Analise de Banca Defensoria Constitucional

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ANLISE DA BANCA DIREITO CONSTITUCIONAL

Dr. Marco Antonio Correa Monteiro - Defensor Pblico - Doutorando em Direito Constitucional pela USP (Tese de Doutorado: Tutela Constitucional da Liberdade de Imprensa). - Mestre em Direito Constitucional pela USP (Dissertao de Mestrado: Incorporao dos tratados internacionais de direitos humanos ao direito interno brasileiro e sua posio hierrquica no plano das fontes normativas, Ano de Obteno: 2008) - Especialista em Direito Constitucional. (Monografia: O impacto da Emenda Constitucional n45/04 na doutrina brasileira sobre a incorporao ao direito interno e o status dos tratados internacionais de direitos humanos) - Graduao em Direito: Monografia da Graduao: Anlise comparativa dos direitos previstos na Conveno Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de So Jos da Costa Rica - e na Constituio Federal brasileira de 1988. Artigos: 1. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . Breve anlise sobre a coisa julgada inconstitucional. Jus Navigandi (Teresina), v. 12, p. 1676, 2008. 2. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . Os partidos polticos e o fenmeno da corrupo eleitoral. Jus Navigandi (Teresina), v. 12, p. 1687, 2008. 3. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . O futuro dos direitos fundamentais: a necessidade de sua efetivao. Jus Navigandi (Teresina), v. 12, p. 1688, 2008. 4. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . O direito de nacionalidade de pessoa fsica no ordenamento jurdico brasileiro. Jus Navigandi (Teresina), v. 12, p. 1723, 2008. 5. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . Efeitos da constitucionalizao dos direitos dos trabalhadores. Jus Navigandi (Teresina), v. 12, p. 1731, 2008. 6. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . O impacto da Emenda Constitucional n45/04 na doutrina brasileira sobre a incorporao ao direito interno e o status dos tratados internacionais de direitos humanos. Revista Brasileira de Direito Constitucional, v. 10, p. 217-258, 2007. 7. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . O princpio da segurana jurdica e o controle de constitucionalidade brasileiro. Jus Navigandi (Teresina), v. 11, p. 1449, 2007.

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8. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . Os partidos polticos e o fenmeno da corrupo eleitoral. Revista Brasileira de Direito Constitucional, v. 8, p. 391-404, 2006. 9. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . Anlise comparativa dos direitos previstos na Conveno Americana sobre Direitos Humanos - Pacto de So Jos da Costa Rica - e a Constituio Federal Brasileira de 1988. Revista Brasileira de Direito Constitucional, So Paulo, v. 4, p. 679-720, 2004. Livros: 1. MONTEIRO, Marco Antonio Corra . Tratados internacionais de direitos humanos e direito interno. 1. ed. So Paulo: Saraiva, 2011. v. 1. 179 p. Palestras Ministradas: 1.- Federalismo brasileiro: entidades da federao e competncias. 2009. (Outra). 2.- Processo legislativo na Constituio de 1988. 2009. (Outra). 3.- Sistemas de controle de constitucionalidade. 2009. (Outra). 4.- Direitos humanos fundamentais na Constituio de 1988. 2009. (Outra). 5.- A segurana jurdica e o papel do STF. 2008. (Seminrio). 6.- Tratados internacionais de direitos humanos na ordem jurdica brasileira. 2008. (Seminrio). 7.- O impacto da Emenda Constitucional n45/04 na doutrina brasileira sobre a incorporao ao direito interno e o status dos tratados internacionais de direitos humanos. 2006. (Outra).

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Efeitos da constitucionalizao dos direitos dos trabalhadores Marco Antonio Corra Monteiro Sumrio: 1. O Constitucionalismo. 1.1. Regras formalmente

constitucionais. 1.2. Regras materialmente constitucionais. 2. A constitucionalizao dos direitos dos trabalhadores. 2.1. Relao com as normas infraconstitucionais: a supremacia da Constituio. 2.2. Relao com as emendas constitucionais: as "clusulas ptreas". Concluses. Referncias bibliogrficas.

1. O Constitucionalismo. O Constitucionalismo um processo histrico, que encontra antecedentes nos pactos, forais e cartas de franquia, dentre os quais se destacam a Magna Carta, de 1215, e a Petition of Rights, de 1628, nos contratos de colonizao, tpicos da histrias das colnias da Amrica do Norte, nas leis fundamentais do Reino, criao dos legistas franceses e limitadoras da ao do Monarca e nas doutrinas do Pacto Social, dentre os quais se destacam Hobbes, Locke e Rousseau, e que culmina no pensamento iluminista do sculo XVIII, representado, entre outros, por Montesquieu, fundamento poltico-doutrinrio da Revoluo Francesa, de 1789 [01]. O fenmeno denominado Constituio escrita, pois, foi sendo construdo paulatinamente, congregando elementos destes mais diversos antecedentes histricos e doutrinrios, ilustrativos do prprio processo evolutivo social, marcado por revoltas, rebelies, enfim, conflitos entre os homens, governantes e governados, no intuito de limitar o poder daqueles. Ao se atribuir a eventos histricos a fora determinante para a formao da idia de Constituio, no se est deixando de lado as foras sociais que para tanto contriburam, sendo estas, ao menos em princpio, as maiores interessadas na limitao do poder arbitrrio.

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Os pactos, forais e cartas de franquia contribuem com a forma escrita e a matria, que a proteo de liberdades individuais. Os contratos de colonizao induziram idia de fixao de normas advindas do mtuo consenso entre os que as produzem e os que as obedecem. Advm das leis fundamentais do Reino a noo de que, acima do soberano e fora do seu alcance, existiriam regras a definir o comportamento do corpo poltico, do que deriva a superioridade das normas constitucionais escritas. J da doutrina do Pacto Social, especialmente de Rousseau, adviria o conceito de que o poder emana dos homens, exercido por meio das leis que, por serem expresso da vontade geral, seriam as nicas legitimadas a restringir o exerccio das liberdades pblicas [02]. A idia de Constituio escrita nasceu, pois, com um propsito definido: limitar o poder arbitrrio do Monarca. esse propsito que definiu, por conseqncia, o que se entenderia por Constituio, conforme delineado no artigo 16 da Declarao francesa de 1789: "Toda sociedade na qual no est assegurada a garantia dos direitos nem determinada a separao de poderes, no tem Constituio". Acreditava-se poca que a liberdade individual estaria preservada em face do arbtrio se se escrevesse a Constituio e se nela se inscrevessem os direitos individuais e a separao de poderes. Acredita-se que a causa de todo o arbtrio estava na concentrao de todos os poderes nas mos de uma nica pessoa, que, na lio de Montesquieu, por ter o poder tenderia a us-lo at que encontrasse limite. Esta a razo da separao de poderes, tal qual idealizada nO Esprito das Leis: a diviso do exerccio do poder, atribuindo-o a mais de uma pessoa, ou a mais de um rgo estatal, faria com que o exerccio do poder por um deles encontrasse limite no exerccio do poder pelo outro, acarretando o que se entendeu por "freios e contrapesos". A essa limitao estrutural ao exerccio do poder, soma-se uma esfera de liberdades individuais contra as quais o Estado no poderia interferir de maneira nenhuma. Essas liberdades deveriam ser declaradas pelo texto constitucional, a fim de 4

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resguard-las. Declaradas, porque, na viso jusnaturalista predominante poca, tais direitos seriam inatos natureza humana, no podendo ser desligados desta por motivo nenhum, muito menos em razo do arbtrio do Monarca. Assim, a Constituio, advinda desse processo histrico, o documento escrito definidor da organizao poltica fundamental de determinado Estado. Trata-se da Lei Maior de todo o ordenamento jurdico; , ao mesmo tempo, sua base e sua cpula. na Constituio que todos os demais atos normativos buscam seu fundamento de validade e nela, tambm, que este mesmo ordenamento encontra limites. , pois, o mandamento supremo de todo o ordenamento, no podendo ser contrariado por nenhum ato normativo infraconstitucional, nem ser alterado, a no ser pelo procedimento previsto em seu prprio texto, obedecidos os limites igualmente expressos no art. 60 da Constituio. Tal supremacia constitucional, no entanto, de nada serviria se no fosse resguardada pelo controle de constitucionalidade, em aplicao ao princpio da compatibilidade vertical dos atos normativos [03]. Mas, o que diz respeito organizao jurdica fundamental de um Estado? Ou seja, quais as matrias dignas de estarem em um texto constitucional? Esta questo leva a duas possveis classificaes, presentes da doutrina constitucionalista das normas formal e materialmente constitucionais, que sero analisadas nos dois tpicos seguintes. 1.1. Normas materialmente constitucionais. Normas materialmente constitucionais so as normas definidoras da organizao poltica fundamental de determinado Estado; dizem respeito de forma imediata ao modus vivendi estatal. So normas, tidas pelo Constitucionalismo, em razo de seu contedo, realmente dignas de compor o texto constitucional. A doutrina constitucionalista, por vezes, diverge com relao a quais

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contedos normativos seriam dignos de pertencer ao texto constitucional. Segundo Manoel Gonalves Ferreira Filho[04]

, seriam estes os que "se referem diretamente

forma de Estado (p. ex., as que o definem como Estado federal), forma de governo (p. ex., democracia), ao modo de aquisio (p. ex., sistema eleitoral) e exerccio do poder (p. ex., atribuies de seus rgos), estruturao dos rgos de poder (p. ex., do Legislativo ou do Executivo), aos limites de sua ao (p. ex., os traados pelos direitos fundamentais do homem)". Assim, normas jurdicas que apresentem quaisquer dos contedos acima enumerados, ainda que no presentes no texto escrito da Constituio, devem ser consideradas como materialmente constitucionais. So os casos, entre outros, no ordenamento jurdico brasileiro, do Cdigo Eleitoral, que traz normas que regulam a aquisio do poder, e do direito fundamental ao nome, garantido pelo Cdigo Civil. No entanto, no obstante terem essas normas contedo materialmente constitucional, pelo fato de no comporem o texto constitucional e, por conseqncia, por no terem sido aprovadas por um procedimento "especial", podem elas ser alteradas, ou mesmo revogadas, por lei ordinria posterior. No gozam essas normas, enfim, do atributo caracterstico das normas formalmente constitucionais que o da supremacia constitucional, consubstanciado em sua rigidez, garantido pelo controle de constitucionalidade. Por fim, resta observar que, entre as normas entendidas como materialmente constitucionais, esto as referentes aos direitos humanos fundamentais, por serem ilustrativas das mais claras limitaes ao arbtrio estatal, conforme demonstra o processo de sua formao histrica. Sendo os direitos dos trabalhadores tpicos direitos sociais, denominados direitos humanos fundamentais de segunda gerao, ou de segunda dimenso, devem ser, por conseqncia, as normas garantidoras desses direitos consideradas materialmente constitucionais, o que ter repercusses na prtica constitucional, como se ver adiante. 1.2. Normas formalmente constitucionais. 6

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Se, por um lado, h normas que, em razo de sua matria, so tidas como constitucionais, ainda que no integrantes do texto da Constituio, h normas integrantes deste texto que, ainda que no tenham contedo constitucional propriamente dito, devem ser tratadas como tal, justamente pelo simples fato de comporem o seu texto. Normas formalmente constitucionais so, assim, todas as normas integrantes da Constituio orgnica, independente de seu contedo. Dizem respeito, pois, quelas normas jurdicas editadas pelo procedimento previsto para aprovao de uma lei constitucional, sendo este, por sua natureza, mais complexo, com quorum de aprovao mais difcil de ser alcanado. A garantia do texto constitucional se d em dois sentidos: o primeiro deles com relao aos atos normativos inferiores, os denominados atos normativos infraconstitucionais, no podendo estes contraria a Constituio de maneira nenhuma, sob pena de serem declarados inconstitucionais; em um segundo sentido, com relao s emendas constitucionais, que somente podem alterar o texto constitucional se obedecidos o procedimento e os limites do artigo 60 da Constituio, tambm sob pena de serem declaradas inconstitucionais. Nesse mesmo sentido, a sua alterao ou revogao somente poder ser efetivada se obedecido esse mesmo procedimento complexo, denominado emenda ou reviso constitucional, previsto pelo prprio texto constitucional, desde que respeitados determinados limites, igualmente expressos. Ao tratar da Constituio, Hans Kelsen afirma que as "normas contidas nesse documento, a lei constitucional, no podem ser revogadas ou alteradas pela mesma forma que as leis simples, mas somente atravs de processo especial submetido a requisitos mais severos" [05]. Nesse mesmo diapaso, Jos Afonso da Silva discorre que esta rigidez constitucional "decorre da maior dificuldade para sua modificao do que para a alterao das demais normas jurdicas da ordenao estatal" [06]. Gozam, portanto, as normas formalmente constitucionais, pelo simples fato 7

consubstanciado na rigidez

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de estarem presentes no texto da Constituio, do atributo da supremacia, constitucional, garantido pelo controle de

constitucionalidade. Assim, encontram-se nesta situao todos os direitos dos trabalhadores positivados nos diversos incisos do art. 7 da Constituio. H, como visto, uma coincidncia de ambos os atributos em relao a essas normas garantidoras dos direitos dos trabalhadores. So elas, a um s tempo, material e formalmente constitucionais.

2. A constitucionalizao dos direitos dos trabalhadores. Viu-se, nos tpicos anteriores, que as normas relativas aos direitos dos trabalhadores, por serem normas garantidoras de direitos humanos fundamentais, os direitos sociais, devem ser consideradas materialmente constitucionais. Da mesma forma, por estarem previstas no texto constitucional, mais especificamente nos incisos de seu artigo 7, devem ser igualmente consideradas formalmente constitucionais. Decorrncia desse processo de constitucionalizao dos direitos dos trabalhadores o gozo, por parte dessas normas, de todas as garantias decorrentes de sua posio hierrquica constitucional. Nos dois tpicos seguintes, sero analisadas as suas duas principais interaes, a primeira com relao s normas infraconstitucionais e, a segunda, com relao s emendas constitucionais. 2.1. Relao com as normas infraconstitucionais: a supremacia da Constituio. O principal atributo da Constituio formal, como herdado de seu processo de formao histrico, o da supremacia. Este primado, conforme ensina Jos Afonso da Silva, "significa que a constituio se coloca no vrtice do sistema jurdico do pas, a que confere validade, e que todos os poderes estatais so legtimos na medida em

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que ela os reconhea e na proporo por ela distribudos"

. Devem todos os atos

normativos estar conformes Constituio, acarretando a sua no conformidade o vcio de inconstitucionalidade, devendo este mesmo ato normativo ser excludo do ordenamento jurdico. No que diz respeito s normas garantidoras dos direitos trabalhistas na Constituio de 1988, dispe o caput do artigo 7: "so direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, alm de outros que visem melhoria de sua condio social". Consagra, assim, a Constituio, nos diversos incisos de seu art. 7, garantias mnimas tanto para o trabalhador urbano quanto para o trabalhador rural. Consagra, insista-se, garantias mnimas para o trabalhador. Dessarte, por um lado, qualquer ato normativo infraconstitucional que disponha de maneira a reduzir de maneira desproporcional o mbito material dessas garantias estabelecidas pelo texto constitucional deve ser fulminado do ordenamento jurdico, em razo de sua inconstitucionalidade, mas, por outro lado, nada impede que seja atribuda maior amplitude de proteo dos trabalhadores pela legislao infraconstitucional. Assim deve ser, uma vez que o prprio texto constitucional no exclui a possibilidade de outros direitos, que no os expressos em seus incisos, que visem melhoria das condies sociais do trabalhador, seja ele urbano ou rural. Quanto a esta segunda hiptese a de ampliao das garantias do trabalhador por fora de ato normativo infraconstitucional , podem surgir algumas indagaes, por exemplo, com relao ao inciso XXVIII da Constituio que atribui ao trabalhador "seguro contra acidentes de trabalho, a cargo do empregador, sem excluir a indenizao a que este est obrigado, quando incorrer em dolo ou culpa" (grifo nosso). Garante o texto, como se pode extrair de sua interpretao textual, o direito do trabalhador indenizao, no caso de acidente de trabalho, quando concorrer o empregador com dolo ou culpa; h, pois, uma clara previso de responsabilizao

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subjetiva por parte do empregador. Acontece que o Cdigo Civil, em seu art. 927, pargrafo nico, ao tratar do dever de indenizar na responsabilidade civil, dispe que "haver obrigao de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem" (grifo nosso). A lei civil, infraconstitucional, enfim, prev a possibilidade de responsabilidade objetiva, sem necessidade de existncia e, por conseqncia, de comprovao de dolo ou de culpa por parte de quem concorreu com o dano, bastando a comprovao do dano e do nexo causal entre este e a atividade. Essa hiptese, prevista pelo Cdigo Civil, se compreender a reparao de dano, nos casos de atividade normalmente desenvolvida, por sua natureza, em situao de risco, sofrido pelo trabalhador, beneficiaria este ltimo, por determinar o seu direito indenizao sem a necessidade, por muitas vezes penosa, de comprovao de concorrncia de dolo ou culpa por parte do empregador. A dvida que surge se seria esta interpretao constitucional. A resposta, em nosso entendimento, deve ser positiva, uma vez que a Constituio, como visto, determina uma srie de garantias mnimas para o trabalhador, podendo o legislador ordinrio, por fora do prprio comando constitucional, estabelecer direitos outros que visem melhoria das condies sociais do trabalhador, o que exatamente o caso da indenizao em razo de acidente de trabalho. Em sntese, a supremacia constitucional atribuda aos direitos dos trabalhadores do artigo 7 protege-os, por meio do controle de constitucionalidade, contra normas infraconstitucionais que porventura venham a diminuir seu mbito de aplicao, mas nada impede, por outro lado, que o legislador ordinrio prescreva atos normativos que tragam melhores condies sociais.

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2.2. Relao com as emendas constitucionais: as "clusulas ptreas". A questo que se pretende, neste tpico, responder diz respeito possibilidade, ou no, de modificao ou excluso, por emenda constitucional, de algum direito do trabalhador previsto em um dos incisos do artigo 7 da Constituio. A Constituio federal, em seu artigo 60, prev o procedimento, com seus limites, de alterao constitucional, que, como analisado anteriormente, mais complexo e mais difcil de ser efetivado do que o dos demais atos normativos. Segundo o texto constitucional, a Constituio pode ser emendada mediante proposta de um tero, no mnimo, dos membros da Cmara dos Deputados ou do Senado Federal, do Presidente da Repblica ou de mais da metade das Assemblias Legislativas das unidades da Federao, manifestando-se, cada uma delas, pela maioria relativa de seus membros, por aprovao de trs quintos das duas Casas do Congresso, em dois turnos (artigo 60, I, II, III e 2, da Constituio). Deixando de lado os aspectos procedimentais de aprovao de qualquer emenda constitucional, que, se descumpridos, acarretam a sua inconstitucionalidade formal, passa-se anlise das limitaes materiais alterao constitucional, as denominadas "clusulas ptreas". Determina o artigo 60, 4, I a IV, in verbis: 4 No ser objeto de deliberao a proposta de emenda tendente a abolir: I a forma federativa de Estado; II o voto direto, secreto, universal e peridico; III a separao de poderes; IV os direitos e garantias individuais.

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Uma primeira leitura do dispositivo constitucional poderia levar o intrprete a afirmar que estariam protegidos pelas denominadas "clusulas ptreas" to somente os "direitos e garantias individuais", ou seja, as liberdades pblicas, previstas no artigo 5 da Constituio de 1988. No entanto, deve-se interpretar o texto constitucional atribuindo-lhe abrangncia maior, interpretando-o como protetor dos "direitos e garantias fundamentais", acobertando-se, deste modo, os direitos sociais previstos, nos artigos 6 e 7 da Constituio. Nesse sentido, preleciona Manoel Gonalves Ferreira Filho: A Constituio em vigor, como se sabe, no seu Ttulo I "Dos Direitos e Garantias Fundamentais", tem o Captulo I, que dedicado aos "direitos e deveres individuais e coletivos", e o Captulo II, aos "direitos sociais". Em face do exposto, forte o argumento de que, na tradio brasileira, "direitos e garantias individuais" expresso que abrange somente as liberdades clssicas. Esses direitos no poderiam ser abolidos pela reviso. O mesmo no ocorreria com os direitos sociais. Entretanto, no despropositado afirmar ser a expresso "direitos e garantias individuais" equivalente a "direitos e garantias fundamentais". Ora, esta ltima designa todo o ttulo e abrange os direitos sociais, que assim no poderiam ser eliminados. Certamente, esta ltima interpretao parece mais condizente com o esprito da Constituio em vigor, incontestavelmente uma "Constituio social". Ademais, ubi eadem ratio eadem dispositio. Se os direitos sociais, como as liberdades clssicas, so reconhecidos como direitos fundamentais, por que somente estes seriam intocveis? [08]. Acompanhamos, pois, incontestavelmente, o constitucionalista, no sentido de incluir os direitos sociais, mais especificamente os direitos dos trabalhadores, previstos no artigo 7 da Constituio, no mbito de proteo das denominadas "clusulas ptreas", o que confirma o entendimento de consider-los normas

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materialmente constitucionais.

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Por fim, admitida a incluso dos direitos dos trabalhadores no mbito de proteo do artigo 60, 4, IV, da Constituio, resta analisar como se d tal proteo. O texto, transcrito anteriormente, fala, claramente, que no ser admitida proposta de emenda constitucional "tendente a abolir" o que se encontra apontado em seus incisos. O termo "tendente a abolir" , com certeza, bastante vago, comportando diversas interpretaes de acordo com o que se apresenta no mundo ftico, mas, ao menos, duas concluses podem ser dele extradas: a primeira delas, e a mais bvia, que o mandamento constitucional no probe nenhum tipo de modificao que "promova" os direitos e garantias fundamentais protegidos, pois, "promover", certamente, anda no sentido inverso de "abolir"; a segunda delas que o mandamento constitucional no probe, em absoluto, a modificao ou alterao do seu regime constitucional, mas, sim, probe qualquer modificao ou alterao "tendente a abolir" tais direitos. O que se passa, porm, que, e aqui se pretende extrair outra regra geral da expresso "tendente a abolir", qualquer modificao redutiva da abrangncia dos direitos dos trabalhadores consagrados constitucionalmente , em princpio, inconstitucional. Se se pode estabelecer uma presuno a de que alteraes constitucionais redutoras do regime jurdico desses direitos dos trabalhadores do artigo 7 da Constituio, por andarem na direo de serem consideradas como "tendentes" a aboli-los, so inconstitucionais, at que se demonstre que assim no devem ser consideradas. Deve haver, pois, presuno relativa de inconstitucionalidade de alteraes que diminuam o mbito material dos direitos dos trabalhadores. Nesse sentido, promulgada emenda constitucional modificadora do regime jurdico dos direitos dos trabalhadores garantidos no artigo 7 da Constituio e questionada a sua constitucionalidade, seja pelo sistema difuso, em qualquer juzo singular ou tribunal, seja por ao direta, de competncia do Supremo Tribunal Federal, devem os julgadores se manifestar, em regra, pela inconstitucionalidade do 13

constitucionalidade.

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dispositivo, a no ser que, excepcionalssimamente, seja demonstrada a sua

Concluses. A constitucionalizao dos direitos dos trabalhadores traz, para estes direitos humanos fundamentais, posio de destaque no ordenamento jurdico: passam eles a gozar do principal atributo decorrente do processo histrico do Constitucionalismo, qual seja o da supremacia constitucional. So esses direitos considerados material e formalmente constitucionais e, imbudos desse atributo constitucional, garante-lhes o Poder Judicirio, por meio do controle de constitucionalidade, fora normativa necessria para serem

verdadeiramente respeitados e implementados nas mais diversas relaes do mundo ftico. Devem, pois, ter o mximo de efetividade. As principais decorrncias dessa posio hierrquica privilegiada so a sua proteo com relao a qualquer ato normativo infraconstitucional que contra esses direitos milite, bem como com relao s denominadas emendas constitucionais, por estarem abrangidos pelo manto de proteo das "clusulas ptreas". Com relao a esta ltima questo, reconhece-se uma regra que deve ser seguida na apreciao da inconstitucionalidade de qualquer dispositivo redutor do mbito de atuao dos direitos dos trabalhadores, criando-se uma presuno relativa de sua inconstitucionalidade, no caso de ser o dispositivo questionado, invertendo-se, com isso, a lgica dessa verificao de compatibilidade entre o ato normativo e a Constituio, que seria o da sua constitucionalidade, em regra, e da sua inconstitucionalidade, excepcionalmente.

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Referncias bibliogrficas.

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Ferreira Filho, Manoel Gonalves. Aspectos do direito constitucional contemporneo. So Paulo, Saraiva, 2003. ____________________. Curso de direito constitucional. 26 ed., So Paulo, Saraiva, 1999. ____________________. Estado de direito e Constituio. 2 ed., So Paulo, Saraiva, 1999. Kelsen, Hans. Teoria pura do Direito. 6 ed., So Paulo, Martins Fontes, 2003. Silva, Jos Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 18 ed., So Paulo, Malheiros, 2000.

Notas01

Cf. Manoel Gonalves Ferreira Filho, Curso, p. 3-9. Cf. Manoel Gonalves Ferreira Filho, Curso, p. 3-9. Sobre o culto lei,

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marcante do Estado de Direito, cf., do mesmo autor, Estado de direito, p.20.03

Cf. Jos Afonso da Silva, Curso, p. 47-49. Curso, p.11-12. Teoria pura, p. 247-248. Curso, p.47.

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Curso, p.47. Aspectos, p. 291.

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Autor Marco Antonio Corra MonteiroDefensor Pblico do Estado de So Paulo. Mestrando em Direito do Estado pela USP. Bacharel em Direito pela USP. Especialista em Direito Constitucional pela ESDC. Professor dos cursos de Graduao e de Ps-Graduao lato sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie e do curso de Ps-Graduao lato sensu da Escola Superior de Direito Constitucional. Membro da Comisso Cultural do Instituto Pimenta Bueno (Associao Brasileira dos Constitucionalistas). Informaes sobre o texto Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT MONTEIRO, Marco Antonio Corra. Efeitos da constitucionalizao dos direitos dos trabalhadores. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1731, 28 mar. 2008. Disponvel em: . Acesso em: 7 set. 2011.

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Direito de nacionalidade de pessoa fsica no ordenamento jurdico brasileiro Marco Antonio Corra Monteiro Introduo: importncia e limitaes do direito de nacionalidade. A nacionalidade " o vnculo jurdico-poltico de Direito Pblico interno, que faz da pessoa um dos elementos componentes da dimenso pessoal do Estado"[01]

, ou seja, o vnculo determinante dos indivduos que compem o povo de um

Estado. Cabe a cada ordenamento jurdico definir quem so os seus nacionais e, conseqentemente, quem so estrangeiros; "so portanto nacionais de um Estado aqueles que o seu direito define como tais"[02]

, tratando-se de normas materialmente

constitucionais, ainda que contidas em lei ordinria [03]. No se trata, porm, "de matria da inteira soberania do Estado, inexistindo regras internacionais que cerceiem sua competncia nesse campo"[04]

. A soberania

estatal, quanto determinao desses critrios, mitigada por normas de direito internacional, entre elas a de que "a atribuio da nacionalidade no pode ser resultante do exerccio de uma competncia discricionria, mas deve ser baseada em vnculos efetivos entre o indivduo e o Estado que lhe atribui a nacionalidade" [05]; o que determina a sentena da Corte Internacional de Justia, no caso Nottebohm.

2. Nacionalidade originria: os brasileiros natos. A Constituio Federal brasileira dispe, em seu artigo 12, I, os casos de atribuio de nacionalidade originria, apresentando hipteses nas quais esto considerados os brasileiros natos.

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A primeira hiptese a de indivduos "nascidos na Repblica Federativa do Brasil, ainda que de pais estrangeiros, desde que estes no estejam a servio de seu pas" (artigo 12, I, a, CF). O legislador optou aqui claramente pelo critrio do ius solis, ainda que atenuado pela previso de pais estrangeiros que estejam a servio de seu pas, no se atribuindo, nesse caso, a nacionalidade brasileira aos seus filhos nascidos na Repblica Federativa do Brasil. Para Jos Afonso da Silva, "nesta ressalva, abre-se exceo ao ius solis, prevalecendo a regra do ius sanguinis combinada com o fato de o pai ou a me estar a servio do seu pas; se este, no entanto, estiver aqui por conta prpria, ou estiver a servio de outro pas, que no o seu, seu filho, aqui nascido, ser brasileiro nato" [06] Discute a doutrina sobre qual seria o mbito territorial abrangido pela expresso "Repblica Federativa do Brasil". Para Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins "a noo vai bem mais longe que o mero conceito de territrio geogrfico (...) a melhor inteligncia da expresso territrio aquela que o faz coincidir com o mbito espacial de validade da ordem jurdica brasileira"[07]

, incluindo-se nesse

conceito os navios e aeronaves alm das terras delimitadas pelas fronteiras geogrficas, "limite espacial dentro do qual o Estado exerce de modo efetivo e exclusivo o poder de imprio sobre as pessoas e bens" [08]. A segunda hiptese a de "nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou me brasileira, desde que qualquer deles esteja a servio da Repblica Federativa do Brasil" (artigo 12, II, b, CF). Trata-se de opo legislativa do critrio do ius sanguinis, acrescido ao fato de um dos pais o pai ou a me estar a servio da Repblica Federativa do Brasil, ou seja, no estar em pas estrangeiro em decorrncia de assuntos particulares. "No seria razovel que estas pessoas que se encontram a servio do seu prprio pas no estivessem em condies de ter filhos nacionais" [09]. Como referido no pargrafo anterior, no necessrio que ambos pai e me estejam a servio de seu pas, bastando que um deles o esteja para que seja atribuda a nacionalidade originria brasileira ao nascido. Igualmente, no h 18

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necessidade de correspondncia entre o brasileiro e o que se encontra a servio da Repblica Federativa do Brasil [10]. Divergem os autores sobre o que estaria sendo abrangido por "Repblica Federativa do Brasil". Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins adotam interpretao restrita, excluindo deste benefcio os empregados de sociedades de economia mista e empresas pblicas, alm dos enviados por Estados, Municpios e Distrito Federal[11]

; j Jos Afonso da Silva e Manoel Gonalves Ferreira Filho

adotam interpretao mais ampla, abrangendo qualquer entidade de Direito Pblico brasileiro: Unio, Estado, Municpio, Distrito Federal, Territrio e at entidades da administrao indireta [12]. Uma terceira hiptese refere-se aos indivduos "nascidos no estrangeiro, de pai brasileiro ou de me brasileira, desde que venham a residir na Repblica Federativa do Brasil e optem, em qualquer tempo, pela nacionalidade brasileira" (artigo 12, I, c, CF). Com nova redao dada pela Emenda Constitucional de Reviso 3/94, optou o legislador por mais uma hiptese de atribuio de nacionalidade originria baseada no critrio do ius sanguinis. Diferentemente da redao anterior, no mais estabelece o dispositivo limite temporal para a "opo" pela nacionalidade brasileira, que antes tinha como prazo mximo a maioridade, e agora pode ser realizada "em qualquer tempo", desde que o indivduo filho de pai brasileiro ou me brasileira venha a residir na Repblica Federativa do Brasil. "Em realidade, a opo a mencionada pura e simplesmente a declarao da vontade de conservar a nacionalidade brasileira que, condicionada a essa manifestao, a Constituio atribui"[13]

. Trata-se, dessa forma,

de aquisio de nacionalidade originria dependente de manifestao de vontade nesse sentido, diferentemente das duas hipteses anteriores nas quais tal aquisio independe de manifestao de vontade alguma.

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3. Nacionalidade secundria: os brasileiros naturalizados. A aquisio de nacionalidade brasileira secundria resulta de manifestao de vontade, observados os requisitos legais. A Constituio Federal apresenta hipteses no seu artigo 12, II, no mais contemplando a denominada "naturalizao tcita" presente nas Constituies de 1824 e 1891 , mas somente a "naturalizao expressa". Os requisitos para a aquisio dessa nacionalidade foram deixados pela Constituio para a regulamentao de lei ordinria, tendo a Lei Maior estabelecido que sero exigidos "aos originrios de pases de lngua portuguesa apenas residncia por um ano ininterrupto e idoneidade moral" (artigo 12, II, a, CF) e aos estrangeiros de qualquer nacionalidade residncia na Repblica Federativa do Brasil por mais de quinze anos ininterruptos e ausncia de condenao penal (artigo 12, II, b, CF). Tal lei ordinria tem seu contedo, portanto, preordenado pelo prprio texto constitucional. Segundo disposto no 2, "a lei no poder estabelecer distino entre brasileiros natos e naturalizados, salvo nos casos previstos nesta Constituio". Dessa forma, fruem os naturalizados de um nmero menor de direitos que os natos, o que pode ser extrado do artigo 5, LI, artigo 12, 3, e artigo 89, VII. A regra a igualdade de tratamento entre os brasileiros natos e naturalizados, sendo o tratamento desigual exceo, podendo este somente ser estabelecido pela prpria Constituio.

4. Perda da nacionalidade. As hipteses trazidas pela Constituio constam de um rol taxativo artigo 12, 4 -, no podendo a lei ampli-las [14]. A primeira hiptese a de cancelamento de naturalizao "por sentena judicial, em virtude de atividade nociva ao interesse social" (artigo 12, 4, I, CF).

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Trata-se de sano poltica, devendo ser aplicada somente em virtude de sentena judicial, com todas as garantias a ela inerentes, sobretudo a do contraditrio e da ampla defesa (artigo 5, LV, CF). Em virtude da importncia do direito de nacionalidade e, conseqentemente, dos profundos efeitos de sua perda, "no o diz expressamente a Constituio, mas a atividade nociva ao interesse nacional apta a provocar o cancelamento da naturalizao h de ser grave" [15]. O inciso seguinte deste artigo prev a perda da nacionalidade em virtude do fato de se "adquirir outra nacionalidade", apresentando, logo em seguida, duas excees: a "de reconhecimento de nacionalidade originria pela lei estrangeira" e a "de imposio de naturalizao, pela norma estrangeira, ao brasileiro residente em Estado estrangeiro, como condio para permanncia em seu territrio ou para o exerccio de direitos civis". Em regra, a aquisio voluntria de outra nacionalidade ocasiona a perda da nacionalidade brasileira. A primeira exceo diz respeito a reconhecimento de nacionalidade estrangeira, no havendo, nesse caso, aquisio voluntria de nacionalidade que justificasse a sano poltica mencionada. No h, da mesma forma, aquisio voluntria de nacionalidade quando h imposio de naturalizao pela norma estrangeira, uma vez que o elemento coao desnatura essa manifestao de vontade.

Concluso. O direito nacionalidade direito fundamental da pessoa humana. Toda pessoa tem direito de possuir vnculo jurdico-poltico com determinado Estado e de participar da vida poltica dessa sociedade poltica; toda pessoa tem o direito de participar da tomada das decises polticas fundamentais do Estado a que pertena. A Constituio da Repblica de 1988 procurou tratar o tema de maneira

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completa, seguindo tendncia traada pelos tratados e pelos princpios internacionais. Buscou o texto constitucional alcanar todas as hipteses possveis de atribuio de nacionalidade brasileira, evitando-se a ocorrncia da figura do aptrida. No possuir nacionalidade ser estrangeiro em qualquer lugar em que se encontre.

Bibliografia. Bastos, Celso Ribeiro, Martins, Ives Gandra. Comentrios Constituio do Brasil. vol. II, So Paulo, Saraiva, 1989. Ferreira Filho, Manoel Gonalves. Comentrios Constituio brasileira de 1988. vol. I, 3 ed., So Paulo, Saraiva, 2000. Silva, Jos Afonso da. Curso de Direito Constitucional positivo. 18 edio, So Paulo, Malheiros, 2000. Soares, Guido Fernando Silva. Curso de Direito Internacional Pblico. vol. I, So Paulo, Atlas, 2002.

Notas01

Jos Afonso da Silva, Curso, p. 322. Celso R. Bastos, Ives Gandra Martins, Comentrios, p. 547. No mesmo

02

sentido, Jos Afonso da Silva, Curso, p. 323: "A adoo de um ou de outro destes [critrios: ius sanguinis e ius solis] problema poltico de cada Estado"; Manoel Gonalves Ferreira Filho, Comentrios, p. 111: " o direito de cada Estado que diz quem nacional e quem no o , ou seja, quem estrangeiro".

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03

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Jos Afonso da Silva, Curso, p. 322, o que de certa forma contraria a

posio do autor quanto distino tradicional entre constituio em sentido formal e em sentido material, p. 45.04

Celso R. Bastos, Ives Gandra Martins, Comentrios, p. 548. Guido Fernando Silva Soares, Curso, p.318 e ss. Curso, p.329. No mesmo sentido Celso R. Bastos, Ives Gandra MArtins,

05

06

Comentrios, p.551 e ss.; Manoel Gonalves Ferreira Filho, Comentrios, p.112.07

Comentrios, p.551. Jos Afonso da Silva, Curso, p. 329. Celso R. Bastos, Ives Gandra Martins, Comentrios, p.552. Celso R. Bastos, Ives Gandra Martins, Comentrios, p.553.

08

09

10

1

1 Celso R. Bastos, Ives Gandra Martins, Comentrios, p.553. Curso, p.330; Comentrios, p.112. Manoel Gonalves Ferreira Filho, Comentrios, p.113. Manoel Gonalves Ferreira Filho, Comentrios, p.115; Jos Afonso da

12

13

14

Silva, Curso, p. 335.15

Manoel Gonalves Ferreira Filho, Comentrios, p.116.

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O futuro dos direitos fundamentais. A necessidade de sua efetivao

Marco Antonio Corra Monteiro O grande problema atual dos direitos fundamentais, no entendimento de Norberto Bobbio, no mais o de fundament-los, mas, sim, o de proteg-los [01]. Para o jusfilsofo italiano, "o problema que temos diante de ns no filosfico, mas jurdico e, num sentido mais amplo, poltico. No se trata de saber quais e quantos so esses direitos, qual a sua natureza e seu fundamento, se so direitos naturais ou histricos, absolutos ou relativos, mas sim qual o modo mais seguro para garanti-los, para impedir que, apesar das solenes declaraes, eles sejam continuamente violados" [02]. A observao coloca-se, no nosso entendimento, nos mesmos termos para os direitos fundamentais na ordem jurdica brasileira. Consagrou a Constituio de 1988 um amplo rol de direitos e garantias individuais e coletivos em seu artigo 5, alm de outros dispersos em seu texto, em razo do 2 do mesmo artigo, j reconhecidos, inclusive, pelo Supremo Tribunal Federal, como o princpio da anterioridade tributria. Trata-se, aqui, da previso dos direitos fundamentais ditos de primeira gerao, direitos subjetivos, cujo titular do poder de agir todo e cada um dos seres humanos, que podem ser contrapostos ao Estado, preservando-se, assim, a liberdade individual desses seus titulares [03]. O artigo 5 da Constituio de 1988, j em seu caput, prescreve que "todos so iguais perante a lei, sem distino de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no Pas a inviolabilidade do direito vida, liberdade, igualdade, segurana e propriedade", nos termos estabelecidos, agora, aps a Emenda Constitucional n45/04, pelos seus setenta e oito incisos. 24

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No h o que se falar, nesse caso, em ausncia de previso constitucional de algum direito humano fundamental. E, ainda que assim fosse, o 2 do mesmo artigo garante o carter exemplificativo do rol trazido pelo constituinte, ainda que seja tarefa difcil encontrar algum direito fundamental implcito. Demonstrao do que se afirmou pode ser encontrada ao se comparar o rol dos direitos humanos de primeira gerao positivados pela Constituio de 1988 e o rol apresentado pela Conveno Americana sobre Direitos Humanos, o Pacto de So Jos da Costa Rica: a quase totalidade dos direitos previstos nesse importante tratado internacional encontra correspondente na Constituio brasileira, com a nica exceo da priso civil por dvidas no caso do depositrio infiel [04]. Assim tambm com relao aos direitos econmicos e sociais, direitos de segunda gerao, que so tambm direitos subjetivos, assim como as liberdades pblicas, mas que tm por objeto o poder de exigir do Estado determinadas prestaes positivas [05]. A Constituio prev, em seu artigo 6, o direito educao, sade, ao trabalho, moradia, ao lazer, segurana, previdncia social, proteo maternidade e infncia, assistncia aos desamparados, bem como um extenso rol de direitos dos trabalhadores, com trinta e quatro incisos, em seu artigo 7. O parmetro internacional que pode ser tomado com relao aos direitos econmicos e sociais o Protocolo adicional Conveno Americana sobre Direitos Humanos em Matria de Direitos Econmicos, Sociais e Culturais, o Protocolo de San Salvador. Esse tratado internacional protege o direito ao trabalho, os direitos sindicais, o direito previdncia social, o direito sade, alimentao, educao, aos benefcios da cultura, constituio e proteo da famlia, aos direitos da criana, de pessoas idosas, deficientes, sem falar ao direito a um meio ambiente sadio, direito fundamental tido de terceira gerao, que tambm se encontra resguardado pela Constituio em seu artigo 225 [06]. J com relao aos direitos humanos de terceira gerao, os direitos de solidariedade, alm do direito ao meio ambiente, j destacado acima, garante a Constituio brasileira, em seu artigo 220, o direito comunicao e, entre os 25

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princpios regentes das relaes internacionais da Repblica Federativa do Brasil, por exemplo, o direito paz e autodeterminao dos povos, em seu artigo 4, incisos III e VI. Como se pode observar, os direitos humanos fundamentais, em suas mais diversas manifestaes, recebem proteo constitucional. No , pois, por falta de previso constitucional que os direitos humanos fundamentais carecem de efetivao no direito brasileiro; de maneira oposta, os direitos so excessivamente previstos na ordem constitucional, ocasionando o que Manoel Gonalves Ferreira Filho aponta ser uma inflao dos direitos fundamentais [07]. O problema , como observado inicialmente, de proteo e no de previso. Nesse sentido, uma primeira proteo aos direitos fundamentais que uma lei constitucional poderia garantir a impossibilidade de sua retirada do texto constitucional. E isso a Constituio de 1988 faz, ainda que com uma impropriedade terminolgica: o artigo 60, 4, IV, prescreve que "no ser objeto de deliberao a proposta de emenda tendente a abolir os direitos e garantias individuais". Sobre o dispositivo, afirma Manoel Gonalves Ferreira Filho que "no despropositado afirmar ser a expresso direitos e garantias individuais equivalente a direitos e garantias fundamentais" [08]. No basta, porm, o dispositivo. necessrio assegurar o texto constitucional contra alteraes indevidas, seja por emenda constitucional, seja por legislao ordinria. Papel fundamental assume, assim, o controle de

constitucionalidade na efetiva proteo dos direitos fundamentais previstos na Constituio. Emenda constitucional ou legislao infraconstitucional que contrariar preceito da Constituio garantidor de direito humano fundamental inconstitucional, devendo ser declarada, pois, a sua nulidade [09]. So protegidos, dessa forma, os direitos humanos fundamentais positivados pela Constituio contra atos legislativos inconstitucionais. E como proteg-los contra

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omisses inconstitucionais? Esse um tema bastante delicado. Em seu artigo 103, 2, o texto constitucional previu a possibilidade de se declarar a omisso inconstitucional, no intuito de tornar efetiva norma constitucional no autoexecutvel. Acontece que a sano decorrente da declarao desse vcio de inconstitucionalidade no garante a efetividade do texto constitucional, pois, "declarada a inconstitucionalidade por omisso de medida para tornar efetiva norma constitucional, ser dada cincia ao Poder competente para a adoo das providncias necessrias e, em se tratando de rgo administrativo, para faz-lo em trinta dias". Assim, a nica sano decorrente da declarao da inconstitucionalidade por omisso a simples notificao ao Poder omisso, que, se no atender ao aviso, no sofrer sano nenhuma. Jos Afonso da Silva[10]

afirma que "a mera cincia ao Poder Legislativo

pode ser ineficaz, j que ele no est obrigado a legislar. Nos termos estabelecidos, o princpio da discricionariedade do legislador continua intacto, e est bem que assim seja". Mas acrescenta que "isso no impediria que a sentena que reconhecesse a omisso inconstitucional j pudesse dispor normativamente sobre a matria, at que a omisso legislativa fosse suprida", concluindo que "com isso conciliar-se-iam o princpio poltico da autonomia do legislador e a exigncia do efetivo cumprimento das normas constitucionais". A sada proposta por Jos Afonso da Silva , de fato, tentadora, mas talvez merea uma maior reflexo levando-se em conta o princpio da separao dos Poderes. Outro instrumento de proteo dos direitos fundamentais previsto pela Constituio brasileira o mandado de injuno. Por fora do artigo 5, LXXI, "conceder-se- mandado de injuno sempre que a falta de norma regulamentadora torne invivel o exerccio dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes nacionalidade, soberania e cidadania". Trata-se, assim, de mais um instrumento hbil proteo dos direitos 27

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humanos fundamentais positivados pelo texto constitucional, mas que dependa de norma regulamentadora. Acontece que, por uma dessas ironias constitucionais, mesmo esse artigo 5, LXXI, carece de aplicabilidade e a doutrina e a jurisprudncia nacional discutem quais seriam os seus efeitos. Sobre o contedo do dispositivo, afirma Jos Afonso da Silva[10]

que ele "consiste na outorga direta do direito

reclamado. O impetrante age na busca direta do direito constitucional em seu favor, independentemente de regulamentao". V-se, assim, o papel central ocupado pelo controle de constitucionalidade na proteo dos direitos humanos fundamentais, seja contra atos, seja contra omisses inconstitucionais. O problema brasileiro, como visto, no a falta de previso constitucional de direitos humanos fundamentais; o texto constitucional o faz e com abundncia (o que no deixa de ser tambm um problema, como visto, em razo de sua inflao). Se o futuro dos direitos fundamentais encontra-se diretamente vinculado, hoje, sua proteo, e no mais a sua fundamentao, deve-se atentar ao sistema nacional de controle de constitucionalidade, de maneira a torn-lo mais eficaz.

Bibliografia. Bobbio, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro, Elsevier, 1992. Ferreira Filho, Manoel Gonalves. Aspectos de direito constitucional contemporneo. So Paulo, Saraiva, 2003. ____________________. Direitos humanos fundamentais. 7 ed., So Paulo, Saraiva, 2005. Monteiro, Marco Antonio Corra. Anlise comparativa dos direitos

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previstos na Conveno Americana sobre direitos humanos Pacto de So Jos da Costa Rica e na Constituio Federal brasileira de 1988, in Revista brasileira de direito constitucional. So Paulo, n 4, julho/dezembro de 2004, p.679-720 Rangel, Vicente Marotta. Direito e relaes internacionais. 7 ed., So Paulo, Revista dos Tribunais, 2002. Silva, Jos Afonso da. Comentrio contextual Constituio. So Paulo, Malheiros, 2006.

Notas01

Cf. A era dos direitos, p.25-26. Atente-se, no entanto, que Norberto

Bobbio no considera o problema do fundamento como inexistente, mas, sim, resolvido: na Declarao Universal dos Direitos do Homem estaria presente um consensus omnium gentium ou humano generis, em que se fundamentariam os direitos humanos fundamentais, o que , no mnimo, discutvel, dada a concepo muulmana de direitos fundamentais, por exemplo.02

Cf. A era dos direitos, p.25. Cf. Manoel Gonalves Ferreira Filho Direitos humanos fundamentais,

03

p.28-30.04

Cf. Marco Antonio Corra Monteiro, Anlise comparativa. Cf. Manoel Gonalves Ferreira Filho, Direitos humanos fundamentais,

05

p.49-51.06

"Todos tm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem

de uso comum do povo e essencial sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder

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futuras geraes".07

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Pblico e coletividade o dever de defend-lo e preserv-lo para as presentes e

Cf. Aspectos, p.284. Cf. Aspectos, p.291. Nulidade, ao menos como regra, dadas as recentes alteraes no sistema

08

09

de controle de constitucionalidade, analisadas por Manoel Gonalves Ferreira Filho, Aspectos, p.217-243.10

Comentrio contextual, p.557-558. Comentrio contextual, p.167.

11

Autor Marco Antonio Corra MonteiroDefensor Pblico do Estado de So Paulo. Mestrando em Direito do Estado pela USP. Bacharel em Direito pela USP. Especialista em Direito Constitucional pela ESDC. Professor dos cursos de Graduao e de Ps-Graduao lato sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie e do curso de Ps-Graduao lato sensu da Escola Superior de Direito Constitucional. Membro da Comisso Cultural do Instituto Pimenta Bueno (Associao Brasileira dos Constitucionalistas). Informaes sobre o texto Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT MONTEIRO, Marco Antonio Corra. O futuro dos direitos fundamentais. A necessidade de sua efetivao. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1688, 14 fev. 2008. Disponvel em: . Acesso em: 7 set. 2011.

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Os partidos polticos e o fenmeno da corrupo eleitoral

Marco Antonio Corra Monteiro Resumo: A democracia representativa, por meio dos partidos, a frmula que se mostrou mais adequada, ao menos at o momento, para conciliar os mais diversos interesses em uma vontade geral. Dada esta realidade, mostra-se necessrio o aprofundamento nos estudos do sistema eleitoral-partidrio, principalmente em seus efeitos perversos, para que se possa combat-los, fortalecendo-se a democracia partidria. A corrupo poltica, em geral, e a corrupo eleitoral, em especfico, somente podem ser efetivamente combatidas em uma democracia em que o exerccio do poder apresente-se visvel e transparente opinio pblica, abastecida esta de valores ticos com os quais ser confrontado o exerccio do poder poltico. Estas so condies sem as quais no se pode falar em democracia material. Palavras-chave: Partido poltico; corrupo eleitoral; democracia; valores ticos.

Introduo. Ao menos at o momento, no se vislumbrou outro meio possvel ou to eficiente quanto, apesar de todos os seus problemas para a operacionalizao da democracia representativa que no atravs dos partidos polticos. O sistema eleitoral-partidrio e suas degeneraes, dentre elas o fenmeno da corrupo, merecem uma maior ateno, dadas as suas implicaes sociais. Na lio de Raul Machado Horta[01]

, "a corrupo uma conseqncia, cuja causa

primeira reside na ruptura de valores, operada no domnio da conduta humana. A autonomia da Poltica, no seu desvinculamento da tica e da Religio, conduziu, em

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seu longo percurso histrico, ao enfraquecimento da conscincia tica, que as formas de organizao poltica aprofundaram, promovendo a separao entre a tica e a Poltica". O presente trabalho tem por escopo analisar a relao existente entre os partidos polticos e o fenmeno da corrupo eleitoral, bem como as implicaes desta relao com o regime democrtico. Para tanto, dividiu-se este trabalho em trs pontos. O primeiro abordar o tema dos partidos polticos, apresentando, inicialmente, a distino entre estes e os agrupamentos "pr-partidrios", bem como a alterao que se deu em sua estrutura e em seu funcionamento. Tais alteraes, como se ver, permitiram a ocorrncia das denominadas "patologias partidrias", quais sejam, a tendncia oligrquica de sua estrutura interna, a personalizao e a espetacularizao no exerccio do poder poltico, inclusive, e principalmente, a corrupo no processo eleitoral. A seguir, em um segundo momento, pretende-se analisar, mais detidamente, o fenmeno da corrupo no processo eleitoral, seu conceito, os momentos e as maneiras pelas quais ele se apresenta no panorama eleitoral-partidrio na atualidade. Em um terceiro momento, busca-se abordar o tratamento constitucional ao fenmeno da corrupo eleitoral. E, aqui, pretende-se analisar tanto os dispositivos repressivos corrupo eleitoral quanto os preventivos, que, em geral, tm seu mbito de aplicao no exerccio do poder poltico que no deve ser utilizado no sentido de garantir a sua "reaquisio". Por fim, ser a patologia da corrupo eleitoral colocada frente aos princpios democrticos, momento no qual se pretender vislumbrar possveis rumos de compatibilidade e de fortalecimento da conscincia tica [02].

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1. Os partidos polticos e a sua degenerao.

neste contexto apresentado que se apresenta o fenmeno da corrupo [23]. No que ele tenha surgido to somente neste momento histrico; a doutrina narra episdios de corrupo eleitoral de longa data. Dessarte, Manoel Martins de Figueiredo Ferraz descreve como se dava a corrupo eleitoral em Roma, bem como quais foram as respostas dadas pelo direito romano ao fenmeno. Segundo o romanista, as leges de ambitus relacionavam-se "com o comportamento ou atos ilcitos dos que visavam as honras ou as magistraturas romanas, objeto de eleies"[24]

. Segue o autor indicando que, no ano 358 a.C., o tribuno da plebe C. Petlio[25]

conseguiu aprovar plebiscito conhecido como Lex Poetelia de ambitu, que proibia se solicitassem votos nas reunies pblicas ou nos mercados . Interessantes[26]

igualmente outras medidas adotadas poca, narradas por Manoel Ferraz

, para

conter a compra de votos: havia prescries contra o costume de banquetear eleitores, no podendo o candidato ter mesa mais de nove candidatos e nem valer-se de terceiros para festividades que lhes possam conferir vantagens eleitorais. No diferem deste ensinamento Raul Machado Horta Gonalves Ferreira Filho[28] [27]

e Manoel

, para quem o fenmeno da corrupo registrado desde

a Antigidade, acrescentando que, nos dias que correm, no ele um fenmeno exclusivamente brasileiro: "o mesmo se passa noutros (pases), inclusive nos mais desenvolvidos: Japo, Holanda, Frana, Estados Unidos, URSS etc. E isto a ponto de provocar reunies internacionais, como o 5 Congresso Mundial sobre a Corrupo, em Amsterdam, na Holanda, em maro passado". Luca Mezzetti, quando esteve no Brasil, por ocasio do 10 Encontro Nacional de Direito Constitucional, que tratou do regime democrtico e da questo da corrupo poltica, apresentou um panorama europeu de combate corrupo; medidas legislativas e no legislativas esto sendo e ainda sero tomadas nos mais diversos pases europeus para a luta contra esta patologia eleitoral. So os caso, v.g., 33

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da Alemanha em que existem, em alguns de seus Lnder, as "Sees anti-corrupo", e da Frana, com o "Servio central de preveno da corrupo", criado em 1993 [29]. A corrupo, pois, no recente e nem fenmeno exclusivo brasileiro. Sobre a sua essncia, afirma Manoel Gonalves Ferreira Filho [30] que "sempre foi ela vista como um mal. E um mal gravssimo, que solapa os alicerces do Estado e ameaa a sociedade. Assemelha-se podrido do fruto. o que assinala a etimologia do termo. Corruptio, em latim, a exploso do mago de um fruto, em razo da sua podrido interna". "Assim, continua o constitucionalista o que se encara como corrupo no apenas uma falta, grave sem dvida, mas que no transcende a pessoa que a comete. uma falta que perverte, e por isso, ameaa o regime, porque solapa os seus fundamentos". Na poltica, a corrupo "est associada persecuo de objetivos privados em detrimento do interesse geral"[31]

, observa Elival da Silva Ramos. Tomam-se

decises polticas levando-se em conta interesses de grupos ou at mesmo interesses particulares, dando-lhes roupagem de interesse pblico. Mas esta utilizao do exerccio do poder poltico para a obteno de vantagens pessoais, em geral, vantagens pecunirias, em tpico desvio de poder, no a nica forma de manifestao do fenmeno da corrupo. O fenmeno da corrupo pode se manifestar igualmente de modo a utilizar-se de meios ilcitos para o alcance de fins lcitos. Distingue as situaes Manoel Gonalves Ferreira Filho [32]: "Ningum contestar, no entanto, ser corrupo todo ato que envolver uma retribuio material essencialmente de dinheiro o instrumento ou mvel da conduta indevida. "Assim, h corrupo, seja quando se usa desse recurso para a obteno do poder, seja quando se utiliza do poder para lograr proveito financeiro. Num caso, o dinheiro usa-se o nome meio ilcito para fim lcito, no segundo o objetivo ilcito de uma conduta". A segunda forma de corrupo, pontada por Ferreira Filho, mais 34

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"comum" na prtica eleitoral-partidria, estando presente diuturnamente nos meios difusores de informao. Mas esta, por bvio, pressupe o exerccio do poder poltico por parte daquele que pretende angariar vantagens indevidas, em tpico desvio de poder. a esta prtica que se referiu Elival da Silva Ramos, em trecho anteriormente mencionado. Mas na primeira ordem de manifestaes corruptivas que se enquadra a corrupo eleitoral. Sim, porque a finalidade do processo eleitoral a apurao da vontade geral, manifestada pelo voto, indicativa de determinado ou determinados candidatos para o loteamento de determinado ou determinados cargos pblicos. A sua finalidade , em suma, legitimar a aquisio do poder poltico. A corrupo no processo eleitoral acaba sendo a utilizao de meios ilcitos, tais como compra de votos e fraude na sua contabilizao, para o alcance de um fim lcito, que a aquisio do poder poltico. Atentou-se a esta patologia Mnica Herman Salem Caggiano [33] ao apontar que "muitos e variados so os fatores atuantes no sentido de produzir ingerncias na livre manifestao das opes polticas. Fatores que, quando acionados margem das linhas da legalidade e da moralidade, quando manipulados de molde a produzir desvios na exteriorizao das preferncias poltico-eleitorais, ingressam na esfera patolgica dominada pela corrupo, onde emerge, como terreno facilmente impregnvel, o campo do financiamento das campanhas poltico-eleitorais". De fato, muitas so as maneiras de desvirtuamento da livre manifestao das opes polticas, e, se, por um lado, ningum negar que a compra de votos ou o denominado voto de "cabresto" so manifestaes deste fenmeno e devem ser combatidos, por outro no fica to claro o enquadramento quando se trata, por exemplo, do financiamento partidrio, quando, por bvio, este no , pelo ordenamento vigente, exclusivamente pblico. Pode-se argumentar que, com os vultosos financiamentos partidrios, abusa-se do poder econmico, procedendo-se compra desenfreada de votos, entre outros. A afirmativa correta, mas, aqui, a conduta ilcita a compra de votos em si, no o financiamento [34]

. A resposta para 35

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esta sorte de problemas decorrentes do financiamento eleitoral est no controle dos gastos de campanha, evitando-se os "gastos no contabilizados", ltima moda em matria eleitoral-partidria; para tanto deve haver transparncia no quanto se recebe, no quanto e em que se gasta. Parece simples, mas, infelizmente, no . Outro aspecto importante e igualmente preocupante do financiamento partidrio diz respeito vinculao que passa a existir entre o partido, cujos membros eventualmente passam a exercer o poder poltico, e o financiador de sua campanha. mais uma vez Mnica Herman Salem Caggiano[35]

quem chama a ateno para a

"macia interveno financeira dos lobbies nas campanhas poltico-partidrias", e este apoio ser cobrado, futuramente, quando do exerccio do poder poltico, que atender, por vezes, aos interesses desses grupos, em detrimento do interesse geral. Mas, ainda assim, o financiamento, em si, no ilcito; ilcito o desvio de poder ulteriormente praticado. Em razo dessas peculiaridades que se torna to difcil o combate corrupo eleitoral nessas hipteses. Por fim, outro momento em que se percebe grande ocorrncia do fenmeno da corrupo eleitoral o do prprio exerccio do poder poltico: ocupantes de cargos pblicos que se utilizam desta situao privilegiada com relao aos demais candidatos para se manterem no poder, que pode ser tanto no mesmo cargo quanto em outro qualquer; o uso da prpria "mquina" para nela se manter. Trata-se de situao peculiar, em que se confundem a corrupo no processo eleitoral com a corrupo no exerccio do poder. So estas situaes, apresentadas em linhas gerais, em que a tica, de uma maneira ou de outra, deixada de lado, rompendo-se valores os quais cabe ao direito resguardar. Ensina Cezar Saldanha Souza Junior que "o direito essa verdadeira atividade de sopesar o poltico e o tico. Descobrir qual aquele mnimo tico que a sociedade precisa, naquele momento histrico, para preservar sua convivncia e tornar esse mnimo tico obrigatrio politicamente. Que papel fundamental! o direito que confere poltica verdadeiro sentido de fim do humano. Sem a tica, a poltica seria uma poltica torta; o direito que endireita a poltica. o direito que 36

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coloca a poltica no caminho do bem, do humano, do justo. Justo que ns vamos descobrir na sociedade por meio da razo prtica, pelo juiz, pelo legislador". Nesse sentido, aponta a doutrina constitucionalista serem as regras que tratam da aquisio e exerccio do poder materialmente constitucionais[36]

; assim,

prprio que se encontrem regras constitucionais que visem a coibir o fenmeno da corrupo tanto no processo eleitoral aquisio quanto no prprio exerccio do poder poltico. E, no que diz respeito ao processo eleitoral, as precaues constitucionais contra a corrupo esto presentes expressamente no art. 14 da Constituio, dentre as quais algumas sero rapidamente apontadas. J em seu caput, prev o texto constitucional o voto secreto. Este , sem dvida, uma das mais importantes manifestaes da liberdade de opo poltica. Na opinio de Manoel Gonalves Ferreira Filho[37]

, "a experincia demonstrou que

somente em segredo o cidado comum pode seguir a prpria conscincia na determinao de quem h de merecer o seu voto. Se indiscutvel que mesmo com o sigilo obrigatrio as conscincias muitas vezes so violentadas, sem ele no h, na prtica, verdadeira liberdade de voto". Neste mesmo artigo, em seu 6, h dispositivo que obriga a renncia de mandato para o Presidente, o Governador de Estado ou do Distrito Federal e o Prefeito que pretender concorrer a outro cargo seis meses antes do pleito. Busca-se, assim, evitar o uso do poder poltico com o propsito de nele se manter. O mesmo objetiva o 7 seguinte, que determina inelegveis, no territrio de jurisdio do titular, o cnjuge e os parentes consangneos ou afins, at o segundo grau ou por adoo, do Presidente, de Governador e de Prefeito ou de quem os haja substitudo dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se j titular de mandato eletivo e candidato reeleio. Vale uma ltima meno possibilidade de impugnao de mandato eletivo perante a Justia Eleitoral no prazo de quinze dias contados da diplomao em razo de abuso de poder econmico, corrupo ou fraude no processo eleitoral. 37

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Concluso: os partidos polticos, a corrupo eleitoral e a democracia retomada dos valores ticos. Bobbio, Norberto. O futuro da democracia uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986. Caggiano, Monica Herman Salem. Corrupo e financiamento das campanhas eleitorais, in Revista de direito constitucional e internacional. So Paulo, ano 10, n 41, out/dez de 2002. ____________________. Direito parlamentar e direito eleitoral. Barueri, Manole, 2004. ____________________. Finanas partidrias. So Paulo, Faculdade de Direito da USP, Dissertao de Mestrado, 1980. ____________________. Legalidade, legitimidade e corrupo em campanhas eleitorais, in Revista trimestral de direito pblico. So Paulo, n 7, 1994, p.131-141. ____________________. Partidos polticos na Constituio de 1988, in Revista de direito pblico. So Paulo, ano 23, n 94, abr/jun de 1990, p.141-145. ____________________. Sistemas eleitorais x representao poltica. Braslia, Senado, 1987. Caliman, Auro Augusto. Mandato parlamentar aquisio e perda antecipada. So Paulo, Atlas, 2005. Duverger, Maurice. Os partidos polticos. Rio de Janeiro, Zahar, 1970.

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Notas01

Improbidade, p.121. Por excluso, dada a complexidade do tema, h os possveis rumos de

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incompatibilidade entre democracia e partidos polticos, com um conseqente enfraquecimento da conscincia tica, mas estas concluses deixamos para os menos otimistas.03

Os partidos, p.19. Cf. Afonso Arinos de Melo Franco, Histria e teoria, p.12. Do esprito das leis, Livro 11, Captulo VI. Cf. Elival da Silva Ramos, Representao, p.7. Cf. Auro Augusto Caliman, Mandato, p.30. Cf. Monica Herman Salem Caggiano, Legalidade, p.131. Cf. Norberto Bobbio, O futuro, p.18. Cf. Robert Michels, Os partidos, p.105 e s.. Os partidos, p.21 e ss.. Legalidade, p.132. Representao e democracia, p.10. O futuro, p.26.

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No caso brasileiro, as eleies para o Senado poderiam ser melhor

enquadradas nesta primeira linha, dadas as suas peculiaridades.16

No tendo mais relevncia a "afinao" ideolgica entre ambos, dados os

acontecimentos recentes...17

Os partidos, p.188. Os partidos, p.27. Os partidos, p.116. Superficial, sim, pois muda ao sabor dos ventos, mas, por vezes,

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determinantes nos espordicos episdios de manifestao direta da vontade popular, tais como as eleies, referendos, etc..21

Os partidos, p.218 e s.. Os partidos, p.130. Maurice Duverger, Os partidos, pp.22 e s., apresenta aspecto interessante

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da corrupo no desenvolvimento dos grupos parlamentares britnicos, tendo ela "ocupado lugar assaz importante" nesse processo. Sustenta o autor, ainda que com uma certa precauo, "a importncia que esses fenmenos de corrupo assumem numa certa fase do desenvolvimento democrtico, como meio de o Governo resistir a uma presso crescente das assemblias (...)".24

A corrupo, p.37. A corrupo, pp.38 e s.. A corrupo, p.40. Improbidade, p.122 e ss. 42

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A corrupo como fenmeno, p.1; o texto se refere, provavelmente, a

maro de 1991, ano de publicao do artigo.29

Consolidamento, p.33 e ss.. Corrupo e democracia, p.213 e s.. tica e poltica, p.88. Corrupo e democracia, p.214. Legalidade, p.136. Os votos podem ser comprados, inclusive, com recursos de

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financiamento pblico, e nesse caso no se falaria que o financiamento pblico corrupto. Parece ser esta a idia de Monica Herman Salem Caggiano, que, ao tratar sobre o tema, em sua obra Finanas partidrias, apresenta, em uma primeira parte, um estudo sobre a captao dos recursos para a campanha, atentando-se apenas s formas adotadas pelos mais diversos ordenamentos para tanto, e na segunda parte de seu trabalho, ao tratar dos gastos, ou seja, da aplicao dos recursos angariados, que se preocupa a autora com a sua fiscalizao, chamando a ateno para o "tratamento legal conferido questo, ainda no intuito de coibir que a irregular utilizao do dinheiro e os abusos a que se conduz o incontido desejo de galgar os degraus do poder possam solapar as bases da democracia" (p.92).35

Finanas partidrias, p.44 e s.. Cf. Manoel Gonalves Ferreira Filho, Curso, p.11. Comentrios, p.120.

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O futuro, p.10. tica e poltica, p.94. O futuro, p.39.

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Autor Marco Antonio Corra MonteiroDefensor Pblico do Estado de So Paulo. Mestrando em Direito do Estado pela USP. Bacharel em Direito pela USP. Especialista em Direito Constitucional pela ESDC. Professor dos cursos de Graduao e de Ps-Graduao lato sensu da Universidade Presbiteriana Mackenzie e do curso de Ps-Graduao lato sensu da Escola Superior de Direito Constitucional. Membro da Comisso Cultural do Instituto Pimenta Bueno (Associao Brasileira dos Constitucionalistas). Informaes sobre o texto Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT MONTEIRO, Marco Antonio Corra. Os partidos polticos e o fenmeno da corrupo eleitoral. Jus Navigandi, Teresina, ano 13, n. 1687, 13 fev. 2008. Disponvel em: . Acesso em: 7 set. 2011.

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Breve anlise sobre a coisa julgada inconstitucional Marco Antonio Corra Monteiro Introduo. A Constituio brasileira, em seu artigo 5, XXXVI, garante que "a lei no prejudicar o direito adquirido, o ato jurdico perfeito e a coisa julgada". O dispositivo em questo diz respeito aplicao da lei no tempo. Este dispositivo constitucional no probe a atividade retroativa da lei, quando expressa, ou a atividade retrospectiva da mesma, que decorre da sua aplicao imediata, desde que no se alcance (prejudique) o direito adquirido, o ato jurdico perfeito e a coisa julgada. Esse dispositivo constitucional, no obstante no dizer respeito diretamente questo da coisa julgada inconstitucional, d relevo a um aspecto relevantssimo na sua anlise: a segurana jurdica [01]. A segurana jurdica , sem dvida nenhuma, um dos valores a serem preservados pela ordem jurdica brasileira; est, inclusive, garantida no caput do artigo 5 da Constituio. A relativizao da coisa julgada, em um sentido amplo, defendida como a possibilidade de cassao da deciso judicial injusta: haveria, nessas hipteses, um conflito principiolgico entre Segurana e Justia e as decises judiciais tidas por injustas feririam a Constituio e, ainda que transitadas em julgado, poderiam ser desconstitudas [02]. Essa possibilidade de relativizao da coisa julgada deve ser, de pronto, afastada. Caso seja admitida a desconstituio da coisa julgada em razo de um critrio por demais subjetivo a injustia das decises , corre-se o risco de perpetuao da discusso dessas decises, pois elas sempre sero "injustas" para uma das partes: a sucumbente. Seria, em ltima anlise, a institucionalizao da insegurana jurdica [03].

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Com essa hiptese ampla de relativizao da coisa julgada material injusta, fundada no conflito "segurana x justia", no se confunde a possibilidade de desconstituio da coisa julgada inconstitucional, que se passa a analisar.

1. Identificao das hipteses de coisa julgada inconstitucional. No direito brasileiro, tradicionalmente, o ato jurdico inconstitucional nulo. No controle de constitucionalidade dito difuso, de origem norte-americana, esta natureza jurdica decorre da prpria lgica deste modelo: o ato jurdico declarado nulo pelo juiz, no exerccio normal da funo jurisdicional. No controle dito concentrado, de origem europia, pela lgica, o ato inconstitucional deveria ter natureza anulvel; contudo, na jurisprudncia brasileira, tal ato igualmente entendido, em regra, como nulo e as suas decises tm efeitos ex tunc. A nulidade , pois, a regra. Acontece que, com a promulgao de duas leis ordinrias, a lei n9.868/99, que regulou as aes diretas de constitucionalidade e de inconstitucionalidade, e a lei n9.882/99, que regulamentou a argio de descumprimento de preceito de preceito fundamental, possibilitou-se ao Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois teros de seus membros e tendo em vista razes de segurana jurdica e de excepcional interesse social, restringir os efeitos das declaraes de inconstitucionalidade de atos normativos ou decidir que ela s tenha eficcia a partir de seu trnsito em julgado ou de outro momento que venha a ser fixado (atribuio de efeitos ex nunc a essas decises) pois, de uma exceo regra da nulidade [05]. A deciso judicial ato final do processo, instrumento por meio do qual o Estado exerce uma de suas funes clssicas, a jurisdio. A deciso judicial , pois, ato tpico do Poder Judicirio, e deve ser fundamentada para que seja vlida e possa produzir efeitos entre as partes e perante terceiros (artigo 93, IX, da Constituio).[04]

. Introduziu-se, assim, a

possibilidade de o ato inconstitucional, no direito brasileiro, ser anulvel. Trata-se,

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Proferida deciso judicial e insatisfeita uma das partes ou terceiro juridicamente interessado, pode ela ser questionada por meio de recursos, previstos nas leis ordinrias processuais, em especial no Cdigo de Processo Civil, perante os tribunais superiores, ou ainda por meio de recurso especial, perante o Superior Tribunal de Justia, e recurso extraordinrio, perante o Supremo Tribunal Federal, garantidos pela Constituio, desde que cumpridos certos requisitos. Encerradas as possibilidades de recursos, previstos tanto no texto constitucional quanto no texto infraconstitucional, adquire esta deciso uma situao, um estado de "imutabilidade" trata-se do que se denomina coisa julgada material. No a coisa julgada material, assim, um dos efeitos da deciso judicial, mas, sim, um estado de "indiscutibilidade" dessa deciso judicial e de seus efeitos, pelo simples fato de no haver mais recursos previstos no ordenamento para tanto. nesse sentido que se afirma que a coisa julgada no tem dimenses prprias, mas as dimenses que tiverem os efeitos da sentena [06]. Partindo-se dessas premissas que se devem analisar as hipteses de coisa julgada inconstitucional, o que se traduziria em duas hipteses: sentena judicial fundada em lei posteriormente declarada inconstitucional, em sede de controle concentrado, em sede de controle difuso (desde que sua execuo seja suspensa pelo Senado) ou em smula vinculante. Uma lei declarada inconstitucional, como visto anteriormente, nula, ou seja, no poderia ter produzido efeito nenhum (excetuada a possibilidade, tambm j analisada, de mitigao dos efeitos dessa "declarao", por voto de dois teros dos Ministros do Supremo Tribunal Federal, tendo em vista razes de segurana jurdica e relevante interesse social). Ora, deciso judicial fundada em ato normativo nulo igualmente nula e, no tendo a coisa julgada dimenses prprias, mas as dimenses que tiverem os efeitos das sentenas, no far coisa julgada material esta deciso.

2. Instrumento processual de declarao de inconstitucionalidade.

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Assim, torna-se necessrio indicar qual seria o instrumento jurdico hbil a declarar a inconstitucionalidade dessas decises judiciais, cessando-se os seus efeitos. A ao rescisria e a ao declaratria apresentam-se como opes. A ao rescisria tem, pelo menos, trs inconvenientes: dois procedimentais e um de ordem lgica. A primeira questo de ordem procedimental diz respeito taxatividade do rol do artigo 485 do Cdigo de Processo Civil, que, em princpio, no abarcaria a deciso judicial violadora da Constituio. Essa questo, todavia, seria facilmente resolvida com uma interpretao extensiva do inciso V do artigo 485, entendendo-se a violao da lei em sentido amplo, tanto a infraconstitucional quanto a constitucional. A segunda questo j no to simples de ser resolvida: o prazo decadencial de dois anos para a propositura da ao, que alguns resolvem de maneira pouco tcnica e razovel: ignorando-o [07]. Por fim, h um inconveniente de ordem lgica: a ao rescisria tem como finalidade desconstituir deciso judicial de alguma maneira viciada; pressupe, assim, a validade dessa deciso. Ocorre que a deciso judicial inconstitucional, em regra, nula, devendo a sua invalidade ser declarada, no desconstituda (a no ser que, excepcionalmente, por dois teros dos votos do Supremo Tribunal, tenha sido a sano do vcio de inconstitucionalidade do ato mitigada, no sendo este nulo, e, sim, anulvel). A ao declaratria, por sua vez, por ser imprescritvel, apresenta-se como uma opo mais interessante, ainda que traga, igualmente, um inconveniente de ordem poltico-institucional: a competncia originria para a anlise dessa ao declaratria dos juzos de primeiro grau, que podem, em alguns casos, declarar inconstitucional deciso judicial proferida em acrdo do tribunal ao qual est vinculado, ao que se soma um possvel aumento desmesurado das aes propostas perante um Judicirio, j abarrotado de litgios [08]. Parece ser esta, apesar do exposto, a melhor opo. 48

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Concluso. Por fim, deve-se observar que esta possibilidade apresentada de declarao de inconstitucionalidade de decises judiciais no fere, de maneira nenhuma, o princpio da segurana jurdica. A possibilidade de declarao de

inconstitucionalidade tendo por critrio a injustia da deciso, sim, afrontaria a segurana jurdica, por subjetiva demais. Agora, esta mesma possibilidade tendo por critrio a inconstitucionalidade de lei declarada em sede de controle concentrado, em sede de controle difuso (desde que sua execuo seja suspensa pelo Senado) ou em smula vinculante, por ser suficientemente objetiva, no ofende, de maneira nenhuma, o princpio da segurana jurdica, mas, de maneira oposta, o preserva, na medida em que consolida a supremacia da Constituio.

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Notas01

Sobre a amplitude de aplicao do dispositivo, cf. Manoel Gonalves

Ferreira Filho, Comentrios, p.54 e s., Jos Afonso da Silva, p.133 e ss., Elival da Silva Ramos, A proteo, p.125-176.02

Cf., n