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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA - UNIFOR Diretoria de Pesquisa e Pós-Graduação Mestrado em Educação em Saúde ANA CLÉA VERAS CAMURÇA VIEIRA CRIANÇAS HOSPITALIZADAS POR ACIDENTES E AS HISTÓRIAS INFANTIS COMO ESTRATÉGIA PROMOTORA DE SAÚDE EM TERAPIA OCUPACIONAL FORTALEZA – CEARÁ 2005

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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA - UNIFOR Diretoria de Pesquisa e Pós-Graduação Mestrado em Educação em Saúde

ANA CLÉA VERAS CAMURÇA VIEIRA

CRIANÇAS HOSPITALIZADAS POR ACIDENTES E AS HISTÓRIAS

INFANTIS COMO ESTRATÉGIA PROMOTORA DE SAÚDE EM

TERAPIA OCUPACIONAL

FORTALEZA – CEARÁ

2005

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Ana Cléa Veras Camurça Vieira

CRIANÇAS HOSPITALIZADAS POR ACIDENTES E AS HISTÓRIAS INFANTIS

COMO ESTRATÉGIA PROMOTORA DE SAÚDE EM TERAPIA OCUPACIONAL

Dissertação apresentada à Banca Examinadora do Curso de Mestrado em Educação em Saúde da Universidade de Fortaleza, UNIFOR, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre.

Orientadora: Prof.a Dr.a Luiza Jane Eyre de Souza Vieira

Grupo de Pesquisa: Políticas e Práticas na Promoção da Saúde

Linha de Pesquisa: Avaliação de Políticas e Práticas na Atenção à Saúde

Fortaleza - Ceará

2005

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Esta dissertação integra a produção de conhecimentos do Núcleo de Estudos e

Pesquisas em Acidentes e Violência - NEPAV.

O trabalho contou com auxílio financeiro da Fundação Cearense de Apoio de

Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP e ajuda material do

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq.

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FUNDAÇÃO EDSON QUEIROZ UNIVERSIDADE DE FORTALEZA - UNIFOR Diretoria de Pesquisa e Pós-Graduação Mestrado em Educação em Saúde

CRIANÇAS HOSPITALIZADAS POR ACIDENTES E AS HISTÓRIAS INFANTIS

COMO ESTRATÉGIA PROMOTORA DE SAÚDE EM TERAPIA OCUPACIONAL

Dissertação apresentada à Banca Examinadora por Ana Cléa Veras Camurça Vieira, sob a orientação da Prof.ª Dr.ª Luiza Jane Eyre de Souza Vieira, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Educação em Saúde, outorgado pela Universidade de Fortaleza – UNIFOR.

Aprovada em 20 de dezembro de 2005, pelos membros da banca:

__________________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Luiza Jane Eyre de Souza Vieira

Orientadora - UNIFOR

___________________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Ana Cláudia Vasconcelos Martins de Souza Lima -

Membro Efetivo - UFPE

___________________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Maria Teresa Moreno Valdés

Membro Efetivo - UNIFOR

____________________________________________________________ Prof.ª Dr.ª Mirna Albuquerque Frota - UNIFOR

Membro Suplente - UNIFOR

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Dedico este trabalho as minhas queridas avós (in memoriam),

Hercília, Rosa, Raimunda e Miminha,

pelos exemplos de fé e de amor,

e pela intercessão a Deus nos momentos de orações,

pedindo-lhes luz para iluminar

os meus caminhos

e discernimento para conduzir

nas ações e atitudes

como filha, mulher, mãe e educadora.

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Ao meu marido, Paulo Dídimo, pela cumplicidade, carinho e acolhimento

nesta caminhada. A sua presença em minha vida é mais um presente de Deus,

aprendi com ele o verdadeiro sentido da palavra amor.

Aos meus filhos, Paulo Dídimo Filho, Ana Paula, Ana Clara que nasceu

durante o curso de mestrado pela compreensão nos momentos de ausência, pela

torcida para comemorar o fim da pesquisa e por tantas vezes me ensinarem com

seus gestos e palavras carinhosas que o amor e a união vencem todas as

dificuldades.

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Prof.ª Dr.ª Jane Eyre, pesquisadora incessante, agradeço sua sensibilidade,

determinação e cumplicidade, presença fiel em todos os momentos na realização

deste sonho.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, luz de infinita grandeza, que no decorrer deste caminho esteve

sempre presente, proporcionando-me coragem, fé e perseverança nesta

caminhada difícil. Obrigado, por todas as vezes que me acolheu e me fortaleceu

com o Seu amor, me mostrando os caminhos que eu teria de seguir.

Aos meus pais, pelo dom da vida, por serem presenças marcantes em todos

os empreendimentos da minha existência, pela realização de mais um sonho, fruto

do investimento que fizeram para minha educação.

Aos meus irmãos, Pedro Ernesto, Paulo André e Alaide, pelos incentivos

constantes nesta caminhada e, em especial, a minha irmã Rogéria Hilma, pela

presença incondicional e o apoio em todos os nascimentos dos meus filhos.

A minha madrinha, Fátima, e às primas, Débora e a Raquel, pelo cuidado e

o carinho dispensados a mim e a Ana Clara no hospital.

À presença da Cícera e Valneide, pelo carinho e cuidado com as minhas

crianças durante este percurso.

Aos meus sogros, que acompanharam este percurso, em especial, Horácio

Dídimo, poeta e escritor, despertando em mim o interesse e o entusiasmo pela

literatura infantil.

À Fundação Cearense de Apoio de Desenvolvimento Científico e

Tecnológico – FUNCAP, pelo auxílio financeiro, na realização desta pesquisa.

À Coordenadora do Curso de Terapia Ocupacional e amiga Clênia, pela

compreensão e apoio neste percurso.

À amiga Elzacy e ao seu filhinho Guilherme, minha gratidão pela

disponibilidade e apoio quando mais precisei.

À amiga, Marilene, pela ajuda e acolhimento em todos os momentos.

Aos colegas do curso de Terapia Ocupacional, que compartilharam comigo

todos esses momentos, especialmente a Elcyana e a Edda, pelas palavras de

apoio e consideração.

À Coordenadora Prof.ª Dr.ª Raimunda Magalhães e aos professores do

Curso de Mestrado em Educação em Saúde da UNIFOR, pelas contribuições e

ensinamentos, especialmente à Prof.ª Dr.ª Maria Teresa Moreno Valdés, pelos

ensinamentos e a amizade constituída.

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À Prof.ª Dr.ª Ana Cláudia Vasconcelos M. S. Lima e à Prof.a Dr.a Mirna

Frota, pela disponibilidade, contribuindo gentilmente na análise crítica dos meus

escritos.

Aos colegas da V Turma do Mestrado em Educação em Saúde, pelos

momentos de aprendizado e colaboração.

Aos funcionários do Mestrado, pela contribuição e assistência técnica.

Às alunas Luana Barreto e Kátia Savioli, pela contribuição voluntária durante

a coleta de dados.

Ao Instituto Dr. José Frota, na pessoa do Dr. Timóteo, e aos funcionários da

Unidade Pediátrica, do Instituto Dr. José Frota, em especial a Jaqueline, pela ajuda

e apoio na pesquisa.

Às crianças, a minha eterna gratidão, pelos momentos compartilhados, pela

vivência e pelos ensinamentos.

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“Sendo produtos históricos da atividade humana, todos os universos socialmente

construídos modificam-se, e a transformação é realizada pelas ações concretas dos seres

humanos.”

(P. Berger e T. Luckmann)

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RESUMO

As injúrias ocorridas na infância e as conseqüentes hospitalizações se constituem grandes desafios para promoção da saúde em crianças, em razão dos problemas que podem acarretar ao desenvolvimento infantil, principalmente na interrupção dos papéis ocupacionais durante a infância, trazendo repercussões em seu ciclo de vida. Nessa perspectiva, o estudo se propôs a compreender o sentido das histórias infantis utilizadas como estratégia promotora de saúde em Terapia Ocupacional, na percepção da criança hospitalizada. O caminho metodológico foi delineado e sustentado na abordagem qualitativa, caracterizando-se como estudo descritivo. A investigação foi realizada nos meses de julho a outubro de 2005, na Unidade Pediátrica, no Instituto Dr. José Frota, hospital de emergência com referência Norte-Nordeste do Brasil, em atendimento ao politraumatizado, situado em Fortaleza, Ceará. Participaram do estudo 10 crianças entre 6 e 10 anos, de ambos os sexos, vítimas de injúrias não intencionais. Em virtude da natureza do estudo, os dados foram obtidos em pesquisa documental, entrevista, leitura de história, anotações no diário de campo, desenho e observação participante. Os resultados foram analisados à luz dos teóricos, bem como pelos conceitos de mediação e internalização da teoria histórico-cultural e apontaram para as categorias: diversidade e ecologia da injúria, sentido das histórias, prática da leitura na hospitalização e pluralidade de cuidados. Essas categorias convergiram para o tema: histórias infantis como instrumento mediador na Promoção da Saúde em Terapia Ocupacional. Conclui-se que a utilização das histórias infantis no ambiente hospitalar, fruto da prática do terapeuta ocupacional, é estratégia promotora de saúde, por favorecer o bem-estar físico, mental e social das crianças, e desenvolver a autoconstrução de conhecimentos sobre a prevenção de injúrias. Acrescenta-se que é um instrumento adaptável ao meio, está em consonância com as necessidades e possibilidades das crianças hospitalizadas, considera os contextos pessoais, sociais e culturais e favorece a articulação com as diretrizes da promoção da saúde.

Palavras-chave: Promoção da Saúde, criança hospitalizada, Terapia Ocupacional, histórias infantis.

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ABSTRACT

Injuries occurred during childhood and their subsequent hospitalizations consist in great challenges for health promotion in children, due to the problems that could be caused to the infant development, especially in the interruption of occupational roles during childhood, raising repercussions in the life cycle. In this way, the study aimed the understanding of the sense of infant stories applied as health promoting strategy in Occupational Therapy, in the hospitalized child’s perception. The methodological pathway was delineated and based upon the qualitative approach, characterizing itself as a descriptive study. The investigation was held from July to October, 2005, at the Paediatric Unit of Instituto Dr. Jose Frota, an emergency hospital, reference to the north and north-eastern of Brasil for polytraumatized patients, located in Fortaleza – Ceará. Ten children, between 6 to 10 years old, of both genders, victims of non-intentional injuries participated on the study. Due to the nature of the study, data were obtained by means of documental research, interview, story telling, notes in a field diary, drawing and participant observation. The results were analysed enlighten by this theme’s theorists, as well as by the historical and cultural theory’s concepts of mediation and internalization and pointed out to the categories: diversity and the injuries’ ecology, the stories’ sense, reading practice during hospitalization and the plurality of the care. These categories converged towards the theme: childhood stories as a mediating instrument for heath promotion in Occupational Therapy. It is concluded that the use of infant stories in the hospital environment a result of the occupational therapist’s practice is a health promoting strategy as it favours the children’s physical, mental and social well-being, and to develop the self-construction of the knowledge concerning injuries prevention. It is also an instrument adaptable to the environment, it is in consonance with the necessities and possibilities of hospitalized children, it considers the individual, social and cultural contexts and it favours the articulation of the health promotion guidelines. Descriptors: health promotion, hospitalized child, occupational therapy, infant stories.

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LISTA DE QUADROS

01 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 1

68

02 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 2

69

03 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 3

69

04 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 4

70

05 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 5

70

06 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pelas crianças 6 e 9

71

07 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 7

71

08 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 8

72

09 Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 10

72

10 Caracterização das crianças participantes hospitalizadas na Unidade Pediátrica do Instituto Dr. José Frota. Fortaleza, Ceará, 2005

84

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LISTA DE FIGURAS

01 Representação esquemática do percurso teórico-metodológico

49

02 Representação esquemática sobre os conceitos teóricos da visão macro

51

03 Representação esquemática da zona de desenvolvimento proximal

54

04 Representação esquemática da visão meso 56

05 Representação esquemática da visão micro 58

06 Fotografia referente ao momento da leitura da história

93

07 Fotografia referente ao momento da leitura da história

93

08 Fotografia referente ao momento do desenho. 95

09 Fotografia referente ao momento do desenho 95

10 Desenho elaborado por Daniel (C1), 9 anos, sobre a história do Polegarzinho

96

11 Desenho elaborado por José (C3), 7 anos, sobre a história do Pinóquio

97

12 Desenho elaborado por Raquel (C5), 9 anos, sobre a história A galinha dos ovos de ouro

97

13 Desenho elaborado por Virgílio (C6), 10 anos, sobre a história O leão e o mosquito

98

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 16

2 O HOSPITAL, A CRIANÇA HOSPITALIZADA E A

POSSIBILIDADE DE PROMOÇÃO DA SAÚDE INFANTIL.

2.1 Hospitalização infantil: um desafio à promoção da saúde

2.2 Terapia Ocupacional, promoção da saúde e as histórias

infantis

26

29

38

3 TRAJETÓRIA TEÓRICO-METODOLÓGICA

3.1 Caminho Teórico

3.2 Decurso Metodológico

3.2.1 Abordagem e tipo do estudo

3.2.2 Locus da pesquisa

3.2.3 Participantes

3.2.4. Coleta de dados

3.2.5 Análise de dados

3.2.6 Preceitos éticos do estudo

49

49

62

62

63

64

64

66

72

4 CRIANÇAS HOSPITALIZADAS POR ACIDENTES E SUAS

HISTÓRIAS

4.1 Caracterização das crianças

4.2 Histórias das crianças hospitalizadas

74

74

76

5 HISTÓRIAS INFANTIS COMO INSTRUMENTO MEDIADOR

NA PROMOÇÃO DA SAÚDE EM TERAPIA OCUPACIONAL

85

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS 102

REFERÊNCIAS 106

APÊNDICES

ANEXO

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1 INTRODUÇÃO

A hospitalização infantil hoje é um tema bastante discutido, fruto de várias

polêmicas sobre a influência do ambiente hospitalar no desenvolvimento da

criança, constituindo objeto de estudo e reflexões sobre o conceito de saúde.

Essas discussões, sobre os rumos da saúde, focalizando o ambiente,

surgiram a partir da Terceira Conferência Internacional sobre Promoção de Saúde,

a Conferência de Sundswall (1991-Suécia), repercutindo, positivamente, com a

promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (1991) e, posteriormente,

com a criação do Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar,

que favoreceram, no Brasil, a necessidade de humanização de cuidados no

ambiente hospitalar.

A Conferência de Sundswall (1991) preconiza a necessidade de se propiciar

os ambientes saudáveis, sendo imperativa a criação de locais favoráveis e

promotores de saúde, estabelecendo que todos os profissionais da saúde podem

contribuir com esses espaços, pois são interdependentes e inseparáveis,

influenciando a dimensão física, social, espiritual, econômica e política do ser.

Reafirma a importância do compromisso que estes profissionais de saúde devem

ter no sentido de promover a saúde, preservando ambientes e condutas voltadas à

humanização no atendimento junto ao usuário do serviço (BRASIL, 2001).

O Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar-

HUMANIZA-SUS (2003) surgiu em decorrência de questões históricas que

conduzirão à implantação e consolidação do sistema de saúde brasileiro. O

hospital era um local de isolamento e segregação, pois acolhia pessoas portadoras

de alguma doença e que não deveriam estar no convívio familiar, social (BRASIL,

2001).

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Esse local ou ambiente de cura inerente ao modelo biomédico,

tradicionalmente é retratado (FOULCAULT, 1998; RIBEIRO 1993) como forma de

punição, para quem, de alguma maneira, foi profundamente acometido pela

enfermidade, especialmente para aqueles que possuem personalidades fatalistas,

que os predispõem ao desenvolvimento de algumas doenças (BARASCH,1997).

Foulcault (1998) enfatiza, por sua vez, que o hospital é o criador de

doença, pelo domínio fechado e doentio que representa, como também pelo

espaço social em que está situado. Essa separação, destinada a proteger,

comunica a doença e a multiplica infinita vezes.

Com a reforma sanitária e as tentativas de mudanças e reconstrução de

paradigmas sobre a assistência hospitalar brasileira, Andrade et al (2001)

identificaram a urgência de se repensar a percepção estabelecida histórica e

culturalmente pela sociedade sobre o conceito de hospital e as nuanças que

permeiam o atendimento à criança hospitalizada.

Atualmente, preconiza-se a transformação do hospital em um ambiente

significativo para Promoção da Saúde, implementando e adequando as

biotecnologias ao contato humano, assim como a relação dos profissionais com o

contexto e com as necessidades da criança e da família que vivenciam o processo

de adoecimento.

Esse lugar tão peculiar chamado de hospital foi, nos anos 70, na Suécia,

objeto de estudo e análise. Na descrição de Lindquist (1993), já nessa época, dava

aos pais a oportunidade de permanecer acompanhando seus filhos neste espaço,

concluindo que a presença dos primeiros concorria significativamente para o

restabelecimento da saúde da criança enferma.

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O Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar, lançado

em Brasília, no dia 24 de maio de 2000, apresenta propostas concretas e ações

claramente definidas. A iniciativa de criação desse programa expressa uma

decisão de enfrentar os grandes desafios de melhoria da qualidade do

atendimento público à saúde e de valorização do trabalho dos profissionais dessa

área. O programa é um convite aos profissionais de saúde, para que trabalhem

com afinco nessa direção, e uma abertura para que as demandas da população se

imponham como determinante maior do direcionamento e da qualidade dos

serviços (BRASIL, 2001).

Considera-se o Programa de Humanização da Assistência Hospitalar uma

oportunidade de propor, discutir e empreender um processo de mudanças na

cultura de atendimento vigente nos hospitais, assim como sensibilizar os

profissionais de saúde em relação a algumas condutas terapêuticas. Assim,

incluem-se em seus objetivos a concepção e implantação de novas iniciativas de

humanização nos hospitais que venham a beneficiar os usuários e os profissionais,

além de capacitar as equipes no hospital para o novo conceito de atenção à saúde

que valoriza a vida humana e a cidadania (BRASIL, 2001).

Visando a salvaguardar alguns desses direitos, surgem no Brasil, a partir

da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente, várias questões sobre o

direito da criança e do adolescente, especificamente durante o período de

hospitalização. Entre esses direitos, encontra-se o fato que a criança e o

adolescente têm o direito a serem acompanhados por mães, pais ou responsáveis,

conhecerem sua enfermidade e os cuidados terapêuticos e diagnósticos, bem

como o prognóstico, de acordo com a sua fase cognitiva. Devem, ainda, receber

amparo psicológico quando se fizer necessário, desfrutar de alguma forma de

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recreação, programas de educação para a saúde, acompanhamento do currículo,

durante o período de internação hospitalar (BRASIL, 1991).

A partir do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), elegem-se

algumas necessidades básicas da criança, não se fazendo referência aqui apenas

à sobrevivência. Para que seja feliz, acredita-se que esta criança necessita ser

amada, sentir-se segura, aceita incondicionalmente e acolhida pelos pais ou

responsáveis, tratada com respeito e tolerância, além de ouvida. Essas

necessidades, que estruturam e favorecem a aquisição de autonomia, devem ser

preservadas, independentemente do ambiente em que elas estejam (BRASIL,

1991).

Diante desse contexto, a hospitalização torna-se um tema que suscita

reflexão para os profissionais que lidam com a prática da Educação em Saúde, não

perdendo o foco no ambiente hospitalar, mas ampliando a visão para a dinâmica

das relações interpessoais de assistência junto a essa criança.

Considerando o hospital um ambiente de cura, esse ainda pode se

constituir para a criança como agente de agravo à saúde mental, devido à

normalização, rigidez de horários para os procedimentos e ações, interrupção das

atividades escolares, bem como a prioridade do atendimento às necessidades

clínicas.

Desse modo, assinala Santa Roza (1997) que a hospitalização na infância

pode configurar uma experiência potencialmente traumática, pelo afastamento do

convívio familiar, perda da autonomia, mudanças comportamentais como medo,

ansiedade, regressão e insegurança que dificultarão a recuperação da saúde.

Essa informação faz refletir sobre o trabalho em equipe interdisciplinar, a

necessidade de inclusão do terapeuta ocupacional, contribuindo para desenvolver

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programas de humanização, que incluem estratégias associadas às histórias

infantis, no sentido de colaborar com o restabelecimento da criança, no ambiente

hospitalar.

De Carlo e Bartalotti (2001) reportam-se sobre à repercussão de

experiências hospitalares em crianças, identificando o fato de que, quando uma

criança se sente segura torna-se disponível na relação com o outro e com o mundo

que a cerca, e isto influenciará na sua aprendizagem e adaptação.

Para contextualizar a prática do terapeuta ocupacional nos ambientes

hospitalares, relaciona-se a ciência Terapia Ocupacional ao indivíduo, aos papéis e

às ocupações. Para Hagedorn (2003), esses são os elementos-chave nas relações

e no desempenho ocupacional no ambiente em que vive. Os terapeutas

ocupacionais têm a função de encorajar os indivíduos nos processos de terapia,

direcionando atividades e tarefas de forma criativa e terapêutica para alcançar

objetivos que sejam significativos e relevantes para a vida diária.

Nessa perspectiva, é necessário investigar a ação da prática terapêutica

ocupacional no sentido de atenuar essas manifestações negativas, canalizando

atitudes positivas, viabilizando ações que proponham a atenção integral à saúde da

criança por meio da assistência humanizada no ambiente hospitalar.

De acordo com Takatori (2003), a história da criança e a compreensão do

seu contexto familiar são pontos de partida para a assistência terapêutica

ocupacional. O principal caminho para elaboração dessa assistência no entanto, é

a observação, considerando que a visão do olhar do terapeuta ocupacional

investiga o que ocorre na relação estabelecida com o cliente e as atividades,

principal instrumento utilizado para registrar e compor uma história que traz

elementos do sujeito da assistência, de seu dia-a-dia e de suas necessidades.

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O terapeuta ocupacional e outras crianças que participam do grupo de

histórias em estudos realizados por Florey apud Parham e Fazio (2000) podem agir

como intérpretes da adequação social e cultural das ações destes sujeitos,

esclarecendo eventos reais. O processo de ouvir a história da criança pode abrir

uma janela para que este profissional compreenda seu mundo e suas percepções a

partir dos questionamentos sobre as histórias infantis e a doença.

Há nessa proposta a intenção de aproximar ou rever meios e momentos

do ambiente de casa para o locus hospitalar, mediante a presença da

acompanhante (mãe) ou qualquer outra pessoa que tenha vínculo com o seu lar,

com a sua família e com o seu cotidiano, que foi interrompido, e desenvolver

atividades que desmitifiquem a hostilidade provocada pelo hospital.

Partindo desse pressuposto, em 2001, a Fundação Abrinq, o Citigroup e o

Ministério da Saúde se uniram para instalar bibliotecas e capacitar profissionais de

saúde, como contadores de histórias infanto-juvenis em diversas situações, como

nas salas de espera, momentos transitórios ou livres da internação e em

atendimento nos hospitais. Esse projeto que, é chamado de Biblioteca Viva em

Hospitais, tem o objetivo de fazer com que a hospitalização não seja somente um

fator de exclusão, mas possa colaborar com a promoção do universo imaginário da

criança.

A partir daí, o Ministério da Saúde interessou-se em estabelecer uma

parceria, visando à humanização da assistência à criança hospitalizada. Ao

Programa da Biblioteca Viva, contudo, cabe a instalação da biblioteca, com a

formação dos profissionais de saúde para que atuem como mediadores de leitura

para as crianças em situação de internação, em consulta ou atendimento

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ambulatorial e a doação de acervos de literatura infanto-juvenil (FUNDAÇÃO

ABRINQ, 2001).

Atualmente, no Brasil, o Programa serve de referência para política de

humanização hospitalar desenvolvida pelo Ministério da Saúde e acontece nas

seguintes cidades: Anápolis/GO, Bauru/SP, Belo Horizonte/MG, Blumenau/SC,

Brasília/DF, Campinas/SP, Campo Grande/MS, Cotia/SP, Curitiba/PR,

Diadema/SP, Fortaleza/CE, Fundão/ES, Limeira/SP, Mauá/SP, Niterói/RJ,

Osasco/SP, Paraibuna/SP, Parati/RJ, Piracicaba/SP, Porto Alegre/RS, Recife/PE,

Ribeirão Preto/SP, Rio de Janeiro/RJ, Salesópolis/SP, Salvador/BA, Santo

André/SP, São Bernardo do Campo/SP, São Caetano do Sul/SP, São Paulo/SP,

Serrana/SP, São Luís/MA, Sorocaba/SP e Taguatinga/DF (FUNDAÇÃO ABRINQ,

2001).

Nessa perspectiva, o uso da leitura de histórias infantis aparece como uma

possibilidade de ser uma prática educativa para a Promoção da Saúde. Caldin

(2002) acentua que, a partir do momento em que a história “tira” a criança por

alguns momentos desse mundo de sofrimento, conduz a criança a sorrir, a sonhar,

ajudando-a no alívio de suas tensões, diminui o estresse e auxilia na adaptação ao

ambiente hospitalar.

Independentemente da cultura, circunstâncias socioeconômicas ou

tradição, as histórias infantis são conhecidas de todas as crianças e adultos, e

surgiram com a intenção de promover na criança elos entre o mundo real e o

imaginário.

As histórias infantis não são somente frutos da imaginação, mas nascem de

acontecimentos reais do cotidiano ou fatos que compõem a história de vida da

criança e são repassados de gerações a gerações.

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Segundo Matthews (2001), as histórias infantis incitam a avaliar situações

diferentes da nossa experiência diária, até mesmo de mundos diversos daquele

que nos é familiar, e compartilhando o que os filósofos chamam de “exercícios de

idéias”. Os exercícios de idéias são uma boa maneira de traçar relações

conceituais e refletir sobre os enigmas filosóficos, imaginar um mundo em que não

haja medidas padronizadas, incitando o ouvinte ou leitor a um convite sobre os

modos de pensar e compreender.

Por meio das histórias infantis, levamos a criança a saber pensar,

imaginar, sonhar e a constituem uma sociedade cidadã. Para Demo (2002), saber

pensar não é só pensar, é sobretudo intervir, e quem sabe pensar não faz por

fazer, mas sabe por que e como fazer.

É nesse sentido que a leitura das histórias infantis no ambiente hospitalar é

capaz de transformar momentos de sofrimento e fazer com que a criança em

interação com o terapeuta ocupacional e mediador dessas histórias adentre o

imaginário mundo da literatura infantil, já que se encontra tão distante do seu real.

Esse encantamento do ser humano pelas histórias é assinado por Shemer apud

Demo (2002) como traço genético, descrevendo-o como um contador de histórias,

a partir dos fatos da vida cotidiana tece como narrativa, sobretudo para fazer boa

figura diante dos outros e interpretando a realidade.

Abordar esse tema é um desafio fascinante, porquanto une as vertentes

teóricas da educação, da literatura infantil e da saúde, requer interdisciplinaridade,

porque aborda a criança em toda sua complexidade de ações, não pelo monóculo

da doença, mas oferece a possibilidade de práticas educativas simples, baseadas

no que a criança mais conhece, sabe e gosta de fazer, seja ler, contar, inventar e

ouvir histórias.

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As atividades lúdicas, envolvendo as histórias infantis, proporcionam

estímulos à imaginação. Vygotski (1998) assinala que a criação de um estado

imaginária não é algo fortuito na vida da criança, pelo contrário, é a primeira

manifestação da emancipação da criança em relação às restrições situacionais.

As histórias infantis deverão ser postas nesse âmbito hospitalar como

práticas educativas e mediadoras, na tentativa de observar o impacto sobre as

ações e atitudes da criança, proporcionando autonomia e elaboração de

conhecimentos a partir do lúdico, recuperando a sensibilidade, compartilhando

momentos de alegria, valorizando a capacidade de imaginação, respeitando a

liberdade, a iniciativa, a criatividade, instituindo uma prática mais integradora,

voltada para a realidade e a complexidade do ser “cliente-criança”.

Analisando o contexto da hospitalização, a proposta desta pesquisa surgiu

das minhas inquietações no convívio com crianças, no Centro de Reabilitação

Infantil da Associação Beneficente Cearense de Reabilitação (CRI-ABCR), onde

pudemos observar o quanto é importante promover uma experiência de

hospitalização positiva para as crianças.

Nesse Centro de Reabilitação, as crianças necessitavam de cirurgias

reparadoras freqüentemente e retornavam ao atendimento com visíveis mudanças

de comportamento: medo, insegurança e dificuldade de relacionar-se com os

técnicos do Serviço de Reabilitação, acarretando inúmeras dificuldades,

principalmente falta de colaboração durante o tratamento, restrições relacionadas

com a vestimenta branca dos profissionais, promovendo adiamento no processo na

evolução do tratamento.

Essa observação foi reforçada durante a nossa prática em docência nas

disciplinas Atividades e Recursos Terapêuticos I e II e em leituras sobre atividades

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terapêuticas, no Curso de Terapia Ocupacional, da Universidade de Fortaleza,

assim como na participação em bancas examinadoras e orientações de trabalhos

relacionados com crianças, que iniciavam atendimento terapêutico ocupacional,

após permanecerem ou terem passado por um período de internação hospitalar

significativo.

A partir da descrição deste contexto, surgiu o interesse em pesquisar

opções de recursos e atividades que poderiam subsidiar práticas educativas, e

serem inseridas no cotidiano da criança hospitalizada, centradas na sua cultura e

no seu desenvolvimento cognitivo, transformando-se em estratégias promotoras da

saúde.

Desse modo, o saber popular e espontâneo da criança deve somado às

ações em Educação em Saúde a partir de iniciativas que favoreçam

transformações no ambiente hospitalar, possibilitem o acolhimento, uma relação

dialógica entre o terapeuta ocupacional e a criança.

Nesse sentido, a pesquisa teve como objetivos:

• compreender o sentido das histórias infantis utilizadas como estratégia

promotora de saúde em Terapia Ocupacional na percepção da criança

hospitalizada;

• descrever os efeitos provocados pelas histórias infantis sobre as ações e

atitudes das crianças hospitalizadas; e

• analisar como a criança reconstitui, por intermédio do desenho, a história

contada, e quais as relações que estabelece entre suas vivências.

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2 O HOSPITAL, A CRIANÇA HOSPITALIZADA E A POSSIBILIDADE

DE PROMOÇÃO DA SAÚDE INFANTIL

A descoberta do “ser criança” padeceu por séculos no abandono e

reconhecimento pela sociedade. Heywood (2004) descreve que o obscurantismo

pairava sobre as crianças na Antigüidade (sec. IV) e o infanticídio era prática muito

comum. Posteriormente, no século XIV, a criança, apesar de encontrar o seu lugar

na vida afetiva dos pais, ainda não exercia os seus papéis ocupacionais. Somente

no final dos séculos XVII-XVIII, com o surgimento da Pediatria, que considerava a

criança objeto de estudo e preocupava-se com as altas taxas de mortalidade, esse

“ser criança” é percebido.

Ainda não era compreendido, porém, o seu psiquismo, fato que surgiu a

partir dos séculos XIX e XX, em decorrência do interesse de sociólogos,

psicólogos, pedagogos e filósofos, dentre eles, Rosseau, Pestalozzzi, Froebel,

Piaget, Vygotski, Luria, Wallon, Leontiev, com trabalhos voltados ao

desenvolvimento infantil e idéias sociointeracionistas (COLL et al.,1995).

Nesse contexto histórico, outro fato importante é o surgimento do hospital

com finalidade terapêutica. Pitta (1994) descreve que o marco de transformação

em suas atribuições ocorreu somente no final do século XVIII, nos trabalhos da

lavra de Howard e Tenon, na mesma época (1775-1780).

Como resultado dos trabalhos dos autores ora citados podemos conhecer as

condições de trabalho hospitalar impostas as pessoas e aos clientes, através de

documentos que descreviam detalhadamente as características, fluxos e

aberrações. Conseqüentemente, a elaboração de um relatório apoiado em

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documentos com o intuito de, pela primeira vez, sistematizar as ações terapêuticas

desta instituição acerca das evidências sobre a situação crítica em que se

encontravam os postos de trabalhos, a identificação de condições de maus-tratos,

e, sobretudo, a necessidade de instituir um programa para a reconstrução dos

hospitais (PITTA 1994).

A medicina e o hospital permaneciam desvinculados até meados do século

XVIII, porém, com o surgimento da atuação do médico no hospital, há profundas

mudanças no sentido do ambiente hospitalar. Antes, o hospital era caracterizado

em sua forma mais geral pelos estigmas da miséria, limitando a sua função a

proteger as pessoas sadias contra a doença, proteção dos usuários contra as

práticas ignorantes: é preciso preservar o povo dos seus próprios erros; proteção

dos usuários uns com relação aos outros (FOUCAULT, 1998).

Na metade do século XX, com a produção industrial dos quimioterápicos e

de equipamentos, o hospital adquire outras características e missões, próprias da

contemporaneidade. Ribeiro (1993) descreve alguns fatos sociais e econômicos

que marcaram ou redesenharam este novo espaço. Um deles foi a transferência da

morte para o hospital. Além de sua função curativa, ficou marcado como um local

apropriado para morrer; isso ocorre entre 1930 a 1950. Outro fato que reproduziu

essa nova imagem foi a atividade econômica sendo agora visto como empresa e

local de investimentos e tecnologias em saúde, assim como de qualificação

profissional.

Ribeiro (1993) alerta para a noção de que a trajetória secular e universal do

hospital revela e descreve em diversas culturas elementos comuns registrados e

agravados, pela própria trajetória histórica e cultural na qual se desenrolaram a

missão e a função do hospital até os dias de hoje.

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Na atualidade, porém, a instituição hospitalar continua necessitando de

reformas imediatas que respondam as mudanças do conceito de saúde e doença e

ampliem as possibilidades de estratégias de Promoção da Saúde.

O profissional de saúde dever ser promotor de ações de saúde. Para isto

não basta somente conhecer sobre a relação saúde–doença, o adoecimento e os

malefícios que a doença traz, mas transformar-se e se capacitar em Educação em

Saúde, contribuindo para minimizar os efeitos da hospitalização e o favorecimento

para a qualidade de vida da criança hospitalizada, do acompanhante e da equipe

no ambiente hospitalar.

Esse processo requer reflexão entre os profissionais de saúde, que não

devem subestimar os resquícios históricos que ainda predominam atualmente nas

instituições hospitalares advindas do século XVIII, reproduzindo modelos

ultrapassados na assistência à criança e potencializando as repercussões sobre os

efeitos da hospitalização infantil.

Essa forma de redesenhar o hospital contemporâneo atingiu diretamente os

profissionais, a clientela e a prática médica através de linhas demarcatórias e

formações de agrupamentos entre esses elementos. Esses resquícios produzem

males na dinâmica do contexto hospitalar até hoje, causando implicações nocivas

ao atendimento junto à criança.

Essas modificações na imagem e transformação do hospital ocorreram

concomitantes à definição e à história da criança. Durante séculos a infância foi

desconsiderada pela sociedade que supunha que a vida das crianças não era nada

além de uma sucessão de sono e sombra (COLL,1995).

Estudo realizado por Oliveira (1993) constata que o hospital, para a criança,

é um local de proibições onde não se pode andar pelos corredores, jogar bola,

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tomar ar fresco, falar alto, conversar com outras crianças, brincar. E, no entanto,

contraditoriamente, é um local de infantilização, onde os maiores são colocados em

berços e alimentados por mamadeiras – o que lhes causa profunda indignação.

Será que ainda há dificuldade em perceber, identificar e respeitar a fase da

infância, mesmo em ambientes que devem ser promotores de saúde?

Diante dessa perspectiva histórica, podemos questionar quais os resquícios

que ainda persistem no atendimento à criança desde a Idade Moderna até os dias

atuais no ambiente hospitalar, colaborando para intensificar os fatores inerentes ao

processo de hospitalização? Que influências esses ambientes refletem sobre a

criança, na execução de seus papéis e atividades ocupacionais?

2.1 Hospitalização Infantil como desafio para a Promoção da Saúde

A hospitalização é um estado que representa o rompimento do desenrolar

normal do cotidiano da criança. Esse momento, no qual a criança se reconhece

como “hospitalizado”, tem algumas associações descritas e pertinentes

relacionadas aos hospitais, sejam da rede pública ou privada.

São fatores inerentes ao processo de hospitalização: o medo do

desconhecido, retratado pela nova realidade que se descortina sem pedir opinião,

ou dar qualquer explicação ou informação, a separação de suas roupas e seus

utensílios ou objetos pessoais, impondo-lhe a despersonalização, a determinação

de regras e horários da instituição, a sensação de punição e/ou culpa, tudo isto é

interpretado como produtos da desobediência aos pais ou a família, a dor, seja

física em virtude dos procedimentos invasivos, ou psicológica, acompanhada da

separação dos amigos, do convívio familiar, acarretando uma sensação de

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abandono, além da limitação das atividades escolares, o impedimento das

brincadeiras, o lazer e/ou práticas esportivas tão comuns nessa idade.

Autores, como Spitz; Escardó; Bowlby; Aubry; Sarti; Glaser; Eisenberg;

Illingworth, citados por Chiattone e Angerami Camon et al (2003), detiveram-se no

estudo de todos os efeitos proporcionados pela hospitalização, e apontaram a

privação materna acompanhada da sensação de abandono como causadoras de

diversos malefícios à saúde emocional, física e intelectual da criança. Esse quadro,

segundo o Relatório de Aubry (1955), citado por Chiattone et al (2003), pode ser

intensificado, dependendo da idade da criança, da situação psicoafetiva e seu

relacionamento com a mãe, personalidade e capacidade de adaptação da criança,

atitudes da equipe hospitalar, rotinas hospitalares, experiências não satisfatórias

vivenciadas durante a hospitalização e o tempo da internação.

De acordo com estudos realizados por Spitz (1993), na Casa da Criança

Abandonada, que abrigava 91 bebês nos Estados Unidos, foram observados os

efeitos da Síndrome da Privação Afetiva ou hospitalismo, dentre eles: choro, perda

de apetite, perda de peso, regressão, insônia, retraimento, rigidez facial, aumento

de morbidez, movimentos atípicos dos dedos, dentre outras reações de carência,

as quais ocasionaram aumento de mortalidade.

Apesar dos estudos realizados sobre a Síndrome da Privação Afetiva ou

hospitalismo e suas terríveis conseqüências, atualmente, no Brasil, ainda há

hospitais que não cumprem o Estatuto da Criança e do Adolescente, alegando falta

de recursos. Citamos como exemplo uma entrevista concedida ao jornal Gazeta do

Povo (PR) pelo gestor em saúde do Hospital das Clínicas do Paraná, ao assinalar

que a estrutura física do hospital é da década de 1960, portanto, não há espaço

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sequer para colocar uma cadeira ao lado de cada cama e que as grandes

enfermarias possuem apenas um banheiro (GAZETA DO POVO, 2004).

Esse fato leva os gestores dos hospitais a se defenderem, garantindo que a

maior dificuldade para se cumprir o que determina o art. 12 do Estatuto da Criança

e do Adolescente é financeira, e atribuem a culpa ao Ministério da Saúde, pela

ineficiência no repasse de verbas (GAZETA DO POVO, 2004).

Para Lamare (2005) esse descompasso das garantias legais em relação à

saúde e a realidade no cotidiano de adolescentes e jovens decorre de múltiplos

fatores, dentre os quais se destacam: a insuficiente sensibilização dos gestores

quanto à importância da atenção à saúde dessa parcela da população; o baixo

percentual de profissionais da atenção básica capacitados para esse tipo de

atendimento; a noção de que apenas os "especialistas" e os centros de referência

seriam suficientemente qualificados para atender as suas demandas; a falta de

integração entre os serviços de saúde e as demais instituições públicas e não

governamentais que atendem à população jovem.

Essas questões fazem com que o direito constitucional à saúde, seja

negado, e concorrem para marcar a realidade com entraves nas Políticas Públicas

impedindo os avanços no Sistema Único de Saúde (SUS) e o cumprimento do

Estatuto da Criança e do Adolescente. Embora, obstáculos fortes

comprometedores alicercem formas e meios de manter a família afastada do

doente em alguns hospitais, potencializando os efeitos da hospitalização,

aumentando, conseqüentemente, a permanência e o tempo de internamento e o

gasto financeiro para o Estado, isso não é regra geral.

Essa afirmação é confirmada por estudos realizados no Hospital Pequeno

Príncipe, de Curitiba, onde 100% das crianças internadas (particular ou Sistema

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Único de Saúde) são acompanhadas em tempo integral por algum parente ou

responsável, resultando numa redução de 50% do tempo de permanência. Esse

estudo revela que as crianças costumavam permanecer internadas por cerca de 12

dias e, quando acompanhadas, esse tempo se reduz para 5 dias,

conseqüentemente diminuindo o custo do doente (GAZETA DO POVO, 2004).

Estudo realizado por Oliveira (1993), no Brasil, relata que é a mãe o

familiar mais próximo da criança doente, personificando o “amor materno”, pois é

ela quem codifica os sintomas como sendo doença, e esse ponto de referência que

as crianças colocam na mãe faz com que seja alvo de identificações amorosas

profundas, refletindo a necessidade da criança de ter a presença próxima de

alguém que lhe transmita confiança.

Em consonância com a afirmação de Bowbly (1984) ao descrever a Teoria

do Apego e assegurar que todo comportamento que busca proximidade pode ser

denominado de apego, e que há determinadas condições que o ativam e o

requisitam, como: fome, fadiga, dor, frio, mãe ausente, e a doença conjugada com

a hospitalização, o apego se torna ainda mais imprescindível ao bebê e à mãe.

Esses fatores contribuem para o agravamento da hospitalização infantil.

Estudo realizado no Brasil por Chiattone et alii (2003) numa enfermaria pediátrica

do Hospital Brigadeiro, na cidade de São Paulo, durante quatro anos, observou que

os fatores como atitudes da equipe hospitalar e rotinas hospitalares concorrem

para agravar a hospitalização em crianças.

Ao se reportar sobre as atitudes da equipe hospitalar, basicamente o que

se observa, seja em hospital do Sistema Único de Saúde ou privado, é que as

pessoas atuantes nessa instituição o fazem sob forma de agrupamentos humanos

organizados, seja este representado pela equipe da enfermaria, da sala cirúrgica

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ou da UTI, ou pelos aglomerados informais, figurados nos acompanhantes. Por

isso, é importante tanto para os profissionais da saúde como para os usuários do

serviço que não se perca este espírito de grupo.

É comum imaginar apenas a equipe médica como grupo organizado dentro

do contexto hospitalar, mas, paralelamente a esta equipe, há uma rede de

relacionamentos que se tecem mediante do consolo e do aconchego formada pelos

acompanhantes dos usuários.

Nesse contexto, Siqueira et al (2002) ressalta que o simples fato de serem

ouvidas e ouvir o relato de outras mães na mesma situação poderá ajudá-las a

transpor este momento com um pouco mais de segurança.

Essas relações humanas entre os acompanhantes, os usuários e a equipe

são indispensáveis, considerando que os elementos informação e diálogo

concorrem para o entendimento e compreensão da dinâmica hospitalar, facilitando

a convivência entre estes grupos durante o período de permanência no hospital e

contribuindo para melhoria da qualidade de vida de todos. Da mesma forma

acontece com o compartilhamento do espaço e do tempo hospitalar entre aqueles

que se encontram doentes.

Enfatizando a necessidade de se fazer pertencer e demonstrando a

necessidade que o ser humano tem de conviver com o outro, Bellato e Carvalho

(2002) descrevem a necessidade do quanto é necessário ter um acompanhante,

quando se está hospitalizado e que a presença do outro no mesmo espaço,

propicia confiança, conforto e acolhimento.

O acompanhante em unidades de internação geralmente é um

componente familiar e este não pode deixar de ser visto como um usuário do

serviço, uma vez que os sentimentos, os conhecimentos e os comportamentos da

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família-acompanhante estão envolvidos, ampla e diretamente no processo

terapêutico, segundo nos fala Souza et alii (2003).

Outro evento que acentua a hospitalização em crianças são as rotinas

hospitalares, que envolvem a rigidez dos horários de medicação, higiene,

alimentação, condutas terapêuticas em certos procedimentos que envolvem

exames, tão temidos pelas crianças, ameaçam dor e pelo medo, que muitas vezes

são considerados e descritos como atos de violência.

Em estudo realizado no Chile sobre a violência hospitalar com usuários,

Moreno e Klijn (2003) apontam que o paciente ou usuário se apresenta susceptível

a todos os estímulos e relações que surgem no contexto hospitalar e reconhecem

essa atenção como despersonalizada e sem privacidade, convertendo-o em uma

vítima em potencial de atos violentos. Assinalam sobre a importância de uma

atenção em saúde baseada no respeito e na dignidade do usuário; enfatizam que é

necessário estudar o fenômeno da violência desde a óptica dos usuários que se

encontram em centros de saúde, com a finalidade de contribuir para

implementação da atenção do cuidado adotado nos hospitais.

Vieira e Soares (2004), em estudo realizado no Município de Fortaleza,

num hospital Infantil de Assistência Terciária, apontaram que as reações

provocadas pelos exames nas crianças eram, principalmente, de dor e de medo. A

dor foi uma manifestação real, nada imaginária, e o medo configurou-se pelo

desconhecido, pelas experiências novas, diversidade de aparelhos e ruídos

diferentes.

Diante de tais fatos descritos, há uma exigência muito clara da

necessidade de repensar a prática e a atitude do profissional de saúde. Torna-se

urgente implementar a humanização na assistência hospitalar, prover estratégias e

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ações em Educação em Saúde, restaurar a identidade individual, a dignidade, o

respeito, a responsabilidade e a solidariedade.

O profissional de saúde em momento algum deve desvencilhar-se do

caminho da Promoção da Saúde, ao contrário, deve incluir no rol atividades em

Educação em Saúde, manutenção e proteção, desenvolvimento da comunidade e

do meio ambiente, pesquisas e políticas de saúde pública.

Baseando-se no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e no

Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), a

Sociedade Brasileira de Pediatria (BRASIL, 1995) aprovou na íntegra o texto sobre

os 10 passos para atenção hospitalar humanizada à criança e ao adolescente

relativo aos seus direitos durante a hospitalização.

Esse documento prevê a realização de ações que garantam a cidadania e a

humanização durante a assistência natal, a implantação do programa de transporte

ao paciente, o acolhimento hospitalar adequado durante o pronto-socorro, no

ambulatório, unidades de internação, bloco cirúrgico e nas unidades de terapia

intensiva, a garantia da participação da família na recuperação integral da criança e

do adolescente, o investimento em programas educativos, culturais, lúdicos e

religiosos.

Além do aperfeiçoamento técnico e científico, fortalecendo as relações

pessoais, interpessoais e institucionais da equipe, são importantes o

estabelecimento de parcerias éticas que visem à promoção da saúde, assegurando

a referência e contra-referência e, finalmente, a instituição do programa de

internação domiciliar.

Apesar do esforço dessas entidades e do crescente aumento de publicações

sobre o Programa de Humanização Hospitalar, ainda persiste a falta de informação

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aos usuários, colocando-os em posição de passividade ao restabelecimento da

saúde, não considerando que o acompanhante seja o mediador nessa relação

equipe de saúde e doente, e muitas vezes conhecem com profundidade e detalhes

sobre a história de vida daquele que acompanham, principalmente em se tratando

de crianças, pois, na maioria das vezes, é a mãe quem percorre com o filho todo o

itinerário hospitalar.

Concordamos com Mezzomo (2003) ao evidenciar que aprimorar as

relações humanas em todos os ambientes e níveis no hospital levará à melhoria

das relações médico-usuários, funcionários da saúde-usuários, servidores-

familiares e relação entre os funcionários da saúde.

As relações humanas entre os usuários e a equipe de saúde são

imprescindíveis, considerando que o elemento da informação concorre para o

entendimento e questionamento, facilitando a convivência durante o período de

permanência no hospital e contribuindo para a melhoria da qualidade de vida de

ambos.

Ressalta Lindquist (1993) que os recursos humanos são de fundamental

importância, assim como a participação efetiva dos pais ou acompanhantes que

certamente contribuirão para que as crianças possam suportar melhor a situação

de internamento.

Nessa perspectiva, um dos grandes desafios da Promoção da Saúde é a

arte de lidar com o outro, a capacidade empática e intuitiva, o respeito por outros

saberes, enfim, o saber cuidar parece não pertencer ao foco principal da prática

dos profissionais de saúde contemporâneos.

Na lição de Boff (1999, p. 99), o “cuidar é mais que um ato; é uma atitude.

Portanto, abrange mais que um momento de atenção, de zelo e de desvelo.

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Representa uma atitude de ocupação, preocupação, de responsabilização e de

envolvimento afetivo com o outro”.

Observa-se hoje que um dos grandes paradigmas da civilização centra-se

no “cuidado”, a sua falta compromete o desvelo com a natureza, a escassez dos

recursos naturais, e compromete a sobrevivência da espécie humana. Desse modo

“cuidar” assume dupla função: de prevenir danos futuros e corrigir danos do

passado. Desse modo, o “homem” age como ser participativo, com ações sociais,

históricas e culturais, sendo fundamental para qualquer interpretação do “ser

humano” (BOFF, 1999).

Corroborando, Morin (2000) pensa que se soubermos compreender antes de

condenar, estaremos no caminho da humanização das relações humanas.

Compreender o outro é se colocar no lugar, centrar as atenções e ações nas

necessidades do outro, mediante a humanização dos cuidados caminharemos na

interface da subjetividade com a objetividade, na intersubjetividade, em que é

necessário abster-se da vaidade, da sede de poder e da ingenuidade científica.

Talvez a incompatibilidade de perceber e respeitar a existência desse

universo seja na verdade um retrato de uma erosão que se forma e deforma as

relações entre os profissionais de saúde e a dificuldade de enxergarem a criança

como usuário do serviço e principalmente o desconhecido do seu papel como

brincante.

Estudo realizado por Mitre e Gomes (2004), busca compreender o

significado do brincar para os profissionais de saúde, apontando as possibilidades

de promover atividades no ambiente hospitalar como facilitador de uma dinâmica

de interações que (re) significa o modelo tradicional de intervenção e cuidado de

crianças hospitalizadas.

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Nesse sentido, há necessidade de criar oportunidades que sensibilizem e

transformem a atitude profissional, a partir da constatação de que, para se intervir

junto às crianças, necessariamente haverá uma adequação de suas rotinas, e que

o brincar é uma linguagem de domínio, e agente facilitador na participação da

criança no processo de tratamento.

2.2 Terapia Ocupacional, Promoção da Saúde e as histórias infantis.

As ações em Terapia Ocupacional no hospital são recentes, pois decorrem

de modificações sociais ocorridas nos fins do século XIX e início do XX, em

concordância com mudanças na estrutura organizacional e o novo enfoque sobre o

papel do hospital, emergindo nesse cenário a preocupação com a promoção da

saúde e a qualidade de vida daqueles que se submetem a internação hospitalar

(TROMBY et alii, 2005; DE CARLO et al., 2004).

De acordo com estudos realizados por Kudo e Pierri (1990), constam na

prática do terapeuta ocupacional em hospitais infantis o atendimento que não

esteja voltado e restrito ao processo de internação e a patologia, mas é essencial

conhecer o desenvolvimento infantil, os impactos do adoecimento e a dimensão

relação terapeuta-criança-atividade.

Nesse sentido, os estudos realizados por Takatori, Oshiro e Otashima

(2003) inserem o profissional de Terapia Ocupacional no programa de

humanização da assistência hospitalar de duas formas: a primeira, por meio do

trabalho clínico com atividades, instrumentos das ações deste profissional; e a

segunda, mediante o trabalho comum aos profissionais da equipe, que se unem em

ações humanizadoras no hospital junto à criança.

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Partindo desse pressuposto, a Terapia Ocupacional direciona sua ação em

desenvolver estratégias de caráter humanizador e fundamentado na ocupação

(CLARK ET AL., 2002) e na recreação (Parham e Primeau; 2000) como

necessidade humana.

Reilly apud Parham (2000) descreve os papéis ocupacionais ao longo de

um continuum, associando-os aos estádios do desenvolvimento do indivíduo, em

que cada papel promove oportunidades de aprendizados e práticas importantes

garantindo o sucesso da aquisição dos papéis subseqüentes.

Nessa perspectiva, a visão do terapeuta ocupacional para a criança não se

dirige somente à clínica, mas nos orienta sobre a percepção desta em sua forma

de ser e fazer, e suas necessidades. A definição do processo terapêutico é

direcionada na formulação de um diagnóstico, no qual os objetivos serão

delineados a partir das limitações, do repertório de habilidades funcionais

(atividades e tarefas diárias) e elementos de sua história, que nos permita ter uma

visão da situação atual e dos prejuízos causados por essa situação em suas

atividades (MOTTA e ENUMO, 2004; DE CARLO e BARTALOTTI, 2001).

Essa prática intervencionista é uma forma de se efetivar um atendimento, a

fim de minimizar a hostilidade, o medo e a dor causados pela internação durante a

infância, um período crucial de mudanças e transformações no desenvolvimento da

criança, e que não deve ser marcado pelas situações estressantes no ambiente

hospitalar.

A ação terapêutica ocupacional para criança hospitalizada desenha

possíveis estratégias de entretenimento e enfrentamento e inclui o brincar como

área de desempenho, considerando uma atividade livre, predominante da infância,

de acordo com a Associação Americana de Terapia Ocupacional (AOTA,2002).

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Essa preocupação com a infância induziu Collins, citado por Parham e Fazio

(2000) em organizar as principais indicações que caracterizam o período da

infância, sob o olhar de Piaget, Erikson e Havighurst. Essas indicações incluem a

complexidade na resolução de problemas e a capacidade de desenvolver e manter

amizades, mudanças no crescimento físico e refinamento em monitorar as próprias

atividades e seu corpo, a complexidade de perceber o ambiente físico sob os

aspectos temporais e espaciais, organizando atividades no decorrer do dia. No

ambiente social da escola, mantém relações com os adultos, organiza e determina

formas, meios e regras, além de incluir e excluir os seus amigos.

É justamente na idade de seis a doze anos, caracterizada como segunda

infância, que o comportamento lúdico assume papel singular responsável pelo

processamento de associações e relacionamentos sociais. E o brincar torna-se

uma ferramenta essencial, independentemente do local, representando uma

atividade eminentemente social, e, desse modo, aproxima as crianças das

pessoas, recobra o contexto familiar, fazendo parte do repertório de singularidades

e especificidades da criança.

Em um estudo recente, Mitre e Gomes (2004) ressaltam três “núcleos de

sentido” para o uso do lúdico em hospitais: 1) o lúdico como atividade prazerosa à

criança, tornando-se um contraponto à dolorosa rotina hospitalar; 2) o brincar como

um espaço democrático, onde ocorrem a valorização das experiências individuais e

a possibilidade de escolhas; e 3) a atividade de brincar como um facilitador para a

interação dos profissionais de saúde, crianças e seus acompanhantes. Como

agente facilitador, o brincar proporciona um nível saudável de relacionamento entre

pais e filhos envolvidos no universo hospitalar.

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O brincar é um papel ocupacional que indica a competência da criança; é

uma porta para o adulto adentrar e se comunicar com a criança, coletar

informações importantes, que irão contribuir para projetar e desenvolver atividades

inerentes aos papéis desempenhados por ela nas áreas subjacentes as suas

necessidades (PARHAM e FAZIO, 2000).

Winnicott (1975) assevera que as crianças evoluem por intermédio de suas

próprias brincadeiras e que, por meio da brincadeira do faz-de-conta, as crianças

não só desenvolvem, mas também dominam suas angústias, controlam idéias e

impulsos.

Vygotsky (1999) e Bruner (1998) descrevem que a aprendizagem é um

processo social e como os adultos podem influenciar e agir efetivamente e

ativamente no brincar e no desenvolvimento cognitivo da criança.

Estudo realizado por Fino (2001) sobre a teoria de Vygotsky descreve três

idéias fundamentais: 1) a atividade humana é mediada pelo uso de ferramentas

que estão para a evolução cultural como os genes estão para a biológica; 2) a

existência entre a atividade socialmente organizada e a construção da consciência;

3) os processos psicológicos se processam primeiro no plano interpsicológico e

depois no plano intrapsicológico, após terem sidos interiorizados. A existência da

zona de desenvolvimento proximal (ZDP), explicada como um espaço de interação,

implica uma janela para a aprendizagem, necessitando de um tutor como agente

metacognitivo.

Esse espaço de interação promove caminhos para o desenvolvimento de

estratégias de aprendizagem. O adulto ou até mesmo uma criança com maiores

habilidades, ou um grupo a que o aprendiz pertença, serão responsáveis pela

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aquisição de infinitas informações, e elaboram esse processo justamente na zona

de desenvolvimento proximal (ZPD).

Para Kitson (2006) o papel do adulto é fornecer estruturas dentro das quais

as crianças possam interagir e contestar, definir problemas a serem resolvidos,

serem incentivadas a testar suas idéias, e principalmente mostrar estratégias de

aprendizagem.

As correlações sobre a necessidade de promover informações na zona de

desenvolvimento proximal têm implicações importantes sobre os contextos, assim

como determinar os níveis de ajuda adequados que a criança necessitará para

atingir seus objetivos. Os níveis de ajuda são descritos como quatro: 1) oferecer

instruções, realizar demonstrações, oferecer pistas e dar assistência (MUNGUBA,

2002, p.43).

Essa perspectiva de assistência contempla a Terapia Ocupacional, trazendo

documentos norteadores para a autonomia desse profissional durante sua prática

com domínios sobre o conceito de saúde, segundo a Organização Mundial da

Saúde (OMS), privilegiando a função e não a doença, considerando a estrutura do

corpo e principalmente a influência e repercussão na participação social do

indivíduo, baseando sua ação sobre a uniformidade dos conceitos de

funcionalidade e incapacidade e em seus determinantes como as condições de

saúde e os fatores contextuais, de acordo com a Classificação Internacional de

Funcionalidade (CIF, 2005).

Por conseguinte, as ações promotoras em saúde de Terapia Ocupacional

estão respaldadas em bases conceituais e políticas contemporâneas, a partir de

três manifestações políticas que se tornaram marcos referenciais na Promoção da

Saúde, frutos de conferências internacionais nesta área, respectivamente, a Carta

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de Ottawa (1986), a Carta de Adelaide (1988) e a Carta de Sundsvall (1991)

(BRASIL, 2001).

A Carta de Ottawa (1986) ressalta a importância da implementação de

políticas públicas saudáveis e a criação de ambientes favoráveis à saúde, reforça a

ação comunitária, o desenvolvimento de habilidades pessoais e reorienta os

serviços de saúde. A Carta de Adelaide (1988), que ratificou a posição das

conferências de Alma-Ata e Ottawa, aprofundou as discussões sobre a dimensão

holística da saúde, contribuindo com temas sobre a multidisciplinaridade,

transdisciplinaridade e interdisciplinaridade. (ALVES , ARRATIA; SILVA, 1996).

Respaldar a prática do profissional de saúde nesses conceitos implica em

consolidar a idéia de Educação em Saúde, a necessidade da interdisciplinariedade

na produção do conhecimento, a importância de delimitar o objeto e não fragmentá-

lo, para alcançar o melhor nível de saúde e qualidade de vida dos usuários do

serviço (BARROSO et al., 2003).

A saúde é mencionada como fator essencial para o desenvolvimento

humano e, desse modo, Buss (2003) propõe que um dos campos de ação no

contexto da Promoção da Saúde seja a criação de ambientes favoráveis. Essa

afirmação se apóia na Carta de Sundsvall (1991), que confere para nós a missão

de criar ambientes favoráveis e promotores de saúde, seja na comunidade, no

trabalho ou no lazer.

Nesse contexto, o Departamento de Cuidados Hospitalares da Sociedade

Brasileira de Pediatria (2003) vê-se diante de um novo paradigma da humanização

no que se refere ao ambiente hospitalar. Essa reflexão que atinge o hospital

estimula o desenvolvimento das ações nos serviços de saúde e solicita dos

profissionais sugestões de programas de Educação em Saúde e a assumirem

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atitude e visão mais real, social e coerente com as necessidades da população na

melhoria da qualidade de vida.

Em virtude disso, surge o novo modelo assistencial de cuidados com a

saúde, respaldado pela humanização da assistência hospitalar e sistematizado por

meio do Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar (PNHAH,

2001). Esse programa propõe fortalecer, articular e difundir uma nova cultura de

humanização na rede hospitalar credenciada ao SUS, capacitar profissionais do

hospital no novo conceito de atenção à saúde, que valoriza a vida humana e a

cidadania, conceber e implantar novas iniciativas de humanização nos hospitais em

benefício dos usuários e dos profissionais.

Estudo realizado por Motta e Enumo (2004) exprime que o brincar constitui

uma estratégia adequada para o enfrentamento da hospitalização. Esse mesmo

estudo, realizado com 28 crianças hospitalizadas com câncer, na faixa etária de 6 a

12 anos, concluiu que num subconjunto representativo de brincadeiras alternativas,

inseridas na categoria de atividades recreativas diversas (AD), o contexto da

brincadeira mostrou-se relevante, principalmente para as escolhas das atividades

de ouvir histórias.

Reportando-nos ao interesse da criança nas histórias infantis, percebemos

o quanto é pouco explorado no ambiente hospitalar. Concordamos com Masetti

(2002,) quando acentua que o modelo assistencial centrado somente em

tecnologias não tem sido satisfatório na maioria das instituições de saúde, e é por

isso que se faz necessário buscar novas formas de assegurar o bem-estar da

criança nessa situação de hospitalização.

A história tem o poder de ativar a imaginação que, para Vygotski (1998), é

um processo psicológico novo para a criança, representando uma forma

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especificamente humana de atividade consciente. Enquanto o brinquedo promove

essa situação imaginária, ensina a criança a dirigir seu comportamento não

somente pela percepção imediata dos objetos ou pela situação, mas também pelo

significado da situação.

Neste sentido, Takata, 1969 (apud Parham, 2000) afirma que o ato de

contar histórias promove diálogo, representando ferramentas valiosas para a

Terapia Ocupacional. Por intermédio de uma história, obtemos informações sobre

materiais, pessoas e ambiente que fazem parte do desenvolvimento lúdico da

criança.

O caráter educativo e de entretenimento das histórias infantis surgiu ainda

na Idade Média, por volta do século XVII. De acordo Ariès (1986), o futuro Rei da

França, Luís XIII, aos três anos, começa a aprender a ler, e gosta de um livro com

as figuras da Bíblia; assim sendo, pede a sua ama que lhe conte histórias da

comadre Raposa e do Mau Rico e Lázaro. Enquanto se mantinha deitado na cama,

contavam-lhe histórias de Melusina1 (DAUDET, 2005).

Há nesse relato um sentido simbólico, as histórias contadas ao rei eram

fábulas e não histórias reais; esse fato revela uma nova preocupação com a

educação moderna, incluindo preceitos morais e culturais. Nessa época, as

histórias não se restringiam somente às crianças, mas eram contadas durante as

reuniões entre os adultos (HEYWOOD, 2004)

Alem disso, Áries (1986) revela, por meio do historiador M. E. Storer, que os

contos de fada eram moda no século XVII, e que Mme. De Sérvigné sabia de

1 . Melusina (Mélusine, no original) é um nome freqüente entre as fadas nas lendas celtas. Melusina é também uma personagem lendária da Idade Média; ancestral mítica da Casa de Lusignan, estava condenada cada semana a se transformar parcialmente em serpente.

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muitos contos, enquanto Colbert contratava pessoas que tinham como função

entretê-lo com os contos. Surge nesse contexto a figura do contador de histórias.

Descrito por Bussato (2003) como um mágico, um artista, que empresta a

voz, usa o poder da narrativa e permite aparecer o inexistente, e nos convence de

que aquilo existe, nos faz sonhar e transforma sonhos em momentos de realidade.

Nessa época, a função das histórias era o entretenimento. Despertado por

Colbert, porém, ao fim do século XVII, esses contos foram transformados em

gênero literário, a princípio pelos contos de Perrault (COELHO, 1981)

Somente no século XVIII, porém, por meio de editores especializados

principalmente em Troyes, são lançadas edições que foram denominadas

Bibliothèque Bleue ou Contos Azuis (1784), e contam a história de Pierre de

Provence e da bela Naguelonne, as histórias de Robert lê Diable e os quatro

irmãos Aymon, os contos de Perrault, e os de Mlle de la Force e Mme

d’Aulnay(HEYWOOD, 2004).

Em virtudes dessas edições e da necessidade de tornar esses contos

popularizados, aparece a figura dos contadores de histórias, inicialmente

ocasionais e, posteriormente, profissionais, que são retratados nos séculos XVII,

XVIII e início do século XIX pela pintura e gravura, e até hoje sobrevivem nos

contextos urbanos e rurais (HEYWOOD, 2004).

No Brasil, segundo Andrade (1984), a literatura Infantil surgiu muito tempo

depois, quase no século XX, muito embora ao longo do século XIX tenha sido

registrada, aqui e ali, a notícia do aparecimento de uma ou de outra obra destinada

à criança.

Somente na segunda metade do século XIX, em decorrência das grandes

transformações da sociedade brasileira, se processam a proliferação das traduções

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e as adaptações de livros literários para o público infantil. Nesse período, é

disseminada, no Brasil, a consciência de uma literatura própria, nacional,

retratando os contextos sociais e culturais das crianças brasileiras

(COELHO,1981).

No século XX, é publicado no Brasil, em 1921, A menina do nariz arrebitado,

escrito por Monteiro Lobato, e marco da literatura infantil brasileira. Seus livros são

marcados pelos textos que realizavam uma fusão entre o real e maravilhoso,

misturando o imaginário com a realidade concreta, descrevendo aventuras dos

contos e fábulas para a realidade (COELHO, 1981).

Esse encanto não pode ser rompido pela passagem da infância. Ler os

contos de fadas e as fábulas é despertar para o poder do imaginário, deixar o

encantamento da literatura infantil nos envolver; talvez seja um meio de nos

comunicarmos com o mundo infantil e o entendermos melhor.

Bettelheim (1980) e Bittencourt (1990) destacam o poder do encantamento

que o faz-de-conta promove na criança ao reconciliar realidade e fantasia, através

da criação. Mediante o faz-de-conta, a criança pode imaginar, imitar, criar ou jogar

usando os símbolos e, aos poucos, constrói simbolicamente os esquemas verbais

e simbólicos de tudo o que está vivenciando.

Partindo desse pressuposto, há uma infinidade de projetos desenvolvidos

nos hospitais das Regiões Sudeste e Sul do Brasil, utilizando a literatura infantil.

Estudo realizado no Brasil por Caldin (2002), no hospital Universitário da

Universidade de Federal de Santa Catarina, revelou que a leitura para crianças

hospitalizadas proporcionava uma viagem ao mundo imaginário, e que o

desconforto e a dor cediam lugar às risadas ante as passagens divertidas da

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história, garantindo, dessa maneira, a experiência vicária, a identificação com

personagens e o alívio das pressões emocionais.

No Hospital Infantil Albert Sabin-HIAS, em Fortaleza-Ceará, foi avaliado o

impacto da mediação das histórias infantis sobre as crianças, os acompanhantes e

a equipe, tendo sido constatado que a leitura mediada para as crianças e os

acompanhantes teve um impacto positivo no que concerne ao incremento na

estratégia de humanização nesse hospital (MORENO et al, 2003).

Essas iniciativas semeiam credibilidade ao processo de promoção da

saúde, mas é necessário entender o conceito de saúde de forma multidimensional,

o modelo assistencial participativo, executado com estratégias diversas e

complementares, com abordagens facilitadoras e integradoras, com apoio de todos

os mecanismos e recursos promotores de saúde.

Oliveira e Soares (2001) propõem aos profissionais de saúde uma

orientação humanista aos serviços assistenciais, permitindo uma aprendizagem

participativa, potencializando as capacidades comunicacionais, a orientação na

gestão do tempo, da auto-estima, do saber lidar com grupos, menos

“medicalização” e ações na concepção dos projetos de assistência em saúde.

Portanto, as iniciativas de humanização utilizando as histórias infantis vão

dimensionando esses projetos na assistência hospitalar à criança e a literatura

infantil conquista popularidade e notoriedade na área da saúde pelo potencial

libertador e criativo da palavra, na constituição de um indivíduo autônomo e

confiante em si, que possa enfrentar as situações e procedimentos clínicos com

mais tranqüilidade, confiança e autonomia.

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3 TRAJETÓRIA TEÓRICO-METODOLÓGICA

3.1 Caminho Teórico

O caminho metodológico para elaboração do nosso referencial teórico

permite que nos apropriemos de alguns conceitos, com a finalidade de orientar a

análise dos resultados. Nessa perspectiva, a opção pela Teoria Histórico-Cultural

no estudo e as teorias sobre o brincar nos levam a correlacionar a autoconstrução

do conhecimento a partir da história infantil e das vivências das crianças,

enfatizando os contextos sociais e culturais, além do papel desempenhado pelo

terapeuta ocupacional no desenvolvimento do brincar e nas atividades infantis. A

trajetória foi constituída enfocando as visões macro, meso e micro sobre a

problemática, como mostra de forma esquematizada esse processo na fig. 01.

FIGURA 1. Representação esquemática do percurso teórico-metodológico.

TTEEOORRIIAA HHIISSTTÓÓRRIICCOO-- CCUULLTTUURRAALL ((VVYYGGOOTTSSKKYY,, 11993300--3322))

DDeesseennvvoollvviimmeennttoo iinnffaannttiill VViissããoo MMaaccrroo

VViissããoo MMeessoo

VViissããoo MMiiccrroo

CCrriiaannççaa HHoossppiittaalliizzaaddaa

CCrriiaannççaa hhoossppiittaalliizzaaddaa HHiissttóórriiaass IInnffaannttiiss

PPrroommooççããoo ddaa ssaaúúddee

DDEESSEENNHHOO,, NNAARRRRAATTIIVVAA,, LLIITTEERRAATTUURRAA IINNFFAANNTTIILL

TTEERRAAPPIIAA OOCCUUPPAACCIIOONNAALL ((CCIIÊÊNNCCIIAA EE PPRROOFFIISSSSÃÃOO))

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Para entender a criança numa visão macro sobre desenvolvimento infantil,

apropriamo-nos da teoria histórico-cultural, preconizada por Vygotski

(1998,1999,2003), a qual nos permitiu o entendimento das questões relacionadas

às funções superiores especificamente humanas e as relações com o contexto

cultural e social.

Estudos realizados por Vygotski (1998) apontam para a importância da

dimensão social no desenvolvimento humano, enfatizando que a interação com o

ambiente social é um elemento determinante nas aquisições durante o

desenvolvimento da criança.

Descrevemos alguns axiomas inerentes à teoria histórico-cultural, inferindo

que, para o autor retrocitado, o desenvolvimento das funções superiores acontece

inicialmente no plano social e depois em um nível individual. A transmissão e a

aquisição desses conhecimentos e dos padrões culturais somente são possíveis a

partir do processo de internalização que passa pelo plano no interpsicológico (entre

as pessoas) e intrapsicológico (no interior da criança).

Na internalização, é estabelece-se a reconstrução interna de uma operação

externa e incide numa série de transformações resultantes de processos evolutivos

a partir dos conceitos, nos quais ocorre a formação da consciência, produto da

subjetividade a partir de situações de intersubjetividade (LA TAILLE et al, 1992).

Essas relações seguem os esquemas transcritos na fig. 02.

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FIGURA 2. Representação esquemática sobre os conceitos teóricos na visão

macro.

Esse processo é promovido pela mediação, caracterizada na relação do

indivíduo com o mundo e com outros indivíduos, para o desenvolvimento das

funções psicológicas superiores. São os seguintes os componentes para a

interação são: o organismo receptor, o estímulo e o mediador (VYGOTSKI, 1999;

BECCO, 2005).

Neste estudo, apropriamo-nos dos componentes para a interação,

esclarecendo que o organismo receptor é simbolizado pela criança hospitalizada, o

estímulo, pelas histórias infantis, e o mediador, pela pesquisadora, que representa

a Terapia Ocupacional como ciência e prática promotora de saúde.

Podemos citar como instrumentos mediadores as ferramentas e os signos.

As ferramentas estão relacionadas aos objetos físicos, que causam modificações

ambientais, enquanto os signos são elementos constituintes da cultura, com a

TTEEOORRIIAA HHIISSTTÓÓRRIICCOO-- CCUULLTTUURRAALL ((VVYYGGOOTTSSKKYY,, 11993300--3322))

DDeesseennvvoollvviimmeennttoo iinnffaannttiill VViissããoo MMaaccrroo

MMeeddiiaaççããoo ee iinntteerrnnaalliizzaaççããoo

FFoorrmmaaççããoo ddee ccoonncceeiittooss

PPeennssaammeennttoo ee LLiinngguuaaggeemm

DDiissccuurrssoo iinntteerriioorr

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função de atuar diretamente nas ações. Os mais comuns são os sistemas

simbólicos que nos permitem atuar sobre a realidade (BAQUERO, 1998).

No processo de mediação e internalização surgem os sentidos e os

significados como produtos da formação da consciência, frutos das situações de

intersubjetividade, que se originam da mediação simbólica e são traduzidos por

meio da linguagem, como sistema simbólico (LA TAILLE et al, 1992).

É imprescindível entender as acepções diferentes sobre o significado e o

sentido. O significado refere-se ao sistema de relações objetivas que se formou no

desenvolvimento da palavra e consiste no núcleo relativamente estável de

compreensão da palavra, compartilhado por todos que a utilizam. O sentido refere-

se ao significado da palavra para cada indivíduo, composto pelas relações que

dizem respeito ao contexto do uso da palavra e as vivências afetivas do indivíduo

(VYGOTSKI, 1998; REGO, 2000; BAQUERO, 1998; OLIVEIRA, 1993).

Quando buscamos o sentido das histórias infantis para as crianças

hospitalizadas por acidentes, visamos a subsidiar e ampliar práticas educativas

alicerçadas no desenvolvimento social e cognitivo da criança, com ênfase nos

papéis ocupacionais.

Nesse sentido, Bruner (1998) também nos oferece alguns elementos para a

reflexão sobre a significação e sua relação com o desenvolvimento constituído na

interação social e no contexto histórico-cultural. Para ele, os “significados estão na

mente”, mas têm origem na cultura em que são constituídos. Isto permite que

sejam negociados, que haja comunicabilidade e troca cultural. Desse modo, é a

cultura que oferece os instrumentos para organizar e compreender nossos mundos

de formas comunicáveis.

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Dentre os sistemas simbólicos, destacaremos a linguagem como

característica humana imprescindível e com funções importantes, como: lidar com

objetos do mundo exterior, organizar os processos de abstração e generalização e

de promover a comunicação entre os indivíduos (VYGOTSKI, 1999; REGO, 2000).

A partir da internalização da linguagem surge o discurso interior, que é um

discurso sem vocalização; é uma linguagem dirigida ao próprio indivíduo; é na

verdade um diálogo consigo mesmo, ocorrente no plano intrapsicológico e lida com

o sentido das palavras e das vivências afetivas e contextuais. O discurso interior é

o alicerce para apoiar os processos psicológicos mais complexos, como: processo

do pensamento, da auto-regulação, de planejamento da ação, de monitoração do

próprio funcionamento volitivo-afetivo (VYGOTSKI,1998; BAQUERO, 1998).

O percurso teórico deve ser explicitado e compreendido em razão de

idéias sobre o aprendizado e definições apresentadas por Vygotski (1998), como: o

nível de desenvolvimento real, entendido como aquilo que as crianças conseguem

fazer por si mesmas. Outro conceito é a zona de desenvolvimento proximal,

determinada por funções que ainda não amadureceram, estão em maturação, e,

finalmente, a zona de desenvolvimento potencial, que descreve aquilo que a

criança não é capaz de fazer sozinha.

Esses conceitos descritos por Vygotski (1998) afirmam que a

compreensão e interpretação do nível de desenvolvimento real e do nível de

desenvolvimento potencial da criança estão baseados em pressupostos teóricos

vinculados à filogênese e à ontogênese. Nessa premissa, assinala a formação da

zona de desenvolvimento proximal (ZDP), denominada como a distância entre o

nível real de desenvolvimento, determinando a independência em resolver

problemas de forma independente, e o nível de desenvolvimento potencial,

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verificado pó meio da requisição dos meios de ajuda durante a interação com o

adulto ou colaboração com outros, com maior aptidão (REGO, 2000; OLIVEIRA,

1993).

Para Lugo (2003) a ZPD é uma zona de subjetividade, um local de

encontro de mentes, para negociar significados e entendimentos à medida que

avança a interação ou o desenvolvimento de tarefas. E não é necessário que haja

compreensão compartilhada e total do significado da atividade, bastando que

ambos atuem como se suas compreensões fossem iguais. A zona de

desenvolvimento proximal e o posicionamento do terapeuta e das ferramentas

mediadoras aparece como mostra o esquema na fig.3.

FIGURA 3. Representação esquemática da zona de desenvolvimento proximal

(ZDP).

Consideramos o conceito da mediação na perspectiva de Vygotski, e

escolhemos o terapeuta ocupacional como mediador e contribuinte no processo de

internalização dos conceitos e propulsor da zona de desenvolvimento proximal

IInnssttrruummeennttooss mmeeddiiaaddoorreess

Zona de

desenvolvimento proximal

(ZPD)

TTeerraappeeuuttaa ooccuuppaacciioonnaall

Nível de desenvolvimento real (ZDR)

Zona de desenvolvimento potencial

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durante sua interação com a criança mediante a atividade no hospital, facilitando a

execução do desempenho ocupacional, enquanto a narrativa da história infantil e o

desenho são denominados de signos (instrumentos mediadores) que auxiliam os

processos psicológicos (BECCO, 2005).

Buscamos esses signos com a finalidade de nos aproximar da criança na

situação de “hospitalizada”, enfatizando o contexto de desempenho, conforme

enfatizam Early e Pedretti (2005). Denominamos esse foco de observação da

problemática a visão meso, visto que exploramos o contexto ambiental em que ela

se encontra e utilizamos instrumentos mediadores, posicionando o terapeuta

ocupacional como articulador, devendo atuar desenvolvendo situações problemas

justamente na zona de desenvolvimento proximal.

Esses instrumentos mediadores incluem a narrativa, a literatura infantil e o

desenho, consoante mostra a representação esquemática na fig.4.

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FIGURA 4. Representação esquemática da visão meso.

Nesse sentido, os elementos estruturantes das narrativas compõem a ação

como base, pois representam o conjunto de fatos ou situações, as personagens,

que executam as ações e estão categorizadas a tipos, com caráter e

individualidades, o espaço-elemento determinante das circunstâncias locais, do

cenário, o tempo produto de fatos que se desencadeiam a um final, em associação

com instrumentos (COELHO,1981). .

Para completar o sentido da narrativa, Coelho (1981) cita a linguagem que

dá corpo, podendo ser realista ou metafórica (simbólica), enfatizando que os

processos narrativos são descrição, narração, diálogo, monólogo, dissertação,

digressão, comentários, afirmando que o sucesso da história depende basicamente

de quem conta, relata ou narra os fatos.

Goldstein et al (2004) citam que Helfrich, Kielhofner e Mattingly propuseram

que as narrativas ajudam a explicar escolhas e comportamentos das pessoas nos

contextos terapêuticos ocupacionais. E acrescenta que as narrativas estão ligadas

VViissããoo MMeessoo CCrriiaannççaa hhoossppiittaalliizzaaddaa ppoorr aacciiddeenntteess

NNAARRRRAATTIIVVAA,, DDEESSEENNHHOO,, LLIITTEERRAATTUURRAA IINNFFAANNTTIILL

IInnssttrruummeennttooss mmeeddiiaaddoorreess

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ao conceito de identidade ocupacional, porque revelam as formas de pensar, de

sentir e de fazer das pessoas e suas influências ambientais.

Portanto, as relações entre o pensamento e a linguagem se desenvolvem

durante a inserção da criança num grupo cultural, e se evidenciam à medida que a

criança utiliza a linguagem como instrumento de pensamento (VYGOTSKI,

1998,1999,2000).

Os signos e as palavras constituem para as crianças uma forma de

comunicação com os adultos. Quando a criança já não faz mais apelos verbais ao

adulto e já é capaz de elaborar, por meio da internalização, formas de resolução de

problemas, esse fenômeno, Vygotski chamou de discurso interior (REGO, 2000)..

Nessa trajetória Vygotsky (1999) conduz-nos para o entendimento das

imagens figurativas do desenho da criança. Relacionando-os com sua percepção,

estão os esquemas figurativos que a criança utiliza para significar alguma coisa e

que “uma das características da percepção é que não podemos separá-la

funcionalmente da atribuição de sentido ao objeto percebido”. A teoria histórico-

cultural de Vygotsky remete-nos ainda à análise sobre o desenho das crianças, que

não desenham o que vêem, mas sim, o que conhecem.

Vygotsky diz que a criança desenha utilizando a memória e por isso o

desenho pode ser considerado uma narração gráfica. A característica dessa

narração é que ela não tem força narrativa em si mesma, mas, sim, na fala que

acompanha o processo de sua produção. Para a criança, quanto mais elementos

gráficos forem colocados, mais significados terão os desenhos (SOUZA et al,

2003a).

Outros autores, como Luquet (1969), Lowenfeld e Brittain (1972), Mèredieu

(1994), pesquisaram sobre a evolução e representação figurativa infantil e

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privilegiaram um ou o outro aspecto do grafismo, como o afetivo, o motor, o gráfico,

mas a fundamentação de seus relatos segue uma visão maturacionista e se

desprende do contexto sociocultural.

Para compreender a criança hospitalizada e o sentido das histórias infantis

no nível micro, baseamo-nos na Terapia Ocupacional como ciência e profissão.

Essa contextualização dar-se-á na concepção do homem como “ser ocupacional”.

Primeiro, pela forma, função, significado da ocupação e a importância da natureza

ocupacional para os seres humanos; segundo, pelos papéis ocupacionais que os

indivíduos exercem em seus contextos pessoais, sociais e culturais; e o terceiro,

pelo instrumento de ação mediador desse processo, que é a atividade humana

(HAGEDORN, 2003; LARSON, CLARK et alii1993), como nos mostra a figura

seguinte:

FiGURA. (5) Representação esquemática da visão micro,

VViissããoo MMiiccrroo CCrriiaannççaa hhoossppiittaalliizzaaddaa

hhiissttóórriiaass IInnffaannttiiss PPrroommooççããoo ddaa ssaaúúddee

TTEERRAAPPIIAA OOCCUUPPAACCIIOONNAALL ((CCIIÊÊNNCCIIAA EE PPRROOFFIISSSSÃÃOO))

DDeesseemmppeennhhoo ffuunncciioonnaall CCoommppoonneenntteess CCoonntteexxttoo

AAttiivviiddaaddee hhuummaannaa

CCoonntteexxttoo ppeessssooaall,, ssoocciiaall ee ccuullttuurraall

DDeesseemmppeennhhoo ooccuuppaacciioonnaall

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As ocupações têm um significado pessoal, bem como dimensões culturais,

temporais, psicológicas, sociais, espirituais e simbólicas, e são historica e

culturalmente estabelecidas (EARLY, 2005, LARSON et al, CLARK, WOOD et alii,

2002).

Estudos realizados por Law, Stteinwender e Leclair (1998) sobre os efeitos

da ocupação para a saúde e o bem-estar incluíram 23 investigações com essa

temática e concluíram que os efeitos da ocupação na vida das pessoas dependem

da relação entre pessoa, ambiente e ocupação. Os terapeutas ocupacionais devem

buscar métodos que estabeleçam uma relação entre a prática e as habilidades

pessoais, propondo atividades que tenham significado para suas vidas.

Nesse sentido, a prática de Terapia Ocupacional deve reunir os conceitos

sobre forma, função e significado das ocupações, essenciais para idealizarmos

mecanismos e estratégias promotoras de saúde. A forma representa os aspectos

observáveis da atividade, determinando a individualidade e identidade das pessoas

enquanto realizam suas ocupações; a função constitui os valores culturalmente

atribuídos às ocupações. Para Wilcock (1993) são funções das ocupações

proverem necessidades de sustentação imediatas ao corpo, auto cuidado, proteção

e segurança; desenvolver habilidades que permitam sobreviver no ambiente e

exercitar e desenvolver capacidades pessoais, tornando o organismo capaz de se

manter e prosperar. O significado pode ser descrito como a significância da

ocupação dentro do contexto da vida real e da cultura (TROMBLY e RADOMSKI,

2005).

Atualmente existem inúmeras definições sobre a Terapia Ocupacional, para

a Federação Mundial de Terapia Ocupacional (WFOT, 2004) trata-se de uma

profissão interessada em promover a saúde por meio da ocupação. A principal

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meta da Terapia Ocupacional é habilitar as pessoas na participação das atividades

da vida diária. Por esse resultado, desenvolver possibilidades das pessoas fazerem

coisas que melhorem suas capacidades, além de promover a participação ativa

e/ou modificar o ambiente para auxiliar melhor suas ações.

A partir da importância dos conceitos gerais sobre ocupação, desempenho

ocupacional, contexto, componentes e desempenho funcional têm período da

infância os correlacionamos com a criança hospitalizada por acidentes e a

assistência em Terapia Ocupacional no hospital. Esses principais quadros ou

estruturas de referência usados em Pediatria pela Terapia Ocupacional estão

relacionados ao desenvolvimento, as aquisições das atividades da vida diária.

Na infância a criança está continuamente em adaptação e interação com o

ambiente. É uma dinâmica natural do desenvolvimento, da maturação e

aprendizagem da criança. A criança semeia esperança e alegria e essa forma de

se relacionar com a realidade é que faz a prática do terapeuta ocupacional, quando

exerce o papel de guia e assistente, encontrando conjuntamente significados para

suas atividades do cotidiano.

De acordo com Case-Smith et alii (1996), o terapeuta ocupacional atua nas

áreas da clínica, da educação e na comunidade, realizando a análise do

desempenho funcional da criança, em diferentes ambientes, para identificar suas

potencialidades e limitações, além de determinar se as limitações no desempenho

são atribuídas às habilidades intrínsecas da criança ou suas características,

relacionado-as aos fatores externos ambientais, ou a combinação das variáveis

intrínsecas e externas. Conseqüentemente, é função do terapeuta ocupacional

analisar o desempenho funcional para identificar as variáveis e determinar os

objetivos da intervenção.

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Para Takatori, Oshiro e Otashima (2003) o terapeuta que se propõe a intervir

com crianças hospitalizadas deve estar atento à rotina geral do hospital e

estabelecer um processo vertical de individuação e outro horizontal seguindo o

desenvolvimento do atendimento.

Consideramos os referenciais apontados pela Associação Americana de

Terapia Ocupacional (AOTA, 2002), quando descreve as ocupações e o

desempenho dos papéis ocupacionais e os classifica em 07 áreas que incluem: as

atividades da vida diária, as atividades da vida prática, educação, trabalho, lazer,

participação social e insere o brincar como área de abrangência da Terapia

Ocupacional.

O brincar é qualquer atividade espontânea e organizada que ofereça

satisfação e entretenimento, diversão e alegria (PARHAM; FAZIO, 1997).

Esse enfoque determina a extensão da responsabilidade e do compromisso

na formulação de conhecimentos relacionados à principal ocupação da criança, o

brincar, a relação com o contexto e o papel do terapeuta ocupacional. Nessa

perspectiva, o elemento do “faz-de-conta” torna-se essencial na caracterização e

na definição do brincar.

Para Anita Bundy (2000), o brincar é uma relação dinâmica, apresentando

elementos importantes como: a motivação intrínseca, o controle interno e a

suspensão da realidade. E é justamente na capacidade de suspender a realidade,

que a definição de “faz de conta” se torna imperativa e determinante, para

descrever o brincar. Enquanto Ferland (1997) considera o brincar como uma

atitude subjetiva na qual o prazer e a espontaneidade são combinados e expressos

mediante comportamentos livres, Stagnitti (2004) refere-se ao brincar como um

comportamento complexo, capaz de transcender a realidade. Para a autora, brincar

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facilita a compreensão da cultura, a resolução de problemas, o desenvolvimento

social, intelectual, emocional e de habilidades físicas.

Desse modo, o faz-de-conta, elemento indispensável nas histórias infantis,

foi estudado por Parham e Fazio (2000), que considera o ato de contar histórias e a

atitude narrativa, respectivamente, estratégias de aproximação e compreensão dos

eventos que acontecem no cotidiano das crianças e de sua família. O primeiro

oferece aos ouvintes opções de pensamentos e comportamentos e o segundo é

uma estratégia em que a pessoa é compreendida no contexto dos eventos da

história de vida pessoal. Podem ser usadas tanto para avaliação, a fim de explicitar

as interpretações que os indivíduos fazem das experiências, e para intervenção,

mediante a renegociação de significados na relação dialética entre o contador de

histórias e o ouvinte.

Portanto, consideramos os aportes teóricos consistentes, por abordarem o

desenvolvimento humano e, mais especificamente, o pensamento, a linguagem e

os mecanismos de leitura de conhecimento.

3.2 Decurso metodológico

3.2.1 Abordagem e tipo do estudo

O caminho metodológico foi delineado e sustentado na abordagem

qualitativa, caracterizando-se como um estudo descritivo. Desse modo, a

modalidade de pesquisa qualitativa é coerente com a interpretação e descrição de

contextos, no qual situamos o sentido das histórias infantis utilizadas como

estratégia promotora de saúde em Terapia Ocupacional, junto à criança

hospitalizada.

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Ao tomar como sujeitos da pesquisa crianças hospitalizadas, concordamos

com a concepção interacionista das relações sociais, citada por Minayo et alii

(2002), que se fundamenta no princípio de que o comportamento humano é

autodirigido e observável em dois sentidos: o simbólico e o interacional. Essa

perspectiva permite a qualquer ser humano planejar e dirigir suas ações em

relação aos outros e conferir sentidos aos objetos que utiliza para realizar planos.

3.2.2 Locus da pesquisa

O estudo foi realizado no Instituto Dr. José Frota, localizado no Centro, na

cidade de Fortaleza, Ceará. Essa instituição foi o primeiro pronto socorro da

Cidade, fundado em 1932, e atualmente é uma autarquia da Prefeitura Municipal

de Fortaleza (PMF). Trata-se de um hospital de emergência com referência no

atendimento ao politraumatizado, abrigando ainda o Centro de Tratamento em

Queimados, Centro de Atendimento Toxicológico do Ceará, Hemoterapia e

Neurocirurgia. Conta com equipe multiprofissional e realiza procedimentos clínicos

e cirúrgicos de alta complexidade, em pessoas, que, na sua maioria, são vítimas de

algum tipo de injúria e violência.

A equipe multidisciplinar da Unidade Pediátrica é composta por médicos,

especialistas na área, enfermeira e auxiliares de enfermagem. A estrutura física

comporta 4 enfermarias, com 5 leitos, totalizando 20 leitos. Em uma das

enfermarias, há um televisor e os leitos estão preparados para acomodar as

crianças que necessitam permanecer imobilizadas ou em repouso. Há um posto,

um telefone público, uma pequena área descoberta, onde as crianças se reúnem

(mesmo aquelas que estão em cadeiras de rodas), com os seus acompanhantes,

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para assistir à televisão e vivenciar momentos de entretenimento e lazer. E,

recentemente foi cedido pelo projeto Jovem Cidadão um espaço, com brinquedos e

jogos.

A rotatividade nas enfermarias é significativa, com taxa de ocupação que

varia entre 50% e 80%, de acordo com o relatório diário emitido pela Unidade

Pediátrica.

Pretendíamos incluir também o Centro de Tratamento de Queimados e a

Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica como cenários desta pesquisa, porém as

dificuldades de ordem operacional e da dinâmica do serviço concorreram para o

impedimento.

3.2.3 Participantes

Participaram da pesquisa 10 crianças hospitalizadas na Unidade Pediátrica

do Instituto José Frota, vítimas de injúrias por causas externas, na faixa etária de 6

a 10 anos, de ambos os sexos, que podiam desenhar, estavam com bom nível de

consciência e compreensão, com ou sem prescrição de repouso no leito. Foram

excluídas as crianças que não desejaram participar ou cujo responsável não

permitiu; que não estavam internadas na unidade pediátrica, e aquelas que

apresentavam alterações auditivas severas, ou quadro clínico instável ou em coma.

Vale acrescentar que todas foram vítimas de agravos externos causados por

injúrias de trânsito, atropelamento, quedas e traumatismos por agressões físicas.

3.2.4 Coleta de dados

Para iniciar a coleta de dados, solicitamos autorização do chefe da unidade

pediátrica e depois mantivemos encontros e conversas informais com a equipe de

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saúde, as acompanhantes e as crianças, visando a interagir e minimizar o

estranhamento entre a pesquisadora, os sujeitos e a dinâmica do ambiente

hospitalar.

O processo da coleta de dados envolveu pesquisa documental, entrevista,

leitura da história, desenho infantil e observação participante. Empregamos a

pesquisa documental por meio da leitura dos prontuários, com vistas a conhecer o

perfil e o motivo da hospitalização da criança, resultando em uma pré-seleção, de

acordo com a idade cronológica e o estado clínico.

Para integrar o universo das observações, incluímos o diário de campo que,

segundo Minayo et alii (2002), é pessoal e intransferível. Sobre ele o pesquisador

se debruça no intuito de indicar detalhes que no seu somatório vai congregar os

diferentes momentos da pesquisa.

Nesse sentido, os encontros da terapeuta ocupacional com as crianças

aconteceram individualmente e puderam ser realizados nos próprios leitos ou em

uma sala recentemente destinada à realização das atividades do Projeto Jovem

Cidadão, garantindo-lhes conforto e um pouco de privacidade.

Realizamos a coleta de dados nos meses de julho a outubro de 2005, tanto

no turno da manhã como no da tarde, respeitando o horário das refeições, e

procedimentos que porventura fossem realizados, como também as diretrizes

institucionais e a disponibilidade dos participantes.

Iniciamos conversando com as crianças, mostramos os livros de histórias e

solicitamos que escolhessem um livro para que a pesquisadora pudesse ler para

ela, dentre os exemplares postos à disposição sobre o leito.

A entrevista foi divida em 2 momentos. Antes da leitura da história, fizemos

perguntas norteadoras relacionadas ao motivo da hospitalização, sentido e escolha

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da história infantil. Após a leitura da história, seguimos com perguntas sobre o

enredo e correlações com a vivência e personagens, e solicitamos a descrição dos

cuidados preventivos com a criança (APÊNDICE 4).

As entrevistas foram gravadas com a finalidade de percebermos dados

relevantes que integram as falas das crianças, como, por exemplo, mudança na

entonação da voz, as articulações, as interações com o pesquisador. O

equipamento não causou nenhum constrangimento às crianças, pelo contrário, era

motivo de brincadeira e interesse no momento de ouvir a reprodução da própria

voz.

Dessa forma, a pesquisadora lemos a história escolhida pela criança, e

solicitamos que representasse livremente qualquer passagem correspondente ao

enredo da história e lhe oferecemos recursos variados (canetas, lápis de cor,

pincel, lápis de cera, lápis de grafite). A técnica do desenho da história seguiu as

orientações de Pillar (1996), que preconiza que as histórias selecionadas para uma

pesquisa devem obedecer aos seguintes critérios: (1) ser uma história pequena; (2)

ser interessante para a faixa etária das crianças; (3) estar relacionada com as

vivências das crianças. Durante o desenho empregamos como instrumento da

coleta de dados a observação livre, na qual anotamos as atitudes, ações e gestos,

enquanto desenhavam.

3.2.5. Análise dos dados

A análise dos dados foi realizada sobre a coletânea do material, tendo como

objetivo a sua decodificação e compreensão, no intuito de confirmar (ou não) os

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pressupostos do estudo e ampliar o corpo de conhecimento sobre histórias infantis

como estratégia promotora de saúde.

Somos conhecedora de que a análise de uma pesquisa não é um passo

estanque no decorrer dessa elaboração, contudo, para situar o leitor, esboçaremos

os passos analíticos em função da técnica de coleta utilizada:

• pesquisa em prontuários resultou nos dados de caracterização das crianças

e foram organizados e agrupados, originando o perfil sociodemográfico das

crianças do estudo;

• seleção das histórias infantis dentre os indicadores, constaram histórias

curtas e simples e os interesses predominantes em cada faixa etária;

• leitura das histórias infantis: as respostas sobre o sentido das histórias

infantis foram organizadas de acordo com cada pergunta norteadora, em um

quadro analítico, que permitiu a visualização, horizontal e vertical, das

similaridades e divergências das respostas; e

• desenhos das crianças essa técnica foi empregada para identificar se havia

correlações entre a passagem da história infantil escolhida pela criança e o

desenho realizado.

Dessa forma, as questões norteadoras se tornaram as categorias pre-

definidas, com vistas a buscar respostas, em perguntas específicas, formuladas

pelo pesquisador, de acordo com as idéias de Franco (2005) e Deslandes et al,

(2002).

Os questionamentos foram sendo respondidos, porém, a partir das

categorias predefinidas e, paulatinamente, comparados com as categorias

específicas que foram emergindo no decorrer da análise dos dados.

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Esse procedimento, como um todo, incluiu leitura flutuante do material

coletado, organização e reflexão à luz dos teóricos sobre o tema, bem como os

conceitos de internalização e mediação da teoria histórico-cultural. Mediante essa

análise, configuraram-se as seguintes categorias: (1) diversidade e ecologia das

injúrias; (2) sentidos das histórias; (3) prática da leitura na hospitalização; e (4)

pluralidade dos cuidados. Essas categorias convergiram para o tema: histórias

infantis como instrumento mediador na promoção da saúde em Terapia

Ocupacional.

Estes quadros sintetizam a ficha técnica das histórias selecionadas pelas

crianças, na unidade pediátrica do Instituto José Frota, Fortaleza, 2005.

Quadro 1 – Síntese e descrição técnica da história infantil escolhida pela criança 1

Criança idade História Síntese da história C1

Daniel 9 anos Polegarzinho Tipo do enredo: fábula

Personagens: pessoas comuns e crianças Cenário: castelos Estilo: fantasioso e aventura Nome, descrição e função das personagens principais: 1 – um casal de lenhadores pobres 2- sete filhos homens: crianças de olhos verdes e cabelos loiros que comiam pão e se perdem dos pais na floresta 3 – uma vovó que acolhe as crianças em casa 4 – um gigante mau 5– o polegarzinho apesar de pequeno era muito inteligente Um casal pobre perde os filhos na floresta e as crianças encontram a casa do gigante que comia gente, até que o polegarzinho se livra do gigante e liberta a cidade também; e sua valentia é reconhecida pelo rei.

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Quadro 2 – Síntese e descrição da ficha técnica da história infantil escolhida pela

criança 2

Criança idade História Síntese da história C2

Armando 9 anos A lebre e as

rãs Tipo do enredo: fábula Personagens: animais (características humanas) Cenário: bosque Estilo: aventura Nome, descrição e função dos personagens principais: 1 – uma lebre medrosa 2 - a coruja sábia 3 – as rãs medrosas Uma lebre medrosa que descobriu que podia vencer o medo e que assustou sem querer as rãs e assim percebeu que podia também assustar outros animais

Quadro 3 – Síntese e descrição da ficha técnica da história infantil escolhida pela

criança 3

Criança idade História Síntese da história C3 José

7 anos Pinóquio Tipo do enredo: Fantasia Personagens: pessoas comuns e brinquedos animados Cenário: ruas, praças e o interior da casa Estilo: fantasioso e aventura Nome, descrição e função das personagens principais: 1 – um velho carpinteiro chamado Gepetto 2– um boneco que criou vida chamado Pinóquio 3–um grilo falante que representava a consciência do boneco 4 – baleia que engoliu o Pinóquio e o Gepetto 5– fada boa que transformou o boneco em gente Um carpinteiro que cria um boneco de madeira chamado Pinóquio; o velho queria muito ter um filho, até que um dia uma fada resolve transformar o boneco em gente, quando boneco se arrepende das mentiras e outras peraltices que fez.

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Quadro 4 – Síntese e descrição da ficha técnica da história infantil escolhida pela

criança 4.

Criança idade História Síntese da história C4

Reginaldo 8 anos A lebre e a

raposa Tipo do enredo: fábula Personagens: Animais (características humanas) Cenário: Floresta Estilo: fantasioso e aventura Nome, descrição e função dos personagens principais: 1 – lebre ligeira 2 - raposa esperta e gulosa 3 – caracol lento Todos os animais tinham medo da raposa, mas ela ajudou o caracol para disfarçar sua fome, mas no outro dia convidou a lebre para jantar com ela; a lebre, ingênua, aceitou logo o convite. Chegando lá, foi atacada pela a raposa, mas muito ligeira foge rapidamente.

Quadro 5 – Síntese e descrição da ficha técnica da história infantil escolhida pela

criança 5.

Criança idade História Síntese da história C5

Raquel 9 anos Galinha dos

ovos de ouro Tipo do enredo: fábula Personagens: pessoas comuns Cenário: uma fazenda Estilo: realista Nome, descrição e função dos personagens principais: 1 – Pedro, um fazendeiro ganancioso 2 - dona Clara, sua esposa 3– gala que era igual às outras Pedro, um fazendeiro rico e ambicioso, vivia numa fazenda com sua esposa, Dona Clara, e descobrem que tem uma galinha que bota ovos de ouro, mas não se contentam e resolvem abrir a gala, pensando que existia dentro da galinha uma máquina de fazer dinheiro e acabam matando a galinha, pois não tinha nada de diferente das outras.

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Quadro 6 - Síntese e descrição da ficha técnica da história infantil escolhida pelas

crianças 6 e 9.

Criança idade História Síntese da história C6; C9 Virgílio Kécia

10 anos O Leão e o mosquito

Tipo do enredo: fábula Personagens: animais (características humanas) Cenário: floresta Estilo: realista Nome, descrição e função das personagens principais: 1 - o leão raivoso 2 - um mosquitinho arrogante Numa bela manhã, um mosquito encontra um leão e começa a importuná-lo. O leão raivoso tenta fugir do mosquito, mas este entra no nariz do leão, e lá se sente seguro, até que, cansado de lutar, o leão se dá por vencido. O mosquito resolve sair de dentro do nariz do leão e cai na teia da aranha e é devorado por ela.

Quadro 7 - Síntese e descrição da ficha técnica da história infantil escolhida pela

criança 7.

Criança idade História Síntese da história C7

Romário 6 anos A pequena

sereia Tipo do enredo: conto Personagens: pessoas Cenário: mar e castelos Estilo: romântico e aventura Nome, descrição e função dos personagens principais: 1 – a sereia 2 - o príncipe 3 – a fada Um príncipe naufraga e é salvo por uma sereia. Apaixonam-se e uma fada a transforma em gente; eles vão morar num castelo e vivem felizes para sempre.

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Quadro 8 - Síntese e descrição da ficha técnica da história infantil escolhida pela

criança 8.

Criança idade História Síntese da história C8 Jorge

7 anos O galo e a raposa

Tipo do enredo: fábula Personagens: animais (características humanas) Cenário: fazenda Estilo: fantasioso e aventura Nome, descrição e função das personagens principais: 1 – a raposa esperta e perigosa 2 - o galo vaidoso, metido e desconfiado 3 - cachorros valentes Um belo dia um galo estava numa árvore quando chegou uma raposa anunciando que gostaria de dar um abraço no galo para comemorar a paz entre todos os animais da floresta; galo disse à raposa que os cachorros já vão também comemorar. A raposa com medo fugiu.

Quadro 9 - Síntese e descrição da ficha técnica da história infantil escolhida pela

criança 10.

Criança idade História Síntese da história C10 William

7 anos A raposa, o lobo e o cavalo

Tipo do enredo: fábula Personagens: animais (características humanas) Cenário: floresta Estilo: fantasioso e aventura Nome, descrição e função das personagens principais: 1 – o lobo forte e guloso 2 - a raposa esperta e gulosa 4 – o cavalo ingênuo A raposa se juntou ao lobo para comer o cavalo, mandando o cavalo entrar numa caverna. Vendo que o cavalo estava assegurado, o lobo tratou de comer a raposa.

3.2.6 Preceitos éticos do estudo

Vale ressaltar que há entre a Instituição e a Universidade de Fortaleza um

convênio de Estágio Curricular, e que somente iniciamos a pesquisa após

aprovação em reunião ocorrida em 25 de abril de 2005, com Parecer nº. 080/2005,

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concedido pelo Comitê de Ética da Universidade de Fortaleza (COÉTICA) e

registro nº. 05-057, e assinatura do termo de fiel depositário (APÊNDICE 1) pelo

presidente do comitê de ética profissional da instituição, foi concedido à

pesquisadora ingressar no local. Após esses trâmites foi comunicada ao chefe da

Unidade de Pediatria a nossa presença e iniciada a coleta de dados. No primeiro

contato com os participantes da pesquisa, foi entregamo-lhes um termo de

consentimento aos participantes do estudo (APÊNDICE 2), respeitando os

preceitos éticos, tendo sido ditas a todos os sujeitos participantes e aos

responsáveis as etapas da pesquisa, como seria a participação deles e quais os

procedimentos utilizados durante a coleta de dados.

Em seguida foi entregue o termo de consentimento livre e esclarecido

(Resolução 196/96, do Ministério da Saúde) deixando claro que todos ficariam

livres para aceitar ou não participar da pesquisa, que não sofreriam nenhum tipo de

discriminação ou repressão, tendo todos os seus direitos resguardados

(APÊNDICE 3). Após esclarecer todas as dúvidas, foi solicitada a assinatura de

cada responsável ou acompanhante do sujeito da pesquisa.

Com esses cuidados o estudo seguiu conforme as diretrizes da pesquisa

com seres humanos (BRASIL, 1996). A Resolução 196/96 determina a

incorporação, sob a óptica do indivíduo e das coletividades, os quatro referenciais

básicos da bioética autonomia, não-maleficência, beneficência e justiça, entre

outros, e visa a assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade

científica, aos sujeitos da pesquisa e ao Estado. Vale ressaltar que restou

salvaguardado o anonimato, com a inclusão de nomes fictícios, e, principalmente,

a livre participação dos sujeitos.

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4. CRIANÇAS HOSPITALIZADAS POR ACIDENTES E SUAS HISTÓRIAS

Nesse estudo, procuramos compreender o sentido das histórias infantis

para um grupo de crianças hospitalizadas, visando a identificar as correlações

entre as histórias e as vivências e como transformá-las em estratégias de

Promoção da Saúde para serem utilizadas pelo terapeuta ocupacional.

Desse modo, o empenho da pesquisa é focalizar a situação de

“hospitalização” da criança e multidimensionar os sentidos das histórias infantis

para serem utilizadas como instrumento mediador e promover a aproximação com

o mundo da criança, incentivando a autoconstrução de conhecimentos diante dos

agravos a sua saúde.

4.1 Caracterização das crianças

Participaram deste estudo 10 crianças, sendo 7 do sexo masculino e 3 do

sexo feminino, cuja idade variou entre 6 e 10 anos, das quais cinco tinham entre 6

e 7 anos e cinco entre 8 e 10 anos.

A maioria dos participantes residia fora da área metropolitana do Município

de Fortaleza e foram encaminhados ou transferidos à Instituição para atendimento

de urgência, considerando que os tratamentos envolviam maior complexidade e

pelo fato de não haver na localidade de origem a assistência e os procedimentos

necessários para o socorro. Quase todos dependem de transporte das prefeituras

vizinhas, permanecendo no hospital maior tempo que o necessário, aguardando a

chegada da ambulância para retornar para casa; ou então dependem de parentes,

amigos ou políticos locais para conseguir leito, cirurgia e transferências.

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Com relação às causas externas (motivos do internamento),

predominaram as originadas por brincadeiras com irmãos ou amigos, na escola,

nas proximidades de casa, em parques ou campo de futebol. Em seguida vieram

as quedas de árvore, de cavalo, de bicicleta, de cima do trem e, por último, os

atropelamentos por carro, que exigem, geralmente, a necessidade de a criança se

submeter a intervenção cirúrgica e permanecer em repouso no leito com algum tipo

de tração transesquelética. Durante o depoimento das mães, era comum

descreverem a criança como: “acelerado”, “danado”, “medonho”, “endiabrado”, “não

sossega em canto nenhum”, “diferente dos outros”, “só pensa em brincar”, “não

aprende nada”, “só faz tudo correndo”, “não ouve a gente”.

De acordo com a permanência da criança na Unidade, tomando como

referência a data de internação até o dia da realização da entrevista, quatro

crianças estavam internadas entre 2 e 7 dias, quatro estavam em 12 e 15 dias e

duas crianças estavam de 22 e 41 dias. Havia muitas queixas dos acompanhantes

com relação ao tempo de permanência, em virtude da falta de dinheiro para se

deslocarem, pelo fato de residirem em localidades circunvizinhas e dependerem de

transporte para retornar para casa.

Amparadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), todas

estavam com acompanhantes, sendo que de sete crianças, o acompanhante era a

mãe e as demais o pai ou padrasto.

Apesar de todas as crianças estarem na escola, somente quatro crianças

sabiam ler, três soletravam e quatro não sabiam ler, nove conheciam os livros da

escola e somente um não conhecia livros de histórias.

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4.2 Histórias das crianças hospitalizadas por acidentes e suas histórias

Para descrever as crianças, apropriamo-nos do diário de campo, de

registros realizados durante as entrevistas, de fotografias e gravações de

conversas. Durante a apresentação, daremos ênfase a alguns dados da

identificação, tipo físico, descrição de alguns momentos, ações, gestos e atitudes

das crianças e dos acompanhantes. A fim de preservar a identidade, atribuímos

nomes fictícios para cada um deles, relacionando por ordem de entrevista e

numerando por caso.

☺☺☺☺ C1 – Daniel

Tem 9 anos, sexo masculino, vítima de injúria: ao jogar futebol com os amigos, a

trave caiu sobre o 3º e 4º pododáctilo esquerdo, causando necrose pós-trauma. Foi

submetido a cirurgia para amputação de ambos. Sua acompanhante era sua mãe.

Cursa a 2ª série e sabe ler e escrever. Tem cabelos e olhos castanho claros, sua

voz é um pouco rouca, meiga e carinhosa; fala baixo e manso. Mora em Fortaleza,

na casa da avó materna. Enquanto realizava a entrevista com outras crianças,

observamos que ele acompanhava atentamente o que as crianças já haviam feito e

ficava sentado no leito, esperando ansioso por sua vez. Falava com expressão de

sorriso, estava vestido somente de calções, como a maioria das crianças. No

momento da entrevista, tivemos que esperar muito tempo até podermos localizar

sua mãe, a fim de solicitar autorização para a pesquisa. Segundo informações de

uma das auxiliares de enfermagem, ela não dava a menor assistência à criança,

quase sempre não estava presente, e, por isso, sua conduta teria sido registrada

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no Serviço Social e, por conseguinte, admoestada. Durante a conversa no posto,

fomos avisada de que sua mãe aparecera. Ao conversarmos, não esboçou

nenhuma atitude de curiosidade sobre a pesquisa, e, ao assinar a autorização,

perguntou-nos se havia algo mais. A entrevista aconteceu apenas nesse encontro.

☺☺☺☺ C2 – Armando

Tem 9 anos, sexo masculino, vítima de queda de cavalo, resultando em fratura

fechada do 1/3 distal dos ossos do antebraço esquerdo, com grande desvio. Seu

acompanhante era seu padrasto. Mora em Redenção, uma cidade no interior do

Estado do Ceará. Cursa a 1ª série, não sabe ler nem escrever. É uma criança

magra e calada, de olhos verdes e espertos. Estava vestindo uma bata do hospital,

de xadrez azul, e calção branco. E encontrava-se com o braço imobilizado numa

tipóia. Enquanto contava a historia, a outra criança presente à enfermaria ouvia

atenciosamente. Aproximou-se do leito e ficou em pé segurando nas amarelas e

altas grades do berço, observando atentamente. Perguntou-nos? – Depois sou

eu?- Dissemos que iríamos falar primeiro com o seu pai, pois já tínhamos visto que

seu acompanhante era um homem, e ele respondeu - Ele não é meu pai, é meu

padrasto, meu pai morreu... É, mais ele é legal? Afirmamos: Veio ficar com você

aqui no hospital? Ele ouviu mas não confirmou. Encontramo-lo no corredor. Era um

homem bastante simples, usava um boné, era moreno, falava baixo, e atendeu

prontamente ao nosso chamado. Enquanto falávamos sobre o trabalho, estava

sempre atento, olhando nos nossos olhos. Ao solicitarmos sua assinatura, disse-

nos em voz baixa que não sabia assinar, nem ler, nem escrever o nome, e que não

era o pai do menino, vivia com a mãe dele, dissemos que não era problema.

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Dirigimo-nos ao posto e solicitamos uma esponja de carimbo para que pudesse

colocar sua digital. Pareceu-nos muito cuidadoso e disponível com a criança.

☺☺☺☺ C3 – José

Tem 7 anos, vítima de queda de bicicleta, que lhe causou um trauma abdominal

fechado, resultando em dilaceração do baço. Foi submetido a intervenção cirúrgica

para retirada do órgão. Mora em Maracanaú, município da área metropolitana da

cidade de Fortaleza. Seu acompanhante era sua mãe. Cursa a 1ª série, sabe ler e

escrever. Apresentamos o documento a ela e ficamos surpresa com sua atitude de

ler atenciosa e detalhadamente, questionando algumas dúvidas. Ficamos felizes

com a sua iniciativa, porque a maioria não sabia ler, e geralmente isso somos nós

que fazemos. Enquanto lia o termo, pensávamos sobre a responsabilidade de

encontrar, registrar e documentar tantas histórias de vida. É uma criança muito

comunicativa, sorridente, curiosa e esperta, que estava acompanhadA de sua mãe.

Segundo relato de sua mãe, já era a 3ª vez que se internava,L vítima de injúrias

Contou que era muito “danado” e que já havia pulado do apartamento do 1º andar,

a uma altura de 7 m, tinha colocado vários baldes e subido na varanda e pulado, e

que “por Deus nada tinha lhe acontecido”. Depois, acidentou-se com ferro elétrico

que estava na tábua de passar, puxando-o pelo fio, batendo no rosto, ocasionando

uma queimadura na face; e agora teria levado uma queda de bicicleta. No horário

de visita, alguns parentes vieram visitá-lo, o que não aconteceu com outras

crianças. Seu pai chegou com um presente: era um pacote enorme e, ao abrir o

pacote, confirmou várias vezes em tom de euforia – “era isso mesmo”, “era isso

que eu queria”. Os pais sorriam e o abraçavam. Sua mãe durante a conversamos

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havia dito que venderia sua bicicleta, e ele continuamente afirmava que ficaria com

o dinheiro.

☺☺☺☺ C4 – Reginaldo

Tem 8 anos, vítima de queda de árvore (cajueiro), resultando em hematoma

extradural. Foi submetido a tratamento cirúrgico (punção) para drenagem do

coágulo. Mora no Mondubim, um bairro da periferia da cidade de Fortaleza. Estava

acompanhado de sua mãe. Cursa a 1ª série, copia o que vê, mas não sabe ler. A

entrevista realizou-se fora da enfermaria, numa sala destinada ao Projeto Jovem

Cidadão. Nessa sala ficamos com Reginaldo e sua mãe. Durante a entrevista, por

várias vezes, sua mãe respondeu por ele algumas perguntas, mesmo se

posicionando em pé próximo à porta. Enquanto conversávamos sobre o que havia

acontecido, Reginaldo, em muitos momentos, ficava pensativo, como se estivesse

se esforçando para lembrar. Usava a cabeça em atitude afirmativa ou negativa. É

uma criança aparentemente calma, magra, cor clara, trajava somente os calções

(uniforme do hospital). Sua cabeça estava enfaixada e para subir na maca

necessitou de ajuda, mas sem grandes dificuldades. Ao solicitar sua aproximação,

atendeu sem pressa ao nosso pedido. Durante a entrevista, observamos que

mantinha a mesma expressão facial, de um esboço de sorriso. Era aparentemente

tímido, suas respostas eram curtas e sua voz baixa. Muitas vezes tivemos de

adaptar as perguntas ao seu entendimento. Durante a entrevista, a mãe, ansiosa,

próximo à porta, nos observava, e respondia por ele algumas perguntas.

Convidamo-la para juntar-se a nós. Dirigimo-nos a ela e perguntamos se gostaria

de falar conosco e se poderíamos ligar o gravador. Ela concordou e iniciou

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brevemente sua narrativa quanto ao ocorrido com seu filho. Segundo informações

do irmão que estava com ele, depois de cair do pé de caju, ele desmaiou, mas se

levantou, ficou tonto de novo, depois vomitou bastante. Sua mãe o levou até a

farmácia, onde foi medicado, mas ele não parava de vomitar e sentia fortes dores

de cabeça. Dirigiram-se ao hospital e lá identificaram um coágulo. Depois foi

transferido para essa instituição e operado.

☺☺☺☺ C5 – Raquel

Tem 8 anos, vítima de queda de cavalo, resultando em fratura de colo de úmero D.

Mora em Canindé, uma cidade no interior do Estado do Ceará. Seu acompanhante

era seu pai. Cursa a 2ª série, sabe ler e escrever. A entrevista não pôde ser

realizada na enfermaria e nos dirigimos à sala do Projeto Jovem Cidadão. Ela

estava muito ansiosa para participar da pesquisa. É uma criança de olhos vivos e

brilhantes, gostava de falar, era amável e estava acompanhado pelo pai. E no

momento em que nos referimos à assinatura do termo, ressaltou que seu pai fazia

uma linda letra, pedindo-lhe para fazê-la e que eu pudesse ver depois. Durante a

entrevista demonstrou interesse e entusiasmo, sendo bastante solícita. Estava

atenta a todos os nossos movimentos. Enquanto eu contava a história, procurou

ficar bastante próxima, e não temia nenhum contato pessoal. Mudava

constantemente as expressões faciais, à medida que um novo evento surgia ou

acontecia algo novo na história.

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☺☺☺☺ C6 – Virgílio

Tem 10 anos, vítima de queda de cima de trem resultando em fratura exposta do

pé direito. Mora em Miraíma, Município de Itapipoca no Estado do Ceará. Seu

acompanhante é o seu pai. Cursa a 1ª série, mas não sabe ler e só escreve o

nome. É uma criança tímida, tem um sorriso escondido e tímido, fala baixo, tem

uma voz um tanto rouca. Durante sua fala não constrói frases completas, junta

palavras com omissão de conectivos. No início da conversa, observamos que

omitia alguns fonemas, e que parecia necessitar de algumas explicações para

entender o que solicitávamos, mas esforçava-se para compreender e responder.

Durante nossa conversa, por vezes, não conseguímos entender suas palavras;

vocabulário muito pobre e na sua pronúncia havia omissão de muitos fonemas. Sua

língua se colocava entre os dentes, e sua boca enchia-se de saliva com rapidez.

Não sabemos dizer ao certo se essa dificuldade na compreensão das perguntas

teria relação com a injúria que sofrera. O acompanhante disse que não sabia como

tinha acontecido, não estava em casa, não levou o filho para o hospital e não

conhece a pessoa que o levou.

☺☺☺☺ C7 – Romário

Tem 6 anos, vítimas de queda do escorregador, resultando em fratura no cotovelo

esquerdo. Mora em Fortaleza. Estava acompanhando de sua mãe, que relatou ele

não ser ele uma criança danada e que levou um susto com a queda. Cursa a

alfabetização, não sabe ler e escrever. É uma criança muito meiga. Fala baixo e,

durante a entrevista tivemos que adaptar as perguntas várias vezes ao

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entendimento da criança, bem como tivemos que nos dirigir à sala do Projeto

Jovem Cidadão.

☺☺☺☺ C8 – Jorge

Tem 7 anos, vítima de queda, resultando em fratura no osso da face (nasal). Foi

submetido a cirurgia reparadora e estética do nariz. Mora em Fortaleza. Estava

acompanhado se sua mãe. Durante nossa conversa, nos disse que se sente muito

desconfiada do comportamento do filho. Enquanto conversávamos, várias vezes

repetiu que a criança era muito diferente dos irmãos. Quando perguntei sobre a

injúria ela respondeu. Ele corre muito, eu não tava nem em casa, eu ia chegando,

ai fomos logo pro Frotinha de Messsejana, depois viemos para cá. Eu tenho 03

crianças com ele, eles dois estudam, ele faz a 1ª série; eu acho ele diferente, tudo

que eu falo ele responde, só que saber de cavalo, e lê muito pouco, tudo ele chora,

é totalmente diferente dos irmãos, gosta muito do pai dele, gosta de fazer amizade,

mas só quer saber de cavalo, já teve problema de cansaço, já teve convulsão, há

06 anos, quando nós tava no hospital, na fila, ele tava com febre, e a médica não

saia pra fora, ai ele começou a se tremer e a si babar, ai o pai dele deu um chute

na porta lá no “Frotinha” (posto de saúde). Enquanto sua mãe falava ele observava

e de vez enquanto esboçava um sorriso como se concordasse com algumas

coisas. Jorge é uma criança magra. Encontrava-se com um curativo no nariz, de

calções brancos e meias cinzas. Aparentemente pareceu-nos uma criança muito

calma. No dia da entrevista, havia muitas mães na enfermaria, e tão logo

começamos a ler a história, as mães que estavam próximas observaram e ouviram

atentamente, o que nesse momento nos despertou a atenção, porque,

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normalmente, observam, mas não param para ouvir. Jorge ouvia atentamente a

tudo e procurava cooperar em tudo o que lhe era requisitado.

☺☺☺☺ C9 – Kécia

Tem 7 anos. Mora em Fortaleza e foi vítima de queda durante uma brincadeira com

outras crianças, resultando em fratura supracondiliana do úmero D, com redução e

fixação percutânea. Estava acompanhada de sua mãe. Cursa a 1ª série, sabe ler e

escrever. Perguntei-a como era Kécia em casa. Sua mãe contou que era uma

criança calma, não dava trabalho, e que era sua única filha. Enquanto

conversamos com a criança, sua mãe permanecia próxima e olhava a filha sem

interromper por nenhum momento a nossa conversa. Depois que terminamos a

entrevista, pedimos a mãe algumas explicações sobre a injúria. Ela falou que a

menina estava brincando no parque perto de sua casa, com algumas amigas,

quando uma colega empurrou e ela caiu. No momento da injúria estava em casa,

quando a menina chegou com as primas e o avô.

☺☺☺☺ C10 – William

Tem 7 anos, vítima de atropelamento, com ferimento corto contuso na região

frontal direita da coxa resultando em fratura da díáfise do fêmur E. Encontrava-se

em tração transesquelética. Estava na acompanhado da mãe. Cursa a

alfabetização, não sabe ler nem escrever. É uma criança franzina, cabelo cortado

bem curto. Brincava com um boneco de plástico pequeno e estava deitado e

enrolado somente com o lençol, no seu corpo ainda podíamos ver as marcas de

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cicatrizes deixadas pela injúria, dando uma tonalidade mais esbranquiçada a sua

pele parda.

Esse quadro descreve e sintetiza as características sociodemográficas das

crianças participantes da pesquisa na Unidade Pediátrica, do Instituto Dr. José

Frota. Fortaleza, Ceará, 2005.

Quadro 10 – Caracterização das crianças participantes hospitalizadas na Unidade

Pediátrica, do Instituto Dr. José Frota. Fortaleza, Ceará, 2005.

Crianças Idade Sexo Escolaridade acompanhante Motivo da Internação Procedência

C1 Daniel

9

M 2ª série Mãe Vítima de injúria; ao jogar futebol, a trave caiu sobre o

3º e 4º pododáctilo, causando necrose pós-trauma, resultando em

amputação.

Fortaleza - CE

C2 Armando

9 M 1ª série Padrasto Vítima de queda de cavalo, resultando em fratura

fechada do 1/3 distal dos ossos do antebraço com

grande desvio.

Antonio Diogo, Distrito de Redenção.

C3 José

7

M 1ª série Mãe Vítima de queda de bicicleta, resultando em dilaceração do baço. Foi submetido a intervenção cirúrgica para retirada do

orgão.

Maracanaú.

C4 Reginaldo

8

M 1ª série Mãe Vítima de queda de árvore (cajueiro), resultando em hematoma extradural, sendo submetido à tratamento cirúrgico

(punção), para drenagem do coágulo.

Fortaleza

C5 Raquel

9 F 2ª série Pai Vítima de queda de cavalo, resultando em fratura de colo de úmero direito.

Canindé

C6 Virgílio

10 M 1ª série Pai Vítima de queda de trem, resultando em fratura

exposta do pé.

Miraíma (Itapipoca)

C7 Romário

6 1ª série Mãe vitima de queda de escorregador, resultando em fratura no cotovelo

esquerdo.

Fortaleza

C8 Jorge

7

M 1ª série Mãe Vítima de queda durante uma brincadeira com o irmão menor, tendo fraturado o nariz.

Fortaleza

C9 Kécia

7

F 1ª série Mãe Vítima de queda durante uma brincadeira com outras crianças, resultando em fratura supracondiliana do úmero D, com redução e fixação percutânea.

Fortaleza

C10 William

7 M Alfabetização Mãe Vítima de atropelamento de carro, com ferimento corto-contuso na região frontal direita, resultando em

fratura da díáfise do fêmur. Encontra-se com tração

transesquelética.

Fortaleza

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5 HISTÓRIAS INFANTIS COMO INSTRUMENTO MEDIADOR NA PROMOÇÃO

DA SAÚDE EM TERAPIA OCUPACIONAL

Discorrer sobre injúrias não se constituiu objetivo do estudo. As crianças

hospitalizadas, porém, são vítimas de algum tipo de injúria. Essa realidade foi

evidenciada em estudos realizados no Brasil no ano de 2000, por Souza e Mello

Jorge (2004), os quais assinala que tivemos 38% de mortes por injúrias de trânsito

e transportes, 24% por homicídios, que representam mais da metade de 63,5% de

mortes por causas externas de crianças e jovens em nosso País.

Assim sendo, a criança às quais nos reportamos é aquela que estava

envolvida em brincadeiras de correr, pular, gritar, rir, nos parques, ou estava a

caminho da escola, ou em casa e, num dado momento, se torna vítima de algum

tipo de injúria que interferiu no seu cotidiano e a transportou a um ambiente

hospitalar. Nessa aventura entre o mundo do adulto e o infantil, ela iniciou uma

nova jornada no hospital, com inúmeros procedimentos e sem previsões do que lhe

pudesse acontecer.

As pessoas não imaginam que esses eventos estão próximos do seu

cotidiano, sendo tomadas de surpresa. Assim, se vêem diante de situações que

requerem poder de decisão, mas não sabem como agir. Araújo e Vieira (2002)

enfatizam que, talvez, um dos motivos para perpetuar a ocorrência dessas “injúrias”

seja a idéia equivocada da criança e da família de subestimar os fatores de risco, e

não identificar o perigo, acreditando que em locais como o lar ou escola estejam

livres de quaisquer riscos.

O estudo descreve elementos significativos para sensibilizar a família e os

profissionais de saúde, sobre a ampliação de ações educativas na prevenção de

injúrias na infância. O conteúdo das entrevistas com as crianças participantes, lido

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exaustivamente, expressa sobre a injúria o local, a forma, o trajeto, as ações e

atitudes, os valores, as crenças e o sentido das histórias infantis no ambiente

hospitalar.

As categorias foram organizadas numa seqüência de acontecimentos, pois

estas se entrelaçam no itinerário realizado pela criança e o acompanhante no

hospital. Durante o procedimento analítico, foram configuradas 04 (quatro)

categorias temáticas, decorrentes da classificação dos dados.

Diversidade e a ecologia da injúria. O estudo nos mostrou que, nos 10 casos

analisados, os motivos da hospitalização foram quedas, lesões traumáticas e

atropelamentos. Essa diversidade tem estreita relação com sua ecologia, ou seja,

quedas de cavalo, de árvores, bicicletas, de brinquedos (escorregador) e estão

retratando o cotidiano e os papéis ocupacionais das crianças na zona rural, urbana,

e o brincar.

De acordo com estudos realizados no Estado do Ceará, Souza e Barroso

(1999) detectaram que as injúrias adquirem características próprias dos locais,

sejam zonas urbana e/ou rural e das etapas do desenvolvimento psicomotor da

criança e relacionaram os motivos à falta de cuidados dos responsáveis na

proteção e segurança da criança.

As crianças vítimas de quedas pertenciam à faixa etária entre 6 e 10 anos,

vivem em bairros na periferia da cidade de Fortaleza, como Mondubim, ou em

cidades outras do Estado do Ceará, como Canindé e Redenção, ou em municípios

vizinhos, como Maracanaú. Nesses locais, os transportes comumente utilizados

pela população carente são a bicicleta e os animais, que integram as atividades do

cotidiano das crianças, expondo-as aos riscos delas decorrentes.

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Filócomo et al (2002) expressam, em estudo realizado no Estado de São

Paulo, que as quedas permanecem em níveis elevados em crianças acima de 4

anos, evento este relacionado provavelmente às atividades de lazer e esportes,

próprios desta faixa etária, destacando-se jogos, bicicleta, patins e outros.

Embora tenhamos uma predisposição “inata” e primitiva para organização

da narrativa, Bruner (1977) assinala que isso nos permite rápida e facilmente

compreendê-la e usá-la, pois a cultura logo nos equipa com novos poderes de

narração através de seu kit de ferramentas e mediante as tradições de contar

histórias e interpretá-las, das quais logo nos tornamos participantes.

As falas das crianças ilustram a prevalência de quedas na infância, as

modalidades de ocorrência, a cronologia dos fatos, os cenários, suas atitudes, os

gestos, e as pessoas envolvidas que socorreram ou levaram para o hospital:

Eu levei uma queda do cavalo, eu taquei ma cabeça num galho de cajueiro e virei para trás. Cai de costa, eu fiquei com braço pra cima aí o menino caiu em cima do meu braço, aí quebrou. Ai, quando eu cheguei em casa, a mãe puxou foi meu braço, mas não puxou muito não, só assim (fez o gesto). (C2). Sei, porque eu caí da bicicleta. O menino tacou a pedrada e eu bati. Eu tava na bicicleta e cai. (C3). Eu tava em cima de um pé de caju. Eu subi, eu segurei a galha, a galha se soltou e eu caí com a cabeça, pra trás... (ficou pensativo) só fiquei tonto...Eu fui pra casa e vomitei, depois fui me deitar. Fiquei deitado. Fui primeiro pra outro, mas esqueci o nome, depois vim pra cá. (C4). Sei porque eu quebrei meu braço, eu fui pra minha madrinha, e eu fui andar a cavalo e o cavalo disparou comigo e com ela, eu fui tentar segurar as rédeas do cavalo pra mim e ela não cair, ai eu cai do cavalo quebrei meu braço e desloquei meu ombro. Eu fui pro hospital do Canindé, ai não deu certo a cirurgia e me transferiram para este hospital aqui de Fortaleza e já faz 15 dias desde que eu sair do Canindé. (C5).

Podemos observar que as elaborações dessas pequenas falas envolvem o

desenvolvimento do pensamento, determinado pela linguagem que, para Vygotski

(1999), são instrumentos lingüísticos do pensamento, e pela vivência socio-cultural

da criança. Para ilustrar o pensamento, descrevemos as falas das crianças:

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Sei, porque eu quebrei o nariz, porque eu tava com a chinela molhada ai eu escorreguei, na calçada da Igreja, lá perto da minha vô, eu tava trazendo meu irmão pequeno ele tem 3 anos na “cacunda”, ai eu cai... Fomo pro Frota e depois pra cá. (C8). O tR-Lem.... Eu não vi o tR-Lem quando o tR-Lem saiu eu escorreguei. Passou por cima da ma perna e o osso saiu. (Na verdade o trem não passou sobre sua perna, mas a queda resultou em fratura exposta. Ele estava brincando em cima do trem quando de repente o trem saiu e ele caiu – esclarecimento obtido com ajuda do acompanhante).(C6). Eu tava no escorregador na praça, perto da ma casa. Eu subi e na hora que fui escorregar eu cai. (C7).

As crianças, ao recordarem as injúrias relacionadas com as brincadeiras,

usam gestos, descrevem detalhes, lembram os nomes dos amigos e, em alguns

casos, se emocionam e transmitem essas emoções pela da entonação da voz

acompanhada de chora, ou falam baixo, ou fazem expressão de choro e os olhos

se enchem. Essa reação das crianças é explicada por Vygotski (1998): por meio

dos vínculos de imaginação e pensamento, vivência, afetividade, há influência dos

processos emocionais no pensamento, proporcionando uma elevadíssima

emocionalidade.

As falas que demonstram essa relação apresentam-se descritas para

explicar essa compreensão:

Sei, eu tava sentado ai o menino ficou balançando a trava ela virou e caiu em cima do meu pé. Ai, inchou, estourou a unha, ai os meninos me levaram pra casa, depois fui pro Frota, lá aonde aconteceu isso tem um hospital, ai eu fui pra casa, de manhã eu fui pra lá, ai fizeram um curativo, ai desinchou, ai eu fui pra outro hospital ai vim numa ambulância lá do centro pra cá. (C1). É porque as meninas tavam se balançando e tavam brincando num brinquedo ai eu fui ver e cai de cabeça para baixo do brinquedo com o braço assim. Quando eu quebrei só aguentei um pouquinho sem chorar, ai depois eu começei a chorar e disse assim – eu quero ma mãe ai as meninas me levaram lá pro meu vô, ai o meu vô pegou com cuidado e disse não é pra pegar que dói, ai eu fui pra casa e as meninas foram atrás de mim. A mãe disse ah! quebrou tu tem que ir direto pro hospital... é o jeito. (C9).

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O modo de sentir os fenômenos, a própria maneira de sentir-se e pensar-

se, de viver as aspirações, os possíveis êxitos e eventuais insucessos, são

descritos por Ostrower (1986), baseado em que tudo o se molda segundo idéias e

hábitos particulares ao contexto social em que se desenvolve o indivíduo. Nesse

caso, a criança assume em sua fala, como propulsor a ação:

Eu bati, eu tive uma barroada, uma kombi, eu tava parado na parada do ônibus, ai eu soltei a mão do meu pai não olhei pra lá e pra lá ai barrou. (C10).

Todas as falas das crianças retratam a correlação entre os processos de

linguagem, pensamento e afetividade. Vygotski (2003) estabelece que o aspecto

emocional estimula os mecanismos geradores da memória, e, por conseguinte, a

descrição da injúria quando narrada durante o estudo em detalhes é novamente

vivenciada.

O contexto temporal e ambiental enfatiza a dimensão histórica e cultural, o

sentido das histórias infantis na percepção das crianças hospitalizadas, as quais

verbalizaram suas histórias de como foram acidentadas, tecendo detalhes e

enriquecendo o cenário, que é histórico e também permeado de valores culturais.

A literatura retrata que as crianças do sexo masculino se acidentam mais do

que as outras, pois histórica e culturalmente, a criação do “filho” é mais permissiva

do que a da filha e essa prática favorece a perpetuação da prevalência masculina

nas estatísticas dos agravos externos à saúde da criança (GASPAR et al, 2004;

FILÓCOMO et alii, 2002).

Desse modo, a dimensão histórica é retratada não como algo do passado da

criança, mas como decurso de transformações que englobam o presente. A forma

de desenvolver conceitos indica que a criança está estabelecendo elos com a

situação que vivencia.

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Estudos realizados por Kyratzis (2005) apontam a importância da relação

entre linguagem e cultura, mediante de leitura de histórias, na educação das

crianças, como elemento para socialização de conhecimentos.

Os sentidos atribuídos às histórias infantis pelas crianças, neste estudo, têm

uma relação direta com as vivências no ambiente de casa e na escola, produto do

processo de internalização, cujo conhecimento é transgeracional, marcado por

valores morais e culturais.

Nessa perspectiva, podemos entender que os contextos pessoais, sociais e

culturais são marcos referenciais para as crianças expressarem o sentido das

histórias infantis. No contexto pessoal, encontramos as respostas atribuídas pelas

crianças com base na vivência individual, e inferimos que a idade é um elemento

que influencia na formulação desse conceito, em virtude das capacidades,

habilidades individuais, mudanças de objetivos e valores concebidos no decorrer

do desenvolvimento cognitivo.

No contexto social, o sentido da história depende da estrutura social em que

se insere a criança na família; tem caráter afetivo e cognitivo, como demonstrado

pelas crianças, ao referirem, várias vezes, que a função da história é ser “contada

na hora de dormir”, o que caracteriza produto de interações com a mãe, com o pai

ou pessoa outra que mantenha vínculo afetivo e se faça presente.

As crianças não hesitam em afirmar para que servem as histórias: “para

contar histórias pros nenes, dormir” (C1, Daniel, 9 anos). “Serve para entreter as

meninas, as crianças, colocar para dormir” (C5, Raquel, 9 anos). “Pra dormir” (C7;

6 anos). Esse fato evidencia que o ato de contar história é um momento de

interação, de aconselhamento, de troca de amor, de aconchego em um lugar

tranqüilo e confortável (DOHME, 2003).

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E, na escola, o sentido das histórias é direcionado à função ocupacional da

leitura, focalizando os papéis desempenhados pelas crianças como educandos e

aprendizes de conhecimento. Como as ocupações são simbolicamente constituídas

em uma cultura, Bruner (1997) anota que, no momento de estabelecer sentido às

ocupações, essas interpretações pessoais estão inevitavelmente impregnadas

pelos significados culturais que absorveram.

Essa afirmação sobre a relação da constituição simbólica dos significados a

partir da cultura é constatada pelas falas das crianças relacionadas:

Sim, e afirmou esse livro é dos pequenos. (C2).

Lá na escola sou quem invento. Pra fazer livros pra dar pro meus amigos ler. Pra ler melhor. (C3).

As funções da literatura infantil foram correlacionadas por Vieira (1986)

como (sete) funções advindas da linguagem e caracterizadas pelo autor como: (1)

Divertir, que se manifesta pela criatividade mediante do poder poético-lúdico da

palavra; (2) emocionar, expressa pela sensibilidade pelo poder expressivo-catártico

da palavra; (3) educar, pela maturidade, através do poder apelativo-pragmático da

palavra; (4) conscientizar, expresso pelo discernimento, via do poder metapoético

da palavra; (5) instruir, demonstrado pelo conhecimento, por meio do poder

referencial-cognitivo da palavra; (6) integrar, que se manifesta pela solidariedade,

via do poder fático-sinfrônico da palavra; e (7) libertar, mostrada pela simplicidade,

por intermédio do poder comunicativo-humanizador da palavra.

No contexto hospitalar, essa relação dos sentidos das histórias é trazida

porque já foi internalizada pela criança, em ações de mediação simbólica a sua

história de vida em outros contextos.

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A constante recriação dos contextos culturais por parte de cada um dos

membros, como descreve Oliveira (1993 b), é a base do processo histórico, sempre

em transformação, das sociedades humanas.

Esse sentido das histórias relatadas pelas falas das crianças refere-se ao

significado da palavra para cada indivíduo, composto pelas relações que dizem

respeito ao contexto de uso da palavra e às vivências afetivas do indivíduo.

Sobre a prática e aplicação do uso da leitura de histórias infantis na

hospitalização, constatamos que a leitura de histórias infantis não pertencia à rotina

do hospital investigado, e as crianças hospitalizadas, até a data da entrevista,

desconheciam essa prática nas enfermarias. Os livros que estavam em poder de

algumas crianças tinham sido trazidos pelos pais ou acompanhantes.

Freeman (1991) relaciona a história infantil a um jogo, podendo ser funcional

e terapêutico. Para ele, enquanto o adulto lê, ou conta histórias para as crianças,

nessa ação, há ativação dos processos de imaginação e motivação, e,

conseqüentemente, fortalecimento e promoção de bem-estar às crianças.

A hora da leitura da história era esperada, pois nela se fazia uma teia de

prazer. Podíamos perceber, pelos gestos, sorrisos e aproximações, a atenção e

participação no enredo. Numa viagem imaginária, as crianças abandonavam a

enfermaria e por alguns minutos se esqueciam dos procedimentos e intempéries

que o ambiente hospitalar lhes proporcionava. Essa ação está retratada nas figuras

1 e 2.

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Figura 6. As expressões no momento da história.

Figura 7. As expressões no momento da história.

Estudos realizados na Carolina do Sul, em Columbia, por Krietemeyer et al.

(1992) com um grupo de crianças hospitalizadas, comprovou que histórias infantis

podem ser utilizadas como meios de resolução de problemas e conflitos

psicológicos.

No Brasil, estudos realizados por Caldin (2002) relatam que o programa de

leitura para crianças pré-escolares e escolares internadas no Hospital Universitário

da Universidade Federal de Santa Catarina resultou em efeitos terapêuticos como

catarse, a projeção, a introjeção e a introspecção, além de despertar nas crianças o

gosto pela leitura e pela literatura infantil.

A falta dessas estratégias promotoras de saúde para a criança pode lhe

trazer sérios prejuízos. Estudos realizados no Canadá, por J. Rennick (2002), com

120 crianças na média de 11 anos, comprovou que a internação em hospitais pode

gerar trauma em crianças por meses, em decorrência dos impactos psicológicos

causados pelos procedimentos invasivos.

Essa repercussão não corresponde à percepção que temos sobre a missão

de cada um de nós. O ato de cuidar do cliente e prover uma assistência vinculada

aos preceitos da humanização nos serviços de saúde deve ser uma realidade.

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Durante a nossa prática com as histórias, constatamos que as crianças se

identificaram com algumas personagens e correlacionaram eventos ocorridos no

enredo das histórias com suas vivências e características fenotípicas. As falas

descrevem as correlações encontradas pelas crianças nas histórias:

O polegarzinho tem cabelo loiro e olhos azuis, ele pede dinheiro aos outro para comprar pão, para a família dele. Ei! Me dá dez, aí ele mim dá. Na avenida, é, sei. Dou a ma avô, um real. Vou mais é de noite que eu faço. (C1).

Baquero (1998), corroborando Vygotski (1998), aponta que a vivência da

criança exerce influência imediata, sendo documentada na memória e determinada

diretamente toda a estrutura de pensamento infantil nas primeiras etapas do

desenvolvimento; e a linguagem combina a função comunicativa com a de pensar.

Essa influência é descrita nas falas das crianças:

Eu desobedeci à mãe. Às vezes eu não faço as coisas que ela quer. Era o Pinóquio. (C3). A galinha, por que vai pra onde quer, entra em qualquer buraquinho, come bem, bebe água de qualquer canto, e as pessoas não cabem em qualquer buraco, não come o que as galinhas comem, comem outras coisas diferentes. (C5). Tem na parte que o Leão ficou bravo, ai eu fiquei bravo com as mas amigas. Brigar né..., mas agora eu não posso brigar né, porque eu tô com braço quebrado, ai eu tenho medo de mim machucar. Eu brigo com as mãos (risos)... batendo assim, não de chute, mas quando eu quero de chute, eu bato de chute. (C9). Na hora que o leão estava “tiste”, e porque eu tava “tiste”, como o leão. (C6).

Daniel, José, Raquel, Vírgílio e Kécia relacionaram as vivências às

histórias por elas escolhidas, e o fizeram no momento da mediação, resultando em

reflexão. Vygotski (1992) explica que, no discurso interior, o sentido sobre o

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significado das palavras se faz no plano intrapsicológico (onde a atividade é

constituída internamente) e se relaciona com as vivências afetivas.

O momento do desenho sempre foi muito esperado por todas as crianças,

talvez pelo uso dos materiais, pelo prazer produzido pela atividade de desenhar, o

desprendimento do ambiente hospitalar, a saudade de casa, dos amigos e das

relações afetivas. Todas as crianças quiseram desenhar, o que confirma o

interesse que essa atividade desperta na criança e suas características promotoras

de desenvolvimento cognitivo, afetivo e social.

Figura 8. O momento do desenho. Figura 9. O momento do desenho.

À medida que as crianças vão ficando mais velhas, elas adquirem a

capacidade de decidir previamente o que vão desenhar. Esse deslocamento

temporal do processo de nomeação, Vygotski (1999) diz que significa uma

mudança na função da fala. Quando a fala se desloca, entretanto para o início da

atividade, surge uma outra relação entre a palavra e a ação. Nesse instante, a fala

dirige, determina e domina o curso da ação; surge a função planejadora da fala,

além da função já existente da linguagem de refletir sobre o mundo exterior.

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Nos desenhos das crianças citadas anteriormente, podemos observar a

inserção de elementos do seu conhecimento, daquilo que vivenciaram. Essas

correlações com as histórias se retratam nos cenários dos desenhos. Para

contextualizar essa afirmação, selecionamos os desenhos e as falas que

representam as correlações dadas pelas crianças:

Figura 10 . Desenho elaborado por Daniel (C1), 9 anos, sobre a história do Polegarzinho

Daniel escolheu a história do Polegarzinho, porque achou o Polegarzinho

parecido com ele. Em seu desenho, podemos observar figuras que mesclam o

enredo da história e a sua história de vida. Ele mesmo aparece no cenário do

desenho, com um cachorro na coleira. Salientamos que essa cena não constava na

história.

O Polegarzinho tem cabelo loiro e olhos azuis, ele pede dinheiro aos outro para comprar pão, para a família dele. Ei! Me dá dez, aí ele mim dá. Na avenida, é, sei. Dou a ma avô, um real. Vou mais é de noite que eu faço. (C1).

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Figura 11. Desenho elaborado por José (C3), 7 anos, sobre a história do Pinóquio.

Quando a criança utiliza a memória, Vygotski (1998) chama de uma

narração gráfica, evidenciada no desenho de José, ao retratar o Pinóquio, quando

aparece com orelhas de burro. Incluiu-se nesse cenário como se estivesse num

passeio. Abaixo registramos a fala de José, citando atitudes que pratica

desobedecendo à mãe e relacionando a injúria a punição e culpa.

Eu desobedeci à mãe. Às vezes eu não faço as coisas que ela quer. Era o Pinóquio. (C3).

Figura 12. Desenho elaborado pela Raquel (C5), 9 anos, sobre a história A galinha dos ovos de ouro.

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No desenho de Raquel, apesar de a galinha dos ovos de ouro ser morta por

um fazendeiro, ela se inclui no cenário. Ela mora em Canindé, onde é uma prática

comum pegar as galinhas no terreiro da casa e matar. Esse contexto é vivenciado

diariamente por ela, e descreve a sua realidade sociocultural. Para Vygotski (1998),

a criança desenha o que conhece e não o que vê.

A galinha, por que vai pra onde quer, entra em qualquer buraquinho, come bem, bebe água de qualquer canto, e as pessoas não cabem em qualquer buraco, não comem o que as galinhas comem, comem outras coisas diferentes. (C5).

Figura 13 . Desenho elaborado por Virgílio (C6), 10 anos, sobre a história O leão e o mosquito.

No desenho de Virgílio, apesar de ser o Leão e o Mosquito, ele se identificou

com o Leão, afirmando que o Leão estava “tiste” como ele. O Leão retratado por

Vírgilio, podemos ver, que ele tem características humanas e expressa sentimentos

de tristeza. Vygotski (1998) declara que o uso adequado da fala é produto do

pensamento verbal, que se constitui no uso intelectual da linguagem. Descrevemos

a fala de Virgílio para contextualizar a afirmação:

Na hora que o leão estava “tiste”, e porque eu tava “tiste”, como o leão”. (C6).

Analisando as falas e os desenhos, identificamos a noção de que as

histórias infantis se mesclam com as histórias das próprias crianças e assumem o

papel de signos na interação com o terapeuta ocupacional, facilitando o processo

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de comunicação com a criança. Assim, uma história descreve uma seqüência de

ações e vivências de um determinado número de personagens, sejam reais ou

imaginários, e o desenho é a narração gráfica desses fatos.

Essas personagens são representadas em situações que mudam e as

crianças agem sobre esses cenários. Essas mudanças, por sua vez, revelam

aspectos ocultos das situações e das personagens, dando lugar a uma nova

condição, que pede reflexão ou ação, ou ambos. Corroborando tal asserção,

Bruner (1997) assinala que a criança, em resposta à condição, leva a história a sua

conclusão.

Relativamente às seis crianças que não correlacionaram as histórias com

suas vivências e aos desenhos, podemos verificar, em anotações do diário de

campo, que, segundo informações de suas acompanhantes, havia fatores

interferentes como: a negação, o entendimento da situação, a idade e vivências

anteriores de hospitalização.

Nesse sentido, as crianças expressaram uma pluralidade dos cuidados

preventivos a partir da ressignificação das suas histórias.

À medida que a criança elabora meios de não incorrer novamente nas

injúrias, isso representa a internalização, pois, de acordo com La Taille et al (1992),

a própria formação da consciência é também um processo de constituição de

subjetividade a partir de situações de intersubjetividade. Para contextualizar essas

afirmações, são descritas as falas das crianças, relatando como evitar as injúrias

não intencionais:

Rémedio, ir pro hospital, e ficar dentro de casa, não sair pro meu da rua, não roubar, e se roubar podem atirar e pegar na cabeça. Não ficar perto dos ladrões. (C1).

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Esses conceitos são construções culturais, internalizadas pelos indivíduos

ao longo do processo de desenvolvimento (VYGOTSKY, 1999; LA TAILLE, 1992).

Eu ia dar remédio e soro e dar cuidado, andar mais na calçada do que na rua. (C2). Pra não subir na árvore... pra não cair...(C4). Não andar mais a cavalo, e obedecer à mãe, que eu não obedeci (risos), ficar em casa, ajudando a mãe que eu não ajudo (risos), e eu não ouvo a mãe por isso que eu quebrei meu braçinho (risos) e nunca mais eu quero quebrar nada nem por morte. (C5).

As frases elaboradas pelas crianças são apontadas por Vygotski (1999)

como a linguagem do grupo cultural no qual a criança se desenvolve e dirige o

processo de formação dos conceitos. Essa trajetória de desenvolvimento de um

conceito é predeterminada e atribuída pela linguagem dos adultos.

Não pode o pé no TR-LEM. (C6).

Eu ia dizer para ele não quebrar, e mandava ele não ir no escorregador, não sobe que é perigoso...(C7). Andar olhando pra frente, ficar quieto. (C8). Que ele olhasse pra frente, para ele ter cuidado. (C9). Rezar um pouquinho, e não atravessar a rua, não ficar no meio da rua. (C10).

Podemos observa que as crianças atribuíram conceitos de forma

diversificada, relacionando-os as suas vivências, e essas construções denotam o

papel determinante da cultura, do contexto histórico e a interação com o adulto,

para elaborar conhecimentos da vida prática, a partir dos mecanismos relacionados

ao pensamento, linguagem e afetividade.

Desse modo, o estudo aponta que a função de planejar uma ação futura nos

remete ao conceito de zona de desenvolvimento proximal traz para a prática dos

terapeutas ocupacionais novos desafios e maior atenção para com o processo

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educativo. O conhecimento do processo que o indivíduo realiza mentalmente ao

desempenhar alguma tarefa é fundamental para compreender o papel e a

necessidade da intervenção terapêutica ocupacional na educação. Ao

desconsiderarmos as funções que se encontram em processo de consolidação,

deixamos de atuar na zona de desenvolvimento proximal, que é a distância entre o

nível de desenvolvimento real e o nível de desenvolvimento potencial do indivíduo.

O conceito de zona de desenvolvimento proximal traz para as práticas

educativas em saúde algumas implicações, como a consideração de que a

formulação do conhecimento é fundamental e não somente o produto final da

leitura do saber; a ressignificação do papel do terapeuta ocupacional como um

mediador, promovedor de situações coletivas e “colaborativas” geradoras de

interação, a comunicação dialogada e níveis de ajuda favorecendo as crianças que

executam conhecimentos a oportunidade de aprendizagem e conseqüente

desenvolvimento.

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6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Essa pesquisa desenvolvida sob a metodologia qualitativa permitiu articular

o sentido, o contexto e suas inter-relações no desempenho ocupacional da criança

hospitalizada, convidando a uma reflexão sobre as práticas educativas mais

informais, que, além do atendimento às necessidades clínicas determinadas pela

equipe, sejam atendidas as necessidades socioafetivas, minimizando os efeitos da

hospitalização, a fim de que a criança possa enfrentá-lo com segurança, menos

medo e angústias originadas pela doença.

Desse modo, nós, terapeuta ocupacional, durante a nossa pesquisa,

observou os gestos, os lapsos, os olhares furtivos, os sorrisos, as lágrimas, as

palavras e os desenhos. Apropriamo-nos das histórias infantis para promover o

brincar nesse ambiente hospitalar e as utilizamos como instrumento mediador de

nossa prática, com base na Teoria Histórico-Cultural e outros referenciais teóricos

que respaldam o desenvolvimento da criança, a ciência e a prática da Terapia

Ocupacional.

Constatamos neste estudo que o principal motivo de hospitalização é a

queda e que o sexo predominante é o masculino. Essas injúrias acontecem tanto

na zona urbana como na área rural, dependendo da exposição das crianças aos

fatores de risco na prevenção de injúrias na infância.

Os sentidos das histórias têm relação direta com os contextos pessoais,

sociais e culturais vivenciados pelas crianças. Algumas delas encontraram nas

histórias correlações com suas histórias de vida, e essas mesmas crianças

retrataram no cenário dos desenhos que debruxaram.

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Os cuidados autoconstruídos pelas crianças apresentavam características

de conceitos estabelecidos anteriormente pelos adultos e nos confirmam a

importância da formação dos conceitos a partir da mediação e da internalização.

Essa prática de utilizar as histórias nesse hospital não é comum, pois esses

momentos de interação nossa com as crianças, durante a escolha e leitura das

histórias e a confecção dos desenhos, foram recebidos, pelas crianças, com prazer

e alegria, proporcionando-lhes, mesmo por curtos espaços de tempo, que se

apoderassem da sua imaginação e transcendesse numa viagem ao imaginário

mundo da literatura infantil.

Vale ressaltar que esse momento de humanização no ambiente hospitalar

não tem sentido unidirecional. Trata-se de um momento de interação, em que não

só as crianças se divertem e sentem prazer, mas também esses sentimentos são

extensivos à pesquisadora e ressignificam a assistência prestada.

Ao investigar o uso das histórias infantis no ambiente hospitalar, deparamos

uma diversidade de aplicações desse instrumento por outros profissionais.

Constatamos que as histórias infantis têm múltiplas finalidades, como

promover atitudes de enfrentamento durante os procedimentos hospitalares nas

enfermarias e ambulatórios; estimular o diálogo entre a equipe médica e a criança;

modificar o ambiente hospitalar, possibilitando uma atmosfera de acolhimento;

aliviar o estresse da hospitalização, favorecer a troca de vivências e contribuir na

humanização durante a assistência à criança hospitalizada.

Por conseguinte, as histórias infantis são promotoras de saúde para crianças

hospitalizadas, porque podem ser utilizadas em combinação com a Educação em

Saúde, pela sua capacidade de ser um instrumento adaptável ao meio e estar em

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consonância com as necessidades e possibilidades das crianças, levando em

consideração os contextos pessoais, sociais e culturais.

Verificamos com esse estudo que a aplicação das histórias infantis como

estratégia promotora de saúde decorre do fato de que sua função é promover

mecanismos que possam favorecer o bem-estar físico, mental e social dessas

crianças, evitando que incorram em novas injúrias e levem consigo outras crianças.

Desse modo, o foco de nossa ação foi na prevenção de novas injúrias, a partir dos

processos de mediação e internalização.

Essa intenção exige, todavia, o respaldo de políticas públicas, no sentido de

redirecionar e enfatizar a importância dessa prática no ambiente hospitalar, e que o

Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) se faça cumprir em todas os hospitais

brasileiros, sensibilizando os profissionais de saúde a buscar em caminhos e novas

estratégias promotores de saúde mais informais, e próximos do contexto histórico-

cultural das crianças.

As histórias infantis estabelecem uma relação dialética por meio de um

contexto simples e adequado ao entendimento da criança. Os elementos-chave

que se deseja comunicar não estarão soltos, exigindo um pensamento abstrato

para lhes dar sentido, pois eles já estarão encadeados dentro da história. E a

compreensão da história resultará no entendimento de situações, razões e

resultados que, em última análise, são os elementos que se deseja transmitir.

Por conseguinte, recomendamos aos terapeutas ocupacionais a utilização

das histórias infantis como instrumento de mediação na formação de novos

conceitos, e, com esse recurso a promoção de atividades educativas, produtivas e

expressivas nos ambientes hospitalares para as crianças, levando em

consideração a sua história e a sua cultura, incluindo temas direcionados à

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hospitalização e a incentivar condutas que promovam a prevenção de injúrias e

possibilitem uma qualidade de vida adequada no ambiente hospitalar.

Considerando que a Terapia Ocupacional proporciona o fazer humano, e

que, por meio dele, nos sentimos humanos, então, no hospital, todas as crianças

devem ter indicações para atendimento terapêutico ocupacional, não só para livrar-

se do ócio, mas também reaver e preservar o humano, o que nos leva a solicitar a

inclusão efetiva do profissional de Terapia Ocupacional numa equipe de saúde,

para elaborar projetos que sejam viabilizados e recebam apoio nas ações

institucionais, que disponibilizem recursos humanos e materiais, sistematizando a

utilização do brincar na rotina hospitalar.

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APÊNDICES

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APÊNDICE 1

TERMO DE AUTORIZAÇÃO DO FIEL DEPOSITÁRIO

Pelo presente instrumento que atende às exigências legais, do comitê de ética profissional, o “fiel depositário”, com o cargo de Diretor do Centro de Estudos e Pesquisas do Instituto Dr. José Frota, após ter tomado conhecimento do protocolo de pesquisa intitulado: CRIANÇAS HOSPITALIZADAS POR ACIDENTES E AS HISTÓRIAS INFANTIS COMO ESTRATÉGIA PROMOTORA DE SAÚDE EM TERAPIA OCUPACIONAL, com objetivo de compreender o sentido das histórias infantis utilizadas como estratégia promotora de saúde em terapia ocupacional na percepção da criança hospitalizada, autoriza a Ana Cléa Veras Camurça Vieira, sob orientação da Prof.a Dr.a Luiza Jane Eyre de Souza Vieira, da Universidade de Fortaleza – UNIFOR, ter acesso aos arquivos de dados dos pacientes desta instituição, sendo permitido a coleta de informações referentes aos prontuários de crianças internadas na Unidade Pediátrica, objeto deste estudo, e que se encontram sob sua total responsabilidade.

Fica claro que o fiel depositário pode a qualquer momento retirar sua AUTORIZAÇÂO e ciente de que todas as informações prestadas tornar-se-ão confidenciais e guardadas por força de sigilo profissional (art. 8 do Código de Ética dos Profissionais de Fisioterapia e Terapia Ocupacional), assegurando que os dados obtidos da pesquisa serão somente utilizados para estudo.

Fortaleza-CE, 28 de Março de 2005.

______________________________________________________

Diretor do Centro de Estudos e Pesquisas do Instituto Dr. José Frota

Instituto Dr. José Frota/ Rua Barão do Rio Branco 1618, 8º andar/tel.3255 5074

_______________________________________________________ Ana Cléa Veras Camurça Vieira Crefito-2903 Av. Washington Soares, 1321 /Tel. 3477 3202

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APÊNDICE 2

MODELO DE TERMO DE CONSENTIMENTO

Esclarecimento sobre a pesquisa para o responsável ou acompanhante:

Car(o) senhor(a) estamos realizando uma pesquisa cujo tema é “Crianças hospitalizadas por acidentes e as histórias infantis como estratégia promotora da Saúde em Terapia Ocupacional”. Mas, para que esta seja realizada, será necessário o levantamento destes dados, que serão de suma importância para área da saúde da criança, principalmente para as crianças em internação hospitalar, pois através deste estudo poderemos dar atenção especial à humanização de cuidados, visando melhor compreensão sobre as questões das crianças que se encontra em processo de internação hospitalar. Esta pesquisa tem como objetivo levantar questões sobre a utilização das “Histórias infantis” como ferramenta a promoção da saúde, posteriormente possibilitar a reflexão, sensibilização, o conhecimento sobre o tema em questão. Sendo assim, sua participação e o preenchimento deste termo de consentimento são de fundamental relevância para esta pesquisa. Esclareço que não haverá danos, riscos ou gastos para você, garantimo-lhes o sigilo das respostas, bem como o direito de desistir a qualquer momento, sem prejuízo algum deste estudo e para você. As entrevistas serão aplicadas no período de julho a outubro de 2005. Pesquisadora responsável: Ana Cléa Veras Camurça Vieira Telefone: 0XX 85 3477 3203 Deste modo, venho solicitar sua colaboração para participar da pesquisa respondendo a uma entrevista contendo perguntas relacionadas ao referido assunto do projeto.

Dados do entrevistado

Nome: Endereço: Telefone: Data do nascimento:

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APÊNDICE 3

TERMO DE CONSENTIMENTO PROPRIAMENTE DITO

Eu ______________, RG_______________, declaro para todos os devidos fins que cedo os direitos da entrevista, gravação em fita K-7, em vídeo e fotos de meu filho (a), na data no dia ___/___/___, para ser usada integralmente ou em partes, sem restrições de prazo ou citações, desde a presente data pela pesquisadora Ana Cléa Veras Camurça Vieira. Assim estou ciente dos meus direitos, abaixo relacionados, como tendo:

1. A garantia de receber informações gerais sobre o significado, justificativa, objetivos e os procedimentos que serão utilizados na pesquisa, bem como o esclarecimento e orientação a qualquer dúvida acerca dos procedimentos, riscos, benefícios e outros relacionados à pesquisa.

2. A liberdade de retirar o meu consentimento a qualquer momento e/ou deixar de participar deste estudo, sem que isto traga penalização, à minha condição .

3. A segurança de que não serei identificada e que será mantido sigilo e o caráter confidencial da informação relacionada à privacidade da criança.

4. O compromisso de me proporcionar informações atualizadas durante o estudo, ainda que possa afetar ma vontade de continuar participando;

5. A garantia da não existência ou vulnerabilidade a danos e riscos a ma pessoa. 6. A garantia de haver gastos de ma parte porque a coleta de dados que participarei, será

realizada no próprio ambiente do hospital, em horário pré-determinado. Portanto, estou ciente de que não haverá nenhum gasto e nem ressarcimento ou indenização. Sendo assim, declaro o meu consentimento de usar as respostas gravadas em fitas K-7, vídeo e fotografias, para esta pesquisa, podendo torná-las pública. Concordo, portanto, em participar deste estudo, levando em consideração todos os elementos acima mencionados.

Fortaleza, ___________. ____________________2005

Assinatura do responsável Esclareço que:

• As informações coletas na entrevista somente serão utilizadas para os objetivos da pesquisa.

• Que o senhor (a) tem liberdade de desistir a qualquer momento de participar da pesquisa. • Também esclareço que as informações ficarão em sigilo e que seu anonimato será

preservado. • Nenhum momento o senhor (a) terá prejuízo no seu tratamento financeiro.

CONSENTIMENTO PÓS-ESCLARECIMENTO

Declaro que após convenientemente esclarecido pelo pesquisador e ter entendido o que me foi explicado, concordo que meu ou (minha) filho(a) participe da pesquisa. Fortaleza, __________ de ___________________________ de 2005.

Assinatura do responsável

Assinatura do pesquisador (a)

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APÊNDICE 4

ORIENTAÇÃO DA APLICAÇÃO PARA O INSTRUMENTO

INSTRUÇÃO PARA O ACOMPANHANTE SOBRE A ENTREVISTA COM A CRIANÇA

Car(o) senhor (a) estamos realizando uma pesquisa cujo tema é “Crianças hospitalizadas por acidentes e as histórias infantis como estratégia promotora da Saúde em Terapia Ocupacional”. Mas, para que esta seja realizada, será necessário o levantamento destes dados, que serão de suma importância para área da saúde da criança, principalmente para as crianças em internação hospitalar, pois através deste estudo poderemos dar atenção especial à humanização de cuidados, visando melhor compreensão sobre as questões das crianças que se encontram em processo de internação hospitalar. Esta pesquisa tem como objetivo levantar questões sobre a utilização das “histórias infantis” como ferramenta para a promoção da saúde, posteriormente trabalhar conjuntamente com as crianças e possibilitar a reflexão, conscientização, o conhecimento sobre o tema em questão. Sendo assim, sua participação e o preenchimento deste termo de consentimento são de fundamental relevância para esta pesquisa. Esclareço que não haverá danos, riscos ou gastos para você, garantimo-lhes o sigilo das respostas, bem como o direito de desistir a qualquer momento, sem prejuízo algum deste estudo e para você. Porém, a sua participação, será muito importante e trará benefícios significantes para a humanização de cuidados de crianças em processo de internação hospitalar. INSTRUMENTO DA COLETA DE DADOS. 1.1 Dados de Identificação: Nome:_________________________________________________________________________ Data do nascimento: _____________________________________________________________ Sexo:__________________________________________________________________________ Escolaridade:____________________________________________________________________ Data do início da internação: _______________________________________________________ Motivo:_________________________________________________________________________ 2.Questões norteadoras para entrevista com a criança:

• Você sabe por que esta aqui? • Você sabe para que serve essas histórias? • Alguém já contou histórias para você aqui? • Qual dessas histórias você gostaria de ouvir? • Desenhe para mim a parte que mais gostou? • Existe alguma coisa nessa história que já aconteceu com você? • Quais os cuidados você tem que tomar par não acontecer de novo isso com você?

Obs.: Este instrumento será submetido à apreciação do orientador para ser testado e validado em plano piloto, com possibilidades de serem ampliadas ou suprimidas algumas questões.

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ANEXO

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