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SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA 1
ANÁLISE DO COMPORTAMENTO CÍCLICO DE UMA VIGA DE B.A. COM ARMADURA LISA
CATARINA FERNANDES
Aluna de Doutoramento
Univ. Aveiro
Aveiro - Portugal
JOSÉ MELO
Aluno de Doutoramento
Univ. Aveiro
Aveiro - Portugal
HUGO RODRIGUES
Aluno de Doutoramento
Univ. Aveiro
Aveiro - Portugal
HUMBERTO VARUM
Prof. Associado
Univ. Aveiro
Aveiro - Portugal
ANÍBAL COSTA
Prof. Catedrático
Univ. Aveiro
Aveiro - Portugal
ANTÓNIO ARÊDE
Prof. Associado
FEUP
Porto - Portugal
SUMÁRIO
Sismos recentes que têm atingido zonas edificadas comprovam a elevada vulnerabilidade de muitos edifícios
existentes de betão armado, em particular daqueles construídos até meados dos anos 70 com armadura lisa. Esta
vulnerabilidade está associada ao facto da concepção de muitas destas estruturas ser anterior à introdução da
regulamentação sísmica à luz dos actuais conceitos e conhecimentos, e por isso, sem adequado dimensionamento
face à acção sísmica. A pormenorização deficiente das armaduras e as fracas características de aderência da
armadura lisa, que caracterizam muitos destes edifícios, são causas comuns de dano e colapso em caso de sismo.
Em particular, o mecanismo da aderência aço-betão influencia fortemente o comportamento cíclico dos
elementos de betão armado com armadura lisa. No entanto, o trabalho experimental e numérico desenvolvido
com vista a estudar o comportamento cíclico de elementos estruturais com armadura lisa é escasso quando
comparado com o verificado para elementos com armadura nervurada. Neste âmbito, neste artigo é feita a
descrição do ensaio cíclico de uma viga de betão armado, de dois tramos, com armadura lisa, proveniente de uma
estrutura existente com mais de 40 anos. É também descrito o modelo numérico desenvolvido no OpenSees para
reproduzir a resposta global da viga, tendo em conta o mecanismo do escorregamento aço-betão. Os resultados
numéricos são apresentados em confronto com os resultados experimentais mais relevantes. Estes resultados são
ainda comparados com os resultados obtidos de uma segunda análise numérica na qual foi assumida a hipótese
de aderência perfeita entre o aço e betão. As comparações estabelecidas entre os resultados numéricos, com e
sem escorregamento, e os resultados experimentais, comprovam a necessidade de considerar o mecanismo do
escorregamento na modelação numérica de forma a obter uma reprodução mais rigorosa da resposta global da
viga para as condições de carga impostas no ensaio.
1. INTRODUÇÃO
Um número importante de edifícios de betão armado existentes na Europa foi construído antes dos anos 70 do
século passado, com armadura lisa e sem pormenorização específica para solicitações sísmicas. No caso
particular das estruturas com armadura lisa, às quais estão geralmente associadas fracas propriedades de
aderência, a sua resposta à acção de cargas cíclicas severas, tais como as induzidas pelos sismos, é fortemente
condicionada pelo comportamento da aderência aço-betão. Sob estas condições de carga, a aderência sofre uma
degradação progressiva, dando origem ao escorregamento entre o aço e o betão. O escorregamento tem uma
influência particularmente significativa sobre os mecanismos de deformação dos elementos estruturais com
armadura lisa. De acordo com [1,2,3], as fracas propriedades de aderência afectam de forma particular as
rotações nas extremidades dos elementos. A contribuição destas para a deformação total dos elementos pode ser
aumentada para cerca de 80% a 90%, reduzindo a contribuição relativa da deformação associada à flexão e ao
corte.
2 SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA
A maioria dos estudos experimentais sobre o comportamento cíclico de elementos de betão armado refere-se a
elementos com armadura nervurada. Em consequência disso, a influência da presença de armadura lisa no
comportamento não-linear dos elementos não é ainda bem conhecida. O mesmo se verifica em relação ao estudo
do mecanismo do escorregamento, não sendo conhecidos modelos bem estabelecidos e calibrados para descrever
o comportamento da aderência em elementos com armadura lisa solicitados por acções cíclicas. Motivado pela
importância crescente que se verifica na avaliação da capacidade sísmica das construções existentes em betão
armado, o número de estudos recentes conduzidos nesta área tem vindo a aumentar. São exemplo de trabalhos
experimentais recentes os descritos em [3 a 10], referentes a ensaios cíclicos de elementos isolados (pilares e
vigas), nós viga-pilar e pórticos, construídos com armadura lisa. Ao nível da interacção entre o aço e o betão, em
[11] é apresentada uma proposta para descrever a relação tensão de aderência versus escorregamento,
desenvolvida e calibrada com base nos resultados experimentais descritos em [12], referentes a ensaios pull-out
(monotónicos e cíclicos) de provetes com armadura lisa.
Os efeitos do escorregamento aço-betão são geralmente negligenciados na análise das estruturas de betão
armado. Em vez disso, é assumida a hipótese de aderência perfeita entre os dois materiais. Para além disso,
poucos são os programas de análise estrutural conhecidos nos quais estejam incorporados modelos para
descrever o comportamento da aderência. Vários autores ([2,10,13,14,15], entre outros), evidenciam a
importância da consideração do mecanismo do escorregamento na análise estrutural para obter uma aproximação
mais rigorosa ao comportamento real das estruturas. Estudos recentes ([13 a 17], entre outros) foram
desenvolvidos com vista a implementar os efeitos do escorregamento na análise de elementos de betão armado.
No âmbito da caracterização experimental do comportamento de elementos de betão armado com armadura lisa
sujeitos a cargas cíclicas, foi realizado na Universidade de Aveiro um ensaio cíclico de uma viga de betão
armado, com dois tramos, construída com armadura lisa. A viga é proveniente de um dos edifícios do Museu de
Santa Joana, em Aveiro, com mais de 40 anos de existência, e foi recolhida em 2007 durante a demolição de
alguns elementos estruturais para reabilitação do edifício. Para reproduzir a resposta global da viga, foi
desenvolvido um modelo numérico recorrendo ao Open System for Earthquake Engineeering Simulation
(OpenSees [18]). O modelo foi calibrado com os resultados do ensaio e nele foram incluídos os efeitos do
mecanismo do escorregamento através do modelo disponível no programa. Neste artigo é feita a descrição da
viga ensaiada, do esquema de ensaio adoptado, dos danos observados e são apresentados os resultados obtidos
com o modelo numérico desenvolvido. Os resultados numéricos são apresentados em confronto com os
resultados experimentais mais relevantes. Para melhor compreender os efeitos do escorregamento no
comportamento global da viga, foi feita uma segunda análise numérica sem a consideração do escorregamento e
estabelecida a comparação entre os resultados numéricos, com e sem os efeitos deste mecanismo, e os resultados
experimentais.
2. ENSAIO CÍCLICO DE UMA VIGA DE BETÃO ARMADO COM ARMADURA LISA
2.1. Descrição da viga
2.1.1. Características geométricas e condições de apoio
A geometria da viga e condições de apoio adoptadas no ensaio são ilustradas na Figura 1. A viga possui uma
secção rectangular constante com dimensões 0,18x0,22 m2 e cada tramo tem um vão de 4,0 m. As condições de
apoio (viga simplesmente apoiada) reproduzem as verificadas in-situ. Na Figura 1 é também ilustrada a
armadura e sua pormenorização, constante ao longo dos dois tramos. Foram verificadas boas condições de
ancoragem dos varões longitudinais. O confinamento do betão é pobre devido à configuração em U dos estribos
e ao seu espaçamento, que se verificou ser superior aos valores máximos actualmente admitidos pelo
Eurocódigo 2 [19] e pelo Eurocódigo 8 [20].
SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA 3
apoio
esquerdo tramo esquerdo tramo direitoapoio
central
apoio
direito
4.0 m 4.0 m
Ø8//0.180 m
0.2
2 m
0.18 m
2Ø12
2Ø10
2Ø12
apoio
esquerdo tramo esquerdo tramo direitoapoio
central
apoio
direito
4.0 m 4.0 m
Ø8//0.180 m
0.2
2 m
0.18 m
2Ø12
2Ø10
2Ø12
Figura 1: Características geométricas, condições de apoio e secção transversal da viga
2.1.2. Materiais
Uma vez que não foi possível obter amostras de aço em adequadas condições para realizar ensaios de tracção, as
suas propriedades mecânicas foram posteriormente estimadas na calibração do modelo numérico. A resistência à
compressão do betão foi estimada através da realização de ensaios de compressão de carotes extraídas em zonas
não danificadas da viga após o ensaio cíclico. Foi obtido um valor médio para a resistência à compressão de
19 MPa. O correspondente valor característico estimado é de 16,8 MPa, ao qual corresponde a classe de
resistência C16/20, de acordo com a classificação do EC2.
2.2. Esquema de ensaio e cargas aplicadas
Na Figura 2 é ilustrado o esquema de ensaio adoptado. O ensaio foi realizado com controlo em força e consistiu
na aplicação de duas forças (F), de igual intensidade, posicionadas a meio-vão dos tramos esquerdo e direito
(carregamento simétrico). As forças foram aplicadas sempre no sentido descendente, descrevendo séries de três
ciclos carga-descarga, de amplitude crescente, até um valor máximo de força igual a 25 kN (ver Figura 3), para o
qual foi verificado o colapso da viga. Os deslocamentos verticais da viga foram registados com recurso a
transdutores de deslocamento dispostos em vários pontos ao longo dos dois tramos (Figura 4), permitindo
registar a evolução da deformada.
FVISTA DA FRENTE VISTA LATERAL
VISTA SUPERIOR
LAJE DE REACÇÃO
SERVOACTUADORES
F
2.0 m 2.0 m 2.0 m 2.0 m
0
5
10
15
20
25
Fo
rça,
F (
kN
)
Step
de dr
F F
F F
de
F F
dr
F F
Figura 2: Esquema de ensaio adoptado Figura 3: Lei de carga aplicada
T10
0.58 0.58 0.58 0.58 0.58 0.58 0.58 0.58 0.58 0.580.50
T11 T12 T13 T14T7 T9 T5 T2 T3 T6 T8 T4
0.580.58
T1
(m)
Figura 4: Localização dos transdutores de deslocamento
4 SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA
2.3. Resultados do ensaio
Os resultados do ensaio, nomeadamente, a evolução da deformada da viga (Figura 5) e os diagramas força-
deslocamento obtidos para as secções de meio-vão dos dois tramos (Figura 10 da Secção 4.1), mostram que,
apesar da simetria ao nível da geometria da viga e das condições de carga impostas no ensaio, a resposta
experimental da viga não foi simétrica. Observou-se que a deformada da viga se manteve praticamente simétrica
até ao início da fissuração, após a qual o tramo esquerdo passou a exibir maiores deslocamentos do que o tramo
direito. O deslocamento máximo registado para os tramos esquerdo e direito é igual a 0,12 m e 0,03 m,
respectivamente. Nos diagramas força-deslocamento da Figura 10, observa-se que a relação força-deslocamento
inicial nos dois tramos é semelhante e que a força máxima no tramo direito é ligeiramente superior à do tramo
esquerdo. As diferenças registadas entre a resposta dos tramos esquerdo e direito poderão estar relacionadas com
pequenas diferenças ao nível da geometria, condições de apoio e propriedades dos materiais.
tramo esquerdo tramo direito
0.12 m
0.03 m
Figura 5: Evolução da deformada da viga
Na Figura 6 são indicados a localização, sequência de formação (RP1, depois RP2 e finalmente RP3) e o
comprimento (estimado por observação visual dos danos) das três rótulas plásticas formadas no ensaio. Os
valores indicados para o comprimento das rótulas plásticas são reduzidos devido ao facto do dano se ter
concentrado nestas regiões, não havendo praticamente o desenvolvimento de fissuras para além delas. A
distribuição dos danos observada é justificada pela ocorrência de escorregamento entre os varões longitudinais e
o betão envolvente.
Figura 6: Localização, sequência da formação e comprimento das rótulas plásticas
3. MODELO NUMÉRICO
3.1. Modelo global da viga
Na Figura 7 é ilustrado o modelo numérico desenvolvido para reproduzir a resposta da viga para as condições de
carga impostas no ensaio cíclico. O modelo foi construído no OpenSees recorrendo aos elementos
BeamWithHinges e Zero-length section. Nos dois elementos as secções são discretizadas em fibras representando
o betão (confinado e não confinado) e a armadura longitudinal, às quais são atribuídas as respectivas
propriedades e leis de comportamento dos materiais. O elemento BeamWithHinges é dividido em três sub-
elementos: i) duas rótulas plásticas, uma em cada extremidade, às quais se atribui o comportamento não-linear
SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA 5
dos materiais; e, ii) um elemento central de maior comprimento com comportamento linear elástico. Para o
comprimento das rótulas plásticas foram adoptados os valores medidos experimentalmente, indicados na Figura
6. O elemento Zero-length section é utilizado para implementar os efeitos do escorregamento no modelo
numérico. Esta é feita associando o modelo de escorregamento, descrito na Secção 3.3, às fibras representativas
do aço no elemento Zero-length section. No modelo da viga, os três elementos Zero-length section foram
colocados entre os quatro elementos BeamWithHinges, ou seja, entre as rótulas plásticas, concentrando os efeitos
do escorregamento naqueles elementos. Na Figura 7, os valores indicados para o comprimento dos elementos
dizem respeito às distâncias efectivas entre pontos de apoio. As grandezas de e dd dizem respeito aos
deslocamentos impostos no modelo numérico, de acordo com o descrito na Secção 3.4.
2 Ø10
2 Ø12
0.2
2 m
0.18 m1.88 m 1.88 m 1.88 m1.88 m
tramo esquerdo
Zero-length section
BeamWithHinges rótula plástica
2 Ø12betão
confinado
tramo direito
de dd
betão não confinado
(a)
2 Ø10
2 Ø12
0.2
2 m
0.18 m1.88 m 1.88 m 1.88 m1.88 m
tramo esquerdo
Zero-length section
BeamWithHinges rótula plástica
2 Ø12betão
confinado
tramo direito
de dd
betão não confinado
(b)
Figura 7: Modelo numérico da viga: a) comprimentos dos elementos BeamWithHinges e localização dos
elementos Zero-length section; b) secção transversal
3.2. Modelos de comportamento dos materiais
Os modelos Concrete02 e Concrete01, disponíveis no OpenSees, foram utilizados para descrever o
comportamento das fibras de betão nos elementos BeamWithHinges e Zero-length section, respectivamente.
Ambos os modelos baseiam-se na lei proposta por Hognestad [21] e modificada por Guedes [22], e contemplam
o efeito do confinamento devido à armadura transversal. Os valores adoptados para os parâmetros que definem o
comportamento do betão são indicados na Tabela 1.
Tabela 1 - Valores adoptados para as propriedades mecânicas do betão no modelo numérico
Betão E
[GPa]
fcm
[MPa]
0
[‰]
fcum
[MPa]
u
[‰]
fctm
[MPa]
0t
[‰]
Confinado 18,5 19,0 2,0 9,5 7,0 1,2 0,12
Não confinado 17,9 19,2 2,1 11,5 33,0 1,2 0,12
O modelo Steel02, baseado na formulação de Giuffré-Pinto e implementada por Menegotto-Pinto [23], foi
utilizado para descrever o comportamento das fibras de aço nos elementos BeamWithHinges. Como referido na
Secção 2.1.2, as propriedades mecânicas do aço não puderam ser estimadas. Assim, foram adoptados os valores
apresentados na Tabela 2, correspondentes aos valores médios das propriedades mecânicas do aço da classe
S235, de comum utilização no passado. Esta hipótese revelou-se satisfatória, podendo ser comprovada pela boa
aproximação dos resultados numéricos aos resultados experimentais apresentada na Secção 4. O modelo de
escorregamento apresentado na Secção 3.3 foi utilizado para descrever o comportamento das fibras de aço nos
elementos Zero-length section.
Tabela 2 - Valores médios das propriedades do aço adoptados no modelo numérico
fy
[MPa]
fu
[MPa]
E
[GPa]
260 360 200
6 SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA
3.3. Modelo do escorregamento aço-betão
O modelo de escorregamento Bond_SP01 [18,24] do OpenSees (Figura 8) foi desenvolvido e calibrado com base
nos resultados experimentais referidos em [24], referentes a ensaios cíclicos realizados em elementos com
armadura nervurada. Assim, para adaptar o modelo às condições da viga em estudo, nomeadamente à utilização
de armadura lisa, foram feitas algumas alterações nos parâmetros do modelo. Em particular: i) o parâmetro ,
que define a forma não linear da envolvente monotónica da curva tensão no aço versus escorregamento, foi
alterado de 0,4 (valor definido para elementos com armadura nervurada) para 0,5 tendo em conta as
recomendações dadas por [25]; ii) foi adoptado o valor máximo admissível para o valor último do
escorregamento (su), igual a 40sy de acordo com [24]; e, iii) foi adoptado o valor mínimo admissível para o factor
de redução da rigidez (b), igual a 0,3 de acordo com [24]. A implementação do modelo de escorregamento no
modelo numérico da viga em estudo é explicada com maior detalhe em [26].
s
fy
fsu
sy su
bK
K
fs
σ = Ks
(a)
σ
s
K
K
K
R
(b)
Figura 8: Modelo de escorregamento Bond_SP01: a) relação tensão no aço versus escorregamento sob
carregamento monotónico; b) resposta cíclica
3.4. Leis de deslocamento impostas
No modelo da viga optou-se por impor as leis de deslocamento medidas a meio-vão dos tramos esquerdo e
direito (de e dd, respectivamente), representadas na Figura 9, em vez da lei de forças imposta no ensaio cíclico. A
imposição da lei de forças no modelo numérico resultaria numa resposta simétrica da viga, não sendo nesse caso
reproduzíveis os resultados experimentais.
0.00
0.02
0.04
0.06
0.08
0.10
0.12
Desl
ocam
en
to (
m)
Step
de
dd
de dr
F F
F F
de
F F
dr
F F
Figura 9: Leis de deslocamentos impostas no modelo numérico
SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA 7
4. COMPARAÇÃO ENTRE OS RESULTADOS EXPERIMENTAIS E NUMÉRICOS
4.1. Resposta em termos de força-deslocamento
Na Figura 10 são representados os diagramas força-deslocamento calculados para as secções de meio-vão dos
tramos esquerdo e direito da viga. A comparação estabelecida com os resultados do ensaio demonstram a boa
capacidade do modelo numérico em reproduzir a resposta global da viga, quer em termos de força máxima, quer
em termos da evolução dos deslocamentos. No entanto, obteve-se uma melhor aproximação da resposta para o
tramo esquerdo. Em termos de força máxima, a variação do valor numérico calculada em relação ao valor
experimental é praticamente nula para o tramo esquerdo, e cerca de 7% para o tramo direito. Em relação à
rigidez, a diferença máxima é de cerca de 0,7% para o tramo esquerdo e 16% para o tramo direito.
Na Figura 10 é ainda assinalada a evolução dos principais estados de dano, determinada com base nos resultados
numéricos, para uma melhor compreensão da sua influência na resposta global da viga.
0.00 0.02 0.04 0.06 0.08 0.10 0.120
5
10
15
20
25
S
Fo
rça,
F (
kN
)
Deslocamento, de (m)
Exp
Num
C
E G
D
F H
BA
de dr
F F
F F
de
F F
dr
F F
(a)
0.000 0.005 0.010 0.015 0.020 0.025 0.0300
5
10
15
20
25G
S
E
Fo
rça,
F (
kN
)
Deslocamento, dd (m)
Exp
Num
A
C
D
B
F
de dr
F F
F F
de
F F
dr
F F
(b)
A – Início da fissuração do betão na secção do apoio central
B – Início da fissuração do betão nas secções de meio-vão
C – Cedência da armadura superior na secção do apoio central
D – Cedência da armadura inferior nas secções de meio-vão
E – Esmagamento do betão não confinado na secção do apoio central
F – Esmagamento do betão não confinado nas secções de meio-vão
G – Esmagamento do betão confinado na secção do apoio central
H – Esmagamento do betão confinado nas secções de meio-vão
S – Carga de serviço
Figura 10: Diagramas força-deslocamento e evolução dos danos: a) meio-vão do tramo esquerdo; b) meio-vão do
tramo direito
Para melhor compreender os efeitos do escorregamento na resposta global da viga, foi feita uma segunda análise,
agora não considerando este mecanismo. Na Figura 11 é estabelecida a comparação entre os resultados
numéricos, com e sem escorregamento, e os resultados experimentais. Verifica-se que a resposta da viga é
reproduzida com maior rigor quando os efeitos do escorregamento são contemplados no modelo numérico.
Apesar de não se verificarem alterações em termos da força máxima, a não consideração do escorregamento
traduz-se num aumento da rigidez (inicial e dos ciclos internos) da resposta.
8 SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA
0.00 0.02 0.04 0.06 0.08 0.10 0.120
5
10
15
20
25
Fo
rça,
F (
kN
)
Deslocamento, de (m)
Exp
Num
Num (s/ escor.)
de dr
F F
F F
de
F F
dr
F F
(a)
0.000 0.005 0.010 0.015 0.020 0.025 0.0300
5
10
15
20
25
Fo
rça,
F (
kN
)
Deslocamento, dd (m)
Exp
Num
Num (s/ escor.)
de dr
F F
F F
de
F F
dr
F F
(b)
Figura 11: Diagramas força-deslocamento, com e sem a consideração do escorregamento no modelo numérico, e
confronto com resultados experimentais: a) meio-vão do tramo esquerdo; b) meio-vão do tramo direito
4.2. Evolução da energia dissipada
A evolução da energia dissipada, obtida com o modelo numérico (com e sem a consideração do mecanismo do
escorregamento) e experimentalmente, é ilustrada na Figura 12 e foi calculada através da soma cumulativa da
energia dissipada associada a cada ciclo carga-descarga. A consideração do escorregamento no modelo numérico
permite obter uma melhor aproximação aos resultados experimentais, sendo a diferença máxima em relação a
estes de cerca de 2%. Não considerando o escorregamento, é verificada maior dissipação de energia, para o
mesmo carregamento cíclico imposto, com uma diferença máxima igual a 10% em relação à obtida considerando
este mecanismo.
0.0
0.5
1.0
1.5
2.0
2.5
3.0
3.5
4.0
En
erg
ia d
issi
pad
a (
kN
.m)
Exp
Num
Num (s/ escor.)
Step
Figura 12: Evolução da energia dissipada
5. CONTRIBUIÇÃO DO ESCORREGAMENTO PARA A DEFORMAÇÃO DA VIGA
Na Figura 13 representa-se a contribuição parcial do escorregamento e da deformação por flexão para a
deformada global da viga, determinadas com base nos resultados numéricos. O valor máximo da contribuição da
deformação por corte, estimado para o instante correspondente ao máximo deslocamento imposto em cada
tramo, é igual a 0,08% para o tramo esquerdo e 0,33% para o tramo direito. A contribuição da deformação por
corte é desprezável, como esperado pelas dimensões do elemento estrutural, e por isso não é representada na
figura, estando incluída na parcela da deformação por flexão. Observa-se que a contribuição do escorregamento
aumenta com a evolução dos deslocamentos impostos a meio-vão. Para o valor máximo de deslocamento
imposto no tramo esquerdo, o mecanismo do escorregamento representa 85% da deformação total nesse tramo.
SÍSMICA 2010 – 8º CONGRESSO DE SISMOLOGIA E ENGENHARIA SÍSMICA 9
0.00 0.02 0.04 0.06 0.08 0.100
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
Deslocamento, de (m)
Escorregamento
Flexão
Co
ntr
ibu
ição
parc
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para
o d
esl
ocam
en
to d
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meio
-vão
do
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mo
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%)
de dr
F F
F F
de
F F
dr
F F
(a)
0.000 0.005 0.010 0.015 0.020 0.0250
10
20
30
40
50
60
70
80
90
100
Deslocamento, dd (m)
Escorregamento
Flexão
Desl
ocam
en
to p
arc
ial
para
o d
esl
ocam
en
to d
e
meio
-vão
do
tra
mo
dir
eit
o (
%)
de dr
F F
F F
de
F F
dr
F F
(b)
Figura 13: Contribuição parcial do escorregamento e da flexão para a evolução dos deslocamentos a meio-vão
do: a) tramo esquerdo; b) tramo direito
6. COMENTÁRIOS FINAIS
Neste artigo foi feita a descrição do ensaio cíclico de uma viga de betão armado, com dois tramos, construída
com armadura lisa, proveniente de uma estrutura existente. Os danos observados no ensaio, nomeadamente a sua
concentração em rótulas plásticas de comprimento reduzido (comprimento máximo igual a 0,15 m), evidenciam
a ocorrência do escorregamento entre o aço e o betão envolvente, demonstrando os seus efeitos ao nível da
distribuição dos danos na viga.
Com base nos resultados experimentais, foi construído um modelo numérico no OpenSees para reproduzir a
resposta global da viga. Numa primeira análise, os efeitos do mecanismo do escorregamento foram tidos em
conta através da utilização do modelo de escorregamento incorporado no programa. Numa segunda análise, foi
assumida a hipótese de aderência perfeita entre o aço e betão.
A comparação estabelecida entre os principais resultados experimentais e os resultados numéricos
correspondentes, com e sem escorregamento, mostram que o modelo com escorregamento reproduz com muito
maior rigor os resultados experimentais. O modelo com escorregamento mostrou ter capacidade de descrever a
resposta global da viga sob as condições de carga impostas no ensaio, nomeadamente em termos de força
máxima, evolução de deslocamentos e energia dissipada. As diferenças registadas em relação aos valores
experimentais foram: i) força máxima praticamente igual para o tramo esquerdo e uma diferença de cerca de 7%
para o tramo direito; ii) em termos de rigidez, diferença de cerca de 0,7% para o tramo esquerdo e 16% para o
tramo direito; iii) para a energia dissipada observou-se uma diferença de cerca de 2%. A não consideração do
escorregamento resulta num aumento da rigidez da resposta e da energia dissipada. Verifica-se que a diferença
máxima entre esta e a energia dissipada que se obtém considerando o escorregamento no modelo, é igual a cerca
de 10%. A partir da análise dos resultados numéricos com escorregamento, verificou-se que a contribuição deste
mecanismo para a deformação da viga aumenta com a evolução dos deslocamentos impostos a meio-vão. Para o
valor máximo de deslocamento imposto no tramo esquerdo, o escorregamento é responsável por cerca de 85% da
deformação total nesse tramo, sendo a restante parcela devida à deformação por flexão.
As análises realizadas reforçam a importância da consideração do mecanismo do escorregamento nos modelos
de análise numérica com vista a obter uma representação mais realista do comportamento deste tipo de
estruturas.
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7. AGRADECIMENTOS
Este artigo refere investigação realizada com o apoio financeiro da FCT – Fundação para a Ciência e a
Tecnologia (Portugal), nomeadamente através das Bolsas de Doutoramento do primeiro, segundo e terceiro
autores e Bolsa de Licença Sabática do quarto autor, com as referências SFRH/BD/27406/2006,
SFRH/BD/62110/2009, SFRH/BD/63032/2009 e SFRH/BSAB/939/2009, respectivamente. Os autores
agradecem a colaboração na preparação e execução do ensaio da viga: i) Eng. Alexandre Costa, Sr. Valdemar
Luís e Sr. André Martins, do Laboratório de Engenharia Sísmica e Estrutural da Faculdade de Engenharia da
Universidade do Porto (LESE-FEUP); ii) Eng. Romeu Vicente, Eng. Henrique Pereira e Eng. Elsa Neto, do
Departamento de Engenharia Civil da Universidade de Aveiro. Os autores agradecem ainda às empresas
CIVILRIA Construções S.A., Silva Tavares & Bastos Almeida Lda. e Arlindo Correia & Filhos S.A., pela
colaboração no transporte da viga e na construção do sistema de reacção para o ensaio. Um agradecimento ainda
para o Museu de Santa Joana, em Aveiro, pelo acesso facilitado ao edifício de onde foi retirada a viga.
8. REFERÊNCIAS
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