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ANÁLISE TÉRMICA E ECONÔMICA DO CICLO COMBINADO INTEGRADO
COM GASEIFICAÇÃO DA CASCA DE ARROZ.
Gabriel Campbell de Oliveira
Projeto de Graduação apresentado ao Curso
de Engenharia Mecânica da Escola
Politécnica, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de
Engenheiro.
Orientador:
Prof. Antonio MacDowell de Figueiredo,
Dr.Ing.
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2014
i
Oliveira, Gabriel Campbell de
Análise Térmica e Econômica do Ciclo Combinado com
Gaseificação Integrada da Casca de Arroz / Gabriel Campbell de
Oliveira – Rio de Janeiro: UFRJ / Escola Politécnica, 2014.
IX, 64 p.:il.; 29,7 cm
Orientador: Antonio MacDowell de Figueiredo
Projeto de Graduação – UFRJ/ Escola Politécnica/ Curso
de Engenharia Mecânica, 2014.
Referências Bibliográficas: p. 53-57
1. Ciclo Combinado. 2. Gaseificação. 3. Biomassa. 4. Casca de
Arroz. 5. Energia. I. Figueiredo, Antonio MacDowell de II.
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Escola Politécnica,
Curso de Engenharia Mecânica. III. Título.
ii
“A mente é como um paraquedas, só funciona quando está aberta.”
Frank Zappa
iii
Agradecimentos
À toda minha família, em especial meus pais e minha irmã, pois constituem a base de
tudo o que sou hoje, e que me apoiaram em todas as escolhas e caminhos traçados;
À todos os meus amigos que ajudaram na minha formação como pessoa e profissional;
Aos meus colegas de faculdade e companheiros de estudo que tornaram a caminhada
pela graduação menos penosa e mais divertida. Em especial, Bernardo Gelelete, Danilo
Dias, Marcus Vinicius e Vicente Curi, pois transformaram longas horas de estudo em
momentos agradáveis e de compartilhamento de conhecimento;
À todos os professores da Escola Politécnica da UFRJ, pela dedicação na profissão de
docente e pelos ensinamentos transmitidos. Em especial ao professor Antonio
Figueiredo, pela atenção e valiosa orientação.
iv
Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/ UFRJ como parte
dos requisitos necessários para a obtenção do grau de Engenheiro Mecânica.
ANÁLISE TÉRMICA E ECONÔMICA DO CICLO COMBINADO INTEGRADO
COM GASEIFICAÇÃO DA CASCA DE ARROZ
Gabriel Campbell de Oliveira
Fevereiro/2014
Orientador: Antonio MacDowell de Figueiredo
Curso: Engenharia Mecânica
No atual contexto de aumento da demanda de energia e dependência do uso de
combustíveis fósseis, o uso da tecnologia de gaseificação de biomassa com ciclo
combinado integrado surge com uma alternativa de gerar eletricidade utilizando fontes
renováveis, proporcionando a diversificação da matriz energética mundial e
contribuindo para um futuro sustentável.
Portanto, o objetivo deste trabalho é apresentar as principais tecnologias
utilizadas em ciclos combinado com gaseificação integrada e analisar a viabilidade
técnica e econômica de uma planta que utiliza a gaseificação da casca de arroz para seu
funcionamento.
Para a modelagem do ciclo combinado, foi realizada uma simulação térmica do
seu funcionamento, resultando na avaliação dos seus principais indicadores, como
potência produzida e eficiência energética.
Palavras-chave: Ciclo Combinado, Gaseificação, Biomassa, Casca de Arroz, Energia.
v
Abstract of Undergraduate Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment of
the requirements for the degree of Engineer.
THERMAL AND ECONOMICS ANALYSIS OF A COMBINED CYCLE
INTEGRATED WITH RICE HUSK GASIFICATION
Gabriel Campbell de Oliveira
February/2014
Advisors: Antonio MacDowell de Figueiredo
Course: Mechanical Engineering
Nowadays, considering the increasing of energy demand and dependence of
fossil fuels, the use of integrated gasification combined cycle offers an alternative to
generate energy using renewable sources, providing diversification of energy source and
contributing to a sustainable future.
Considering that, the objective of this study is to present the main technologies
used in integrated gasification combined cycles and analyze the technical and economic
viability of a plant that uses gasification of rice husk for its operation.
To perform the model of a combined cycle, a thermal simulation was made,
resulting in the evaluation of the main parameters calculated, such as power and
efficiency.
Keywords: Combined Cycle, Gasification, Biomass, Husk Rice, Energy.
vi
Índice:
1. Capítulo 1 - Introdução ............................................................................................. 1
2. Capítulo 2 – Ciclo combinado integrado à Gaseificação da biomassa ........................ 6
2.1 – Ciclos Termodinâmicos .................................................................................... 6
2.1.1 – Turbinas a Gás e o Ciclo Brayton ............................................................... 7
2.1.1.1 – Resfriamento Intermediário ................................................................. 9
2.1.1.2 – Reaquecimento ................................................................................. 10
2.1.1.3 – Regeneração ..................................................................................... 10
2.1.1.4 – Injeção de Vapor ............................................................................... 11
2.1.2 – Turbinas a Vapor e o Ciclo Rankine ......................................................... 11
2.1.2.1 – Diminuição da Pressão no Condensador ............................................ 12
2.1.2.2 – Superaquecimento do Vapor ............................................................. 13
2.1.2.3 – Aumento da Pressão na Caldeira ....................................................... 13
2.1.3 – Ciclo Combinado ..................................................................................... 13
2.2 – Gaseificação da Biomassa ............................................................................... 15
2.2.1 – Histórico da Gaseificação ......................................................................... 15
2.2.2 – Processo de Gaseificação .......................................................................... 15
2.2.3 – Gaseificadores .......................................................................................... 16
2.2.3.1 – Gaseificador de Leito Fixo ................................................................ 17
2.2.3.2 – Gaseificador de Leito Fluidizado ....................................................... 20
2.2.4 – Filtros ....................................................................................................... 21
2.3 – Integração Ciclo Combinado e Gaseificadores ................................................ 22
2.3.1 – Adaptações do Ciclo Brayton para Gases com Baixo Poder Calorífico ..... 25
3. Capítulo 3 – Estudo de um Ciclo Combinado com Gaseificação da Casca de Arroz 27
3.1 – Potencial da Geração de Energia Utilizando Casca de Arroz ........................... 27
3.2 – Gaseificação da Casca de Arroz ...................................................................... 28
3.3 – Simulação e Análise Termodinâmica .............................................................. 30
3.3.1 – Dimensionamento .................................................................................... 31
3.3.2 – Modelagem do Ciclo ................................................................................ 33
3.3.2.1 – Premissas de Modelagem .................................................................. 34
3.3.2.2 - Cálculo do Calor Fornecido ............................................................... 34
3.3.2.3 – Cálculo da Vazão Mássica da Turbina a Gás ..................................... 35
3.3.2.4 – Simulação do Ciclo Combinado ........................................................ 36
3.3.3 – Análise da Variação da Temperatura na Saída da Turbina a Gás ............... 37
vii
3.3.3.1 – Análise do Trabalho Produzido ......................................................... 37
3.3.3.2 – Análise da Exergia ............................................................................ 39
3.3.3.3 – Conclusão da Simulação ................................................................... 42
3.3.4 – Resultados Simulação Ciclo Combinado .................................................. 43
3.4 – Análise de Viabilidade Econômica .................................................................. 44
3.4.1 - Valor de Presente Líquido (VPL) .............................................................. 45
3.4.2 - Taxa Interna de Retorno (TIR) .................................................................. 45
3.4.3 - Tempo de Retorno do Investimento (Payback) .......................................... 45
3.4.4 - Custo da Energia (COE) ............................................................................ 46
3.4.5 – Modelo de Avaliação Econômica ............................................................. 46
3.4.6 – Premissas da Modelagem ......................................................................... 47
3.4.7 – Resultados da Modelagem ........................................................................ 49
4. Capítulo 4 – Conclusão ........................................................................................... 51
5. Referências Bibliográficas....................................................................................... 53
Apêndice A – Cálculo da Quantidade de Calor Necessária para Parboilização ............. 58
A.1 - Premissas........................................................................................................ 58
A.2 – Cálculos ......................................................................................................... 58
Apêndices B – Dados e Gráficos T x s do Ciclo Combinado ....................................... 60
viii
Índice de Figuras
Figura 1 – População Mundial desde 10.000 anos antes de Cristo. (HOTAKAINEN,
2011) ............................................................................................................................ 1
Figura 2 – Projeção da população mundial (ALLIANZ, 2013) ...................................... 2
Figura 3 – Taxa de crescimento populacional ao ano. (HOTAKAINEN, 2011) ............. 2
Figura 4 – Demanda de Energia no Mundo (MONGABAY, 2009) ............................... 3
Figura 5 – Eletricidade gerada no mundo por fonte (IEA, 2008) .................................... 4
Figura 6 – Turbina a gás em ciclo aberto ....................................................................... 7
Figura 7 - Evolução da Temperatura de Entrada dos Gases, do Limite de Resistência ... 8
dos Materiais e dos Sistemas de Refrigeração das Palhetas – (SCHILKE, 1996) ........... 8
Figura 8 - Eficiência termodinâmica do ciclo Brayton de acordo com a temperatura de
entrada dos gases na turbina e com a taxa de compressão – (ARONGAUS, 1996) ....... 9
Figura 9 – Ciclo Combinado ....................................................................................... 14
Figura 10 - Gaseificador contracorrente ...................................................................... 18
Figura 11 - Gaseificador concorrente........................................................................... 19
Figura 12 - Gaseificador de Leito Fluidizado............................................................... 20
Figura 13 – Filtro de Manga ........................................................................................ 22
Figura 14 – Esquema simplificado de um ciclo combinado com gaseificação integrada
................................................................................................................................... 23
Figura 15 – Quantidade de turbina a gás instaladas em 2020 (HERMSMEYER, 2008) 25
Figura 16 – Modificação Manifold para gases de baixo poder calorífico
(NASCIMENTO, 2009) .............................................................................................. 26
Figura 17 – Modificação câmara de combustão (NASCIMENTO, 2009) ..................... 26
Figura 18 – Esquema do ciclo combinado simulado no software CyclePad ............... 366
Figura 19 – Gráfico da variação da potência líquida produzida .................................. 388
Figura 20 – Variação de Exergia no ponto 1 .............................................................. 400
Figura 21 – Variação da Exergia no ponto 8 .............................................................. 411
Figura 22 – Variação da Destruição de Exergia do ciclo. ........................................... 411
Figura 23 - Diagrama T x s do Ciclo Brayton.................................................................63
Figura 24 - Diagrama T x s do Ciclo Rankine.................................................................64
ix
Índice de Tabelas
Tabela 1 - Exemplos de plantas de ciclo combinado com gaseificação integrada
localizadas na Europa. (DOE,NETL 2007).....................................................................25
Tabela 2 – Potencial de geração de energia elétrica a partir da casca de arroz (COELHO,
2008) ........................................................................................................................ 277
Tabela 3 – Valores de PCI da casca de arroz gaseificada encontrados em diferentes
estudos .................................................................................................................... 2929
Tabela 4 – Valores de PCI de diferentes combustíveis (FIGUEIREDO, 2010) .......... 300
Tabela 5 – Composição molar do gás proveniente da gaseificação da casca de arroz
(MURARO 2008) ..................................................................................................... 300
Tabela 6 – As vinte cidades que mais produzem arroz no Brasil (CONAB, 2011) ..... 322
Tabela 7 – Usinas termoelétricas movidas a casca de arroz no Brasil (ANEEL, 2008)333
Tabela 8 – Especificações turbinas Siemens (SIEMENS, 2013) ................................ 355
Tabela 9 – Variação de potência líquida produzida .................................................... 388
Tabela 10 – Variação de exergia nos pontos 1 e 8 e destruição de exergia do ciclo .... 400
Tabela 11 – Calor Necessário na Parboilização do Arroz........................................... 433
Tabela 12 – Resultados obtidos no ciclo Brayton e Rankine ...................................... 433
Tabela 13 – Resultados obtidos no ciclo Combinado ................................................. 444
Tabela 14 – Estrutura do Demonstrativo do Resultado do Exercício .......................... 477
Tabela 15 – Impostos aplicados na modelagem ......................................................... 488
Tabela 16 – Valores de custos fixos e variáveis para ciclos combinados com
gaseificação de biomassa (NETO, 2001) ................................................................... 499
Tabela 17 – Modelagem do Demonstrativo do Resultado do Exercício .................... 5050
Tabela 18 – Análise Financeira para taxa de desconto de 12% a.a. ............................ 500
Tabela 19 – Análise Financeira para taxa de desconto de 1,2% a.a. ........................... 511
Tabela 20 - Dados Componentes do Ciclo……………………………………………..60
Tabela 21- Dados Pontos do Ciclo..................................................................................61
Tabela 22 - Dados Ciclo Combinado..............................................................................62
1
1. Capítulo 1 - Introdução
A forma com que vivemos no mundo atual, se deve aos grandes avanços em
tecnologia ao longo dos últimos anos. Importantes conceitos de convivência humana
sofreram grandes alterações, sendo a energia elétrica responsável por diversas
mudanças. Transporte, comunicação e saúde, são alguns exemplos de como a energia
mudou o funcionamento destes setores ao longo do tempo.
Apesar do uso de energia ser algo essencial nos dias de hoje, sua utilização é
algo recente. No século 18, grandes cientistas começaram a desenvolver o uso de
eletricidade, Benjamin Franklin, Alessandro Volta, André-Marie Ampère, Georg Ohm e
Nikola Tesla foram alguns dos responsáveis por este avanço. Com o estudo do
comportamento da eletricidade, esta forma de energia deixou de ser algo desconhecido e
muitas vezes apenas objeto de contemplação, como raios e relâmpagos, e passou a ser
peça importante da sociedade humana. A partir de então, o uso da eletricidade aumentou
de forma significativa ao longo dos últimos anos, tornando a geração desta energia um
grande desafio.
O consumo de energia está diretamente ligado ao aumento da população
mundial e do aumento produto interno bruto, pois ela é utilizada nos diferentes
processos industriais e no convívio das pessoas. A população mundial cresce
continuamente há 600 anos, desde o fim da pandemia de peste bubônica, conhecida
como peste negra, onde morreu aproximadamente um terço da população mundial na
época.
Figura 1 – População Mundial desde 10.000 anos antes de Cristo. (HOTAKAINEN, 2011)
2
A taxa de crescimento populacional teve grande aumento a partir do século 19,
concomitantemente com os maiores progressos no estudo da energia elétrica.
Figura 2 – Projeção da população mundial (ALLIANZ, 2013)
Apesar desta taxa estar diminuindo nos últimos anos, principalmente nos países
desenvolvidos, a expectativa é que a população humana continue aumentando nos
próximos anos, e consequentemente a demanda por energia elétrica.
Figura 3 – Taxa de crescimento populacional ao ano. (HOTAKAINEN, 2011)
3
Figura 4 – Demanda de Energia no Mundo (MONGABAY, 2009)
Portanto, podemos concluir que no cenário atual do mundo, a necessidade de
gerar mais energia é fundamental para a manutenção do estilo de vida humano. Cada
vez mais equipamentos que necessitam desta energia para funcionamento estão sendo
utilizados, podemos citar como exemplos, computadores, celulares, ar-condicionado,
chuveiro elétrico, lâmpadas, entre outros. Somado a isto, outro desafio é o fato da
eletricidade não poder ser armazenada de modo eficiente e em grandes quantidades.
Portanto é fundamental o estudo, desenvolvimento e planejamento da geração de
eletricidade.
O mundo sempre teve o carvão como principal como insumo para geração de
energia elétrica, como observado na figura 5. O carvão responde por 41% da produção
de eletricidade no mundo e o minério manterá esta posição de fonte mais utilizada, por
mais 30 anos. Em seguida vem o gás natural, com 20,1%. (IEA, 2008). Estes
combustíveis geram grande impacto no meio ambiente, além de não serem renováveis.
No cenário atual, 63,6% da energia elétrica utilizada no mundo são deste tipo de fonte,
tornando o desafio da geração de eletricidade mais importante ainda.
4
Figura 5 – Eletricidade gerada no mundo por fonte (IEA, 2008)
Com o apresentado, podemos concluir que o mundo hoje necessita gerar cada
vez mais energia, sendo esta geração o mais eficiente possível, menos poluente e que
utilize recursos renováveis. Neste contexto, podemos destacar a geração de energia
elétrica a partir de biomassa.
Do ponto de vista energético, biomassa é toda matéria orgânica (de origem
animal ou vegetal) que pode ser utilizada na produção de energia. Assim como a energia
hidráulica e outras fontes renováveis, a biomassa é uma forma indireta de energia solar.
A energia solar é convertida em energia química, através da fotossíntese, base dos
processos biológicos de todos os seres vivos. Embora grande parte do planeta esteja
desprovida de florestas, a quantidade de biomassa existente na terra é da ordem de dois
trilhões de toneladas; o que significa cerca de 400 toneladas per capita. (RAMAGE &
SCURLOCK, 1996).
Dois fatores importantes fazem com que a geração de energia elétrica a partir da
biomassa tenda a aumentar nos próximos anos (ROSILLO-CALLE et al., 2000):
i) Desenvolvimento de novas tecnologias, que tornam a transformação da
biomassa em energia elétrica mais eficiente.
5
ii) Reconhecimento das vantagens ambientais do uso racional da biomassa,
principalmente no controle das emissões de CO2 e enxofre.
A produção em larga escala da energia elétrica, proveniente da biomassa, no
Brasil ocorre em conjunto com a produção agrícola. A biomassa é obtida pelo
processamento dos resíduos de grandes plantações de soja, arroz, milho ou cana-de-
açúcar. Assim, do milho é possível utilizar, o sabugo, colmo, folha e palha. Da soja e
arroz, os resíduos que permanecem no campo, tratados como palha. Na cana-de-açúcar,
o bagaço, a palha e o vinhoto (ANEEL, 2008).
Existem várias técnicas para transformar a matéria-prima em combustível
energético. A mais simples é a combustão direta desta matéria-prima para ser utilizado
em caldeiras para geração de vapor. Também é possível realizar a pirólise do
combustível, que consiste na queima deste material em pouca presença de ar, a fim de
obter um combustível de maior poder energético. Em geral, este processo é utilizado na
transformação de lenha em carvão vegetal. Outra transformação é a gaseificação, que
ocorre por meio de reações termoquímicas que transformam o combustível sólido em
gás, que pode ser utilizado em motores de combustão interna e em turbinas. Podemos
destacar também o processo de tratamento de dejetos orgânicos, que consiste na
decomposição do material orgânico pela ação de bactérias, formando o biogás,
composto por metano (CH4) entre outros gases. Um processo bastante utilizado no
Brasil é de conversão dessas energias através da fermentação dos açúcares presentes na
matéria-prima a fim de se obter o etanol. Este produto final pode ser utilizado como
combustível em termoelétricas e em automóveis. Por fim, o último processo de
conversão é a transesterificação, que consiste na reação química entre óleos vegetais e
metanol ou etanol, produzindo biodiesel, por exemplo.
A biomassa é uma das fontes para produção de energia com maior potencial de
crescimento nos próximos anos. Tanto no mercado internacional quanto no interno, ela
é considerada uma das principais alternativas para a diversificação da matriz energética
e a consequente redução da dependência dos combustíveis fósseis. A biomassa
respondeu pela produção total de 183,4 TWh em 2005, o que correspondeu a pouco
mais de 1% da energia elétrica produzida no mundo naquele ano (WEC, 2007).
6
Ainda segundo o World Energy Council, o líder mundial na geração de energia
elétrica a partir de biomassa foi o Estados Unidos, que em 2005 produziu 56,3 TWh,
representando 30,7% do total mundial. Na sequencia estão Alemanha e Brasil, com
produção próxima dos 13,4 TWh e participação de 7,3% do total mundial.
No Brasil, a biomassa foi a segunda principal fonte de energia elétrica em 2011.
Ela respondeu por 6,5% da oferta de energia, atrás apenas da hidroeletricidade, que foi
responsável por 81,7 da produção. (EPE, 2012).
Em 2008, existiam 302 termelétricas movidas à biomassa no país. Desse total de
usinas, 13 são abastecidas por licor negro (resíduo da celulose) com potência total de
944 MW; 27 por madeira (232 MW); três por biogás (45 MW); quatro por casca de
arroz (21 MW) e 252 por bagaço de cana (4 mil MW). Uma das características desses
empreendimentos é o pequeno porte com potência instalada de até 60 MW, o que
favorece a instalação nas proximidades dos centros de consumo e suprimento (ANEEL,
2008).
Uma das principais tecnologias utilizadas por estas usinas de geração de energia
elétrica é a do ciclo combinado integrado com a gaseificação da biomassa. Esta
tecnologia consegue alcançar elevadas eficiências térmicas e gerar grande quantidade de
eletricidade. Portanto, diante do cenário apresentado, este trabalho visa o estudo desta
tecnologia, suas características, aplicações e o seu estudo termoeconômico.
2. Capítulo 2 – Ciclo combinado integrado à Gaseificação da biomassa
2.1 – Ciclos Termodinâmicos
Grande parte da energia elétrica produzida nos dias de hoje, deriva da
transformação da energia química contida nos combustíveis, através de processos e
equipamentos desenvolvidos pela humanidade. As termoelétricas, fundamentais nos
sistemas de geração de eletricidade em todo o mundo, utilizam esta transformação da
energia contida nos combustíveis em energia térmica, para posteriormente ser
convertida em eletricidade. O funcionamento destes equipamentos é baseado em
diversos ciclos termodinâmicos, entre eles o ciclo Brayton e o ciclo Rankine.
7
2.1.1 – Turbinas a Gás e o Ciclo Brayton
O ciclo Brayton foi proposto por George Brayton para ser utilizado no motor
alternativo desenvolvido por ele em 1870. Hoje, é apenas usado em turbina a gás, em
que os processos de compressão e expansão ocorrem em um maquinário rotativo. Em
geral, as turbinas a gás operam em um ciclo aberto, ou seja, o fluido de trabalho é
admitido na pressão atmosférica e os gases de escape, após passarem pela turbina, são
descarregados de volta na atmosfera sem que retornem à admissão. O ciclo da turbina a
gás se inicia quando o ar fresco, em condições ambientes, é admitido no compressor,
onde a pressão e a temperatura são elevadas. O ar à alta pressão entra na câmara de
combustão, na qual o combustível é queimado, adicionando calor à mistura ar e
combustível à pressão constante. Em seguida, os gases provenientes da queima, em alta
temperatura, entram na turbina, onde se expandem até a pressão atmosférica enquanto
produzem potência. Os gases de exaustão que deixam a turbina são jogados no meio
ambiente, caracterizando, como mencionado acima, um ciclo aberto.
Figura 6 – Turbina a gás em ciclo aberto
O funcionamento da turbina a gás apresentou grande crescimento desde o início
do seu desenvolvimento em 1930. As primeiras turbinas a gás fabricadas nos anos de
1940 e 1950, tinham eficiências próximas de 17%, principalmente devido a baixa
eficiência do compressor e da baixa temperatura de entrada na turbina (CENGEL et al,
2007). Portanto um dos principais desafios tecnológicos das turbinas foi e continua
sendo a busca do aumento da eficiência do ciclo. O aumento da temperatura de entrada
dos gases na turbina tem sido a principal medida utilizada para este aumento de
8
eficiência. As temperaturas de entrada aumentaram de forma constante de cerca de
800°C nos anos de 1950 a 1425°C ou mais nos dias de hoje. Este aumento está
associado ao desenvolvimento de novas tecnologias de refrigeração de palhetas da
turbina, como revestimento das pás das turbinas com camadas cerâmicas e resfriamento
delas com ar da descarga do compressor, e ao desenvolvimento de novos materiais,
resistentes às temperaturas mais elevadas.
Figura 7 - Evolução da Temperatura de Entrada dos Gases, do Limite de Resistência
dos Materiais e dos Sistemas de Refrigeração das Palhetas – (SCHILKE, 1996)
O desempenho das primeiras turbinas também era prejudicado pelas
ineficiências dos componentes das turbomáquinas do ciclo. Com o advento dos
computadores e consequentemente técnicas mais avançadas de projeto destes
componentes, possibilitou a melhor adequação da aerodinâmica de turbinas e
compressores, proporcionando menores perdas. Portanto, as taxas de compressão dos
gases nos compressores também aumentaram ao longo desses anos.
Os aumentos da temperatura de entrada dos gases na turbina e da taxa de
compressão do compressor proporcionaram um aumento significativo na eficiência do
ciclo, conforme demonstrado na figura 8.
9
Figura 8 - Eficiência termodinâmica do ciclo Brayton de acordo com a temperatura de entrada dos gases na turbina e com a taxa de compressão – (ARONGAUS, 1996)
Outra importante vertente tecnológica objetivando o aumento da eficiência das
turbinas a gás são as modificações do ciclo básico. A eficiência do ciclo das primeiras
turbinas a gás praticamente dobraram com a incorporação destas modificações. Porém,
estas alterações impactam em um custo inicial e de operação maior, se tornando,
portanto, somente justificáveis em casos em que as despesas dos combustíveis
compensem o aumento do custo destas alterações. Podemos citar quatro modificações
comumente utilizadas visando o aumento das eficiências de turbinas a gás: resfriamento
intermediário, regeneração, reaquecimento e injeção de vapor.
2.1.1.1 – Resfriamento Intermediário
Tanto o resfriamento intermediário quanto o reaquecimento (que será discutido a
frente) se baseiam em um princípio simples: O trabalho de compressão ou expansão em
regime permanente é proporcional ao volume específico do fluido. Portanto, o volume
específico do fluido de trabalho deve ser o mais baixo possível durante o processo de
compressão e o mais alto possível durante um processo de expansão (CENGEL et al,
2007). Como o volume específico aumenta de acordo com o aumento da temperatura, o
trabalho de compressão será minimizado quando a compressão se aproximar de um
processo isotérmico.
Portanto, turbinas a gás podem utilizar um resfriador intermediário, também
chamado de intercooler, para reduzir a temperatura do ar entre os estágios de
10
compressão. Desta forma, o processo de compressão se aproxima de uma curva
isotérmica, impactando numa redução da potência necessária para a compressão do ar.
2.1.1.2 – Reaquecimento
O objetivo do reaquecimento é manter a temperatura no processo de expansão
constante, de forma a manter o volume específico do gás alto, garantindo um maior
valor do trabalho de expansão. Nesta alteração do ciclo básico, adiciona-se uma câmara
de combustão intermediária e divide-se a expansão na turbina em dois estágios ou mais
estágios. Assim, o ar comprimido entra na primeira câmara de combustão e reage com o
combustível para realizar trabalho na primeira turbina e, em determinado ponto, quando
a pressão é ainda significativa, os gases são direcionados a outra câmara de combustão e
recebem nova carga de energia (reaquecimento) mediante a queima de mais
combustível e então, seguem para a segunda turbina para produzir mais trabalho e assim
por diante. Em geral a combustão nas turbinas a gás ocorre com quatro vezes a
quantidade de ar necessária para efetuar uma combustão completa dos gases e evitar
temperaturas excessivas. Portanto, este ar adicional utilizado na câmara de combustão
garante a presença de oxigênio nos gases na saída da primeira turbina, possibilitando as
queimas de combustível nos processos de reaquecimento.
Apesar de esta modificação garantir maior potência produzida, ela implica num
maior gasto de combustível e consequentemente numa redução do rendimento do ciclo,
devido à queima de mais combustível nos processos de reaquecimento.
2.1.1.3 – Regeneração
Os gases provenientes do fim do processo de expansão nas turbinas ainda estão
com uma temperatura elevada, portanto este calor pode ser aproveitado para aquecer os
gases na saída do compressor, antes de entrarem na câmara de combustão. Isto garante
uma redução no consumo de combustível, pois o calor fornecido na câmara de
combustão deverá ser menor e consequentemente, esta modificação proporciona um
aumento da eficiência do ciclo. Este aquecimento dos gases na saída do compressor
ocorre utilizando um trocador de calor, o que implica num aumento da área física do
11
ciclo, pois para uma troca de calor eficiente é necessário um trocador de calor com
grandes dimensões.
Em geral, a regeneração é utilizada em conjunto com o resfriamento
intermediário e o reaquecimento, isto ocorre devido a menores temperaturas do ar ao
sair do compressor e a maiores temperaturas do ar na saída da turbina, proporcionando
uma melhor troca térmica entre esses fluidos.
2.1.1.4 – Injeção de Vapor
O ciclo com injeção de vapor começou a ser utilizado em meados de 1980 e seu
objetivo é aumentar o trabalho gerado na turbina através da adição de vapor na câmara
de combustão. Este vapor é gerado durante a troca de calor dos gases na saída da turbina
e água líquida, que deve ser fornecida continuamente ao ciclo. Esta adição de vapor
proporciona uma diminuição nas emissões de NOx, pois diminui a temperatura de
queima dos combustíveis. Além disso, a adição de vapor implica em um aumento da
potência gerada devido ao aumento do fluxo mássico e do calor específico do fluido de
trabalho que entra na turbina.
Esta modificação garante maiores eficiências térmica quando comparado ao
ciclo básico, e permite uma conversão em ciclo combinado, devido à parte dos
componentes dos ciclos serem comuns. Em contrapartida, a utilização deste ciclo
implica na necessidade de sistemas complexos de tratamento de água, pois é necessário
um abastecimento contínuo de água purificada.
2.1.2 – Turbinas a Vapor e o Ciclo Rankine
O ciclo Rankine foi idealizado por William John Macquorn Rankine, e seu
conceito é o ciclo ideal das usinas de potência a vapor. Em um ciclo Rankine, a água
entra na bomba como líquida saturada e é comprimida até a pressão de operação da
caldeira. A temperatura da água aumenta ligeiramente no processo de compressão,
devido à diminuição do volume específico da água. Na caldeira, a água entra como
líquido comprimido e sai como vapor superaquecido, devido à adição de calor dos gases
provenientes da queima de combustível, reatores nucleares, entre outras fontes. O vapor
12
d’água superaquecido entra na turbina, na qual ele se expande e produz potência,
girando um eixo que está conectado a um gerador elétrico. A pressão e a temperatura
caem durante o processo de expansão, transformando o vapor superaquecido em uma
mistura de líquido e vapor saturado com título elevado. Em seguida o vapor é
condensado a pressão constante em um condensador, que funciona como um trocador
de calor, onde ao rejeitar calor para o ambiente, faz com que o vapor se resfrie e
condense. A água deixa o condensador como líquido saturado e entra na bomba
completando o ciclo.
Assim como no ciclo Brayton, é possível modificar o ciclo Rankine para
aumentar sua eficiência. Este aumento da eficiência pode gerar grande economia na
utilização de combustível, uma vez que as usinas de potência a vapor são responsáveis
pela produção da maior parte da energia elétrica no mundo. Essas modificações buscam
aumentar a eficiência através do aumento da temperatura média na qual o calor é
transferido para o fluido de trabalho na caldeira ou diminuir a temperatura média na
qual o calor é rejeitado do fluido de trabalho no condensador. As três formas mais
comuns de modificação do ciclo Rankine são:
2.1.2.1 – Diminuição da Pressão no Condensador
O vapor no condensador é uma mistura saturada na temperatura de saturação
correspondente à pressão dentro do condensador. Assim, a diminuição da pressão de
operação no condensador implica na diminuição da temperatura do vapor e
consequentemente na temperatura na qual o calor é rejeitado. Portanto, esta modificação
provoca um aumento na eficiência global do ciclo.
É comum a utilização de pressões de operação do condensador menores que a
pressão atmosférica. Com isso, ela ocasiona dois efeitos indesejáveis: a possibilidade de
infiltração do ar ambiente para o interior do condensador e o aumento da umidade do
vapor nos estágios finais da turbina. Este aumento da umidade na turbina provoca
erosão e diminuição na eficiência da turbina. Portanto, é comum a modificação de
diminuição de pressão no condensador ser acompanhada do superaquecimento do
vapor, que será descrito no próximo item.
13
2.1.2.2 – Superaquecimento do Vapor
O aumento da temperatura média com a qual o calor é transferido para o vapor
pode ser realizado sem aumentar a pressão da caldeira, isto ocorre através do
superaquecimento do vapor a temperaturas elevadas.
Apesar do aumento do consumo de combustível devido ao maior fornecimento
de calor ao ciclo, a eficiência global aumenta devido ao aumento do trabalho líquido.
Além disso, o superaquecimento do vapor diminui a presença de umidade deste vapor
ao ser expandido na turbina, prevenindo a ocorrência de erosão e aumentando a
eficiência da turbina. Este superaquecimento do vapor é limitado pelos materiais
utilizados na turbina, pois eles devem resistir às altas temperaturas utilizadas.
2.1.2.3 – Aumento da Pressão na Caldeira
O aumento da pressão na caldeira provoca o aumento da temperatura de ebulição
da água, portanto, a temperatura média com a qual o calor é transferido para o vapor
também sofre um aumento. Com isso, a eficiência global do ciclo é elevada.
As pressões de operação das caldeiras aumentaram gradualmente ao longo dos
anos, de cerca de 2,7 MPa em 1922 para mais de 30 MPa nos dias de hoje. (CENGEL et
al, 2007). Pesquisas em metalurgia para utilização de materiais que resistem a maiores
pressões e temperaturas continuam sendo incentivadas nos dias hoje, principalmente
devido ao aumento da eficiência do ciclo que estas modificações proporcionam.
2.1.3 – Ciclo Combinado
Um ciclo combinado é uma central termoelétrica constituída por dois ou mais
ciclos termodinâmicos em uma mesma planta cuja finalidade é produzir energia elétrica.
Diferentes máquinas térmicas e processos podem ser combinados, seja trabalhando com
meios fluidos distintos, ou com meios fluidos iguais, e ciclos empregando as mais
diferentes substâncias podem ser construídos. Nos dias de hoje, o tipo de ciclo
combinado que tem encontrado ampla aplicação, é o que utiliza a combinação de
14
turbinas a gás (ciclo Brayton) juntamente com turbinas a vapor (ciclo Rankine),
esquematicamente apresentado na figura 9.
Figura 9 – Ciclo Combinado
Neste ciclo a energia térmica contida nos gases quentes exaustos pela turbina a
gás é utilizada em um trocador de calor, também chamado de caldeira de recuperação,
para produzir vapor. Esta produção de vapor no trocador de calor é viabilizada devido
às altas temperaturas com que o ar sai da turbina a gás, em geral acima dos 500°C. Este
vapor é então utilizado como fluido de acionamento em uma turbina a vapor para gerar
trabalho adicional.
O acréscimo de potência alcançado em um ciclo combinado é, em geral, da
ordem de 50% da potência da turbina a gás e a eficiência global passa da média de 30%
do ciclo simples e atinge valores bem acima dos 40% em ciclos combinados comerciais.
A produção de vapor em um ciclo combinado pode ser elevada através da
queima suplementar de combustível. Pois os gases de exaustão das turbinas a gás são
ricos em oxigênio devido à utilização de excesso de ar para garantir a combustão
15
completa do combustível, fazendo com que a quantidade ar admitida atinja valores da
ordem de 300% do excesso de ar de combustão, carregando consigo o calor rejeitado.
Por esse motivo podem ser utilizados como comburente em uma caldeira de
recuperação para efetuar uma queima suplementar, gerando quantidade de vapor até 2,5
vezes maior que a gerada em uma caldeira puramente de recuperação de calor dos
gases.
2.2 – Gaseificação da Biomassa
2.2.1 – Histórico da Gaseificação
A tecnologia de gaseificação de combustíveis é conhecida desde o século
passado, tendo ficado praticamente estagnada desde a década de 30, quando o petróleo
começou a ser oferecido em larga escala e a baixos preços no mercado mundial. A
gaseificação de combustíveis sólidos como a biomassa, o carvão mineral ou carvão
vegetal não é uma tecnologia nova, tendo sido utilizada principalmente nos períodos das
guerras mundiais, quando o acesso aos combustíveis tradicionais foi dificultado.
Ao final da década de 70, com a intensificação da crise energética mundial a
partir dos choques do petróleo, verificou-se o despertar do interesse na gaseificação, em
especial de carvão, madeira e o carvão vegetal e, no inicio da década de 90, biomassa
energética, resíduos agrícolas e o bagaço de cana-de-açúcar. Mais recentemente, as
pressões ambientais sob as termelétricas a carvão, associadas à necessidade de atender
as demandas por energia elétrica nos países em desenvolvimento, tem produzido um
esforço mundial significativo para o desenvolvimento comercial da tecnologia da
gaseificação aplicada à geração de energia elétrica em centrais de elevada potência.
(NETO, 2001)
2.2.2 – Processo de Gaseificação
A gaseificação é a conversão de qualquer combustível sólido ou líquido em um
gás energético através da oxidação parcial a temperatura elevada. Esta conversão pode
ser realizada em vários tipos de reatores, chamados gaseificadores. O objetivo da
gaseificação é produzir um combustível gasoso com melhores características de
16
transporte, melhor eficiência de combustão e também que possa ser utilizado como
matéria-prima para outros processos.
Uma instalação de gaseificação é constituída pelos seguintes sistemas e
equipamentos:
pré-processamento: estoque, transporte e redução da biomassa ao
tamanho adequado;
gaseificador, dotado de seção de alimentação apropriada para não
permitir vazamento de gás;
tratamento do gás, com limpeza e, se necessário, resfriamento;
sistema de controle;
tratamento dos resíduos, com disposição adequada.
2.2.3 – Gaseificadores
O gaseificador é um reator químico alimentado com combustível sólido ou
líquido e com uma quantidade controlada de ar forçada para dentro do equipamento em
uma posição ditada pelo projeto. Parte do combustível entra em combustão como em
uma fornalha qualquer e a característica principal da gaseificação é que o fornecimento
de ar é controlado de modo a evitar que a combustão se estenda a toda carga. Pela
queima de parte da carga libera-se a energia que é utilizada na degradação química e
gaseificação do resto do material.
Foram idealizados e desenvolvidos, até hoje, diversos tipos de gaseificadores, a
fim de atender as peculiaridades das características da matéria prima e as necessidades
de gás. A grande maioria dos gaseificadores em comercialização ou em fase de
desenvolvimento é enquadrada segundo o tipo de leito utilizado, em uma das duas
concepções de gaseificadores apresentadas a seguir. (CENBIO, 2002)
Gaseificador de leito fixo;
Gaseificador de leito fluidizado ou leito circulante.
17
Os gaseificadores também podem ser classificados segundo outras
características, como: (NETO, 2001)
Poder Calorífico do Gás Produzido: baixo poder calorífico, até
5 MJ/Nm3, médio Poder Calorífico, de 5 a 10 MJ/Nm3 e alto Poder
Calorífico, de 10 a 40 MJ/Nm3;
Tipo de Agente Gaseificador: ar, vapor d’água, oxigênio, hidrogênio;
Pressão de Trabalho: baixa pressão (atmosférica), pressurizados (até
6 MPa, 59,2 atm);
Natureza da Biomassa: resíduos agrícolas, resíduos industriais,
resíduos sólidos urbanos (lixo), biomassa in natura, biomassa
peletizada, biomassa pulverizada.
2.2.3.1 – Gaseificador de Leito Fixo
Este tipo de gaseificador representa a maioria dos gaseificadores em operação ou
construção no mundo. Os gaseificadores de leito fixo são os mais indicados para
instalações de pequeno porte e eles são classificados segundo a circulação de gases,
podendo ser: concorrente (“downdraft”) ou contracorrente (“updraft”).
O gaseificador mais simples é o de contracorrente, figura 10, onde a entrada de
ar fica na parte de baixo do gaseificador. O fluxo de gás é ascendente, contrário ao fluxo
de combustível que é introduzido pela parte superior e descende pela ação da gravidade
conforme é consumido. Os gaseificadores contracorrente tendem a ter uma eficiência
térmica alta, pelo fato dos gases quentes provenientes da zona de combustão pré-
aquecerem a carga de combustível ao passar por ela. Sua principal característica é a
simplicidade, porém possui a desvantagem de produzir gás extremamente impuro.
(SÁNCHEZ, 2009). Esta impureza se deve principalmente à concentração de alcatrão,
normalmente o gás gerado contém de 10 a 20 % do alcatrão gerado na pirólise do
combustível, com uma concentração da ordem de 100 g/Nm3.
18
Figura 10 - Gaseificador contracorrente
Os gaseificadores de leito fixo mais utilizados são os concorrentes. No
gaseificador concorrente, figura 11, as zonas de combustão e de redução estão
posicionadas de forma oposta aos gaseificadores contracorrente. Com a alimentação de
combustível pelo topo, a alimentação de ar é feita em fluxo descendente (mesmo sentido
do fluxo de combustível) passando pelas zonas de combustão e redução.
19
Figura 11 - Gaseificador concorrente
A característica essencial deste gaseificador é que ele faz com que o ar
introduzido no gaseificador encontre primeiro a biomassa não queimada, portanto a
temperatura máxima ocorre na fase gasosa (não mais na fase sólida). Desta forma os
alcatrões e voláteis provenientes da zona de pirólise são direcionados a passar pela zona
de combustão onde, com condições de operação controladas, serão craqueados. Neste
tipo de gaseificador, o ar injetado no gaseificador, pode queimar até 99,9 % do alcatrão
liberado pelo combustível. (CENBIO, 2002)
Em muitos casos, o diâmetro interno é reduzido na zona de combustão, criando
uma garganta, geralmente feita de material cerâmico substituível. É na garganta que se
posicionam os injetores de ar, arranjados a fim de distribuir o ar de forma mais uniforme
possível. Em todos os arranjos o objetivo é garantir que seja atingida uma temperatura
adequada em toda a secção, a fim de craquear todos os alcatrões que passam por ela.
Esta mudança de sentido faz toda a diferença para um combustível com teor elevado de
matéria volátil como a biomassa.
Este tipo de gaseificador foi largamente empregado na Segunda Guerra
Mundial, principalmente na Europa, devido ao embargo de derivados de petróleo para o
esforço da guerra. Milhares de unidades deste tipo de gaseificador foram construídas.
20
Em geral estas unidades eram constituídas de três conjuntos integrados, uma unidade de
gaseificação, um sistema de resfriamento e limpeza de gases e um motor.
2.2.3.2 – Gaseificador de Leito Fluidizado
Nos gaseificadores de leito fluidizado, figura 12 , as partículas do combustível
são mantidas suspensas em um leito de partículas inertes (areia, cinzas ou alumina)
fluidizadas pelo fluxo de ar, criando melhores condições de transferência de calor e
homogeneidade da temperatura na câmara de reação. Nestas condições, a maior parte
dos voláteis estará em contato com as partículas do leito aquecido, contribuindo para
uma gaseificação mais completa e limpa.
Figura 12 - Gaseificador de Leito Fluidizado
O leito fluidizado foi desenvolvido antes da Segunda Guerra Mundial para
sistemas de gaseificação de carvão mineral de grande capacidade. Após este período
inicial, ele foi adotado pelas indústrias petroquímicas e químicas para o craqueamento
de hidrocarbonetos pesados, secagem entre outras aplicações. Os equipamentos de leito
fluidizado tem como característica, elevadas taxas de produção e de troca de calor. Eles
são mais complicados de operar que os leitos fixos e por esta razão são empregados
majoritariamente em grandes instalações.
21
2.2.4 – Filtros
Alguns elementos devem ser filtrados para que se possa utilizar o gás oriundo da
gaseificação sem que prejudique um motor ou turbina. Os elementos que devem ser
filtrados após a gaseificação são o alcatrão, cinzas volantes e os óxidos de nitrogênio.
(MURARO 2006)
Dependendo da aplicação, os sistemas para controle e limpeza dos gases são
tecnicamente viáveis, mas podem se mostrar caros a ponto de inviabilizar
economicamente o projeto (FERNANDES, 2000).
Se utilizada uma turbina a gás, deve-se considerar a temperatura de entrada dos
gases para manter uma adequada eficiência térmica do ciclo. KINOSHITA (1997)
indica que se deve desenvolver a tecnologia de limpeza de gases quentes para tornar a
geração de energia pela gaseificação da biomassa um processo comercialmente viável.
As tecnologias aplicadas para a limpeza dos gases dependem do uso aos quais estes se
destinam e do ponto no processo a ser aplicada a tecnologia (antes, durante ou depois da
gaseificação).
ZAPOROWSKI (2003) também comenta que o tipo de limpeza do gás
combustível para uso em turbinas tem um impacto significativo na eficiência energética.
A substituição de limpeza de gás a frio por limpeza a quente resulta em um aumento de
2% na eficiência de geração de eletricidade no ciclo combinado. Segundo JANSEN
(2002), o melhor custo beneficio para gaseificadores é filtragem com filtro de manga.
22
Figura 13 – Filtro de Manga
2.3 – Integração Ciclo Combinado e Gaseificadores
As primeiras experiências relevantes de gaseificação no setor elétrico foram
feitas já na década de 60 com plantas que processavam biomassa, resíduos municipais e
resíduos de petróleo. Essas plantas, porém, ainda não operavam em ciclo combinado.
Plantas de gaseificação operando em ciclo combinado foram introduzidas a partir do
início dos anos 90. (HOFFMANN, 2012)
O Ciclo Combinado com Gaseificação Integrada (Integrated Gasification
Combined Cycle – IGCC) vem se desenvolvendo a partir da combinação das duas
tecnologias citadas anteriormente: a geração de energia em ciclo combinado e a
gaseificação de combustíveis sólidos ou líquidos, como demonstrado na figura 14.
23
Figura 14 – Esquema simplificado de um ciclo combinado com gaseificação integrada
A biomassa tem grande potencial na geração de energia, principalmente pela sua
grande oferta. Porém, a geração de energia elétrica a partir deste tipo de combustível é
menos eficiente quando comparado aos combustíveis fósseis. Portanto, a integração
entre o ciclo combinado e a gaseificação da biomassa permite potencializar a geração de
energia, uma vez que o ciclo combinado tem como característica, elevada eficiência
energética.
Além da eficiência energética, o ciclo combinado integrado à gaseificação da
biomassa apresenta como vantagens ambientais o abatimento das emissões de carbono
na atmosfera quando comparada com a energia elétrica oriunda de fontes fósseis, a
redução da destruição de florestas, da inundação de terras agricultáveis e da
interferência em ecossistemas tropicais frágeis quando comparada a geração elétrica
através da fonte hidráulica, o aproveitamento de terras de uso marginal para a
agricultura implantando nelas maciços florestais. Além destas vantagens, pode-se
acrescentar como benefícios de seu emprego a competitividade de unidades de tamanho
reduzido que permitem a descentralização dos centros de geração e a redução dos custos
de transmissão e a criação de empregos rurais.
As principais áreas de dúvidas para aplicação em um projeto comercial são
relacionadas ao abastecimento contínuo do gaseificador com matéria-prima, as opções
24
de gaseificação, a limpeza do gás e a adaptação da turbina a gás para operar com um gás
de baixo poder calorífico.
A maior atratividade dos sistemas de ciclo combinado com gaseificação
integrada está relacionada a mercados específicos, ou nichos de mercado, tais como
projetos com subprodutos economicamente atrativos, áreas com restrições a
combustíveis fósseis ou com custos elevados, áreas com prioridade de desenvolvimento
rural, áreas com disponibilidade de rejeitos ou resíduos diversos e áreas onde os custos
da biomassa são significativamente baixos. (NETO, 2001)
O número de plantas que utilizam este sistema de geração de energia tem
aumentado consideravelmente nos últimos anos. O principal combustível utilizado é o
carvão, devido ao seu elevado poder calorífico e alta disponibilidade. Plantas que
utilizam biomassa como combustível têm como dificuldade a utilização contínua de
biomassa, devido a sua dificuldade de armazenamento e sazonalidade de produção.
Portanto, estas plantas são, geralmente, de menor porte quando comparado as que
utilizam carvão como combustível, conforme demonstra a tabela 1.
Tabela 1 – Exemplos de plantas de ciclo combinado com gaseificação integrada localizadas na Europa.
(DOE,NETL 2007)
25
A Siemens realizou um estudo de mercado que confirma essa tendência de
crescimento de utilização de turbinas que utilizam combustíveis de baixo poder
calorífico. A figura 15 analisa a demanda do mercado em 2020 em dois cenários, de alta
no preço de derivados de petróleo e de preço estável.
Figura 15 – Quantidade de turbina a gás instaladas em 2020 (HERMSMEYER, 2008)
2.3.1 – Adaptações do Ciclo Brayton para Gases com Baixo Poder Calorífico
As principais adaptações do ciclo brayton para operar com gases com baixo
poder calorífico são:
i. Modificação no manifold de alimentação do combustível na câmara de
combustão, para proporcionar uma maior concentração de combustível.
Pois os gases com baixo poder calorífico criam uma menor zona de
combustão. (MITSUBISHI, 2006)
26
Figura 16 – Modificação Manifold para gases de baixo poder calorífico (NASCIMENTO, 2009)
ii. Maior abertura para alimentação do combustível, para proporcionar um
aumento do fluxo de alimentação de combustível na câmara de
combustão. Esta modificação deve ser realizada para manter o alto
fornecimento de energia ao ar, utilizando um gás com baixo poder
calorífico. (MITSUBISHI, 2006)
Figura 17 – Modificação câmara de combustão (NASCIMENTO, 2009)
27
3. Capítulo 3 – Estudo de um Ciclo Combinado com Gaseificação da Casca de
Arroz
Para compreender o potencial de geração de energia através do ciclo combinado
com gaseificação da biomassa, nos próximos capítulos será realizada uma simulação
térmica e econômica do funcionamento deste ciclo utilizando a casca de arroz como
combustível. A escolha deste combustível se deve ao fato da alta disponibilidade desta
biomassa no Brasil e o seu potencial subutilizado para geração de energia elétrica.
3.1 – Potencial da Geração de Energia Utilizando Casca de Arroz
A produção de energia elétrica utilizando a casca de arroz tem grande potencial
no Brasil, pois o país é o nono maior produtor do mundo de arroz. Na safra de
2010/2011 foram colhidos 12,83 milhões de toneladas de arroz e as projeções de
produção indicam que o Brasil irá colher 13,70 milhões de toneladas na safra de
2020/2021 (CONAB, 2011).
Além do potencial de geração de energia elétrica o país possui grande
capacidade de gerar calor de processo. Conforme MAYER, HOFFMANN e
RUPPENTHAL (2006), o calor de processo empregado em um engenho de arroz pode
ser obtido a partir de diferentes equipamentos, o que possibilita a geração simultânea
com a eletricidade. Como exemplo de equipamentos, pode-se citar gerador de vapor,
motor Stirling, fornalhas, entre outros.
Segundo COELHO (2008) o potencial de geração de energia elétrica a partir da
casca de arroz é de 268,69 MW por ano, conforme demonstrado na tabela 2. Para este
estudo foi considerado o Poder Calorífico Inferior (PCI) da casca de 3384 kcal/kg e o
uso de ciclos a vapor de pequeno porte com rendimento de 15%.
Tabela 2 – Potencial de geração de energia elétrica a partir da casca de arroz (COELHO, 2008)
28
No ano de 2012, o Brasil gerou 32,61 MW, através de oito usinas que utilizavam
casca de arroz como combustível, representando 0,03% do total da produção energética
nacional. A produção de arroz no Brasil, atualmente, é de 12.628,2 toneladas, e tem
apresentado crescimento em algumas regiões, como a Nordeste e a Sul. Se utilizada
toda produção, seria possível gerar cerca de 268,69 MW por ano, representando 0,21%
na produção energética total do Brasil. (ARDENGHI, 2012).
3.2 – Gaseificação da Casca de Arroz
A casca de arroz é considerada uma biomassa de difícil gaseificação utilizando
métodos tradicionais, devido as suas características de umidade, granulometria e baixa
densidade. Quando sua gaseificação é realizada em fornos de grelha (leito fixo ou
queima em pilha), a casca de arroz distribui-se de forma desigual, algumas seções
recebem muito ar, enquanto outras recebem pouco. Isto produz baixa eficiência no
sistema térmico. A distribuição desigual de ar e as temperaturas altas nas seções onde
existe excesso fazem com que a sílica na cinza se funda e forme uniões fortes,
impedindo a reação de todo o carbono fixo (NATARAJAN ET AL, 1998). Isto não
deixa o carbono restante na cinza reagir, baixando a eficiência de carbono do sistema.
Portanto, para evitar este efeitos indesejáveis na gaseificação, o gaseificador
mais indicado é o leito fluidizado. Podemos citar algumas vantagens deste tipo de
gaseificador (NATARAJAN ET AL, 1998)
A turbulência na fluidização quebra o esqueleto rígido da cinza e faz o carbono
reagir;
A cinza pode ser removida por elutriação no fluxo de gás e posteriormente
retirada com um separador de partículas;
A temperatura do leito pode se manter abaixo da temperatura de fusão da cinza.
FLANIGNAN et al (1997) também conclui que entre as vantagens do leito
fluidizado para gaseificação são: boa circulação, o conteúdo da cinza e a umidade na
casca de arroz se mantêm nos padrões desejáveis, a cinza é separada facilmente, o
29
material inerte provê uma grande massa térmica que amortece as perturbações da
temperatura e o material inerte do leito fluidizado permite o uso de tamanho de
partículas variadas.
Além disso, nas aplicações da gaseificação, pode-se desconsiderar a formação
térmica de NOx, pois a temperatura adiabática de chama do gás produzido não
ultrapassa 1.100oC (JANSEN ET AL., 2002).
Diversos experimentos foram realizados em relação ao poder calorífico do gás
produzido na gaseificação da casca de arroz em leito fluidizado. NATARAJAN et al
(1998) concluiu que os gases produzidos a partir da casca de arroz possuem poder
calorífico inferior entre 4 e 6 MJ/Nm³ e potência térmica de 2,8 até 4,6 MWterm/m³.
Estas variações ocorrem devido a diversos fatores, sendo o principal deles a temperatura
em que a gaseificação acontece, podendo variar de 750 °C até 900 °C.
Já BING et al (1985) concluiu através de experimentos realizados na
Universidade de Missouri nos Estados Unidos, que o poder calorífico do gás obtido foi
entre 4,4 e 7,5 MJ/Nm³. FLANING et al (1997) utilizando parâmetros similares ao de
Bing et al (1985), obteve valores de poder calorífico de 5,2 MJ/m³.
Estudos para determinar o poder calorífico do gás produzido a partir da
gaseificação da casca de arroz também foram realizados no Brasil. MURARO (2006)
obteve, através de experimentos realizados na UNICAMP, valores de poder calorífico
de 4,24 MJ/Nm³.
Tabela 3 – Valores de PCI da casca de arroz gaseificada encontrados em diferentes estudos
A tabela 4 mostra o comparativo entre o poder calorífico inferior de alguns
combustíveis. Conforme os valores típicos encontrados para o gás proveniente da
30
gaseificação da casca de arroz, ele pode ser considerado um gás pobre, ou seja, com
baixo poder calorífico.
Tabela 4 – Valores de PCI de diferentes combustíveis (FIGUEIREDO, 2010)
Além do baixo poder calorífico, o gás produzido a partir da gaseificação da
casca de arroz tem monóxido de carbono em sua composição, conforme demonstrado na
tabela 5, característica típica de gases de sínteses, ou seja, aqueles produzidos a partir da
queima incompleta da biomassa.
Tabela 5 – Composição molar do gás proveniente da gaseificação da casca de arroz (MURARO 2008)
Considerando a composição molar acima, a equação de combustão do gás está
demonstrada abaixo:
3,85 H2 + 3,81 CH4 + 19,54 CO + 19,22 (3,76N2 + O2) + 0,16 O2 = 38,69 CO2 + 11,47
H2O + 219,6 N2
Além disso, podemos concluir que a relação de massa de ar/combustível é de
1,03:1. Enquanto que, por exemplo, para o gás natural é de 16,3:1.
3.3 – Simulação e Análise Termodinâmica
31
A análise realizada a seguir, tem como objetivo simular o funcionamento
termodinâmico de um ciclo combinado utilizando casca de arroz gaseificada. De forma
a avaliar todos os componentes do ciclo do ponto de vista termodinâmico, a capacidade
de geração de energia e a eficiência energética.
3.3.1 – Dimensionamento
Para tornar a simulação próxima do potencial de geração de energia dos
empreendimentos deste tipo no Brasil, sua capacidade será dimensionada a partir da
disponibilidade de gás produzido a partir da casca de arroz, e consequentemente da
produção de arroz no Brasil.
Portanto, ao observar os maiores produtores de arroz no Brasil, concluímos que
existe uma grande concentração da produção no Rio Grande do Sul, conforme
demonstra a tabela 6.
32
Tabela 6 – As vinte cidades que mais produzem arroz no Brasil (CONAB, 2011)
Para a simulação que será realizada em seguida, a quantidade de casca de arroz
utilizada para manter a planta em funcionamento será de aproximadamente 6 mil
toneladas por mês. Considerando que a casca do arroz representa cerca de 20% do peso
do grão (ARDENGHI, 2012), isto significa que uma produção de 330 mil toneladas de
arroz atenderia a demanda da termoelétrica.
33
ROCHA, PÉREZ e CORTEZ (2004) reforça a importância de fazer a conversão
da casca próximo ao local onde ocorre o beneficiamento do arroz, uma vez que o
transporte da casca de arroz representa uma etapa altamente problemática, pois sua
baixa densidade torna o volume muito grande e transportá-la não é economicamente
vantajoso.
Portanto, a instalação destas usinas no estado do Rio Grande do Sul se torna
atrativa. Atualmente o estado concentra a maioria das usinas termoelétricas movidas à
casca de arroz do Brasil, conforme demonstra a tabela 7.
Tabela 7 – Usinas termoelétricas movidas a casca de arroz no Brasil (ANEEL, 2008)
A usina de São Borja utiliza cerca de 8,5 mil toneladas por mês de casca de
arroz para produzir a potência de 12,5 MW (BARBOSA, 2012). Portanto, a simulação
realizada a seguir, que utilizará como combustível 6 mil toneladas por mês de casca de
arroz, pode ser viável assim como a usina de São Borja, se instalada no estado do Rio
Grande do Sul, em uma região que produza grandes quantidades de arroz.
3.3.2 – Modelagem do Ciclo
Com o dimensionamento da oferta de casca de arroz para a usina termoelétrica,
foi calculado o potencial de calor fornecido na câmara de combustão da turbina a gás e
posteriormente o dimensionamento de todos os elementos do ciclo.
34
3.3.2.1 – Premissas de Modelagem
Dentre as premissas e variáveis assumidas no modelo estão:
i. Temperatura ambiente: 27 °C;
ii. Pressão ambiente: 101.3 kPa;
iii. Os processos de compressão, na bomba e no compressor, e os processos de
expansão, nas turbinas a gás e a vapor, ocorrem de forma adiabática;
iv. Os processos de troca de calor no condensador, no trocador de calor e na
câmara de combustão ocorrem de maneira isobárica;
v. A eficiência isoentrópica da bomba é de 85%;
vi. As turbinas isoentrópicas possuem eficiência de 87%;
vii. A eficiência isoentrópica do compressor é de 80%;
viii. O período de manutenção programada é de 30 dias por ano;
ix. Taxa de produção de gás no gaseificador de leito fluidizado é de 2,5
Nm³/kg;
x. Temperatura na entrada da Turbina: 1300 ºC
xi. Efetividade da troca de calor na caldeira de recuperação: 0,85
3.3.2.2 - Cálculo do Calor Fornecido
Para calcular o Calor Fornecido utilizou-se o Poder Calorífico Inferior (PCI) da
casca de arroz gaseificada multiplicado pela sua vazão volumétrica.
.
A vazão volumétrica é dada pela quantidade de casca de arroz gaseificada no
gaseificador de leito fluidizado. Segundo NATARAJAN (1998) a produção de gás neste
tipo de gaseificador varia de acordo com a temperatura do processo. Quando a
temperatura de gaseificação é de 900ºC a produção de gás é de 2,35 Nm³ por kg de
casca de arroz.
A vazão volumétrica foi calculada pela multiplicação da taxa de fornecimento da
casca de arroz pela a taxa de conversão em gás.
35
[eq.1]
Portanto o calor fornecido foi calculado utilizando:
[eq.2]
3.3.2.3 – Cálculo da Vazão Mássica da Turbina a Gás
A definição da vazão mássica da turbina a gás foi definida a partir de
especificações de turbinas similares, encontradas no mercado e que possuem capacidade
de geração de energia compatível com o porte da usina a ser dimensionada. Além disso,
foi considerado o potencial de quantidade de calor fornecido por kg de ar. A tabela 8
demonstra algumas turbinas da Siemens que possuem como característica a utilização
de diferentes tipos de combustíveis.
Tabela 8 – Especificações turbinas Siemens (SIEMENS, 2013)
Foi considerado para a definição do fluxo de gás que o potencial de quantidade
de calor fornecido por kg de ar deve ser próximo de 950 kJ/kg, pois este valor seria
suficiente para elevar a temperatura do ar na entrada da turbina próxima dos 1300 ºC.
Caso o valor de calor fornecido por kg de ar seja 950 kJ/kg o valor de ṁ seria,
[eq.3]
36
Para esta modelagem o valor de ṁ considerado foi 26,0 kg/s. Pois este valor
torna possível o aquecimento do ar até altas temperaturas e está próximo das
especificações de equipamentos ofertados no mercado.
3.3.2.4 – Simulação do Ciclo Combinado
A simulação do funcionamento do ciclo combinado foi realizada através do
software CyclePad, que é um software de simulação térmica de caráter educacional
desenvolvido pela Northwestern University. O CyclePad utiliza ar padrão e valores
variáveis de calor específico a pressão contaste (Cp variável).
Os pontos “A” são referentes ao ciclo de geração de energia utilizando uma
turbina a gás (ciclo Brayton) e os pontos “B” referentes à geração de energia utilizando
uma turbina a vapor (ciclo Rankine).
Figura 18 – Esquema do ciclo combinado simulado no software CyclePad
37
3.3.3 – Análise da Variação da Temperatura na Saída da Turbina a Gás
Para analisar a energia utilizada no ciclo, foi realizada uma análise de exergia do
ciclo utilizando diferentes parâmetros de funcionamento. O objetivo é minimizar a
destruição de exergia nas diferentes etapas do processo e potencializar o trabalho
produzido.
Por se tratar de um ciclo combinado, o aumento da temperatura de saída dos
gases da turbina a gás pode aumentar a energia cedida ao vapor no ciclo Rankine e
consequentemente gerar mais trabalho na turbina a vapor. Por outro lado, a diminuição
na temperatura de saída dos gases da turbina do ciclo Brayton provoca um decréscimo
no trabalho produzido. Portanto, para analisar o efeito das mudanças dos parâmetros do
ciclo, foi observada a variação do trabalho produzido total e da destruição de exergia.
3.3.3.1 – Análise do Trabalho Produzido
O trabalho líquido produzido em ciclo combinado é a soma dos trabalhos
produzidos pela turbina a gás e a vapor, subtraído pelo trabalho do compressor e da
bomba.
[eq.4]
Portanto, ao aumentar a temperatura de saída dos gases na turbina a gás, é
esperado um decréscimo no trabalho produzido pela turbina a gás, porém o trabalho da
turbina a vapor deve aumentar. Pois conforme demonstrado abaixo, o trabalho
produzido na turbina está relacionado à diferença de entalpia na entrada e saída,
multiplicada pela eficiência da turbina.
[eq.5]
Foi realizada uma análise da variação da potência produzida de acordo com a
variação da temperatura de saída dos gases. A simulação das temperaturas começou a
38
partir do valor de projeto das turbinas comerciais que se encaixam nas especificações da
modelagem, ou seja, 555 ºC. (SIEMENS, 2013).
A tabela 9 demonstra o resultado obtido.
Tabela 9 – Variação de potência líquida produzida
Figura 19 – Gráfico da variação da potência líquida produzida
Podemos concluir através dos resultados obtidos que apesar de existir um
crescimento na potência produzida no ciclo Rankine, a potência líquida total diminuiu,
pois a maior parte da potência é produzida pela turbina a gás.
39
Portanto, o investimento em turbinas a gás que possuem alta eficiência e que
conseguem aproveitar grande parte da exergia dos gases provenientes da câmara de
combustão é justificável do ponto de vista da potência produzida.
3.3.3.2 – Análise da Exergia
O potencial de trabalho útil do sistema é chamado de Exergia. Portanto, a análise
da destruição de exergia no ciclo é de grande importância. Na planta modelada acima, o
ar no ponto 1 e o vapor no ponto 8, possuem valores elevados de exergia, porém esta
exergia não é aproveitada para gerar trabalho ou para gerar calor.
O objetivo desta análise é verificar o efeito da variação da exergia com o
aumento da temperatura dos gases de exaustão da turbina a gás.
Desprezando a variação de energia cinética e potencial, a exergia de um sistema
fechado φ é dada por:
φ [eq.6]
Em [eq.6] u representa a energia interna específica, a temperatura ambiente, s
entropia específica, pressão ambiente e volume específico.
Já a destruição de exergia de um sistema fechado é dada por:
[eq.7]
Sendo que a destruição de exergia de todo o ciclo é dada pela soma da
destruição de todos os processos que compõem este ciclo.
Assim como no cálculo da potência produzida, descrita no item 3.3.3.1, para o
cálculo da exergia e a sua destruição também foi utilizado diversos valores para a
temperatura. A tabela 10 demonstra os resultados obtidos:
40
Tabela 10 – Variação de exergia nos pontos 1 e 8 e destruição de exergia do ciclo
Podemos concluir que o aumento da temperatura na saída dos gases da turbina a
gás provoca um aumento na exergia no ponto 1, pois o ar que passa na turbina produz
menos trabalho. Já o aumento da exergia no ponto 8, se deve ao aumento da temperatura
no ponto 7 (entrada da turbina a vapor). Este aumento ocorre devido a maior energia
transferida na caldeira de recuperação devido ao aumento da temperatura de exaustão
dos gases da turbina a gás.
Figura 20 – Variação de Exergia no ponto 1
41
Figura 21 – Variação da Exergia no ponto 8
Além disso, a destruição da exergia em todo o ciclo aumentou, conforme
demonstra a figura 22.
Figura 22 – Variação da Destruição de Exergia do ciclo.
A maior parte da destruição da exergia do ciclo ocorre durante o processo de
troca de calor na caldeira de recuperação, devido aos altos valores de calor transferido
somado a grandes variações de entropia. Outra parcela significativa da destruição da
exergia ocorre durante os processos de rejeição de calor para o ambiente no ciclo
Brayton e de rejeição de calor no condensador no ciclo Rankine.
42
Portanto, para reduzir a destruição de exergia do ciclo, é necessário o
investimento em uma caldeira de recuperação que torne a troca de calor mais efetiva, e
consequentemente diminua o calor rejeitado no ambiente e no condensador. Porém,
essas ações implicam em maiores investimentos de capital na planta.
3.3.3.3 – Conclusão da Simulação
Através dos resultados obtidos, podemos concluir que a temperatura de saída dos
gases que obteve os melhores resultados foi a de 555 ºC. Pois gerou a maior quantidade
de potência líquida e a menor destruição de exergia.
Portanto, é de extrema importância o investimento em turbinas a gás que possam
transformar a exergia dos gases na saída da câmara de combustão em trabalho. Mesmo
que isso acarrete em um decréscimo no trabalho produzido na turbina a vapor, o
trabalho líquido total aumenta.
Caso a turbina a gás utilizada na planta, proporcione a exaustão de gases a uma
alta temperatura, é recomendável a utilização da exergia destes gases para gerar calor de
processo.
Na indústria de beneficiamento de arroz, por exemplo, este calor de processo
pode ser utilizado em diferentes etapas do preparo do grão.
Segundo RUPPENTHAL (2006) o calor produzido por turbinas a gás ou
motores stirling pode ser aproveitado através de uma caldeira de recuperação, para
geração de vapor de processo, empregado na secagem e parboilização do arroz.
Parboilização é um processo de beneficiamento do arroz que visa transportar
nutrientes dispostos em camadas mais externas para o centro do grão, pela ação da água
aquecida, e posteriormente sendo fixados pela ação do calor. Este processo demanda
muita energia térmica, sendo, portanto, interessante o aproveitamento do calor dos gases
na saída do trocador de calor para o fornecimento desta energia. (BIDONE, 2007)
43
Segundo BIDONE (2007) os principais processos que demandam energia térmica
na parboilização do arroz são: encharcamento, gelatinização, secagem primária e
secundária. A tabela 11 mostra a quantidade de taxa de calor necessária por kg de arroz
para cada processo. Os cálculos estão demonstrados no Apêndice A.
.
Tabela 11 – Calor Necessário na Parboilização do Arroz
A partir dos dados apresentados, podemos concluir que a utilização de um
sistema de cogeração para a parboilização do arroz aproveitando a energia térmica dos
gases oriundos da termoelétrica é viável e interessante do ponto de vista de
aproveitamento energético. Sendo que a variação da temperatura no Ponto 5 do ciclo
modelado, influi de maneira significativa o potencial de calor que pode ser fornecido,
conforme descrito no item 3.3.3.2.
Para a análise do potencial de geração de energia e da análise de viabilidade
econômica, não foi considerado a utilização de cogeração e o valor considerado para
temperatura de saída dos gases foi de 555 ºC.
3.3.4 – Resultados Simulação Ciclo Combinado
As tabelas 12 e 13 demonstram os principais resultados do ciclo, considerando
as premissas definidas no item 3.3.2.1 e utilizando o software CyclePad para simular o
ciclo. No apêndice B constam todos os resultados encontrados para os pontos e
componentes do ciclo, além dos diagramas T x s..
Tabela 12 – Resultados obtidos no ciclo Brayton e Rankine
44
Tabela 13 – Resultados obtidos no ciclo Combinado
3.4 – Análise de Viabilidade Econômica
Para calcular os indicadores é preparado um demonstrativo de resultados de cada
exercício, que apresenta a receita líquida anual do projeto para a construção do seu
fluxo de caixa ao longo de sua vida útil. Este demonstrativo contempla todas as entradas
e saídas de capital a cada ano, incluindo-se as receitas diretas e indiretas, os custos de
investimento, custos operacionais fixos e variáveis, a depreciação dos equipamentos e
as deduções dos impostos (PUCCINI et al., 1992).
Utilizando o fluxo de caixa do projeto, é possível realizar diversas análises
econômicas e financeiras. Tornando possível avaliar a viabilidade econômica do projeto
e o retorno do investimento. Neste capítulo apresentamos os principais indicadores
utilizados na avaliação econômica de projetos, que serão calculados em nossa
modelagem: o Valor Presente Líquido (VPL), a Taxa Interna de Retorno (TIR), o
Tempo de Retorno do Investimento (Payback) e, um especificamente importante na
análise de projetos de geração de energia, o Custo da Energia (COE).
A metodologia de avaliação econômica difere de acordo com o perfil do
investidor e seus objetivos, mas para todos eles constitui um conjunto de indicadores
que permitem a comparação por diferentes critérios.
O Valor Presente Líquido (VPL), a Taxa Interna de Retorno (TIR), o Tempo de
Retorno do Investimento (Payback) e o Custo da Energia (COE) estão entre os
45
principais indicadores considerados na análise de projetos (ABREU e STEPHAN, 1982,
BUARQUE, 1984).
3.4.1 - Valor de Presente Líquido (VPL)
Valor Presente Líquido é o valor total dos fluxos de caixa do investimento
(negativos e positivos), trazidos à data presente, depois de descontado o imposto de
renda, de todos os anos de duração do projeto. O método de VPL é um valioso indicador
porque reconhece o valor do dinheiro no tempo. Projetos que apresentam VPL positivo
são atraentes.
[eq.8]
Em [eq.8] Ct representa os lucros líquidos anuais, i a taxa de desconto, n o
tempo da vida útil da planta e I o valor do investimento inicial.
3.4.2 - Taxa Interna de Retorno (TIR)
Taxa Interna de Retorno (TIR) é definida como a taxa de desconto que iguala a
zero o VPL dos fluxos de caixa do projeto. A TIR é calculada para determinar se a
rentabilidade do projeto excede uma mínima taxa de retorno aceitável, frequentemente
chamada de taxa de atratividade. A vantagem da TIR é que, diferentemente do VPL,
seus resultados de porcentagem permitem comparar projetos de tamanhos diferentes
com facilidade.
[eq. 9]
3.4.3 - Tempo de Retorno do Investimento (Payback)
Um cálculo do tempo de retorno do investimento ou payback compara as rendas
com os custos e determina o período de tempo exigido para recuperar o investimento
inicial. Um período de payback simples é calculado frequentemente sem levar em conta
o valor do dinheiro no tempo. Este indicador é frequentemente usado para analisar
46
oportunidades de investimento que oferecem benefícios incrementais e aplicações de
uso final.
[eq. 10]
Em [eq.10] I representa o custo total do investimento e C os lucros líquidos
anuais.
3.4.4 - Custo da Energia (COE)
O Custo de Energia (COE - Cost of Energy) é definido como o custo médio por
MWh de energia útil produzida por um sistema. O cálculo do COE é feito a partir do
conhecimento de valores como o custo anual dos equipamentos, custos com o
combustível e os custos com operação e manutenção.
O COE é frequentemente usado pelos analistas de política energética e pelos
avaliadores de projeto para analisar a taxa de atratividade primária de um projeto.
O COE define o fluxo de renda que minimamente satisfaz as exigências para retorno e
cobertura dos investimentos e custos.
[eq. 11]
Em [eq.11] F representa o custo com combustível, os custos fixos e
variáveis da planta, P a potência líquida produzida e H o número de horas no ano de
funcionamento da planta.
3.4.5 – Modelo de Avaliação Econômica
O modelo de avaliação econômica utilizado neste projeto é baseado na
realização de uma Demonstração de Resultados do Exercício (DRE), considerada
idêntica para cada ano da vida útil do projeto.
47
O objetivo do DRE é demonstrar a formação do resultado líquido em um
exercício através do confronto das receitas, despesas e resultados apurados, gerando
informações significativas para tomada de decisão.
Segundo IUCÍBUS (2004) a Demonstração do Resultado do Exercício é um
resumo ordenado das receitas e despesas da empresa em determinado período. É
apresentada de forma dedutiva (vertical), ou seja, das receitas subtraem-se as despesas e
em seguida, indica-se o resultado (lucro ou prejuízo).
A DRE apresentada na Tabela 14 é a representação das receitas e custos
esperados com o projeto, incluindo as deduções com impostos, a depreciação e o
imposto de renda. Com o resultado final encontramos o Lucro Líquido Anual do
projeto.
Tabela 14 – Estrutura do Demonstrativo do Resultado do Exercício
Para o cálculo do lucro líquido da planta, é necessário considerar algumas
premissas para a modelagem.
3.4.6 – Premissas da Modelagem
Dentre as premissas e variáveis assumidas no modelo estão:
i. O valor de comercialização da energia elétrica gerada na planta foi baseado na
média dos valores de janeiro de 2013 até dezembro de 2013, da câmara de
48
comercialização de energia elétrica. O valor da média encontrada é de 261,58
R$/MWh;
ii. A taxa de desconto é de 12% a.a. Este valor foi considerado levando em
consideração a taxa Selic, que possui o valor de 10,5% a.a. Cabe ressaltar que o
BNDES apoia projetos que visam à diversificação da matriz energética nacional
e que contribuam para a sua sustentabilidade por meio da linha energia
alternativa. Para projetos de geração de energia elétrica que utilizam biomassa
como combustível, o banco financia em até 90% do investimento a uma taxa de
1,2% a.a.;
iii. Os impostos, taxas e contribuições considerados foram as seguintes:
Tabela 15 – Impostos aplicados na modelagem
iv. O custo da casca de arroz utilizada é de 50 R$/tonelada; (YASSIMURA, 2012)
v. A taxa de câmbio utilizada é de 2,42 R$/U$;
vi. Os custos fixos e variáveis do funcionamento da planta são de:
49
Tabela 16 – Valores de custos fixos e variáveis para ciclos combinados com gaseificação de biomassa (NETO,
2001)
vii. O valor do investimento para instalação da planta é de U$ 2450/kW. (LEAL
2001);
viii. A vida útil do projeto é de 25 anos; (NETO, 2001);
ix. A depreciação utilizada é a do método direto, ou seja, a depreciação é
considerada igual para cada ano de vida do bem. (PAMPLONA, 2012).
[eq. 12]
3.4.7 – Resultados da Modelagem
Considerando as premissas do item 3.4.6, o demonstrativo de resultado do
exercício está apresentado na tabela 17.
50
Tabela 17 – Modelagem do Demonstrativo do Resultado do Exercício
A partir do lucro líquido, podemos calcular os principais indicadores financeiros
para este projeto, conforme descrito no item 3.4. Foram realizadas duas simulações, a
primeira considera a taxa de desconto do investimento de 12% a.a., sendo próxima da
taxa de juros praticada no mercado brasileiro. Já a segunda simulação considera a taxa
de juros de 1,2% a.a., que é a taxa que o BNDES oferece para projetos de geração de
energia elétrica que utilizam biomassa.
i. Caso 1 – Taxa de Desconto 12% a.a.
Tabela 18 – Análise Financeira para taxa de desconto de 12% a.a.
51
ii. Caso 2 – Taxa de Desconto 1,2% a.a.
Tabela 19 – Análise Financeira para taxa de desconto de 1,2% a.a.
A partir dos resultados observados na tabela 18, podemos concluir que o
investimento realizado a uma taxa de desconto de 12% a.a. não torna o projeto
economicamente viável, pois o Valor Presente Líquido ficou negativo.
Já o investimento realizado a uma taxa de 1,2 a.a. é economicamente viável. O
Valor Presente Líquido calculado teve um valor expressivo, indicando que o projeto
pode ser um excelente investimento. Além disso, o valor do Custo de Energia teve um
valor competitivo, devido ao baixo custo do combustível.
4. Capítulo 4 – Conclusão
O objetivo principal deste trabalho era analisar se a tecnologia de geração de
eletricidade utilizando biomassa gaseificada integrada a ciclo combinado era viável do
ponto de vista tecnológico, térmico e econômico. Como forma de exemplificar os
indicadores de funcionamento e de retorno financeiro, buscou-se modelar o
funcionamento de uma planta movida a casca de arroz.
Como visto no capítulo 2, a tecnologia de produção de energia a partir da
gaseificação da biomassa integrada ao ciclo combinado já é uma tecnologia utilizada em
diversos locais, sendo uma importante alternativa frente ao aumento da demanda de
52
energia no mundo e a alta participação de energia não renovável na matriz energética
mundial.
Todavia, é importante ressaltar que apesar da alta disponibilidade de biomassa
no Brasil, existem poucas plantas termelétricas que utilizam este tipo de combustível,
em especial a casca de arroz. Conforme descrito no item 3.1, o potencial desse de
geração de energia utilizando a casca de arroz é bastante significativo, porém
atualmente, apenas uma pequena parte desse potencial é revertida em energia elétrica.
Atualmente o Brasil produz 32,61 MW utilizando a casca de arroz, sendo que o país tem
potencial de gerar 268,69 MW, o que representa cerca de 0,21% na produção energética
total do Brasil.
Os resultados da modelagem térmica demonstraram que é viável a instalação de
termelétricas com capacidades instaladas significativas e com elevadas taxas de
eficiência energética. Plantas com capacidade de 10 MW podem funcionar somente com
o uso desta biomassa, pois a produção do arroz no Brasil, em especial no estado do Rio
Grande do Sul, consegue fornecer energia térmica suficiente para abastecer o ciclo
combinado.
Já a modelagem da viabilidade financeira indicou que a geração de energia
utilizando esta tecnologia é custosa, sendo necessários altos investimentos iniciais.
Portanto a viabilidade econômica desta tecnologia, com os níveis de investimento e
custos operacionais estimados, dependerá fundamentalmente da utilização de
mecanismos de incentivo, sejam nacionais ou internacionais, conforme citado no item
3.4.7.
53
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58
Apêndice A – Cálculo da Quantidade de Calor Necessária para Parboilização
A.1 - Premissas
As premissas consideradas no cálculo foram baseadas em Bidone (2007) e estão
explicitadas a seguir:
i. Temperatura da água utilizada no processo de encharcamento: 65ºC;
ii. Quantidade de água necessária no encharcamento: 750 litros por tonelada de
arroz;
iii. Calor específico da água: 4,18 kJ/kg ºC;
iv. Densidade da água: 1 g/cm³;
v. Calor Específico do arroz: 1,27 kJ/kg ºC;
vi. Quantidade de água necessária na gelatinização: 25 litros por tonelada de arroz;
vii. Quantidade de ar necessário na secagem primária: 8,5 m³ por kg de arroz;
viii. Quantidade de ar necessário na secagem secundária: 4,4 m³ por kg de arroz;
ix. Calor Específico do ar: 1,05 kJ/kg ºC;
x. Massa específica do ar: 1,2 kg/m³;
xi. Temperatura da água utilizada no processo de gelatinização: 107ºC;
xii. Temperatura do ar utilizado na secagem primária: 110ºC;
xiii. Temperatura do ar utilizado na secagem secundária: 80ºC;
A.2 – Cálculos
i. Encharcamento
59
ii. Gelatinização
iii. Secagem Primária
iv. Secagem Secundária
60
Apêndices B – Dados e Gráficos T x s do Ciclo Combinado
Tabela 20 – Dados Componentes do Ciclo
61
Tabela 21 – Dados Pontos do Ciclo
62
Tabela 22 – Resultados da Modelagem do Ciclo Combinado
63
Figura 23 – Diagrama T x s do Ciclo Brayton
64
Figura 24 – Diagrama T x s do Ciclo Rankine