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AMBr revista 20 A Doença Renal Crônica (DRC) pode ser atualmente entendida como um problema de saúde pública, sendo necessário este conceito tanto por parte dos profissionais da saúde quanto pelos demais segmentos da sociedade, uma vez que suas implicações acabam por afetar – direta ou indiretamente – a vida de todos nós. Os rins são considerados órgãos-chave para manutenção da homeostase corporal devido às inúmeras funções básicas que exercem: controle do volume corporal, regulação da pressão arterial, depuração das escórias nitrogenadas, manu- tenção do equilíbrio hidroletrolítico e ácido básico, produção de hormônios (eritropoetina, vitamina D), regulação do metabolismo ósseo, dentre outras. A perda progressiva da capacidade renal de executar estas funções é o que chamamos de DRC. De uma maneira mais objetiva, definimos que o indivíduo é portador de DRC quando seu clearance de creatinina (exame que demonstra o grau de funcionamento renal) encontra-se menor que 60 ml/min/1.73m 2 de superfície corpórea e/ou quando o paciente apre- senta evidência de lesão renal progressiva (principalmente proteinúria ou microalbuminúria) por um período superior a três meses. Tal definição permite a classificação da DRC em estadios (numerados de um a cinco) de acordo com o grau de perda de função renal do paciente. Quando o paciente apresenta-se com um clearance de creatinina menor que 15 ml/min/1.73m 2 de superfície corpórea, ele é diagnosticado como portador de falência renal terminal (DRC estágio cinco) e necessita com urgência ser encaminha- da para confecção de um acesso definitivo e/ou instituição de alguma das terapias renais substitutivas (TRS) existentes: hemodíalise, diálise peritoneal ou transplante renal. Estima-se que existam atualmente no Brasil em torno de 90 mil indivíduos em programa crônico de diálise e mais de 20 mil transplantados renais com enxerto funcionante. Mais de 80% destes pacientes tem seu tratamento subsidiado pelo SUS. Apenas para o tratamento desta parcela de doentes, es- tima-se que 10% de todo o orçamento do Ministério da Saúde (algo em torno de dois bilhões de reais) é gasto para manu- tenção dos programas de dialise crônica (dialise peritoneal e hemodiálise) e fornecimento de drogas imunossupressoras para os transplantados renais. Ou seja, a despeito da necessi- dade imprescindível deste tratamento para a manutenção da vida destes pacientes, é um tratamento caro e extremamente oneroso para nosso sistema de saúde. Entretanto, os pacientes em TRS não são os únicos porta- dores de DRC. Estima-se que 2% de toda a população brasi- leira apresentam algum grau de disfunção renal. E os níveis atuais de incidência e prevalência de pacientes com DRC são preocupantes e crescentes. Tudo isto somado ao progressivo envelhecimento populacional brasileiro e aos níveis elevados de prevalência da hipertensão arterial e de diabetes em nos- so meio (duas das principais etiologias de DRC) constituem um campo extremamente propício para a manutenção desta o p i n i ã o Prevenção da doença renal crônica: um grande desafio Foto: Divulgação

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AMBr revista20

A Doença Renal Crônica (DRC) pode ser atualmente entendida como um problema de saúde pública, sendo necessário

este conceito tanto por parte dos profissionais da saúde quanto pelos demais segmentos da sociedade, uma vez que

suas implicações acabam por afetar – direta ou indiretamente – a vida de todos nós.

Os rins são considerados órgãos-chave para manutenção da homeostase corporal devido às inúmeras funções básicas

que exercem: controle do volume corporal, regulação da pressão arterial, depuração das escórias nitrogenadas, manu-

tenção do equilíbrio hidroletrolítico e ácido básico, produção de hormônios (eritropoetina, vitamina D), regulação do

metabolismo ósseo, dentre outras.

A perda progressiva da capacidade renal de executar estas funções é o que chamamos de DRC. De uma maneira mais

objetiva, definimos que o indivíduo é portador de DRC quando seu clearance de creatinina (exame que demonstra o grau

de funcionamento renal) encontra-se menor que 60 ml/min/1.73m2 de superfície corpórea e/ou quando o paciente apre-

senta evidência de lesão renal progressiva (principalmente proteinúria ou microalbuminúria) por um período superior a

três meses. Tal definição permite a classificação da DRC em estadios (numerados de um a cinco) de acordo com o grau de

perda de função renal do paciente.

Quando o paciente apresenta-se com um clearance de creatinina menor que 15 ml/min/1.73m2 de superfície corpórea,

ele é diagnosticado como portador de falência renal terminal (DRC estágio cinco) e necessita com urgência ser encaminha-

da para confecção de um acesso definitivo e/ou instituição de alguma das terapias renais substitutivas (TRS) existentes:

hemodíalise, diálise peritoneal ou transplante renal.

Estima-se que existam atualmente no Brasil em torno de

90 mil indivíduos em programa crônico de diálise e mais de

20 mil transplantados renais com enxerto funcionante. Mais

de 80% destes pacientes tem seu tratamento subsidiado pelo

SUS. Apenas para o tratamento desta parcela de doentes, es-

tima-se que 10% de todo o orçamento do Ministério da Saúde

(algo em torno de dois bilhões de reais) é gasto para manu-

tenção dos programas de dialise crônica (dialise peritoneal

e hemodiálise) e fornecimento de drogas imunossupressoras

para os transplantados renais. Ou seja, a despeito da necessi-

dade imprescindível deste tratamento para a manutenção da

vida destes pacientes, é um tratamento caro e extremamente

oneroso para nosso sistema de saúde.

Entretanto, os pacientes em TRS não são os únicos porta-

dores de DRC. Estima-se que 2% de toda a população brasi-

leira apresentam algum grau de disfunção renal. E os níveis

atuais de incidência e prevalência de pacientes com DRC são

preocupantes e crescentes. Tudo isto somado ao progressivo

envelhecimento populacional brasileiro e aos níveis elevados

de prevalência da hipertensão arterial e de diabetes em nos-

so meio (duas das principais etiologias de DRC) constituem

um campo extremamente propício para a manutenção desta

o p i n i ã o

Prevenção da doença renal crônica: um grande desafio

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n o t a sn o t a s

pandemia em escala alarmante, com cada vez mais pacientes renais crônicos

necessitando de tratamento dialítico.

Durante muito tempo, os focos para combate desta pandemia se resu-

miam no estímulo a abertura de novas clínicas de hemodiálise (principal for-

ma de TRS em nosso país) e no aumento no número de transplantes renais

doadores vivos e cadáveres. Apesar de ambos serem alternativas válidas, tais

medidas não resolvem o problema, uma vez que apenas atuam na parcela da

população já dialítica, não conseguindo previnir a chegada de novos pacien-

tes vindos dos outros estadios da DRC. Além do mais, são alternativas caras,

perpetuando a dificuldade de autofinanciamento de nosso sistema de saúde.

Devido ao fato de o rim apresentar uma grande reserva funcional, a maior

parte dos indivíduos portadores de DRC é assintomático até níveis avançados

da doença, quando já apresentaram uma perda expressiva de função renal.

Desta maneira, não se pode simplesmente cruzar os braços e esperar que os

doentes apareçam, pois os sintomas geralmente são tardios. A única maneira

de conseguirmos conter esta epidemia de uma maneira racional, barata e

efetiva é através da detecção precoce desta patologia, visando à instituição

rápida do tratamento conservador objetivando a prevenção da progressão da

DRC para níveis dialíticos.

Uma alternativa que já vem funcionando em algumas regiões do país é a integração de centros nefrológicos com os

Centros Primários de Saúde através do Programa de Saúde da Família. Por meio de palestras e de programas de educação

continuada, os profissionais dos centros de saúde são treinados para realizar a busca ativa de novos casos de DRC, sobre-

tudo na população de alto risco (idosos, diabéticos, hipertensos e aqueles com antecedente de DRC familiar) e instituem

as medidas clínicas iniciais, triando os casos mais graves (com perda de função renal mais acentuada) para seguimento

nefrológico secundário.

É importante salientar que o paciente renal crônico é um paciente multidisciplinar, sendo necessário para seu segui-

mento conservador adequado a atuação não apenas do nefrologista, mas também da enfermagem, psicólogos, assisten-

tes sociais, dentistas, dentre outros, visando à atuação conjunta para realização das medidas preventivas para evolução

da DRC.

Desta forma, conclamamos a todos os profissionais de saúde e a sociedade civil para participar conosco do World

Kidney Day - Dia Mundial do Rim, em 10 de março de 2011. Trata-se de uma iniciativa internacional – no Brasil coordena-

da pela Sociedade Brasileira de Nefrologia com apoio de outras Sociedades Médicas afins – com o intuito de divulgar a

imperiosa necessidade do rápido diagnóstico, prevenção e tratamento da DRC visando à promoção da saúde renal.

Faça sua parte! Acompanhe-nos nesta luta contra a Doença Renal Crônica!

Dr. Fábio Humberto Ribeiro Paes Ferraz CRM 13909-DF

Presidente da Sociedade Brasileira de Nefrologia – Regional DF

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Dr. Fábio Humberto Ribeiro Paes Ferraz