnosticadas em cada comunidade.

O registro fotográfico, feito com máquina digital, durante a visita in loco, foi também um recurso utilizado para os jovens defenderem as intervenções com ações estruturadoras e não es-truturadoras nas áreas visitadas.

O exercício prático vivenciado pelos participantes culminou em elementos para maior propriedade na elaboração do planejamento das ações do Nudec.

Com base nos problemas levantados e hierarquizados pelos jovens, conforme gravidade e prejuízo coletivo à qualidade de vida na comunidade, foram planejadas atividades que poderiam mitigá-los ou dirimi-los.

A partir das etapas vivenciadas, sendo o eixo do projeto o envolvimento e a sensibilização do jovem para a problemática dos riscos socioambientais, considerou-se também a redução da violência na realidade local. É importante ressaltar que o resultado das avaliações realizadas pelos jovens das seis escolas envolvidas

transmitiu um sentimento muito verdadeiro acerca da aceitabilidade e da percepção do grau de relevância dos conteúdos abordados em relação ao cotidiano e a vida.

No desenvolvimento do projeto, percebeu-se a curiosidade dos jovens em conhecer a proposta e poder relacionar as questões abordadas com as suas vivências e histórias de vida.

O diferencial, nesse sentido, é que o jovem com a continuidade do pro-jeto torna-se o protagonista no processo de transformação da sua própria realidade, sentindo-se responsável pela sua história e pela história da sua comunidade a partir das reflexões provocadas pelos trabalhos realizados durante o curso.

Por meio da continuidade do projeto, outros resultados serão observa-dos, cabendo aos atores envolvidos, Defesa Civil, Secretaria de Educação, Secretaria de Meio Ambiente, seguir as diretrizes criadas com esse trabalho, como também criar outros instrumentos que fortaleçam o desenvolvimento de atividades relevantes à integração e à motivação do grupo.

Os grupos de cada escola têm capacidades que necessitam ser estimula-das por meio do processo de descoberta, de criatividade, de conhecimentos e de experiências que favoreçam o crescimento individual e coletivo, esti-mulando a construção do saber e favorecendo a troca de experiências que permitirá a sintonia do grupo em favor da melhoria das condições de vida da comunidade.

NOTAS

1. O Núcleo Comunitário de Defesa Civil tem como princípio o envolvimento da comunidade para atuar na ação

conjunta, visando à redução dos desastres no âmbito local.

2. Programação de Aulas

Abertura do Curso - apresentação do conteúdo programático e dos objetivos

A degradação ambiental, fatores relacionados ao risco socioambiental, identificação e análise de risco; relações

entre aspectos e condições sociais e físico-naturais e as ações antrópicas (formas de uso e ocupação do solo e

práticas que contribuem para a degradação ambiental) em encostas urbanas.

Processos e metodologia para mapeamento de risco em encostas urbanas

Medidas de prevenção e controle do risco

Participação, solidariedade, cooperação, responsabilidade e transformação social – o sentido de desenvolvimento

comunitário e do voluntariado

Direitos humanos da criança e dos jovens em situação de emergência

Conceituação, objetivos e atribuições do Núcleo Comunitário de Defesa Civil/ NUDEC JOVEM

Construindo o perfil e formando NUDECs JOVENS*

NUDECs JOVENS – Oficina de Planejamento de Ações

Exercício prático de campo (simulados) - visita à área

Avaliação, discussões finais e fechamento do curso

Sobre as autorasRejane Lucena é mestre em Gestão de Políticas Públicas

Damares Lopes de Albuquerque é Assistente Social e especialista em Políticas Públicas

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