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Coletânea de Poemas Trabalho realizado por: Ana Natália nº 4 Disciplina de Português Prof.ª Elisabete Miguel EAAA 10F

Ana Natália - Coletânea de poemas

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Ana Natália, 10.º ano, n.º4, turma F, Escola Artística António Arroio - Disciplina de Português - Professora Eli

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Coletânea de Poemas Trabalho realizado por: Ana Natália nº 4

Disciplina de Português Prof.ª Elisabete Miguel

EAAA

10F

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Índice

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Introdução

Explicação do Tema abordado no trabalho

A tua morte em mim , Adolfo Casais Monteiro

O vermelho por dentro , Ana Hatherly

“Requiem” de Mozart , Jorge de Sena

E a Vida foi, e é assim, e não melhora , António Nobre

Aquela triste e leda madrugada , Luís de Camões

O dia em que eu nasci, moura e pereça , Luís de Camões

Queixa e imprecações dum condenado à morte , Ary dos Santos

Os olhos do poeta , Manuel da Fonseca

Fonógrafo, Camilo Pessanha

Vida , Camilo Pessanha

Não fugir. Suster o peso da hora , Cristovam Pavia

Apesar das ruínas e da morte , Sophia de Mello Breyner Andresen

Carta aos amigos mortos(, Sophia de Mello Breyner Andresen

Morta , Sophia de Mello Breyner Andresen

A morte é a curva da estrada , Fernando Pessoa

Tenho dó das estrelas , Fernando Pessoa

Mistério , Florbela Espanca

A noite desce... Florbela Espanca

E alegre se fez triste , Manuel Alegre

Este Inferno de amar , Almeida Garret

Ilustração

4

Explicação do tema abordado no trabalho:

Neste trabalho decidi contrariar os temas mais comuns e escolhi aqueles que mais

me agradam, a Morte e o Mistério.

Tal escolha deve-se ao meu mais adorado poeta e escritor, nada mais, nada menos, que

Edgar Allan Poe. Desde pequena que lia as suas histórias de mistério, crime e horror e, embora

seja da opinião geral da minha família que isso me ‘perturbou’, continuo a discordar e a afirmar

que apenas acordou em mim um interesse profundo por tais temas.

Escolhi alguns poemas que, embora talvez não inteiramente integrados no tema, têm algo

de coeso com os restantes selecionados, permitindo assim uma imersão mais ligeira no tema

em si.

É de salientar que, embora tais assuntos me intriguem, de modo algum sou crente em tais

superstições como o sobrenatural, considero, isso sim, que são temas interessantes e que

algum dia gostaria de os abordar em obras artísticas da minha autoria.

Para mim o sobrenatural e o mistério envolvem tudo aquilo que o ser Humano não

consegue explicar e que, de certo modo, transcende o acreditável.

Mistério, em geral, é algo secreto e escondido, de significado ou causa oculta;

um fenómeno que ocorre e não se tem conhecimento de quais as causas.’

Wikipédia

5

A tua morte em mim (excerto) À memória de Raquel Moacir

A tua morte é sempre nova em mim.

Não amadurece. Não tem fim.

Se ergo os olhos dum livro, de repente

tu morreste.

Acordo, e tu morreste.

Sempre, cada dia, cada instante,

a tua morte é nova em mim,

sempre impossível.

E assim, até à noite final

irás morrendo a cada instante

da vida que ficou fingindo vida.

Redescubro a tua morte como outros

redescobrem o amor,

porque em cada lugar, cada momento,

tu estás viva.

6

Viverei até à hora derradeira a tua morte.

Aos goles, lentos goles. Como se fosse

cada vez um veneno novo.

Não é tanto a saudade que dói, mas o remorso.

O remorso de todo o perdido em nossa vida,

coisas de antes e depois, coisas de nunca,

palavras mudas para sempre, um gesto

que sem remédio jamais teve destino,

o olhar que procura e nunca tem resposta.

O único presente verdadeiro é teres partido.

Adolfo Casais Monteiro

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"Requiem" de Mozart

I

Ouço-te, ó música, subir aguda

à convergente solidão gelada.

Ouço-te, ó música, chegar desnuda

ao vácuo centro, aonde, sustentada

e da esférica treva rodeada,

tu resplandeces e cintilas muda

como o silente gesto, a mão espalmada

por sobre a solidão que amante exsuda

e lacrimosa escorre pelo espaço

além de que só luz grita o pavor.

Ouço-te lá pousada, equidistante

desse clarão cuja doçura é de aço

como do frágil mas potente amor

que em teu ouvir-te queda esvoaçante.

8

II

Ó música da morte, ó vozes tantas

e tão agudas, que o estertor se cala.

Ó música da carne amargurada

de tanto ter perdido que ora esquece.

Ó música da morte, ah quantas, quantas

mortes gritaram no que em ti não fala.

Ó música da mente espedaçada

de tanto ter sonhado o que entretece,

sem cor e sem sentido, no fervor

de sublimar-se nesse além que és tu.

Ó vida feita uma detida morte.

Ó morte feita um inocente amor.

Amor que as asas sobre o corpo nu

fecha tranquilas no possuir da sorte.

Jorge de Sena

9

O vermelho por dentro

Estão envolvidos em corpos negros vermelhos por

dentro. Estão num barco sobre o mar e o mar é

negro. É de noite. O céu está negro e sobre a

água negra tudo é vermelho por dentro.

Os corpos eram negros

sobre o mar a água era de noite

não se via o vermelho por dentro

os corpos não se viam

eram barcos com os ventres todos negros

e as línguas eram de águas muito rentes

A sangue não sabia

não se via o vermelho por dentro

o céu a água envolvia

tudo envolvia nos vermelhos dentros

e os mares todas as noites estavam negros

negros por dentro

E a água volvia pelo céu tão negra

e à noite por dentro do mar todo vermelho

a noite era vermelha

e os barcos negros por dentro

E nos corpos a água negra era vermelha por dentro

e eles estavam envolvidos

e

Ana Hatherly 10

E a Vida foi, e é assim, e não melhora

E a Vida foi, e é assim, e não melhora.

Esforço inútil. Tudo é ilusão.

Quantos não cismam nisso mesmo a esta hora

Com uma taça, ou um punhal na mão!

Mas a Arte, o Lar, um filho, António? Embora!

Quimeras, sonhos, bolas de sabão.

E a tortura do Além e quem lá mora!

Isso é, talvez, minha única aflição.

Toda a dor pode suportar-se, toda!

Mesmo a da noiva morta em plena boda,

Que por mortalha leva... essa que traz.

Mas uma não: é a dor do pensamento!

Ai quem me dera entrar nesse convento

Que há além da Morte e que se chama A Paz!

António Nobre

11

Aquela triste e leda madrugada

Aquela triste e leda madrugada,

cheia toda de mágoa e de piedade,

enquanto houver no mundo saudade

quero que seja sempre celebrada.

Ela só, quando amena e marchetada

saía, dando ao mundo claridade,

viu apartar-se de üa outra vontade,

que nunca poderá ver-se apartada.

Ela só viu as lágrimas em fio,

de que uns e outros olhos derivadas

se acrescentaram em grande e largo rio.

Ela viu as palavras magoadas

que puderam tornar o fogo frio,

e dar descanso às almas condenadas.

Luís de Camões

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O dia em que eu nasci, moura e pereça

O dia em que eu nasci, moura e pereça

Não o queira jamais o tempo dar,

não torne mais ao mundo e, se tornar,

eclipse nesse passo o sol padeça.

A luz lhe falte, o sol se escureça,

mostre o mundo sinais de se acabar,

nasçam-lhe monstros, sangue chova o ar,

a mãe ao próprio filho não conheça.

As pessoas pasmadas, de ignorantes,

as lágrimas no rosto, a côr perdida,

cuidem que o mundo já se destruiu.

Ó gente temerosa, não te espantes,

que este dia deitou ao mundo a vida

mais desgraçada que jamais se viu.

Luís de Camões

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Queixa e imprecações dum condenado à morte

Por existir me cegam,

Me estrangulam,

Me julgam,

Me condenam,

Me esfacelam.

Por me sonhar em vez de ser me insultam,

Por não dormir me culpam

E me dão o silêncio por carrasco

E a solidão por cela.

Por lhes falar, proíbem-me as palavras,

Por lhes doer, censuram-me o desejo

E marcam-me o destino a vergastadas

Pois não ousam morder o meu corpo de beijos.

Passo a passo os encontro no caminho

Que os deuses e o sangue me traçaram.

E negando-me, bebem do meu vinho

E roubam um lugar na minha cama

E comem deste pão que as minhas mãos infames amassaram.

Com angústia e com lama.

14

Passo a passo os encontro no caminho.

Mas eu sigo sozinho!

Dono dos ventos que me arremessaram,

Senhor dos tempos que me destruíram,

Herói dos homens que me derrubaram,

Macho das coisas que me possuíram.

Andando entre eles invento as passadas

Que hão-de em triunfo conduzir-me à morte

E as horas que sei que me estão contadas,

Deslumbram-me e correm, sem que isso me importe.

Sou eu que me chamo nas vozes que oiço,

Sou eu quem se ri nos dentes que ranjo,

Sou eu quem me corto a mim mesmo o pescoço,

Sou eu que sou doido, sou eu que sou anjo.

Sou eu que passeio as correntes e as asas

Por sobre as cidades que vou destruindo,

Sou eu o incêndio que lhes devora as casas,

O ladrão que entra quando estão dormindo.

15

Sou eu quem de noite lhes perturba o sono,

Lhes frustra o amor, lhes aperta a garganta.

Sou eu que os enforco numa corda de sonho

Que apodrece e cai mal o sol se levanta.

Sou eu quem de dia lhes cicia o tédio,

O tédio que pensam, que bebem e comem,

O tédio de serem sem nenhum remédio

A perfeita imagem do que for um homem.

Sou eu que partindo aos poucos lhes deixo

Uma herança de pragas e animais nocivos.

Sou eu que morrendo lhes segredo o horror

de serem inúteis e ficarem vivos.

Ary dos Santos

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Os olhos do poeta

O poeta tem olhos de água para reflectirem todas as cores do mundo,

e as formas e as proporções exactas, mesmo das coisas que os sábios desconhecem.

Em seu olhar estão as distâncias sem mistério que há entre as estrelas,

e estão as estrelas luzindo na penumbra dos bairros da miséria,

com as silhuetas escuras dos meninos vadios esguedelhados ao vento.

Em seu olhar estão as neves eternas dos Himalaias vencidos

e as rugas maceradas das mães que perderam os filhos na luta entre as pátrias

e o movimento ululante das cidades marítimas onde se falam todas as línguas da terra

e o gesto desolado dos homens que voltam ao lar com as mãos vazias e calejadas

e a luz do deserto incandescente e trémula, e os gestos dos pólos, brancos, brancos,

e a sombra das pálpebras sobre o rosto das noivas que não noivaram

e os tesouros dos oceanos desvendados maravilhando com contos-de-fada à hora da infância

e os trapos negros das mulheres dos pescadores esvoaçando como bandeiras aflitas

e correndo pela costa de mãos jogadas pró mar amaldiçoando a tempestade:

- todas as cores, todas as formas do mundo se agitam e gritam nos olhos do poeta.

Do seu olhar, que é um farol erguido no alto de um promontório,

sai uma estrela voando nas trevas

tocando de esperança o coração dos homens de todas as latitudes.

E os dias claros, inundados de vida, perdem o brilho nos olhos do poeta

que escreve poemas de revolta com tinta de sol na noite de angústia que pesa no mundo.

Manuel da Fonseca, Poemas completos

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Fonógrafo

Vai declamando um cómico defunto.

Uma plateia ri, perdidamente,

Do bom jarreta... E há um odor no ambiente

A cripta e a pó, – do anacrónico assunto.

Mudo o registo, eis uma barcarola:

Lírios, lírios, águas do rio, a lua.

Ante o Seu corpo o sonho meu flutua

Sobre um paul, – extática corola.

Muda outra vez: gorjeios, estribilhos

Dum clarim de oiro – o cheiro de junquilhos,

Vívido e agro! – tocando a alvorada...

Cessou. E, amorosa, a alma das cornetas

Quebrou-se agora orvalhada e velada.

Primavera. Manhã. Que eflúvio de violetas.

Camilo Pessanha

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Vida

Choveu! E logo da terra humosa

Irrompe o campo das liliáceas.

Foi bem fecunda, a estação pluviosa!

Que vigor no campo das liliáceas!

Calquem. Recalquem, não o afogam.

Deixem. Não calquem. Que tudo invadam.

Não as extinguem. Porque as degradam?

Para que as calcam? Não as afogam.

Olhem o fogo que anda na serra.

É a queimada... Que lumaréu!

Podem calcá-lo, deitar-lhe terra,

Que não apagam o lumaréu.

Deixem! Não calquem! Deixem arder.

Se aqui o pisam, rebenta além.

- E se arde tudo? - Isso que tem?

Deitam-lhe fogo, é para arder...

Camilo Pessanha

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Não fugir. Suster o peso da hora Não fugir. Suster o peso da hora

Sem palavras minhas e sem os sonhos,

Fáceis, e sem as outras falsidades.

Numa espécie de morte mais terrível

Ser de mim despojado, ser

abandonado aos pés como um vestido.

Sem pressa atravessar a asfixia.

Não vergar. Suster o peso da hora

Até soltar sua canção intacta.

Cristovam Pavia

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Apesar das ruínas e da morte

Apesar das ruínas e da morte,

Onde sempre acabou cada ilusão,

A força dos meus sonhos é tão forte,

Que de tudo renasce a exaltação

E nunca as minhas mãos ficam vazias.

Sophia de Mello Breyner Andresen, Poesia (1944)

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Carta aos amigos mortos

Eis que morrestes - agora já não bate

O vosso coração cujo bater

Dava ritmo e esperança ao meu viver

Agora estais perdidos para mim

- O olhar não atravessa esta distância -

Nem irei procurar-vos pois não sou

Orpheu tendo escolhido para mim

Estar presente aqui onde estou viva.

Eu vos desejo a paz nesse caminho

Fora do mundo que respiro e vejo.

Porém aqui eu escolhi viver

Nada me resta senão olhar de frente

Neste país de dor e incerteza.

Aqui eu escolhi permanecer

Onde a visão é dura e mais difícil

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Aqui me resta apenas fazer frente

Ao rosto sujo de ódio e de injustiça

A lucidez me serve para ver

A cidade a cair muro por muro

E as faces a morrerem uma a uma

E a morte que me corta ela me ensina

Que o sinal do homem não é uma coluna.

E eu vos peço por este amor cortado

Que vos lembreis de mim lá onde o amor

Já não pode morrer nem ser quebrado.

Que o vosso coração que já não bate

O tempo denso de sangue e de saudade

Mas vive a perfeição da claridade

Se compadeça de mim e de meu pranto

Se compadeça de mim e do meu canto.

Sophia de Mello Breyner Andresen, Livro Sexto (1962)

23

Morta

Morta,

Como és clara,

Que frescura ficou entre os teus dedos...

És uma fonte,

Com pedras brancas no fundo,

És uma fonte que de noite canta

E silenciosamente

Vêm peixes de prata à tona de água.

Morta como és clara,

E florida ...

És a brisa

Que num gesto de adeus passa nas folhas,

És a brisa que leva os perfumes e os entorna,

És os passos leves da brisa

Quando nas ruas não passa mais ninguém!

És um ramo de tília onde o silêncio floresce,

És um lago onde as imagens se inquietam,

És a secreta nostalgia duma festa

Que nos jardins murmura.

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Cantando

Com as mãos deslizando pelos muros

Passas colhendo

O sangue vermelho e maduro das amoras

Vais e vens

Solitária e transparente

E a memória das coisas te acompanha.

Morta como és clara,

E perdida!

És a meia-noite da noite,

És a varanda voltada para o vento,

És uma pena solitária e lisa,

As sombras recomeçam a dançar,

O perfume das algas enche o ar

E as ramagens encostam-se às janelas:

Suaves cabelos de pena tem a brisa.

Sozinha passas no fim das avenidas.

Não mostras o teu rosto,

Passas de costas com um vestido branco.

25

Como tu és leve e doce como um sono!

O sopro da noite enche-se de angústia

E de mim sobem palavras solitárias:

És o perfume de infância que há nas rochas,

És o vestido de infância que há nos campos,

És a pena de infância que há na noite.

Subitamente

Agarro perco a forma do teu rosto:

Como tu és fresca!

Passas e dos teus dedos correm fontes.

Como tu és leve,

Mais leve que uma dança!

Mal chegaste, mal voltaste, mal te vi

Já no fundo dos caminhos te extinguiste:

Areia lisa e branca que nenhum passo pisa

Pena lisa

Angústia fonte fresca e brisa.

Sophia de Mello Breyner Andresen

26

A morte é a curva da estrada

A morte é a curva da estrada,

Morrer é só não ser visto.

Se escuto, eu te oiço a passada

existir como eu existo.

A terra é feita de céu.

A mentira não tem ninho.

Nunca ninguém se perdeu.

Tudo é verdade e caminho.

Fernando Pessoa, Cancioneiro

27

Tenho dó das estrelas

Tenho dó das estrelas

Luzindo há tanto tempo,

Há tanto tempo...

Tenho dó delas.

Não haverá um cansaço

Das coisas,

De todas as coisas ,

Como das pernas ou de um braço?

Um cansaço de existir,

De ser,

Só de ser,

O ser triste brilhar ou sorrir...

Não haverá, enfim,

Para as coisas que são,

Não morte, mas sim

Uma outra espécie de fim,

Ou uma grande razão –

Qualquer coisa assim

Como um perdão?

Fernando Pessoa

28

Mistério

Gosto de ti, ó chuva, nos beirados,

Dizendo coisas que ninguém entende!

Da tua cantilena se desprende

Um sonho de magia e de pecados.

Dos teus pálidos dedos delicados

Uma alada canção palpita e ascende,

Frases que a nossa boca não aprende,

Murmúrios por caminhos desolados.

Pelo meu rosto branco, sempre frio,

Fazes passar o lúgubre arrepio

Das sensações estranhas, dolorosas...

Talvez um dia entenda o teu mistério...

Quando inerte, na paz do cemitério,

O meu corpo matar a fome às rosas!

Florbela Espanca, Charneca em Flor (1930)

29

A noite desce...

Como pálpebras roxas que tombassem

Sobre uns olhos cansados, carinhosas,

A noite desce... Ah! doces mãos piedosas

Que os meus olhos tristíssimos fechassem!

Assim mãos de bondade me embalassem!

Assim me adormecessem, caridosas,

E em braçadas de lírios e mimosas,

No crepúsculo que desce me enterrassem!

A noite em sombra e fumo se desfaz...

Perfume de baunilha ou de lilás,

A noite põe-me embriagada, louca!

E a noite voi descendo, muda e calma...

Meu doce Amor, tu beijas a minh'alma

Beijando nesta hora a minha boca!

Florbela Espanca, Livro de Soror Saudade (1923)

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E alegre se fez triste

Aquela clara madrugada que

viu lágrimas correrem no teu rosto

e alegre se fez triste como se

chovesse de repente em pleno Agosto.

Ela só viu meus dedos nos teus dedos

meu nome no teu nome. E demorados

viu nossos olhos juntos nos segredos

que em silêncio dissemos separados.

A clara madrugada em que parti.

Só ela viu teu rosto olhando a estrada

por onde um automóvel se afastava.

E viu que a pátria estava toda em ti.

E ouviu dizer-me adeus: essa palavra

que fez tão triste a clara madrugada.

Manuel Alegre, O canto e as armas

31

Este inferno de amar

Este inferno de amar - como eu amo!

Quem mo pôs aqui n'alma... quem foi?

Esta chama que alenta e consome,

Que é a vida - e que a vida destrói -

Como é que se veio a atear,

Quando - ai quando se há-de ela apagar?

Eu não sei, não me lembra: o passado,

A outra vida que d'antes vivi

Era um sonho talvez... - foi um sonho -

Em que paz tam serena a dormi!

Oh! que doce era aquele sonhar...

Quem me veio, ai de mim! despertar?

Só me lembra que um dia formoso

Eu passei... dava o sol tanta luz!

E os meus olhos, que vagos giravam,

Em seus olhos ardentes os pus.

Que fez ela? eu que fiz? - Não no sei;

Mas nessa hora a viver comecei...

Almeida Garrett, Folhas Caídas

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“A Tua Morte em Mim” Fotografia de: Natália Morais

Ilustração:

O poema que decidi ilustrar foi, “A tua morte em mim”, de Adolfo Casais Monteiro, devido

às memórias que este me desperta.

Ao ler o poema fui navegando por emoções que me preenchem a cada dia que passa. Cada

dia sem o meu pai. Cada dia que corre pelas minhas veias como sangue, grosso e lento,

carregado de veneno.

Quando o meu pai morreu, todo o meu mundo desabou, e com ele eu morri.

Não me lembro de ser feliz, não me lembro de rir, e rir genuinamente.

Não me lembro.

São poucas as alegrias, e até essas parecem desabar, ou nem chegar à solidez. Desfalecem,

antes de eu lhes poder tocar.

Com esta ilustração quis demonstrar uma parte da minha rotina, a minha ligação com o

poema e a razão pelo qual o escolhi. Razão em si que só se explica com a ausência de uma vida.

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Conclusão:

Foi-nos pedido, por volta do início das férias de Natal, para começarmos a reunir

poesia do nosso agrado para um trabalho que teria início no segundo período. Fiquei

extremamente entusiasmada e comecei logo a procura de tais poemas, no entanto,

posteriormente, no início do 2.º período, com a especificação das regras, todos os poemas

que havia reunido pareciam fora de lugar e sem uma conexão específica.

Reiniciei, então, o dossiê, escolhendo a Morte, e o Mistério como temas principais.

O trabalho acabou por se desenvolver de forma lenta devido à minha insatisfação com o

trabalho em geral. Por várias vezes o refazia, escolhia novos poemas e voltava a ilustrar o

poema escolhido.

No fim, ainda insatisfeita com a minha ‘Colectânea de Poemas’, tentei por várias vezes

enviá-lo, mas em vão. O browser não me permitia anexar ficheiros. Acabei por utilizar esse

tempo para, de novo, “limar” o trabalho.

Depois sucedeu outro infortúnio. O papel onde tinha notas, e poemas para adicionar ao

trabalho que tinha recolhido durante a aula e, através de livros de familiares, perdeu-se, ou foi

tirado do meu Diário Gráfico pouco depois de o ter realizado, não tendo assim tempo para

incorporar tais notas ao meu trabalho.

No fim, tendo a certeza que o trabalho não está, de maneira nenhuma, de acordo com as

minhas expetativas iniciais, espero que mesmo assim me possa valer uma nota razoável.

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Coletânea de Poemas Trabalho realizado por: Ana Natália nº 4

Disciplina de Português Prof.ª Elisabete Miguel

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