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1 ANAIS III CIMDEPE SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE CIDADES MÉDIAS RIO DE JANEIRO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO- 27 A 30 DE ABRIL

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ANAIS III CIMDEPE SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE CIDADES MÉDIAS

RIO DE JANEIRO - UNIVERSIDADE FEDERAL DO

RIO DE JANEIRO- 27 A 30 DE ABRIL

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Coordenação WILLIAM RIBEIRO DA SILVA (UFRJ)

MARIA ENCARNAÇÃO BELTRÃO SPOSITO (UNESP)

MARIA JOSÉ MARTINELLI CALIXTO (UFGD)

PAULO PEREIRA DE GUSMÃO (UFRJ)

Comitê Científico ARTHUR MAGON WITHACKER (UNESP)

BEATRIZ RIBEIRO SOARES (UFU)

CARLOS BRANDÃO (UFRJ)

CARMEN BELLET SANFELIU (UNIVERSITAT DE LLEIDA)

CLEVERSON REOLON (UNESP)

CRISTIAN HENRÍQUEZ (PUC/CHILE)

DENISE DE SOUZA ELIAS (UECE)

DIANA LAN (UCPBA/ARGENTINA)

DORALICE SÁTYRO MAIA (UFPB)

ELISEU SAVÉRIO SPOSITO (UNESP)

EVERALDO SANTOS MELAZZO (UNESP)

FEDERICO ARENAS VÁSQUEZ (PUC/CHILE)

FLORIANO GODINHO DE OLIVEIRA (UERJ)

FREDERIC MONIÉ (UFRJ)

GLÁUCIO MARAFON (UERJ)

JAN BITOUN (UFPE)

JOSÉ ALDEMIR DE OLIVEIRA (UFAM)

JOSÉ MARIA LLOP TORNE (CATEDRA UNESCO)

JULIA ADÃO BERNARDES (UFRJ)

LIA OSORIO MACHADO (UFRJ)

MARIA LAURA SILVEIRA (CONICET/ARGENTINA)

OSCAR ALFREDO SOBARZO MINO (UFS)

OSWALDO BUENO AMORIM (PUC/MG)

PAULO PEREIRA DE GUSMÃO (UFRJ)

RENATO PEQUENO (UFCE)

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ROBERTO LOBATO CORRÊA (UFRJ)

ROSA MOURA (IPARDES)

SAINT-CLAIR CORDEIRO DA TRINDADE JUNIOR (UFPA)

TATIANA SCHOR (UFAM)

Monitores ANA CAROLINA ALVES CARVALHO DE OLIVEIRA

BRUNO BARRETO DOS SANTOS

BRUNO PEREIRA DO NASCIMENTO

CAIO VITOR VILLARINO

CHRISTINA BARBARA GIESEBART

CINDY MARTINS RODRIGUES

EURIDSON RIBEIRO DA CRUZ

GABRIELLE DE SOUZA FRADE

HUMBERTO MIRANDA DE CARVALHO

JOSÉ BERNARDO DA SILVA JUNIOR

LÍVIA MARIA DE SOUZA MAGALHÃES

LUANA ALVES LESSA

MONIQUE DEISE GUIMARÃES BASTOS

NATHAN FERREIRA DA SILVA

RAFAELA DETTOGNI DUARTE PAES

RENILDO NASCIMENTO SANTOS

VIVIAN SANTOS DA SILVA

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FICHA DE CATOLOGRÁFICA

III Simpósio Internacional Cidades Médias, 30 Rio de Janeiro - RJ, 2015

Anais do III Simpósio Internacional Cidades Médias, UFRJ/ReCiMe, 26

à 30 de abril de 2015 / organizado por William Ribeiro da Silva, Maria

Encarnação Beltrão Sposito, Maria José Martinelli Calixto e Paulo Pereira de

Gusmão. Rio de Janeiro.

Tema: Cidades Médias, Reestruturação Urbana e Redes.

ISBN:

1. Geografia; 2. Espaço Urbano; 3. Urbanismo. Org. I. SILVA, W.R.; org.

II. SPOSITO, M.E.B.; org. III. CALIXTO, M.J.M. e org. IV. GUSMÃO, P.P.

Título: Anais do III Simpósio Internacional Cidades Médias.

CDU:

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Índice

Autor Pág.

Helen Ribeiro Rodrigues ...............................................................................................13

José Queiroz de Miranda Neto ......................................................................................35

Júlio Cláudio da Gama Bentes .......................................................................................56

Leonardo da Silva Galindo .............................................................................................80

Rafaela Dettogni Duarte Paes .......................................................................................103

Ricardo Nagliati Toppan ..............................................................................................123

Cássio Arruda Boechat .................................................................................................139

Elias Mendes Oliveira ...................................................................................................160

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Apresentação

A realização do III CIMDEPE busca propiciar a continuidade do debate

acerca da relação entre o desenvolvimento econômico e os novos/velhos

problemas da urbanização mundial. O processo da urbanização tem

demonstrado novas nuances que atribuem novos papéis às cidades médias

em todo o mundo, de tal maneira, que elas passaram a apresentar, por um

lado, novos problemas urbanos e, por outro, novas perspectivas de

desenvolvimento econômico, por meio de investimentos de grandes

empresas (indústrias, redes e franquias comerciais e de serviços) que

ampliam suas escalas de ação via cidades médias, como nós de articulação

da nova economia mundial.

Histórico

O I CIMDEPE teve como tema central – “Cidades Médias: Dinâmica

econômica e produção do espaço urbano”, o que explica a sigla que lhe

nomeia. Ocorreu em Presidente Prudente, na Universidade Estadual

Paulista (UNESP), entre 6 e 9 de junho de 2005. O segundo evento desta

série – II CIMDEPE – teve lugar em Uberlândia, de 6 a 9 de novembro de

2006, na Universidade Federal de Uberlândia.

Desde então a Rede de Pesquisadores sobre Cidades Médias (ReCiMe),

responsável pela organização destes encontros científicos, priorizou a

apresentação de trabalhos sobre este tema em diversos outros congressos,

simpósios e encontros, propondo, somente agora, em 2015, a realização do

III CIMDEPE.

O III CIMDEPE

A realização do III CIMDEPE busca propiciar a continuidade do debate

acerca da relação entre o desenvolvimento econômico e os novos/velhos

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problemas da urbanização mundial. O processo da urbanização tem

demonstrado novas nuances que atribuem novos papéis às cidades médias

em todo o mundo, de tal maneira, que elas passaram a apresentar, por um

lado, novos problemas urbanos e, por outro, novas perspectivas de

desenvolvimento econômico, por meio de investimentos de grandes

empresas (indústrias, redes e franquias comerciais e de serviços) que

ampliam suas escalas de ação via cidades médias, como nós de articulação

da nova economia mundial.

Assim, as novas estratégias do desenvolvimento econômico passaram a

incluir estas cidades como alternativas locacionais às escolhas anteriores que

recaíam de modo quase exclusivo sobre as metrópoles, ampliando os limites

geográficos da expansão capitalista, o que cria oportunidades de acesso ao

consumo e à desconcentração de atividades econômicas, mas também,

produz novos problemas urbanos, o que coloca como premente o debate

sobre uma urbanização não planejada e o rompimento dos mitos da

qualidade de vidas em cidades médias, tidas como “redutos de classe

média”, pois se constatam processos de favelização, segregação espacial,

degradação de áreas centrais, congestionamentos, elevação dos preços

imobiliários e consequente expulsão de populações mais pobres.

Os seis eixos principais

Nesta perspectiva, convidamos a comunidade acadêmica para participar dos

debates que incluirão seis eixos principais, com os seguintes coordenadores:

Rede urbana – história, tendências e perspectivas

Jan Bitoun (UFPE), Doralice Sátiyro Maia (UFPB), Beatriz Ribeiro Soares

(UFU), Marcio Catelan (UNESP), Carmen Bellet (Universitat de

Lleida/Espanha).

A discussão sobre a constituição da rede urbana brasileira encontra-se desde

os estudos clássicos da Geografia Urbana. De rede de cidades à rede urbana,

a interligação entre centralidades (cidades de diversos tamanhos, vilas e

aglomerados rurais) vai se dando desde os caminhos de passagem, caminhos

de gado, ferrovias, percursos fluviais e marítimos, rodovias, e linhas aéreas.

Desta forma, as transformações da rede urbana brasileira são representativas

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do aumento da complexidade da divisão técnica e territorial do trabalho no

campo, nas florestas e nas cidades e das permanências presentes na trama de

relações entre os centros urbanos e outras centralidades. O espaço, cada vez

mais fruto do movimento relacional entre instituições e agentes que atuam

em múltiplas escalas, é melhor compreendido a partir desta relação – a

coexistência entre as permanências e as transformações contemporâneas.

Nesta relação é que se observa a (re) definição dos papéis e das funções das

cidades na rede urbana. Esta (re) definição de papéis e de funções ganha

relevância nos estudos urbanos sob as perspectivas elaboradas a partir dos

centros urbanos, que por um conjunto de variáveis e metodologias

convenciona-se chamá-los como cidades médias. Embora estas cidades não

componham os níveis mais elevados da hierarquia urbana, ganham

importância por exercerem papel cada vez mais importante tanto no que diz

respeito à mediação entre campo e cidade; cidades locais e/ou cidades

pequenas e metrópoles, etc., bem como porque participam da reprodução

do capital e das condições materiais de reprodução da vida conforme são

inseridas no âmbito das lógicas da globalização, reunindo lógicas de

diferentes escalas, e articulando-as no processo de consolidação de sua

centralidade, primeiro regional, e em outros momentos para além desta

escala. Neste jogo de escala entende-se um contexto analítico para o debate

da reconfiguração da rede urbana que adquiriu conteúdos particulares em

sua relação com as cidades médias.

Reestruturação produtiva, indústria e cidades médias

Eliseu Sposito (UNESP), Cleverson Reolon (UNESP), Diana Lan

(UCPBUA/Argentina)

As mudanças nas formas de organização da produção industrial, no

momento de um regime de acumulação chamado flexível, tem importância

não apenas em termos gerais, mas rebatimento importante sobre as cidades

médias e seu papel na rede urbana. A maneira como as empresas se

organizam (em redes, principalmente), como suas atividades se articulam em

diferentes escalas, como tomam decisões e definem padrões de localização e

ações que visam ampliar sua competitividade em nível global, são alguns dos

aspectos que iremos estudar nesta seção do Workshop.

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Dinâmicas e lógicas do comércio e dos serviços em cidades médias

Maria Encarnação Sposito (UNESP), William Ribeiro (UFRJ), Arthur

Withacker (UNESP)

O setor de atividades comerciais e de serviços passou por significativo

processo de crescimento nas três últimas décadas, em decorrência, inclusive,

das dinâmicas relativas à reestruturação produtiva, o que significou maiores

articulações com a produção agropecuária e industrial. Tal crescimento foi

acompanhado de significativa concentração econômica das empresas,

alcançando a escala internacional. Este processo redundou em enorme

expansão espacial das redes comerciais e de serviços, com destaque para

alguns ramos, como: o de super e hipermercados, o bancário e o de

eletrodomésticos.

Paralelamente e como parte do mesmo conjunto de mudanças, capitais de

diferentes escalas, do internacional ao local, passaram a operar no setor

comercial e de serviços, de modo associado, por meio do sistema de

franquias, o que também teve como resultado enorme expansão espacial de

produtos, serviços e, sobretudo, marcas que se difundiram por diferentes

países.

Tais dinâmicas trouxeram rebatimentos diretos sobre a organização das

redes urbanas, em função da redefinição na divisão interurbana e regional

do trabalho e também dos processos e formas de produção das cidades.

Se, no período anterior, os grandes capitais do setor terciário atuavam

predominantemente nas metrópoles e grandes cidades, a concentração

econômica e difusão espacial das redes promoveu uma procura por outros

estratos das redes urbanas, o que ampliou os mercados consumidores.

Todos estes movimentos podem ser analisados por meio de novas relações

entre processos, conteúdos e formas urbanas. O estudo de centralidade em

suas múltiplas escalas impõe-se, então, como um desafio.

Tendo em vista este quadro geral, que particularidades podem ser notadas

nas cidades médias quando analisamos as mudanças do setor comercial e de

serviços? De que modo se estruturam seus espaços e se redefinem suas

centralidades face às transformações recentes? Em que medida as novas

estruturas espaciais refletem velhas e/ou novas formas de segmentação

socioespacial? A situação geográfica das cidades médias é fator importante

nas escolhas espaciais das empresas? O aumento das possibilidades de

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transportes e comunicações reforça interações espaciais e isso tem

consequências para estas cidades? Como se articulam produção, circulação e

consumo nas redes urbanas sob os novos arranjos espaciais?

Agronegócio e urbanização

Denise Elias (UECE), Gláucio Marafon (UERJ), Mirlei Fachini Vicente

Pereira (UFU)

O GT objetiva aprofundar os debates sobre os processos e formas inerentes

à urbanização da sociedade e do território oriundos da difusão da agricultura

capitalista globalizada no Brasil e no mundo, no âmbito das discussões

teóricas e metodológicas. Serão aceitos trabalhos que versem sobre os

seguintes temas: as novas relações entre o agronegócio, as cidades e a

reestruturação regional; a especialização funcional das cidades inerente à

difusão do agronegócio; o crescimento do terciário (comércio e serviços)

alicerçado no consumo produtivo agrícola; incremento da urbanização, das

relações interurbanas e novas regionalizações considerando a organização

das redes agroindustriais; as novas relações campo-cidade resultantes dos

fluxos de capital, mão de obra, mercadorias, informação, tecnologia etc.

inerentes às diferentes atividades industriais, agrícolas, comerciais e de

serviços que integram as redes agroindustriais; urbanização corporativa

associada ao agronegócio e às redes agroindustriais; reestruturação do centro

e formação de novas centralidades nas ‘cidades do agronegócio’;

aprofundamento das desigualdades socioespaciais nas ‘cidades do

agronegócio’.

Desigualdades socioespaciais. Produção de moradia, dinâmica imobiliária e

segregação residencial

Renato Pequeno (UFCE), Everaldo Melazzo (UNESP), Maria José Martineli

Calixto (UFGD)

Esta sessão de trabalho dedica-se a analisar os processos gerais, os

particulares e os singulares das cidades médias considerando os diferentes

agentes da produção da habitação e suas articulações com a política urbana:

Estado, mercado imobiliário, movimentos sociais, dentre outros. A dinâmica

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imobiliária e a produção da moradia são dois eixos analíticos que se

complementam e que devem ser tomados em suas dimensões espaciais e

que remetem a permanente produção e reprodução de desigualdades

socioespaciais.

Políticas públicas, governança e desenvolvimento regional – políticas

públicas / escalas local e regional

Paulo Gusmão (UFRJ), Saint-Clair Trindade (UFPA), Carlos Brandão

(UFRJ)

O eixo temático volta-se para a discussão das cidades médias, relacionando o

atual perfil e dinamismo das mesmas às políticas públicas implementadas

pelos diversos níveis de governo – federal, estadual e municipal. Busca-se,

dessa forma, enfatizar a dimensão política dessas cidades, considerando o

papel das mesmas para o desenvolvimento regional, assim como

problematizar elementos relacionados às diversas formas e experiências de

governança no contexto geográfico imediato no qual se inserem.

OBS: Devido à falta de trabalhos, o EIXO IV - Agronegócio e urbanização,

foi condensado ao EIXO III - Dinâmicas e lógicas do comércio e dos

serviços em cidades médias.

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Eixo II: Reestruturação produtiva, indústria e cidades médias.

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A INFLUÊNCIA DA UTILIZAÇÃO DE UM AEROPORTO NA

LOGÍSTICA INDUSTRIAL: A PROPOSTA PARA VARGINHA/MG

Helen Ribeiro Rodrigues1

Teresa Cristina de A. Faria2*

Resumo

Este artigo tem como objetivo apresentar os resultados do estudo desenvolvido, para

elaboração de uma proposta de ampliação e adequação do aeroporto Major Brigadeiro

Trompowsky, localizado no município de Varginha/MG, desenvolvido no âmbito do

Trabalho Final de Graduação, do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade

Federal de Viçosa, MG. O objetivo da proposta visa aperfeiçoar a logística das

indústrias da cidade de Varginha e região, através da utilização do aeroporto. Dessa

forma, pretende-se transformá-lo em aeroporto cargueiro e utilizá-lo como meio de

transporte de matéria prima e escoamento da produção industrial e agrícola regional.

1 Arquiteta e Urbanista graduada pela Universidade Federal de Viçosa. E-mail: [email protected]

2 Professora doutora do curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Viçosa. E-mail:

[email protected];

*A autora não apresentou o trabalho e não participou do evento.

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Palavras-chave: Aeroporto-cidade. Logística de carga. Desenvolvimento regional.

1. INRODUÇÃO

A Mesorregião Sul/Sudoeste de Minas Gerais é a segunda em importância

econômica no Estado, sendo um dos principais fatores do seu desenvolvimento, a

duplicação da Rodovia Fernão Dias, que liga São Paulo à Belo Horizonte e corta 33

cidades ao longo do seu traçado. Além disso, a região tornou-se uma importante área de

progresso devido a sua localização privilegiada – é uma área central entre Rio de

Janeiro, São Paulo e o resto do Estado de Minas Gerais.

A Rodovia Fernão Dias tem uma importância fundamental na região, pois faz

parte do mais relevante eixo rodoviário nacional, aliado à BR-116, interligando os três

principais estados do Brasil e da região Sudeste, transformando-se em um corredor de

transporte tanto para o mercado interno como para a exportação. Com isso, empresas de

grande porte e de vários setores consideram este quesito como um grande atrativo à

instalação de unidades na região, como é o caso da Philips-Walita e da Standard (do

setor de autopeças) localizadas em Varginha; Danone, Alcoa, e Ferrero Rocher, em

Poços de Caldas; Helibrás e Mahle, em Itajubá; Metagal, em Santa Rita do Sapucaí; e

Renolds Latasa, Unilever Bestfoods do Brasil e Refinações de Milho Brasil, em Pouso

Alegre.

Dentro da área estudada, Varginha, que é o foco do estudo em questão e ponto

de intervenção da proposta, possui como características uma população de

aproximadamente 120 mil habitantes, atividades econômicas voltadas para o setor

industrial e de prestação de serviços além da produção agrícola - principalmente

cafeeira. Para o crescimento da cidade, alguns fatores contribuem, como a duplicação da

Fernão Dias, o porto seco Sul de Minas, a mão-de-obra qualificada e o aeroporto.

O aeroporto de Varginha, nomeado Major Brigadeiro Trompowsky, foi

construído em 1948 e preparado para prestar informações eficientes à navegação aérea.

Em 1959 houve a construção do terminal de passageiros, que foi reformado em 1987. A

partir de 1984, com o balizamento do aeroporto (iluminação noturna), a cidade passou

também a servir de ponto de convergência e vértice do tráfego aéreo. Em 2012 houve a

construção de outro terminal de passageiros em uma área diferente do aeroporto, que

atende de forma limitada às necessidades da demanda. Situado a 5 km do centro da

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cidade na direção sudoeste, o sítio aeroportuário tem como acesso principal a Rodovia

BR-491 que liga Varginha ao município de Elói Mendes e localiza-se a 925 m de

altitude, em posição estratégica, operando no cruzamento das rotas Rio - Brasília e Belo

Horizonte - São Paulo. Sua pista asfaltada possui 2.100 metros de extensão por 30

metros de largura, e nela é possível a operação de aviões do porte Fokker-100, com

capacidade para 122 passageiros. No entanto, o governo tem projetos para obras de

melhorias.

Para o entendimento da problemática foram realizadas consultas aos órgãos

públicos e de planejamento, como a Prefeitura de Varginha e as prefeituras dos

municípios de onde se estima virem as principais demandas de operação, além de

empresas como a Autopista que administra a Rodovia Fernão Dias e indústrias da

região, buscando entender suas demandas de transportes. Além disso, também foram

feitas consultas às indústrias da região e a realização de entrevistas com o setor

responsável pela logística, buscando entender suas demandas logísticas.

2. CONTEXTO: O AEROPORTO E REGIÃO

A alta concentração de indústrias no Sul e Sudoeste de Minas Gerais, demanda

estratégias de planejamento que visem a otimização da logística de transporte na região.

No nosso caso, as indústrias possuem como única alternativa para o escoamento da sua

produção o transporte rodoviário através da Rodovia Fernão Dias, que se encontra com

sua capacidade saturada. Em 2008, o tráfego diário na rodovia Fernão Dias aumentou

vertiginosamente para cerca de 200 mil veículos, sendo 45% veículos comerciais, 55%

veículos de passeio (Autopista Fernão Dias). Além disso, 25% da população mineira

vivem e trabalham em sua área de influência (ALMEIDA, 2004).

Outra situação problemática encontrada é a subutilização do Aeroporto de

Varginha, pois atualmente não há uma companhia aérea atuando no aeroporto e fazendo

voos regulares para passageiros (a última companhia rescindiu o contrato e atuou até o

dia 20 de março deste ano) e se trata de um local privilegiado geograficamente em

relação às maiores capitais do Brasil.

De acordo com o que foi apresentado anteriormente, a subutilização do

aeroporto de Varginha e a saturação da rodovia Fernão Dias são um empecilho para o

desenvolvimento regional, uma vez que a adequação do aeroporto para aeroporto

cargueiro proporcionaria uma conectividade entre a Rodovia Fernão Dias, o aeroporto e

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os demais centros de distribuição, favorecendo assim, a logística das indústrias

regionais, as potencialidades de desenvolvimento do município de Varginha e da região.

Diante do contexto apresentado anteriormente, coloca-se a seguinte questão: de

que forma o desenvolvimento do aeroporto de Varginha poderá influenciar na logística

industrial da região de Varginha e na conectividade entre o município e o restante do

país, contribuindo para o desenvolvimento regional?

De acordo com a problemática exposta, a reestruturação do Aeroporto de

Varginha para aeroporto de cargas poderá contribuir para o desenvolvimento da região,

sendo uma das alternativas para tentar solucionar o fluxo de veículos comerciais na

Rodovia Fernão Dias, a melhor utilização do aeroporto citado e a geração de empregos

e atrativos para futuras instalações industriais na Mesorregião do Sudoeste/Sul de Minas

Gerais, pois o transporte aéreo é uma opção mais rápida e segura para a movimentação

de cargas, resultando em uma logística mais eficiente.

Varginha possui muitas características que tornam favorável a ampliação e

adequação do Aeroporto Major Brigadeiro Trompowsky para aeroporto cargueiro.

Dentre elas podemos citar:

A equidistância entre Varginha e as seguintes capitais: São Paulo (316 Km),

Belo Horizonte (313 Km) e Rio de Janeiro (390 Km) o que favorece a logística

industrial, podendo atrair futuros investimentos para a economia da região.

O Município possui um Porto Seco, um importante centro de importação e

exportação de produtos (matérias primas e máquinas) para as indústrias situadas

na região.

O entorno de Varginha dispõe de grandes indústrias localizadas em um raio de

100 km de distância, e a cidade possui um condomínio industrial tecnológico

próximo ao Aeroporto de Varginha. Este apresenta uma área de 1.300.000m² e é

um espaço complementar ao Porto Seco Sul de Minas.

A Rodovia Fernão Dias é um importante eixo de distribuição de produtos e

equipamentos no eixo São Paulo - Belo Horizonte. Com a duplicação da

rodovia, a instalação de indústrias na região e o aumento da produção de

mercadorias, houve um aumento considerável de caminhões que realizam o

transporte de produtos neste eixo de circulação.

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3. NOVAS PERSPECTIVAS DE DESENVOLVIMENTO URBANO E

REGIONAL

Perante o novo cenário da sociedade pós-industrial, compreende-se que o

desenvolvimento regional não é somente a instalação de indústrias em determinado

local, mas também o importante papel das inovações tecnológicas produzido pela

agregação de valor aos produtos e serviços (VASCONCELOS, 2007).

De acordo com Vasconcelos (2007), o mundo vive uma nova realidade

produtiva e tecnológica que inclui novos fatores de concorrência e determina novas

condições de localização das atividades de produção. Consequentemente, esta realidade

afetou o pensamento dos indivíduos responsáveis pela formulação de políticas de

desenvolvimento regional no Brasil.

Sendo assim,

“A abordagem recente do planejamento regional brasileiro considera

que os projetos devem ser aplicados considerando-se os “eixos de

desenvolvimento”, ou seja, as regiões de atuação estão contidas em

fronteiras que não mais obedecem aos limites dos estados ou das cinco

macrorregiões definidas pelo IBGE. Atendem agora aos critérios de

semelhança das potências e dos indicadores socioeconômicos, gerando

uma divisão regional diversa daquela até então estabelecida.” (DINIZ,

1995 apud Vasconcelos, 2007, p. 27)

No âmbito da infraestrutura de acesso a estes locais, os investimentos em

transporte e a diversificação dos modais são válidos, uma vez que a melhoria do

transporte poderá gerar um crescimento da região e o desenvolvimento dos municípios

ao seu entorno.

Neste sentido, o aeroporto como integrante da infraestrutura em transporte

(modal rápido e disperso geograficamente por todo o território), é ideal como parceiro

das aglomerações industriais. O mesmo pode estimular o crescimento da região

oferecendo serviços diferenciados, como é o caso do aeroporto-cidade e ainda suprir as

carências de infraestrutura técnica e física da região na qual está inserido.

Segundo Vasconcelos (2007), o termo aeroporto-cidade resume o novo perfil

aeroportuário do século XXI. O aeroporto é administrado como um negócio com o

intuito de desenvolver socioeconomicamente a região na qual está inserido. Ao redor do

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aeroporto em si são construídos hotéis, shopping centers, parques industriais e

tecnológicos, centros de convenções, entre outras edificações, unindo, as atribuições de

um terminal aeroportuário com as características de shopping center, com comércio

diversificado, restaurantes, áreas de lazer, além de serviços de logística de carga aérea.

De acordo com Kasarda (2006), o conceito de aeroporto-cidade nasceu devido a

três fenômenos relacionados ao crescimento dos aeroportos e do tráfego aéreo, sendo

eles: a obtenção de lucros maiores, referentes a atividades não aeroportuárias; o

desenvolvimento de uma marca, atraindo investimentos não ligados à atividade

aeroportuária; e o desenvolvimento comercial dentro e nos arredores desses aeroportos

gerando crescimento urbano.

Segundo MARQUES (2002 apud. CAPPA, 2013), para compreender as relações

contemporâneas entre cidades e aeroportos e pensar políticas públicas de gestões

aeroportuárias, é necessário aplicar os conceitos de aeroporto-cidade e centros de

negócios e serviços. Sendo estas relações formadas pela demanda de:

1. Ampliação e modernização dos terminais aeroportuários;

2. Planejamento urbanístico do entorno dos aeroportos;

3. Estarem integrados à dinâmica urbana e econômica das cidades em

que estão localizadas por meio de sistema multimodal de transportes;

4. Suas participações nos processos de desenvolvimento das cidades,

regiões e países; e por último,

5. Amenizar impactos ambientais.

De acordo com CAPPA (2013), o aeroporto-cidade

“...caracteriza-se ainda pela importância que os aeroportos exercem

nas áreas do seu entorno, pois centros de negócios são formados

devido à presença do aeroporto e às atividades econômicas que tem

relações, diretas ou indiretas, com o transporte aéreo, além de serviços

aeroportuários como apoio logístico à produção de mercadorias,

aeroporto industrial, comércio e serviços diversificados que são

importantes na geração de empregos, rendas e tributos tanto para o

município onde se localiza o aeroporto, quanto para as cidades

localizadas no seu entorno.” (CAPPA, 2013, p. 32)

Güller e Güller (2002) afirmam que a acessibilidade do aeroporto também

resulta em atratividade para outras atividades não diretamente relacionadas com o

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19

aeroporto. Para estes autores, a exploração do transporte aéreo de mercadorias é

especialmente atrativa se existe a oportunidade de combiná-lo com o transporte

marítimo ou com centros de distribuição e terminais de logística já existentes,

transformando as áreas ao entorno do aeroporto em áreas estratégicas para

empreendimentos.

3.1 O AEROPORTO NO DESENVOLVIMENTO REGIONAL

Em países com ampla dimensão territorial, como o Brasil, o transporte aéreo

possui grande importância devido ao fato de ser o único modal com a capacidade de

interligar pontos territoriais distantes em um único dia.

Além disso, os aeroportos interferem de outras maneiras no desenvolvimento

econômico da região na qual estão instalados, ou seja, nas suas áreas de influência.

Vasconcelos (2007) afirma que existem dois tipos de impactos econômicos, são eles:

Impactos diretos: renda, emprego, investimento de capital, receitas de taxas

geradas pela relevante atividade econômica aeroportuária;

Impactos indiretos: desenvolvimento do turismo (negócios e lazer),

investimentos em armazéns, filiais de empresas de grande porte, melhorias na

estética e estrutura da cidade, ou seja, elementos que o autor define como

infraestrutura remota.

Os aeroportos, além da função de elos de conexão e integração global, são

elementos marcantes na infraestrutura de uma cidade devido à dimensão de suas

instalações e à demanda de serviços e infraestrutura urbana do local de sua implantação.

Com isso, os mesmos tendem a orientar os vetores de crescimento urbano ou consolidar

as tendências existentes, como é o caso do aeroporto-cidade.

3.2. LOGÍSTICA DE CARGA AÉREA

O termo logística, de acordo com o Novo Dicionário da Língua Portuguesa, vem

do francês logistique e tem como uma de suas definições "a parte da arte da guerra que

trata do planejamento e da realização de: projeto e desenvolvimento, obtenção,

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20

armazenamento, transporte, distribuição, reparação, manutenção e evacuação de

material para fins operativos ou administrativos“.

Segundo a entidade americana Council of Logistic Management3,

Logística é o processo de planejar, implementar e controlar

eficientemente, ao custo correto, o fluxo e a armazenagem de matérias

primas, estoque durante a produção e produtos acabados, e as

informações relativas a estas atividades, desde o ponto de origem até o

ponto de consumo, visando atender aos requisitos do cliente.

(Tradução nossa)

De acordo com Ballou (1993) os fatores decisivos na escolha do modal de

transporte objetivando um processo logístico eficiente são os seguintes: custo do

serviço, tempo médio de entrega, tempo de trânsito, perdas e danos. O modal aéreo não

possui custos baixos quando comparados aos demais modais, no entanto, o mesmo

resulta em menores gastos com embalagens de proteção, o tempo de entrega e trânsito é

bem inferior e a possibilidade de perdas e danos também é menor. Além disso, o

transporte de carga aérea possibilita a diminuição dos estoques de mercadorias nas

empresas ou centros de distribuição, maior competitividade no mercado devido à

garantia de entrega rápida e a racionalização das trocas comerciais através do conceito

just-in-time4.

A importância do transporte aéreo e da logística de carga aérea no

desenvolvimento regional surgem a partir do crescimento da economia globalizada

através da qual as empresas vão aumentando consideravelmente suas ações no comércio

exterior, ou seja, se ramificam em diversas partes do mundo tornando o transporte

3 O Comitê Executivo da entidade americana Council of Logistic Management (Conselho da Gestão

Logística – CLM) votou favoravelmente para tornar-se Conselho de Profissionais de Gestão da Cadeia de

Suprimentos (CSCMP). A votação foi realizada em 1 º de janeiro de 2005. Disponível em:

<http://mhlnews.com/global-supply-chain/council-logistics-management-become-council-supply-chain-

management-professional> Acesso em: 06 mai. 2014.

4 Também denominado Sistema de Produção Toyota, é traduzido como “produção apenas-a-tempo”,

consiste em um sistema de controle de estoques no qual as partes e componentes são produzidas e

entregues nas diferentes seções, um pouco antes de serem utilizadas. A definição mais sintética deste

sistema seria “a peça certa, no lugar certo, no momento certo.” (DICIONÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO

E FINANÇAS, 1996, p. 257)

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marítimo ou aéreo as únicas formas de fornecimento e distribuição de seus produtos,

sendo o transporte aéreo o meio mais rápido.

O transporte aéreo de cargas é basicamente multimodal uma vez que em poucas

situações a movimentação cargueira inicia ou termina no aeroporto. O autor afirma que

“a cadeia logística é uma teia cuidadosamente ajustada, integrada e que se apoia em

uma estrutura aérea e terrestre sem a qual a eficiência origem-destino seria totalmente

comprometida.” (RAVEN, 2002 apud KAUFMANN, 2009, p. 60)

Produtos e peças frágeis, de baixo peso e volume, mas de alto valor agregado,

como os produtos eletrônicos, e mercadorias com data de entrega rígida ou com caráter

de urgência, como documentos, produtos perecíveis e amostras encontram no transporte

aéreo o seu principal modal de transporte. Entretanto, o transporte aéreo de cargas pode

envolver todo tipo de produto. (TRINDADE, 20--?)

No Brasil, a Infraero (Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária)

controla a atividade logística cargueira dos aeroportos administrados pela empresa.

Dentre os cinco aeroportos concessionados atualmente (Campinas, Guarulhos, Brasília,

Confins e Galeão) apenas os três primeiros estão sob o controle das próprias

concessionárias e os aeroportos Galeão e Confins permanecem sob a administração da

Infraero até o mês de agosto deste ano. A atividade logística aérea é realizada em 31

terminais de logística de carga conhecidos como rede TECA que estão distribuídos por

todo o território, constituindo uma das parcelas mais relevantes da exploração comercial

e industrial dos aeroportos. Dentre estes terminais, 27 operam com importação, 23 com

exportação, 14 com carga nacional, e dois com Courier5. (INFRAERO)

O desenvolvimento do transporte aéreo de cargas no Brasil possui condições

bastante favoráveis (Labegalini; Dias; Martins, 2008). De acordo com Théry (2003

apud Labegalini et al, 2008), a dimensão do território brasileiro e a estrutura do

povoamento em “arquipélago” resultam em uma demanda de deslocamentos de grandes

5 Documentos ou encomendas internacionais transportadas por via aérea, por empresa de Transporte

Expresso Internacional, “porta a porta”. Para que a carga tenha essa denominação, diversos critérios

deverão ser cumpridos, como por exemplo, não ter destinação comercial, o valor não ser superior ao

permitido pela legislação específica (Instrução Normativa RFB nº 1.073, de 1º de outubro de 2010, que

disciplina o despacho aduaneiro de importação e de exportação de Remessas Expressas), não ser bebidas

alcoólicas, entre outros. (INFRAERO)

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distâncias, que encontram no avião a maneira mais eficiente para transportar cargas,

administrar o tráfego de negócios e também de pessoas.

Kasarda (1998) afirma que a capacidade das indústrias do Brasil para responder

aos concorrentes globais dependerá cada vez mais não só de mudanças operacionais

internas, mas também da criação da infraestrutura externa, que faz com que novas

práticas de cadeia de suprimento globais se tornem possíveis. É cada vez mais claro que

essas novas práticas de cadeia de suprimentos vão exigir o desenvolvimento de novas

infraestruturas logísticas que reúnem tecnologia da informação e sistemas de transporte

multimodal para facilitar a entrega rápida e eficiente de materiais e bens dos

fornecedores aos fabricantes e dos fabricantes aos clientes. Para o autor, estamos na era

da instantaneidade e a regra fundamental dos negócios imobiliários deixou de ser

localização para se tornar acessibilidade. “Existe atualmente uma nova forma de

medição: não se trata mais de ‘espaço’, mas de ‘tempo’ e ‘custo’” (KASARDA, 2012).

4. CARACTERIZAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO

4.1. A CIDADE DE VARGINHA

O município de Varginha, situado na região sul do estado de Minas Gerais,

possui uma área de 396 km², é a terceira mais populosa do Sul de Minas com mais de

123 mil habitantes e seu IDH é 0,778 (IBGE, 2010).

A cidade destaca-se por ser um dos principais centros de comércio e produção de

café do Brasil e do mundo, e ser polo de exportação de café, escoando a maior parte da

produção do Sul de Minas Gerais e comercializando o produto com diversos países.

Varginha conta com localização privilegiada e estratégica, situada às margens do

Lago de Furnas e equidistante das três principais capitais do Brasil: São Paulo, Rio de

Janeiro e Belo Horizonte, além de ser próxima de cidades importantes como Campinas,

Ribeirão Preto e região do Vale do Paraíba.

De acordo com o IBGE, o município de Varginha possui o segundo maior PIB

da Região do Sul de Minas e um dos maiores do estado de Minas Gerais. O setor

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terciário ocupa 53,2% do total da população economicamente ativa, o setor secundário

ocupa 34,3% e o setor primário apenas 12,5%.

Encontram-se instaladas em Varginha empresas de grande porte como Philips-

Walita, Philips Lighting, CooperStander, Coletek, Plascar, dentre outras, resultando em

um total de 5.271 empresas atuantes na cidade.

Além disso, o município possui o Porto Seco Sul de Minas, que consiste em uma

estação aduaneira do interior (EADI). Na cidade, existem diversas empresas que atuam

na área de comércio exterior, e que trabalham diretamente com serviços de importação e

exportação, fator que influenciou grandes empresas multinacionais a montarem

unidades na cidade e região.

Recentemente foi construído em Varginha o CIT - Condomínio Industrial

Tecnológico, um parque tecnológico de propriedade do Porto Seco que tem como

propósito abrigar empresas de alta tecnologia e centros de distribuição, tendo dentro da

área serviços aduaneiros, transporte aéreo e terrestre, escritórios administrativos e

incentivos fiscais. O mesmo situa-se ao lado do aeroporto da cidade e conta com uma

área de aproximadamente 1.300.000m².

4.2. ASPECTOS DO SETOR INDUSTRIAL

O setor industrial desta região tornou-se importante devido aos vários fatores

apresentados anteriormente, principalmente pela acessibilidade e localização

estratégica. Os mesmos geram a atração de empresas que visam à proximidade com os

Mapa 1 - Microrregiões da Mesorregião Sul/Sudoeste de Minas. Em destaque as

microrregiões analisadas neste estudo. Fonte: Acervo pessoal.

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Tabela 1 - Número de empresas e empregados por porte

2012

grandes centros além de questões logísticas e de mão de obra qualificada devido à

presença de instituições como SENAI, SEBRAE, CEFET e centros de ensino superior.

Segundo a FIEMG, em 2013 a mesorregião Sul/Sudoeste de MG gerou cerca de

R$1.129.538,70 de ICMS6 além de U$S 3.163.997.000 em exportações e U$S

2.456.529.000 em importações.

Ainda de acordo com a FIEMG, a mesorregião possui a seguinte quantidade de

empresas:

Nos meses de abril e maio deste ano, algumas das empresas localizadas na área

de estudo foram entrevistadas para mensurar as suas demandas logísticas, a qualidade

dos transportes rodoviários - a única forma de escoamento da produção e de transporte

de matéria prima presente na região - e a utilização de um aeroporto cargueiro como

forma de transporte de matéria prima e mercadorias produzidas pelas empresas

entrevistadas.

Como resultado da entrevista, percebe-se que o modal utilizado encontra-se

saturado e os custos tais como diária de motorista, abastecimento, pedágios e o desgaste

e manutenção dos veículos geram gastos que se analisados em relação aos benefícios do

transporte aéreo como tempo, segurança e menores gastos com embalagens, os mesmo

se tornam mais lucrativos.

6 Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de

transporte interestadual, intermunicipal e de comunicação. Este imposto é de competência dos Estados e

do Distrito Federal. Disponível em: <http://www.portaltributario.com.br/tributos/icms.html>. Acesso em:

17 jun. 2014.

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“No caso do avião há praticamente apenas um custo quando a carga foi

preparada com as documentações e embalagens corretas (KEEDI, 2004).

Outra questão logística a ser considerada é a proximidade do aeroporto a

fábrica, pois eles normalmente se situam em grandes centros urbanos e

também em partes interiores do país, tendo um custo rodoviário menor. Os

custos de embalagem também são menores por conta de uma menor

manipulação e chegada mais rápida ao destino”. (MONTILHA, 2007, p. 84)

Dente as empresas entrevistadas, apenas uma delas possui frota própria de

veículos para o transporte e não tem interesse em utilizar um aeroporto cargueiro como

modal alternativo.

4.3. A RODOVIA FERNÃO DIAS E SUAS CONEXÕES

“Inaugurada em 1960 pelo então Presidente Juscelino Kubitschek

(1902/1976), a rodovia Fernão Dias tornou-se, rapidamente, não só

um importante eixo rodoviário nacional, mas também a coluna

vertebral do desenvolvimento de toda uma região que, após a sua

construção, passou a ter um acesso direto tanto ao maior e mais

importante centro produtor e consumidor do país - São Paulo - quanto

à capital do Estado, Belo Horizonte. Ao mesmo tempo, esta rodovia

passou a ser o vetor estruturante de uma região que até então não

existia.” (ARANTES, 2001, p. 200)

Em 2007, a Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) realizou um

leilão para iniciar o processo de concessão da estrada. A partir de então, a Autopista

Fernão Dias do grupo Arteris é a responsável pelos 562,1km que ligam as cidades de

Contagem/MG e Guarulhos/SP. A validade desta concessão é de 25 anos.

A Rodovia Fernão Dias corta 33 cidades ao longo do trecho e tem um

importante papel na rede rodoviária brasileira. Ela integra um dos principais corredores

de ligação entre importantes polos econômicos das regiões Sudeste e Sul do Brasil além

dos países do MERCOSUL. A rodovia faz parte do mais relevante eixo rodoviário

nacional, junto da BR-116, interligando os três maiores estados da federação - Minas

Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo - formando um corredor de transporte para abastecer

tanto o mercado interno como para exportação.

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26

Imagem 1: Localização do Aeroporto de Varginha, pontos relevantes

para o estudo e implantação atual do sítio aeroportuário.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Google Earth.

De acordo com a concessionária Autopista, em 2011, o tráfego foi composto por

38% de veículos comerciais, 57% de veículos de passeio e 5% de motocicletas.

4.4 O AEROPORTO DE VARGINHA

O aeroporto Major Brigadeiro Trompowsky, situado em Varginha, foi

construído no governo Getúlio Vargas e preparado para prestar informações eficientes a

navegação aérea em 1948. Suas instalações foram melhoradas em 1959 com a

construção do terminal de passageiros que foi reformulado em 1987. Em 2012 foi

construído outro terminal de passageiros em uma área diferente do aeroporto.

O sítio aeroportuário possui 571.000m² de área documentada mais 229m² de área

a ser desapropriada em virtude da ampliação do aeroporto. Situa-se a 5 km do centro da

cidade na direção sudoeste, tendo como acesso principal a Rodovia BR-491 que liga

Varginha-Elói Mendes.

5. RESULTADOS E ANÁLISES

Figura 3 – Localização do Aeroporto

de Varginha e pontos relevantes para o

estudo. Fonte: Elaboração própria a

partir de dados do Google Earth.

Figura 2 – Localização do Aeroporto

de Varginha e pontos relevantes para o

estudo. Fonte: Elaboração própria a

partir de dados do Google Earth.

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“O transporte aéreo no Brasil, doméstico e internacional, cria

benefícios econômicos distintos e seus efeitos são medidos pela sua

contribuição ao PIB, empregos e receitas de impostos geradas pelo

setor e a sua cadeia de suprimentos.” (CAPPA, 2013, p. 10)

No caso do Aeroporto de Varginha, através da recente instalação do Condomínio

Industrial Tecnológico (CIT) próximo ao sítio aeroportuário, da construção da cidade

universitária do UNIS e da locação de grandes empresas relacionadas com o setor

agrícola, principalmente cafeeiro, nota-se que há a intenção de ocupar as áreas próximas

ao aeroporto com atividades voltadas para o setor de logística das indústrias e do setor

agrícola da região. Além disso, existe a conexão com um polo de ensino, configurando

assim, o aeroporto como indutor do desenvolvimento da região e criando base para a

implantação do conceito de aeroporto-cidade.

Acredita-se que as crescentes atividades relacionadas ao aeroporto em questão

promoverão o aumento da geração de empregos e renda, da captação de impostos e da

circulação de capital no Município de Varginha e também na região além de se tornar

um grande atrativo para futuras instalações industriais no local. Segundo o diretor do

Aeroporto de Varginha, Rogério Evaristo, o CIT já possui um centro de distribuição da

empresa Polishop operando com 20% da sua capacidade de distribuição sendo que a

mesma pretende transferir 100% desta capacidade para este local. Se isto acontecer,

segundo Evaristo, Varginha terá o maior VAF do país. Além disso, o SEBRAE, que

recentemente mudou sua sede regional para a cidade de Varginha, vem demonstrando

bastante interesse neste contexto de desenvolvimento do aeroporto varginhense.

No entanto, para que tal desenvolvimento seja viável é necessário realizar

intervenções tanto no âmbito arquitetônico, ou seja, na ampliação e adequação do sítio

aeroportuário, quanto no âmbito urbanístico, conectando o aeroporto e a cidade de

Varginha ao restante da região, através da otimização do acesso à Rodovia Fernão Dias.

5.1. ÁREA DE INTERVENÇÃO ARQUITETÔNICA

A área de intervenções arquitetônicas consiste na área do Aeroporto de

Varginha.

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5.2. ÁREA DE INTERVENÇÃO URBANÍSTICA

A área de intervenção urbanística é constituída pela área de influência imediata

do aeroporto. A mesma consiste no acesso de Varginha à BR-381 e à área

compreendida pelo Porto Seco Sul de Minas, CIT, Distritos Industriais, Aeroporto de

Varginha, seu acesso e entorno.

Figura 3 – Área de intervenção arquitetônica e urbanística.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Google Earth.

O aeroporto Major Brigadeiro Trompowsky, situado em Varginha, foi

construído no governo Getúlio Vargas e preparado para prestar informações eficientes a

navegação aérea em 1948. Suas instalações foram melhoradas em 1959 com a

construção do terminal de passageiros que foi reformulado em 1987. Em 2012 foi

construído outro terminal de passageiros em uma área diferente do aeroporto.

O sítio aeroportuário possui 571.000m² de área documentada mais 229m² de área

a ser desapropriada em virtude da ampliação do aeroporto. Situa-se a 5 km do centro da

cidade na direção sudoeste, tendo como acesso principal a Rodovia BR-491 que liga

Varginha-Elói Mendes.

O aeroporto Major Brigadeiro Trompowsky, situado em Varginha, foi

construído no governo Getúlio Vargas e preparado para prestar informações eficientes a

navegação aérea em 1948. Suas instalações foram melhoradas em 1959 com a

construção do terminal de passageiros que foi reformulado em 1987. Em 2012 foi

construído outro terminal de passageiros em uma área diferente do aeroporto.

Imagem 2: Área de intervenção arquitetônica e

urbanística.

Fonte: Elaboração própria a partir de dados do Google

Earth.

LEGENDA:

Área arquitetônica

Área urbanística

BR-381

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O sítio aeroportuário possui 571.000m² de área documentada mais 229m² de área

a ser desapropriada em virtude da ampliação do aeroporto. Situa-se a 5 km do centro da

cidade na direção sudoeste, tendo como acesso principal a Rodovia BR-491 que liga

Varginha-Elói Mendes.

5.3. INTERVENÇÕES PROPOSTAS

5.3.1. INTERVENÇÕES ARQUITETÔNICAS

Para que o Aeroporto de Varginha possa operar de acordo com a demanda de

passageiros e cargas encontrada num horizonte de projeto de 15 anos, serão necessárias

as seguintes intervenções:

Elevação da categoria do aeroporto com o intuito de estar apto a receber

aeronaves de grande porte e o terminal de cargas;

Ampliação da pista e modernização da mesma com a colocação de papis7 para

atender às exigências para a operação de aeronaves cargueiras no aeroporto;

Ampliação do terminal de passageiros e seu estacionamento, visando o aumento

do fluxo de passageiros que utilizarão a edificação.

Incorporação da edificação do Porto Seco Sul de Minas como terminal de

cargas, pois o mesmo possui infraestrutura adequada para o funcionamento.

Desta forma, é possível adequar a arquitetura existente no local para um novo

uso, poupando recursos que seriam gastos na construção de um TECA;

Criação de um pátio de manobras para o terminal de cargas com o intuito de

aprimorar as atividades logísticas do TECA uma vez que este se encontra do

lado oposto ao terminal de passageiros em relação à pista do aeroporto;

Construção de hangares para locar e realizar a manutenção das aeronaves

cargueiras que operam no aeroporto;

7 PAPI - Indicador de Precisão de Trajetória de Aproximação. Conjunto de 2 ou 4 unidades luminosas que

fornecem ao piloto a indicação de sua posição (muito baixa, correta, alta e muito alta) em relação a rampa

de descida e ponto de toque. Disponível em:

<http://technilux.com.br/site/index.php?option=com_k2&view=item&layout=item&id=94&Itemid=210>.

Acesso em 15 jun. 2014.

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Aumento do PCN (Número de Classificação do Pavimento), ou seja, número que

indica a resistência de um pavimento para operações sem restrições.

Ampliar a brigada de incêndio com o objetivo de atender tanto passageiros

quanto cargas.

Ampliação da área do sítio aeroportuário a fim de possuir área suficiente para

futuras expansões.

5.3.2. INTERVENÇÕES URBANÍSTICAS

Com o objetivo de melhorar a conectividade da região e do Município de

Varginha com o aeroporto, são necessárias as seguintes ações:

Elaborar o plano diretor do aeroporto, estabelecendo as zonas de proteção

aeroportuárias e número de gabaritos máximos das edificações adjacentes, zonas

de atração para prestadoras de serviço para o aeroporto e seu entorno, tais como

hotéis, restaurantes, centros de distribuição e logística de carga, centros de

negócios e parques industriais, além disso, é preciso elaborar diretrizes para

minimizar os impactos ambientais relacionados com o sítio aeroportuário;

Desenvolver a área de intervenção dentro do conceito de aeroporto-cidade,

promovendo maior sinergia entre o Aeroporto de Varginha e a cidade de

Varginha.

Melhorar e aumentar o número de acessos da cidade ao Aeroporto de Varginha,

criando acessos secundários ao aeroporto visando o aumento do fluxo de pessoas

e cargas para o local e também duplicar o acesso principal existente, destinado à

circulação de passageiros e funcionários do aeroporto e sua área de influência;

Duplicar o acesso de Varginha à BR-381, com o objetivo de promover a

integração da região com o aeroporto em questão. Além disso, propõe-se a

criação de uma alça no acesso à Rodovia Fernão Dias direcionada

exclusivamente para os veículos cargueiros, evitando assim que tais veículos

circulem dentro da área urbana de Varginha, congestionando o trânsito de

determinadas avenidas que são importantes vias de circulação da cidade;

Conectar o aeroporto aos distritos industriais de Varginha;

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Elaborar diretrizes para futuras expansões da área aeroportuária, visando, por

exemplo, à criação de um aeroporto-indústria;

6. CONCLUSÕES

Desde o princípio da aviação como modal de transporte disseminado, houve a

necessidade de realizar o transporte de carga seja, correio, pacotes ou mercadorias,

utilizando a flexibilidade e rapidez do meio aéreo como seu principal atrativo.

Atualmente o transporte de cargas exerce papel fundamental em relação ao

desenvolvimento social e econômico. O aeroporto passou a servir como um ponto de

apoio logístico para as empresas produtoras, uma alternativa de expansão de atividades

para as companhias aéreas, um canal de operação para os agentes de carga, passando a

ser visto como indutor de desenvolvimento para as regiões onde estão inseridos uma vez

que a velocidade do serviço de transporte aliada à flexibilidade de destinos é justamente

o que torna o transporte aéreo de cargas atrativo.

No entanto, a distribuição irregular da malha logística brasileira pode acarretar

na saturação do transporte de cargas, gerando estrangulamento dos grandes aeroportos.

Tal situação pode se tornar um grande obstáculo para a continuidade do transporte de

carga aérea, mas ao mesmo tempo, pode significar uma oportunidade para os aeroportos

regionais no futuro. Dessa forma, deve-se verificar se aeroportos secundários podem,

por vezes, atender de maneira mais eficiente demandas regionais que são direcionadas

aos grandes aeroportos.

Portanto, a ampliação e adequação do aeroporto de Varginha como aeroporto

cargueiro permite que o mesmo seja capaz de servir como ferramenta logística para as

empresas da região além de atrair investimentos para este mesmo local. Transformando-

o em um elemento precursor do desenvolvimento regional, impulsionando a geração de

empregos e rendas e atraindo outros tipos de investimentos decorrentes de prestações de

serviços necessárias ao funcionamento de um aeroporto desse porte.

7. REFERÊNCIAS

AEROPORTO de Varginha (2014). Disponível em:

<http://blog.voeazul.com.br/ultimas/aeroporto-de-varginha/>. Acesso em: 18 jun. 2014.

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MOBILIDADE DO TRABALHO E REESTRUTURAÇÃO URBANA EM

CIDADES MÉDIAS: UHE BELO MONTE E AS TRANSFORMAÇÕES NA

CIDADE DE ALTAMIRA-PA

José Queiroz de Miranda Neto8

Resumo

Com este artigo se pretende analisar o processo de mobilidade da força de trabalho e as

implicações da reestruturação urbana em cidadesmédias, tendo como recorte

metodológico a intensificação das frentes migratórias para a construção da usina

hidrelétrica de Belo Monte entre 2010 e 2014 e as transformações urbanas na cidade de

Altamira, no Estado do Pará. Para tanto são utilizados dados de admissão do consórcio

construtor no período delimitado, bem como informações que tratam das mudanças na

dinâmica urbana, como as alterações no quadro habitacional, incremento demográfico e

modificações econômicas recentes.

Palavras Chave: mobilidade do trabalho, reestruturação urbana, cidade média.

1. INTRODUÇÃO

No contexto da crise do regime de acumulação (HARVEY, 2005) e de

mudanças na dinâmica urbana do país a partir da década de 1970, algumas cidades com

população entre 50 e 500 mil habitantespassaram a responder de forma mais ativa aos

interesses do capital, em especial com a expansão da atividade produtiva (SPOSITO e

SPOSITO, 2013). Trata-se de um processo de reestruturação urbana que atinge, em

níveis variados, a escala nacional e se estabelece como tendência até o presente.

Conforme argumenta Sposito (2004, p. 126), as cidades médias “são aquelas que, numa

8 Professor da Universidade Federal do Pará e doutorando em Geografia pela FCT/UNESP – Presidente

Prudente, sob a orientação do Prof. Dr. Eliseu Savério Sposito.

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dada divisão territorial do trabalho, são centros regionais importantes, em função de

serem elos de ligação entre as cidades maiores e menores”.

Ainda que de modo diferenciado, algumas cidades do Norte do país começam a

se destacar como resultado desse processo entre as décadas de 1970 e 1980, como

Santarém, Marabá e, mais timidamente, Altamira. Esta última ganha atenção como um

dos principais centros urbanos do sudoeste do Pará, polarizando as cidades situadas no

interfluxo entre o rio Xingu e a rodovia Transamazônica (BR-230).

Atualmente, com a construção da usina hidrelétrica de Belo Monte a partir de

2010, começa-se a inferir sobre o grau de interferência dos processos relativos à

barragem nessa cidade média e seus nexos causais com a dinâmica urbana

recente.Entende-se que o processo de construção do complexo hidrelétrico é

componente da reestruturação produtiva, uma vez que surge para dar condições à

expansão do processo de acumulação de capital no território nacional. De acordo

Sposito e Sposito (2013, p. 5) “à medida que se constituem as dinâmicas que

consubstanciam uma reestruturação econômica, observamos, pari passu, uma

reestruturação urbana que lhe é base e lhe revela”. Com este trabalho se pretende,

portanto, analisar de que forma o intenso processo migratório de força de

trabalhodecorrente da usina hidrelétrica vem produzindo transformações urbanas da

cidade de Altamira, no Estado do Pará.

Longe de se estabelecer uma relação mecânica, os processos de mobilidade da

força de trabalho e de reestruturação urbana representam uma parte importante da

literatura sobre a dinâmica espacial do Brasil, notadamente com intensificação da

produção industrial. De um lado, o ciclo de acumulação de capital necessitou explorar

os excedentes de mão-de-obra de regiões decadentes e, portanto, com estoque de força

de trabalho para a expansão da atividade produtiva. De outro lado, a produção industrial

concentrada nas metrópoles também produziu seu próprio estoque de superpopulação

relativa: trabalhadores urbanos sub-remunerados do terciário, integralmente aptos para

serem absorvidos em novos movimentos de expansão do capital. É necessário, contudo,

estudos sobre como as cidades médias se comportam diante do rápido incremento

demográfico, especialmente no caso de surtos industrializantes ou de instalações de

projetos de grande escala.

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Adiante, será possível entender como se dá essa dinâmica de reprodução da

força de trabalho para as barragens, bem como as implicações urbanas nas áreas em que

se instalam,com destaque para as transformações recentes na cidade de Altamira.

2. USINA HIDRELÉTRICA E MOBILIDADE DA FORÇA DE TRABALHO NA

AMAZÔNIA

Amobilidade da força de trabalho é um tema recorrente no campo das ciências

sociais e de grande importância para se entender de que forma o capitalismo consegue

deslocar fluxos com vistas à reprodução ampliada do capital. Neste item, pretende-se

abordar sobre o papel da migração de trabalhadores relacionada à construção de grandes

usinas hidrelétricas, bem como o significado destes deslocamentos nas cidades em que

se instalam.

Ao longo da história é evidente o papel da migração como um fenômeno

determinante para a sobrevivência da espécie humana, porém as populações nunca se

deslocaram de forma tal como fazem no modo-de-produção vigente. Mesmo as grandes

diásporas ou a saída em massa de populações de regiões ambientalmente precárias e

desprovidas de recursos não produziram efeitos tão dinâmicos quanto os processos

decorrentes da economia capitalista. O nomadismo cidade-campo, os deslocamentos

para as regiões das minas ou as migrações para as áreas de produção industrial

montaram um quadro sem precedentes de mobilidade humana. Mas qual seria, então, a

razão fundamental para a existência de um intenso fluxo migratório no mundo

contemporâneo?

Até a década de 1970, a explicação dada a esse fenômeno se repousava em

uma perspectiva neoclássica, onde “a decisão de migrar era percebida como decorrente

apenas da decisão pessoal e não pressionada ou produzida por forças socioeconômicas

exógenas” (BECKER, 1997, p. 323). Os estudos se concentravam em descrever os

fluxos de origem/destino, bem como as tipologias de deslocamentosem, contudo,

levantar maiores explicações a respeito dos fatores estruturais que determinavam tais

movimentos. Porém, alguns se permitiram questionar para além da mera aparência do

fenômeno e encontraram na teoria marxista da população um importante ponto de

encontro em suas análises.

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Em sua obra principal, Marxmostrou interesse por esta questão ao tratar da

existência de uma superpopulação relativa, ou seja, “uma população trabalhadora

adicional relativamente excedente, isto é, excessiva para as necessidadesmédias de

valorização do capital e, portanto, supérflua” (MARX, 2013, p. 705). Deste excedente,

parte seria aproveitada como um volume de força de trabalho a ser utilizado de acordo

com os movimentos cíclicos de expansão/retração do capital. Nenhum trabalhador

estaria livre de compor a superpopulação relativa, mesmo que por curtos períodos ou de

acordo com as fases da produção industrial. Embora fosse possível considerar as

variações desta lei, Marx viu uma estreita relação entre o desenvolvimento econômico e

o pauperismo da classe trabalhadora ao afirmar que

“Quanto maiores forem a riqueza social, o capital em funcionamento, o

volume o vigor de seu crescimento e, portanto, também a grandeza absoluta

do proletariado e a força produtiva de seu trabalho, tanto maior será o

exército industrial de reserva (...) Mas quanto maior for esse exercito de

reserva em relação ao exército ativo de trabalhadores, tanto maior será a

massa da superpopulação consolidada, cuja miséria está na razão inversa do

martírio de seu trabalho”. (MARX, 2013, p. 719).

A partir da lei da superpopulação relativa, têm-se duas importantes afirmações

que podem ser relacionadas à questão aqui proposta: a) quanto maior a atividade

produtiva do capitalismo, o exército de reserva tende a ser maiore b) quanto maior a

quantidade de trabalhadores em reserva em relação aos trabalhadores ativos, as

condições de vida dos primeiros tenderão a ser piores. Se for isto correto, em momentos

de expansão das atividades industriais, onde se demanda uma grande quantidade de

trabalho, estarão os trabalhadores sempre sujeitos aos deslocamentos demandados pela

economia de mercado, segundo Becker (1997, p. 334) “o capital pode escolher a força

de trabalho onde melhor lhe convier e da forma que lhe for mais rentável, pois crescem

de forma assustadora os estoques de população excedente”.

As determinações de existência dessa população relativa residem na

acumulação de capital, já que este a cria e, dialeticamente, é reproduzido por ela. A

acumulação não é somente um crescimento quantitativo de capital, mas também sua

alteração qualitativa, isto é, sua composição orgânica. Na medida em que aumentam as

forças produtivas do trabalho (com o uso sistemático de máquinas) e se conforma um

modo de produção especificamente capitalista, torna-se cada vez mais supérfluo o

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trabalho vivo, uma vez que este, no capitalismo, é reificado como capital variável, um

mero custo de produção. A relação, então, entre as partes variáveis e constantes do

capital se modifica (diminuindo o componente variável), produzindo a diminuição da

demanda por trabalho vivo pari passo ao aumento do capital total, provocando, por sua

vez, maior demanda por trabalho, mas sempre em menor proporção. Nesse sentido, a

superpopulação relativa não é somente um produto necessário da acumulação, mas

também sua impulsionadora, dado o aumento relativo da demanda por força de trabalho

em função da ampliação do capital. Desta feita, é que Marx (2013, p. 707) afirma que a

superpopulação relativa se torna condição de existência do capital, pois ela “fornece a

suas necessidades variáveis de valorização o material humano sempre pronto para ser

explorado”.

A razão pela qual a mobilidade existe no capitalismo de forma específica e

mais intensa que em outros momentos da história reside na ideia da “liberdade” da força

de trabalho, ou seja, a “condição de exercício de sua liberdade de se sujeitar ao capital,

de se tornar mercadoria cujo consumo criará o valor e assim produzirá o capital”

(GAUDEMAR, 1977, p. 190). O que há, em verdade, é uma decisão entre migrar ou

viver de parcos recursos em seu local de origem, sujeito a condições miseráveis de

subsistência. São, portanto, as necessidades dos capitais (e não dos indivíduos) que são

atendidas com o processo migratório, de acordo com Gaudemar (1977, p. 192)

“Se se afirmou que o capitalismo começava com a exploração da força de

trabalho, é necessário acrescentar que ele só poderia nascer uma vez que o

trabalhador tivesse adquirido esta mobilidade; não no sentido apologético que

a teoria clássica reconheceu, do homem inteiramente livre do seu destino,

ator de sua própria história, mas no sentido das contrariedades que lhe são

impostas por esta procura de emprego. A mobilidade da força de trabalho

surge então como uma condição necessária, se não suficiente, da gênese do

capitalismo e como um índice de seu desenvolvimento.”

No caso do Brasil, a história é marcada por esta mobilidade. De acordo com os

ciclos de desenvolvimento e com a divisão territorial instalada, grandes porções do país

passaram a constituir áreas de destino da força de trabalho, como a região centro-sul a

partir da montagem dos grandes parques industriais, da construção de Brasília e de

obras faraônicas de infraestrutura entre as décadas de 1950 e 1970. Para estes

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empreendimentos, levas de migrantes foram deslocadas da região nordeste para serem

utilizados como força de trabalho ativa nas áreas de expansão do capital. A partir da

década de 1960, sob a égide do Governo Militar, articula-se outro grande ciclo de

mobilização da força de trabalho, desta vez em direção à Amazônia com vistas a ocupar

a nova fronteira de expansão nacional através dos programas nacionais de colonização.

Esse tipo de migração, que à primeira vista parece ser de cunho rural-rural, adquire

diferente conotação ao se consideraro caráter urbano da fronteira amazônica, uma vez

que foi articulada tendo como suporte uma rede de cidades e vilas concebidas pelos

militares.

É, portanto, nesse novo contexto de expansão da capacidade econômica do país

que surgem as grandes hidrelétricas, a exemplo de Itaipue de Tucuruí, ambas

iniciadasna década de 1970. Estes Projetos de Grande Escala (PGE) estão diretamente

ligados ao desenvolvimento capitalista e demandam uma grande quantidade de força de

trabalho para sua constituição.Porém, segundo RIBEIRO (1987, p. 5)

“Si escierto que los PGE crean una considerable oferta de empleo, tambienlo

es que, en general, laspoblacioneslocales y de áreas vecinasson incorporadas

enlas posiciones mas bajas del mercado de trabajo, que losproyectosposeenun

circuito migratoriopropio y que lacantidad de empleoscreados guarda una

proporcion baja conrespecto a losmontos gigantescos de lasinversiones. La

dinamicatipica de los PGE termina por replicar ladependenciapolitico-

económica, sobre todo cuandoestanenjuego relaciones conpaisespoco o no

industrializados.“

Tomando-se o exemplo da usina hidrelétrica de Tucuruí, é possível constatar o

papel de intervenção de um PGE na mobilização de fluxos migratório para a região

Amazônica. Instalada no rio Tocantins entre 1975 e 1985, verifica-se um intenso

processo migratório para a área no entorno do lago. Segundo Rocha (2008, p. 150) “é

exemplar a intensidade e volume de população que se dirigiu durante a construção da

usina hidrelétrica”. O autor aponta que, entre 1970 e 1986, a população da região que

abrange os municípios de Itupiranga, Jacundá, Marabá e Tucuruí saltou de 47.486 para

360.791, um crescimento de 760%. No caso específico de Tucuruí, passou de 10.091

habitantes para 182.021, multiplicando 18 vezes (ROCHA, 2008, p. 150). Sobre a

atratividade exercida pelas áreas de projetos hidrelétricos, a realidade aponta sempre um

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deslocamento maior que a capacidade de absorção da mão-de-obra efetiva dos

empreendimentos. Para os que não conseguem empregos diretos nas atividades

relacionadas à usina, resta a ocupação no comércio local ou em atividades urbanas sub-

remuneradas. Essa tendência produz efeitos críticos sobre as condições de vida nessas

áreas urbanas, especialmente com a proliferação de assentamentos irregulares ao longo

da cidade.

A área urbana do município de Tucuruí se constituiu como o principal ponto de

destino da população migrante, gerando em um curto período os seguintes efeitos: a)

ampliação da população em vinte vezes na sede municipal; b) crescimento significativo

da malha urbana; c) surgimento de novos bairros periféricos decorrentes de

assentamentos irregulares; d) aprofundamento das desigualdades espaciais internas; d)

alterações na forma urbana, com deslocamento de atividades do centro histórico para

novas áreas; d) aumento da densidade populacional na área urbana, com imóveis se

multiplicando nos quintais (ROCHA e GOMES, 2002). Embora este quadro seja

recorrente em várias outras cidades que absorveram a população migrante ao longo do

país, no caso da região amazônica se soma a grande deficiência desses centros urbanos

antes da instalação dos empreendimentos, especialmente quanto à ausência de

equipamentos urbanos ligados à saúde, educação e assistência social.

Trinta anos após a construção da hidrelétrica de Tucuruí, grande parte da

legislação brasileira foi alterada. Os estudos para constituição de usinas hidrelétricas se

tornaram mais rigorosos, sobretudo por pressão de grupos sociais como o Movimento

dos Atingidos por Barragens (MAB) e de organismos internacionais de proteção ao

meio ambiente. Não obstante tais iniciativas, as usinas hidrelétricas ainda são as

principais fontes de energia do país e,a cada ano,se criam novos projetos de instalação.

Na Amazônia estão previstas 20 hidrelétricas para os próximos oito anos e, destas, cinco

já estão em processo de construção: Jirau, Teles Pires, Ferreira Gomes, Santo Antônio e

Belo Monte.

Neste trabalho, aborda-seacerca dos deslocamentos migratórios por ocasião da

construção da usina hidrelétrica de Belo Monte, que está em processo de instalação no

Rio Xingu, com capacidade de 11.233 MW. Segundo o Relatório de Impacto Ambiental

(RIMA), serão gerados no pico das obras (terceiro ano) maisde 18 mil empregos diretos

e de 23 mil indiretos (BRASIL, 2009). O município de instalação da usina é Vitória do

Xingu (PA) que, apesar de abrigar grande parte do complexo estrutural relacionado à

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barragem, não é o grade impactado do ponto de vista da densidade populacional,

situação que fez de Altamira o principal lócus de absorção dos problemas relacionados à

hidrelétrica.

Diferente de Tucuruí, que possuía poucos habitantes no início das obras da

usina hidrelétrica, Altamira apresenta ao final de 2010 uma população urbana estimada

em 76 mil habitantes, ou seja, deverá responder de modo diferenciadoàs intervenções

causadas pelo grande incrementopopulacional. Até a conclusão das obras, esta cidade

deve passar por grandes mudanças em sua estrutura intraurbana, muitas das quais

podemos verificar a seguir.

3. O NÚCLEO URBANO DE ALTAMIRA E SEU PAPEL DE ABSORÇÃO DOS

FLUXOS POPULACIONAIS

Neste trabalho, considera-se a cidade de Altamira como uma cidade média com

importante papel de centralidade no sudoeste paraense. Sua área de influencia

compreende os núcleos urbanos de Brasil Novo, Vitória do Xingu, Pacajá, Uruará,

Medicilândia, Anapú e Senador José Porfírio. As áreas municipais que abrangem esses

núcleos formam a microrregião de Altamira, conforme se pode visualizar na Figura 1.

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Imagem 1: Mesorregião do Sudoeste paraense. Fonte: Base Cartográfica do IBGE,

2010.

Os núcleos urbanos da rede estão situados entre dois eixos de ligação: a

rodovia transamazônica (BR-230) e o Rio Xingu. Entre a cidade de Altamira e a cidade

de Vitória do Xingu o rio faz uma curva denominada “volta grande do Xingu”, área

onde será construída a usina hidrelétrica. Trata-se de um trecho de 100 km povoado por

rochas e extensas corredeiras, que tornam impraticável a navegação em embarcações

maiores. Por esse motivo, desde o final do Séc. XIX foi criada uma via de ligação por

terra entre Altamira (antigo Forte Ambé) e o Porto de Vitória, onde se faria a ligação

entre o Rio Tucuruí e o alto Rio Xingu. O declive de 90 metros no trecho da volta

grande, que antes seria um obstáculo ao desenvolvimento comercial, torna-se agora uma

grande oportunidade de geração de energia por meio da construção da barragem.

Os estudos para o aproveitamento hidrelétrico na bacia do rio Xingu

começaram em 1975, a partir de quando se poderia aferir a viabilidade técnica de uma

usina hidrelétrica naquele curso d’água. Na época, a usina foi denominada de

“Kararaô”, que significa “grito de guerra”na línguaKaiapó, nome que seria alterado em

1989 por ser considerado uma afronta aos povos indígenas. Após um longo período de

revisões e avaliações, os estudos foram concluídos somente em 2006 através de uma

cooperação técnica entre a Eletrobrás e as construtorasAndrade Gutierrez,

CamargoCorrea e Norberto Odebrecht (BRASIL, 2009). No ano seguinte os estudos

foram repassados ao IBAMA para o licenciamento, que foi concluído somente no final

de 2009, diante de vários protestos viabilizados por ONGs e movimentos sociais. Em 1º

de fevereiro de 2010 a licença ambiental é publicada e, em abril do mesmo ano, é

definida em leilão a empresa responsável pela construção e venda da energia gerada

pela usina, a Norte Energia S.A (NESA).

A partir de então se iniciam os deslocamentos de trabalhadores para a cidade

de Altamira, a começar pelos técnicos responsáveis pelo gerenciamento dos trabalhos.

Como ainda não havia sido criada uma área específica para abrigar a população no

perímetro do projeto, a cidade de Altamira, localizada a 54 km de Belo Monte, passou a

absorver esses migrantes pioneiros. Nesse período, o crescimento do preço dos aluguéis

chega a superar a taxade 300% (Portal G1, 2011). Grande parte das residências

disponíveis para locação passou a servir ao projeto Belo Monte entre 2010 e 2013,

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quando ainda não haviam sido concluídas as obras dos alojamentos coletivos e as

residências para trabalhadores. O primeiro impacto da imigração é, portanto, a pressão

sobre a oferta de bens e serviços na cidade, com destaque para aluguéis e alimentos.

De acordo com os documentos ligados à admissão da Norte Energia, entre

2011 e 2014 um número de 45.934 trabalhadores diretos foi admitido, incluindo

atividades ligadas às obras e aos escritórios (CCBM, 2014). Os dados incluem todas as

admissões diretas no período, sem considerar os desligamentos. Os mapas da Figura

2representam as cidades de origem desses trabalhadores e os feixes de deslocamento, o

que demostra a capacidade de recrutamento de uma usina hidrelétrica. Além disso,

indicam a desigualdade na distribuição dos trabalhadores pelo país, uma vez que

determinadas regiões fornecem profissionais especializados (executivos), outras se

destacam em funções intermediárias (escritórios), enquanto que as regiões

historicamente mais pobres ofertam trabalhadores ligados às atividades que demandam

maior esforço físico (obras).

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Imagem 2: Deslocamentos de trabalhadores para Belo Monte. Fonte: Elaboração própria

com base nos dados de admissão da CCBM, 2014.

No que se refere ao deslocamento de executivos, percebe-se o total afastamento

dessa categoria de trabalhadores da região de atividade ou mesmo das metrópoles

regionais, sendo que os maiores fluxos partem de Belo Horizonte(10) e São Paulo(14).

Todas as demais cidades representadas não ofertam mais que três executivos. Em

primeira instância, esse dado indicaria a capacidade presente no eixo de maior

desenvolvimento do país quanto à oferta de profissionais especializados em função do

próprio desenvolvimento técnico-científico dos pontos de origem. Porém, mais do que

isso, representa a disposição de comando que emana das “regiões do mandar” em

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relação às “regiões do fazer”, embora não seja possível dissociar uma coisa da outra, ou

seja, a densidade técnica das funções de controle (SANTOS & SILVEIRA, 2001).

No que tange aos deslocamentos para cargos de escritório,em Altamira se

encontra o maior contingente, de 1.465 admitidos no período. Vale observar que nos

estudos de licenciamento havia uma previsão de que a empresa contratasse entre 60% e

70% de trabalhadores locais, o que justifica o maior número de pessoas situadas em

Altamira. Na sequência, é possível observar o destaque da capital e demais núcleos de

importância, respectivamente Belém-PA (26), Santarém-PA (19), Brasil Novo-PA (18)

e Marabá-PA (18), além da capital Porto Velho-RO (18). Somados a estes estão os

núcleos de Vitória do Xingu-PA (14), Belo Horizonte-MG (13) e Tucuruí-PA (11), os

quais compõem os oito primeiros. Santarém e Marabá se destacam como os subcentros

regionais mais próximos, com presença de uma população devidamente qualificada para

as atividadesque, em geral, exigem o ensino médio completo ou ensino superior em

nível de graduação. Porto Velho, onde estão sendo erguidas as Barragens de Jirau e

Santo Antônio, atende ao ciclo das hidrelétricas, onde há pessoas disponíveis para o

deslocamento por ocasião do excedente gerado quando se encerra o pico das atividades.

Os trabalhadores que se deslocaram para as atividades relacionadas às obras

correspondem a mais densa representação, com grande número de cidades ao longo do

Brasil e destaque para as regiões norte e nordeste. No total somam 44.019 admissões

(95,83%) e se destinam aos sítios Belo Monte e Pimentel (áreas das barragens), além

dos diques, canais, portos e acessos e infraestrutura geral. O maior número está

registrado na cidade de Altamira (12.141), seguido por Tucuruí-PA (2.619), Santarém-

PA (1.574), Belém-PA (1.520), São Luiz-MA (1.185), Pinheiro-MA (1.161), Porto

Velho-RO (1.095) e Marabá (757), sendo estas os oito primeiras. A lista é extensa e

abrange principalmente os municípios dos estados do Pará (114) e Maranhão (178), os

quais apresentam também o maior número de admissões, 12.405 e 8.720,

respectivamente. Os dados revelam a prevalência dos centros regionais mais próximos,

além da manutenção do ciclo das hidrelétricas para o caso dos deslocamentos da capital

Porto Velho. Porém, chama a atenção a grande presença de trabalhadores da região

nordeste do país, na proporção de 28%, o que indica a presença de um estoque de

população excedentedisponível para o deslocamento.

Os gráficos a seguir exibem os dados obtidos junto ao Ministério do Trabalho e

Emprego (MTE) e representam o número de admissões e dispensas da construção civil

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entre janeiro de 2010 e dezembro 2014, onde é possível observar a flutuação para os

municípios de Altamira e Vitória do Xingu.

Gráfico 1 – Admissões e desligamentos entre 2010 e 2014. Fonte: CAGED/MTE,

2015

O Gráfico 1representa o número de admissões e desligamentos em Altamira e

Vitória do Xingu, porém em escalas bem diferentes. No primeiro é possível visualizar

um fluxo maior de trabalhadores, enquanto que no segundo as contratações não

ultrapassam o número pouco significativo de 1.185 admissões em 2014. Esse quadro

reflete o papel de Altamira enquanto cidade-suporte para as atividades de

gerenciamento da usina, mesmo que este não seja o local das instalações do complexo

estrutural hidroelétrico.

No que se refere à Altamira, o gráfico apresenta um crescimento constante nas

admissões entre 2010 e 2013 e uma tendência de estabilidade em 2014. Esse dado pode

indicar, entre outras questões: a) o período de pico das obras, previsto para o primeiro

triêniodo projeto e b) a redução das atividades ligadas ao consórcio construtor (CCBM)

e início das atividades vinculadas ao consórcio montador (CMBM), relacionado à

estrutura eletromecânica do projeto. Chama atenção, contudo, a alta incidência de

desligamentos, superior a 28 mil ao final de 2014, o que demonstra o processo de

renovação constante dos canteiros. A esse respeito, Souza (1988, p. 121) argumenta

que:

“A economia da obra acaba por determinar altíssimos níveis de crescimento

demográfico anual, com forte incidência sobretudo nos anos que coincidem

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com o “pico” dos trabalhos, desde o desvio do rio até o fim da concretagem.

Segue-se um período de gradativa desmobilização dos efetivos, uma parte

significativa dos quais, sendo subcontratada, acaba por se tornar um “peso

morto” na área, carecendo de todo apoio governamental, seja para manter-se

no local, seja para retornar à sua área de origem.”

Com base nas estimativas apontadas pelo EIA de Belo Monte, a previsão é que

“ao todoe ao longo do período de obras,96 mil pessoas cheguem à região,incluindo

aquelas que estarãotrabalhando nas obras, o que deverá causar outros impactos”

(BRASIL, 2009, p. 85). Nesse caso, o fluxo de trabalhadores diretos é grande, porém

não são apenas estes que chegam à região de instalação da usina hidrelétrica, que

funciona como um polo de atração populacional para os trabalhadores de todo país, com

especial destaque para regiões onde é maior ainsegurança na oferta de emprego. A

seguir, veremos como esse processo atinge a principal cidade de destino dos

deslocamentos populacionais: o centro urbano de Altamira.

4. BELO MONTEE A REESTRUTURAÇÃO URBANA EM ALTAMIRA-PA

Mesmo antes da finalização da rodovia Transamazônica, inaugurada em 1972,

Altamira já se apresentava como um polo de atração de migrantes devido à atividade da

colonização dirigida. A cidade se destacava como um importante centro comercial e de

serviços entre a densa floresta Amazônica, fazendas e assentamentos rurais em

instalação. Os núcleos que se desenvolveram ao longo da rodovia começaram a divisar

Altamira como um ponto de encontro entre a economia regional e a verticalidade das

redes do capitalismo, mediadas pelos sistemas de transporte e telecomunicações, bem

como pela instalação de instituições financeiras, comerciais eadministrativas. Ao final

de 1980, este núcleo já havia se consolidado como uma cidade média na rede urbana do

sudoeste paraense. Porém, ao mesmo tempo, a história da colonização na Amazônia

reservou para Altamira um difícil papel de absorção de fluxos populacionais, tanto no

que se refere aos deslocamentos inter-regionais como intrarregionais.

Com a crise no campo a partir de 1974 eo consequente êxodo rural, houve um

forte deslocamento para a área urbana, que se mostrou mais intenso entre 1980 e 1990.

Em decorrência desse processo, de acordo com (Becker, 1985, p. 134)“novos bairros

surgiram na periferia urbana, habitados por migrantes sem-terra, assalariados urbano-

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rurais, bem como, no centro ou próximo a ele, loteamentos espontâneos, ocupados por

ex-colonos empregados no setor terciário”. O foco desses migrantes foi a ocupação em

áreas próximas aos leitos dos igarapés Altamira e Ambé, muitas das quais sujeitas a

alagamentos no período de cheia do Rio Xingu. Segundo Miranda Neto (2014, p. 4)

“Tal crescimento esteve acompanhado de uma ocupação urbana sem

planejamento, pois muitas famílias fixaram residência em áreas de

alagamento próximas aos igarapés Altamira e Ambé. Tais ocupações se

deram, em grande parte, a partir da construção de residências em palafitas,

com sistemas de saneamento precário ou inexistente, motivando o despejo de

esgoto residencial diretamente no rio. Com as crises sucessivas no campo e a

consequente migração rural-urbana, outras frentes de migrantes passaram a

ocupar a cidade em áreas ainda mais inadequadas, a exemplo da “Invasão dos

Padres”.

Na medida em que se acentuam os níveis de urbanização e se ampliam os

assentamentos espontâneos ao longo da cidade, esta vai ampliando os índices

relacionados à precariedade urbana. Proliferam-se moradias precárias, a maioria sem

rede de coleta de esgoto e abastecimento de água. De acordo com o IBGE, até 2010 se

registra um contingente de mais de nove mil pessoas residindo em aglomerados

subnormais na cidade, o que representa 11% da população urbana (IBGE, 2010).

É, portanto, nesse quadro de insuficiência de infraestrutura e equipamentos

urbanos que começa a se instalar o projeto da usina hidrelétrica de Belo Monte. Em

2011,desembarca em Altamira uma grande quantidade de trabalhadores, tanto de forma

conduzida pelo sistema de recrutamento da UHE Belo Monte quanto de forma

espontânea, sem qualquer garantia de alojamento e subsistência. Nos primeiros meses,

era comum a presença de famílias circulando pela cidade à procura de uma atividade

sub-remunerada, apenas para garantir um dia de alimentação. Próximo à rodoviária se

instalou um acampamento improvisado de migrantes espontâneos, os quais se

abrigavam durante vários dias sob as árvores na esperança de serem absorvidos por um

posto de trabalho formal. Essa área chegou a ser nacionalmente conhecida como “hotel

calango”, como referência à grande quantidade de redes instaladas entre as árvores.

A estimativa do IBGE para a população urbana de Altamira em 2010, de 76

mil habitantes (considerando os situados no perímetro urbano), estaria em muito

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subestimada nos anos seguintes. Em 2012, a Secretaria de Planejamento do Município

avaliou a população total do município em 148.224 mil com base no acesso aos serviços

de saúde, o que representaria para área urbana um contingente próximo de 127 mil. A

dificuldade em se obter uma estatística oficial reside na própria velocidade nos fluxos

de admissões/demissões de trabalhadores, bem como a inexistência de um registro das

migrações espontâneas em direção ao núcleo urbano. Sobre esse aspecto, Souza (1988,

p. 132) argumenta que:

“A pressão do mercado de trabalho aberta com as obras conduz a um

processo de crescimento acelerado da população urbana, diante do qual a

oferta de serviços públicos jamais é suficiente, tornando-se intensa e precária

a urbanização tudo se agrava ainda mais, conforme o tipo de política de mão-

de-obra adotada pelas empreiteiras e pelas empresas de eletricidade.“

A respeito das consequências desse processo migratório e das transformações

estruturais recentes na área urbana de Altamira, é possível elencar algumas tendências

verificadas nos três primeiros anos de execução do projeto:

a) Acelerado crescimento da população urbana: em 2010 a população urbana

de Altamira situada na sede municipal estava em torno de 79.622 (IBGE, 2010). Com o

processo migratório, espera-se um crescimento acelerado da população urbana, com

predomínio da população masculina. De acordo com o EIA de Belo Monte, “Essas

pessoas deverão procurar morar próximo aos alojamentos e às residências dos

trabalhadores, podendo formar núcleos sem as condições adequadas” (BRASIL, 2009).

Os efeitos desse crescimento começam a ser percebidos de forma mais intensa a partir

da desmobilização da mão-de-obra, quando muitos trabalhadores decidem permanecer

na região. As consequências para a cidade dizem respeito às alterações na estrutura

urbana, especialmente com o crescimento da ocupação desordenada.

b) Significativa mudança no quadro habitacional:entre 2010 e 2014 vários

assentamentos foram criados pela NESA com vistas à indenização das populações

atingidas na área urbana de Altamira e também para abrigar a mão-de-obra vinculada ao

projeto, denominados RUC (Reassentamento urbano coletivo). Ao todo, somam-se

cinco assentamentos com distância de até 2km da área de origem, designados na

sequência com a quantidade de lotes residenciais previstos: Casa Nova (453), São

Joaquim (1.041), Jatobá (1.286), Água Azul (775) e Laranjeiras (545). Além destes,

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dois loteamentos subsidiados pelo programa “minha casa minha vida”, do governo

federal: residencial Santa Benedita (958) e Residencial Ilha do Arapujá (1.444).

Ressalta-se, também, a forte presença das empresas incorporadoras, com lotes

planejados para os segmentos de alta/media renda: Terras de Bonanza (6.615), Cidade

Jardim (5.386), Cidade Nova (7.000), Viena (2.458) e São Francisco (709). Apenas no

que se refere à presença de lotes planejados, se prevê uma oferta de 28.670 unidades.

c) Ampliação da malha urbana: em 2010 a malha urbana de Altamira estava

estimada em 2.200 hectares com uma tendência de crescimento já acelerada em

decorrência das migrações desde 1980. Com as alterações no quadro habitacional

provenientes dos novos assentamentos urbanos e da ação de empresas incorporadoras,

se prevê um crescimento próximo de 50% entre 2010 e 2014, conforme se pode

visualizar no mapa da Figura 3.

Imagem 3 - Evolução da Malha urbana de Altamira

Com base na leitura do mapa é possível perceber um grande incremento da

malha urbana em várias direções, seguindo o eixo das principais vias da cidade.

Percebe-se, também, uma mudança no perímetro urbano da cidade, que passou de

95,235 km² (incluindo partes do rio e da ilha do Arapujá) para 111,229 km².

d) Alterações na economia local:sabe-se que as usinas hidrelétricas possuem a

capacidade de gerar uma divisão do trabalho estranha ao local em que se instalam.

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Tanto nos sítios de instalação dos canteiros de obras quanto nas cidades mais próximas

percebe-se um circuito de cooperação marcado pela mobilização de diversas empresas e

funcionários especializados. Não raro as empresas locais são contratadas para fornecer

produtos e serviços exclusivos para atender as necessidades do projeto, especialmente

no ramo da alimentação. O comércio se intensifica de forma acelerada, de modo que

mercados e lojas de varejo são ampliados de forma improvisada em tendas ou estruturas

de madeira com vistas a acompanhar a nova demanda local. Entre 2010 e 2013 já se

observa um aumento da transferência de impostos9 na taxa de 470%, sendo que os

incrementos anuais não ultrapassavam 30% até 2010 (IDESP, 2014). De modo geral, o

ritmo econômico se intensifica, porém parece subsistir com base no fluxo de pessoas e

capitais decorrentes da obra, sem garantias de sua real continuidade nos anos

subsequentes.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A experiência da construção de hidrelétricas no Brasil permite dizer que não se

trata de um tipo de indústria como as outras, especialmente por sua capacidade de

mobilização de mão-de-obra e de organização/desorganização das estruturas regionais.

Sabe-se, porém, que não é a hidrelétrica, enquanto objeto técnico, que produz as

transformações de maior destaque, mas os processos sociais decorrentes de sua

construção, o que inclui a instalação de um conjunto de infraestruturas de suporte e

obras de mitigação em uma vasta área geográfica. A força de trabalho utilizada em um

primeiro momento é cristalizada na forma de um grande artefato técnico, o qual é

empregado para a geração da hidroeletricidade, esta sim a verdadeira mercadoria.

Poder-se-ia dizer, inclusive, que a energia consumida em megawatts é nada mais que o

resultado do trabalho aplicado de milhares de trabalhadores ao longo de cinco anos, que

pela tecnologia pode se estender para cem anos ou mais. Nestes termos, a usina

hidrelétrica é um grande monumento de trabalho morto, utilizado para vários ciclos de

exploração do trabalho vivo.

O Brasil se destaca no cenário mundial como um grande construtor de usinas

hidrelétricas, com um número invejável de 112 unidades. Mas como se tornariam

9Referem-se às transferências constitucionais do ICMS, IPI, IPVA, FUNDEB-ICMS e FUNDEB-IPVA.

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viáveis estes projetos sem os estoques de força de trabalho presentes no território

brasileiro? É, portanto, a disponibilidade de trabalhadores “livres” que permite a

realização desses empreendimentos em áreas remotas do país, cuja liberdade reside na

difícil escolha entre migrar e viver de recursos insuficientes em seu local de origem. Um

exemplo é o deslocamento de trabalhadores de Pinheiro-MA, uma cidade de 79 mil

habitantes que mobilizou em torno de 1,2% de seus habitantes para Belo Monte. Os

mapas apresentados demostram a capacidade de mobilização de uma grande usina

hidrelétrica, bem como o cenário desigual de residência dos funcionários.

A usina hidrelétrica, como um tipo de indústria, depende de uma grande

quantidade de força-de-trabalho para sua instalação, de modo que absorve os excedentes

gerados ao longo do país durante curtos períodos. Os trabalhadores são, portanto,

inseridos na lógica de controle do empreendedor e depois dispensados para exercerem

sua “livre opção”, que basicamente se resume em três escolhas: a) retornar ao local de

origem, b) tentar a vida na região em que se estabeleceram e c) serem lançados

novamente no chamado “ciclo das barragens”, migrando para outras áreas de instalação.

Na outra ponta do fluxo migratório se encontra a região de instalação da usina

hidrelétrica e, em especial, o núcleo urbano de Altamira, que mais uma vez aceita o

difícil papel de anteparo dos deslocamentos populacionais. Ao mesmo tempo em que

sofre impactos diretos relativos à obra, a cidade precisa responder de forma premente à

necessidade dos moradores locais, antigos e novos. Com carências estruturais históricas,

o núcleo urbano recebe novos assentamentos e lotes urbanizados em uma quantidade

sem precedentes, alterando sobremaneira o quadro da habitação. A economia se

modifica com vistas a receber os novos moradores e atender as demandas do projeto, de

modo que as necessidades locais históricas são desconsideradas em nome de um

desenvolvimento que demora a acontecer.

As transformações na cidade de Altamira estão em pleno curso e avançam de

modo associado aos avanços das instalações de Belo Monte. Espera-se até a conclusão

das obras, em 2019, um conjunto de fenômenos novos e também novos indicadores para

se compreender as mudanças recentes nessa cidade média amazônica.

REFERÊNCIAS

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REINDUSTRIALIZAÇÃO E TRANSFORMAÇÕES URBANAS RECENTES NA

MICRORREGIÃO DO MÉDIO VALE DO PARAÍBA FLUMINENSE E SUAS

CIDADES MÉDIAS

Júlio Cláudio da Gama Bentes10

Resumo

A microrregião do Médio Vale Paraíba fluminense vem passando por uma intensa

reestruturação produtiva e espacial desde a privatização da Companhia Siderúrgica

Nacional (CSN) em 1993. Essa região é formada por nove municípios, sendo três deles

cidades médias: Volta Redonda, Barra Mansa e Resende. Ela vem se reindustrializando,

com a instalação de novas fábricas relacionadas principalmente ao setor

metalomecânico, que inclui a indústria automobilística. Essas atividades e outras de

caráter comercial, residencial e de serviços estão sendoimplantadasno território regional

como formas urbanas dispersas. O trabalho tem como objetivo estudar a reestruturação

em curso na microrregião, analisando a reindustrialização e as transformações urbanas

recentes que envolvem a urbanização dispersa.

Palavras-chave: Reindustrialização. Urbanização dispersa. Cidades médias.

1. INTRODUÇÃO

A microrregião do Médio Vale Paraíba fluminense, importante região

industrial do Estado do Rio de Janeiro, passa por uma intensa reestruturação produtiva e

espacial, iniciada na década de 1990-2000, com a atração de novas indústrias –

principalmente automotivas. As novas indústrias estãosendo implantadas com formas

urbanas desconectadas dos tecidos consolidados (espaço intraurbano), quesão

características do processo de dispersão urbana. Essa reestruturação levou a

modificações das relações sociais, econômicas e espaciais na microrregião. A rede

10Doutor em Arquitetura e Urbanismo pela USP. Laboratório de Estudos sobre Urbanização, Arquitetura e

Preservação - LAP, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo - FAUUSP.

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rodoviária, como também as redes de comunicação, ganharam maior destaque e são

parte do cotidiano regional dos moradores dessa microrregião.

A microrregião do Vale do Paraíba fluminense situa-se no terço médio da bacia

hidrográfica do rio Paraíba do Sul11

(Figura 1) e possui localização estratégica, interna

ao triângulo cujos vértices são as mais importantes capitais do país – São Paulo, Rio de

Janeiro e Belo Horizonte, grandes centros consumidores e acumuladores de capital.

Essa microrregião possui área de 3.828.702 km2 e população de 680 mil

habitantes segundo o Censo de 2010, sendo formada por nove municípios (Figura 2),

três deles cidades médias: Volta Redonda, com população de 257,8 mil habitantes em

2010; Barra Mansa, com 177,8 mil; Resende, com 119,7 mil habitantes.

Mapa 1: Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (mancha laranja), que ocupa parte

dos territórios dosestados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais12

. A

microrregião do Médio Vale Paraíba fluminense está destacada em vermelho.

11 Esta bacia hidrográfica está localizada no bioma da Mata Atlântica e é conformada ao norte pela Serra da

Mantiqueira e ao sul pela Serra do Mar, divisores de águas da bacia.

12 Fonte: CEIVAP – Disponível em: <www.ceivap.org.br>.Acesso em: 10 Mai. 2014.

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Mapa 2 - Mapa do Estado do Rio de Janeiro com a microrregião do Vale do Paraíba

fluminense em destaque. Ao lado, os municípios do Vale do Paraíba fluminense13

.

Essa microrregião fluminense é atravessada longitudinalmente pela principal

rodovia do país, a Presidente Dutra (BR-116), como também pela antiga Estrada de

Ferro Central do Brasil. Ambas conectam as metrópoles de São Paulo e do Rio de

Janeiro. Esta rodovia e seus acessos viários estruturam as formas urbanas dispersas que

estão sendo implantadasna região.

O trabalho tem como objetivo estudar a reestruturação produtiva e espacial em

curso na microrregião do Vale do Paraíba fluminense, analisando sua reindustrialização

e as subsequentes transformações urbanas que envolvem atividades e formas dispersas,

impactando suas três cidades médias e demais municípios.

O Vale do Paraíba fluminensedistingue-sepor seu ciclo industrial, iniciado nos

anos 1930-40 na Era Vargas. Esse ciclo – fordista – tem como marco a Companhia

Siderúrgica Nacional (CSN), criada em 1941 pelo Estado brasileiro e instalada no então

distrito de Volta Redonda (pertencente à Barra Mansa). Essa empresa assegurou em

definitivo a industrialização do país.

Com a industrialização fordista, essa microrregião teve um forte e acelerado

crescimento populacional, urbanizando-se. O conjunto fordista CSN-Volta Redonda era

uma verdadeira company-town que polarizava a região e centralizava o seu

desenvolvimento. Esse conjunto caracterizava-se espacialmente por suas formas

urbanas concentradas.

13 Fonte dos mapas: Wikipédia.

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A rápida expansão urbana motivada pela industrialização fez com que, ainda

nos anos 1960-70, os municípios de Volta Redonda e Barra Mansaultrapassassem,cada,

os cem mil habitantes, formando uma conurbação (BENTES, 2008).Resende

sóalcançou este número na década de 1990-2000. As duas primeiras cidades médias

concentravam a industrialização, além das atividades de comércio e de serviços com

melhor qualidade na microrregião.

A adoção do modelo neoliberal e de suas medidas de ajuste econômico pelo

governo brasileiro, no início dos anos 1990-2000, levou a profundas transformações na

economia, nas atividades produtivas e nas relações trabalhistas, com a consequente

reestruturação dos espaços urbanos. A CSN foi privatizada em 1993, o que gerou

significativos efeitos sobre a microrregião e seu território. Essa região passou por uma

forte crise social e econômica pós-privatização, o que levou a demissões em diversas

atividades econômicas, além da desarticulação e fechamento dos fornecedores locais da

CSN.

Como metodologia da pesquisa, o estudo teórico-conceitual e a análise do

espaço urbano-regional foram as principais estratégias para identificar e examinar as

mudanças em curso e seus rebatimentos espaciais na microrregião. Foram realizados

trabalhos de campo para documentar o processo de dispersão urbana. Observaram-seas

formas urbanas e atividades dispersas, além da circulação e modos de vida regionais.A

reunião e confrontação dos elementos teóricos e empíricos possibilitaram a elaboração

de análises para compreensão mais ampla dos fenômenos em curso, com reflexões sobre

a reindustrialização e as transformações urbanas recentes, envolvendo o processo de

urbanização dispersa.

2. A REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E ESPACIAL COM A

REINDUSTRIALIZAÇÃO DA MICRORREGIÃO

Na década de 1990-2000, teve início a reestruturação produtiva e espacial da

microrregião do Vale do Paraíba fluminense, após a privatização e reorganização da

CSN. A região começou a se reindustrializar, com a instalação de novas plantas fabris,

relacionadas principalmente ao setor metalomecânico, que inclui a indústria

automobilística. Os novos empreendimentos foram implantados de maneira dispersa

pelo território regional.

O processo de dispersão urbana, conforme as definições elaboradas por Reis

(2006), ocorre com a formação de áreas cuja urbanização se estende por um vasto

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território, com núcleos urbanos separados no espaço por vazios intersticiais, mas que

mantêm vínculos estreitos entre si, formando um único sistema urbano. A população

passa a adotar novos modos de vida, com maior mobilidade, o que possibilita a

organização da vida cotidiana na escala metropolitana ou intermetropolitana e regional,

abrangendo vários municípios. Ainda segundo esse autor, o modo de vida metropolitano

leva ao que este denominou de “regionalização do cotidiano”.

Com a urbanização dispersa, em curso nessa microrregião, ocorre o

esgaçamento do tecido urbano, com a formação de novos núcleos de diferentes

dimensões na região, interligados pelas redes viária e de comunicação. Novos

empreendimentos são implantados desarticulados dos tecidos urbanos tradicionais dos

municípios (espaços intraurbanos), com infraestrutura e urbanização desconectadas –

dispersas no território regional.

Em 1994, o governo do Estado do Rio de Janeiro e a Prefeitura de Resende

iniciaram negociações com a Volkswagen (VW, atual MAN), que havia anunciado a

intenção de instalar no Brasil sua fábrica mundial de ônibus e caminhões. Segundo os

sociólogos José Ramalho e Marco Santana (2002), a empresa elaborou um extenso

formulário e enviou a diversosmunicípios– num verdadeiro processo seletivo–, primeiro

separando 100, depois 40, 15 e,ao final da competição, reduzindo-sea 2 cidades médias:

Resende e São Carlos14

(SP).

No ambiente econômico e político altamente competitivo da época, a

instalação da Volkswagen em Resende foi um marco importante para a recuperação da

condição industrial do Vale do Paraíba fluminense, possibilitando ao mesmo tempo,

segundo Lima (2006), a reinserção dessa região no movimento econômico e produtivo

do país.

Os fatores decisivos dessa negociação não foram apenas técnicos, mas também

políticos. O município de Resende acabou tendo um papel secundário na negociação,

cabendo ao governo estadual a negociação política e a oferta de incentivos e benefícios

econômicos, que foram articulados com o Governo Federal, como o financiamento pelo

BNDES. Os governos estadual e municipal ofereceram à empresa uma série de

recursos: incentivos fiscais, com a isenção total de impostos estaduais por dez anos,

liberação de impostos municipais por 15 anos e da taxa de água; instalação de

infraestrutura viária; melhoria dos portos para exportação; qualificação da mão de obra,

14 Esta cidade paulista recebeu a fábrica de motores da Volkswagen, inaugurada em 1996.

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entre outros. Além disso, o Grupo Porto Real (privado) propôs doar um terreno de 200

ha sem qualquer contrapartida. Dessa forma, Resende conseguiu vencer a disputa pela

fábrica da VW (LIMA, 2006; OLIVEIRA, 2008).

Neste ínterim, simultaneamente ao anúncio oficial da instalação da fábrica da

VW em Resende, feito pelo estado em 1995, surgiu o movimento pela emancipação do

então distrito de Porto Real15

. Para o sociológico Raphael Lima (2006), a negociação

para a implantação da VW e as possibilidades de crescimento econômico advindas desta

indústria tiveram um papel essencial para a separação de Porto Real, com a

emancipação fazendo parte do jogo político e dos interesses dos atores regionais.

Imagem 1 - Vista aérea da fábrica da Volkswagen em Resende, atual MAN Latin

America16

. Sem data.

A localização da fábrica serviu de “moeda de troca” (RAMALHO;

SANTANA, 2002), com a indústria permanecendo no município de Resende desde que

fosse aceita a separação de Porto Real. Assim foi feito, trocando-se a fábrica da

15 O desejo de autonomia de Porto Real vem desde a década de 1960-70, quando do primeiro desenvolvimento

industrial de Resende, período em que as indústrias químico-farmacêuticas começaram a ser instaladas às margens da

Rodovia Presidente Dutra (LIMA, 2006). 16 Fonte: Site BMB Mode Center. Disponível em: <www.modecenter.com.br/fabrica-da-man-em-resende-atinge-

meio-milhao-de-veiculos-produzidos>. Acesso em: 01 Mai. 2014.

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Volkswagen pela emancipação17

. Dessa forma concretizou-se a separação, alterando-se

o perímetro de Porto Real, com o futuro município abrindo mão de parte de seu

território, 90 ha, e sendo mantido em Resende o terreno para a instalação da fábrica da

VW18

.

Com sua independência, Porto Real iniciou uma estratégica e agressiva política

de atração de investimentos, tornando-se um dos municípios que mais recebe recursos

no estado (LIMA, 2006). Isso levou à rápida modernização do seu parque industrial,

com a diversificação das atividades. Com isso, alterou-se significativamente o perfil

econômico domunicípio, onde predominava a atividade rural até 1996, quando se

destacava a pecuária leiteira.

A Prefeitura de Porto Real, no seu primeiro ano de funcionamento em 1997,

conseguiu a instalação da fábrica da Guardian – grande empresa norte-americana de

fabricação de vidros planos –, que também foi implantada de maneira dispersa no

território, com a planta industrial inaugurada em 1998. A empresa beneficiou-se de

recursos oriundos de fundos de investimentos públicos, além de incentivos fiscais e a

doação de terrenos.

No mesmo ano, o grupo francês PSA Peugeot-Citroën decidiu instalar sua

fábrica no país. Porto Real deflagrou uma “campanha” para a implantação do polo

metalomecânico, pois já contava com a base logística instalada para a VW, com a PSA

constituindo-se na primeira fábrica de automóveis do Estado do Rio de Janeiro. Os

mecanismos de atração dessa indústria foram basicamente os mesmos utilizados com a

Volkswagen. Junto com a indústria, foram implantados ao redor da fábrica diversos

fornecedores, no chamado Tecnopolo I, que posteriormente foi ampliado com o

Tecnopolo II.

As instituições municipais e estaduais voltadas para o desenvolvimento

econômico atuaram na criação do polo metalomecânico, através de legislações e

mecanismos de incentivos a investimentos na região, orientando o crescimento

econômico e a geração de empregos.

17 A emancipação foi confirmada em 5 de novembro de 1995, com o novo município sendo estabelecido em 28 de

dezembro do mesmo ano. Em 1996 foram realizadas as eleições municipais. 18 O limite original do distrito, que era o Rio Paraíba do Sul (que contorna Porto Real), foi modificado e deslocado

para a estrada que separa as plantas industriais da VW (Resende) e posteriormente da PSA Peugeot-Citroën (Porto

Real). O município de Porto Real tem uma área de 50,7 km2.

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Em 1999 foi inaugurada a planta da GalvaSud (atual CSN Porto Real)19

,

produzindo bobinas de aço galvanizado para abastecer, principalmente, as indústrias

automotivas instaladas na microrregião e nos estados de São Paulo, Minas Gerais e

Paraná, além do Mercosul.

Com a implantação dessas indústrias, a arrecadação de impostos em Porto Real

cresceu significativamente, mesmo com todos os incentivos fiscais concedidos às

indústrias. Entre 2007 e 2012, o crescimento da arrecadação de ICMS foi de 132%.

Entre 2001, início do funcionamento da PSA, e 2003, o crescimento do PIB de Porto

Real foi de 1.300%, superior a qualquer município fluminense, segundo Lima (2006). O

PIB em 2010 do município foi de 4,82 bilhões de reais, sendo o 6o maior PIB per capita

do país eo maior do Estado do Rio de Janeiro, com 290.834 reais por habitante20

.

O município de Resende, cidade média que sofreu um grande impacto com as

perdas do antigo distrito de Porto Real e dos seus respectivosinvestimentos, buscou

atrair novos empreendimentos em diferentes áreas da cidade. A Votorantim Siderurgia

(2009)21

, instalada no oeste do município, tem sua produção de aços longos22

agregada à

da antiga Siderúrgica Barra Mansa, do mesmo grupo empresarial e que localiza-se na

cidade média homônima.

Foi também instalada a fábrica de automóveis da nipo-francesa Nissan (2014), próxima

ao polo de Porto Real (leste), e que tem sua produção associada com a linha de

montagem instalada na planta industrial da Renault em São José dos Pinhais (PR).

Em Itatiaia, município que também se emancipou de Resende, em 1988,

ocorreu a expansão da fábrica de pneus da francesa Michelin (2012), seguida pela

instalação da indústria de máquinas pesadas sul-coreana Hyundai (2013), em parceria

com a BMC Brasil Máquinas. Essas plantas fabris estão localizadas no polo industrial

desse município, entre o tecido intraurbano de Itatiaia e Resende, às margens da Via

Dutra e a menos de 20 km da divisa com o Estado de São Paulo. Este é o único

poloindustrial da região que tem acesso ferroviário, sendoprevista a construção de um

19 Essa empresa foi criada como uma jointventure entre a CSN e o grupo alemão ThyssenKrupp, sendo totalmente

adquirida pela CSN em 2003 (LIMA, 2006). 20 Dados tabulados a partir de informações do IBGE e Fundação CEPERJ (Estado do Rio de Janeiro). Ranking do

PIB per capita e avanço do ICMS foram obtidos a partir da reportagem “Porto Real tem o melhor PIB per capita”, do

Diário do Vale, publicada em 26 Dez. 2013. Disponível em: <m.diariodovale.com.br/

views/noticiaInterna.asp?cod=82995&codArea=1>. Acesso em: 01 Mai. 2014. 21 As datas entre parênteses referem-se ao ano de inauguração. 22 Produtos voltados principalmente para a construção civil e mecânica: vergalhões, barras, fio-máquinas e perfis.

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terminal rodoferroviário. Além dessas indústrias, esse polo conta com um centro de

logística e distribuição da Procter & Gamble (2010).

Em 2013 foi anunciada a construção da indústria de automóveis britânica

Jaguar Land Rover em Itatiaia. A concorrência envolveu oito estados, tendo como

fatores decisivos para a escolha do município a presença de fornecedores na região e a

proximidade dos principais mercados consumidores brasileiros, com a possibilidade de

atender a América Latina.

As transformações que levaram à reindustrialização do Vale do Paraíba

fluminense só foram possíveis a partir da adoção por parte do governo brasileiro da

política neoliberal, no início da década de 1990-2000. Foi implementado um conjunto

de medidas macroeconômicas, formuladas por organismos internacionais, que tinham

como objetivo promover políticas de ajuste econômico e social com a realização de

reformas estruturais, justificadas pela necessidade de restabelecer a competitividade e o

crescimento do país.

Isso resultou em profundas modificações institucionais, com o Estado

diminuindo drasticamente sua participação e desregulamentando a economia, retirando-

se em grande parte do processo produtivo, abrindo o mercado nacional e privatizando

empresas – como a CSN. Foram reduzidos os investimentos estatais em

desenvolvimento, em especial na infraestrutura, transferindo-os, em sua maioria, para a

iniciativa privada, atraindo ainda investimentos estrangeiros.

Com isso, alterou-se a organização e a localização da produção no Brasil. Esse

fato, associado à globalização – com a ampliação dos mercados consumidores, maior

intercâmbio de produtos e serviços entre países, acirramento da concorrência – e aos

movimentos de emancipações municipais, a partir da Constituição Federal de 198823

,

teve como consequência a “guerra fiscal”, com estados e municípios buscando atrair

diretamente investimentos externos. Essas alterações influíram no processo de

urbanização, com a reestruturação dos espaços urbanos.

23 Essa constituição de caráter municipalista permitiu a criação de diversos municípios durante a década de 1990-

2000, o que fragmentou politicamente o território. Ela possibilitou ainda um maior repasse de verbas do Governo

Federal para os municípios, utilizando o Fundo de Participação dos Municípios (FPM), em que os repasses dos

recursos são feitos em patamares conforme o tamanho da população. Assim, com os repasses garantidos do FPM, os

municípios podem abrir mão dos impostos, ou parte desses, em troca da instalação dos empreendimentos.

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Nessa conjuntura foi criado pelo governo brasileiro, em 1994, o “Novo Regime

Automotivo”24

, que associado ao acirramento da “guerra fiscal” no começo dos anos

1990 -

2000, possibilitaram o início da reindustrialização do Vale do Paraíba fluminense. Esse

regime automotivo possibilitou a reformulação do setor ao longo dessa década25

.

O mercado nacional foi aberto aos produtos estrangeiros e foram criados

incentivos por parte dos governos federal, estaduais e municipais, de maneira a

estimular os investimentos fora das áreas que já concentravam tradicionalmente a

produção de veículos (RAMALHO; SANTANA, 2002). Assim, teve início no Brasil o

redesenho geográfico dos investimentos e plantas industriais automotivas, que passaram

a ser instaladas em municípios que, na maioria dos casos, não tinham tradição deste tipo

de indústria, gerando a mencionada “guerra” por vantagens para atrair as montadoras

(RAMALHO, 2006)26

.

As indústrias automotivas instaladas no Vale do Paraíba fluminense valeram-se

da lógica de incentivos fiscais, buscando isenções de impostos e vantagens logísticas,

como observado anteriormente. A “guerra fiscal” ocorreu inclusive entre municípios da

mesma região, envolvendo mais diretamente as cidade médias de Volta Redonda e

Resende, além dos antigos distritos de Porto Real e Itatiaia. Com isso, cada nova

possibilidade de investimento na microrregião, seja privado ou público, cria grandes

expectativas de desenvolvimento e provoca a disputa entre os municípios, o que não

favorece a integração regional.

Foram também decisivos para a reindustrialização da região a preexistência da

indústria, com a garantia de fornecimento de aço pela CSN, então recém-privatizada, e

de uma cultura industrial. Contribuiu ainda para isto, o início da operação privada da

Rodovia Presidente Dutra, através de concessão em 1996.

Com o aquecimento da economia e, principalmente, do consumo no Brasil,

ocorrido no final da década passada(2000-2010), mais indústrias e empreendimentos

dispersos surgiram no Vale do Paraíba fluminense. No caso das indústrias

24 Esse regime, criado com o Plano Real, tinha como objetivos: manter em funcionamento as grandes montadoras

existentes no país; reestruturar as empresas brasileiras do setor; atrair novas montadoras e marcas, estimulando a

instalação de novas plantas industriais no país; consolidar o Mercosul e reforçar o papel de liderança do Brasil na

região (RAMALHO, 2006). 25 Segundo Ramalho e Santana (2006), a reestruturação desse setor deve-se à longa crise e à recessão econômica no

mercado interno brasileiro, associada ainda à entrada de concorrentes estrangeiros no país e ao lento abandono da

política de substituição das importações, ocorrido no final dos anos 1980-90 e no começo da década seguinte. 26 Anteriormente as montadoras automotivas, presentes no país desde os anos 1950-60, estavam concentradas no

Estado de São Paulo - principalmente, nos municípios do ABC Paulista e no Vale do Paraíba paulista.

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automobilísticas, pesou na decisão de instalação das novas fábricas o estabelecimento

pelo Governo Federal de um novo regime automotivo chamado de “Inovar-Auto”, que

entrou em vigor no começo de 2013 e valerá até 2017. Esse regime aumentou o IPI27

para veículos importados e com menos de 65% de conteúdo nacional, visando estimular

a implantação de fábricas automotivas no Brasil. Com isso, além das novas indústrias

destacadas anteriormente, foram anunciados, em 2011, investimentos na ampliação das

fábricas da MAN (anteriormente VW)28

e da PSA29

, com conclusão até 2016, como

também a diversificação das atividades industriais na microrregião.

As indústrias instaladas no Vale do Paraíba fluminense a partir da década de

1990-2000 são parte da “nova geografia industrial”, como definida por Castells e Hall

(2001). Esses autores entendem que nenhum país pode prosperar sem um certo nível de

conexão com as fontes de inovação e produção, eque o impulso para a construção de

novos espaços industriais produz uma onda de reindustrialização mundial, que vai

contra os mitos do pós-industrialismo. A nova geografia industrial vincula-se à nova

economia global e informacional, ao processo de globalização, informatização e

comunicação.

Na microrregião, as fábricas instaladas configuram um novo espaço industrial

– que envolve alterações nos padrões de produção e de localização industrial (como

observado anteriormente) –, seguindo a lógica espacial do espaço de fluxos, como

conceituado por Manuel Castells (2012). O espaço de fluxos é o suporte material das

práticas sociais simultâneas e dominantes na sociedade pós-moderna, que são

comunicadas à distância. Ele possui uma nova lógica espacial – dominante –,que está se

traduzindo na manifestação espacial do poder que é preponderante na sociedade em rede

(contemporânea) e resulta em novas formas espaciais.

Como observado por Michael Storper (1990), a substituição do antigo sistema

tecnológico e institucional fordista pelo regime de flexibilidade da produção introduz

um conjunto de novas realidades. Este conjunto configura o novo desenvolvimento

econômico regional e uma nova forma da urbanização, como está sendo observado no

Vale do Paraíba fluminense.

27 Imposto sobre Produtos Industrializados. 28 A MAN Latin America adquiriu em 2009 a VW Caminhões e Ônibus e ambas pertencem ao mesmo grupo

empresarial. 29 Investimentos de 1 bilhão de reais na MAN e 3,7 bilhões na PSA.

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As novas indústrias instaladas na região, com características do período atual

pós-fordista, já foram planejadas e implantadas com base nesses princípios da economia

informacional e global, com suas linhas de montagem projetadas no regime de produção

flexível, modular, envolvendo processos inovadores de produção e gestão, como o

sistema just in time. Nessa forma de produção, são adotados novos vínculos com os

fornecedores – instalados dentro da planta industrial e operando diretamente na linha de

produção –, alterando-se ainda as relações de trabalho. O processo de flexibilização da

produção e das relações de trabalho nas indústrias automotivas da microrregião é

simultâneo à reorganização mundial desse setor industrial.

A produção flexível e sua lógica de implementação espacial, com base no

espaço de fluxos, possibilitam a diminuição da polarização espacial global do

desenvolvimento industrial, incentivando a multiplicação de polos de crescimento

industrial. De modo concomitante, os meios de inovação industrial de alta tecnologia e

dos setores industriais que seguiram em direção à flexibilidade da produção levaram ao

ressurgimento do fenômeno dos polos e distritos industriais, segundo Storper (1990).

Assim, as novas indústrias implantadas nos municípios de Resende, Porto Real

e Itatiaia seguem a tendência de se concentrarem geograficamente em polos industriais,

com o objetivo de reduzir custos e gerar maior produtividade.Esse agrupamento de

empresas e indústrias facilita o encadeamento com as demais empresas e fornecedores,

proporcionando ainda a reunião de mão de obra e de suprimentos. Isso permite maior

rotatividade de estoques e de produção, bem como a redução de custos na contratação e

treinamento da mão de obra e ainda a socialização dos empregados (STORPER, 1990).

As novas fábricas instaladas na microrregião, como também as de seus

fornecedores locais, foram e estão sendo implantadas com formas urbanas dispersas no

espaço regional, gerando por aglutinação, ao longo do tempo, centralidades com os

polos industriais. A concentração e ligação das estruturas industriais urbano-regionais

ajudam na maximização do acesso ao contexto cultural e informacional dos sistemas de

produção, tendo como características comuns funcionarem como nós, que articulam

diferentes redes com intensivas interações: empresariais, de pesquisa, industriais

(produção), acadêmicas, entre outras.

Essas plantas industriais e os polos em que estão instaladas apresentam

características de não-lugares, como definido por Marc Augé (1994), que são pontos de

não permanência e transitórios, conectados pela Via Dutra e seus acessos. Caracterizam-

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se como espaços abstratos, em que não se criam laços sociais e afetivos profundos e

duradouros.

O aumento no número de fábricas automotivas na microrregião fez com que o

conjunto dos municípios de Resende, Itatiaia e Porto Real fosse apelidado de RIP ou

ABC Fluminense, em alusão ao ABC Paulista.

O nível de inovação nas indústrias do Vale do Paraíba fluminense é, em sua

maioria, secundário, pois os departamentos de pesquisa e projeto presentes nessas

fábricas estão conectados globalmente em redes próprias, comandadas por suas

matrizes. Nas indústrias da microrregião são realizadas pesquisas para a regionalização

de produtos, adequando-os aos mercados brasileiro e latino-americano e, em alguns

casos, criando-se produtos regionais.

Porém, há exceções, como o “consórcio modular”, implantado pela

Volkswagen na sua fábrica de ônibus e caminhões em Resende nos anos 1990-2000.

Esta planta industrial foi considerada, à época, uma inovação mundial na forma de

organização da produção, com a divisão de trabalho dentro da planta industrial. Nesse

modelo de fabricação a flexibilização chegou ao extremo, tornados os fornecedores

parceiros no projeto e na construção dos caminhões, com a participação direta na

montagem dos veículos e sendo responsáveis pela fabricação. Posteriormente, até o

controle de qualidade passou a ser terceirizado.

A cadeia de fornecedores sofreu uma mudança radical. Isso inclui, além da

divisão de tarefas na montagem dos veículos, a repartição de investimentos, custos,

responsabilidades e riscos. Isso alterou também as relações de trabalho, normatizando

os padrões de remuneração e benefícios entre os funcionários dos parceiros do

consórcio modular. No entanto, a participação dos trabalhadores no funcionamento da

fábrica não apresentou inovações com o consórcio modular, diferente do que ocorreu

com a organização produtiva.

Outro exemplo de inovação foi o projeto da picape Peugeot Hoggar, veículo

desenvolvido inteiramente no Brasil, no interior da fábrica da PSA em Porto Real. Esta

empresa possui um centro de pesquisa em um edifício à parte, dentro do sítio industrial,

e estabeleceu parcerias com universidades fluminenses e paulistas, neste último caso

com apoio da FAPESP.

As indústrias instaladas na região são integrantes de um sistema global de

produção flexível, sendo partes interdependentes dos meios de inovação espalhados por

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todo o planeta, aumentando ainda mais as sinergias produtivas de maneira a obter maior

produtividade e competitividade. Essas fábricas estão articuladas em redes com outros

polos industriais mundiais, compartilhando e racionalizando a produção, incluindo as

demais fábricas do mesmo grupo empresarial – localizadas no Brasil ou em outros

países –, e ainda os fornecedores – instalados localmente no interior ou ao redor das

plantas industriais, como também espalhados pelo globo.

Já a direção nacional e os departamentos de compras, vendas e marketing

dessas empresas industriais estão localizados majoritariamente em São Paulo, e de lá

reportam-se às suas matrizes nos países de origem, no caso das multinacionais. Dessa

forma, as indústrias dispersas instaladas na microrregião mantêm vínculos estreitos com

a metrópole paulista, que no caso brasileiro exerce a função de comando nacional e

continental, como observado por Santos (1993) e Spósito (2007).

Essas relações de interdependência global podem ser exemplificadas a partir do

caso da PSA30

, que além da fábrica em Porto Real, possui duas outras na Argentina –

em El Palomar (veículos), na Região Metropolitana de Buenos Aires (RMBA), e em

Jeppener (motores e componentes), próxima a essa região metropolitana. Os modelos de

veículos e motores produzidos no Brasil são diferentes dos fabricados na Argentina,

com as linhas de produção sendo complementares. Sua sede latino-americana está

localizada na cidade de São Paulo.

A mão de obra para as novas indústrias foi recrutada, em sua maioria, na

própria região. Como nos revela Ramalho (2006), para a instalação da nova fábrica, a

VW realizou uma pesquisa na região para adaptar seus salários aos existentes no Vale

do Paraíba fluminense, de modo a não “inflacionar” o mercado. A possibilidade de

menores salários e a presença de sindicatos fracos foram considerados também como

fatores positivos para a implantação das novas fábricas fora do Estado de São Paulo,

pela ação sindical no ABC Paulista ser forte.

Com a chegada das novas indústrias, criou-se uma grande expectativa quanto à

oferta de empregos. Tanto em Resende quanto em Porto Real, as demandas de trabalho

foram crescentes, mas não na quantidade imaginada pela sociedade local e anunciada

pelos políticos, então acostumados como o modelo fordista do antigo conjunto CSN-

Volta Redonda estatal. Como as novas indústrias já surgiram estruturadas pela produção

30 O total de veículos fabricados nas duas plantas é de 253.048, sendo 115.302 na fábrica argentina. Dados de 2013.

Fonte: Sites PSA Brasil e Argentina.

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flexível, não geraram um grande número de empregos diretos, por não necessitarem de

mão de obra intensiva.

O bom nível de escolaridade na região deve-se àpresença de escolas técnicas

profissionalizantesem suas cidades médias. Em Volta Redonda destaca-se a Escola

Técnica Pandiá Calógeras (ETPC), fundada em 1944 para a formação dos filhos de

operários da siderúrgica e dirigida até hoje pela CSN, e que oferece diversos cursos

técnicos em atividades relacionadas com a indústria. Em Resende encontra-se a

Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN).

Além disso, aumentou-se a oferta dos cursos de nível superior na região, com a

instalação de um polo da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) em

Resende, implantado nas edificações da antiga fábrica da Kodak (2001). O Campus

Regional de Resende31

está localizado no polo industrial do município e é acessado

diretamente pela Via Dutra, desconectado do espaço intraurbano e sendo um exemplo

de dispersão urbana não industrial.

Em Volta Redonda, o tradicional polo da Escola de Engenharia Metalúrgica da

Universidade Federal Fluminense (UFF) foi ampliado, oferecendo diversos cursos32

. Os

municípios da região contam ainda com muitas universidades particulares33

. Os cursos

oferecidos estão relacionados, em sua maioria, às necessidades industriais da região.

3 - OUTRAS ATIVIDADES DISPERSAS, MODOS DE VIDA E MOBILIDADE

REGIONAL

Na reestruturação produtiva e espacial em curso no Vale do Paraíba

fluminense, com a reindustrialização e dispersão urbana, os empreendimentos

industriais funcionam como catalisadores do processo de ocupação e organização do

território regional, como observado anteriormente. Essas indústrias, por atraírem mão de

obra qualificada e com salários mais elevados, característicos da atividade industrial,

31Nesse campus está instalada a Faculdade de Tecnologia (FAT) e são oferecidos os cursos de graduação e pós-

graduação em Engenharia de Produção, de acordo com a crescente instalação de indústrias no Vale do Paraíba

fluminense. 32 O Polo Universitário de Volta Redonda da UFF possui três unidades: Instituto de Ciências Humanas e Sociais;

Escola de Engenharia Industrial e Metalúrgica; Instituto de Ciências Exatas. Nessas unidades são oferecidos curso de

graduação em diferentes áreas da Engenharia, além de Física, Matemática, Química, Administração, Ciências

Contábeis, Direito e Psicologia; e de pós-graduação em Engenharia Metalúrgica, Modelagem Computacional e

Administração.

33 A maioria dos cursos das universidades particulares são noturnos, muito frequentados por trabalhadores industriais,

facilmente perceptíveis pelos uniformes de trabalho.

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possuem o efeito de atração e multiplicação das atividades comerciais, de serviços e

residenciais na microrregião, gerando, inclusive, novas centralidades. Essas atividades

também são articuladas pela lógica do espaço de fluxos e apresentam características do

processo de dispersão urbana.

Dessa forma, a reestruturação produtiva da região levou ao aumento da

demanda por casas e apartamentos, melhores restaurantes, comércios e serviços

espalhados pelo território regional, como shopping centers, hipermercados, hotéis para

executivos, centros empresariais e educacionais.

Com isso, são gerados também novos empregos nos setores da construção civil

e de serviços, inclusive em atividades turísticas. No entanto, os trabalhadores menos

qualificados da região são subcontratados ou estão em atividades que não necessitam de

especialização.

Os novos equipamentos urbanos localizam-se principalmente nas cidades

médias, ao longo das redes, em vias e linhas conectoras dos espaços de fluxos, como a

Rodovia Presidente Dutra e os acessos viários aos municípios. Eles estão voltados tanto

para o atendimento aos moradores do município-sede, quanto aos da região e aos que

estão de passagem, com implantações desarticuladas do tecido urbano tradicional

(espaço intraurbano).

Em Volta Redonda, cidade média mais populosa da microrregião, esses

equipamentos foram instalados na área de expansão urbana ao sul de seu território, em

seu principal acesso viário (Rodovia dos Metalúrgicos). Há três hipermercados, além de

condomínios e loteamentos. Recentemente foi anunciada a construção do Shopping

Park Sul, empreendimento comercial de grande porte com múltiplos usos. Esse

município já conta com o Sider Shopping (1989), shopping de médio porte localizado

na Vila Santa Cecília (antiga Vila Operária da CSN).

Em Resende, foi instalado no entroncamento entre a Via Dutra e o principal

acesso viário ao município um hipermercado (Spani, 2008) e posteriormente construído

o shopping center da rede fluminense PátioMix (2011), de médio porte e com usos

múltiplos. Eles formam conjuntamente uma centralidade comercial.

A empresa francesa Accor anunciou em 2013 a construção na microrregião de

quatro hotéis da bandeira Ibis, rede hoteleira de baixo custo já presente em São Paulo e

no Vale do Paraíba paulista. Esses empreendimentos serão construídos nas cidade

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médias, junto à Rodovia Presidente Dutra ou em acessos viários, o que ajudará a suprir

a carência de hotéis na região.

Além desses, há diferentes equipamentos urbanos dispersos, como o Hospital

da Unimed (2009) em Volta Redonda, que tem médio porte e alta complexidade de

atendimentos, e o Hospital Regional do Médio Paraíba, localizado no entroncamento da

Via Dutra com o acesso à cidade. Esse hospital está sendo edificado pelo município

(com recursos estaduais) e será de alta complexidade, atendendo aos12 municípios

(âmbito maior que o da microrregião) que formam o Consórcio Intermunicipal de Saúde

do Médio Paraíba (CISMEPA). Com isso, pretende-se diminuir a lotação dos hospitais

existentes no espaço intraurbano de Volta Redonda.

Também em Volta Redonda está prevista a construção do Aeroporto Regional

do Vale do Aço, articulado com o novo terminal rodoviário interestadual e tendo acesso

à Via Dutra.

Em Resende, a partir da reindustrialização, teve início uma forte expansão

urbana no oeste do município. Surgiram uma série de loteamentos com casas

autoconstruídas e conjuntos habitacionais para as classes de renda média-baixa e baixa,

na região conhecida como “Grande Alegria”. As áreas de dispersão urbana de baixa

renda no oeste desse município estão, em sua maioria, em terrenos planos, enquanto os

loteamentos e condomínios voltados para a atendimento das faixas de renda média-alta

e alta localizam-se, em grande parte, nas franjas dessas áreas, nas encostas dos morros.

Em 2008 foi terminada uma ponte sobre o rio Paraíba do Sul, criando um novo acesso

direto à cidade –Acesso Oeste.

Com essa conexão direta à Via Dutra e a presença da siderúrgica, a zona oeste

do município foi ainda mais ampliada, num processo de dispersão urbana com uso

predominantemente residencial, repetindo a malha urbana típica de áreas residenciais.

Não há articulação direta do tecido dessa área com o espaço intraurbano do centro da

cidade. A contínua expansão urbana no vetor oeste pode, no futuro, levar à conurbação

de Resendecom Itatiaia.

Os projetos habitacionais do programa Minha Casa Minha Vida em Volta

Redonda e Resende também estão sendo implantados com formas urbanas dispersas,

localizados nos extremos dos territórios municipais, próximos às estradas regionais.

Recentemente houve o aumento na implantação de loteamentos e condomínios

fechados de médio e grande porte em Resende e Volta Redonda, muitos com serviços,

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clubes de lazer e atividades esportivas.Esses são utilizados como primeira residência e

apresentam características que lembram as gated communities norte-americanas. Nessas

cidades médias foram instalados os condomínios fechados da “grife” imobiliária

Alphaville, com os lotes residenciais e comerciais rapidamente vendidos.

No tecido urbano consolidado das cidades médias de Volta Redonda, Resende

e, em menor proporção em Barra Mansa, como também nas bordas do espaço

intraurbano, está ocorrendo uma intensa verticalização. Os lançamentos imobiliários

ocorrem tanto por construtoras locais, quanto pelas de grande porte com atuação

nacional, vindas de fora da região.

As múltiplas atividades urbanas dispersas pela microrregião são induzidas e

estruturadas a partir da Rodovia Presidente Dutra e de seus entroncamentos viários e

estradas que dão acesso ao tecido urbano dos municípios. Isso tem levado amodos de

vida de grande mobilidade, com características regionais e semelhantes aos existentes

nas metrópoles.

As relações sociais e os modos de vida, antes organizados basicamente no

interior das cidades, tornaram-se dispersos e estruturados regionalmente, orientados de

acordo com os interesses globais das novas indústrias, que são estranhas aos elementos

preexistentes na microrregião. Para a maioria dos habitantes tornou-se comum morarem

num município, trabalharem em outro e estudarem ou se divertirem em um terceiro. No

entanto, a localização e acessibilidade dos equipamentos urbanos dispersos e,

principalmente, das áreas residenciais dispersas, interferem na qualidade de vida da

população. A mobilidade dos mais ricos e a imobilidade dos pobres afeta diretamente os

modos de vida e as possibilidades de trabalho e renda (SPÓSITO, 2007).

As dinâmicas urbanas e regionais, assim como as formas urbanas, tornaram-se

mais complexas, intensificando as inter-relações entre distintas escalas espaciais,

internas e externas ao Vale do Paraíba fluminense: intraurbana, regional e

extrarregional.

A Rodovia Presidente Dutra possui cada vez mais características de via urbana

no trecho que atravessa a região, com congestionamentos entre Volta Redonda e

Resende durante a semana, pela manhã e no final da tarde (horários de rush),

coincidentes com a entrada e saída da maioria dos empregados das indústrias dispersas.

Em grande parte desse trecho não há vias marginais, o que faz somar o tráfego

rodoviário pesado, principalmente de grandes caminhões, com o urbano. Ao mesmo

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tempo que a Via Dutra serve ao tráfego urbano-regional, ela é utilizada como principal

meio de conexão entre as regiões metropolitanas de São Paulo e do Rio de Janeiro.

Além do intenso fluxo da Via Dutra, destaca-se a forte movimentação nas

rodovias: Lúcio Meira (BR-393) entre Três Rios, na divisa dos estados do Rio e Minas

Gerais, e os municípios de Volta Redonda e Barra Mansa, principalmente de cargas; dos

Metalúrgicos (VR-001), com o trânsito urbano. Nesta última rodovia, há um grande

fluxo de veículos entre o tecido intraurbano de Volta Redonda e os empreendimentos

comerciais dispersos.

Os limites da dispersão urbana nessa microrregião são definidos pelas

distâncias a serem percorridas facilmente pelos automóveis e ônibus fretados,

semelhante ao observado por Robert Fishman (1987) em Los Angeles e por Reis (2006)

em São Paulo. As divisões político-administrativas dos municípios não são definidoras

da dispersão, tendo-se como únicos limitadores a Serra das Araras, a sudeste dessa

região, e o pedágio na Via Dutra, a oeste em Itatiaia, próximo à divisa com o Estado de

São Paulo34

.

A reestruturação produtiva e espacial, com a reindustrialização em curso no

Vale do Paraíba fluminense, vem provocando transformações nas relações sociais e

econômicas, alterando a matriz de desenvolvimento dos municípios da microrregião.

Isso pode ser comprovado a partir da análise do Produto Interno Bruto (PIB) da região e

dos seus municípios.

A partir do estudo do PIB do Vale do Paraíba fluminense no período entre os

anos de 1999 e 2010, observou-se que ocorreu uma transição na atividade

preponderante, com a maior concentração do PIB nas atividades de comércio e serviços

(incluindo a administração pública), seguido pela indústria, que dominava

anteriormente. O PIB da região em 2010 foi de 26,66 bilhões de reais, com 44,09%

referente ao comércio e serviços e 41,68% à indústria.

Examinando os números de 2010 relativos aos municípios da microrregião,

percebeu-se que o PIB regional é bastante desigual, com as cidades médias de Volta

Redonda concentrando 34,4% e Resende 24%, seguido por Porto Real com 18%, que

está à frente de Barra Mansa com 12%. Estes quatro municípios concentram a maior

34 Esse pedágio, alvo de contenda judicial, não é tarifado para os veículos emplacados em Resende, já que separa o

centro desse município do seu distrito de Engenheiro Passos.

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parte do PIB regional, com os outros cinco municípios somados representando apenas

11,4% da microrregião.

O crescimento desses quatro municípios ocorreu em ritmos diferentes, com

alterações na composição desse indicador da atividade econômica. No período 1999-

2010, nas cidades médias de Volta Redonda e Barra Mansa o PIB das atividades de

comércio e serviços ultrapassou o industrial. Os dados de 2010 confirmam essa

tendência: Volta Redonda com 46,8% do seu PIB nas atividades de comércio e serviços,

incluindo a administração pública, e Barra Mansa com 63%35

. Já Resende e Porto Real

têm seu PIB concentrado na indústria, respectivamente com 52,3% e 49,6%.

Os dados apresentados comprovam não a desindustrialização das cidades

médias que,no passado, concentravam as indústrias – Volta Redonda e Barra Mansa,

antigas centralizadoras da polarização regional –, mas sim, a transformação dessas em

polos de comércio e serviços, com a implantação de atividades dispersas. Volta

Redonda continua na liderança do PIB da região, por ter maior diversidade de atividades

econômicas e maior população.

Este município abriga a planta principal da CSN, maior indústria da

microrregião, que, além de ampliar a produção, instalou no interior de sua planta

industrial uma fábrica de cimento (2009) para aproveitar a escória siderúrgica e

recentemente inaugurou uma instalação para a fabricação de aços longos (2014). A

manutenção do desenvolvimento dessa cidade média pode ser confirmada pelos

números absolutos de 2010 – o PIB industrial de Volta Redonda foi de 3,53 bilhões de

reais, enquanto o de Resende foi menor, com 3,35 bilhões, apesar desse último

município ter mais da metade do seu PIB na atividade industrial.

Ao mesmo tempo que a microrregião se reindustrializa nesses municípios,

incluindo ainda Itatiaia, o comércio e os serviços mais desenvolvidos da microrregião

(com maior valor agregado) concentram-se em Volta Redonda. Esta cidade média

possui atividades especializadas – centros médicos, universidades, comércio de maior

padrão –, atraindo moradores das demais cidades e reforçando o seu caráter de polo

regional.

4: CONSIDERAÇÕES FINAIS

35 Mesmo sem contar com a administração pública, o PIB de comércio e serviços desses municípios é maior que o da

atividade industrial.

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Hoje, o Vale do Paraíba fluminense apresenta-se com um conjunto de novas

realidades, evidenciando profundas transformações em seus processos sociais. A

microrregião caracteriza-se por um novo desenvolvimento econômico-regional e por

formas urbanas dispersas, alterando-se a configuração e a escala dos espaços urbanos,

com modos cotidianos que se desenvolvem regionalmente.

As transformações provenientes da reestruturação produtiva e espacial foram

acompanhadas pelo aumento da renda nas cidades que receberam as novas indústrias,

mudando-se o perfil dos municípios dessa microrregião. O maior percentual do PIB

industrial em Resende e Porto Real demonstra o processo de reindustrialização do Vale

do Paraíba fluminense. Os dados apresentados comprovam a reestruturação produtiva

da microrregião e as consequentes alterações nas relações econômicas e sociais, que são

rebatidas no espaço regional.

A reindustrialização dessa microrregião fluminense, iniciada nos anos 1990-

2000, é parte do processo de desconcentração-concentrada da indústria, antes muito

concentrada na Região Metropolitana de São Paulo. As indústrias do Vale do Paraíba

fluminense possuem estreitas relações com a metrópole paulista e com o capital

internacional, como observado anteriormente. No entanto, a reindustrialização dessa

microrregião ocorre somente duas décadas depois de iniciada no estado paulista.

No trabalho foi evidenciada a conformação e o desenvolvimento do processo

de dispersão urbana na microrregião, que ocorre de maneira crescente e abrange as

atividades industriais – origem da dispersão –, como também as demais atividades

urbanas. Elas são articuladas pela lógica do espaço de fluxos e suas formas urbanas

estão dispersas no território regional.

Nessa lógica, as hierarquias territoriais e do trabalho podem ser transformadas

rapidamente, conforme determinados setores industriais expandem-se mundialmente ou

a concorrência entre empresas é intensificada. Essa mesma lógica leva à estruturação de

uma hierarquia da inovação e da produção, que são articuladas em redes globais, na qual

as indústrias desta região estão inseridas. No entanto, é preciso chamar a atenção para a

possibilidade oposta, de retração industrial, que pode acontecer devido às oscilações

econômicas, políticas e normativas, tendo como efeito o enfraquecimento de toda a

microrregião.

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As antigas formas urbanas e modos de vida do período industrial fordista, que

eram muito presentes na microrregião, modificaram-se com a reestruturação produtiva e

espacial, com formas urbanas dispersas e modos de vida que passam a ocorrer na escala

regional. A proximidade relativa das formas urbanas concentradas e dispersas na

microrregião, essas últimas representativas do período de desenvolvimento atual – pós-

fordista –, estabelece um forte contraste que torna evidente e denuncia as novas formas

de urbanização e industrialização, como também os processos sociais envolvidos.

Observa-se que, simultaneamente ao surgimento das novas indústrias,

implantadas com formas dispersas, e ao crescente cotidiano regional, o antigo centro

polarizador fordista – concentrado na CSN e na conurbação das cidades médias de

Volta Redonda e Barra Mansa – foi sendo deixado em segundo plano. Estes municípios

passam a receber, em grande parte, os benefícios indiretos e os ônus dessa nova onda de

industrialização na microrregião.

O município “vencedor” da competição por um determinado empreendimento,

como uma grande indústria, recebe os benefícios sociais e econômicos, além do

eventual “bônus” político para o administrador que conseguiu o investimento. Contudo,

os ônus do novo empreendimento são distribuídos por toda a região e, especialmente,

para as cidades médias, pois os trabalhadores – ao terem modos de vida regionais –, vão

morar, utilizar a infraestrutura e os equipamentos urbanos principalmente desses

municípios.

Há cada vez mais uma relação de interdependência entre os municípios da

microrregião, que vem ampliando-se ao longo dos anos, mesmo não existindo quase

nenhuma articulação institucional entre eles36

. Essa interdependênciaé reconhecida

pelos gestores municipais, como foi observado por Oliveira (2008). A falta de

entendimento entre os municípios dessa região não permite a elaboração de um

planejamento regional. As cidades médias de Volta Redonda e Barra Mansa, que são

conurbadas, elaboraram seus Planos Diretores de Desenvolvimento Urbano no mesmo

período de tempo (em 2006), e ainda assim não houve nenhuma iniciativa formal no

sentido de planejar conjuntamente seus territórios e continuidades urbanas.

36 As únicas articulações regionais existentes são: Consórcio Intermunicipal de Saúde do Médio Paraíba (CISMEPA),

criado em 1998 e formado por 12 municípios da região (já mencionado); Consórcio Intermunicipal de Segurança com

Cidadania do Médio Vale do Paraíba (CISEGCI), composto por 13 municípios; Comitê da Bacia Hidrográfica do

Médio Paraíba do Sul (CBH-MPS), composto pelos municípios e empresas que englobam o terço médio fluminense

do Rio Paraíba do Sul.

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Sem o planejamento urbano e regional, abrem-se lacunas para a ação do

mercado imobiliário. Valendo-se das fragilidades institucionais, os promotores

imobiliários atuam como planejadores privados, promovendo a dispersão urbana. Este

processo é estruturado numa escala mais ampla do que a do território municipal.

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O PROCESSO DE REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E SEUS

REBATIMENTOS SOBRE A ATIVIDADE INDUSTRIAL NA CIDADE DE

MOSSORÓ – RIO GRANDE DO NORTE – BRASIL.

Leonardo da Silva Galindo37

Resumo

O processo de reestruturação produtiva tem impulsionado usos ao território.

Partindo desta premissa, o presente trabalho tem como objetivo analisar como esse

processo tem ocorrido em Mossoró/RN, tendo em vista seus efeitos no setor industrial

do município. Os procedimentos metodológicos adotados incluema realização de

pesquisa bibliográfica, assim como a coleta e análise de dados secundários em órgãos

como IBGE e FIERN, os quais serão apresentados na forma de gráficos, quadros e

cartogramas. As análises realizadas revelam que se destacam em Mossoró os ramos da

indústria vinculados a atividade extrativa (petróleo e sal marinho) e da indústria de

transformação, de modo particular o setor de alimentos. A dinamização destes ramos

tem corroborado para aumento da interação espacial de Mossoró com outros lugares

para além dos limites do RN.

Palavras-Chave: Mossoró/RN. Reestruturação Produtiva. Indústria.

1. INTRODUÇÃO

Nas últimas décadas do século XX o município de Mossoró passou por várias

transformações, dentre as quais se destacam o crescimento acelerado de sua população e

37

Estudante de graduação em Geografia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - UFRN. Faz

parte do Grupo de Pesquisa Unidade Interdisciplinar de Estudos Sobre a Habitação eEspaço Construído.

Este trabalho resulta do desenvolvimento do Programa de Cooperação Acadêmica

PROCAD/CASADINHO (UFRN/FCT-UNESP-Presidente Prudente/SP) “A reestruturação produtiva e a

dinâmica urbano-regional do Rio Grande do Norte (1990-2010)”, a partir do qual foi elaborado o projeto

de pesquisa intitulado: O Desenvolvimento Industrial do Rio Grande Do Norte no Contexto da

Reestruturação Produtiva Entre 1990 e 2010. E tem como orientador o Professor Dr. Francisco

Fransualdo de Azevedo.

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a intensificação do processo de urbanização, decorrentes em parte do surgimento de

novas atividades econômicas e modernização de outras, que demandaram por sua vez

investimentos em infraestruturas e deram novos usos ao território. Nesse sentido, Santos

e Silveira (2004, p. 21) observam que

“O uso do território pode ser definido pela implantação de infraestruturas, para

as quais estamos igualmente utilizando a denominação de sistemas de

engenharia, mas também pelo dinamismo da economia e da sociedade.”

Dessa forma, destaca-se neste trabalho a importância de compreender os novos

usos do território, no contexto do processo de reestruturação produtiva e seus

rebatimentos no setor industrial em Mossoró. A partir da coleta de dados secundários e

pesquisa bibliográfica ficou evidente que a atividade industrial, especialmente a indústria

extrativa é de significativa importância para a economia do referido município, e as

mudanças pelas quais têm passado decorrentes do processo de reestruturação produtiva

provocaram transformações na configuração do território, na medida em que estimularam

a criação de materialidades, muitas delas construídas diretamente pelo Estado, para

atender as demandas e exigências impostas pelas atividades econômicas modernas.

Mossoró localiza-se no oeste do estado do Rio Grande do Norte (RN) entre as

capitais Natal e Fortaleza. Em 2010 sua população era de 259.815 pessoas, das quais

91,31% residiam em área urbana. Em 2012, Mossoró apresentava um Produto Interno

Bruto (PIB) de R$ 4.493.958.000,00, equivalente a 11,36% do total do RN.

Considerando-se apenas o setor industrial o valor chega a R$ 1.490.121.000,00

equivalente 18,6% da produção industrial do RN, sendo inferior apenas ao registrado pela

capital do estado, Natal. (IBGE, 2014). As principais atividades

econômicas desenvolvidas em Mossoró estão relacionadas à indústria extrativa (sal

marinho e petróleo) além da fruticultura irrigada(Rocha 2005; Elias e Pequeno 2010).

Este trabalho se delimita apenas ao setor industrial, compreendendo tanto a atividade

extrativa quanto a Indústria de Transformação. Os procedimentos metodológicos

utilizados incluem pesquisa bibliográfica, coleta e análise de dados secundários em

órgãos como o IBGE e a Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte

(FIERN). Os dados coletados junto a FIERN integram o Cadastro Industrial do

estado do Rio Grande do Norte (FIERN, 2014), que está em constante atualização, onde

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se encontram informações a respeito da distribuição dos estabelecimentos industriais e

número de empregos por estabelecimento a nível municipal, bem como o endereço e

telefone de cada estabelecimento. Os dados serão apresentados em forma de quadros,

gráficos e cartogramas. Inicialmente discutiremos a respeito do processo de

reestruturação produtiva: como ele tem afetado a indústria extrativa, contribuindo para a

instalação de novas materialidades em Mossoró ao estabelecer novas dinâmicas

territoriais. Posteriormente discutiremos como esse processo contribuiu para a formação

de uma recente indústria da transformação baseada principalmente no setor de alimentos,

terminando o texto com breves considerações finais.

2: REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E INDÚSTRIA: A INSERÇÃO DE

MOSSORÓ NA ECONOMIA GLOBAL

No início do século XX Mossoró tinha como principal atividade econômica a

extração de sal marinho, além de setores relacionados ao beneficiamento de gêneros

agrícolas, dentre os quais se destacavam a cera de carnaúba e o algodão arbóreo (Elias e

Pequeno, 2010, p.110). No final do mesmo século Mossoró passou por várias

transformações em sua estrutura econômica, com o fim de algumas dessas atividades (o

cultivo e beneficiamento do algodão para a fabricação de óleo, por exemplo) e a

modernização de outras como a extração de sal e o surgimento de novos segmentos

relacionados à exploração de petróleo e gás natural e a fruticultura irrigada. Pode-se

dizer que tais mudanças ocorrem sobre a égide da expansão do sistema capitalista,

contexto nos quais diversos lugares tem se articulado ao sistema produtivo global

conforme explicitado por Bomtempo (2011, p. 54)

“Na atual fase do capitalismo, presenciamos a expansão do capital, sobretudo

dos grandes grupos empresarias, na escala global. Esse processo redefine o

papel desempenhado pelos lugares, até então articulados à escala local e

regional. A instalação de novos equipamentos vinculados à economia mundo

permite aos lugares a ampliação de papéis, tanto na divisão territorial do

trabalho, como também na rede urbana em que está inserido e que mantém

relações.”

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Nesse contexto, com o surgimento da indústria extrativa, Mossoró amplia sua

escala de articulação, anteriormente restrita ao local e regional para a nacional e mesmo

internacional. Com isso tem-se como exemplo o sal marinho produzido no município que

chegas às indústrias química e de alimentos da região Sudeste e que também é exportado

para outros países; máquinas e equipamentos importados de outras áreas do Brasil e do

Mundo para a exploração do petróleo; e fora do setor extrativo é exemplo a exportação de

frutas tropicais, principalmente o melão e a castanha de caju.

Exemplo do aumento dessa articulação que ultrapassa as escalas local e regional

pode ser observado no gráfico 1, que apresenta a evolução da exportação e importação de

produtos atribuída a Mossoró. Se no ano 2000 a exportação foi inferior a US$ FOB 40

milhões, a partir de 2009 esses valores estão em torno de US$ FOB 80 milhões (embora

entre 2005-2008 aproximaram-se ou mesmo ultrapassaram os US$ FOB 100 milhões). Já

a importação que não chegou a US$ FOB 10 milhões em 2000 estava em torno de US$

FOB 30 milhões em 2013(MDIC, 2014).

O melão se destaca como principal produto exportado em quase todos os anos

analisados, mas também é significativo à comercialização da castanha de caju e produtos

da atividade extrativa mineral como o sal marinho. Os principais destinos das exportações

são Estados Unidos e União Europeia (principalmente Holanda), que absorvem mais de

80% do valor exportado (melão e castanha de caju) seguidos pela Nigéria na África

(importa sal marinho) (MDIC, 2014). Dentre os principais produtos importados no

período estão: caixas de papel, polietileno, polipropileno e milho. Quanto à origem das

importações totais destacamos os Estados Unidos, Argentina, Espanha, Itália, Índia,

China e Reino Unido. (MDIC, 2014).

Gráfico 1: Mossoró - Evolução da Exportação e Importação - 2000 – 2013 (US$ FOB).

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É importante lembrar que no Rio Grande do Norte (RN) e especificamente em

Mossoró tais mudanças se deram com a atuação direta do Estado na medida em que este

foi responsável por dotar o território de infraestruturas tais como portos, melhoramento

de rodovias e infraestrutura hídrica (barragens, açudes, perímetros irrigados), de modo

que possibilitou acelerar a circulação de fluxos dando novos usos ao território.

De acordo com a FIERN (2014) o pessoal ocupado no setor industrial do Rio

Grande do Norte em 2012 chegava a 292.000 pessoas, equivalente a 20,3% da população

economicamente ativa do estado. Com base nos dados referentes ao número de

empregados e estabelecimentos industriais no RN para 2014, observa-se que os setores

mais significativos do estado estão relacionados à indústria extrativa e também aos

chamados ramos tradicionais da indústria de transformação: alimentos, bebidas, têxtil,

artigos de vestuário e de acessórios. Em 2014 a atividade extrativa

mineral e a indústria de transformação empregaram formalmente em Mossoró 12.868

pessoas distribuídas 652 estabelecimentos industriais (FIERN, 2014). No que se refere à

indústria extrativa estavam sediados no município 33,56% dos estabelecimentos (99) e

47,4% dos empregos (6.669) em relação ao total do RN (cartograma 1). Dentro desse

grupo a extração de petróleo e gás natural e atividades de apoio à extração concentravam

em Mossoró 36 estabelecimentos (62,07% do total do RN) e 5.036 empregados (73,38%).

Em relação à extração e refino de sal marinho eram 55 estabelecimentos (49,11%) e

1.522 funcionários (35,3%) (FIERN, 2014).

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Cartograma 1: Número de Estabelecimentos e Empregados da Indústria Extrativa Por

Município do Rio Grande do Norte (2014).

No entanto, até os anos 1960 a exploração de petróleo não estava estabelecida em

Mossoró e a extração de sal era uma atividade artesanal. Sendo assim, veremos a seguir

como essas atividades se desenvolveram.

2.1. A REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA E A EXTRAÇÃO DE SAL EM

MOSSORÓ

Comumente a atividade salineira tem sido desenvolvida em áreas nas quais os

elementos geoambientais, dentre os quais se destacam o clima e o relevo, favorecem a

ocorrência de elevadas taxas de evaporação, condição essencial para a produção do sal

marinho. Em Mossoró a ocorrência e dinamização desta atividade, possui estreita relação

com a ocorrência do clima semiárido, o qual se caracteriza dentre outros fatores pelos

baixos índices de umidade do ar e precipitação pluviométrica, associadas às altas

temperaturas durante todo o ano, além de relevo plano e sujeito a ação das marés nas

margens dos rios Carmo e Mossoró (ROCHA, 2005).

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A exploração do mineral tem início em meados do século XVIII associado às

oficinas de carne seca, na medida em que o sal possibilitava a conservação dos alimentos

(FELIPE, et al, 2010). Segundo os autores citados, com a comercialização da carne seca

para Paraíba, Pernambuco, Bahia, Minas Gerais e Rio de Janeiro, também torna-se viável

economicamente a exportação do sal in natura (enviado nas mesmas barcaças que a carne

seca, barateando consideravelmente o preço do frete) para outras regiões da Colônia.

No entanto, como o sal extraído do RN tornou-se mais competitivo em relação ao

preço do que o produzido por Portugal, este proibiu a comercialização do sal coletado no

RN para outras regiões da Colônia(FELIPE, et al, 2010). Além disso, os autores

destacam que o estabelecimento das charqueadas no Rio Grande do Sul, associado à

proibição das oficinas de carne seca no RN levou consequentemente a diminuição do

consumo do mineral. Com isso, de meados da década de 1790 até

1802, o sal coletado no RN abasteceu somente o mercado local ganhando novo impulso

a partir desse último ano devido ao fim do monopólio do sal pela metrópole a abertura

dos portos em 1808 (FELIPE, et al, 2010). Para Maia (2011, p. 32) “as indústrias

salineiras do estado do RN sucedem o período colonial”, uma vez que o mineral “não era

produzido, mas apanhado” (CARVALHO JÚNIOR, 1982, apud MAIA, 2011, p. 31).

Nesse sentido, ressalta-se que do início do século XIX até meados dos anos 1960 a

extração do sal no RN praticamente não passou por grandes mudanças técnicas,

caracterizando-se como uma atividade artesanal, na qual eram empregadas poucas

ferramentas como a pá, enxada e carro-de-mão (Maia, 2011).

Azevedo (2013, p. 114) entende a reestruturação produtiva como:

“um conjunto de transformações de caráter estrutural, organizacional e

técnico, fazendo-se refletir no espaço geográfico em sua totalidade. Tais

transformações se articulam e se configuram como alternativas de superação

das crises cíclicas do sistema capitalista para a ampliação/reprodução do

próprio capital, afetando sobretudo o mundo do trabalho, com contornos

muito bem definidos, especialmente nos países subdesenvolvidos, onde o

Estado do bem-estar-social ainda apresenta sérios problemas, limites e

vulnerabilidades.”

Nesse sentido, a partir da segunda metade do século XX a produção de sal em

Mossoró passa por um processo de modernização, no contexto do processo de

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industrialização do país, o qual acentuou-se, sobretudo na região Sudeste. O crescimento

das indústrias química e de alimentos demandava aumento na produção de sal, o que

levou ao Brasil a importar o produto (ROCHA, 2005). A mecanização da produção de sal

em Mossoró permitiu o aumento da produtividade e consequentemente da quantidade

produzida, que possibilitou reduzir a importação.

Com a produção mecanizada, a restruturação do setor salineiro resultou em

grande número de demissões, e concentração econômica, na medida em que as pequenas

empresas deram lugar a grandes corporações de capital nacional e também internacional.

Além disso, tal modernização foi resultado da ação do Estado uma vez foi em parte

financiada com recursos da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste –

SUDENE (ELIAS; PEQUENO, 2010). Exemplo do processo de

concentração econômica pode ser observado no quadro 1 em que apresenta-se as 10

maiores empresas em relação ao número de empregos do setor de extração de sal marinho

em Mossoró. Elas respondiam por 68,2% do número de empregados na indústria salineira

do município, ao passo que outras 11 empresas não registraram empregos formais e

outras 12 tinham entre 1 e 5 funcionários (FIERN, 2014). Em relação a produção, apenas

a empresa Salinor responde por 45% do sal produzindo no país. A empresa possui dois

estabelecimentos em Mossoró com capacidade de produção de 1,3 milhões de toneladas

de sal por ano e outro estabelecimento no município de Macau, cuja capacidade é de 1

milhão de toneladas de sal (SALINOR, 2014).

Quadro 1: Maiores Empresas de Extração e Refino de Sal Marinho em Relação ao

número de Empregados - Mossoró (2014).

EMPRESA N ° DE EMPREGOS FORMAIS

1 SALINOR – SALINAS DO NORDESTE S.A 310

2

CIMSAL COM E IND DE MOAGEM E REFINAÇÃO STA

CECÍLIA LTDA 179

3 SOCEL SOCIEDADE OESTE LTDA 100

4

REFIMOSAL REFINAÇÃO E MOAGEM DE SAL SANTA

HELENA LTDA. 81

5

REFINORTE - REFINARIA DE SAL DUNORTE INDUSTRIA&

COMERCIO LTDA 72

6 R DE HOLANDA TERCEIRO 66

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7 L PRAXEDES GOMES 59

8 R DE HOLANDA NETO 58

9 PROSSAL SALINAS POTIGUAR LTDA 57

10 SALINEIRA SÃO CAMILO LTDA 56

- TOTAL 1.038

Fonte: Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte – FIERN, 2014.

A reestruturação não se limitou apenas ao processo produtivo, mas exigiu a

construção de novas materialidades de modo a permitir o aumento do fluxo de sal. Nesse

sentido dá-se a construção do Porto Ilha de Areia Branca (imagem 1) em alto mar,

exclusivamente voltado para o escoamento do sal, e que atende a produção de vários

municípios produtores no litoral noroeste do RN (MAIA, 2011).

Imagem 1: Porto Ilha de Areia Branca

Fonte: Construmac, 2010.

De acordo com a Companhia Docas do Rio Grande do Norte (CODERN, 2014), o

embarque de sal no porto apresentou variação de aproximadamente 1 a 1,9 milhões de

toneladas entre 2008 e 2013. Segundo ROCHA (2005), o porto ilha de Areia Branca

recebe principalmente a produção salineira de municípios como Areia Branca, Grossos e

Porto do Mangue. Enquanto o escoamento do sal produzido em Mossoró é realizado

principalmente por modal rodoviário. No entanto, também são registrado embarques de

sal provenientes de Mossoró conforme dados da CODERN (2014), assim como parte da

produção de outros municípios é refinada e vendida em Mossoró (GOMES, 2005), o que

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evidencia como essa atividade articula diversos municípios do RN a outras áreas do

Brasil e do mundo. Se por um lado, a reestruturação da produção salineira

contribuiu para estabelecer novas interações espaciais, em contrapartida provocou

mudanças dentro da própria cidade levando a transferência dos estabelecimentos de

refino do sal, antes localizados no centro para as margens das rodovias, conforme observa

Gomes (2005):

“houve também o descarte de formas edificáveis que estavam, na cidade, a

serviço da salinicultura. Grandes depósitos de armazéns abrigavam o sal e

seu exército de empregados. Esses depósitos e armazéns foram erguidos

principalmente nos bairros ‘Alto da Conceição’, ‘Doze Anos’ e ‘Centro’ [...]

Somado a isto, o solo urbano havia se valorizado, tornava-se antieconômico

manter essas construções, pois ofertas de compra eram feitas aos seus

proprietários, a fim de esses armazéns darem lugar a novas formas e outros

conteúdos, pois as funções que desempenhavam não requisitavam mais

aquele espaço. Alguns prédios foram totalmente destruídos, outros apenas

preservaram a imponente fachada, quando assim a nova função exigia para

impressionar. Em seu lugar surgiram: shoppings, lojas, restaurantes, agências

bancárias etc. (p. 80, grifo nosso).”

Elias e Pequeno (2010) salientam as tensões sociais resultantes do desemprego

provocado pela mecanização da extração de sal marinho. Para os autores anteriormente

mencionados, o grande número de desempregos do setor foi em parte absorvido pela

construção civil, tendo em vista que a atividade estava em crescimento na cidade em

função dos projetos de habitação graças aos recursos disponibilizados pelo Sistema

Financeiro de Habitação (SFH). Além da ação do Estado, o crescimento da construção

civil também estava atrelado a uma série de fatores dentre os quais destacamos a

instalação de outra moderna indústria extrativa, desta vez associada à extração de

petróleo e gás natural.

2.2. A EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO EM MOSSORÓ/RN NO CONTEXTO DA

REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA

A extração e petróleo e gás natural tem início no RN em meados da década de

1970 com a produção em mar e posteriormente em terra (ALVES, 2012). Atualmente o

mineral é extraído em 15 municípios localizados no oeste do estado e no litoral norte. A

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produção é realizada pela empresa Petróleo Brasileiro S/A (PETROBRÁS) que possui

três subunidades administrativas no RN nos municípios de Natal, Alto do Rodrigues e

Mossoró. Neste último a subunidade é responsável pela extração nos municípios de

Mossoró, Serra do Mel, Areia Branca, Felipe Guerra, Gov. Dix-Sept Rosado, Caraúbas,

Upanema e Apodi. (PETROBRÁS 2012, apud ALVES 2012, p.138).

A extração de petróleo no estado pode ser

entendida no contexto da reestruturação produtiva em curso a nível mundial, na medida

em que se sabia da existência do mineral no RN desde os anos 1950 (ALVES, 2012).

Nesse sentido, a mudança na conjuntura internacional com os chamados choques do

petróleo na década de 1970 levando ao aumento do preço do produto tornou viável

economicamente a extração do mineral no RN. A extração do produto se tornou possível

graças ao desenvolvimento tecnológico do setor que possibilitou a extração no mar. A

respeito de como esse processo se deu no estado atrelado a indústria petrolífera, Alves

(2012, p. 8) observa:

“A atividade petrolífera implantou-se no território norte-rio-grandense em um

momento marcado pela reestruturação produtiva de diversos segmentos

econômicos. O setor petrolífero passou a atuar cada vez mais atrelado às bases

científicas e informacionais, tendo em vista o aumento da produtividade. A

presença desse circuito demandou ao território, mais especificamente a

Mossoró, uma diversa estrutura organizacional que ocorre desde o vasto

sistema nacionalmente integrado de corporações comerciais privadas até as

pequenas empresas, todas elas relacionando-se diretamente ou indiretamente

com a PETROBRAS. Os fluxos entre empresas, cujas sedes localizam-se em

estados e mesmo países distantes, têm gerado um movimento contínuo de

produtos, pessoas, informações e ideias, o que vem provocando também novas

materialidades no território.”

Concomitantemente a instalação da Petrobrás em Mossoró, diversas empresas,

nacionais e estrangeiras prestadoras de serviços associado à atividade petrolífera também

chegam ao município. Assim sendo, para Elias e Pequeno (2010, p.115)

“O crescimento e a diversificação das atividades econômicas, cada vez mais

presentes nos espaços organizados por Mossoró, reforçam sua condição como

cidade média, a qual passa a promover no espaço intraurbano o surgimento de

processos que evidenciam o acirramento das desigualdades socioespaciais.”

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Dentre as características do processo de reestruturação produtiva Bomtempo

(2011) destaca mudanças relacionadas ao trabalho com a adoção de estratégia das

empresas como as subcontratações e terceirizações. Em Mossoró, isso se reflete na

terceirização de atividades associadas à perfuração de poços, transporte, levantamentos

geofísicos, etc. (RAPPEL, 2007, Apud ALVES, 2011). Com isso, apesar de comandar a

extração de petróleo no RN a Petrobrás não é a maior empregadora (quadro 2) e grande

parte dos empregos formais criados no município estão relacionados a atividades de

apoio à extração de petróleo, como pode ser percebido analisando dos dados fornecidos

pela FIERN (2014).

Quadro 2: Mossoró: Maiores Empresas Relacionadas a Extração e Atividades de Apoio a

Extração de Petróleo Considerando-se o Número de Empregos Formais (2014)

EMPRESA

N ° DE EMPREGOS

FORMAIS CLASSIFICAÇÃO

1

EMPERCOM EMPRESA DE

MONTAGEM E SERVICOS GERAIS

LTDA

1096 EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

2 PETROLEO BRASILEIRO S A

PETROBRAS 916

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

3 SMITH INTERNATIONAL DO BRASIL

LTDA 485

ATIVIDADES DE APOIO À

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

4 PREST PERFURACOES LTDA 431

ATIVIDADES DE APOIO À

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

5 EMPRESA BRASILEIRA DE

SERVICOS E PERFURACAO LTDA 404

ATIVIDADES DE APOIO À

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

6 ETX SERVICOS DE PERFURACAO E

SONDAGEM DE PETROLEO LTDA 281

ATIVIDADES DE APOIO À

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

7 LUPATECH - PERFURACAO E

COMPLETACAO LTDA 232

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

8 HALLIBURTON SERVICOS LTDA 192 ATIVIDADES DE APOIO À

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

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Fonte: Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte – FIERN, 2014. Organização: Leonardo

Galindo.

Rocha (2005) e Elias e Pequeno (2010) destacam o surgimento de atividades em

Mossoró indiretamente relacionadas ao setor petrolífero tendo em vista que a chegada de

milhares de trabalhadores demandou aumento de serviços como hospedagem,

alimentação, aluguel de carros, etc. Além disso, mencionam o crescimento da construção

civil decorrente da especulação imobiliária causada pela instalação provisória da sede da

Petrobrás no bairro Alto de São Manoel e posteriormente com a sede definitiva no bairro

Alto do Sumaré. O crescimento acelerado da construção também pode ser

explicado pelos altos salários recebido pelos trabalhadores do setor petrolífero (gráfico 2)

em comparação às demais atividades, na medida em que a extração de petróleo exige

elevada qualificação profissional.

Gráfico 2: Salário Médio Mensal (média de salários mínimos) por Setores da Indústria

Extrativa do Rio Grande do Norte (2012)

GÁS NATURAL

9

SUPERIOR ENERGY SERVICES -

SERVICOS DE PETROLEO DO

BRASIL LTDA

171

ATIVIDADES DE APOIO À

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

10 SAIPEM DO BRASIL SERVICOS DE

PETROLEO LTDA. 131

ATIVIDADES DE APOIO À

EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO E

GÁS NATURAL

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Fonte: IBGE, Cadastro Central de Empresas, 2012. Organização: Leonardo Galindo.

Embora o dado seja referente ao estado do RN não podemos deixar de

considerar que a extração de petróleo e gás natural concentra-se em Mossoró. Percebe-se

que o segundo segmento mais bem pago da indústria extrativa corresponde as Atividades

de Apoio à Extração, com média de 4,9 salários mínimos por trabalhador (IBGE, 2012).

Um dado interessante é que a atividade “extração de outros minerais não metálicos”, na

qual está inserida a atividade salineira pagava ao trabalhador formal uma média de 2,2

salários mínimos(IBGE, 2012). Dessa forma, a existência de atividades econômicas que

pagam remunerações tão díspares acaba se refletindo na cidade com o aumento das

desigualdades socioespaciais (ELIAS; PEQUENO, 2014).

Além de contribuir para a dinamização da Construção Civil, a extração de

petróleo e gás natural em Mossoró contribui para o setor da Construção como um todo. A

Classificação Nacional das Atividades Econômicas (CNAE 2.0) do IBGE divide o setor

da Construção em 3 tipos: construção civil, serviços especializados para a construção e

obras de infraestrutura. Enquanto em Natal, capital do RN ocorre o predomínio da

Construção Civil, em Mossoró predominam os empregos relacionados a Obras de

Infraestrutura devido a sua relação com a extração de petróleo.

De acordo com dados do Cadastro

Industrial do Estado do Rio Grande do Norte (FIERN, 2014), o município de Natal tinha

1102 estabelecimentos relacionados ao setor da construção, dos quais 707 dedicavam-se à

construção civil (gerando 8.260 empregos formais), 345 estabelecimentos voltados para

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obras de infraestruturas e que empregavam 3.764 pessoas e 50 estabelecimentos

relacionados a serviços especializados para a construção com 1.471 empregos. Já em

Mossoró, apesar do maior número de estabelecimentos voltados para a construção é nas

obras de infraestrutura que se concentram os empregos: mais de 100 estabelecimentos de

construção civil no município de Mossoró empregavam 1.341 funcionários, enquanto 28

estabelecimentos de obras de infraestrutura empregavam 2.412 funcionários.

Esse número deve-se principalmente a três empresas: Vipetro Construções e

Montagens Industriais Ltda. (600 funcionários), Skanska Brasil Ltda. (500 funcionários)e

Tenace Engenharia e Consultoria Ltda. (314 funcionários), todas atuando na montagem

de instalações industriais e de estruturas metálicas, na cadeia produtiva do petróleo. A

Vipetro, por exemplo, atuado na construção de Gasodutos no estado. Mossoró ainda tinha

em 2014, 418 funcionários trabalhando no setor de serviços especializados para a

construção (FIERN, 2014). Nos últimos anos observou-se a diminuição da produção de

petróleo no RN, já que em finais do século XX chagava a aproximadamente 100 mil

barris por dia, enquanto em 2012 eram extraídos em torno de 60 mil barris/dia

(PETROBRÁS, 1999apud GALVÃO, 2002; SECRETARIA DE ESTADO DO

PLANEJAMENTO E DAS FINANÇAS - SEPLAN, 2014). Dentre os

motivos apontados para a redução da produção estão a centralização dos investimentos da

PETROBRÁS na extração de petróleo na camada pré-sal, cujas maiores reservas

comprovadas localizam-se na porção do Oceano Atlântico na costa dos estados do

Sudeste Brasileiro. Desse modo, se no passado, o processo de reestruturação da produção

petrolífera levou a dinamização da economia de Mossoró, no presente significou a

descoberta e prospecção de novas reservas em outros lugares, causando redução do

número de trabalhadores no município Norte-rio-grandense (TRIBUNA DO NORTE,

2014).

2.3. AS DIFERENCIAÇÕES ESPACIAIS E A INDÚSTRIA DE

TRANSFORMAÇÃO EM MOSSORÓ/RN

De acordo o Cadastro Industrial da Federação das Indústrias do Estado do Rio

Grande do Norte (FIERN, 2014), Mossoró apresentava o segundo maior número de

estabelecimentos da Indústria de Transformação do RN (inferior a Natal) e era o terceiro

em número de empregos formais (inferior a Natal e Parnamirim) (cartograma 2). Eram

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em 2014 553 estabelecimentos (13,04% do total do RN) e 6.199 empregos formais

(corresponde a 9,1% do valor do estado).

Cartograma 2: Número de Estabelecimentos e Empregados da Indústria de

Transformação por município do Rio Grande do Norte (2014).

Apesar do grande número de estabelecimentos, a maior parte dos empregos da

indústria de transformação em Mossoró (49,3%) concentra-se em apenas 11

estabelecimentos industriais de 10 empresas (quadro 3). Dos quais 5 estão relacionados

ao setor de alimentos e bebidas, 3 na fabricação de produtos de minerais não metálicos

(cimento, materiais para uso estrutural na construção, concreto, cal, gesso, etc.); 1

relacionado a atividade petrolífera, 1 a fabricação de embalagens plásticas e outro a

fabricação de carrocerias. Enquanto isso, 195 estabelecimentos não tinham registro de

empregados (FIERN, 2014).

Quadro 3: Maiores estabelecimentos da Indústria de Transformação em Mossoró Quanto

ao Número de Empregos Formais (2014).

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EMPRESA N ° DE EMPREGOS

FORMAIS

1 USIBRAS USINA BRASILEIRA DE OLEOS E CASTANHA LTDA

(ALIMENTOS E BEBIDAS) 938

2 A FERREIRA INDUSTRIA COMERCIO E EXPORTACAO LTDA

(ALIMENTOS E BEBIDAS) 444

3 PORCELLANATI REVESTIMENTOS CERAMICOS S/A (PRODUTOS

DE MINEIRAIS NÃO METÁLICOS) 315

4 ITAPETINGA AGRO INDUSTRIALAS (PRODUTOS DE MINERAIS

NÃO METÁLICOS) 311

5 TRES CORACOES ALIMENTOS S.A. (ALIMENTOS E BEBIDAS) 227

6 NOV DOWNHOLE COMERCIALIZACAO DE EQUIPAMENTOS

PARA PETROLEO (PETRÓLEO) 172

7 SACOPLAST DO BRASIL LTDA – ME (EMBALAGENS PLÁSTICAS) 169

8 TRES CORACOES ALIMENTOS S.A. (ALIMENTOS E BEBIDAS) 153

9 MOSSORO INDÚSTRIA E COMERCIO DE PREMOLDADOS LTDA

(MINERAIS NÃO METÁLICOS) 117

10 INDÚSTRIA DE CARROCERIAS SAO PAULO LTDA – EPP

(CARROCERIAS) 109

11 INDÚSTRIA DE TEMPERO REGINA LTDA (ALIMENTOS E

BEBIDAS) 101

Fonte: Federação das indústrias do Estado do Rio Grande do Norte, FIERN, 2014. Organização:

Leonardo Galindo.

Como se pode observar destaca-se em relação ao número de empregados a

empresa Usibrás relacionada ao processamento da castanha de caju. Instalada no

município de Mossoró em 1979 atualmente tem outras duas unidades industriais, uma

situada no Ceará também voltada para o processamento da castanha, e outra unidade em

New Jersey, Estados Unidos, voltada para o beneficiamento de nozes (USIBRÁS, 2014).

Conforme destacado anteriormente, a castanha de caju tornou-se um dos principais

produtos exportados por Mossoró, principalmente para os Estados Unidos. Além da

Castanha de Caju a empresa também beneficia o amendoim comercializando a marca

Amendoim Dunorte.

Já a empresa A. Ferreira Industria Comércio e Exportação Ltda. (Aficel) também

atua no processamento da castanha de caju. Sua produção é vendida para os estados de

São Paulo e Rio de Janeiro e exportada principalmente para os Estados Unidos e Canadá.

Além da castanha também é produzido o derivado LCC ( Líquido da Casca da Castanha

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de Caju) que pode ser utilizadosna fabricação de tintas e vernizes. (AFICEL, 2014). A

empresa Três Corações Alimentos S/A possui três fábricas no Rio Grande do Norte,

sendo dois estabelecimentos industriais em Mossoró, um relacionado à produção de

produtos de culinária regional e outro a fabricação de refrescos. A Três Corações também

possui estabelecimentos industriais em outras unidades da federação.

Elias e Pequeno (2010)destacam que outras atividades associadas à extração do

petróleo tais como a confecção de fardamentos. Nesse sentido, no cadastro industrial da

FIERN (2014) estavam contabilizados 10 estabelecimentos relacionados à confecção de

roupas profissionais, a maioria com não mais do que 10 funcionários. Segundo os autores

essas empresas confeccionam fardamento principalmente para a Petrobrás e outras

empresas do setor de petróleo.Numerosos também são os estabelecimentos relacionados à

fabricação de sabão e detergentes, e adubos e fertilizantes, com número de funcionários

formais por estabelecimento variando de 0 a 80.

O grande número de estabelecimentos entre 0 e 5 funcionários formais indica

que em sua maioria são pequenas empresas e cujos empregados são pessoas de uma

mesma família e também alto grau de informalidade. De acordo com a FIERN (2014),

dos 292.000 empregados no setor industrial do Rio Grande do Norte em 2012, 49,32%

trabalhavam informalmente. No entanto, não encontramos dados relativos à porcentagem

de trabalhadores informais apenas do município de Mossoró, por isso não podemos

confirmar se o mesmo apresenta índice semelhante ao do RN.

Em meados do século XIX Mossoró tinha como principais atividades

econômicas a exploração de sal e uma pequena agroindústria associada ao

beneficiamento do algodão, da cera de carnaúba e da mamona. Para Elias e Pequeno

(2010, p. 172) “tais atividades são determinantes para a expansão da economia de

Mossoró, assim como para sua reestruturação urbana.” Esses fatores associados ao

assoreamento do porto de Aracati no Ceará fizeram de Mossoró “uma praça comercial

emergente” (ELIAS; PEQUENO, 2010, p. 110) do semiárido do RN.

Dessa forma, embora o território norte-rio-grandense se caracterizasse como

rarefeito quanto a presença de objetos técnicos que permitissem maior fluidez de pessoas,

capitais, mercadorias e informações, o estabelecimento das atividades citadas permitiu a

Mossoró concentrar uma maior infraestrutura em relação as cidades do entorno, tais como

ferrovias, rodovias, terminal aeroviário, etc.

Nesse sentido, apesar da cotonicultura e da fabricação de óleos vegetais

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terem desaparecido em meio ao processo de reestruturação produtiva, tendo em vista as

novas matérias-primas utilizadas no processo industrial e a resistência local a adoção de

novas tecnologias no processo de produção das mercadorias citadas (ROCHA, 2005),

algumas infraestruturas utilizadas no período permanecem como herança. Isso, aliado a

permanência de Mossoró como “empório comercial” (ROCHA, 2005, p. 45) foi

determinante para a instalação da sede da PETROBRÁS neste município, muito embora o

mineral esteja presente em mais de uma dezena de municípios potiguares. Da mesma

forma ocorre com a extração e refino de sal, na medida em que parte dos municípios

produtores envia parte do sal marinho para ser refinado em Mossoró.

Sendo assim, a instalação da indústria extrativa em Mossoró irá reforçar a sua

diferenciação em relação às cidades vizinhas, na medida em que estimulam a expansão

do comércio, dos serviços e exigem a construção de novas materialidades na cidade.

Nesse escopo é importante considerar as observações de Reolon (2013) a respeito da

localização dos estabelecimentos industriais da Indústria de Transformação nas cidades

médias:

“Todavia, se, na comparação com as demais categorias de cidades sugeridas, as

cidades médias da Região Sudeste chamam a atenção pela ausência de

diferenças significativas quanto aos ganhos de empregos e de estabelecimentos

das indústrias de transformação, o outro lado da moeda seria a diferenciação

nas regiões que apresentam menor densidade dos sistemas de engenharia,

notadamente no Nordeste e no Norte. É nestas regiões que, na ausência das

metrópoles, as economias de urbanização das cidades médias realmente

despontam como vantagens comparativas à localização das atividades

produtivas.” (REOLON, 2013, p. 169. Grifo nosso).

Em Mossoró, as materialidades criadas pelo desenvolvimento do comércio e das

agroindústrias nos séculos XIX e XX serão reforçadas com o estabelecimento da

moderna indústria extrativa. Consequentemente, a diferenciação espacial quanto ao

entorno proveniente de um maior desenvolvimento da técnica e existência de

infraestruturas aliado a localização geográfica de Mossoró, entre as capitais Natal e

Fortaleza, farão do município o lugar privilegiado da localização da emergente indústria

de transformação (especialmente relacionada ao setor de alimentos) no semiárido do RN.

3. CONSIDERAÇÕES FINAIS

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O processo de reestruturação produtiva tem provocado várias transformações em

Mossoró, na medida em que foi um dos responsáveis pelo fim de algumas atividades

econômicas tais como a cotonicultura e o beneficiamento da mamona e carnaúba.

Contudo, algumas atividades se modernizaram e outras surgiram associadas à existência

de recursos minerais, de modo que atualmente Mossoró caracteriza-se por um setor

industrial baseado na extração de petróleo e gás natural, bem como de sal marinho.

Tais setores contribuíram para a aceleração do processo de

urbanização na cidade na medida em que demandaram a construção de infraestruturas e o

crescimento do setor de serviços. Consequentemente, como resultado do processo de

reestruturação produtiva ocorre o “desenvolvimento, por um lado, de concentração e

centralização do capital, e por outro, dispersão e interações entre os territórios e as

cidades envolvidas em diversos circuitos produtivos”. (BOMTEMPO, 2011, p. 53).

Nesse sentido, Mossoró além de exportar produtos como o sal, castanha do caju,

melão, dentre outros, para diversos lugares do Brasil e do mundo, também passa a

importar insumos, mão-de-obra, e equipamentos necessários a extração de petróleo. Com

isso, o município amplia seu papel na rede urbana brasileira e na divisão territorial do

trabalho ao estabelecer conexões com outros lugares extrapolando a escola local e

regional que extrapolam a escala local e regional.

Em contrapartida o desenvolvimento do capitalismo na cidade, atrelado ao

processo de reestruturação produtiva tem acentuado o crescimento das desigualdades

socioespaciais em Mossoró (ELIAS; PEQUENO, 2010). Nesse sentido a atividade

petrolífera se constitui como uma exceção em Mossoró no que se refere à média salarial,

pois enquanto sua remuneração média chega a 18 salários mínimos, a extração de sal e a

indústria da transformação pouco ultrapassam 2 salários e a construção não chega a 3

(FIERN, 2014). Tais diferenças acabam se refletindo no território, com a diferenciação

econômica e social dos bairros na cidade. Por sua vez, a localização

geográfica entre duas capitais estaduais, aliada ao desenvolvimento de sua infraestrutura

relacionada as heranças de antigas atividades econômicas, provocam um processo de

diferenciação espacial e relação as cidades do entorno. Essa diferenciação será reforçada

com o estabelecimento da produção de petróleo e da modernização do sal, aliada ao

desenvolvimento da fruticultura irrigada, que exigem uma ampliação das materialidades

existentes em Mossoró. Consequentemente, a concentração de infraestruturas, técnicas,

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100

população, etc., fará surgir na cidade uma indústria de transformação “tradicional”

associada principalmente ao setor de alimentos.

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103

A ORGANIZAÇÃO PRODUTIVA DA INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA NO

MÉDIO VALE DO PARAÍBA:REDES, ATORES E ESTRATÉGIAS

TERRITORIAIS.

Rafaela Dettogni Duarte Paes38

Resumo

O processo de reestruturação produtiva, iniciado a partir da década de 1990, surgiu

como um importante agente modelador da organização do espaço econômico do Brasil e

do estado do Rio de Janeiro. Em busca por melhores benefícios à produção, atores

econômicos de escala global passaram a se alocar em cidades de pouca expressão

econômica no cenário nacional. Atualmente, estas cidades compõem –se como peças

estratégicas à organização produtiva e passam por um intenso processo de

reorganização territorial. Dessa maneira, pretendemos analisar a atual conjuntura das

cidades do Médio Vale do Paraíba fluminense em relação às lógicas de acumulação

flexívele as mudanças estabelecidas para e com a inserção de montadoras automotivas

na região, buscando tecer uma análise sobre a reorganização do território a partir dessas

ações.

Palavras chave: Reestruturação produtiva. Médio Vale do Paraíba. Industria

automotiva.

1. INTRODUÇÃO

A partir da década de 1990, o estado do Rio de Janeiro passou a sofrer

significativastransformações em seu espaço produtivo, adequando-se aos padrões de

acumulação flexível, iniciados a partir da década de 1970,com advento do período pós

38

Graduanda em Geografia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Bolsista FAPERJ vinculada ao

laboratório de pesquisa GEOPORTOS, coordenado pelo professor Dr. Fréderic Monié. Pesquisa atrelada

ao projeto “reestruturação urbana no estado do Rio de Janeiro: Governança e desenvolvimento territorial

no Médio Vale do Paraíba”, coordenado pelos professores Doutores Willian Ribeiro, Fredéric Monié e

Paulo Gusmão.

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104

fordista. Marcada pelo processo de reestruturação produtiva, a estrutura industrial da

região do Médio Vale do Paraíba sofreumodificações, passando dos setores tradicionais

para o desenvolvimento de uma economia pautada em setores mais modernos. Através

de investimentos em tecnologia e infraestruturas de qualidade que modificaram o

espaço regionalbuscando torna-lo atraente aos atores econômicos, estimula-se o

processo de formação de um novo polo de desenvolvimento metal- mecânico/

automobilísticona região.

Em caráter do estudo geográfico, a temática torna-se relevantea partir das

perspectivas da geografia econômica, entendidas como fundamentais para compreensão

e analiseda lógica espacial dos sistemas econômicos e sua evolução, a fim de apreender

as desigualdades sociais e territoriais. (PIRES DO RIO,2012). A análise do espaço

econômico pode ser realizada a partir da concepção de agentes que estruturam espaços

por meio de suas estratégias, práticas e ações. (PIRES DO RIO, 2012). Segundo Veltz,

(1992) e Pires do Rio (2012), a composição dos espaços econômicos regionais podem

ser apreendidas no que tange à realização de investimentos, constituição de redes de

empresas, regimes institucionais que balizam o comportamento dos agentes econômicos

ou nas estratégias e ações das empresas- redes. Dessa maneira, analisar os processos de

reestruturação econômica, industrial e urbanas, ocorridas em períodos recentes no

Médio Vale do Paraíba Fluminense a partir da inserção de novos atores econômicos,

tornam-se essenciais à compreensão das dinâmicas do espaço regional.

Uma vez definida a importância de análise dos espaços econômicos,

justificamoso objetivo do presente trabalho. Buscaremos uma breve compreensão sobre

as lógicas de articulação dos atores econômicos localizados na região do Médio Vale do

Paraíba fluminense, em escala regional e global, abordando suas repercussões para a

reestruturação do espaço regional.

2. ANÁLISES SOBRE O FORDISMO E A REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA.

O período fordista, iniciado a partir do ano de 1930modificou

significativamente as características da produção mundial de mercadorias, quando

Henry Ford implementou uma mudança no ordenamento dos trabalhadores e suas

funções atrelando-os a uma esteira produtiva,possuindo como finalidade um drástico

aumento de produtividade. A partir desse momento, surge um novo sistema de

reprodução do trabalho, pautado no reconhecimento explícito de que produção em

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massa significava consumo em massa. Altera-se a política de controle e gerência do

trabalho, trazendo uma nova estética e uma nova psicologia que causaram significativos

reflexos à sociedade, transformando-a em uma sociedade democrática, racionalizada,

modernista e populista. (HARVEY, 1989)

Com a expansão da indústria de fabricação em massa no período pós-guerra, o

fordismo tornou- se, além de um sistema de produção, um modo de vida, influenciando

significativamente na cultura e nos padrões de consumo,uma vez que que o consumo e a

estética relacionada a ele, implicava em um processo de massificação cultural. Neste

período, a organização da produção era marcada pela contiguidade espacial da indústria.

Dessa maneira, todas as etapas da produção estavam localizadas em uma relação

estratégica de proximidade, em função da baixa eficiência das redes de transporte e de

comunicação, que implicavam na constituição de grandes plantas industriais onde eram

realizadas a fabricação todas as peças necessárias aos veículos, direcionando-as para as

linhas de montagem e possuindo como etapas finais a estocagem e a distribuição das

mercadorias.

Com a crise mundial de 1973, o modelo de produção e consumo fordista é

abalado. Os mercados já se encontravam saturados dos produtos estandardizados que

possuíam um lento tempo de giro de capital devido ao alto grau de durabilidade. Dessa

forma, as grandes empresas passaram a redefinir suas estratégias de produção e foram

estimuladas à expansão para outros territórios a fim de enfrentar as novas condições da

competitividade (HARVEY, 1989). A necessidade de redução de custos e a busca pela

competitividade estimularam a transferência dos setores de baixo conteúdo tecnológico

para as regiões sem tradição industrial moderna. Os avanços técnicos dos setores de

transporte, como o marítimo, e a abertura comercial dos países foram essenciais à

viabilização do processo. (MONIÉ e VASCONCELOS, 2012; VELTZ; 1999;

STORPER,2004). As mudanças para o alcance de um mercado mais atrativo,

atravessam os avanços tecnológicos, pautados na automação.A busca por novas linhas

de produtos e nichos de mercado, dispersão geográfica para as zonas de controle mais

fácil, fusões e medidas para acelerar o tempo de giro do capital, passaram ao primeiro

plano das estratégias corporativas de sobrevivência em condições gerais de deflação.

(HARVEY, 1989).

O processo de acumulação flexíveldifere-se do fordismo. Este é marcado pela

flexibilidade dos processos de trabalho, dos produtos e padrões de consumo.

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Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas

maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e sobretudo, taxas

altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional.

(HARVEY, 1989). O atual processo de interação entre mercados é possibilitado pela

pelo avanço das redes de comunicação via satélite e por tecnologias de transportes,

como atravésda implantação do uso de contêineres para a circulação de mercadorias.

Dessa maneira a indústria, que tradicionalmente dependia de restrições locais no tocante

a fontes de matérias primas e a mercados, pôde tornar-se muito mais independente.

(HARVEY,1989).

Tabela 1: As grandes fases da industria automobilística.

Primórdios do

Fordismo

1930/1940

Auge do Fordismo

1940/1980

Pós Fordismo.

Desde 1970/80s

Produção Pequena escala Larga escala Larga escala e

escopo

Produtos Bens de luxo Bem estandardizado;

longo ciclo de vida

Expansão social e

geográfica do

mercado

Consumo Socialmente restrito Consumo em massa

nos países centrais

Expansão social e

geográfica do

mercado

Organização

espacial da

produção

Fábrica Fábrica e

fornecedores

próximos

Redes

multilocalizadas;

unidades de

montagem

Inovação de

processos

Taylorismo; linha de

montagem

Inovação técnica;

lógicas extensivas

Informatização;

automação;

flexibilidade

Escalas de logística Fábrica Fábrica; regional Fábrica; regional;

mundial.

Fonte: Elaborado por Dettogni e Monié.

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3. A INDÚSTRIA AUTOMOBILÍSTICA NO BRASIL

Objetivando a obtenção de melhores fatores locacionais à produção que

permitissem uma competitividade por custos concomitantemente ao ganho de escala, a

reestruturação produtiva implicou na ampliação e reorganização da indústria, levando

esta a abranger novas regiões para a localização de suas plantas industriais. A

organização dos atores produtivos foram rearticuladas, acarretando na atuação destes

em escala global. O processo de integração da produção é viabilizado por eficientes

redes,definidas porCurien (1988, p.212) como toda infra-estrutura, que permite o

transporte de matéria, de energia ou de informação, e que se inscreve sobre um território

onde se caracteriza pela topologia dos seus pontos de acesso ou pontos terminais, seus

arcos de transmissão, seus nós de bifurcação ou de comunicação. Dessa maneira, os

territórios passam a estar articulados, e é possibilitada a abrangência de novos

mercados, aumentando o potencial econômico dos atores produtivos globais a partir da

competição por melhoresvantagens locacionais.

A reespacialização da indústria automobilística, desde meados dos anos 1980,

traduz um movimento agudo de encerramento e enxugamento de plantas produtivas

historicamente consolidadas, como no caso de Detroit, nos EUA. Posteriormente a esse

período, na década de 1990, observa-se uma orientação para novos investimentos em

regiões com pouca ou nenhuma tradição no setor automotivo (DOS SANTOS,2006). No

Brasil, até o início da década de 1990, a indústria automobilística concentrava-se em

algumas regiões específicas, como no ABC paulista, sob o viés da lógica de

contiguidade espacial da produção, típica do período Fordista. O município de São

Bernardo do Campo, foi o principal território das montadoras neste período. Junto ao

crescimento das plantas produtivas, surgiam em seu entorno um significativo aumento

das empresas fornecedoras de autopeças e por extensão, um desenvolvimento vigoroso

do sindicalismo na região.(DOS SANTOS, 2006).

Na década de 1990, a região do ABC Paulista, tradicional no setor da indústria

automobilística no Brasil é marcada por um processo de fuga dos investimentos do

setor. Os investidores, que anteriormente concentravam-se de forma expressiva nesta

região, passaram a alterar o direcionamento de investimentos para outras regiões do

país, devido ao desenvolvimento predatório alcançado no período anterior,responsável

pelo aparecimento de uma série de problemas ou desvantagens econômicas, também

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conceituadas como deseconomias de aglomeração. Estas podem ser entendidas

comoconsequências de problemas, tal como:trânsito caótico, enchentes nos períodos de

chuvas, os altos custos de movimentação de mercadorias no porto de Santos, escassez e

alto preço da água industrial, poluição ambiental, terrenos supervalorizados, entre

outros. (LEITE, 2003). Além desses fatores, a presença de um forte sindicalismo que

pressionava os produtores da região, atuou de maneira preponderante à expansão das

montadoras para outras regiões menos conflituosas.

A partir desses novos processos e da abertura econômica brasileira, estratégias

políticas do governo de Fernando Henrique Cardoso, foram particularmente benéficas

para o estado do Rio de Janeiro em um momento no qual se manifestavam duas

ausências chave: de uma política industrial nacional e de políticas regionais de

desenvolvimento. A instalação da Volkswagen e da Peugeot-Citroën no Vale do Paraíba

Fluminense, a aquisição de recursos para a ampliação e conversão do atual porto de

Itaguaí, até então nomeado como porto de Sepetiba, em um hub port internacional,

assim como a implementação de um intenso processo de desestatização – que convergia

com a agenda privatista federal são exemplos emblemáticos dessa coalizão política

conjuntural. (DOS SANTOS, 2006). Dessa forma, verifica-se um processo de

reorganização do espaço regional do Médio Vale do Paraíba para a implementação de

novos atores produtivos, buscando a obtenção de competitividade da região no contexto

nacional e crescimento econômico. Essa nova etapa de investimentos econômicos no

país, gerou uma significativa mudança na implantação de parques industriais no Brasil,

fomentando guerras ficais entre os estados, mudanças infraestruturais nas regiões cujas

indústrias seriam implementadas, calcados na produção enxuta e nas novas tecnologias

produtivas.

4. O MÉDIO VALE DO PARAÍBA: INFRAESTRUTURAS PARA A

INSTALAÇÃO DO POLO AUTOMOTIVO.

Novas estratégias de localização da produção surgiram a partir da década de

1990 no Brasil. Dessa forma, o território passou sofrer consequências dos novos

arranjos produtivos. Os recentes movimentos de reorganização dos territórios implicam

em novas formas de uso do mesmo. Trata-se da busca por fatores associados ao novos

padrões produtivos, que privilegiam fatores como: sistemas de inovações regionais e

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locais, tecnologias de comunicação, infraestruturas viárias e logísticas que possibilitam

a rápida circulação de mercadorias associadas ao baixo custo da produção (OLIVEIRA,

2007)

As montadoras passaram a se instalar no país atraídas pelo potencial mercado

consumidor brasileiro e sul-americano formado a partir da criação do Mercosul. Os

mercados emergentes tornam-se atrativos a partir da consideração dos seguintes fatores:

Rápido crescimento do mercado de veículos, unidades de produção em localidades com

custos mais baixos,acelerado crescimento das taxas de motorização e privilegiados

campos para novos experimentos organizacionais e trabalhistas. (LUNG,2000).

Para a realização dos investimentos, foi necessária uma articulação entre as

esferas governamentais, do nível Federal ao nível local, que estimularam à capacitação

dos territórios à inserção do capital. Segundo Santos (1996) a produtividade espacial

pode ser expressa pela guerra dos lugares, onde estes se distinguem pela diferente

capacidade de oferecerem rentabilidade aos investimentos. Esta rentabilidade pode ser

maior ou menor em função das condições locais de ordem técnica-organizacional.

Dessa maneira, na conjuntura do país na década de 1990, surge um intenso processo de

competição pela localização dos investimentos por parte dos estados. Nesse contexto, a

região sul fluminense foi escolhida como locus de investimentos da indústria

automotiva. Como motivações para a escolha da região, foram considerados fatores

como a relativa distância da região metropolitana do Rio de Janeiro, buscando o escape

da conjuntura das deseconomias de aglomeração. A intensidade dos investimentos

econômicos e infra estruturais, que beneficiaram o estado do Rio de Janeiro em relação

aos outros estados do país que se encontravam em processo de disputa por

investimentos, também foram de extrema relevância para a escolha da região. Nesta

nova etapa de desenvolvimento econômico brasileiro, foi relevante o fato das empresas

já instaladas no país, especialmente na concentração industrial do ABC paulista,

estarem vendo uma oportunidade de se aproveitar das vantagens fiscais oferecidas pelos

governos e também escapar da força política do sindicalismo daquela região e dos

salários “elevados” pelo poder de barganha desse mesmo movimento sindical(ABREU,

2000), rearticulando os territórios produtivos do país.

A Escolha da região do Médio Vale do Paraíba para tornar-se um território

produtivo da indústria automobilística não foi aleatória. A região, que anteriormente ao

processo de reestruturação produtiva foi marcada por setores industriais tradicionais,

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com pouco desenvolvimento tecnológico, já apresentava um tecido industrial pré

existente, de referência no setor metalúrgico e siderúrgico, muito viabilizado pela

presença da Companhia Siderúrgica Nacional, hoje privatizada, no município de Volta

Redonda, além de ser o lócus de outras empresas do ramo da siderurgia.

Na década de 1990, portanto, diversos incentivos foram concedidosàs

montadoras fomentando a guerra fiscal entre estados concorrentes. No caso do Rio de

Janeiro, a primeira montadora a ser instalada foi a fábrica de caminhões da Volkswagen,

que contou com o apoio estadual como estratégia de suma importância para este

processo, resultando em ótimas condições de infraestruturas. Foram investidos um total

de US$ 15 milhões, distribuídos da seguinte forma: a) uma estação de força elétrica para a

fábrica no valor de US$ 4 milhões; b) uma linha nova de canalização de gás de 14

quilômetros, no valor de US$ 7.3 milhões; c) uma estrada asfaltada de 3,4 quilômetros, no

valor de US$ 2.3 milhões; d) recursos para permitir as autoridades municipais a

providenciar para a fábrica postes de luz, sinalização, água, esgoto, transporte etc, no valor

de US$ 2.1 milhões; e) infraestrutura de telecomunicações com ligações através de fibra

ótica (ABREU, 2000). Destacando o processo de articulação governamental para a

realização dos investimentos, podemos observar a fala do então secretário de indústria e

comércio de Resende, município onde a montadora foi instalada.

“O município no processo de instalação de uma empresa desse porte é a

última etapa a ser ouvida. Normalmente a coisa começa no governo federal,

passa para o governo estadual e cai no município. O município não escolhe,

ele é escolhido. E Resende entrou no processo porque tem uma posição

estratégica privilegiada, porque tem terreno apropriado, porque é servido pela

principal rodovia do país, tem uma infra-estrutura privilegiada, tem facilidade

de formação de mão-de-obra. (...) Resende não escolheu.” (Eliel de Assis

Queiroz, secretário de Indústria e Comércio de Resende). (ABREU,2000)

Além de possuir vantagens comparativas, a escolha da região sul fluminense

foi marcada pela proximidade da mesma em relação aos dois maiores centros

consumidores do país: as cidades de São Paulo e Rio de Janeiro. A rodovia Presidente

Dutra, que no períodoestava em vias de privatização e que estabelece a conexão Rio-

São Paulo foi um dos pontos chave para a escolha da região. O porto de Sepetiba, atual

porto de Itaguaí, que também se encontrava em vias de construçãofoi um atrativo para

as montadoras, A concessão de outros incentivos fiscais, a doação de terrenos para as

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111

montadoras e para os fornecedores próximos a ela, como no caso da Peugeot/Citroën,

localizada no município de Porto Real foram preponderantes à escolha da região.

5. OS PRINCIPAIS INVESTIMENTOS NA REGIÃO DO MÉDIO VALE DO

PARAÍBA

Segundo Castells (1999), a globalização estimula a regionalização. A

internacionalização crescente das atividades econômicas nas regiões tornou-as mais

dependentes destes investimentos, que são fomentados através dos impulsos

estabelecidos porgovernos e elites empresariais e estruturaram-se para competir na

economia global através de redes de cooperação entre as instituições e empresas

localizadas na região. Dentro desse raciocínio, o novo espaço industrial se

caracterizaria pela capacidade organizacional e tecnológica de separar o processo

produtivo em diferentes localidades, ao mesmo tempo em quereintegra sua unidade por

meio de conexões de telecomunicações, da flexibilidade e precisão resultante da

microeletrônica na fabricação de componentes. (CASTELLS, 1999).

A partir dessas afirmações, podemos tecer analises sobre a região do Médio

Vale do Paraíba, indicando esta como pertencente auma nova lógica produtiva, pautada

nos processos de acumulação flexível que insere os municípios em um contexto

globalde circulação de mercadorias. Os municípios portanto, passam a ser permeados

por processos políticos e conectados por eficientes redes de transporte e

telecomunicação, centros logísticos estratégicos, como os portos secos, que acarretam

em uma reorganização do espaço regional e o adequa às dinâmicas econômicas de

escala global.

Os investimentos nos setores de metalurgia e siderurgia, são predominantes na

região analisada. Os municípios que alocaram em seus territórios as plantas das

industrias automotivas, Resende e Porto Real, possuem uma organização territorial onde

se estabelece um arranjo entre as montadoras automotivas e seus fornecedores. Estes

participam do processo de montagem dos veículos em uma relação de proximidade

espacial da produção. Esta forma de organização do território pautada na proximidade e

aglomeração de atores produtivos em uma mesma região é caracterizada por Veltz

(1999) como Território- Zona. O município de Porto Real, que possui a montadora

Peugeot- Citroën (PSA)localizada em seu território, e o de Resende com a Volkswagen

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voltada à produção de ônibus e caminhões, estabelecem esta estratégia como forma de

organização espacial da produção em suas respectivas linhas de montagem. A seguinte

tabela apresenta os principais investimentos localizados na região do Médio Vale do

Paraíba, segmentadas por setor, produtos e o quantitativo de empregos estabelecidos

com a presença dos novos atores produtivos nos municípios.

Tabela 2. Principais investimentos no médio vale do paraíba 1996-2006.

Município Empresa Setor Produto Emprego

Barra do Piraí QuimVale Químico Carbonato de cálcio 120

Barra Mansa Sid. B. Mansa- Amp. Siderúrgico Aço -

Barra Mansa Sid. B. Mansa-nova Siderúrgico Aço 700

Itatiaia Meyenfreund Bebidas Cerveja 250

Itatiaia Instituto Biochimico Farmacêutico Remédios 90

Itatiaia Michelin Borracha Pneus de automóveis 200

Pinheral CSN (cimento) Minerais não

metálicos

Cimento 330

Piraí Aloés Piraí Farmacêutico Absorv. e lenços 168

Piraí Aro Metalúrgico Tampinhas/latas de

aço

50

Piraí Cervejaria Cintra Bebidas Cerveja 500

Piraí Networking Mat. elét. e de tel. Gabinetes de

computador

500

Piraí Pastifício St. Amália Alimentos Snacks 200

Porto Real Cia. F. Refrigerantes Bebidas Refrigerantes 400

Porto Real Copo Autopeças Espuma 10

Porto Real Eurostamp Autopeças Estamparia 200

Porto Real Galvasud I Metalurgico Galvanização de

chapas

150

Porto Real Galvasud II Metalurgico Unidade de corte e

solda

130

Porto Real Gefco Autopeças Linha de montagem 70

Porto Real Guardian Minerais não

metálicos

Vidros 200

Porto Real Peugeot Citroën Automotivo Automóveis 2.500

Porto Real Vallourec Autopeças Eixos, rodas e pneus 70

Porto Real Volkswagen Autopeças Caminhões e ônibus -

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Resende Pernod Ricard Bebidas Destilaria 63

Resende Sagez Alimentos Pães 359

Resende Volkswagen Metal- mecânico Caminhões 1.500

Resende Volkswagen II Automotivo Caminhões 400

Valença Ferreira e luz Confecção Camisas e calças 180

Valença Recap pneus Borracha Pneus remodelados 120

Volta Redonda CSN (alto forno 4) Siderurgia Chapas de aço 600

Volta Redonda Inaí Siderúrgico Distribuição de aço 600

Volta Redonda Tubonal Metalurgico Tubos de aço com

costura

380

Volta Redonda MRS Infraestrutura Transporte de carga 275

Total 11.045

Fonte: Codin (2007) – Dias da Silva, 2012.

6. O SETOR METAL MECÂNICO NA REGIÃO DO MÉDIO VALE DO

PARAÍBA

Alguns dos municípios que compõem a região do Médio Vale do Paraíba

Fluminensesofreram a partir da década de 1990mudanças significativas no padrão

industrial de seus territórios. Nas décadas que antecederam o processo de reestruturação

produtiva, setores tradicionais da indústria marcados pelo baixo conteúdo tecnológico,

caracterizavam a estrutura produtiva dos municípios. Com o processo de acumulação

flexível, a busca por territórios que oferecessem vantagens à produção e a significativa

eficiência dos sistemas de transporte e dos meios de comunicação, transformaram o

padrão dos setores industriais em alguns municípios da região. Dessa forma, Resende e

Porto Real passaram a estar inseridos nas estratégias globais de produção e circulação

de mercadorias, alterando significativamente a organização espacial de algumas regiões.

A partir desses processos, a indústria automobilística tornou-se o principal

agente transformador do espaço regional. No período entre 1996 e 2006, retratados na

tabela abaixo, os investimentos nos setores metal- mecânico, traduzidos por uma

indústria mais moderna, foram extremamente significativos para a economia do Estado

do Rio de Janeiro. Esses investimentos foram realizados principalmente nos municípios

de Resende e Porto Real, que apresentaram vantagens comparativas frente aos outros

municípios da região e dessa forma passaram a compor uma região marcada pela

presença da indústria automobilística, que reorganiza o território produtivo e viabiliza

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significativos ganhos econômicos, tanto para os municípios em questão, quanto para o

Estado do Rio de Janeiro, além da posição de destaque da indústria automotiva no

cenário mundial.

Tabela 3: Principais investimentos no setor metal-mecânico/ automotivo (1996-2006)

Município Empresa Setor Produto Emprego

Barra Mansa Sid. Barra Mansa- Amp. Siderúrgico Aço -

Barra Mansa Sid. Barra Mansa- Nova Siderúrgico Aço 700

Itatiaia Michelin Borracha Pneus de automóveis 200

Porto Real Copo Autopeças Espuma 10

Porto Real Eurostamp Autopeças Estamparia 200

Porto Real Faurecia Autopeças Bancos/escapamentos 70

Porto Real Galvasud I Metalurgico Galvanização de chapas 150

Porto Real Galvasud II Metalurgico Unidade de corte e solda 130

Porto Real Gefco Autopeças Linha de montagem 70

Porto Real Guardian Minerais não

metálicos

Vidros 200

Porto Real Peugeot Citroën Automotivo Automóveis 2.500

Porto Real Vallourec Autopeças Eixos, rodas e Pneus 70

Porto Real Volkswagen Autopeças Caminhões e ônibus

Resende Volkswagen Metal- Mecânico Caminhões 1500

Resende Volkswagen II Automotivo Caminhões 400

Valença Recap Pneus Borracha Pneus Remodelados 120

Volta Redonda CSN (alto forno 4) Siderurgia Chapas de Aço 600

Volta Redonda Inaí Siderúrgico Distribuição de aço 260

Volta Redonda MRS Infraestrura Transporte de carga 275

Total 7.455

7. AS ESTRATÉGIAS PRODUTIVAS DA PEUGEOT- CITROËN

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115

Localizada no município de Porto Real, a montadora Peugeot Citroën deu

início a sua produção industrial no ano de 2001. Na planta industrial do município

fabrica-se veículos de duas marcas, Peugeot e Citroën, sendo este processo possibilitado

pela flexibilidade das linhas de montagem. Na montadora do Sul Fluminense produz-se

atualmente os veículos Peugeot 207, 208 e os Citroën C3, C3 Picasso e Aircross. A

fábrica possui capacidade de fabricação de 160.000 veículos por ano e em 2012, a

unidade produziu 100.000 veículos de ambas as marcas (PSA,2014). Além da

fabricação de veículos automotores, a planta conta com um centro de produção onde são

fabricados motores voltados à exportação. O centro de produção de Porto Real emprega

cerca de 3.200 funcionários e é responsável por gerar empregos indiretos na região.

(PSA ,2014).

Evidenciados os quantitativos de produção da PSA em Porto real, buscaremos

analisar as estratégias territoriais da montadora para a fabricação dos veículos e a

produção das autopeças. Segundo Veltz, (1999) duas dinâmicas espaciais explicam as

estratégias produtivas dos grandes atores produtivos que operam em escala global: o

Território- Zona e o Território- Rede. A estratégia de organização do espaço produtivo

sob o víes do território zona evidencia este como os nós das redes e sobretudo, como

centro de direção das redes. Esta organização do território é caracterizada por uma

significativa relação de proximidade espacial das etapas produtivas, que nos remetem a

forma de organização do espaço produtivo do período fordista. O município de Porto

real é marcado por essa estratégia produtiva. Ao analisarmos a região, percebemos que a

montadora PSA possui uma série de fornecedores que se encontram organizados em

uma relação de proximidade à linha de montagem. Os fornecedores localizados

próximos a PSA, estão situados em grande parte em uma área denominada como

Tecnopolo e possuem uma relação essencial às etapas finais de produção dos veículos

automotores. Quando analisamos os determinados produtos fornecidos à linha de

produção, conseguimos justificar a presença dessas empresas através da abordagem do

território em zona. A empresa Faurecia Automotive do Brasil, fornece os bancos à

montadora, que por sua vez são as últimas peças à serem introduzidas nos automóveis.

A Guardian, mesmo não estando situada na área do tecnopolo, produz vidros para

automóveis, peças que possuem significativa fragilidade e que também são postas nas

últimas etapas da linha de produção. A Gefco, fabrica os acessórios veiculares

opcionais, que são adquiridos no momento da compra do veículo, a partir da solicitação

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do cliente e que necessariamente também fazem parte das etapas finais na linha de

montagem. A empresa também éresponsável pelo abastecimento da fábrica, com coletas

e entregas de peças e pelo desembaraço de importações em portos. No pátio da PSA, a

Gefco é responsável pela armazenagem de veículos finalizados, peças e partes;

operações de pós-produção e de preparação, que customizam veículos novos, além de

realizar auditorias e consertos de avarias. Na ponta da cadeia, a Gefco também é o

integrador entre fábrica e pontos de venda, e opera a expedição de veículos até as

concessionárias e o embarque para exportação a partir do Porto do Rio. (REVISTA

LOGÍSTICA, 2013)

Dessa maneira, evidenciamos a organização do território em zona na região do

Médio Vale do Paraíba como uma das estratégias produtivas da Peugeot Citroën- PSA.

Justifica-se portanto, a doação de terrenos pelos órgãos governamentais tanto para a

montadora, quanto para a contemplação de um cinturão de fornecedores em uma relação

de proximidade. Esses fornecedores são essenciaisà montagem dos veículos, e

estabelecem uma significativa relevância à geração de empregos na região, acarretando

em uma reorganização do espaço e crescimento econômico dos municípios em questão.

Na tabela abaixo estão relacionados os principais fornecedores da Peugeot- Citroën na

região do Médio Vale do Paraíba.

Tabela 4. Fornecedores da Peugeot Citroën no MVP

Empresa Produto Endereço

Copo Industria de Poliuterano

do Brasil Ltda.

Espuma Av. Renato Monteiro,

6200, B1- Tecnopolo,

Porto Real, RJ

Faurecia Automotve do Brasil

Ltda.

Bancos Av. Renato Monteiro, 6200

– Área C, Tecnopolo, Porto

Real, RJ.

Galvasud Galvanização de chapas Av. Renato Monteiro,

7777, bairro Polo Urb. agro

Ind. Porto Real, RJ.

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Imagem 1: Imagem cinturão de fornecedores psa. Fonte: Google Maps.

Concomitantemente à organização dos territórios em zona, Veltz (1999) indica

que os territórios devem ser analisados sob o viés das redes, ou seja, um Território-rede,

marcado pela descontinuidade e segmentação espacial, unido por múltiplas redes que se

superpõem e emaranham o espaço, realizando a conexão entre os territórios que fazem

parte da produção em escala global. Esta forma de organização espacial da produção

também faz parte das estratégias da montadora PSA em Porto Real, uma vez que esta

empresa conta com múltiplos fornecedores que fabricam peças automotivas em diversos

territórios de escala global. O processo de reestruturação produtiva instituiu um espaço

Gefco Linha de Montagem Acessórios veiculares, como:

adesivos, teto solar, sensores de

ré, sons e acabamentos

especiais.

Av. Renato Monteiro,

6.200, Tecnopolo 1, Área

F, Porto Real, RJ.

Vallourec do Brasil autopeças Eixos e rodas Av. Renato Monteiro,

6.200, Porto Real, RJ

Guardian Vidros para automóveis Rua Fernando Bernadelli,

2000, Porto real [Rua José

dos Santos – Google maps]

próximo à PSA.

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econômico mundial integrado e interdependente que segundo Veltz, (1999) adquire uma

feição de arquipélago, onde os centros mais competitivos são conectados por eficientes

redes logísticas que estabelecem umconjunto de interações materiais e imateriais

formando oespaço global de fluxos, possibilitando a circulação de mercadorias em

distâncias, volumes e velocidades crescentes (CASTELLS, 1999; MONIÉ,

VASCONCELOS, 2012). A tabela abaixo relaciona os principais fornecedores da

montadora em escala global.

Tabela 5: Rede mundial de fornecedores de peças automotivas Peugeot/Citroën.

País Centro de produção Produtos

Argentina Instalações mecânicas de

Jeppener

Bomba de óleo; Records; Tambor; Apoio de

braço Pivô; Peças de alumínio; motores;

volantes; cubos de roda de alumínio; cartão de

cilindro; pintura registros; pintura tambor.

Brasil Instalações mecânicas de

Porto Real

Motores (1.4 e 1.6 l. gasolina e flex)para os

modelos fabricados localmente; blocos e

cabeçotes para motores de 1.6l flex (modelos

do Brasil)

França Fundação de Sept- Fons Carcaças de cilindro; peças para travões

França Sítio de Herimoncourt Motores; cabeçotes; caixas de câmbio

França Instalações mecânicas de

Caen

Transmissões e sistemas de suspensão

França Fundição de Charleiville Power train; sistemas de suspensão; Chefões;

trilhos laterais, suportes; braços de suspensão;

caixas de diferenciais; vibrabrequins e

coletores.

França Instalações mecânicas de

Metz

Caixas de velocidade

França Instalações mecânicas de

Valenciennes

Caixas de velocidade; caixas de engrenagem;

transmissão manual (5 e 6 velocidades) caixa

manual (6 velocidades)

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119

França Instalações mecânicas de

Mulhouse

Peças conexões de aterramento; discos.

Tambores; cubos ; Wishbones; conjunto de

rodas; trens e trens ½ volta; forjado (beliches e

travesseiros); proteção de peças do eixo

traseiro.

França Française de Mécanique Usinagens e montagens de motores

China Sítio produtivo de

Xiangyang

Motores; BV; conexão de aterramento de

motores; caixas de velocidades.

Fonte: PSA Homepage. Elaborado por: Rafaela Dettogni.

8. CONCLUSÕES PRELIMINARES

A atual fase da globalização, marcada pelas redes de valor agregado, (VELTZ,

2002) que multilocalizam a fabricação e a montagem dos produtos em lugares que

ofereçamcondições ideais de produçãoe pela competitividade por mercados atraentes,

compõem as dinâmicas produtivas das grandes montadoras de automóveis. O Brasil se

insere nesse contexto por apresentar atratividade às montadoras em função de suas

condições ideais à produção de veículos e pelo aquecido mercado consumidor de

automóveis, que na atual conjuntura do país, possuem o consumo estimulado através

das políticas governamentais.

A indústria automobilística é marcada historicamente por seu papel relevante

para o crescimento econômico das nações.Como consequência desse processo, a

organização dos territórios onde se instalam as montadoras é transformada.A partir

dessa afirmação, concluímos que a região do Médio Vale do Paraíba fluminense está

inserida nas atuais estratégias produtivas das montadoras, que se pautam no processo de

acumulação flexível, justificando o reordenamento dos territórios e inserindo os

municípios em uma escala global de circulação de mercadorias. O território pode ser

compreendido por espaços contíguos e espaços em rede. Segundo Santos, (1996) os

processos produtivos são expressados por meio de verticalidades (redes) e

horizontalidades (domínio de contiguidades). As horizontalidades seriam definidas

como o domínio da contiguidade, dos lugares vizinhos reunidos pela contiguidade

territorial. As verticalidades, por sua vez, seriam formadas por pontos distantes um dos

outros, ligados por todas as formas e processos sociais. Dessa maneira, evidenciamos as

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estratégias produtivas da Peugeot Citroën- PSA no território regional do Sul fluminense.

O capital corporativo reconhece os territórios buscando novas formas e relações sociais

que darão sentido à sua formação. O momento atual traduz a produção do espaço a

partir de uma nova forma de organização do trabalho, baseada em novas tecnologias,

que buscam nos territórios recursos técnicos, naturais e sociais a fim de prepara-los para

utiliza-los e estabelecer nestes uma relação instrumental.(OLIVEIRA, 2007.)

Aarticulação entre esferas governamentais e as empresas viabilizam o processo. A

conectividade estabelecida por redes de comunicação, transportes eficientes e centros

logísticos se tornaram essenciais à produção. Dessa maneira, os municípios que

compõem a região do Médio Vale do Paraíba sofrem um processo de reestruturação

urbana, econômica e social em função dos recentes investimentos. O jogo de escalas, do

regional ao global, explica as estratégias produtivas da montadora PeugeotCitroën-PSA,

que por sua vez possui um caráter determinante à reorganização dos territórios e

progresso econômico no estado do Rio de Janeiro.

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DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL EM PEQUENAS E MÉDIAS

CIDADES: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE “O PROGRAMA BID” E o

APL de BORDADOS DE CAMA, MESA E BANHO DE IBITINGA.39

Ricardo Nagliati Toppan40

Resumo

Considerando as implicações da Globalização na elaboração de políticas para o

desenvolvimento urbano e regional, o objetivo desse artigo consiste em apresentar o

Plano de Melhoria da Competitividade do Estado de São Paulo – “Programa BID”,

responsável pela competitividade de alguns Arranjos Produtivos Locais (APL) em

cidades e aglomerados urbanos do estado de São Paulo. À guisa compreender a ação

dessa política é usado o caso do APL de Bordados de Cama, Mesa e Banho de Ibitinga,

no desígnio de tecer uma avaliação do Programa e seu desempenho no referido arranjo.

Palavras-chaves: Arranjo Produtivo Local. Desenvolvimento Urbano e Regional.

Plano de Melhoria da Competitividade.

Keywords: Local Productive Arrangement, Urban and Regional Development,

Competitiveness Improvement Plan.

1. INTRODUÇÃO

Muito além de um tema apropriado pela Geografia Industrial ouUrbana, desde

o início dos anos de 1990 o processo de globalização vem,

concomitantemente,promovendo uma série derevisões teóricasem nossa ciência assim

como exigindocada vez mais uma reformulação das estratégias de desenvolvimento

39

Esse artigo apresenta um resultado empírico a partir de uma primeira análise do coletiva do Programa

BID e das contribuições dos professores do Grupo de pesquisa “Estruturas de Governança e

Desenvolvimento Territorial”.

40 Mestrando em Geografia – PPG em Geografia, Universidade Estadual Paulista, campus Rio Claro.

Laboratório de Desenvolvimento Territorial. Grupo de Pesquisa CNPq Estruturas de Governança e

desenvolvimento Territorial.

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urbano. Conforme apontado por Benko 2001 e Benko e Pecqueur 2001, aglobalização,

em diferentes tempos e intensidades,vem provocando uma recomposição dos espaços

suficiente para os autores enxergá-lospor um “mosaico de regiões produtivas

especializadas”, capazes de expor tanto processos complexos de crescimento localizado

como também dinâmicas de desenvolvimentodependente de outras regiões. Nesse

instante, é fundamental pensar essas questões na reorganização das políticas de

desenvolvimento econômico das cidades proporcionados pela globalização, sobretudo

em cidades médias, concebidas a partir de sua função e centralidade.

Nos últimos tempos, várias cidades brasileiras inspiraram-se nas práticas dos

distritos marshallianos na Itália e nos sistemas produtivos locais na França para

promoverem políticas de desenvolvimentoancoradas na aproximação produtiva,

coordenação e cooperação dos atores, constituindo assim em Arranjos Produtivos

Locais (APLs). Segundo o governo do Estado de São Paulo, o estado possui 24 APL

institucionalizados, sendo 14 deles escolhidos para uma política especial de melhoria da

competitividade, amparada pelo Banco de Desenvolvimento Interamericano (BID),

denominado “Programa BID”. Tal programa foi firmado em 2008, numa cooperação

entre a Secretaria de Desenvolvimento do Estado de S. Paulo, o Serviço Brasileiro de

Apoio às Micros e Pequenas Empresas (Sebrae-SP) e a Federação das Indústrias do

Estado de S. Paulo (FIESP), denominada a Rede Paulista de APL.

Dessa forma, considerando as implicações da Globalização na elaboração de

políticas de desenvolvimento urbano e regional, o objetivo desse artigo consiste em

apresentar esse Plano de Melhoria da Competitividade do Estado de São Paulo–

“Programa BID”, responsávelpela competitividade de alguns APLs, especialmente em

pequenas e médias cidades e aglomerados urbanos. À guisa de entender melhor a ação

dessa política é utilizado o caso do APL de Bordados de Cama, Mesa e Banho de

Ibitinga, nodesígnio de tecer uma avaliação do Programa referido.

Para arguir a temática central, esse artigofoi organizado em quatro seções, sendo

a primeira essa breve introdução. Na segunda seção são apresentadas algumas reflexões

acercado “Programa BID”, uma política de desenvolvimento econômico para

municípios e/ou aglomerados urbanos de pequeno e médio porte que possuem em seu

território um Arranjo Produtivo Local (APL). Na terceira seção, é apresentado o APL de

Ibitinga e sua grande influência na dinâmica urbana, visto no elevado grau de

especialização do município, e comoo referido programa não vem contribuindo

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satisfatoriamente para o desenvolvimento do arranjo. Por fim, na última seção são

postas considerações acerca das potencialidades e limitações do Programa, a exemplo

de Ibitinga.

2. DESENVOLVIMENTO REGIONAL E URBANO NO ESTADO DE SÃO

PAULO: OS APLS E O PROGRAMA BID

As transformações políticas e econômicas ocorridas desde a crise do petróleo

em 1973 e o avanço do neoliberalismo nos EUA, Inglaterra, Sudeste Asiático e América

Latina ajudaram a consolidar o processo de globalização caracterizada por uma atuação

reduzida do Estado na economia e aceleraram a integração regional entre diferentes

países, o que culminou na formação de blocos econômicos e na intensificação dos

fluxos financeiros, de mercadorias, informação e pessoas.No Brasil, esse processo

intensifica-sea partirda abertura comercial e redução das tarifas alfandegárias no início

da década de 1990, das quais foram precedidas pela Constituição de 1988, que realizara

uma nova organização política administrativa entre poder central e entes federados,

atribuindo-os novas responsabilidades sociais e econômicas. No entanto, essa

descentralização do Estado trouxe como resultado inúmeras distorções na questão dos

recursos, provocando a dificuldade de manutenção da política fiscal encarada pelas

regiões e municípios, suficiente para criar um ambiente de disputa fiscal entre as

cidades e os estados federativos.

“A descentralização estabelecida no país a partir da Constituição de 1988,

elevando o município à categoria de executor da política urbana e ampliando

suas condições de autonomia jurídica, política e financeira, conduziu a uma

mudança no conteúdo das políticas públicas de desenvolvimento urbano. É

neste contexto que as cidades médias ganham importância como centros

econômicos”. (MOTTA; MATA, 2009, p 1)

Com esse novo cenárioe o avanço das políticas neoliberais, fez-se necessário

emergir novas estratégias de desenvolvimento urbano e regional. No momento de

estabilização da inflação, estagnação econômica e mudança no papel do Estado,

algumas localidades utilizaram-se de novos artifícios no intuito de garantir crescimento

econômico, competitividade e autonomia.Novas políticas de caráter endógeno passam a

compor a pauta das políticas públicas então. Surgem assimalgumas ações locais que

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visamorganizar estruturas institucionais e projetos de desenvolvimento a partir de uma

rede de atores, recursos e conhecimentos locais. Chega-se, nesse instante, às noções

dedesenvolvimento territorial (Pecqueur, 2005; Dallabrida, 2006; Fuini 2011; Pires et

al, 2011), reforçadas pela a existência de estruturas de coordenação e cooperaçãodos

atores geograficamente próximos, denominada de governança territorial.

Essas concepções teóricas ganharam suma significância nos contextos das

cidades de pequeno, e principalmente médio porte, dada a sua centralidade e

funcionalidade possuída a partir da globalização (num contexto geral) e da formação

territorial de cada espaço existente.

O interior do estado de São Paulo apresentou nos anos entre 1970 e 1990 um

expressivo crescimento econômico derivado principalmente do processo de

desconcentração da indústria ocorrida na metrópole paulista; da formação de um

arcabouço técnico e recursos humano qualificados com a proliferação de centros de

ensino e pesquisa; e dos investimentos em infraestrutura como aeroportos regionais e

das rodovias. Nesse caso, as rodovias puderam ser entendidas como verdadeiros eixos

dessa desconcentração industrial, uma vez que muitas das cidades com tais

características estão localizadas exatamente a margem dessas vias.

ParaSelingard-Sampaio (2009), é importante que se concebaessa reorganização

espacial industrial e urbana do estado de São Paulo enquanto formação de uma grande

aglomeração espacial da indústria. Essa aglomeração propicia envolver os municipios

mais industrializados do país e integra-los às principais regiões metropolitanas do

estado, como São Paulo, Campinas e São José dos Campos,resultando no

multicomplexo territorial industrial (metropolitano/urbano) paulista, que

apresentaproduções industriais e agroindustriais diversificadas.

Assim, diferente do papel financeiro e global das grandes metrópoles no Brasil,

as cidades médias, e mais especificamente as cidades do inteior paulista, sofreram

grande impacto das transformações na economia e na política nacional e global.

“Tomando-se como referência esses traços é que se considera de fundamental

importância a compreensão das dinâmicas por que passam as cidades médias,

pois essa análise, longe de se restringir ao plano de suas reestruturações

espaciais, permite revelar os elementos da mudança de seus papeis

econômicos, frente a tendência de complexificação das relações entre as

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cidades, decorrentes da sobreposição das lógicas (...) – territorial,

competitividade e em rede.” (SPÓSITO, 2001)

Sobre as dinâmicas econômicas e a emergência de uma nova lógica espacial

das cidades médias na globalização,PINTAUDI (2001) acredita que há uma tendência

no aumento dos fluxos das trocas e consequentemente nas relações entre os espaços

urbanos, aumentando sua complexidade e interdependência. Diante disso vê-se uma

mudança do modelohierárquico de fluxos por um modelo em rede, onde:

“A organização territorial é produto da rede de fluxos que se estabelece na

cidade e que garante o seu funcionamento interno e suas relações com outros

lugares. A cidade combina território e movimento através das redes. O antigo

modelo – hierárquico - era pobre em relação entre dominante e dominado.

Hoje há reciprocidade e uma nova organização do trabalho. Uma nova

organização do trabalho corresponde há uma nova organização territorial. O

fordismo apresentava do trabalho uma divisão hierarquizada e que reproduziu

um espaço igualmente hierarquizado.” (PINTAUDI, 2001, p 285).

Por tudo isso, a autora considera a organização territorial um fator de produção

tão estratégico quanto o capital, a terra e o trabalho. O local, no momento que se

relaciona com o global, necessita fortalecer suas instituições políticas e administrativas

a fim de conseguir abranger toda a complexidade dessas relações em rede. Já segundo

Spósito (2001), essas relações em rede são consolidadas por um ambiente de

competição e também cooperação. Ao que tudo indica, a institucionalização dessas

redes, coordenada com uma política de Estado, têm se mostrando uma importante

ferramenta para o fortalecimento das economias dessas cidades ou de um aglomerado de

cidades.

Já é real a dialética local-mundial, nas bases de uma organização em rede, não

mais hierarquizada. É a partir deste par que precisamos pensar as nossas

instituições. Uma rede de cooperação entre instituições é um tipo de inovação

institucional (a outra é tecnológica) que tem grande importância para o

município, porque pode significar um impulso para uma tomada de decisão

diante de problemas comuns ou semelhantes entre os integrantes da

rede(PNTAUDI, 2001, p 286).

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Um exemplo dessa articulação em rede posta em várias cidades do país, e

também objeto de estudo desse artigo, são os Arranjos Produtivos Locais. No estado

paulista são 24 APLs reconhecidos oficialmente pela Rede Paulista de APLs41

, do qual

o governo se apoia para a promoção de políticas públicas. Para a Rede, os APLs devem

partir de uma concentração geográfica significativa de empresas, principalmente

pequenas e médias, em comunhão de um mesmo setor ou mesma cadeia produtiva,

mantendo algum vínculo de cooperação entre si e com outros agentes públicos e

privados (São Paulo, 2014). É importante frisar que tal conceito utilizado é incapaz

deabarcar todas as dimensões e articulações territoriais potenciais de um arranjo

produtivo42

.

O Programa de Fortalecimento e Melhoria da Competitividade para empresas

localizadas em APLs(PMC), surgiu em parceria com o Banco Interamericano de

Desenvolvimento (BID) e têm em seu objetivo fomentar a estrutura produtiva e

organizacional de uma parcela das aglomerações industriais existentes em APLs do

estado, assim como desenvolver a coordenação empresarial e institucional para a adoção

de práticas competitivas nos setores dos APLs atendidos pelo Programa

(BID/PMC/SDE-SP, 2008). Como plano de fundo, o PMC procura, através dos

investimentos setoriais, propiciar o crescimento econômico, o fortalecimento das

instituições locais e promover a redução das desigualdades entre as regiões.

Para a consolidação do programa com o BID era necessário fortificar os

mecanismos de governanças nesses APL, concebida pela formação dos Comitês

Gestores, o que na verdade implicaria em fortalecer o próprio arranjo e incentivar a

41

A Rede Paulista de APLs é uma instância interinstitucional criada em 2007 com o objetivo de

coordenar as políticas dos APLs no estado, desde a seleção dos setores produtivos com uma determinada

aglomeração específica de empresas até a elaboração de projetos e programas para o desenvolvimento

econômico dos mesmos. Ela é composta pela Secretaria de Desenvolvimento, coordenadora da rede, além

da Federação das Indústrias do Estado de S. Paulo (Fiesp) e do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e

Pequenas Empresas do Estado de S. Paulo (SEBRAE/SP).

42Para a Redesist, os APLs são “aglomerações territoriais de agentes econômicos, políticos e sociais - com

foco em um conjunto específico de atividades econômicas - que apresentam vínculos mesmo que

incipientes. Geralmente envolvem a participação e a interação de empresas - que podem ser desde

produtoras de bens e serviços finais até fornecedoras de insumos e equipamentos, prestadoras de

consultoria e serviços, comercializadoras, clientes, entre outros - e suas variadas formas de representação

e associação”. (Redesist, 2003, p.3)

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articulação e a cooperação dos atores envolvidos. Essa medida acabou dificultando o

avanço dos investimentos do BID, já indicando uma grande fragilidade de articulação e

envolvimento desses APLs.

Mapa 1: Distribuição dos municípios inseridos no Plano de Melhoria da

Competitividade dos APLs. Fonte: Elaborado pelo autor a partir da base da Fundação

SEADE.

A discussão sobre governança territorial não é um tema novo, sendo discutido

com maior vigor desde meado dos anos 1980. Ela seria uma das principais ferramentas

para garantir o desenvolvimento e competitividade dos municípios e das regiões,

principalmente a partir do período de se evidencia o aumento das trocas comerciais e a

formação de uma rede global. Desse modo,

“Os conceitos de governança territorial resultam de estratégias dos atores

coletivos que se engajam para coordenar ações que permitam resolver

problemas locais e regionais oriundos da aglomeração, da especialização ou

especificação territorial. Além disso, lançam as seguintes perguntas-chave

sobre a regulação social e governança do território: Como os atores lançam

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mão de determinados meios para construir um padrão de estabilidade social?

Como os atores lidam com planos que contemplam opacidades sociais?

Como são estabelecidas pelo planejamento as relações entre normas

regulatórias, funções operacionais, responsabilidades decisórias e

avaliações?” (PIRES &NEDER, 2008, p. 34).

Na metodologia adotada pelo BID, os APLs serão reconhecidos a partir deuma

determinada concentração geográficas de empresas e de instituições interconectadas

numa área de atuação específica, configurando-se a existência de uma governança local.

Com esses dois elementos (concentração de empresas e governança) são definidos

“estágios de desenvolvimento” de cada arranjo, utilizados como critérios para a seleção

do Programa BID – PMC. Os estágios são:

- APLs consolidados: importantes para o desenvolvimento local ou para o setor em que

estão inseridos, com governança local consolidada.

-APLs em desenvolvimento: importantes o desenvolvimento local ou possuem

participação expressiva no setor industrial em que estão inseridos, mas ainda não têm

uma governança consolidada.

- APLs embrionários: concentrações de empresas com pouca representatividade para

o setor industrial, mas com potencial para o desenvolvimento da economia local, sem

governança consolidada.

Diante desse quadro, o APL de Ibitinga é classificado como “em

desenvolvimento”, pois embora o setor tenha representatividade industrial, a

consolidação dos mecanismos de governança ainda é baixa, instituída apenas por

umsindicato patronal.

Já sobre a execução governamental inicial do programa orientado pela Rede

Paulista, a Secretaria de Desenvolvimento ficou designada pela coordenação técnica e

administrativa dos arranjos; o Sebrae-SP concentrou esforços na capacitação dos

agentes envolvidos, além de gerenciamento e fomento de projetos; a Fiesp contribui

com análises e diagnósticos sobre o panorama econômico nacional e internacional,

auxiliando na elaboração dos planos estratégicos e na capacitação e mobilização dos

atores; já o BID insere-se com o suporte metodológico e financeiro de US$ 10 milhões.

No total, o “Programa BID” disponibilizou U$ 20 milhões, uma vez que o Sebrae-SP

ficou responsável pela metade dos recursos adquiridos. A tabela abaixo indica os 14

APL selecionados pelo programa, onde 43% das cidades-sedes dessa política são

cidades médias e 36% são cidades pequenas. Se considerada todo o aglomerado urbano

de cada APL participante, o Programa conseguiu abarcar 93 cidades em todos o estado.

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Tabela 1: Arranjos Produtivos Locais comtemplados pelo PMC/SP

Setor Município Sede do Aglomerado

Calçados Jaú, Franca e Birigui

Construção Civil Itu, Tatuí, Tambaú e Vargem Grande do Sul

Móveis São Paulo e Mirassol

Confecção Cerquilho-Tietê, Americana e Ibitinga

Plástico Região do ABC – paulista

Etanol Piracicaba

Médico Hosp. Odontológico Ribeirão Preto

Fonte: Secretaria de Desenvolvimento Econômico de São Paulo

Como desenvolvido em estudos anteriores realizados pelo grupo de pesquisa

“Estruturas de Governança e Desenvolvimento Territorial (CNPq-Unesp – Rio Claro)”

esses municípios e aglomerados, embora compõem um território com estruturas

produtivas, comércio e serviço bem desenvolvidos consolidados em uma rede de

cidades complexa e especializada, não executam satisfatoriamente o Programa do BID,

principalmente pela falta de institucionalização dos atores envolvidos no arranjo,

dificultando o avanço da política.

Na maioria dos casos estudados (APLs de Birigui, Piracicaba, Jaú, Franca,

Cerquilho Tietê e Americana), a articulação entre os atores envolvidos é baixa, e o

mecanismo de governança territorial muito incipiente, configurado apenas por um

sindicato patronal do setor em questão. Cabe na sequência, avaliar os avanços e

impasses desse programa no APL do município de Ibitinga, município com uma

dinâmica urbana estritamente relacionada com a indústria de confecções.

3. O PROGRAMA BID E O APL DE BORDADOS DE CAMA, MESA E BANHO

DO MUNICÍPIO DE IBITINGA

Embora segundo os critérios estatísticos do IBGE Ibitinga seja considerada

uma cidade de pequeno porte, a dinâmica urbana e econômica coloca o município em

destaque nacional na produção de enxovais de cama, mesa e banho. A cidade possui

mais de 54 mil habitantes (2012) e com grau de urbanização de 96%. Têm um PIB de

942,3 milhões de reais, com uma economia calcada na indústria e no comércio. O valor

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adicionado industrial gira em torno dos 198,65 milhões de reais, correspondendo a 23%

do valor total obtido pelo município.

A cidade possui uma indústria altamente especializada e estruturada na

atividade industrial da qual motivou a formação do APL. Segundo o acervo municipal

de Ibitinga, o bordado apareceu na cidade em meados dos anos de 1930 a partir do

trabalho artesanal e semi-artesanal de mulheres da época, que buscaram uma

complementação da renda familiar. O avanço e a modernização da produção

aconteceram com o advento das máquinas elétricas de costura da Escola de Bordados

Singer, tornando-se atualmente na principal fonte de desenvolvimento econômico para a

cidade.

De acordo com os dados de 2010 da CNAE-RAIS, o município possui 525

indústrias, sendo 457 delas ligadas à confecção de vestuários e produtos têxteis, o que

representa 88% das empresas do município. Em relação ao número de empregos

formais gerados diretamente, a cidade possui mais de 15 mil vínculos ativos, sendo

aproximadamente 8,2 mil provenientes da indústria, dentre os quais 87% está vinculado

ao ramo produtivo do APL, como visto na tabela 2.43

Em relação ao tamanho das

empresas, de acordo com a FIESP, em 2006 apenas 4% eram empresas de médio e

grande porte eque correspondiam aproximadamente a 20% do faturamento local; o

restante é concentrado em pequenas e micros empresas.

Nos últimos anos, o setor vem aumentando o número de postos de trabalho e

quantidade de firmas,identificando um crescimento de 20% desde 2006 no número de

empresas, e 24% no número de empregos formais. Embora esses dados demonstrem um

crescimento da atividade industrial do APL, o setor se desenvolveu basicamente pelo

aumento do comércio interno, haja vista que a balança comercial setorial sofreu uma

grande queda, passando de U$ 291.141,00 em 2005 para U$ 76.011,00 em 2010,

representando um déficit de U$ 456.800. O município também entra em déficit no

referido ano atingindo a cifra negativa de U$ -5.511.998,00(dados da Secretaria de

Comércio Exterior).

43

Não foi possível identificar a informalidade do setor produtivo em questão, porém, segundo dados do

último censo do IBGE, a porcentagem de trabalhadores informais (sem carteira assinada) no município de

Ibitinga é de aproximadamente 11,2%.

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Tabela 2: Número de Estabelecimentos e empregos no APL de Ibitinga, 2010.

Total no município Indústria

Ramo do

APL

Estabelecimentos 1.816 525 457

Empregos formais 15.017 8.245 7.177

Fonte: RAIS

Todas essas informações vêm atestar a grande especialização produtiva que a

cidade possui desde a segunda metade do século XX, não por acaso levando o título de

capital nacional no bordado. A história do município de Ibitinga se mistura com o

avanço econômico no ramo de confecções e com o trabalho em bordados, concebido

hoje como parte da cultura local. Tudo isso indica a necessidade de investir em políticas

que fortifiquem a cooperação e coordenação dos atores envolvidos local – empresários e

sociedade civil – e o Estado, sempre presente e ativo, numa perspectiva de projeto nessa

escala territorial, na tentativa de produzir recursos e ativos territoriais (Pecqueur,

2005), frente aos novos determinantes impostos pela globalização.

“Em primeiro lugar, esses recursos só aparecem no momento das

combinações das estratégias de atores para resolver um problema inédito.

Mais exatamente, a própria formulação do problema ao mesmo tempo que

sua solução, são objetos de um processo heurístico, feito de ensaios

sucessivos, tateando e repetindo. Em segundo lugar, esses recursos não são

mensuráveis, o que significa dizer que não podem ser expressos em preço;

portanto não podem ser transferidos de forma alguma. Em terceiro lugar, a

natureza parcialmente não mercantil desses recursos não é incompatível com

o mercado mas lhe é complementar. Esses recursos resultam de uma longa

história, de um acúmulo de memória, de uma aprendizagem cognitiva

coletiva.”

“Por fim, esses recursos são, em certos casos, produzidos num território, que

se torna então “revelado”. A produção desses recursos resulta, pois, de

normas, de costumes, de uma cultura que são elaborados num espaço de

proximidade geográfica e institucional, a partir de uma forma de troca que

não é mercantil: a reciprocidade.” (PECQUEUR, 2005, p.16)

A organização que representa as empresas no município é o Sindicato da

Indústria e do Comércio de Ibitinga (SINDICOBI) que possui cerca de 90 empresas

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associadas no município, além de uma empresa em Tabatinga e outra em Itápolis. O

aglomerado de empresas não possui um mecanismo de governança territorial instituída,

mesmo com a exigência do Programa BID, do qual se previa a governança pela criação

de um Conselho Gestor.Embora exista o Sindicato dos Trabalhos nas Indústrias de

Confecções e Bordados de Ibitinga e Região (SINTRACOBI), a articulação deste com o

SINDICOBI se limita às questões salariais. A prefeitura também não possui um

envolvimento com as questões pertinente ao fortalecimento da cooperação e articulação

das empresas (seja nas empresas envolvidas inicialmente no chamado “Projeto APL”,

seja em todo o aglomerado), excetoem sua atuação na promoção de feiras especiais do

bordado, realizada anualmente.

As únicas instituições que mantinham acordos e projetos com o APL anterior

ao “Programa BID” era o SEBRAE,que atuava no auxílio à gestão empresarial, e o

SENAI, através do Programa Menor Aprendiz, destinado à capacitação de mão-de-obra

qualificada. Esses acordos compõem o “Projeto APL”, uma ação iniciada há 11 anos,

em que 20 empresas foram selecionadas para receber o apoio técnico/logístico dessas

instituições mencionadas.

O SINDICOBI é a principal organização interlocutora com a Secretaria de

Desenvolvimento do Estado e responsável pelo “Programa BID” no aglomerado. O

programa foi apresentado em 2009 por uma empresa especializada em competitividade

empresarial. A partir de então a proposta demorou a tomar consistência, originando

críticas de empresários e sindicato. Além do SEBRAE e SENAI, a FIESP está inserida

no programa do BID em Ibitinga através do incentivo a criação do selo de identidade

espacial e também por meio de treinamentos e assessorias para algumas empresas na

cidade

Sobre a proposta do selo, ele foi a primeira proposta do Plano na tentativa de

criar uma marca canal44

como forma de reconhecimento da qualidade e origem dos

produtos fabricados em Ibitinga. Tal proposta apenas foi concretizada no término do

ano de 2013.Outra medida financiada pelo PMC foi a criação do Centro de Qualificação

de Ibitinga, com o intuito de capacitar mão-de-obra local, proposta similar ao já

desenvolvido pelo SENAI anteriormente. Por último, há também a proposta pela

prefeitura em criar um projeto de lei municipal que desburocratize a abertura, alteração

44

A proposta de criação de um selo de identificação inspira-se na ideia conceitual de Indicação Geográfica

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e encerramento de empresas, além de ampliar a venda de produtos do APL para os

órgãos públicos municipais.

Apesar desses projetos realizados no PMC, e também apoiado nas análises

sobre a proposta inicial do programa, poucas propostas foram postas em práticas,

adquirindo resultados a baixo do esperado inicialmente. As ações em sua maioria foram

pontuais e restringidas apenas as necessidades cotidianas e particulares de determinadas

empresa. Não há um projeto de médio e longo prazo para o ramo, com temas e

propostas universais para o eixo empresarial, nem para com o envolvimento maior dos

trabalhadores. Embora haja um programa de capacitação de mão-de-obra, áreas como

desenvolvimento de P&D ainda não se consolidaram dos projetos do Programa BID em

Ibitinga. As ações mais visíveis são aquelas ligadas ao marketing, não havendo

nenhuma preocupação em fortalecer a rede de empresas locais na cidade e na região.

A governança territorial é inexistente, uma vez que apenas o sindicato patronal

responde por todo o APL. Não há um comprometimento incisivo dos órgãos públicos,

seja municipal ou pela Secretaria de Desenvolvimento, e não há vínculos formados com

demais instituições de ensinos, sindicatos trabalhistas e instituições de outras

localidades. Também inexiste qualquer programa que incentive a cooperação dos atores

envolvidos, sobretudos empresários, muito menos uma agenda para projetos ou fundo

local de investimentos conjuntos para inovação de produtos ou na engenharia de

produção. Por fim, há um profundo descrédito por parte das lideranças do sindicato

patronal e dos empresários locais (assim como também há pouca mobilização da

prefeitura) quanto à criação de um conselho gestor, dificultando ainda mais a existência

de uma governança forte.

Desse modo, é possível constatar a pouca eficiência do Programa BID,

começando pela própria governança territorial almejada, fundamental para o

funcionamento e crescimento do Arranjo Produtivo Local. A governança territorial

torna-se um elemento fulcral na elaboração e sucesso de públicas setoriais (tais como

essas propostas feitas pelo Programa BID para dar competitividade ao setor de bordados

e, consequentemente, impulsionar o desenvolvimento urbano-regional)assim como na

coordenação e cooperação de empresários entre si (resolução de conflitos inéditos,

estratégias de arrecadação e atração de investimentos, investimento em P&D) e para

com outros atores do território.

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136

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O novo ambiente de concorrência dado a partir da abertura comercial dos anos

1990 e o novo cenário político (descentralização do Estado) e fiscal (guerra fiscal)

exigem que as cidades e as regiões possuam características e singularidades que as

façam garantir vantagens competitivas locais. Para isso, a governança representa uma

institucionalização dos atores espacialmente envolvidos capaz de produzir recursos e

ativos específicos para tal fim.

O Programa de Melhoria da Competitividade dos APLs, ou “Programa BID”,

tem um positivo propósito em desenvolver políticas setoriais para as aglomerações

urbanas de pequeno e médio porte que possuem uma determinada especialização

produtiva, ou meros aglomerados de empresasunidas por mesmo ramo produtivo. Na

verdade, esse programa procura potencializar tais aglomerações produtivas no intuito de

constituir um verdadeiro arranjo produtivo, com conceitos aspirante aos distritos

marshallianos.

Porém, a proposta do BID antevê a institucionalização e articulação dos atores

territorialmente envolvidos a partir de um mecanismo de governança, algo não

desenvolvido e não valorizado pelo APL de Ibitinga, dado ao descrédito a criação do

Conselho gestor municipal. Assim, constata-se que as políticas do “Programa BID”,

uma vez pontuais e pouco expressivas, surtiram pouco efeito no fortalecimento do ramo

produtivo, assim como na aproximação e cooperação dos atores envolvidos, tanto pelos

empresários quanto a sociedade civil organizada e ao Estado, cujo papel ativo é

fundamental para o desenvolvimento urbano (e territorial) em sua plenitude.

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A PRODUÇÃO DO ESPAÇO DOS BAIRROS DE TRABALHADORES RURAIS

EM CIDADES DO AGRONEGÓCIO NO ESTADO DE SÃO PAULO

Cássio Arruda Boechat45

Resumo

Este artigo apresenta uma proposta de interpretação do processo histórico de

constituição de bairros de trabalhadores rurais em cidades do agronegócio no estado de

São Paulo. Assim, delineia-se uma abordagem igualmente histórica que visa identificar

o momento anterior da urbanização, atrelado à expansão da cafeicultura. Nesta

passagem do meio natural ao meio técnico, segundo a concepção de Milton Santos, as

relações campo-cidade que problematizamos incorrem num processo de territorialização

do capital que culmina na formação de áreas hoje consideradas como os centros das

referidas cidades. Num segundo momento, traçamos elementos da transformação que

levaria à conformação do meio técnico-científico-informacional. Neste contexto,

circundamos dois sentidos da produção do espaço desses bairros de trabalhadores rurais.

Palavras-chave: Bairros de trabalhadores rurais. Cidades do agronegócio. Produção do

espaço.

1. FORMAÇÃO DE CIDADES NA EXPANSÃO CAFEEIRA SOB O PRISMA

DO CORONELISMO E DO COLONATO

A passagem do meio natural para o meio técnico deu-se de maneiras diversase

antecede a consolidação do meio técnico-científico-informacional. No caso da ocupação

territorial do estado de São Paulo, houve uma violenta tomada das terras indígenas por

posseiros, a maioria oriundos das Minas Gerais, que ali se instalaram46

. De nossa parte,

45

Pós-doutorando no Programa de Pós-Graduação de Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura

e Sociedade da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (CPDA/UFRRJ), sob supervisão do Prof.

Dr. Sérgio Pereira Leite. Bolsita de PDJ do CNPq. Pesquisador junto ao Grupo de Estudos em Mudanças

Sociais, Agronegócio e Políticas Públicas (GEMAP).

46 A discussão se as culturas indígenas constituiram, por si, um meio técnico ou mesmo se essa “frente de

expansão” (Martins, 1975) também o fez, pode incorrer em perspectivas classificatórias e civilizatórias,

ou tão-somente numa aceitação de um processo longo de constituição do referido meio. M. Santos (2002,

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achamos por bem, antes de incorrer numa história do povoamento atrelado à

cafeicultura, frisar que este se deu como fase final de um processo anterior de

territorialização que constitui um capítulo do genocídio indígena, na assim chamada

“Guerra dos bárbaros” (Puntoni, 2002).

Aquela expansão, articulada à expansão da pecuária pós-colonialismo, não

levava necessariamente à constituição de núcleos urbanos, porém certamente um

primeiro boom de formação de vilas pelo Oeste Paulista diz respeito à transformação

das posses ali consolidadas. Lembremos que Pierre Monbeig caracterzou a frente

pioneira do café como uma “sementeira de cidades” (Monbeig, 1998), mas qual a

relação aqui buscada?

O movimento do povoamento de fins do século XIX até meados do XX

guardava relações de complementaridade com a territorialização dos pressupostos da

fazenda cafeeira, de modo que os centros antigos das pequenas cidades, geralmente

constituídos a partir da doação de patrimônios para a Igreja Católica, respondiam à

necessidade de legalização de posses estabelecidas à revelia da legislação em vigor a

partir da Lei de Terras de 1850 (Silva, 1996). A constituição de patrimônios era, assim,

uma parte do processo de legalização das posses, transformadas, a partir disso, em

propriedades privadas, algo que procuramos dar conta analisando o caso de Olímpia-SP

(Boechat, 2009).

Além disso, o coronelismo, que caracterizou a chamada Primeira República

(Nunes Leal, 1979), constituiu, de certa forma, a mediação da divisão territorial em que

a cafeicultura se assentou, ao mesmo tempo em que representou uma expansão da

infraestrutura do poder estatal, organicamente fundida ao poder particular dos grandes

fazendeiros, segundo a maneira como o compreendi (Boechat, 2009 e 2013). O poder do

coronel sobre a cidade local era a base do poder estadual num processo de expansão

também do Estado, ainda que fusionado ao capital que se territorializava. Pode-se

perguntar se a cidade não poderia ser compreendida, até então, como o espaço

complementar de materialização tanto do povoamento dos sertões como do coronelismo

republicano.

cap. 10) parece levar a crer que a noção de meio técnico não se aplicaria a essa primeiras ocupações e

usos do meio natural. Discutimos questões relacionadas a essas interpretações em Boechat, 2014.

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141

Simultaneamente, a expansão da cafeicultura e do povoamento se articula com

aquela das companhias ferroviárias, a ponto de Monbeig concluir sua tese identificando

no Oeste Paulista antes a formação de “regiões ferroviárias do que econômicas”

(Monbeig, 1998). A efemeridade das relações sociais dinâmicas da frente pioneira não

havia permitido, segundo o geógrafo francês, a constituição de gêneros de vida próprios.

A ferrovia, no entanto, possibilitava a expansão das lavouras e a mobilidade do capital47

e do trabalho, fomentava o crescimento de algumas cidades e decretava o fim ou a

decadência daquelas mais distantes das suas estações. À sua maneira, mecaniza-se o

território (Santos, 2008). A expansão e seletividade desse sistema de engenharia se

consistia, portanto, num aspecto central do meio técnico, determinando não apenas o

sistema de ações da dinâmica cafeeira, como também o sistema de objetos no qual se

incluía aspectos da produção do espaço das cidades a ela atrelada.

A discussão sobre o caráter constitutivo de uma região, incluindo sua

recuperação como conceito fundante de uma geografia regional e objeto de crítica tanto

de uma Geografia quantitativa como de uma Geografia autodenominada de crítica48

, foi

central em nossa pesquisa de mestrado. Nela, tomamos o caminho de compreender a

territorialização de relações sociais de produção e de relações particulares de poder do

Estado em formação como constituindo uma região do colonato (ver Boechat, 2009).

Daí a importância de articular a territorialização do capital com as questões da

autonomização de suas categorias (terra, trabalho e capital), pensando particularmente

nos casos da contradição encontrada nas figuras do colono, do coronel e da fazenda.

Ressaltamos, porém, na abordagem que agora propomos, uma retormada breve de parte

desse estudo pelo viés particular da urbanização na modernização dessas condições

regionais. Para tanto, propomos aqui pensar ligeiramente na cidade daquela “região do

colonato” em comparação com a cidade que se formou a partir da dissolução dessas

relações sociais particulares. Cidade esta que pode ser qualificada como “corporativa”

47

Certo é que o capital inglês, que financiava tal expansão, articulava-se com o capital conjugado das

principais famílias de cafeicultores (ver Cardoso de Mello, 2009), determinando o direcionamento dessa

expansão também pelas relações do coronelismo local e estadual. O coronelismo, desse modo, também

representava a mediação que personificava a territorialização do capital financeiro na frente pioneira, algo

que Raymundo Faoro (2008) ressaltou à sua maneira.

48 Para uma observação dessas passagens na História do Pensamento Geográfico, ver M. Santos, 2008c.

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(Santos, 2008c; Elias, 2003; e Elias, 2007) ou mesmo como “cidade do agronegócio”

(Elias, 2007).

Em suma, pode-se caracterizar um processo de constituição dos centros antigos

da maior parte das cidades locais do interior paulista como tributário das relações

próprias da expansão dessa cafeicultura. Organizado em torno do patrimônio doado aos

bispados da Igreja Católica, o núcleo de povoamento modificava-se rapidamente com a

instalação de uma infraestrutura (ou sistema de objetos) decisiva para a ligação das

fazendas produtoras com o mercado mundial. Concentrava um comércio de

mantimentos e ferramentas, sobretudo para o uso daquelas fazendas, bem como

máquinas para o beneficiamento do café e de outras produções agrícolas, como o arroz e

o algodão. Ainda, um incipiente setor de serviços (hospitais, farmácias, matadouros,

etc.) e de pequenas manufaturas (marcenarias, ferralherias, etc.) completava uma

paisagem urbana que também recebia um contingente grande de imigrantes e migrantes

mobilizados primordialmente para o trabalho nas fazendas.

Estas fazendas eram mais do que meras unidades produtoras de café, sendo

também local de moradia de trabalhadores e de muitos dos seus proprietários. Ademais,

segundo a fórmula como se organizou o trabalho no sistema do colonato, parte das

mesmas fazendas se destinava às plantações e criações dos próprios trabalhadores

(Martins, 2000). A cessão parcial dos meios de produção complicava, portanto, a

caracterização do colono como simples assalariado, ao mesmo tempo em que tornava a

fazenda uma unidade contraditória (Franco, 1984). Realizamos (Boechat, 2013) essa

discussão, demonstrando que a contradição do colonato se expressava espacialmente na

contraditória constituição espacial da própria fazenda.

Entendemos, ainda, o processo de expansão da cafeicultura para o Oeste

Paulista como embasado num projeto de modernização que articulou a legislação

fundiária com uma política de incentivo à imigração em massa, possibilitando o

questionamento efetivo da colonização até então ancorada no escravismo. Este projeto

foi denominado de “colonização sistemática” pelo seu teórico, o economista inglês E.

G. Wakefield, e visava equacionar a possibilidade de acumulação de capital no contexto

de abundância de terras “livres” a potencialmente “desviar” os trabalhadores do trabalho

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para o capital, levando-os a ocupar meios de produção para si mesmos49

. O colonato

aparecia, assim, como aplicação particularizada desse projeto, na qual o acesso aos

meios de produção no interior das fazendas mediava o trabalho do colono também no

cafezal.

Por mais que ali se produzisse parte dos meios de vida de quem nela residisse,

a fazenda, entretanto, seguia dependendo do suprimento pelo comércio instalado nas

cidades próximas de mercadorias complementares, não sendo efetivamente uma unidade

autônoma do mercado em geral. Igualmente, por outro lado, sua produção seguia sendo

encaminhada para o beneficiamento e a comercialização que se davam, principalmente,

nessas cidades locais. A colonização sistemática conduzia, portanto, a uma paralela

urbanização, num processo que constitui parte da rede urbana e transforma a vida social.

2. CRISE E MODERNIZAÇÃO NA TRANSFORMAÇÃO DA EXPANSÃO

CAFEEIRA E DA URBANIZAÇÃO

As crises da cafeicultura como um todo se reiteravam desde princípios do

século XX, ganhando proporções agigantadas a partir de 1929. As respostas econômicas

a essas crises, materializando um processo de diversificação da produção em direção a

certa policultura, passariam a testar tanto a incorporação às fazendas cafeeiras da

pecuária e de outras produções agrícolas (entre elas, principalmente: cana, laranja e

algodão), assim como surgia como alternativa o parcelamento das grandes propriedades

(ver Prado Jr., 1935; Monbeig, 1957; e Milliet, 1982).

Paralelamente, as redes de relações que comandavam a urbanização no

território paulista faziam com que São Paulo se transformasse em metrópole, cujas

relações com a expansão e as crises da cafeicultura nem sempre foram ressaltadas como

sendo de complementariedade.

Teoricamente encharcada por um pensamento dualista50

, a metrópole se

apresentaria, cada vez mais, como contraposta às pequenas e médias cidades do interior,

49

Para um resgate da implantação dessas políticas, ver Cirne Lima, 1990, e Costa, 1998; e para uma

crítica ao projeto de Wakefield, ver Marx, 1985, cap. 25. Estas questões fundamentaram boa parte de

nossas pesquisas até aqui, sendo apresentadas tanto em Boechat (2009) como em Boechat (2013).

50 Ver crítica ao dualismo em Oliveira (2003); porém, a primeira parte do terceiro capítulo de Boechat

(2013) procura uma crítica diferenciada ao dualismo.

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de modo que o desenvolvimentismo (sobretudo a partir do pós-guerra) apontaria

seguidamente o “atraso” destas em relação à modernidade materializada naquela. No

entanto, também no interior desse locus de modernidade, a segregação da população

trabalhadora em cortiços e favelas indicaria semelhante dualismo próprio da

metropolização (Seabra, 2004b), numa desigual apropriação da suposta liberdade

(contraditória) da cidade. De todo modo, o espraiamento (Elias, 2003) ou a explosão

(Seabra, 2004a) da metrópole seria uma marca distintiva desta em comparação com as

demais cidades da rede urbana, ao menos até certo período.

É de se lembrar, todavia, que a década de 1930 foi marcada por uma recessão

também em escala mundial. O rompimento com parte dos fundamentos do complexo

cafeeiro se dava, pois, em meio à crise, como movimento de mudança local relacionado

a transformações num nível geral da sociedade mundial produtora de mercadorias

(Kurz, 2000). Desse modo, se o coronelismo estava sendo “combatido” pela

urbanização, pela escolarização e ascensão de camadas médias, bem como pela

industrialização e pela centralização política, a modificação interna da fazenda cafeeira

contribuía para relativizar a centralidade da cafeicultura na economia nacional também

com a adoção de novas lavouras e da pecuária. Tais fazendas, diante dos problemas

econômicos e da busca por outros rendimentos, substituíam parte dos seus cafezais por

outras plantações ou por pastagens, ou vendiam parte de suas terras para sitiantes.

Neste contexto, o loteamento de propriedades rurais para a expansão das

cidades podia representar um “retorno” econômico extraordinário face às dificuldades

da agropecuária em crise. Como observou Orlando Valverde (2006), a citricultura da

Baixada Fluminense se deparava com a transformação de suas terras em “improdutivas”

pela sua fragmentação e comercialização de lotes, para suprir a demanda da urbanização

daquela metrópole, sobretudo durante a crise da citricultura dos anos 1940-1950. Em

ritmo menos avassalador, também em cidades locais e médias do interior paulista, a

possibilidade do loteamento urbano se colocava para os proprietários fundiários de

terras aos seus arredores. Crise e especulação certamente andaram juntas no crescimento

das cidades neste período.

O desenvolvimentismo, que positivava a modernidade da metrópole em

processo de industrialização, embasaria uma modernização também da agricultura. A

passagem da “colonização sistemática” à era da assim chamada Revolução Verde

indicaria um processo de industrialização das relações sociais de produção no campo,

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que se iniciava com a importação de tratores e insumos tidos por modernos. Enquanto

essa importação representava uma mitigação da crise de superprodução de economias

recém-egressas do pleno emprego promovido pelo conflito mundial (Harvey, 2005),

possibilitava também uma expansão intensiva da produção agrícola e uma mudança do

esquema de expansão extensiva até então vigente51

.

Do ponto de vista das fazendas, o uso de maquinário e de insumos permitia

transformar as condições de uso de solos antes inadequados para o cultivo do café. A

entrada de outros cultivos rentáveis pressionava para a reincorporação de terras cedidas

para os trabalhadores52

. Máquinas tornavam relativamente menos “necessários”

trabalhadores e a existência de um mercado de trabalho alocado nas cidades53

fazia

deixar de ser prioridade a manutenção de trabalhadores morando no interior das

unidades produtivas, sobretudo com as maiores facilidades de transportes e a redução

dos salários (ver Stolcke, 1986; e Graziano da Silva, 1981). Rompia-se, assim, a

51

A própria industrialização nacional, por sua vez, dar-se-ia através da substituição de parte dessas

importações (ver Furtado, 2000; e Tavares, 1972). Entre elas, a constituição de uma indústria nacional de

tratores e de adubos representaria um primeiro passo para a industrialização da agricultura (Delgado,

1985; e Graziano da Silva, 1981). Entretanto, apenas a partir da sistematização de um Sistema Nacional

de Crédito Rural (SNCR), em 1965, a generalização do uso desses insumos poderia vir a ocorrer, com o

Estado financiando o consumo produtivo dessas mercadorias, que aumentavam a composição orgânica

dos capitais agrícolas (ver Boechat, 2013, cap. 3). Assim, a intensificação da produção agropecuária

podia ter seus custos de reprodução rebaixados a ponto de se equiparar aos custos e rendimentos

provenientes da forma extensiva de uso do solo e do trabalho, até então vigentes.

52 Mudanças na legislação trabalhista, com o Estatuto do Trabalhador Rural, de 1963, e na legislação de

parcerias e do uso partilhado da terra, com o Estatuto da Terra, de 1964, completariam um quadro em que

o colonato seria radicalmente transformado em seus fundamentos. O questionamento das terras, internas

às fazendas, destinadas para uso dos trabalhadores acabaria por inviabilizar o esquema conjugado de

reprodução desses.

53 Para o caso de áreas como as da chamada Alta Sorocabana, em torno de municípios como Assis-SP e

Presidente Prudente-SP, autores como Brant (1976) e D’Incao (1979) indicariam um processo de

transformação em que a crise da cafeicultura, sua substituição pela pecuária e pelo algodão, levavam à

migração do campo para as cidades. A ausência de um simultâneo processo de industrialização nessas

cidades, porém, fazia com que o engajamento dos trabalhadores mobilizados seguisse se dando, ainda, em

atividades rurais ou esporadicamente no comércio e na construção civil. O mercado unificado de trabalho

simples se dava, assim, de maneira bastante crítica.

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unidade contraditória da fazenda, que passaria a se especializar apenas como local de

produção, “expulsando” de seu interior as condições de reprodução do trabalhador.

Foi nestas condições que se formaram as primeiras turmas de trabalhadores

boias-frias, logo coordenadas por turmeiros, que descontavam parte dos ganhos de seus

subordinados, agenciados nos bairros periféricos das cidades e levados em ônibus até os

pomares (ver Brant, 1976 e Baptistella, 1998). Não tardaria para um mesmo esquema

mobilizar trabalhadores em outros estados para o trabalho no agronegócio paulista.

Paralelamente, o sistema de financiamento e de incentivo governamental que

fomentava a utilização dessas mercadorias nas fazendas facilitava a instalação de

indústrias processadoras das mercadorias agropecuárias. A industrialização a montante e

a jusante da produção agropecuária se mostrava como uma nova integração entre

agricultura e indústria, conformando o que alguns autores teorizaram como um

complexo agroindustrial (ver Graziano da Silva, 1981; Delgado, 1985; Paulillo, 2006).

A citricultura teria uma integração semelhante, constituindo-se, assim, o complexo

agroindustrial citrícola (ver Martinelli Jr., 1987; e Paulillo, 2006).

Tem-se, assim, a constituição do meio técnico-científico-informacional,

dotando o território de maior fluidez e mecanizando o espaço de maneira que a

informação passa a ser variável indispensável na reprodução social. Nele, as cidades

adquiriram novos sistemas de objetos, para retomar a terminologia de M. Santos (2002,

2008a, 2008c), culminando numa integração que também pode ser concebida como uma

produção de um espaço (Elias, 2007) no qual a reprodução ampliada dos capitais

aplicados na produção de mercadorias agroindustriais determina a refuncionalização das

cidades, a ponto de poderem ser concebidas, a partir de então, como “cidades

corporativas” (Santos, 2008a; Elias, 2003). Diante deste contexto, indicamos a

conformação de novas relações campo-cidade.

3. LOTEAMENTOS URBANOS DERIVADOS DA DISSOLUÇÃO DO

COLONATO: A URBANIZAÇÃO NA MODERNIZAÇÃO CRÍTICA DA

AGRICULTURA DOS ANOS 1970 E 1980

Com o processo de modernização acima recuperado, a cidade, incluindo as

pequenas e médias do interior paulista, aparecerá gradativamente mais como o local da

infraestrutura, dos bens e dos serviços necessários a esta transformação.

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Além de centralizar a circulação da mercadoria agrícola, a cidade será onde se

concentrará o comércio de maquinários e insumos essenciais para a nova agricultura e

suas demandas. Será também o local privilegiado dos bancos que farão a mediação do

financiamento dessa modernização e de órgãos estatais de controle, pesquisa e

supervisão. Será, ainda, onde se organizará o mercado de trabalho de trabalhadores

rurais, agrônomos e técnicos mobilizados para o seu consumo produtivo nas fazendas e

sítios. Será, por fim, onde se localizarão as indústrias processadoras dos complexos

agroindustriais, modificando as matérias-primas em mercadorias industrializadas ou

semi-industrializadas para o mercado interno ou para a sua exportação.

A paisagem urbana da metrópole parece articular um “mar de prédios” à

sucessão interminável de “laje e bloco” de suas periferias, como sintetiza Seabra

(2004a), fazendo-se perder a conexão imediata com a topologia, a hidrografia e a

vegetação onde inicialmente a cidade se situou (ver Monbeig, 1957). Por sua vez, as

cidades do agronegócio aparecem, em geral, com uma paisagem contraposta em que o

centro antigo e os bairros residencias mais recentes, por mais que se diferenciem quanto

às suas construções, estão corriqueiramente cercados por imensas plantações, como na

“leitura espacial” feita por Maria Ap. de Moraes Silva:

“A homogeneidade espacial foi produzida em função da destruição (muitas

vezes utilizando-se máquinas) das casas dos ex-colonos, parceiros, sitiantes,

dos engenhos e até mesmo de antigas usinas. À “leitura espacial” de antes,

seguiu-se uma outra “leitura” definida pelas imensidões dos canaviais

entrecortados pelos laranjais, cafezais, algodoais, onde, segundo um antigo

morador “até mesmo os pássaros foram embora”, e pelas cidades dos

trabalhadores rurais. Estas assemelham-se a cidades fortificadas. Ao invés

das pedras, o verde destes produtos constitui-se em suas próprias muralhas,

em seus próprios limites”. (Silva, 1993; 31).

Porém, Moraes Silva (1993) vai além e distingue três tipos de pequenas

cidades de trabalhadores rurais. Numa primeira, haveria a cessão direta de moradia aos

trabalhadores pela empresa, formando quase que uma vila de operários cativos, como

em Santa Ernestina-SP. Numa segunda, haveria a acima referida divisão entre centro e

periferia, como em Altinópolis-SP e Serrana-SP, com os trabalhadores confinados mais

às vilas e bairros periféricos. Por fim, haveria aquelas em que, além da distinção acima,

estas vilas e bairros apresentariam um processo de favelização, “caracterizadas pela

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falta de infra-estrutura urbana: rede de esgoto, ruas asfaltadas, etc.” (Silva, 1993; 31),

como em Guariba-SP.

Trata-se, pois, de uma urbanização que se dá de forma bastante desigual, não

apenas na comparação entre diferentes casos de cidades, mas também no interior dessas

cidades. A desigual apropriação do espaço urbano e o recente espraiamento dessas

cidades permite a constatação de “áreas luminosas” (Elias, 2003) nas quais reluz os

sistemas de objetos que cumprem as funções primordiais da reprodução ampliada do

capital agroindustrial articuladas àquelas em “opacas” em que se reproduz boa parte de

sua população, acionando o circuito inferior da economia (Santos, 2008b).

Os bairros de trabalhadores rurais que primeiramente se formaram nos

arredores dos centros antigos daquelas cidades, muitas vezes derivaram de loteamentos

de sítios e fazendas que aproveitaram o processo de transformação das relações sociais

de produção. Foram frutos, portanto, do processo de migração de trabalhadores que

deixaram de ser colonos e camaradas das fazendas antes cafeeiras. A infraestrutura

desses loteamentos, como indica o trabalho de Silva (1993), variou, embora tenha

normalmente sido bastante deficiente, ao menos num primeiro momento. As condições

de trabalho e de remuneração que passaram a enfrentar esses moradores também

contribuiram para a constituição de moradias precárias e um comércio informal. Deu-se,

com isso, uma produção do espaço que, no conjunto, poderia ser compreendida como

parte de uma “urbanização crítica” (Damiani, 2004).

4. LOTEAMENTOS ATUAIS NO CONTEXTO DA CRISE E DA

FINANCEIRIZAÇÃO DA SOCIEDADE: CRISE DA CITRICULTURA E DO

TRABALHO NA URBANIZAÇÃO CRÍTICA

Apresentamos nossa compreensão sobre os fundamentos e as expressões da

crise do complexo agroindustrial em nossa tese de doutorado (Boechat, 2013). Alguns

de seus aspectos podem ser brevemente retomados.

Ali, sugerimos uma compreensão do fundamento da crise como oriundo da

própria modernização da agricultura. Isto é, retomando o termo de Lencioni (1985), a

intensificação do capital na agricultura, a partir dos anos 1960, representou mais do que

a proletarização do trabalhador rural, ao que se ateve aquela autora. Indicamos que esse

processo condizia com um aumento da composição orgânica dos capitais, em que a

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parte constante dos mesmos se tornava relativamente superior à variável, aquela que

valoriza o valor pelo trabalho não-pago, produzindo mais-valia. Com isso, a tendência

seria de se reduzir a base da valorização perante o montante do capital mobilizado,

ainda que, contraditoriamente, a quantidade de mercadorias e a massa de lucro

pudessem estar aumentando.

Desse movimento crítico geral, tinha-se particularmente na história da

agroindústria citrícola a observação de um processo de centralização de capitais,

sobretudo no setor industrial. Por outro lado, a mecanização e o uso de insumos

modernos, aumentavam os custos de reprodução do setor agrícola, ao passo que

eliminavam relativamente a necessidade de emprego extensivo de força de trabalho em

diversos elos da produção de laranjas. Enfim, o desdobrar de uma tendência de queda da

taxa de lucro se contrapunha a diversos mecanismos de monopolização postos em

prática e se camuflava perante outros de financeirização e de incentivo estatal.

Quase que simultaneamente à derrocada da antiga cafeicultura e de seu sistema

de trabalho, a conformação de novas relações sociais de produção apresentava logo um

caráter de informalidade e intermitência quanto à contratação dos trabalhadores, algo

que se permitia pelas dificuldades de contestação política da época, mas também pela

crescente relativização da centralidade da força de trabalho na composição orgânica dos

capitais citrícolas. Com isso, uma crise do trabalho se mostrava em gestação, embora a

expansão das lavouras e das massas de lucros escamoteasse essa formação como sendo

uma fase áurea da citricultura.

A crise da citricultura, ainda que tenha se apresentado a partir dos anos 1980,

parece ter sido adiada pela constituição de mecanismos de regulação que permitiram

uma relativa divisão mais aceitável das massas de lucros entre citricultores e indústrias,

num contexto de altos preços internacionais do suco concentrado, em muito ajudado

pelas condições de produção paralelas na Flórida-EUA.

Nos anos 1990, entretanto, com o diminuição do aporte financeiro do sistema

de crédito rural subsidiado e com o acirramento da monopolização industrial54

, a crise

se expressaria de maneira mais violenta, no que denominamos de “espetáculo da auto-

54

A monopolização do setor de processamento do suco concentrado também fez por centralizar na mão

de poucas empresas as indústrias existentes, levando ao fechamento de inúmeras plantas produtivas.

Somente em Bebedouro, a fábrica da Cargill e a packing-house da Cutrale foram definitivamente

fechadas, enquanto a da Louis-Dreyfus opera com capacidade reduzida.

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destruição do complexo citrícola” (Boechat, 2013, cap. 3). Essa concepção catastrófica

se deveu muito a um processo de aumento de custos e diminuição de preços finais,

controlados pelos monopólios estabelecidos. Assim, desde então, numerosos pequenos

sitiantes e mesmo produtores de médio porte têm abandonado a atividade, afetando

potencialmente o nível de acumulação de capital do setor.

Por sua vez, do ponto de vista do trabalhador, após um primeiro momento de

desregulamentação dos contratos de colheita da laranja, delegados a falsas cooperativas

de colhedores, durante os anos 1990, teve-se nos anos 2000 um maior controle estatal

sobre os termos desses contratos, firmados a partir de então entre citricultores e

trabalhadores, organizados geralmente em turmas (ver Baptistella, 1998 e Paulillo,

2006). Por mais que esse controle, feito principalmente pelo Ministério Público do

Trabalho, represente a retomada parcial de direitos assegurados pela legislação

trabalhista, a decadência de pomares e a saída de fazendeiros e sitiantes da citricultura

tem diminuído postos de trabalho e piorado as condições dos que restam.

Desse modo, a crise do trabalho parece se apresentar localmente para os

trabalhadores antes engajados no complexo agroindustrial citrícola, tendo como

agravante, ainda, a intensa mecanização da lavoura canavieira, observada na última

década, diminuindo uma potencial alternativa de emprego. Este parece ser, portanto, o

cenário de uma urbanização crítica que permeia e à qual se articula a constituição de

novos loteamentos e a reprodução social dos antigos bairros de boias-frias e de

trabalhadores em geral dessas cidades.

Retomando a questão da precariedade dos bairros periféricos formados para

abrigar o crescimento populacional de cidades como Bebedouro, o dinamismo da

urbanização, no entanto, poderia incorporar áreas inicialmente favelizadas ao chamado

“tecido urbano” pelo investimento estatal nessa infraestrutura, como também no

fornecimento das próprias moradias tanto pelo extinto Sistema Nacional de Habitação,

como pelas Cohabs (Conjuntos Habitacionais) e, recentemente, pelo Programa Minha

Casa, Minha Vida. Neste processo, a mediação da política local seria decisiva e

remeteria, ao menos em aparência, ao compromisso coronelista de outrora,

reproduzindo práticas eleitoreiras.

No entanto, o aporte de crédito para financiar tais obras de grande envergadura

sugere uma generalização da produção do espaço antes aparentemente restrita ao

consumo das classes média e alta da sociedade. No que se refere ao processo de

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financeirização da economia nacional, Maria da Conceição Tavares (1972) afirmava

que a Reforma Bancária e a re-organização da Bolsa de Valores tinham, ainda, ao seu

lado a constituição de um sub-sistema voltado para a habitação, com o novo marco legal

e a constituição de um Banco Nacional da Habitação. Neste sub-sistema da habitação, à

maneira como o capital financeiro especulava com títulos de propriedade de ações, o

mercado da habitação tentaria promover a liquidez necessária para uma expansão da

construção civil, o que de fato teria ocorrido. Tavares (1972), no entanto, via um

mercado imobiliário voltado, principalmente, para o consumo das classes média e alta

das grandes e médias cidades. Os mecanismos de crédito não se generalizavam até então

e a maioria da população entrava na promoção da urbanização, sobretudo como força de

trabalho da construção civil.

Não seria de se perguntar se esta produção espacial da periferia de pequenas

cidades, atrelada à dívida pública, não seria expressão particular da financeirização da

sociedade como um todo? Os próprios loteamentos de sítios e fazendas visando à

construção de casas atreladas a tais linhas de crédito não seriam, ainda, expressões de

uma reprodução crítica do agronegócio, cujos rendimentos decrescentes tornam-se

gradativamente menos interessantes frente à obtenção de rendas fundiárias capitalizadas

por meio da venda da terra?

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Como justificativa da importância do estudo de cidades médias e locais, em

contraposição aos estudos mais disseminados de Geografia Urbana sobre as metrópoles

e, recentemente, também sobre as cidades médias (ver Damiani, 2006 e também

Sposito, 2006), podemos citar a indicação dada por Pierre Monbeig, para quem:

“A geografia urbana não se limita ao estudo das grandes capitais: cidades

pequenas apresentam tanto interesse quanto as colmeias urbanas modernas e

é quase sempre mais difícil precisar seu mecanismo e o ritmo mais calmo de

sua vida, do que analisar as engrenagens bem lubrificadas, correndo a toda

velocidade, das metrópoles imponentes. (...) o Brasil (...) tem suas cidades

pequenas estreitamente ligadas à vida rural” (Monbeig, 1957; 36).

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Esta ligação com uma vida rural, aparentemente mais calma e em oposição à

modernidade veloz e imponente das metrópoles, é algo a ser repensado para as relações

impostas pela modernização da agricultura a essas cidades do agronegócio.

Transformadas para abrigar os trabalhadores egressos das fazendas, estas cidades

adquiriram espaços periféricos, serviços diversos, pequenas e grandes indústrias e talvez

um ritmo de vida semelhante ao observado nas metrópoles, a ponto de Sandra Lencioni

concluir:

“Essa paisagem urbana modificou-se radicalmente quando a intensificação do

capital nas atividades agrárias prevaleceu significando a proletarização do

trabalhador rural. Como decorrência, a relação entre agricultura e

urbanização se traduziu na formação de periferias.” (Lencioni, 1985; 51).

O estudo de bairros de periferia das cidades do agronegócio remete, portanto, à

necessidade de entendimento dessa intensificação do capital nas atividades agrárias,

conduzindo às mudanças do urbano, mas também a uma compreensão do lugar nesta

configuração. Lugar este compreendido como resultado de processos mais amplos de

transformação social e, ainda, como a potencial concretização particular de

transformações que vão para além dele, modificando o plano geral. Na concepção de

Milton Santos:

“Num dado momento, o “Mundo” escolhe alguns lugares e rejeita outros e,

nesse movimento, modifica o conjunto dos lugares, o espaço como um todo.

É o lugar que oferece ao movimento do mundo a possibilidade de sua

realização mais eficaz. Para se tornar espaço, o Mundo depende das

virtualidades do Lugar. (...) A ordem global busca impor, a todos os lugares,

uma única racionalidade. E os lugares respondem ao Mundo segundo os

diversos modos de sua própria racionalidade.” (Santos, 2002; 338).

Certa particularidade da racionalidade local e de sua conformação segundo a

ordem global é, pois, o que se busca ao se enquadrar o caso das cidades locais do

agronegócio paulista num estudo como o que aqui apresentamos, de maneira que,

enquanto particularidade, representa uma compreensão única da reprodução social a que

todos estamos submetidos, ainda que de formas distintas. Assim, o estudo da periferia

de cidades não metropolizadas não tem interesse apenas para aqueles que a vivenciam,

alçando-se como objeto de pesquisa relevante para toda a Geografia Humana. Parece-

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nos, por isso, importante relacionar diferentes escalas de tempo e de espaço entre si,

como sugere Sposito (2006).

Neste sentido, compreendemos o cotidiano reiterado localmente como alçado à

condição de conceito, de modo que a vida cotidiana parece ter emergido do plano das

rotinas de maneira cindida, tal qual a forma social derivada do duplo da mercadoria –

valor de uso e valor; trabalho concreto e trabalho abstrato (Seabra, 2004b). Assim, o

plano concreto do viver nesses bairros, articula-se contraditoriamente com a

personificação do trabalho nas lavouras, indústrias e comércio/serviços, e também com

a personificação diferenciada do consumidor de mercadorias, motivado por uma

indústria cultural, em relações constantemente permeadas por cisões de gênero e por

outras diferenciações sociais (Sholz, 2010).

Porém, a crise econômica e social que se generaliza, a partir de um fundamento

de exclusão do trabalho vivo do processo de valorização do valor (Kurz, 1995), aponta

para a constituição cotidiana de uma urbanização crítica, como sintetiza Amélia L.

Damiani:

“O mundo das massas despossuídas é a urbanização crítica. O mundo de uma

economia que se realiza criticamente é a urbanização crítica. O urbano como

centralidade de culturas, festas, desejos, encontros, necessidades, que é

negado, é a urbanização crítica. O mundo do dinheiro, da equivalência, que,

nos seus fundamentos e subterrâneos, move-se como relações de não

equivalência, de exploração do trabalho, de expropriação de meios de vida e

de produção, de embate entre formas do dinheiro – a do dinheiro como

medida de valor e como meio de circulação, sintetizadas na forma do

dinheiro como capital – é a urbanização crítica. A tábua rasa da história, o

seu varrer, a produção da obsolescência precoce dos produtos vários,

incluindo a cidade, para afirmar novos produtos, é a urbanização crítica.”

(Damiani, 2004; 39).

O drama da vida cotidiana nestas condições, em particular para o caso dos

bairros de boias-frias de cidades locais do agronegócio, e não por isso livres da crise

social que fundamenta aquela forma de urbanização crítica, motiva a pespectiva crítica

desse artigo.

Trabalhadores rurais, no caso aqui mais estudado, de uma citricultura em crise,

porém mobilizados tanto para um modo de vida urbano, como para seguir em busca da

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mediação tanto do dinheiro como do trabalho na reprodução de suas vidas; portanto,

boias-frias cada vez mais condizentes com a condição social em vias de generalização, a

saber, a de serem sujeitos do dinheiro sem dinheiro (Kurz, 2000). A conformação

histórica dessa condição, especialmente no lugar enfocado, requer uma abordagem tanto

da modernização da agricultura articulada à urbanização, como dos fundamentos e

desdobramentos da crise e, com ela, da urbanização crítica também dessas

manifestando-se nas pequenas cidades e, por meio delas, expressando-se de modo

particular.

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DINÂMICA LOCACIONAL INTRAURBANA DE INDÚSTRIAS EM CIDADES

MÉDIAS: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA

Elias Mendes Oliveira55

Resumo

A periferização de fábricas constitui a principal tendência da dinâmica locacional

intraurbana de indústrias em cidades médias. Este “deslocamento” das unidades

produtivas rumo às periferias visa a maximizar a reprodução dos capitais investidos na

atividade secundária e promove uma série de impactos nas estruturas internas das

cidades. No pós-guerra e, principalmente, após a década de 1970, muitas cidades médias

tornaram-se destinos privilegiados para investimentos industriais de origens exógenas

(nacionais e/ou estrangeiros), motivo pelo qual vivenciaram sensíveis alterações em

suas dinâmicas socioespaciais.

Palavras-chave: Industrialização. Localização industrial. Cidades médias.

1. DINÂMICA LOCACIONAL DAS INDÚSTRIAS - UMA ABORDAGEM

MULTIESCALAR:

A Geografia Industrial analisa as relações histórica e dialeticamente

estabelecidas entre indústria e território (MENDÉZ e CARAVACA, 2008). Uma

particularidade dessas relações consiste na vigência de dinâmicas locacionais distintas

da indústria, que se diferenciam pela escala de análise (SELINGARDI-SAMPAIO,

2009).

Em escala mundial, no pós-guerra, a progressiva internacionalização do capital

financeiro e produtivo caracteriza-se pelos vultosos investimentos de firmas estrangeiras

55

Mestre em Geografia. Professor no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo,

campus de São João da Boa Vista (IFSP-SBV).

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em regiões periféricas. A abundância de recursos naturais, a presença de mão de obra

barata, as ações governamentais de fomento à indústria e as leis ambientais menos

restritivas permitem a redução de custos produtivos nos países em desenvolvimento,

trazendo melhores condições para reprodução dos capitais investidos (SELINGARDI-

SAMPAIO, 2009). Além disso, a aplicação de recursos financeiros em regiões

periféricas constitui estratégia para conter a desvalorização de capital nos países centrais

por conta das crises periódicas de superacumulação típicas do capitalismo (HARVEY,

2005).

A modernização dos sistemas de transportes e de comunicações é fundamental

neste processo, na medida em que potencializa a permuta de materiais, indivíduos,

capitais e informações em escala global, ao mesmo tempo em que reforça a disjunção

espacial da produção pelas empresas multinacionais.

Como consequência, conforma-se uma nova divisão internacional do trabalho

com a inserção de novas áreas ao sistema de transformação industrial e a integração dos

mercados nacionais, abrindo novas frentes à acumulação capitalista.

O Brasil constitui um dos principais destinos para os capitais de origem

externa, motivo pelo qual figura como um dos mais importantes Newly Industrialized

Countries juntamente com a Índia, a China, o México e a África do Sul.

O território de grandes dimensões, rico em recursos naturais; o enorme

potencial do mercado consumidor e de trabalho, representado por uma das maiores

populações do mundo; e a ação incisiva do Estado (União, Estados e Municípios) na

promoção da indústria, justificam o poder de atração do Brasil junto aos investidores

internacionais.

A entrada maciça de capitais externos na economia brasileira promoveu a

diversificação de seu parque industrial, acelerando os processos de urbanização e de

integração do território. Contudo, o Brasil aderiu ao sistema mundial de produção como

país periférico, porque manteve a dependência financeira e tecnológica aos países

centrais.

Em escala regional, até a década de 1970, a introdução de capitais externos

destinava-se basicamente à Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), principal área

de concentração industrial do país. O maior volume e qualidade das economias de

aglomeração nesta área influenciaram grande parte das decisões locacionais dos

empresários, haja vista seus papéis na redução de custos produtivos (ganhos de escala).

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A maior atração exercida pela RMSP sobre as indústrias advém do

desenvolvimento, da última metade do século XIX até a década de 1930, de relações

tipicamente capitalistas no período áureo da produção cafeeira. As inversões de capital

agrário na indústria, a expansão do mercado consumidor, o território melhor equipado e

a urbanização mais intensa conferiram à capital paulista as melhores condições de

acolher e sustentar a atividade industrial no Brasil (CANO, 1975, SELINGARDI-

SAMPAIO, 2009).

Com base na diversificação e consolidação de seu parque industrial,

historicamente a metrópole paulistana condensou a maior parte da riqueza e de

população, assumindo a primazia econômica sobre o território. A concentração das

atividades econômicas acentuou os desequilíbrios regionais preexistentes no país,

principalmente com a integração do mercado nacional devido à expansão da malha

rodoviária (CANO, 1975, LENCIONI, 1991; SELINGARDI-SAMPAIO, 2009).

Todavia, o excesso de atividades econômicas e habitantes nessa região

manifestou “efeitos indesejáveis” ao funcionamento da indústria, principalmente após a

década de 1970. A presença de deseconomias de aglomeração, como a valorização do

solo urbano, a poluição ambiental, os congestionamentos da malha viária, a

sindicalização da força de trabalho, dentre outras, acabaram por elevar os custos de

produção na metrópole paulistana (LENCIONI, 1991; SELINGARDI-SAMPAIO,

2009).

Por essa razão, iniciou-se um movimento de desconcentração da indústria no

território nacional, quando muitas unidades produtivas se transferiram da RMSP e

novos empreendimentos industriais foram implantados em outras cidades paulistas e

Estados brasileiros.

As cidades médias tornaram-se alvos preferenciais no processo de

(re)localização dos estabelecimentos industriais, na medida em que disponibilizaram o

suporte urbano (infraestruturas básicas, presença de mão de obra e serviços) necessário

ao desenvolvimento da indústria, sem apresentar as deseconomias de aglomeração

identificadas nas regiões metropolitanas e nos grandes centros urbanos. Além disso,

muitos governos municipais, ansiosos em promover a industrialização local, utilizaram-

se da criação de distritos industriais e de subvenções fiscais para atrair fábricas

(OLIVEIRA, 1976; MENDES e SELINGARDI-SAMPAIO, 1987).

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Contudo, os impactos da desconcentração regional da indústria não atingiram

as cidades médias de modo uniforme. Ao contrário, o que se observa é um maior

dinamismo industrial nas cidades do Centro-Sul do país, principalmente naquelas bem

localizadas em relação aos principais sistemas logísticos e aos mercados consumidores

de maior relevância (DINIZ e CROCCO, 1996).

Além disso, as cidades médias que tiveram sua industrialização (re)ativada

neste contexto, em sua maioria, acolheram atividades mais padronizadas da produção ou

as mais poluentes. A metrópole paulistana, por sua vez, manteve a primazia econômica

sobre o território, especializando-se na oferta de serviços sofisticados e abrigando as

atividades nucleares (gestão, desenvolvimento de novos produtos, publicidade e

propaganda) dos principais grupos empresariais que atuam no país (LENCIONI, 1991).

A dinâmica locacional das indústrias em escala regional caracteriza-se,

portanto, pela aquisição de novas áreas ao circuito produtivo. Nesse processo, observa-

se maior alcance da atividade industrial no território, com a reestruturação das

hierarquias urbanas e a manutenção dos desequilíbrios regionais.

Na escala local, intensifica-se a tendência de descentralização da indústria no

espaço urbano, nos diferentes tipos de cidades, o que será discutido nos segmentos

posteriores deste estudo.

Independente da escala de análise, o movimento das indústrias no território tem

por finalidade maximizar as condições de acumulação do capital em relação às

condições técnicas de produção vigentes a cada contexto histórico (MENDES, 2011).

Embora se diferenciem quanto ao alcance espacial, as diferentes dinâmicas locacionais

da indústria mantêm entre si relações de reciprocidade, já que os lugares se articulam

por meio de eventos com origem e realização nessas diferentes escalas geográficas

(SELINGARDI-SAMPAIO, 2009).

2. LOCALIZAÇÃO INTRAURBANA DAS INDÚSTRIAS

A principal tendência de localização intraurbana das indústrias consiste na

descentralização das unidades produtivas. Este processo caracteriza-se pela realocação

ou implantação de fábricas nas periferias ou subúrbios, sinalizando o declínio do centro

e de suas adjacências enquanto destino privilegiado nas escolhas locacionais.

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A descentralização das indústrias em meio urbano fortaleceu-se ao longo do

século XX, permanecendo na atualidade. Nos países desenvolvidos, o fenômeno ocorre

de forma mais intensa, tanto que existem experiências de “ruralização” da indústria na

Europa (MENDES e SELINGARDI-SAMPAIO, 1987). No Brasil, suas principais

manifestações consistem na suburbanização dos estabelecimentos em áreas

metropolitanas e na periferização destes em cidades de menor porte.

Nas cidades médias, Amorim Filho (2005) argumenta que a migração de

fábricas das zonas centrais e pericentrais rumo às zonas periféricas e auréolas

periurbanas intensifica-se paralelamente ao desenvolvimento urbano e industrial.

As causas da descentralização da indústria são várias e despertaram a atenção

de diversos estudiosos. Para Gachelin (1977), o processo encontra explicação nas

dificuldades encontradas nas áreas centrais para ampliação da capacidade produtiva das

indústrias, como a indisponibilidade de terrenos livres, o alto valor do solo urbano e

conflitos com a vizinhança devido à produção de dejetos, maus cheiros, ruídos e

aumento nos fluxos de tráfego.

Para Dézert (1978), o mesmo fenômeno deve ser compreendido à luz das

facilidades de se produzir nas áreas periféricas, como a oferta de terrenos amplos e

baratos, a proximidade da mão de obra e os incentivos concedidos pelos governos locais

para a instalação fora do centro.

Para Borde et al (1980),

[...] “a expansão das indústrias nas periferias urbanas deve-se,

principalmente, às dificuldades crescentes de sua manutenção nas zonas

centrais e pericentrais, ou seja, preço alto do terreno, poluição provocada

pelas indústrias, dificuldades operacionais resultantes de problemas

logísticos, isolamento em relação a complexos industriais localizados em

outras partes da cidade, etc”.

No Brasil, Mendes e Selingardi-Sampaio (1987, p. 61) consideram que:

“o êxodo dos estabelecimentos industriais em direção às periferias urbanas

pode ser explicado por inúmeras causas, dentre as quais se destacam: o alto

preço dos terrenos nas áreas centrais das cidades, a necessidade de muitas

indústrias em ocupar grandes espaços, inexistentes nas áreas centrais, a

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necessidade de se evitar congestionamentos e poluição, a existência de

incentivos para a localização em distritos industriais.”

Em síntese, as dificuldades de operacionalização e de ganhos de escala

(ampliação ou modernização da capacidade produtiva) dão origem às forças centrífugas

que operam sobre os estabelecimentos consolidados nas áreas centrais e afetam as

decisões locacionais futuras. Em contrapartida, a menor incidência dessas forças e o

contato com economias de aglomeração presentes nas periferias reforçam a tendência

geral de descentralização das unidades produtivas.

A descentralização da indústria pode ocorrer de modo espontâneo ou induzido

(MENDES e SELINGARDI-SAMPAIO, 1987; SAILER, 2010). No primeiro caso, a

iniciativa de (re)localização nas periferias parte das empresas, enquanto que, no

segundo, o Estado interfere diretamente nas escolhas locacionais.

De acordo com Mendéz e Caravaca (2008), as ações estatais podem ser de

promoção e/ou de ordenamento da indústria. As primeiras sustentam que a atividade

industrial constitui o setor dinâmico por excelência da economia, por seus efeitos

multiplicadores de emprego e renda. Desta forma, essas políticas visam à introdução,

diversificação ou consolidação da indústria no território. A concessão de incentivos

fiscais e creditícios constitui um dos principais instrumentos utilizados para

subvencionar a implantação de indústrias nos municípios (SELINGARDI-SAMPAIO e

CUSTÓDIO, 1995).

Por outro lado, o ordenamento visa a racionalizar as formas de uso e ocupação

das cidades. Este tipo de política tem por finalidade mediar conflitos entre as diferentes

formas de uso do solo urbano (residencial, comercial, industrial, serviços, circulação,

espaços públicos) nas disputas pelas melhores localizações. Para Mendéz e Caravaca

(2008, p. 293), “trata-se, [...], de tentar resolver alguns dos problemas e conflitos

provocados pelo choque de interesses contraditórios derivados da lógica do sistema

capitalista e do livre jogo das forças de mercado”.

No caso específico da indústria, as políticas de ordenamento procuram

minimizar os efeitos negativos associados à concentração de estabelecimentos em áreas

urbanas de ocupação mais densa, como congestionamentos, poluição ambiental e

conflitos com o entorno. As normas urbanísticas, como as leis de uso e ocupação do

solo, restringem cada vez mais a atividade industrial no centro das cidades. Em países

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como a Espanha, inclusive, os governos locais institucionalizaram medidas para

refuncionalização de conjuntos industriais decadentes do centro em usos residenciais,

comerciais ou de serviços (PASCUAL e ANDRÉS, 2006).

A criação de distritos industriais constitui a principal estratégia utilizada pela

Administração Pública para fomentar e ordenar a indústria no território. Para Oliveira

(1976), os distritos industriais são espaços previamente equipados para abrigar ou

estimular a (re)instalação das unidades produtivas.

Os critérios observados pelo planejamento na implantação de distritos

industriais prezam pela racionalização dos sistemas de circulação e de comunicação

interna; preparação dos terrenos (terraplenagem, fechamento de lotes); oferta de todo o

equipamento de infraestruturas básicas (fornecimento de água e energia elétrica,

saneamento básico, limpeza pública); e localização mais adequada em relação ao tecido

urbano (MENDES e SELINGARDI-SAMPAIO, 1987).

Sobre este último aspecto, convém frisar que a posição estratégica dos distritos

industriais é de suma importância para se alcançarem os objetivos de promoção e

ordenamento da indústria. Em geral, a implantação desses espaços ocorre nas periferias,

junto às principais vias de circulação interurbana, permitindo o acesso facilitado aos

fornecedores, clientes e mão de obra. Além disso, a (re)instalação das unidades

produtivas nos distritos industriais, quase sempre, é facilitada pela cessão de incentivos

fiscais e creditícios às empresas, o que reforça o movimento de periferização da

indústria.

Mendes e Selingardi-Sampaio (1987, p. 61) sintetizaram as principais

vantagens da (re)localização de fábricas nos distritos industriais:

[...] “preço do terreno menor do que o existente no centro da cidade, fato que

possibilita ampliações futuras e mesmo a realização de reserva financeira;

possibilidades de estabelecimento de linkages entre as indústrias

concentradas e o desfrute de economias de aglomeração; uso de

equipamentos comuns, como bancos, restaurantes, áreas de lazer, etc;

benefícios de infraestruturas comuns, tais como serviços de água, energia,

telefone, etc.; eliminação de congestionamentos."

Apesar da orientação geral de periferização das indústrias, inclusive com o

estímulo dos governos locais, o movimento de descentralização não anula de imediato

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os padrões locacionais de tempos pretéritos, nem as necessidades espaciais específicas

de alguns gêneros da indústria.

De acordo com Ribeiro e Almeida (1980), muitas indústrias leves e de pequeno

porte conseguem manter-se nas áreas centrais porque utilizam pequenas extensões de

espaço e não produzem grande quantidade de resíduos. Outras indústrias, como as do

gênero editorial e gráfico, priorizam a localização central em função da proximidade ao

mercado consumidor mais relevante. Além disso, muitas fábricas com ano de fundação

mais antigo permanecem nas áreas centrais por “inércia geográfica”, já que não dispõem

de capital suficiente para a relocalização em outro sítio.

Desta forma, na maioria das cidades coexistem dois padrões distintos de

localização industrial. O primeiro caracteriza-se pela presença de pequenos

estabelecimentos, de ramos tradicionais e/ou com ano de fundação mais antigo nas áreas

centrais, geralmente próximos às linhas férreas ou principais vias de circulação

rodoviária intraurbana. Este padrão denota a influência dos fatores locacionais clássicos

(custos de transportes) em outras épocas e da “inércia geográfica”. Demonstra, também,

a preferência explícita de muitos governos em atrair grandes indústrias de ramos

motrizes aos distritos industriais, como Mendes e Selingardi-Sampaio (1987)

observaram em Rio Claro (SP).

O segundo padrão é representado pelas unidades produtivas de maior porte, de

setores mais dinâmicos e/ou ano de instalação mais recente nas áreas periféricas,

inclusive nos distritos industriais. Trata-se de indústrias que consomem grandes parcelas

de espaço ou que atuam em setores poluentes, motivo pelo qual evitam a localização nas

áreas centrais das cidades.

Os dois padrões citados foram identificados em diversos estudos empíricos

realizados em cidades do Brasil e do exterior, como será discutido na próxima seção do

trabalho.

Um aspecto mais recente que convém destacar dentro da dinâmica locacional

intraurbana das indústrias incide sobre os impactos da reestruturação produtiva em meio

urbano. A reestruturação produtiva surgiu como resposta aos entraves impostos pela

crise do fordismo à acumulação capitalista a partir dos anos 1970. As principais

estratégias utilizadas são a desintegração vertical das firmas, a “externalização” de fases

ou processos produtivos (subcontratação e terceirização), a mecanização das fábricas e o

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investimento em tecnologias e mercadorias sofisticadas ou inovadoras (MENDES,

2011).

Nesse contexto, muitas fábricas não conseguiram se adaptar aos novos

requisitos de competitividade associados à abertura dos mercados nacionais desde a

década de 1980, e acabaram falindo ou sendo absorvidas por outras empresas. Por outro

lado, muitas das indústrias que conseguiram se (re)estruturar aproveitaram a

oportunidade para abandonar as áreas centrais, (re)localizando-se nas periferias,

distritos industriais ou em parques tecnológicos. Suas novas plantas industriais, em

geral, são mais modernas, flexíveis e adaptadas ao atual cenário das trocas econômicas

(MENDES, 2011).

Independente do motivo, o encerramento de atividades nas áreas centrais ou

nos antigos espaços planejados pelo Estado deixa formas industriais obsoletas no espaço

urbano, os brownfields. A presença de prédios ou conjuntos industriais desativados traz

uma série de problemas às populações do entorno, além da desvalorização imobiliária.

De acordo com Hummel e Mendes (2005, p. 6967 – 6968),

“o fechamento de fábricas não traz somente o prejuízo do desemprego para

os funcionários e do encerramento das atividades. Prédios e terrenos

abandonados representam um transtorno para os moradores do entorno,

porque muitas vezes são transformados em ponto de esconderijo para a

marginalidade, depósito clandestino de lixo e criadouro de insetos. Muitos

prédios abandonados são atualmente a causa da desvalorização de áreas

centrais e bairros. Há também o problema ambiental presente em muitos

brownfields que no passado abrigaram atividades poluentes.”

Outro impacto da reestruturação produtiva sobre a dinâmica locacional

intraurbana das indústrias consiste na mudança gradativa de conteúdo das políticas

locais de fomento à atividade secundária. De acordo com Mendéz e Caravaca (2008), se

no século XX almejava-se a implantação de grandes indústrias químicas ou

siderúrgicas, atualmente privilegiam-se unidades produtivas intensivas em tecnologia e

informação, haja vista seus papéis na promoção do desenvolvimento local/regional,

além do menor impacto ambiental.

Como resultado, além dos tradicionais distritos industriais, muitos municípios

conjugam esforços para a criação de parques tecnológicos, incubadoras de empresas e

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condomínios industriais, com o intuito de atrair indústrias de alta tecnologia. Políticas

promocionais nesse sentido foram identificadas recentemente por Mendes (2007) em

Atibaia (SP); por Sailer (2010) em São José dos Campos (SP); e por Mendes (2011) na

cidade espanhola de Valladolid.

Vale lembrar, por fim, que a sucessão dos padrões de localização intraurbana

das indústrias reflete a mutabilidade das estratégias espaciais das firmas. Tais estratégias

partem do pressuposto de que a localização mais adequada em meio urbano traz consigo

a redução de custos operacionais da indústria ou a inserção mais competitiva no

mercado. Para Mendes (2011, p.37), este é o princípio da “[...] racionalidade capitalista

que se apropria dos melhores espaços e cria as condições necessárias de sua produção”.

A variação nas tendências de localização intraurbana das indústrias, portanto, deve ser

compreendida à luz das condições técnicas de produção vigentes em cada contexto

histórico, das necessidades espaciais específicas de cada gênero ou tamanho dos

estabelecimentos, e do próprio processo de produção do espaço urbano. Por essa razão,

reforça-se que a dinâmica locacional intraurbana das indústrias deve ser apreendida de

modo dialético.

3. DINÂMICA LOCACIONAL INTRAURBANA DE INDÚSTRIAS EM

CIDADES MÉDIAS - ESTUDOS DE CASO:

As tendências de localização intraurbana das indústrias suscitaram vários

estudos sobre o comportamento espacial da indústria nas cidades médias, tanto no

Brasil, quanto no exterior. A natureza empírica deste tipo de trabalho contribui para

ratificar, complementar ou refutar o conteúdo das teorias que abordam esta temática, e

permitem comparar se os padrões de localização se repetem em diferentes lugares.

Na Espanha, Pascual e Andrés (2006) discorreram sobre a evolução do sistema

produtivo e seus impactos na reestruturação espacial de Burgos. Esta cidade média

desponta como um dos principais centros urbanos e industriais em sua região (Castilla y

León), em partes devido à industrialização intensa porque passou entre 1964 e 1973.

Nesse período, a cidade foi alvo das políticas de ordenamento territorial empreendidas

pelo governo espanhol, as quais tinham como base ações de fomento à indústria. Como

resultado, instalaram-se em Burgos grandes estabelecimentos de capitais exógenos, que

diversificaram sua estrutura industrial. Aos tradicionais setores têxtil e alimentício,

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capitalizados por recursos de origem local, somaram-se indústrias dedicadas à produção

de peças para automóveis e à transformação de produtos metálicos (PASCUAL e

ANDRÉS, 2006).

No entanto, a crise dos anos 1980 constitui importante marco na história

econômica de Burgos, com reflexos diretos na conformação de seus espaços industriais.

As necessidades de modernização do aparelho produtivo no mercado globalizado

contrastaram com a obsolescência das antigas unidades produtivas. As maiores

indústrias conseguiram reestruturar-se mais rapidamente ao novo cenário. Estas, com o

objetivo de racionalizar e ampliar a capacidade produtiva, optaram por se reinstalar nas

áreas periféricas, onde existiam terrenos maiores e baratos, bem posicionados aos

principais corredores logísticos. Contudo, muitos dos estabelecimentos de menor porte,

principalmente de ramos tradicionais, faliram ou foram absorvidos por empresas de

origem externa (nacionais ou estrangeiras). O fechamento dessas fábricas deixou

brownfields no espaço urbano e todo o tipo de problemas associados às populações do

entorno (PASCUAL e ANDRÉS, 2006).

É interessante observar que, nesse contexto, a Administração Pública vem

atuando diretamente na refuncionalização dos conjuntos industriais decadentes

localizados no interior da cidade (Áreas de Transfomación), estimulando a implantação

de usos residenciais ou terciários naquelas áreas. Os principais instrumentos utilizados

consistem na adoção de normas urbanísticas restritivas à indústria nas áreas centrais e

na criação de espaços planejados na periferia, como os parques tecnológicos, a fim de

reestruturar o uso do solo e aumentar a competitividade das empresas (PASCUAL e

ANDRÉS, 2006).

Mendes (2011) também realizou um estudo sobre as consequências da

reestruturação produtiva sobre as indústrias instaladas em outra cidade média espanhola:

Valladolid. Sua análise recai, basicamente, sobre a readequação dos polígonos

industriales ao novo requisito de competitividade concebido pela globalização:

produção de mercadorias sofisticadas e inovadoras, intensivas em informação e

tecnologia.

Os polígonos industriales, assim como os distritos industriais brasileiros, são

espaços planejados pelo governo na década de 1960, com o intuito de promover e

racionalizar a indústria no território. Naquela época, a implantação dos polígonos

industriales constituía importante estratégia para descongestionar as principais áreas

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metropolitanas do país (Madrid e Barcelona), e desenvolver áreas interioranas na

Região de Castilla y León, onde se localiza Valladolid (MENDES, 2011).

À semelhança de Burgos, a reestruturação produtiva promoveu a falência ou

modernização das atividades produtivas de muitas fábricas situadas nos polígonos

industriales de Valladolid. Os interesses especulativos incidiam fortemente sobre os

prédios abandonados ou subutilizados, em virtude da posição estratégica dos antigos

polígonos industriales em relação às principais vias de circulação intra e interurbana e

às áreas centrais da cidade. As principais alternativas empregadas pelo mercado

imobiliário para a reutilização de áreas ocupadas pelos polígonos industriales

consistiam na refuncionalização dos estabelecimentos por indústrias mais modernas

e/ou pelo setor de serviços, ou na implantação de condomínios residenciais de luxo

(MENDES, 2011).

Mendes (2011) concluiu que a reestruturação produtiva reforçava a tendência

de descentralização da indústria em Valladolid. Os antigos polígonos industriales das

décadas de 1960/70, devidamente absorvidos pela cidade durante o processo de

expansão urbana, perderam a capacidade de suporte e atração junto às atuais e futuras

instalações da indústria, respectivamente. Isso ocorreu devido à obsolescência de suas

estruturas físicas e aos transtornos relacionados à ocupação do entorno, como

congestionamentos, valorização do solo, conflitos de vizinhança e poluição.

No Brasil, em Rio Claro (SP), Mendes e Selingardi-Sampaio (1987) avaliaram

os principais processos e formas espaciais envolvidos na dinâmica locacional

intraurbana das indústrias no município. Os autores identificaram dois padrões de

localização que se diferenciam pela fase de industrialização, origem dos capitais

investidos, tamanho e gênero a que pertencem os estabelecimentos industriais.

O primeiro padrão caracteriza-se pela instalação de unidades produtivas

preferencialmente nas áreas centrais da cidade, junto aos terminais de transporte

ferroviário ou às principais vias de circulação intraurbana. Esse padrão é típico das duas

primeiras fases de industrialização de Rio Claro (SP) propostas por Selingardi-Sampaio

(1987): a “pioneira” (1873-1929) e a “tradicional” (1930-1968). As indústrias leves

(produtos alimentares, vestuário, editorial e gráfica), de pequeno porte, capitalizadas por

recursos locais, são as mais representativas nesse universo de estabelecimentos

industriais. A facilidade na aquisição de insumos, a proximidade do principal mercado

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urbano e da força de trabalho, e a menor demanda por espaço justificam a localização

central das indústrias nesses períodos (MENDES e SELINGARDI-SAMPAIO, 1987).

A fase denominada “dinâmica” por Selingardi-Sampaio (1987) começou em

1969 e estende-se aos dias atuais. Caracteriza-se pela inserção de grandes volumes de

capitais exógenos (nacionais ou estrangeiros) na economia local, consonante aos

processos de internacionalização do capital financeiro e produtivo e de desconcentração

da indústria paulista. Nesta fase, instalaram-se unidades produtivas de grande porte,

representadas por gêneros mais dinâmicos da indústria, como as químicas, metalúrgicas

e mecânicas. Enquanto grandes consumidoras de espaço, a localização central destas

indústrias é preterida a favor da implantação periférica. A criação do distrito industrial

na década de 1970 e a concessão de incentivos fiscais e creditícios pela Administração

Pública Municipal reforçaram a tendência de localização dos estabelecimentos na

periferia (MENDES e SELINGARDI-SAMPAIO, 1987).

Mendes e Selingardi-Sampaio (1987) ressaltaram que os padrões de

localização intraurbana das indústrias em Rio Claro (SP) não se anularam na passagem

de uma fase de industrialização para outra. Ao contrário, coexistem no espaço urbano

indústrias que se mantiveram na área central por “inércia geográfica”, outras que

emigraram das áreas centrais e aquelas que se instalaram prontamente na periferia ou no

distrito industrial.

Em Presidente Prudente (SP), Spósito (1986/87) também analisou os diferentes

padrões de localização intraurbana da indústria, com base no ano de fundação, tamanho

e gênero industrial dos estabelecimentos. O autor identificou, no município, dois tipos

de comportamento espacial das unidades produtivas: as pequenas e médias indústrias,

principalmente as de fundação mais antiga, encontram-se localizadas na área central da

cidade, junto aos principais eixos de circulação urbana; enquanto os estabelecimentos de

maior porte e de instalação mais recente alocaram-se basicamente nas periferias, devido

à existência de terrenos amplos e baratos.

Em Araraquara (SP), Selingardi-Sampaio e Daltrini (1990) avaliaram as

interfaces entre a modernização da agricultura e os processos de industrialização e de

crescimento urbano no município. Até a década de 1940, predominavam na cidade

pequenos e médios estabelecimentos, associados às inversões de capital agrário na

indústria, sobretudo em ramos tradicionais. No entanto, a partir da década de 1940, a

modernização da agricultura passou a impulsionar a atividade industrial araraquarense,

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inclusive com a inserção de grandes somas de capitais exógenos (nacionais e/ou

estrangeiros). Nesse momento, fortaleceram-se relações do tipo “indústria para a

agricultura” e “agricultura para indústria”, responsáveis pela formação de complexos

agroindustriais, com destaque para o setor sucroalcooleiro. Como em outras cidades

médias, o crescimento e a diversificação industrial vieram acompanhados de maior

complexificação do espaço urbano, visto que, com o maior dinamismo da economia

local, intensificaram-se alguns problemas, como a expansão desordenada, a elevação do

preço do solo, a segregação urbana, a poluição ambiental, entre outros.

Em Bauru (SP), Toledo (2009) visualizou os padrões de localização intraurbana

das unidades produtivas nos diferentes períodos de industrialização da cidade. O autor

apontou que, até a década de 1960, a instalação das fábricas ocorria preferencialmente

junto aos trilhos das ferrovias que cortam o centro da cidade. A partir dessa década,

porém, os congestionamentos, a valorização do solo urbano, a poluição ambiental e os

conflitos com a vizinhança sinalizaram a tendência de periferização da indústria. É

interessante notar que, em Bauru (SP), a criação de distritos industriais data da década

de 1960, o que atesta a preocupação precoce do governo municipal em racionalizar a

indústria no território e atrair unidades produtivas que começavam a migrar da RMSP

(TOLEDO, 2009).

Sailer (2010) reconheceu os mesmos padrões de localização intraurbana em

São José dos Campos (SP): presença de pequenas e médias indústrias, principalmente

daquelas com ano de fundação mais antigo, na área central; e localização periférica

daquelas de grande porte e/ou de instalação mais recente, principalmente junto às vias

troncais de circulação intraurbana, às margens de rodovias, ou em distritos e

condomínios industriais.

O diferencial de seu trabalho reside na ênfase sobre as indústrias de alta

tecnologia, atraídas pela ampla rede universitária e pela presença de instituições de base

tecnológica em São José dos Campos (SP), como a Empresa Brasileira de Aeronáutica

(Embraer), o Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) e o Instituto Nacional de

Pesquisas Espaciais (INPE). A proximidade geográfica entre os estabelecimentos

envolvidos na produção de novas tecnologias constitui fator locacional de suma

importância, por facilitar a permuta de informações e reforçar as sinergias e cooperação

entre as firmas. A criação do Parque Tecnológico de São José dos Campos (SP) teve

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como objetivo condensar no espaço firmas inovadoras, de modo a fomentar a produção

de mercadorias sofisticadas e desenvolver o município (SAILER, 2010).

Em Poços de Caldas (MG), Oliveira (2012) constatou que a descentralização

das unidades produtivas constitui a tendência predominante nas escolhas locacionais,

mas não é capaz de eliminar lógicas pretéritas de localização, nem as necessidades

específicas de espaço de alguns gêneros industriais. Por esse motivo, coexistem no

espaço urbano dois padrões distintos de localização industrial: pequenos

estabelecimentos e de gêneros tradicionais no centro e suas adjacências; e médios e

grandes estabelecimentos, de gêneros mais modernos e/ou com ano de fundação mais

recente nas periferias.

A única ressalva à teoria e aos demais estudos empíricos mencionados

anteriormente consiste na implantação de estabelecimentos com ano de fundação

relativamente recente nas áreas centrais, ao invés dos mais antigos. Esta característica

deve-se basicamente às peculiaridades do processo de produção do espaço urbano local,

fortemente marcado pela concentração excessiva e histórica das principais funções

urbanas (atrativos turísticos, gestão do território e prestação de bens e serviços nas

escalas local e regional) no centro e suas imediações. No mercado imobiliário, o alto

valor dos imóveis engendra alta rotatividade entre as formas de uso e ocupação do solo

nas referidas áreas, como o demonstra a baixa incidência de bronwnfields no espaço

urbano de Poços de Caldas (MG) (OLIVEIRA, 2012).

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

De modo geral, os estudos empíricos validaram a hipótese de que a indústria

tende a se descentralizar nas cidades médias. O acúmulo de deseconomias de

aglomeração (valorização do solo urbano, poluição ambiental, congestionamentos e

conflitos com a vizinhança, dentre outros) e a aprovação de normas urbanísticas

restritivas à indústria vêm minimizando a capacidade de sustentação e de atração das

áreas centrais junto às fábricas. Por outro lado, a menor incidência destes fatores e a

presença de espaços planejados (distritos industriais e, mais recentemente, parques

tecnológicos e condomínios industriais) constituem estímulos à implantação industrial

nas periferias.

Além disso, em todos os exemplos mencionados, as cidades testemunharam

diferentes padrões de localização das unidades produtivas, que coexistem no espaço

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urbano e que deixaram resquícios na paisagem, como os brownfields, os distritos

industriais, os parques tecnológicos, etc. Dessa forma, a análise da sucessão das

tendências de localização intraurbana das indústrias permite captar a evolução das

condições técnicas de produção, bem como seus impactos na dinâmica industrial e no

próprio processo de produção do espaço urbano das cidades médias.

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