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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI ANIÚSKA MANSUÊTA CARVALHO BARROS ANÁLISE DO FILME “OBRIGADO POR FUMAR” E A REPRESENTAÇÃO DO GERENCIAMENTO DE CRISES DE IMAGEM EM SEU ENREDO SÃO PAULO 2013

análise do filme obrigado por fumar e a representação do

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UNIVERSIDADE ANHEMBI MORUMBI ANIÚSKA MANSUÊTA CARVALHO BARROS

ANÁLISE DO FILME “OBRIGADO POR FUMAR” E A REPRESENTAÇÃO DO GERENCIAMENTO

DE CRISES DE IMAGEM EM SEU ENREDO

SÃO PAULO 2013

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ANIÚSKA MANSUÊTA CARVALHO BARROS

ANÁLISE DO FILME “OBRIGADO POR FUMAR” E A REPRESENTAÇÃO DO GERENCIAMENTO

DE CRISES DE IMAGEM EM SEU ENREDO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi de São Paulo, sob a orientação do Professor Doutor Rogério Ferraraz.

SÃO PAULO 2013

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ANIÚSKA MANSUÊTA CARVALHO BARROS

ANÁLISE DO FILME “OBRIGADO POR FUMAR” E A REPRESENTAÇÃO DO GERENCIAMENTO DE

CRISES DE IMAGEM EM SEU ENREDO

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Mestre do Programa de Mestrado em Comunicação da Universidade Anhembi Morumbi de São Paulo, sob a orientação do Professor Doutor Rogério Ferraraz.

Aprovada em:

_______________________________

Prof. Dr. Rogério Ferraraz (Universidade Anhembi Morumbi)

_______________________________

Prof. Dr. Vander Casaqui (Escola Superior de Propaganda e Marketing)

_______________________________

Profa. Dra. Maria Ignês Carlos Magno (Universidade Anhembi Morumbi)

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Dedico este estudo ao meu marido

Gustavo, a quem agradeço o

companheirismo e o amor; e ao meu

amado filho Antônio, que vivenciou, ainda

em meu ventre, parte dessa minha

trajetória pelo mestrado e que enche

nossas vidas de felicidade.

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AGRADECIMENTOS

É difícil agradecer a todas as pessoas que, de algum modo, nos momentos serenos

ou naqueles difíceis fizeram parte da minha trajetória pelo mestrado. Primeiramente,

gostaria de agradecer a toda minha família.

Agradeço aos meus muitos amigos do mestrado, não citarei nomes uma vez que

percorri diversas turmas, pela compreensão, carinho, risadas, apoio, ensinamentos.

Meu sincero e especial agradecimento aos meus professores/mestres Luiz Antônio

Vadico, Maria Ignês Carlos Magno, Sheila Schvarzman, Maria Bernadette Cunha de Lyra

que, com dedicação e carinho, ministraram aulas que transformaram a minha visão sobre o

cinema e a arte de forma geral.

Com muito carinho e imensa admiração, agradeço ao meu orientador e professor

Rogério Ferraraz que, com toda paciência, atenção e gentileza, conseguiu me direcionar

nessa pesquisa, principalment nos momentos em que eu já imaginava ter de desistir de

finalizar esse projeto.

Agradeço à assistente do Mestrado Alessandra Marota, que atenciosamente me

atendeu e, literalmente, me salvou nos momentos de tensão.

Também agradeço à Universidade Anhembi Morumbi por ter me dado a oportunidade

de fazer esse curso como aluna bolsista e por abrir suas portas para que eu pudesse

começar uma nova carreira como professora. Em um País em que a Educação não é

prioridade, sempre tive como lema que o conhecimento é fonte de transformações pessoais

e sociais. E nessa Universidade, esse meu lema tomou nova dimensão, principalmente por

mais essa conquista.

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Se fôssemos traçar uma linha reta da trajetória de uma crise de imagem, o

ponto zero seria o sucesso. E, como ponto final, a execração. Em qualquer nível em

que esse sucesso se expresse.

MÁRIO ROSA

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RESUMO

Esta dissertação tem como objetivo analisar o filme “Obrigado por Fumar” (Thank you for

smoking. REITMAN, J. & BUCKLEY, C. Fox Seach Pictures. EUA. 2005. Cor. 92 min.),

longa-metragem de estreia de Jason Reitman como diretor, baseado no livro de mesmo

nome de 1994 de Christopher Buckley. Busca-se, aqui, investigar a representação e o

processo de midiatização do gerenciamento de crises de imagem organizacionais pelo

cinema americano a partir da década de 1990, através da análise de uma obra específica. O

interesse desta pesquisa é mostrar a representação midiática da cultura organizacional no

que tange o gerenciamento de crises de imagem e como o cinema americano se apropria do

tema para demonstrar o que as empresas, de forma geral, costumam fazer para defender

seus interesses. A estética e a narrativa, neste contexto, são importantes para alavancar

personagens e caracterizá-los em face do que acontece no mundo corporativo. Esta

pesquisa é considerada de fundo analítico, sendo que para descrever o processo de

midiatização foi feito um levantamento de documentos e registros sobre o tema realizados

por pesquisadores do setor. E, para realizar o estudo fílmico, foram utilizados estudos

anteriores sobre análise fílmica e processos de representação no cinema americano. Esta

dissertação traça um paralelo entre o mundo corporativo e sua representação em momentos

de gerenciamento de crises de imagem. Em “Obrigado por Fumar”, esta representação

corporativa ganha ares de sátira, mas o tema é, literalmente, esmiuçado em suas pequenas

nuances. A perspicácia do enredo, a precisão do roteiro, no desenvolvimento dos

personagens, dos diálogos e das ações, a escolha do elenco, entre outros elementos,

contribuem para se estabelecer uma sólida argumentação sobre o tema.

Palavras-chave: cinema americano, gerenciamento de crises, representação, análise de

filmes, “Obrigado por Fumar”.

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ABSTRACT

This thesis aims to analyze the feature film "Thank You for Smoking" (Thank you for smoking. Reitman, J. & BUCKLEY, C. Fox Seach Pictures. U.S. 2005. Colors, 92 min. The first film of Jason Reitman as director, based on the book of the same name by Christopher Buckley 1994. One aim here to investigate the representation and process of mediatization of the crisis management of organizational image by American cinema from the 1990 ’s. the interest of this research is to show the media representation of the organizational culture regarding crisis management and image as the American film appropriates the theme to demonstrate that companies, in general, usually do to defend their interests . The aesthetic and narrative in this context are important to leverage characters and characterize them in light of what happens in the corporate world. This research is considered analytical background because to describe the process of mediatization was a survey of documents and records on the subject conducted by researchers from industry. And, to make the filmic study, previous studies on film analysis and processes of representation in American cinema were used. This paper draws a parallel between the corporate world and its representation in moments of crisis management picture, portrayed from the decade 1990 by the American cinema. In "Thank You for Smoking" this corporate representation wins airs of satire, but the theme is literally scrutinized in their little nuances. The insight of the plot and the casting contribute to establishing a solid argument about the theme.

Keywords: American cinema, crisis management, representation, film analysis, "Thank You

for Smoking".

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - O Senador Ortolan K. Finistirre, papel de William H. Macy, e um cartaz de seu projeto antitabagista 74

Figura 2 - Nick Naylor e a jornalista Heather Holloway em um de seus encontros, nos quais ele confessou a ela todas as suas artimanhas 81

Figura 3 - Luz e sombra ajudam a projetar a atmosfera de suspense e reforçam no filme as questões de ética e retórica versus persuasão 83

Figura 4 - Nick Naylor faz apologia ao tabaco até mesmo durante apresentação na escola do filho Joey (Cameron Bright) 84

Figura 5 - Nick Naylor em um dos momentos com seu filho, que o faz repensar seu trabalho e a forma de usar seu poder de persuasão 87

Figura 6 - Nick Naylor analisa sua performance em encontro informal com seus colegas lobistas em uma das cenas de “Obrigado por fumar” 87

Figura 7 - Naylor aprende, com seu filho, já na terceira fase da trama a trabalhar de forma mais crível, mais embasada em valores e não somente em astúcias 89

Figura 8 - Ao lado do Filho Joey Naylor, Nick Naylor demonstra que é possível trabalhar como lobista com ética 90

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SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO ............................................................................... 11

CAPÍTULO – 2 – GERENCIAMENTO DE CRISES INSTITUCIONAIS ................. 20

2.1 Definição de Imagem, Valor de Marca e Crise ................................................. 20

2.2 Perdas e Ganhos em uma Crise Empresarial .................................................. 27

2.3 Tipos de Crises Empresariais ........................................................................... 31

2.4 Classificação das Crises Empresariais ............................................................. 35

2.5 A escolha do porta-voz ..................................................................................... 41

2.6 Planejamento ou Sorte?.................................................................................... 43

2.7 Jornalistas ......................................................................................................... 47

2.8 Midiatização do Gerenciamento de Crises ....................................................... 51

CAPÍTULO – 3 – A REPRESENTAÇÃO DO GERENCIAMENTO DE CRISES

DE IMAGEM EM “OBRIGADO POR FUMAR” ....................................................... 57

3.1 O Cinema Midiatizou a Forma de Viver ............................................................ 67

3.2 Controle Social .................................................................................................. 70

3.3 Questão de Retórica, Regras e Midiatização ................................................... 71

3.4 Quando a Verdade é Inconveniente ................................................................. 77

3.5 Elenco, Enredo e Personagens ........................................................................ 79

3.6 Contexto ............................................................................................................ 85

CONCLUSÃO .......................................................................................................... 91

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 94

Sites pesquisados ................................................................................................... 96

ANEXOS.................................................................................................................. 97

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CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO

A construção de um planejamento de comunicação para a formação de

imagem1/reputação2 empresarial parece ser um dos pontos de partida para o

estabelecimento de uma organização social ou de mercado da contemporaneidade.

Baseados em pilares construídos pela comunicação organizacional tais planejamentos

difundem lemas, valores e missões de milhares e milhares de organizações mundo afora,

especialmente para tentar fazer com que estas mesmas companhias estabeleçam com seus

públicos e com o mercado de forma geral um conceito de perenidade, de sustentabilidade.

Mas, quando o cenário da sustentabilidade esbarra em alguma farpa, o que fazer? Esta é a

indagação desta pesquisa que busca traçar um paralelo entre momentos extremos de

comunicação, como os que ocorrem em ocasiões de gerenciamento de crises de imagem, e

a sua representação3 midiática4 feita pelo cinema americano a partir da década de 1990.

1 Imagem institucional ou corporativa é um diferencial decisivo em relação à concorrência. Para que um produto desperte a atenção do consumidor, é preciso promover um amplo e complexo processo de comunicação que se inicia – e se sustenta – na imagem institucional da empresa que o produz. Por meio dessa imagem é possível saber que por trás do design, do desempenho tecnológico e da modernidade de um produto ou serviço está o compromisso da empresa com a qualidade e o respeito aos seus acionistas, colaboradores e consumidores. Artigo a Força da Imagem, Site Aberje, acessado em 05.11.2013, em http://www.aberje.com.br/antigo/revista/n22/artigo4b.htm

2 A reputação é o juízo de valor que a empresa sofre quando se compara a sua imagem a um modelo ideal aos olhos de quem a vê. Pode ser entendida como recurso fonte de valor ou de vantagem competitiva para as organizações, sendo um dos recursos que contribuem positiva ou negativamente para o seu desempenho. A reputação é o mais importante ativo de uma organização. Problemas na esfera da reputação influenciam poderosamente as relações com os públicos de interesse e podem arruinar negócios, derrubar governos e destruir relacionamentos e esforços moldados e consolidados ao longo de décadas. Curso do professor, Renato Manzano, para a Aberje, acessado em 05.11.2013,

em http://www.aberje.com.br/servicos_cursos_nao_detalhes.asp?id=164

3 O conceito de representação coletiva nasceu na sociologia, nos estudos de Émile Durkheim. O

sociólogo argumentou que esses fenômenos coletivos não podem ser explicados em termos de indivíduo, pois ele não pode inventar uma língua ou uma religião. Esses fenômenos são produto de uma comunidade, ou de um povo. Acessado em 05.11.2013, em http://www.scielo.br/pdf/ln/n61/a08n61.pdf 4 A comunicação midiática é formadora de representações e, como tal, interfere diretamente na conduta dos indivíduos, conforme a dinâmica das interações realizadas entre sujeito e objeto, articuladas no âmbito do meio comunicacional. Artigo Teoria Social e Comunicação: Representações Sociais, Produção de Sentidos e Construção dos Imaginários Midiáticos, acessado em 05.11.2013 –

endereço eletrônico http://compos.org.br/seer/index.php/e-compos/article/viewFile/9/10

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Procurou-se entender como o cinema americano, mais especificamente o longa-

metragem “Obrigado por Fumar”, utilizou a relação de midiatização audiovisual para retratar

o gerenciamento de crises de imagem e suas várias formas, que, na verdade, são pré-

requisitos para se tentar manter a ordem. Esta dissertação tem como objetivo analisar o

longa-metragem “Obrigado por Fumar” (Thank you for smoking. REITMAN, J. & BUCKLEY,

C. Fox Seach Pictures. EUA. 2005. Cor. 92 min. Longa de estreia de Jason Reitman como

diretor, baseado no livro de mesmo nome de 1994 de Christopher Buckley. Busca-se, aqui,

investigar a representação e o processo de midiatização do gerenciamento de crises de

imagem organizacionais pelo cinema americano a partir da década de 1990, por meio da

análise dessa obra em particular.

Esta pesquisa tem o intuito de mostrar a representação midiática da cultura

organizacional no que tange o gerenciamento de crises de imagem e como o cinema

americano se apropria do tema para demonstrar o que as empresas, de forma geral,

costumam fazer para defender seus interesses. Avaliar a estética e a narrativa do longa-

metragem é importante para averiguar como personagens foram caracterizados a fim

representarem o que acontece no mundo corporativo.

Os fenômenos da midiatização do gerenciamento de crises de imagem são o alvo

deste estudo. Procura-se entender como o cinema americano da década de 1990 em diante,

mais especificamente o filme “Obrigado por fumar”, utiliza a relação de midiatização

audiovisual e os processos nos quais a cultura audiovisual se estabelece para retratar o

gerenciamento de crises de imagem e suas repercussões. Busca-se, mais especificamente

avaliar como os processos históricos/culturais estabelecidos sob modelos pré-concebidos de

administração organizacional interferem na concepção e, também, no próprio gerenciamento

de crises.

Baseado nos autores estudados, (MITROFF, 2000; IRVINE, 1996; GASCHEN, 2003;

SUSSKING e FIELD, 1997; WAKEFIELD, 1999; NEVES, 2002; MELO, 2004; ROSA, 2001;

VIANA, 2001) este estudo buscou referências sobre Comunicação, Gerenciamento de

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Crises, Imagem, Organizações. Pode-se aferir, com base nas teorias destes estudiosos, que

poucas são as empresas que estão preparadas para vivenciar um momento de crise de

imagem ou que tenham elaborado um plano de contingência5 para o seu gerenciamento.

Nota-se, no Brasil principalmente, um despreparo muito grande por parte das empresas para

tratar as contingências a que elas mesmas se impõem. Concluí-se que não é dada a devida

atenção aos problemas que têm o potencial de arranhar suas imagens ou reputações. É

plausível afirmar que, na verdade, as próprias lideranças das companhias não se preparam

porque, no íntimo, não acreditam que um dia poderão ser vítimas de tal experiência.

Quem já vivenciou momentos de crises de imagem corporativa, no entanto, sabe muito

bem que uma situação como esta deixa sérias consequências. Desta forma, cabe ressaltar

que não se preparar para tais eventos reflete a pouca preocupação que as empresas dão a

tais questões. Ter um evento que afete a imagem de uma corporação e não estar preparado

pra gerenciá-lo é, no mínimo, uma falta de visão corporativa de médio prazo.

Informações de 1996 do Institute for Crisis Management (ICM)6, instituição americana

responsável por pesquisas e planejamentos organizacionais no que se refere à

gerenciamento de crises de imagem, revelam que apenas 35% das crises são repentinas ou

inesperadas; contra 79,96% latentes. Previstas ou não, anunciadas antecipadamente ou

não, as crises de imagem institucional ocorrem no mundo inteiro, cada vez com maior

repercussão na mídia e com maiores danos para a empresa e para a sociedade.

5 Um plano de contingência é um tipo de plano preventivo, preditivo e reativo. Este tipo de plano propõe uma série de procedimentos alternativos ao funcionamento normal de uma organização, sempre que alguma das suas funções usuais se vê prejudicada por um problema interno ou externo.

6 Institute for Crisis Management (ICM) é uma empresa de consultoria americana que atua com base

em pesquisas oferecendo serviços de administração e comunicação para empresas, organizações sem fins lucrativos e órgãos governamentais. O ICM foi fundado em 1989 e dedica-se à pesquisa e consultoria à empresas e personalidades auxiliando na elaboração do plano de contingência e de estratégias de comunicação em situações de crise. Site oficial – http://crisisconsultant.com

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Grosso modo, buscou-se nesse estudo apontar as diversas tramas que uma crise de

imagem corporativa estabelece. O objetivo desta averiguação do que se faz num momento

de crise e do que, realmente, pode-se denominar crise de imagem corporativa/institucional é

demonstrar o que as empresas, de forma geral, costumam fazer para defender seus

interesses e sua reputação em situações limite. Tais situações, em geral, envolvem

questões pertinentes à imagem, o que é muito difícil de se estabelecer e mais ainda de

recuperar. Avaliar como essas situações foram retratadas pelo cinema, em especial no

longa-metragem adotado como base dessa pesquisa, é o foco deste trabalho.

Analisar o longa-metragem “Obrigado por Fumar” e a representação do gerenciamento

de crises de imagem em seu enredo trouxe para esse estudo a possibilidade de abordagem

do tema e a dificuldade de se encontrar literatura que intermediasse os dois universos:

cinema americano versus gerenciamento de crises institucionais. Há pouca fortuna crítica7

sobre o filme e é ainda menor a literatura que envolve o tema gerenciamento de crises de

imagem e sua representação pelo cinema americano.

A escolha de “Obrigado por Fumar” para abordar tal assunto se deu por sua

peculiaridade e por sua representatividade no quesito representação midiática. Em

“Obrigado por Fumar”, o tema gerenciamento de crises de imagem é tratado de forma

caricatural. Mas, por detrás da pretensa ironia do enredo, é possível perceber a importância

do assunto e traçar um paralelo sobe como se preparar para sua abordagem no dia-a-dia

empresarial. E, principalmente, se preparar para as contingências que cercam esse tipo de

evento.

No filme, o enredo é uma tentativa de proteger a indústria do tabaco do que pode se

tornar o seu colapso. Toda a trama articula-se sobre tal blindagem. Não se pode negar,

contudo, que não há mais uma ordem pré-estabelecida que perdure para sempre. Nem

mesmo no mundo que parecia ideal das grandes companhias de cigarro. As mudanças

sociais, de conduta, de postura, obrigam as empresas a estarem sempre em mudança.

7 Acervo de críticas sobre obra publicada.

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Principalmente quando estas empresas estão no limiar do que é politicamente correto, como

é o caso do tabaco, das armas de fogo, da bebida. Todas estas indústrias tem

representatividade em “Obrigado por Fumar”.

O filme de Jason Reitman pode ser dividido em três partes distintas. É possível

configurar a trama como um desenrolar de uma tese, síntese e antítese. Na primeira parte

do filme, Nick Naylor (Aaron Eckhart) é um contumaz vice-presidente/porta-voz8/lobista9 da

indústria do tabaco e defende seu posicionamento em função de suas despesas pessoais,

em especial do pagamento da hipoteca.

Já num segundo momento, ainda no começo da trama, a personagem se defronta com

os próprios valores (influenciado pela postura crítica sobre moral de seu filho pré-

adolescente Joey Naylor – interpretado pelo ator Cameron Bright). Neste momento, Nick

Naylor recua e até pensa em deixar o posto de porta-voz da indústria do tabaco em função

da força de argumentação do filho. Esta abordagem ganha um grande espaço na trama. O

personagem principal demora algum tempo até decidir-se por qual caminho continuar.

Num terceiro momento, já no final da trama, Nick Naylor discorre que existe uma linha

tênue entre uma postura com ética, moral e de credibilidade, mesmo que seja em defesa de

um produto que pode ser tão prejudicial. Ele continua seu trabalho de lobista, desta vez na

indústria de telecomunicações. Setor que também é bastante criticado. Mas, consegue o

apoio do filho para esta sua nova forma de agir e trabalhar. É tênue a linha que separa a

personagem do limiar da ética, dos valores. Principalmente, quando o assunto é tratado

quase de forma fronteiriça no enredo.

8 Porta-voz é uma pessoa que fala em nome de outrem, mas que não se constitui, necessariamente, como parte de outrem (isto é, não precisa ser um empregado do representado).

9 Lobby é o nome que se dá à atividade de pressão, ostensiva ou velada, de um grupo organizado

com o objetivo de interferir diretamente nas decisões do poder público, em favor de causas ou objetivos defendidos pelo grupo. Lobista, em português, é o nome que se dá ao profissional que faz tal atividade. Illustrated Oxford Dictionary, 2000 p. 478

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Em “Obrigado por Fumar” é possível analisar cada preâmbulo do gerenciamento de

crises de imagem, desde o fato que a acarreta até os pontos negativos de quem as

gerencia, passando pelos atos falhos, improvisações etc. Ao contrário do que se possa

antever, “Obrigado por Fumar” representa quase todas as facetas do processo de

gerenciamento de crises. O enredo pode-se dizer, é uma verdadeira aula sobre o assunto.

Em especial do que não fazer e de como a ética e a moral podem ser maleáveis, quando

não tem o rigor de um planejamento.

É preciso ter em mente, no entanto, que o mundo vive em plena crise, seja de ordem

social, econômica ou moral. Gilles Deleuze (1992), um dos principais autores estudados

para o embasamento teórico deste trabalho argumenta que o mundo está numa crise

generalizada de todos os meios de confinamento. Desta forma, faz-se necessário estar

preparado para esse novo mundo. É quase uma questão de sobrevivência criar mecanismos

para enfrentar adversidades, situações fora do controle, emergências.

Para a definição da nomenclatura e definições em relação ao gerenciamento de crises

utilizadas nesta dissertação foram adotadas as classificações feitas por MITROFF (2000);

IRVINE (1996); GASCHEN (2003); SUSSKING e FIELD (1997); WAKEFIELD (1999);

NEVES (2002); MELO (2004); ROSA (2001); VIANA (2001); OLIVEIRA (1996); BIRCH

(1993).

Os autores VANOYE e GALIOT-ÉTÉ (1994); AUMONT (1997) e JULLIER e MARIE

(2009) foram pesquisados a fim de se estabelecer parâmetros para a análise fílmica. Assim,

para os dois pilares desta pesquisa buscou-se estabelecer parâmetros de denominações,

definições sobre comunicação, gerenciamento de crises, cinema, representação e

midiatização. Embora, como já citado, haja pouca referência em relação à interligação das

duas áreas.

Os pesquisadores DELEUZE (1992); KELLNER (2001); RUBIM (1992); SODRÉ (2002);

MOSCOVIVI (2003); WEBER (1993); CUNHA (2012); SCHVARZMAN (2008); BOURDIEU

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(1997) também foram retratados por este estudo para embasar os conceitos de

midiatização, história do cinema e representação.

Considera-se esse estudo como pesquisa de investigação documental e de fundo

analítico, uma vez que, para se descrever o processo de gerenciamento de crises,

representação, midiatização, história do cinema foi realizado um levantamento de

documentos e registros sobre o tema por pesquisadores da área. E, para realizar o estudo

fílmico, foram utilizados estudos anteriores sobre análise fílmica e processos de

representação, espetacularização, no cinema americano a partir da década de 1990.

Quanto aos fins tem-se que a pesquisa é do tipo descritiva e analítica, uma vez que

foram retratadas as características do fenômeno abordado, por meio de estudos prévios

sobre o tema. Nesse estudo, por meio de metodologia de análise comparativa, foram

observados e avaliados os pontos de vista dos estudiosos sobre o tema

contingência/gerenciamento de crises de imagem institucionais e a representação do

gerenciamento de crises de imagem no cinema, mais especificamente em “Obrigado por

fumar”.

Em relação aos meios de investigação, foi utilizada a análise fílmica sobre o tema

central da pesquisa que é o gerenciamento de crises de imagem e sua representação e

midiatização pelo cinema americano desde a década de 1990.

Neste estudo, pretende-se elucidar como o cinema americano pode ser representativo

quando retrata a midiatização de determinada ação ou fato. Busca-se analisar, nos três

capítulos que fazem parte deste trabalho, a representação midiatizada pelo cinema

americano do gerenciamento de crise de imagem.

No primeiro capítulo, foi feita uma breve apresentação do estudo, em forma de

Introdução sobre o que se debruçava a pesquisa. Metodologia, objetivos e autores

estudados foram mencionados nesse primeiro capítulo, a fim de esboçar o que se pretendia

avaliar com o estudo fílmico propriamente dito.

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Já no segundo capítulo, foi abordado o papel do gerenciamento de crises e suas

características, nomenclaturas, diretrizes. Estudiosos da área foram pesquisados a fim de se

entender como eles categorizam, pressupõem, organizam e definem tais fenômenos. Falar

em gerenciamento de crises de imagem é, também, abordar alguns pontos de vista: como o

mundo corporativo as vê, como os estudiosos as entendem e classificam, como geralmente

acontecem e como tratá-las. Os desdobramentos também são importantes, quando se toca

neste assunto. Em especial, quando o tema é utilizado para alavancar recursos, valores,

ideias, marcas, produtos, que poderiam ser destruídos por este fenômeno.

No terceiro e último capítulo desse estudo, buscou-se tratar o tema representação

midiática do gerenciamento de crises de imagem tendo como instrumento de análise o

longa-metragem “Obrigado por fumar”. Utilizando-se o longa-metragem de 2005, do diretor

Jason Reitman, com Aaron Eckhart, Robert Duvall, Maria Bello, Kate Holmes entre outros,

foi possível fazer um paralelo sobre como o mercado e os estudiosos encaram o assunto,

bem como observar o processo de midiatização e representação que o cinema americano, a

partir da década de 1990, adotou. O filme analisado é um balizador dinâmico do que é

factual e do que pode ser um aspecto midiatizado do fenômeno gerenciamento de crises de

imagem. Enredo, personagens e narração são analisados a fim de se entender como esse

processo pode ser representado na grande tela do cinema.

Para traçar um paralelo entre o que ocorre em “Obrigado por Fumar” e outro exemplo

de filme com o mesmo tipo de temática, fez-se uma breve análise de “O Informante” – The

Insider – filme americano de 1999, gênero drama, dirigido por Michael Mann10. O roteiro é

10 Considerado um dos diretores mais inovadores e respeitados em atividade. O americano Michael

Mann possui um estilo bastante característico de filmar, muito focado no apuro visual e no tom documental. A maior parte de sua obra baseia-se no gênero policial e geralmente tem personagens obsessivos. Costuma operar ele próprio a câmera na fotografia de seus filmes e nos mais recentes optou pelo uso do formato digital. Informações do Site IMDB – acessado em 05.11.2013, endereço

eletrônico http://www.imdb.com/name/nm0000520/

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uma adaptação do artigo The Man Who Knew Too Much, de Marie Brenner. “O Informante”

tem Al Pacino e Russell Crowe como atores principais.

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CAPÍTULO – 2 – GERENCIAMENTO DE CRISES INSTITUCIONAIS

Se você é dono de uma pequena, média ou de uma grande empresa, se for um empregado ou um executivo de alto nível ou

um profissional liberal bem-sucedido, enfim, seja qual for a sua posição no mercado de trabalho, as crises de imagem podem

um dia atingir você. Direta ou indiretamente.

MÁRIO ROSA

2.1 Definição de Imagem, Valor de Marca e Crise

Para iniciar este estudo, torna-se imprescindível compreender o significado da palavra

crise e seu desdobramento dentro do contexto de gerenciamento de comunicação de crises

de imagem corporativa. É preciso também ter em mente o valor de uma marca, a fim de se

estabelecer o quão grave pode ser um arranhão em uma imagem corporativa.

A importância monetária das empresas corresponde não só a valor de seus bens

tangíveis, mas, principalmente, de seus ativos intangíveis, incluindo a construção de uma

imagem (é o que a empresa parece aos olhos de quem a vê) ou marca que leva anos para

ser consolidada no mercado. Desde o século XX, a marca representa alavancagem

econômica e impõe sua força nas negociações. As pessoas depositam enorme confiança e

fidelidade à marca, pois creem que os valores de empresa estão expressos nos seus

produtos / serviços.

Uma marca não representa só um nome, são promessas, são valores, são mensagens

que a empresa transmite ao cliente e que estes transmitem entre si. Terão mais sucesso,

aquelas marcas que cumprirem o que prometem ou que tenham sua imagem colada à sua

reputação (juízo de valor que a empresa sofre quando se compara a sua imagem a um

modelo ideal aos olhos de quem a vê). Não só as que criarem no consumidor o sonho, mas

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que permitirem realmente a sua vivência. De acordo com David Aaker (2002), o valor da

marca tem o mesmo impacto sobre os dividendos para os acionistas que os lucros.

Crise, grosso modo, pode ser caracterizada como uma situação grave em que os

acontecimentos da vida social rompem com os padrões tradicionais ou perturbam a

organização. Vários autores foram pesquisados na tentativa de se estabelecer um

parâmetro nesta pesquisa sobre o que realmente entendem determinar a palavra crise.

Mas então, num primeiro plano, o que os teóricos estudados entendem por crises

organizacionais? Ian Mitroff (2000) conceitua crise como sendo algo que não pode ser

completamente contido dentro das paredes de uma organização. Apesar desta definição

abrangente, é pertinente considerarmos que nem todos os problemas organizacionais se

caracterizam como crise.

De acordo com o estudioso Robert Irvine (1996), crise é uma palavra bastante ampla e

pode ser, em termos de administração empresarial, uma ruptura que estimula uma grande

cobertura por parte da mídia/imprensa. Segundo Irvine (1996), “o resultado do exame

minucioso feito pelo público afetará as operações normais da organização podendo ter um

impacto político, legal, financeiro ou governamental nos negócios” (IRVINE, 1996, p. 45).

Por outro lado, Mateus Furlanetto Oliveira (1996), ao citar Lerbinger, diz que crise é

“um evento que traz ou tem potencial para trazer à organização uma futura ruptura em sua

lucratividade, seu crescimento e, possivelmente, sua própria existência".

Aprofundando um pouco mais o estudo sobre o que a palavra crise representa, John

Birch (1993) distingue crise de problema. Segundo este autor,

a crise é um evento imprevisível que, potencialmente, provoca prejuízos significativos a uma organização ou empresa e, logicamente, a seus empregados, produtos, condições financeiras, serviços e à sua reputação. (BIRCH,1993 p.10)

Page 22: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

22

Um outro significado para a palavra crise existe, segundo Mário Rosa (2001), E vai

além da ideia de previsibilidade ou não. Segundo Rosa, as crises de imagem são as que

configuram maiores problemas e são as mais difíceis de serem debeladas. O conceito de

crise, neste caso, se estende para aquelas chamadas crises de imagem, que constituem um

conjunto de eventos que podem atingir o patrimônio mais importante de qualquer entidade

ou personalidade que mantenha laços estreitos com o público: a credibilidade, a confiança, a

reputação. Como mencionado no início deste capítulo, a imagem e, consequentemente, a

reputação de uma empresa tem valores monetários associados maiores do que os seus

bens tangíveis, ainda mais para aquelas companhias que tenham ações em bolsas e suas

atuações em âmbito internacional.

Por outro ângulo, Roberto de Castro Neves (2002) define crise empresarial como uma

situação que surge quando algo feito ou não pela organização afeta, afetou ou poderá afetar

interesses de públicos relacionados à empresa. Ainda segundo este autor, caracteriza crise

os acontecimentos que tenham repercussão negativa junto à opinião pública. Ao contrário

das crises empresarias que fazem parte da rotina da empresa, as crises com a opinião

pública extrapolam os muros da organização. Desta forma, Neves (2002) corrobora com

Rosa (2001), ao frisar que estas são as verdadeiras crises. Mais uma vez outro autor afirma

que as crises de imagem são as mais temidas e perigosas para uma organização.

O ICM (2009) refere-se às crises organizacionais como uma perturbação significativa

na organização que provoca uma extensa cobertura da mídia. O escrutínio público sobre o

ocorrido pode afetar as operações normais da organização e, também, ter um impacto

político, jurídico, financeiro e governamental sobre o negócio. Configura-se, mais uma vez,

uma situação de crise de imagem que afeta a reputação empresarial.

É, a partir desta evolução contextual que se compreendem os diversos conceitos da

palavra crise, como sendo "toda e qualquer ação interna ou externa que pode impactar

direta ou indiretamente a harmonia ou os interesses de uma organização com os seus

públicos" (MELO, 2004, p. 4). Corroborando com essa discussão, Melo (2004) define que

Page 23: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

23

uma crise de imagem se constitui em um conjunto de eventos que podem atingir o

patrimônio mais importante de qualquer entidade ou personalidade: a credibilidade, a

confiabilidade e a reputação. Melo é mais um autor que defende a ideia de que a imagem e

a reputação são os bens mais preciosos de uma companhia quando o assunto é crise. É

preciso ter cuidado ao gerenciar tais eventos considerados crises, para que não haja mais

impactos negativos sobre estes pilares tão importantes às empresas.

As crises organizacionais, como vistos por intermédio dos conceitos dos autores até

aqui estudados, configuram-se como importantes eventos que extrapolam as paredes da

organização e que provocam impactos junto aos públicos podendo trazer prejuízos para a

corporação como um todo e provocando uma ampla cobertura midiática. Por outro ângulo,

Dan P. Millar e Robert L. Heath (2004) avaliam que as crises devem ser definidas como

eventos previsíveis, mas sem hora para acontecer e que tem reais ou potenciais

consequências para os interesses dos públicos, assim como para a reputação da

organização que passa por esse momento. Vista por esta avaliação, a crise de imagem

somente consolida-se se tanto a reputação quanto os interesses dos diversos públicos

ligados à organização forem afetados.

Francisco Viana (2001) também destaca a existência do elemento surpresa quando se

fala em crise. Segundo sua argumentação, o elemento surpresa ainda é o ponto crítico na

eclosão de uma crise. Para Viana (2001), neste momento, a competência da comunicação

organizacional será medida.

Em situações de crises as ações de comunicação precisam demonstrar coerência entre

o discurso e a prática. Além disso, a ética deve ser o balizador dos trabalhos de

comunicação ou da empresa ao lidar com os diversos públicos envolvidos. Viana (2001)

corrobora com esta ideia ao dizer que: “a diretriz básica para vencer as crises encontra-se

no teor do relacionamento que foi consolidado antes dos momentos de dificuldades”.

(VIANA, 2001, p. 384)

Page 24: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

24

Já o autor Paul Argenti (2006) acredita que crise deve ser conceituada como uma

catástrofe séria que pode ocorrer como resultado ou erro humano. Este autor faz uma das

conceituações mais amplas sobre crise. Para ele, crise deve ser encarada como intervenção

ou mesmo intenção criminosa. Argenti frisa que as consequências de uma crise empresarial

são mensuradas pela devastação que causam. Para este autor, esta devastação é tangível,

como vidas, e, também, intangível, como a perda de credibilidade ou outros danos à

reputação.

Mais do que discorrer sobre os diferentes conceitos para a palavra crise, faz-se

oportuno perceber, a partir dos significados propostos pelos diversos autores, a evolução

dessa terminologia ao longo do tempo. Há pouco tempo, a sociedade vivia em guetos de

classe, cultura, religião e, até mesmo, territórios. A cobertura da imprensa também era

bastante regionalizada, o que permitia que um fato ocorrido em uma determinada área não

fosse de conhecimento em outras partes do mundo e, até mesmo, do país. Mas, a partir do

processo de globalização, houve uma grande mudança nestes parâmetros.

A partir do processo de globalização e, consequentemente, da evolução da

comunicação, a palavra crise ganhou nova conotação. A globalização tornou o mundo

pequeno do ponto de vista do acesso à informação. Não existe mais fronteiras para o

acesso ao conhecimento, à informação. O mundo do conhecimento, da informação, da

globalização provocou transformações significativas e fez surgir uma nova cultura

empresarial. Atualmente, as empresas podem até continuar agindo e trabalhando em termos

locais, mas seu alcance e penetração tem aspectos globais que afetam o relacionamento

com fornecedores, clientes, governo, imprensa, empregados e comunidade.

O estudioso Waltemir Melo (2004) acredita que nunca no mundo se produziu tanta

informação de caráter público como na atualidade. O mundo tornou-se, literalmente, plano

do ponto de vista do acesso à informação. "Hoje, a notícia pode chegar ao público, inclusive

como pauta para os veículos, de qualquer local a qualquer hora. A tecnologia ampliou a

vulnerabilidade das organizações e da própria sociedade." (MELO, 2004, p. 3)

Page 25: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

25

A transformação ocorrida na mídia, a partir da introdução da tecnologia em suas rotinas

produtivas, cobre fatos e acontecimentos em tempo real e âmbito global. Esta transformação

também mudou a forma de trabalho no âmbito empresarial. A mídia com características de

instantaneidade, simultaneidade e globalidade, também transforma os modos de visibilidade

dos fatos no mundo.

A mídia, em situações de crise, transforma-se em palco da legitimação. Permite tanto a

fluência de discursos quanto de posições críticas e de protestos. A mídia condicionada a

interesses de mercado impõe suas regras quanto a captura e seleção de assuntos ou

ângulos de abordagem dos fatos a partir de crenças e pressupostos compartilhados pelos

produtores da notícia. Assim, a escolha de temas ou focos considerados relevantes

obedecem a orientações prévias da empresa jornalística, de tal sorte que os produtores

consideram o que será interessante e bem aceito por seus públicos. Há quase uma

homogeneização do que é informação, de qual a melhor imagem, melhor ângulo.

E, sobre este ponto o sociólogo francês Pierre Bourdieu (1997), em estudo sobre as

características da televisão, alerta para um problema oriundo da cultura midiática em geral.

Esta, com suas tendências homogeneizantes e de banalização voltadas para a esfera do

dramático e da espetacularização, retira da audiência a capacidade de propor, de forma

autônoma o que quer ver e ouvir sobre os fatos. Dessa forma, a mídia detém o poder de

fabricar o gosto, impondo padrões de comportamentos e de agendamento de assuntos da

atualidade.

A mídia passa a ser responsável, desta forma, pelos processos de interação social,

principalmente pelo seu poder de influência a partir de seus meios e mensagens. A

cobertura da mídia em situações de crise dá ênfase a discursos e imagens com forte apelo

psicológico, transformando a vida de pessoas comuns em espetáculo e formas de

entretenimento. Percebe-se que em sociedades na qual impera a cultura da mídia, até

Page 26: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

26

mesmo as narrativas produzidas sobre uma crise, têm como objetivo principal a satisfação

dos espectadores ou receptores.

Pode-se compreender que, a partir da transformação do papel da mídia na sociedade

de consumo, a comunicação organizacional necessita adaptar-se a esta configuração e

articular mídias tradicionais e novas mídias. Esta articulação parece destinada a

transcodificar, segundo o termo de Douglas Kellner (2001), discursos da política dominante

da mídia massiva, buscando fazer eclodir vozes de outros atores e de outros meios de

comunicação.

É plausível aferir, a partir de todos estes conceitos, que as empresas podem ser

afetadas por crises e sofrerem graves consequências. Desestruturação de suas operações,

diminuição de suas vendas e lucros, intervenções do governo, geração de despesas

operacionais, desmotivação dos empregados e queda da moral da equipe, obrigação de

pagamento de indenizações, diminuição da capacidade competitiva da empresa são

algumas destas possíveis consequências. Enfim, prejuízos à organização de diversos

modos e que não podem ser mensurados de forma generalizada. Tudo isso, terá reflexo na

percepção dos stakeholders11 sobre a empresa e, consequentemente, abalará sua imagem,

por conseguinte sua reputação e a credibilidade de sua marca no mercado. É, basicamente,

uma cascata de acontecimentos, que se bem gerenciados ou pré-concebidos, podem ser

amenizados.

11 Público estratégico. São os acionistas, clientes, fornecedores, colaboradores, parceiros, bancos,

instituições financeiras, órgãos reguladores, comunidades, enfim todos os públicos ligados direta ou indiretamente a empresa. Site Business Dictionary, acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico

http://www.businessdictionary.com/definition/stakeholder.html

Page 27: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

27

2.2 Perdas e Ganhos em uma Crise Empresarial

A ocorrência de crises de imagem tem marcado presença na história de muitas

organizações mundo a fora. A literatura consultada sobre o assunto é unânime em dizer que

normalmente as organizações não estão preparadas para enfrentar tais ocasiões, ou ainda,

denunciam que há aqueles gestores crédulos de que tal descontrole nunca se sucederá em

suas empresas. Para falar sobre os problemas a serem enfrentados por uma organização no

momento de uma crise de imagem com a opinião pública, é preciso, de antemão, mostrar as

consequências que tal evento pode acarretar.

Fica a pergunta: o que uma empresa tem a perder? Por que se afirma ser tão

importante ter um Plano de Gerenciamento de Crises (PGC)12 elaborado com antecedência?

Há algum ganho em uma crise de imagem? Como tirar vantagem em uma crise de

imagem/reputação?

Experiências deixam claro que, ao viver uma crise de imagem, as organizações podem

sofrer graves consequências. Perder clientes, apresentar queda no faturamento, ser

forçadas a demitir empregados, perder market share13, receber multas altíssimas, ter de

fechar suas portas, perder a credibilidade dentre várias outras perdas que levam tempo para

serem recuperadas são algumas destas repercussões atribuídas às crises. Mas, muito mais

do que isso, qualquer experiência de crise com a opinião pública significa um grande

prejuízo para a reputação corporativa.

12 Plano de Gerenciamento de Crise – PGC – segundo Rosa (2004, p. 71), sob a ótica da comunicação, é um conjunto de medidas, posturas e consensos capazes de fazer com que o sucesso de uma ação no lugar onde ocorreu uma situação adversa possa ser captado como tal. 13 Quantifica, em porcentagem, a quantidade do mercado dominado por uma empresa. Divide-se o

número total de unidades que a empresa vendeu pelo total de unidades vendidas no segmento em que a empresa atua. O valor pode ser obtido ainda da divisão do valor total em vendas da empresa pelo valor total em vendas do segmento. Site Business Dictionary, acessado em 05.11.2013, endereço

eletrônico http://www.businessdictionary.com/definition/market-share.html

Page 28: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

28

A despeito das grandes crises de imagem, pode-se afirmar que elas são capazes de

incinerar uma reputação não em questões de anos, nem em questão de meses, mas em

apenas alguns poucos dias. A principal diferença é que uma crise de imagem tem o poder

de destruir o patrimônio de uma organização, até mesmo de um líder, colocando em xeque a

capacidade dos outros de acreditarem nela, em sua confiança. Vale ressaltar que crises de

imagem têm sempre um ponto em comum: o sucesso, uma imagem pública reconhecida,

uma reputação.

Rosa (2001) acredita que uma crise atinge aqueles que têm muito a perder, aqueles

que alcançam o sucesso ou o destaque em seu mundo particular, em seu segmento, em sua

profissão ou atividade. O autor sugere analisar qualquer caso recente para perceber que o

protocolo é quase sempre o mesmo: uma empresa de grande visibilidade, um empresário de

sucesso, um cirurgião bem-sucedido, um magistrado respeitado, um político em ascensão,

uma construtora exuberante – são vencedores como esses que acabam triturados pelos

processos de crise. Em qualquer nível em que esse sucesso se expresse.

É preciso reafirmar que uma boa imagem/reputação corporativa junto aos seus

diferentes públicos representa ganhos, também financeiros, para a empresa. As

organizações deveriam entender que uma imagem ou identidade inapropriada, ultrapassada

ou arranhada por meio de uma crise, pode ser tão danosa quanto uma performance

financeira fraca. Aaker (2002) é categórico ao afirmar que a imagem, muitas vezes, é mais

valiosa do que a performance financeira ou tão importante quanto esta para a empresa.

Não precisar trabalhar para recuperar ou defender uma reputação corporativa é o ideal.

Defender uma reputação, às vezes, é tarefa essencial e entender como e quando fazê-lo é

imperativo para uma administração bem-sucedida da identidade corporativa. Existem

inúmeras pesquisas sobre como a comunicação e o marketing podem contribuir de forma

significativa para o fortalecimento da interação entre empresa e seus consumidores ou

stakeholders e os trazer para mais perto do que sejam seus reais valores, objetivos e metas.

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Desta forma, a atuação da área de Comunicação e Marketing, em uma empresa, passa

a visar os consumidores por meio de seus corações, mentes e espíritos. E isso, pode ser

cruzado, em uma matriz, com a Missão, Visão e Valores de uma organização e transformar

um momento de crise em um momento de ganho. Segundo Philip Kotler (2010), sempre há

uma história atrás de uma boa missão de Marketing e esta pode alavancar a empresa,

mesmo em momentos de crise.

Portanto, difundir a missão junto aos consumidores envolve uma história que emociona as pessoas. Uma ideia incomum embutida em uma missão teria de ser adotada pelo mercado mainstream14 para causar impacto significativo. Em outras palavras, a concretização da visão requer a participação do consumidor. Assim, o empowerment15 do consumidor é fundamental. (KOTLER, 2010, p. 60)

O ICM, ao analisar a cobertura da mídia no ano de 2008, mostra a ocorrência de

10.386 casos de crises organizacionais que estamparam as manchetes da imprensa dos

EUA. Outra questão apontada pelo relatório é o fato de que os executivos e gestores são

responsáveis por mais da metade de todas as crises, enquanto aos funcionários é creditado

31%, e às forças externas os restantes 18%.

Embora esses dados façam referência à realidade americana, quando observada a

realidade brasileira as estatísticas não são diferentes. E, quando se fala sobre crises

institucionais a situação mais comum é presenciarmos práticas reativas, nas quais os

desafios a serem superados serão muito maiores. Um exemplo desta situação foi a crise

14 Termo inglês que designa o pensamento ou gosto corrente da maioria da população. O termo inclui tudo que diz respeito a cultura popular e é disseminado principalmente pelos meios de comunicação em massa. Muitas vezes é também usado como termo pejorativo para algo que "está na moda". O contrário do mainstream seria chamado de Underground ou o que não está ao alcance do grande

público, sendo restrito a cenas locais ou públicos restritos. Illustrated Oxford Dictionary, 200, p. 493 15 Parte da ideia de dar às pessoas o poder, a liberdade e a informação que lhes permitem tomar decisões e participar ativamente da organização. Illustrated Oxford Dictionary, 200, p. 267

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enfrentada pela TAM16 com a queda do Fokker 100 em 1996. Tanto no caso da TAM,

quanto no da GOL17, para ficarmos somente no campo da aviação civil, percebe-se que tão

importante quanto o próprio planejamento estratégico da organização, é, também, o plano

para a gestão de crises.

Pode-se observar que as definições sobre crises acompanharam e aprimoraram-se de

acordo com as diversas crises já ocorridas nas organizações, como: a adulteração do

medicamento Tylenol18, em 1982, o vazamento de óleo da Exxon Valdez19, em 1989, ou o

caso das pílulas anticoncepcionais de farinha da Schering20, em 1998, entre vários outros

exemplos.

16

No final de 1996, um avião da TAM caiu logo depois da decolagem sobre um bairro próximo do

aeroporto de Congonhas, em São Paulo, com 99 pessoas abordo. Naquela época, a empresa não possuía um plano de gestão de crise bem estruturado, o então presidente da companhia, Comandante Rolim Amaro, precisou retornar de uma viagem para encabeçar a tomada de decisões. Informações do site www.g1.com, acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico

http://g1.globo.com/Noticias/SaoPaulo/0,,AA1331514-5605-676,00.html

17

Em 26.09.2006, um avião da Companhia GOL colidiu em pleno voo com um Jato Legacy, caindo na

altura da Serra do Cachimbo, em Mato Grosso. 154 pessoas morreram. Na ocasião, a empresa já tinha um Plano de Gerenciamento de Crises e o porta-voz foi o seu presidente, Constantino de Oliveira Junior. A prioridade foi o atendimento aos familiares das vítimas. Informações do site www.uol.com.br,

acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico http://noticias.uol.com.br/album/2013/09/28/relembre-o-

acidente-com-aviao-da-gol-que-completa-7-anos.htm#fotoNav=3

18 Em 1982, um indivíduo colocou cianeto em vários comprimidos do produto Tylenol, da Johnson &

Johnson, ocasionando a morte de sete pessoas. Na época, o produto tinha 40% de market share e em alguns dias as suas vendas caíram cerca de 90%. A Johnson & Johnson quando gerenciou a crise não tinha um plano estabelecido. Informações do site www.nytimes.com, acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico http://www.nytimes.com/2002/03/23/your-money/23iht-mjj_ed3_.html 19 Em 24.03.1989, o navio de petróleo Exxon Valdez (atualmente chamado Dong Fang Ocean) lançou

cerca de 257 mil barris do petróleo que transportava no mar, na Costa do Alasca. Houve um grande desastre ambiental. De acordo com estimativas, morreram 250 mil pássaros marinhos, cerca de 3 mil lontras, 250 águias e 22 orcas, além da perda de bilhões de ovos de salmão. Foi o segundo maior derramamento de petróleo da história dos Estados unidos. Na época, o navio pertencia à ExxonMobil. Informações do site www.ig.com.br, acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico http://ultimosegundo.ig.com.br/ciencia/meioambiente/vazamento+do+exxon+valdez+faz+21+anos/n1237587272742.html

20 Em 1998, o anticoncepcional Microvlar, em decorrência de teste na fabricação teve seu material

trocado por uma máquina embaladora, usando-se farinha e não o medicamento. Essas pílulas acabaram chegando ao mercado e foram consumidas. Algumas mulheres engravidaram por não

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2.3 Tipos de Crises Empresariais

Catalogar as várias possibilidades de crise corporativa, de acordo com a literatura, é

um trabalho árduo. Existem vários autores que tratam o assunto, mas cada um deles

defende linhas que, às vezes, se contrapõem. Crises de Imagem, crises institucionais, crises

de governança corporativa, crises financeiras. São várias as ocorrências de crises que

podem afetar uma instituição.

Para Robert Wakefield (1999), existem dois tipos fundamentais de estudos sobre crises

que afetam o mundo corporativo: as naturais e as administrativas. Outros autores, como é o

caso de Irvine (1996), classificam as crises empresarias de acordo com a natureza do fato

em si. Existe, ainda, pesquisadores que buscam nos stakeholders a base da diferenciação,

como é o caso de Neves (2002), que tem nos diferentes públicos a referência de sua

classificação dos tipos de crise. Segundo Neves (2002), as crises podem ser classificadas

em cinco dimensões de públicos com os quais as empresas atuam: com consumidores,

clientes e usuários; com o público interno; com investidores; com a comunidade e crises

relacionadas ao poder público.

De acordo com a classificação das cinco crises de Neves (2002), elas se

desmembrariam da seguinte forma:

1. Crises com consumidores, clientes e usuários − relacionadas a produtos

fabricados, comercializados ou a serviço prestado. As mais comuns têm como

fatos geradores: produtos/serviços; violações contratuais; violações à lei de

defesa do consumidor; problemas de relacionamento com tais públicos (na

maioria dos casos o que impacta é a qualidade de atendimento).

estarem devidamente protegidas. Informações do site www.portal-rp.com.br, acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico http://www.portal-rp.com.br/bibliotecavirtual/relacoespublicas/administracaodecrises/0120.htm

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2. Crises com o público interno – relacionadas, de forma geral, aos interesses

dos empregados e de seus familiares/dependentes. Grande parte das vezes, os

empregados são vítimas, mas também podem ser agentes de crises, como: em

acidentes de trabalho; em demissões em massa; em violações da legislação

trabalhista; nos casos de discriminação; em assédios de qualquer natureza,

sendo o assedio sexual o mais comum; nos casos de violação de direitos

humanos; em casos de morte ou afastamento inesperado de altos executivos;

em escândalos de qualquer natureza (crimes de colarinho branco, fraudes

internas, envolvimento em corrupção etc).

3. Crises com investidores − relacionadas aos interesses dos acionistas da

instituição. Geralmente estes interesses estão associados ao valor da ação e à

remuneração do investimento (dividendos) dos investidores. São comuns nestes

casos de crise: resultado abaixo da expectativa; fusões e aquisições; tomada

hostil de controle; problemas de relacionamento com esses públicos, como

brigas de poder; perda de clientes; perdas patrimoniais significativas por roubo,

furto, desapropriação, má administração, fraudes, perda de ações judiciais,

multas e indenizações; fraudes contábeis; morte ou saída inesperada de altos

executivos; envolvimento da empresa em corrupção, crimes do colarinho branco,

sonegação fiscal, crimes ambientais; solicitação de concordatas ou pedidos de

falência.

4. Crises com a comunidade − relacionadas aos interesses de comunidades

específicas (aquelas ligadas fisicamente à empresa) ou da comunidade em

geral. Os problemas mais comuns deste tipo de crise são: relacionados ao meio

ambiente (vazamentos, destruição da camada de ozônio, contaminações,

tratamento inadequado do lixo, poluição sonora e visual, desmatamentos, desvio

de rios, alagamentos, aterros, caça e pesca predadoras, agressão ao patrimônio

histórico); conflitos com a comunidade/segmentos (mídia, minorias, mulheres,

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33

religiões, nacionais/etnias, partidos políticos, comunidades geográficas,

comunidades acadêmicas e científicas, sindicatos e ONGs).

5. Crises relacionadas ao poder público − relacionadas com a ordem jurídica

e, também, institucional. São comuns neste tipo de crise: violação de leis e de

regulamentos, posturas municipais que podem comprometer/impedir o trabalho

da empresa (legislação fiscal, lei de defesa do consumidor, leis ambientais,

corrupção, crimes de colarinho branco, concorrência desleal, publicidade

abusiva, encerramentos de operações, fechamento de fábricas, descontinuação

de serviços ou de produtos).

Seguindo o exemplo de Neves (2002), Lerbinger apud Oliveira (1996) também faz um

estudo aprofundado sobre as crises empresariais. Mas, para este autor, as crises se dividem

em sete tipos diferentes, dentro de três categorias. As categorias são exemplificadas por

Lerbinger apud Oliveira (1996) como: crises do mundo físico; crises de clima humano e

crises de falha administrativa. Estas categorias se desdobram em sete, quais sejam:

1 - Crises do mundo físico

▪ Crises naturais – Aceitas como uma fatalidade. Como, por exemplo, furacão,

tornado, terremoto, inundações etc.

▪ Crises tecnológicas – Causadas pelo homem, pois são resultado da manipulação

dos recursos. Os avanços tecnológicos são bastante controversos e causam muitas

discussões, já que podem representar riscos que não existiam, como as usinas

nucleares, os implantes de silicone etc. Um exame de custo-benefício é necessário

neste tipo de atuação. Geralmente, as empresas são consideradas culpadas neste

tipo de crise.

2 - Crises de clima humano

▪ Crises de confronto – Envolvem a atuação de grupos civis, organizações não

governamentais, movimentos ambientalistas e de consumidores, enfim, grupos

Page 34: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

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organizados que se reúnem para lutar pelos interesses que defendem. Estes grupos,

grosso modo, aproveitam as oportunidades de espaço na imprensa para se

promoverem.

▪ Crises de malevolência – Grupos, indivíduos e, até mesmo, concorrentes usam de

atividades ilícitas ou de pura maldade para causar danos à imagem de uma empresa.

Terrorismo, atentado, falsificação, boatos, mentiras e rumores são alguns tipos de

ataques nesse tipo de crise.

▪ Crises de distorção de valores administrativos – Neste caso de crise, a empresa

se preocupa com o interesse de um de seus públicos em detrimento dos demais.

Muitas vezes este tipo de crise ocorre por um posicionamento da própria empresa. A

administração satisfaz a vontade de um dos públicos, causa grande insatisfação a

outro e, com isso, gera uma crise interna que pode ganhar repercussão externa.

3 - Crises de falha administrativa

▪ Crises de decepção – Ocorre quando há uma diferença entre o produto ou serviço

anunciado e a realidade do mesmo produto ou serviço.

▪ Crises de má administração – Caracterizadas pelos atos ilegais ou imorais

cometidos pelos administradores da empresa e estes tem seus nomes envolvidos em

fraudes, subornos, roubos etc.

Além de todas estas definições de crises e como elas se dão, existe mais um bastante

comum: os fatos corriqueiros que acontecem diariamente no ambiente empresarial. São

eles, muitas vezes de pequena ou nenhuma importância, os causadores de tais crises. Não

se costuma dar importância a pequenas intercorrências que afetam a vida da empresa, mas

não a paralisam ou prejudicam seu processos. Mas, ao não darem importância a estes

pequenos soluços administrativos, as organizações muitas vezes deixam suas crises se

proliferarem e crescerem sob seus pés.

Irvine (1996) define as crises empresariais em duas categorias: Repentina e Latente.

São exemplos de crises Repentinas a explosão de uma fábrica, a contaminação em

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35

produtos alimentícios etc. Elas representam 35% das crises empresariais. No caso das

crises Latentes, há uma configuração interna na empresa que as propiciam. Elas são

gestadas e tem data de início previamente conhecida pela própria gestão da empresa.

Grande parte das ocorrências destas crises se dá pela atuação empresa e seus líderes.

Representam 65% das crises institucionais.

De acordo com Neves (2002), 90% das causas que vão gerar as crises empresariais

no futuro são de conhecimento da própria gestão e configuram crises latentes. O autor

argumenta que os fatos geradores de tais crises já existem dentro das empresas e são

conhecidas ou estão em processo de gestação e crescimento. Somente os outros 10% das

causas das futuras crises, que configuram as repentinas, não há como prever.

Ainda de acordo com o pesquisador, metade de suas causas de crises latentes é

conhecida pelo corpo gerencial. Neves (2002) afirma que tais causas não são tratadas por

inércia, medo ou conveniência. Ainda segundo este autor, a outra metade das crises

latentes não é notada pelo corpo gerencial. Neves (2002) assegura que nesta segunda

possibilidade de crises latentes, que configuram a metade das ocorrências, cerca 90% de

suas causas poderia ser descoberta se a empresa usasse processos de investigação sobre

gerenciamento de crises. Isso significa que se houver planejamento e vontade empresarial,

a empresa pode administrar 85% das possibilidades de crises empresariais.

2.4 Classificação das Crises Empresariais

Explanar sobre o gerenciamento de crise institucional demanda mais do que uma breve

pesquisa. É preciso saber distinguir as classes nas quais elas estão subdivididas, ter noção

de administração empresarial ou governança corporativa, ter noção de planos de

contingência. As classificações de crises ajudam a ter uma noção de como evitá-las ou

contorná-las.

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36

Vários autores configuram as fases das crises como agudas, crônicas e de

recuperação. Na fase aguda, a crise é caracterizada pela pressão dos veículos de

comunicação e de espetacularização21 da informação. Esta fase oscila entre horas e

semanas. Tudo depende da repercussão que a mídia lhe confere. Na fase crônica, a

empresa enfrenta consequências jurídicas, administrativas e, mesmo, corporativas

provocadas pelo conflito. Já na fase de recuperação, a empresa consegue restabelecer seu

equilíbrio e dar continuidade a seus processos de produção/serviço.

Para Rosa (2001), há uma analogia que facilita a definição dos estágios de uma crise.

Segundo ele, a Teoria da Vidraça é perfeita para ter uma noção do que uma crise

empresarial pode revelar. Arranhão, pedrada, estilhaço, conserto, normalidade e referência

são os seis patamares desta analogia. Rosa (2001) acredita que uma crise pode apenas

arranhar uma imagem de uma empresa forte e reconhecida por seus públicos por sua

postura/reputação.

Por outro lado, o autor afirma que algo bombástico, que se assemelharia a uma

pedrada, pode configurar uma crise sem precedentes a uma instituição. Este tipo de estágio

de crise chama a atenção de um grande público e causa interesse sobre o assunto. Na

etapa do estilhaço, o barulho atribuído à crise é seguido por um grande ruído e leva o

público a ter noção do ocorrido. Em seguida a esta etapa, a empresa normalmente começa

sua recuperação. Neste momento, configura-se a etapa do conserto, que nada mais é do

que um grande empenho por parte da liderança da empresa a fim de recobrar sua imagem.

No estágio da normalidade, a empresa assume uma postura de sobrevida e toma a

experiência da crise como uma herança, embora desgastante, útil para que os fatores que a

fizeram acontecer não se repitam e não causem futuros abalos à imagem corporativa. Já no

estágio de referência, a organização, depois de algum tempo transcorrida a crise, não deixa

21 Transformar algo rotineiro em espetáculo, show. Superdimensionar a informação com o intuito de

atrair, reter o espectador/leitor. Informações do site www.observatoriodaimprensa.com.br, acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/as_raizes_da_espetacularizacao_da_noticia

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37

de lembrá-la. Tendo o fato como histórico, a imagem da organização ou de quem foi atingido

por ele sempre será lembrada. Apenas o tempo, o trabalho de recuperação e a ausência de

novos erros farão com que esqueçam o ocorrido.

Diante desse panorama traçado tanto por Rosa (2001) quanto por Neves (2002), Irvine

(1996) e demais autores sobre o tema gerenciamento de crises de imagem, observa-se a

necessidade básica de todas as empresas desenvolverem um PCG e possuírem

profissionais qualificados e treinados para o colocarem em prática, caso seja necessário.

Depender apenas do talento individual de um profissional é um risco que não merece ser

corrido. Para a atualidade, ter processos de administração de crise é uma responsabilidade

social e, também, uma política de proteção financeira e sustentabilidade.

Nos EUA, o assunto é tão sério que não dispor de um planejamento de gerenciamento

de crise é considerado crime. Esse tipo de iniciativa ocorre porque crises de imagem

acontecem rotineiramente. Julgá-las distante, que só abate alguns poucos empresários e/ou

empresas, pode até parecer correto, mas não deve ser frequente. Os noticiários diários de

rádios, tevês e jornais revelam com uma frequência cada vez maior que pessoas e

organizações estão passando por situações de crise com a opinião pública.

Com ou sem precisão, Rosa (2003) e alguns dos estudiosos apontados neste estudo

acreditam que é possível prever os desdobramentos de uma crise e fazer um planejamento

para situações extremas. Foi essa a lógica que começou a definir os contornos do

gerenciamento de crise: as crises têm um padrão. Alicerçado sobre este ponto de vista,

Rosa (2003) argumenta que é possível se antecipar aos desdobramentos de uma possível

ameaça.

Se existe um padrão, logo há determinados impasses e dilemas que se repetem de uma forma regular e, consequentemente, o melhor momento para encontrar as formas mais adequadas de lidar com essas dificuldades é antes que elas eclodam. (ROSA, 2003, p. 70)

Page 38: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

38

De acordo com tudo o que foi explanado até aqui, há um consenso, nesse sentido, de

que o melhor caminho para o gerenciamento das crises de imagem empresariais é a

prevenção. Adotar atitudes preventivas não significa anular tais eventos, mas mapear as

dificuldades que poderão surgir e definir os melhores e mais adequados caminhos e

soluções a serem tomadas. "Resumindo: hora de crise é hora de reagir – e não de planejar."

(ROSA, 2003, p. 70)

Por meio de um diagnóstico organizacional, Irvine (1996) fundamenta uma questão

importante e que merece reflexão em relação ao gerenciamento de crises. De acordo com o

autor, este diagnóstico possibilitou uma análise que qualifica a maioria destas situações

como previsíveis e, portanto, evitáveis. Aquelas que não podem ser evitadas, segundo ele,

podem ser minimizadas. Irvine (1996) sugere ainda, apoiado em tal diagnóstico, que graves

problemas empresariais não se transformam em crises até que o público descubra via

imprensa e que quanto mais demoradas as crises, maiores os danos sobre as vendas,

ganhos, preços e posição competitiva da organização. Segundo ele, a recusa da

administração em admitir a realidade é o maior obstáculo para o efetivo gerenciamento de

uma crise.

A crise não deve, entretanto, ser vista apenas como momentos de prejuízos. No interior

de toda crise, pode estar presente uma grande oportunidade. Melo (2004), vislumbrando

esse ponto positivo de uma crise, acrescenta que uma crise bem gerenciada pode e deve

trazer significativas vantagens para a empresa como difundir os propósitos sociais e

empresariais como a missão e visão; disseminar valores e mensagens institucionais;

alcançar o comprometimento e conquistar a adesão verdadeira dos públicos envolvidos.

Melo (2004) argumenta também que, durante uma crise, é possível aprimorar o

relacionamento com os stakeholders, já que será preciso se aproximar deles durante e,

principalmente, depois do ocorrido para reconquistar a confiança e alcançar a sinergia entre

áreas e pessoas da empresa, uma vez elas se unem para se solidarizar com a empresa. "O

importante é ter em mente que a crise apresenta enorme possibilidade de desgaste, mas

oferece oportunidade para a demonstração cabal de competência." (ROSA, 2003, p. 176)

Page 39: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

39

Preparo, esta é a palavra de ordem em uma situação de crise. Não basta à empresa

possuir um PGC e não saber colocá-lo em prática ou, por outro lado, estabelecer processos

burocráticos na tomada de decisões durante o processo de crise. Melo (2004) lembra que

muitas empresas apresentam uma enorme dificuldade na tomada de decisões porque não

estão preparadas e treinadas. Em momentos como este, as possibilidades de escolha são

muito amplas, o que atrasa a tomada de decisões. Em crises, as ações devem ser

assertivas e rápidas. Para piorar a situação, Melo (2004) enfatiza que, quando tomadas sob

pressão, as escolhas em sua maioria são feitas de forma incorreta.

Variados são os posicionamentos de articulação e comunicação possíveis a serem

tomados por uma empresa no momento de uma crise. Mas, para que esses

posicionamentos sejam realmente os mais adequados, a empresa deverá tê-los

experimentado e ter ciência dos resultados obtidos com cada uma das propostas de

posicionamentos em um PCG.

Wilcox apud Sandra Klinke (2000) apresenta uma lista de estratégias de comunicação

que podem variar em três aspectos, mas que bem gerenciadas podem trazer grandes

benefícios para as empresas que as utilizam. Segundo a autora, as estratégias dividem-se

em ações de duração, ações defensivas (ataque ao acusador, negação, desculpa,

justificativa) e as ações de acomodação (agrado, ação corretiva, pedido completo de

desculpas).

Wilcox apud Klinke (2000) defende que o uso de estratégias de comunicação

ancoradas por uma proposta de acomodação ou de defesa pode ser útil e efetivo

dependendo da natureza da crise que está afetando a organização. Elas não se propõem a

toda e qualquer situação de crise de imagem. Ainda de acordo com Wilcox apud Klinke

(2000), estratégias de comunicação que sugerem a acomodação dão ênfase ao reparo da

imagem. Este tipo de estratégia é necessário quando os danos à imagem pioram. No caso

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40

do uso das estratégias defensivas, como negar ou minimizar o fato, elas se tornam menos

efetivas quando a organização é vista como responsável pela crise.

Para Wilcox apud Klinke (2000), a postura defensiva se caracteriza por quatro

posicionamentos básicos: atacar o acusador, negar, dar uma desculpa e justificar. Nas três

formas de posicionamento existem uma série de artifícios que as empresas utilizam. Ao

atacar o acusador, para minimizar uma crise, a empresa usa artifícios que confrontam a

lógica e contestam fatos. Ao negar a existência de um fato gerador de crise, a própria

empresa se coloca numa situação de confronto com a realidade aprontada.

E na terceira forma de posicionamento, conforme estudo de Wilcox apud Klinke (2000),

ao dar uma desculpa a organização diminui sua responsabilidade pela crise. Qualquer

intenção em se provocar o dano é negada e a organização afirma que não teve controle

sobre os acontecimentos. Tal estratégia é normalmente utilizada quando há um desastre

natural ou falha mecânica. Na última forma de estratégia, de acordo com a autora, ao

justificar minimiza-se a crise com uma declaração de que não houve danos ou ferimentos.

Algumas vezes, a culpa é transferida para as vítimas. Isso, frequentemente, ocorre quando

há mau uso do produto pelo consumidor ou acidente industrial.

Já a postura de acomodação, de acordo com a autora, é caracterizada pelos seguintes

posicionamentos: agradar, tomar ações corretivas e pedir desculpas por completo. No

primeiro caso, ao tentar agradar as ações são tomadas para acalmar o público envolvido. Os

consumidores que reclamam recebem cupons ou a organização faz uma doação para uma

entidade beneficente. Ao tomar ações corretivas as empresas, na maioria das vezes,

articulam algumas etapas e as seguem para se reparar o dano causado pela crise e se

prevenirem em relação à uma possível repetição do fato. No terceiro tipo de posicionamento,

a empresa ao pedir desculpas por completo assume toda a responsabilidade. Algumas

recompensas em dinheiro ou em assistência são normalmente incluídas neste processo.

Pesquisas anteriores indicam que as organizações que usaram estratégias de acomodação

tiveram mais sucesso do que aqueles que preferiram as defensivas.

Page 41: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

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Em seu estudo Klinke (2001), revela que as estratégias relatadas por Wilcox podem ser

úteis para analisar como a maioria das empresas lidaram com as crises. A autora explica

que grande parte das empresas afetadas por uma crise de imagem utilizam suas

experiências para criar novas guidelines22, o que também ajuda outras instituições a

evitarem os mesmos erros.

2.5 A escolha do porta-voz

A partir de todas estas constatações, é conveniente frisar que a construção de um PGC

varia de autor para autor. Existe, entretanto, vários elementos que se assemelham em todas

as propostas de criação de um planejamento dessa modalidade. Uma compilação dos

diversos autores estudados para este trabalho identificou os pontos em comum elucidados

sobre a construção de um PGC. Segundo os estudiosos do gerenciamento de crises de

imagem, um PGC deve conter, pelo menos, os seguintes elementos: avaliação das crises

mais prováveis; o comando das situações de crise e comitê da crise; a doutrina da crise; a

base de dados; identificação dos stakeholders e processos de comunicação e, por último,

mas não menos importante a definição do porta-voz. Não cabe a esse estudo avaliar cada

um destes elementos, mas sim entender como age ou deveria agir, o porta-voz em uma

situação de crises.

Deve-se pensar que a organização leva anos para a consolidação de sua imagem,

marca e reputação. Nas horas de crise é extremamente importante saber proteger tal

patrimônio. Uma vez que ele pode ruir em segundos e, até mesmo por descuido. E proteger

tais ativos passa pela escolha de um porta-voz bem preparado. A escolha do porta-voz pé

tão importante quanto a escolha dos procedimentos que deverão ser adotados e seguidos.

22 Guidelines ou diretriz é uma declaração usada para se determinar um curso de ação. A orientação tem como objetivo agilizar os processos específicos de acordo com uma rotina definida ou uma prática. Por definição, seguir a orientação nunca é obrigatório. Illustrated Oxford Dictionary, 2000 p.362

Page 42: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

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De acordo com Rosa (2003), há sete princípios básicos para o porta-voz. Estes

princípios, segundo o autor, têm sido chamados de Doutrina Ui. Um bom porta-voz: não fala

em tese (Não faz especulações. O porta-voz comenta fatos); não pode mentir; não pode

permitir privilégios (Suas falas são necessariamente públicas e, por isso mesmo, o conteúdo

deve ser igualmente acessível para todos); deve ter vocação ou ser treinado para

desempenhar a função (Deve ter o dom de transmitir suas mensagens sem ruído e com

conteúdo em cada fala); precisa ter credibilidade e respaldo da voz que ele porta, seja uma

empresa, uma instituição ou um líder; precisa ter domínio técnico e informação em

profundidade para esclarecer determinadas questões, especialmente as mais técnicas e,

finalmente, não pode perder o equilíbrio (Por ser a face de uma organização, sua imagem

não lhe pertence. Qualquer exagero – sinais de ironia, desprezo, irritabilidade, mal humor,

rancor, impaciência – será necessariamente associado a voz que ele representa).

Rosa (2003) faz uma observação importante a respeito das empresas que optam por

indicar advogados para o papel do porta-voz no momento da crise. Ele acredita que essa

providência pode ser adequada, pois a responsabilidade fica nas mãos de um profissional

teoricamente frio e racional, porém, ele destaca que são poucos os profissionais no Brasil

com treinamentos adequados principalmente para as entrevistas na TV. Como há falha

neste quesito, os porta-vozes não treinados em suas aparições televisivas, inúmeras vezes

fazem “declarações juridicamente perfeitas, mas herméticas ou inadequadas do ponto de

vista da comunicação em massa, resultando em prejuízo para a imagem da empresa"

(ROSA, 2003, p. 147). Muito autores defendem a tese de que, dependendo da gravidade do

problema, é o presidente que tem que vir a público explicar a situação, como ocorreu nos

dois exemplos citados das companhias aéreas brasileiras.

Rosa (2002) apresenta as três regras que devem nortear a atuação de um profissional

nessa situação de porta-voz de uma empresa. Estas três regras foram criadas por Larry

Speakes, porta-voz da Casa Branca no governo de Ronald Reagan. São elas: diga tudo o

que puder, o mais rápido possível (O importante é tomar a iniciativa em casos que envolvem

a opinião pública. O vácuo da informação abre espaço para especulações e

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43

desinformação.); fale com uma única voz, sendo absolutamente fundamental a unificação

do discurso (As menores diferenças entre diferentes porta-vozes adquirem distorções

desproporcionais); nada substitui a honestidade (Mentiras ou tentativas de minimizar

costumam induzir a uma caçada a fatos ou dados que destruam a versão oficial. Isso

significa que, por pior que seja a informação a se dar, torná-la pública o quanto antes

desmonta, na origem, pesquisas controversas).

Um porta-voz não fala apenas por meio das palavras. O representante institucional

também transmite a mensagem pelo tom de sua fala, das pausas e respiração. Mais do que

isso sua expressão, roupa, olhar e estado de espírito; tudo isso tem significados importantes

e também refletem a imagem da empresa que defendem publicamente. Elementar arma da

comunicação, principalmente em situações de crise, a mensagem verbal ou não-verbal deve

ser tratada minuciosamente em casos de gerenciamento de crises de imagem. É preciso

levar em conta dois pontos principais: aquilo que você fala e aquele que você quer alcançar,

ou seja, o público.

2.6 Planejamento ou Sorte?

“Na crise, a sorte conta pouco; o preparo, muito”, adverte Rosa (2001). Uma crise não

necessita de um fato. Pode se iniciar com um simples boato e causar danos irreversíveis à

instituições, pessoas, localidades e até países. No primeiro estágio da crise, geralmente,

acontece uma tentativa de simplificação. No segundo estágio, ocorre o exagero. No terceiro,

a opinião pública interpreta o ocorrido de acordo com seus valores e visão de mundo. Se até

esse momento não se gerenciou a crise, os efeitos podem ser incontroláveis.

Gilles Deleuze (1992) pondera que estamos em plena crise generalizada de todos os

meios de confinamento e que se estabelece uma nova ordem mundial de relacionamentos,

confinamentos. É preciso atentar-se para tais mudanças e redesenhar atitudes, visões,

modus operandi, em especial, os organizacionais.

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Encontramo-nos numa crise generalizada de todos os meios de confinamento, prisão, hospital, fábrica, escola, família. A família é um “interior” em crise como qualquer outro interior, escolar, profissional etc... Reformar a escola, reformar a indústria, o hospital, o exército, a prisão; mas todos sabem que essas instituições estão condenadas, num prazo mais ou menos longo. Trata-se apenas de ocupar as pessoas, até a instalação das novas forças que se anunciam. (DELEUZE, 1992, p. 56)

Sabe-se que na atualidade, a ocorrência de uma crise rapidamente ganha projeção em

escala mundial principalmente por meio das tecnologias da comunicação e da informação.

Tecnologias, essas, que segundo Muniz Sodré (2002) transformam a sociedade atual e

apontam para uma virtualização da vida. Até alguns anos atrás o conhecimento sobre a

ocorrência de acidentes ou crises limitavam-se ao âmbito de determinada comunidade, ou

seja, para tomar conhecimento sobre a sucessão de algum fato era necessário compartilhar

do mesmo território geográfico.

Neste contexto, passa a mídia a ser responsável pelos processos de interação social.

O seu poder simbólico de influência exercido pela mídia a partir de seus meios e mensagens

reforça uma potencial crise. A cobertura da mídia em situações de crise pode ser crucial,

uma vez que esta prioriza discursos e imagens com forte apelo psicológico, transformando a

vida de pessoas em espetáculo e, até mesmo, em entretenimento. Nas sociedades nas

quais a cultura da mídia é dominante, as narrativas produzidas sobre uma crise têm como

objetivo principal a satisfação dos receptores ou, simplesmente, a audiência. Os fatos em si

são relegados a um segundo plano da cobertura.

Pode-se compreender que, a partir da transformação do papel da mídia na sociedade

de consumo, a comunicação organizacional necessita adaptar-se a essa configuração e

articular mídias tradicionais e novas mídias. Essa articulação parece destinada a

transcodificar, segundo o termo de Douglas Kellner (2001), discursos da política dominante

da mídia massiva, buscando fazer eclodir vozes de outros atores e de outros meios de

comunicação. A busca de espaços em uma sociedade pluralista e democrática reflete-se em

um diferente posicionamento da organização frente às crises, já que hoje a mesma tem a

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45

possibilidade de comunicar-se com seus públicos por meio de ações comunicativas em que

deixam de ser anunciantes para se tornarem produtoras de conteúdo informativo.

As organizações tornam-se mídias, transformando-se em seus próprios veículos de

comunicação direcionados aos públicos de interesse, quando inseridas em um ambiente

marcado pela convergência tecnológica, globalização, fragmentação e interações mais

fluidas. De patrocinadoras de eventos, as instituições passam a ser o próprio evento. Da

mesma forma que a mídia, enquanto organização, também articula suas diversas

ferramentas tecnológicas, inaugurando uma nova forma de estar no mundo e de se

relacionar com os outros, uma tecnocultura conforme os dizeres de Sodré (2002) na qual ou

sob a qual as relações humanas tendem a ser mais virtuais.

Em termos de vantagens trazidas pelo advento da tecnologia, é possível manter uma

gestão telemática23 das crises. Utilizando os artifícios da rede, as organizações podem

disponibilizar informações sobre o desenvolvimento dos acontecimentos em escala mundial

e, assim, estabelece-se uma capacidade de distribuir informação de forma imediata, concisa

e direcionada aos públicos de interesse. Sem contar o alcance global.

Presencia-se no gerenciamento de crises de imagem uma imediaticidade e uma

urgência. A cobertura midiática dos fatos, cada vez mais ampla e dinâmica, articula diversos

atores e ferramentas. É premissa da mídia ocupar-se da apuração do inusitado, do diferente,

do conflito. Desta forma, as crises organizacionais imediatamente ganham espaço nas

pautas midiáticas. São, em geral, fatos que fogem ao controle, ao dinamismo real dos

acontecimentos, à simetria do cotidiano. Depoimentos contraditórios, a busca por culpados,

a espetacularização do ocorrido, boatos, fatos antigos que são suscitados na busca por uma

23 Telemática é o conjunto de tecnologias de transmissão de dados resultante da junção entre os

recursos das telecomunicações (telefonia, satélite, cabo, fibras ópticas etc.) e da informática (computadores, periféricos, softwares e sistemas de redes), que possibilitou o processamento, a compressão, o armazenamento e a comunicação de grandes quantidades de dados (nos formatos texto, imagem e som), em curto prazo de tempo, entre usuários localizados em qualquer ponto do planeta. Informações do site www.uol.com.br – acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico

http://aulete.uol.com.br/nossoaulete/telem%C3%A1tica

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explicação sobre a crise recém deflagrada servem de alicerce para a construção midiática.

Forma-se um clima de apreensão, incerteza e comoção, no qual a sociedade demanda por

respostas e manifestações dos envolvidos. Torna-se o fato partícula a todos os sujeitos.

E, nesse contexto, em que o surgimento de novas mídias ampliam o fluxo de

informações, entende-se ser a própria mídia um público que demanda uma atenção

especial. O caráter amplificador dos fatos perante a opinião pública já é um ponto que torna

a mídia um dos principais articuladores do processo de publicização da crise. Da mesma

forma, outros públicos precisam ser acionados em épocas de crise, a fim de que os atributos

da empresa como produtos e valores para a sociedade sejam transformados em escudos na

preservação da imagem da instituição. Buscar aliados neste momento é crucial.

Articuladores sociais, representantes de classes, membros de institutos de pesquisa não

associados à empresa, mas que tenham força de opinião e que possam dar depoimentos

favoráveis à instituição são bem vindos neste momento. Muitas vezes, são eles que abrem

portas para que a empresa articule-se com seus públicos e consiga expressar o que,

realmente, está acontecendo.

De acordo com Rosa (2001), a administração de crise não é uma fórmula de ação. É

uma forma de pensar. O autor enfatiza que

embora o aspecto humano das crises seja preponderante na repercussão que atingem, parece mais abrangente colocar a crise de imagem sob outra perspectiva. A melhor definição é de que a crise de imagem constitui um conjunto de eventos que pode atingir o patrimônio mais importante de qualquer entidade ou personalidade que mantenha laços estreitos com o público: a credibilidade, a confiabilidade, a reputação. (ROSA, 2001, p. 38)

Outro efeito da globalização e da comunicação da era digital é a uniformização dos

padrões éticos e das expectativas e direitos dos consumidores. Não só o pensamento, mas

também a atuação e expectativas humanas tornaram-se planas. Além dos diversos órgãos

de defesa do consumidor, as milhares de Organizações Não-governamentais (ONGs) em

contato com seus parceiros no exterior também auxiliam na divulgação e na fiscalização das

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melhores práticas de atendimento aos consumidores. Um acidente ou uma prática não-ética

na filial de uma cidade longínqua no interior de qualquer estado brasileiro pode e

seguramente vai, se não for bem administrada, causar danos aos acionistas em Wall Street.

Haja vista as turbulências causadas pela quebra de empresas ou as falas de políticos sobre

pagamento ou não de dívidas.

2.7 Jornalistas

Seguindo por este mesmo caminho do poder de articulação da mídia, pode-se avaliar o

poder dos jornalistas. São eles que dão o tom, reforçam mensagens, apuram os fatos.

Dependendo do que for alavancado por um jornalista em uma determinada cobertura, o

restante dos veículos de comunicação podem e, muitas vezes o fazem, dar continuidade ou

mesmo seguir o mesmo ponto de vista e comprar a ideia da ocorrência de um determinado

fato. A distorção, por negligência ou não, pode comprometer de forma séria um processo de

gerenciamento de crises. A informação precisa ser discutida cada vez mais e não só

consumida.

Em 1994, um fato parou o Brasil: as denúncias de maus tratos a crianças na Escola de

Base, em São Paulo. Os proprietários forma acusados de abusos sexuais contra crianças de

quatro anos. E a mídia encabeçou uma verdadeira força-tarefa de acusações contra os

donos da instituição. Passados 35 anos, o repórter Valmir Salaro não hesita ao afirmar que o

Caso Escola Base foi o que mais marcou sua carreira. Em entrevista à jornalista Nathália

Carvalho (2013) para o site Observatório da Imprensa, Salaro conta que entrevistou as

pessoas que foram acusadas e elas negavam que tinham feito aquilo e realmente não o

tinham. “Até hoje, é uma história que me marcou e me marca muito. Sofri muito com isso.

Não tanto quanto eles, mas sofri”, argumenta o jornalista.

É uma ferida aberta, que no meu caso já virou cicatriz, mas que está presente. Quando tem esses debates, jornalistas e colegas que estão começando me procuram para falar justamente sobre esse tema. Tenho o dever de falar. Muitos colegas na redação

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48

lembram que o erro não foi só meu, mas sempre digo: “cometi um erro. Eu tenho o dever de assumir”. (SALARO, 2013)

Outro aspecto que merece destaque é que as notícias também geram dividendos para

as empresas de comunicação. E os ganhos não são apenas financeiros para estas

empresas. Crises empresariais significam investigação, furos jornalísticos e, muitas vezes,

destaque profissional. São, para o repórter, um trabalho mais instigante, longe da rotina

diária. De acordo com Rosa (2003), os jornalistas são movidos pela ambição, querem

crescer profissionalmente para ganhar mais e ter mais influência, como em qualquer outra

atividade.

A figura do jornalista enquanto mediador entre a realidade e os receptores é

extremamente importante para se entender os processos de gerenciamento de crise de

imagem/reputação. A seleção de uma entre várias realidades, com a finalidade de a

transformar em notícia, e a seleção dos fragmentos representativos da realidade são os

momentos nucleares desta mediação.

Ao procurar comunicar desde a melhor perspectiva, o jornalista vê-se obrigado a

selecionar, destacar e reordenar alguns aspectos. Isso ocorre muito em função da linha

editorial ou mesmo por pressão do tempo que se tem para apurar e formatar uma

informação. No caso da TV, o tempo é outro imperativo que dificulta a melhor articulação

dos fatos. A mediação pode assumir assim, em função de todas estas perspectivas,

contornos de manipulação. Não se pode, no entanto, ignorar que parte desta manipulação

nasce da necessidade de apresentar a informação com clareza, perceptibilidade e de forma

quase que instantânea. Não há muito tempo para se discutir a informação.

Independentemente das exigências da mediação, existe um conjunto de critérios de

seleção de acontecimentos. Os jornalistas são treinados para avaliar, de acordo com uma

escala de valores, o grau de possibilidade de um acontecimento se transformar em notícia.

Selecionar implica reconhecer que um caso é um acontecimento e não uma casual

sucessão de coisas. Se o homem morde o cachorro, a máxima jornalista de valor de notícia

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se estabelece. Assim, o que sai da normalidade, vira notícia. E quanto mais fora da média

ou do esperado diante das normas e condutas sociais um fato se estabelece, mais interesse

e comoção causa.

Desta forma, independentemente do papel do jornalista e das características do meio,

existe um conjunto de critérios de noticiabilidade. Este critério permite aplicar uma prática de

seleção estável, o que favorece a estandardização do processo produtivo. Esses critérios de

noticiabilidade assentam num conjunto de valores/notícia que atuam combinados e que

permitem distinguir o que é notícia do que é apenas acontecimento corriqueiro.

Neves (2002) apresenta alguns aspectos a serem levados em consideração para

melhor entender a relação empresa e mídia. De acordo com o autor, há naturalmente uma

competição entre os jornalistas pelo furo jornalístico, pela notícia. Dar a notícia na frente e

com exclusividade é a glória do repórter, sua obsessão. Outro ponto a ser levado em conta

quando se pensa no trabalho da mídia é o sentido de urgência da imprensa, que é diferente

do sentido de urgência empresarial.

Neves (2002) fala que há naturalmente um preconceito por parte dos jornalistas com a

atividade empresarial, partindo do princípio de que os empresários estão sempre

escondendo alguma coisa da opinião pública. E este costuma ser um dos principais pontos

de dificuldade na relação entre imprensa e líderes empresariais. Há sempre um receio por

parte dos líderes ao dar entrevistas do que virá de questionamento por parte dos jornalistas

ou até onde a relação é saudável. Outro grande paradigma a ser enfrentado é o de que

jornalistas não sabem a respeito de tudo, por isso, não conhecem todos os negócios e

atividades que estão cobrindo. A melhor hora de explicar o core business não é no momento

da crise, mas antes de ela acontecer, quando se tem tempo de conquistar a confiança dos

stakeholders.

Neves (2002) também frisa que, algumas vezes, jornalistas trocam números,

confundem milhões com bilhões. O melhor é falar com cuidado e checar a compreensão ao

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50

dar entrevistas, falar sobre números. Outra preocupação que deve nortear a relação com a

imprensa é compreender que, no negócio de comunicação, existem diferentes profissionais,

como repórteres, editores, subeditores, editores especializados, colunistas, fotógrafos,

âncoras, comentaristas, repórteres de rádio, donos de empresas. Compreender as

diferenças profissionais significa uma abordagem específica para cada um deles e,

consequentemente, uma comunicação eficaz. Outra preocupação apontada pelo autor é

sobre a imparcialidade da imprensa. Segundo ele, “a tese de que jornalista é isento é

ensinada nas faculdades de comunicação, mas, na prática, não é bem assim. Cada ser

humano tem suas próprias convicções”. (NEVES, 2002, p. 137)

Rosa (2003) também faz uma análise que identifica muitos dos códigos associados à

imagem dos jornalistas a partir de uma leitura cinematográfica do profissional, visando traçar

um perfil da profissão. Este perfil, de acordo com Rosa (2003) pode ser chamado de

arquétipo dos jornalistas. Fazendo, desta forma, uma analogia com os arquétipos

configurados por Carl Jung24.

Segundo Rosa (2003), o jornalista mais famoso do mundo é Clark Kent. O personagem

que encarnava o Super-homem à paisana, enviado a terra por seus pais, juntamente com

cristais com toda a história de seu planeta de origem, suas tradições e saber. Assim, se

informação é poder, toda a informação é superpoder. E esse é o primeiro componente de

Clark Kent, válido também para a mídia.

O Super-homem é alguém plenamente engajado na defesa dos interesses de sua comunidade, assim como se pretende o jornalismo, combatendo sem tréguas os vilões e os agentes do mal, assim como o jornalismo idealmente também de entende. (ROSA, 2003, p. 269)

24 Médico e pensador suíço, considerado o pai da psicologia analítica. Jung estudou o inconsciente humano e influenciou várias áreas do conhecimento com suas pesquisas. Informações do site www.uol.com.br – acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico http://educacao.uol.com.br/biografias/carl-gustav-

jung.jhtm

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51

Os jornalistas, assim como o Super-Homem, acreditam que exercem uma função de

caráter público e coletivo. Sentem-se no exercício de uma missão social, combatendo e

corrigindo vícios, distorções, ações contra o status quo. Rosa (2003) afirma, no entanto, que

ter um superpoder também tem um lado perigoso já que, em certas situações, pode ocorrer

uma falta de percepção da realidade, ou da intensidade desse poder, desconhecendo o

tamanho e, principalmente, as consequências de sua força.

É importante perceber como um viés destacado pela da imprensa pode provocar a

destruição de uma marca, de um líder ou de uma empresa. Os jornalistas, no entanto, atuam

numa faixa de poder tão especial que tendem a achar que o estrago que podem causar não

é tão devastador assim. O que importa, no fim do dia, é manter a ordem. Salvar o planeta.

2.8 Midiatização do Gerenciamento de Crises

A midiatização da questão do gerenciamento de crises institucional coloca uma lente

de aumento no que é lícito ou não fazer num momento tão singular. A representação desse

fenômeno o torna ainda mais singular. A maioria das empresas já trata o assunto de forma

séria. Mas, ainda existem organizações que não têm controle sobre sua imagem e, mesmo,

que não levam a sério a necessidade de se ter um bom gerenciamento de crise e se utilizam

de artimanhas da própria comunicação ou de seu processo para tentar obter benefícios.

Essa nova modalidade de comunicação, a chamada midiatização, iniciou-se no século

XIX, mas somente se expandiu no século XX, adquiriu características diferentes da

comunicação interpessoal. De acordo com Antônio Albino Canelas Rubim (1992), a

comunicação midiática estabelece uma nova ordem. Ainda, segundo Rubim (1992), no

mundo contemporâneo, há uma “revolução das comunicações”, que cria uma “nova

comunicação”, que é um ser todo poderoso, que “constitui e aproxima o mundo através da

imagem”. O autor frisa, ainda, que a “sociabilidade modifica-se eletronicamente”.

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Em lugar de se constituir como compartilhamento (tornar comum, portanto) através do intercâmbio de mensagens e dos lugares do falante e do ouvinte, como realiza a comunicação interpessoal, essa nova comunicação compartilha (torna comum) sem que configure nenhuma troca ou intercâmbio. As mensagens tornam-se públicas sem qualquer procedimento dialógico, apresentando-se como produtos completados. Os “lugares” do falante e do ouvinte também não são intercambiáveis no processo comunicativo mas, em sentido inverso, são aprisionados e fixados sócio-tecnologicamente. (RUBIM, 1992, p. 148)

O exercício das tradicionais funções de circulação de ideias e opiniões não satisfaz

totalmente a comunicação midiática. De mera intermediária, ela se transforma em meio de

produção de bens simbólicos, tornando-se o lugar no qual os discursos sociais são

reproduzidos, com formas, valores e simbologias próprias. Alimentada por aparatos

tecnológicos cada vez mais avançados, com estratégias de enunciação sofisticadas e de

caráter centralizador, a comunicação midiática parece tornar o ato de publicizar (tornar as

coisas públicas) um momento autônomo, segmentado da realidade social, com grande

poder de penetração e mobilização da sociedade.

A comunicação midiática deixa transparecer, de imediato, sua mutação fundante: de mera intermediária (como acontece sob a modalidade da comunicação dita interpessoal), a comunicação, agora conformada como mediática ou media, plasma-se como produção (e divulgação, é óbvio) de bens simbólicos; como “falante/fala” acerca da sociedade; como “intermediação” ativa, ou enfim, como fabricadora de intermediações, onde e quando os discursos sociais são reproduzidos, Ito é, produzidos novamente, na incorporação de suas regras e de seu olhar, e difundidos, agora fantasticamente, potencializados. (RUBIM, 1992, p. 148)

A comunicação midiática une lugares longínquos e temporalidades distintas, relativiza a

noção que temos de tempo e espaço. Os limites impostos pelo experiência vivida parecem

desaparecer com o desenvolvimento sociotecnológico das telecomunicações. “A

possibilidade de viver tempos e lugares distantes inscreve-se como marca emblemática da

contemporaneidade.” (RUBIM, 1992, p. 05)

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A instantaneidade propiciada pela comunicação midiática ultrapassa os espaços sócio-

geográficos. O transporte instantâneo e simultâneo da imagem, do som e de todos os signos

que compõem uma trama cinematográfica permitem, temporariamente, a integração

imaginária do homem com o mundo que o cerca. Essa mediação é entendida como um

mecanismo que permite estabelecer laços, vínculos entre atores e estruturas alheias da vida

de cada um, como intervenção deliberada num certo espaço vazio.

No passado, a comunicação, em conjunto e através da diversidade das instituições

sociais, solidariamente tornava as coisas públicas, transformando-as em comuns e

compartilhadas socialmente. Hoje, as imagens geradas pela media, mais do que nunca,

nutrem-se dos elementos que formam o imaginário coletivo. O domínio do imaginário e do

simbólico, portanto, torna-se uma importante estratégia para o exercício do poder, em

especial na dimensão pública da sociedade. E o acesso a esta dimensão pressupõe, de

certa forma, submeter-se ao caráter sociotecnológico da comunicação mediática e ter certa

intimidade com uma linguagem que se traduz essencialmente através da mídia.

... a dimensão pública aparece como espaço social habitado por imagens. Nela, os itens sociais só transitam com naturalidade sob a forma composta, por ser constituída simbolicamente de imagens e não como seres (primários) de carne, contradições e ossos. (RUBIM, 1992, p. 92)

Nenhuma relação social e nenhuma instituição política são possíveis sem que o

homem prolongue a existência de ambas por meio de imagens que tem de si próprio. Ao

produzir esse sistema de representações, que a um só tempo traduz e legitima a sua ordem,

a sociedade instala um controle, ao duplicar e reforçar no indivíduo laços identificatórios com

seu imaginário e universo simbólico.

O crescimento quantitativo da população, as mudanças qualitativas das necessidades

humanas, as alterações espaço-temporais decorrentes das modernas revoluções dos

transportes e das comunicações, bem como a produção de bens culturais realizam e

reafirmam o destaque da comunicação midiática nessa nova complexidade social. Agindo de

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acordo com o que lhes é mediatizado25, os grupos formarão mensagens ou, de modo mais

abrangente, em discursos sociais, pois um discurso sempre fundamenta outros.

A sociedade deve necessariamente buscar modos de colocar os media sob o seu controle, portanto, de submetê-los à atividade política, pensada enquanto modalidade de gestão da sociedade. A subordinação mediática e de seus poderes aos interesses da sociedade e por consequência sua democratização aparece como essencial para a existência e aprofundamento da democracia na contemporaneidade. (RUBIM, 1992, p. 78)

A institucionalização da comunicação midiática ocasiona, em termos sociotecnológicos,

o deslocamento e a fixação do emissor e do receptor do processo comunicativo, antes

momentos de intercambiáveis como pólos independentes e “petrificados”, subvertendo o

próprio conceito de comunicação transformada em processo unidimensional.

A compatibilidade de interesses entre política, sociedade e os sistemas de

comunicação é relativizada pela escolha, pela opção da mídia, enquanto empresa ou

enquanto linguagem. Há um ocultamento de dados relevantes à formação do senso crítico e

exaltação de outros, segundo interesses específicos. Os fatos parecem não ter causa nem

consequência na própria realidade da qual são extraídos. Os fatos são, assim, reordenados,

não permitindo uma delimitação do que seja causa ou consequência. A influência dos

massmedia26 é admitida sem discussão, na medida em que ajudam a estruturar a imagem

da realidade social, a organizar novos elementos, a formar crenças novas.

A partir da década de 80, os estudos realizados sobre os efeitos da mídia sobre o

público apontam para uma alteração. Deixam-se de observar as mudanças de atitudes e de

opinião, numa perspectiva de curto prazo, para se passar aos estudos de efeito a longo

25 Divulgar através dos meios de comunicação; disseminar ou divulgar; midiatizar. 26 O termo massmedia é formado pela palavra latina media (meios), plural medium (meio), e pela

palavra inglesa mass (massa). Em sentido literal, os massmedia seriam os meios de comunicação de

massa (TV, rádio, imprensa etc). Illustrated Oxford Dictionary, 2000 p. 503

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prazo, ou seja, a preocupação é com o processo pelo qual o indivíduo modifica sua própria

representação da realidade social. Os valores, comportamentos e opiniões dos destinatários

processos do processo comunicativo não são mais objeto principal dos estudos. A atenção

desvia-se para os efeitos nos sistemas de conhecimento do indivíduo, provocados, no caso,

pelas mensagens veiculadas, cotidianamente, nos meios de comunicação.

Esse redirecionamento de perspectivas no estudo da comunicação midiática se deve à

ascensão da sociologia do conhecimento, ciência que vê o valor dos processos simbólicos

como indispensáveis à sociabilidade. Falar de representações sociais implica

necessariamente falar de comunicação, pois é no processo comunicacional que as

representações sociais são geradas e expressas. Como mostra Serge Moscovici (2003),

uma condiciona a outra, porque nós não podemos comunicar sem que partilhemos determinadas representações e uma representação é compartilhada e entra na nossa herança social quando ela se torna um objeto de interesse e de comunicação. (MOSCOVICI, 2003 p.371)

Moscovici (1978) propõe a discussão sobre o papel da comunicação na formação das

representações sociais a partir de três enfoques: dos fenômenos cognitivos, da criação de

um universo consensual e dos fenômenos de influência e de pertença sociais. Em relação a

esse último, o teórico mostra a influência dos meios de comunicação de massa na formação

das representações sociais e sua relação com a conduta humana.

A percepção pública, de acordo com estudos de Moscovici (1978), é construída com

base nas informações transmitidas pela mídia. Estas informações, veiculadas sob as mais

diversas formas, são apropriadas e reconstruídas pelos indivíduos ou grupos. Dando, assim,

origem a condutas pertinentes aos sentidos atribuídos nessa reorganização.

A mídia tem o poder de construir determinada imagem na medida em que revela o

mundo ao público e intermedia a relação entre esse e os acontecimentos, diminuindo a

distância entre ambos (ou aumentando-a). Ela circunscreve campos simbólicos, desenha

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uma nova territorialidade, propaga ideologias. É preciso observar a existência de uma

mecânica complexa entre a comunicação e o feito. Essa “mecânica” seria a diversidade dos

efeitos, às vezes previsíveis e reguláveis e, às vezes, vagos. Há também a possibilidade de

que se opere o “efeito bumerangue”, quando o resultado obtido se mostra o oposto do

intencionado, como nos esclarece Weber (1993).

A mídia fabrica. O indivíduo é alvo e resultado. Ela revela o mundo, amplia horizontes, agencia uma multiplicidade de eventos atomizados, costura e adensa um conhecimento da realidade, distribuindo poderes e contrapoderes, norteando a governabilidade e a cidadania. (WEBER, 1993, p. 03)

Por outro lado, quem não utiliza ou não tem acesso às variadas fontes de informação,

tende a tomar como sua a versão fornecida pela mídia, conforme esclarece Weber (1993).

Não que a mídia invente os acontecimentos (se bem que também o faça), mas os detecta,

dramatiza, potencializa e produz. E, como em qualquer indústria, é necessário assegurar o

ritmo da produção, controlar a oferta e a demanda e manter uma boa reserva de matéria-

prima.

Por meio de uma exposição periódica, as mensagens veiculadas pela mídia, uma

imagem vai se formando na cabeça do espectador. As informações vão se acumulando e se

organizando enquanto a memória se encarrega de solidificar esse processo de formação de

conhecimento.

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CAPÍTULO – 3 – A REPRESENTAÇÃO DO GERENCIAMENTO DE CRISES DE IMAGEM EM “OBRIGADO POR FUMAR”

Este capítulo tem como objetivo fazer a análise fílmica do longa-metragem “Obrigado

por fumar”, sob a ótica da representação midiática do gerenciamento de crises de imagem

pelo cinema americano. O interesse é mostrar a representação midiática da cultura

organizacional e o que as organizações, de forma geral, costumam fazer para defender seus

interesses quando algum fato pode arranhar a forma como são vistas publicamente tendo

como ponto de vista o cinema americano, em especial as obras criadas a partir da década

de 1990. Procura-se, nessa dissertação, entender como o cinema americano, mais

especificamente o filme “Obrigado por fumar”, utiliza a relação de midiatização audiovisual e

os processos nos quais a cultura audiovisual se estabelece para retratar o gerenciamento de

crises de imagem e suas peculiaridades. Não pretende-se neste estudo estabelecer regras

ou questionar o que é certo ou errado fazer em momentos tão cruciais.

O longa-metragem “Obrigado por Fumar” (Thank you for smoking. REITMAN, J. &

BUCKLEY, C. Fox Seach Pictures. EUA. 2005. Cor. 92 min), filme de estreia de Jason

Reitman como diretor, baseado no livro de mesmo nome de 1994 de Christopher Buckley,

foi escolhido para embasar esta análise por suas peculiaridades no que diz respeito ao

processo de representação midiática do gerenciamento de crises de imagem. Busca-se,

neste capítulo investigar a representação e o processo de midiatização mais

especificamente a partir da década de 1990 em função das transformações que os estúdios

americanos sofreram naquela época.

Crise, obviamente, é um termo relativo. Como já foi estudado no capítulo anterior,

existem vários autores que estudam esse fenômeno e cada um deles defende pontos de

vista e argumentos para definirem o que seria uma crise organizacional. Para alguns

autores, um concorrente agressivo que se muda para as proximidades constitui uma crise.

Para outros, pode ser um escândalo, um indiciamento ou, no mínimo, uma inferência de

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alguma maldade que se torna pública antes que uma situação de crise pareça existir. Se ou

quando a má notícia chegar, seja uma insinuação desagradável, um boato, um artigo na

imprensa ou a história de um grande desastre, a resposta corporativa correta é e deveria

ser: qual é a extensão do dano, a curto e longo prazos, tanto para a companhia como para a

clientela. E como o cinema traduziu este tipo de fato para as telas?

De acordo com Paulo Roberto Ferreira da Cunha (2012), a relação entre o cinema e os

espectadores sofreu grandes transformações no século XX, advindas de fatores

econômicos, novas tecnologias e, também, de processos mercadológicos. Mais

profundamente, esta transformação se deveu ao novo tipo de relação que a sociedade

americana passou a ter com produtos midiáticos.

Cunha (2012) enfatiza que a indústria cinematográfica vivia um momento delicado,

após o fim do sistema de estúdios. Por volta da década de 80, havia, segundo o autor, um

movimento para buscar alternativas que garantissem mais espectadores e boas bilheterias.

Cunha conta que Mascarello, identifica tal movimentação como uma “reconfiguração de seu

estado de ser, ou ainda, como uma resposta ao novo cenário gerada, por exemplo, pela

televisão que se colocava como uma alternativa real de consumo midiático e pelo

crescimento do interesse pelo público mais jovem”. (MASCARELLO apud CUNHA, 2012, p.

55)

Pode-se dizer que existem perguntas e respostas para as diversas crises de imagem

institucionais e os fenômenos contemporâneos ligados ao universo propriamente fílmico,

como o fato fílmico, como questões narrativas, de gênero, de uso do espaço e de todo o

arcabouço técnico, poético e narrativo que compõem o cinema. Segundo Jacques Aumont

(1995),

... nos primeiros tempos de sua existência, o cinema não se destinava a se tornar maciçamente narrativo. Poderia ser apenas um instrumento de investigação científica, um instrumento de reportagem ou de documentário, um prolongamento da pintura e até um simples divertimento efêmero de feira. Fora concebido

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como um meio de registro, que não tinha a vocação de contar histórias por procedimentos específicos. (AUMONT, 1995, p. 89)

Assim, é possível trazer para o mundo corporativo uma análise fílmica e vice-versa. Em

“Obrigado por Fumar” o tema gerenciamento de crises de imagem é tratado de forma

caricatural, quase fora da realidade, mas por detrás da ironia é possível perceber a

importância do tema e como se preparar para sua abordagem no dia-a-dia empresarial. Por

esse ângulo, configura-se a representação feita pelo cinema.

Segundo Aumont (1995), o cinema promove a representação da representação, uma

vez que, à imagem figurativa em movimento, oferece uma outra imagem já reconhecida por

certo número de convenções.

A imagem de um revólver não é apenas o equivalente do termo “revólver”, mas veicula implicitamente um enunciado do tipo “eis um revólver” ou “isto é um revólver”, que deixa transparecer a ostentação e a vontade de fazer com que o objeto signifique algo além de sua simples representação.(...)Desse modo, qualquer figuração, qualquer representação chama a narração, mesmo embrionária, pelo peso do sistema social ao qual o representado pertence e por sua ostensão27. Para perceber isso, basta contemplar os primeiros retratos fotográficos, que instantaneamente se tornam, para nós, pequenas narrativas. (AUMONT, 1995, p. 90)

Em “Obrigado por Fumar” a missão da personagem principal é das mais ingratas: dar

a cara a tapa para defender o hábito de fumar, que é a fonte de riquezas para seus patrões

e, consequentemente, de onde vem o seu salário. Além de todas essas atribuições, cabe à

personagem a narração da trama. Esta pode-se dizer é a diegese28 que dá o tom à

narrativa.

27 Ato ou efeito de mostrar, de gabar-se acerca de seus próprios feitos ou de algo seu. 28 Conceito de narratologia, estudos literários, dramatúrgicos e de cinema que diz respeito à dimensão ficcional de uma narrativa. O tempo diegético, o espaço diegético são, assim, o tempo e o espaço que decorrem ou existem dentro da trama, com suas particularidades, limites e coerências determinadas pelo autor. No cinema e em outros produtos audiovisuais, diz-se que algo é diegético

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Para Aumont (1995), narrar consiste em relatar um evento real ou imaginário. Ainda

segundo o autor, pelo menos no plano de consumo, hoje em dia, predomina o cinema

narrativo. “No plano da produção, não se deve esquecer o lugar importante dos filmes nos

campos industrial, médico ou militar.” (AUMONT, 1995, p. 90)

Aumont (1995) ressalta ainda a importância da representação social feita pelo cinema,

quando esse é “concebido como o veículo das representações que uma sociedade dá de si

mesma”.

...o cinema tem capacidade para reproduzir sistemas de representação ou articulação sociais que foi possível dizer que ele substituía as grandes narrativas míticas. A tipologia de um personagem ou de uma série de personagens pode ser considerada representativa não apenas de um período do cinema como também um período da sociedade. (AUMONT, 1995, p. 98)

O primeiro longa-metragem de Reitman como diretor pode ser considerado um

sucesso de representação social/industrial. O filme arrecadou mais de 39 milhões de dólares

em todo o mundo e foi indicado a dois Prêmios Globo de Ouro (Golden Globe Awards)29.

Reitman é diretor, roteirista e ator canadense, responsável por alguns elogiados por público

e crítica: Obrigado por Fumar (2005), Juno (2007), Nova York eu te amo (2008), Amor sem

Escalas (2009), Jovens Adultos (2012) e Labor Day (2013). Reitman foi indicado quatro

quando ocorre dentro da ação narrativa ficcional do próprio filme. Informações do site www.uol.com.br, acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico http://aulete.uol.com.br/diegese

29 Prêmios entregues anualmente aos melhores profissionais do cinema e da televisão americana.

Estes prêmios são entregues desde 1944 nos estúdios 20th Century Fox, pela Associação de

Correspondentes de Hollywood. São uma das maiores honrarias que um ator ou atriz, diretores e

demais profissionais que trabalham na indústria cinematográfica e na TV pode receber. O Globo de

Ouro é entregue no começo de cada ano, baseando-se nos votos de 96 jornalistas que vivem em

Hollywood. Informações do site www.goldenglobes.org, acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico

http://www.goldenglobes.org/

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vezes ao Oscar30 até o momento por Juno e Amor sem Escalas (Melhor Diretor, Melhor

Filme, Melhor Diretor e Melhor Roteiro Original). Uma curiosidade sobre os bastidores de

“Obrigado por Fumar” é que, em face do sucesso com a crítica e o público, o filme foi

comprado pela Fox Searchlight por US$ 7 milhões, depois de uma disputa com a

Paramount, que perdeu os direitos sobre ele por não ter tido o cuidado de formalizar o

acordo verbal que havia feito com os produtores.

“Obrigado por Fumar” enquadra-se na definição de Aumont (1995) sobre filme de

ficção. De acordo com este autor, a representação fílmica é mais realista pela riqueza

perceptiva, pela ‘fidelidade’ dos detalhes do que os outros tipos de representação (pintura,

teatro). O autor argumenta, ainda, que qualquer filme é um espetáculo e apresenta sempre

um caráter um pouco fantástico de uma realidade que não poderia atingir seu espectador

em face da posição de isenção que esse assume diante dos dispositivos cinematográficos.

Enquanto filme, “Obrigado por Fumar” enquadra-se no que Laurent Jullier e Michel

Marie (2009) denominam filmes modernos dos anos 1960 em diante, que apresentam com

frequência heróis desorientados que não sabem o que fazer e vagueiam ao acaso sem

reagir diretamente ao seu ambiente por não ter objetivo na vida. Em “Obrigado por Fumar”

está claro o elemento de confrontação estabelecido por esses autores. Segundo Jullier e

Marie (2009), alguns cineastas adoram colocar o pingos nos “is”. Nesse filme, a ética e falta

de pudor sobre como tratar assuntos institucionais são confrontados em seu limite.

30 Prêmio entregue anualmente pela Academia Americana de Artes e Ciências Cinematográficas. A

Academia foi fundada em 1927. Seus prêmios são entregues em reconhecimento à excelência

profissional na indústria cinematográfica. São condecorados diretores, atores e roteiristas. A cerimônia

formal na qual os prêmios são entregues é uma das mais importantes do mundo. É também a mais

antiga cerimônia de premiação da mídia em todo o mundo. A primeira entrega de prêmios da

Academia aconteceu em 1929. Informações acessadas em 05.11.2013, endereço eletrônico

http://oscar.go.com/

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Eles (os cineastas) colocam o espectador diante da evidência, obrigam-no a olhar o que às vezes ele teria preferido deixar fora do seu campo de visão. Ele deve guardar em sua companhia tanto rostos em lágrimas como cabeças cortadas – dane-se o pudor, a intimidade e o não dito! (JULLIER e MARIE, 2009, p. 64)

A despeito do gênero, Jullier e Marie (2009) enfatizam que não existe nenhuma regra

para saber se um filme pertence a determinada categoria/classe ou outra. Segundo esses

autores,

o melhor é compará-lo a um protótipo, ou seja, a um filme do qual todo mundo concorde em dizer que constitui um modelo indiscutível do gênero e buscar em que medida o filme em questão se parece com ele. Toda regra é tão inconcebível quanto os gêneros são etiquetas de uso e não de essência, rótulos que flutuam ao sabor das épocas, dos países e das tribos de cinéfilos. (JULLIER e MARIE, 2009, p. 65)

Jullier e Marie (2009) também discorrem sobre o jogo que o cinema faz com o

espectador. Segundo eles, todos os filmes modelam um “espectador ideal”, que coopera no

máximo de suas possibilidades, que treme e que ri diante de boas passagens, sem jamais

se lamentar de ter comprado suas entradas. De acordo com esses autores, existem quatro

pequenos jogos de posicionamento nos quais o espectador é, literalmente, lançado: a

participação, a transgressão, a cumplicidade e a vertigem. Em “O brigado por fumar”, o

diretor utiliza claramente três desses jogos: a participação, a transgressão e a cumplicidade

para trazer o espectador para o mais próximo possível da trama.

Na participação ou identificação, de acordo com Jullier e Marie (2009), o espectador

participa da cena graças a sua capacidade mental de imaginar – de modo a poder agir em

consequência disso – o que as pessoas que ele olha sentem e em que elas pensam,

baseado no que ele próprio sente e pensa.

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O cinema bem-sucedido baseia-se neste princípio: o filme leva o espectador a se unir ao grupo, mas o coloca em uma posição de convidado, em que modelará as sensações e os pensamentos do outro sem ter de agir de verdade, nem se preocupar com a segurança do seu corpo real – um pouco como nos simuladores de vôo usados para treinamento dos pilotos. (JULLIER e MARIE, 2009, p. 68)

Na transgressão, o filme sacia o desejo de não fazer o que nos parece bom – mas

‘desfrutar livremente’- quando se está cansado da sociedade e das regras estabelecidas ‘por

causa dos outros’. “Obrigado por Fumar” representa a transgressão ao abordar um tema que

não é politicamente correto31, que não deveria estar na pauta do cinema.

“A cumplicidade varia segundo a competência do espectador”, definem Jullier e Marie

(2009). Em “Obrigado por fumar”, quando a personagem principal narra a história e, às

vezes, olha diretamente para a câmera chama para perto de si o espectador e o torna

cúmplice de suas artimanhas. “...a cumplicidade adquiriu importância nos últimos anos, e o

cinema pós-moderno faz grande uso de piscadelas cúmplices e de alusões explícitas”,

argumentam Jullier e Marie (2009, p. 70).

O filme de Jason Reitman pode ser dividido em três partes distintas. Na primeira, Nick

Naylor (Aaron Eckhart) é um contumaz defensor/porta-voz da indústria do tabaco e defende

seu posicionamento em função de suas despesas pessoais, em especial do pagamento da

hipoteca. A personagem surge como o anti-herói. É quase uma desconstrução do que

deveria ser o profissional real. Aliás, esta desconstrução inicia-se no título do filme e é

transportada para as cenas de abertura e letreiros/ficha técnica que traz os nomes do

elenco.

Na segunda parte da trama, a personagem se defronta com os próprios valores

(influenciado pela postura de seu filho pré-adolescente Joey Naylor – interpretado pelo ator

31 Refere-se a uma suposta política que consiste em tornar a linguagem neutra em termos de discriminação e evitar que possa ser ofensiva para certas pessoas ou grupos sociais, como a linguagem e ou imaginário racista ou sexista. Informações do site www.uol.com.br – acessado em 05.11.2013, endereço eletrônico http://aulete.uol.com.br/correto

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Cameron Bright). Neste momento da trama, Nick Naylor recua e até pensa em deixar o

posto de porta-voz da indústria do tabaco. A personagem passa por um verdadeiro encontro

consigo mesma e com todas as suas polaridades. É quase uma transformação pessoal

proporcionada por um elemento externo.

Num terceiro momento do longa-metragem, já no final da trama, Nick Naylor discorre

que existe uma linha tênue entre defender uma postura com ética, moral e de credibilidade,

mesmo que seja em defesa de um produto que pode ser tão prejudicial. Ele passa por um

verdadeiro momento de redenção. Se transforma, se redime dos próprios erros e continua

sua trajetória de uma forma mais suave, menos contraditória aos seus valores e nem tão

arrogante em relação a estabelecer um novo patamar de convivência.

Logo no início do filme, os créditos que o apresentam é possível perceber o tom

irônico e satírico que predominará durante todo o filme. Os nomes dos produtores, atores,

atrizes, elenco e responsáveis pela produção são apresentados em embalagens e maços de

cigarros, colocados em meio a frases que remetam à qualificação do fumo, comuns às

marcas famosas e mundialmente conhecidas de cigarros.

O longa-metragem é narrado em primeira pessoa pelo protagonista Nick Naylor, vice-

presidente/porta-voz/lobista da Academia Americana de Estudos sobre Tabaco. Empresa

criada pelos principais lobistas da indústria de cigarros no governo dos Estados Unidos para

dar embasamento científico às suas defesas em Washington.

O fato de Nick Naylor narrar o filme atribui ao filme um tom pessoal e permite que ele

próprio apresente suas impressões sobre os fatos, em especial sobre sua atuação e a

indústria que defende. Como dito anteriormente, esta é a diegese do longa-metragem de

Reitman. Tanto a atuação de Naylor quanto sua transformação em frente às câmeras dão ao

espectador a fundamentação da narrativa.

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65

De acordo com Francis Vanoye e Anne Galiot-Été (1994), esse tipo de narrador é

dotado de voz encarregada de acompanhar a história narrada.

É a ‘voz-eu’ de Miche Chion retomada por Christian Metz, qualificada pelo último de ‘justa-diegética’. O personagem é diegético, mas a voz, como voz, não é completamente, pois não se mostra o narrador no ato de contar. [...] Essa voz [...] permite que o personagem da diegeses dela saia ao mesmo tempo que nela permanece. (VANOYE e GALIOT-ÉTÉ, 1994, p. 47)

Ainda segundo esses estudiosos, entretanto,

em um filme, qualquer que seja seu projeto (descrever, distrair, criticar, denunciar, militar), a sociedade não é propriamente mostrada, é encenada. (...) Reflexo ou recusa, o filme constitui um ponto de vista sobre esse ou aquele aspecto do mundo que lhe é contemporâneo. Estrutura a representação da sociedade em espetáculo, em drama (no sentido geral do termo). (VANOYE e GALIOT-ÉTÉ, 1994, p. 56)

A primeira cena de “Obrigado por Fumar” acontece em um programa de auditório com

vários participantes. Como enfatizam Vanoye e Galiot-Été (1994), esta é uma cena que

representa o contemporâneo nesse longa-metragem, uma vez que os programas de

auditório são extremamente populares e comuns nas TVs em todo o mundo. O debate,

transmitido em rede nacional por uma das maiores emissoras de televisão dos EUA, tem

como tema central os malefícios do cigarro para a saúde humana. Entre os convidados a

participar desse encontro estão: três representantes de ONGs (Organizações Não-

governamentais) antitabagistas, um garoto de 15 anos que tem câncer no pulmão provocado

pelo uso de cigarros e o representante de um instituto de estudos sobre o fumo bancado

pelas empresas fabricantes de cigarros.

O último a ser apresentado ao espectador é, justamente, o representante dos

interesses da indústria tabagista. Mediante clara evidência de que ele era o único ali

presente que tentaria defender ou justificar a venda de cigarros no país, acabou sendo alvo

de uma grande vaia coletiva. Praticamente todos os espectadores externaram sua rejeição,

Page 66: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

66

enquanto amostragem da população, a péssima reputação do produto perante a maioria dos

habitantes do país. O que não impediu Nick Naylor de roubar, em seguida, literalmente, a

cena. Naylor no final da primeira sequência do filme sai como vitorioso de um debate de TV

no qual arriscou toda sua reputação e da indústria que representa.

Ao ser apresentado e vaiado pelos espectadores presentes no estúdio, Nick Naylor

olha diretamente para a câmera e é, neste momento, que se congela a imagem e ao fundo

ouve-se a voz deste personagem a dizer que aparentemente está em uma das mais

complicadas situações nas quais esteve envolvido e que, provavelmente, seria muito difícil

sair da mesma sem arranhões.

Nesse momento do filme, Nick Naylor reforça a teoria de Vanoye, segundo a qual, é

possível “que um personagem da diegese dela saia ao mesmo tempo que nela permanece”.

(VANOYE e GALIOT-ÉTÉ, 1994, p. 47) De acordo com VANOYE e GALIOT-ÉTÉ, “quando

um filme é narrativo, tudo nele se torna narrativo”. (VANOYE e GALIOT-ÉTÉ, 1994, p. 45)

Para Aumont, esse tipo de narrativa configura-se como “fictícia” ou aquela que é

interna à história e é explicitamente assumida por um ou vários personagens. “A narrativa é

atribuída, desde as primeiras imagens, ao herói que anuncia de imediato que vai nos contar

uma história na qual foi envolvido.” (AUMONT, 1995, p. 112)

O que se vê, a partir desse momento, é a reversão total das piores perspectivas do

lobista da indústria do fumo. Voltando à trama, ele consegue literalmente “virar o jogo” e sair

da emissora de televisão como o grande vencedor de um debate no qual, de antemão, já era

considerado perdedor. Não é para menos, uma vez que ao se apresentar, Nick Naylor

dispara e fala tal qual uma metralhadora. Ele se auto-intitula como persuasivo ao extremo

para alcançar seus objetivos.

Segundo Adilson Citelli (2002), persuadir não é sinônimo imediato de coerção ou

mentira. “Pode ser apenas a representação do desejo de se prescrever a adoção de alguns

Page 67: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

67

comportamentos, cujos resultados finais apresentam saldos socialmente positivos.”

(CITELLI, 2002, p. 67)

Nick Naylor embarca numa ofensiva manipulando informações e diminuindo os riscos

do uso do cigarro em programas de entrevistas de TV depois de ser desafiado pelos

vigilantes da saúde que querem banir o consumo de cigarros e por um senador oportunista

(William H. Macy), que deseja colocar rótulos de veneno nas embalagens de cigarros. A

partir deste momento, Nick busca alternativas na tentativa de salvar a indústria do tabaco.

Ele pensa numa alternativa de retomar o uso do cigarro no cinema, em especial nos filmes

que tenham um grande potencial de público e de midiatização. A personagem faz uma

estratégia de para dar visibilidade ao cigarro, buscando a ajuda de um agente de Hollywood

(Jeff Megall – Rob Lowe) para promover o fumo nos filmes. Os dois tramam um plano para

levar às produções mais caras do cinema cenas de atores com cigarros em punho a fim de

inserirem mensagens de cunho subliminar nos espectadores que lhes levariam ao desejo de

fumar. Os dois planejam cenas nas quais os atores mais cobiçados de Hollywood estejam

envolvidos e fumem após cenas de sexo, tendo como pano de fundo o universo.

Assim, pode-se dizer que o filme tem seus créditos ao deixar que o personagem

principal Nick Naylor trace verdadeiros labirintos para engendrar planos mirabolantes que

garantam à indústria do tabaco sua sobrevida aos ataques de diversos setores sociais.

3.1 O Cinema Midiatizou a Forma de Viver

Antes de prosseguir falando das crises e observando em detalhes sua representação

no filme “Obrigado por Fumar”, é preciso lançar luz sobre o pressuposto desta discussão:

afinal de contas, por que a crises de imagem fazem parte do nosso dia-a-dia? Por que

parecem tão inevitáveis? Efetivamente o são? E como estudar o gerenciamento de crises a

partir da ótica do cinema, em especial do cinema americano da década de 1990? Para tanto,

é preciso fazer um breve mergulho na história do cinema e como os filmes saíram das telas

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68

e alcançaram o nosso dia-a-dia e, ao contrário, como o cinema midiatizou a forma de viver,

de pensar, de agir do mundo corporativo, pessoal e social.

E, de acordo com Sheila Schvarzman (2008), somente nos idos de 1960 é que o

cinema foi alçado à categoria de “cultura”, quando entrou para a universidade. Antes disso,

segundo a autora, o cinema era visto somente como mero divertimento. Então, como

estudar os processos midiáticos que o cinema aborda numa relação tão peculiar quanto a

organizacional e o seu gerenciamento de imagem?

A própria pesquisadora revela ainda:

a absorção acadêmica do cinema tem relação também com as mudanças no âmbito da cultura: ocorrem no mesmo momento em que surgem os estudos sobre cultura popular, sobre os grupos sem voz como mulheres, negros etc. (SCHVARZMAN, 2008, p.15)

Desta forma, pode-se assegurar hoje em dia que o cinema consegue contrapor e,

mesmo, retratar a realidade e o faz com veracidade e com propriedade acadêmica e não só

meramente como arte ou entretenimento.

Pode-se afirmar, ainda, que ao definir a história do cinema são muitas as suas

vertentes ou possibilidades. O cinema, de acordo com Schvarzman (2008), é capaz de

realizar o filme, a atividade cinematográfica em si, a estética, a tecnologia, a economia ou os

aspectos sociológicos. Esses dois últimos são o alicerce do objeto de interesse desse

estudo.

A ideia do mundo como representação posta por Roger Chartier dá ao cinema e a toda atividade social a ele ligada, assim como sua projeção seja na concretude da economia, seja na imaginação, um papel fundamental como forma de conhecimento. (SCHVARZMAN, 2008, p. 16)

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69

A pesquisadora também afirma ainda que, a partir dessas diferentes abordagens, os

autores propõem o recorte dos estudos da história do cinema e do filme como documento

cultural. Nesse estudo, fez-se a análise do filme como possibilidade de abordagem

sociocultural e retratação de valores institucionais.

Desta forma, encontramos hoje trabalhos no âmbito da economia, da arquitetura, da frequentação, das salas de cinema, da crítica, da música, da análise da recepção, o papel do cinema na urbanização e na projeção da ideia do urbano na modernidade. (SCHVARZMAN, 2008, p. 16)

Voltando ao tema dessa análise, existem perguntas e respostas para as diversas

crises institucionais, pessoais e sociais e os fenômenos contemporâneos e em sua maioria

ligados ao universo propriamente fílmico, como o fato fílmico, como questões narrativas, de

gênero, de uso do espaço e de todo o arcabouço técnico, poético e narrativo que compõe o

cinema. Todos estes elementos do filme podem ser alvo de estudo sobre a abordagem

institucional do gerenciamento de crises e a sua transposição para as telas docinema.

Com historiadores e outros especialistas, o foco sai da tela para a sala, o espectador, as significações simbólicas do cinema, a frequentação e as práticas sociais. Isso agregou rigor aos estudos de cinema, ampliou o foco, e tornou mais ricas as abordagens. Ou seja, o cinema é um foco privilegiado de observação de algo que é mais ampliado – o cotidiano, a vida na fábrica ou na cidade. (SCHVARZMAN, 2008, p. 17)

Assim, é possível levar elementos ou problemas do mundo corporativo, pessoal e

social para uma análise fílmica e vice-versa. Como dito anteriormente, em “Obrigado por

Fumar”, o tema gerenciamento de crises é tratado de formar caricatural. Mas, em quase

todos os filmes de Jason Reitman os elementos fronteiriços podem ser encontrados. O

diretor, nesta trama, faz uso da ironia para mostrar a importância do tema e, também, para

alertar para o que pode acontecer tanto com instituições sejam elas pequenas, médias ou

grandes ou até mesmo com pessoas normais em seus dias mais corriqeiros.

Page 70: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

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Voltando à teoria de Deleuze (1992), é possível averiguar uma possível crise

generalizada de todos os meios de confinamento. O autor afirma que tal crise configura-se

numa nova ordem mundial de relacionamentos, confinamentos. Por este ponto de vista, é

preciso atentar-se para tais mudanças e redesenhar atitudes, visões, modus operandi, em

especial, os organizacionais.

3.2 Controle Social

Os modelos de gerenciamento de crise de imagem não estariam, mais uma vez,

assegurando os modelos de sociedade de controle descritos por Foucault? Segundo

Deleuze (1992), ao retratar a obra de Foucault,

a fábrica constituía os indivíduos em um só corpo, para a dupla vantagem do patronato que vigiava cada elemento da massa, e dos sindicatos que mobilizavam uma massa de resistência, mas a empresa introduz o tempo todo uma rivalidade inexpiável como sã emulação, excelente motivação que contrapõe indivíduos entre si e atravessa cada um, dividindo-o em si mesmo. (DELEUZE, 1992, p. 60)

Mas, até que ponto as convicções pessoais ou organizacionais podem ser sacrificadas

em troca de se manter a estabilidade profissional, a reputação em si? E, or outro ângulo,

como o estabelecimento da ordem corporativa pode determinar a ordem social. Seria

praticamente uma inversão de valores ou voltar à velha máxima de quem nasceu primeiro: o

ovo ou a galinha?

Essa indagação da falta de limites da vida corporativa e de sua influência ou inversão

de papéis em relação ao que é lícito ou não fazer persegue a personagem principal do filme

“Obrigada por Fumar”, Nick Naylor, uma vez que ele lida com dois lados de uma mesma

moeda o tempo todo.

Page 71: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

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Para completar a falta de noção do que é certo ou errado retratada pelo filme, Nick

Naylor ainda é amigo de Poll (Maria Bello) e Lorne (Sam Elliott), que representam outras

duas controversas realidades: ela está a serviço da indústria de bebidas, enquanto ele

representa uma importante indústria de armas. O teor satírico do filme é reforçado por esta

tríade, já que cada uma das personagens demonstra entender e aceitar como correta a

situação da outra, que é estar sempre na corda bamba. Quase no fim do filme, antes de Nick

Naylor fazer seu processo de transformação, há uma cena na qual os três discutem qual

deles tem o emprego mais perigoso e cada um apresenta seus interessantes argumentos

para afirmar-se como merecedor do título. Sob suas falas, está embutida uma crítica feroz a

alguns valores distorcidos que a sociedade aprendeu a aceitar como válidos. O que se vê

nesta cena, é que em qualquer lugar do mundo, levar vantagem e ganhar dinheiro de forma

fácil tem seus adeptos.

3.3 Questão de Retórica, Regras e Midiatização

E, se a crise empresarial ou social é tida e vista como um fato, é preciso ou vital que se

conheça ou se caracterize a cultura ou premissas das crises. Isso pressupõe adotar, de

antemão, políticas de planejamentos preventivos, as quais fornecem ferramentas

necessárias e capazes de lidar com os momentos críticos. Para gerenciar uma crise, a

empresa, a pessoa ou a sociedade movimenta uma série de atividades internas

responsáveis por trabalhar em prol dela mesma, buscando controlar e sanar o problema. A

comunicação é uma destas ferramentas/atividades. A área de Comunicação Empresarial,

por exemplo, é o setor institucional que se comunica com todos os stakeholders da

organização, seja antes, durante e após a crise, por meio, inclusive, das chamadas

assessorias de imprensa.

No caso de “Obrigado por fumar”, o personagem principal Nick Naylor (Aaron Eckhart),

é o próprio departamento de comunicação ambulante. Se assim pode-se denominar. Ele

monta estratégias, as coloca em prática e, ainda, as discute num pós-venda com seus

colegas de profissão.

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Pode-se, no entanto, auferir à personagem a alcunha de retórico. A personagem é

retratada no filme de forma exagerada e, às vezes, ganha cunho de herói, de forma crítica e

bem humorada. Mas, a fotografia e o jogo de luz em cada quadro reforçam o clima de

heroísmo e de poder de articulador do personagem central. Embora outros personagens,

como o Senador Ortolan K. Finistirre, papel de William H. Macy, também ganhem, em certos

frames, ares de personagens centrais, que poderiam roubar a atenção do espectador. Isso

aconteceria se a retórica distorcida de Naylor não fosse tão bem articulada e feroz ao ponto

de prender a atenção do espectador do início ao fim da trama.

De acordo com Citelli (2002), falar em persuasão implica retornar ao discurso clássico.

Segundo o autor, na Grécia Clássica havia uma grande preocupação com a estruturação do

discurso. “O problema não era apenas o de falar, mas fazê-lo de forma convincente e

elegante, unindo arte e espírito, bem ao gosto da Cultura Clássica.” (CITELLI, 2002, p. 7)

Citelli (2002) ainda frisa que o estudo da retórica mostra uma primeira reflexão acerca da

linguagem no mundo ocidental. Cabe à retórica, neste sentido, mostrar o modo de construir

as palavras visando a convencer o receptor sobre dada verdade.

A retórica foi, porém, transformando-se em mero sinônimo de recursos embelezadores do discurso, ganhando até certo tom pejorativo. O desenvolvimento da retórica pode ser visto no século XVII e XIX, onde isso já não era mais um método compositivo, mas sim de buscar o melhor enfeite, a palavra mais bela, a figura inusual, a expressão inusitada, à moda dos ideais estéticos dos parnasianos. (CITELLI, 2002, p. 7)

Citelli (2002) mostra que existem graus de persuasão, sendo alguns menos visíveis,

outros mais ou menos mascarados, isto indica que um leitor pode ser mais ou menos

persuadido dependendo do texto lido. E citando Aristóteles, Citelli (2002) afirma que a

retórica é a faculdade de ver teoricamente o que pode ser capaz de gerar persuasão.

Nenhuma outra arte possui esta função, porque as demais artes têm, sobre objeto que lhes é próprio, a possibilidade de instruir e de persuadir; por exemplo, a medicina, sobre o que interessa à saúde e à doença; a geometria, sobre as variações das grandezas;

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a aritmética sobre o número, e o mesmo acontece com as outras artes e ciências. Mas a Retórica parece ser capaz de, por assim dizer, no concernente a uma dada questão, descobrir o que é próprio para persuadir. (ARISTÓTELES apud CITELLI, 2002, p. 10)

Embasado por estes argumentos de Arisóteles, Citelli (2002) diz que é possível deduzir

que a

retórica não é persuasão, mas pode revelar como se faz persuasão; a retorça é analítica (descobrir o que é próprio para persuadir); a retórica é uma espécie de código dos códigos, está acima do compromisso estritamente persuasivo (ela não aplica suas regras a um gênero próprio e determinado), pois abarca todas as formas discursivas. (CITELLI, 2002, p. 10)

Desta forma, Citelli (2002) diz que é possível entender que a retórica não é uma ética,

pois ela não entra no mérito daquilo que está sendo dito, mas, sim como está sendo dito de

modo eficiente. “Eficácia implica, nesse caso, domínio de processo, de formas, instâncias,

modos de argumentar.” (CITELLI, 2002, p. 11)

Mas, mesmo com todo este poder de articulação que a sua retórica lhe aufere, Naylor

não está imune à sua própria crise pessoal. A personagem passa por uma crise de

identidade, de valores e, também, por uma crise de imagem. Esta crise pessoal da

personagem central de “Obrigado por Fumar” pode ser considerada uma forma de acentuar

o tempo diegético da trama ou mesmo de lhe dar a oportunidade de se redimir diante da

própria incoerência. É quase um momento de redenção32 da personagem, de sua

purificação. A coincidência perfeita entre o desenvolvimento cronológico da trama e a

sucessão, no discurso, dos acontecimentos, demonstram um desencontro na narrativa. Aos

desencontros entre a ordem dos acontecimentos no plano da diegese e a ordem porque

aparecem narrados no discurso, dá-se a designação de anacronia. Esta anacronia da

32 livramento de algum mal por meio do pagamento de um preço. Conceito encontrado em 05.11.2013, no endereço eletrônico http://www.recantodasletras.com.br/mensagensreligiosas/2509038

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personagem pressupõe que a crise está próxima de qualquer cidadão que atue ou se

predisponha a estar em sociedade.

Figura 1

Figura 1 - O Senador Ortolan K. Finistirre, papel de William H. Macy, e um cartaz de seu projeto antitabagista

De acordo com Deleuze (1992), ao retratar a obra de Foucault33, nos séculos VIII e

XIX os modelos de sociedades disciplinares se estabelecem. Mas, ainda segundo o autor, é

no início do século XX que elas atingem seu apogeu. Ainda em citação de Deleuze (1992),

as sociedades disciplinares também conheceriam sua crise, em favor de novas forças que

se instalavam lentamente e se precipitariam depois da Segunda Guerra Mundial.

“Sociedades disciplinares é o que não éramos mais, o que deixávamos de ser.” (DELEUZE,

1992, p. 62)

33 Importante filósofo e professor. Seu trabalho foi desenvolvido sobre o saber filosófico, experiência

literária e análise de discurso. Foucault também estudou a relação entre poder e governabilidade e as

práticas de subjetivação. Informações encontradas em 05.11.2013, no endereço eletrônico

http://www.infoescola.com/psicologia/michel-foucault/

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75

As várias formas de gerenciamento de crise corporativa, na verdade, são pré-

requisitos para se tentar manter a ordem estabelecida. No filme “Obrigado por Fumar” tenta-

se proteger a indústria do tabaco do que pode se tornar o seu colapso. Não se pode negar,

contudo, que não há mais uma ordem pré-estabelecida que perdure para sempre. As

mudanças sociais, de conduta, de postura, obrigam as empresas e os indivíduos, em

consequência, a estarem sempre em mudança.

Normalmente, não se está preparado para gerenciar a crise, pois quase nunca

acredita-se que uma situação dessas irá vir a tona. Hoje, não só as empresas têm cuidados

com sua imagem/reputação. Todos os indivíduos, grosso modo, estão cada dia mais

expostos no espaço midiático. Não há mais como se esconder. E, como não há mais

esconderijos seguros, é preciso ter em mãos um modelo de gerenciamento de crises de

imagem, de reputação. Seja ele corporativo ou individual. Esses modelos de gerenciamento

de crises estariam, mais uma vez, assegurando os modelos de sociedade de controle

descritos por Foucault.

Ainda segundo Deleuze (1992), é preciso ter em mente que as empresas têm alma. O

que é uma notícia aterrorizadora. De acordo com o autor,

o marketing é agora o instrumento de controle social, e forma a raça imprudente dos nossos senhores. O controle é de curto prazo e de rotação rápida, mas também contínuo e ilimitado, ao passo que a disciplina era de longa duração, infinita e descontínua. (DELEUZE, 1992, p. 63)

Pressuposto por Rosa (2001), na crise, a sorte conta pouco, o preparo, muito.

Se você é dono de uma pequena, média ou de uma grande empresa, se for um empregado ou um executivo de alto nível ou um profissional liberal bem-sucedido, enfim, seja qual for a sua posição no mercado de trabalho, as crises de imagem podem um dia atingir você. Direta ou indiretamente. (ROSA, 2001, p. 40)

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Rosa (2001) enfatiza que a administração de crise não é uma fórmula de ação. É uma

forma de pensar. Para o autor,

embora o aspecto humano das crises seja preponderante na repercussão que atingem, parece mai abrangente colocar a crise de imagem sob outra perspectiva. A melhor definição é de que a crise de imagem constitui um conjunto de eventos que pode atingir o patrimônio mais importante de qualquer entidade ou personalidade que mantenha laços estreitos com o público: a credibilidade, a confiabilidade, a reputação. (ROSA, 2001, p. 57)

Na midiatização, pode-se, portanto, estabelecer o que é correto ou não fazer. Conhecer

o que está por trás do jogo do mundo corporativo. Estabelecer uma nova visão sobre o

tema. E é exatamente isso que a trama de Jason Reitman nos possibilita. Sair da frente da

tela com uma visão mais clara do jogo no qual todo o mundo está envolvido. O processo de

midiatização é latente e utilizado mundialmente pela mídia. Reitman utiliza o longa-

metragem como uma abordagem fronteiriça, mas que deixa a cargo do espectador avaliar o

que é certo ou errado no jogo da informação. As pílulas de informação utilizadas na trama

servem tanto de conhecimento de um fato quanto de articulação narrativa e não tem a força

necessária de moldar discussões ou novas ordens sociais. É possível afirmar que a

narrativa perpassa o tema quase que somente pela controvérsia que causa e não para

moldar novas políticas ou posturas. É mais um produto da midiatização tão somente.

O cinema já abordou o tema em outros filmes. Um deles – “O Informante”, de Michael

Mann – desenvolveu a trama sobre a história real de Jeffrey Wigand, um químico demitido

da Brown & Williamson, porque se recusou a continuar cooperando em pesquisas para

aumentar a eficácia dos efeitos da nicotina nos cigarros fabricados pela companhia. Assim,

como outros do gênero, “O Informante” tem um viés altamente dramático e perpassa os

meandros da própria indústria da informação. O que não acontece com o trabalho de

Reitman, uma trama leve, de diálogos curtos, inteligentes e com muitas cenas engraçadas

que quebram a rigidez do tema central do enredo.

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Assim como “Todos os Homens do Presidente” (que narra a investigação do caso

Watergate por dois jornalistas e que levou à renúncia do presidente americano Richard

Nixon, em 1974), “O Informante” mergulha nos bastidores da mídia e mostra os caminhos

percorridos pela notícia desde sua fonte até o momento de sua veiculação, revelando todos

os bastidores cercado de interesses tanto das empresas quanto dos próprios veículos de

comunicação em dar o seu tom/interesse à informação.

Embora não figure entre filmes de questionamento, “Obrigado por Fumar” não é

apenas uma história engraçada sem maiores consequências. Ao contrário, é inovador,

criativo, pode sim levar à reflexão e, acima de tudo, propiciar debates sobre um assunto

polêmico e cada vez mais presente nas organizações e na sociedade como um todo que é a

utilização do tabaco e, também, a representação midiática e suas consequências. Mesmo

não tendo a pretensão de tornar-se um marco da discussão acerca da representação

midiática, como é o caso de “O Informante”, a trama de Reitman possibilita tal reflexão.

3.4 Quando a Verdade é Inconveniente

Existe uma relação tênue entre o jornalismo televisivo e o cinema. Ambos, são partes

fundamentais dos meios de comunicação de massa que informam e entretêm. Há, no

entanto, alguns pontos relevantes que os distinguem. A diferença entre ambos está,

principalmente, na maneira como chegam ao público. O jornalismo tem como característica

informar e propagar os fatos da realidade, o cinema existe para entreter. O que muitas

pessoas não sabem ou não param para pensar, é que jornalismo televisivo e cinema, não

raramente, mesclam-se de forma tão tênue, que acabam um tomando o lugar do outro ou

cumprindo ambos os papéis.

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É o que acontece em “O Informante”, dirigido por Michael Mann. O longa-metragem

que narra a história de Lowell Bergman, produtor do famoso programa 60 Minutes34, que em

1995 convenceu o cientista Jeffrey Wigand, ex-pesquisador de uma grande empresa de

tabaco dos Estados Unidos, a revelar a verdade sobre a manipulação de nicotina nos

cigarros fabricados pela indústria do fumo, que não hesitava em acrescentar carcinógenos

em seus produtos para aumentar a dependência. Essa produção é, quem sabe, a que mais

mostra as faces do jornalismo quando a verdade não é conveniente para a própria

imprensa.

“O Informante” mostra caminhos da notícia desde sua fonte até o momento de sua

veiculação, revelando todos os percalços encontrados no trajeto, incluindo até mesmo os

interesses da própria emissora. O roteiro é extremamente habilidoso ao procurar cobrir a

maior quantidade possível de fatos envolvidos nesse polêmico caso, que na época acabou

despertando a atenção do mundo não só pelas revelações envolvendo as empresas de

tabaco, mas principalmente por descortinar o intrincado jogo de interesses existente por trás

da própria divulgação das informações - levando-nos a diversas perguntas, como: “Quem

são os donos das notícias?”

O cinema, no caso do filme “O Informante”, mostrou o que ocorre em off nas empresas

jornalísticas. Não se pode nem estimar quantas dessas situações já aconteceram em cada

redação no mundo todo. A verdade inconveniente, muitas vezes, não se dita pelo jornalista.

Apenas fragmentos dela estão nas páginas dos jornais, nos noticiários da TV ou nas ondas

do rádio. E muitos fatos importantes estão de fora. Esse é um de muitos casos, em que o

cinema, além de sua função de entreter, tomou para si o papel de informar, o papel que

seria da própria imprensa.

34 60 Minutos é um premiado programa jornalístico da TV americana, apresentado na CBS News desde 1968. Foi criado por Don Hewitt e classificado entre os programas top-TV durante grande parte de sua existência. Ganhou inúmeros prêmios ao longo dos anos. Informações do http://www.cbsnews.com/60-minutes/, pesquisadas em 05.11.2013.

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Como dito anteriormente, ao fazer uma breve análise de sua filmografia, pode-se

afirmar que todos os filmes de Reitman trabalham temas limites ou fronteiriços. Por um lado,

o diretor coloca o espectador para pensar, usando limites/fronteiras temáticas, críticas. Mas,

ao mesmo tempo o diretor não faz desta sua característica uma força a fim de lutar por

limites éticos. Ele perpassa estas discussões e as deixa, de certa forma, a cargo do

espectador. Para ele decidir até onde a ética se estabelece e o que é ou não ético. É o que,

claramente, ocorre em “Obrigado por Fumar” desde os letreiros, que fazem alusão a maços

de cigarros até a cena final, quando Nick Naylor decide permanecer lobista.

Será que ao sair de uma sessão, um usuário não se sentiria ainda mais tentando a

fumar? Ou o contrário também pode ocorrer com quem já tinha uma postura contrária ao

uso do tabaco? Não cabe a esse estudo responder tais questões. Mas elas são bastante

elucidativas do ponto de vista desta análise fílmica. Desta forma, não se pode rotular

“Obrigado por Fumar” por um viés apenas. A trama é tanto engraçada quanto informativa.

O julgamento moral das personagens nos filmes de Reitman sempre fica a cargo do

espectador, que opta por condená-los ou não. Nick Naylor, assim como qualquer outro

personagem de sua filmografia, não é nem um coitadinho, nem um canalha. Apenas vive de

acordo com as circunstâncias que se lhe impõem. Reitman, por intermédio de seu discurso

fílmico, também não parece preocupado em defender uma verdade única nem um ponto de

vista absoluto.

3.5 Elenco, Enredo e Personagens

Nick Naylor (Aaron Eckhart) é o centro da ação e narrador do longa-metragem,

baseado em livro homônimo e best seller nos EUA escrito por Christopher Buckley. A

personagem ganha a vida sendo lobista defendendo publicamente o cigarro. Ele trabalha

para uma associação que investiga os efeitos do tabaco na saúde dos fumantes. O detalhe

é que seu maior argumento é que não há provas concretas em relação aos males do hábito

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de se fumar. Nick Naylor é muito bem pago para falar e consegue argumentar muito bem. É

articulado e persuasivo.

A personagem é um homem de, aproximadamente, 40 anos, separado da mulher e

muito ligado ao seu filho Joey, de 12 anos. O garoto é bastante influenciado pelo pai, que

precisa se esforçar para se tornar um bom exemplo. Mas, é a personagem Joey quem faz

com que Nick Naylor repense sua forma de agir e seus valores.

As coisas não são fáceis para Nick Naylor ao longo da trama. No início do longa-

metragem, a personagem parece ter recriado para si um mundo de novos valores, tudo em

prol do salário que ganha. Até subornos, para melhorar a imagem de sua empresa na guerra

pela qual passa a indústria do tabaco, são feitos por Naylor sem nenhum constrangimento.

Para reafirmar seu discurso, Nick Naylor conta com a cumplicidade de Polly (Maria Bello),

uma lobista da área de bebidas e, também, com Bobby Jay (David Koechner), defensor dos

interesses da indústria armamentista, com quem se encontra sempre para “trocarem

figurinhas” sobre o seu trabalho. Os três lobistas tentam articular seus discursos em tais

reuniões como se estes fossem corretos. Um novo mundo se configura para as três

personagens, que vivem à margem dos valores sociais. Elas recriam valores, a fim de

alicerçar suas condutas.

De imediato, o longa-metragem propicia uma reflexão e um interessante debate sobre

a situação/posição de gerentes e empregados que trabalham em organizações como a

retratada. Além disso, aborda temas relacionados com alianças, ética corporativa, fidelidade

à empresa, liberalidade, meio ambiente, mentoring35, modelos mentais, negociação,

paradigmas, raciocínio lateral, relacionamento entre pais e filhos, responsabilidade social e

valores. Os mundos paralelos criados pela personagem Nik Naylor encontram-se e se

degladiam, a partir das proposições éticas propostas pela personagem Joey.

35 É uma ferramenta de desenvolvimento profissional e consiste em uma pessoa experiente ajudar

outra menos experiente. O mentor é um guia, um mestre, conselheiro, alguém que tem vasta experiência profissional no campo de trabalho da pessoa que está sendo ajudada. Illustrated Oxford Dictionary, 2000 p. 511

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William Macy interpreta um senador progressista de Vermont, Ortolan Finistirre. Esta

personagem é um ferrenho anti tabagista, envolvido numa campanha feroz para que seja

colocado em cada maço de cigarro o desenho de uma caveira. Esta seria uma tentativa

midiática de mostrar os malefícios do cigarro, além de outras alternativas propostas pelo

senador para diminuir o uso do tabaco ou ao menos informar seus malefícios. Na defesa dos

interesses de seu patrão, Nick Naylor contesta o senador com base na teoria universal do

ser liberal. Diz que só fuma quem quer, que todo mundo sabe que cigarro mata (inclusive

todo fumante), e que os fumantes não querem a imagem de uma caveira lhes encarando a

toda hora. É a liberdade de escolher, sempre argumenta o lobista.

Já Robert Duvall interpreta a personagem conhecida por O Capitão, que chefia uma

academia de estudos a favor do tabaco. Completam o excelente elenco Sam Elliott, Rob

Lowe e Katie Holmes, que vive uma repórter ambiciosa e de ética duvidosa. É a

personagem interpretada por Holmes quem coloca, literalmente, Nick Naylor na berlinda ao

fazer uma reportagem na qual conta os deslizes ou falcatruas praticados por ele para

proteger a indústria do tabaco.

Figura 2 - Nick Naylor e a jornalista Heather Holloway em um de seus encontros, nos quais ele confessou a ela todas as suas artimanhas

Page 82: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

82

Nick Naylor também conta com a ajuda de Jeff Megall (Rob Lowe), um poderoso

agente de Hollywood, para fazer com que o cigarro seja promovido nos novos filmes.

Embora esta alternativa não seja concretizada na trama.

O grande atrativo do filme são os conflitos pessoais de um profissional defendendo

sua empresa perante denúncias contra a indústria do tabaco. Os diálogos são marcados por

crises morais entre Nick Naylor e seu filho Joey que, em principio, não aceita a profissão do

pai.

Em um dos diálogos entre Nick Naylor e Joey, a personagem principal chega a

afirmar para o filho os malefícios do cigarro. Mas, relativiza que, com uma boa

argumentação, é capaz de convencer as pessoas de que o cigarro não é tão prejudicial

assim. Com isso, Nick Naylor passa a ser massacrado pelos vigilantes da saúde que o

questionam sobre o futuro do seu filho e se ele gostaria de ver o filho fumando.

O ponto em questão é defender os princípios e a cultura da empresa à qual está

representando e deixar, de forma transparente, os familiares alinhados quanto à sua postura

e opinião. A resposta de Nick Naylor sobre a questão foi, contudo, objetiva: “meu filho sabe

de todos os males do cigarro, mas, caso ele opte por fumar, comprarei seu primeiro maço!”.

Outro ponto em questão é a discrição/sigilo que envolvem os assuntos do ambiente

corporativo. Nick Naylor deixou-se envolver com Heather, a jornalista investigativa, e, com

isso, comprometeu toda a indústria do tabaco e, também, seus colegas lobistas de outros

ramos de negócios delicados como o de bebidas e o de armas. Ele foi demitido devido a

estas inconfidências. A personagem jamais deveria revelar informações confidenciais para

nenhuma pessoa do ciclo pessoal, ainda mais para uma repórter. Apesar de todo

desconforto, ele reverteu a situação quando declarou aos jornalistas seu erro e abriu o jogo

sobre o seu envolvimento com Heather, divulgando os métodos nada éticos da jornalista

para fazer sua reportagem. Nick Naylor, com esta atitude, volta a ter credibilidade e coloca a

repórter em situação difícil em relação aos seus colegas e ao jornal para o qual trabalhava.

Page 83: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

83

Fazer lobby - representar os interesses de uma entidade e influenciar outras - é uma

profissão legalizada nos Estados Unidos. Não que ela seja bem vista, pelo contrário. O caso

de Nick Naylor é, basicamente, cômico. Ele personifica publicamente a indústria do tabaco

ao tentar convencer pessoas e instituições de que o cigarro não é ruim. Falando diretamente

ao espectador, em narração em off, Nick Naylor é como a voz, o alter ego36, do diretor Jason

Reitman. Nick Naylor é, indiscutivelmente, bom no que faz – tão bom que não é difícil para o

espectador corroborar com seus pontos de vista.

Figura 3 - Luz e sombra ajudam a projetar a atmosfera de suspense e reforçam no filme as questões de ética e retórica versus persuasão

Mas a briga é desleal: o tempo todo Nick Naylor exercita sua persuasão. Paga

milhões para que o velho Homem de Marlboro, hoje canceroso, pare de reclamar na mídia.

Numa clara menção a suborno. Procura um produtor de Hollywood para ver se consegue

reemplacar o cigarro na telona, como nos filmes charmosos de antigamente. O produtor,

interpretado por Rob Lowe, não apenas concorda como oferece, quem sabe, Brad Pitt e

Catherine Zeta-Jones fumando um cigarro depois de transarem no espaço sideral. Não há,

36 É uma outra personalidade de uma mesma pessoa, podendo ser um amigo ou alguém próximo em

que se deposita total confiança. Na Literatura, o alter ego significa a identidade oculta de uma personagem, que pode ser também uma estratégia usada pelo autor do livro para se revelar indiretamente aos leitores. Conceito encontrado em 05.11.2013, no site

http://www.infoescola.com/literatura/alter-ego/

Page 84: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

84

realmente, mensagem subliminar37 mais poderosa. Que liberdade de escolha é essa,

quando vivemos soterrados num consumismo cada vez mais dissimulado e num processo

de representação?

Há um diálogo primoroso na metade do filme que ilustra um pouco a situação. Nick

Naylor repete ao seu filho, Joey (Cameron Bright), nos momentos em que a mãe deixa o

garoto ficar junto do pai, que o importante é argumentar. Nick Naylor diz:

Suponhamos que você defenda o sorvete de chocolate; eu, o de baunilha. Você dirá que o seu é a melhor coisa do mundo. Eu direi que a melhor coisa do mundo é poder escolher entre chocolate e baunilha. Mas com isso você não me convenceu de que baunilha é melhor, reclama Joey. Mas eu não quero te convencer, quero só provar que estou certo e você errado, retruca o pai.

Figura 4 - Nick Naylor faz apologia ao tabaco até mesmo durante apresentação na escola do filho Joey (Cameron Bright)

37 Mensagem subliminar é a definição usada para o tipo de mensagem que não pode ser captada

diretamente pela porção do processamento dos sentidos humanos que está em estado de alerta. Subliminar é tudo aquilo que está abaixo do limiar, a menor sensação detectável conscientemente. Conceito encontrado em 05.11.2013, no endereço eletrônico

http://www.brasilescola.com/curiosidades/mensagem-subliminar.htm

Page 85: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

85

É de se condenar essa moral maleável? Há momentos em que Jason Reitman vende

a ideia de que liberdade de escolha existe, sim - e o seu lobista chega perto de se heroificar.

E há essa evidência gritante de que o livre mercado é a mentira perfeita do capitalista-

golpista, vendendo baunilha aos baldes para quem sequer gosta de sorvete. O mais

interessante de “Obrigado por Fumar” é que fica difícil saber no que o personagem/diretor

acredita de verdade.

3.6 Contexto

Unir humor e inteligência em um filme que se propõe retratar o mundo corporativo e

uma de suas mais difíceis faces (a das crises institucionais) é, no mínimo, um contrassenso,

uma vez que esta é uma das mais delicadas e cheias de artimanhas esferas da cultura

organizacional. Mas, em “Obrigado por Fumar” o humor serve de base para um saber mais

consolidado e praticado por grandes representantes organizacionais: a retórica. Não se trata

apenas de saber usar as palavras. No enredo, é preciso contextualizá-las, retratá-las e lhes

dar ênfase quando se faz necessário. Ás vezes, de forma sutil; às vezes, de forma

escancarada. E a fotografia é bastante utilizada em “Obrigado por Fumar” para trazer tais

efeitos à tona e os reforçar. Ângulos em primeiro e primeiríssimos planos, recortes de partes

do rosto das personagens, luz, sombra. Tudo serve de moldura para o discurso.

De acordo com Citelli (2002), falar em persuasão implica, de algum modo, retomar

uma certa tradição do discurso clássico. Citelli argumenta, no entanto, que

a retórica foi, porém, transformando-se em mero sinônimo de recursos embelezadores do discurso, ganhando até um certo tom pejorativo. Um pouco desta postura se deve a certas visões da retórica, como as desenvolvidas no século XVIII e XIX, para quem já não se tratava mais de uma questão de método compositivo, mas sim de buscar o melhor enfeite, a palavra mais bela, a figura inusual. (CITELLI, 2002, p. 8)

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86

Reitman demonstra um domínio narrativo muito atraente nesse filme. Pode-se dizer

que se trata dos bastidores da indústria do cigarro, de como esses setores, de certa forma,

ainda manipulam a mídia, de como faturam milhões espalhando a morte entre a população

mundial. “Obrigado por Fumar”, portanto, é sobre o poder da retórica. Esse jei to de dizer

uma coisa com tanta certeza e convicção que consegue convencer todo mundo de que se

está certo. Quando a veemência toma conta do discurso e o transforma em verdade

absoluta, inquestionável.

O título do filme, traduzido ao pé da letra do original em inglês, pode nos levar a

pensar que se trata de uma produção que tem o propósito de defender os interesses das

grandes corporações que produzem e vendem esse produto pelo mundo afora. É, na

verdade, mais uma das ironias finas contidas nesse filme que surpreende a todos que o

assistem e que, principalmente, enseja a uma mais do que necessária reflexão sobre a

temática. Por outro lado, para os fumantes é quase impossível não sair da frente da tela com

um desejo ainda maior de fumar mais um cigarro, depois de ser bombardeado, literalmente,

por tanta fumaça.

O foco das indústrias tabagistas, retratado pela trama de “Obrigado por Fumar” não é

a manutenção de seus clientes já estabelecidos, mas o estímulo ao uso do produto por

novas gerações de consumidores. Nesse sentido, sua ação acaba sendo direcionada aos

jovens e atinge, como efeito colateral, também aos adolescentes e até mesmo crianças.

Page 87: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

87

Figura 5 - Nick Naylor em um dos momentos com seu filho, que o faz repensar seu trabalho e a forma de usar seu poder de persuasão

Droga legalizada como o álcool, que movimenta grandes somas de dinheiro, gera

empregos, produz dividendos e lucros para seus acionistas e ainda garante arrecadação

fiscal substantiva para o governo (já que é sobretaxada) – dificilmente será impedida de ser

fabricada ou terá proibida sua venda.

Em determinados momentos da produção de “Obrigado por Fumar”, estão reunidos

ao redor de uma mesa, num restaurante, os representantes das indústrias do álcool, das

armas de fogo e do tabaco. São amigos e se sentem muito próximos pelo fato de fazerem

lobby por produtos que são fortemente rechaçados através da mídia ou pela pressão de

ONGs. Sentem-se, em determinados momentos, ainda mais próximos, pois ao encarnarem

os advogados de defesa desses produtos acabam se tornando o alvo da hostilidade pública

contra as indústrias que representam.

Figura 6 - Nick Naylor analisa sua performance em encontro informal com seus colegas lobistas em uma das cenas de “Obrigado por fumar”

Page 88: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

88

Entre as conversas que têm, acabam até com certo orgulho comparando os índices

de mortalidade nos Estados Unidos auferidos para os produtos que representam. Cada qual

deles munido das mais recentes estatísticas, parecem querer mostrar mais poder de fogo.

Até o momento em que percebem o rumo que a discussão tomou e o quanto o que estão

afirmando atenta contra os interesses que representam ou, ainda pior, contra eles mesmos

uma vez que eles dependem de seus trabalhos para sobreviverem.

Essa sequência emblemática da reunião entre os três lobistas é apenas uma amostra

do senso de humor que permeia a produção do filme de Jason Reitman e que,

propositalmente, nos direciona a refletir sobre a indústria tabagista e os seus rumos no

mundo em que vivemos.

Há várias outras oportunidades em que podemos conferir o quanto o trabalho de

lobistas muito bem preparados, como a personagem principal Nick Naylor, acaba sendo

decisivo para que uma droga legalizada, de sérias e graves consequências para a saúde

pública, não apenas mantém seus já fiéis consumidores como ainda tem fôlego para

conquistar novas legiões de adeptos apesar das restrições legais e batalhas jurídicas nas

quais está envolvida mundialmente.

Mas, ao repensar sua própria postura, a personagem abre brechas para um olhar que

contempla um universo mais sustentável, mais alicerçado em valores éticos e morais. Em

conversa consigo mesmo e driblando seus próprios fantasmas, Nick Naylor estabelece uma

nova conexão com o mundo externo. A personagem muda o foco, nesse segundo momento

do filme, e tenta buscar alternativas para o seu trabalho. É, nesse momento, que ele se

distancia da proposta de ganhar a qualquer custo, pois tem a hipoteca para pagar e passa a

pensar no futuro, em especial o do seu filho. A personagem, nesse momento, passa por um

processo de redenção.

Uma análise um pouco mais profunda remete à avaliação do filme em seu papel

social contra problemas igualitários e não apenas à indústria tabagista. Ele relata esquemas

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89

imorais e acordos antiéticos, como, por exemplo, a ideia de subornar agentes de Hollywood

para incluir cenas com cigarros em seus filmes (o que não acontece em face da crise que

Nick Naylor passa a enfrentar). Ainda nesse contexto, o filme faz acusações também a

outras indústrias que podem ser consideradas nocivas, como a armamentista e a do álcool.

Daí, pode-se dizer que o filme serve também como ponto de partida para outras discussões,

como a legalização de outras drogas que ainda são consideradas ilícitas.

Para avaliar o filme “Obrigado por Fumar”, é preciso ter em mente que há uma

reverberação e uma lente de aumento enorme sobre a esfera do gerenciamento de crise

institucional que caracteriza a trama. Assim, pode-se dizer que o filme tem seus créditos ao

deixar que o protagonista trace verdadeiros labirintos para engendrar planos mirabolantes

que garantam à indústria do tabaco sua sobrevida aos ataques de diversos setores sociais.

A fama de Nick Naylor como porta-voz e lobista atrai a atenção do chefão das

indústrias de cigarro (Robert Duvall) e uma repórter de um influente jornal de Washington

que deseja investigá-lo (Katie Holmes). Nick Naylor diz que só trabalha para pagar as

contas, mas a atenção cada vez maior que filho pequeno Joey, (Cameron Bright) presta em

seu trabalho e uma ameaça de morte bastante real fazem com que ele mude de opinião.

Figura 7 - Naylor aprende, com seu filho, já na terceira fase da trama a trabalhar de forma mais crível, mais embasada em valores e não somente em astúcias

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90

Figura 8 - Ao lado do Filho Joey Naylor, Nick Naylor demonstra que é possível trabalhar como lobista com ética

Pode-se, por outro ângulo, falar ainda sobre a força do discurso. Em níveis diferentes,

a retórica ganha força quando Nick Naylor afirma ao seu filho que ao “argumentar

corretamente, nunca se está errado”. Nesse aspecto, o filme é um forte exemplo de como

técnicas de argumentação podem influenciar pessoas ao se utilizar diferentes tipos de

discurso. Por esse ponto de vista, é possível afirmar que o filme demonstra como o discurso

pode ser utilizado para influenciar pessoas e como esse tipo de técnica é empregada em

propagandas, filmes e por profissionais de diversas áreas em função de suas atividades.

Page 91: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

91

CONCLUSÃO

O estudo proposto por essa dissertação não objetiva fornecer fórmulas prontas ou

estratégias para o gerenciamento de crises de imagem organizacionais. Fomentou-se aqui a

reflexão acerca da representação midiatizada sobre o gerenciamento de crises institucionais

que o cinema americano promoveu a partir da década de 1990. Nesse estudo, pretendeu-se

elucidar como o cinema americano pode ser representativo quando retrata de forma

midiatizada determinada ação ou fato.

Entender como o cinema americano, mais especificamente o longa-metragem

“Obrigado por Fumar” (EUA, 2005), utilizou a relação de representação midiática e os

processos nos quais a cultura audiovisual se estabelece para retratar o gerenciamento de

crises de imagem e suas repercussões a partir de processos históricos/culturais tomou

forma a partir dessa análise.

A estética e a narrativa, nesse contexto, foram primordiais para alavancar

personagens e caracterizá-los em face do que acontece no mundo corporativo. Nuances do

enredo que, quase passam despercebidas pelo espectador comum que vê na trama apenas

uma sátira sem maiores pretensões, foram trazidas à tona nessa dissertação.

Retratou-se, nos três capítulos desse trabalho, como e porque falar em

gerenciamento de crise de imagem é importante e como o cinema americano se apropriou

do tema para nos fazer rir, pensar sobre ética, questionar valores. Já no primeiro capítulo,

buscou-se enfatizar quais seriam os passos dessa pesquisa e quais os autores embasariam

esse estudo.

No segundo capítulo, foi abordado o gerenciamento de crises de imagem e suas

características. Estudiosos da área foram pesquisados para balizar o que se pretendia

antever em “Obrigado por fumar”, longa-metragem analisado no terceiro capítulo. Como tais

Page 92: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

92

pesquisadores categorizam, pressupõem, organizam e definem os processos de crises de

imagem tornou-se o pilar de concepção dessa análise.

No terceiro capítulo, foi realizada uma análise fílmica do longa-metragem “Obrigado

por Fumar” a fim de se estabelecer um paralelo entre a teoria e o que cinema americano, a

partir da década de 1990, tentou representar midiaticamente. Ao se fazer uma leitura mais

crítica desse longa-metragem, foi possível estabelecer um paralelo sobre como o mercado e

os estudiosos encaram o assunto gerenciamento de crises de imagem, bem como observar

o processo de representação midiática do qual o cinema americano se apropria para

recontar histórias que acontecem em todo o mundo com milhares e milhares de empresas.

O filme analisado é um balizador do que é factual e do que pode ser um aspecto midiatizado

do fenômeno aqui estudado. Enredo, personagens e narração foram analisados a fim de se

entender como esse processo pode ser representado na grande tela do cinema. Em

paralelo, fez-se breve análise do longa-metragem “O Informante” para averiguar uma

possível analogia entre as duas obras.

Em “Obrigado por Fumar” o gerenciamento de crises de imagem é levado ao extremo

da falta de ética e valores e mostra uma ruptura com o que, geralmente, se pratica em

planejamento de comunicação institucional em tais circunstâncias. A midiatização do tema

exarceba o que é lícito ou não fazer. A maioria dos setores sociais e, em especial as

empresas, já trata o assunto de forma séria, com Plano de Gerenciamento de Crises (PGC)

e porta-vozes estabelecidos e treinados. Mas, ainda existem organizações e pessoas que

não têm controle sobre sua imagem e reputação e, até, que não levam a sério a

necessidade de se ter/saber o bom passo a passo sobre gerenciamento de crises.

Se enxergarmos as crises organizacionais metaforicamente como batalhas, que

envolvem a participação de diversos atores em uma sociedade midiatizada, a decisão de se

estabelecer uma boa comunicação, embasada por um planejamento de discurso e

aderência deste ao que a companhia pratica, pode ser feita com maior tranquilidade e

benefício para todos os envolvidos e tornar-se a melhor estratégia a ser adotada.

Page 93: análise do filme obrigado por fumar e a representação do

93

Pode-se dizer que “Obrigado por Fumar” é uma peça de contrapropaganda e de

reverberação da representação factual de um assunto pela sua midiatização. O longa-

metragem é, num primeiro momento, literalmente, uma aula do que não se deve fazer em

termos de gerenciamento de crises de imagem. Mas, apesar disso, “Obrigado por Fumar”

consegue transportar para a tela, a partir de sua segunda parte, o que acontece no mundo

real das organizações corporativas. Não cabe aqui fazer uma conclusão do que é correto ou

não fazer em uma situação similar. É preciso lembrar que esse estudo é apenas teórico e

não tem a intenção de trazer solução para tais acontecimentos.

No processo de midiatização, no entanto, pode-se estabelecer o que é lícito ou não

fazer. Tanto pelo lado das instituições quanto pelo dos meios de comunicação de massa,

estabelece-se padrões, formas, canais para se falar o que, quando e como se quer, se

deseja, de acordo com o que é mais vantajoso ou menos prejudicial para quem pauta os

meios de comunicação ou médias. Conhecer o que está por trás do jogo do mundo

corporativo. Estabelecer uma nova visão sobre o tema é plausível a partir de estudos

fílmicos como este.

É exatamente isto que possibilita a trama de Jason Reitman. Sair da frente da tela

com uma visão mais clara do jogo no qual se está envolvido. Na democracia do consumo,

afinal, pressupõem-se que ninguém força ninguém a comprar nada, apesar de todas as

mensagens subliminares e campanhas de marketing às quais se está exposto diariamente.

Mas, até onde vão as corporações para recriar suas imagens ou reputações?

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ANEXOS

Quem é quem no enredo

Este anexo tem como objetivo detalhar quem foram os atores que compuseram as

personagens de “Obrigado por Fumar”. Tem, ainda, como pressuposto resgatar a sinopse

do longa-metragem, a fim de elucidar quando, como e quanto custou a obra. Esta sinopse

foi encontrada no site IMDb, considerado a mais popular site de pesquisas sobre filmes, TV

e celebridades em todo o mundo ( endereço eletrônico http://www.imdb.com/).

Esta sinopse encontra-se em inglês, conforme abaixo, no site, endereço eletrônico

http://www.imdb.com/title/tt0427944/?ref_=fn_al_tt_1, pesquisado em 30 de setembro de

2013. Não foram encontradas outras sinopses ou traduções em português. Desta forma,

optou-se, aqui, por trazer a mesma em inglês, para elucidar algumas curiosidades sobre o

filme.

Obrigado por Fumar (2005) "Thank You for Smoking" (original title)

92 min - Comedy | Drama

Satirical comedy follows the machinations of Big Tobacco's chief spokesman, Nick Naylor, who spins

on behalf of cigarettes while trying to remain a role model for his twelve-year-old son.

Director: Jason Reitman

Writers: Jason Reitman (screenplay), Christopher Buckley (novel)

Stars: Aaron Eckhart, Cameron Bright, Maria Bello

Storyline

The chief spokesperson and lobbyist Nick Naylor is the Vice-President of the Academy of Tobacco

Studies. He is talented in speaking and spins argument to defend the cigarette industry in the most

difficult situations. His best friends are Polly Bailey that works in the Moderation Council in alcohol

business, and Bobby Jay Bliss of the gun business own advisory group SAFETY. They frequently

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meet each other in a bar and they self-entitle the Mod Squad a.k.a. Merchants of Death, disputing

which industry has killed more people. Nick's greatest enemy is Vermont's Senator Ortolan Finistirre,

who defends in the Senate the use a skull and crossed bones in the cigarette packs. Nick's son Joey

Naylor lives with his mother, and has the chance to know his father in a business trip. When the

ambitious reporter Heather Holloway betrays Nick disclosing confidences he had in bed with her, his

life turns upside-down. But Nick is good in what he does for the mortgage.

Written by Claudio Carvalho, Rio de Janeiro, Brazil

Plot Keywords: business | tobacco | reporter | lobbyist | health |

Taglines: Tobacco lobbyist Nick Naylor is trying to SAVE YOU!

Genres: Comedy | Drama

Details

Country: USA

Language: English

Release Date: 18 August 2006 (Brazil)

Also Known As: Obrigado por Fumar

Filming Locations: The Prince - 3198 W. Seventh Street, Koreatown, Los Angeles, California, USA

Box Office

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Budget: $6.500.000 (estimated)

Opening Weekend: $19.447 (Chile) (22 September 2006)

Gross: $35.206 (Chile) (29 September 2006)

Company Credits

Production Co: Room 9 Entertainment, TYFS Productions LLC, ContentFilm

Show detailed company contact information on IMDbPro »

Atores e Personagens

Nesta abordagem, tentou-se resgatar a história dos atores que compuseram a trama de

“Obrigado por Fumar”, com o intuito de demonstrar que o elenco contribuiu para que o longa-

metragem alcançasse diversos públicos. Veja abaixo os principais atores e seus personagens na

trama. A Internet foi a base dessa pesquisa sobre autores/personagens.

Aaron Edward Eckhart - é um ator estadunidense de cinema e teatro. Nascido na Califórnia, mudou-se

para a Inglaterra aos treze anos, acompanhando sua família.

Personagem: Nick Naylor – Lobista da indústria do tabaco americana.

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100

Maria Elaine Bello – Começou sua carreira com peças de teatro, mas foi em 1997 que se tornou conhecida do

grande público, ao participar dos três últimos episódios da terceira temporada da série

médica televisão ER como a Dra. Anna Del Amico. A personagem foi muito bem-recebida pelo público e pelos

produtores da série, e a atriz foi contratada como parte do elenco regular da série, do qual fez parte durante

toda a quarta temporada.

Personagem: Polly Bailey – Lobista da indústria de armas e amiga de Nick Nalor.

Katie Noelle Holmes – atriz americana. Katherine Noelle Holmes nasceu e foi criada em Toledo, Ohio. Ainda

em sua cidade natal, começou atuando em peças do ginásio e participou de concursos de beleza.

Personagem: Heather Holloway – Jornalista que denuncia Nick Naylor.

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Cameron Bright – Bright nasceu Cameron Douglas Crigger, na Colúmbia Britânica, Canadá. Seu primeiro

trabalho como ator foi em um comercial da Telus, seguido de uma pequena aparição na série de

televisão Higher Ground.1 Ele apareceu posteriormente em vários papéis menores em filmes feitos para

televisão, e foi creditado como "Cameron Crigger" em seus primeiros papéis.

Depois de um papel de apoio no filme The Butterfly Effect, seu primeiro papel maior foi em Godsend, um filme

de terror lançado em abril de 2004, co-estrelando Robert De Niro.4No filme seguinte, Birth, ele interpretou um

garoto de dez anos que afirmava ser a reencarnação do marido falecido de uma mulher (Nicole Kidman). Ele

foi escolhido para fazer parte do filme New Moon, sequência de Twilight, onde interpretou Alec, irmão gêmeo

de Jane, vivida por Dakota Fanning.

Personagem: Joey Naylor – Filho pré-adolescente de Nick Naylor.

William Hall Macy, Jr – ator americano ganhador do Emmy Award e nomeado ao Óscar, mais

conhecido pelo papel de Jerry Lundegaard no filme Fargo.

Personagem: Senator Ortolan Finistirre – principal inimigo de Nick Naylor na trama.

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Jonathan Kimble "J. K." Simmons – é um ator americano, conhecido pelo seu papel na série Oz, da

HBO, como o neonazista Vernon Schillinger.

Personagem: Budd "BR" Rohrabacher – Diretor de Nick Naylor na trama.

David Koechner – ator, comediante e cantor americano.

Personagem: Bobby Jay Bliss – lobista amigo de Nick Naylor.

Rob Lowe – Começou a fazer filmes na adolescência. Nos anos 80 faz parte do Brat Pack, um grupo de

atores e atrizes jovens. Em 1984 foi indicado ao Globo de Ouro pela atuação em Thursday's Child, um filme

para a televisão. Em 1988 foi novamente indicado ao mesmo prêmio pela atuação em Square Dance. Em

2000 e 2001 voltou a ser indicado ao Globo de Ouro pelo papel no seriado The West Wing. Em 2001 foi

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indicado ao Emmy pela atuação no mesmo seriado. Trabalhou no seriado Brothers & Sisters como o

senador da Califórnia Robert McCallister até a quarta temporada. Atualmente está fazendo o seriado Parks

and Recreation.

Personagem: Jeff Megall – Produtor de Hollywood.

Robert Selden Duvall – ator, produtor e cineasta americano. Duvall já venceu um Oscar, quatro Globos de

Ouro, dois Prêmios Emmy, um BAFTA e um SAG Awards, ao longo da sua carreira. Começou a sua carreira

no início dos anos 60 em séries de televisão e apenas em 1962 fez o seu primeiro filme, To Kill a

Mockingbird (O Sol é Para Todos). Duvall é mais conhecido pelas atuações em clássicos, como The

Godfather (O Poderoso Chefão), The Godfather Part II (O Poderoso Chefão: Parte II) e Apocalypse Now.

Ganhou o Oscar de Melhor Ator em 1984, com o filme Tender Mercies (A Força do Carinho). Foi indicado

como Melhor Ator outras duas vezes, e mais três como Coadjuvante. Dirigiu e escreveu duas obras: The

Apostle (O Apóstolo), de 1997, e Assassination Tango (O Tango e o Assassino), de 2002.

Personagem: Doak "Capitão" Boykin

Adam Jared Brody – ator americano mais conhecido por interpretar Seth Cohenna extinta série The O.C.

Personagem: Jack