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Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

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Imposto de Renda Pessoa Jurídica

Teoria e Prática

QUARTIER LATIN

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Editora Qy.artier Latin do Brasil

Rua Santo Amaro, 349 - CEP 01315-001

Vendas: Fone (11) 3101-5780

Email: [email protected]

Site: www.quartierlatin.art.br

TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio ou processo, especialmente por sistemas gráficos, microfílmicos, fotográficos, reprográficos, fonográficos, videográficos. Vedada a memorização c/ou a recuperação total ou parcial, bem como a inclusão de qualquer parte desta obra em qualquer sistema de processamento de dados. Essas proibições aplicam-se também às

características gráficas da obra e à sua editoração. A violação dos direitos autorais é punível como crime (art. 184 e parágrafos do Código Penal), com pena de prisão e multa, busca e apreensão e indenizações diversas (arts. 101 a 110 da Lei 9.610, de 19.02.1998, Lei dos Direitos Autorais).

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COORDENAÇÃO

PEDRO ANAN JR.

Advogado em São Paulo, Especialista em Direito Empresarial pela PUC/SP, MBA Contro//er pela FEA/USP, Vice-presidente da Diretoria

Jurídica da ANEFAC, Professor de Especialização da APET

Imposto de Renda Pessoa Jurídica

Teoria e Prática

Editora Quartier Latin do Brasil São Paulo, verão de 2007

quartier la [email protected]

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EDITORA QyARTIER LATIN DO BRASIL

Rua Santo Amaro, 349 - Centro - São Paulo

Editor: Vinicius Vieira

Formado em Administração de Empresas pela Fundação Getúlio Vargas

FGV-SP

Editora de Texto: Priscila Tanaca

Mestra em Direito na PUC-SP

Produção Editorial: MônicaA. Guedes

Formada em Letras pela FFLCH-USP

Produção de Arte: Thiago Kazuo Muniz de Souza

Anar Jr., Pedro (coordenação)

Pedro AnanJr. Imposto de Renda Pessoa

Jurídica - Teoria e Prática. São Paulo: Qyartier

Latin,2006.

1. Direito Tributário

ISBN: 85-7674-183-0

Índice para catálogo sistemático

1. Brasil: Direito Tributário

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SUMÁRIO

Prefácio, 17 José Eduardo Soares de Melo

Apresentação, 21 Pedro Anan Jr.

Remessas de Contraprestação por Serviços Técnicos para o Exterior Vis-à-Vis aos Tratados Para Evitar a Dupla

Tributação, 23 Andrea Nogueira Neves

Fernanda Junqueira Calazans

I. Introdução 24 II. Consideração Inicial: Da Prevalência dos TDTs sobre a

Legislação Interna no Brasil 26

III. Dos Dispositivos dos TDTs Aplicáveis aos Serviços

Técnicos - Da Possibilidade de Equiparação a "Royalties"

- Tratamento Tributário ................................................ 28

III.l.Dos tributos visados pelos TDTs .......................... 34

IV. Dos Tributos Incidentes na Remessa vis-à-vis ao IRF

Visado no TDTs 43

IV.1. CIDE .................................................................... 43

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IV.2.ISSlImportação 47 IV.3. PISllmportação e COFINSllmportação 50

IVA. CPMF 51

V. Da Conclusão 53

Tributação das Receitas Financeiras Auferidas na Fase Pré­Operacional, 55

Cristiano Augusto Ganz Viotti de Azevedo

Frederico de Almeida Fonseca

I. Objetivos e Justificativas

II. Situação de Fato

56

56

III. Desenvolvimento 57

III.l.Regime de competência e a tributação da renda .... 57

I11.2. Tratamento comercial e tributário dos resultados

auferidos na fase pré-operacional ................................... 59

III.3. A Instrução Normativa SRF nO 54/88 - Confrontação

do resultado financeiro com as despesas pré-operacionais

registradas no ativo diferido 64

IIIA. Parêntese: normas internacionais de contabilidade .... 70

IV Conclusões 71

Uma Visão Geral do Regime de Tributação na República Popular da China: Regras Aplicáveis às Sociedades Estran­geiras e às Sociedades com Investimento Estrangeiro, 73

Daniel Takaki

Page 9: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

L Introdução 74

II. Formas de investimentos estrangeiros admitidas na

China 76

II.L Consórcios de patrimônio sino-estrangeiros 77

II.2. Consórcios contratuais sino-estrangeiros 77

II.3. Empresas totalmente pertencentes a sócios es-

trangeiros 77

III. Imposto de Renda 78

IILL Obrigações acessórias 79

IIL2. Regime de apuração do imposto de renda 79

III.3. Rendimentos tributáveis 80

IIIA. Prejuízos fiscais 80

IIL5. Depreciação e amortização 81

IV. Incentivos Fiscais 82

IV.1. Redução de alíquota 82

IV.2. Reinvestimento de lucros ....................................... 83

IV.3. Áreas geográficas com redução de alíquota de impos-

to de renda ..................................................................... 83

V Tributação Internacional 84

VI. Transfer Pricing ............................................................. 85

VII. Reorganizações So :ietárias 87

VII. L Considerações societárias ..................................... 87

VI1.2. Considerações tributárias ..................................... 89

VIL3. Diversos 90

VIII. Tributação de Internet ............................................... 91

IX. Reformas fiscais

X. Conclusão

91

92

XI. Referências .................................................... ···.· .. ········ 94

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Aspectos Tributários da Variação Cambial do Investimento Brasileiro no Exterior, 98 Edison Carlos Fernandes

I. Introdução 100

II. Tributação dos Rendimentos Auferidos no Exterior 100

III. Variação Cambial de Investimento no Exterior 103

IV. Conclusão ................................................................... 105

IRPJ e CSLL: Efeitos da Correção Monetária do Capital Social com Base em Dispositivo Contratual ou

Assemblear, 107 Edmar Oliveira Andrade Filho

I. Qyestões em Debate: A inflação como Fato Social 108

II. As Distorções da Falta de Correção Monetária do

Patrimônio ................................................................... 111

III. Ofensa ao Princípio da Capacidade Contributiva ..... 116

IV Validade da Correção Monetária do Capital Social .... 123

V Conclusões .................................................................. 127

Anotações Sobre a Distribuição Disfarçada de Lucros, 129 Elidie Palma BiJano

I. Introdução .................................................................... 130

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1.1. Delimitação do tema e noções gerais sobre o instituto 130 1.2. Breves noções históricas ......................................... 130

II. Conteúdo Legal do Instituto ....................................... 132

II.1. Conceito de DDL 132

II.2. O lucro distribuído e seus beneficiários

II.3. DDL: natureza

134

135

II.4. DDL, valor de mercado e preço de transferência .. 137

III. Decorrências da Prática de DDL ............................... 139

IV. Jurisprudência: Fonte para Estudo da DDL 139

V. Bibliografia 141

Tributação no Mercado Financeiro, 143 Hélio Hanada

1. Tributação na Fonte

II. Imposto de Renda F_etido na Fonte (IRRF)

11.1. Mercado de renda fixa

144

144

144

11.2. Fundos de inve;timento ....................................... 147

II.2.1. Fundos de longo prazo 147

II.2.2. Fundos de curto prazo

II.2.3. Fundos fechados

148

149

II.3. Mercado de renda variável ............................... ··· .. 150

II.3.1. Mercado de bolsa de valores e de balcão 151

II.3. 1. 1. Tributação de fonte sobre as operações praticadas

em bolsa ....................................................................... 152

II.3.2. Fundos e clubes de investimento em ações ........ 153

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II.3.3. Não aplicabilidade das regras de tributação na

fonte 154

lIA. Imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro

ou relativas a títulos ou valores mobiliários - IOF 155

lIA. 1. IOF sobre aplicações financeiras - prazo inferior a

30 dias 155

IIA.2. IOF sobre resgate de fundos após a data de venci-

mento de carência ........................................................ 157

II.4.3. IOF sobre operações de empréstimos de mútuo 158

II.5. Contribuição provisória sobre a movimentação ou

transmissão de valores e de créditos de natureza financeira

-CPMF 159

II.5.1. Aplicações em bolsas de valores 159

II.5.2. Conta de investimento ....................................... 160

III. Tratamento Fiscal dos Rendimentos e Perdas nos Resul-

tados da Pessoa Jurídica ............................................... 161

III. 1. Tratamento fiscal dos rendimentos e do imposto de

renda retido na fonte 161

III.2. Perdas nas operações financeiras - condições e

limitações impostas para a sua dedução 162

III.3. Tributação dos ativos, bens e obrigações em moeda

estrangeira em regime de caixa .................................... 164

IIIA. Planos de previdência complementar, fundos de

aposentadoria programada individual (FAPI) e seguros de

vida com cláusula de sobrevivência - condições de

dedutibilidade das contribuições efetuadas em favor de

empregados e de dirigentes .......................................... 165

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Uma Inteligência Possível do Artigo 74 da MP 2.158, de 24/ 0412001, 167

Ives Gandra da Silva Martins

Tributação de Lucros Auferidos no Exterior e Limites Relativos de Normas Antielisas, 187

João Dácio Rolim Gilberto Ayres Moreira

I. Introdução

II. Elisão Fiscal Internacional

188

189

III. Transparência Fiscal Internacional 193

IV. Da Definição de Renda como Base Imponível ........... 196

V. Tributação dos Lucros Auferidos no Exterior .............. 201

VI. Conclusão .................................................................. 209

Tributação da Renda em Bases Universais - Tendências Atuais, 211

Luciana Rosanova Galhardo

Jorge Ney t'e Figueirêdo Lopes Junior

I. Introdução ................................................................... 212

II. Breve Histórico Legislativo ......................................... 213

11.1. Lei 9.249/95 ......................................................... 213

11.2. lN 38/96 ............................................................... 214

11.3. Lei 9.532/97 ......................................................... 215

II.4. MP 1.858-6/99 - CSL 218 11.5. Lei 9.959/00 ......................................................... 218

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II.6. LC 104/01- Alteração do artigo 43 do CTN ...... 220

II.7 MP 2.158/01 220 IL8. lN 213/02 ............................................................. 225

III. Panorama AtuaI 231

IILl. Alienação de sociedades controladas ou coligadas

estrangeiras .................................................................. 231

IIL2. O emprego de lucros em favor da beneficiária brasi-

leira - item "4" ............................................................. 234

III.3. O "pagamento" de lucros à controladora no Brasil-

item "1" 236

IIL 4. Síntese ................................................................ 239

IV Conclusão ................................................................... 239

Breves Considerações sobre a Prova no Processo Tributário, 241

Luiz Martins Valero

L Introdução 242

II. O Dever da Prova por parte do Agente Tributário 242

III. A Prova em Contrário como Ônus do Contribuinte . 245

IV As Presunções Simples a Partir dos Indícios 246

V. As Presunções Legais a Partir dos Indícios Provados 247

VI. A Prova na Glosa de Custos ou Despesas

Operacionais ............................................................... 249

VIL Conclusões ............................................................... 251

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Preços de Transferência e Juros sobre o Capital Próprio, 253 Marcelo Natale Rodriguez

I. Introdução 254 II. Preços de Transferência ............................................... 254

III. Juros sobre Capital Próprio 256

IV Dos Efeitos do Ajuste de Preços de Transferência no

Cálculo dos Juros sobre Capital Próprio ...................... 259

V. Dos Efeitos do Pagamento de Juros sobre Capital Próprio

no Cálculo do Safe Harbour de Lucratividade para Fins

Preços de Transferência 265

V.I. Safe Harbour da Representatividade 266

V.2. Safe Harbour da Lucratividade 266

VI. Efeitos Imprevistos do art. 45 .................................... 268

VII. Conclusões ............................................................... 268

Pessoas Jurídicas Imunes ou Isentas - Impossibilidade de Incidência do Impo ;to de Renda sobre suas Aplicações

Financeiras, 271 Marie, Beatriz Martinez

I. Pessoas Jurídicas Imunes ............................................... 272

II. Pessoas Jurídicas Isentas 275

11.1. Da configuração do IRRF como mera antecipação

do IR ........................................................................... 277

II.2. Da tributação exclusiva na fonte ............................ 282

II.3. Da violação ao princípio da isonomia .................... 285

lI.4. Do atual posicionamento do Supremo Tribunal

Federal ........................................................................ 286

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Incorporação - Aspectos Relevantes e a Posição do Conse­lho de Contribuintes, 289

Pedra Anan Jr. Juliana Grandina Latarre

I. Introdução .................................................................... 290

II. Aspectos Atinentes à Incorporação de Empresas 292

11.1. Da utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da

CSLL na incorporação, sem a trava de 30% ................ 292

11.2. Da incorporação da controladora pela controlada ..... 296

11.3. Incorporação de empresa superavitária por defici-

tária ............................................................................. 298

III. Da Possibilidade de Qyestionamento pela Procuradoria

da Fazenda e pelo Ministério Público Federal ............. 300

111.1. Do MPF 301

111.2. Da Procuradoria .................................................. 304

IV. Conclusão ................................................................... 305

Tributação do Mercado Financeiro, 307 Rachel Katlauskas Murara

I. Aplicações Financeiras .................................................. 308

1.1. Aplicações financeiras de renda fixa ....................... 308

1.2. Aplicações financeiras de renda variável.. ............... 311

1.3. Isenções para pessoas físicas 314

II. Fundos de Investimentos ............................................. 315

11.1. Fundos de investimento de longo prazo 317

11.2. Fundos de investimento de curto prazo 318

11.3. Fundos de investimento de renda variável ............ 319

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lIA. Outros fundos de investimento ............................ 320 III. Outros Instrumentos Financeiros 321

Juros sobre o Capital Próprio, 323 Silvério das Neves

I. Objetivo da Remuneração do Capital Próprio .............. 324

II. Dedutibilidade na Apuração do IRPJ e da CSLL ...... 324 III. Patrimônio Líquido 326

IV. Imposto de Renda na Fonte 327

V Crédito dos Juros 329 VI. Integralização de Aumento de Capital ....................... 330

VII. Imputação ao Valor dos Dividendos 330

VlI.l. Companhias Abertas 330

VIII. Encargos sobre os Juros Remuneratórios do Capital

Próprio 332

IX. Reflexos nos Investidores 333

IX.l. Empresa tributada pelo lucro reaL ...................... 333

IX.2. Empresa tribL tada pelo lucro presumido ou

arbitrado ..................................................... 334

IX.3. Contabilização dos juros auferidos 334

X. Vantagens e Desvantagens na Distribuição dos Juros 335

X.l. Juros distribuídos para pessoas físicas 335

X.2. Juros distribuídos para pessoas jurídicas ................ 337

XI. Dedução dos Juros no Balanço de Suspensão ou Re-

dução .......................................................................... 339

XII. Juros de Períodos de Apuração Anteriores ................ 339

XIII. Dever de Informar os Valores Creditados ............... 340

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XXIV Caso Prático .......................................................... 341

Regras Gerais da Dedutibilidade das Despesas, 345 Pedro Anan Ir.

Thaís Abreu de Azevedo Silva

L Introdução 346

II. Da Dedutibilidade das Despesas 347

III. Conclusão 354

IRPJ e o Lançamento Tributário Controvertido: Autonomia e Imparcialidade na Discussão Administrativa, 355

Wilfrido Augusto Marques Leonardo Mendonça Marques

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JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

PREFÁCIO

Este livro trata de relevantes matérias afetas ao Imposto de Ren­da, tendo por objetivo proceder à análise de complexas questões de significativo interesse para as pessoas naturais e jurídicas. O imposto em comento sempre constituiu uma figura tributária intrincada para permitir o pleno conhecimento de seus comandos normativos e possi­bilitar a devida aplicação prática.

Além dos imprescindíveis conhecimentos de natureza jurídica, também implica princípios hauridos na ciência contábil e a considera­ção de elementos financeiros e corporativos, daí a razão pela qual têm sido escassos os estudos doutrinários e as manifestações judiciais so­bre o assunto.

Portanto, torna-se extremamente importante uma análise detida e sistemática das significativas questões suscitadas, de plena atualida­de e ainda carentes de um estudo criterioso.

O programa desenvolvido é sobremodo amplo e diversificado, pois tanto aborda questões de índole internacional concernentes aos serviços técnicos para o exterior, à tributação com bases universais, à

singularidade do regime fiscal na China, lucros no exterior, como matérias afetas à tributação do mercado financeiro e decorrentes re­ceitas, preços de transferência, juros de capital, variação cambial do investimento, correção monetária do capital social, distribuição disfarçada de lucros; e ainda aspectos processuais.

Os artigos foram produzidos por experientes profissionais (pro­fessores, magistrados e advogados empresariais), que não mediram esforços para analisar tormentosas questões jurídicas sob enfoques conceituais e práticos, considerando as normas de incidência, as ins­truções regulamentares, as regras internacionais de contabilidade, fim­damentando-se em alentada doutrina (nacional e estrangeira) e per­tinente jurisprudência.

O tratamento diferenciado que fora ofertado nas proposições doutrinárias demonstra as diversas facetas do imposto incidente so-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

bre fenômenos reveladores de riqueza, vislumbrando-se uma visão heterogênea deste rico ternário.

Os estudos não se restringiram, exclusivamente, ao âmbito do Imposto de Renda, uma vez que na digressão dos variados assuntos houve constante preocupação em apurar a vinculação com as demais espécies tributárias. Nesse sentido, foram examinados os efeitos re­lativos às contribuições sociais (PISlImportação, COFINSlImpor­tação, CIDE, CPMF), e aos impostos (IOF e ISS/Importação).

Considerando que o Direito Tributário incide sobre demais realidades jurídicas, os doutrinadores também apreciaram maté­rias de natureza civil e comercial (reorganizações societárias, ope­rações entre coligadas), financeira (aplicações em Bolsas de Valo­

res e títulos específicos) e previdenciária (planos), ponderando, outrossim, sobre as normas desonerativas (isenções, imunidades)

e de elisão tributária. Trata-se de obra que revela marcante utilidade para os ope­

radores do Direito, não só para permitir o conhecimento dos pal­pitantes assuntos que permeiam as atividades empresariais, como

também para firmar fecundas diretrizes importantes à solução

dos problemas que afligem os contribuintes e as autoridades go­

vernamentais. A literatura jurídic;1. encontra-se enriquecida para os magis­

trados, professores, agentes fiscais, empresários e estudantes, que, certamente, ampliarão seus conhecimentos sobre o Imposto de

Renda. Cumprimento o eminente advogado Pedro Anan Junior pela

realização de obra de fôlego, oferecendo à comunidade jurídica um

trabalho sério, metódico e científico, que muito colaborará para a

adequada aplicação do Imposto de Renda. Fico honrado em haver

prefaciado esta obra jurídica.

JOSÉ EDUARDO SOARES DE MELO

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PEDRO ANAN JR.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

APRESENTAÇÃO

A questão do Imposto de Renda das Pessoas Jurídicas é uma constante preocupação no dia-a-dia do empresariado brasileiro. Todo ano as empresas são obrigadas a ajustar suas contas com o Leão, de sorte a verificar quanto é o imposto devido pela sociedade.

A nossa legislação tributária referente à matéria é extremamente complexa e está consolidada, em sua grande maioria, no Regula­mento do Imposto de Renda - RIR/99, aprovado pelo Decreto nO 3.000, de 26 de março de 1999.

Além disso, como a apuração da base de cálculo do imposto tem como partida a demonstração do resultado das sociedades, hoje é fundamental que o profissional que lide com esse tributo, conheça direito tributário e tenha noções de contabilidade, finanças e direito societário, caso contrário haverá dificuldades em entender toda a abrangência da sua apuração, o que pode, em muitos casos, levar o contribuinte a recolher um valor maior aos cofres públicos.

Diante dessas ponderações, vi a necessidade de elaborar uma obra que pudesse ajudar ao operador do direito, contabilidade e fi­nanças a entender a complexidade desse tributo.

Procurei convidar os maiores especialistas na matéria, que pu­deram contribuir com seu conhecimento e experiência nos artigos que fazem parte dessa singela obra. Gostaria de agradecer à Dra. Juliana Latorre, que me ajudou na elaboração do presente livro.

Espero que as lições aqui trazidas possam ser de grande utili­dade ao leitor e ajudem a desvendar o tributo chamado imposto de renda pessoa jurídica.

PEDRO ANAN J R.

Coordenador

22

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1 t 'lh."-

'i 'S, _-,.,,'~" Remessas de Contraprestação pôr Serviços Técnicos para o Exterior

Vis-à- Vis aos Tratados para Evitar a Dupla Tributação

A -JDREA NOGUEIRA NEVES

A ivogada em São Paulo

Especialista em Direito Tributário pela PUClSP

Professora de Especialização da FGV-R] e da APET

FERNANDA]UNQUEIRA CALAZANS

Advogada em São Paulo

Especialista em Direito Tributário pelo IBDT e pelo IBET

Especialista em Direito nos Mercados Financeiro e de Capi­tais LLM - Ibmec Law

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

REMESSAS DE CONTRAPRESTAÇÃO POR SERViÇOS TÉCNICOS PARA O EXTERIOR V,S-À-V,S AOS TRATA­

DOS PARA EVITAR A DUPLA TRIBUTAÇÃO

I. INTRODUÇÃO

o presente estudo tem por finalidade ponderar as chances de êxito, especialmente no âmbito judicial, de inclusão de tributos inci­dentes na remessa de contraprestação de serviços prestados por pes­soa jurídica não-residente no âmbito de aplicação de Tratados para Evitar a Dupla Tributação ("TDT") celebrados entre o Brasil (fonte de pagamento) e o país de residência do beneficiário do rendimento, diante da existência de argumentos jurídicos consistentes, bem como de manifestações da doutrina (nacional ou internacional) e jurispru­dência, judicial e administrativa, sobre o tema.

Os valores objeto das remessas em análise estariam enquadra­dos como contraprestação por "serviços que envolvem tecnicidade" de maneira que, possivelmente, seriam onerados no Brasil pelos se­guintes tributos: (a) Imposto de Renda na Fonte ("IRF"); (b) Con­tribuição de Intervenção no Domínio Econãmico, destinada a fl­nanciar o Programa de Estímulo à Interação U niversidade-Empresa para Apoio à Inovação (UCIDE"); (c) Contribuições ao Programa de Integração Social ("PIS") e ao Financiamento da Seguridade Social ("COFINS"), nas modalidades "Importação" (respectivamente, "PIS/ Importação" e "COFINS/Importação"); (d) Imposto sobre Serviços de Qyalquer Natureza ("ISS"), também na modalidade "Importa­ção" - uISS/Importação"; e (e) por fim, sobre os lançamentos a débi­to em conta corrente de titularidade do tomador no Brasil para efetivação de tais remessas, a Contribuição Provisória sobre Movi­mentação ou Transmissão de Valores, de Créditos e Direitos de Na­tureza Financeira ("CPMF").

Parece-nos nítido que, em um primeiro momento, as disposi­ções dos TDTs celebrados pelo Brasil aplicar-se-iam tão-somente

24

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

ao IRF, como modalidade de "imposto sobre a renda" - tributo ex­pressamente contemplado no âmbito dos TDTs firmados pelo Bra­sil -, não produzindo efeitos, no que concerne à CIDE, ao PIS/ Importação, à COFINSlImportação, ao ISSlImportação e à CPMF, por não estarem os mesmos expressamente listados no escopo desses TDTs e diante de algumas manifestações das Autoridades Fiscais! sobre o assunto. Portanto, poder-se-ia depreender que a tentativa de inclusão desses tributos no âmbito de aplicação dos TDTs depende­ria de questionamento judicial específico para este fim.

Diante dessa introdução sobre o tema, delimitamos o objeto do presente estudo quanto ao seguinte: (a) possibilidade de caracteriza­ção, por força de TDT celebrado entre o Brasil e o país de residência do beneficiário dos rendimentos, da natureza jurídica das remessas referentes à contraprestação por serviços prestados por este último, como "royalties", e o correspondente tratamento fiscal a que estaria sujeito diante desta natureza; e (b) argumentação a ser proposta em eventual questionamento judicial objetivando abarcar, no âmbito de aplicação do TDT, os demais tributos incidentes na remessa em ques­

tão, quais sejam: CIDE, PISlImportação, COFINSlImportação, ISS/

Importação e CPMF. Assim sendo, passaremos a comentar cada um dos

questionamentos acima listados. Preliminarmente, faremos breves

comentários acerca da prevalência dos TDTs frente à legislação in­

terna brasileira.

Exemplificativamente. destacamos a decisão n° 83. de 07.05.03. da Superintendência Re· gional da Receita Federal ("SRRF") da 9' Região Fiscal. cuja ementa (trecho) possui o seguinte teor: U( ... ) As remessas efetuadas à empresa domiciliada no exterior em face de contrato referente à licença sobre direitos de propriedade industrial e de direito de uso de informações técnicas. incluindo. subsidiariamente. a obrigação da Licenciante de forne­cer informações técnicas e assistência técnica. caracteriza pagamento de Uroyalties" con­forme definição dada ao termo pela Convenção Internacional para Evitar a Dupla Tribu­tação em Matéria de Imposto de Renda. entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Coréia. ( ... ) Outros Tributos ou Contribuições. A Contribuição de Intervenção no Domínio Econõmico - CIDE. instituída pela Lei n° 10.168/2000. não está sujeita ao limite de tributação fixado pela Convenção Internacio­nal para Evitar a Dupla Tributação em Matéria de Imposto de Renda. entre o Governo da

República Federativa do Brasil e o Governo da República da Coréia. ( ... )"

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Para fins de interpretação dos TDTs, além da doutrina (nacional e internacional) e da jurisprudência, utilizaremos os comentários da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico ("OCDE"), ainda que o Brasil não seja signatário dessa organização.1

II. CONSIDERAÇÃO INICIAL: DA PREVALÊNCIA DOS TDTs SOBRE A

LEGISLAÇÃO INTERNA NO BRASIL

No plano Constitucional brasileiro, destaca-se o parágrafo 2° do artigo 5° da Constituição Federal, o qual determina que os direi­tos e garantias fundamentais assegurados pelos TDTs assinados pelo Brasil não podem ser excluídos pela legislação interna infra-consti­tucionaP Através deste dispositivo, pode-se inferir que, a par da Constituição Federal brasileira não ter disposto expressamente da supremacia dos tratados internacionais sobre as regras internas, tal interpretação pode ser deduzida através desse dispositivo.

Na esfera tributária, destaca-se o artigo 98 da Lei nO 5.172, de 25.10.66 - Código Tributário Nacional (CTN)4, o qual determina

expressamente que os tratados e convenções internacionais em ma­téria tributária devem prevalecer sobre a legislação interna.

Deste modo, se o Brasil celebrar um TDT com outro Estado Contratante, a análise da legislação que governa as transações inter­nacionais que envolvem residentes nestes dois países deverá levar em consideração, para fins tributários, os dispositivos do TDT em questão, conforme artigo 98 do CTN.

2 Isso porque, de acordo com a melhor doutrina, no que tange à interpretação dos TDTs, os comentários ao modelo de Convenção da OCDE podem servir de guia para interpretação pelo Brasil, a despeito do mesmo não ser um país signatário da OCDE.

3 O caput do artigo 150 da Constituição Federal (que trata das limitações do poder de tributar) inclui as questões tributárias no conceito de direitos fundamentais, esten­dendo, assim, a aplicabilidade do parágrafo 2° do artigo 5° aos TDTs.

4 "Art. 98. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legisla­ção tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha".

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

Ademais, os TDTs devem ser considerados como espécie de "t t d "5 d ra a o-contrato , o que nos con uz a outro argumento a fim de defender a supremacia dos tratados internacionais sobre a lei inter­na6 , qual seja, o princípio internacional do pacta sunt servanda. Nes­te sentido, todos os Estados Contratantes devem considerar os TDTs como contratos.

É importante levar em consideração, também em relação aos TDTs, que as decisões mais recentes dos tribunais superiores no Brasil - Supremo Tribunal Federal ("STF")1 e Superior Tribunal de Justi­ça ("ST]")8 - fazem referência à regra definida no artigo 98 do CTN, conforme mencionado pelo renomado Professor Ruy Barbosa No­gueira9 : "Isto é inconcuJJo e o Brasil não pode deixar de honrar o que

contratou e aJJinou como Tratado Internacional. Aprovou, ratificou e in­

corporou como supra-ordenado à sua legislação interna, quando sua le­

gislação tributária complementar à Constituição já reconhecia e reconhece

como revogatório da legislação tributária interna e imperativamente man­

da que os tratados e convenções internacionais também serão observados

pela legislação interna que lhes sobrevenha. A disposição do art. 98 do CTN,

além de legislação para-constitucional, é texto imperativo, dirigido ao legis­

lador ordinário e regulativo da limitação do poder de tributar'

5 Alguns doutrinadores brasJieiros distinguem os chamados tratados internacionais normativos ("tratado-normativo") e os tratados contratos ("tratado-contrato"). pelo qual o primeiro seria considerado como imposição de uma regra, aplicável aos Esta­dos signatários, enquanto q'le o último seria como contrato em que os Estados con­tratantes estabelecem direit >s e obrigações mútuas. Neste sentido, Jacob Dolinger, no artigo "As Soluções da Suprema Corte Brasileira para os Conflitos entre o Direito Interno e o Direito Internacional: um exercício de ecletismo", Revista Forense, Edito­

ra Forense, tome 334,1996, Rio de Janeiro, p. 71. 6 Outro argumento para sustentar a prevalência dos TDTs perante a legislação interna

refere-se à especificidade do tratado internacional, em contraposição com a genera­lidade da legislação interna, baseando-se no princípio /ex specia/is derogate gOlera/i. Isto significa que, os dispositivos do TDT são mais específicos e, em razão disso, devem prevalecer sobre as regras gerais internas, quando aplicáveis às relaçôes inter­

nacionais entre os dois Estados Contratantes. 7 Destacamos o Recurso Especial n° 426.945 - PR (2002/0043098-0), de 22.06.04.

8 Recurso Extraordinário nO 90.824-2 - SP, de 25.06.80. 9 ln "Tratados Internacionais em Matéria de Tributação", DTA, tomo 3, 1983, p. 354,

mencionado por Luís Eduardo Schoueri, in "Planejamento Fiscal Através de Acor·

dos de Bitributação - Treaty Shopping", Ed. RT, 1995, p. 102.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Com a finalidade de confirmar a posição de supremacia dos tratados internacionais, sob a perspectiva tributária, especialmente em referência ao imposto de renda, o artigo 99710 do Decreto nO 3.000, de 26.03.99, que aprovou o Regulamento do Imposto de Renda - "RIRl99", dispôs que os tratados internacionais, celebrados pelo governo brasileiro e devidamente inseridos em nosso ordenamento jurídico, no âmbito do Direito Tributário, devem prevalecer sobre as regras estabelecidas pela legislação interna.

III. Dos DISPOSITIVOS DOS TDTs APLICÁVEIS AOS SERViÇOS TÉc­

NICOS - DA POSSIBILIDADE DE EQUIPARAÇÃO A "ROYALTlES"

- TRATAMENTO TRIBUTÁRIO

Tendo em vista que o valor objeto dessa análise refere-se à

contraprestação por serviços técnicos, e que não há tratamento espe­

cífico reservado nos TDTs celebrados pelo Brasil para tal rendimen­to, resta-nos verificar a possibilidade de enquadramento dos mes­

mos no dispositivo desses TDTs que tratam de "roya/fies"

Neste sentido, verificamos que em diversos TDTs assinados pelo Brasil, embora os "serviços técnicos" não tenham sido conceitu­

ados como "royalties" no próprio artigo denominado como tal, os res-

la "Art. 997. Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legis­lação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha (Lei nO 5.172, de 1966, art. 98)."

De acordo com a melhor doutrina (e, inclusive, conforme comentários ao modelo de TDT proposto pela OCDE), no que tange à interpretação dos TDTs, os rendimentos oriundos da prestação de serviços, pagos por residente de um Estado contratante a beneficiário residente no outro Estado contratante, que não tenham sido expressa­mente equiparados a "royalties" pelo próprio TDTs em questão - tendo em vista a disposição do parágrafo 5 do artigo "Lucro das Empresas" da maioria dos TDT cele­brados pelo Brasil, pelo qual "quando os lucros compreenderem elementos de rendi­mentos tratados separadamente nos outros artigos da presente Convenção, as dispo­sições desses artigos não serão afetadas pelas disposições do presente Artigo", deve prevalecer o tratamento específico concedido pelo artigo de "royalties", devem ser enquadrados, no âmbito dos TDTs, no artigo relativo ao "Lucro das Empresas"

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

pectivos "Protocolos" (que muitas vezes são assinados em conjunto com os TDTs), subordinaram os pagamentos por serviços técnicos ao regime aplicável aos pagamentos de ''royalties'', criando, no âmbi­to de aplicação desses TDTs, certa equiparação para fins fiscais.

Tal equiparação está presente nos TDTs fumados pelo Brasil com os seguintes países12 : Alemanha13, Argentina14 , Canadã1s ,

("Business Profits"). Este enquadramento implicaria. regra geral. que tais rendimen­tos. desde que não atribuíveis a estabelecimento permanente do prestador do serviço localizado no país do tomador. somente poderiam ser tributados no país de residência do respectivo beneficiário. Não obstante. salienta-se que as Autoridades Fiscais brasi­leiras expressaram entendimento diverso por meio do Ato Declaratório (Normativo) COSIT n.O O 1. de 05.01.00. no sentido de que os rendimentos auferidos por residente no exterior pela prestação de serviços que não envolvam a transferência de tecnologia devem ser classificados nos TDTs celebrados pelo Brasil como "Rendimentos não Ex­pressamente Mencionados" ("Olher Incorne") e não como "Lucro das Empres'as ("Business Profils"). o que autorizaria a incidência do IRF no Brasil (chamada "com­petência cumulativa"). Em razão disso, o Brasil vem exigindo o IRE mesmo nos casos em que haja TDT celebrado com o pais do beneficiário do rendimento. 'ainda que o respectivo TDT não contenha o artigo referente aos "Rendimentos não Expressamente Mencionados" (no caso da França. por exemplo), admitindo. a nosso ver. hipótese ex­plicita de bi-tributação. No entanto. entendemos existirem ótimos argumentos para questionamento judicial do referido AD(N) COSIT n.O 01/00. inclusive com decisões positivas emanadas pelo judiciário, Neste sentido. apontamos as decisões da IS' Vara Federal da Justiça Federal de São Paulo. nos Mandados de Segurança nO 2000.61.00.012154-0 e n° 2000.61.00,015742-0, favoráveis à não incidência do IRF nas remessas de contraprestação por serviços que não envolvam a transferência de

tecnologia. 12 O TDT Brasil/Ucrânia. ass'nado em 16,01.02. também contém esta disposição. contu­

do ainda não foi aprovado e promulgado pelo ordenamento jurídico brasileiro. 13 Aprovado pelo Decreto Le;;islativo n.O 92, de 05,11.75, e promuJgado.pelo Decreto n°

76.988, de 06,0176. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo Decreto que aprovou o TDT, item 4. Tivemos acesso à informação ainda não oficial de

que a Alemanha pretende denunciar o TDT Brasil/Alemanha, 14 Aprovado pelo Decreto Legislativo n,O 74. de 05.12.81. e promulgado pelo Decreto n°

87.976. de 22,12.82, Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo

Decreto que aprovou o TDT. item 7. 15 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 28. de 12,11.85, e promulgado pelo Decreto n°

92.318. de 23.01.86, Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo Decreto que aprovou o TDT. item 8, A decisão do Processo de Consulta n° 124/99 da SRRF da 7a. Região Fiscal confirma essa possibilidade: "( ... ) Remessas ao exterior rela­cionadas a gastos com assistência técnica ou científica são tributadas na fonte à aliquota de 15%, recebendo o tratamento de roya/fies, eis que o Tratado Internacional entre Brasil e Canadá no seu respectivo Protocolo adicional, item 8, por pura ficção jurídica. equipara as remunerações de serviços técnicos ao conceito de roya/ties. (, .. )"

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

China!6, Chile!7 Coréia do Sul!8, Dinamarca!9,

Equador 20 , Espanha 2 !, Filipinas 22 , Holanda 23

16 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 85, de 24.11.92, e promulgado pelo Decreto n° 762, de 19.02.93. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo Decreto que aprovou o TDT, item 3. Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 331, de 22.07.03, e promulgado pelo Decreto nO 4.852, de 02.10.03. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mes­mo Decreto que aprovou o TDT, item 5.

18 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 205, de 07.10.91, e promulgado pelo Decreto nO 354, de 02.12.91. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo Decreto que aprovou o TDT, item 4. Neste sentido, destacamos a decisão do Processo de Consulta n° 83/03 da SRRF da 9a Região Fiscal, cujo trecho da ementa transcreve­mos: "As remessas efetuadas à empresa domiciliada no exterior em face de contrato referente à licença sobre direitos de propriedade industrial e de direito de uso de informações técnicas, incluindo, subsidiariamente, a obrigação da Licenciante de fornecer informações técnicas e assistência técnica, caracteriza pagamento de raya/ties conforme definição dada ao termo pela Convenção Internacional para Evitar a Du­pla Tributação em Matéria de Imposto de Renda, entre o Governo da República Fe­derativa do Brasil e o Governo da República da Coréia".

19 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 90, de 28.11.74, e promulgado pelo Decreto n° 75.106, de 20.12.74. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mes­mo Decreto que aprovou o TDT, item 3.

20 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.o 04, de 20.03.86, e promulgado pelo Decreto n° 95.717, de 11.02.88. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mes­mo Decreto que aprovou o TDT, item 5.

21 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 62, de 07.08.75, e promulgado pelo Decreto n° 76.975, de 02.0 1.76. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mes­mo Decreto que aprovou o TDT, item 5. Destacamos, para este TDT, as ementas das seguintes decisões: (i) Processo de Consulta n° 119/99, da SRRF da 7a. Região Fiscal: "Nas remessas a empresa domiciliada na Espanha aplicam-se as normas veiculadas na respectiva Convenção Internacional, em detrimento da lei interna. Por força do Protocolo, que é parte integrante do Tratado firmado, dá-se à remuneração relativa a prestação de serviços técnicos o mesmo tratamento dispensado ao pagamento de roya/ties" e (ii) Processo de Consulta nO 148/99, também da SRRF da 7a. Região Fis­cal: "Os rendimentos decorrentes do contrato de prestação de serviços de natureza técnica e gerencial, celebrado entre a consulente e a empresa domiciliada na Espanha (prestadora), sem qualquer estabelecimento em nosso país, dar-se-á o tratamento de transferência de royalties."

22 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 198, de 01.10.91, e promulgado pelo Decreto n° 241, de 25.10.91. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo Decreto que aprovou o TDT, item 7 b.

23 Aprovado pelo Decreto Legislativo nO 60, de 17.12.90, e promulgado pelo Decreto n° 355, de 02.12.91. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo Decreto que aprovou o TDT, item 5. Destacamos que tal equiparação contemplou "serviços'; de modo geral, e "assistência técnica': de maneira que os pagamentos decorrentes

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

H u ngri a 24, Í n dia2s , Itália26 , Luxemburg027 , Noruega28 , Por­tugal29 e T checoslováquiaJO

Portanto, nestes casos, as remessas de contraprestação por ser­viços realizados pelo prestador não-residente, efetuadas pelo tomador no Brasil, sujeitar-se-ão às regras do respectivo artigo atinente aos "royalties" do TDT celebrado pelo Brasil e o país de residência do prestador beneficiário do rendimento.

De modo geral, o artigo dos TDTs relativo a ''royalties'' deter­mina que tais valores serão tributados no Estado Contratante de residência do beneficiário, podendo os mesmos serem tributados no Estado Contratante de fonte (Brasil, in casu), de acordo com a legis­lação interna - a chamada "competência cumulativa" entre os Esta­

dos signatários, cuja tributação nesse segundo Estado (de fonte) es-

da prestação de serviços de modo geral estariam sujeitos ao tratamento aplicável aos "roya/ties" trazido pelo próprio TDT. Corrobora tal entendimento a decisão do Pro­cesso de Consulta n° 42/00 da SRRF da 7a. Região Fiscal: "( ... ) O Protocolo Adicional constante da Convenção Internacional Brasil-Holanda estabelece que às remunera­ções pela prestação de serviços e assistência técnica aplica-se o mesmo tratamento dispensado pela norma internacional aos roya/ties ( ... l."

24 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 13, de 22.06.90, e promulgado pelo Decreto n° 53, de 08.03.91. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo Decreto que aprovou o TD r. item 6.

25 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 214 de 12.11.91, e promulgado pelo Decreto n° 5 lO, de 27.04.92. Tal equ'paração está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo Decreto que aprovou o TD r, item 2.

26 Aprovado pelo Decreto Le) islativo n.O 77, de 05.12.79, e promulgado pelo Decreto n0 85.985, de 06.05.81. Tal e,-!uiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mes­

mo Decreto que aprovou o TDT, item 5. 27 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 78, de 05.12.79, e promulgado pelo Decreto

n0 85.051, de 18.08.80. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mes­

mo Decreto que aprovou o TDT, item 4. 28 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 50, de 05.10.81, e promulgado pelo Decreto

n0 86.7 lO, de 09.12.81. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mes­

mo Decreto que aprovou o TDT, item 6. 29 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O 188, de 08.06.01, e promulgado pelo Decreto

n0 4.012, de 13.06.01. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mes­

mo Decreto que aprovou o TDT, item 5. 30 Aprovado pelo Decreto Legislativo n.O II. de 23.05.90, e promulgado pelo Decreto

n0 43, de 25.02.91. Tal equiparação está contida no Protocolo aprovado pelo mesmo

Decreto que aprovou o TDT, item 3.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

taria limitada a determinado percentual do valor a ser remetido, caso a pessoa receptora dos "royalties" seja a efetiva beneficiária dos mes­mos3! Tal percentual geralmente corresponde a 15% (quinze por cento) do valor remetido, mas pode variar dependendo do TDT (em alguns casos, como no TDT Brasil/Argentina, não há fixação de limite de alíquota32 ) e/ou dependendo da natureza jurídica dos pa­gamentos efetuados (no caso da França, por exemplo, há três alíquotas distintas - de 10%, 15% e 25% - conforme a classificação/modalida­de específica dos "royalties" pagos). Outro exemplo de alíquota dis­tinta está presente no TDT Brasil/Japão, cuja alíquota máxima corresponde a 12,5%.

Importante destacar que em alguns TDTs firmados pelo Bra­sil, por meio de seus respectivos Protocolos, há cláusula usualmente denominada de "Cláusula do País Mais Favorecido". Referida Clã­usula dispõe que, em linhas gerais, na eventualidade de o Brasil,

posteriormente à assinatura do correspondente TDT, conceder a outro país Contratante tratamento tributário mais benéfico no que tange a determinado rendimento - como, por exemplo, a concessão de limitação de alíquota inferior no Estado de fonte para os paga­mentos de "royalties" -, referido tratamento será automaticamente

31 Tal "requisito", para incidência do limite de tributação no Estado contratante de fonte, aplica-se nos TDTs que contiverem a chamada "cláusula do beneficiário efe­tivo" dentro do artigo de "roya/ties" Exemplificativamente, citamos o TDT Brasill Holanda: "Artigo 12 - "Roya/ties" I. Os "roya/ties" provenientes de um Estado Con­tratante e pagos a um residente no outro Estado Contratante podem ser tributados nesse outro Estado. 2. Todavia, esses "roya/ties" podem ser também tributados no Estado Contratante de que provêm, e nos termos da lei desse Estado; mas se a pessoa que os receber for o beneficiário efetivo dos "roya/ties" o imposto inci­dente não poderá exçeder a: a) 25% (vinte e cinco por cento) do montante bruto dos "roya/ties" provenientes do uso ou do direito de usar marcas de indústria ou de comércio; b) 15% (quinze por cento) do montante bruto dos "roya/ties", nos de­mais casos. ( ... )" (destacamos).

32 No TDT Brasil/Noruega, a limitação de alíquota no Estado de fonte não está mais em vigor, conforme interpretação conjunta do Protocolo e Protocolo Suplementar, aprovado pelo Decreto Legislativo n. ° 04, de 28.02.96, e promulgado pelo Decreto nO 2.132, de 22.01.97, e de acordo com a interpretação emanada pelas Autoridades Fis­cais no Brasil por meio do Ato Declaratório n° 57, de 16.12.96, artigo 2°.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

aplicável ao primeiro país Contratante. Dentre os TDTs firmados pelos Brasil, identificamos que os TDTs Brasil/Coréia e Brasil/ Espanha possuem esta cláusula quanto aos ''royalties''. Isso signifi­ca, por exemplo, que a alíquota reduzida de 12,5% concedida pelo TDT Brasil/Japão poderia ser aplicável às remessas de ''royalties''

realizadas entre o Brasil e estes outros países. Contudo, especifica­mente com relação à aplicação da alíquota mais benéfica concedida pelo TDT Brasil/Japão, a mesma somente poderia ser estendida ao TDT Brasil/Espanha, pois somente neste caso o TDT Brasil/]a­

pão foi celebrado posteriormenteY Diante dessa análise, pode-se depreender que há legitimidade

para que a remessa efetuada ao beneficiário efetivo do rendimento

residente no outro Estado Contratante, correspondente a

contraprestação por serviços técnicos, sujeite-se às regras previstas no respectivo TDT aplicável a "royalties", de forma que a incidência tributária no Brasil (correspondente aos tributos visados pelo TDT

incidentes no país de fonte dessa remessa) estaria sujeita ao limite de alíquota fixado no artigo referente a "royalties" desse TDT (ou de outro mais benéfico, desde que haja a "Cláusula do País mais Favo­

recido", e a mesma possa ser aplicada no caso específico) sobre o

valor da contraprestação do serviç034

33

34

Inclusive, as Autoridades Fi .cais brasileiras já reconheceram este direito. conforme se pode depreender da ementa da Solução de Consulta n° 80, de 24.03.04, da SRRF da 8' Região Fiscal, vejamos: "Ementa: REMESSA AO EXTERIOR - "Royalties" Diante do disposto no parágrafo 3 do Artigo 12 do Decreto n° 76.975, de 2 de janeiro de 1976 (promulgou a Convenção destinada a Evitar a Dupla Tributação e Previnir a Evasão

Fiscal em Matéria de I mpostos sobre a Renda Brasil/Espanha) e do item 5 do Protocolo (parte integrante da Convenção), a remuneração paga, creditada, entregue, empregada ou remetida, a residente ou domiciliado no exterior, pela licença de uso de marca e signos e pela prestação de serviços de assistência, assessoramento e consultoria, carac­teriza "royalties" Por força do disposto no item 4 do Protocolo (parte integrante da Convenção), tais importâncias sujeitam-se à incidência do imposto de renda na

fonte à alíquota de 12,5% (doze e meio por cento). ( ... )" (destacamos) Na hipótese de a remessa não ser efetuada ao efetivo beneficiário do rendimento, e nos casos dos TDTs que tenham a "cláusula do beneficiário efetivo" no artigo refe­

rente aos "Royalties", entendemos que deveria ser aplicada a legislação interna braSI­leira, sem qualquer limitação de alíquota máxima no Brasil determinada pelo TDT.

33

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

111.1. Dos TRIBUTOS VISADOS PELOS TDTs

No tópico anterior vimos que, caso o receptor dos valores re­metidos a título de serviços técnicos seja o beneficiário efetivo des­tes valores, a incidência dos tributos visados pelo TDT estaria limi­tada a determinada alíquota (conforme regra definida pelo respecti­vo TDT aplicável ao caso) do valor remetido.

Resta-nos verificar, tanto diante da própria redação dos TDTs, bem como da legislação interna, doutrina (nacional e internacional) e jurisprudência, quais devem ser considerados os tributos visados pelos TDTs celebrados pelo Brasil, os quais estariam sujeitos à limi­tação de alíquota, determinada no respectivo artigo de "royalties",

com relação à tributação no Brasil (fonte de pagamento). Especificamente com relação às disposições do Modelo de Con­

venção da OCDE, no que tange aos tributos visados porTDTs, de­termina seu artigo 20 :

''Artigo 2 - Impostos Visados

1. Esta convenção aplica-se aos impostos sobre a renda e so­

bre o capital exigidos por um dos Estados Contratantes ou

uma de suas subdivisões políticas ou autoridades locais, in­

dependentemente da maneira pelo qual eles são arrecadados.

2. Consideram-se impostos sobre a renda e sobre o capital

aqueles que incidem sobre a totalidade da renda, sobre a

totalidade do capital ou sobre elementos do lucro ou do

capital, inclusive os impostos sobre os ganhos provenientes

da alienação de bens móveis ou imóveis, os impostos sobre

o montante total das remunerações ou salários pagos pela

empresa, assim como os impostos sobre as mais-valias.

3. Os impostos atuais aos quais se aplica a Convenção são particularmente:

a-) (no Estado A): ( ... )

b-) (no Estado B): ( ... )

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

4. A convenção aplica-se também a quaisquer impostos

idênticos ou substancialmente semelhantes que forem es­

tabelecidos após a data de sua assinatura, adicionalmente

ou em substituição aos impostos existentes. As autorida­

des competentes dos Estados Contratantes notificar-se­

ão mutuamente sobre quaisquer modificações substanciais

que ocorram em suas respectivas legislações tributárias." (destacamos)

Primeiramente, importante destacar que, a par de os TDTs, de modo geral, referirem-se ao termo "imposto", ao tratar da abrangência de aplicação do respectivo TDT, o mesmo deve ser entendido, no Brasil, como "tributo"35 . Isso porque, a nosso ver, a tradução do ter­mo utilizado na versão em inglês dos TDTs ("tax") foi efetuada de forma estrita, sendo "tributo" a tradução mais adequada ao sistema tributário brasileiro36 Tanto é assim que o TDT celebrado entre o Brasil e PortugaP7 incluiu expressamente no escopo de sua aplica­ção a Contribuição Social sobre o Lucro ("CSL"), denominando-a genericamente, juntamente como imposto de renda, de "imposto brasileiro".38

35 A palavra tributo no âmb to do direito tributário brasileiro abrange os impostos e as

contribuições previstos na Constituição Federal brasileira. 36 No mesmo sentido é o posicionamento de Heleno Torres. in "Pluritributação Inter­

nacional sobre as Rendas (e Empresas". editora Revista dos Tribunais. São PauJo. 2001.

p. 601. que assim dispõe: Os impostos aos quais se aplicam as regras convencionais

são os que constam do art 2°. e que fonnam também. o campo material das conven­

ções. como já foi dito. No modelo da OCDE parece que os únicos tributos que deve­

riam sofrer alteração seriam os impostos sobre a renda e o capital. Mas só aparente­

mente. porque esta limitação é uma garantia mínima. que não restringe a liberdade dos Estados contratantes em pactuarem entre si uma abrangência maior para o âmbito objeti­

vo dos Tratados. como fazem muitos. ampliando-o para abarcar impostos transvestidos de

contribuições e até mesmo legítimas contribuições. como veremos adiante."(dcstacamosl 37 Aprovado pelo Decreto-Legislativo nO 188, de 08.06.01. e promuJgado pelo Decreto nO 4.0 12,

de 13.11.01. 38 Destacamos as Decisões n.Os 109 e 112. da 7" Região Fiscal que. contrario sensu,

admitem a aplicação dos dispositivos dos TDTs para a COFINS. vejamos, respectiva­

mente suas ementas: "Na ausência de Convenção ou Tratado Internacional firmado

entre o Brasil e Peru para evitar a dupla tributação da renda. as receitas auferidas pela

empresa de transporte aéreo em epígrafe sujeitam-se à legislação tributária vigente

35

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Ademais, devemos esclarecer que as contribuições ora sob exa­me (quais sejam, PISlImportação, COFINSlImportação39 , CID E e CPMF) não se confundem com as contribuições diretas oferecidas pelo próprio segurado a fim de financiar a seguridade social40 Tais contribuições são expressamente excluídas dos TDTs, de acordo com as orientação previstas nos Comentários do Modelo da OCDE41 , pois consistem em pagamentos dos beneficiários-segurados aos sis­temas previdenciários e estão afastados do referido regime tributá­rio, tendo em vista que o objetivo das parcelas é garantir a proteção do sistema de seguridade social mediante retribuição de benefícios

individuais e pessoais.42

Pela leitura do artigo 2° do Modelo sugerido pela OCDE de TDT, percebe-se a dinâmica a ser adotada para verificação dos tri­butos visados pelo TDT: (i) o parágrafo 1° traz uma visão geral e abrangente dos tributos visados pelo TDT; (ii) o parágrafo 2°, à luz do anterior, especifica quais os tributos, dentre os tributos existentes

no Brasil. Portanto, a interessada deverá efetuar o recolhimento da contribuição para financiamento da seguridade social- COFlNS, à alíquota de 2% (dois por cento) sobre o faturamento mensal","Na ausência de Convenção ou Tratado Internacional firmado entre o Brasil e Inglaterra para evitar a dupla tributação da renda, as receitas auferidas pela empresa de transporte aéreo em epígrafe sujeitam-se à legislação tri­butária vigente no Brasil. Portanto, a interessada deverá efetuar o recolhimento da contribuição para financiamento da seguridade social - COFINS, à alíquota de 2% (dois por cento) sobre o faturamento mensal"

39 A despeito do PIS e da COFINS consistirem em contribuições à seguridade social, contudo não são contribuições feitas pelo segurado diretamente para seu próprio benefício, sendo, inclusive, as mesmas recolhidas à Receita Federal.

40 O caso típico dessa espécie tributária no Brasil é a contribuição para o Instituto Na­cional de Seguridade Social ("INSS").

41 111 Organisation for Economic Co-operation and Development ("OECD") Committee on Fiscal Affairs. Model Tax COl1ventiol1 on 1l1corne and On Capital. Danvers: Copyright Clearance Center, v. 1 e 2, 2000. Segundo tais comentários da OCDE ao parágrafo 2 do artigo 2: "Contribuições para seguridade social, ou cargas tributárias similares não são consideradas como impostos sobre o montante total dos salários, porque existe uma relação direta entre essas contribuições e as vantagens individuais recebidas em contrapartida" (tradução livre).

42 ln Coelho, Sacha Calmon Navarro. As contribuições para a seguridade e os tratados internacionais. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Oliveira Rocha -Comércio e Serviços Ltda., n. 26, p. 67,1997.

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

nos países contratantes, estão visados pelo TDT (no caso do Brasil, no geral somente o imposto de renda está contemplado neste pará­grafo, exceção feita ao TDT Brasil/Portugal, anteriormente mencio­nado, no qual a CSL foi expressamente incluída); e, por fim, (iii) o parágrafo 3°, que prevê (a) na sua primeira parte, a possibilidade de aplicação do TDT aos tributos futuros de natureza idêntica ou se­melhante aos abrangidos pelo mesmo no momento da celebração do TDT, que venham a acrescê-los ou substituí-los; e (b) na segunda parte, o compromisso de notificação mútua entre as autoridades com­petentes dos Estados Contratantes quanto às modificações substan­ciais que ocorram em suas respectivas legislações tributárias.

Apesar dos Estados Contratantes se comprometerem a notifi­car uns aos outros acerca das modificações relevantes introduzidas em suas respectivas legislações tributárias - incluídas aquelas refe­rentes à introdução de tributos idênticos ou semelhantes abrangidos pelo escopo do TDT4J, entendemos que tal artigo não gera uma

obrigação de notificar para que certo tributo novo esteja abarcado pelo correspondente TDT. Ou seja, na falta de notificação pela au­

toridade competente quanto à introdução de novos tributos idênti­cos ou semelhantes aos expressamente visados pelo TDT, não deve­

rão ser os beneficiários do TDT prejudicados.44

43 Destacamos, neste sentido, I recho dos Comentários da OCDE: "Cada Estado se com­promete a notificar o outro de qualquer mudança significativa ocorrida em suas leis

tributárias, informando, por exemplo, os detalhes dos impostos novos ou substituí­dos. Países membros são encorajados a informarem também sobre outros aconteci­mentos significativos, tais como novas regulamentações ou decisões judiciais; vários

países já adotam tal prática. Estados Contratantes podem também estender esta exi­gência de notificação, a fim de abranger quaisquer alterações significativas em outras leis que tenham impacto sobre suas obrigações nos termos desta convenção; ( ... )"

(tradução livre) 44 Neste sentido, citamos Vogel, Klaus. On Double Taxation Conventions. 3. ed. London: Kluwer

Law International, 1997, p. 158: "A notificação tem o propósito de informar a outra parte contratante de mudanças, caso haja alguma, no escopo de aplicação do tratado. A deficiên­cia em tal informação, porém, não deve acarretar nenhuma conseqüência legal. Se um Esta­do contratante omite-se em notificar qualquer mudança de suas leis tributárias, o imposto

recém-criado deve, não obstante, ser abrangido pelo TDT, desde que se encaixe nas condi­

ções estipuladas na primeira sentença do art. 2 (4)." (tradução livre)

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Superada esta questão, destacamos a relevância da primeira parte desse último parágrafo, cuja função é, de um lado, evitar que a mo­dificação da legislação interna afete o normal funcionamento das disposições do TDT, de modo a torná-lo inaplicável ou impedir o seu benefício às situações que normalmente estariam abarcadas pe­las suas disposições e, de outro, mostrar a tendência abrangente do TDT, o qual busca submeter às suas regras o maior número possí­vel dos tributos incidentes sobre os rendimentos, independente­mente das denominações utilizadas.

Diante disso, e seguindo a própria orientação constante dos

Comentários da OCDE em relação ao Artigo 2°45 , conclui-se que a "lista" de tributos contida no parágrafo 2° do artigo 2° é mera­mente declaratória, contendo apenas os tributos em vigor no mo­

mento das negociações46 de forma a ilustrar o TDT, não havendo que se falar em alcance limitativo do TDT, haja vista que futuros

tributos podem ser incorporados pelo mesmo, desde que atendam

aos requisitos do parágrafo 3° do artigo 2°, quais sejam: identidade ou substancial semelhança.

Apesar dos TDTs estabelecerem expressamente os requisitos relevantes para sujeição de tributos futuros aos seus dispositivos

45 Os Comentários da OCDE em relação aos parágrafos 3° e 4° do artigo 2° do Modelo dispõem. respectivamente: "( ... ) Este parágrafo relaciona os impostos em vigor à

época da celebração da Convenção. A lista não é completa. servindo para ilustrar os parágrafos anteriores ao Artigo. Em princípio. no entanto. é uma lista completa de impostos cobrados em cada Estado à época da assinatura e abrangidos pela Conven­ção.C .. )". e "C .. ) Este parágrafo prevê que. visto que a lista de impostos no parágrafo 3 é meramente declaratória. a Convenção deverá também se aplicar a todos os im­postos idênticos ou consideravelmente semelhantes que incidem sobre um Estado Contratante após a assinatura da Convenção. além de. ou no lugar de. impostos existentes naquele Estado." ( ... )"

46 Essa é a posição adotada por grande parte dos juristas do Brasil. como Alberto Xavier. ln "Direito Tributário Internacional do Brasil. 6" edição. atualizada - Rio de Janeiro: Forense. 2004. p. 170 e Heleno Torrês. Op. Cit.. p. 602. que entendem que a lista dos tributos constante do parágrafo 2° do artigo 2° não é exaustiva. porém. no momen· to da assinatura do TDT. este artigo deve conter todos os impostos em vigor. Caso isso não ocorra. o imposto ausente não poderá ser considerado "imposto visado" com base nos critérios de semelhança ou identidade.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

(i.e. identidade ou semelhança substancial), os mesmos não defini­ram com maior clareza o conceito ou o alcance desses requisitos, para fins de subordinação dos TDTs. Assim, devemos nos socorrer da legislação interna, doutrina (nacional e internacional) e juris­prudência para determinarmos a abrangência desses requisitos.

O legislador brasileiro estabeleceu, no artigo 4° do CTN, cri­tério a ser utilizado para a determinação da natureza jurídica espe­cífica de cada tributo, vejamos:

"Art. 4° - A natureza jurídica específica do tributo é de­terminada pelo fato gerador da respectiva obrigação, sen­do irrelevantes para qualificá-la:

I - a denominação e demais características formais adotadas pela lei;

II - a destinação legal do produto da sua arrecadação."

Diante deste dispositivo, verifica-se que o legislador nacional

utilizou o fato gerador dos tributos como critério de determinação

de sua natureza jurídica. Assim, poder-se-ia inferir que a identida­

de ou semelhança substancial entre fatos geradores de tributos po­

deria torná-los com naturezas jurídicas idênticas ou semelhantes,

respectivamente, parecendo-nos um critério a ser possivelmente

admitido pelas Autoridades Fiscais e Judiciárias brasileiras para

fins de aplicação do parágrafo 3° do artigo 2° do TDT, diante de

sua positivação no CTN. Nesse ponto, encontra destaque o trabalho do jurista alemão

Klaus Voge147 , ao dizer que, para comparação entre o fato gerador

de um novo imposto com o de outro já existente, devemos ponde­rar a totalidade das espécies tributárias historicamente concebidas

no Estado em questão e assim descobrir a qual delas o novo im­

posto mais se aproxima. Portanto, devemos analisar todo o sistema

47 Op. Cit.. p. 157.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

tributário. Além disso, afirma, acompanhado pela doutrina majori­tária48 , que os aspectos formais dos tributos, tais como a denomina­ção, o método adotado para sua cobrança, os contribuintes envolvi­dos e a alíquota, entre outros, são irrelevantes, devendo ser persegui­dos os aspectos materiais constitutivos dos tributos.

São cinco os elementos constitutivos dos tributos, de acordo com Paulo de Barros Carvalh049 , os quais podem ser agrupados em duas colunas, sendo assim: (i) hipótese ou fato gerador, identificado pelo (a) elemento material - comportamento de pessoas; (b) ele­mento espacial- local no qual deve o fato ocorrer; e (c) elemento temporal- instante em que acontece o fato descrito; e (ii) conseqü­ência ou efeito jurídico, identificado pelo (d) elemento pessoal- su­jeitos da relação (ativo e passivo); e (e) elemento quantitativo - fato­res que, conjugados, exprimem o valor pecuniário da dívida (alíquota e base de cálculo).

Diante disso, verifica-se que o aspecto material da constitui­ção dos tributos corresponde ao seu fato gerador (comportamento das pessoas, eleito pelo legislador como evento que dá origem ao nascimento da obrigação tributária). Já a base de cálculo corresponde a um dos elementos quantitativos pertencente ao efeito jurídico do tributo. Contudo, conforme Alfredo Augusto Beckerso , fato gera­dor e base de cálculo estão intrinsecamente relacionados, sendo a base de cálculo o núcleo do fato gerador por lhe conferir seu gêne­ro jurídico.

48 Neste sentido, destacamos, Luciano Amaro in "Os tratados internacionais e a contri­

buição sobre o lucro", Valdir de Rocha (org.), in "Grandes questões atuais de Direito Tributário, p. 155 ss.; Helenilson Cunha Pontes, A contribuição social sobre o lucro e

os tratados para evitar a dupla tributação sobre a renda, ibidem, 41 ss.e Heleno T ôrres in "A pluritributação internacional sobre as rendas de empresas", São Paulo 200 I, p. 603 e 604.

49 ln "Curso de direito Tributário': \3- ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 236 à 238. 50 ln "Teoria Geral do Direito Tributário" São Paulo: Saraiva, 1963. p. 298, vejamos: "Na

composição da hipótese de incidência o elemento mais importante é o núcleo. E a [Iatureza do núcleo que permite distinguir as distintas naturezas jurídicas dos negócios jurídicos. Também é o núcleo que confere o gênero jurídico ao tributo. Nas regras jurídicas de tributação, o núcleo da hipótese de incidência é sempre a base de cálculo':

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COORDENAÇÃO: PEDRO MAN JR.

Assim, entendemos que são estes os aspectos (fato gerador e, conseqüente, base de cálculo) que devem ser perseguidos a fim de determinar identidade e semelhança entre os tributos, por serem os mesmos genericamente entendidos como os aspectos materiais dos tributos.

No mesmo sentido é o posicionamento do doutrinador Alberto Xavie~1 , o qual esclarece que para dois tributos serem considerados idênticos ou substancialmente semelhantes devem possuir a mesma base de cálculo e fato gerador, não importando sua denominação, o destino dos seus recursos, a pessoa de direito público titular do mes­mo ou a forma de sua cobrança. Confira-se: "Os Estados contratantes

elaboram uma lista dos impostos atuais a que a Convenção se aplica, lista

que se reveste de caráter meramente declaratório, não tendo qualquer al­

cance limitativo. (. . .) Ora, a natureza dos tributos deve identificar-se no

fato gerador e na base de cálculo (substancialmente idênticos aos do im-

posto de renda propriamente dito) e não na sua denominação ou destino,

como esclarece o art. 4° do Código Tributário Nacional."

Qyanto às manifestações do poder judiciário brasileiro sobre o

tema, localizamos o Acórdão no Agravo Regimental no Agravo de Instrumento nO 98.02227170, da 6a Turma do Tribunal Regional

Federal ("TRF") da 2a Região, publicado em 08.12.98, do qual trans­

crevemos parte da ement 1:

"PROCESSUAL CIVIL. DIREITO TRIBUTÁRIO IN­TERNACIONAL. TRATADO DE RECIPROCIDA­DE ENTRE OS ESTADOS ESTRANGEIROS. BITRIBUTAÇÃO. COFINS. DESCABIMENTO DA ANTECIPAÇÃO DA TUTELA. ( ... )

III) Acordo aprovado pelo Decreto nO 69.398, de 21.10.71,

tem por escopo evitar a dupla tributação em matéria de imposto sobre o rendimento, seja na modalidade de acrés­

cimo ou substituição.

51 Op. Cit.. p. 170 e 171.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

IV) Não se confunde renda com faturamento mensal (re­

ceita bruta das vendas de mercadorias e de serviço de qual­quer natureza). Não configurada dupla tributação sobre rendimentos a cobrança da COFINS, que tem por base de

cálculo o faturamento e não o lucro."

Diante deste trecho da ementa acima transcrito, pode-se notar que o Judiciário, mais especificamente o TRF da 2" Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo), tomou como elemento para descaracterizar a pretendida dupla tributação para fins de aplicação de determinado TDT a base de cálculo da COFINS, em sua hipótese de incidência original sobre a receita bruta das pessoas jurídicas de direito privado residentes no Brasil, a qual é diversa da base de cálculo do imposto de renda.

Deste modo, poderíamos concluir no sentido de que, para que tributos sejam considerados "idênticos ou substancialmente seme­lhantes", os seus fatos geradores e bases de cálculo devem ser igual­mente idênticos ou substancialmente semelhantes, de maneira que os mesmos possuam a mesma natureza jurídica, desde que não haja relação direta entre a exação e o benefício individual a ser recebido pelo contribuinte, sendo irrelevante a respectiva espécie tributária, a denominação, a pessoa de direito público que seja titular, a destinação constitucional da renda, os métodos adotados para cobrança.

Neste sentido, para que outros tributos estejam abarcados por TDTs celebrados pelo Brasil, necessário se faz que os mesmos pos­suam, respectivamente, fato gerador e base de cálculo idênticos ou substancialmente semelhantes ao do imposto de renda (tributo con­templado expressamente no escopo dos TDTs), no caso em questão (i.e. remessa para o exterior de remuneração pela prestação de servi­ços técnicos), na modalidade "retido na fonte" (IRF).

O IRF tem como fato gerador, especificamente para fins do presente estudo, o pagamento, crédito, entrega, emprego ou remessa de valores remuneratórios (base de cálculo) de serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa e semelhantes pagos por fonte brasileira à pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no ex-

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COORDENAÇÁO: PEDRO ANAN JR.

terior, independente da forma de pagamento e do local e data em que a operação tenha sido contratada, os serviços executados ou a assistência prestada, conforme determina o artigo 70852 do RIR/99.

Ora, para que determinado tributo esteja abarcado por TDT celebrado pelo Brasil, em nossa opinião, faz-se necessário que seu fato gerador e base de cálculo sejam idênticos ou substancialmente semelhantes ao fato gerador e à base de cálculo do IRE

Após essas considerações, resta-nos analisar um a um os tribu­tos mencionados na introdução, incidentes na remessa de contraprestação de serviços técnicos para o exterior, para verificar a consistência na argumentação em eventual ação judicial buscando aplicar aos mesmos as disposições dos TDTs firmados pelo Brasil, especialmente quanto à limitação de alíquota incidente no Brasil

(país de fonte) prevista no respectivo TDT.

IV. Dos TRIBUTOS INCIDENTES NA REMESSA VIS-À-VIS AO IRF

VISADO NO TDTs

1V.1. (IDE

Em 30.11.00, a Med da Provisória ("MP") nO 2.062-60 deter­

minou, em seu artigo 3°, a redução de 25% (vinte e cinco por cento)

para 15% (quinze por cento), da alíquota do IRF incidente sobre os

52 "Art. 708. Estão sujeitos à incidência do imposto na fonte. à alíquota de vinte e cinco por cento, os rendimentos de serviços técnicos e de assistência técnica, administrati­va e semelhantes derivados do Brasil e recebidos por pessoa física ou jurídica resi­dente ou domiciliada no exterior, independentemente da forma de pagamento e do local e data em que a operação tenha sido contratada, os serviços executadm ou a assistência prestada. (Decreto-Lei n.O 1.418, de 3 de setembro de 1975, art. 6°, Lei n.O 9.779, de 199, art. 70). Parágrafo único. A retenção do imposto é obrigatória na data do pagamento, crédito, entrega, emprego ou remessa dos rendimentos (Decreto-Lei

n.O 5.844, de 1943, art. IDO}."

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDlCA

"royafties", bem como sobre a remuneração da assistência técnica e dos serviços técnicos, pagos por fonte situada no Brasil a residente ou domiciliado no exterior, sob a condição de ser instituída aCIDE, a qual incidiria sobre as mesmas importâncias, in verbis:

"AIt. 3°. Fica reduzida para 15% a alíquota do imposto de ren­

da incidente na fonte sobre as importâncias pagas, creditadas,

entregues, empregadas ou remetidas ao exterior a título de re­

muneração de serviços técnicos e de assistência técnica, e a

título de "royafties", de qualquer natureza, a partir do início da

cobrança da contribuição instituída pela lei 10.168/00"

Tal contribuição foi instituída pela Lei nO 10.168, de 29.12.00, posteriormente alterada pela Lei nO 10.332, de 19.12.01, que nos

parágrafo 2° e 3° do artigo 2°, determina:

"Art. 2°. ( ... )

§2°. A partir de 1° de janeiro de 2002, a contribuição de

que trata o caput deste artigo passa a ser devida também

pelas pessoas jurídicas signatárias de contratos que tenham

por objeto serviços técnicos e de assistência administrativa

e semelhantes a serem prestados por residentes ou

domiciliados no exterior, bem assim pelas pessoas jurídicas

que pagarem, creditarem, entregarem, empregarem ou re­

meterem royalties, a qualquer título, a beneficiários, resi­

dentes ou domiciliados no exterior.

§3°. A contribuição incidirá sobre os valores pagos, credi­

tados, entregues, empregados ou remetidos, a cada mês, a

residentes ou domiciliados no exterior, bem assim pelas

pessoas jurídicas que pagarem, creditarem, entregarem,

empregarem ou remeterem roya/ties, a qualquer título, a

beneficiários residentes ou domiciliados no exterior."

Diante da legislação supracitada, pode-se verificar que o fato gerador da CID E corresponde ao pagamento, crédito, entrega, em-

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

prego ou remessa de valores remuneratórios (base de cálculo) de ser­viços técnicos, assistência técnica e "royalties" prestados por residen­tes ou domiciliados no exterior.

Deste modo, comparando fato gerador e base de cálculo entre o IRF e a CID E, podemos observar substancial semelhança entre os dois tributos, quanto a estes aspectos materiais. Ademais, o fato da alíquota do IRF ter sido reduzida, condicionada tal redução a criação de nova contribuição (CIDE), parece-nos clara a intenção do legisla­dor de simplesmente introduzir no mesmo lugar um novo tributo de nome diferente, mas com mesmo fato gerador. Portanto, mediante uma observação sistemática da introdução da CIDE no ordenamento jurídico brasileiro, nota-se que o legislador optou por reduzir a alíquota

do IRF sobre as referidas remunerações, substituindo tal parcela por nova contribuição incidente sobre o mesmo montante. 53

Poderia ser alegado, com o objetivo de afastar a CID E do âmbi­

to de aplicação dos TDTs, que a mesma possui contribuinte54 dis­

tinto do IRF. Todavia, entendemos que eventual argumentação nes­te sentido não deve prosperar, pois: (a) como vimos anteriormente, o

53 Neste particular. é de extrema relevância o comentário de Vogel in 01'. Cit.. p. 157: "Um imposto com a finalidade de substituir um imposto existente não é. por outro lado. necessariamente idê lticO a seu antecessor. e somente o será. caso assuma o lu­gar da lei anterior no siste na tributário e estiver amplamente em conformidade com

suas características essenl iais." 54 Os contribuintes da CIDE estão definidos no artigo 2°. caput e parágrafo 2n da Lei

n.O 10.168/00. vejamos: "Art. 2° Para fins de atendimento ao Programa de que trata o artigo anterior. fica instituída contribuição de intervenção no domínio econômico. devida pela pessoa jurídica detentora de licença de ou adquirente de conhecimentos tecnológicos. bem como aquela signatária de contratos que impliquem transferência de tecnologia. firmados com residentes ou domiciliados no exterior. ( ... ) § 2° A partir de 1 ° de janeiro de 2002. a contribuição de que trata o cap .. t deste artigo passa a ser devida também pelas pessoas juridicas signatárias de contratos que tenham por ob­jeto serviços técnicos e de assistência administrativa e semelhantes a serem prestados por residente ou domiciliados no exterior. bem assim pelas pessoas jurídicas que pagarem. creditarem. entregarem. empregarem ou remeterem rora/ties. a qualquer título. a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior.". Já quanto ao IRE consta do artigo 722 do RIR/99 a responsabilidade da fonte pagadora: "Art. 722. A fon~~ pagadora fica obrigada ao recolhimento do imposto. ainda que não o tenha retido.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JlIRIDIC A

aspecto pessoal (contribuinte) não seria relevante para determinação de identidade ou semelhança entre tributos; e (b) ainda que fosse relevante, o sujeito passivo55 da obrigação tributária nos dois tribu­tos coincidem, um como efetivo contribuinte (CIDE), e o outro como responsável tributário (IRF).

Contudo, localizamos o Acórdão nO 141460, da 6a Turma do TRF da 3a Região56 , que decidiu no sentido de excluir a CIDE da aplicabilidade do TDT em questão naquele caso (TDT BrasiV Holanda), com base na argumentação de que tal contribuição tem "contornos absolutamente distintos" do IRF, não se assemelhando ao mesmo, e de que somente impostos sujeitam-se às disposições dos TDTs, e não contribuições. Vale destacar que a argumentação apre­sentada pelo Relator do Agravo de Instrumento em comento nos pa­rece inconsistente, tendo em vista que, como restou demonstrado aci­ma, a hipótese de incidência da CIDE se assemelha substancialmente à do IRF, além de ser a não aplicação dos TDTs às contribuições, de maneira geral, tema ultrapassado, tendo sido já a CSL expressamente contemplada no escopo do TDT BrasiVPortugal.

55 Destacamos o artigo 121 do CTN, que trata do sujeito passivo da obrigação tributária, vejamos: "Ar!. 121 Sujeito passivo da obrigação principal é a pessoa obrigada ao paga­mento de tributo ou penalidade pecuniária. Parágrafo único. O sujeito passivo da obri­gação principal diz-se: I - contribuinte, quando tenha relação pessoal e direta com a situação que constitua o respectivo fato gerador; " - responsável, quando, sem revestir a condição de contribuinte, sua obrigação decorra de disposição expressa de lei."

56 Destacamos trecho da íntegra do referido acórdão: "Por derradeiro, relativo à violação, pela legislação atual, ao Decreto n." 355/91, que incorporou ao ordenamento jurídico brasileiro tratado firmado entre o Brasil e os paises bai­xos, referente ao imposto de renda, a legislação atacada exige a arrecadação de novo tributo, criado sob a mesma hipótese de incidência tributária na qual se assenta o Imposto de Renda, cuja alíquota, no presente caso, não poderia ser superior a 15%. Consideramos o sistema tributário nacional, previsto na Carta Constituição, não há vício algum na medida em que a contribuição ora discuti­da tem contornos absolutamente distintos, apenas, a incidência de imposto de renda e de qualquer outro imposto idêntico ou substancialmente semelhante que forem posteriormente criados. Assim, a contribuição de intervenção sequer se assemelha ao imposto de renda, não podendo, portanto, sofrer a limitação do trata­do. O Tratado refere-se à disciplina da incidência de impostos e não contribuições, não havendo que se falar em violação ao Tratado ratificado pelo Decreto n." 355/91, nem em bitributação." (destacamos)

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Concluímos esta análise quanto à CID E no sentido de que, em noss~ opinião, há argumentos bastante consistentes para questlOnamento judicial objetivando a inclusão desta contribuição no escopo de aplicação dos TDTs celebrados pelo Brasil, especial­mente quanto à limitação de alíquota onerada no país de fonteS7 ,

apesar das decisões administrativasS8 e do Acórdão localizados, em sentido contrário.

1V.2. ISSIIMPoRTAçÃo

Com o advento da Lei Complementar ("LC") nO 116, de

31.07.03, que reformulou a disciplina nacional do ISS, as importa­

ções de serviços passaram a ser tributadas também por este imposto.

57 Corroborando nosso entendimento, destacamos artigo de Matos, Gustavo Martini de. Questões Relacionadas à Tributação dos" Royalties", em virtude da Existência de Tratados Internacionais. Revista Dialética de Direito Tributário, São Paulo: Oliveira Rocha - Comércio e Serviços Ltda., n. 95, p. 65, 2003.

58 Destacamos, adicionalmente à decisão citada na nota de rodapé n.O I, as seguintes decisões: Processo de Consulta n° 134, de 07.05.01, da SRRF da 8a. Região Fiscal: "( ... ) Outros Tributos e Cnntribuições REMESSA AO EXTERIOR DE "R OYA LTIES " É devida a contribuição de intervenção de domínio económico, à alíquota de dez por cento, sobre os valores pagos, creditados, entregues, empregadas ou remetidas, à títu­lo de remuneração decor 'ente das obrigações indicadas no art. 2° da Lei n° 10.168/ 2000, à pessoa jurídica re' idente ou domiciliada na Holanda. A Convenção Destina­da a Evitar a Dupla Trib ltação e Prevenir a Evasão Fiscal em Matéria de Imposto sobre a Renda, entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo do Reino dos Países Baixos, aplica-se relativamente ao imposto federal sobre a renda, não alcançando contribuições federais. Portanto, não se cogita da aplicação de limite de alíquota de tributação do imposto de renda, de que !Tata o art. 12, inciso 2, da citada Convenção, no pagamento de royalties a residente na Holanda, considerando­se a soma das alíquotas do imposto sobre a renda e da contribuição de intervenção de domínio económico. ( ... )"; e Processo de Consulta n° 341, de 11.12.02, da SRRF da 8a. Região Fiscal: "Assunto: Outros Tributos ou Contribuições. Ementa: CON­TRIBUIÇÃO DE INTERVENÇÃO NO DOMINIO ECONOMICO - Tratados Inter­nacionais - Aplicação. O disposto na Convenção firmada entre Brasil e França (pro­mulgada pelo Decreto n° 70.506, de 1972) para evitar a dupla tributação e prevenir a evasão fiscal em matéria de impostos sobre o rendimento, não se aplica à Contribui­ção de Intervenção no Domínio Económico - Cide, por ter sido instituída posterior­

mente e não se enquadrar no parágrafo 2° do Artigo II."

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

Referida LC determina, no seu artigo 1°, "capu! ", que o fato gerado~9 do ISS consiste na prestação de serviços incluídos na lista anexa a esta Lei, ainda que esses serviços não constituam a atividade preponderan­te do prestador, estabelecendo, no seu parágrafo 1°, a incidência do ISSlImportação sobre os serviços provenientes do exterior ou sobre os serviços cuja prestação se tenha iniciado no exterior. A base de cálculo do ISS, conforme o artigo 7° da LC nO 116/03, corresponde ao preço do serviço60

É importante ressaltar que, conforme o artigo 15661 da Cons­tituição Federal, o ISS é um imposto de competência Municipal, sendo.esta, portanto, a autoridade legitimada para criá-lo e instituí-10. Neste sentido, o Município de São Paulo, no âmbito de sua com­petência, editou a Lei Municipal nO 13.701, de 24.12.03, que trata do ISS, reforçando ser a base de cálculo do ISS (mesmo na modali­dade "Importação", o preço do serviçoY

Com relação ao contribuinté3 e ao responsável pelo recolhi­mento64 do ISSlImportação, podemos notar semelhança substan­cial quanto aos do IRF, conforme artigos 5° e 6° da LC nO 116/03. De fato, inclusive a sistemática de recolhimento desses tributos são

59 '"Art. 1°. O imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Mu­nicípios e do Distrito Federal. tem como fato gerador a prestação de serviços cons­tantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponde­rante do prestador. § 1 0. O imposto incide também sobre os serviços proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País. ( ... )"

60 '"Arl. 7°. A base de cálculo do imposto é o preço do serviço. ( ... )" 61 '"Art 156: Compete aos municípios instituir imposto sobre: ( ... ) III - serviços de qual­

quer natureza, não compreendidos no arl. 155, II, definidos em Lei Complementar." 62 Em seu artigo 14, referida Lei traz a definição da base de cálculo do ISSISão Paulo:

'"Art 14. A base de cálculo do Imposto é o preço do serviço, como tal considerada a receita bruta a ele correspondente, sem nenhuma dedução, excetuados os descontos ou abatimentos concedidos independentemente de qualquer condição."

63 Conforme LC n° 116/03: '"Arl. 5°. Contribuinte é o prestador do serviço." 64 Conforme LC n° 116/03: "Artigo 6° ( ... ) § 1 ° Os responsáveis a que se refere este

artigo estão obrigados ao recolhimento integral do imposto devido, multa e acréscimos legais, independentemente de ter sido efetuada sua retenção na fon­te. § 2° Sem prejuízo do disposto no caput e no § 1 ° deste artigo, são responsá­veis: I - o tomador ou intermediário de serviço proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País; ( ... )" (destacamos)

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

semelhantes, na medida em que ambos devem ser, em princípio, re­tidos pela fonte de pagamento.

Contudo, como já argumentamos, tais aspecros não seriam re­levantes para perseguir identidade/semelhança entre tributos. Para tanto, devemos verificar se o fato gerador (qual seja, a prestação de serviço provenientes do exterior ou serviços cuja prestação se tenha iniciado no exterior) e a base de cálculo (qual seja, preço do serviço) do ISSlImportação se assemelham substancialmente ao fato gera­dor e à base de cálculo do IRF.

De fato, entendemos que o valor da base de cálculo desses tri­butos pode coincidir, mas o aspecto material da hipótese de incidên­cia (revelado, como vimos, especialmente pelo fato gerador) difere, na medida em que o fato gerador (a) do IRF corresponde ao paga­mento, crédito, emprego, à entrega ou remessa de rendimento pela contraprestação de serviços, independentemente do local em que tais serviços tenham sido executados; e (b) do ISS, como visto, corresponde à própria prestação do serviço - prestação esta que, na modalidade "ISSlImportação", precisa ter sido totalmente realizada ou pelo me­nos iniciada no exterior. 65

Deste modo, apesar de tais impostos dependerem da "prestação de serviço" para que os respectivos fatos geradores ocorram (ou seja, se não houver prestação de serviço em si, não haverá nem fato gera­dor do IRF, nem do ISS/lmportação), são acontecimentos diferen­tes que acarretam a hipótese de incidência dos mesmos. Assim, no caso do ISSlImportação, a mera prestação de serviços provenientes do exterior ou ali iniciadcs, cujo tomador desses serviços seja brasi­leiro, acarretaria ocorrência do seu fato gerador, independentemente de haver, por fonte brasileira, pagamento, crédito, emprego, entrega ou remessa do rendimento pela contraprestação desses serviços (fato gerador do IRF), de maneira que, a nosso ver, tais impostos possuem

natureza jurídica distinta.

65 No mesmo sentido, destacamos Schoueri, Luis Eduardo. O ISS sobre a importação de serviços do exterior. Rel'ista Dia/ética de Direito Triblltário. São Paulo: Oliveira

Rocha - Comércio e Serviços Ltda .. n. 100, p. 39.2004.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

Assim, podemos concluir que, a par do contribuinte e da metodologia de recolhimento do ISSlImportação guardar semelhança substancial com o IRF, pela diferença no aspecto material, tais se­melhanças não nos parecem substancias o suficiente (diferente da CIDE) para lograr êxito em medida judicial objetivando a inclusão do ISS/Importação no âmbito de abrangência dos TDTs.

66 IV.3. PIS/IMPORTAÇÃO E (OFINS/IMPORTAÇÃO

o PISlImportação e a COFINS/lmportação foram instituí­dos em nosso ordenamento jurídico após a Emenda Complementar ("EC") nO 42, de 19.12.03, pela MP nO 164, de 29.01.04, posterior­mente convertida na Lei nO 10.865, de 30.04.04.

Referida Lei nO 10.865/04 determina, quanto ao PISlImpor­tação e à COFINS/lmportação incidentes na importação de servi­ços: (a) em seu artigo 3°67 , inciso II, o fato gerador, que consiste no pagamento, crédito, entrega, emprego ou remessa a residentes ou domiciliados no exterior, seja pessoa física ou jurídica, de valores como contraprestação por serviços prestados e executados no país (Brasil) ou executados no exterior, cujo resultado se verifique no país (Brasil); e (b) em seu artigo 7°68 , a base de cálculo, que corresponde ao valor do serviço, acrescido do valor pago a título de ISSlImporta­ção e do valor das próprias contribuições.

Podemos perceber que o fato gerador do PISlImportação e da COFINSlImportação possui semelhança com o do IRF, ainda que

66 Ressalta-se que, apesar da nomenclatura, o PIS/lmportação e a COFINS/lmportação não se confundem com o PIS e a COFINS, dispostos pelas Leis nOs 9.718, de 27.1 1.98; 10.637, de 30.12.02 e 10.833, de 29.12.03, cujas hipóteses de incidência são distintas.

67 "Art.3°. O fato gerador_será: ( ... ) II - o pagamento, o crédito, a entrega, o empre­go ou a remessa de valores a residentes ou domiciliados no exterior como contra prestação por serviço prestado."

68 "Artigo 7°. A base de cálculo será: ( ... ) II - o valor pago, creditado, entregue, empregado ou remetido para o exterior, antes da retenção do imposto de renda, acrescido do Imposto sobre Serviços de qualquer Natureza - ISS e do valor das próprias contribuições, na hipótese do inciso II do caput do artigo 3 desta Lei."

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(OOROENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

esta não seja tão patente, como no caso da CIDE, por nós já analisa­da. Isso porque o IRF incide no pagamento, remessa, crédito, em­prego ou entrega de contraprestação de serviços, independente do local de execução do mesmo pelo não-residente. Já o PISlImporta­ção e a COFINSlImportação incidem sobre pagamento, remessa, crédito, emprego ou entrega de contraprestação de serviços, executa­dos no Brasil ou, se executados no exterior, desde que seus resultados sejam verificáveis no Brasil.

Do mesmo modo, há dessemelhança nas bases de cálculo des­ses tributos, tendo em vista que a do IRF corresponde, em suma, ao valor remetido, enquanto que a do PI S/Importação e da COFINS/ Importação corresponde ao valor do serviço, acrescido do valor pago a título de ISSlImportação e do valor das próprias contribuições.

Tais dessemelhanças não nos parecem suficientes para impedir que esses tributos sejam considerados substancialmente semelhan­tes para fins de tentativa de ampliar a abrangência dos TDTs cele­brados pelo Brasil.

Desse modo, apesar de termos identificado algumas dessemelhanças entre o fato gerador e a base de cálculo do IRF e do PISlImportação e da COFINSlImportação, os quais não são tão substancialmente semelhantes como no caso da CIDE, entendemos que há semelhanças relevantes, como vimos, com relação a estes as­pectos materiais, de maneIra que entendemos defensável a tentativa de questionamento judicial para inclusão dessas contribuições no

âmbito de abrangência dcs TDTs.

1V.4. ePMF

Por fim, cabe a análise da CPMF, instituída pela Lei nO 9.311, de 24.11. 96, que, mediante a análise combinada dos seus artigos 10 e 2069 , tem como fato gerador a movimentação ou transmissão de va-

69 Art. l0. ( ... ) § Único: "Considera-se movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira qualquer operação liquidada ou lançamen­to realizado pelas entidades referidas no art. 2°, que representem circulação escriturai

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

lores, créditos e direitos de natureza financeira, sendo que o legisla­dor considerou como movimentação financeira qualquer liquidação de operação ou lançamento efetuado por instituição financeira ou demais entidades referidas nos incisos do artigo 2° da Lei nO 9.311/ 96, que represente circulação escritural ou física de moeda, e de que resulte ou não transferência da titularidade dos mesmos valores, cré­

ditos e direitos. No tocante à base de cálculo desta contribuição, determina o

legislador, no artigo 6°70 da Lei nO 9.311/96, corresponder a mesma

ao valor lançado, movimentado ou transmitido. Diante destes dispositivos, resta-nos patente a dessemelhança en­

tre os fatos geradores e as bases de cálculo da CPMF e do IRF, o que torna, a nosso ver, remota, as possibilidades de êxito de medida judicial

objetivando incluir a CPMF no âmbito de abrangência dos TDTs.

ou física de moeda, e de que resulte ou não transferência da titularidade dos mesmos valores, créditos e direitos." Art. 2° ( ... ) I - o lançamento a débito, por instituição financeira, em contas correntes de depósito, em contas correntes de empréstimos, em contas de depósito de poupança, de depósito judicial e de depósitos em consigna­ção de pagamento ( ... ); II - o lançamento a crédito, por instituição financeira, em contas correntes que apresentem saldo negativo, até o limite de valor da redução do saldo devedor; III - a liquidação ou pagamento, por instituição financeira, de quais­quer créditos, direitos ou valores, por conta e ordem de terceiros, que não tenham sidos creditados, em nome do beneficiário, nas contas referidas nos incisos anterio­res, IV - o lançamento, e qualquer outra forma de movimentação ou transmissão de valores e de créditos e direitos de natureza financeira, não relacionados nos incisos anteriores, efetuados pelos bancos comerciais, bancos múltiplos com carteira co­merciai e caixas econômicas; V - a liquidação de operação contratadas nos mercados organizados de liquidação futura e VI - qualquer outra movimentação ou transmis­são de valores e de créditos e de direitos de natureza financeira que, por sua finalida­de, reunindo características que permitam presumir a existência de sistema organi­zado para efetivá-Ia, produza os mesmos efeitos previstos nos incisos anteriores, in­dependentemente de pessoa que a efetue, da denominação que possa ter e da forma jurídica ou dos instrumentos utilizados para realizá-Ia."

70 "Art. 6° Constitui a base de cálculo: I - na hipótese dos incisos, I, II e IV do art. 2°, o valor do lançamento e de qualquer outra forma de movimentação ou transmissão; II - na hipótese do inciso III do art. 2°, o valor da liquidação ou do pagamento; III- na hipótese do inciso V do art. 2°, o resultado, se negativo, da soma algébrica dos ajustes diários ocorridos no período compreendido entre a contratação inicial e a liquida­ção do contrato; IV - na hipótese do inciso VI do art. 2°, o valor da movimentação ou da transmissão."

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

v. DA CONCLUSÃO

Pelo todo exposto neste artigo, podemos concluir que: a) Nos TDTs celebrados entre o Brasil e um dos países mencio­

nados (quais sejam, Alemanha, Argentina, Canadá, China, Chile, Coréia do S,ul, Dinamarca, Equador, Espanha, Filipinas, Holanda, Hungria, lndia, Itália, Luxemburgo, Noruega, Portugal e Tchecoslováquia), as remessas efetuadas por residentes no Brasil de contraprestação por serviços técnicos prestados por não-residentes podem sujeitar-se às regras atinentes a "royalties" perante tais TDTs, diante da equiparação trazida pelo Protocolo dos mesmos;

b) Diante da equiparação mencionada no item (i), e desde que a remessa seja efetuada ao beneficiário efetivo do rendimento, o mesmo sujeitar-se-á às disposições do artigo relativo à "royalties" no respectivo TDT, que determina, dentre outras regras, a possibilidade de tributação desse valor pelo Estado Contratante de fonte (e.g. Bra­sil), de acordo com a sua legislação doméstica, limitada, contudo, à determinada alíquota aplicável ao valor a ser remetido;

c) A limitação da alíquota pode variar dependendo do TDT firmado pelo Brasil, especialmente em conta da natureza dos "royalties"

pagos. No caso do TDT Brasil/Espanha que contempla a chamada "Cláusula do País Mais Favorecido", pode ser aplicada a limitação de alíquota mais benéfica constante no TDT BrasillJapão;

d) A limitação mencionada no item (iii) deve ser aplicada a todos os tributos abrangic os no escopo do respectivo TDT.

e) De maneira geral, os TDTs celebrados pelo Brasil incluem dentre os tributos visados (a) expressamente, o imposto de renda (inclusive, a nosso ver, a modalidade denominada "retido na fonte" ou IRF) - exceção deve ser feita ao TDT Brasil/Portugal que já in­cluiu expressamente a CSL; e (b) quaisquer outros idênticos ou subs­tancialmente semelhantes que forem estabelecidos após a data de sua assinatura, adicionalmente ou em substituição ao imposto men­

cionado no item (a); f) De acordo com a nossa interpretação da legislação interna,

jurisprudência e o consenso da doutrina, nacional e internacional:

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

(a) o termo "imposto" nos TDTs deve ser entendido como "tributo"; e (b) para estabelecer identidade ou substancial semelhança entre tributos, deve-se analisar a natureza dos mesmos, externada por dois de seus aspectos, quais sejam, o fato gerador e a base de cálculo, sendo irrelevante a respectiva espécie tributária, a denominação, a pessoa jurídica de direito público que seja titular, a destinação cons­titucional da renda, os métodos adotados para cobrança, a alíquota;

Tomando-se por base, no caso em exame, o IRF, cujo fato gera­dor consiste, em linhas gerais, no pagamento, crédito, entrega, em­prego ou remessa de valores remuneratórios de serviços técnicos e de assistência técnica, administrativa e semelhantes, e a base de cálculo corresponde nos valores remuneratórios pagos, creditados, entregues, empregados ou remetidos, pode-se concluir que:

a. a CIDE, por possuir fato gerador e base de cálculo substancial­mente semelhantes ao do IRF, e pela alíquota do IRF ter sido reduzi­da por força da sua criação, apresenta argumentos jurídicos bastante consistentes para, na esfera judicial, tentar ser incluída no âmbito dos TDTs, a par de decisões administrativas e judiciais em contrário;

b. o ISSlImportação, apesar de algumas semelhanças com re­lação à forma de recolhimento e ao contribuinte do IRF, careceria de semelhança substancial com relação ao fato gerador, uma vez que o seu fato gerador recai sobre a prestação do serviço em si, e não sobre o "pagamento" pelo serviço (genericamente considerado em uma das formas elencadas no artigo 708 do RIR/99), como no IRF, o que poderia prejudicar a argumentação em eventual tentativa, por meio de medida judicial, de inclusão deste imposto no âmbito dos TDTs;

c. já com relação ao PISlImportação e à COFINS/lmporta­ção, ainda que estes não possuam fato gerador e base de cálculo tão semelhantes ao IRF como a CIDE, consideramos que os mesmos poderiam ser considerados substancialmente similares para fins de abrangência nos TDTs, de maneira que seria defensável a tentativa de questionamento judicial objetivando inclusão dessas contribui­ções nesta esfera;

d. quanto à CPMF, tendo em vista patente dessemelhança com o fato gerador do IRF, entendemos remota a chance de êxito em even­

tual medida judicial objetivando sua inclusão no âmbito dos TDTs.

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Tributação das Receitas Finan Auferidas na Fase Pré-Operacional

CRISTIANO AUGUSTO GANZ VIOTTI DE AzEVEDO

A ivogado em Belo Horizonte Pós-Graduado em Direito e Economia da Empresa - FGV

Professor de Direito Tributário e Planejamento Tributário - FGVIBH e

FGVIPA

FREDERICO DE ALMEIDA FONSECA

Advogado Professor de Direito Tributário da Faculdade de Ciências Contábeis

Milton Campos

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

TRIBUTAÇÃO DAS RECEITAS FINANCEIRAS AUFERIDAS NA FASE PRÉ-OPERACIONAL

I. OBJETlVOS E JUSTIFICATIVAS

o presente estudo tem por objetivo avaliar o regime jurídico da tributação do Imposto sobre a Renda da Pessoa Jurídica e da Contribui­ção Social sobre o Lucro Líquido incidentes sobre as receitas financeiras realizadas durante a fase pré-operacional das pessoas jurídicas.

Como objeto específico do tema serão também analisados: a} o regime tributário aplicável a outras receitas com caráter de

eventualidade (não operacionais, aluguéis, extraordinárias, etc.) também realizadas durante o curso da fase pré-operacional;

b) o regime tributário aplicável às receitas acima tratadas durante os projetos de expansão, planos de investimentos e outras fases dos em­preendimentos das pessoas jurídicas.

Justifica-se um estudo específico sobre as questões acima apresen­tadas em razão dos excessos de arrecadação fiscal perpetrados pelos re­

gimes de antecipações do IRPJ e da CSL, no qual se inclui o regime de tributação de fonte.

Sob o manto das antecipações repousam elevados riscos de tri­butação ineficiente do ponto de vista da preservação da continuida­

de da entidade empresarial e imposições fiscais juridicamente ina­dequadas sob a ótica dos princípios constitucionais tributários.

II. SITUAÇÃO DE FATO

Como exemplo típico da situação a ser analisada destaca-se a posição de investidores estrangeiros que ingressam com seus recur­sos no Brasil para fins de implantação de uma unidade permanente de negócios. Este investidor, ao aportar seus recursos sob a forma de

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

investimentos societários, terá, necessariamente, que converter a moeda estrangeira em moeda de curso forçado no Brasil (REAL).

Ao dispor de sua proteção cambial, as parcelas disponíveis do capital investido tendem a buscar outros instrumentos de proteção contra as variações típicas dos ativos não remunerados pela atividade social.

Usualmente, pela necessidade de liquidez, os recursos disponí­veis são aplicados no mercado financeiro e os rendimentos auferidos são submetidos à tributação do IRPJ (IRRF) e da CSLL, o que impli­ca em transformar a proteção do capital disponível em custo equiva­lente a 34% (trinta e quatro por cento), sem mencionar, por delimita­ção editorial, a carga tributária relativa ao PIS, COFINS e CPMF.

III. DESENVOLVIMENTO

111.1. Regime de competência e a tributação da renda

A Lei nO 6.404, de 15 de dezembro de 1976, ao prescrever re­

gras aplicáveis à escrituração comercial das companhias, elegeu, em seu art. 17771 , o regime de competência como critério de reconheci­

mento das mutações patrimoniais das pessoas jurídicas. Por sua vez, o Decret.) nO 1.598/7772 , ao adaptar a legislação do

Imposto de Renda à Lei das Sociedades por Ações, determinou que

"Art. 177 - A escrituração da companhia será mantida em registros permanentes, com obediência aos preceitos da legislação comercial e desta lei e aos princípios de contabilidade geralmente aceitos, devendo observar métodos ou critérios co~tábels uniformes no tempo e registrar as mutações patrimoniais segundo o regime de

competência" (destacamos) 72 "An. 60 - Lucro real é o lucro líquido do exercício ajustado pelas adições, exclusões ou

compensações prescritas ou autorizadas pela legislação tributária. . § 10 O lucro líquido do exercício é a soma algébrica do lucro operaCIonal (art. II), dos

resultados não-operacionais, do saldo da conta de correção monetária (art. 51) e das participações, e deverá ser determinado com observância dos preceitos da leI comercIal.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

as pessoas jurídicas observem os preceitos da legislação comercial para fins de reconhecimento do lucro líquido do exercício, base para

a apuração do lucro tributável (lucro real). Assim, a partir da edição do DL nO 1.598/77, o regime de com­

petência passou a orientar a tributação da renda das pessoas jurídi­cas. A Exposição de Motivos do Ministro da Fazenda sobre o proje­to do DL nO 1.598/77 confirma essa orientação:

"O Capítulo II reúne as normas sobre a base de cálculo do im posto. O lucro real é o lucro apurado pela pessoa jurídica na escrituração comercial, com ajustes determinados pela legislação tributária. A lei de sociedades por ações redefiniu o lucro comercial (denominado lucro líquido do exercício), regulando mais pormenorizadamente do que a legislação anterior os critérios de classificação e avaliação do patrimônio, de elaboração das demonstrações financeiras e de apuração do lucro. O Projeto adapta a definição da base de cálculo do imposto aos novos conceitos da lei comerci­al, inclusive quanto à adoção (no reconhecimento do lu­era) do regime de competência" (destacamos)

Essencialmente, o objetivo do regime de competência é distri­

buir o fluxo de renda da pessoa jurídica entre os exercícios sociais

mediante critérios que atribuam a cada período a renda que efetiva­

mente lhe compete.

Com efeito, a observância do regime de competência pressu­

põe que a escrituração comercial da pessoa jurídica adote o critério

de registrar, em cada período, todas as mutações que digam respeito

a este período. Essa orientação se faz necessária para que se permita

Art. 7° O lucro real será determinado com base na escrituração que o contribuinte deve manter. com observância das leis comerciais e fiscais. § 4° Ao fim de cada período-base de incidência do imposto o contribuinte deverá apurar o lucro líquido do exercício mediante a elaboração, com observância das dis­posições da lei comercial. do balanço patrimonial. da demonstração do resultado do exercício e da demonstração de lucros ou prejuízos acumulados':

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

determinar os custos correspondentes às receitas geradas e aos ren­dimentos reconhecidos nas contas de resultado.

A denominação "regime de competência" exprime a idéia de que as receitas e as despesas devem ser registradas no período de apuração a que competirem, confrontando-as, mutuamente, no re­sultado do exercício da pessoa jurídica, prevalecendo o sistema de conciliação das origens (receitas e passivos) e das aplicações (despe­sas e ativos) de recursos.

Em síntese, essas são as razões pelas quais o regime da compe­tência compreende a conjunção dos princípios da "realização da re­ceita" e do "confronto entre as receitas e as despesas" e as premissas para a preservação da técnica-normativa comercial de apuração da

renda/lucro para fins tributários.

111.2. TRATAMENTO COMERCIAL E TRIBUTÁRIO DOS RESULTADOS AUFERIDOS NA FASE

PRÉ-OPERACIONAL

A fase pré-operacional compreende o período de tempo que

antecede ao início das operações tendentes ao cumprimento dos

objetivos sociais de uma empresa, durante o qual a pessoa jurídica se vê obrigada a incorrer em gastos relacionados à sua organização jurí­

dica, social e econômica, envolvendo desde o registro nos órgãos

competentes, planejamen :os, construções, implantação de projetos, pesquisa e desenvolvimento de produtos e serviços, remuneração de

pessoal, organização, alocação de recursos em ativos monetários e em ativos não monetários, e tantas outras atividades que se façam

necessárias para a colocação da empresa em condições de iniciar o

cumprimento da missão para a qual foi constituída. Durante a fase pré-operacional, todos os gastos incorridos pela

pessoa jurídica caracterizam-se por serem ativos "intangíveis" que

contribuirão para a formação dos resultados futuros do empreendi­mento. Por esse motivo, devem ser classificados como ativo diferido,

nos termos do art. 179, da Lei nO 6.404/76:

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIOICA

"Art. 179 - As contas serão classificadas do seguinte modo:

( ... )

v - no ativo diferido: as aplicações de recursos em despesas que contribuirão para a formação de mais de um resultado social, in­clusive os juros pagos ou creditados aos acionistas durante o período

que anteceder o início das operações sociais" (destaques nossos)

Os gastos realizados na fase pré-operacional não devem ser apro­priados corno despesa dentro do exercício em que são pagos, pois somente serão reconhecidos no resultado de um ou mais exercícios futuros, conforme se realize a contraprestação que lhes corresponda.

Assim, o ativo diferido resulta do princípio jurídico-contábil do confronto das despesas com as receitas, pelo qual "toda despesa direta­

mente delineável com as receitas reconhecidas em determinado período,

com as mesmas deverá ser confrontada; os consumos ou sacrifícios de ativos

(atuais ou futuros), realizados em determinado período e que não puderam

ser associados à receita do período nem às dos períodos futuros, deverão ser

descarregados como despesa do período em que ocorrerem7]

Em outros termos, o reconhecimento simultâneo das receitas e despesas, quando correlatas, é conseqüência natural do regime de competência.

O Instituto dos Auditores Independentes do Brasil IBRACON, através do seu pronunciamento nO VIII - Diferido, de­termina que devem ser classificadas no ativo diferido 'as aplicações de

recursos em despesas que contribuirão para a formação do resultado de

mais de um exercício socia!", entre as quais se incluem os gastos com a organização do empreendimento, os incorridos na fase pré­operacional e os despendidos na realização de estudos e projetas.

73 ln Manual de Contabilidade das Sociedades por Ações: aplicável às demais socieda­des/ FIPECAFI; diretor responsável Sérgio de ludícibus, coordenador técnico Eliseu Martins, supervisor de equipe de trabalho Ernesto Rubens Gelbcke. 6a. ed. rev. e atual. - São Paulo: Atlas, 2003, p. 64.

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COOROENAçAO: PEORO ANAN JR.

Após o início das operações normais, deve a empresa amortizar periodicamente os recursos aplicados no ativo diferido, em prazo não superior a 10 (dez) anos, tendo em vista que a partir de então passará a usufruir os benefícios decorrentes do empreendimento, pela geração de resultados suficientes para absorverem as despesas pré-operacionais, nos termos do art. 183, § 30, da Lei nO 6.404/76, abaixo transcrito:

·~rt. 183 - ( ... )

§ ]o - Os recursos aplicados no ativo diflrido serão amortizados

periodicamente, em prazo não superior a 10 (dez) anos, a par­

tir do início da operação normal ou do exercício em que passem

a ser usufruídos os beneficios deles decorrentes, devendo ser re­

gistrada a perda do capital aplicado quando abandonados os

empreendimentos ou atividades a que se destinavam, ou com­

provado que essas atividades não poderão produzir resultados

suficientes para amortizá-los" (destacamos)

Concretizando a ciência contábil e seus princípios fundamen­tais jurisdicizados pela Lei nO 6.404/76, o IBRACON manifesta, em seu Pronunciamento VIII, que a amortização deve começar com o início das operações da entidade, pois é a partir de então que os resul­tados operacionais passam a integrar a conta de resultado, independente dos lucros ou prejuízos que possam resultar dessas operações.

A condição para o reg istro do ativo diferido é que haja razoável segurança da sua realização futura, por meio de receitas que possam cobrir as despesas incorridas na fase pré-operacional.

Para Bulhões Pedreira, "essas despesas somente são reconhecidas como

elementos ativos no inventário do patrimônio financeiro levantado no

pressuposto da continuidade de funcionamento da empresa, pois o valor

do capital nelas aplicado somente pode ser recuperado se vier efetivamente

a contribuir para a formação do lucro em exercícios futuros 74 ..

74 ln Finanças e Demonstrações Financeiras da Companhia: conceitos e fundamentos. \' Edição· Rio de Janeiro: Forense, \989, p. 324.

61

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Assim, os valores registrados no diferido devem ser amortiza­

dos, mediante a baixa parcial ao resultado do exercício em que as

receitas correspondentes forem auferidas, de maneira a reduzi-lo até

o seu desaparecimento total do balanço. Em termos fiscais, a amortização do diferido será considerada

como custo ou despesa dedutível no período de apuração em que for

reconhecida no resultado do exercício, por força dos arts. 324 e 325

do Decreto nO 3.000/99 (atual Regulamento do Imposto de Renda­

RlR/99), abaixo descritos:

"Art. 324 - Poderá ser computada, como custo ou encargo, em cada período de apuração, a importância corresponden­te à recuperação do capital aplicado, ou dos recursos apli­cados para a formação do resultado de cada período de apuração" (destaques nossos).

"Art. 325 - Poderão ser amortizados:

II - os custos,encargos ou despesas, registrados no ativo diferido, que contribuirão para a formação do resultado de mais de um período de apuração, tais como:

as despesas de organização pré-operacionais ou pré-industriais;

( ... )

e) a parte dos custos, encargos e despesas operacionais registrados como ativo diferido durante o período em que a empresa, na fase inicial da operação, utilizou apenas parcial­mente o seu equipamento ou as suas instalações;

f) os juros durante o período de construção e pré-operação;

g) os juros pagos ou creditados aos acionistas durante o pe­ríodo que anteceder o início das operações sociais ou da implantação do empreendimento inicial;

h) os custos, despesas e outros encargos com a reestruturação, reorganização ou modernização da empresa." (destacamos)

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COORDENAÇAo: PEDRO ANAN JR.

Importante demonstrar que o Parecer Normativo CST n° 72/ 75 conceitua despesas pré-operacionais, para fins de dedutibilidade no cálculo do Imposto de Renda, como sendo 'as despesas necessárias

à organização e implantação ou ampliação de empresas, inclusive as de

cunho administrativo, pagas ou incorridas até o início de suas operações

ou plena utilização de suas instalações, obedecidas as condições gerais de

dedutibilidade e limites estabelecidos no artigo 162 do RIR [atual art. 299 do RlR/99] e demais normas sobre o assunto"

Fica claro, então, que o que caracteriza a despesa como pré­operacional é o momento em que ela é realizada ou incorrida, ou seja, o seu aspecto temporal. ~anto à natureza, devem ser observa­das as disposições gerais sobre despesas operacionais atualmente descritas no art. 299 do RlR/99.

O Parecer Normativo CST nO 110/75, por sua vez, esclarece

que devem ser criados dois grupos de despesas distintos no ativo

diferido: a} despesas pré-operacionais dedutíveis; e b} despesas pré-operacionais não-dedutíveis. Nos termos do referido Parecer, por ocasião da amortização, deve

a empresa aplicar o percentual sobre o subgrupo de despesas pré­operacionais dedutíveis, apropriando-o ao resultado do exercício.

~anto ao subgrupo de despesas pré-operacionais não

dedutíveis, o débito à conta de resultado ficará a critério da empresa, uma vez que esses valores deverão ser oferecidos à tributação quan­

do da incorporação àqueh conta. Nota-se, até o presente momento, que tanto a legislação

societária quanto a fiscal acima mencionadas versam apenas sobre o

tratamento aplicável aos custos, despesas e encargos incorridos na

fase pré-operacional. Todavia, nada impede que uma companhia aufira receitas du­

rante essa fase, o que pode ocorrer, por exemplo, na hipótese do re­conhecimento de rendimentos de aplicações financeiras ou de recei­ta de venda de bens do ativo permanente intimamente ligados ao

empreendimento.

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Page 66: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

Em ambas as hipóteses a empresa deve considerar as receitas como dedução das despesas registradas no ativo diferido, a fim de manter o critério de contraposição de receitas e despesas, já expos­to anteriormente.

Ao conceituar a fase pré-operacional, Bulhões Pedreira tam­bém chega a essa conclusão:

"No início da operação de qualquer instalação produtiva há uma

fase 'de partida' durante a qual os equipamentos ainda não atin­

giram o regime normal de operação, apresentam defeitos ou exi­

gem ajustamentos, e os produtos muita vez [sic] ainda não têm

as especificações requeridas pelo mercado, não são vendáveis ou

somente são com grandes rebates de preço. É normal que, nessa

fase, o rendimento seja baixo e a operação deficitária, e os cus­

tos, despesas e encargos suportados (diminuídos das receitas

auferidas) são considerados parte do investimento inicial na

instalação produtiva7s .. (destacamos)

Assim, uma empresa em fase pré-operacional não deve possuir, na realidade, uma Demonstração de Resultado do Exercício - D RE relativa a esse período. Poder-se-ia admitir, no máximo, uma De­monstração de Transações Eventuais ou uma Demonstração de Re­sultados Pré-Operacionais, os quais serviriam apenas para fins gerenciais, como forma de evidenciação dos valores acrescidos ou reduzidos do ativo diferido.

111.3. A INSTRUÇÃO NORMATIVASRF N° 54/88-CONFRONTAÇÃO DO RESULTADO FINAN­

CEIRO COM AS DESPESAS PRÉ-OPERACIONAIS REGISTRADAS NO ATIVO DIFERIDO

Corroborando o exposto acima, a Instrução Normativa nO 54, de 05 de abril de 1988, ao estabelecer os procedimentos relativos à

75 Op. cit, p. 325.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

correção monetária de balanço para os empreendimentos em fase de pré-operação, previu, em seu subitem 2.1., a possibilidade do con­fronto entre o resultado auferido na fase pré-operacional com as des­pesas registradas no ativo diferido, sem impacto no resultado do exercício. Veja-se:

"2. EMPRESA EM FASE PRÉ-OPERACIONAL

2.1 - Durante o período que anteceder o início das opera­

ções sociais ou a implantação do empreendimento inicial a

pessoa jurídica deverá apurar o saldo conjunto das despesas

e receitas financeiras, das variações monetárias ativas e pas­

sivas e do resultado líquido da correção monetária do ba­

lanço, o qual terá o seguinte tratamento:

a) se devedor, será acrescido ao saldo da conta de gastos a

amortizar, do ativo diferido;

b) se credor, será diminuído do total das despesas pré­

operacionais incorridas no próprio período-base.

2.2 - Caso o saldo conjunto credor, referido no subitem anterior, ex­

ceda o total das despesas pré-operacionais incorridas no próprio perí­

odo-base, o excesso deverá compor o lucro líquido do exercício e poderá

ser totalmente diferido (?mo lucro inflacionário" (destacamos)

Não obstante a revoÉ ação do regime de correção monetária de balanço (Lei 9.249/95) m mtém-se a conclusão de que as receitas e despesas eventualmente auferidas durante o período pré-operacional não devem compor o lucro líquido do exercício, a não ser que o saldo das receitas ultrapasse o valor mantido em conta de ativo diferido. Caso isso ocorresse, a pessoa jurídica devia à época da lN SRF 54,

diferir a tributação da receita como lucro inflacionário. O Comunicado Técnico nO 01/89 do IBRACON, em conso­

nância com a lN 54/88, manifestou o entendimento que "um empre­

endimento em fase pré-operacional ou com projetos em implantação, como

regra geral, não deve gerar resultado enquanto não estiver concluído ou

em operação ".

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Page 68: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Percebe-se, portanto, que a lN 54/88 nada mais fez do que assimilar as normas e princípios jurídico-contábeis aplicáveis ao di­ferido, regulamentando, por conseguinte, seus efeitos fiscais.

A apuração, à época, de lucro inflacionário decorre de mera adap­tação fiscal às normas contábeis de forma a evitar que recaiam tributos sobre renda decorrente da variação do valor dos itens não monetários, não realizáveis cumprimento do objeto social da entidade, como ocor­re com as receitas financeiras e outras receitas eventuais.

A Comissão de Valores Mobiliários - CVM, adotando

posicionamento semelhante ao do IBRACON, publicou o Parecer

de Orientação nO 17/89, contendo, entre outros, os procedimentos a

serem observados pelas companhias abertas por ocasião da publica­

ção de suas demonstrações financeiras, no qual concluiu o seguinte a

respeito dos resultados auferidos em empreendimentos em fase pré­

operacional:

"6. EMPREENDIMENTOS EM FASE DE IMPLAN­TAÇÃO

As companhias abertas que possuam empreendimentos em fase pré-operacional, em decorrência de projetos de expan­são, reorganização ou modernização, para atendimento ao disposto no artigo 177 da LEI N° 6.404/76 e, particular­mente, ao princípio da confrontação da receita com a des­pesa ... deverão observar as seguintes recomendações:

lltais empreendimentos, enquanto não estiverem em ope­ração, não devem produzir efeito nos resultados apurados contabilmente pelas companhias;

b} as despesas incorridas no período antecedente ao do iní­cio das operações de um empreendimento em implantação devem ser agregadas ao ativo diferido e se sujeitar à corre­ção monetária, a partir do mês seguinte em que tenham sido incorridas;

c} devem ser agregados ao ativo diferido todos os efeitos de receitas e despesas financeiras, de atualizações mone-

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Page 69: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

COORDENAÇlO: PEDRO ANAN JR.

tárias ativas e passivas e correção monetária do ativo per­

manente e do patrimônio líquido atribuíveis a empreendi­mentos em fase de implantação;

d) se o efeito líquido resultante se mostrar como saldo cre­

dor e montante superior ao ativo diferido acumulado, ca­

racterizando-se um ganho, este efeito deve ser apresentado

como resultado de exercícios futuros, para futura confron­

tação com despesas pré-operacionais futuras e com efeitos líquidos devedores futuros.

Este efeito só deverá ser reconhecido como resultado, excepcio­

nalmente, nos casos em que, comprovadamente, haja certeza de

que os ganhos sejam de natureza recorrente durante todo o perí­

odo de implantação do empreendimento. Em nota explicativa

deve ser justificada a decisão adotada bem como esclarecida a

causa dos referidos ganhos" (destacamos)

A única diferença entre o procedimento adotado pela SRF e o da CVM é que este último prevê a contabilização do excesso da

receita financeira auferida em fase pré-operacional como resultado de exercícios futuros, a serem confrontados juntamente com a amor­

tização do ativo diferido, e não diretamente como resultado do exer­

cício. Ou seja, a contabihação indicada pela CVM não redundaria

na apuração de lucro inflacionário, mesmo porque a CVM não po­

deria tratar das questões :iscais reflexas. Relevante ressaltar <[ue a CVM adere ao princípio do confron­

to entre as despesas e receitas auferidas no período pré-operacional através do lançamento no resultado do exercício somente a partir do

momento em que a companhia entrar em operação. Até o presente momento, pode-se concluir que o procedimen­

to de se apurar o saldo líquido das receitas e despesas financeiras, bem como das variações monetárias ativas e passivas, e atribuí-lo ao

diferido, é perfeitamente possível e adequado aos princípios de con­

tabilidade geralmente aceitos, recepcionados pela legislação comer­

cial e fiscal.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Ocorre que, por ocasião da edição da Lei nO 9.249/95, resultou extinta a correção monetária das demonstrações financeiras das pes­soas jurídicas e a questão a ser solucionada é se as normas previstas na lN 54/88, relativas ao reconhecimento dos efeitos da inflação, restaram prejudicadas.

Efetivamente, em 01 de agosto de 2000, foi editada a Instrução Normativa SRF nO 79/00 que, entre outros normativos da Receita Federal, revogou expressamente a lN 54/88. Após a revogação, ne­nhum outro normativo da SRF previu tratamento análogo para os resultados auferidos em fase pré-operacional.

Esta situação levou diversos contribuintes a formularem consul­tas junto à SRF no sentido de obter pronunciamento formal daquele órgão sobre os efeitos da revogação da lN 54/88. A Solução de Con­sulta nO 86/2001, da 7" Região Fiscal, entendeu que os procedimentos previstos na lN 54/88 teriam perdido a eficácia quando da revogação, pela Lei nO 9.249/95, do instituto da correção monetária de balanço:

"LUCRO INFLACIONÁRIO- RECONHECIMENTO DE RECEITAS-DESPESAS PRÉ-OPERACIONAIS. O disposto na lN 54/88, que cuidava da apuração, tratamento e

respectivo diferimento aplicáveis ao lucro inflacionário das em­

presas em fase pré-operacional, perdeu a eficácia com a extinção

da correção monetária de balanço. As receitas e despesas financei­

ras de tais pessoas junâicas devem compor o resultado tributável do

período em que incorridas, sem a possibilidade de confrontação com

as despesas pré-operacionais do mesmo período,-que se integram ao

ativo diferido para posterior amortização" (destacamos)

A Solução de Consulta acima, ao determinar o lançamento das receitas e despesas auferidas em fase pré-operacional no resultado do

exercício e, por conseguinte, a apuração da renda tributável, fere, niti­damente, o princípio jurídico-contábil do confronto das receitas com as despesas.

Deve-se destacar que as Instruções Normativas da SRF não ge­ram direitos e obrigações, e sua revogação não implica em mudança

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COOROENAçAO: PEORO ANAN JR.

do regime de apuração da renda. Não se admite que uma norma com­plementar, pelo simples fato de ter sido revogada, tenha o condão de alterar a natureza dos atos praticados pelas empresas na fase pré­operacional, que passariam a sofrer todas as conseqüências fiscais apli­cáveis às empresas operativas, ou seja, pagar tributos mesmo sem ter entrado em atividade.

Existem, inclusive, decisões da própria SRF em sentido contrá­rio, entre as quais destacamos a seguinte:

"RECEITAS PRÉ-OPERACIONAIS - É lícita a dedução de

eventuais receitas decorrentes da venda de árvores, antes do iní­

cio da operação, em conseqüência da abertura de caminhos para

o preparo da área para posterior corte, do montante dos gastos

pré-operacionais escriturado no ativo diferido (Dec. 9' Região Fiscal nO 86/99)" (destacamos)

A decisão acima considera até mesmo a possibilidade de

diferimento contábil de receitas não financeiras (venda de árvores de­

correntes do preparo de área), o que demonstra, até mesmo, a

desnecessidade da lN 54/88, que previa apenas o diferimento dos re­

sultados financeiros auferidos na fase pré-operacional. Torna-se, portanto, correto e recomendável que as empresas re­

gistrem as receitas eventualmente auferidas na fase pré-operacional

em conta de Ativo Diferido, para posterior amortização do saldo re­manescente a partir da entrada em funcionamento das suas operações.

O mesmo tratamento é recomendável para as receitas eventuais

realizadas durante a fase pré-operacional e para as receitas que te­

nham relação direta com os recursos aplicados em processos de pes­

quisa, investimentos, reestruturação que possam ser registrados em

conta de ativo diferido por terem relação com resultados futuros. Assim, mesmo que o saldo do ativo diferido seja credor, ou seja,

haja receitas em montante superior aos gastos diferidos, a diferença

positiva não deve ser reconhecida como lucro do exercício, devendo, com efeito, ser escriturada em conta de passivo exigível- Resultado de Exercícios Futuros, conforme dispõe o item 6, letra "d", do Parecer de

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Orientação CVM nO 17/89, sem tributação pelo IRPJ e CSL até que sejam lançadas em conta de resultado.

Relativamente ao IRRF, não obstante a responsabilidade dos agentes financeiros pela retenção e recolhimento do imposto, a inexistência de rendallucro impede a tributação na fonte.

111.4. PARtNTESE: NORMAS INTERNACIONAIS DE CONTABILIDADE

Antes das conclusões da presente opinião legal, abre-se um parên­tese estritamente comercial relativo às normas internacionais de conta­bilidade que têm por objetivo promover a convergência entre as diversas normas contábeis locais sobre um determinado tema, de forma a har­monizar os procedimentos relativos à apresentação das demonstrações contábeis. São desenvolvidas por profissionais de diversos países que, reunidos em um Comitê Internacional, estabelecem os padrões inter­nacionais de contabilidade que deverão ser adotados pelas entidades com vistas a facilitar a compreensão de suas demonstrações financeiras por parte dos usuários.

Para fins do presente estudo, destacamos a Norma Internacional de Contabilidade nO 38 - NIC 38, aprovada em julho de 1998, a qual pres­creve os parâmetros internacionais de contabilização dos ativos intangí­veis, entre os quais se enquadram os gastos relacionados com o início das atividades de uma empresa ou empreendimento (despesas pré­operacionais).

De acordo com a NIC 38, somente se exige que uma entidade reconheça um ativo intangível se cumpridos os seguintes requisitos:

i) que seja provável que os benefícios futuros atribuíveis a esses ativos ingressarão na entidade;

ü) que o custo do ativo possa ser mensurado com segurança. Na hipótese de um item intangível não preencher os requisitos

mencionados acima, deve ser ele reconhecido como despesa no período em que for incorrido.

Até aqui, não há novidades nas normas internacionais em relação à regra brasileira.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Com efeito, as despesas pré-operacionais, dada a sua natureza, preenchem todos os requisitos acima, tendo em vista que (i) contri­buirão para a formação dos resultados futuros do empreendimento e (ii) o seu custo pode ser mensurado com segurança pela entidade.

Ocorre que a norma internacional acima exige que todos os custos e despesas pré-operacionais relacionados com o início das ati­vidades de uma entidade sejam reconhecidos como despesa quando incorridos, não podendo ser registrados como ativo diferido.

Outros exemplos de itens intangíveis que devem ser reconhe­cidos como despesa, segundo a NIC 38, são os dispêndios com pes­quisas, treinamento, publicidade e promoção, etc.

Nesse particular, o procedimento contábil internacional difere do adotado no Brasil.

A despeito de entendermos ser mais adequado, do ponto de vista jurídico-contábil, o procedimento adotado no Brasil (por todos

os argumentos anteriormente expostos, principalmente em relação ao princípio do confronto entre as despesas e as receitas, amplamen­te aplicável à espécie), não podemos deixar de ressaltar que a experi­ência internacional poderá ensejar futuras mudanças no cenário

contábil nacional. Caso uma empresa brasileira necessite divulgar as suas demons­

trações contábeis no exterior, onde se exige a adoção do procedimento

manifestado pela NIC 38, devem ser feitos os ajustes necessários no balanço a fim de adequar ;1.S normas brasileiras ao padrão internacio­

nal de contabilidade. Referido ajuste contábil não determina, contu­

do, a mudança do procedimento tributário exposto anteriormente.

IV. CONCLUSÕES

Defende-se no presente estudo que as receitas financeiras

auferidas por pessoas jurídicas na fase pré-operacional devem ser

reconhecidas em conta de ativo diferido e não como resultado do

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIOICA

exercício e, por decorrência, não representam renda/lucro tributável pelo lRPJ (inclusive lRRF) e CSLL.

A despeito de a lN SRF nO 54/88 ter sido revogada, aplica-se o Parecer de Orientação CVM nO 17/89, posto que embasado por prin­cípios contábeis geralmente aceitos, recepcionados pela legislação co­mercial e fiscal, com destaque para o princípio da confrontação das receitas com as despesas, amplamente aplicável a presente hipótese.

Entre as decisões fiscais nesse sentido, destaca-se a Solução de Consulta nO 86/99, da 6' Região Fiscal.

Aplica-se o mesmo tratamento fiscal às receitas eventuais, como aluguéis e não operacionais realizadas na fase pré-operacional, e as receitas auferidas durante a fase de investimentos, reestruturação, enfim, fases em que os gastos e receitas decorrentes da aplicação dos recursos destinados aos respectivos gastos guardam relação com re­sultados operacionais futuros.

A tributação exigida pela Solução de Consulta nO 86/01, além de ferir princípios fundamentais de contabilidade, "equipara" fiscalmente as pessoas jurídicas em fase pré-operacional com aque­las em plena atividade, situação que poderia afetar, inclusive, a con­tinuidade desses empreendimentos.

Por fim, as normas internacionais de contabilidade, não obstante tratarem as despesas pré-operacionais como despesas efetivas do exer­

cício em que são incorridas, ainda não são aplicáveis diretamente no Brasil.

Caso uma empresa brasileira necessite divulgar as suas demons­trações contábeis no exterior, onde se exige a adoção do procedi­mento manifestado pela NIC 38, devem ser feitos os ajustes neces­sários no balanço a fim de adequar as normas brasileiras ao padrão internacional de contabilidade, sem que tal adaptação implique em alteração das conclusões de ordem tributária acima apresentadas.

72

Page 75: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

l t "nbilr*.

i""114 ' _ Uma Visão Geral do Regime de

Tributação na República Popular da China: Regras

Aplicáveis às Sociedades Estrangeiras e às Sociedades com

Investimento Estrangeiro

DANIEL TAKAK1

Advogado Mestre em Direito pela Universidade Mackenzie

Page 76: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

UMA VISÃO GERAL DO REGIME DE TRIBUTAÇÃO NA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA: REGRAS APLICÁVEIS

ÀS SOCIEDADES ESTRANGEIRAS E ÀS SOCIEDADES COM INVESTIMENTO ESTRANGEIRO

76 I. INTRODUÇÃO

A evolução do sistema tributário da China foi influencia~a pela abertura gradual da sua economia durante a década de 70, bem como pela necessidade de atração de capitais estrangeiros. A política fiscal foi um dos meios para a absorção de investimentos estrangeiros, resultando na aprovação de leis tributárias específicas e aplicáveis tão-somente às empresas estrangeiras (Foreign Enterprises - FEs) e às empresas com investimento estrangeiro (Foreign-Invested Enterprises- FIEs).

Em geral, as FEs e as FIEs possuem alíquota menor de impos­to de renda, e incentivos fiscais mais benéficos do que as empresas domésticas chinesas.

Enquanto a Administração Central dos Tributos (Central Tax Bureau - autoridade central) cria a política fiscal, a arrecadação dos tributos tem sido realizada por dois órgãos distintos, em nível local, a saber a Administração Tributária Provincial (State Tax Bureau), e a Administração Tributária Local (LocalTax Bureau). A Administração Tributária Provincial possui a competência de recolher o imposto de renda das pessoas jurídicas (que incluem FIEs e FEs) e os impostos sobre valor agregado; enquanto a Administração Tributária Local, os impostos de pessoa física77 , dentre outros tributos locais.

76 YUEN, Clement. Overview of the current system and the coming reformo Country guide: China, London, Dec. 2003/1an. 2004. Disponível em:<http:// legal mediagroup.com/in terna tional taxreview/defaul t.asp? Page= 1 &Sl D= 2 799 Type=Country%20Guides>. Acesso em: 03/12/004. PRlCEWATERHOUSECOOPERS. The People's Republic ofChina: tax facts and fi­gures, [S.I.I: [s.n.l. c2004. p, I.

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Page 77: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

COOROENAçAO: PEORO ANAN JR.

Tratamos, ainda que de forma sucinta, o tratamento do impos­tos de renda na China continentaF8 , sob a perspectiva de uma em­presa ou investidor estrangeir079

Neste trabalho, abordamos os seguintes assuntos, quais sejam: (i) esta introdução; (ii) formas de investimentos estrangeiros admiti­das na China; (iii) imposto de renda; (iv) incentivos fiscais; (v) tribu­tação internacional; (vi) transfer pricing; (vii) reorganizações societárias; (viii) tributação de internet; (ix) reformas fiscais; e, (x) conclusão.

Para a preparação e elaboração deste material, recorremos às fontes disponíveis em inglês, tais quais artigos publicados nos Esta­dos Unidos e no Japão; newsletters e websitej3° de empresas de audi­toria/consultoria tributária que têm escritórios próprios na China; bem como, monografias e artigos publicados na China continental disponíveis em inglês81

Devido às constantes mudanças na legislação tributária chine­

sa, a mesma pode ser constantemente alterada. Outrossim, ressalta­

mos que existe a possibilidade de introdução de reformas na legisla­

ção tributária chinesa até 200882 , devido ao ingresso da China na

Organização Mundial do Comércio (OMC).

78 Neste trabalho, não analisa··emos os respectivos regimes de tributação de Hong Kong,

Macau e Taiwan. 79 Vide CURLEY, Stephen c.; :ORTUNATO, Darren R. Tax considerations for investors

in China: a preliminary look. North Carolina Journal of International Law &

Commercial Regulation, v. 29, p. 531 e ss., Summer 1995. 80 ARTHUR ANDERSEN. Asia and the Pacific: a tax tour 2000. [S.I.[: [s.n.I, c2000. p. 34-

40; PRICEWATERHOUSECOOPERS. Overview ofPRC taxation system. [2004?1. Dis­ponível em: <http://www.pwccn.com/home/englctax_corp_overview_taxation.html> . Acesso em: 19 novo 2004; e, PRICEWATERHOUSECOOPERS. 2004 corporate tax information for Asia Pacific region. [Boletim informativol· 30 abril 2004. Disponível em: <http://www.pwccn.com/home/engcontentlistlasiatax>. Acesso em: 19 novo 2004.

81 DELOITTE TOUCHE TOHMATSU. China master tax guide 2003. 1. ed. Singapore: CCH Asia, Singapore, 2003; PRICEWATERHOUSECOOPERS. Doing business and

investing in the People's Republic of China. [S.I.I: [s.n·I, c2002. . 82 PRICEWATERHOUSECOOPERS. China: imminent tax reformo Aug./Sept. 2004. DIS­

ponível em: <http://www.pwccn.comlhomelenglcnjmrninenu axJeform_nov2004.html>.

Acesso em: 13 dez. 2004.

75

Page 78: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

II. FORMAS DE INVESTIMENTOS ESTRANGEIROS ADMITIDAS NA CHINA

Apesar de não ser o tema principal deste trabalho, entendemos quanto à necessidade de descrevermos as principais formas societárias previstas na legislação da China.

Na China, existe uma legislação específica (a do imposto de renda e a dos incentivos fiscais) aplicável às empresas com investi­mento estrangeiro e às empresas estrangeiras e para tanto, vale a pena destacar as principais formas societárias (na qual há um sócio ou investidor estrangeiro), quais sejam83 :

(i) Empresas com investimento estrangeiro (Foreign-Investment

Enterprieses- FIEs) se referem aos: a) consórcios de patrimônio sino­estrangeiros (Chinese-Joreign equity joint-ventures - EJV); b) consór­cios contratuais sino-estrangeiros (Chinese-Joreign contractual joint

ventures - CJV); e, às c) empresas totalmente pertencentes a sócios estrangeiros (Wholly Foreign-Owned Enterprise - WFO E); e,

(ii)Empresas estrangeiras (Foreign Enterprises - FEs) corresponde às empresas estrangeiras que: a) têm estabelecimentos ou local de produção84 na China e que exercem as suas atividades

empresariais na China; ou, b) que, não tendo estabelecimento ou local de produção na China, possuem rendimentos originários den­tro do território da China.

83 YUAN, Anyuan. Foreign direct investments in China: practical problems of complying with China's company law and laws for foreign-invested enterprises. Northwestern lournal of International Law & Business, v. 20, p. 477 et seq., Spring 2000. Vide art 2° da Lei do Imposto de Renda das Empresas com Investimento Estrangeiro e das Em­presas Estrangeiras, de 9 de abril de 1991, transcrição da tradução não-oficial do art 2°: "'Enterprise with foreign investment' referred to in this Law means Chinese-foreign equity joint ventures, Chinese foreign contractual joint ventures and foreign-capital enterprises that are established in China. 'Foreign enterprise' referred to in this Law means foreign companies, enterprises and other economic organizations which have establishments or places in China and engage in production or business operations, or which, though without establishments or places in China, have income from sources within China."

84 Através de uma filial ou sucursal.

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COOROENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

11.1 . CONSÓRCIOS DE PATRIMÓNIO SINO-ESTRANGEIROS 85

Os consórcios de patrimônio sino-estrangeiro correspondem a uma sociedade de responsabilidade limitada pertencentes a investi­dores chineses e estrangeiros, em que a participação do sócio estran­geiro deve ser acima de 25% do total do capital social. Esta forma societária possui personalidade jurídica, conforme a legislação chi­nesa, e é a mais utilizada pelos investidores estrangeiros na China. Os investidores de um consórcio de patrimônio Sino-estrangeiro dividem os lucros e incorrem com as perdas na proporção do capital social contribuído.

86 11.2. CONSÓRCIOS CONTRATUAIS SINO-ESTRANGEIROS

Os consórcios contratuais sino-estrangeiro são sociedades regidas por um contrato entre uma sociedade estrangeira e uma sociedade

chinesa. Em princípio, esta forma societária pode tanto possuir como não possuir personalidade jurídica. O consórcio contratual sino-es­trangeiro difere do consórcio de patrimônio sino-estrangeiro, já que no consórcio contratual pode haver maior flexibilidade na sua consti­tuição e na distribuição de lucros às partes contratantes ou aos sócios.

87 11.3. EMPRESAS TOTALMENTE PEf'TENCENTES A SÓCIOS ESTRANGEIROS

As empresas totalmente pertencentes a SOClOS estrangeiros

correspondem a uma entidade que é completamente pertencente a investidores estrangeiros; e, que possui personalidade jurídica pró­

pria, desde que atenda a certos requisitos.

85 YUAN, Anyuan. Op. cit., p. 478-480.

86 Ibidem. 87 lbidem.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

88 III. IMPOSTO DE RENDA

o imposto de renda das pessoas jurídicas (Enterprise Income Tax) se encontra regulamentado: (i) pela Lei do Imposto de Renda da República Popular da China às Empresas com Investimento Es­trangeiro e às Empresas Estrangeiras (Income Tax Law of the People's Republic ofChina for En terprises with Foreign Investment and Foreign Enterprises), de 9 de abril de 1991 89 ; e, (ii) pelas Regras de Implementação da Lei do Imposto de Renda da República Popular da China às Empresas com Investimento Estrangeiro e às Empresas Estrangeiras (Rules for the Implementation of the Income Tax Law 01

the People's Republic ofChina for Enterprises with Foreign Investment

and Foreign Enterprises) de 10 de julho de 1991. O imposto de renda incide às (i) FIEs (tais quais, aos consórcios e às subsidiárias inte­grais de sócios estrangeiros), bem como às (ii) FEs com atividades na China seja por meio de operações independentes; ou, por meio de cooperação com empresas chinesas.

A alíquota do imposto de renda para as pessoas jurídicas é de 30% sobre os rendimentos das FIES e das FEs. Também incide o imposto de renda local (Local Income Tax) de 3% sobre tais rendi­mentos, totalizando 33% de alíquota. Os rendimentos (originários dentro e fora da China) das FIEs que possuem uma sede adminis­trativa na China são tributáveis, enquanto tão-somente rendimen­tos das FEs, originários dentro da China, em geral, são tributados pelo imposto de renda90

Admite-se a redução de alíquota do imposto de renda, depen­dendo da região da China, ou da atividade econômica da pessoa jurídica.

88 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit. p. 34. 89 Ao longo do corpo deste texto, procuramos adotar a tradução livre pelo autor em

português e sua respectiva denominação em inglês. 90 CURLEY, Stephen c.; FORTUNATO, Darren R. Op. cit., p. 547-548.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

91 111.1 . OBRIGAÇÕES ACESSÓRIAS

o exercício fiscal termina em 31 de dezembro, e o prazo para a entrega da declaração anual de imposto de renda é 30 de abril do exercício seguinte. Além da declaração anual, as empresas também devem entregar a declaração trimestral junto às autoridades fiscais da China. O pagamento definitivo do imposto devido do exercício anterior tem como data limite 31 de maio.

Uma FIE que tenha dois ou mais estabelecimentos na China (como por exemplo, as filiais) deverá preparar a declaração consoli­dada de imposto de renda (ConsolidatedTax Return)92 Uma FE, que também possua dois ou mais estabelecimentos na China, poderá consolidar a sua declaração de imposto de renda no estabelecimento que efetivamente assumir a administração e a supervisão das ativi­dades de toda organizaçã093

94 111.2. REGIME DE APURAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA

O imposto de renda das pessoas jurídicas pode ser apurado con­

forme os dois seguintes critérios, a saber: Actual Basis, semelhante ao nosso regime do lucro real, de acor­

do com a seguinte fórmula, em princípio:

Rendimento tributávlI = [(Receita total) - (Custos + despesas + perdas)]

(i) Deemed Projit Basis, semelhante ao nosso regime do lucro presumido. Admite-se a presunção de lucro a casos bastante limita­dos, sendo que a percentagem varia de 10 a 40%95, dependendo do

ramo de atividade da pessoa jurídica.

9\ ARTHUR ANDERSEN. Op. cit.. p. 34. 92 PRICEWATERHOUSECOPPERS. The People's Republic ofChina: Tax fucts and figures. p. \2.

93 lbidem. 94 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit .• p. 34-35. 95 PRICEWATERHOUSECOOPERS. The People's Republic of China: Tax facts and

figures. p. \3.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

96 1/1.3. RENDIMENTOS TRIBUTÁVEIS

Em princípio, os seguintes rendimentos de uma FIE e de uma FE estão sujeitos à tributação na China, a saber: (i) aqueles decor­rentes das atividades das FIEs e das FEs com estabelecimento ou filial na China; (ii) juros; (iii) aluguéis; (iv) royalties; e, (v) demais rendimentos originários dentro e fora da China relacionados: a) às FIEs, e b) aos estabelecimentos ou filiais de FEs.

O rendimento de uma FIE que tiver a sua sede administrativa na China é tributado em bases mundiais, ou seja, as rendas originá­

rias dentro e fora da China97

Os seguintes rendimentos, obtidos por FEs que não possuam estabelecimento ou filial na China estão sujeito à tributação na Chi­na, a saber: (i) lucros/dividendes provenientes de empresas na China (excluindo-se as FIEs); (ii) juros sobre depósitos, ou empréstimos bancários, originários na China; (iii) rendimentos de aluguel de imó­vel a locatários situados na China; (iv) royalties provenientes de mar­cas, direito autorais, patentes, utilizados na China; (v) ganhos obti­dos na venda de imóveis localizados na China; e, (v) demais rendi­mentos originários na China e especificados pelo Ministério das Finanças.

98 11/.4. PREJUIZOS FISCAIS

Os prejuízos fiscais acumulados podem ser compensados nos

exercícios seguintes, em princípio, pelo período máximo de 5 anos.

96 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit., p. 34.

97 Art. 3° da Lei do Imposto de Renda da República Popular da China às Empresas com Investimento Estrangeiro e às Empresas Estrangeiras, de 9 de abril de 1991. transcri­ção da tradução não-oficial do art. 3°: "Any enterprise with foreign investment which establishes its head office in China shalI pay income tax on its income derived from

sources inside and outside China. Any foreign enterprise shalI pay income tax on its income derived from sources within China."

98 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit., p. 34 ..

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN lR.

Não é permitida a compensação de prejuízos fiscais nos exercícios anteriores99

Os prejuízos fiscais gerados por uma sociedade pertencente a um grupo de societário que tiver preenchido uma declaração conso­lidada de imposto de renda poderão, em princípio, ser compensados com os lucros tributáveis de outras sociedades pertencentes ao mes­mo grupo societáriolOO

101 111.5. DEPRECIAÇÃO E AMORTIZAÇÃO

Como regra geral, admite-se a utilização do método linear na depreciação de bens, equipamentos e ativos imobilizados. Para ado­ção da depreciação acelerada, geralmente deve-se obter uma autori­zação da Administração Tributária.

Bens que não correspondam aos equipamentos (bens de pro­dução) cujo valor não exceda RMB 2.000102 , ou bens cuja vida útil não ultrapasse 2 anos poderão ser contabilizadas como despesas.

Na amortização de ativos intangíveis (tais quais patentes, pro­priedade de tecnologia, marca, direitos autorais e de websites) permi­

te-se a adoção do método linear durante o período de uso previsto

no respectivo contrato. Caso não haja menção específica de prazo de uso, a amortização poderá ~;er feita por período máximo de 10 anosl03

Como regra geral, os prédios e imóveis são depreciados em 20 anos; trens, navios, e equiF amentos de produção, 10 anos; e, os equi­pamentos eletrônicos e demais meios de transportes (exceto trens e

navios), 5 anoslO4

99 DELOITTE TOUCHE TOHMATSU. Op. cit.. p. 122.

100 Ibidem. \01 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit., p. 35 e 36. 102 US$ 1.00 = aproxidamente RMB 8.25. 103 PRICEWATERHOUSECOOPERS. The People's Republic of China: tax facts an(

figures, p. 9.

104 Ibidem.

81

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

105 IV. INCENTIVOS FISCAIS

A alíquota normal de imposto de renda de 33% pode ser redu­zida. As modalidades de incentivos fiscais existentes na China são analisadas nos itens a seguir.

106 IV.1 • REDUÇÃO DE ALlQuOTA

Na China, há a concessão de isenção da alíquota de imposto de renda (Tax Holiday) pelo período de 2 anos, sendo possível nos 3 anos seguintes a redução de alíquota de 30% a 15% para FIEs comprome­tidas na produção pelo período mínimo de 10 anos. Entendemos que existe um termo específico, que podemos traduzir para "2 de isenção total, 3 de redução (da alíquota de imposto de renda) pela metadé'107

A vigência do período de isenção se inicia a partir do exercício fiscal em que houver lucros tributáveis após a compensação de pre­juízos fiscais.

Outrossim, as empresas agrícolas, florestais, ou as que estive­rem estabelecidas em áreas remotas, além da concessão de: (i) isen­ção (2 anos), e de redução da alíquota (3 anos) (no total de 5 anos); podem se beneficiar de: (ii) redução de 15% a 30% do imposto de

105 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit., p. 36 e ss. Para maiores referências vide também MAUGUE, Pierre. Tax incentives in the People·s Republic of China: who benefits? Tulane !ournal of International and Compara tive Law, v. 5, p. 155, Spring 1997.

106 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit.. p. 36. 107 EGUCHI, Takuya. Chyugoku no ChyuSeibu nitaisuru Atarashii Toushi Yuuguu Seido

INova sistemática de tratamento preferencial aos investimentos efetuados na região oeste da China] (tradução livre do título pelo autor). Kokusai Shojihomu -International Business Law, v. 27, n. 12, p. 1484, Dec. 1999 (em japonês). Original do termo "2 Men 3 Hangen", em japonês. Vide também TOSHIGE, Mitsuo. Chyugoku no Seibu Daikaihatsu: gaishi wo Seikyokuteki Kastuyo IAtração de investimentos estrangeiros na região oeste na China] (tradução livre do titulo pelo autor). Nihon Keizai Shimbun, p. 7, Nov. 12,2000 (em japonês); e. CHUO AOYAMA KANSA HOUJIN. Chyugoku Zeimu, Kaikei ITributação e contabilidade na China] (tradução livre do título pelo autor). 2. ed., Tóquio: Toyo Keizai, 2003. p. 39 et seq., ao se referir aos projetos de infra-estrutura, tais quais estradas, portos, e geração de energia.

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COOROENAçAO: PEDRO ANAN JR.

renda nos 10 anos seguintes (após o período total de 5 anos, mencio­nado no item ui" deste parágrafo).

Tais incentivos são também concedidos às empresas tecnologicamente avançadas (Technologically Advanced Enterprieses

- TAEs), ou ainda para as empresas orientadas às exportações (Export­

oriented Enterprises - EEs). A estas empresas, podem ser concedidos os benefícios de redução de 50% do imposto de renda pelo período adicional de 3 anos, além do período regular de 3 anos108

1V.2. REINVESTIMENTO DE LUCROS

As empresas estrangeiras que reinvestirem parte dos lucros (Reinvestment of Projits) obtidos na China podem, mediante apro­vação prévia, obter o reembolso de 40% do imposto de renda pago sobre a parte reinvestida, desde que tais lucros permaneçam reinvestidos por, no mínimo, 5 anos109

Um reembolso de 40% a 100% do imposto pago anteriormente pode ser concedido às TAES, ou ainda para às EEsllO

111 1V.3. ÁREAS GEOGRÁFICAS COM REDUÇÃO DE ALlQUOTA DE IMPOSTO DE RENDA

Na China, existem cinco áreas econômicas especiais (Special

Economic Zones - SEZs), situadas nas seguintes regiões: Shenzhen, Zhuhai Shantou Xiamen e Hainen ll2 As FIEs e as FEs que exer-, , cerem atividades nestas áre25 podem se beneficiar de redução de

108 PRICEWATERHOUSECOOPERS. The People's Republic ofChina: tax facts and fi-

gures. p. 7. 109 Ibidem .• p. 9. 1 lO Ibidem. p. 6. 111 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit .• p. 36, 112 Conforme art. 69 das Regras de Implementação da lei de Imposto de Renda da Re­

pública Popular da China às Empresas com Investimento Estrangeiro e às Empresas Estrangeiras. de 1° de julho de 1991. Disponível em: <http://www.novexcn.com/ implim_incm_tax_sinojv_9I.html>. Acesso em: 1 dez. 2004.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

alíquota de imposto de renda de 30% (alíquota normal) para 15%113, desde que cometidas com atividades ligadas à produção.

Dentre as cidades que possuem Áreas de Desenvolvimento Eco­nômico e Tecnológico (Economic andTechnological Development Zones

- ETDZs) podemos destacar: Beijing, Changchun, Chonqing, Dalian, Dayawan, Dongshandao, Fuqing-Rongqiao, Fuzhou, Guangzhou, Hangzhou, Harbin, Kunshan, Lianyungang, N ansha, Nantong, Ningbao, Qingdao, Qinhuangdao, Shanghai, Shenyang, Tianjin, Urumqi, Weihai, Wenzhou, Wuhan, Wuhu, Xiaoshan, Yantai, Yingkou e Zhanjiang, dentre outras114

115 V . TRIBUTAÇÃO INTERNACIONAL

Na China, existe a possibilidade de remessa de lucros, dividen­dos (por parte das FIEs), sem a incidência do imposto de renda reti­do na fonte116 • A partir de 10 de janeiro de 2000, os pagamentos de juros, aluguéis, royalties, leasing em geral, venda de bens imóveis si­tuados na China e demais pagamentos estão sujeitos à alíquota de 10%, quando remetidos para o exterior, podendo tal alíquota ser re­duzida por um tratado de bitributaçãoll7

A China possui tratados de bitributação assinados com os se­guintes países, a saber118 : África do Sul, Alemanha, Austrália, Áus­tria, Bahrain, Bélgica, Brasil, Canadá, Cingapura, Coréia do Sul, Cuba, Dinamarca, Espanha, Estados Unidos, Filipinas, Finlândia, França, Hong Kong SAR, Índia, Irlanda, Israel, Itália, Japão, Kuwai t,

113 DELOITTE TOUCHE TOHMATSU. Op. cit. p. 325. 114 lbidem. 115 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit., p. 36. 116 PRICEWATERHOUSECOOPERS. The People's Republic ofChina: tax facts and fi·

gures, p. 16 e 17. 117 lbidem. 118 lbidem, p. 21 e 22.

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

Luxemburgo, Macao SAR, Malásia, Países Baixos, Nova Zelândia, Noruega, Portugal, Rússia, Reino Unido, Suécia, Suíça, Tailândia, Venezuela, dentre outros.

Conforme afirmado acima, os rendimentos de FIEs, originários fora do território da China, estão sujeitos à tributação na China. En­

tretanto, na China é possível a obtenção de crédito de imposto de

renda pago no exterior, desde que tal crédito não exceda ao valor do imposto pago fora da Chinal19

De acordo com a legislação tributária da China, nos casos em

que as disposições acordadas nos tratados de bitributação entre um governo estrangeiro e a República Popular da China não estiverem de

acordo com as disposições da legislação interna, entendemos que po­

dem prevalecer as disposições previstas no respectivo tratado de

bitributação120

Vale ressaltar que existe um acordo de bitributação entre o Brasil

e China, assinado em 5 de agosto de 1991121

122 VI. TRANSFER PRICING

Transfer pricing "pressupõe uma divergência entre o preço efeti­

vamente estipulado e o preço 'justo', 'normal' ou 'objetivo" entenden-

119 Ibidem, p. 22. 120 Ar!. 28 da Lei do Imposto de Renda da República Popular da China às Empresas com

Investimento Estrangeiro e às Empresas Estrangeiras, de 9 de abril de 1991. Trans­crição da tradução não-oficial de seu art. 28: "\Vhere the provisions of tax agreements concluded between the gOl'ernment of the Peoplc's Republic of China and foreign gOl'ernments are different from the prol'isions of this Law. the pro\'isions of the

respective agreements shall apply." 121 Decreto n° 762, de 19 de fevereiro de 1993. 122 LEE. Stephen. Transfer pricing. Country guide: China, London. Dee. 2oo3l/an. 2004. Dispo­

n íl'el em: <http://www.legalmediagroup.com/in ternationaltaxrevlew/ default.asp?Page= 1 &SI D=2806& Type=Country%20Guides>. Acesso em: 3 dez. 2004. Vide também YUNFANG. Wendy Guo. Chyugoku no Ittenkagaku Zeisei ITransfer pricing na China! (tradução livre do titulo pelo autor). Kokusai Zeimu ITributação Intemaciol~all (tradução livre da publicação pelo autor). Tokyo. v. 20. n. 8, p. 12 et seq .. 1 1998?j (em ppones).

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

do-se por este o que seria fIxado entre empresas independentes, atu­ando em circunstâncias análogas (arm's length price}."123

Ou seja, transfir pricing envolve as operações realizadas entre sociedades do mesmo grupo societário, principalmente entre as em­presas multinacionais. Tais operações incluem a transferência de bens tangíveis, intangíveis, propriedade intelectual, serviços, empréstimos, leasing, dentre outras operações.

A China ado ta o princípio arm's length124 Este dispositivo per­mite às autoridades fiscais chinesas efetuarem os ajustes razoáveis, se os pagamentos ou recebimentos entre as empresas relacionadas não forem efetuados nas mesmas condições de operações entre par­tes independentes, ou se os pagamentos ou recebimentos resultarem na redução do lucro tributável.

As autoridades fiscais chinesas aceitam acordo prévio de pre­ços (Advanced Pricing Agreements -APA). Os procedimentos neces­sários para a solicitação do acordo estão previstos nas Regras de Implementação do Acordo Prévio de Preços (Implementation Rules

for Advance Pricing Arrangement for Transactions between Related

Parties), de 20 de setembro de 2004125

Para a legislação chinesa, parte relacionada inclui as empresas que tenham os seguintes vínculos, dentre outros:

123 XAVIER, Alberto. Direito tributário internacional do Brasil. 6. ed., Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 363-364.

124 Art. 13 da Lei do Imposto de Renda da República Popular da China às Empresas com Investimento Estrangeiro e às Empresas Estrangeiras, de 9 de abril de 1991. Trans­crição da tradução não-oficial de seu art. 13: "The payment or receipt of charges or fees in business transactions between an enterprise with foreign investment, or an establishment or place set up in China by a foreign enterprise to engage in production or business operations, and its associated enterprises shall be made in the same manner as the payment or receipt of charges of fees in busincss transactions between independent enterprises. Where lhe payment or receipt of charges or fces in not made in lhe same manner as in business Iransactions between independent enterprises and this results in a reduction of laxable income, the tax authorities shall have lhe right lo make reasonable adjustments."

125 PRlCEWATERHOUSECOOPERS. China seIS implementation rules on advance price arrangements. [Boletim informativo]. 21 setembro 2004. Disponível em: <http:// www.pwccn.comlhomeJeng/chinatax_news_sep2004_apa.html> . Acesso em: 29 mar. 2005.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

(i) participação societária, direta ou indireta, acima de 25%; (ii) a) empréstimos no valor de 50% ou mais em relação aos

fundos disponíveis! caixa disponível da própria sociedade; ou, b) pres­tação de garantia no valor de 10% (em relação aos fundos disponí­veis da própria sociedade) ou mais;

(iii) mais da metade dos diretores ou executivos seniores são nomeados pela outra sociedade; e,

(iv) controle de operações através do fornecimento de know­

how, matérias-primas, spare parts, dentre outros. Os métodos de ajuste de transfer pricing admitidos na China

são: (i) método do preço comparável entre partes independentes (Comparable Uncontrolled Price Method - CUP); (ii) método do preço da revenda (Resales Price Method - RPM); (iii) método do preço de custo mais lucro; ou (iv) demais outros métodos.

As principais considerações que se devem atentar são a razoabilidade na aplicação dos métodos, bem como as condições! possibilidades de aplicação e cálculo de um determinado método de ajuste.

Por se tratar de um assunto específico, e devido à amplitude

deste tema, não faz parte deste trabalho uma análise detalhada de cada um dos métodos de transfer pricing admitidos na China, bem

como os demais aspectos relacionados.

126 VII. REORGANIZAÇÕES SOCIETÁRIAS

VIL1. CONSIDERAÇÕES SOCIETÁRIAS

As formas de reorganizações societárias estão regidas no capí­

tulo VII da Lei das Sociedades de 1993, nas Regras de Incorporação

126 ZIMMERMAN. James M. el a!. Merger and division rules for foreign enlerprises.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

e Divisão de Empresas com Investimentos Estrangeiros de 10 de novembro de 1999 (Rules on Merger and Division ofForeign Investment Enterprises), nas Regras Provisórias de Tratamento Tributário às In­corporações, Divisões, Reestruturação Patrimonial, Transferência de Ativo e Reorganizações de Empresas com Investimentos Estrangei­ros (Regras Tributárias de Incorporações e Divisões) de 28 de abril de 1997 (Provisional Rules on Income Tax Treatment of Merger, Division, Equity Restructure, Asset Transfer and Reorganization of Foreign Investment Enterprises), dentre outras normas127. 128

Existem duas espécies de incorporações, conforme a legislação chinesa, a saber: (i) incorporação por absorção (Absorption Mergers); e, (ii) estabelecimento de nova incorporação (New Establishment Mergers)129 Entretanto, esta classificação se encontra prevista na Lei das Sociedades, mas não corresponde exatamente aos termos utili­zados nas Regras Tributárias de Incorporações e Divisões. Incorpo­ração por absorção se refere quando uma sociedade adquire uma outra empresa, ou um outro grupo de empresas - a sociedade incorporadora

People's Republic ofChina. The International Lawyer. v. 34. n. 3. p. 899-906, Autumn 2000. Para maiores referências, vide também HUI. Jane. Mergers and acquisitions. Country guide: Chin, London, Dec. 2003/1an. 2004. Disponível em: <hup:// www.legalmediagroup.com/internationaltaxreview/default.asp?Page= 1 &510=2805& Type=Country%20 Guides>. Acesso em: 3 dez. 2004.

127 ZIMMERMAN, James M. et aI. Op. cit., p. 899-900. 128 Ao traduzirmos a palavra "merger", utilizamos o conceito descrito em GAUGHAN,

Partick A. Mergers, acquisitions and corporate restructurings. 2" ed., New York, John Wiley & Sons: 1999, p. 7-8, que, entendemos, corresponde ao termo "incorporação" em português. O termo "incorporação" se encontra descrito em ANAN Jr., Pedro. Fusão, cisão e incorporação de sociedades: teoria e prática. São Paulo, Quartier Latin: 2004, p. 20-24. Basicamente entende-se por incorporação, "a operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra sociedade. Em virtude dessa absorção extingue-se a sociedade incorporada, sucedendo-lhe em todos os direitos e obriga­ções a sociedade incorporadora" (ANAN Jr., Pedro. Op. cit., p. 20). Já a definição do termo "merger': transcrevemos: "A merger is a combination of two corporations in which one corporation survives and the merged corporation goes out of existence. ln a merger, the acquiring company assumes the assets and the liabilities of the merged company. I ..... 1 with a merger A + B = A, where B is merged into company A I ..... 1" (GAUGHAN, Partick A. Op. cit., p. 7).

129 ZIMMERMAN, James et aI. Op. cit., p. 900-901.

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

continua a existir, enquanto a empresa incorporada deixa de existir (após a conclusão/fechamento da incorporação). O estabelecimento de nova incorporação se refere à operação em que duas ou mais sociedades se associam para estabelecer uma nova empresa, sendo que cada parte

desta transação deixa de ter sua existência (após a conclusão/fecha­mento da incorporação)lJO

Conforme as Regras de Incorporação e Divisão de Empresas com Investimento Estrangeiro, a divisão de empresas pode ser reali­zada sob duas formas, quais sejam: (i) divisão por continuação (Continuation Division); ou, (ii) divisão por dissolução (Dissolution

Division)lJl. Divisão por continuação pode ser definida como opera­

ção em que uma empresa é dividida em duas ou mais empresas, medi­

ante a continuação de existência da sociedade original, e com a criação

de uma ou mais sociedades. A divisão por dissolução se refere a uma

situação em que uma empresa é dividida em duas ou mais empresas,

com a dissolução da empresa original e com a criação de uma ou mais

novas empresas. Esta classificação não se encontra prevista na Lei das

Sociedades - entretanto, a mesma está consistente com aquelas pre­

vistas nas Regras Tributárias de Incorporações e Divisões1J2

133 VII.2. CONSIDERAÇÕES TRIBUTARIAS

Entende-se que as regras tributárias na China em matéria de

reorganizações societárias sã J lenientes. O princípio geral rege que

os benefícios fiscais134 origi:lalmente concedidos a cada sociedade

podem ser assumidos pelos sucessores da incorporação ou divisão.

130 Entendemos que se trata de uma fusão. "A operação de fusão é a operação através da qual duas ou mais sociedades se unem, para formar uma sociedade nova, a qual lhe sucede, em todos os direitos e obrigações extinguindo-se as sociedades submetidas

ao processo de fusão" (ANAN Jr., Pedro. Op. cit., p. 24). 131 ZIMMERMAN, James M. et aI. Op. cit., p. 903.

132 Ibidem. 133 Ibidem, p. 905 et seq. 134 Beneficios relacionados no item 4 acima. Vide ZIMMERMAN, James M. et aI. Op.

cit., p. 903.

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IMPOSTO OE RENDA PessOA JURlolCA

Outrossim, as Regras Tributárias de Incorporações e Divisões determinam que os valores das contas de ativo, passivo e de patrimônio líquido sejam calculados conforme o seu valor histórico nos livros contábeis e fiscais antes da reestruturação. Entende-se que tal requi­sito possa servir como meio de evitar a reavaliação de ativos (que tipicamente possa resultar em valores superiores aos valores históri­cos), e conseqüentemente aumentar os montantes relativos à depre­ciação e/ou amortização.

Com relação aos prejuízos fiscais, a legislação tributária prevê a possibilidade de utilização dos prejuízos fiscais acumulados em uma das sociedades nos anos posteriores às operações de incorporação ou de divisão, o que pode resultar em redução de carga tributária. Em 2003, foi aprovado o Documento 60 de 28 de maio, que conce­de os benefícios fiscais de isenção e redução de imposto de renda (comentado no item 2.3.1 acima) às empresas chinesas, quando a participação estrangeira atingir 25%135 de seu capital social. Trata-se de uma medida que procura encorajar e regulamentar a aquisição de participações societárias de empresas chinesas por investidores es­trangeiros136 Neste caso a empresa, que era chinesa, passa ser reco­nhecida como FIE, sendo-lhe aplicável as mesmas regras tributárias às FIEs e FEs, inclusive com relação à utilização de prejuízos fiscais acumulados anteriormente pela empresa chinesa (e antes da mu­

dança para FIE) pelo período máximo de 5 anos137

VI 1.3 . DIVERSOS

Apesar de haver diversas particularidades societárias e tributá­rias a este respeito, não é possível analisar detalhadamente todos os tratamentos fiscais dados às reorganizações societárias na China.

135 ERNEST & YOUNG. New tax holiday rules - China update. [S.I.J: [s.n.]. July 2003. p.l et seq.

136 lbidem. p. 1. 137 Ibidem. p. 2.

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COOROENAÇAo: PEDRO ANAN JR.

Cada situação concreta necessita de uma análise específica para cada caso. Procuramos apenas descrever os principais aspectos sobre este assunto.

VIII. TRIBUTAÇÃO DE INTERNET

Na China não existe nenhuma norma tributária específica que prevê a tributação das operações de internet138 • Em princípio, as opera­ções de internet podem ser tributadas normalmente, conforme as regras atualmente em vigor139 • A China reconhece quanto à necessidade de aprovar regras específicas de tributação às operações de internetl40

IX. REFORMAS FISCAIS

Conforme afirmado anteriormente, ressaltamos que o governo da China, mediante um anúncio público feito em fevereiro de 2004,

pretende efetuar a reforma da legislação do imposto de renda às pes­soas jurídicas estrangeiras141

Com o ingresso da China na OMC, admite-se que parte de sua legislação tributária devt rá estar reformada para harmonizar com os seus princípios/compromissos assumidos. Dentre as diversas re­formas, destacam-se142 : (i) 1 unificação das regras sobre o imposto

138 KlLLION. Ulrich M. China Internet tax: issues of particularism.liberalization.and integration. Michigan State University - DCL louma! of Intemationa! Law. v. II. p. 387. Autumn 2002.

139 ARTHUR ANDERSEN. Op. cit.. p. 40. 140 Ibidem. 141 DESOUZA. Glenn; TAN. Vickie; FUNG. Nicole. Minimising China taxes: looking ahead to

2006. Fevereiro 2004. Disponível em: <http://www.pwccn.com/home/printengl minimize_chinataxes.html>. Acesso em: 17 fev. 2005; BINGLAN. Xu. Debates to centre

upon tax reforms. China Daily. p. 3. mar. 9.2005. . ' 142 YUEN. Clement. Op. cit.; DESOUZA. Glenn; TAN. Vickie; FUNG. NICole. Op. Clt.;

LONGCHEN. Liu. Time for unified business taxo China Daily. p. 6. mar. 17.2005.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

de renda, mediante a aplicação de alíquotas única e variável na faixa entre 24 a 28%143, com a finalidade de dar o mesmo tratamento às empresas estrangeiras e às empresas chinesas, tanto em relação à alíquota do imposto de rendal44 ; e, (ii) diminuição/redução de in­centivos fiscais concedidos às empresas de exportação, já que tais incentivos podem ser caracterizados como subsídios às exportações - o que se encontraria inconsistente com as regras da OMC145

Ainda, com relação à políitica de incentivos fiscais, pode ha­ver a sua redução ou eliminação gradual, e que poderá ser estipula­do um período de transição entre 3 a 5 anos no qual os benefícios fiscais previamente concedidos às FEs e às FIEs poderão ser man­tidosl46. A manutenção de tal política de incentivos fiscais repre­sentaria um dos maiores obstáculos à unificação das alíquotas de imposto de renda, segundo opiniões mais otimistas147 Entretanto, dúvidas ainda persistem quanto à data de introdução de tais refor­mas fiscais na China.

x. CONCLUSÃO

Apesar da amplitude do tema, procuramos descrever, ainda que sucintamente, os principais tributos e impostos que incidem sobre as atividades de uma pessoa jurídica com a participação de um sócio ou investidor estrangeiro na República Popular da China.

143 YUEN. Clement. Op. cit.

144 A alíquota de imposto de renda das empresas chinesas é de 33%. sendo 30% às em· presas estrangeiras (YUEN. Clement. Op. cit.). Caso não sejam introduzidas as re· formas fiscais. a concessão de benefícios fiscais mais vantajosos às FIEs e às FEs. po­derá caracterizar por concorrência desleal a favor das empresas estrangeiras (Ibidem); LONGCHEN. Liu. Op. cit.. p. 6; BEl. Suo Official pledges further tax reforms. China Daily. p. II. mar. 21. 2005; BINGLAN. Xu. Op. cit.. p. 3.

145 YUEN. Clement. Op. cit. Para maiores informações a respeito das reformas tributá­rias na China. vide PRICEWATERHOUSECOOPERS. China: Imminent tax reform; LONGCHEN. Liu. Op. cit.. p. 6.

146 LONGCHEN. Liu. Op. cit.. p. 6. 147 Ibidem.

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

Caso haja tenha interesse em se estabelecer (através de consti­tuição de uma empresa com um sócio local, ou de aquisição de uma empresa chinesa) no mercado chinês, ressaltamos que os seguintes itens, dentre outros, devem ser observados, a saber:

(i) existência de regras tributárias específicas às empresas com sócio(s) estrangeiro(s), que diferem com as regras aplicáveis às em­presas domésticas chinesas, com relação ao imposto de renda;

(ii) incidência de 33% (30% + 3% de imposto local) de imposto de renda às empresas com investimento/capital estrangeiro, tais quais

os consórcios de patrimônio sino-estrangeiros, os consórcios contratuais sino-estrangeiros, as empresas totalmente pertencentes a sócios es­trangeiros, bem como as filiais de empresas estrangeiras; e,

(iii) concessão de isenção de impostos de renda por 2 anos e a

redução de alíquota para 15% nos 3 anos seguintes, desde que o in­vestidor estrangeiro esteja comprometido na produção pelo período mínimo de 10 anos, aplicável a quase todos os setores produtivos,

em princípio. Além do mais, o governo da China pretende introduzir novas

leis tributárias, mediante uma reforma da legislação do imposto de

renda das pessoas jurídicas. Assim sendo, ao investir na China, deve-se analisar cuidadosa­

mente os impostos incidentes, e também estar atento às possíveis refor­

mas fiscais, esperadas para ser aprovadas em 2008, segundo opiniões mais otimistas148 • Mudanças substanciais poderão ser introduzidas na

legislação da China - portan to, alterações e modificações no regime

de tributação deverão ser con ;tantemente monitoradas.

148 CHINA to unify tax on domestico foreign firms. Xinhuanel. 9 março 2005. Disponí­vel em: <hllp://news3.xinhuanel. comi english/200S-03/09/content_2676036.htm>.

Acesso em: 29 mar. 2005.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

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Aspectos ln rios da Cambial do

Investimento Brasileiro no Exterior

EmSON CARLOS FERNANDES

Advogado, mestre em D :reito Político e Económico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie, doutor em Direito das Relações Económicas Interna­

cionais pela Pontificia Universidade Católica de São Paulo, professor do Centro de Extensão Universitária e da Universidade Presbiteriana Mackenzie, ex­

membro do Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda e ex-Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas do Estados de São Paulo.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

ASPECTOS TRIBUTÁRIOS DA VARIAÇÃO CAMBIAL DO INVESTIMENTO BRASILEIRO NO EXTERIOR

I. INTRODUÇÃO

Dentre as várias confusões geradas pela edição da Medida Pro­visória na 232, de 31 de dezembro de 2004, uma que mereceu bas­tante destaque foi a prevista no seu artigo 90 , a qual possuía a se­

guinte redação:

"Art. 9° A variação cambial dos investimentos no exterior avaliados pelo método da equivalência patrimonial é consi­derada receita ou despesa financeira, devendo compor o lu­cro real e a base de cálculo da Contribuição Social sobre o

Lucro Líquido - CSLL do período de apuração.

Para melhor entendermos as implicações desse dispositivo, bem como as implicações de ele não ter sido convertido em lei, faz-se conveniente alguns esclarecimento sobre o tratamento dos investi­mentos brasileiros no exterior e, por via reflexa, da variação cambial desses mesmos investimentos.

II. TRIBUTAÇÃO DOS RENDIMENTOS AUFERIDOS NO EXTERIOR

A partir da entrada em vigor do artigo 25 da Lei na 9.249, de 1995, o Brasil passou a adotar o critério da renda mundial para o Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas - IRPJ, o que significa dizer que passaram a ser incluídos na apuração do lucro real os ren-dimento eridos no exterior. Assim determina o referido artigo:

\\8ute" cf :J ... ~

Jun6,6J 100

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COORDENAÇAD: PEDRO ANAN JR.

"Art. 25. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior serão computados na determinação do lucro real das pessoas jurídicas correspondente ao balan­ço levantado em 31 de dezembro de cada ano."

Mais tarde, por meio do artigo 21 da Medida Provisória n0 2.158, ainda em vigor, o critério da renda mundial foi estendido para a apuração da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, nestes termos:

"Art. 21. Os lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior sujeitam-se à incidência da CSLL, observadas as normas de tributação universal de que tratam os arts. 25 a 27 da Lei n° 9.249, de 1995, os arts. 15 a 17 da Lei n° 9.430, de 1996, e o art.1° da Lei n° 9.532, de 1997."

Atualmente, a incidência tanto do lRPJ quanto da CSLL so­bre os rendimentos auferidos no exterior está regulamentada pela Instrução Normativa SRF nO 213, de 2002, que deve ser aplicada como norma complementar, nos termos do artigo 100, I do Código Tributário Nacional- CTN.

No que diz respeito ao rendimento auferido por meio de inves­timento permanente (participação societária) sediado no exterior, a regra geral aplicável ao seu reconhecimento no Brasil para efeitos de incidência dos tributos acirr a indicados está descrita no artigo 2° combinado com o artigo 7°, ? 1 ° da mencionada lN SRF 213/2002,

nestes termos:

"Art. 2° Os lucros auferidos no exterior, por intermédio de

filiais, sucursais, controladas ou coligadas serão computa­

dos para fins de determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL no balanço levantado em 31 de dezembro

do ano-calendário em que tiverem sido disponibilizados para

a pessoa jurídica domiciliada no Brasil."

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

"Art. 7° A contrapartida do ajuste do valor do investimento no exterior em filial, sucursal, controlada ou coligada, avali­ado pelo método da equivalência patrimonial, conforme estabelece a legislação comercial e fiscal brasileira, deverá ser registrada para apuração do lucro contábil da pessoa ju­rídica no Brasil.

§ 1° Os valores relativos ao resultado positivo da equivalên­cia patrimonial, não tributados no transcorrer do ano-ca­lendário, deverão ser considerados no balanço levantado em 31 de dezembro do ano-calendário para fins de determina­ção do lucro real e da base de cálculo da CSLL."

Conquanto o citado artigo 2° da lN SRF 213/2002 disponha sobre a inclusão dos lucros auferidos no exterior, por meio de inves­timento permanente, no momento da sua disponibilização, o artigo 7°, § 1°, também transcrito, determina o oferecimento de tais rendi­mentos ao lRPJ e à CSLL por ocasião do seu registro contábil pela empresa brasileira, o que se dá com a equivalência patrimonial.

A incidência tributária em razão do mero reconhecimento contábil da equivalência patrimonial tem sido objeto de muito questionamento na doutrina e perante o Poder Judiciário, pois viola o conceito de disponibilização previsto no artigo 43 do Código Tri­butário Nacional- CTN, cujo entendimento deve ser de acréscimo

patrimonial.

Somente para lembrar, o referido artigo 43 do CTN, alterado pela Lei Complementar nO 104, de 2001, tem a seguinte redação:

"Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a ren­

da e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:

I - de renda, assim entendido o produto do capital, do tra­balho ou da combinação de ambos;

II - de proventos de qualquer natureza, assim entendidos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior.

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COOROENAçAO: PEDRO ANAN JR.

§ 10 A incidência do imposto independe da denominação

da receita ou do rendimento, da localização, condição jurí­dica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. (Parágrafo incluído pela Lep nO 104, de 10.1.2001)

§ 2" Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em

que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo. (Parágrafo incluído pela Lep

nO 104, de 10.1.2001)."

Nesse sentido, os rendimentos auferidos no exterior, por meio da titularidade de participação societária em empresa estrangeira, somente seriam incluídos na apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL quando efetivamente disponibilizados, o que impli­ca dizer, quando houvesse a distribuição de dividendos.

Com base no parágrafo único do mencionado artigo 43 do CTN, por outro lado, além do disposto no artigo 21 da Medida Provisória nO 2.158, as autoridades flscais têm exigido o IRPJ e a CSLL sobre os rendimentos auferidos no exterior por ocasião do registro contábil da equivalência patrimonial.

Por força do entendimento das autoridades fiscais, e da sua con­seqüente conduta, as empresas investidoras no exterior deverão, sal­vo se respaldada por medid 1 judicial, incluir na apuração do lucro real e da base de cálculo da CSLL, ao final de cada período fiscal, os lucros registrados pelas empresas estrangeiras das quais detém parti­

cipação societária.

III. VARIAÇÃO CAMBIAL DE INVESTIMENTO NO EXTERIOR

Qyestão relevante atinente aos investimentos permanentes (par­ticipação societária) no exterior diz respeito ao tratamento fiscal da variação cambial, decorrente do registro nas demonstrações finan­

ceiras da empresa brasileira por seu correspondente valor em Reais.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Do ponto de vista contábil, no silêncio da legislação, entende­mos aplicável, inclusive para as sociedades limitadas, a orientação expressa no artigo 16, I, b da Instrução CVM nO 247, de 27 de março

de 1996, abaixo transcrita:

"Art. 16. A diferença verificada, ao final de cada período, no valor do investimento avaliado pelo método da equiva­lência patrimonial, deverá ser apropriada pela investidora como:

I - receita ou despesa operacional, quando corresponder:

b) a variação cambial de investimento em coligada e con­trolada no exterior."

Em conformidade com o dispositivo acima, temos que a varia­

ção cambial do investimento permanente no exterior deve ser consi­

derada como parte da equivalência patrimonial, possuindo, portan­

to, a mesma natureza. Essa era a mesma orientação do artigo 9° da Medida Provisória nO 232.

Dessa forma, a referida variação cambial teria tratamento idên­

tico àquele concedido aos lucros auferidos no exterior, nos termos

mencionados acima.

Ocorre que, com relação ao tratamento fiscal, a variação cam­

bial está disciplinada pelo artigo 9° da Lei nO 9.718, de 1998, nestes termos:

"Art. 9° As variações monetárias dos direitos de crédito e das obrigações do contribuinte, em função da taxa de câm­bio ou de índices ou coeficientes aplicáveis por disposição legal ou contratual serão consideradas, para efeitos da le­gislação do imposto de renda, da contribuição social sobre o lucro líquido, da contribuição PIS/PASEP e da COFINS, como receitas ou despesas financeiras, conforme o caso.

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COOROENAçAO: PEORO ANAN JR.

Por força desse dispositivo, qualquer variação monetária em hm­ção da taxa de câmbio deve ser registrada, para efeitos de incidência dos tributos sobre as receitas e o resultado, como receita ou despesa financeira, conforme o caso.

Portanto, as autoridades fiscais, com base na legislação atual­mente em vigor, podem exigir que a variação cambial dos investi­mentos estrangeiros seja incluída não só na base de cálculo não só do IRPJ e da CSLL, mas também da Contribuição para o Programa de Integração Social- PIS e da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social- COFINS, independentemente da regra anterior­mente prevista na citada Medida Provisória nO 232.

IV. CONCLUSÃO

Conforme pode ser percebido, a inadequação e inconstitucionalidade, denunciadas e combatidas quando da edi­ção da mencionada Medida Provisória nO 232, não foram causadas pela disciplina da variação cambial de investimento trazida por essa MP, mas decorre da previsão de incidência do IRPJ e da CSLL antes da disponibilização do resultado gerado no exterior.

Repetimos: a nova disciplina (considerando a variação cambial

de investimento como equivalência patrimonial), em nossa opinião (e na da CVM), é a mais ccrreta. Se a regulamentação do IRPJ e da CSLL estabelecesse claran,ente (como faz o artigo 43 do Código Tributário Nacional) que o resultado auferido no exterior somente seria tributado no momento da disponibilização, a correta alteração promovida pelo artigo 9° da MP 232 não teria efeito, já que, no exemplo acima, não haveria resultado a ser disponibilizado à empre­sa brasileira e, dessa forma, não haveria incidência de imposto. Por­tanto, o foco para evitar essa possível distorção (tributação de preju­

ízo) não é a MP 232, mas a MP 2.158-35

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IRPJ e CSLL: Efeitos da Correção Monetária do Capital Social com

Base em Dispositivo Contratual ou Assemblear

EDMAR OLIVEIRA ANDRADE FILHO

Advogado em São Paulo Doutor em Direito pela PUClSP

Membro benemérito da APET Professor de Especialização da APET

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

IRPJ E CSLL: EFEITOS DA CORREÇÃO MONETÁRIA DO CAPITAL SOCIAL COM BASE EM DISPOSITIVO

CONTRATUAL OU ASSEMBLEAR

I. QUESTÕES EM DEBATE: A INFLAÇÃO COMO FATO SOCIAL

Pretendo, neste estudo, discutir as questões jurídicas fundamen­tais acerca da validade da correção monetária do valor do capital social com base em deliberação de sócios ou acionistas de socieda­des, que são pessoas jurídicas contribuintes do IRPJ e CSLL calcu­lados com base no lucro rea1.149

O fio condutor das discussões é a existência de inflação1so e alguns dos seus efeitos no resultado das empresas tributadas com base no lucro real, cujas idéias mestras já expus em outro estudo. lsl

A inflação, fenômeno que as Ciências Econômicas descreve -em apertada síntese - como sendo um aumento geral de preços no mercado, é fato social que não pode ser ignorado pelo Direito Positi-

149 Adianto que as premissas e as conclusões que serão aqui expostas podem ser, mutatis mutandis, adotadas para o campo das contribuições sociais incidentes sobre a recei­ta. De fato, considero ser legítima a exigência de tributo sobre correção monetária e variação cambial quando elas representam atualização de receita ou lucro efetivo, como é o caso, por exemplo, da correção monetária incidente sobre o preço de um produto vendido que deveria ter o mesmo tratamento atribuído à receita de venda.

150 Não me interessa discutir, aqui, a eventual responsabilidade estatal pelo fenômeno da inflação. Remeto o leitor para: TILBERY, Henry. Inflação e tributação. Direito triblltário: estudos em homenagem ao Professor Ruy Barbosa Nogueira. I. ed. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 455; e MARTINS, Ives Gandra da Silva. Ajustes por perdas inflacionárias e cambiais e o seu tratamento perante o imposto sobre a renda. V Co­lóqllio irttemacional de direito tributário. I. ed. São Paulo: 10B, 2003, p. 157

151 ANDRADE FILHO, Edmar Oliveira. Imposto de renda das empresas. I. ed. São Pau­lo: Atlas, 2004, p. 255. Na mesma obra discorri sobre a correção monetária dos preju­ízos fiscais (p. 351 ) matéria que não foi considerada neste estudo mas que tem afini­dade estrutural e tel~ológica com as premissas e conclusões aqui expostas.

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vo, posto que, consoante adverte Caio Tácito, "a ordem jurídica não pode ser indiferente aos pressupostos econômicos que lhe servem de alicerce"152 De igual modo, são ainda atuais as lições de Amílcar de Araújo Falcão proferidas em 1967. Segundo ele, "à ordem jurídica não é possível ficar indiferente diante do fenômeno da depreciação da moeda" posto que ela (a moeda) constitui um dos instrumentos bási­cos "para a definição de inúmeros dos seus institutos e para a formula­ção da maior parte das soluções jurídicas que consagra" .153

Portanto, os efeitos da inflação sobre a vida econômica das pes­soas em geral não podem ser ignorados ou desprezados pelo Direito, sem justa causa. 154 Um dos mecanismos de consideração do fenô­meno inflacionário é a correção monetária. Ainda de acordo com Amílcar de Araújo Falcão, ela "é a técnica pelo direito consagrada de traduzirem-se em termos de idêntico poder aquisitivo quantias e valores que fixados pro tempore, se apresentam expressos em moeda

sujeita a depreciação".!SS A ordem jurídica positixa ignora esse tipo de fato social quan­

do não dispõe de regras que permitam reduzir as probabilidades de

decisões que levam a algum tipo de injustiça que a existência da

inflação possa eventualmente causar. Logo, se numa determinada comunidade há inflação, a falta de mecanismos de correção ou aco­

modação de seus efeitos leva a uma lacuna axiológical56 que pode

implicar decisões injustas 011 não eqüitativasl57 Por tal razão, é atual

a advertência de Caio Tácito, no sentido de que "o reajustamento da

expressão nominal de obrig:lções pecuniárias, de modo a conservar o

152 TAcITO, Caio. Direito administrativo. I. ed. São Paulo: Saraiva, 1975, p. 320. 153 FALCÃO, Amílcar de Araújo. A inflação e suas conseqüências para a ordem jurídica.

Revista de direito público n" 1. São Paulo: RT, julho a setembro de 1967, p. 54-63. 154 ASCARELLl, Tullio. Problemas das sociedades anónimas e direito comparado. 2. ed.

São Paulo: Saraiva, 1969, p. 165. 155 FALCÃO, Amílcar de Araújo. Idem, idem. 156 DINIZ, Maria Helena. Norma constitucional e seus efeitos. 2. ed. São Paulo: Saraiva,

1992,p.63. . 157 CAMPOS FILHO, Paulo Barbosa. Obrigações de pagamento em dinheiro. I. ed. RIo

de Janeiro: EJV, 1971, p. 81-88.

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seu valor intrínseco diante da deterioração da moeda, repousa em princípios gerais de direito respeitáveis, de fundo eqüitativo: o da ilegitimidade do enriquecimento sem causa do credor e o da irresponsabilidade pela álea económica extraordinária, insupor­tável pelo devedor" 158

O potencial lesivo 159 da falta de mecanismos de atualização monetária, diante de um quadro de notória inflação, é tanto mai­or quando a ordem jurídica está assentada em uma desigualdade estrutural, que se forma quando ela nega tutela jurídica para cer­tas situações em que o fenómeno atua, mas, ao mesmo tempo, permite a adoção de mecanismos de estabilização em certas áreas da vida social e econômica, ou seja, quando existem condições

jurídicas para que apenas parte dos players do jogo social e eco­nômico acautelem-se contra os nefastos efeitos da desvaloriza­

ção da moeda. 160

No campo tributário esta lacuna pode subverter ou destruir

a distribuição constitucional de competências encartada na Cons­titulçao FederaP61 e malferir o princípio da capacidade

contributiva. A lesão162 cuja a ausência de condições jurídicas que permitam aos sujeitos passivos possam proteger-se dos efeitos da inflação torna-se ainda mais candente se considerarmos que o

158 T ACITO, Caio. Direito administrativo. I. ed. São Paulo: Saraiva, 1975, p. 320. 159 Em situações extremas, a lacuna pode levar a situações em que o ordenamento passa a

tutelar o enriquecimento sem causa que deveria combater. A respeito: PAES, Pedro. Introdução ao estlldo do el1riquecimento sem callsa. I. ed. São Paulo: VB, 1975, p. 31. Acerca da eqüidade como fundamento moral da necessidade de repressão ao enrique­cimento ilícito, vide: COMPARATO, Fábio Konder. Direito empresarial. I. ed. São Pau­lo: Saraiva, 1990, p. 531, e RIPERT, Georges. A regra morall1as obrigações civis. I. ed. São Paulo: Bookseller, 2000, p. 245.

160 Exemplo são as regras que dispõem acerca da correção monetária nos contratos entre particulares e nos contratos de concessão de serviços públicos.

161 DERZI, Misabel. Os conceitos de renda e patrimônio: efeitos da correção monetária

illsuficiel1te 110 imposto de renda. I. ed. Belo Horizonte: Dei Rey, 1992, p. 19. 162 A idéia de lesão, nas relações jurídicas, estará presente quando as bases contratuais ou

legais não estiverem baseadas na equivalência das prestações ou das condições jurídi­cas existentes em determinada época e comunidade. A respeito: PEREIRA, Caio Mário da Silva. Lesão 1105 cOl1tratos. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 190.

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Poder Público conta com leis que garantem a realidade valorativa do crédito tributário por via de juros que embutem expectativas inflacionárias l63

II. As DISTORÇÕES DA FALTA DE CORREÇÃO MONETÁRIA DO

PATRIMÓNIO

No ordenamento jurídico vigente, não há regra a determinar o reconhecimento dos efeitos da inflação sobre o patrimônio das socie­dades, a exemplo do que ocorria quando do advento da Lei nO 6.404/ 76, que, no art. 185, prescrevia uma sistemática de correção monetá­ria dos valores constantes do patrimônio líquido (capital, lucros e reservas) e do Ativo Permanente. O objetivo das normas sobre cor­reção monetária do balanço era permitir que a contabilidade captu­rasse os efeitos da inflação sobre o patrimônio social de uma forma abrangente.

A cada ano, o efeito era medido e computado como perda ou ganho em rubrica específica do resultado do exercício, e os valores constantes do balanço eram atualizados. O sistema de normas então vigentes não determinava a correção integral dos elementos do ativo do passivo, posto que se limitava a determinar a atualização dos va­lores permanentes, na suposição de que os valores circulantes (os débitos e direitos, inclusiv,! estoques) corrigiam-se por si mesmos porque eram liquidados e, no mais das vezes, eram protegidos por cláusulas de estabilização monetária.

Assim, para adotar uma classificação proposta por Rubens Gomes de Sousa, havia duas espécies de correção monetária: patrimonial e obrigacional. A primeira decorria da atualização de elementos estáticos do patrimônio social; a segunda, por outro lado,

163 ANDRADE FILHO. Edmar Oliveira. lnfrações sanções tributárias. I. ed. São Paulo:

Dialética. 2003. p. 137.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

estava fundada na autonomia privada e tinha feição dinâmica por­quanto incidia sobre valores a liquidar e produzia efeitos imediatos em função do próprio ato ou negócio.164

As normas sobre correção monetária, que tinham importância na determinação do montante dos tributos incidentes sobre os re­sultados das empresas, foram revogadas pela Lei nO 9.249/95.

A falta de regras sobre correção monetária do Balanço acaba por gerar distorções nos resultados tributáveis, o que se pode com­provar a partir de um singelo exemplo. Tomemos o caso de um in­vestidor que subscreve capital de uma sociedade no valor de RS 100.000,00, e que o dinheiro recebido tenha sido depositado em uma conta remunerada cujo rendimento foi o mesmo que a inflação do período, fIXada em 10% (dez por cento).

Ao cabo do período considerado a sociedade irá apurar um "lu­cro" de RS 10.000,00 que não corresponde a um incremento do va­lor do capital investido; ele deriva, unicamente, da atualização do valor da moeda. No entanto, segundo as regras hoje vigentes, esse contribuinte deveria recolher IRPJ e CSLL sobre esse lucro, que não é real; é apenas nominal. I65 Se ainda vigorassem as normas sobre correção monetária do Balanço, o resultado apurado pela sociedade em questão seria igual a zero, já que a correção monetária do capital social investido seria considerada como uma perda inflacionária; ou seja, os efeitos da inflação seriam globalmente captados consideran­do-se a origem e a aplicação dos recursos.

Assim sendo, se fosse possível (válida) a correção monetária do valor do capital social com base em dispositivo contratual ou assemblear, o resultado daquela hipotética sociedade seria igual a zero, pois em contrapartida ao aumento do valor do capital social seria contabilizada despesa no valor de RS 10.000,00. Por conse-

164 SOUSA. Rubens Gomes de. Pareceres 3: imposto de renda. 1. ed. São Paulo: Resenha Tributária. 1976. p. 297-298.

165 Deveria recolher. também. contribuições ao PIS e COFINS. salvo nos casos em que a lei não exige tais contribuições sobre as chamadas "receitas financeiras':

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guinte, se esta correção monetária não puder ser registrada, continu­ará havendo tributação sobre renda apenas nominal.

O singelo exemplo acima apresentado demonstra, à sociedade, haver apenas aparência de lucro: que é mascarado pelo sistema de contabilidade que não consegue captar todos os efeitos da inflação sobre aquele patrimônio. Para que houvesse tributação legítima - a advertência é de Cleber Giardino e Geraldo de Ataliba - não basta a aparência, é necessário que "a potencialidade econômica seja efetiva, de tal maneira que os ganhos, para não serem falseados, devem ser demonstrados em termos monetários homogêneos (Moschetti)" .166

A ilegitimidade da tributação de uma renda fictícia, como a do nosso exemplo, foi denunciada por Pontes de Miranda, no monu­mental Tratado de Direito Privado, nos seguintes termos:

A expressão "correção monetária" é elíptica. Não é a moeda que se corrige; é o valor da moeda. Mais precisamente: corrige-se o valor

das dívidas ou das promessas em moeda, para que o valor, não corri­gido, da moeda, deixe de ser nocivo às relações jurídicas entre deve­dores ou promitentes e credores ou promissários. 167

A renda supõe o acréscimo de valor em moeda, entre dois pon­

tos de tempo, a determinado poder econômico, sem que se possa pensar em renda se o poder econômico apenas mudou de valor por ter-se degradado a moeda. Não importa qual seja a teoria dos econo­

mistas para conceituar renda (e.g. Georg Stranz, B. Puisting, R. M. Haig, G. Strutz). A depreciação da moeda não é fonte de renda: o

valor verdadeiro persiste, e'n princípios, por isso se corrige o valor

falsificado, digamos assim, :la moeda. 168

Correção do valor monetário absolutamente não aponta renda.

Nada rendeu; foi a moeda que se desvalorizou. O Estado, para o

166 GIARDINO, Cleber e ATALIBA, Geraldo. lntributabilidade das correções monetári­as: capacidade contributiva. Princípios tributários no direito brasileiro e compara­do. Estlldos em homenagem 11 Gilberto de Ulhoa Canto. I. ed. Rio de Janeiro: Foren­

se, 1988, p. 174. 167 MIRANDA, Francisco Cavalcante Pontes de. Tratado de direito privado. v. 50. 2. ed.

Rio de Janeiro: Borsoi, 1965, p. 481.

168 Idem, p. 492-493.

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poder editar regras jurídicas sobre tributos, tem de partir da afirma­ção e da prova de que há suporte fático necessário e suficiente para cada uma das regras jurídicas. Onde não há terreno não se pode tributar com imposto predial. Onde não há ato jurídico não se pode exigir selo de instrumento. Onde não há venda ou consignação não se pode querer que se atenda a imposto de vendas e consignações. Onde não há renda não é concebível imposto de renda. 169

O tema foi debatido por diversas vezes no Supremo Tribunal Federal. Cabe destacar, neste momento, os doutos votos dos Minis­tros Oswaldo Trigueiro, Relator do Recurso Extraordinário na 71.758170 e do Ministro Cunha Peixoto, Relator de Recurso Extra­ordinário n.O 89.791-7. Disse o ilustre Ministro Oswaldo Trigueiro:

Qyaisquer que sejam as nuanças doutrinárias sobre o conceito de renda, parece-me, acima de toda dúvida razoável, que, legalmen­te, a renda pressupõe ganho, lucro, receita, crédito, acréscimo patrimonial, ou, como diz o preceito transcrito, aquisição de dispo­nibilidade econômica ou jurídica. Concordo em que a lei pode, casuisticamente, dizer o que é ou o que não é renda tributável. Mas não deve ir além dos limites semânticos, que são intransponíveis.

Para bem explicar a Constituição, o Poder Judiciário tem que fazer uso de noções precisas e claras, não sendo de admitir-se como legítimo que o imposto de renda recaia sobre o que, evidentemente, não é renda.

Dir-se-á que a lei pode alterar a definição de qualquer imposto, como pode, para fazê-lo, recorrer ao expediente das ficções jurídicas. No caso, porém, esse argumento não tem préstimo, porque estamos diante de um conceito da Constituição, explicitado pelo Código Tri­butário Nacional.

Por sua vez, o douto Ministro Cunha Peixoto deixou assentado que:

169 Idem. p. 492.

170 Publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência nO 66/150.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Na verdade por mais variado que seja o conceito de ren­

da, todos os economistas, financistas e juristas se unem

em um ponto: renda é sempre um ganho ou acréscimo de patrimônio.

Ora, a correção monetária, realmente, não constitui rendi­mento, porque lhe faltam elementos constitutivos deste, princi­palmente a reprodutividade. A renda se destaca da fonte sem empobrecê-la.

Tal não ocorre na correção monetária, em que o capital con­tinua o mesmo; apenas é atualizado para o valor do dia do paga­mento. Sem ela, haveria uma diminuição do capital. Procura-se, com a correção monetária, apenas dar ao capital o mesmo valor que tinha, quando do negócio. Nada se lhe acrescenta; portanto, nenhuma renda há.

A correção, portanto, não é renda, mas simples restauração do valor primitivo do capital. Trata-se de mera alteração nomi­nal, e não real. Mera substituição do desfalque do valor, e não acréscimo do valor. E nota-se que, no caso sub judice, as partes estabeleceram a correção monetária tomando por índices que não acompanham os da inflação, sendo-lhe inferior. Há, pois, mesmo com a correção monetária, nos termos em que é posta no contrato, um decréscimo nó capital, e não é lícito ao legisla­dor dizer que a diminuição do patrimônio constitui renda, pois o conceito dela, além de I!star consubstanciado no art. 43 do Código Tributário Nacional, existe no direito privado, seja no Código Comercial (lucros, etc, arts. 302, 288), seja no Código Civil (frutos, produtos, rendimentos, rendas, etc. - arts. 60, 178,

parágrafo 10,674, VI, 749, etc). Consoante foi demonstrado, a partir do exemplo numérico

antes apresentado, a falta de correção monetária do valor do capi­tal social produz um efeito tributário que implica incidência tri­butária sobre uma riqueza inexistente. De fato, em essência, a falta de uma norma que imponha a correção monetária do valor

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do capital social acaba por mudar a forma de medida dos fatos econômicos, "porém não sua consistência substancial". 171

A conseqüência imediata deste tipo de distorção172 é o aumen­to da carga tributária e cobrança de tributo sobre hipótese material de incidência não autorizada pela Lei das Leis, posto que leva à tri­butação de "manifestação fictícia de capacidade contributiva"!73 A correção monetária do valor do capital social, como será demonstra­do, tem a virtude de eliminar os nefastos efeitos da tributação inci­dente sobre atualização meramente nominal sem geração de acrésci­mo patrimonial efetivo.

III. OFENSA AO PRINCípIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA

A tributação, por via direta ou transversa, de acréscimos nomi­nais não traduzíveis em receita ou ganho de qualquer espécie, acaba

por vulnerar, de forma irremediável, o princípio da capacidade contributiva.

Dispõe o § 10 do art.145 da Constituição Federal que "sempre

que possível os impostos terão caráter pessoal e serão graduados se­

gundo a capacidade econômica do contribuinte"

Toda norma jurídica (princípio ou regra) desempenha uma ou

mais funções na ordem jurídica positiva à qual pertencem. Os prin­cípios têm, por natureza, uma função sistêmica mais abrangente por­

quanto fornecem fundamento de validade para grande número de

regras e porque prestigiam valores que são caros à comunidade. As

GIARDINO, Cleber e ATALlBA, Geraldo. Intributabilidade das correções monetá­rias: capacidade contributiva. Princípios tributários no direito brasileiro e comparado. Estudos em homenagem a Gilberto de Ulhoa Canto. J. ed. Rio de lanei­ro:Forense, 1988,p. 158.

172 Neste sentido: TILBERY, Henry. Inflação e tributação. Direito tributário: estudos em homenagem ao Professor RI/y Barbosa Nogueira. I. ed. São Paulo: Saraiva, 1984, p. 467.

173 Idem, p. 159.

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regras estabelecem situações concretas de dever-ser na medida em que estipulam direta e incisivamente o que é permitido, obrigatório ou proibido.

Pois bem, o princípio da capacidade contributiva tem uma im­portante função; ele induz à idéia de justiça distributiva. O bem ju­rídico que o princípio da capacidade contributiva visa a proteger é a distribuição da carga tributária de forma razoável; assim, de um ponto de vista funcional ele visa instaurar critérios indispensáveis para o estabelecimento de um equilíbrio entre as necessidades públicas e a preservação da fonte produtora da riqueza. Em outras palavras, a razão última do referido princípio é a justiça do sistema tributário que, como é sabido, está fundado no princípio da legalidade.

O princípio da capacidade contributiva (ao lado da isonomia e proporcionalidade) faz parte do núcleo das normas que visam a rea­lizar os ideais de justiça da ordem jurídica positiva de nosso país. Portanto, nesta condição, ele adquire importância sistemática que o credencia a ostentar a posição de princípio fundamental de proteção dos direitos e garantias individuais que se projetam sobre a vida de

todas as pessoas, individuais ou coletivas. Em outras palavras, não existe norma tributária válida que não atenda ao seu vetor axiológico.

A despeito da inegável importância deste princípio para a or­

dem jurídica positiva ainda existem dúvidas sobre a aplicação dele em relação às contribuições. Colabora para esta dúvida o enunciado

do § 10 do art. 145 da Constituição Federal, segundo o qual "sempre

que possível os impostos ter: o caráter pessoal e serão graduados se­

gundo a capacidade econôm ca do contribuinte" O texto normativo faz referência apenas e tão somente aos "im­

postos" e, portanto, não menciona as "contribuições" Essa lacuna

torna-se ainda mais problemática se considerarmos que ainda per­manece arraigada, entre nós, a idéia de esse princípio só se aplicar aos impostos, porquanto os demais tributos, as taxas e as contribui­

ções, seriam governados pelo princípio da retribuição ou utilidade. Temos como verdadeiro, todavia, que, para que um cidadão possa

ser incluído dentre aqueles que irão contribuir para as receitas do

Estado, é de fundamental importância que revele condições de su-

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

portar a exigência que a lei tributária cria, ou seja; a exação deve guardar proporcionalidade com essa capacidade.

Essa exigência de proporcionalidade se irradia para as contri­buições, sem dúvida alguma. Também em relação a elas, a obrigação tributária que surge da ocorrência do fato gerador deve ser dimensionado segundo a capacidade que, virtualmente, o sujeito passivo deverá ter. Se assim não fosse, estariam abertas as portas para o arbítrio, um absurdo que deve ser conjurado.

Assim, se não se pode haurir do § lodo art. 145 da Constitui­ção Federal, a conclusão de que as contribuições submetem-se ao crivo do princípio da capacidade contributiva; é indisputável que a exigência de proporcionalidade - que adentra a ordem jurídica pela porta do princípio que consagra o substantive due proceJs of law -

imponha tal consideração pela norma tributária. Na idéia de proporcionalidade está contida a de razoabilidade,

que constitui importante freio ao exercício do poder de tributar, con­soante decidiu o Plenário do Supremo Tribunal Federal, quando da apreciação da Medida Cautelar em ADIN nO 2.010, cuja decisão está publicada no Diário de Justiça de 14 de abril de 2002, nos se­guintes termos:

o Poder Público, especialmente em sede de tributação (as contribuições de seguridade social revestem-se de caráter tributário), não pode agir imoderadamente, pois a ativida­de estatal acha-se essencialmente condicionada pelo prin­cípio da razoabilidade.

Em outra decisão, quando do julgamento da ADIMC 1.407,

aquela mesma Corte delineou as vigas mestras do princípio da proporcionalidade como limite ao poder de legislar, dizendo:

O Estado não pode legislar abusivamente. A atividade legislativa está necessariamente sujeita à rígida observância de diretriz funda­mental, que, encontrando suporte teórico no princípio da proporcionalidade, veda os excessos normativos e as prescrições

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irrazoáveis do Poder Público. O princípio da proporcionalidade que extrai a sua justificação dogmática de diversas cláusulas consti­tucionais, notadamente daquela que veicula a garantia do substantive

due process of law - acha-se vocacionado a inibir e a neutralizar os abusos do Poder Público no exercício de suas funções, qualificando­se como parâmetro de aferição da própria constitucionalidade mate­rial dos atos estatais. A norma estatal que não veicula qualquer con­teúdo de irrazoabilidade presta obséquio ao postulado da proporcionalidade, ajustando-se à cláusula que consagra, em sua di­mensão material, o princípio do substantive due process of law (CF, art. 50, LIV).

Por estas razões, estou plenamente convicto de que não há tri­buto que não se submeta, por inteiro, aos limites do princípio da capacidade contributiva.

Este princípio tem uma função positiva e outra negativa. Sob o ponto de vista positivo ele tem a função de estabelecer um programa normativo ou pauta de ação para legislador e, no sentido negativo ele tem a importante função de interditar, de plano, a validade da norma tributária que eleja como fato tributário algo desprovido de

conteúdo econômico apreciável. Estas funções estão presentes em diversas manifestações da dou­

trina. Para Alfredo Beckerl74 , em face desse princípio, o legislador

ordinário "deverá escolher f ara a composição da hipótese de inci­dência da regra jurídica criadora do tributo, exclusivamente fatos

que sejam signos presuntivo; de renda ou de capital. A desobediên­

cia, pelo legislador ordinári<) a esta regra constitucional, tem como

conseqüência a inconstitucionalidade da lei" A doutrina de Alfredo Becker coincide, em linhas gerais, com

a antiga lição de Alberto Xavier, verbis:

174 BECKER, Alfredo Augusto. Teoria geral do direito tributário. 2. ed. São Paulo: Sarai·

va, 1972, p. 454.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Nem todas as situações da vida abstratamente susceptíveis de desencadear efeitos tributários podem, pois, ser desig­nada pelo legislador como fatos tributáveis. Este encontra­se limitado na faculdade de seleção pela exigência de que a situação da vida a integrar na previsão da norma seja reveladora de capacidade contributiva, isto é, de capacidade econômica, de riqueza, cuja expressão sob qualquer forma se pretende submeter a tributo.

Pode o legislador escolher livremente as manifestações de ri­queza que repute relevantes para efeitos tributários, bem como delimitá-las por uma ou outra forma - mas sempre deverá proceder a essa escolha dentre as situações da vida reveladoras de capacidade contributiva, e sempre a estas se há-de (sic) referir na definição dos critérios da medida do tributo.175

Na lição de Geraldo Ataliba, esse princípio, traduz-se na exi­gência de que a tributação seja modulada de modo a adaptar-se à

riqueza dos contribuintes, e:

Implica que cada lei tributária tenha por efeito atingir ma­nifestações, ou aspectos dessa riqueza, sem destruir sua base criadora. 176

A eleição, pelo legislador, de situações que irão compor o su­porte fático da uma norma tributária não pode ser aleatória ou des­provida de substância econômica, conforme observam Cleber Giardino e Geraldo Ataliba 177 :

175 XAVIER, Alberto. Manual de direito fiscal. 1. ed. Lisboa: FDL. 1974, p. 108. 176 ATALlBA, Geraldo. Progressividade e capacidade contributiva. Em: Princípios cons­

titucionais tributários. Separata da Revista de Direito Tributário. 1. ed. São Paulo: IDEPE, 1991, p. 50.

GIARDINO, Cleber e ATALlBA, Geraldo. Intributabilidade das correções monetá­rias: capacidade contributiva. Princípios tributários no direito brasileiro e com­parado. Estudos em homenagem a Gilberto de Ulhoa Canto. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1988, p. 164.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

No Brasil, mais que alhures, há exigência insuperável de

que o fato imponível seja passível de medição; quer dizer, deve necessariamente - e a necessidade é impostergável, porque constitucional- ter conteúdo econômico.

Assim, o postulado universalmente consagrado da capacidade contributiva é, aqui, erigido em exigência básica e fundamental, a que não pode fugir o legislador. Portanto, tributo com hipótese de incidência destituída de qualidades subjetivamente mensuráveis -quer dizer substância econômica - é, no Brasil, inconstitucional.

Cabe aditar que este princípio, por dispor sobre matéria relati­va aos direitos e garantias fundamentais, está sujeito ao cânone da máxima efetividade das normas constitucionais. 178

Em matéria de capacidade contributiva, o mandamento da má­xima efetividade atua na formulação hipotética da norma e da apli­cação prática da mesma, diante dos fatos relevantes para a incidência na norma tributária e, há muito, deixou de ser mera recomendação

ao legislador. 179 Assim, tal mandamento será cumprido na medida

em que o princípio da capacidade contributiva deixar de ser uma

mera hipótese normativa constitucional para tornar-se ato concreto

na vida quotidiana dos sujeitos passivos em geral; ou seja, quando a promessa de proteção for efetivamente cumprida. A exigência de

concreção daquele princípio impõe, aos formuladores e aplicadores das leis tributárias e das normas regulamentares, o dever de permitir que a sua potencialidade normativa seja exercida da melhor maneira

possível e de modo a garantir-lhe a máxima efetividade.

178 FARIAS. Edilsom Pereira de. Colisão de direitos. 1. ed. Porto Alegre: Fabris. 1996. p. 75; VIEIRA DE ANDRADE. José Carlos. Os direitos fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976.1. ed. Lisboa: Almedina. 1987. p. 228-229; e MIRANDA. Jorge. Manual de direito constitucional. Tomo 4. 2. ed. Coimbra: Coimbra Editora. 1993. p. 306-320. passim; ALEXY. Robert. Teoria de los derechos fimdamentales. Trad. Ernesto Garzón Valdés. 1. ed. Madri: Centro de Estudios Constitucionales. 1997. p. 272-274.

179 A importância sistemática do princípio da capacidade económica supera antigas con· cepções doutrinárias acerca da sua condição de "norma programática". Vide. a res­peito: FALCÃO. Amílcar de Araújo. Fato gerador da obrigação tributária. 4. ed. São

Paulo: Revista dos Tribunais. 1977. p. 68.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

A concretização do princípio da capacidade contributiva é feita pela lei, segundo critérios técnicos ou de valoração adotados pelos legisladores. De fato, na lição de Tulio Raúl Rosembuj, "a noção de tributo resulta da convergência do princípio da legalidade e da capa­cidade contributiva, convergência que marca, frente a cada tributo, sua legitimidade constitucional".180 De fato, a lei é, por excelência, o veículo de concretização do princípio da capacidade contributiva, de tal modo que a sua consideração não pode ser olvidada quando da construção da hipótese normativa de toda norma tributária. ~an­do a lei falhar caberá ao Poder Judiciário suprir a deficiência ou falha e aplicar a Constituição em adição (interpretação conforme a Cons­tituição) ou em substituição da lei.

No caso analisado no presente estudo, se algum juiz ou Tribu­nal vier a considerar que é válida a correção monetária do capital social com base em deliberação dos sócios ou acionistas, não estará

agindo como "legislador positivo", o que lhe é vedado em certas cir­

cunstâncias; de fato, em tais circunstâncias, aqueles juizes e tribunais

simplesmente reconhecerão que é válido o pacto sobre correção mo­netária nas relações entre particulares (a sociedade não se confunde com os seus sócios ou acionistas) e sobre a dedutibilidade de despe­sas de variações monetárias.

Essas considerações são inteiramente pertinentes à questão que

constitui o ponto central deste estudo. O exemplo numérico acima

apresentado mostra, de forma clara e insofismável, que a falta de

correção monetária do valor do capital social implica incidência de

tributo sobre algo que não constitui riqueza nova, com frontal ofen­

sa ao princípio da capacidade contributiva que invalida a incidência

de tributo sobre fato sem conteúdo econômico apreciável.

Por último, cabe lembrar que, além da frontal ofensa ao princí­

pio da capacidade contributiva, a falta de correção monetária do va­

lor do capital social, e que produz a incidência de tributos sobre mera

180 ROSEMBUJ. Tulio. El hecllO de contribuir. I. ed. Buenos Aires: Cooperadora de derecho y ciencias sociales. 1975. p. 108.

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COOROENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

atualização monetária - fora dos casos em que essa atualização se refere a uma receita, ganho ou acréscimo patrimonial efetivo ou real - constitui violação, também, ao princípio que veda a tributação confiscatória181 e permite a tributação sobre patrimônio sem lei an­terior, com ofensa aos artigos 150, IV e 154, I, da Constituição Fe­deral de 1988.

IV. VALIDADE DA CORREÇÃO MONETARIA DO CAPITAL SOCIAL

Como foi exposto, encontram-se revogadas as normas sobre correção monetária que tinham importância na determinação do montante dos tributos incidentes sobre os resultados das empresas. Ocorre, todavia, que a inflação não foi banida com aquela revogação e continua a trazer os mesmos transtornos que foram vislumbrados pelo Legislador de 1976, que, ao editar a Lei nO 6.404/76, determi­nou que fossem reconhecidos os efeitos da inflação sobre o patrimônio

das sociedades por ações. Naquela oportunidade, a introdução da medida foi justificada

com base em argumentos técnicos que não mudaram com o tempo.

Portanto, é de se indagar sobre a atualidade dos argumentos conti­

dos na Exposição de Motivos da Lei nO 6.404, que a certa altura, a

respeito da correção monetária do valor do capital, dizia:

o parágrafo único do r, rt. 5° prescreve a correção anual da expressão monetária do valor do capital social, regulado nos arts. 168 e 186. No curso do processo inflacionário, a fIxa­ção do capital em moeda nominal, sem correção, conduz à

redução gradativa do seu valor (em termos de moeda do

ISI MARTINS. MARTINS. Ives Gandra da Silva. Ajustes por perdas inflacionárias e cam· biais e o seu tratamento perante o imposto sobre a renda. V Colóquio internaciolla,

de direito tributário.!. ed. São Paulo: lOBo 2003. p. 168.

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IMPOSlO DE RENDA PESSOA JURlolCA

mesmo poder aquisitivo) e à distribuição do capital aos acio­nistas, sob a forma de dividendo, não obstante o Código Penal conceituar essa distribuição como crime. \

I

Essa assertiva tem firme fundamento jurídico; de fato, o consa­grado José Luiz Bulhões Pedreira182 disse:

A inflação, ao modificar o poder de compra da moeda nacio­

nal, tem efeitos sobre os elementos patrimoniais que distorcem as demonstrações financeiras levantadas com base em escritu­

ração que adota custo histórico como critério de avaliação e usa a moeda nacional como unidade de medida de valor.

A finalidade do procedimento de correção monetária, previsto nas leis comercial e tributária, é eliminar essas distorções do balanço e da demonstração do resultado do exercício.

O saldo devedor dessa conta elimina das contas de resultado lucros contábeis, que são fictícios porque têm a função de manter -em moeda de poder de compra constante - o capital de giro próprio da pessoa jurídica.

Também o douto mestre Rubens Gomes de Sousa183 já vis­lumbrava que a falta de um adequado sistema de correção das de­monstrações financeiras acabava por criar lucros fictícios, dizendo:

Mas, no caso que interessa ao presente trabalho, o objetivo vi­sado é evidentemente o de evitar a descapitalização das empresas pela tributação de lucros meramente escriturais (às vezes popular­mente chamados "lucros de papel"), decorrentes apenas de uma apre­ciação, em termos de moeda desatualizada, dos valores patrimoniais ou financeiros que concorrem para a formação do lucro "real"

182 PEDREIRA. José Luiz Bulhões.Imposto de Renda Pessoas ]llrídicas. v. II. Justec. Rio de Janeiro: 1979. p. 694.

183 SOUSA. Rubens Gomes de. Pareceres J. Imposto de Renda. Edição Póstuma. IBDTI USP. São Paulo: 1976. p. 107.

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

Pois bem, cabe indagar se a falta de norma regulando a forma da correção monetária dos elementos do patrimônio muda o pressupos­to, contido no trecho da "Exposição de Motivos" acima transcrito, de que: (a) a falta de atualização do valor do capital diminui o seu valor intrínseco e afeta a garantia dos credores, e (b) que a falta de conside­ração dos efeitos da inflação mascara os resultados apurados pelas empresas e que pode, perfeitamente, permitir a distribuição de lucros fictícios que, a despeito de ser prática proibida, implica prejuízo, uma vez mais, do valor do capital, que é distribuído de forma oblíqua.

Essas considerações permitem uma reflexão sobre a possibili­dade de, à mingua da falta de autorização legal, poderem os sócios deliberarem sobre a correção monetária do valor do capital. Em fa­vor dessa possibilidade podem ser aduzidas as seguintes razões: (a) a falta de permissão não implica proibição, (b) a indexação dos con­tratos com terceiros é perfeitamente legal e largamente utilizada, de modo que não há razão plausível para discriminar os sócios, se eles

podem receber juros sobre o capital podem, pelas mesmas razões de ordens econômica e jurídicas, pactuar correção monetária. Em prin­

cípio, a validade dessas proposições só poderia ser posta em questão se admitirmos que a inflação não é um fato social que existe de for­ma concreta e que persiste a despeito de ser solenemente ignorada pelo direito em certas circunstâncias.

A simples existência da inflação e dos efeitos apontados no exemplo numérico antes apres·:ntados já seriam suficientes para, à

luz do princípio da capacidade contributiva, justificar a validade da

correção monetária do capital a despeito da existência de lei impera­tiva. Com efeito, como já foi di '0, a possibilidade jurídica da cogita­

da correção tem esteio nas regras sobre correção monetária aplicá­

veis nas convenções entre particulares e nas regras sobre

dedutibilidade de variações monetárias passivas. Não se pode olvidar, todavia, que as proposições expostas po­

deriam ser, em princípio, refutadas em face do princípio da legalida­de tributária. Não faltará quem diga que a falta de lei a autorizar a correção monetária do valor do capital social implicaria a conclusão

de que toda despesa desta natureza não deveria produzir nenhum

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

efeito tributário e, portanto, a dedutibilidade da despesa seria cerce­ada em face da impossibilidade jurídica do ato jurídico que lhe deu causa. 184 A suspeita de invalidade seria reforçada pela vigência do enunciado do parágrafo único do art. 4° da Lei nO 9.249/95, segundo o qual "fica vedada a utilização de qualquer sistema de correção monetária de demonstrações financeiras, inclusive para fins

societários" Tais refutações, no entanto, não têm densidade normativa para

afastar a legalidade da correção monetária e por pelo menos três razões. Em primeiro lugar, é um rematado equívoco considerar que

correção monetária tem como única fonte a lei; ela tem origem na lei, no contrato e na jurisprudência dos tribunais. Basta, para corro­borar esta assertiva, o que foi dito em antiga decisão do Supremo Tribunal Federal quando do julgamento do Recurso Extraordinário nO 69.268, no qual ficou assentado que o regime da correção mone­

tária é aplicável em virtude de leis específicas, "por construção de jurisprudência e, pela sua própria natureza, nas dívidas de valor".185

Assim, consoante adverte Arnoldo Wald, "a jurisprudência passou a

aplicar a correção monetária mesmo independentemente de lei, a fim de fazer prevalecer a justiça em hipóteses nas quais a manuten­ção rígida do princípio nominalista implicaria iniquidade".186

Em segundo lugar, a correção monetária pode ser objeto de

contrato entre particulares e, por tal, razão os sócios podem

convencionar que a sociedade suporte os efeitos da correção mone­

tária do valor do capital, a exemplo - e de acordo com os mesmos

índices - do que ocorre com o capital de terceiros. O motivo do

contrato, no caso, é a necessidade de proteção contra tributação in-

184 Isto me traz à lembrança o texto de um antigo Parecer Normativo editado pela Coordenadoria do Sistema de Tributação da Secretaria da Receita Federal. Trata-se do Parecer Normativo nO 9/96, em cuja ementa está dito: "não são operacionais as despesas decorrentes de operações de realização impossível, em razão de disposições legais"

185 WALD, Arnoldo. Parecer publicado na Revista Forense nO 258. Rio de Janeiro: Foren­se, 1977, p. 196.

186 Idem, p. 195.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

justa porque recai sobre fato sem conteúdo econômico apreciável. Em outras palavras, a avença visaria a corrigir um problema estrutu­ral da ordem jurídica tributária para evitar que ela propicie enrique­cimento sem causa justa para o tesouro público que não pode, por via direta ou transversa, exigir tributo que não atenda ao princípio da capacidade contributiva.

Em terceiro lugar; sobre o sentido e o alcance da norma do parágrafo único do art. 4° da Lei nO 9.249/95, basta dizer que a cor­reção monetária do capital não constitui, em si, um sistema de corre­ção monetária do Balanço, ao menos no modelo das normas revogadas porque nele corrigiam-se as contas do patrimônio líquido e do Ati­vo Permanente (inclusive depreciações) e algumas contas do Ativo Circulante e Realizável a Longo Prazo.

Em adição, cabe referir que aquela norma proibitiva não é váli­da porque: (a) contraria o princípio da capacidade contributiva; (b) opera verdadeiro confisco na medida em que, sem lei complementar, faz incidir imposto de renda e contribuição social sobre o patrimônio e não sobre a renda (acréscimo patrimonial) e sobre o lucro; (c) in­troduz uma proibição não eqüitativa na medida em que a inflação é considerada para outros fins; e (d) arrima o enriquecimento sem causa do tesouro público pelas três razões antecedentes.

v. CONCLUSÕES

À vista destas considera! ões, considero plausível e legítima a deliberação social que determi nar a correção monetária do valor do capital social segundo os índices oficiais e idôneos de inflação. A despesa correspondente será considerada dedutível na determinação do lucro real e o valor correspondente pode ser registrado em Reser­va, no Patrimônio Líquido, ou ser creditado ao sócio ou acionista. O eventual valor creditado ao sócio ou ao acionista não será tributável

porque a correção monetária, no caso, não é a mera reposição de um ganho patrimonial, mas, sim, a simples atualização do valor de um

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIOICA

bem que está afetado a um patrimônio empresarial. ~ando o sócio ou acionista for residente ou domiciliado no exterior a atualização monetária pode ser feita em face da variação do valor da moeda de registro do investimento no Banco Central do Brasil, de modo que o valor do capital social registrado na contabilidade reflita, em moeda nacional, o montante em moeda estrangeira constante do Certifica­do de Registro previsto na Lei nO 4.131/62.

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Anotações So a Distribu Disfarçada de Lucros

ELIDIE PALMA BIFANO

Consultora em São Paulo Especialista em Direito Tributário pela USP e pela PUClSP

Mestre em Direito Tributário pela PUClSP Doutoranda em Direito Tributário pela PUClSP

Professora da FGV-Law

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

ANOTAÇÕES SOBRE A DISTRIBUIÇÃO DISFARÇADA DE LUCROS

I. INTRODUÇÃO

1.1. DELIMITAÇÃO DO TEMA E NOÇÕES GERAIS SOBRE O INSTITUTO

o objetivo deste estudo é analisar alguns aspectos da figura, denominada pela lei, distribuição disfarçada de lucros (DDL) e os seus correspondentes reflexos em matéria de imposto sobre a renda. De início, cabe delimitar a abrangência que se pretende dar a este trabalho, considerando a origem e natureza do instituto, bem como os fundamentos sobre os quais se assenta a sua eleição como instru­mento de tributação. Dessa forma, serão examinados alguns elemen­tos relevantes para efeito de incidência do imposto sobre a renda como o conceito de lucro e de pessoa ligada, as hipóteses de DDL descritas pela lei e, por fim, o importante trabalho da jurisprudência na definição dos contornos da matéria.

1.2. BREVES NOÇÕES HISTÓRICAS

Na análise do instituto é importante referir a legislação básica que cuidou da matéria, bem como sua correspondente evolução. Ini­cialmente a Lei nO 4.506/64, em seu art. 72, introduziu a figura da DDL a partir de uma lista exaustiva de operações que relacionava, vinculando como partes necessárias na transação a sociedade e os sócios, seus parentes ou dependentes. O objetivo, presumido pela lei para a transação, era distribuir lucros sem que, entretanto, em ne­nhum momento e por nenhuma ação efetiva, essa finalidade fosse demonstrada e ele tributado. Na época, os lucros distribuídos eram

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

objeto de tributação na fonte, de tal sorte que a DDL permitia à

sociedade, além de beneficiar uma certa pessoa, furtar-se também à

obrigação legal de reter e recolher o tributo. Em algumas situações, a DDL não permitia, também, reconhecer encargos e despesas (reali­zados sob a forma de distribuição aos beneficiários da DDL) que não eram necessários ao atendimento da finalidade social.

As hipóteses de DDL, descritas pela Lei na 4.506/64, todas praticadas com as pessoas retro referidas, eram: alienação ou aquisi­ção de bens e direitos, por valor notoriamente diverso do mercado; pagamento de rendimento ou despesa não efetivos; concessão de empréstimos, se a sociedade dispusesse de lucros; devolução de capi­tal após a capitalização de lucros; capitalização de dividendos de ações preferenciais devidos há menos de dois anos; resgate de partes beneficiárias antes de cinco anos de sua emissão/colocação gratuita e pagamento de comissões sem causa.

O Decreto-Lei na 1.598/77 (art. 60), depois alterado pelo De­creto-Lei na 2.065/83, regulou a matéria por inteiro continuando a considerar como partes na relação, sujeita à caracterização como DDL, a sociedade e as pessoas anteriormente relacionadas em lei (sócios, administradores e seus cônjuges ou parentes em até terceiro

grau) que passam a ser denominadas "pessoas ligadas" Algumas mudanças importantes, entretanto, ocorreram, a saber: (i) inclusão, dentre as pessoas ligadas, da figura do sócio ou acionista controlador que, através de terceiros, percebe lucros disfarçadamente; (ii) redu­ção das hipóteses de DDL, que também deixaram de ser cerradas para aceitar uma figura aberta e de grande amplitude, chamada "con­dições genéricas de favorecirr .ento"; (iii) ênfase do conceito de valor de mercado que passa a ser definido em lei; (iv) prova de realização do negócio no interesse da pessoa jurídica e em condições estrita­mente comutativas ou em que se teria realizado com terceiros, como

condição para afastar a caracterização de DDL; (v) ônus tributário

imputado ao beneficiário, que inclui sociedade, pessoa jurídica. Da mesma forma que na legislação anterior, os reflexos da DDL são colhidos não apenas para efeitos de imposto sobre a renda na distri-

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIOICA

buição (que virá, na década de 90, a desaparecer) mas também para efeitos de cálculo de lucro real e, portanto, do imposto pago pelas sociedades.

Com a Lei nO 9.249/95 afastou-se, em definitivo, a imputação de DDL a duas situações antes tidas como forma de alienação ou aquisição e largamente discutidas nos tribunais: (i) devolução de ca­pital a sócio em bens ou direitos avaliados a valor contábil ou de mercado e (ii) integralização de capital em bens e direitos pelo valor constante da declaração de bens do sócio.

II. CONTEÚDO LEGAL DO INSTITUTO

11.1. CONCEITO DE DDL

A lei não definia no passado, e tampouco hoje define, o que seja DDL apenas fazendo a ela referência ao presumir que certos comportamentos são tidos como tal. Bulhões Pedreira187 comenta, ainda na vigência da norma anterior, o instituto afirmando que "a

distribuição de lucros pela pessoa jurídica pode processar-se de modo dis­

farçado, através de pagamentos ou transferências de capital ou de paga­

mentos de outros rendimentos. Essas transações, embora não revistam a

forma de distribuição de lucros, constituem instrumento de transferência

de bens do patrimônio da pessoa jurídica para terceiros, em condições que

economicamente correspondem à distribuição de lucros" De fato, desdo­brando-se a expressão DDL em seus vários elementos componen­tes, observa-se que ela se refere a um certo comportamento que im­plica disponibilizar, entregar, pagar lucros de sociedade, sem obser­vância das condições e exigências aplicáveis, já que isso é feito de forma oculta, não percebida, em detrimento do Fisco. Observe-se que a lei considera, para qualificar o comportamento como DDL,

187 Imposto sobre a Renda. 7.40.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

apenas os reflexos tributários dele advindos, sendo irrelevante que a ação praticada também seja capitulada como prática desconforme em relação à lei societária ou ao contrato ou estatuto social.

As normas atualmente aplicáveis sobre a matéria, incluídas no vigente Regulamento do Imposto sobre a Renda /RIR, arts. 464 e seguintes, relacionam as seguintes hipóteses de DDL: (i) alienação, por valor notoriamente inferior ao de mercado, de bem do ativo de sociedade a pessoa ligada; (ii) aquisição pela sociedade, por valor notoriamente superior ao de mercado, de bem de pessoa ligada; (iii) perda pela sociedade, em decorrência do não exercício de direito à aquisição, de bem e em benefício de pessoa ligada, sinal, depósito em garantia ou importância paga para obter opção de aquisição; (iv) transferência pela sociedade, a pessoa ligada, sem pagamento ou por

valor inferior ao de mercado, de direito de preferência à subscrição de valores mobiliários de emissão da companhia; (v) pagamento, pela sociedade, a pessoa ligada de aluguéis, royalties ou assistência técnica em montante que excede notoriamente ao valor de mercado; (vi)

realização pela sociedade, com pessoa ligada, de qualquer outro ne­

gócio em condições de favorecimento, assim entendidas condições

mais vantajosas para a pessoa ligada do que as que prevalecem no mercado ou em que a pessoa jurídica contrataria com terceiros.

A prova de ter sido o negócio realizado no interesse da socieda­

de e em condições estritamente comutativas ou em que contrataria

com terceiros, afasta a presunç~io de DDL, de acordo com a lei. Duas,

portanto, são as condições que permitem descaracterizar a DDL: (i)

interesse da sociedade no negticio, ou seja, exclusivo atendimento às

necessidades operacionais e ( i) condições comutativas do negócio

com negócios efetivados junto a terceiros. Comutatividade é quali­

dade de prestações que se equivalem 188 , logo, o negócio contratado em condições de comutatividade com terceiros implica ser equiva­

lente àquele firmado com terceiros. É interessante observar que o

conceito de equivalência pode ser amplo, e é cabível que assim o seja,

188 De Plácido e Silva, Vocablllário Jurídico.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

pois pode haver equivalência em muitos sentidos: de preços, de qua­lidade, de efeitos, de prazo e outros. Ao contribuinte caberá demons­trar a equivalência a que cada negócio está referido para que se possa concluir sobre haver ou não comutatividade.

11.2. O LUCRO OISTRIBUloo E SEUS BENEFICIÁRIOS

Lucro é fruto da aplicação do capital e do trabalho, obtido em atividade economicamente organizada, correspondendo à receita auferida por uma sociedade, deduzida dos correspondentes custos. O lucro é direito dos sócios e deve ser entre eles dividido na forma da lei, do contrato ou do estatuto. A DDL pressupõe a atribuição de lucros de forma diversa daquela preconizada pela lei ou pelo contra­to/estatuto, ou seja, apuração em balanço elaborado de acordo com as práticas contábeis recomendadas, aprovação dos sócios e subse­qüente partição.

O lucro distribuído somente se configura como DDL se disponibilizado a pessoa ligada. A lei considera como pessoas liga­das: (i) sócio ou acionista da pessoa jurídica; (ii) administrador ou titular da pessoa jurídica; (iii) cônjuge e parentes, até o terceiro grau inclusive afim de sócio, pessoa física ou de administrador; (iv) sócio controlador, ainda que os negócios sejam realizados com a intermediação de outrem189 O sócio ou acionista pode ser pessoa física ou jurídica; na vigência da lei anterior entendia-se, em algu­mas das hipóteses de DDL, que o beneficiário somente poderia ser pessoa física. 190 A lei incluiu como DDL a prática das mesmas opera-

189 Sócio controlador é aquele titular, direto ou indireto, de direitos de sócio que lhe permitam preponderância nas decisões da sociedade.

190 Sobre o tema comenta Bulhões Pedreira, "ü conceituação de distribuições disfarçadas entre pessoas jurídicas poderia constituir fonte inesgotável de conflitos entre a ad­ministração do imposto e os contribuintes e de insegurança para estes, pois razões comerciais legítimas podem justificar que uma empresa aliene bens a outra por va­lor inferior ao de mercado. Não havendo, no caso, a forma de evasão do imposto que se verifica quando o adquirente do bem é pessoa física... in Imposto de Renda, 7.40.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

ções com sócio ou acionista controlador!9! mediante participação de terceiros ou de sociedade da qual o beneficiário participe ou tenha interesse. O negócio assim realizado permite a transferência indireta de lucros, razão pela qual é objeto de especial regulação.

11.3. DDL: NATUREZA

Durante muitos anos discutiu-se a natureza da DDL diver­gindo os estudiosos sobre a mesma. Luis Eduardo Schoueri iden­tifica diversas correntes sobre o tema: presunção, ficção, ato ilícito, abuso de forma e ato anormaP92 Descartando os primeiros enquadramentos aponta-a como ato anormal, logo, praticado fora das perspectivas do objeto social e, portanto, não dedutível. Parece assistir razão ao autor, pois embora a lei utilize a expressão "Presu­

me-se distribuição disfarçada ... " (art. 464, RIR) e em seguida admita

excluir essa "presunção" à prova de interesse e à comutatividade

com terceiros (§§ 10 ,20 e 3° do art. 464), a natureza da DDL não

permite que ela seja enquadrada definitivamente como presunção

(opinião ou juízo antecipado, de caráter provisório ou definitivol93 )

pois, de acordo com a lei a autoridade fiscal, em verificando a exis­tência de DDL, está compelida a qualificar o fato, de forma defini­tiva, cabendo ao contribuinte afastar essas conclusões se aplicáveis

as exceções acima; ficção (verdade jurídica que difere da realidade fenomênica 194) tampouco é aplicável à hipótese, assim como ato ilícito ou abuso de forma, que ficam excluídos, pois o ato ilícito

prevê punição, e o abuso de forma não é, muitas vezes, aceito no

sistema brasileiro exceto se associado à simulação ou fraude. Res­salte-se que a prova de interesse da pessoa jurídica no negócio, re-

191 As disposições em referência nasceram juntamente com a Lei n° 6.404/76, Lei de Sociedades Por Ações que introduziu no Brasil conceitos de controle de empresas.

192 Distribuição disfarçada de lucros, págs 164-167. 193 Eduardo Marcial Ferreira Jardim, Dicionário Jurídico Tributário.

194 Eduardo Marcial Ferreira Jardim, Dicionário Jurídico Tributário.

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IMPOSTO DE RENDA PESSDA JURIDICA

ferida no § 30 do art. 464 do RIR, comprova que a prática de DDL é um desvio da finalidade societária.

Até a edição do Decreto- Lei na 2.065/83 as hipóteses legais de DDL eram exaustivas além de descreverem situações específicas que não atendiam às condições de normalidade, usualidade, operacionalidade e necessidade que devem pautar os atos societários, para fins tributários, caracterizando-se, pois, na classificação de Schoueri como atos anormais. Com a entrada em vigor do Decreto­Lei em apreço surge uma nova hipótese de DDL que tem caracterís­ticas diversas das anteriores. De fato, a hipótese correspondente à "re­alização de qualquer outro negócio em condições de favorecimento, assim entendidas condições mais vantajosas para a pessoa ligada do que prevale­çam no mercado ou em que a pessoa jurídica contrataria com terceiros" além de facultar ao fisco apontar atos societários caracterizados pela anor­malidade, atos firmados em condições de favorecimento, admite também que seja apontado qualquer tipo de negócio possível de ser objeto de favorecimento. A redação utilizada pelo legislador, como se observa, é diversa daquela adotada para as outras hipóteses de DDL que fazem referências objetivas a situações definidas como alienação e aquisição de bens, perda e transferência de direitos, pagamentos.

O dispositivo insere-se nas chamadas cláusulas gerais195 em oposição à tradição doutrinária no Brasil que sempre entendeu que o fato gerador em matéria tributária deveria estar plenamente des­crito na lei, de tal sorte que ao contribuinte não se poderia exigir tributo cuja hipótese, além de estar contida em lei anterior também não estivesse descrita em todos os seus elementos, sob o fundamen­

to de que a Constituição Federal o protegia com base no princípio da segurança jurídica. Dessa forma, enunciou-se o princípio da

tipicidade, terminologia por alguns questionada196 , não se admitin-

195 No mesmo sentido Alberto Xavier, Extinção de sociedade e distribuição disfarçada de lucros, in Estudos sobre o imposto de renda, págs. 101-107.

196 Luis Eduardo Schoueri, Fato Gerador e Obrigação Tributária, in Direito Tributário,

Homenagem a Alcides Jorge Costa, vol. I, pág, 168, coordenação de Luis Eduardo Schoueri.

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COOROENAÇÃO: PEDRO AAAN JR.

do exigência de tributo a partir de hipóteses genéricas ou mal for­muladas, que permitam ao fisco a liberdade de, interpretando-as, atingir o contribuinte.

É certo que as possibilidades de um tributo incidir sobre fatos e situações é muito ampla, de tal maneira que lei alguma os esgotaria, limitando-se à possibilidade de tributar caso o princípio da tipicidade fosse aplicado de forma tão estreita, não admitindo nenhuma flexi­bilidade em sua aplicação. A análise da questão envolvendo tipicidade e segurança jurídica ensejou, mais recentemente, entendimento no sentido de se admitir alguma flexibilidade no relacionamento fisco­contribuinte, ou seja, no sentido de admitir que as regras legais po­dem conter uma certa indeterminaçãol97 , sem com isso afetar a se­gurança jurídica. Esta conclusão admite a utilização de cláusulas gerais l98 e de conceitos indeterminados pelo legislador com a fmali­

dade de tributar.

11.4. DDl, VALOR DE MERCADO E PREÇO DE TRANSFER~NCIA

o instituto da DDL, à exceção da hipótese de perda do exercí­

cio de direito, está todo ele referido ao valor de mercado. Assim, uma

certa operação poderá enquadrar-se como distribuição de lucro em desconformidade com as regras que lhe são próprias se o valor prati­

cado não acompanhar o valor de mercado. O conceito de valor de

mercado é dado pela lei e pode ser: (i) importância em dinheiro que

o vendedor pode obter med Lante negociação do bem no mercado;

(ii) preço das vendas efetuac as em condições normais de mercado,

197 Luis Eduardo Schoueri. Fato Gerador e Obrigação Tributária. in Direito Tributário. Homenagem a Alcides Jorge Costa. vol. I. coordenação de Luis Eduardo Schoueri.

198 Segundo Fernando Zilvetti. nas cláusulas gerais o legislador deixa um espaço para o contribuinte e o fisco determinarem. de comum acordo. o que deve efetivamente ser objeto de tributação. para determinar o imposto devido; não havendo consenso ca­beria a intervenção do poder jurisdicional. in Princípios de Direito Tributário e "

Capacidade Contributiva, pág. 262 ..

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

que tenham por objeto bens em quantidades e qualidades semelhantes (valor de bem negociado freqüentemente no mercado ou em bolsa); (iii) negociações anteriores, recentes ou contemporâneas de bens se­melhantes entre pessoas não compelidas a negociar e que tenham conhecimento das circunstâncias que influam de modo relevante na determinação do preço (valor de bens para os quais não haja merca­do ativo); (iv) valor de laudo, cabendo neste caso ao fisco provar que o laudo prestou-se à DDL.

Observe-se que a expressão negociações "entre pessoas não

compelidas a comprar ou vender e que tenham conhecimento das circuns­

tâncias que influem de modo relevante na determinação do preço" significa: (i) operações corriqueiras e não operações atípicas ou em excepcionais condições (pessoas compelidas a vender por qualquer especial circuns­tância); (ii) operações entre partes que habitualmente transacionam nesse mercado (conhecimento de circunstâncias). Se o parâmetro to­mado pelo Fisco não atender a esses critérios, a comparação não será adequada.

Até a edição da Lei nO 9.532/95, todas as operações envolven­do partes relacionadas eram reguladas pelas normas de DDL, inclu­sive importação e exportação. A partir do diploma legal em referên­cia, as operações efetivadas no mercado internacional (importação e exportação) de bens e serviços deixaram de ser enquadradas nas hi­póteses de DDL para serem reguladas pela lei em referência. O es­pectro de entidades envolvidas é muito maior do que na DDL, que abrange apenas as pessoas ligadas, voltando-se para empresas vincu­ladas, quer por ligações societárias, quer por negócios. As regras de preço de transferência, contudo, não tomaram o mercado como úni­co parâmetro, elegendo diversos critérios para demonstrar a adequa­

ção dos preços praticados, dentre os quais o contribuinte pode ado­

tar o que mais lhe convenha. Interessante observar que o pagamento ainda que internacional de royalties e de serviços de assistência téc­nica, administrativa, científica ou similar não se submetem às regras de preço de transferência, mas sujeitam-se à caracterização de DDL.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

III. DECORR~NCIAS DA PRATICA DE DDL

A prática de DDL obriga o beneficiário a incluir as receitas não reconhecidas e adicionar os custos não computados, no cálculo do lucro real tributando, dessa forma, a vantagem que indevidamente lhe foi transferida. De acordo com o art. 467, RIR, se confirmada a distribuição disfarçada de lucros, a pessoa beneficiária deverá adicio­nar a diferença entre o valor de mercado e o de alienação (valor de compra pelo beneficiário) do bem ou direito à sociedade, como re­ceita e considerar como custo indedutível, na apuração do lucro real, a diferença entre o custo de aquisição e o valor de mercado do bem ou direito, no momento da alienação ou baixa, inclusive por depreci­ação, amortização ou exaustão do item adquirido em desconformidade com a lei, bem como a importância perdida pelo não exercício, de direito de sinal ou depósito. Na hipótese de paga­mento de royalties e de prestação de serviços, o montante dos rendi­mentos que exceder ao valor de mercado é custo indedutível na apu­ração do lucro real, assim como as importâncias pagas ou creditadas

em condições de favorecimento. O imposto referente à DDL somente pode ser lançado após o

encerramento do período de apuração (art. 469, RIR) o que guarda coerência com a obrigação do beneficiário de afetar o lucro real caso

incorra na prática de DDL.

IV. JURISPRUDÊNCIA: FONTE PARA ESTUDO DA DDL

A autoridade fiscal ao examinar um negócio entre partes rela­

cionadas (sociedade e pessoa ligada) deve considerar, antes de exa­minar o interesse da sociedade e as condições de comutatividade,

outros elementos que norteiam os negócios jurídicos e que são pre­conizados pela lei civil (Código Civil, art. 113) como a boa-fé e os usos e costumes do local da celebração. Além disso, em matéria de

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

negócios, a prova da razoabilidade dos critérios adotados pelos adminis­tradores, considerando sua função e responsabilidade correspondente, é extremamente relevante especialmente se considerados segmentos e momentos da economia. A razoabilidade desdobra-se em diversos ou­tros conceitos, inclusive a praticabilidade, sendo praticável, em matéria de negócios, o que o bom senso do administrador demonstra que possa ser implementado, observados os limites objetivos da lei.

A aceitação paulatina da boa-fé, dos usos e costumes e dos cri­térios de razoabilidade, em matéria de DDL, pode ser evidenciada pela jurisprudência que sobre ela se vem construindo, o que demonstra que uma das mais ricas e interessantes formas de estudar o instituto é analisar a jurisprudência que sobre ele se formou. Os tribunais exa­minaram a matéria em seus vários aspectos dando-lhe contornos, com riqueza de detalhes, de tal sorte que é possível afirmar-se ter sido ele analisado quase que por completo199 • Mais recentemente, as reiteradas decisões jurisprudenciais ensejaram a edição da Lei nO 9.249/95, já comentada.

A partir das decisões emanadas dos tribunais conceitos impor­tantes foram fixados, e limites de diversas hipóteses, construídos, a saber: alienação de participação societária por valor de patrimônio líquido contábil é considerada a valor de mercado, na falta de cota­ção em Bolsa (Ac. 10 CC 103-6.850/85)200; impossibilidade de cumulação de hipóteses de DDL (Ac. 10 CC 103-06.869/89); con­ceito de bens, objeto de alienação, aplica-se a todos os elementos do patrimônio (Ac. 10 CC 101- 75.195/84); valor "notoriamente supe­rior ao de mercado" é valor "conhecidamente diferente do mercado" e não diferença substancial em termos de valor, relativamente ao mercado (Ac. 10 CC 108- 1.054/94); ônus da prova é da Fiscaliza­ção (Ac.1° CC 101- 89.194/95); integralização de capital mediante

199 Luis Eduardo Schoueri reporta que antes de seu nascimento legislativo, a DDL foi construida pelos tribunais. Vide Distribuição disfarçada de lucros, págs 46 ..

200 As decisões referidas são meramente exemplificativas e não exaustivas.

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

conferência de bem imóvel não configura ato de comércio, não se lhe aplicando as normas de DDL (REO 114.195 - RS, TFR, 4aT); método comparativo para determinar valor de mercado não pode basear-se em uma única operação, muito menos atípica (Ac. 10 CC 101- 72.096/81); pagamentos a beneficiários não identificados não podem ser considerados como DDL (Ac. 10 CC 101- 85 - 85.528/ 93); alegada ausência de boa fé em operação, para caracterizar DDL, não prescinde da adoção dos princípios relacionados à avaliação do contraditório (Ac.01 -0176, CRF), dentre outros.

Como se observa, grande parte das perplexidades e dúvidas que o instituto pode sugerir se resolvem mediante pesquisa jurisprudencial, elemento fundamental na construção do direito.

v. BIBLIOGRAFIA

JARDIM, Eduardo Marcial Ferreira Jardim. DicionárioJurídi­

co Tributário, 5a ed. Dialética, São Paulo PEDREIRA, José Luis Bulhões. Imposto de Renda, JUSTEC,

Rio de Janeiro, 1971. SCHOUERI, Luis Eduardo. Fato gerador da obrigação tributá-

ria, in Direito Tributário, Homenagem a Aleides Jorge Costa, voI. L Co­ordenação de Luis Eduardo Sclloueri. ~artier Latin, São Paulo, 2003

Distribuirão disfiarçada de lucros. _____________________ r

Dialética, São Paulo, 1996 SILVA, De Plácido e. Vocabulário Jurídico. Atualizadores

N agib Slaibi Filho e Geraldo Magela Alves, 173 ed., Forense, Rio de

Janeiro, 2000. XAVIER, Alberto. Extinção de sociedade e distribuição

disfarçada de lucros, in Estudos sobre o Imposto de renda. Belém:

CEJUP, 1988. ZILVETTI, Fernando A. Princípios de Direito Tributário e a

Capacidade Contributiva. São Paulo, ~artier Latin, 2004

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Tributação no Mercado Finailcé

HÉLIO HANADA

Consultor em São Paulo Bacharel em Administração Pública pela FGV

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIOICA

TRIBUTAÇÃO NO MERCADO FINANCEIRO

A tributação no mercado financeiro deve ser analisada sob o prisma da tributação na fonte e do tratamento fiscal a ser dispensado aos rendimentos, perdas e tributos retidos na fonte, na apuração dos impostos corporativos das pessoas jurídicas domiciliadas no Brasil e apurados em operações realizadas no mercado financeiro.

I. TRIBUTAÇÃO NA FONTE

De 1° de janeiro de 2002 até 31 de dezembro de 2004, os ren­dimentos auferidos em todas as aplicações financeiras estavam su­jeitos à tributação na fonte à alíquota de 20%. As recentes mudanças ocorridas na legislação do imposto de renda retido na fonte sobre as aplicações financeiras, promovidas pelas Leis nO 11.033/04 e 11.053/ 04, introduziram regras que premiam investidores que assumem ris­cos, por aplicar seus recursos em títulos de renda fixa de longo prazo ou em ativos de renda variável com a redução da carga tributária sobre seus rendimentos. Por outro lado, aumenta a carga tributária para quem aplica por prazos mais curtos.

II. IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE (lRRF)

11.1. MERCADO DE RENDA FIXA

Segundo o disposto no capu! e no §4° do art. 65 da Lei nO 8.981/95, os rendimentos auferidos em: (i) aplicações financeiras em

renda flXa; (ii) operações realizadas em bolsas de valores, de merca-

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COOROENAÇÃO: PEDRO ANAN lR.

dorias, de futuros e assemelhadas que permitam a obtenção de renda predeterminada; (iii) operações de transferência de dívidas realiza­das com instituição financeira, ou autorizada a funcionar pelo Ban­co Central do Brasil ou pessoa jurídica não financeira; e (iv) pela entrega de recursos a pessoa jurídica, sob qualquer forma e a qual­quer título, independentemente de ser ou não a fonte pagadora ins­tituição autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil serão tributados na fonte como aplicações no mercado de renda fixa. No entendimento do Fisco, essa é a base legal para se tributar os rendi­mentos auferidos em títulos públicos e privados de renda fixa, ope­rações conjugadas que permitam obtenção de rendimentos prefIXa­dos, operações de mútuo, operações com ouro ativo financeiro, equi­paradas às operações de renda fIXa, empréstimos de mútuo entre em­presas ligadas ou não e Swap.

O § 1 ° do art. 65 da Lei nO 8.981/95 determina que a base de cálculo é a diferença positiva entre o valor da alienação, líquido do imposto sobre operações de crédito, câmbio e seguro, e sobre ope­rações relativas a títulos ou valores mobiliários (IOF), de que trata a Lei nO 8.894, de 21 de junho de 1994, e o valor da aplicação financeira.

Segundo os §§ 2° e 3° do art. 65 da Lei nO 8.981/95, o momen­to da retenção ocorrerá: (i) por ocasião da alienação; compreende qualquer forma de transmissão da propriedade, bem como a liquida­ção, resgate, cessão ou repactuação do título ou aplicação; e (ii) por ocasião de sua percepção, qu~ndo se tratar de rendimentos periódi­cos produzidos por título ou aplicação, bem como qualquer remune­ração adicional aos rendimentos prefIXados.

Segundo o disposto no art. 1° da Lei nO 11.033/04, os rendi­mentos auferidos nas aplicaçi:,es nesses ativos financeiros apurados a partir de 1 ° de janeiro de 2005 serão tributados às seguintes alíquotas:

Alíquotas

22,5%

20%

17,5%

15%

Prazos

Até 180 dias De 181 até 360 dias De 361 dias até 720 dias

Acima de 720 dias

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

Segundo o disposto no § Iodo art. 80 da Instrução Normativa SRF nO 487/04, os prazos acima serão contados a partir da data de início de aplicação ou de aquisição do título ou valor mobiliário, inclusive no que tange aos pagamentos intermediários de juros, pre­vistos em alguns tipos de títulos públicos e privados (por exemplo, debêntures). Assim, se o investidor adquirir um título já emitido e, depois de um mês da data de aquisição, receber juros semestrais, a contagem de prazo para fins de apuração da alíquota de IR será a data de aquisição do título. Dessa forma, como esse prazo é inferior a 180 dias, os rendimentos serão tributados à alíquota de 22,5%.

O § Iodo art. 10 desse mesmo artigo determina o tratamento fiscal a ser dispensado às aplicações financeiras em curso em 31 de dezembro de 2004. Nesse caso, os rendimentos produzidos 201 até aquela data serão tributados à alíquota de 20%; e os rendimentos produzidos a partir de 2005 serão tributados às alíquotas acima, de acordo com o seguinte critério:

I - se aplicação tiver sido efetuada até 22 de dezembro de 2004, a data que será considerada para fins de aplicação da tabela acima será a de Iode julho de 2004; e

II - para as aplicações efetuadas após essa data, a data de aplicação. A regra de transição acima descrita visa evitar o aumento do cus­

to tributário sobre as aplicações financeiras em curso até a data de publicação da Lei. Sem essa regra, um investidor que tivesse efetuado uma aplicação financeira após Iode julho de 2004 (tributada à alíquota de 20% quando a operação foi iniciada) poderia ser penalizado com O

aumento da carga tributária sobre os rendimentos produzidos a partir de Iode janeiro de 2005, se o período de aplicação, calculado entre as datas de aplicação e de resgate/liquidação fosse inferior a 180 dias. Nesse caso, a alíquota seria de 22,5% ao invés de 20%.

201 Rendimento calculado aplicando-se a taxa de juros contratada sobre o principal in­vestido, levando-se em conta a data de emissão e a data em que se está calculando os juros. no caso, 31 de dezembro de 2004.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

11.2. FUNDOS DE INVESTIMENTO

Os fundos de investimento são organizados sob a forma de con­domínio e, dessa forma, não são caracterizados como pessoa jurídica.

Em linhas gerais, o fundo funciona da seguinte forma: (i) os ad­ministradores dos fundos recebem recursos financeiros dos condôrninos e emitem quotas em favor dos mesmos, dividindo o valor financeiro recebido pelo valor da quota no dia de sua conversão; (ii) O valor da quota é calculado diariamente a partir da divisão entre o valor do patrimônio líquido (ativos totais deduzidos dos passivos) pelo núme­ro de quotas emitidas. (ii) Os recursos arrecadados são aplicados em ativos financeiros que geram rendimentos ou mesmo perdas; (iii) As­sim, o valor da quota variará conforme o resultado líquido dos rendi­

mentos e dos custos/perdas auferidos pelos ativos que o fundo possui em carteira. Dessa forma, o rendimento a ser atribuído a cada um dos condôminos será apurado através da variação do valor das quotas que possuírem entre a data de cada aplicação efetuada e a data em que

ocorrer o fato que determinará a cobrança dos tributos. Os rendimentos dos títulos da carteira dos fundos que comen­

taremos nesse estudo são isentos de Imposto de Renda Retido na FontelOl , CPMP03 e IOpo4

Comentaremos apenas as regras dos tipos de fundos de inves­

timento mais comuns.

11.2.1. FUNDOS DE LONGO PRAZO

Os fundos de longo prazo devem possuir títulos com prazo mé­

dio superior a 365 dias. O cálculo deverá ser efetuado diariamente e

levará em consideração a média ponderada de prazos e valores finan­ceiros de cada título. A contagem do prazo dos títulos levará em consi-

202 Incisos I e II do art. 68 e §2° do art.73. ambos da Lei n° 8.981/95.

203 I nciso III da Lei nO 9.31 1/96. 204 Inciso II do art. 33 do Decreto n° 4.494/02.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

deração a data em que a quota está sendo apurada e a data de venci­mento do principal e de cada parcela de juros. Essa medida visa man­ter a carteira, permanentemente, com títulos de longo prazo.

As alíquotas de IR variarão de acordo com o prazo de aplicação de cada aporte de recursos efetuado e nas regras descritas no item 1.1 acima. O mesmo se aplica à base de cálculo.

O IR fonte será retido da seguinte forma: para os fundos sem carência ou com carência superior a 90 dias, nos últimos dias úteis dos meses de maio e de novembro de cada ano, o administrador calculará e resgatará as quotas correspondentes ao IR devido, calcu­lado à alíquota de 15%. Essa sistemática de apuração e retenção de IR fonte é apelidada de "come-cotas", pois o Administrador resgata cotas205 no montante equivalente ao IR devido. Apura-se a alíquota aplicável para cada aporte a ser resgatado, levando-se em considera­ção os prazos de aplicação e as regras de aplicação das alíquotas co­mentadas no item 1.1. Se a alíquota aplicável for superior a 15%, o administrador apurará e recolherá a diferença de alíquota sobre a base de cálculo utilizada nos recolhimentos efetuados anteriormen­te, além de recolher o montante devido sobre os demais rendimen­tos que não sofreram retenção na fonte. Para os fundos com carência de até 90 dias, a única diferença será é a data de retenção de 15%, que será a data de vencimento de cada carência ao invés de ser o último dia útil dos meses de maio e de novembro de cada ano.

11.2.2. FUNDOS DE CURTO PRAZO

Os fundos de curto prazo são aqueles que não se enquadram no conceito de fundo de longo prazo. As alíquotas aplicáveis serão de: (i)

22,5% para aplicações até 6 meses; e (ii) de 20% para prazos superiores a 6 meses.

205 Segundo o disposto no art. 5° da Instrução Normativa SRF n° 25/0 I, o Administra­dor poderá escolher entre o critério de custo médio ou do custo especítico de cada certificado ou quota para efetuar o resgate de quotas. Nesse caso, a opção será exercida a todos os cotistas do fundo e somente poderá ser alterada anualmente, no dia I ° de janeiro de cada ano calendário.

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

As datas de retenção, a escolha das quotas para fins de resgate, a forma de apuração e de recolhimento de imposto de renda na fonte é

idêntica aos fundos de longo prazo. A única diferença é que a alíquota a ser utilizada para retenção nos meses de maio e novembro será de 20%.

Desenquadramento do fundo de longo prazo - tributação como fundo de curto prazo

A legislação prevê a possibilidade de desenquadramento do fundo de longo prazo e sua respectiva tributação como sendo de curto prazo. Isso ocorrerá quando o prazo médio da carteira for inferior a 365 dias por três vezes ou por prazo de 45 dias ou mais (o que ocorrer primeiro). Assim, os rendimentos do fundo serão tribu­tados como: (i) longo prazo, até o dia anterior ao do desenquadramento; e (ii) curto prazo, a partir da data do

desenquadramento.

11.2.3. FUNDOS FECHADOS

Segundo o disposto nos §§ 2° e 3° do art. 12 da Instrução CV1\1 nO 409/04, as cotas de fundos fechados podem ser transferidas, me­

diante termo de cessão e transferência, assinado pelo cedente e pelo cessionário, ou através de bolsa de valores ou entidade de balcão organizado em que as cotas do fundo sejam admitidas à negociação. O estatuto desses fundos nãe admite resgate de quotas em prazos

inferiores aos estipulados no estatuto do fundo para o resgate do

principal e do pagamento dos rendimentos. Atualmente, a forma m:.is comum de fundos fechados são os

Fundos de Investimento em Direitos Creditórios. Esse fundo, re­gulamentado pela Instrução CVM nO 356/01, destinados a investi­dores qualificados206 , objetiva adquirir recebíveis de uma indústria

206 Segundo o arl. 109 da Instrução CVM n° 409/04. são considerados investidores qua­lificados: instituições financeiras; companhias seguradoras e sociedades de capitali­zação; entidades abertas e fechadas de previdência complementar; pessoas físicas ou

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

ou de um comércio, com deságio e sem coobrigação. Os rendimen­tos decorrem da valorização desses recebíveis no tempo, deduzidos do custo de inadimplência, assumido pelos quotistas que possuem quotas subordinadas emitidas por esse fundo.

Para fins de incidência de Imposto de Renda na Fonte, esses fundos deverão ser enquadrados como de curto ou de longo prazo, na forma descrita nos itens anteriores. O que difere é o momento da retenção do tributo, que ocorrerá por ocasião da amortização das quotas.

Se o investidor pessoa flsica vender essas quotas em bolsa de valores, os rendimentos serão tributados conforme as regras de renda variável (vide tópico abaixo). Se vender fora de bolsa, será aplicada a legislação de ganhos de capital. Se for pessoa jurídica, aplicar-se-ão as regras de tributação em ganhos com operações em renda variável, in­dependentemente do fato de ter ocorrido em bolsa ou fora dela.

11.3. MERCADO DE RENDA VARIAvEL

As rendas obtidas em operações realizadas em bolsa de valo­res, de mercadorias e de balcão organizado e que não produzem rendimentos pré-determinados serão tributadas com base nas re­gras que discorreremos abaixo. O art. 71 da Lei nO 9.430/96 deter­

mina que as operações de mercado futuro, realizadas fora de bolsa, também estão sujeitas às mesmas regras que comentaremos abaixo.

Diferentemente do mercado de renda fixa, a retenção e o pró­

prio beneficiário do rendimento é o responsável pelo recolhimento

do tributo e não da instituição financeira que efetuar a liquidação financeira da operação.

jurídicas que possuam investimentos financeiros em valor superior a R$ 300.000.00 (trezentos mil reais) e que. adicionalmente. atestem por escrito sua condição de in· vestidor qualificado mediante termo próprio. de acordo com o Anexo I; fundos de investimento destinados exclusivamente a investidores qualificados; e administrado· res de carteira e consultores de valores mobiliários autorizados pela CVM. em rela· ção a seus recursos próprios.

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COORDENAÇÃO: PEDRO AAAN JR.

11.3.1. Mercado de bolsa de valores e de balcão

As alíquotas aplicáveis a essas operações são: (i) para aquelas iniciadas e encerradas no mesmo dia (denominadas de "DayTrade") 20%; e (ii) para as demais operações, 15%.

A base de cálculo é definida nos arts. 25 a 30 e 32 da Instru­ção Normativa SRF nO 25/0l.

No mercado à vista, a base de cálculo é a diferença líquida positiva entre o valor de alienação do ativo e o seu custo de aquisi­ção, calculada pela média ponderada dos custos unitários.

No mercado de opções, tendo por objeto a negociação da op­ção, a base de cálculo é o resultado positivo apurado no encerra­mento de opções da mesma série.

No caso de exercício da opção: a) Titular de opção de compra: Diferença positiva entre o va­

lor da venda à vista do ativo na data de exercício da opção e o preço de exercício da opção, acrescido do valor do prêmio;

b) Lançador de opção de compra: Diferença positiva entre o preço de exercício da opção, acrescido do prêmio, e o custo de aqui­sição do ativo objeto do exercício da opção;

c) Titular de opção de venda: Diferença positiva entre o preço de exercício da opção e o valor da compra à vista do ativo, acrescido

do valor do prêmio; e d) Lançador de opção de venda: Diferença positiva entre o

preço da venda à vista do ativ0 na data de exercício da opção, acres­cido do valor do prêmio, e o preço de exercício da opção.

Caso não ocorra a vend.l do ativo na data do exercício da op­ção, o ativo terá como custo de aquisição o preço de exercício da opção, acrescido ou deduzido do valor do prêmio, para o titular de

opção de compra e do lançador de opção de venda. No mercado futuro, será o resultado positivo da soma algébri­

ca dos ajustes diários ocorridos em cada mês. No mercado a termo, o ganho será tributado da seguinte

forma:

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IMPOSTO DE RENDA PeSSOA JURIDICA

(i) Comprador: a diferença positiva entre o valor de venda à vista do ativo na data da liquidação do contrato a termo e o preço nela estabelecido;

(ii) Vendedor descoberto, pela diferença positiva entre o preço estabelecido no contrato a termo e o preço de compra à vista do ativo para a liquidação daquele contrato.

Os ganhos auferidos em contratos a termo de taxas de juros e de câmbio negociadas em bolsa de mercadorias e de futuros serão apurados pelo valor de liquidação, quando o contrato tiver sido cele­brado sem ajuste periódico de posições e pelo valor do ajuste perió­dico de posições quando houver previsão para tal.

Os ganhos em operações de swap são tributados apenas por ocasião da liquidação e da cessão do contrato, às alíquotas previstas para as aplicações financeiras de renda fixa.

11.3.1.1. Tributação de fonte sobre as operações praticadas em bolsa

Segundo o disposto no art. 80 da Lei na 9.959/00 e no art. 31

da Instrução Normativa SRF na 25/01, os ganhos apurados em ope­rações de "Day Trade" apurados a partir de 1 ° de janeiro de 2000 são tributados na fonte à alíquota de 1%. A apuração do resultado será considerada, pela ordem, o primeiro negócio de compra com o pri­meiro de venda ou o primeiro de venda e o primeiro de compra, sucessivamente. É permitida a compensação de ganhos e perdas apu­rados no mesmo dia desde que ambas as operações tenham sido intermediadas pela mesma instituição.

A partir de 1 ° de janeiro de 2005, o art. 20 da Lei na 11.033/04 determina a tributação na fonte sobre as demais operações pratica­

das em Bolsa de Valores, de mercadorias, de futuros e assemelhadas. Em linhas gerais, a alíquota será de 0,005% e incidirá sobre os valo­res brutos recebidos pelos beneficiários nesses mercados. Está dis­pensada a retenção na fonte, se a somatória das operações realizadas em um mês não gerar imposto a recolher em montante superior a

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

RS 1,00. Esse controle será efetuado pela instituição que receber a ordem para realizar a operação.

Em ambos os casos, a intenção de se instituir essa cobrança é informar o Fisco sobre as operações praticadas nesses mercados, uma vez que a fonte retentora será obrigada a informar a base de cálculo e o imposto retido desses beneficiários através da Declaração de Im­posto de Renda na Fonte. Dessa forma, o Fisco poderá utilizar essas informações para verificar se os beneficiários declararam essas ope­rações em suas declarações de rendimentos.

11.3.2. Fundos e clubes de investimento em ações

Os clubes de investimento em ações são organizados/adminis­trados por corretoras e distribuidoras de valores mobiliários com o intuito de investir em ações e são regulados pela Instrução CV1'v1 nO 40 e alterações posteriores. Os clubes são organizados sob a forma de condomínio e reúnem pessoas físicas para aplicação de recursos em títulos e valores mobiliários.

O § 2° do art. 95 da Instrução CV1'v1 nO 409/04, o art. 2° da Medida Provisória nO 2.189-49/01 e o § 6° do art. 28 da Lei nO

9.532/97 determinam que os fundos, cujas carteiras possuam, no mínimo, 67% de ações negociadas no mercado à vista de bolsa de valores ou de entidade assemelhada, serão tributados como fundo de ações. Dessa forma, os rendimentos serão tributados apenas por oca­sião do seu resgate. Segundo disposto no § 16 do art. 8° da Instrução Normativa SRF nO 25/01, es~e tratamento fiscal também se aplica aos fundos de investimento er 1 cotas de fundos de investimento em ações, definidos como sendo aqueles que possuem, no mínimo, 95%

dos seus recursos em quotas desses fundos. O § 7° do art. 28 da Lei nO 9.532/97, a base de cálculo é cons­

tituída pela diferença positiva entre o valor de resgate e o valor de

aquisição da quota, líquido de IOF. Para os resgates que ocorrerem a partir de Iode janeiro de 2005,

o imposto de renda retido na fonte será à alíquota de 15%. A alíquota

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

pode ser diferente para as aplicações efetuadas antes de 1° de janeiro de 2002, visto que até 31 de dezembro de 1994, a alíquota era de 25% e incidia sobre o ganho líquido corrigido monetariamente pela variação da Unidade Fiscal de Referência (UFIR) e 10% sobre o ganho nominal líquido, se o ganho se referir ao período de 1° de janeiro de 1995 a 31 de dezembro de 2001.

Se o limite mínimo de 67% de ações na carteira não for obser­vado, o § 4° da Lei nO 11.033/05 determina a tributação dos rendi­mentos na forma prevista para os demais fundos de investimento. Porém, o desenquadramento não ocorrerá se: (i) a proporção não ultrapassar a 50% do total da carteira; (ii) a situação for regularizada no prazo máximo de 30 dias; e (iii) o fundo não incorrer em hipótese

de desenquadramento no período de 12 meses subseqüentes.

11.3.3. Não aplicabilidade das regras de tributação na fonte

o art. 77 da Lei nO 8.981/95 dispõe quando as regras de tribu­

tação na fonte acima comentadas não são aplicáveis: (i) Aos rendi­

mentos auferidos em operações de renda fIxa, renda variável em bol­

sa, no mercado de balcão organizado, autorizado pelo órgão compe­

tente, ou através de fundos de investimento, para a carteira própria

das instituições fInanceiras, inclusive sociedade de seguro e capitali­

zação, sociedade corretora de títulos, valores mobiliários e câmbio,

sociedade distribuidora de títulos e valores mobiliários ou sociedade

de arrendamento mercantil (incisos I e III); (ii) A alienação de par­

ticipações societárias permanentes em sociedades coligadas e con­troladas, e de participações societárias que permaneceram no ativo

da pessoa jurídica até o término do ano-calendário seguinte ao de

suas aquisições (inciso IV); As operações de cobertura (hedge) reali­

zadas em bolsa de valores, de mercadoria e de futuros ou no mercado

de balcão (inciso V). Consideram-se de cobertura (hedge) as opera­

ções destinadas, exclusivamente, à proteção contra riscos inerentes

às oscilações de preço ou de taxas, quando o objeto do contrato ne-

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

gociado: a) estiver relacionado com as atividades operacionais da pessoa jurídica; b) destinar-se à proteção de direitos ou obrigações da pessoa jurídica.

Segundo o disposto no art. 5° da Lei n° 11.053/04, a partir de 1 ° de janeiro de 2005, ficam dispensados a retenção na fonte e o pagamento em separado do imposto de renda sobre os rendimentos e ganhos auferidos nas aplicações de recursos das provisões, reservas técnicas e fundos de planos de benefícios de entidade de previdência complementar, sociedade seguradora e FAPI (Fundo de Aposenta­doria Programada Individual), bem como de seguro de vida com cláusula de cobertura por sobrevivência.

liA. IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES DE CRÉDITO, CÂMBIO E SEGURO OU RELATIVAS A

TITULOS OU VALORES MOBILIÁRIOS - IOF

Segundo disposto no inciso V do art. 153 da Constituição Fe­

deral, o IOF incide sobre as operações de crédito, câmbio e seguro, ou relativas a títulos ou valores mobiliários. O § 1° desse texto legal permite ao Poder Executivo alterar as alíquotas, atendidas as condi­

ções e os limites estabelecidos em lei. Logo, a Lei estipula as regras genéricas que devem ser observadas pelo Poder Executivo na

regulação da cobrança desse tributo. Permanecem duas modalidades de tributação na fonte sobre as

aplicações financeiras.

11.4.1. IOF sobre aplicações financeiras - prazo inferior a 30 dias

O art. 33 do Decreto nO 4.494/02 determina a cobrança do

IOF à alíquota de 1% ao dia sobre o valor do resgate de aplicações

financeiras mercado de renda fixa, ao resgate de quotas de fundos de investimento e de clubes de investimento (exceto ações) e nos rendi­mentos predeterminados produzidos em operações praticadas em

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

bolsa de valores, de mercadorias e assemelhados. A cobrança será limitada ao rendimento produzido na operação em função do prazo, conforme tabela constante do Anexo àquele texto legal.

Segundo aquele anexo, o limite inicial é 96%, se a aplicação for de um dia; 93%, para dois dias e assim sucessivamente até o 30° dia, quando o limite é zero.

As aplicações financeiras serão tributadas à alíquota zero nas operações: (i) de titularidade das instituições financeiras e das de­mais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil; (ii) das carteiras dos fundos de investimento e dos clubes de investimento; (iii) do mercado de renda variável, inclusive as realiza­das em bolsas de valores, de mercadorias, de futuros e entidades as­

semelhadas; (iv) de resgate de quotas dos fundos de investimento

em ações, assim considerados pela legislação do imposto de renda; e (v) de titularidade de órgãos da Administração Pública Federal, Es­tadual, do Distrito Federal ou Municipal, direta, autárquica ou

fundacional, de partido político, inclusive suas fundações, e de enti­dade sindical de trabalhadores.

Assim, quando o IR fonte e o IOF são devidos, no caso, quan­

do a aplicação financeira tiver prazo inferior a 29 dias, o IOF deve

ser apurado primeiro e deduzido na base de cálculo do IR fonte.

Segundo disposto nos §§ 2° e 3° do art. 1° da Instrução Normativa SRF nO 25/01, nas datas em que o "come-cotas" é devido

(resgate de IR fonte devido em aplicações em fundos de curto e de

longo prazo) e o investidor não efetua o resgate de quotas, o admi­

nistrador deve calcular o IOF devido sobre as aplicações que estão

sujeitas ao IOF, como se devido fossem nessa data. Esse IOF calcu­

lado (é chamado de "virtual", uma vez que o tributo não será recolhi­

do nessa ocasião) deve ser abatido na base de cálculo do IR fonte. O

valor de IOF "virtual" será adicionado à base de cálculo do IR fonte

na próxima incidência desse tributo. Esse procedimento visa evitar o

recolhimento indevido de IR, que ocorreria caso o investidor decida

resgatar a aplicação nos dias seguintes ao dia do "come-cotas" e ain­da estivesse sujeito à incidência de IOF.

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11.4.2. IOF sobre resgate de fundos após a data de vencimento de carência

Em fundos com carência, os quotistas serão remunerados até o valor da quota da data do último vencimento de carência. Se o inves­tidor resgatar em data posterior à do vencimento da carência, rendi­mento apurado nesse período, em tese, seria apropriado pela carteira do fundo.

Porém, o art. 31 do Decreto nO 4.494/02 determina a incidên­cia de IOF sobre o resgate de fundos após a data de vencimento da carência, à alíquota de zero vírgula cinco por cento ao dia sobre o valor de resgate de quotas de fundos de investimento, constituídos sob qualquer forma, na hipótese de o investidor resgatar quotas an­tes de completado o prazo de carência para crédito dos rendimentos. O IOF fica limitado à diferença entre o valor da quota, no dia do resgate, multiplicado pelo número de quotas resgatadas, deduzido o valor do imposto de renda, se houver, e o valor pago ou creditado ao quotista. Na prática, todo o rendimento apurado cntre a data de ven­cimento da carência e a data de resgate deve ser recolhido a título de IOF, pois a alíquota aplicável é bem superior à variação das quotas

apurada nesse mesmo período. Essa regra foi introduzida para retirar a vantagem dos cotistas

de fundos exclusivos, à época em que a regulamentação vigente favorecia os fundos com carência de 60 dias. Naquela ocasião, os

demais investidores deveriam esperar o vencimento da carência de suas aplicações para ter direi10 aos rendimentos produzidos pelos títulos da carteira do fundo. Os grandes investidores conseguiam neutralizar essa regra ao constituir fundos exclusivos (nos quais havia um cotista só) de 60 dias, aplicando e resgatando indepen­dentemente dos prazos de carência. As perdas realizadas no resga­te de quotas eram incorporadas como rendimento extraordinário pelo fundo. Como todas as quotas remanescentes eram do próprio

investidor, a perda era integralmente recuperada através da valori­

zação das mesmas.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

11.4.3. IOF sobre operações de empréstimos de mútuo

o empréstimo de mútuo, regulado pelo art. 586 do Código Civil, é uma forma de realocar os recursos financeiros entre empre­sas de mesmo grupo econômico. As empresas doadoras de recursos estão sujeitas ao Imposto de Renda na Fonte na forma descrita no item 1.1 acima, a ser retido pela empresa tomadora de recursos. As empresas tomadoras de recursos estão sujeitas ao IOF sobre crédito, a ser retido pela empresa doadora de recursos.

Segundo disposto no art. 4° do Decreto nO 4.494/02, as pessoas jurídicas tomadoras de empréstimos são contribuintes do IOF inciden­te sobre o crédito. O inciso III do art. 5° do Decreto nO 4.494/02 de­termina que a pessoa jurídica que conceder o crédito, sob a forma de mútuo, é responsável pelo recolhimento do tributo.

O art. 7° desse mesmo texto legal determina que a alíquota é de 0,0041% ao dia sobre o valor do crédito concedido. Se o emprésti­mo é concedido com prazo determinado, o IOF é calculado por par­cela a ser paga, da seguinte forma: multiplica-se o valor do principal a ser pago pelo número de dias entre a data de concessão do emprés­timo e a data de vencimento da parcela e a alíquota diária. O tributo é devido na data de concessão do empréstimo. A alíquota é limitada a 365 vezes o valor da alíquota diária, hoje aproximadamente 1,5%. Assim, se o empréstimo for concedido em prazos superiores a 365 dias, a alíquota máxima será de 1,5%. Se o empréstimo for concedi­do por prazo indeterminado, o IOF é calculado ao final de cada mês calendário, a partir da aplicação da alíquota de 0,0041% sobre a somatória dos saldos negativos diários. O imposto será devido no primeiro dia útil do mês subseqüente. Se o IOF não for ressarcido pelo devedor na data de vencimento do tributo, esse passa a compor a base de cálculo do IOF desse mês em diante.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

11.5. CONTRIBUIÇÃO PROVISÓRIA SOBRE A MOVIMENTAÇÃO OU TRANSMISSÃO DE VA­

LORES E DE CRÉDITOS DE NATUREZA FINANCEIRA - CPMF

Em linhas gerais, a CPMF é devida pelo lançamento a débito em conta corrente de depósito em instituição financeira.

A base de cálculo desse tributo é o valor lançado a débito de conta e está sujeita à alíquota de 0,38%. Segundo o disposto no art. 90 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, alterado pelo art. 3° da na Emenda Constitucional nO 42/03, esse tributo será devido até 31 de dezembro de 2007, salvo algum ato que venha a prorrogar esse prazo novamente.

No que tange ao mercado financeiro, comentaremos a respeito da conta de investimento e das aplicações em bolsa de valores.

11.5.1. Aplicações em bolsas de valores

Segundo disposto no art. 85 do Ato das Disposições Constitu­cionais Transitórias, alterado pelo art. 3° da Emenda Constitucional nO 37102 e no item IX do art. 4° da Instrução Normativa SRF nO 450/04 não incide CPMF sobre os lançamentos a débito em contas correntes de depósito relativos a operações que tenham por objeto ações ou contratos referenciados em ações ou índices de ações, reali­

zados nos mercados à vista e em mercados organizados de liquida­ção futura, admitidos à negociação em bolsas de valores, de merca­dorias e de futuros; em compl a e venda à vista em mercado de balcão

organizado, assim considerac.o pela CVM. A não incidência vale apenas para as operações efetuadas dire­

tamente pelo beneficiário nas operações descritas no parágrafo aci­ma. As aplicações efetuadas através de fundos de investimento em ações estarão sujeitas à incidência de CPMF, pois a aplicação deverá ser efetuada através da conta de investimento (vide abaixo).

O art. 11 da Lei nO 11.033/05 faculta a utilização dos recursos

depositados na conta de investimento para efetuar as aplicações em ações, desde que a instituição financeira mantenha controle em separado, dos

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA 1 valores mobiliários adquiridos por intermédio das contas correntes de depósito à vista e de investimento (vide comentários abaixo).

11.5.2. Conta de investimento

A conta de investimento passou a vigorar a partir de 1° de ou­tubro de 2004. Até essa data, os bancos criaram a conta de investi­mento atrelada à conta corrente de depósito. A partir dessa data, segundo o disposto no § 11 do art. 8° da Lei nO 9.311/96, introduzi­do pelo art. 1° da Lei nO 10.892/04, as aplicações financeiras devem ser efetuadas da seguinte forma: Debita-se o valor a ser aplicado na conta corrente de depósito e credita-se a conta de investimento. Nessa

ocasião, a CPMF é devida. No momento seguinte, a aplicação fi­nanceira é efetuada através do débito dessa conta. O débito realiza­

do na conta de investimento não é sujeita à CPMF. O resgate dessas aplicações será creditado na conta de investimento. Caso o investi­

dor desejar reaplicar esses recursos, o fará sem incidência de CPMF. O art. 13 da Circular nO 3.248/04 determina que os valores de

resgate, liquidação, cessão ou repactuação das aplicações financeiras

existentes em 30 de setembro de 2004, bem como dos rendimentos

produzidos por essas aplicações, devem ser pagos exclusivamente em

crédito de sua conta corrente de depósito, cheque cruzado,

intransferível ou por DOC e/ ou TED (Transferência Eletrônica

Disponível). Segundo o disposto no § 15 do art. 8° da Lei nO 9.311/

96, introduzidos pelo art. 1° da Lei nO 10.892/04, os resgates efetuados

a partir de 1° de outubro de 2006, os recursos podem ser creditados diretamente na conta de investimento.

As operações realizadas em bolsas de valores, de mercadorias,

de futuros e assemelhadas, que já não pagavam CPMF desde julho

de 2002, podem ser incluídas na conta de investimento, desde que a instituição financeira que acatar a ordem de operação possua con­

trole sobre os valores oriundos de cada tipo de conta (a conta de investimento e a conta corrente bancária).

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COOROENAçAO: PEDRO AAAN JR.

III. TRATAMENTO FISCAL DOS RENDIMENTOS E PERDAS NOS RESUL­

TADOS DA PESSOA JURIDICA

111.1. TRATAMENTO FISCAL DOS RENDIMENTOS E DO IMPOSTO DE RENDA RETIDO NA FONTE

Segundo o disposto no capuI, no inciso I e no § 2° do art. 76 da Lei nO 8.981/95, o rendimento bruto auferido em aplicações finan­ceiras pelas pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real deve ser tributado na apuração do Imposto de Renda e o imposto de ren­da retido na fonte pode ser compensado com o devido na declaração de rendimentos. Esses rendimentos também devem ser tributados

na base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido. O mesmo tratamento fiscal é aplicável aos rendimentos e ao imposto

de renda retido na fonte às entidades tributadas pelo lucro presumi­do e lucro arbitrado, segundo disposto no art. 51 da Lei nO 9.430/96.

As Leis n° 9.718/98, e 10.637/02, dispõem que a COFINS e

a contribuição ao PIS, respectivamente, devem ser calculadas com

base no faturamento da pessoa jurídica, considerando-se esse como "a totalidade das receitas auferidas, sendo irrelevantes o tipo de

atividade por ela exercida e a classificação contábil adotada" Logo,

o rendimento auferido em aplicações financeiras pelas entidades sujeitas ao regime cumulativo, tais como as instituições financei­

ras, as pessoas tributadas com base no lucro presumido e outras são

tributáveis nas bases de cálcuh desses tributos. O art.l ° do Decre­to nO 5.164/04 determina qUt as receitas financeiras auferidas pe­

las pessoas jurídicas sujeitas ao regime não-cumulativo são tribu­

tadas à alíquota zero, exceto a referente às operações de cobertura

(hedge) e de juros sobre o capital próprio, a que se refere o art. 9° da

Lei nO 9.249/95. O inciso II do art. 76 da Lei nO 8.981/95 determina que os

rendimentos auferidos nas aplicações de renda fixa e variável co­

mentadas acima são tributados exclusivamente na fonte pessoas ju­

rídicas tributadas pelo SIMPLES e as pessoas jurídicas isentas (as

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

que não possuem finalidade de lucro). Para essas entidades, apli­cam-se apenas as regras de tributação na fonte.

As entidade imunes 207, discriminadas no inciso VI do art. 150 da Constituição Federal, estão dispensadas da retenção na fonte so­bre os rendimentos auferidos nas aplicações financeiras de renda fixa e de renda variável, desde que o beneficiário do rendimento declare sua condição de imune à fonte pagadora, dispõe o art. 71 da Lei nO 8.981/95, com redação dada pelo art. 1° da Lei nO 9.065/95.

111.2. PERDAS NAS OPERAÇÕES FINANCEIRAS - CONDiÇÕES E LIMITAÇÕES IMPOSTAS

PARA A SUA DEDUÇÃO

Segundo disposto no § 4° da Lei nO 8.981/95, as perdas auferidas em operações de renda variável, que incluem as operações nos mer­cados à vista, de opções, de futuros, fundos de investimento e swap,

são dedutíveis até o limite dos ganhos auferidos nessas mesmas ope­rações, exceto com relação às perdas em operações "Day-Trade" não são dedutíveis na apuração do lucro real.

A regra que limita a dedutibilidade das perdas nesses merca­dos não é aplicável àquelas operações realizadas com intuito de cobertura (hedge), de acordo com o disposto no inciso V do art. 77 da Lei nO 8.981/95. Conceitua-se como sendo hedge, aquelas ope­rações destinadas, exclusivamente, à proteção contra riscos ineren­tes às oscilações de preço ou de taxas, quando o objeto do contrato negociado: a) estiver relacionado com as atividades operacionais da pessoa jurídica; b) destinar-se à proteção de direitos ou obriga­ções da pessoa jurídica.

Com razoável freqüência, constatei que as pessoas jurídicas não financeiras deduzem as perdas auferidas nessas operações, pois sem-

207 Consideram-se imunes de tributos sobre o patrimônio. renda ou serviços dos parti­dos políticos. inclusive suas fundações. das entidades sindicais dos trabalhadores. das instituições de educação e de assistência social. sem fins lucrativos. atendidos os requisitos da lei e os templos de qualquer culto.

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

pre alegam que as realizam apenas para fins de proteção. Por outro lado, não documentam essas operações de modo a vincular a opera­ção financeira com o ativo, o passivo ou a operação-objeto a ser pro­tegida ("objeto de hedge"), em termos de prazo de vencimento e de quantidade (valor financeiro). Dependendo do caso, as perdas po­dem ser significativas e, em caso de eventual fiscalização, é possível que o Fisco venha a questionar a dedutibilidade dessas perdas, em virtude do fato de a prova do hedge não ter sido efetuada adequada­mente. O grande problema é que a fiscalização ocorre alguns anos após a liquidação dessas operações, o que pode dificultar a localiza­ção dos documentos.

Existe confusão entre a legislação de fonte e a legislação que se refere ao tratamento fiscal das perdas nas operações realizadas nes­ses mercados.

Como exemplo, é o caso do Day-Trade. A legislação permite a compensação das perdas realizadas com os ganhos auferidos nessas transações para fins de apuração da base de cálculo para o pagamento do imposto de renda. Por outro lado, a legislação determina a tributa­ção das perdas e dos ganhos auferidos nessas operações na base de cálculo do lucro real. Essa diferença de tratamentos na fonte e na apu­ração do resultado corporativo é que gera a confusão.

As perdas realizadas em operações de renda fixa e de renda vari­ável de titularidade de instituições financeiras, inclusive sociedade de seguro e capitalização, sociedade corretora de títulos, valores mobiliá­rios e câmbio, sociedade distribuidora de títulos e valores mobiliários ou sociedade de arrendamento mercantil são dedutíveis, sem a limita­ção acima descrita, com base 1\0 disposto nos incisos I e III do art. 77

da Lei nO 8.981/95. Outra questão é a perda gerada em aplicações de renda fixa. Sem

uma análise mais detalhada, podemos concluir que não haveria perdas em aplicações de renda fixa, uma vez que são operações que remune­

ram a taxas predeterminadas. Porém, a instabilidade das taxas de juros e de câmbio mais voláteis, ainda em períodos de crise que vivenciamos

há pouco tempo, geraram perdas aos aplicadores.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Dada a inexistência de uma norma expressa que determine a sua dedutibilidade, pode-se interpretar que o art. 375 208 do Decreto nO 3.000/99, que trata de variações monetárias, permite a dedução dessas perdas.

111.3. TRIBUTAÇÃO DOS ATlVOS, BENS E OBRIGAÇÕES EM MOEDA ESTRANGEIRA EM

REGIME DE CAIXA

o art. 32 da Lei nO 11.051/04 determina que, a partir de 1° de janeiro de 2005, os resultados positivos ou negativos incorridos nas operações realizadas em mercados de liquidação futura, inclusive os sujeitos a ajustes de posições, serão reconhecidos por ocasião da li­quidação do contrato, cessão ou encerramento da posição na base de cálculo do Imposto de Renda, Contribuição Social sobre o lucro lí­quido, PIS e COFINS. O resultado positivo ou negativo será cons­tituído pela soma algébrica dos ajustes, no caso das operações a futu­ro sujeitas a essa especificação, e pelo rendimento, ganho ou perda, apurado na operação, nos demais casos.

São considerados como mercados de liquidação futura, o swap, as operações no mercado futuro que determinam a chamada de mar­gem diária, o termo de câmbio sem liquidação futura do mesmo e outros. O art. 33 desse texto legal determinou que a Secretaria da Receita Federal regulamentará tal assunto.

Apesar de já estar em vigor, não existe regra definida para a tran­sição da regra anterior (tributação em regime de competência), bem como as regras de como devem ser apurados esses ganhos e perdas.

208 Decreto nO 3.000/99. '"art. 375 Na determinação do lucro operacional deverão ser incluídas. de acordo com o regime de competência. as contrapartidas das variações monetárias. em função das taxas de câmbio ou de índices ou coeficientes aplicáveis. por disposição legal ou contratual. dos direitos de crédito do contribuinte. assim como os ganhos cambiais e monetários realizados no pagamento de obrigações. §

único. As variações monetárias de que trata este artigo serão consideradas como re­ceitas ou despesas financeiras. conforme o caso"

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Enquanto essas regras não forem definidas, recomendo às pes­soas jurídicas tributadas com base no lucro real, e que vêm contabilizando essas operações pelo regime de competência, a ela­borar uma planilha por operação em aberto, atualizando a posição quando as operações forem iniciadas e liquidadas, com indicação do valor do ganho ou da perda, quando realizadas financeiramente, para fins fiscais. Essa planilha servirá para conciliar os ganhos e perdas de operações em abertos, não sujeitos à tributação, bem como deter­minar o momento em que tais ganhos e perdas devem ser reconheci­

dos para fins fiscais.

111.4. PLANOS DE PREVIDtNClA COMPLEMENTAR, FUNDOS DE APOSENTADORIA PRO­

GRAMADA INDIVIDUAL (FAPI) E SEGUROS DE VIDA COM cLÁUSULA DE SOBRE­

VIVtNClA - CONDiÇÕES DE DEDUTIBllIDADE DAS CONTRIBUiÇÕES EFETUADAS

EM FAVOR DE EMPREGADOS E DE DIRIGENTES.

Apesar de não se tratar de aplicações no mercado financeiro, as

contribuições a entidades de previdência complementar, por parte

das pessoas jurídicas em favor de seus empregados e dirigentes, es­

tão ganhando importância como uma forma de remunerar seus diri­

gentes e empregados sem a incidência de encargos sociais, como con­

tribuições ao INSS e das verbas trabalhistas. Dentre as novas normas de tributação que entraram em vigor

em janeiro de 2005, temos as que beneficiam os participantes de

planos de previdência complenentar. Dentre as medidas está a não

aplicabilidade da tributação n; fonte e no pagamento em separado do imposto de renda sobre os rendimentos auferidos por entidades

de previdência complementar aberta e fechada e a opção pela tribu­

tação exclusiva na fonte dos rendimentos auferidos pelos partici­

pantes do plano, cujas alíquotas variam de 35% a 10%, conforme o

prazo de acumulação, na forma prevista na Instrução Normativa SRF nO 524/05. Essas medidas visam aumentar a rentabilidade dessa mo­

dalidade e motivar os investidores a aplicarem em prazos mais longos.

165

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

Segundo disposto no art. 11 da Lei nO 9.532/97, as contribui­ções ao Plano Gerador de Benefícios Livre (PGBL), ao Fundo de Aposentadoria Programada Individual (FAPI) e a planos de previ­dência complementar fechada e aberta são dedutíveis na declaração de ajuste anual até o limite de 20% do valor dos salários e honorários de seus empregados e dirigentes.

O art. 4° da Lei nO 11.053/04 determina que as contribuições da pessoa jurídica a seguros de vida com cláusula de sobrevivência (comercializados sob o nome de VGBL - Vida Gerador de Benefí­cios Livre) a favor de seus empregados estão limitadas a 20% do valor dos salários e honorários de seus empregados e dirigentes e condicionado a que o benefício deve ser oferecido a todos os empre­gados e dirigentes da pessoa jurídica.

Através do art. 3° da Instrução Normativa SRF nO 497, o Fisco entende que essa condição é também extensiva à contribuição aos

planos de entidades fechadas de previdência complementar. No caso

de FAPI, o benefício deve atingir, no mínimo, 50% dos empregados.

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Uma Inteligência Possível () A 74 da MP 2.158, de 24/04/2001

lVES GANDRA DA SILVA MARTINS

Aa vogado em São Paulo Profissor emérito da Uni~ ersidade Mackenzie. UNIFMU e da Escola

de Comanao e Estado Maior do Exército Presidente do Conselho de EstudosJuridicos da Fecomércio. da Academia Paulista

e Letras e do Centro de Extensão Universitária Membro benemérito da APET

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

UMA INTELIGÊNCIA POSSiVEL DO ARTIGO 74 DA MP 2.158, DE 24/04/2001

Embora o STF esteja examinando a matéria no que diz respei­to à tributação no Brasil de resultados não distribuídos, mas apenas apurados no Exterior, com voto excludente da Ministra Ellen Gracie quanto às coligadas, não pretendo neste artigo abordar tal aspecto, mas um outro, qual seja o de saber qual o tratamento impositivo para empresas no Exterior não diretamente ligadas à empresa brasileira.

Os aspectos jurídicos, que abordarei para exame do artigo 74 da M.P. n. 2158-35 de 24/04/2001, concentram-se em saber:

a) se o referido dispositivo ofertaria disciplina legal às disponibilizações diretas de controladas e coligadas ou também àquelas ocorridas, segundo as regras dos países, em que empresas exclusivamen­te estrangeiras estão sediadas, sendo controladas ou coligadas de outras empresas também estrangeiras vinculadas a empresas brasileiras;

b) se o artigo 98 do CTN teria eficácia recepcionada pela nova ordem constitucional 209 ;

c) se a lei complementar n. 104/2001 seria aplicável à hipótese. A primeira reflexão vincula-se ao artigo 74 da MP. 2158-35 de

24/8/2001 que alterou o artigo 25 da Lei 9249 de 26/12/95, cuja dicção é a seguinte:

':Art. 74. Para fim de determinação da base de cálculo do impos­

to de renda e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei nO 9.249,

209 Maria de Fátima Ribeiro lembra que. ao comentar o artigo 98 do CfN: "E por que os

tratados e convenções internacionais devem integrar a legislação tributária? Esse é o

questionamento que Fábio Fanucchi faz ao comentar o art. 98 do CfN. Salienta. então.

que comumente ocorre que determinada situação tributável se submeta a uma pluralidade

de poderes impositivos. de Estados soberanos distintos. Desde que ocorrida essa circuns­

tância e a fim de evitar que o sujeito passivo se subordine a várias imposições perante um

só fator de avaliação de sua capacidade contributiva. surgem os tratados e convenções

internacionais que. no seu contexto. declaram pretender evitar a bi-tributação intemacio­

nar' (Comentários ao CfN. Editora Forense. Rio de Janeiro. 1997. p. 205).

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

de 26 de dezembro de 1995, e do art. 21 desta Medida Provi­

sória, os lucros auferidos por controlada ou coligada no exterior

serão considerados disponibilizados para a controladora ou co­

ligada no Brasil na data do balanço no qual tiverem sido apu­

rados, na forma do regulamento.

Parágrafo único. Os lucros apurados por controlada ou coligada

no exterior até 31 de dezembro de 2001 serão considerados

disponibilizados em 31 de dezembro de 2002, salvo se ocorri­

da, a~tes desta d~ta, qualque~ da~,hifoóteses de disponibilização prevzstas na legIslação em vIgor

Nitidamente, o texto legislativo faz menção à disponibilização de lucros auferidos pela controlada ou coligada na data do balanço em que tiverem sido apurados.

Os lucros de coligadas ou controladas de empresas sediadas no exterior, embora sob controle ou vinculação a empresa brasilei­ra, à evidência, têm o reflexo em sua contabilidade ditada pela le­gislação local, que pode ser -e o é na maior parte das vezes- de conformação contábil, jurídico-tributária semelhante à do Brasil.

Visualiza a empresa brasileira a disponibilização de lucros de sua controlada ou coligada direta, pela sua simples apuração nas datas de seu balanço. Não o mesmo quanto à disponibilização ou distribuição das controladas ou coligadas da empresa do exterior, cujos resultados poderão ou ,lão refletir-se, de imediato, no balan­ço de sua controladora ou coligada, nos exatos termos da lex loci.

Em outras palavras, nãc poderia o artigo 74 cuidar, como não cuidou, de controladas ou cc ligadas indiretas, pois:

a) quem pode fazê-lo e definir o tratamento a ser dado a seus lucros é a controlada ou coligada direta, nos termos do direito local

2\ O Por força do artigo 2° da E.C. n. 32 de \1/9/200 I. assim redigido: 'I\s medidas provi­sórias editadas em data anterior à da publicação desta emenda cOIllinuam cm vigor

até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até deliberação de­

finitiva do Congresso Nacional': não havendo necessidade de nova reedição da MP.

n.2158/35.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

do país em que se situa e naquele em que se situa a entidade vinculada; e,

b) somente se houver impacto contábil na declaração da controladora ou coligada estará sujeita ao tratamento tributário da legislação brasileira ou dos tratados contra a dupla tributação assi­nados pelo Brasil, se houver conformação jurídica para a hipótese concreta.

Não se referiu, portanto, o legislador nacional a controlada e coligada indireta, pois só cuidou efetivamente das controladas e coligadas diretas, visto que apenas o resultado destas poderia ser apurado e refletido no balanço da empresa nacional. É, de rigor, o que escrito está no texto e não cabe ao intérprete criar hipóteses legais por preferências ou antipatias, sem lei que as estabeleça 211

Nada obstante, a tributação universal, a adoção do princípio do "arm's length" da Lei 9249/95, o certo é que apenas o reflexo direto da controlada ou coligada sobre a empresa brasileira deve ser consi­derado, em nível de disponibilização, até porque apenas este tem um perfil claro a ser fiscalizado pelas autoridades brasileiras, exteriorizando toda a movimentação direta da controlada ou coliga­da externa, que as leis locais autorizarem, aplicando-se nesta disponibilização direta ou o artigo 74 ou o Tratado contra dupla tributação pelo Brasil assinado com diversos países.

Entendo, pois, que cuidou, o dispositivo referido da M.P. n. 2518-35, de disponibilização apenas das controladas ou coligadas diretas e nunca da movimentação de resultados, entre empresas es­

trangeiras controladas ou coligadas de controladas ou coligadas no exterior de empresa brasileira.

211 Francesco Ferrara, em "Interpretação e aplicação das leis': 2a. ed., Coimbra, 1963, p. 129, dizia que: "o excessivo apego à letra da lei é pernicioso, mas, ainda mais grave é o perigo de que o intérprete force a exegese, encaixlllldo no texto aquilo 'p,e gost/lrú, que lá estivesse ou suprimindo o que contrariasse suas preferências" ("apud" Direito Tributário 2, aI/tores: Hamilton Dias de Souza, Hel/ry Tilbery. lvcs G{/ndra da S. Martins e José Carlos Graça Wagner, Ed. Bushatsky, 1972, p. 32).

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

Pessoalmente, considero, todavia, que a "disponibilização direta no exterior" a que se refere a lei não ensejaria a incidência do imposto sobre a renda, sendo o artigo 74 de duvidosa constitucionalidade, como passo a demonstrar.

Na redação anterior do artigo 43 do CTN não constava o § 20

assim redigido:

"Na hipótese de receita ou de rendimentos oriundos do exterior, a lei

estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibi­lidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo" m

À luz deste parágrafo, houve "por bem" o legislador ordinário entender que a "disponibilização legal" poderia independer de "disponibilização real", de tal maneira que a mera apuração, sem "disponibilização real", seria, contudo, tida por "disponibilização",

212 José Rubens Marone comenta-o: "Destarte, em relação ao rendimento, só será possível a eleição como materialidade do imposto de renda na fonte de forma isolada e exclusiva se prevalecer a classificaçiio de fato gerador instantâneo, ou seja, aquele que se verifica a cada aquisição de disponibilidade, e se a lei ordinária eleger hipótese em que a descolISideração de custos, despesas e perdas, em termos gerais, só ocorra se o auferimento lião i,nplicdr a incorrência desses fatores. É importante ressaltar que a matéria é doutrinária e jurisprudencialmente controversa,

podendo-se concluir, entretanto, que a interpretação dos parágrafos adicionados ao art.

43 do CTN não permite a tributaç-io pelo imposto de renda de receita pura e simples, por

ser este um conceito de entrada de valores sem identidade direta com o acréscimo

patrimonial próprio para a incidê lcia, e, em relação aos rendimentos, devem ser analisa­das as hipóteses à luz das considero ções aduzidas'; acrescentando: "Para a exegese do § 2°,

inserido no art 43 do CTN pela L : n. 104/2001, devem ser considerados os parámetros

aduzidos da proteção ao direito adquirido, ao ato jurídico perleito e à coisa julgada, nos

termos do inciso XXXVI do art 5° da Constituição, e dos princípios da anterioridade e

irretroatividade, contidos no art. ISO, inciso m, alíneas a e b, também da Carta Magna.

Tais parâmetros constitucionais influem na vigência da lei no tempo e, por conseqüência.

nos limites legais na eleição do momento em que se reputará ocorrida a disponibilidade

de receita ou rendimentos oriundos do exterior. Cabe também ao legislador da lei a que alude o § 2" do art. 43 do CfN atentar à classifi­cação do fato gerador do imposto de renda em instantâneo ou complcxivo para eleger o entendimento a respeito do "momento em que se dará" a disponibilidade de rendimen­tos e receitas, pois a periodicidade de apuração inflllencia esses conceitos, cOllforme men­cionado" (Comentários ao CfN, vai. I, Ed. Saraiva, 3a. ed., 2002, p. 3231324).

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

apesar de não haver "lucro disponível" Em outras palavras a "não disponibilização de lucros" seria para todos efeitos "disponibilização de lucros", podendo a lei fazer do vermelho o branco, do redondo o quadrado, desde que assim a autoridade desejasse.

Instituiu hipótese de "ficção legal" - não de presunção - pois tornou, o "produtor de leis", disponibilização o indisponibilizado ou indisponibilizável 213

Na leitura do referido dispositivo da lei complementar, não me parece ter havido a outorga ou delegação para o legislador ordinário de tornar "disponível" o "indisponível" ou pelo menos o "indisponibilizado"

O que o legislador complementar autoriza é que a "disponibili­dade" - não a indisponibilidade - possa ter, na legislação ordinária, a definição das condições e do momento em que a incidência se dará.

O pressuposto do texto é que a disponibilidade ocorra, lem­brando-se que um lucro apurado em balanço pode não ser disponí­vel por variadas razões, inclusive de legislação local, tributária e co­mercial, razão pela qual as condições e o momento em que a inci­dência se dará caberá ao legislador ordinário definir.

É que a disponibilidade a que se refere o legislador comple­mentar é aquela do caput do artigo que implique "aquisição", ou seja, "acréscimo" de valores econômicos ao patrimônio do contribuinte 214 E nem pode ser de outra maneira, risco de se atingir o próprio

2 \3 O IX Simpósio Nacional de Direito Tributário do Centro de Extensão Universitária aberto pelo Ministro Moreira Alves assim tratou o lo quesito: "Por ficção não se pode considerar ocorrido o aspecto material do fato imponível, pois ou se esta­rá exigindo tributo sem fato gerador ou haverá instituição de tributo fora da competência outorgada pela Constituição. O mesmo se aplica à instituição da presunção absoluta pois, de sua aplicação, poderá resultar exigência de tributo sem fato gerador (unânime)" (destaques meus) (Caderno de Pesquisas Tributárias nO lO, Co-edição ed. Resenha Tributária/CEEU, 1991, p.354).

214 Escrevi: "Por essa razão, explicita o legislador complementar que a renda e os proventos implicam, necessariamente, uma aquisição. A aquisição correspondente a algo que se acrescenta, que aumenta a patrimonialidade anterior, embora outros fatores pos­sam diminuí-Ias. Por isto, o aumento, como sinônimo de fluxo, lhe é pertinente.

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

espírito do artigo 153, inciso III da c.F. em que se fala em "renda e proventos de qualquer natureza", ou seja, algo que se soma ao patrimônio anterior, como acréscimo 215

Algo que não é "acréscimo", nem "disponibilidade" não pode ser tributado. Já a Justiça decidiu no caso da Lei 7713/1988, artigo 35, em que o conceito de "disponibilidade" se discutiu, que os divi­dendos não distribuídos não poderiam ser considerados distribuídos para efeitos de incidência do imposto sobre a renda, sendo, pois, inconstitucional. E no caso cuidava-se de "disponibilidade real", mas não de "distribuição efitiva"

Leia-se o dispositivo (art. 35 da Lei 771311988):

"Art. 35. O sócio quotista, o acionista ou titular da empresa individual ficará sujeito ao imposto de renda na fonte, à

Por outro lado, o legislador complementar aclara que tipo de aquisição seria de fato imponível do tributo questionado, ou seja, aquele das disponibilida­des econômicas e jurídicas. O discurso corresponde, por decorrência, a uma limitação. Não a qualquer tipo de aquisição, mas apenas àquele correspon­dente à ostentação de disponibilidade econômica ou jurídica refere-se oco· mando intermediário." Os intérpretes têm, algumas vezes, tido dificuldades em esclarecer o que seria dispo­nibilidade jurídica, mormente ao se levar em consideração que o simples fato de uma disponibilidade econômica ter tratamento legal, tal tratamento a transforma tam­

bém em disponibilidade jurídi, a. Temos 1105 illsurgido co,ltra a Impropriedade redacional, a partir da collcepção de que não há objeto jurídico 1/0 Direito. E distillguir, Direito, situações a partir da adjetivação ''jurídica''é tornar' gênero, espécie" (Caderno de Pesquisas Tributárias vai. II, O fato gerador do IR t prove,lIos de qualquer Ilatureza, co-ed. Ed. Rescl/lta Tributária e Celltro de ExtCllsã ) Universitária, 1986, p. 266/267).

215 José Luiz Bulhões Pedreira ao distinguir "fluxo" de acréscimo" identifica o "acréscimo"como "acumulação" (visão estática) e a "entrada "(visão dinâmica) re­presentam, sob o aspecto temporal, isto é, no momento de sua ocorrência, um acrés­cimo, vocábulo inclusive utilizado pelo legislador complementar para definir o su­porte fático do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza. Assim, se expressa o eminente jurista: "O sCIltido vulgar da rCIlda é o produto do capital 011

trabaUlO, e o termo é usado como sillônimo de lueros, juros, aluguéis, proventos ou receitas. A exprcssão "provelltos"é cmp rega da como sillônill/o de pensão, crédito, provellto ou lucro. No seu sentido vulgar, tallto a exprcssão "renda" quallto a "proveI/tos" iII/plica a idéia de fluxo, alguma coisa quc elltra, que é recebida"! Imposto

de Rellda"APEC, p. 2 a 21 l.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

alíquota de oito por cento, calculado com base no lucro lí­quido apurado pelas pessoas jurídicas na data do encerra­

mento do período-base"

É que a ficção não se compagina com o princípio da estrita lega­lidade plasmado no artigo 150, inciso I da Constituição Federal e so­

bre o qual falarei adiante. Desta forma, o que posso dizer é que o § 2° autoriza ao legisla­

dor ordinário a determinar momentos e condições de uma "disponibi­lidade real", mas o artigo 74 será inconstitucional na medida em que possibilite, nas hipóteses em que possibilitar, que lucro "indisponível", apesar de apenas apurado, mas não disponibilizado, seja considerado

tributável no país 216

216 Gustavo Miguez de Mello lembra a lição do Eminente MINISTRO ALDIR G. PAS­SARINHO (então Vice-Presidente do TRIBUNAL FEDERAL DE RECURSOS) cm respeitável despacho de 30.06.82, no qual ele indeferiu o seguimento de recurso ex­traordinário de decisão da 5· TURMA DO TRIBUNAL FEDERAL DE RECURSOS, no qual são apreciadas características essenciais dos conceitos de disponibilidade de renda: "Despacllo. Trata-se de recurso extraordinário manifestado pela União Fede­

ral, com fundamento no artigo 119, inciso III. letra "a" da Constituição Federal, con­

tra acórdão da Egrégia 5" Tllrma deste Tribunal, CIIjo enunciado proclama:

Tributário. IR. Disponibilidade de Renda. Inteligência do art. 43 do CTN. A disponibilidade económica ou jurídica implica a possibilidade de entrega da coisa (arts. 675 e 676 do C. Civil), pressuposto indispensável à interpretação do art. 43 do CTN. Quem apenas possui título de crédito está em condições de vir a possuir renda, mas não possui renda. ( ... ) O Sr. Ministro-Relator Justino Ribeiro, no seu voto contrário à União Federal, no qual se reporta a dois arestos de que foi relator, transcreve, como ponto fulcral de sua argumentação, após reproduzir o art. 43 do Código Tributário Nacional. o tópi­co de pronunciamento seu, anterior na AC 46.904 - RI. pois, embora os fatos fossem outros, era o mesmo o tema de direito discutido: "Vê-se que o Código fala em dispo­nibilidade da renda. Ora, mesmo que se possa extrair alcance prático da distinção doutrinária entre disponibilidade jurídica e económica, é certo que qualquer delas só se compreende com a possibilidade, que lhe é imanente da entrega da coisa (arts. 675 e 676 do C. Civil) de posse dessa mesma coisa. Não é este o caso dos autos. ( ... ) Antes disto, tinha ela apenas direito de crédito a essas parcelas, título certamente disponível mas que não se confunde com o conceito de renda de que trata o CTN. Quem apenas possui título de crédito está em condições de vir a possuir renda, não possui renda."(Caderno de Pesquisas Tributárias, vol. II, O Fato Gerador do Impos­to Sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, Gustavo Miguez de Mello, pág,. 198-200, Ed. Resenha Tributária, 1986).

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(OOROENAÇAo: PEDRO ANAN JR.

o certo é que, independentemente destas considerações, sempre que a disponibilização de lucros não for da controlada ou coligada da empresa brasileira, ou, para efeitos de mera argumentação, a apuração do lucro não se der na empresa coligada ou controlada, mas no âmbito de outras empresas coligadas ou controladas pelas controladas ou co­ligadas, à evidência, o artigo 74 não se aplica, por ser

1) hipótese não prevista na lei; e,

2) operar-se a disponibilização além do controle da empresa brasileira, ou seja, em empresa por ela não diretamente controlada.

O segundo aspecto a considerar diz respeito ao artigo 98 do CTN, assim redigido:

"Os tratados e as convenções internacionais revogam ou modi­

ficam a legislação tributária interna, e serão observados pela 'h b h ,,117 que " es so reven a

217 Antonio Carlos Rodrigues do Amaral comenta-o. dizendo: "O Brasil, no campo do im­posto sobre a renda, é signatário de cerca de vinte e cinco tratados para evitar a dupla tributação; além de tratados regulamentando serviços de /lavegação e transporte aéreo e, igualmente. os acordos com implicações tributárias derivados do Mercosu4 da ALADI e da OMe (sucessora do GATT). A Constituição Federal brasileira. já no parágrafo único do art 4°. que trata dos princípios fundamentais. informa que: "A República Federativa do Brasil buscará a integração econó­mica. política. social e cultural dos povos da América Latina. visando à formação de uma comunidade latino-americana de nações': Daí já se destaca a importância das conven, ções internacionais para o sistema jurídico brasileiro. Os tratados internacionais são negociados pelo Poder Executivo e oficialmente celebra­dos pelo Presidente da Repúb ica (art. 84. Vlll. da CF), e deverão ser ratificados pelo Congresso Nacional (art. 49. I. da CF). Os tratados internacionais. em sentido geral. não possuem hierarquia superior à legisla­ção ordinária brasileira. No entanto. aqueles voltados para questões tributárias ganham tratamento diferenciado pelo legislador pátrio. que esculpiu no art. 98 do CTN. com eficácia de lei complementar. o seguinte comando normativo: "Os tratados e as conven­ções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna. e serão obser­vados pela que lhes sobrevenha': Não obstante a redação do dispositivo fale em "revogação". as disposições de um tratado. na realidade. representam normas especiais sobre questões tratadas em uma lei geral. Com isso. a lei geral permanece vigente. mas não aplicável aos casos específicos regulados pelo tratado em questão. Tal interpretação deriva também das lições de ilustres juristas pátrios. como Agostinho Tavolaro. Fábio Fanucchi. Alberto Xavier. José Carlos Faleiro. Hely Lopes Meirelles e Ricardo Lobo Torres" (Comentários ao aN. vol. 2. Ed. Saraiva. 3'. ed .• 2002. p.41/42).

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Tem sido colocado que as disposições dos tratados internacio­nais não prevalecem, se não cuidarem de direitos e garantias indivi­duais, sobre o direito interno. Têm a mesma hierarquia de direito interno, podendo ser revogado pela legislação ordinária.

Já decidiu o STF na extradição:

''Na Extradição 662-2/República do Peru, o STF-Pleno, em

decisão majoritária de 28.11.1996, o relator, Ministro Celso

de Mello, consignou na ementa: "O Código Bustamante -que constitui obra fUndamental de codificação do direito internacio­

nal privado -não mais prevalece, no plano do direito positivo

interno brasileiro, no ponto em que exige que o pedido

extradicional venha instruído com peças do processo penal que

comprovem, ainda. que mediante indícios razoáveis, a culpa­

bilidade do súdito estrangeiro reclamado (art. 365,1, infine)

... Tratados e convenções internacionais -tendo-se presente o sis­

temajurídico existente no Brasil (RE 80.004-SE, STF-Pleno

-RTJ 83/809) -guardam estrita relação de paridade normativa

com as leis ordinárias editadas pelo Estado brasileiro. A

normatividade emergente dos tratados internacionais, dentro

do sistema jurídico brasileiro, permite situar esses atos de direi­

to internacional público, no que concerne à hierarquia das fon­

tes, no mesmo plano e no mesmo grau de eficácia em que se

posicionam as leis internas do Brasil. A eventual precedência

dos atos internacionais sobre as normas infraconstitucionais de

direito interno brasileiro somente ocorrerá - presente o contexto

de eventual situação de antinomia com o ordenamento domés­

tico-, não em virtude de uma inexistente primazia hierárqui­

ca, mas, sempre, em face da aplicação do critério cronológico ("lex

posterior derogat priori") ou, quando cabível, do critério da es­

pecialidade, precedentes. (...r (in RJROB 1/11J92)" 218

218 Pesquisas Tributárias - Nova Série n. 4, Imunidades Tributárias, Ed. CEU/Ed. Revista dos Tribunais, 1998, p. 21.

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COORDENAÇÁO: PEDRO ANAN JR.

tendo o Ministro Moreira Alves se referido a esta inexistência de hierarquia:

"No STF há pouco tempo tivemos um debate em que essa questão se colocou, e foi justamente a ADIN 1.480, que

tratou do problema da Convenção da OIT, no que diz res­

peito principalmente ao problema das dispensas

injustificadas. E um dos nossos colegas, o Ministro Carlos

Velloso, sustentou qúe o Tratado ingressa na ordem jurídi­

ca interna, ora como lei complementar, ora como lei ordi­

nária: quando se exige lei complementar e a matéria é

disciplinada em Tratado, esse Tratado entraria na ordem

interna como lei complementar; quando se exige lei ordi­

nária, entraria como lei ordinária.

Essa opinião, no entanto, ficou praticamente isolada. E a obje­ção capital que se fez é esta: não é possível que nós tenhamos o Tratado como uma norma jurídica que, ao ingressar na ordem jurí­dica interna, ele seja bifronte: ora seja uma coisa, ora seja outra. Ou ele entra como lei complementar ou ele entra como norma constitu­cional, ou ele entra como lei ordinária.

E a maioria do STF entendeu que o Tratado ingressa na ordem jurídica interna como lei ordinária, seguindo aliás a orientação que

já é antiga no STF. Eu me lembro que, logo que ingressei na Corte, na década de

1970, houve uma discussão de ([ue eu não participei - porque havia dado parecer como Procurador- ::;eral da República -, com referência a um problema não tributário, mas um problema de Direito Comercial, que era saber da possibilidade de um Decreto-lei estabelecer um re­quisito para título de crédito que não havia na Convenção de Gene­bra, que era justamente de um registro fiscal que se fazia necessário para que o título tivesse validade. Nessa discussão a maioria assentou que os Tratados ingressam na ordem jurídica interna como lei ordi­nária. E o argumento que naquela ocasião foi decisivo foi justamen­te de que, em face da Constituição da época, que era a EC 1/69, se

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA 1 est~bel~cia na competência do S~F o jul~a~e~to de recurso extra~ ordmáno em que houvesse negatIva de vIgencIa de Tratado ou LeI Federal. Se concebeu que essa equivalência considerava que os Tra- I

tados estavam abaixo da Constituição, portanto hierarquicamente inferiores às normas constitucionais. E essa colocação paritária com as leis em geral lhe dava a natureza de lei ordinária.

Essa posição foi a que prevaleceu quando se examinou a liminar

nessaADln 1.480" 219

Qyando da discussão do Tratado de Assunção, todos os 3 paí­ses signatários (Uruguai, Paraguai e Argentina) dispunham em suas Constituições de dispositivos pela prevalência do direito internacio­nal sobre o direito interno, alguns deles adaptando suas Constitui­ções à nova realidade, como a Argentina e o Paraguai.

A Constituição brasileira de 88 é anterior ao Mercosul, e a ju­risprudência -é melhor falar em tendência- é no sentido de não dar prevalência maior ao direito decorrente do Tratado do que aque­le interno que o poder legislativo elabore, sempre que não se cuide de direitos individuais.

Neste particular, todavia, a Constituição Brasileira determinou no § 2° do artigo 5° que:

"Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não exclu­

em outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados,

ou dos tratados internacionais em que a Repúhlica Federativa J B ·1· ,,220 aO rast se.;a parte

tendo a doutrina consagrado o princípio de petrificação daque­les tratados que cuidem de direitos individuais, entre os quaIs os direitos dos contribuintes.

219 Pesquisas Tributárias - Nova Série n. 4. ob. dI. p. 20/21/22. 220 Celso Bastos comentou-o: ''A Constituição portuguesa preferiu referir-se à Declara­

ção Universal dos Direitos do Homem, depois de já ter feito menção "às regras apli­cáveis de Direito internacional': o qlle levolI Gomes Canotilho e Vital Moreira a afir­marem que a Lei Maior portuguesa aponta para um conceito material e para lima perspectiva aberta dos direitos fundamentais. Assim. além dos direitos fundamentais. formalmente poderia haver outros resultan­tes de leis e de normas de direito internacional. Como exemplo de direitos fundamentais

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Com efeito, o artigo 150 de uma secção inteiramente dedicada à proteção ao contribuinte (limitações constitucionais ao poder de tributar) principia com a seguinte dicção:

"Art. 150 Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I - exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; " (destaques meus),

em que se admite não apenas que aqueles direitos colocados nos artigos 150 a 152, mas outros são considerados "direitos e garan­tias individuais" ganhando a proteção constitucional 221

resultantes de lei, aponta o direito ao nome e o direito geral de personalidade, ambos constantes do Código Civil. Conceitua, ainda, as regras aplicáveis de direito internacional como sendo direitos consa­grados no direito internacional geral ou comum, ou no direito convencional,

designadamente os pactos internacionais referentes aos direitos do homem e ratificados pelo Estado português. No Texto brasileiro não podemos notar aquela perspectiva aberta de que fala Canotilho, uma vez que a referência não é feita ao direito internacional geral, mas sim aos tratados internacionais de que faça parte o Brasil. De qualquer sorte, essa referência é de grande importância, porque o Texto Constitucio­nal está a permitir a inovação, pelos interessados, a partir dos tratados internacionais, o que não se admitia, então, no Brasil. A doutrina dominante exigia a intermediação de um ato de força legislativa para tornar

obrigatório à ordem interna um tr. tado internacional. A menção do parágrafo em questão ao direito internacional como fonte possível de direi­tos e garantias deverá trazer mudar ças sensíveis em alguns aspectos do nosso direito. Não será mais possível a 5!lstenta ção da tese dI/alista, é dizer, a de que os tratados obrigam diretame/lte aos Estados mas não geram direitos subjetivos para os parti­culares, que ficariam /la dependê1lcia da referida i1ltermediação legislativa. Dorava1lte será, pois, possível a i1lvocação de tratados e c01lve1lções, dos quais o Brasil seja signatário, sem a 1lecessidade de edição pelo Legislativo de ato com for­ça de lei voltado à outorga de vigê1lcia interna aos acordos internacionais" (Co­metJtários à CotlStituição do Brasil, 2° vol., Ed. Saraiva, 2001, p. 423/424).

221 Escrevi: "O art. 150, que se aplica à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Munidpios, faz, de início, me1lção a outras gara1ltias asseguradas ao contribuinte, quase todas elas pos­tadas /lO al1. 52, como as da i/lviolabilidade de correspondência, de domia7io, do direito à

propriedade, à plena defesa perante o Poder Judiciário etc. O "caput" do artigo, por outro lado, suscita problema de interesse, qual seja, o de saber se seria ou não possível o alarga­mento das garantias asseguradas pelo Estado em face das discriminadas /la C01lstituição.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

Desta forma, não por força do artigo 98 do CTN, que dispu­nha em nível d~ legislação complementar a prevalência, mas por for­ça de uma hierarquia maior das normas (princípio constitucional) permanece a prevalência, no que diz respeito aos direitos do contri­buinte, do tratado internacional sobre o direito interno, tendo sido recepcionado o artigo 98 do CTN com força maior do que possuía no direito pretérito.

Vale dizer, o artigo 98 do CTN, por força do artigo 5°, § 2° e 150 caput da Constituição Federal foi hospedado pela nova ordem,

o Supremo Tribunal Federal, no passado, entendeu que o princípio da anualidade não poderia ser introduzido pela Constituição estadual, à luz daquele da anteriori­dade esculpido na Constituição anterior. Na defesa de tese de Hugo de Brito Machado para professor titular de direito tributá­rio da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Ceará, todos os cinco exami­nadores questionaram-no sobre a possibilidade ou não de a norma infraconstitucional distender o leque de garantias do contribuinte, todos eles posicionando-se pela pos­sibilidade, à luz de uma Constituição não imposta, não surgida de um regime gover­namental de exceção. A Constituição conformada pela sociedade, de resto, a verda­deira detentora das garantias e dos princípios constitucionais, é sempre destinada à comunidade a quem os governos devem servir e não aos governantes, que se julgam os beneficiários do esforço da comunidade. Com efeito, parece-me que o Poder Judiciário ao reexaminar a questão, em face da nova ordem constitucional, poderá reformular sua postura anterior, permitindo que o legislador infra-supremo alargue o espectro de direitos e garantias dos contribuintes. Aliás, toda a extrafiscalidade se alicerça em benefícios outorgados a segmentos da so­ciedade, numa abertura do poder tributante, que, podendo tributar, deixa de fazê­lo no interesse da comunidade, único motivo a justificar as isenções e as não-incidên­cias. O certo é que, entendo eu, garantias e direitos expostos no art. 150 e em outros dispositivos da Lei Suprema estão alargados pelo Código Tributário Nacional, no que diz respeito a princípios como são os da "benigna amplianda': da retroatividade premiaI, da integração analógica a favor do sujeito passivo, do "in dubio pro reo" Parece-me, pois, que não só a Constituição assegura garantias e direitos ao contribu­inte, estes imutáveis, enquanto não modificável a própria ordem constitucional, como outras garantias e direitos podem ser introduzidos, inclusive nas ordens constitucio­nais inferiores, a que não é lícito retirar direitos supremos, mas a que é lícito acres­centar elenco maior de proteção. O discurso inicial do art. 150 cuida, pois, exclusivamente, de parcela importante de garantias, mas lião de todas elas. Até porque na busca da proteção jurídica a Consti­tuição deve voltar-se sempre à proteção da sociedade contra o excesso de poder do Estado" (Comentários à Constituição do Brasil, 6· vol., tomo I, Ed. Saraiva, 2". ed., 2001, p. 152 a 154).

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN 1ft.

com predominância, no campo exclusivamente normativo, sobre o direito interno, por ele não podendo ser revogado, a não ser que o governo brasileiro denuncie o tratado, conforme os padrões, proces­sos e procedimentos de direito internacional 222 E se esta denúncia não afetar cláusulas pétreas.

O segundo aspecto, portanto, é o de que os tratados contra du­pla tributação assinados pelo Brasil prevalecem sobre o direito inter­no, abrindo para as hipóteses acordadas exceções às disposições ge­rais internas, seja por cuidar de direitos fundamentais dos contribu­intes, conforme entendem alguns, seja porque, sendo lei especial, só poderia ser revogada por outra lei especial de igual nível, ou seja, por outro Tratado.

Parece-me ser este o tratamento jurídico atual, nada obstante

os fundamentos diversos por força da representatividade da nação

no concerto mundial, visto que não honrar tratados assinados é for­

ma de exclusão do país e de seus cidadãos do convívio comunitário, dificultando a vida de uns e outros em todas as demais relações de todas as naturezas. País que não respeita tratados que assine, não

merece confiança de nacionais, investidores e cidadãos estrangeiros,

risco que felizmente o Brasil não tem corrido, por respeitá-los. Resta uma terceira questão que é de saber se a norma anti­

elisão poderia prevalecer sobre o direito posto.

Está o artigo 116 do CTN, § único, na redação ofertada pela

L.C. nO 104 assim redigido:

222 A grande maioria dos autores pr< fere entender que sendo lei especial não pode ser revogado por lei ordinária, à luz do disposto 110 art. 2° da lei de introdução do Códi· go Civil assim redigido: "Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até

que outra a modifique 011 revoglle. § lo A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior. § 20 A lei nova. que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já exis­

tentes, não revoga nem modifica a lei anterior, § 30 Salvo disposição cm contrário, a lei revogada não se restaura por ter J lei revogadora perdido a vigência", com o que s6 um outro tratado poderia revogar o

anterior.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

~ autoridade administrativa poderá desconsiderar atos ou ne­

gócios jurídicos praticados com a finalidade de dissimular a ocor­

rencia do fato gerador do tributo ou a natureza dos elementos

constitutivos da obrigação tributária, observados os procedimen­

tos a serem estabelecidos em lei ordinária"22J

À evidência, cria-se a "flexibilização" do princípio da legalida­de, ainda plasmado na Constituição como de "estrita legalidade" Todos os autores mais renomados, no direito tributário, atribuem ao princípio do artigo 150 caput, que explicita para o direito tributário aquele colocado no artigo 5°, inciso II, uma inflexibilização do ge­nérico comando maior da legalidade 224 É flexível no artigo 5°. É inflexível no artigo 150. É relativo no artigo 5°. É absoluto no artigo 150. É extensível no artigo 5°. É inextensível no artigo 150. É elás­tico no artigo 5°. É inelástico no artigo 150. À legalidade scripta do

223 Escrevi: "Em outras palavras. até hoje. o Fisco teve o poder de deflagrar a produção legislativa e - desde que a lei não fosse confocat6ria e respeitasse o princípio da capa­cidade contributiva pôde usar da espada da imposição. cabendo ao contribuinte. exclusivamente. lastrear sua defesa no escudo do cumprimento da lei. Dentro da lei. tudo pode o Fisco; fora nada. A norma antielisão objetiva permitir que o Fisco imponha tributos e penas "fora da lei", desconsiderando a lei aplicável, escolhendo o instrumento que lhe permita arreca­dar mais, dando por configurada a hipótese de operação mais onerosa, mesmo que a menos onerosa tenha sido utilizada dentro da lei, pelo contribuinte. Pretende, como disse V. Exa., o Secretário da Receita, fechar, as "brechas legais'; não da maneira legítima, através do Congresso, com projetos de lei, mas através da ação da fiscalização. Ora, as "brechas" ou são legais, e não há o que contestar, ou são ilegais. e, portanto, sempre houve tratamento legislativo para coibir o seu aproveitamento. É lamentável que o CTN. obra elaborada pelos mais eminentes tributaristas do país da época. tenha sido desfigurado por texto resultante de pressões do Ministério da Fa­zenda. em que a eliminação dos direitos do contribuinte. o alijamento da ação do Poder Judiciário (quebra do sigilo bancário sem autorização judicial) e do Poder Legislativo (norma antielisão. definida, não pelo Congresso, mas pelo agente focal) foram as tônicas dominantes. objetivando a instalação definitiva de uma ditadura fiscal no país" (O plane­jamento tributário e a Lei Complementar n. 104. &l. Dialética, 2001, p. 128).

224 O artigo 150 caput e 5°. inciso II, estão assim redigidos: 'I\rt. 150 Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte. é vedado à União. aos Estados, ao Distri­to Federal e aos Municípios: 1- exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça; "Ar!. 5° - 11: ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei':

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COOROENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

artigo 5°, segue a legalidade "stricta" do artigo 150, que pressupõe uma tipicidade fechada e uma reserva absoluta da lei 225

O artigo 108, § 1°, do CTN ao proibir a analogia para a imposição tributária, não o faz por decisão e opção do legislador complementar, mas por determinação impostergável do legislador supremo 226 • Explicita,

225 Escrevi: "Com efeito, em direito tributário, só é possível estudar o princípio da lega­lidade, através da compreensão de que a reserva da lei formal é insuficiente para a sua

caracterização. O principio da reserva da lei formal permitiria uma certa

discricionariedadc, impossível de admitir-se, seja no direito penal, seja no direito tributário.

Como bem acentua Sainz de Bujanda (Hacienda y derecho, Madrid, 1963, vol. 3, p. 166), a reserva da lei no direito tributário não pode ser apenas formal, mas deve ser absoluta, devendo a lei conter não só o fundamento, as bases do comportamento, a administração, mas --e principalmente-- o próprio critério da decisão no caso concreto. A exigência da lex scripta, peculiar à reserva formal da lei, acresce-se da lex stricta,

própria da reserva absoluta. t: Alberto Xavier quem esclarece a proibição da discricionariedade e da analogia, ao dizer (ob. cit., p.39): E daí que as normas que instituem sejam verdadeiras normas de decisão material (Sachentscheidungsnormen l, na terminologia de Werner Flume, porque, ao contrário do que sucede nas normas de ação (handlungsnormen). não se limitam a autorizar o órgão de aplicação do direito a exercer, mais ou menos livremente, um poder, antes lhe impõem o critério da decisão concreta, predeterminando o conteúdo de seu comportamento. Yonne Dolácio de Oliveira, em obra por nós coordenada (Legislação tributária, tipo legal tributário, in Comentários ao CTN, Bushatsky, 1974, v. 2, p. 138). alude ao princípio da estrita legalidade para albergar a reserva absoluta da lei, no que encon­tra respaldo nas obras de Hamilton Dias de Souza (Direito Tributário, Bushatsky, 1973, v. 2) e Gerd W. Rothmann (O princípio da legalidade tributária, in Direito Tributário, 5' Coletânea, coorden3da por Ruy Barbosa Nogueira, Bushatsky, 1973, p. 154). O certo é que o princípio d,llegalidade, através da reserva absoluta de lei, em direito tributário, permite a segurança jurídica necessária, sempre que seu corolário conseqüente seja o princípio da ipicidade, que determina a fixação da medida da obrigação tributária e os fatore: dessa medida a saber: a quantificação exata da alíquota, da base de cálculo ou d, penalidade. É evidente, para concluir, que a decorrência lógica da aplicação do princípio da

tipicidade é que, pelo princípio da seleção, a norma tributária elege o tipo de tributo

ou da penalidade; pelo princípio do "numerus clausus" veda a utilização da analogia;

pelo princípio do exclusivismo toma aquela situação fálica distinta de qualquer ou­

tra, por mais próxima que seja: e finalmente, pelo princípio da determinação corrceitua

de forma precisa e objetiva o fato imponível, com proibição absoluta às normas

elásticas (Resenha. Tributária, 154:779-82, Sec. 2.1, 1980)" (Curso de Direito Tribu·

tário, Co-edição CEEU-FlEO/Editora Saraiva, 1982, p. 57/58). 226 O artigo 108, § l°, do CTN está assim redigido: "Art. /08 - § l° O emprego da analo­

gia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei':

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

nos termos do artigo 146 do CTN, o perfil cerrado do princípio da legalidade a que se refere o constituinte no artigo 150 227

Ora, a denominada norma antielisão da L.C. nO 104/2001 cami­

nha em sentido rigorosamente oposto aos princípios constitucionais, ao permitir que o legislador seja o agente fiscal que, em cada situação, definirá, a seu bel-prazer e alvedrio, qual a norma que aplicará a esta

ou àquela operação ou situação, não à luz do cumprimento da lei, mas

de sua pessoal opinião, palpite, preferência ou antipatia, deixando de haver o que de mais relevante existe na seção II do Capítulo I do

Título VI (Das Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar) que

é a segurança e a certeza do direito. A partir da norma antielisão, ne­

nhuma conduta legal poderá ser considerada definitiva, à luz da incer­

teza que leva a se dar ao agente fiscal mais força que ao legislador, pois,

pelo prisma de uma pretendida e não escrita norma antielisão para aquela situação concreta, poderá desconsiderar o cumprimento de lei

para adotar procedimento diverso 228

227 Yonne Dolácio de Oliveira sobre o referido princípio ensina: "Na criação e "lteraçiio dos tributos, o Legislativo dos entes de governo, por força da norma constituciol1al

que lhes ol/torga a competência impositiva (e que é norma de organização da atri·

buição de poderes), recebe o poder para traçar na lei de incidência, o fato-tipo legal.

a que vai ligar, como conseqüência ou estatuição, o tributo. Tal atribuição assegura

ao legislador ordinlrio. com exclusividade. a opção para a escollJa dos fatos tribl/tá,oeis.

o poder de proceder à qualificação tipológica, isto é, a seleção de tais fatos de acordo com os fins por ele objetivados para defini-los na IJipótese de incidência. Também.

com exclusividade, toca-lhe o poder de determinar o "quantum" do tributo (base de

cálculo e alíquota) e o SI/jeito passivo.

Essa competência atribuída pela Constituição. por exigência desta, quando exercida. deve observar a norma geral do art. 97 do C.T.N., isto é, o legislador ordinário deve proceder à definição exaustiva dos elementos do fato-tipo legal ou hipótese de inci­dência, do sujeito passivo, e dos elementos da quantificação do tributo - a base de cálculo e a alíquota" (Caderno de Pesquisas Tributárias n° 6, co-edição CEEU/ed. Resenha .. Tributária, 1991, p. 503/504).

228 Hugo de Brito Machado vê flagrante inconstitucionalidade na L.c. n. 104/2001. ao dizer: "4°) A norma albergada pelo parágrafo Úllico do art. //6 do Código TribllltÍri"

Naciollal, introduzido pela Lei Complementar nO /04, de /0.0/.2001, nos parece "''' simples alargamento dos poderes da administração em matéria tributária, e sendo

assim é flagrante a sua inconstitucionalidade, posto que, como assevera Marco Auré­

lio Creco, "a própria noção de Estado Democrático de Direito repele uma norma

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COOROENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Nem mesmo em países onde há maior respeito das autoridades fiscais aos contribuintes que os sustentam e, portanto, o princípio da legalidade é mais flexível, a "norma superativa" tem a extensão que se pretende outorgar ao agente fiscal pela lei n. 104/2001, acreditando que Raupach, que foi quem melhor o estudou, no direito alemão, ficaria, se lesse hoje a lei brasileira, arrepiado ao ver os termos em que se pretende adotá-Io no Brasil 229

Em 2000, quando transitava o projeto de lei pelo Congresso Nacional, fomos chamados Alberto Xavier, Ozires Lopes de Azeve-

anti-elisão no perfil meramente atributivo de competência ao Fisco para desqualificar operações dos contribuintes para o fim de assegurar de forma absoluta a capacidade contributiva. O fato gerador é qualificado pela lei e uma pura norma de competência não convive com a tipicidade, ainda que aberta". 5°) O argumento segundo o qual a questionada norma anti-elisão apenas permite a realização dos princípios da capacidade contributiva e da isonomia é insuficiente para justificá-Ia, tendo em vista que tais princípios devem conviver com o princípio da legalidade, não podendo amesquinhá-lo. Aliás, entendida como instrumento de realização do princípio da isonomia, tal norma se põe em aberto conflito com o próprio Código Tributário Nacional, que em seu art. 108, § l°, veda expressamente a tributação por analogia. 6°) Por outro lado, norma albergada pelo parágrafo único do art. 116 do Código Tributário Nacional, introduzido pela Lei Complementar n° 104, de 10.01.200 I, não se compatibiliza com o "caput" desse artigo, que distingue as hipóteses de incidência ruídas por situação de fato e por situação jurídica. 70) Realmente, sendo a hipótese de incidência tributária uma situação jurídica, e inadmissível a desconsideração de atos ou negócios jurídicos que a componham. 80 ) Em face do que estabelece o art. 116, "caput': do Código Tributário Nacional, e tendo em vista o respeito do princípio da legalidade e do Estado Democrático de Direito, a realização do princípio da capacidade contributiva e da isonomia constitui tarefa do legislador, e não da administração tributária" (O planejamento tributário e a L.c. n. 104, ob. cit.p. 1151116).

229 Arndt Raupach, na sua obra 'j\ desconsideração no Direito Tributário" (Der Durchgriff i/ll Steuerrecht, Muniqlle, C. H. Beckshe VerlagsbllchlJandlung, 1968) escreve sobre quatro situações jurídicas em que, Durchgriff pode ser aplicável: "a) qllando há U/lla norma legal expressa, que permite o Dllrchgriff em determinadas situações fáticas; b) quando a interpretação da norn a legal torna necessário identificar a pessoa juridica com seus sócios pessoas físicas (por exemplo, quando se trata de normas relativas a características de pessoas naturais como raça, nacionalidade etc.); c) quando a consideração econ.Jmica leva à aplicação do Durchgriff; d) quando Durchgriff é necessário para evitar a violação de norma legal que proíbe a evasão de tributo" (pág. 194 - tradução Henry Tilbery). Henry Tilbery fulmina a possibilidade da aplicação da teoria desconsiderativa por elaboração jurisprudencial, ao dizer: "Manifestamos nossa opinião categórica de que, dentro do princípio da estrita legalidade tributária, a doutrina alienigena da desconsideração da pessoa jurídica não pode ser aplicada no Direito Tributário BraSI­leiro sem base em norma legal"( Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Integração entre a sociedade e sócios, Ed. Atlas, 1985, pág. 96).

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

do Filho, Marco Aurélio Greco e eu para o exame da pretendida alteração. Alberto Xavier, Ozires e eu nos colocamos absolutamente contrários à proposta por ferir a Constituição e até mesmo Marco Aurélio Greco, por entender que para que pudesse ser adotada uma norma anti-elisão, o caso teria que ser previamente examinado por um colegiado de contribuintes e agentes fiscais e apenas se o Colegiado concordasse haver hipótese desconsiderativa, a autuação poderia ser lavrada, com o que se retirava ao agente fiscal o "poder legislativo" que a L.c. n. 104/2001 lhe dá de dizer que a lei ordinária aplicada deve ser superada para aplicar aquela lei que lhe for mais simpática ou de sua preferência.

Estou convencido de que a lei complementar n. 104 é de manifes­ta inconstitucionalidade, como de resto muitos autores de renome 230

Por todas as considerações atrás apresentadas, entendo que o artigo 74 da M.P. n. 2158-35 de 24/04/2001 de duvidosa constitucionalidade, cuidou, se constitucional for, apenas de disponibilizações diretas, devendo prevalecer em sua eventual apli­cação, os princípios dos tratados internacionais assinados pelo Bra­sil, afastada a possibilidade de utilização da Lei Complementar n. 104/2001, também esta de duvidosa constitucionalidade.

230 Sacha Calmon Navarro Coelho ensina: '~ Lei Complementar n. 104/01 nesta parte é

inconstitucional. É oportuno notar que o Relator da matéria nO-Congresso Nacional faz questão de inserir no texto originário a frase "observados os procedimentos pre· vistos em lei': para contornar os artigos 5°, II e 150, 1 e II. Ocorre que a exigência da Constituição não é apenas formal, mas material. Nem mesmo a lei pode permitir ao Estado-Administração achar fato gerador por "inter­pretação analógica" O fato gerador deve estar exaustivamente previsto em lei (tipicidade). Assim também a equiparação de efeitos fiscais entre institutos e formas de Direito Privado. O exclusivismo da lei obsta a interpretação económica a que visa a "norma geral anti-elisiva" Esta, por não poder mesmo ser geral, há de ser sempre específica (nor­ma anti-elisiva específica, espécie por espécie) e legislada, jamais intuida pela Admi­nistração. Se prevalecer a norma geral anti-elisiva em face da Constituição, a lei tem que prever um contencioso com efeito suspensivo para decidir se a "desclassificação do ato ou negócio jurídico" procede ou não. É a única saída jurídica possível. No meio está a virtude. O princípio do contencioso deve prevalecer, smj" (O planeja­mento tributário e a L.c. n. \04, ob. cit., p. 304 ,.

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Tributa Exterior e

Limites Relativos de Normas Antielisas

JOÃO DÁCIO ROLIM

Advogado, LLM em Direito Tributário Internacional pela London

School of Economics, Doutor em Direito Tributário pela UFMG, Pesquisador

pela Queen Mary Un iversity of JJondon, Professor de Direito Tributário do

Curso de Direito da Economia e da Empresa da FGV

GILBERTO AYRES MOREIRA

Advogado em Belo Horizonte

Especialista em Direito Tributário pelo IBETIIBDT

Especialista em Tributação e Comércio Exterior

ITP pela Harvard Law School- USA

Professor Convidado dos cursos de Pós-Graduação da FGV

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

TRIBUTAÇÃO DE LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR E LIMITES RELATIVOS DE NORMAS ANTIELlSAS

I. INTRODUÇÃO

Em um mundo cada vez mais globalizado, em que as relações de comércio e investimento entre países aumentam de forma exponencial de ano a ano, empresas :'.tuam não apenas em seus mercados domésti­cos, mas inclusive no exterior (tornando-se transnacionais), seja por meio da constituição de estabelecimentos permanentes (diretamente) ou de sociedades controladas ou coligadas (indiretamente).

Por outro lado, em vista da abertura dos mercados de capitais a investimentos estrangeiros em quase todo o globo, pessoas físicas e jurídicas realizam investimentos de portfólio no estrangeiro objetivando alcançar as vantagens comparativas envolvidas na nego­ciação com títulos e ações em outros mercados231

Em vista destas operações transnacionais, muitos Estados vis­lumbram neste fato uma oportunidade para captarem investimentos

estrangeiros por meio da concessão de vantagens fiscais àqueles que pretendam investir em seus territórios por meio de investimento di­reto ou de portfólio.

Fosse apenas pelo fluxo internacional de capitais para o exterior, a situação já seria preocupante para os países exportando capitais, entretanto, a questão passa a ter contornos ainda mais graves quando

países de baixa pressão fiscal232 são utilizados como instrumento para

Enquanto Investimento Externo de Porfólio não envolve controle sobre uma atividade no exterior, e geralmente representa menos de 10% do capital envolvido nesta atividade, Investimento Externo Direto abrange controle ou maior interesse sobre a atividade, re­presentando sempre mais de 10% do capital envolvido na atividade. Os países de baixa pressão fiscal podem ser classificados como (i) países de tributação favorecida ou paraísos fiscais (lax haven), ou (ii) países de regime fiscal privilegiado (preferePltial tax system).

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COORDENAÇÁO: PEDRO ANAN JR.

impedir, reduzir ou postergar a incidência do Imposto de Renda por meio de elisão fiscal internacional, que impedem a ocorrência do fato gerador do tributo numa certa jurisdição para forçar sua apuração em uma jurisdição mais favorável.

Diante da redução de suas receitas tributárias e de seus esto­

ques de divisas, os Estados exportadores de capitais estabelecem

mecanismos regulatórios ou tributários tendentes a limitar o fluxo

internacional de capitais ou anular os efeitos dos planejamentos

tributários internacionais.

Em vista das peculiaridades do sistema tributário brasileiro, e

principalmente dos questionamentos que vêm surgindo em razão

das alterações legislativas realizadas no intuito de alterar o mo­

mento da incidência do Imposto de Renda sobre os lucros auferidos

no exterior, o presente trabalho tem por objetivo verificar o grau de

legitimidade e de razoabilidade das normas introduzidas no

ordenamento jurídico.

II. ELISÃO FISCAL INTERNACIONAL

Sob o ponto de vista da tributação internacional, as exigências

fiscais dependem da identificação de um elemento de conexão en­

tre o fato tributável (a renda) e o ente tributante233 , ou seja, a nor­

ma de incidência tributária de ve necessariamente incluir no seu

antecedente um fato jurídico relacionado com a jurisdição fiscaF34

Em razão da forma como lltilizados estes elementos de cone­

xão, o Imposto de Renda pode ser orientado pelo Princípio da

Territorialidade (source income taxation) ou da Universalidade da

233 ARNOLD. Brian. The Taxation of CorJtrolled Foreign Corporatiolls: An lnternatiOlJa/

ComparisolJ. Toronto: CanadialJ Tax Fundation. 1986. pág. 65. 234 Este elemento de conexão pode ser: i) subjetivo. quando relacionado com a pessoa

do sujeito passivo (residência. domicílio ou nacionalidade); ou ii) objetivo. quando

relacionado com a fonte ou natureza da renda.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Renda (worldwide income taxation)23S , dependendo da preocupação do legislador quanto ao tratamento tributário das riquezas produzi­das fora do território nacional.

Segundo o Princípio da Territorialidade, que encontra força na doutrina da neutralidade econômica da importação de capitais, o objetivo é garantir a igualdade de tratamento entre empresas nacio­nais atuando em outra jurisdição e as demais empresas negociando neste mercado externo, o que aumenta a competitividade de em­presas nacionais na jurisdiçã0236 , homenageando o Princípio da Livre

Concorrência.

Já o Princípio da Universalidade da Renda valoriza a doutrina da neutralidade econômica na exportação de capitais, por meio da qual se pretende igualar a carga tributária incidente sobre os investimen­tos de nacionais no país e no exterior de forma a eliminar qualquer vantagem fiscal à segunda espécie de investiment0237 , e que, ainda, valorizando os Princípios da Isonomia e da Capacidade Contributiva

ao estabelecer que as rendas dos sujeitos passivos serão tributadas quando relacionadas ou não com um elemento externo.

A maioria dos Estados adota o Princípio da Universalidade da

Renda na estrutura de apuração do Imposto de Renda, utilizando, ainda, sistema que, de uma certa forma, limita a neutralidade econô­mica da exportação de capitais em benefício da manutenção de rela­tiva neutralidade econômica da importação de capitais, vez que não seria interessante reduzir ou anular a competitividade internacional das empresas nacionais.

235 Segundo o Princípio da Territorialidade, o imposto incide sobre a renda gerada den­tro das fronteiras dos Estados, independentemente do país de residência do agente, enquanto que de acordo com o Princípio da Universalidade da Renda, também são tributadas as riquezas geradas no exterior pelos residentes ou nacionais do pais.

236 BIRD, Richard, MINTZ, Jack, Sharing the International Tax Base in a Changing World in Public Finance and Public Policy in the New Century, ed. Sijbren Cnossen, MIT Press, 2003, pág. 416.

237 A doutrina da neutralidade da exportação de capitais parte de uma série de premis­sas, entre elas, a de que a renda deve ser tributada de forma isonômica quando acu­mulada, seja no território nacional ou no estrangeiro.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Com raras exceções, estes Estados tributam as rendas geradas no país e os rendimentos auferidos no exterior referentes a juros, roya/ties, e dividendos, ou seja, respeita-se a separação da personali­dade jurídica das sociedades nacionais e das sociedades estrangeiras nas quais aquelas mantêm participação societária, incidindo o Im­posto de Renda exclusivamente quando os lucros auferidos por estas últimas fossem distribuído às primeiras.

A observância da personalidade jurídica das sociedades estran­geiras ligadas para fins tributários respeita os conceitos e definições da legislação societária, e não acarreta a exclusão da tributação sobre a renda mundial das empresas transnacionais, apenas admite, numa análise econômica, a postergação da tributação dos lucros para o momento da sua distribuição.

Levando-se em conta a neutralidade econômica da importação de capitais e a necessidade de se manter a competitividade internacio­nal das empresas nacionais, as quais não poderiam enfrentar em pé­de-igualdade as empresas de outras jurisdições fiscais, caso tivessem que assumir a carga tributária do país de sede da matriz e do país de sede da sociedade estrangeira ligada238 , a sistemática adotada garan­

te receitas tributárias aos Estados e a liberdade de investir no país ou no exterior, resultante do sopesamento de princípios, de um lado os

Princípios da Isonomia e Capacidade Contributiva e de outro o Princí­

pio da Livre Concorrência.

No entanto, uma vez que, por questões de arbitragem, as ativi­

dades econômicas e sua estrutu,ação jurídica tendem a se ajustar de forma a evitar maiores custos fiscais, uma vez que as empresas pro­curam maximizar lucros e com )etitividade, as empresas fazem uso

de planejamentos tributários in ternacionais para reduzir, anular, ou retardar a incidência do tributo nos países de maior carga tributária.

238 "Any difference in the corporate tax rate faced by two corporations cornpeting in the sarne location will give one a cornpetitive advantage" (DEVEREUX, Michael, Issues

in the Taxation of Incorne frorn Foreign Portfolio and Direct Investrnent, Taxing

Capital Income in the European Union: Issues and Optiolls for Refonn, ed. Sijbren

Cnossen, Oxford, 2000, pág. 123).

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

Por meio de vários mecanismos, as empresas sediadas em paí­ses de alta carga tributária relativa, como é o caso do Brasil, utilizam sua liberdade para contratar e pactuam negócios jurídicos diversos, que têm como intenção principal ou exclusiva alterar os elementos de conexão das operações internacionais para concentrar ou transfe­rir seus rendimentos para países de tributação privilegiada (atraindo ou desviando a hipótese de incidência tributária).

Neste sentido, mostra-se pertinente apresentar o exemplo da interposição das sociedades-controladoras (holding companies) e das sociedades-base (base companies) entre empresas nacionais e suas con­troladas e coligadas no exterior, instrumentos societários utilizados comumente com o intuito de elisão fiscal internacional.

No que se refere à utilização das Holding Companies, uma em­presa que tenha controle societário sobre outras sociedades estran­geiras se vale de sua participação societária nestas empresas para cons­

tituir uma nova sociedade estrangeira em um país de regime fiscal

privilegiado que isente da tributação os lucros auferidos no exterior

(participation examption), que passa a concentrar a distribuição de

lucros oriundos das demais sociedades controladas, impedindo que

estes valores sejam tributados no país de sede da sociedade controladora.

Já em relação às Base Companies, uma empresa que tenha em seu ativo bens intangíveis (patentes, licenças etc.) ou valores dispo­níveis, utiliza estes ativos como aporte de capital para a constituição

de uma sociedade num paraíso fiscal, e ato contínuo, pactua, por

meio desta sociedade estrangeira, contratos de licença de uso e de

mútuo com outras sociedade ligadas ou com a própria sociedade

controladora, passando a acumular os valores pagos em

contraprestação a tais serviços, de modo a evitar a tributação da ren­da pelo país de sede da sociedade controladora.

Observa-se, ainda, a canalização de lucros no exterior por meio

da utilização de instrumentos de transfer pricing quando da exporta­ção de mercadorias, uma vez que, ao se instalar uma subsidiária em

um país de baixa pressão fiscal e se efetuar todas as exportações por

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

meio desta empresa controlada estrangeira, empresas tendem a re­duzir os preços praticados quando da transferência do país de maior para o de menor tributação e, posteriormente, vender os produtos por seu valor de mercado a seus clientes, o que implica na concentra­ção dos lucros naquele país de tributação favorecida.

Caso estas sociedades estrangeiras distribuíssem os seus lucros acumulados, os países de sede das empresas controladoras poderiam tributar estes rendimentos. Entretanto, as sociedades controladoras tendem a evitar a distribuição do lucro gerado pelas empresas es­trangeiras controladas por meio da acumulação de ganhos naquelas jurisdições fiscais que oferecem benefícios fiscais e da postergação

da tributação dos lucros auferidos no exterior.

239 III. TRANSPARÊNCIA FISCAL INTERNACIONAL

Em vista da perda de receitas públicas em razão de planeja­

mentos tributários internacionais e de divisas relacionadas com tais

atividades, os Estados Unidos foram o primeiro país a se preocupar

com os efeitos nocivos da postergação tributária internacional sobre

a distribuição de lucros auferidos no exterior por sociedades ligadas.

A primeira norma antielisiva editada no intuito de combater

tais espécies de planejamentos tributários foi instituída em 1934, e

visava à desconsideração da personalidade jurídica de holding

companies constituídas no exteri,)r para postergar a tributação sobre

o lucro distribuído aos sócios de empresas norte-americanas.

239 "Fiscal transparency mealls 'Iooking througl!' an entity alld attributillg profits alld

losses directly to the clltity's membcrs." "Ullder SUelI a systcm. the corporate profits

(whether or not distributed) are imputed to the shareholders or partllers (whether

individuais or compallies) and taxed in t/leir hands." InternationaI tax gIossary. IBFD.

1996, 3rd edition. Ed. Susan M. Lyons. p. 128.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

Em vista da expansão das operações das empresas multinacionais norte-americanas, as quais constituíam sociedades estrangeiras liga­das em todo o globo, em 1962, o então Presidente Kennedyapresen­tou projeto de lei visando eliminar por completo a figura da postergação tributária sobre lucros no exterior (tax deferral) por meio da desconsideração da personalidade jurídica das sociedades estrangeiras controladas e da tributação imediata dos lucros auferidos no exterior.

Diante da irracionalidade da medida proposta, a lei foi aprova­da pelo Congresso com sérias modificações240 , pois além de ser in­justo tributar as sociedades coligadas sob o fundamento de que ha­veria postergação de distribuição de lucros, porque não há como o acionista minoritário exigir a disponibilização dos ganhos auferidos241 , a exigência imediata do imposto representaria um duro golpe na competitividade internacional das empresas multinacionais.

A norma finalmente instituída, conhecida como Controlled

Foreign Corporation - CFC - Rules tem por objetivo explícito afastar de forma racional a possibilidade de postergação tributária sobre a distribuição de lucros no exterior mediante a utilização dos planeja­mentos tributários internacionais, pois os rendimentos passivos (royalties,juros, dividendos, aluguéis etc.) auferidos pelas sociedades estrangeiras controladas seriam considerados como tendo sido auferidos pela sociedade controladora americana, independentemente de distribuição, na proporção de sua participação societária.

240 "Your cornrnittce, while recognizing the need to rnaintain active American Busilless

operations abroad on equal cornpetitive footing with other operating business in the sarne coutries, nevertheless sus no need to rnaintain the deferral of US tax where the investirnents are portfolio types of investrnents, ar where the cornpany is rnerely

recciving ÍllI'estrnent incarne. ln such cases there is no cornpetitive problern justifying postponernent of the tax until the incarne is repatried" (Sessões de votação das CFC

Rules in KUNTZ, loel D.; PERONI, Robert S., US IlIternational Taxation, vol. 1., West, pág. B3·7).

241 "The rationale for these ownership requirements is fairness. It rnight be unfair to tax resident shareholders 071 the IIndistribllted incarne of a foreign corporation if they

do 1101 have sufficient power of influence to require the corporation to distribute its incarne". ARNOLD, Brian; MCINTYRE, Michael, International Tax Primer. Boston: Kluwer. 1995, pág. 79.

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN lR.

As condições para se presumir que uma sociedade estrangeira estaria sendo utilizada para fins elisivos seriam (i) identificar se a empresa norte-americana teria controle sobre a sociedade estrangei­ra, e conseqüentemente o poder para determinar a distribuição dos lucros ou não, e (ii) se a sociedade estrangeira recebia rendimentos passivos. Necessário observar que caso a empresa provasse que a so­ciedade estrangeira tenha intuito negocial (não elisivo), não seria aplicada a regra de desconsideração da personalidade jurídica.

A abordagem adotada pelos Estados Unidos para a instituição da norma antielisiva foi posteriormente introduzida no Canadá, e é

classificada como abordagem transacional, pois leva em conta os negócios desenvolvidos pela sociedade estrangeira.

Apesar da histórica relutância das empresas multinacionais em aceitar as normas de Transparência Fiscal InternacionaF42, a medida é sugerida como sendo de consideração necessária em razão da sua efetividade na luta contra os planejamentos tributários internacio­nais243 , e vem sendo adotada validamente por inúmeros países.

De acordo com a sistemática das regras de Transparência Fis­cal InternacionaF44 , a norma se aplica após a verificação (i) do nível de controle da empresa transnacional na sociedade estrangeira245 , (ii) do regime tributário estabelecido no país no qual é constituída a sociedade estrangeira246 , e (iii) do tipo de renda auferida por esta

242

243

244

245

246

FERNANDEZ, Albertina M. Tlte L'S Deferral Privilege: Shollld Supart F be Repealed?

Tax Notes International, fevereiro 2000 pág. 831. "The countries that do not have such (CFC) rules consider adopting them and that countries who have such rules ensure that they apply in a fashion consistent with the desirability of curbing harmful tal practices" (OCDE, Committee on Fiscal Affairs: Harmful Tax Competition, OCDE 1998, pág. 40). Existem três espécies de Transpar< ncia Fiscal Internacional. as quais utilizam dife­rentes institutos jurídicos para cor.siderar tributável os lucros auferidos no exteriur: i) a abordagem da ficção da distribuição de lucros; ii) a abordagem da desco~sideraçã.o da personalidade jurídica da sociedade estrangeira; e iii) tributação do efeito pOSltl­vo de equivalência patrimonial. OCDE, Base Compallies, Paris: OCDE, 1987. Geralmente exige-se a existência de controle efetivo para a aplicação da norma, com poucas exceções como a da França, onde se aplica a norma às sociedades estrangeiras em que se tenha investimento relevante. . '_ Na maioria dos casos, a norma é aplicável exclusivamente aos palses de baixa pressao fiscal (aburdagem jurisdicional), com exceção de países como os Estados Unidos ~ o Canadá, que determinam a aplicação da norma em relação a qualquer SOCiedade es· trangeira (abordagem global).

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

sociedade247 A grande preocupação é evitar que a norma incida sobre negócios legítimos das empresas nacionais operando no ex­terior por meio de sociedades estrangeiras, pois o ideal é a manu­tenção do equilíbrio entre a neutralidade econômica na exportação e importação de capitais.

Uma vez realizada uma sintética análise do direito compara­do, cabe verificar se no ordenamento jurídico brasileiro seria válida a introdução de uma norma de Transparência Fiscal Internacional, e se a norma brasileira atualmente em vigor apresenta-se como le­gítima, racional e razoável.

IV. DA DEFINiÇÃO DE RENDA COMO BASE IMPONíVEL

Ao delimitar as competências tributárias dos entes federados, a Constituição Federal estabeleceu em seu artigo 153, inciso III, que compete à União Federal instituir o Imposto sobre a Renda, sendo vedado ao legislador infraconstitucional extrapolar os limi­tes do Conceito de Renda, sob pena de agressão ao Princípio de

Repartição de Competências insculpido no artigo 110 do Código Tributário Nacional.

No que tange ao Conceito de Renda, o legislador constituin­te estabeleceu no artigo 153, § 20 , inciso I, da Lei Maior, que o tributo homenagearia ao critério da generalidade, o que implica na

definição de uma grandeza tributável que engloba toda e qualquer forma de renda, o que equivale à definição econômica apresentada por Haig e Simmons: renda corresponde ao somatório do acréscimo

patrimonial e do consumo observado em um dado período, ou à totali-

247 Em regra é utilizado sistema por meio do qual são incluídos ao lucro da sociedade controladora os rendimentos passivos da sociedade estrangeira (abordagem transacional). com exceções como as da Nova Zelândia e da Suécia. países que deter· minam a adição ao lucro de qualquer tipo de rendimentos auferidos no exterior (abor­dagem da entidade).

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

dade de fluxos financeiros recebidos, do valor do uso de bens duráveis e da valorização líquida do conjunto de ativos verificado em um certo intervalo248

Entretanto, apesar da atenção ao critério da generalidade im­plicar na efetiva homenagem ao Princípio da Isonomia e da Capacida­

de Contributiva, vez que a incidência do imposto sobre toda e qual­quer forma de renda implicaria em maior distribuição da carga tri­butária sobre os sujeitos passivos possíveis, a tributação de acrésci­mos patrimoniais independemente de sua realização traz uma série de dificuldades de ordem prática, tais como a dificuldade de se indi­car qual o montante equivalente à valorização de um conjunto de ativos ou de se efetuar o pagamento de um tributo sem que tenha sido apurado numerário para a sua satisfaçã0249

Sendo assim, em atenção ao artigo 146 da Lei Maior, e objetivando trazer maior simplicidade e segurança à legislação tri­butária, o legislador complementar reduziu o escopo da base imponível do Imposto de Renda ao definir seu fato gerador como sendo o conjunto dos fluxos financeiros que resultam acréscimo

patrimonial250

248 "Income (Iooked at form the sources side af t/Ie househald account) s/lOuld be t/lOug/1I of as a person's elltire accretio11 to /tis or her wealth, illcluding ali forms thereof As we will examille ill detaillater on, a perso11's eco11omic capacity and /lC/lCe ability to pay is increased whether i11come aêcrues ill the form of money i11come (such as wages, salaries, illterest, or dividellds), as imputed illcome (such as imputed re11t from OWller· occupicd /IOUSÚlg), or as ali appreciatioll (whether realized or not) in I/,e l'alue of assets. The same requiremellt of c0mprellC/ISivelless call be stated if we loak at illcome from the uses side of the /lOuse/ old accoullt. Illcome then equals illcrmsc iII lIet worlh (or savillgs) plus colISum/tion during the period" (MUSGRAVE, Richard,

MUSGRAVE, Peggy, Public Fina.1ce in Theory and Practice, 5. ed., McGraw-Hill.

1989, pág. 224). 249 GRAETZ, Michael, SCHENK, Deborah, Federal Incorne Taxation, 4. ed., Foundation

Press, pág. 144. 250 "TRIBUTO _ RELAÇÃO JURfDICA ESTADO/CONTRIBUINTE - PEDRA DE TO­

QUE. No embate diário Estado!contribuinte, a Carta politica da República exsurge com illsuplalltável l'alia, no que, em prol do segundo, impõe parâmetros a serem respeitados pelo primeiro. Delltre as garalltias constitucionais explícitas, e a constatação não exclui o reconhecimento de outras correntes do próprio sistema adotado, exsurge a de que somente a lei complementar cabe a definição de tributos

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Nos termos do artigo 43 do Código Tributário Nacional, res­peitou-se o conceito de Renda como acréscimo patrimonial, mas a hipótese de incidência possível do Imposto de Renda foi restringida por uma razão de razoabilidade e praticidade, para que fossem tribu­tados apenas aqueles acréscimos patrimoniais acompanhados de flu­xos econômicos, ou seja, quando verificada a aquisição de nova dis­ponibilidade jurídica ou econômica.

Por disponibilidade econômica se entende a riqueza nova efe­tivamente realizada, expressão monetária entregue ao contribuinte, enquanto que, como disponibilidade jurídica se deduz os ganhos re­presentados pela aquisição de título hábil para a imediata realização de um direit02S1

Neste mesmo sentido, advertem Luís Eduardo Schoueri e Miguel Hilu Neto que "nem todo acréscimo patrimonial pode ser consi­

derado uma renda, nos termos do Código. Importa esteja ele disponível

para o contribuinte, económica ou juridicamente. Não havendo disponi­

bilidade, não há que se falar em tributação pelo imposto de renda. Temos,

portanto, que a renda auferida deve caracterizar-se por ser um acréscimo

patrimonial disponível ao sujeito passivo da obrigação tributária"2s2

e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta COllSti­tuição, a dos respectivos fatos geradores, bases de calculo e contribuitltes" - alínea a" do inciso III do artigo 146 da do Diploma Maior de 1988" (Ac. uno do Plenário do STF, RE n.· 172.058, ReI. Min. Marco Aurélio).

251 ':.4 disponibilidade adquirida pode, nos termos da definição, ser 'econômica' 011 :illrí­dica' (CrN, art. 43, caput). A aquisição de 'disponibilidade econômica' corresponde ao qlle os economistas chamam 'separação' de renda: é a sua efetiva percepção em dinheiro ou outros valores (RIR, ar/. 498). A aquisição de 'disponibilidade jurídica' corresponde ao que os economistas cha­mam de 'realização' da renda: é o caso em que embora o rendimento ainda não esteja 'economicamente disponíve/'(isto é percebido), entretanto o beneficiário já tenha título hábil para percebê-lo" SOUZA, Rubens Gomes de. Pareceres 3 - Imposto de

Renda. São Paulo: Resenha Tributária, pág. 277. apud SCHOUERI. Luís Eduardo. Tributação de lucros auferidos por controladas e coligadas no exterior: um novo capítulo no direito tributário internacional do Brasil? Imposto de Renda: Alterações Fundamentais. São Paulo: Dialética, 1996. pág. 143.

252 SCHOUERI, Luís Eduardo; HILU NETO. Miguel. Sobre a Tributação dos 'Lucros Disponibilizados' do Exterior. Imposto de Renda: Alterações Fundamentais. 2. vol., São Paulo, Dialética. 1998, pág. 120.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Como o Código Tributário Nacional não autorizava a tributa­ção de lucros objeto de postergação no exterior em que não foram incluídos em fluxos de renda, e diante do cenário de perda de recei­tas tributárias e divisas ocasionadas pelos planejamentos tributários internacionais envolvendo sociedades estrangeiras ligadas, o legisla­dor alterou a redação do artigo 43 do Código Tributário Nacional para criar uma exceção à regra prevista no caput do artigo e em seus incisos, de modo a permitir a tributação dos lucros no exterior inde­pendentemente de sua distribuição.2S3

Como se verifica do § 20 introduzido ao artigo 43 do Código Tributário Nacional pela Lei Complementar n.O 104, de 2000, "na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá

as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de

incidência do imposto referido neste artigo" (sem grifos no original). O legislador nacional não abandonou a tradição legislativa bra­

sileira ao alterar a redação do artigo 43 do Código Tributário Nacio­nal, pois manteve a definição básica da hipótese de incidência do Imposto de Renda, o qual continua a incidir exclusivamente sobre os acréscimos patrimoniais de nova disponibilidade econômica ou jurídica, nos termos do caput e dos incisos do artigo 43 do Código Tributário Nacional.

253 As propostas de mudança no Código Tributário Nacional partem de doutrinadores pre­ocupados com a elisão fiscal inter lacional e que entendem que a alteração do Código Tributário Nacional permitiria a tributação dos lucros não disponibilizados em empre­sas ligadas para efeitos da norma específica antielisiva: "a fim de evitar os transtomos

mencionados no item precedente a perpétua postergação da distribuição dos lucros auferidos no exterior I. e serem pie, 'amente atingidos os objetivos da tributação pelo prin­

cípio da universalidade da renda. o Covemo deveria propor alteraçtio '10 Código Tri­

butário Nacional. via Lei Complementar. alargando. para alcançar o caso das chamadas

"empresas de pape/'; o conceito de fato gerador. E mais. a fim de agir com justiça. e.

sem ferir norma constitucional, seguir o que fazem países mais experientes na apli­

cação do pri,lôpio da w,il'ersalidade da renda. ou seja. submeter. à incidência do impos­to de renda. na matriz. já no momento de sua apuração. os resultados das filiais. sucur­

sais. controladas ou coligadas. que exerçam atividades 1ItlO operacionais ('of! shore') e.

some'lte no momento de sua distribuição. ou disponibilização. os resultados auferidos

daquelas dependê"cias, qUQ/ldo cIas forem operacionais e não meras 'empresas de pa­

peI'" (SILVA. Eivany Antônio. Ob. cit., pág. 114).

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

o Código Tributário Nacional se restringiu a flexibilizar o ele­mento material da hipótese de incidência possível do imposto ao autorizar que o legislador ordinário estabelecesse que um acréscimo patrimonial não disponível, resultante da valorização de um conjun­to de ativos localizados no exterior, poderia ser tributado.

Apesar de terem sido apresentados inúmeros trabalhos doutri­nários destacando que esta regra teria introduzido abusivamente uma ficção legal ao dispor que um ganho não realizado deveria ser consi­derado como renda, assumindo ainda o posicionamento de que o § 2° do artigo 43 do Código Tributário Nacional estaria transbordan­do o Conceito Constitucional de Renda, entendemos que da mesma forma que não existem palavras inúteis, também não existem ações

inúteis, e a lei complementar é expressa ao introduzir uma exceção à

regra geral, perfeitamente aceitável segundo a hipótese de incidên­cia constitucional do tributo.

Entretanto, a flexibilização da hipótese de incidência possível

do Imposto de Renda não pode ser considerada como um cheque em branco ao legislador ordinário, pois a este não é permitido esta­belecer que grandezas que não representem acréscimo patrimonial

sejam consideradas renda ou que importâncias relativas a acréscimo

patrimonial não realizado sejam consideradas nova disponibilidade

de acréscimo patrimonial independentemente do cumprimento das

condições estabelecidas pela lei em harmonia com o Código Tribu­tário Nacional e a Constituição Federal.

Estabeleceu a nova redação do artigo 43 do Código Tributário Nacional, num evidente intuito de viabilizar a instituição de uma

norma de Transparência Fiscal Internacional, que cabe ao legislador ordinário estabelecer as condições e o momento para que se consi­

dere disponível a renda auferida no exterior.

Caso o legislador complementar pretendesse apenas alargar a

base imponível do Imposto sobre a Renda, não deveria introduzir

uma exceção à regra do artigo 43 do Código Tributário Nacional,

mas sim alterar o texto do dispositivo legal para permitir a tributação

de todo e qualquer acréscimo patrimonial, ao menos no que se refere

aos lucros, ganhos de capital ou rendimentos auferidos no exterior.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

V. TRIBUTAÇÃO DOS LUCROS AUFERIDOS NO EXTERIOR

Numa breve análise histórica da legislação do Imposto de Ren­da, verifica-se que o legislador tributário havia feito opção pela tributação segundo o Princípio da Territorialidade, preocupando-se exclusivamente com a tributação da renda auferida no território nacional.

Em que pese uma momentânea tentativa de se adotar o Prin­CIPio da Universalidade da Renda ainda na década de 80 (Decreto­lei nO 2.397, de 1987, e Decreto-lei nO 2.413, de 1988), a legislação que alterou o regime do Imposto de Renda foi rapidamente revogada (Decreto-lei nO 2.429, de 1988) de forma que o Brasil se manteve fiel ao Princípio da Territorialidade.

Já com a edição da Lei nO 9.249, de 1995, o legislador brasi­

leiro atendeu ao disposto no artigo 153, § 2.°, inciso I, da Consti­

tuição Federal, ao optar pelo Princípio da Universalidade da Renda

como elemento estrutural do Imposto de Renda, tributo que pas­

sou a incidir sobre rendimentos, ganhos de capital e lucros auferidos no exterior.

Entretanto, demonstrando uma clara preocupação com a elisão

fiscal internacional, o legislador brasileiro pretendeu abandonar um sistema que isentava as rendas auferidas no exterior para adotar

uma espécie de Transparência Fiscal Internacional ampliada, na

qual seria afastada qualquer Fossibilidade de tax deferral em total atenção à doutrina da neutralidade na exportação de capitais.

Em síntese, a norma jur dica determinava a desconsideração

da personalidade jurídica das ·.ociedades estrangeiras controladas e

coligadas e a adição ao lucro real da sociedade brasileira dos lucros

auferidos no exterior na proporção da sua participação societária

naquelas empresas, no momento em que apurados pelas socieda­

des controladas ou em que demonstrado em balanço pelas socieda­

des coligadas. A impensada e radical opção do legislador, inédita no Direito

Tributário Internacional Comparado, além de agredir o disposto

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

no artigo 146, inciso III, alínea a, da Constituição Federal e na antiga redação do artigo 43 do Código Tributário Nacionaps4, ao estabelecer a tributação de renda desacompanhada de fluxos econô­micos ou jurídicos, é totalmente arbitrária e irracional ao deixar de lado os problemas técnicos envolvidos na apuração, registro e fisca­lização do Imposto de Renda sobre a mera valorização de ativos e as barreiras introduzidas à liberdade negocial dos empresários brasilei­ros ao desestimular investimentos externos diretos.

Em que pese a possibilidade de valorização do investimento da sociedade brasileira nas sociedades estrangeiras pelo método da equi­valência pa trimoniaPss, o que caracteriza um acréscimo patrimoniaps6, não se identificaria a aquisição de nova disponibili­dade econômica ou jurídica até a distribuição dos lucros, pressupos­to para a incidência do Imposto de Renda257

Nos termos do artigo 43 do Código Tributário Nacional, o Im­posto de Renda somente poderia ser exigido na hipótese de realiza­ção da renda (por meio da remessa dos lucros a empresa brasileira) ou do recebimento de título hábil à sua realização (deliberação da sociedade estrangeira no sentido de disponibilizar a parcela dos lu­cros atinentes à sociedade brasileira).

254 São plenamente aplicáveis os fundamentos utilizados pelo Supremo Tribunal Fede­ral no julgado do RE n.O 172.058, vez que os lucros auferidos no exterior e não disponibilizados pelas sociedades estrangeiras não representam acréscimo patrimonial de disponibilidade econômica ou jurídica.

255 De acordo com a legislação societária, a Lei n.O 6.404, de 1964, os resultados (lucro ou prejuízo) das sociedades controladas e coligadas deverão ser considerados na apu­ração dos resultados (lucro ou prejuízo) das empresas, de modo que seja apurado o lucro das sociedades.

256 O conceito de lucro do direito societário pode ser englobado pelo conceito de rend" como acréscimo patrimonial (ROLlM, João Dácia. Imposto de Renda, Contribuição Social sobre o Lucro e Planejamento Tributário. Planejamento Fiscal: Teoria e Práti­ca. São Paulo: Dialética. 1995, pág. 73).

257 Observe-se que o legislador tributário, em razão de uma coeréncia sistémica, deter· mina a exclusão do lucro real dos efeitos da equivalência patrimonial, de modo a evitar uma bitributação econômica da renda e a incidência do imposto sobre acrés­cimo patrimonial indisponível.

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

Por esta razão, o administrador tributário deixou de aplicar esta norma eivada de inconstitucionalidade, independentemente de sua declaração pelo Poder Judiciário, e reconhecendo a impossibilidade da regra produzir efeitos, editou a Instrução Normativa nO 38, de 1996, e mais tarde a Lei nO 9.532 de 1997, dispondo que o lucro auferido no exterior em razão de participações societárias se consi­deraria disponível apenas quando da sua distribuição.

Entretanto, uma vez introduzido o § 2° ao artigo 43 do Código Tributário Nacional, de forma a autorizar a tributação de acréscimos patrimoniais auferidos no exterior e ainda não disponibilizados por meio de fluxos econômicos ou jurídicos, o Governo Federal editou a Medida Provisória nO 2.158-34, de 2001, que introduziu no

ordenamento jurídico uma regra de eliminação da postergação tri­butária internacional de caráter eminentemente arrecadatório, que estabelece que o lucro auferido pelas sociedades estrangeiras coliga­das e controladas considerar-se-ia disponibilizado na data do balan­ço em que foi apurado, ou seja, prevê as condições e o momento para a tributação destes acréscimos patrimoniais não realizados.

Apesar da legislação em referência parecer atender ao disposto

no Código Tributário Nacional, a nosso ver o Governo Federal incidiu no mesmo erro que o legislador ordinário havia incorrido em 1995, ao

desconsiderar os princípios e garantias de observância necessária para a instituição de uma norma de Transparência Fiscal InternacionaF58

Cabe salientar que não há que se falar que a norma jurídica

respeitaria o Princípio da Isonumia e da Capacidade Contributiva no que se refere às empresas coligadas estrangeiras, pois apesar do lucro em empresas ligadas representar um acréscimo patrimonial, a sua

realização mediante distribui\ ão de lucros está fora do campo de

ação do investidor.

258 Apesar de ser latente na doutrina internacional a questão relativa à legitimidade da instituição de normas visando acabar com a postergação tributária sobre o lucro das sociedades controladas estrangeiras (BLESSING. Peter H. Revisiting the Deferral of Foreign Business Income. 2000 World Tax Conference Repor!. Toronto: Canadian

Tax Foudation. 2000. pág. 18:11/18:12).

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Verifica-se uma inaceitável distinção de tratamento entre os investidores de portfólio, que visam apenas a especulação financeira e os ganhos em mercados estrangeiros, e as empresas brasileiras com investimentos em coligadas, pois enquanto os primeiros são tributa­dos apenas quando da realização da renda por meio da venda de suas participações societárias ou do recebimento de dividendos, os outros devem recolher o tributo anualmente como se houvessem recebido parcelas referentes à distribuição de lucro.

Apesar de respeitada a regra-matriz constitucional do Imposto de Renda, vez que o acréscimo patrimonial resultante da valorização da participação societária compõe a regra-matriz constitucional do imposto, inexiste razoabilidade na regra quando trata de forma equi­valente os investimentos em sociedades estrangeiras controladas, nas quais a sociedade controladora tem o poder para determinar ou não a distribuição de lucros, e em empresas coligadas, nas quais a sociedade

brasileira é mera investidora, não tendo qualquer poder de gestão.

Reconhecendo a inconstitucionalidade da aplicação da norma de Transparência Fiscal Internacional quando a empresa ligada na­cional não tenha influência sobre as empresas coligadas estrangeiras, a Instrução Normativa nO 213, de 2002, estabeleceu que apenas as sociedades coligadas estrangeiras sujeitas ao método de equivalência patrimonial deveriam estar submetidas à regra, ou seja, que somente

quando a sociedade brasileira tenha maior controle sobre a distri­

buição dos resultados pela sociedade estrangeira estaria obrigada à

regra que elimina a postergação tributária internacional.

Por outro lado, ao introduzir a regra da Transparência Fiscal In­

ternacional, o Governo Federal parece ter partido da desproporcional e dezarrazoada presunção de que todas as sociedades estrangeiras cons­

tituídas por pessoas jurídicas brasileiras têm por objetivo a elisão fiscal e de que nenhuma empresa brasileira teria outro interesse eco­nômico ou propósito negocial.

A simples eliminação da postergação na distribuição de lucros auferidos no exterior, independentemente da aplicação de testes vi­

sando verificar o intuito elisivo por meio da análise do tipo de ren­

das da sociedade estrangeira ou jurisdição sua de incorporação, po-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

deria até ser considerada como adequada a um núcleo da hipótese de incidência constitucional do imposto sobre a renda, mas encontraria outros obstáculos sérios, tal como o Princípio da Livre Concorrência,

ao literalmente impedir que as empresas brasileiras tenham competitividade internacional em suas operações por meio de socie­dades estrangeiras ligadas.

Como se observa da prática do comércio internacional, uma vez que uma empresa nacional adquire certo nível de market share

em outro país, passa a ser interessante a realização de investimentos diretos nesta jurisdição para consolidar a posição no mercado e au­mentar lucratividade ao invés de continuar a suprir o mercado alvo por meio de exportações e o apoio de agentes autônomos ou distri­buidores independentes.

Todavia, nos países em que as empresas brasileiras estariam sub­metidas à incidência de Impostos de Renda exigidos sob alíquotas

inferiores a 34%, as sociedades estrangeiras ligadas acabam tendo

reduzida competitividade em comparação com empresas locais e subsidiárias de empresas de outros países que estariam sujeitos a uma

alíquota menor de Imposto de Renda. Para que fosse razoavelmente atendida a liberdade de empresa,

seria necessário que a norma de Transparência Fiscal Internacional

se fundasse em forte presunção de que a constituição da sociedade

estrangeira teria o objetivo de evitar ou postergar a incidência do tributo brasileiro, e para tanto, de vital importância seria a aplicação

dos testes de controle, nível de ~ributação na jurisdição fiscal de cons­

tituição e tipo de renda recebida. Apesar de dispendiosa e « )mplexa a verificação do intuito elisivo

do contribuinte ao constituir sociedades estrangeiras, tal fato não

permitiria ao legislador concluir arbitrariamente que todo e qual­

quer investimento societário no exterior tem finalidade de postergar

a incidência do Imposto de Renda. Da mesma forma, não se pode considerar que a constituição de

empresas no exterior por si só seja um ato anormal de gestão ou um abuso de direito por meio do qual se pretende evitar a incidência do

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

imposto brasileiro, e como tal, a regra deveria ter sua aplicação redu­zida aos casos em que se pretenda efetivamente uma finalidade elisiva.

A norma jurídica em exame parece não ser aquela que melhor atenderia aos anseios arrecadatórios do Estado e a aspiração de se desenvolver a economia nacional, pois apesar de dar solução ao pro­blema relativo à elisão fiscal internacional ao afastar qualquer espé­cie de postergação do Imposto de Renda, a medida não é adequada, vez que tem efeito muito mais abrangente.

Existem formas menos agressivas de se combater a elisão fiscal internacional, como através da Transparência Fiscal Internacional e seus testes de aplicação, pois confrontando-se os princípios e valores envolvidos na questão, verificaríamos que em nome do aumento da arrecadação tributária e dos Princípios da Isonomia e da Capacidade Contributiva, deixa-se de lado o Princípio da Livre Concorrência2s9

Ao tentar introduzir uma norma contra a postergação tributá­ria internacional sobre lucros auferidos no exterior por empresas li­gadas, o Governo Federal perdeu a oportunidade de introduzir o Brasil no crescente grupo de países que adotaram medidas contra a elisão fiscal internacionapo, mas sem ferir a competitividade das empresas brasileiras.

Como observado em certo sentido por parte da doutrina, a ins­tituição da norma específica antielisiva em referência seria possí­vel261 , ou até mesmo desejável, pois aliada às regras de preços de transferência, já relativamente consolidadas no nosso ordenamento

259

260

261

Assim. não se pode generalizar a idéia de que o artigo 74 da Medida Provisória n." 2.158-34. de 200 I. veio "simplificar a legislação tributária e combater a evasão 011 a elisão fiscal internacional abusiva ou com frallde à lei. geradas. sobretudo. pelas cha­madas empresas de papel ou pelos estímulos fiscais oferecidos pelos chamados para­ísos fiscais" (SARAIVA FILHO. Oswaldo Othon de Pontes. Ob. cito pág. 254). Como destacado no LV Congresso da International Fiscal Association em São Fran­cisco. EUA. 26 (vinte e seis) países já haviam adotado a Transparência Fiscal Interna­cional no início de 2001. "Não nos parece que o sistema constitucional tributário brasileiro seja tão rígido a ponto de impedir que o legislador federal combata os planejamentos tributários con­siste1ltes em criar sociedades não-operacionais em paraísos fiscais ou jurisdições de baixa pressão fiscal. tra1lsferir a tais sociedades ativos diversos e deS\·iar para aquelas os rendimentos passivos correspondentes. posterga1ldo indefinidamente. ou mesmo eli­minando integralmente. a incidência do imposto de renda brasileiro" (GODOI. Mar­ciano Seabra de. O imposto de Renda e os lucros auferidos no exterior. Inédito).

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

jurídico, embora com algumas imperfeições, representaria uma limi­tação salutar no que concerne à elisão fiscal internacional.

Seria valioso o aprimoramento da norma de Transparência Fiscal Internacional Brasileira, seja pelo intérprete e aplicador da lei, seja pelo próprio legislador se este se utilizar da experiência do direito comparado262 , de modo a prevalecer no Brasil uma regra eficiente e adequada ao sistema tributário nacional, a outros princípios consti­tucionais e ao desenvolvimento econômico de empresas brasileiras.

Exemplificando, além de reduzir a aplicação da norma ao âm­bito das sociedades estrangeiras controladas ou em que haja influên­cia perceptível, caso considerasse o legislador que uma abordagem global (aplicação da norma a qualquer sociedade estrangeira contro­lada) seria dispendiosa e desnecessária, vez que inexistiria interesse elisivo de direcionar a renda entre jurisdições de elevada carga fiscal, poderia optar pela abordagem jurisdicional (aplicação da norma ape­nas às sociedades estrangeiras controladas sediadas em países de baixa pressão fiscal), aproveitando para tanto as normas já existentes, apli­cáveis aos preços de transferência e à retenção de imposto de renda

na fonte. Da mesma forma, uma vez que a abordagem transacional para

a verificação das rendas passivas também demonstra ser um método

complexo e dispendioso, poderia o legislador adotar a abordagem da

"Mas, e"fim, seria comtitucional a inserção de uma regra sobre o 'co"trole de socie­

dades estrangeiras' 110 Direito Tributário brasileiro, crialldo uma regra de tra/lSpa­

rência para as operações com raíses com tributação favorecida? Desde que seja

identificdda exclusivamente par" essa finalidade, e assegurando ao COlltribuillte o

direito de demonstração da legItimidade das operações, por i/J1'ersão do ÔIlJlS da

prova, COI/1 todos os mcios de prvva ad,lIitidos, ne,JI""'J(J incollStitucio"alidadc po·

der ser alegada. E dever do Estado desencorajar o uso de países com tributaçào

fcll'orecida, como mais duma forma de realizar o princípio da livre concorrêllcia 'lO

mercado illtCTIlO e estabilizar o cumprimento do princípio dd isonomia em face do

sistema tributário" (TORRES, Heleno. Direito Tributário Internacional: Plane.iamento Tributário e Operações Transnacionais, São Paulo, Revista dos Tribunais, 2001, pág. 132).

262 Neste sentido, proveitosas as considerações do relatório geral apresentado no LV Con· gresso da Internacional Fiscal Associatioll, ARNOLD. Brian I .. DIBOUT. Patrick. Gelleral Report: Limits on the use of low-tax regimes by multi'Jatiollal busi"ess:

currellt mesures alld trends {lntemational Fiscal Association. Ob. cit.. pág. 21 l.

2Q7

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

entidade, tributando toda e qualquer receita daquelas sociedades estrangeiras constituídas em países de baixa pressão fiscal.

Ainda, e de forma a evitar abusos e arbitrariedades, o legisla­dor deveria afastar a aplicação da norma caso o contribuinte com­provasse que as sociedades estrangeiras controladas tenham ativi­dades negociais, de modo a preservar a sua competitividade inter­nacional.

Por fim, cabe salientar que na forma como introduzida a nor­ma contra a postergação tributária internacional no Brasil, como regra estrutural que retira o véu da personalidade jurídica das em­presas ligadas estrangeiras para tributar o lucro das sociedades lo­calizas no exterior, no montante apurado antes da tributação no exterior (artigo 10, § 70, da Instrução Normativa SRF n.O 213, de 2002), o Imposto de Renda incide sobre o lucro auferido no exte­rior, e não sobre os rendimentos das controladoras brasileiras refe­rentes à distr~buição de lucros das empresas ligadas.

Sendo assim, verifica-se a incompatibilidade da regra brasi­leira com os tratados para evitar a bi-tributação firmados pelo Bra­sil, o que abre espaço para a adoção de planos tendentes ao estabe­lecimento de empresas holding nas jurisdições conveniadas ao Bra­sil para evitar a aplicação da regra, o que pode distorcer ainda mais as práticas empresariais.

Nos termos dos tratados em questão, compete apenas ao país de residência das empresas controladas e coligadas estrangeiras tri­butar a renda destas, nos termos do artigo 70 da Convenção Mode­lo da OCDE e das Nações Unidas, o que impede a desconsideração da personalidade jurídica destas empresas para alcançar os lucros apurados no exterior pelas sociedades ligadas263

Observe-se que caso a hipótese da legislação brasileira se res­tringisse ao combate de planejamentos fiscais objetivando a cana­lização de rendas em jurisdições de baixa pressão fiscal mediante a tributação corrente de rendas passivas acumuladas no exterior ou

263 BAKER. Philip. Double Taxation Conventions. 2. ed .• Sweet&Maxwell. 2002. pág. 1·2/32.

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de reservas de lucros mantidas no exterior, poder-se-ia argumentar que nos termos do artigo 10 destas convenções a norma poderia ser em tese aplicável a lucros ou rendimentos não distribuídos injustificadamente, mas não é isto que se verifica por meio do exame da regra de eliminação da postergação tributária internacional.

VI. CONCLUSÃO

Face à complexidade das operações transnacionais de comér­cio e investimento verificadas neste mundo globalizado, os Esta­dos necessitam de mecanismos para garantir a tributação da renda, mas sem que isto implique a perda de competitividade do país e o retardamento do desenvolvimento e crescimento da economia.

Neste cenário, a introdução de normas de Transparência Fis­cal Internacional se mostra necessária para reduzir os efeitos noci­vos de certos planejamentos tributários internacionais, e para tan­to, o § 2° introduzido no artigo 43 do Código Tributário Nacional, pela Lei Complementar nO 104, de 2000, flexibilizou a hipótese de

incidência possível do Imposto de Renda sobre lucros auferidos no exterior, para permitir a introdução de uma regra que restrinja a postergação tributária internacional aos casos em que não haja um

propósito negocial. A Medida Provisória nO 2.158-34, de 2001, ao pretender tri­

butar de forma corrente os hcros apurados por empresas ligadas

no exterior, acaba por agredir os Princípios Constitucionais da Isonomia e da Capacidade Ccntributiva ao pretender tributar lu­cros acumulados em sociedades estrangeiras coligadas, nas quais

a sociedade brasileira ligada não tenha poder para influenciar a distribuição de lucros, mas a Instrução Normativa SRF nO 213, de 2002, afasta esta abusiva exigência ao disciplinar a norma.

A regra de Transparência Fiscal Internacional ampliada pre­

vista na legislação tributária não se mostra razoável e necessita de

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

reparos para reduzir as nocivas distorções que vem causando às decisões negociais e os danos que vem sendo causados à competitividade das empresas brasileiras operando no exterior.

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Tributação da Renda em Universais - Tendências Atuais

LUCIANA ROSANOVA GALHARDO

Advogada em São Paulo Pós-graduada el'l Direito Tributário pela PUClSP

Mestre em Direito Tributário pela USP

JORGE NEY DE FIGUEIRÉDO LOPES JUNIOR

Advogado em São Paulo Engenheiro Civil pela Escola Politécnica da USP Especialista em Direito Tributário pela PUClSP

Mestrando em Direito Tributário Internacional pela New York University Schoolof Law (L.L.M.)

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

TRIBUlAÇÃO DA RENDA EM BASES UNIVERSAIS -TENDÊNCIAS AlUAIS

I. INTRODUÇÃO

Até o fim de 1995, a tributação da renda auferida pelas pessoas jurí­dicas brasileiras estruturava-se segundo o chamado princípio da territorialidade da renda, alcançando apenas acréscimos patrimoniais pro­duzidos em território nacional. Eventuais lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior por sociedades brasileiras estavam fora da incidência do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (UIRPJ").

Em 26.12.1995, o Governo Federal editou a Lei no9.249 ("Lei 9.249/95"), determinando que, a partir de 1.1.1996, a renda das pes­soas jurídicas brasileiras passaria a ser tributada em bases universais, isto é, abrangendo igualmente lucros, rendimentos e ganhos de ca­pital auferidos no País ou no exterior.

Nos moldes estabelecidos pela Lei 9.249/95, ficariam sujeitas à tributação no País as rendas diretas e indiretas auferidas no exterior pelas sociedades brasileiras. As rendas diretas, vale dizer, são aquelas decorrentes de negócios realizados no exterior pela sociedade brasilei­ra, em nome próprio, tais como rendimentos ou ganhos de capital. Já as rendas indiretas correspondem àquelas auferidas por intermédio de suas filiais, sucursais e subsidiárias estrangeiras, controladas ou coliga­

das, ou seja, os lucros auferidos por tais entidades no exterior.

A mudança na legislação fiscal foi adequada para fazer valer a

tributação da renda externa direta da pessoa jurídica brasileira, ali­nhando-a ao princípio da universalidade da renda, mas o mesmo não se pode dizer em relação à tributação da renda indiretamente auferida no exterior.

Instituída de forma precária pela Lei 9.249/95, a sistemática de tributação dessa renda indireta, ou seja, dos lucros auferidos por con­troladas ou coligadas de empresas brasileiras no exterior, sofreu inú-

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meras modificações em diferentes atos normativos editados pelo Governo Federal ao longo da última década.

Em torno de tais modificações e de seus efeitos jurídicos, acirra­dos debates se travam ainda hoje entre fisco e contribuintes nas esferas administrativa e judicial. Em linhas gerais, as principais controvérsias referem-se às situações em que os lucros auferidos por controladas ou coligadas no exterior podem ser considerados disponibilizados à socie­dade brasileira para fms de sua tributação no País.

Atualmente, chamam atenção às tentativas das Autoridades Fazendárias de engendrar novos meios de caracterizar atos e negócios praticados pelos contribuintes como hipóteses legais de disponibilização de lucros. Com efeito, algumas das discussões mais conhecidas sobre a matéria têm origem em pretensões do fisco fede­ral que, desprovidas da necessária base legal, têm sido rejeitadas pela jurisprudência administrativa e judicial. Em uma espécie de resposta a essa tendência jurisprudencial, as recentes autuações fiscais na área têm trazido interpretações inusitadas aos dispositivos legais em vi­gor, buscando tributar lucros auferidos e retidos por sociedades con­troladas ou coligadas no exterior, mas jamais disponibilizados à pes­soa jurídica brasileira. É o que se pretende examinar a seguir.

II. BREVE HISTÓRICO LEGISLATIVO

11.1. LEI 9.249/95

A Lei 9.249/95, em seu artigo 25, determinava que os lucros,

rendimentos e ganhos de capital auferidos por sucursais, filiais, con­troladas e coligadas da pessoa jurídica brasileira no exterior deveriam ser computados na determinação de seu lucro real no balanço levan­

tado em 31 de dezembro de cada ano. Olvidou-se o legislador, na ocasião, de que sociedades contro­

ladas e coligadas estrangeiras constituem entidades independentes da sociedade brasileira, dotadas de personalidade jurídica e patrimônio

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIOICA

próprios e autônomos. Assim, ainda que os lucros auferidos por tais sociedades no exterior representem uma expectativa de direito da sociedade brasileira, certo é que esse direito não se concretiza antes de praticados os atos jurídicos que impliquem a efetiva transferência dos lucros em favor da sociedade brasileira264

Somada essa premissa às disposições do artigo 43 do Código Tributário Nacional (CTN) à época, que não continha ainda o seu atual § 2° e as controvérsias dele decorrentes, era fácil ver que a Lei 9.249/95 era ilegal e inconstitucional no tocante à sua pretensão de tributar os lucros auferidos por controladas ou coligadas no exterior antes mesmo de sua disponibilização, jurídica ou econômica, à socie­dade brasileira.

11.2. lN 38/96

Na tentativa de sanar a ilegalidade da Lei 9.249/95 nesse parti­cular, o Poder Executivo editou, em 27.6.1996, a Instrução Normativa nO 38 (lN 38/96), estabelecendo que a tributação de lucros auferidos por controladas ou coligadas de sociedades brasileiras no exterior

somente ocorreria quando verificada a disponibilização desses lu­cros à pessoa jurídica brasileira. Em paralelo, a lN 38/96 trouxe uma lista descrevendo taxativamente as hipóteses em que esses lucros se­riam considerados disponibilizados à empresa brasileira.

Além de pretender corrigir os vícios de uma lei sem ocupar o mesmo patamar hierárquico para tanto, o que não podia ser admiti-

264 Alberto Xavier. a esse respeito. leciona: "Ora. é inequívoco que os lucros auferidos pelas pessoas jurídicas. enquanto não forem objeto de atos que formalizem a sua retirada do respectivo património. continuam a pertencer a esta pessoa jurídica e não a seus acionistas ou sócios. Estes têm. é certo. uma expectativa de direito sobre aqueles lucros. os quais porém não se transferem para os respectivos patrimõnios enquanto não praticados os atos jurídicos adequados à deslocação jurídica dos lu­cros do património das sociedades estrangeiras para o património da sociedade bra­sileira" (Alberto Xavier. Direito Tributário Internacional do Brasil. 6" ed. Rio de Ja­neiro. Forense. 2004. pág. 444)

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

do, a lN 38/96 revelou-se também uma tentativa da Administração Fazendária de estabelecer, segundo o seu próprio entendimento e sem o imprescindível amparo legal, hipóteses de disponibilização de lucros auferidos por controladas ou coligadas de sociedades brasilei­ras no exterior.

Não obstante, como é sabido, doutrina e jurisprudência majori­tárias rejeitaram a possibilidade de "correção" da Lei 9.249/95, uma lei ordinária, pela lN 38/96, norma secundária de direito. Além dis­so, as hipóteses de disponibilização trazidas pela lN 38/96 careciam de base legal para serem aplicadas, gerando-se à época um consenso no sentido de que a edição da lN 38/96 não havia regularizado a sistemática de tributação da renda indireta de pessoas jurídicas bra­sileiras em bases universais.

11.3. LEI 9.532/97

Diante desse cenário, em 10.12.1997, o Governo Federal pu­blicou a Lei n° 9.532 (Lei 9.532/97), fruto da conversão da Medida Provisória n° 1.602, de 14.11.1997 (MP 1.602/97), determinando que os lucros auferidos no exterior por meio de controladas ou coli­gadas seriam computados na determinação do lucro real da pessoa jurídica brasileira, no balanço de 31 de dezembro do ano-calendário em que esses lucros fossem disponibilizados para essa pessoa jurídica

brasileira. Em complementação, a Lei 9.532/97 enumerou, taxativamente,

as hipóteses em que os lucros" uferidos no exterior por meio de con­troladas ou coligadas seriam co'lsiderados legalmente disponibilizados

à sociedade brasileira, para fins de sua tributação no País. Válida e eflcaz para tributar lucros auferidos no exterior a partir de

1.1.1998, em obediência aos prinápios da anterioridade e irretroatividade, a Lei 9.532/97, contudo, não convalidou todas as hipóteses de

disponibilização que indevidamente constavam da lN 38/96. Ao contrário, dentre os eventos impropriamente trazidos pela

lN 38/96 como hipótese de disponibilização de lucros auferidos no

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

exterior, quatro situações deixaram de ser incluídas pela Lei 9.532/ 97 entre aquelas válidas para caracterizar a disponibilização desses lucros e a sua conseqüente tributação no Brasil, a saber:

(i) encerramento das atividades da controlada ou coligada no exterior (artigo 2°, § 5° da lN 38/96);

(ii) absorção de patrimônio de sociedades estrangeiras por socie­dades brasileiras em virtude de incorporação, fusão ou cisão (artigo 2°, § 7° da lN 38/96);

(iii) absorção de patrimônio de sociedade controlada ou coliga­da por sociedade sediada no exterior (artigo 2°, § 3° da lN 38/96); e

(iv) alienação da participação societária em controlada ou coli­gada no exterior (artigo 2°, § 9° da lN 38/96).

O entendimento uníssono da doutrina, posteriormente confir­mado pela jurisprudência majoritária, era no sentido de que somen­te as situações expressamente descritas na Lei 9.532/97 poderiam caracterizar a disponibilização de lucros auferidos no exterior por controladas ou coligadas de sociedades brasileiras. Essa lei, ressalte­se, foi editada com o declarado objetivo de sanar os vícios contidos nos normativos que até então regulavam a tributação da renda em bases universais (Lei 9.249/95 e lN 38/96), conforme se verifica em sua Exposição de Motivos265

Os quatro eventos supramencionados permanecem, ainda hoje, carentes do necessário amparo legal que autorize sua aplicação e não

265 A Exposição de Motivos da Medida Provisória n° 1.602197 (posteriormente conver· tida na Lei 9.532/97) trazia o seguinte texto:"O artigo I o do projeto refere·se às hipó­teses em que os lucros auferidos por filiais, sucursais, controladas ou coligadas de empresas brasileiras no exterior são considerados disponíveis para investidora no Brasil. Essa definição é importante do ponto de vista tributário, tendo em vista que o fato gerador do imposto de renda, na hipótese desses rendimentos, ocorre com a disponibilização dos lucros auferidos no exterior." No mesmo sentido, o Sr. Roberto Brant, deputado relator do projeto de conversão da MP 1.602197 na Lei 9.532/97, declarou:"O artigo I o resolve um problema de ordem jurídica constatado na execu­ção da recente e complexa legislaçãO sobre a matéria, aprovada pela Lei n° 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Verificou-se que o fato gerador do imposto de renda, na hipótese desses rendimentos, ocorre com a disponibilização dos lucros auferidos no exterior."

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

podem ser invocados para tributar tais lucros no Brasil, sob pena de violação dos princípios constitucionais tributários da estrita legali­dade, da tipicidade fechada e da reserva absoluta de lei.

Além disso, a Lei 9.532/97 não pode tributar lucros gerados

nos anos-calendário de 1996 e 1997 (antes de sua vigência), já que

tais lucros se submetem à legislação vigente no período em que fo­

ram gerados, conforme esclarecido pelo Coordenador-Geral do Sis­

tema de Tributação da Receita Federal no Ato Declaratório

(Normativo) nO 49, de 23.9.1994 ("ADN 49/94"), abaixo transcrito:

"Declara, em caráter normativo às Superintendências Re­gionais da Receita Federal e aos demais interessados, que:

I - os dividendos, bonificações em dinheiro, lucros e outros interesses, oriundos de lucros apurados, até 31 de dezem­bro de 1993, por pessoas jurídicas tributadas com base no lucro real submetem-se às normas de incidência aplicáveis

à época de formação dos lucros~

II - o disposto no item anterior aplica-se também aos lu­cros e dividendos redistribuídos por pessoas jurídicas, auferidos em decorrência de participação societária em outra pessoa jurídica, que os tenha apurado até 31 de de­

zembro de 1993;

III - em qualquer hipótt:se, será considerada época da for­mação dos lucros aquela constante dos registros da primei­ra pessoa jurídica que o~ tenha apurado." (não destacado no

origina/)

Desse modo, o País somente dispõe de amparo legal válido

para tributar os lucros gerados no exterior a partir de 1.1.1998, se e

quando esses lucros forem efetivamente disponibilizados à pessoa

jurídica brasileira.

217

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

11.4. MP 1.858-6/99 - CSL

Em 29.6.1999, foi publicada a Medida Provisória nO 1.858-6 ("MP 1.858/99"), sucessivamente reeditada até a atual Medida Pro­visória nO 2.158-35, de 24.8.2001 ("MP 2.158/01"), estabelecendo que os rendimentos, ganhos de capital e lucros auferidos no exterior passariam a ser tributados no Brasil também pela Contribuição So­cial sobre o Lucro Líquido ("CSL").

Considerada a anterioridade nonagesimal, prevista para as con­tribuições sociais, somente a partir de outubro de 1999 é que os lu­cros auferidos (gerados a partir desta data) por pessoas jurídicas bra­sileiras no exterior, por meio de sociedades controladas, passaram a ser tributados pela CSL.

Nessa oportunidade, ressalte-se, embora editasse ato normativo com força de lei a respeito da mesma matéria, o Governo Federal novamente deixou de incluir as quatro hipóteses de disponibilização de lucros dadas exclusivamente pela lN 38/96, as quais permaneciam sem amparo legal e impassíveis de serem aplicadas.

11.5. LEI 9.959/00

No ano de 2000, com a edição da Lei n° 9.959, de 27.1.2000 ("Lei 9.959/00"), resultante da conversão em lei da Medida Provisó­ria nO 1.924, de 7.10.1999 ("MP 1.924/99"), a legislação sobre a matéria foi mais uma vez modificada. Nos termos de seu artigo 3°, duas novas situações foram acrescentadas às então vigentes hipóte­ses legais de disponibilização de lucros auferidos por controladas ou coligadas no exterior à sua controladora brasileira, a saber:

Ue} na hipótese de contratação de operações de mútuo, se a

mutuante, coligada ou controlada possuir lucros ou reser­vas de lucros;

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(OOROENAÇÁO: PEDRO ANAN JR.

d) na hipótese de adiantamento de recursos, efetuado pela

coligada ou controlada, por conta de venda futura, cuja liqui­dação, pela remessa do bem ou serviço vendido, ocorra em prazo superior ao ciclo de produção do bem ou serviço."

Com a adição dessas novas hipóteses, o Governo Federal quis impedir que operações de mútuo ou de adiantamento de recursos por conta de venda futura pudessem servir de base para o pagamento de lucros a empresas brasileiras por suas controladas ou coligadas estrangeiras.

Vale notar que são igualmente questionáveis a constitucionalidade e a legalidade dessas duas novas hipóteses de disponibilização de lu­cros acrescentadas pela Lei 9.959/00, que pretendem tratar como tributáveis pelo IRPJ situações que não representam qualquer acrésci­mo patrimonial para a pessoa jurídica brasileira, em clara afronta às disposições do artigo 43 do CTN. 266

Porém, o caso é representativo para ilustrar uma ocasião em que, ao deparar-se com eventos que entendia deviam também carac­terizar a disponibilização de lucros auferidos no exterior, o Governo Federal tratou prontamente de adicioná-los às demais hipóteses le­gais em vigor, por meio de uma Medida Provisória subseqüente­mente convertida em lei. Logo, a despeito de eventual questionamento sobre a conformação constitucional e legal do con­teúdo de cada uma das novas hipóteses trazidas pela Lei 9.959/00, é cediço que não há qualquer v lcio formal a lhes obstar a aplicação,

pois que adentraram o ordenamento jurídico por meio de veículos

normativos com força de lei.

266 Sobre o assunto, Alberto Xavier declara: "Com efeito, nas operações de crédito atrás referidas não ocorre qualquer acréscimo patrimonial, uma vez que os valores credi­tados são simultaneamente registrados no ativo, como caixa, e no passivo, como exigibilidade de valor rigorosamente idêntico, correspondente à obrigação de resti­tuir a quantia mutuada ou de entregar o bem ou serviço cuja entrega futura foi con­tratada. Trata-se, por conseguinte, de inconstitucional tributação sobre a renda ou capital" (Alberto Xavier, Direito Tributário Internacional do Brasil, 6' ed. Rio de

Janeiro, Forense, 2004, pág. 462)

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDlCA

De forma oposta, as quatro hipóteses de disponibilização de lucros trazidas somente pela lN 38/96 permaneceram no nível infralegal, isto é, sem constar de qualquer lei que as pudesse vali­dar. É digno de nota o fato de que, mesmo em face da oportunida­de representada pela edição da Lei 9.959/00, o Governo Federal optou por deixar de incluir essas viciadas situações entre as hipóte­ses legalmente válidas de disponibilização de lucros à pessoa jurí­dica brasileira.

11.6. LC 104/01 - ALTERAÇÃO DO ARTIGO 43 DO ClN

Em 10.1.2001, foi editada a Lei Complementar nO 104 ("LC

104/01"), que alterou importantes dispositivos do CTN, dentre os quais o artigo 43. Preparando o terreno para tentar introduzir no País a disponibilização automática de lucros auferidos no exterior ao fim de cada ano-calendário, a LC 104/01 acrescentou ao artigo

43 o seu parágrafo 2°, segundo o qual caberá à lei estabelecer as condições e o momento em que se dará a disponibilidade de "recei­

tas ou rendimentos oriundos do exterior", para fins de incidência

do imposto sobre a renda.

11.7 MP 2.158/01

Com base no recém-introduzido § 2° do artigo 43 do CTN,

o Poder Executivo editou a MP 2.158/01, alterando mais uma vez

o critério de tributação dos lucros auferidos no exterior por socie­

dades controladas ou coligadas de empresas brasileiras. Dispõe o

artigo 74 da referida medida provisória:

"Art. 74. Para fim de determinação da base de cálculo do imposto de renda e da CSLL, nos termos do art. 25 da Lei n° 9.249, de 26 de dezembro de 1995, e do art. 21 desta Medida Provisória, os lucros auferidos por contro­lada ou coligada no exterior serão considerados disponibilizados para a controladora ou coligada no Bra-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

sil na data do balanço no qual tiverem sido apurados, na forma do regulamento.

Parágrafo único. Os lucros apurados por controlada ou coliga­

da no exterior ati 31 de dezemhro de 2001 serão considerados

disponihi/izados em 31 de dezemhro de 2002, salvo se ocorri­

da, antes desta data, qualquer das hipóteses de disponihilização

previstas na legislação em vigor." (não destacado no original)

Em poucas palavras, a MP 2.158/01 determinou que os lu­cros auferidos no exterior por controladas ou coligadas devem ser oferecidos à tributação no Brasil quando do encerramento do perí­odo-base em que foram apurados, ou seja, independentemente de sua efetiva disponibilização jurídica ou econômica à pessoa jurídi­ca brasileira.

A constitucionalidade do dispositivo, contudo, é questionável. A alegação do Governo Federal é a de que a disponibilização auto­mática de lucros no fim de cada período-base corresponderia à elei­ção, pela lei, do momento em que tais lucros seriam disponibilizados à sociedade brasileira, a teor do recém-introduzido artigo 43, § 2°

do CTN. Não nos parece a melhor interpretação. O artigo 43, caput, do

CTN dispõe que o fato gerador do imposto de renda é a aquisição de disponibilidade jurídica ou econômica da renda267 O § 2° des­se dispositivo, portanto, deverá ser entendido à luz das disposições do caput, ou seja, ainda que a lei seja dado definir as condições e o

267 Bulhões Pedreira leciona que "( ... ) disponibilidade econõmica é o poder de dispor efetivo e atual, de quem tem a posse direta da renda. Em regra, a renda consiste em moeda, quem aufere renda adquire dinheiro, que é domínio de moeda; e o fato que caracteriza a aquisição da disponibilidade econõmica da renda é a aquisição da posse de moeda ( ... )." Em relação à disponibilidade juridica. disciplina que "( ... ) é a presu­mida por força de lei, que define como fato gerador do imposto a aquisição virtual. e não efetiva, do poder de dispor de renda. A disponibilidade é virtual quando já ocor­reram todas as condições necessárias para que se torne efetiva ( ... )." (Bulhões Pedrei­ra, Imposto sobre a Renda Pessoas Jurídicas, Volume I, justec-Editora LIda., 1979.

págs. 196 e 197)

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

momento em que os lucros auferidos no exterior serão considera­dos disponibilizados à pessoa jurídica brasileira, não se pode per­der de vista que essa definição deve ater-se estritamente às situa­ções em que se verifique a disponibilização jurídica ou económica da

renda268

Ademais, independentemente da interpretação que se dê ao artigo 43, § 2° do CTN, é forçoso reconhecer que não se pode tribu­tar como renda aquilo que não representa qualquer forma de acrés­cimo patrimonial para a pessoa jurídica brasileira269 Se os lucros auferidos no exterior permanecem retidos na sociedade controlada ou coligada estrangeira, não há que se falar em disponibilização au-

268 Ricardo Mariz de Oliveira é preciso: "Mais ainda, considerando a unicidade orgânica que os parágrafos formam com o "caput" do artigo, a norma do § 2° e a de qualquer lei editada sob sua tutela devem estar em consonância com o disposto na cabeça do art. 43, que, esta sim, conserva paridade com a realidade das coisas, com o ordenamento jurídico integral e, principalmente, com os limites do poder de tribu­tar." (Ricardo Mariz de Oliveira, Revista Dia/ética de Direito Tributário nO 73, Dialética, 2001, pág. 115)

269 Já comentamos nesse sentido: "Rubens Gomes de Souza103(Pareceres - 3 -Imposto de Renda, São Paulo: Resenha Tributária, 1976, p. 277 e ss.). ao comentar o artigo 43 do CTN, esclarece que em se tratando tanto de 'renda' como de 'proventos', o elemen­to essencial do fato gerador é a aquisição da disponibilidade de riqueza nova, defini­da em termos de acréscimo patrimonial. Essa circunstância - de tratar-se de riqueza nova - está implícita, no caso de 'renda', na palavra 'produto' (CTN, art. 43,1), que envolve a noção de algo novo produzido por, ou seja, decorrente de algo existente: a fonte produtora (capital, trabalho ou combinação de ambos). Por outro lado, no caso dos 'proventos', aquela mesma circunstância - de tratar-se de riqueza nova -está expressamente referida (CTN, art. 43, I) em termos, como disse, de 'acréscimos patrimoniais'. O imposto incide, portanto, sobre a renda e os proventos de qualquer natureza, assim entendidos como acréscimos patrimoniais, à medida que venham a ser auferidos. Para tanto, deve ser adquirida a disponibilidade sobre tais montantes, que pode ser 'económica' ou 'jurídica'. A disponibilidade económica é a sua efetiva percepção em dinheiro ou outros valores. A disponibilidade jurídica ocorre quando, embora a renda não esteja 'economicamente disponível' (isto é, efetivamente perce­bida). o beneficiário já tenha o título hábil para percebê-Ia e dela dispor. Rubens Gomes de Souza esclarece ainda, que a disponibilidade económica envolve automa­ticamente a jurídica; mas a recíproca pode não ser verdadeira; certo é que a aquisição de qualquer daqueles tipos de disponibilidade basta para configurar o fato gerador, isto é, para dar lugar à incidência do imposto." (Luciana Rosanova Galhardo, Rateio

de Despesas no Direito Tributário, Quartier Latin 2004, págs. 126 e 127)

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

tomática desses lucros, sob pena de afronta ao artigo 43 do CTN, bem como ao artigo 153, inciso III da Constituição Federal.

Pode ocorrer de a sociedade controlada ou coligada no exterior auferir lucros em um determinado exercício fiscal e, no período-base subseqüente, utilizar esses lucros para investir em um novo projeto ou atividade no exterior. Se esse novo investimento não for capaz de proporcionar o retorno de todo o valor investido, é fácil concluir que a pessoa jurídica brasileira jamais receberá os lucros que original­mente esperava receber dessa sua controlada ou coligada estrangeira.

Esse é só um dos exemplos com que se pode ilustrar o fato de que a sociedade controlada ou coligada no exterior é, antes de tudo, uma pessoa jurídica autônoma e independente da sua controladora ou coligada no Brasil. Portanto, ainda que se admitisse a desconsideração de sua personalidade jurídica pela lei fiscal brasilei­ra, o que já seria discutível, é notório que é indevida a tributação de lucros auferidos no exterior sem que a sociedade estrangeira tenha efetivamente praticado ato jurídico que implique a transferência des­ses lucros para o patrimônio da sociedade controladora ou coligada brasileira. Caso contrário, em manifesta afronta ao artigo 153, inciso III da Constituição Federal, a tributação recairá sobre uma mera ex­pectativa de direito (que pode jamais se materializar), não sobre qual­

quer forma de renda. Qyestão semelhante, ressalte-se,já foi objeto de apreciação pelo

Plenário do STF. O artigo 35 da Lei 7.713, de 22.12.1988 (Lei 7.713/ 88), considerava automaticamente distribuído o lucro aos acionistas

ao final do período-base, par:1 fins de incidência do Imposto sobre o Lucro Líquido (ILL), o lucru apenas auferido, mas não distribuído, pelas sociedades. O Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou

a inconstitucionalidade de referido artigo 35, sob o argumento de ser impossível a presunção de distribuição dos lucros, por violação

expressa do artigo 43 do CTN. Na ocasião, concluiu o STF que a aquisição de disponibilidade

econômica ou jurídica dos lucros da sociedade não ocorre na data de

sua mera apuração (encerramento do período-base), sobretudo por­que a Lei 6.404, de 15.12.1976 (Lei das S.A.) afasta a presunção de

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

distribuição automática de lucros, indispensável para que se cogite da aquisição da disponibilidade da renda270

A constitucionalidade do artigo 74 da MP 2.158/01 também entra em xeque quando se examina sua pretensão de tributar lucros auferidos anteriormente à sua própria vigência. Considerando que o resultado direto da disponibilização automática de lucros dada pela MP 2.158/01 é a tributação desses lucros no Brasil, essa norma de­veria, ao menos, ter estabelecido que a disponibilização automática dos lucros auferidos no exterior abrangeria apenas os lucros auferidos (gerados) após 1.1.2002, sob pena de ofensa aos princípios constitu­cionais da anterioridade e irretroatividade.

Encontra-se em trâmite, no STF, a Ação Direta de Inconstitucionalidade nO 2.588, movida pela Confederação Nacio­nal das Indústrias - CNI, argüindo a inconstitucionalidade do arti­go 74 da MP 2.158/01. Até o momento, contudo, o dispositivo per­manece em vigor e continua a ser aplicado.

270 Confira-se o seguinte trecho do voto do Exmo. Ministro Marco Aurélio Mello: U( ... ) O encerramento do período-base aponta-o. mas o faz relativamente à situação que não extravasa o campo de interesse da própria sociedade. Ocorre. é certo. uma expec­tativa. mas. enquanto simples expectativa. longe fica de resultar na aquisição da dis­ponibilidade erigida pelo art. 43 do Código Tributário Nacional como fato gerador. Uma coisa é a incidência do imposto de renda sobre o citado lucro e. portanto. a obrigação tributáril da própria pessoa jurídica. Algo diverso é a situação dos sócios. no que não passam. com a simples apuração do lucro líquido na data do encerra­mento do período-base. a ter a disponibilidade reveladora do fato gerador. Imagine­se. apenas para exemplificar. quadro em que a assembléia de acionistas. respeitado o percentual alusivo aos dividendos obrigatórios. resolva promover investimentos. Descabe. na hipótese. partir para o campo da presunção. equiparando a apuração do lucro líquido à distribuição deste. ou mesmo. à aquisição da disponibilidade pelos sócios. ~ que o recurso a tal método normativo da presunção legal pressupõe harmonia com os princípios norteadores do direito. especialmente do direito consti­tucional e. mais do que isso. também com os princípios lógicos da identidade. não­contradição e do terceiro excluído. Os lucros apurados em balanço de pessoa jurídica integram o património desta e não dos sócios. já que estes. considerados isolada­mente. deles não dispõem. quer sob o ângulo económico. quer. até mesmo. sob o jurídico. ( ... ) A aquisição da disponibilidade. quer sob o ângulo económico ou jurídi­co do rendimento. há de estar assentada no poder daquele que se beneficiou do acrés­cimo patrimonial dele dispor efetivamente. Conforme exsurge da Lei das Sociedades Anónimas. a apuração. em si. do lucro líquido pela pessoa jurídica não revela a dis­ponibilidade pelos sócios.( ... )"

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COORDENAÇAO: PEDRO AAAN JR.

A par de toda a problemática atinente à disponibilização auto­mática de lucros, importa ressaltar que permanecem aplicáveis as hi­póteses legais de disponibilização de lucros auferidos no exterior, da­das pela Lei 9.532/97 e pela Lei 9.959/00. Em verdade, a disponibilização automática de lucros ao final de cada período-base, imposta pelo artigo 74 da MP 2.158/01, somente alcança os lucros que não tenham sido de outra forma disponibilizados à pessoa jurídi­ca brasileira, segundo as hipóteses legais de disponibilização em vigor.

Por esse motivo, é curioso notar que, mais uma vez, mesmo alterando profundamente a sistemática de tributação da renda da pessoa jurídica brasileira em bases universais, por meio de uma lei complementar e de uma medida provisória (LC 104/01 e MP 2.158/ 01), o Governo Federal deixou de incluir as quatro situações trazidas exclusivamente pela lN 38/96 entre as hipóteses legitimamente vá­lidas para caracterizar a disponibilização de lucros auferidos no ex­

terior à sociedade brasileira.

11.8. lN 213/02

Em 7.10.2002, com o pretexto de compilar toda a legislação referente à tributação de lucros, rendimentos e ganhos de capital auferidos no exterior pelas pessoas jurídicas domiciliadas no País, a Secretaria da Receita Federal editou a Instrução Normativa nO 213

(lN 213/02), que revogou e Sl bstituiu a lN 38/96. Todavia, em lugar de contribuir para a consolidação e regula­

mentação da legislação tribUl ária em vigor, como é a função dos normativos infralegais editadc s pela Secretaria da Receita Federal, a lN 213/02 foi muito além de seus limites hierárquicos.

Ao listar as hipóteses que caracterizam a disponibilização de

lucros auferidos no exterior à sociedade brasileira, a lN 213/02 per­petuou o grave dano causado pela lN 38/96 e manteve integralmen­

te, sem nenhum amparo legal, as quatro situações que até então so­mente haviam sido trazidas pela lN 38/96 como hipóteses de

disponibilização desses lucros.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Nova irregularidade: tributação, sem base legal, da equivalência patrimonial de investimentos detidos no exterior

Como se não bastasse, a lN 213/02 incorreu em novas irregu­laridades, dispondo que os resultados positivos de equivalência patrimonial da pessoa jurídica brasileira em relação ao investimento detido em sociedades controladas ou coligadas no exterior deveriam ser considerados no balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano-calendário para fins de determinação do lucro real e da base de

cálculo da CSL. Contudo, a legislação fiscal em vigor jamais contemplou hipó­

tese de incidência do IRPJ e da CSL sobre os resultados positivos de equivalência patrimonial. Muito ao contrário, o artigo 23 do Decre­to-lei n° 1.598, de 26.12.1977 (Decreto-lei 1.598/77) e o artigo 10, inciso IV, do Decreto-lei na 1.648, de 18.12.1978 (Decreto-lei 1.648/ 78), incorporados ao artigo 389 do Decreto na 3.000, de 26.3.1999 -Regulamento do Imposto de Renda de 1999 (RIR/99), determinam

que a contrapartida dos ajustes resultantes da aplicação do método da equivalência patrimonial não será computada na determinação

do lucro real. Ora, é evidente que o artigo 70 da lN 213/02 não

poderia dispor de forma oposta. Nem se alegue que essa previsão teria por base a MP 2.158/01,

pois que a medida provisória trata meramente da disponibilização de "lucros" à sociedade brasileira. Os resultados positivos de equiva­

lência patrimoniap71 englobam não só os lucros, mas também ou­

tros valores derivados de fenômenos que influenciam positivamente

271 Rutnéa Navarro Guerreiro e Sérgio Murilo Zalona Latorraca. atualizando a obra de Nilton Latorraca. ensinam que "( ... ) o resultado da avaliação de investimentos pelo valor do patrimônio líquido compreende tanto os lucros ou os prejuízos apurados nas controladas ou coligadas. como os ganhos ou perdas que a investidora tenha obtido pelo simples fato de possuir os investimentos. ganhos e perdas destes cuja apuração decorre obrigatoriamente da aplicação desse método de avaliação de in· vestimento. (. .. )" (Nilton Latorraca. Direito Tributário· Imposto de Renda das Em· presas. São Paulo. Ed. Atlas. 15' edição. 2000. pág. 535). Da mesma forma. concluem que a variação cambial de investimento no exterior é parte integrante dos resultados da avaliação de investimentos pelo valor de patrimônio líquido ( pág. 371).

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

o patrimônio líquido da sociedade controlada ou coligada no exte­rior, tais como a flutuação cambial do período ou eventual subscri­ção de capital da sociedade estrangeira efetuada com ágio por um outro sócio no exterior.

Em outras palavras, o método de equivalência patrimonial é

técnica contábil destinada a refletir, na sociedade investidora, o valor das contas integrantes do patrimônio líquido da sociedade investida (capital, reservas de capital, reserva de lucros e lucros acumulados). Na hipótese de a sociedade investida, controlada ou coligada, en­contrar-se situada no exterior, esse reflexo sofrerá também os efeitos de eventual variação cambial ocorrida no período.

Não restam dúvidas de que a tributação dos resultados positi­vos de equivalência patrimonial não encontra previsão na legislação fiscal em vigor e, portanto, sua instituição constituiria nova hipótese de incidência tributária. Por outro lado, é sabido que essa instituição não pode ser feita por meio de instrução normativa272 Ciente deste

vício, que já vinha motivando decisões judiciais favoráveis aos con­tribuintes273 , o Governo Federal fez incluir no texto do projeto de

272 O STF já teve a oportunidade de se manifestar acerca do caráter secundário das Ins­truções Normativas. Ao tratar da natureza e função dos atos infra-legais, no julga­mento do Agravo Regimental em Ação Direta de Inconstitucionalidade nO 365/DF. cujo Relator foi o I. Ministro Celso de Mello, o Plenário do STF assim decidiu: "( ... l As Instruções Normativas, editadas por órgão competente da administração tributá­ria, constituem espécies jurídic.ls de caráter secundário, cuja validade e eficácia re­sultam, imediatamente, de sua estrita observância dos limites impostos pelas leis, tratados, convenções internacionais, ou decretos presidenciais, de que devem consti­tuir normas complementares. fssas Instruções nada mais são, em sua configuração jurídico-formal, do que provim ,ntos executivos cuja normatividade está diretamen­te subordinada aos atos de natu eza primária, como as Leis e as Medídas Provisórias, a que se vinculam por um claro nexo de assessoriedade e de dependência ( ... )."

273 Apesar de recente, a lN 213/02 já teve sua legalidade examinada em sede liminar pela D. Juíza Federal da 20' Vara da Seção Judiciária de São Paulo nos autos do Mandado de Segurança 2003.6\.00.000331-3, illl'erbis:"A mell ver, tal 'lei' (IlO caso, a MP 2158) deve ser illterpretada segllndo o 'caput' do artigo 43 do CTN, vale dizer, ainda que tenha a atribuição de determinar o momellto da disponibilidade, não pode desprel1-der-se do conceito de acréscimo patrimonial. E acréscimo patrimonial só ocorre quando o resultado positivo ingressa, efetivamente, no património do seu titu~ar. Ora, é sabido que o resultado positivo auferido pode receber d,versas destlllaçoes, entre as quais a distribuição aos acionistas. Neste caso, e apellas aqui, é que deve

haver incidência do Imposto de Renda. Como bem afirmado pelo lmpetrante na

petição inicial, 'pode ser até mesmo que os lucros ncm se tornem renda da empresa

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

brasileira por opção da pessoa jurídica estrangeira, que é pessoa jurídica diversa da Impetrante' (fi. 08). Desta feita, entendo que o artigo 74 da MP 2.158 fere o artigo 43 do CTN, não podendo prosperar, em respeito ao princípio da estrita legalidade. Su­pOllhamos, então, que o § 2° constitua uma exceção à regra geral prevista no 'caput: permitindo, assim, que a receita ou rendimerJto oriundos do exterior tenham trala­mellto distinto. Ainda assim, entendo que o artigo 74 da MP 2158 não atmdeu às diretrizes da lei complementar (CTN). É que o próprio § 2" fala em 'disponibilidade', definida como 'a qualidade daquilo de que se pode dispor. em viril/de do que se diz que é alienável' (Vocabulário Jurídico, De Plácido e Silva, 17" edição, Ed. Forense, pág. 280). Ora, o resultado positivo obtido na balanço da empresa sediada no exteri­or não pode ser disposto à sociedade brasileira, sem que haja destinação para tanto. Já o parágrafo lÍnico do artigo 74, em questão, afronta, neste exame preliminar, o

princípio da irretroatividade tributária, ao alcallçar fatos praticados antes da sI/a vi­gência (lucros obtidos até 31 de dezembro de 2001). Com efeito, referidos lucros devem obedecer à legislação vigente à época de sua ocorrência (Leis nOs 9249/96 e

9532/97, cOllforme o caso). Por fim, foi editada a Instrução Normativa SRF nO 213/ 02, a fim de regulamentar o artigo 74 da MP 2158, determinando a tributação dos

resultados positivos de equivalência patrimonial em coligadas e controladas na exte­

rior de pessoas jurídicas brasileiras. Em princípio, quer parecer que a regulamenta­ção desbordou de seus limites, vez que há lei dispondo em sentido contrário (Decre­

to-lei nO 1598/77, Decreto-lei nO 1648/78 e Decreto n° 3000/99), estipulando que tais

resultados positivos não devem ser adicionados às bases de cálCl/lo do IRPJ e da CSLL.

O mesmo raciocínio elaborado com relação à dispollibilização do II/cro para fills de Imposto de Renda é válido para a CSLL. Presente a plausibilidade do direito invoca­

do, vislumbro, ainda, o 'periCl/lum in mora; considerando a data de recolhimento

das exações (31 de janeiro). Isto posto, CONCEDO A LIMINAR, a fim de suspellder

a exigibilidade do crédito tributário de IRPJ e CSL relativo aos lucros aCl/mulados pelas sociedades estrangeiras até sua efetiva disponibilização, bem como os lucros

futuros que permanecerem acumulados pelas sociedades estrangeiras, até a efetiva

disponibilização para a Impetrante, impedindo ainda que as DD. Autoridades Admi­

nistrativas pratiquem qualquer ato tendente à imposição de penalidades pelo fato de

a Impetrante não recolher no próximo dia 31 de jmleiro o IRPJ e a CSL nos termos

do artigo 74, capl/t e parágrafo lÍnico da MP 2158-35/2001, mantendo-se a sistemá­

tica da Lei ,,0 9532/97 (artigo 1·). Determino, ainda, seja afastada a aplicação do

artigo r, §1° da Instrução Normatil'a SRF nO 213, suspendendo a exigibilidade do

crédito tributário relativo à tributação pelo IRPJ/CSL dos valores relativos aos resul­

tados positivos de equivalência patrimonial concernentes aos investimentos detidos

na exterior, nas quais é sociedade controladora ou coligada, suspendendo, também

neste aspecto, a exigibilidade do crédito tributário relativo ao IRPJ e CSL." A questão também foi apreciada pela D. Juíza Federal da 2' Vara Federal de Joinville, nos autos do Mandado de Segurança n° 2003.72.01.000014-4: "Por fim, cabe a atlálise da 1115-trução Normativa n· 213/2002, que ao regulamentar o artigo 74 da MP elll comento

determinaI/ a tribl/tação dos resultados positil'os de equivalêtlcia patrimonial em

coligadas e controladas no exterior de pessoas jl/rídicas brasileiras. Da comparação

entre o § lo do artigo 7· da Instrução Normativa e o seu caput, se extrai que o 'resul­

tado positivo da equivalência patrimonial' não foi apenas registrado no balanço le­

vantado em 3l de dezembro do ano-calendário para que fossem apurados o II/era

real e a base de cálculo da CSL. mas sim. foi tributado. É o que se denota a seguir: ( ... )

228

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

conversão em lei da Medida Provisória nO 135, de 30.10.2003 (MP

135/03) uma previsão de tributação da variação cambial de investi­mentos detidos no exterior274

No entanto, ao sancionar a Lei n° 10.833, de 30.12.2003 (Lei

10.833/03), como resultado da conversão da MP 135/03, o próprio

Governo Federal optou por vetar o dispositivo, deixando ainda mais

clara a ilegalidade da lN 213/02 no que tange à tributação da varia­

ção cambial de investimentos detidos no exterior. A Mensagem de

Veto do Presidente da República nO 795, de 29.12.2003, editada na

ocasião, era a seguinte:

"Não obstante tratar-se de norma de interesse da adminis­tração tributária, a falta de disposição expressa para sua en­trada em vigor certamente provocará diversas demandas judiciais, patrocinadas pelos contribuintes, para que seus efei­tos alcancem o ano-calendário de 2003, quando se registrou variação cambial negativa de, aproximadamente, quinze por cento, o que representaria despesa dedutível para as pessoas jurídicas com controladas ou coligadas no exterior, provo­cando, assim, perda de arrecadação, para o ano de 2004, de

significativa monta, comprometendo o equihbrio fiscal."

A casuística sede arrecadatória do Poder Executivo concluiu

que, em função da valorização da moeda nacional registrada no ano-

Assim, verifico que a lnstruçà,. da Receita Federal, com o pretexto de regulamentar o artigo 74 da Medida Provisóri: em análise, alterou a hipótese de incidência do tribu­to, ao tributar o 'resultado de equivalência patrimonial', antes vedado. lsio porque a tributação do 'resultado de equivalência patrimonial' incide sobre outros valores que não apenas os lucros disponibilizados por empresas coligadas ou contratadas por pessoas jurídicas brasileiras. Assim, se somente a lei em sentido amplo pode criar, modificar ou extinguir direitos, a instrução 'IOrmativa não poderia ter ampliado a

hipótese de incidência. ( ... )" 274 Dispunha o artigo 46 do referido projeto: "A variação cambial dos investimentos no

exterior avaliados pelo método da equivalência patrimonial é considerada receita ou despesa financeira, devendo compor o lucro real e a base de cálculo da CSLL relativos

ao balanço levantado em 31 de dezembro de cada ano-calendário".

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDlCA

calendário de 2003, a tributação da variação cambial relativa aos in­vestimentos detidos no exterior nesse mesmo período-base levaria ao efeito inverso do esperado, ou seja, a uma queda na arrecadação causada pela dedução das perdas sofridas pelas empresas brasileiras. Com esse singelo argumento, o Governo Federal optou por deixar de convalidar em lei a tributação da variação cambial de investimen­tos detidos no exterior.

O assunto foi retomado com a edição da célebre Medida Pro­visória nO 232, de 30.12.2004 (MP 232/04), que trazia, em seu arti­go 9°275 , a previsão de tributação dessa espécie de variação cambial. O artigo 9° da MP 232/04 era reprodução literal do vetado artigo 46 do Projeto de conversão em lei da MP 135/03. Seu objetivo, mais uma vez, era "legalizar" a tributação da variação cambial de investi­mentos detidos no exterior, a partir de 1.4.2005 para a CSL e, de 1.1.2006, para o lRPJ (artigo 14, inciso l, da MP 232/04).

A MP 232/04, todavia, não foi convertida em lei e o seu artigo 9° foi expressamente revogado pelo artigo 4°276 da Medida Provisó­ria n° 243, de 31.3.2005 (MP 243/05), de modo que também essa tributação permanece sem o devido amparo legal, constando exclu­sivamente do texto da lN 213/02.

O veto ao artigo 46 do Projeto de conversão em lei da MP 135/ 03 e a revogação do artigo 9° da MP 232/04 tornam ainda mais evidente a ofensa ao princípio da legalidade tributária pela lN 213/ 02, uma vez que não há qualquer dispositivo na legislação nacional que autorize a inclusão, no lucro real e na base de cálculo da CSL, da variação cambial do valor do investimento.

275 O artigo 9° da MP 232/04 trazia a mesma redação do vetado artigo 46 do Projeto de Conversão em lei da MP 135/03. a seguir transcrita: 'I\rt. 9°. A variação cambial dos investimelltos no exterior avaliados pelo método da equivalêllcia patrimollial é cO/15i·

derada receita ou despesa fillanceira. devendo compor o lucro real e a base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL do período de apuração."

276 Artigo 4° da MP 243/05: "Art. 4Q Ficam revogados: I - os arts. 4° a 13 da Medida Provisória n° 232. de 30 de dezembro de 2004; (. .. )"

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

III. PANORAMA ATUAL

Como se vê, a história da tributação da renda da pessoa jurí­dica brasileira em bases universais é repleta de irregularidades jurí­dicas e vícios normativos, incluindo graves violações à Constitui­ção Federal. Felizmente, o Poder Judiciário tem sustentado o siste­ma de freios e contrapesos nacional e vem arrefecendo o afã do Executivo em arrecadar cada vez mais e de forma tão perigosa­mente desvinculada dos princípios constitucionais que regem o sis­tema tributário do País.

Assim tem sido com as hipóteses de tributação que nunca estiveram previstas em normas com força de lei, mas somente em instruções normativas (lN 38/96 e lN 213/02). Sensíveis ao fato de que regras secundárias de direito não podem criar novas hipóte­ses de incidência tributária, as cortes judiciais vêm consolidando jurisprudência no sentido de que a tributação que se origine exclu­sivamente de um ato infralegal deve ser afastada, por ofensa ao

princípio constitucional da legalidade. Por outro lado, recentes autuações fiscais sobre a matéria de­

notam que, ao invés de resignar-se, o fisco federal continua a exigir

a tributação de lucros nessas mesmas situações não previstas em lei, desta vez, contudo, buscando enquadrá-las nas hipóteses de

disponibilização de lucros já consagradas na legislação em vigor.

Para isso, utiliza-se de inter.)retações descabidas quanto ao sentido

desses dispositivos legais, forçando sua aplicação aos eventos que

sempre quis ver tributados, mas nunca estiveram previstos em qual­

quer ato normativo com fOI ça de lei.

111.1. ALIENAÇÃO DE SOCIEDADES CONTROLADAS OU COLIGADAS ESTRANGEIRAS

Tome-se, por exemplo, o caso da alienação de participação

societária detida em controlada ou coligada no exterior. Sem qual-

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

quer base legal, o artigo 2°, § 6° da lN 213/02, mantendo a redação do hoje revogado artigo 2°, § 9° da lN 38/96, determina que a sociedade brasileira que aliene participação societária detida em controlada ou coligada estrangeira terá a obrigação de, ao final do respectivo perío­do-base, oferecer à tributação no País os lucros retidos na sociedade alienada e não tributados no Brasil, independentemente de esses lu­cros jamais terem sido disponibilizados à empresa brasileira.

É bem verdade que os dispositivos legais atualmente em vigor articulam-se de forma a permitir que uma sociedade controlada ou coligada estrangeira, que tenha auferido lucros no exterior e nunca os tenha disponibilizado à pessoa jurídica brasileira, seja alienada sem que esses lucros sejam tributados no País. Esse efeito decorre da com­binação dos artigos 389 e 426 do RIR/99.

A regra geral aplicável às pessoas jurídicas nacionais, estipulada no artigo 389 do RIR/99, é de que a contrapartida do ajuste da avaliação dos investimentos pelo método de equivalência patrimonial, por au­mento ou redução no valor de patrimônio líquido do investimento, não deve ser computada na determinação do lucro real. Especificamente sobre investimentos no exterior, o § lodo artigo 389 do RIR/99 estabe­lece que "não serão computadas na determinação do lucro real as contrapartidas de ajuste do valor do investimento ou da amortização do ágio ou deságio na aquisição de investimento em sociedades estrangei­ras coligadas ou controladas que não funcionem no Brasil"

Portanto, embora os lucros auferidos no exterior pela sociedade

controlada ou coligada estrangeira sejam refletidos nos livros da pes­soa jurídica brasileira, com base no método da equivalência patrimonial,

o ganho auferido pela pessoa jurídica brasileira, nesse caso, não será computado na determinação do lucro real, por expressa determinação do artigo 389 do RIR/99.

Por seu turno, o artigo 426 do RIR/99 dispõe que:

"Art. 426. O valor contábil para efeito de determinar o ganho ou perda de capital na alienação ou liquidação de investimento em coligada ou controlada avaliado pelo va-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

lor de patrimônio líquido (art. 384), será a soma algé­brica dos seguintes valores (Decreto-Lei na 1.598, de 1977, art. 33, e Decreto-Lei na 1.730, de 1979, art. la, inciso V):

I - valor de patrimônio líquido pelo qual o investimen­to estiver registrado na contabilidade do contribuinte;

II - ágio ou deságio na aquisição do investimento, ainda

que tenha sido amortizado na escrituração comercial do

contribuinte, excluídos os computados nos exercícios fi­nanceiros de 1979 e 1980, na determinação do lucro real;

III - provisão para perdas que tiver sido computada, como

dedução, na determinação do lucro real, observado o disposto

no parágrafo único do artigo anterior. (não destacado no

original)

Em conseqüência, quando a controlada ou coligada estran­geira aufere lucros no exterior, o valor desses lucros passa a com­

por o custo de aquisição do investimento detido nessa sociedade pela pessoa jurídica brasileira, ainda que não tenha sido compu­tado na determinação do lucro real desta última. Desse modo, o ganho de capital apurado na alienação desse investimento levará

em conta apenas a diferença positiva entre o preço cobrado na

alienação e o custo de aquisição supramencionado, este último já incluindo o valor dos lucr( s auferidos no exterior pela sociedade

alienada. Não obstante a situaç io acima exposta, certo é que qualquer

tributação somente pode (,correr no País quando houver lei, ou

ato normativo com força de lei, que assim o determine. Se o le­gislador entender que a alienação de sociedade controlada ou co­

ligada estrangeira deve ser elevada à hipótese legal de

disponibilização de lucros auferidos e retidos no exterior, que o faça por meio do processo legislativo próprio; caso contrário, essa

tributação não poderá ser aplicada.

233

Page 236: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

Como visto, porém, à exceção do artigo 2°, § 6° da lN 213/02, que repetiu a redação do artigo 2°, § 9° da lN 38/96277 - duas instru­ções normativas, sem força de lei - nenhuma outra norma tributária previu a alienação de sociedade controlada ou coligada estrangeira como hipótese de disponibilização de lucros auferidos e retidos no exterior. Não há, portanto, base legal para a tributação nessa hipótese.

Por essa razão, sucessivas decisões judiciais têm negado a apli­

cação desse normativo. Ainda assim, autuações federais continuam

sendo lavradas para exigir a tributação de lucros na alienação de par­ticipação detida em controlada ou coligada estrangeira, em que os

lucros gerados e retidos no exterior pela sociedade alienada não te­nham sido ainda oferecidos à tributação no Brasil.

Ciente, porém, de que tais autuações terão reduzidas chances de

sucesso se lavradas com base nos supracitados artigo 2°, § 9° da lN 381

96 ou artigo 2°, § 6° da lN 213/02, o fisco federal as tem fundamen­

tado em diferentes dispositivos, tais como: (i) artigo 1°, § 1°, alínea "b" e § 2°, alínea "b", item "4"278 da Lei 9.532/97; e (ii) artigo 1°, § 1°, alínea "b" e § 2°, alínea "b", item "1"279 da Lei 9.532/97

111.2.0 EMPREGO DE LUCROS EM FAVOR DA BENEFICIÁRIA BRASILEIRA - ITEM "4"

o primeiro desses normativos trata como hipótese de

disponibilização de lucros auferidos no exterior à sociedade brasileira

o "emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça, inclusive

no aumento de capital da controlada ou coligada, domiciliada no exterior'

277 Luís Eduardo Schoueri, sobre o dispositivo, comenta: "Ainda, o § 90 do mesmo dispo­sitivo da lN prevê a tributação dos lucros quando ocorrer alienação do investimento no exterior. Parece-nos claro que esta não é uma hipótese de realização de lucros; tampouco parece-nos hipótese de auferimento de lucros." (Luís Eduardo Schoueri, Sobre " Triblltação dos 'Lueros DispOIlibilizados' do Exterior, Dialética, pág. 115 l.

278 O item "4" desse dispositivo faz referência à hipótese de "emprego do valor, em favor da beneficiária, em qualquer praça, inclusive no aumento de capital da controlada ou coligada, domiciliada no exterior."

279 O item "I" desse dispositivo faz referência à hipótese de "crédito do valor em conta bancária, em favor da controladora ou coligada no Brasil."

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Tais autuações pretendem equiparar, para fins fiscais no Brasil, a alie­nação de sociedade controlada ou coligada no exterior ao emprego dos lucros nela retidos em favor da pessoa jurídica brasileira.

Todavia, as hipóteses não se confundem. O "emprego do valor em

fovorda beneficiária" a que se refere o artigo 10, § 20, alínea "b", item 4 da Lei 9.532/97 não possui amplitude infinita, devendo ser entendido nos exatos limites da legislação que o previu. Com a citada expressão, o legislador quis se referir às hipóteses em que, ao invés de disponibilizar os próprios lucros gerados no exterior para a pessoa jurídica brasileira, a controlada ou coligada estrangeira, de algum modo, utiliza o valor desses lucros em favor dessa mesma empresa brasileira.

Essa utilização (emprego) pode se dar, por exemplo, para a aqui­sição de um bem ou direito no Brasil ou no exterior (em qualquer praça) em nome da pessoa jurídica brasileira. Também pode ocorrer no caso de quitação, pela controlada ou coligada estrangeira, de uma obrigação da empresa brasileira no País ou no exterior, ou ainda,

como menciona o próprio texto legal, na hipótese de aumento de

capital da controlada ou coligada no exterior. Em qualquer caso, ressalte-se, o "emprego" exigido para a tri­

butação em referência há de ser feito pela própria sociedade estran­geira que auferiu e acumulou os lucros no exterior, em favor de sua

beneficiária, controladora ou coligada brasileira. Em outras palavras, o disposto no artigo 10, § 20, alínea "b", item 4 da Lei 9.532/97 somente se aplica aos casos em que a sociedade estrangeira, por meio de uma ação própria, empregue os valores (dos lucros gerados e reti­

dos no exterior) em favor da pessoa jurídica brasileira. Admitir o contrário eq üvaleria a afirmar que o dispositivo em

questão teria criado nova hipótese legal de desconsideração da per­

sonalidade jurídica das sociedades controladas ou coligadas no exte­

rior, para flOs de tributação de seus lucros no Brasil, o que não parece

ser o caso. A desconsideração da personalidade jurídica da empresa estrangeira pelo fisco federal apenas pode ocorrer nas hipóteses le­

gais que a autorizam, como nos casos de comprovada fraude, dolo ou

simulação.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIOICA

Na alienação da sociedade controlada ou coligada no exterior, quem pratica a operação (de alienação) é a empresa brasileira. A con­trolada ou coligada, nesse caso, terá sido o objeto da alienação, e não o seu agente. Trata-se, portanto, de operações distintas, que não se confundem e não podem ser tomadas uma pela outra para fins de tributação no Brasil.

O dispositivo tem sido utilizado para fundamentar pretensões fiscais relativas às mais diversas operações, incluindo, por exemplo, situações como a cisão de uma controladora brasileira, em que a par­ticipação detida na controlada estrangeira tenha sido vertida para uma outra empresa do mesmo grupo econômico no País, em meio a uma reorganização societária. Nesse caso, o fisco alega que a cisão da sociedade brasileira, com a versão da participação detida na contro­lada estrangeira para uma outra empresa do grupo, seria equiparada ao emprego dos lucros retidos na controlada estrangeira em favor da empresa cindida no Brasil.

Ora, a par de todos os argumentos acima, se, por absurdo, essa equiparação pudesse ser admitida, resultaria que esses lucros estari­am sujeitos a uma dupla tributação no Brasil: (i) uma no momento da cisão; e (ii) outra, quando da real disponibilização desses lucros à nova controladora brasileira da sociedade estrangeira. Evidentemente, essa pretensão fiscal deve ser repelida.

111.3. O "PAGAMENTO" DE LUCROS À CONTROLADORA NO BRASIL -ITEM "1"

Outro normativo que tem fundamentado autuações fiscais la­vradas em casos de alienação de sociedade controlada ou coligada no exterior é o artigo 1°, § 1°, alínea "b" e § 2°, alínea "h", item 1 da Lei 9.532/97, a seguir transcrito:

"Art. 10 Os lucros auferidos no exterior, por intermédio de filiais, sucursais, controladas ou coligadas, serão adiciona­dos ao lucro líquido, para determinação do lucro real cor­respondente ao balanço levantado no dia 31 de dezembro

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

do ano-calendário em que tiverem sido disponibilizados para a pessoa jurídica domiciliada no Brasil.

§ 10 Para efeito do disposto neste artigo, os lucros serão considerados disponibilizados para a empresa no Brasil:

( ... )

b) no caso de controlada ou coligada, na data do pagamento ou do crédito em conta representativa de obrigação da em­presa no exterior.

§ 20 Para efeito do disposto na alínea "b" do parágrafo an­terior, considera-se:

( ... )

b) pago o lucro, quando ocorrer:

1. o crédito do valor em conta bancária, em favor da controladora ou coligada no Brasil;

( ... )"

De forma ainda mais surpreendente, o fisco alega que, ao pagar à sociedade brasileira o preço de venda da participação detida na controlada ou coligada estrangeira, o adquirente teria creditado à

conta da sociedade brasileira os próprios lucros que estavam retidos na sociedade estrangeira até o momento.

O argumento do fisco tem por base o fato de que o preço da alienação divide-se, principalmente, em duas parcelas: (i) o ganho de capital auferido pela sociedade brasileira na alienação; e (ii) o patrimônio líquido da controlada ou coligada estrangeira cujo capital esteja sendo alienado, refletido na con Toladora brasileira por equivalência patrimonial. Partindo desse) ,onto e considerando que os lucros reti­dos na sociedade estrangeira compõem o valor de seu patrimônio lí­quido, completa-se o sofisma fazendário de que o preço pago à socie­dade brasileira equivaleria, para fins fiscais, ao pagamento dos pró­prios lucros gerados e retidos no exterior, mas nunca disponibilizados à sociedade brasileira, juntamente com o eventual ganho de capital

apurado na operação.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

o raciocínio é perspicaz, mas não se sustenta em um exame da matéria à luz da legislação fiscal e do ordenamento jurídico em vi­gor. O dispositivo citado versa, em verdade, sobre a primeira e mais óbvia das hipóteses legais em que se consideram pagos os lucros, pela controlada ou coligada estrangeira, à empresa brasileira, qual seja, quando a empresa estrangeira credita o valor dos lucros em conta bancária pertencente à controladora ou coligada no Brasil. A hipó­tese é precisa e tem elasticidade mínima, não podendo se prestar à tributação de lucros em uma situação tão diversa quanto a alienação de participação detida na controlada estrangeira.

Adicionalmente, é de se notar que a hipótese de incidência normativa requer dois elementos principais para a sua caracterização. Em primeiro lugar, devem ser pagos "lucros", e não outra coisa. Ora, o

"preço" pago na aquisição de participação societária tem natureza jurí­dica absolutamente distinta daquela dos "lucros" auferidos no exterior

pela sociedade alienada. Tomar um pelo outro, para fins de tributação

no Brasil, equivaleria à distorção de sólidos conceitos de direito priva­do, o que é expressamente vedado pelo artigo 110 do CTN.

Em segundo lugar, para que fosse caracterizada a hipótese legal do dispositivo em exame, o "pagamento" ou "crédito de valores na

conta bancária" deveria ser efetuado pela própria controlada ou coli­

gada estrangeira. É basilar que somente a sociedade titular dos lu­

cros poderia pagá-los a quem quer que seja. A exemplo do artigo 10, § 20, alínea "b", item "4" da Lei 9.532/

97, acima examinado, o artigo 10, § 20, alínea "b", item "1" da mesma

lei aplica-se exclusivamente aos casos em que a sociedade controla­

da ou coligada estrangeira, ela mesma, por meio de uma ação pró­

pria, venha a realizar o pagamento dos lucros gerados e retidos no

exterior em favor da sua controladora ou coligada brasileira.

Portanto, se o preço foi pago pelo adquirente da participação

societária na sociedade controlada ou coligada estrangeira, resultará

que essa sociedade estrangeira terá sido o mero objeto da alienação, e não o agente de nenhum pagamento. Não procede a interpretação

do fisco para o dispositivo em exame.

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

1I1.4.SINTESE

A aplicação de dispositivos legais já consagrados na legislação em vigor, tais como os itens "I" e "4" do artigo 1°, § 2°, alínea "b" da Lei 9.532/97, revela-se uma tentativa astuta, porém indevida, do fis­co federal de tributar a alienação de sociedades controladas ou coli­gadas estrangeiras, assim como outras situações não previstas em lei. Espera-se, pelos motivos demonstrados, que tais autuações sejam devidamente canceladas nas esferas administrativa e judicial, de modo a que se preserve a lei, e os atos que se revistam de sua força, como o único instrumento capaz de introduzir novas hipóteses de incidên­cia tributária no País.

IV. CONCLUSÃO

Desde a edição da lN 38/96, o legislador pátrio teve diver­sas oportunidades (Lei 9.532/97, MP 1.858/99, Lei 9.959/00 e MP 2.158/01) de incluir outros eventos, tais como a alienação de sociedade estrangeira, entre as hipóteses de disponibilização de lucros auferidos no exterior para a pessoa jurídica brasileira, mas não o fez. É conclusão lógica a de que a alienação de participação societária nessas condiçõe:. não pode ser invocada para a tributa­ção dos lucros porventura retidos na sociedade estrangeira alie­

nada sem que esses lucros 1 enham sido disponibilizados à empre­

sa brasileira. Com a edição da MP 2.158/01, o foco do debate deslocou-

se das hipóteses que caracterizam a disponibilização de lucros auferidos no exterior para a validade, ou não, da disponibilização automática desses lucros para a pessoa jurídica brasileira ao fim de cada ano-calendário. As questões que permeiam a aplicação da MP 2.158/01, ao lado daquelas recentemente trazidas pela lN 213/02, com destaque para a tentativa de tributação dos resulta-

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

dos positivos de equivalência patrimonial sem a necessária base legal, continuarão a gerar incansáveis discussões entre fisco e con­

tribuintes. No momento, o que se observa é que diversas empresas nacio­

nais estão ainda em meio a disputas judiciais a respeito de alienações de controladas ou coligadas estrangeiras efetuadas em um passado recente. Há casos em que, mesmo protegido por medida judicial sus­pendendo a exigibilidade do crédito tributário que resultaria da apli­cação do artigo 2°, § 9° da lN 38/96, por exemplo, o contribuinte é surpreendido por autuações fiscais. Ignorando a suspensão de exigibilidade, tais autuações chegam a ser lavradas com a imposição de multa de ofício, ao tentar enquadrar os mesmos fatos (alienação de participação em controlada ou coligada estrangeira) em um dos dispositivos legais da Lei 9.532/97, acima examinados.

Em que pese a premente necessidade de arrecadação do país, que muitas vezes faz justificar a valente atitude das Autoridades

Fazendárias, o que se percebe é que, em benefício da integridade da Constituição Federal, de todo o ordenamento jurídico, assim como

da paz e da ordem social do país, a pressão deveria ser feita não sobre

os contribuintes, mas sobre o legislador pátrio.

As dificuldades vivenciadas por fisco e contribuintes na compre­

ensão e aplicação da legislação que trata da tributação da renda da

pessoa jurídica brasileira em bases universais ilustram que a sociedade

como um todo receberia melhor préstimo se as energias de ambos os

lados fossem direcionadas à boa-feitura das leis, prestigiando o prin­

cípio constitucional da legalidade em vez de sobrepujá-lo.

240

Page 243: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

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Breves Considerações sobre a Prova no Processo Tributário

LlIZ MARTINS VALERO

Advogadu e Administrador de Empresas Pós-graduado em Direito Tributário pela Universidade Federal do

Recife - PE Auditor Fiscal do Tesouro Nacional

Membro da 7a Câmara, do 10 Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda

Page 244: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIOICA

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A PROVA NO PRO­CESSO TRIBUTÁRIO

I. INTRODUÇÃO

É nossa intenção ofertar um breve ensaio sobre a prova no Pro­cesso Administrativo Tributário, traçando algumas linhas sobre en­tendimentos doutrinários acerca das espécies de provas admitidas, do dever de prova por parte do agente da administração tributária e da prova em contrário como ônus do contribuinte.

II. O DEVER DA PROVA POR PARTE DO AGENTE TRIBUTÁRIO

A competência tributária, traduzida na autorização constitu­cional para a instituição de tributos, traz implícita, a capacidade legislativa plena, nos precisos termos do art. 6° do Código Tribu­tário N acionaPso

Vale dizer, portanto, que quem dá o poder tem que dar os meios. No caso, os meios necessários para o cumprimento das funções de arrecadação e fiscalização de tributos, parte integrante do estado so­cial que se sustenta nas receitas derivadas.

Mas esse poder-dever tem de ser exercido em sua plenitude, nos estritos termos do Código Tributário Nacional, de forma a dar ao lan­çamento a necessária presunção de certeza e liquidez.

A busca da verdade material, embora árdua e espinhosa, é ati­vidade inseparável do poder conferido pela Lei à fiscalização. Sua

280 Ar!. 6° A atribuição constitucional de competência tributária compreende a compe· tência legislativa plena. ressalvadas as limitações contidas na Constituição Federal, nas Constituições dos Estados e nas Leis Orgânicas do Distrito Federal e dos Municí­pios. e observado o disposto nesta Lei.

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COORDENAÇAo: PEDRO ANAN JR.

importância é inferida por uma constatação simples: o procedimen­to fiscal pode levar a uma exigência tributária que, em última análi­se, atinge dois direitos fundamentais do cidadão contribuinte, cons­titucionalmente previstos: o de propriedade e o de liberdade.

O dever de fazer prova da ocorrência do fato gerador da obri­gação tributária., em consonância com o artigo 142281 do Código

Tributário Nacional, está estampado no artigo 9° do Decreto nO

70.235/72282 que regula o Processo Administrativo Fiscal:

'~rt. 9° A exigência de crédito tributário, a retificação de prejuízo fiscal e a aplicação de penalidade isolada serão for­malizadas em autos de infração ou notificações de lança­mento, distintos para cada imposto, contribuição ou penalidade, os quais deverão estar instruídos com todos os termos, depoimentos, laudos e demais elementos de prova indispensáveis à comprovação do ilícito." (Redação dada pelo

arfo 10 da Lei n. 08.748/93)

281 CTN: "Ar!. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo tendente a verilicar a ocorrência do fato gerador da obrigação correspondente. de­terminar a matéria tributável. calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, ;>ropor a aplicação da penalidade cabível. Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigató­

ria, sob pena de responsabili, 'ade funcional." 282 PAF: Hodiernamente, reconl.ece-se que o Decreto n° 70.235/72 tem status de lei,

pois ele regula e não apenas r !gulamenta o processo de determinação e exigência de créditos tributários da União. Por isso, as alterações são processadas poP dispositivo

legal de igual natureza. Esta natureza especial decorre da sua origem histórica, pois o Decreto n° 70.235/72 concretizou a tarefa então cometida ao Decreto-lei nO 822, de 05 de setembro de 1969, cujos poderes originais "visavam regular o processo administrativo de deter­minação e exigência de créditos tributários federais, penalidades, empréstimos com­

pulsórios e o de consulta" Com base na delegação assim recebida, o Decreto n° 70.235/72 exauriu o campo normativo reservado ao aludido Decreto-lei, disciplinando inteiramente o Processo Administrativo Tributário Federal. Dai dizer-se que o Decreto nO 70.235/72 tem ii

natureza material de lei, pois ele regulou e não apenas regulamentou a matéria.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Ainda na esfera federal, o Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto nO 3.000, de 1999, estabelece:

"Art. 923. A escrituração mantida com observância das dis­posições legais faz prova a favor do contribuinte dos fatos nela registrados e comprovados por documentos hábeis, segundo sua natureza, ou assim definidos em preceitos le­gais (Decreto-Lei nO 1.598, de 1977, art. 9°, § 1°).

Art. 924. Cabe à autoridade administrativa a prova da inveracidade dos fatos registrados com observância do disposto no artigo anterior (Decreto-Lei nO 1.598, de 1977, art. 9<>, § 2°).

Art. 925. O disposto no artigo anterior não se aplica aos casos em que a lei, por disposição especial, atribua ao con­tribuinte o ônus da prova de fatos registrados na sua escri.­turação." (Decreto-Lei nO 1.598, de 1977, art. 9)

Em suma, nas lições de Antônio Silva Cabral283 , deve o agente tributário produzir prova tal que permita ao julgador, ancorado no velho princípio do livre convencimento, decidir de acordo com os ditames da razão.

Tendo-se presente as lições do mestre Moacyr Amaral Santos, citado por Antonio Airton Ferreira284 , percebe-se que o livre con­vencimento aqui tratado se aproxima do sistema nominado de per­suasão racional, em que o julgador, embora tendo liberdade para apre­ciar as provas, não segue as suas impressões pessoais, formando sua convicção a partir das provas produzidas. Se as provas forem insufi­cientes, a lei dá ao julgador o poder para determinar as medidas ne­cessárias - por exemplo, determinando diligências - para a apuração exata dos fatos.

283 Cfr. Processo Administrativo Fiscal. São Paulo: Saraiva. 1999. 284 Cfr. Processo Administrativo Fiscal Anotado e Comentado (São Paulo, 2005.

FISCOSoft Editora)

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

III. A PROVA EM CONTRARIO COMO ÔNUS DO CONTRIBUINTE

Levado a cabo a exigência tributária por parte do agente fiscal, tendo ele carreado aos autos a prova da materialidade do fato gera­dor da obrigação tributária, resta ao contribuinte esbater-se contra a

pretensão estatal. Daí surge o ônus da prova em contrário.

Diz-se ônus da prova (do latim onus probandi) com significado

de fardo, carga, peso ou imposição, jamais com significado de dever

jurídico de provar, mas sim como necessidade, sob pena de prevalência

do lançamento tributário.

Em outras palavras, o fisco tem o dever de provar a ocorrência

do fato jurídico tributário que faz nascer a obrigação tributária, ob­

jeto da pretensão externada pelo ato de lançamento. Ao contribuin­

te, para desfazer a presunção de legitimidade do ato administrativo,

cabe a prova em contrário. É a confirmação de que, ao contrário da pregação doutrinária

mais antiga, a presunção de legitimidade do lançamento tributário

não é absoluta. No dizer de Gian Antonio Michele, citado por Paulo Celso B.

Bonilha285 :

"Não pode ser, ao reverso, invocada a presunção de legiti­midade inerente ao ato administrativo, de vez que ela não é

suficiente para explicar os seus efeitos no âmbito do pro­cesso em questão, exatamente porque, nele, o juiz adminis­trativo é posto na c lndição de formar seu próprio convencimento com a máxima liberdade e, portanto, a precitada presunção não está com força para vincular a for­

mação da decisão judicial, no caso de dúvida."

285 efr. Da prova no Processo Administrativo Tributário. São Paulo, 1997, Dialética, pago 75.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

IV. As PRESUNÇOES SIMPLES A PARTIR DOS INDlclOS

Nas conclusões do plenário de encerramento do IX Simpósio Nacional de Direito Tributári0286 , restou asseverado:

"Indícios são fatos conhecidos, comprovados, que se prestam como ponto de partida para as presunções hominis. Estas cons­tituem um processo de raciocínio pelo qual se parte do fato conhecido para um não conhecido com base numa regra de freqüência suficiente ou de resultados conhecidos ou em de­

corrência da previsão lógica do desfecho.

Os lançamentos de tributos com base nas presunções hominis

ou indícios (ressalvados os indícios veementes quando pro­porcionam certeza quanto aos fatos), sempre que ocorrer in­certeza quanto aos fatos, não se compatibilizam com os

princípios da legalidade e da tipicidade da tributação."

Sem dúvida, meros indícios isolados não se prestam como prova da ocorrência de fatos jurídicos geradores de exigências tributárias. Mas a doutrina tem evoluído no sentido de aceitar a prova indiciária em matéria de Direito Tributário.

A presunção simples, na qualidade de prova indireta, é meio idôneo para referendar uma autuação, desde que ela resulte da soma de indícios convergentes, o que é muito diferente de uma autuação lastre ada apenas no primeiro elemento colhido pelo Fisco.

Somente se os fatos relatados pelo fisco apresentarem um en­cadeamento lógico dos indícios convergentes, pode a prova se consi­derar feita visando ao convencimento do julgador.

Daí a advertência nas lições de Alberto Xavier87

286 Cfr. IX Simpósio Nacional de Direito Tributário. realizado em São Paulo em 23.10.84. sob a coordenação de Ives Gandra da Silva Martins. sob o tema Presunções no Direito Tributário.

287 Crr. Do Lançamento no Direito Tributário Brasileiro. Rio de Janeiro. 2005. Forense. Pag.144

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COOROENAçAO: PEDRO ANAN JR.

"Em qualquer caso, está-se sempre perante o mesmo obje­tivo: a descoberta da verdade material, variando apenas os métodos probatórios predominantemente utilizados pela Administração fiscal, métodos esses que exprimem, afmal, as dificuldades e limitação que a natureza do caso concreto suscita à fixação da verdade.

Contudo, as naturais limitações na fixação da verdade não de­

vem conduzir a arvorar-se a simples probabilidade em princí­

pio de decisão. Reconhecer-se que a certeza é relativa

conseqüência inevitável de todo o juízo histórico - não autoriza

a confundir-se a verdade e verosimilhança, enquanto a primei­

ra excluiu a reserva da verdade contrária. É evidente que a

convicção do órgão de aplicação do direito é suscetível de gradu­

ação e que, portanto, o grau de convicção necessário para se falar

em prova há de ser o necessário para justificar a decisão de que

se trata no caso concreto.

V. As PRESUNÇÕES LEGAIS A PARTIR DOS INDíCIOS PROVADOS

Das conclusões do IX Simpósio Nacional de Direito Tributá­

rio restou asseverado que é preciso distinguir as presunções legais das ficções legais. Nesta a lei atribuiu a determinado fato, coisa, pes­soa ou situação características ou natureza que, no mundo real, não

existem nem podem existir. As ficções são incompatíveis com os princípios que regem o

direito tributário. Da mesm 1 forma, as presunções legais absolutas

(jure et jure) não são admitic'as.

Ainda no aludido Simpósio, registrou-se:

"Nas presunções legais a identificação da conseqüência de­

corrente dos fatos conhecidos se dá por determinação da lei

que substitui o processo de raciocínio desenvolvido pelo seu aplicador, podendo comportar prova em contrário ou não,

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

conforme se trate de presunções relativas ou absolutas. As presunções legais relativas podem ser adotadas pelo legisla­dor desde que sejam estabelecidas no âmbito da competên­cia tributária respectiva."

Necessário recordar o conceito de presunção e depois avaliar como uma presunção simples torna-se uma presunção legal.

Já registramos que a presunção representa uma prova indireta, partindo-se de ocorrências de fatos secundários, fatos indiciários, que apontam para o fato principal, necessariamente desconhecido, mas relacionado diretamente ao fato conhecido.

O mestre Alfredo Augusto Becker, citado por Antonio Airton Ferreira288 , assim define esse processo:

A observação do acontecer dos fatos segundo a ordem na­tural das coisas, permite que se estabeleça uma correlação natural entre a existência do fato conhecido e a probabili­dade de existência do fato desconhecido. A correlação na­tural entre a existência de dois fatos é substituída pela correlação lógica. Basta o conhecimento da existência de um daqueles fatos para deduzir-se a existência do outro fato cuja existência efetiva se desconhece, porém tem-se como provável em virtude daquela correlação natural.

Logo, resta claro que a presunção legal não deriva da iniciativa criativa e original do legislador. Ao contrário, ela deve resultar sem­pre da experiência, da observação do acontecer dos fatos na ordem natural das coisas. "Só a certeza da correlação natural entre esses fatos autoriza a inserção da correção lógica entre tais fatos, mediante a via

legislativa", conclui Antonio Airton Ferreira no artigo citado. Em suma, entre o fato conhecido (fato indiciário) e o fato des­

conhecido (provável) deve haver uma correlação segura e direta, não podendo haver dúvidas sobre a materialização dessa correlação, sob pena desse artifício legal resultar indevido por absoluta inadequação do conceito jurídico escolhido para sua concreção.

288 Cfr. Os Depósitos Bancários de Pessoas Físicas Como Base Para a Presunção Legal de Omissão de Rendimentos. Artigo publicado em http://www.fiscosoft.com.br/Arti­gos. Acesso em: 03.08.2005.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

VI. A PROVA NA GLOSA DE CUSTOS OU DESPESAS OPERACIONAIS

Um dos grandes pontos de atrito entre o fisco e os contribuin­tes, face à fluidez dos conceitos envolvidos, diz respeito às despesas operacionais redutoras da renda tributável.

Dispõe a Lei que, para ser aceito como dedutível, os dispêndios contabilizados em contas de despesas operacionais devem ser neces­sários à atividade e à manutenção da fonte produtora de renda tributável. São necessárias as despesas pagas ou incorridas para a realização das transações ou operações exigidas pela atividade da empresa.

Além de necessárias, as despesas dedutíveis devem ser usuais ou normais no tipo de transações, operações ou atividades da empresa.

Não raro a fiscalização do imposto de renda é tentada a patro­cinar verdadeira inversão do ônus da prova nas glosas de despesas operacionais. Inúmeras são as Decisões do Primeiro Conselho de Contribuintes em que essa questão é posta em julgamento.

Dos Acórdãos que selecionamos ressalta uma clara tendência no sentido de que, apresentado o comprovante hábil que suporta o lança­mento contábil, é do fisco o dever de provar que o dispêndio não aten­de aos requisitos legais da necessidade, usualidade e normalidade:

"O Ato Administrativo de Lançamento requer seja produ­zida a prova da ocorrência de fato que, inequivocamente, se subsuma à hipótese de~crita pela norma jurídica. A funda­mentação da glosa de custos ou despesas operacionais rea­lizadas e contabilmente apropriadas pelo sujeito passivo há de ser acompanhada de demento probatório, produzido pela Fiscalização, de que os gastos suportados não são necessá­rios à atividade da empresa ou à manutenção da fonte pro­dutora dos rendimentos." (Acórdão 101-93.759, publicado

no DOU de 21.08.2002)

"Não há como tipificar um gasto como indedutível sem a prova de uma efetiva contra prestação. A indedutibilidade exige que o bem ou o serviço tenha sido contraprestado, pois de outra forma não haveria como conceituá-lo como necessário, usual ou normal. Q!ando um gasto não corresponder a algo

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

recebido, a hipótese tributária caracterizar-se-á como redu­ção indevida do resultado do exercício, com reflexos na fonte. A não-distinção das suas especificidades implicará erro insanável na construção do ilícito, só suprível quando houver minudente exposição da infração e desde que não haja preju­ízo ao contraditório e à defesa." (Acórdão 103-20.815, pu­blicado no DOU de 11.03.2002)

"Uma despesa ou custo indedutível se-Io-á não em função meramente do aspecto formal do documento, mas em ra­zão da natureza do bem ou do serviço adquirido. A glosa dos dispêndios, por indedutíveis, só se arrimará nos docu­mentos quando estes não expressarem - com minudência -os bens adquiridos ou os serviços contraprestados. Dessa forma a glosa deve se materializar pelo simples fato de que tais elementos incongruentes impedem a avaliação da ne­cessidade, usualidade ou normalidade dos entes adquiridos ou contratados. Recurso parcialmente provido." (Acórdão 107-06869, publicado no DOU de 28.02.2003).

"Não é ücito ao Fisco proceder à glosa de despesas de servi­ços suficientemente descritos em notas fiscais, se a fiscaliza­ção deixa de reunir provas, ou mesmo indícios, de que os serviços não foram ou não poderiam ter sido prestados. Ca­bível, entretanto, a glosa, se o contribuinte deixa de compro­var documentalmente os lançamentos contábeis relativos às despesas de serviços. Recurso especial parcialmente provi­do." (Cárnara Superior de Recursos Fiscais - CSRF - Acórdão CSRF/01-03.972, publicado no DOU de 04.07.2003)

''A glosa praticamente integral dos custos e despesas haverá de ensejar quando muito a aplicação da tributação sob a forma do chamado arbitramento em face da então imprestabilidade da escrita. Nunca porém a sua glosa sob pena da subversão do fato gerador dentro do chamado "lu­cro real" onde as despesas/custos devem ser abatidas da re­ceita, assim apurando-se a base de cálculo imponível." (Acórdão 103-21.494, publicado no DOU de 02.03.2004)

"Para a exigência do tributo é necessário que se comprove de forma segura a ocorrência do fato gerador do mesmo. Tra­

tando-se de atividade plenamente vinculada (Código Tribu-

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

tário Nacional, arts. 3° e 142), cumpre à fiscalização realizar as inspeções necessárias à obtenção dos elementos de con­

vicção e certeza indispensáveis à constituição do crédito tri­butário. Havendo dúvida sobre a exatidão dos elementos em

que se baseou o lançamento, a exigência não pode prosperar, por força do disposto no art. 112 do CTN. O imposto, por

definição (CTN. art.3°), não pode ser usado como sanção."

(Acórdão 107-05545, publicado no DOU de 30.04.1999).

VII. CONCLUSÕES

Deste breve ensaio podemos concluir:

1) O dever de provar a ocorrência do fato gerador da obrigação tributária é do agente fiscal, somente admitindo-se a transferência

do ônus da prova para o contribuinte nas presunções legais relativas. 2) A prova indiciária é admitida no processo tributário, mor­

mente na ocorrência de delitos fiscais, somente quando resultar de

provados indícios convergentes, capazes de convencer o julgador da

ocorrência do fato que se quer provar. 3) As presunções só podem ser erigidas à categoria de legais a

partir da experiência anterior em que não restem dúvidas sobre a correlação certa e direta entre o fato indiciário (provado) e o fato que

se quer provar (presunção). 4) Apresentado o comprovante hábil que suporta o lançamento

contábil, é do fisco o dever de provar que o dispêndio não atende aos

requisitos legais da necessidade, usualidade e normalidade.

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Preços de Transferência e urõ" sobre o Capital Próprio

MARC ELO NATALE RODRIGUEZ

Cc -nsultor em São Paulo

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIOICA

PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA E JUROS SOBRE O CAPI­TAL PRÓPRIO

I. INTRODUÇÃO

o objetivo deste artigo é discutir os aspectos tributários relacio­nados ao art. 45 da Lei 10.637/02, que estabeleceu conexão anterior­mente inexistente entre as figuras tributárias Preços de Transferência ou Transfer Pricing e Juros sobre Capital Próprio. Abordaremos tam­bém efeito em sentido oposto, qual seja, o reflexo da adoção de Juros sobre Capital Próprio no cálculo de Preços de Transferência.

Muito embora cada uma destas figuras permita uma série de considerações em si mesmas, nosso enfoque aqui será a conexão ou os efeitos reflexos de uma figura sobre a outra. Preliminarmente, contudo, é necessário fazer breves considerações sobre cada uma de­

las, para um adequado encadeamento lógico.

II. PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA

Como é sabido, o Brasil incorporou normas específicas de Pre­ços de Transferência através da Lei 9.430/96. Basicamente, talle­

gislação introduziu a obrigatoriedade de aplicação de métodos e

testes em todas as transações internacionais envolvendo bens, ser­

viços e direitos, praticadas entre pessoas vinculadas. Também nos casos de operações financeiras de empréstimos, foram estabeleci­

dos balizadores para verificação de dedutibilidade ou presunção de receita.

Pode-se afirmar que o objetivo da legislação de Preços de Trans­

ferência é "neutralizar" possível distorção existente na apuração de

tributos sobre lucros (Imposto de Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ e

Contribuição Social sobre Lucro Líquido - CSLL), mediante a adi-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

ção, nas respectivas bases de cálculo daqueles tributos, do ajuste de Preços de Transferência apurado pela aplicação de métodos específicos.

Assim, no caso das importações, na eventualidade de um con­tribuinte praticar um sobrepreço em transação com pessoa vincula­da, o excesso de custo dele decorrente, que reduziu a base de cálculo de apuração do lucro real e da contribuição social deverá ser neutra­lizado mediante um ajuste fiscal, qual seja, a adição daquele "exces­so", apurado por um dos métodos de escolha do contribuinte.

Cedo reconheceu o legislador pátri.o que tais distorções pode­riam ocorrer em diversos tipos de transações e não somente naquelas verificadas entre controlada e sua controladora, ou seja, com vínculo societário direto. Elegeu assim o legislador que tais regras aplicam­se também a transações praticadas com diversos tipos de pessoas tidas como vinculadas, adotando inclusive o conceito de vinculação por interesse econômico comum, como seria o caso da representação

comercial exclusiva (aliás, bastante discutível). Ora, parece claro então que a ocorrência de ajuste de Preços de

Transferência não decorre necessariamente da existência de benefí­cio direto ou indireto verificado pela empresa controladora em rela­

ção à sua controlada estabelecida no Brasil. Neste sentido, pode-se

inclusive constatar que a figura Preços de Transferência é mais

abrangente do que aquela tradicional figura denominada Distribui­

ção Disfarçada de Lucros - DDL, prevista pelo Decreto-Lei 1.598/ 77 e consolidada no art. 464 do Regulamento do Imposto de Renda

- Decreto 3.000/99 - RlR/99289

289 Art. 464. Presume-se distribuição disfarçada de lucros /lO negócio pelo qual a pessoa jurídica (Decreto-Lei n° 1.598. de 1977. art. 60. e Decreto-Lei nO 2.065, de 1983. art.

20, illciso 11): I _ aliena. por valor notoriamente inferior ao de mercado. bem do seu ativo a pessoa

ligada; II _ adquire, por valor notoriamente superior ao de mercado, bem de pessoa ligada; III _ perde, em decorrência do não exercício de direito à aquisição de bem e em bene­fício de pessoa ligada, sinal, depósito em garantia ou importância paga para obter

opção de aquisição; IV _ transfere a pessoa ligada, sem pagamento ou por valor inferior ao de mercado, direito de preferência à subscrição de valores mobiliários de emissão de companhia;

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Portanto, enquanto as normas da DDL aplicam-se às transações entre pessoas ligadas, conforme definido no art. 465290 do RIR/99, as normas de Preços de Transferência aplicam-se às transações entre pessoas vinculadas, conceito bem mais amplo, conforme definição dada pelo art. 23 da Lei 9.430/96 e consolidado no art. 244291 do RIR/99.

Esta distinção será crítica para a análise aqui pretendida e de­veremos voltar a este aspecto em tópico adiante.

III. JUROS SOBRE CAPITAL PROPRIO

o pagamento de Juros sobre Capital Próprio como remuneração aos sócios e acionistas foi instituído pelo art. 9° da Lei n° 9.249/95, o qual prevê que a pessoa jurídica poderá deduzir como despesa do perío-

v - paga a pessoa ligada aluguéis. royalties ou assistência técnica em montante que excede notoriamente ao valor de mercado; VI - realiza com pessoa ligada qualquer outro negócio em condições de favorecimento, assim entendidas condições mais vantajosas para a pessoa ligada do que as que pre­valeçam no mercado ou em que a pessoa jurídica contrataria com terceiros. § I ° O disposto nos incisos I e IV não se aplica nos casos de devolução de participa­ção no capital social de titular. sócio ou acionista de pessoa jurídica em bens ou direi­tos. avaliados a valor contábil ou de mercado (Lei n° 9.249. de 1995. art. 22). § 2" A hipótese prevista no inciso II não se aplica quando a pessoa física transferir a pessoa jurídica. a título de integralização de capital. bens e direitos pelo valor cons­tante na respectiva declaração de bens (Lei n° 9.249. de 1995. art. 23. § 10). § 3D A prova de que o negócio foi realizado no interesse da pessoa jurídica e em condições estritamente comutativas. ou em que a pessoa jurídica contrataria com terceiros. exclui a presunção de distribuição disfarçada de lucros (Decreto-Lei nO 1.598. de 1977. art. 60. § 20 ).

290 Art. 465. Considera-se pessoa ligada à pessoa jurídica (Decreto-Lei nO 1.598. de 1977. art. 60. § 3D• e Decreto-Lei nO 2.065. de 1983. art. 20. inciso IV): I - o sócio ou acionista desta. mesmo quando outra pessoa jurídica; II - o administrador ou o titular da pessoa jurídica; III - o cônjuge e os parentes até o terceiro grau. inclusive os afins. do sócio pessoa física de que trata o inciso I e das demais pessoas mencionadas no inciso II.

291 Art. 244. Para efeito do disposto nos arts. 240. 241 e 243. será considerada vinculada à pessoa jurídica domiciliada no Brasil (Lei n° 9.430. de 1996. art. 23): I - a matriz desta. quando domiciliada no exterior; II - a sua filial ou sucursal. domiciliada no exterior;

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

do, os juros pagos ou creditados individualmente aos sócios ou acio­nistas, calculados sobre as contas do patrimônio líquido e limita­dos à variação, pro rata dia, da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP).

Tem-se entendido que para efeito de cálculo dos Juros sobre Capital Próprio, a base deve ser o patrimônio líquido ajustado do período de apuração imediatamente anterior. Portanto, o lucro do próprio período-base não é possível ser remunerado, pois que ainda não compõe o patrimônio líquido. A partir do encerramento contábil do período e a conseqüente transferência do resultado para o patrimônio líquido, ter-se-á uma nova base de cálculo para os Juros sobre Capital Próprio para o período subseqüente, seja este trimes­tral ou anual conforme opção do contribuinte.

Conforme previsão legal, alguns ajustes no patrimônio líquido devem ser realizados quando do cálculo dos Juros sobre Capital Pró­

pno, como segue:

1II - a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, cuja participa­ção societária no seu capital social a caracterize como sua controladora ou coligada, na forma definida nos §§ 1 ° e 2° do art. 243 da Lei n° 6.404, de 1976; IV - a pessoa jurídica domiciliada no exterior que seja caracterizada como sua con­trolada ou coligada, na forma dos §§ 1 ° e 2° do art. 243 da Lei n° 6.404, de 1971i; V - a pessoa jurídica domiciliada no exterior, quando esta e a empresa domiciliada no Brasil estiverem sob controle societário ou administrativo comum ou quando pelo menos dez por cento do capital social de cada uma pertencer a uma mesma

pessoa física ou jurídica; VI - a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, que, em conjunto com a pessoa jurídíca domiciliada no Brasil. tiver participação societária no capital social de uma terceira pessoa jl'rídica, cuja soma as caracterize como controladoras ou coligadas desta, na forma defir ida nos §§ 1° e 2° do art. 243 da Lei n° 6.404, de 1976; VIl a pessoa física ou jurídi :a, residente ou domiciliada no exterior, que seja sua associada, na forma de consó:cio ou condomínio, conforme definido na legislação

brasileira, em qualquer empreendimento; VlII _ a pessoa física residente no exterior que for parente ou afim até o terceiro grau. cônjuge ou companheiro de qualquer de seus diretores ou de seu sócio ou acionista

controlador em participação direta ou indireta; IX a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, que goze de exclusividade, como seu agente, distribuidor ou concessionário, para a compra e venda

de bens, serviços ou direitos; X _ a pessoa física ou jurídica, residente ou domiciliada no exterior, em relação àqual a pessoa jurídica domiciliada no Brasil goze de exclusividade, c,omo agent~, dlstn­buidora ou concessionária, para a compra e venda de bens, servIços ou dIreItos,

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

a) Reserva de Reavaliação não realizada: o patrimônio líqui­do será diminuído quando houver reserva de reavaliação não rea­lizada, ou seja, não tributada para fins de Imposto de Renda e Contribuição Social sobre o Lucro, ainda que capitalizada, con­forme disposto no art. 90 , §8° da Lei na 9.249/95.

b) Reserva de Reavaliação Capitalizada: o patrimônio líqui­do será diminuído quando houver reserva de reavaliação capitali­zada e não tributada para fins de Imposto de Renda e Contribui­ção Social, nos termos dos artigos 436 e 437 do RIR/99;

c) Reserva Especial: o patrimônio líquido será diminuído quando houver reserva especial, proveniente de correção mone­tária das contas de ativo permanente, incorporada ao capital e não tributada para fins de Imposto de Renda e Contribuição So­cial sobre o lucro nos termos do artigo 460 do RIR/99.

Caso o patrimônio líquido permaneça inalterado durante todo o período, ou seja, não ocorram acréscimos ou reduções tais como aumento de capital, pagamento de dividendos, etc, o cálcu­lo dos Juros sobre Capital Próprio será linear, ou seja, a base será constante para todo o período e igual ao patrimônio líquido do período de apuração imediatamente anterior. Maior complexida­de é verificada quando houver alterações do patrimônio líquido no decorrer do período-base uma vez que, neste caso, a aplicação da taxa de juros será pro rata dia, para cada intervalo de tempo e montante de patrimônio.

Observe-se ainda a existência de limites, regulamentados pelo art. 29, §3o da Instrução Normativa na 11/96, que dispõe

que os Juros sobre Capital Próprio pagos aos sócios ou acionistas não poderão exceder a 50% do maior dos seguintes valores:

a) Dos lucros acumulados de períodos anteriores; ou b) Do lucro líquido correspondente ao período-base do pa­

gamento ou crédito dos juros, antes da provisão para o Imposto de Renda e após a despesa de Contribuição Social sobre o Lucro e da dedução dos referidos juros, como disposto no art. 29, pará­grafo único, da Instrução Normativa na 93/97.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

A legislação em vigor determina que para fins de dedutibilidade dos juros, estes devem ser registrados na escritu­ração contábil como despesa financeira, em contrapartida a conta ou subconta de seu passivo exigível, representativa de direito de crédito dos sócios da Sociedade.

Desta forma, para fins fiscais, o valor apurado, a título de pagamento de Juros sobre Capital Próprio, é considerado despesa financeira dedutível na apuração do lucro real, bem como na base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, con­forme dispõe o art. 30, parágrafo único da Instrução Normativa nO 11/96.

Ademais, cabe mencionarmos que o montante reconhecido, a título do pagamento de Juros sobre Capital Próprio, e constitu­ído no passivo exigível da Sociedade, poderá ser imputado aos sócios ou acionistas na forma de dividendos, conforme dispõe o

art. 9°, §6° da Lei nO 9.249/95. Destaca-se, ainda, que é facultada a possibilidade de poste­

rior aumento de capital, no montante dos Juros sobre Capital Pró­

prio, sem a perda da dedutibilidade da despesa, como disposto no

art. 1°, parágrafo único, da Instrução Normativa nO 41/98.

IV. Dos EFEITOS DO AJUSTE DE PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA NO

CÁLCULO DOS JUROS SOBRE CAPITAL PRÓPRIO

Até o ano-calendário de 2001, os ajustes de preços de trans­

ferência causavam efeitos somente para fins de adição ao Lucro

Real e à base de cálculo da CSLL. Entretanto, a partir do ano-calendário de 2002, com a edi­

ção da Medida Provisória nO 66 de 29 de agosto, posteriormente

convertida na Lei 10.637, de 30 de dezembro de 2002, os ajustes

de preços de transferência nas importações geram efeitos tam­

bém no cálculo dos juros sobre o capital próprio.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Isto porque, segundo a regra inserida pelo art. 45 292 de cita­da Lei, a pessoa jurídica poderia optar quanto à forma de reco­nhecimento dos ajustes de Preços de Transferência decorrentes de

importação, quais sejam: Opção contábil: na qual o ajuste de preços de transferência so­

bre as importações deveria ser efetuado a débito da conta lucros acu­mulados, e parte a crédito de conta de ativo, para os bens não vendi­dos dentro do mesmo exercício de aquisição, e parte a crédito de custo ou despesa (Lucros e Perdas), caso os bens adquiridos tenham

sido realizados dentro do próprio período de aquisição. A previsão de contabilização do ajuste de preços de transferên­

cia é matéria que em si merece análise complexa e específica. De

292 Art. 45. Nos casos de apuração de excesso de Cl/sto de aq.úsição de bens, direitos e

serviços, importados de empresas vinculadas e que sejam considerados indcdutíveis na determinação do lucro real e da base de cálCl/lo da contribuição social sobre o

lucro líquido, apurados na forma do art. 18 da Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, a pessoa jurídica deverá ajustar o excesso de custo, determinado por um dos

métodos previstos na legislação, no encerramento do período de apuração,

cmllabilmente, por meio de lançamento a débito de conta de resultados acumulados e a crédito de:

I - conta do ativo onde foi contabilizada a aquisição dos bens, direitos ou serviços e que permanecerem ali registrados ao final do período de apuração; ou " - conta própria de custo ou de despesa do período de apuração, que registre o valor dos bens, direitos ou serviços, no caso de esses ativos já terem sido baixados da conta de ativo que tenha registrado a sua aquisição. § I" No caso de bens classificáveis no ativo permanente e que tenham gerado quotas de depreciação, amortização ou exaustão, no ano-calendário da impor­tação, o valor do excesso de preço de aquisição na importação deverá ser credi­tado na conta de ativo em cujas quotas tenham sido debitadas, em contrapartida à conta de resultados acumulados a que se refere o caput. § 2" Caso a pessoa jurídica opte por adicionar, na determinação do lucro real e da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido, o valor do exces­so apurado em cada período de apuração somente por ocasião da realização por alienação ou baixa a qualquer título do bem, direito ou serviço adquirido, o valor total do excesso apurado no período de aquisição deverá ser excluído do patrimônio líquido, para fins de determinação da base de cálculo dos juros so­bre o capital próprio, de que trata o art. 9° da Lei n° 9.249, de 26 de dezembro de 1995, alterada pela Lei n° 9.430, de 27 de dezembro de 1996. § 3" Na hipótese do § 2°, a pessoa jurídica deverá registrar o valor total do exces­so de preço de aquisição em subconta própria que registre o valor do bem, ser­viço ou direito adquirido no exterior.

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

qualquer modo, devemos observar que sua adoção produzirá signifi­cativa distorção das demonstrações financeiras, misturando concei­tos fiscais com contábeis. Imagine-se, só como exemplo, alterar toda a valorização dos estoques de produtos importados de pessoas vin­culadas, que passariam não mais a ser representados pelo seu custo histórico de aquisição, mas pelo preço máximo admitido de acordo com a legislação de preços de transferência.

Opção fiscal: onde o ajuste de preços de transferência conti­nuaria a ser efetuado apenas para fins de adição ao lucro real e à

base de cálculo da CSLL, sendo que o valor do excesso de custo apurado no período de aquisição deverá ser excluído do patrimônio líquido, para fins de determinação da base de cálculo dos juros so­

bre o capital próprio. Assim, interessa-nos aqui o teor do §2° do art. 45 da Lei 10.637,

aplicável somente no caso de opção pelo ajuste fiscal, que na verdade sempre foi a forma de reconhecimento do ajuste de preços de trans­

ferência desde sua regulamentação no Brasil. Determina referido § 2° que havendo ajuste de Preços de Trans­

ferência decorrente de importações, deve o contribuinte ajustar seu

patrimônio líquido, de modo a reduzir a base de cálculo para efeito de quantificação dos Juros sobre Capital Próprio. Portanto, o legis­lador entendeu que existe certa conexão entre as duas figuras e esta­

beleceu restrição ao cálculo dos Juros sobre Capital Próprio. Interessante buscar a ra :ionalidade por trás desta exigência, ou

seja, cabe perguntar por que um contribuinte que apresenta concomitantemente ajuste d ~ Preços de Transferência de importa­

ções e optou pelo cálculo dt Juros sobre Capital Próprio deva ser penalizado de modo a ter uma despesa menor que outro contribuin­

te que não tem ajuste de Preços de Transferência. Como vimos anteriormente, os Juros sobre Capital Próprio re­

presentam uma receita em que somente os sócios são elegíveis para

recebê-la. Mesmo em um determinado grupo econômico, as empre­

sas interligadas, coligadas, etc, jamais poderão configurar como beneficiárias dos Juros sobre Capital Próprio. Mesmo controladores indiretos não poderão nunca receber diretamente tais recursos, dada

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

a característica peculiar dos Juros sobre Capital Próprio como misto

de dividendo e juros. Por outro lado, vimos também anteriormente que ajustes de

Preços de Transferência podem decorrer de transações variadas, muitas vezes não realizadas no contexto estrito de controlada -controladora em função da terminologia "partes vinculadas"

Analisemos uma situação hipotética em que a empresa "Pt lo­calizada no exterior, controladora da empresa "B" no Brasil, pratica com pessoas vinculadas transações de compra e venda que impli­quem em ajustes de preços de transferência na importação para o Brasil. Ao mesmo tempo, pretende a empresa "B" remunerar sua sócia "/'\' com Juros sobre Capital Próprio. Assumamos ainda que a em­presa "B" opte por refletir apenas fiscalmente o ajuste de Preços de

Transferência e não contabilmente. Na situação acima temos que a empresa "B", ao praticar transa­

ções com sobrepreço, incorreu em custos maiores do que seriam admissíveis e, portanto, teve seu lucro contábil diminuído. Este lu­cro contábil a menor será, ao final do período, transferido para patrimônio líquido, e, assim, a empresa "B" terá um patrimônio total

menor do que teria se não tivesse praticado tal sobrepreço. Este efei­

to, porém, será perceptível somente no ano subseqüente e não no

próprio período-base.

A partir destes fatos, podemos constatar que a empresa "B" irá reduzir implicitamente sua própria base de cálculo futura de Juros

sobre Capital Próprio, independentemente de qualquer ajuste re­querido pelo legislador.

Na busca do nexo causal vislumbrado pelo legislador, devemos analisar ainda as seguintes perspectivas:

a) Identidade entre controladora e origem do ajuste de Preços de Transferência

O legislador adotou um pressuposto altamente questionável,

qual seja, de que o ajuste de preços de transferência na importação

necessariamente relaciona-se com a empresa controladora "/'\' em

nosso exemplo. Com efeito, pode ser que a empresa "B" sequer tenha

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN lR.

importado algum bem, serviço ou direito de "i\.' e, portanto, o ajuste de Preços de Transferência decorra de transações com outras empre­sas vinculadas, que não "i\.'

O disposto no §2° parece sugerir que a intenção do legislador foi penalizar a controladora "i\.' porque esta já estaria recebendo lu­

cros via sobrepreço, e se recebesse os Juros sobre Capital Próprio

sobre o patrimônio líquido "normal" estaria recebendo em duplicidade ou antecipadamente.

Parece-nos que esta identidade não é sempre verdadeira e, por­

tanto, houve uma simplificação indevida por parte do legislador.

Conforme demonstramos em tópicos anteriores, o conceito de empresa vinculada não se confunde com o conceito de empresa liga­

da. Sendo aquele conceito amplo, não restrito à relação controlada /

controladora, não poderia o legislador estabelecer este pressuposto.

b) Necessidade ou não do ajuste na base de cálculo dos Juros

sobre Capital Próprio Mesmo assumindo o pressuposto adotado pelo legislador de

que há identidade entre origem do ajuste de Preços de Transferência

com a controladora "i\.', cabe discutir se de fato cabe algum ajuste na

forma pretendida. Como demonstramos anteriormente, a prática de sobrepreço

automaticamente impõe uma redução patrimonial à empresa "B" para

períodos futuros. Considerando que a base de cálculo dos Juros so­

bre Capital Próprio para o período corrente é o Patrimônio Líquido

do período anterior, o qual não poderia ter sido afetado por transa­

ções ocorridas no período CI lrrente, não há sentido em querer ajustar

algo que, por definição, não poderia ter sido distorcido. Mesmo admitindo que a intenção do legislador tenha sido de

"antecipar" o efeito que será verificado no futuro para o período atu­

aI, em que houve a importação, o legislador teria que pressupor que

houve o efetivo pagamento das importações no período corrente, o

que não necessariamente ocorre.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

Outra possibilidade seria assumir que o ajuste de Preços de Transferência do ano corrente seja considerado no cálculo de Juros sobre Capital Próprio do ano seguinte. Neste caso haverá redução em duplicidade (contábil e fiscal) e, portanto, também este entendi­mento é pouco defensável.

Uma terceira possibilidade seria considerar como base de cál­culo para Juros sobre Capital Próprio para o período corrente o Patrimônio Líquido do anterior, reduzido do ajuste de Preços de Transferência também do ano anterior. Seria aplicar o regime de competência entre o ajuste de Preços de Transferência e o Patrimônio Líquido. Mas também neste caso seria evidente a duplicidade de ajuste pois o Patrimônio Líquido do período anterior já encontraria reduzido, o que seria duplicado pelo ajuste fiscal.

Resta evidente que nenhuma das alternativas parece suportável ou logicamente consistente.

c) Diferenciação no tratamento de importações e exportações Um detalhe na redação do art. 45 merece algumas considerações,

qual seja, referido dispositivo menciona apenas ajustes decorrentes de importações, não fazendo qualquer menção às exportações.

Ora, tanto as importações quanto as exportações estão sujeitas às regras de preços de transferência. Diferem entre si na medida em

que, nas importações, temos parte de um custo ou despesa efetiva­mente incorridos, e supostamente pagos, tratados como parcialmen­te não dedutíveis, enquanto nas exportações temos uma presunção de que a receita que deveria ter sido reconhecida seria maior do que a registrada contabilmente e, portanto, sem contrapartida em caixa. Tal diferença, contudo, não parece justificar o tratamento tributário desigual entre as duas figuras.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

V. Dos EFEITOS DO PAGAMENTO DE JUROS SOBRE CAPITAL PRÓ­

PRIO NO CALCULO DO SAFE HARBOUR DE LUCRATlVIOAOE

PARA FINS PREÇOS DE TRANSFERÊNCIA

No tópico anterior buscamos explorar a conexão entre as duas figuras (Preços de Transferência e Juros sobre Capital Próprio) no sentido do efeito de Preços de Transferência nos Juros sobre Capital Próprio. Existe, porém, um efeito em sentido oposto, ou seja, a ado­ção de Juros sobre Capital Próprio afeta também Preços de Transfe­rência no que se refere ao cálculo do chamado safe harbour da lucratividade.

Note-se, contudo, que enquanto o efeito dos Preços de Trans­ferência nos Juros sobre Capital Próprio é apenas na parcela decor­rente de importações, o efeito dos Juros sobre Capital Próprio no Pre­ços de Transferência é apenas na parcela de exportações pois os safe

harbours beneficiam exclusivamente estas. Com isso, não há efeito

circular entre os cálculos. De acordo com a legislação vigente, "as receitas auferidas nas

operações efetuadas com pessoa vinculada ficam sujeitas a arbitramento

quando o preço médio de venda dos bens, serviços ou direitos, nas exporta­

ções efetuadas durante o respectivo período de apuração da base de cálculo

do imposto de renda,for inferior a noventa por cento do preço médio pra­

ticado na venda dos mesmos bens, serviços ou direitos, no mercado brasi­

leiro, durante o mesmo período, em condições de pagamento semelhantes"

Caso se verifique qUi: o preço médio praticado na exportação

de cada bem para vinculada é inferior ao mínimo exigido, calculado de acordo com o método legal escolhido, a diferença deverá ser adi­

cionada às bases tributáveis como "complementação" da receita. Por outro lado, através de sua Instrução Normativa 243/02, a

Secretaria da Receita Federal dispensou da aplicação dos métodos de preços de transferência relativos à exportação, o contribuinte que se enquadre em pelo menos uma das situações descritas a seguir,

conhecidas como "safe harbours"

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

É importante ressaltar que, de acordo com seu artigo 37, o enquadramento em um dos safo harbours mencionados não implica em sua aceitação definitiva, uma vez que poderá ser questionado em eventual procedimento de ofício pela Secretaria da Receita Federal.

V.l . SAFE HARBOUR DA REPRESENTATIVIDADE

Estará dispensada de adotar os métodos de apuração dos Preços de Transferência a pessoa jurídica que comprovar, através dos próprio:> documentos que lastrearam as operações, que a receita líquida das suas exportações para vinculadas e paraísos fiscais não excedeu a 5% (cinco por cento) da receita líquida total do mesmo período. Para esse fim, consideram-se todas as operações de venda no mercado interno e ex­terno praticadas com pessoas vinculadas e terceiros.

Esta dispensa não beneficia as operações realizadas com pessoas, vinculadas ou não, localizadas em países com tributação favorecida, também conhecidas como paraísos fiscais. Tais operações sempre deverão ter justificados seus preços praticados.

V.2. SAFE HARBOUR DA LUCRATIVIDADE

Ainda de acordo com a Instrução Normativa SRF 243/02, po­derá comprovar a adequação dos preços praticados apenas com os documentos das operações de exportação, a pessoa jurídica que tiver apurado lucro líquido, em valor equivalente a, no mínimo, 5% (cinco por cento) antes do IRPJ e da CSLL, decorrente das receitas das exportações para empresas vinculadas. Esta dispensa também não alcança as operações realizadas com pessoas localizadas em paraísos fiscais, vinculadas ou não.

Através da Instrução Normativa 382/03, a Secretaria da Recei­

ta Federal alterou a forma de determinação desse dispositivo, exi­gindo que o referido percentual de 5% corresponda à "média anual do período de apuração e dos dois anos precedentes".

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Remanesce, porém, ambigüidade na interpretação desta nor­ma, pois não se esclarece se a" média anual do período ... " refere-se à

média aritmética dos percentuais dos lucros líquidos apurados nas exportações de cada um dos três anos consecutivos ou à rentabilida­de média de todo o triênio conjuntamente considerado.

O fato é que o contribuinte, ao optar por pagar Juros sobre Capital Próprio aos seus sócios, deverá reconhecer despesa financei­ra em sua contabilidade para permitir a dedução dos Juros sobre Capital Próprio. Em que pese a existência de teses sobre a possibili­dade de alocação dos Juros sobre Capital Próprio apenas fiscalmente, sem a respectiva contabilização, tema que não será aqui analisado, assumimos aqui a posição tradicional.

Ao proceder os cálculos de rateio de receitas e despesas para de­

terminação do safe harbour da lucratividade, aquela despesa financeira deverá também ser rateada para as exportações como vinculadas.

Este entendimento baseia-se na constatação de que os Juros sobre Capital Próprio têm como base de cálculo o Património Lí­quido que por sua vez é indistinto, ou seja, não pode ser atribuído com exclusividade para mercado interno ou mercado externo, esse ou aquele cliente. Com efeito, o Património Líquido, assim enten­dido como os recursos dos sócios, destina-se à sobrevivência da enti­

dade como um todo e por isso não passível de segregação em partes. Considerando que os Juros sobre Capital Próprio representa

uma opção do contribuinte, este pode se deparar com uma situação

insólita: se optar por reconhecer os Juros sobre Capital Próprio po­

derá, com isso, afetar o safi harbour da lucratividade de modo a não alcançar o mínimo requerido de 5% de margem. Nesta hipótese, es­

tará sujeito aos ajustes de Preços de Transferência que podem inclu­sive representar montante superior à economia tributária decorrente

da adoção dos Juros sobre Capital Próprio. Temos aqui verdadeira "armadilha" tributária, em que o contri­

buinte, buscando otimizar sua carga tributária, acaba sendo induzi­do a não mais se enquadrar no safe harbour, ficando exposto ao ajuste

d.e Preços de Transferência da exportação.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

VI. EFEITOS IMPREVISTOS DO ART. 45

Ao pretender impor efeitos contábeis aos ajustes de preços de transferência, o legislador inadvertidamente permite a ocorrência de situações imprevistas, dependendo da conjugação de alguns fatores.

Com efeito, imagine-se contribuinte que apresente ajuste de preços de transferência nas importações de significativa proporção, estando ele em situação de prejuízo contábil. Ao proceder os lança­mentos contábeis previstos pelo art. 45, será feito crédito direto no resultado do período (na hipótese do inciso II), podendo chegar a ponto de reverter de prejuízo para lucro a demonstração financeira

deste contribuinte. Assumamos, ainda, que referido contribuinte que calcula Juros

sobre Capital Próprio, apresente base de cálculo significativa e adote como limitador o valor de 50% do lucro do período. Nesta situação, veremos que o contribuinte pode se beneficiar com a Opção Contábil, à medida em que, agora, a demonstração financeira apresenta lucro no que antes havia prejuízo. Resultado: a norma pode fazer com que a despesa de Juros sobre Capital Próprio aumente ao invés de dimi­nuir, contrariando a pretensa lógica do dispositivo.

VII. CONCLUSÕES

Conforme pudemos discutir ao longo deste trabalho, é possível

estabelecer conexões em dois sentidos entre as figuras tributárias dos Juros sobre Capital Próprio e Preços de Transferência.

A primeira, introduzida pelo art. 45 da Lei 10.637/02 estabele­

ceu efeito reflexo do ajuste de preços de transferência no cálculo dos Juros sobre Capital Próprio. Esta conexão é restrita à parcela do ajuste

de preços de transferência das importações.

A segunda decorre da inevitável redução da lucratividade do contribuinte ao exercer a opção dos Juros sobre Capital Próprio, fato que irá impactar o cálculo do safe harbour da lucratividade pela

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

alocação proporcional das despesas de juros na verificação da lucratividade mínima requerida de cinco por cento.

Se a segunda conexão é uma decorrência matemática e contábil , o mesmo não se pode afirmar da primeira conexão, que foi estabelecida arbitrariamente pelo legislador, em base a pressupostos discutíveis.

Demonstramos que, sendo os Juros sobre Capital Próprio apli­cáveis somente aos sócios e, sendo o ajuste de importação de Preços de Transferência possivelmente decorrente de várias pessoas vincu­ladas, não é possível assegurar a identidade entre a origem do ajuste de Preços de Transferência com o sócio controlador. A conexão estabelecida pelo legislador foi, portanto, simplista.

Qyanto à efetiva necessidade de ajuste do Patrimônio Líquido

para efeito de cálculo dos Juros sobre Capital Próprio, pudemos tam­bém demonstrar que não existe prévia distorção patrimonial que ca­racterize benefício indevido ao sócio controlador que justifique a adoção do ajuste. A aplicação do dispositivo em tela implicará inevi­tável duplicidade de efeitos, seja qual for a interpretação adotada

dentre aquelas listadas anteriormente. Apontamos também efeito imprevisto, mas benéfico ao contri­

buinte, em que a contabilização do ajuste de importação aumenta o

lucro do período, um dos limitantes da despesa de juros sobre capital

próprio. Embora a norma pretendesse diminuir a base de cálculo dos juros, ao mesmo tempo f(·z com que o limitador fosse majorado,

permitindo situações extremas em que ao final do dia o contribuinte possa reconhecer mais jun,s sobre capital próprio se contabilizar os

ajustes de preços de transf'Tência do que se não o fizer. Por fim, cabe observar que o art. 45 irá resultar em tratamento

não isonômico entre contribuintes, pois sua aplicação representará uma penalização dos contribuintes com ajuste de Preços de Transfe­

rência, pois estes poderão pagar proporcionalmente menos Juros so­bre Capital Próprio do que outros contribuintes sem ajuste de Pre-

ços de Transferência.

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t + I

Pessoas Jurídicas Imunes ou Isentas - Impossibilidade de Incidência do

Imposto de Renda sobre suas Aplicações Financeiras

MARIA BEATRIZ MARTINEZ

Advogada. especialista em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Estudos Tributários ('lBET") e especialista em Direito dos Negócios Internacio­nais pela Universidade Complutense de Madrid - Espanha. LLM pela Uni­

versidade de Nova York.

Page 274: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

PESSOAS JURíDICAS IMUNES OU ISENTAS -IMPOSSI­BILIDADE DE INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA SO­

BRE SUAS APLICAÇÕES FINANCEIRAS

o presente artigo trata da impossibilidade de tributação das pes­

soas jurídicas imunes ou isentas pelo Imposto de Renda da Pessoa Jurí­

dica ("IRPJ"), incidente sobre os rendimentos ou ganhos de capital

auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável.

No âmbito da imunidade, serão consideradas as instituições de

educação e assistência social, sem fins lucrativos. No âmbito da isen­

ção, serão consideradas as instituições de caráter filantrópico, recre­

ativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os servi­

ços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposi­

ção do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos.

I. PESSOAS JURíDICAS IMUNES

Nos termos do artigo 150, inciso V1, alínea 'c', da Constituição

Federal (CF/88), corroborado pelo artigo 9°, inciso IV, 'c', do Códi­

go Tributário Nacional (CTN), é vedada a instituição de impostos

que incidam sobre o patrimônio, a renda ou os serviços prestados

por instituições de educação e de assistência social sem fins lucrati­vos, in verbis:

"Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao

contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito

Federal e aos Municípios:

( ... )

VI - instituir impostos sobre:

( ... )

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

c) patrimônio, renda ou serviços dos partidos políticos, in­clusive suas fundações, das entidades sindicais dos traba­lhadores, das instituições de educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei."

Os requisitos legais a serem cumpridos pelas referidas institui­ções encontram-se previstos no artigo 14 do CTN, complementado pelo artigo 12, § 2°, da Lei nO 9.532, de 10 de dezembro de 1997 ("Lei nO 9.532/97"), a saber: a) não distribuição de qualquer parcela de seu patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; b) não remu­neração de seus dirigentes pelos serviços prestados293 ; c) aplicação integral, no País, de seus recursos na manutenção de seus objetivos institucionais; d) manutenção da escrituração de suas receitas e des­pesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão; e) conservação, pelo prazo de cinco anos contados da data da emissão, dos documentos que comprovem a origem de suas recei­

tas e a efetivação de suas despesas, bem como a realização de quais­quer outros atos ou operações que venham a modificar sua situação patrimonial; f) apresentação anual de Declaração de Rendimentos;

g) recolhimento dos tributos retidos sobre os rendimentos pagos ou

creditados, assim como da contribuição para a Seguridade Social relativa aos empregados e o cumprimento das obrigações acessórias

decorrentes; e h) no caso de incorporação, fusão, cisão ou encerra­mento de suas atividades, d!stinação de seu patrimônio a outra ins­

tituição que atenda às condições para o gozo da imunidade.

293 A esse respeito, ver artigo 34 da Lei n° 10.637/02, iII verbis: "A condição e a vedação estabelecidas, respectivamente, no art. 13, § 2°, III, b, da Lei n° 9.249, de 26 de dezem· bro de 1995, e no art. 12, § 2°, a, da Lei n° 9.532, de 10 de dezembro de 1997, não alcançam a hipótese de remuneração de dirigente, em decorrência de vinculo empregatício, pelas Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), qualificadas segundo as normas estabelecidas na Lei nO 9.790, de 23 de março de 1999, e pelas Organizações Sociais (OS), qualificadas consoante os dispositivos da Lei nO 9.637, de 15 de maio de 1998. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica­se somente à remuneração não superior, em seu valor bruto, ao limite estabelecido

para a remuneração de servidores do Poder Executivo Federal."

273

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Com base nos dispositivos legais acima referidos, portanto, não pode ser instituído imposto sobre a renda de instituições de educação e assistência social, o que logicamente afasta a incidência do IRPJ.

Ocorre que, a despeito da clareza do alcance da imunidade tri­butária concedida, o artigo 12, § 1°, da Lei nO 9.532/97, corroborado pelo artigo 28 do mesmo diploma legaF94 , afastou a imunidade refe­rida no que diz respeito aos rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fIXa ou de renda variável, in verbis:

"Art. 12. Para efeito do disposto no art. 150, inciso Vl, alí­

nea c, da Constituição, considera-se imune a instituição de

educação ou de assistência social que preste os serviços para

os quais houver sido instituída e os coloque à disposição da

população em geral, em caráter complementar às atividades

do Estado, sem fins lucrativos.

§ 10 Não estão abrangidos pela imunidade os rendimen­

tos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras

de renda fixa ou de renda variável.

( ... )

§ 3° Considera-se entidade sem fins lucrativos a que não apre­

sente superávit em suas contas ou, caso o apresente em determi­

nado exercício, destine referido resultado integralmente ao

incremento de seu ativo imobilizado. 295 "

294 "Art. 28. A partir de 1 o de janeiro de 1998, a incidência do imposto de renda sobre os rendimentos auferidos por qualquer beneficiário, inclusive pessoa jurídica imune ou isenta, nas aplicações em fundos de investimento, constituídos sob qualquer forma, ocorrerá: I - diariamente, sobre os rendimentos produzidos pelos títulos, aplicações financeiras e valores mobiliários de renda fixa integrantes das carteiras dos fundos; II - por ocasião do resgate das quotas, em relação à parcela dos valores mobiliários de renda variável integrante das carreiras dos fundos. ( ... )"

295 O disposto por esse dispositivo legal é corroborado pelo Conselho Federal de Conta­bilidade em suas Normas Brasileiras de Contabilidade (NBC T 10.19 - Entidades sem finalidade de lucros), i/1 I'erbis:" 10.19.1.3 - As entidades sem finalidade de lucro são aquelas em que o resultado positivo não é destinado aos detentores do patrimônio líquido e o lucro ou prejuízo são denominados, respectivamente, de superávit ou

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Assim, a despeito de ser concedida imunidade às instituições de educação e de assistência social no tocante ao IRPJ, existe dispo­sitivo legal que limita o alcance do instituto, possibilitando a co­brança do tributo sobre os rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável.

Um exemplo interessante de entidade imune diz respeito às entidades fechadas de previdência privada sem fins lucrativos, as quais configuram instituições de assistência social. Em relação a este caso específico, já existe posicionamento do Supremo Tribunal Federal ("STF"), o qual será analisado posteriormente.

II. PESSOAS JURiolCAS ISENTAS

o artigo 15 da Lei nO 9.532/97 prevê a isenção do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido ("CSLL") para as insti­tuições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico, bem como para as associações civis nela definidas, sem fins lucrativos.

Os requisitos legais a serem cumpridos pelas instituições con­sideradas isentas são os que seguem: a) não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados; e b) apresentar, anu­

almente, Declaração de Rendimentos, em conformidade com o dis­

posto em ato da Secretaria ria Receita Federal.

déficit. 10.19.1.4 - As entidades sem finalidade de lucros exercem atividades assistenciais. de saúde. educacionais. técnico-científicas. esportivas. religiosas. políticas. culturais. beneficentes. sociais. de conselhos de classe e outras. administrando pessoas. coisas. c interesses coexistentes e coordenados em torno de um património com finalidade co­mum ou comunitária. 10.19.1.5 - Essas entidades são constituídas sob a forma de fun­dações públicas ou privadas. ou sociedades civis. nas categorias de entidades sindicais. culturais. associações de classe. partidos políticos. ordem dos advogados. conselhos federais. regionais e seccionais de profissóes liberais. clubes esportivos não-comerciais e outras entidades enquadradas no conceito do item 10.19.1.4 ....

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Ocorre que, da mesma forma como acontece no caso da imuni­

dade, o § 2° do artigo em questão afastou da isenção o imposto de renda incidente sobre os rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplicações financeiras de renda fixa ou de renda variável, in verbis:

"Art. 15. Consideram-se isentas as instituições de caráter filantrópico, recreativo, cultural e científico e as associações civis que prestem os serviços para os quais houverem sido instituídas e os coloquem à disposição do grupo de pessoas a que se destinam, sem fins lucrativos.

§ 1° A isenção a que se refere este artigo aplica-se, exclusi­vamente, em relação ao imposto de renda da pessoa jurídica e à contribuição social sobre o lucro üquido, observado o disposto no parágrafo subseqüente.

§ 2°. Não estão abrangidos pela isenção do imposto de ren­da os rendimentos e ganhos de capital auferidos em aplica­ções financeiras de renda fixa ou de renda variável.

§ 3 D Às instituições isentas aplicam-se as disposições do art. 12,

§ 2 0, alíneas 'ii" e 'e" e § 3 D e dos arts. 13 e 1196

296 "Ar!. 13. Sem prejuízo das demais penalidades previstas na lei. a Secretaria da Receita Federal suspenderá o gozo da imunidade a que se refere o artigo anterior, relativa­mente aos anos-calendários em que a pessoa jurídica houver praticado ou, por qual· quer forma, houver contribuído para a prática de ato que constitua infração a dispo­sitivo da legislação tributária, especialmente no caso de informar ou declarar falsa­mente, omitir ou simular o recebimento de doações em bens ou em dinheiro, ou de qualquer forma cooperar para que terceiro sonegue tributos ou pratique ilícitos fis­cais. Parágrafo único. Considera-se. também. infração a dispositivo da legislação tri­butária o pagamento. pela instituição imune. em favor de seus associados ou dirigen­tes. ou, ainda. em favor de sócios. acionistas ou dirigentes de pessoa jurídica a ela associada por qualquer forma. de despesas consideradas indedutíveis na determina­ção da base de cálculo do imposto sobre a renda ou da contribuição social sobre o lucro líquido." "Art. 14. A suspensão do gozo da imunidade aplica-se o disposto no art. 32 da lei n° 9.430, de 1996."

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COORDENAÇAo: PEDRO ANAN JR.

Ora, ao ser imune ou isenta do recolhimento do IRPJ, a pessoa jurídica não pode ser obrigada ao recolhimento ou à retenção do mesmo em fonte. Isso porque tanto o IRPJ como o Imposto de Ren­da Retido em Fonte (UIRRF") configuram o mesmo tributo, com mesmo fato gerador, qual seja, lucro/renda, o que afasta qualquer tipo de cobrança.

11.1. DA CONFIGURAÇÃO DO IRRF COMO MERA ANTECIPAÇÃO DO IR

Como é sabido, a apuração dos resultados sujeitos à tributa­ção do IR deve ser apresentada anualmente, ao final de cada exer­cício financeiro, por meio da Declaração de Rendimentos, a qual compreende o resultado das operações realizadas de Iode janeiro a 31 de dezembro.

Para determinação do saldo do IRPJ a pagar, a ser restituído ou compensado, o contribuinte poderá reduzir do imposto devido o valor do IRRF incidente sobre algumas receitas e rendimentos, especialmente aplicações financeiras de renda fixa ou variável. Essa

é a disposição do inciso II, § 3°, do artigo 620 do Decreto na 3.000/

99 (RIR/99), in verbis:

"Art. 620. Os rendimentos de que trata este Capítulo es­tão sujeitos à incidência do imposto na fonte, mediante

aplicação de alíquota; progressivas, de acordo com as se­

guintes tabelas em R,~ais:

( ... )

II - relativamente a fatos geradores que ocorrerem a par­tir de 10 de janeiro de 2000 (Lei nO 9.250, de 1995, art. 3°,

e Lei nO 9.532, de 1997, art. 21, parágrafo único):

§ Jo. O valor do imposto retido na fonte durante o ano-calen­

dário será considerado redução do apurado na declaração de

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

197 rendimentos, ressalvado o disposto no arfo 638 (Lei n"

9.250, de 1995, ar/o 12, inciso V)"

Indiscutível, portanto, que o IRRF é mera antecipação do IRPJ, sendo, inclusive, considerado redução deste. Dessa forma, no caso de instituições imunes ou isentas, em que não há IRPJ devido no final de cada exercício financeiro, não cabe a cobrança do IRRF.

Sobre o tema, sustenta a doutrina predominante que o fato ju­rídico que enseja o nascimento da obrigação tributária de pagar o imposto de renda, qual seja, auferir renda e proventos de qualquer natureza, nos termos do artigo 153, da CF/88, é de formação suces­siva. Isto porque o fato jurídico em questão não se resume a um único ato, mas a uma série deles que, em sua consecução, constituem fatos juridicamente relevantes.

Assim, ao longo do exercício financeiro, toda a aferição de ren­da e/ou proventos deve ser considerada a fim de que, ao final do exercício, seja possível verificar (i) a variação patrimonial positiva ocorrida em relação ao contribuinte e, em havendo, (ii) qual o mon­tante desta efetiva variação patrimonial.

Foi a partir desse conceito que o legislador infraconstitucional determinou que os rendimentos auferidos em aplicações financeiras em geral deveriam sofrer tributação na fonte (antecipação) e, poste­riormente, ser incluídos no cômputo do lucro real do exercício (tri­butação definitiva).

Ou seja, ao invés do IRPJ incidente sobre os rendimentos ser

pago somente ao final do exercício, existiria uma parte antecipada quando do resgate dos recursos aplicados ou ao final do período de

297 "Art. 638. Os rendimentos pagos a titulo de décimo terceiro salário (CF, art. 7°. inciso VIII) estão sujeitos à incidência do imposto na fonte com base na tabela progressiva (art. 620). observadas as seguintes normas (Lei n° 7.713, de 1988. art. 26. e Lei n° 8.134. de 1990. art. 16): I - não haverá retenção na fonte. pelo pagamento de anteci­pações; II - será devido. sobre o valor integral. no mês de sua quitação; III - a tributa­ção ocorrerá exclusivamente na fonte e separadamente dos demais rendimentos do beneficiário; IV - serão admitidas as deduções previstas na Seção VI."

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COORDENAÇAo: PEDRO ANAN JR.

carência da aplicação, dependendo da modalidade de investimento realizado pelo contribuinte.

Ao tratar do tema, Rubens Gomes de Sousa298 entende que "O imposto na fonte pode assumir duas naturezas: a) ou é o único imposto

devido sobre o rendimento de que se trate, sendo então definitivo o seu

pagamento: é o que na doutrina italiana se chama de imposto una tantum (de uma só vez); (. . .) b) ou é cobrado como antecipação por conta de um

imposto futuro, ou menor que a do imposto antecipado: é o que na doutri­

na francesa se chama accompte e na norte-americana e inglesa prepayment."

Misabel Abreu Machado Derzi, ao atualizar e comentar a obra de Aliomar Baleeiro, "Direito Tributário Brasileiro" (l1a ed. Rio de Janeiro: Forense, 1996), manifesta entendimento semelhante, in verbis:

"Originariamente, o imposto de renda (fonte) incidia ape­

nas sobre os rendimentos ao portador e dos residentes e domiciliados no exterior. Surgiu, portanto, por razões de praticidade ou pelas limitações territoriais da lei brasileira, como incidência única e exclusiva, cabendo às fontes paga­doras reter e recolher o tributo à repartição competente. Posteriormente, estendeu-se o imposto de fonte a outras

hipóteses, até a ampla generalização que se tem hoje. Não configura, em nenhum caso, tributo diferente do imposto de renda, mas, antes àeve ser analisado como mera anteci­

pação de imposto que se presume devido. Se, ao final do ano-base em que está periodizado ( ... ) o imposto não for devido, em decorrênci a de saídas-despesas elevadas, deverá ser devolvido ao contribuinte. ( ... ) A regra é sempre de que o imposto de renda-fonte é antecipação do imposto de ren­da, que se presume devido, no momento da retenção. As

exceções são poucas e somente se deve admitir o imposto de renda retido na fonte como incidência única e exclusiva naqueles casos em que se desconhece o beneficiário ou à lei

298 "Pareceres-3Imposto de Renda", Resenha Tributária, 1976, pág. 151.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

brasileira se impõem limites territoriais (praticidade). Nos demais casos, é evidente a inconstitucionalidade (aplicações de renda fIxa ou variável), pois poderá haver cobrança de impostos sem que se consume o fato jurídico."

Ou seja, o IRRF configura mera antecipação do IR devido ao final do exercício fiscal e como tal deve ser considerado. Nesse as­pecto, além do pacífico entendimento doutrinário a respeito, faz-se necessário salientar a posição de nossos Tribunais a respeito, incluí­do o Superior Tribunal de Justiça (STJ), a saber:

"EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. TRIBUTÁRIO. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. IMPOSTO DE REN­DA RETIDO NA FONTE. HIPÓTESE DE INCI­DÊNCIA COMPLEXA. TRIBUTO SUJEITO A LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. PRES­CRIçÃO. VERBA HONORÁRIA. A retenção do im­posto de renda na fonte configura mera antecipação do

imposto devido na declaração anual de rendimentos, uma vez que o conceito de renda envolve necessariamente um

período que, conforme determinado pela Constituição Fe­

deral, é anual. Mais a mais, é complexa a hipótese de inci­dência do aludido imposto, cuja ocorrência dá-se apenas ao

final do ano-base, quando se verifica o último dos fatos re­

queridos pela hipótese de incidência do tributo. "No caso de antecipação (como é o imposto de renda na fonte), em

regra, o que se passa é uma presunção, tendo em vista fortes indícios de que o indivíduo irá estar sujeito à existência de

um dever. C ... ) Então, antecipa-se o pagamento diante da

presunção imposta pelo ordenamento jurídico. Porém, não se pode criar uma ficção de renda. Portanto, na medida em

que se antecipa, necessariamente deve haver um acerto de

contas" CMarçal ]usten Filho, "Periodicidade do Imposto

de Renda I", in Revista de Direito Tributário, n. 63, p. 22).

No imposto de renda descontado na fonte, o lançamento é

feito por homologação. Dessarte, aplica-se à espécie a regra

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geral do prazo prescricional aplicada aos tributos sujeitos à homologação, no sentido de que a extinção do direito de pleitear a restituição ocorrerá após 05 (cinco) anos, conta­dos do fato gerador, acrescidos de mais 05 (cinco) anos da homologação. Vencida a Fazenda Pública, nada impede que seja a verba honorária fixada em percentual inferior àquele mínimo indicado no § 3° do artigo 20 do Código de Pro­cesso Civil, a teor do que dispõe o § 4° do retro citado arti­go, porquanto esse dispositivo processual não faz qualquer referência ao limite a que deve se restringir o julgador quando do arbitramento. Embargos de divergência acolhidos em parte." (STJ, P Seção, ERESP 289.398/DF, Relator: Mi­nistro Franciulli Neto, DJ 02/08/04).

"PROCESSUAL CIV1L E TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA NA FONTE. VERBAS INDENIZATÓRIAS. AÇÃO DE REPETIÇÃO DE INDÉBITO. EXIGÊN­CIA DE PROVA DE QUE NÃO HOUVE COMPEN­SAÇÃO COM O IMPOSTO APURADO NA

DECLARAÇÃO.

1. O imposto de renda retido na fonte constitui antecipa­

ção daquele a ser apurado na declaração. 2. Logo, para se

pleitear a sua restituição, indispensável a prova de que não houve compensação do valor retido na fonte com aquele apurado na declaração. 3. Por se tratar de fato constitutivo do direito alegado, o ÔI IUS da prova é da parte autora, não da União Federal. 4. Remessa provida para julgar-se improce­

dente o pedido, prejuc icado o exame das apelações" (TRF 1 a Região, Terceira TUI ma, Processo nO 1998.01.00008264-

9/DF, Relator: Juiz Tvurinho Neto, DJ 14/08/98).

"IMPOSTO DE RENDA. ANTECIPAÇÕES. DEL 2354/87 1. O imposto de renda tem como fato gerador a

aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de ren­da (Art. 43, inciso I, CTN). 2. As pessoas jurídicas adqui­

rem tal disponibilidade ao longo do exercício social, podendo ser exigido o pagamento antecipado do imposto, assim como ocorre com as pessoas físicas (imposto de renda retido na

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fonte), não sendo, em conseqüência, ilegal ou inconstitucional a exigência do inciso l, Art. 3° do Decre­to-lei 2.354/87 3. Ordem denegada." (TRF 4a Região, 2a

Turma, Processo nO 9004241990/RS, Relatora: Juíza Tânia Terezinha Cardoso Escobar, DJ 17/05/95)

Diante do exposto, fica claro que a retenção de IRPJ em rela­ção aos rendimentos auferidos nas aplicações financeiras das pessoas jurídicas em comento acaba por desvirtuar sua natureza de institui­ções imunes ou isentas, tornando parcialmente sem efeitos o benefí­cio concedido.

Isto porque, como amplamente explicado, o IRRF configura, indiscutivelmente, antecipação do IRPJ devido ao final de cada exer­cício, do que decorre que sua cobrança configura tributação do pró­prio patrimônio das instituições, o que não se pode admitir.

11.2. DA TRIBUTAÇÃO EXCLUSIVA NA FONTE

Outro ponto que não pode deixar de ser analisado é a caracte­rística da tributação exclusiva na fonte, sendo certo que o imposto de renda é regido pelos princípios constitucionais da generalidade, uni­versalidade e progressividade. Tais princípios garantem que todas as rendas e proventos obtidos por qualquer pessoa serão tributados de forma mais onerosa quanto maior for o lucro auferido.

Nesse sentido, o fato gerador do imposto de renda é a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de acréscimo patrimonial. Ocorre que, quando se trata de tributação na fonte, não há acrésci­mo patrimonial, sendo irrelevante para essa conclusão o fato de exis­tir ou não aplicação financeira. Explica-se.

Conforme esclarecido, o imposto de renda é tributo de trato sucessivo, cujo fato gerador não se encerra em um único evento e sim em todo o ano-calendário. É justamente em razão deste fato que o IRRF configura mera antecipação do IRPJ, razão pela qual a ocor-

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rência de evento isolado - aplicação financeira - não pode ser consi­derada acréscimo patrimonial apto a gerar tributação.

Ora, se não há acréscimo patrimonial, não há fato gerador do tributo, inexistindo também progressividade, universalidade ou ge­neralidade.

Exatamente dessa forma entendeu a Desembargadora do Egré­gio Tribunal Regional Federal da 3a Região, Annamaria Pimentel, ao analisar caso semelhante, a saber:

"( ... ) A Constituição estabelece, como princípio geral de tributação, o caráter pessoal dos impostos e sua graduação, segundo a capacidade econômica do contribuinte (§ 1° do art. 145), vedando o tratamento desigual entre os que se encontrem em situação equivalente, bem como qualquer distinção em razão de sua atividade, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos e direitos (art. 150, II). De outra parte, a Carta Política determina que o imposto sobre a renda e proventos de qualquer natu­reza seja informado, nos termos da lei, pelos critérios da generalidade, universalidade e progressividade (art. 153, § 2°, inc. 1), manifestações do princípio da isonomia tributá­ria (CR/88, art. 150, inc. II). Por tais critérios, o imposto deve incidir sobre todas as espécies de rendas e proventos (generalidade), obtidas por toda e qualquer pessoa (univer­salidade), de forma mais onerosa, quanto maior o valor auferido (progressividade). Verifica-se que o legislador cons­titucional procurou tecer um conjunto de princípios, que se interligam, formand) uma rede de proteção dos direitos fundamentais do cor tribuinte, limitadora do poder estatal de tributar. O fato gerador do imposto em comento é a aqui­sição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos (acréscimos patrimoniais), ou seja, é o acréscimo verificado no patrimônio de determinada pessoa (física ou jurídica), num determinado período de tempo (art. 43, incisos I e II). ( ... ) Assim, o acréscimo patrimonial verifica­do num período é o resultado de uma série de operações, não se confundindo com mera entrada ou ingresso, que no patrimônio não pode permanecer. Ora, a tributação em sepa-

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

rado de determinadas operações realizadas pelo contribu­inte, isoladas das demais operações que contribuem para a formação do fato gerador do tributo, num dado período, provoca distorções na realidade, incompatíveis com a es­sência do imposto sobre a renda, pois permite a incidência do imposto quando não ocorrer acréscimo patrimonial. Assim, o contribuinte que num determinado período obte­nha ganhos líquidos com operações financeiras de renda variável, mas que no mesmo período apure perdas em ou­tras operações, que por disposição legal, com aquelas não se comunicam, será obrigado a pagar imposto de renda, ainda que a somatória das perdas tenha sido superior aos ganhos obtidos, ou seja, sem que tenha ocorrido acréscimo de seu patrimônio. Por outro lado, o regime de imposição segregada de rendas parece desconsiderar o caráter pessoal dos im­postos, não permitindo a progressividade da tributação (in­clusive pela adoção de alíquota fixa), nem a sua graduação,

de acordo com a capacidade contributiva do contribuinte. De fato, a progressividade só pode ser estabelecida consi­derando-se a totalidade das operações que formam o acrés­

cimo patrimonial real do sujeito. Isto é, quanto maior o acréscimo patrimonial, decorrente do conjunto das opera­

ções realizadas pelo contribuinte, maior a sua capacidade

contributiva e, portanto, mais oneroso, progressivamente, o

imposto. ( ... ) O imposto sobre a renda deve abranger a to­

talidade das pessoas que obtenham acréscimo patrimonial,

decorrente do conjunto de suas atividades e operações, as quais não podem ser discriminadas, sob pena de maltratar o princípio da isonomia, além de descaracterizar o próprio tributo, pois sobre as operações consideradas em si mes­

mas, a Constituição prevê a incidência de outro imposto

(CR/88, art. 153, V). ( ... )" (TRF 3a Região, Medida Cautelar

nO 96.03.091408-8, Despacho da Juíza Annamaria

Pimentel, DJU 2 10/03/97).

Assim, a desconsideração do aspecto material da regra matriz de incidência tributária, qual seja, auferir lucro, não pode ser admitida, sob pena de afronta aos princípios da universalidade, generalidade e progressividade.

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Ademais, ao tributar valores que não representam lucro, a tri­butação pelo IRRF de instituições imunes ou isentas do pagamento de IRPJ culmina por atingir o patrimônio do contribuinte. Tal com­portamento assume, portanto, caráter explicitamente confiscatório em total afronta ao princípio do não-confisco, previsto no artigo 150, inciso IV, da CF/88.

Logo, inegável a necessidade de afastamento dos dispositivos legais em comento que, apesar de existirem, são inconstitucionais, sob pena de que se tribute o que não existe, qual seja, a renda de instituições que não a auferem.

11.3. DA VIOLAÇÃO AO PRINCiPIO DA ISONOMIA

Ademais, conclui-se pela flagrante violação do princípio da isonomia entre os contribuintes, previsto no art.150, inciso II, da CF/88, a tributa­ção das entidades isentas e imunes ao pagamento do IRPJ.

Como já dito, todos os demais contribuintes do IRRF poderão ter a quantia retida reduzida do IRPJ a ser pago ao final de cada ano. Se, ao término do exercício, for apurado prejuízo fiscal, o IRRF reti­do permanecerá registrado como ativo na empresa, sendo atualizado monetariamente até o momento em que se apurar lucro e, conse­

qüentemente, IRPJ devido compensável com aquele IRRF retido.

Ademais, a tributação na fonte incide sobre valores que não repre­

sentam acréscimo patrimonial. Em razão desse fato, aqueles que possuem

aplicações financeiras e sofrem a retenção na fonte são tratados de forma diversa em relação aos que não possuem aplicações financeiras. Ambos

não auferem renda, mas apenas um deles é tributado. Ora, é de inquestionável transparência que as pessoas jurídicas

aqui consideradas não poderão exercer esse direito pelo simples fato de serem imunes ou isentas do recolhimento do IRPJ, de forma que o IRRF retido permanecerá em seu ativo sem qualquer possibilida­

de de compensação.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

A tributação de valores que não constituem fato gerador do IRPJ e a própria impossibilidade de dedução do IRRF no final do período, portanto, ferem sobremaneira o princípio da isonomia, previsto no inciso II, do artigo 150, da CF/88, que veda tratamento desigual para contribuintes que se encontrem em situação equivalente.

11.4. Do ATUAL POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

No que diz respeito à questão da imunidade ora tratada, limi­tada pelo disposto nos artigos 12 e 28 da Lei na 9.532/97, já existe decisão definitiva e com efeito erga omnes proferida pelo Tribunal

Pleno do STF. A decisão em comento foi proferida em 10/1112004 e publicada

em 11/03/05, na Ação Direta de Inconstitucionalidade na 1.758, ten­

do sido declarada a inconstitucionalidade da expressão "inclusive pes­soa jurídica imune", contida no artigo 28 da Lei na 9.532/97, in verbis:

"Decisão: Preliminarmente, o Tribunal, por unanimidade, não conheceu da ação direta com relação à Medida Provi­sória na 1.636, de 12 de dezembro de 1997 No mérito, o Tribunal, também por unanimidade, julgou procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade da expressão "in­clusive pessoa jurídica imune", contida no artigo 28 da Lei na 9.532, de 10 de dezembro de 1997, nos termos do voto do Relator. Votou o Presidente, Ministro Nelson Jobim. Ausente,justificadamente, a Senhora Ministra Ellen Gracie. Plenário, 10.11.2004. (STF, Plenário, Relator: Ministro Carlos Velloso, DJ 19/11/04).

Corroborando esse entendimento, o STF também concedeu

medida liminar nos autos da ADIN na 1.802, determinando a sus­

pensão do artigo 12, §§ 10 e 20, "f", da Lei na 9.532/97, in verbis:

"EMENTA ( ... ) 1. Conforme precedente no STF (RE 93.770, Mufioz, RTJ 102/304) e na linha da melhor doutrina, o que a Constituição remete à lei ordinária, no tocante à imunidade

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

tributária considerada, é a fixação de normas sobre a constitui­ção e o funcionamento da entidade educacional ou assistencial imune; não o que diga respeito aos lindes da imunidade, que, quando susceptíveis de disciplin~ infraconstitucional, ficou re­servado à lei complementar. 2. A luz desse critério distintivo, parece ficarem incólumes à eiva da inconstitucionalidade for­mal argüida os arts. 12 e §§ 2° (salvo a alínea f) e 3°, assim como o parág. único do art. 13; ao contrário, é densa a plausibilidade da alegação de invalidez dos arts. 12, § 2°, f; 13, caput, e 12 e, finalmente, se afigura chapada a inconstitucionalidade não só formal mas também material do § lodo art.12, da lei questionada. ( ... )" (STF, ADIN 1.802-3, Relator: Ministro Sepúlveda Pertence, DJ 13/02/04).

No tocante às entidades fechadas de previdência privada sem fins lucrativos, o STF reconheceu a imunidade apenas para os casos de financiamento exclusivo pelo empregador. Esse entendimento foi fir­mado no julgamento do Recurso Extraordinário nO 259.756-R], em Sessão de 28 de novembro de 2001, no qual foi relator o Excelentíssimo Ministro Marco Aurélio, tendo sido concluído que, in verbis:

/I imunidade tributária conferida a instituições de assistência so­

cial sem fins lucrativos (CF. art. 150, VI. cj alcança aquelas enti­

dades fichadas de previdência privada nas quais não há contribuição

dos empregados. mas tão-só a do patrocinador. Com esse entendi­

mento. o Tribunal mm·teve acórdão do TRF da ]a Região que

reconhecera a imunidade tributária de entidade de previdência

privada mantida com rontribuição exclusivamente do emprega­

dor. Salientou-se a disfÍ lção da esPécie em relação à orientação fir­

mada pelo Plenário no RE 202. 700-DF. o qual se referia a entidade

de previdência pri1Jada. de caráter oneroso. em que havia contri-.199

buição bilateral. tanto do empregado como do empregador

Posteriormente, foi editada a Súmula nO 730 pelo STF, a qual reitera o posicionamento no sentido de que a imunidade tributária

299 Veiculado no Informativo STF n° 252.

287

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

em comento alcança as entidades fechadas de previdência social pri­vada em que não exista a contribuição dos beneficiários, in verbis:

"Súmula nO 730. A imunidade tributária conferida a insti­tuições de assistência social sem fins lucrativos pelo art. 150, VI, c, da Constituição, somente alcança as entidades fecha­das de previdência social privada se não houver contribui­ção dos beneficiários."

Diante do exposto, percebe-se a possibilidade de que seja con­solidado entendimento favorável ao contribuinte no que diz respei­to à tese em debate, o que justifica a discussão judicial da questão e demonstra a possibilidade de êxito das ações ajuizadas.

288

Page 291: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

Incorporação - Aspectos Relevantes e a Posição do Conselho de

Contribuintes

PEDRO ANANJR.

Advogado em São Paulo, Especialista em Direito Empresarial pela PUC/SP. MBA Controller 'Jela FEA/USP. Viu-presidente da Diretoria

Jurídica da ANEFAC, Professor de Especialização da APET

JULIANA GRANDINO LATORRE

Advogada em São Paulo, Administradora de Empresas pela Universida­de Mackenzie, Especialista em Direito Tributário e em Imposto de Renda pela

APET, Pós-graduanda em Direito Empresarial pela PUClSP

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

INCORPORAÇÃO - ASPECTOS RELEVANTES E A POSI­çÃO DO CONSELHO DE CONTRIBUINTES

I. INTRODUÇÃO

As reorganizações societárias têm se utilizado cada vez mais de institutos, como a incorporação, cisão e transformação de so­ciedades, com vistas à reestruturação interna, redução de custos administrativos e operacionais, ganho em escala, redução da car­ga tributária e, eventualmente, até como parte do planejamento sucessório, na preparação da empresa familiar para a transição de uma geração de controladores à outra.

Importa ressaltar que as operações em questão não encon­tram qualquer vedação legal. Aliás, ocorre justamente o oposto, na medida em que há previsão dessas operações no ordenamento jurídico brasileiro30o Ressaltamos, todavia, que a ausência de res­trição legal não pode ser interpretada como um permissivo para qualquer reestruturação que leve à evasão fiscal, pois só cabe ao contribuinte agir visando a elisão, forma lícita de se economizar tributos.

Merece ainda destaque a necessidade das operações em apre­ço observarem a sustentação econômica. Ou seja, deve haver um propósito negocial na operação, que não esbarre na ilicitude do ato, caso contrário a validade da operação pode ser facilmente questionável.

Nada impede, portanto, que lançando mão de figuras como a incorporação e a fusão de sociedades, de forma lícita, se vis-

300 As disposições relativas à incorporação, fusão e cisão de sociedades estão disciplina­

das em sua maioria na Lei n° 6.404, de 15 de dezembro de 1976 (Lei das S/A) e na Lei nO 10.406, de \O de janeiro de 2002 (Código Civil).

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

lumbre a concentração de empresas, ou mesmo a solução de pro­blemas empresariais ou interesses profissionais e econômicos.

O visível crescimento das operações de reestruturação societária, entretanto, vêm sendo constante alvo de fiscalização por parte das autoridades tributárias, notadamente no âmbito federal. Neste aspecto, verificamos uma série de autuações que questionavam as operações realizadas pelo contribuinte.

Tais autuações acabam por ser julgadas pelo Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, que têm se compor­tando de maneira sábia até o presente momento ao não desconsiderar de pronto determinadas operações que não ocor­rem de forma adequada, especialmente com relação à incorpora­ção, a mais utilizada para esse fim.

Sendo assim, o objetivo deste artigo é tecer algumas consi­derações sobre determinados aspectos relevantes da incorpora­ção, que constantemente são alvo de autuação por parte da fisca­lização federal e são levados a julgamento, e se referem à:

(i) utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL sem a trava de 30%, diante da incorporação que extinga a socie­

dade incorporada; (ii) possibilidade de incorporação da controladora pela con­

trolada, bem como; (iii) incorporação de empresa superavitária por deficitária,

quando pertencentes ao nesmo Grupo Econômico. Ademais, não podemos nos eximir também de comentar a

possibilidade de questior amento dessas operações pelo Ministé­rio Público e pela Procu -adoria-Geral da União, a despeito das decisões favoráveis às mencionadas operações, emanadas pelos

Conselhos de Contribuintes.

291

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

II. ASPECTOS ATlNENTES À INCORPORAÇÃO DE EMPRESAS

11.1. DA UTILIZAÇÃO DO PREJUIZO FISCAL E DA BASE NEGATIVA DA CSLL NA INCOR­

PORAÇÃO, SEM A TRAVA DE 30%

No tocante à utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL, inicialmente devemos destacar a edição da Lei nO 9.065, de 20 de junho de 1995 (Lei nO 9.065/96), que tratou da possibili­dade de compensação desses com o lucro líquido ajustado pelas respectivas adições e exclusões, com observância do limite de 30% do lucro líquido301

Em regra, portanto, possibilitou-se a compensação do preju­ízo fiscal e da base negativa da CSLL acumulados até o limite de 30% do lucro líquido ajustado, desde que a pessoa jurídica manti­vesse livros e documentos comprobatórios, tal qual exigidos pela legislação tributária.

Essa disposição foi também ratificada pelo artigo 250 do Re­gulamento do Imposto sobre a Renda (RlRl99), aprovado pelo

301 "Art. 15. O prejuízo fiscal apurado a partir do encerramento do ano-calendário de 1995. poderá ser compensado. cumulativamente com OS prejuízos fiscais apurados até 31 de dezembro de 1994. com o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação do imposto de renda. observado o limite máximo. para a compensação. de trinta por cento do referido lu -ro líquido ajustado. Parágrafo único. O disposto neste artigo somente se aplica às pessoas jurídicas que mantiverem os livros e documentos. exigidos pela legislação fiscal. comprobatórios do montante do prejuízo fiscal utilizado para a compensação." Art. 16. A base de cálculo da contribuição social sobre o lucro. quando negativa. apurada a partir do encerramento do ano-calendário de 1995. poderá ser compensa­da. cumulativamente com a base de cálculo negativa apurada até 31 de dezembro de 1994. com o resultado do período de apuração ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação da referida contribuição social. determinado em anos-ca­lendário subseqüentes. observado o limite máximo de redução de trinta por cento. previsto no art. 58 da Lei nO 8.981. de 1995. Parágrafo único. O disposto neste artigo somente se aplica às pessoas jurídicas que mantiverem os livros e documentos. exigidos pela legislação fiscal. comprobatórios da base de cálculo negativa utilizada para a compensação. (Grifos nossos)

292

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COORDENAÇAo: PEDRO ANAN JR.

Decreto nO 3.000, de 26 de maio de 1999, que determinou a pos­sibilidade de exclusão do prejuízo fiscal, limitada ao percentual estabelecido em lei, do lucro líquido ajustad0302

À primeira vista, a interpretação que pode ser dada é a de que o limite de 30% é aplicável a toda e qualquer sociedade, in­clusive à sociedade a ser incorporada, que estaria extinta ao final da operação.

Entretanto, a despeito de haver essa interpretação do texto legal de que não haveria excepcionado qualquer sociedade dessa limitação, não foi esse o entendimento firmado na 83 Câmara do 1° Conselho de Contribuintes, ao analisar o Recurso nO 133.147, de 02/0712003 303 , tampouco da 13 Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF), ao examinar o Recurso de Divergência nO 101-122.596, em 19/10/2004, os quais entenderam que a limi­tação em apreço não se aplica à empresa extinta por incorporação,

in verbis:

302

303

"Ementa: IRPJ - COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO -LIMITE DE 30% - EMPRESA INCORPORADA - À empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de

"Art. 250. Na determinação do lucro real, poderão ser excluídos do lucro líquido

do período de apuração (Decreto·Lei n° 1.598, de 1977, art. 6°, § 3°): I . os valores cuja dedução seja autorizada por este Decreto e que não tenham sido computados na apuração d ) lucro líquido do período de apuração; II . os resultados, rendimen ,os, receitas e quaisquer outros valores incluídos na apu· ração do lucro líquido que, de acordo com este Decreto, não sejam computados no

lucro real; III o prejuízo fiscal apurado em períodos de apuração anteriores, limitada a compensação a trinta por cento do lucro líquido ajustado pelas adições e excluo sões previstas neste Decreto, desde que a pessoa jurídica mantenha os livros e do­cumentos, exigidos pela legislação tlscaI. comprobatórios do prejuízo fiscal utIlIzado para compensação, observado o disposto nos arts. 509 a 515 (Lei n° 9.065, de 1995,

art. 15 e parágrafo único). ( ... )" "Ementa: IRP] _ COMPENSAÇÃO DE PREJU!ZO - LIMITE DE 30% - EMPRESA INCORPORADA _ A empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de

30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal.(. .. }"

293

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal."

(destaque nosso)

No mesmo sentido foi julgado o Acórdão nO 108-06.682, relativo ao Recurso na 126.597, analisado também pela 8a Câ­mara do 10 Conselho de Contribuintes, em 20/09/2001, que es­tabeleceu que a apresentação da última declaração de rendimen­tos da empresa incorporada não estaria sujeita à limitação do percentual de 30% para compensação, a saber:

"Ementa: INCORPORAÇÃO - DECLARA­çÃO FINAL DA INCORPORADA LIMITA­çÃO DE 30% NA COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS INAPLICABILIDADE - No caso de compensação de prejuízos fiscais na última de­claração de rendimentos da incorporada, não se aplica a norma de limitação a 30% do lucro líqui­do ajustado."(destaque nosso)

Os julgados em apreço delimitam a orientação de que a extinção da empresa incorporada a excluiria da limitação impos­ta pelo texto legal na compensação de prejuízos. Entretanto, não são suficientes para consolidar a questão.

Assim, devemos ainda nos ater a outros julgados do Conse­lho de Contribuintes que auxiliam a pacificar a questão, tais como o Acórdão da Câmara Superior de Recursos Fiscais (CSRF) nO 01-05.100, de 19/10/2004 julgado pela la Turma30\ O Acórdão 108-07.456, de 02/07/2003 julgado pela 8a Câmara do 10 Con­selho de Contribuintes305 e o Acórdão CSRF 01-04.258, de 02/

304 "Ementa: IRP/ - COMPENSAÇÃO DE PRE/ulzo - LIMITE DE 30% • EMPRESA INCORPORADA - A empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal::

305 "Ementa: IRP/ - COMPENSAÇÃO DE PRE/ulzo - LIMITE DE 30% - EMPRESA INCORPORADA. A empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal."

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

12/2002 julgado pela 1 a Turma, este último objeto de transcrição abaixo:

"Ementa: COMPENSAÇÃO PREJUÍZO E BASE NE­GATIVA - No caso de incorporação, uma vez que vedada

a transferência de saldos negativos, não há impedimento

legal para estabelecer a limitação, diante do encerramento da empresa incorporada." (destaque nosso)

Cumpre ressaltar, no tocante a este último acórdão a que nos referimos, alguns trechos retirados do voto do Conselheiro Mario Junqueira Franco Júnior, e que merecem destaque a fim de auxiliar a interpretação da norma tributária:

"Aqui me basta fundamentar meu entendimento de que,

em casos de descontinuidade da pessoa jurídica, como na

incorporação, não se pode aplicar a limitação à compensa­

ção, mais comumente denominada por "trava"

( ... )

Essa certeza mais se concretiza quanto mais se busca o his­tórico da legislação quando em tramitação. No Diário Oficial do Congresso Nacional de 14 de junho de 1995, a fls. 3270, consta a exposição de motivos da Medida Provisória nO 998/95, reedição das Medidas Provisórias 947/95 e 972/95 e convertida na Lei nO 9.065/95. Dela se pode àestacar o seguinte excerto:

'Arts. 15 e 16 do Projeto: decorrem de Emenda do Relator,

para restabelecer o direito à compensação de prejuízos,

embora com as limitações impostas pela Medida Provisória

nO 8121/94 (Lei nO 8.8981/95). Ocorre hoje vacatio legis

em relação à matéria. A limitação de 30% garante uma par­

cela expressiva da arrecadação, sem retirar do contribuinte

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

o direito de compensar, até integralmente, num mesmo ano, se essa compensação não ultrapassar o resultado positivo.

A expressão "sem retirar do contribuinte o direito de com­

pensar" reforça o meu entendimento de que, em casos de

descontinuidade da empresa, na declaração de encerra­

mento cabe integral compensação dos prejuízos acumula­

dos, sendo inaplicável a trava." (destaque nossos)

É clarividente a orientação extraída do voto do M. Conse­lheiro, que se preocupa em garantir a aplicabilidade da limitação da compensação de prejuízos fiscais, desde que esta não resulte na retirada do direito da compensação, do contribuinte. Se assim o é, ou seja, na hipótese do limite recair sobre empresa objeto de extinção, torna-se incabível a trava de 30%.

Com base nos argumentos ora indicados, entendemos que a utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL, em de­corrência da incorporação de qualquer sociedade, não estará sujei­ta à limitação de 30% do lucro líquido ajustado, e que as decisões por ora apresentadas configuram sólidos argumentos, bem como importantes precedentes jurisprudenciais, caso eventual fiscaliza­ção venha eventualmente questionar a limitação contida nos arti­gos 15 e 16 da Lei na 9.065/96.

11.2. DA INCORPORAÇÃO DA CONTROLADORA PELA CONTROLADA

A Lei nO 9.532, editada em 10 de dezembro de 1997 (Lei nO 9.532/97), indiretamente aborda a possibilidade da incorporação de empresa investidora pela investida ao determinar a aplicabilidade do dispositivo que determina registro específico para a participação societária adquirida com ágio ou deságio, em virtude de incorpora­ção' fusão ou cisão.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Tal fato pode passar despercebido à primeira vista, mas consta­tamos na leitura do artigo 8° da Lei nO 9.532/97 que o registro é

aplicável mesmo que a empresa, objeto de incorporação, fusão ou cisão, fosse a que anteriormente detivesse participação societária na sociedade incorporadora, fusionada ou cindida30b

Em suma, portanto, resta claro que o ágio ou deságio prove­niente da reestruturação societária, inclusive na incorporação, de­

verá ser registrado em qualquer hipótese, especialmente no caso da sociedade investidora ter sido incorporada pela empresa investida,

nos exatos termos esculpidos pela legislação tributária. Adicionalmente às determinações constantes na lei, encontra­

mos algumas respostas à Consulta de Contribuintes no mesmo sen­

tido e que implicitamente esclarecem a possibilidade da controlada

incorporar a controladora, conforme segue:

306

"EMENTA: LUCRO REAL. ADIÇÕES. DESÁGIO. Deve ser oferecido à tributação, como adição ao lucro real, o deságio apurado na aquisição de participação societária em decorrência de liquidação, por incorporação, da empresa in­vestidora." (Delegacia da Receita Federal de Julgamento em Juiz de Fora/ 2"Turma/DECISÃO 1.961 em 11/09/2002)

"EMENTA: A contrapartida do ajuste por aumento do patrimônio líquido de investimento em virtude de reavaliação de bens na sociedade controlada, por esta utilizada para cons­tituir reserva de reava' iação, não será computada na determi­nação do lucro real, quando a sociedade investidora for incorporada pela SOCiedade investida, obedecidas as condi­ções previstas no art. 333 do RIR/94" (SuperintendênCia

"Ar!. 80 O disposto no artigo anterior aplica-se. inclusive. quando: .." a) o investimento não for. obrigatoriamente. avaliado pelo valor de patnmonlo li-

quido; , . d b) a empresa incorporada. fusionada ou cindida for aquela que detmha a propne a-

de da participaçãO societária," (destaque 110550)

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IMPOSTO OE RENOA PESSOA JURlolCA

Regional da Receita Federal - SRRF / 7a. Região Fiscal / Processo de Consulta nO 200/97 em 19/08/1997)

"EMENTA: ( ... ) REAVALIAÇÃO DE BENS. ÁGIO EM INVESTIMENTO. INOBSERV ÃNCIA. RESERVA DE REAVALIAÇÃO. Uma vez não comprovada a ocorrência de ágio em investimento, motivado por suposta mais-valia de bens do ativo permanente de coligada, bem ainda, obser­vado que quando da incorporação da investidora pela coli­gada esta última reavalia esses mesmos bens, sem contudo constituir a competente reserva de reavaliação, obriga-se a pessoa jurídica que tem os bens reavaliados a realizar, no momento da reavaliação, a receita decorrente de tal aumento patrimonial." (Delegacia da Receita Federal de Julgamento no Rio de Janeiro I / 9a. Turma / DECISÃO 5.076 em 11.05.2004) (destaques nossos)

Agregando-se os elementos consubstanciados na lei e as ori­entações aos contribuintes, emanadas pela própria Receita Federal por meio de Respostas à Consulta, não nos resta outra alternativa senão concluir pela total procedência da incorporação da socieda­de detentora do investimento por aquela investida, ainda que esta não corresponda à uma operação corriqueira.

11.3. INCORPORAÇÃO DE EMPRESA SUPERAVITÁRIA POR DEFICITÁRIA

Outro ponto que merece ser mencionado corresponde à pos­sibilidade de incorporação de empresa superavitária por deficitá­ria, componentes do mesmo Grupo econômico. Inicialmente im­porta ressaltar que não existe qualquer impedimento legal que restrinja ou impeça a incorporação em questão, a qual está estri­tamente de acordo com a jurisprudência do Conselho de Con­tribuintes, conforme segue:

"INCORPORAÇÃO DE SUPERAVIT ÁRIA POR DE­FICIT ÁRIA - Guardados os requisitos legais, nada impe-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

de que uma sociedade deficitária incorpore uma superavitária. Os prejuízos fiscais da incorporadora podem ser compensados com os resultados futuros, observado o prazo legal." (Ac. 10 CC 101-83.870/92 e 101-83.894/92).

"INCORPORAÇÃO DE SUPERAVIT ÁRIA POR DE­FI CIT ÁRIA - Incomprovada a ocorrência de simulação na operação de incorporação de uma empresa superavitária por uma deficitária, podem os prejuízos desta serem compensa­dos com os lucros daquela, no futuro, observado o prazo legal posto não haver vedação legal." (Ac. CSRF 01-1.756/94). (destaques nossos)

Nos termos anteriormente salientados, frisamos mais uma vez que devemos nos ater sempre à sustentação econômica da operação. Não que isso não seja importante em qualquer tipo de reestruturação societária, mas, no caso em tela, torna-se imprescindível, em vista da ávida suspeita do Fisco de fraude ou simulação.

Note-se que a incorporação efetuada nesses moldes por socie­dades que não pertencem ao mesmo Grupo é condenada pelo Fis­co como uma conduta ilícita, no intuito de combater a prática de empresas que iam ao mercado buscar uma sociedade deficitária para esse fim, com o único objetivo de reduzir a carga tributária

suportada. A incorporação às a vessas, como é denominada a operação em

que ocorre a incorporação de empresa lucrativa por uma deficitária, possibilita que o prejuíz) fiscal acumulado seja abatido do lucro tributável. Dessa forma, os acórdãos que apreciou a questão com maior profundidade decidiu que tal incorporação só é possível com relação a sociedades ativas e sob o controle comum, vejamos:

"Ementa: IRPJ - INCORPORAÇÃO ÀS AVESSAS­GLOSA DE PREJUÍZOS - IMPROCEDÊNCIA - A denominada "incorporação às avessas", não proibida pelo

ordenamento, realizada entre empresas operativas e que sempre estiveram sob controle comum, não pode ser

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

tipificada como operação simulada ou abusiva, mormente quando, a par da inegável intenção de não perda de prejuí­zos fiscais acumulados, teve por escopo a busca de melhor eficiência das operações entre ambas praticadas.» (Ac. 10

CC 107-07596,14/0412004). (destaques nossos)

Destaque-se que o propósito negocial da operação é eviden­te, pois sendo as ambas empresas pertencentes ao mesmo Grupo, o contribuinte não pode ser impedido de buscar melhor aproveita­mento no desenvolvimento de suas atividades.

Cabe registrar, ainda, que, recentemente, tivemos notícia de que a Câmara Superior de Recursos Fiscais julgou procedente a incorporação ocorrida nesses termos, em razão da reestruturação de empresas do mesmo Grupo Econãmico, ratificando que real­mente existe essa possibilidade.

Não podemos, entretanto, acreditar que com essa decisão da Câmara Superior a matéria esteja pacificada, ainda que represente um excelente precedente para os demais casos similares. Todavia, concluímos que não há qualquer impedimento legal para se pro­ceder à incorporação nos termos ora relatados, e que a própria Receita Federal reconhece tal direito do contribuinte, frente à im­possibilidade de lhe negar o melhor aproveitamento das empresas que controla, no desenvolvimento de suas atividades.

III. DA POSSIBILIDADE DE QUESTIONAMENTO PELA PROCURADORIA

DA FAZENDA E PELO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

A fim de dirimir quaisquer dúvidas que possam permanecer acerca da possibilidade de revisão judicial das decisões dos Conse­lhos de Contribuintes, teceremos os comentários a seguir que com­provam, definitivamente, a existência de diversos precedentes que demonstram que tal alternativa é inócua, sob pena do Conselho de

300

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Contribuintes deixar de existir, na hipótese das decisões emanadas por ele poderem ser reformadas.

111.1. Do MPF

Cabe ressaltar que, em relação à revisão das decisões admi­nistrativas pelo Ministério Público, o posicionamento deste Ór­gão em duas ações civis públicas reside no Princípio da apreciação pelo Judiciário de toda lesão ou ameaça a direito, bem como na proteção do patrimônio público, nos termos do artigo 50, incisos XXXV e LXXIII da Constituição Federal307

Todavia, tais artigos constam do Capítulo da Constituição Fe­deral que trata dos direitos e garantias fundamentais do cidadão, o que significa que tais normas prestam para o amparo do cidadão, e nunca do Estado, no intuito de defender a parte hipossuficiente em caso de eventuais abusos. Nessa hipótese, não se pode admitir que a perenidade da coisa julgada administrativa, ou seja, da decisão defi­nitiva do Conselho de Contribuintes, possa ser revista, sob pena de violação do Princípio da Segurança Jurídica.

Ademais, temos a legislação do processo administrativo fis­cal, conforme estabelecido no artigo 45 do Decreto nO 70.235, de 06 de março de 1972308 , e o próprio Código Tributário Nacional (CTN) que asseguram tCltal eficácia às decisões dos Conselhos de Contribuintes. Nessa linha, destacamos que não se pode admitir

307 "Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, ii liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito; ( ... ) LXXIII. qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao património público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao património histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ónus da sucumbência; ( ... l".

308 "Art. 45. No caso de decisão definitiva favorável ao sujeito passivo, cumpre à autori­dade preparadora exonerá-lo, de ofício, dos gravames decorrentes do litígio."

301

Page 304: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

que decisão judicial pretenda cobrar um tributo diante da ausên­cia de lançamento deste por autoridade administrativa competen­te, nos termos assegurados pelo artigo 142 do CTN309 Ora, se o tributo não foi constituído, de acordo com decisão do Conselho de Contribuintes que anulou auto de infração, não se pode pretender

sua exigibilidade. Nesse sentido, transcrevemos abaixo a decisão do Tribunal

Pleno do STF, a qual condiciona a propositura de ação penal sobre crime contra a ordem tributária ao lançamento definitivo do tri­buto, que está intimamente atrelado à decisão definitiva em pro­

cesso administrativo:

EMENTA: L Crime material contra a ordem tributária (L. 8137/90, art. 1°): lançamento do tributo pendente de deci­

são definitiva do processo administrativo: falta de justa causa para a ação penal, suspenso, porém, o curso da prescrição enquanto obstada a sua propositura pela falta do lançamen­to definitivo. 1. Embora não condicionada a denúncia à

representação da autoridade fiscal (ADlnMC 1571), falta

justa causa para a ação penal pela prática do crime tipificado

no art. 1° da L. 8137/90 - que é material ou de resultado­, enquanto não haja decisão definitiva do processo admi­

nistrativo de lançamento, quer se considere o lançamento

definitivo uma condição objetiva de punibilidade ou um elemento normativo de tipo. 2. Por outro lado, admitida

por lei a extinção da punibilidade do crime pela satisfação

do tributo devido, antes do recebimento da denúncia (L. 9249/95, art. 34), princípios e garantias constitucionais

309 "Art. 142. Compete privativamente à autoridade administrativa constituir o crédito tributário pelo lançamento, assim entendido o procedimento administrativo ten­dente a verificar a ocorrência do fato gerador da obrigaçãO correspondente, determi­nar a matéria tributável, calcular o montante do tributo devido, identificar o sujeito passivo e, sendo caso, propor a aplicação da penalidade cabível. Parágrafo único. A atividade administrativa de lançamento é vinculada e obrigató­ria, sob pena de responsabilidade funcional."

302

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

eminentes não permitem que, pela antecipada propositura da ação penal, se subtraia do cidadão os meios que a lei mesma lhe propicia para questionar, perante o Fisco, a exa­tidão do lançamento provisório, ao qual se devesse subme­ter para fugir ao estigma e às agruras de toda sorte do processo criminal. 3. No entanto, enquanto dure, por iniciativa do con­tribuinte, o processo administrativo suspende o curso da pres­crição da ação penal por crime contra a ordem tributária que dependa do lançamento definitivo. (HC 81611 / DF­DISTRITO FEDERAL, Relator Ministro SEPÚLVEDA PERTENCE, Tribunal Pleno, STF, DJ 13/05/2005) (des­taques nossos)

Infere-se, da leitura do acórdão transcrito, que a decisão do Conselho de Contribuintes a qual deve constituir o crédito tribu­tário é imprescindível para a propositura de eventual ação penal tributária. No mesmo sentido, não há que se admitir a exigibilidade de tributo não constituído por decisão do Tribunal Administrati­vo, vez que tal decisão representa um posicionamento definitivo quanto à validade ou não do auto de infração.

Devemos ainda nos ater à jurisprudência emanada pelo Su­periorTribunal de Justiça (STJ) que, na mesma linha de orienta­ção que o STF, esclarece que as decisões do Consellio de Contri­buintes tornam-se definitivas se não recorridas, e que eventual intervenção nessa seara só seria possível ao Ministro da Fazenda diante do descontrole totu do órgão administrativo, vejamos:

ADMINISTRATIVO MANDADO DE SEGU-RANÇA - CONSELHO DE CONTRIBUINTES

DECISÃO IRRECORRIDA RECURSO HIE-RÁRQUICO CONTROLE MINISTERIAL

ERRO DE HERMENÊUTICA.

I A competência ministerial para controlar os atos da administração pressupõe a existência de algo des­

controlado não incide nas hipóteses em que o órgão

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

controlado se conteve no âmbito de sua competência e do devido processo legal.

II O controle do Ministro da Fazenda (Arts. 19 e 20 do DL 200/67) sobre os acórdãos dos conselhos de con­tribuintes tem como escopo e limite o reparo de nulida­des. Não é lícito ao Ministro cassar tais decisões, sob o argumento de que o colegiado errou na interpretação da

Lei.

III - As decisões do conselho de contribuintes, quan­do não recorridas, tornam-se definitivas, cumprindo à

Administração, de ofício, "exonerar o sujeito passivo "dos gravames decorrentes do litígio" (Dec. 70.235/ 72, Art. 45).

IV -Ao dar curso a apelo contra decisão definitiva de conse­lho de contrihuintes, o Ministro da Fazenda põe em risco

direito líquido e certo do heneficiário da decisão recorrida.

(MS - MANDADO DE SEGURANÇA - 8810 - DF,

P Seção, STJ, DJ 06/10/2003) (destaques nossos)

Extrai -se do acórdão por ora examinado que o STJ apenas admite, em casos especialíssimos, o denominado recurso hierár­quico. Isto é, caberia à autoridade máxima rever a decisão do Con­selho de Contribuintes somente diante de evidente ilegalidade, abuso ou desvio de poder. Nem o equívoco na interpretação da Lei seria capaz de promover tal revisão.

111.2. DA PROCURADORIA

Em 29 de outubro de 2004 foi editada a Portaria PGFN nO 820 (Portaria PGFN 820/04), baseada no Parecer do Procu­rador da Fazenda Nacional nO 1.087, editado em 25 de outubro de 2004, com o objetivo de estabelecer que as decisões do Con­selho de Contribuintes e da Câmara Superior de Recursos Fis-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

cais deveriam ser submetidas à apreciação do Judiciário, nos termos do artigo 2° da mencionada PortariaJlO

Sob os mesmos argumentos levantados pelo Ministério Pú­blico para a revisão da decisão do Conselho de Contribuintes, quais sejam, a proteção do patrimônio público e a garantia de apreciação pelo Poder Judiciário de toda lesão ou ameaça ao direito, a Procu­radoria, por sua vez, acredita que o Judiciário é capaz de rever a decisão emanada pelo Tribunal Administrativo.

De acordo com o anteriormente declinado, verificamos que tais argumentos foram extraídos do artigo 5° da Constituição Fe­deral e que revelam, tão-somente, o amparo ao cidadão diante de eventual abuso do Estado, e não o contrário. Ademais, nossos Tri­bunais Superiores também já se manifestaram de maneira favorá­

vel à perenidade da decisão administrativa. Assim, por todas as razões expostas, é certa a ilegalidade e

inconstitucionalidade da Portaria PGFN 820/04, posto que se deve afastar por definitivo a possibilidade do Estado rever decisões des­

favoráveis por meio do Poder Judiciário.

IV. CONCLUSÃO

Face a essas considerações, entendemos que não há qualquer impedimento na utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL sem a trava de 3(10/0, em caso de extinção da sociedade in-

310 "Art. 20. As decisões dos Conselhos de Contribuintes e da Câmara Superior de Re­cursos Fiscais podem ser submetidas à apreciação do Poder Judiciário desde que ex­pressa ou implicitamente afastem a aplicabilidade de leis ou decretos e. cumulativa

ou alternativamente: 1- versem sobre valores superiores a R$ 50.000.000.00 (cinqüenta milhões de reais); 11- cuidem de matéria cuja relevância temática recomende a sua apreciação na esfe-

ra judicial; e III - possam causar grave lesão ao patrimônio público."

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

corporada; tampouco quanto à incorporação da empresa controladora pela controlada; bem como na incorporação de em­presa lucrativa por deficitária, quando pertencentes ao mesmo Grupo Econômico.

As operações por ora referidas foram analisadas pelo Conse­lho de Contribuintes e possuem bons precedentes jurisprudenciais acerca da respectiva viabilidade. Na hipótese de obtenção de deci­são administrativa favorável e eventual questionamento por parte do Ministério Público Federal ou da Procuradoria-Geral da Fa­zenda Nacional, visando a submissão da decisão administrativa pelo Judiciário, o contribuinte estará amparado por decisões ju­diciais, tanto do STF quanto do STJ, rechaçando tal possibilida­de de interferência, e ratificando a perenidade da decisão admi­nistrativa.

306

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4' T li 'I'

Tributação do Mercado Finance

RACHEL KATLAUSKAS MURARO

A ivogada em São Paulo

Pós-graduada em I )ireito Tributário pela PUC-COGEAE

MBA Mercado de Capitais - FIPECAFI

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

TRIBUTAÇÃO DO MERCADO FINANCEIRO

A tributação do mercado financeiro e de capitais pelo impos­to de renda, sofreu recentemente profundas alterações com a edi­ção da Lei nO 11.033, de 21 de dezembro de 2004, que passou a produzir efeitos a partir de Iode janeiro de 2005.

O principal objetivo desta nova legislação foi criar condições para melhorar a estrutura do mercado financeiro e promover um incentivo aos investimentos de longo prazo, mediante concessão de estímulos tributários, acreditando-se que a readequação da car­ga tributária sobre os ativos financeiros auxiliaria o crescimento sustentado da economia, com maior geração de emprego e renda, propiciando ainda, para o Tesouro Nacional, o alongamento do prazo médio e a redução dos custos da Dívida Pública.

Como será notado a seguir, em regra houve um incentivo aos investimentos realizados a longo prazo, havendo uma diminuição na tributação dos rendimentos advindos destes. Contudo, em relação aos investimentos de curto prazo, a carga tributária incidente sobre seus rendimentos foi aumentada, desistimulando este tipo de operação.

I. APLICAÇÕES FINANCEIRAS

Em breve análise, as aplicações financeiras podem ser conceitu­adas como operações de cunho financeiro relativas a este mercado e de capitais, realizadas por intermediação de instituições financeiras ou qualquer outra pessoa que possua autorização legal para tanto.

1.1 . APLICAÇÕES FINANCEIRAS DE RENDA FIXA

Há aplicações financeiras que apresentam maior ou menor ris­co para seus investidores - risco, essencialmente, de perda do princi-

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COOROENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

paI investido. Às aplicações cujo risco de perda do principal investi­do é baixo, denominam-se "aplicações financeiras de renda fixa"

De acordo com o artigo 65, da Lei nO 8.981 de 20 de janeiro de 1995, e artigo 729, do Decreto nO 3.000 de 26 de março de 1999 ("RIRJ99"), os rendimentos auferidos por aplicações finan­ceiras de renda fixa estão sujeitos à incidência do imposto sobre a renda na fonte ("IRFonte").

A Instrução Normativa nO 134, de 30 de dezembro de 1985, já revogada, dispunha que aplicação financeira de renda fixa é "o rendimento pré ou pós-fixado (ou misto) correspondente a título, obrigação ou aplicação com data estabelecida para liquidação"

Atualmente, não há na legislação brasileira norma vigente que disponha sobre o conceito de "aplicação financeira de renda fiXa", sendo entendida como toda operação em que haja uma re­muneração preestabelecida, não sujeita às variações aleatórias. Por­tanto, para tal caracterização, é necessário que no momento da contratação da operação haja prévia estipulação da remuneração a ser recebida pelo investidor.

A fim de evitar a incidência do IRFonte sobre tais operações, os agentes dos mercados financeiros e de capitais começaram - há muitos anos - a utilizar determinados contratos que não eram ex­clusivos de instituições financeiras, ou seja, que não eram "aplica­ções financeiras" por excelência.

O legislador tributário, observando esse fenômeno, entendeu por bem equiparar deterllinadas transações a aplicações financei­ras. Assim, editou a Lei nO 8.981, de 20 de janeiro de 1995, que equiparou a aplicações Lnanceiras os (i) contratos de assunção de dívidas (quando o assuntor é instituição fmanceira); (ii) combina­ção de operações envolvendo instrumentos de renda variável que resultem o efeito de renda fiXa; (iii) mútuo de ouro, ativo financei­ro; (iv) compra de ouro, ativo financeiro, vinculada à revenda; (v) mútuos entre empresas não-financeiras; e (vi) debêntures.

Ademais, o parágrafo 4°, alínea c, do artigo 65, da Lei 8.981, de 20 de janeiro de 1995, equiparou, para fins da incidência do IRFonte, os rendimentos auferidos pela entrega de recursos à pessoa

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

jurídica, sob qualquer forma e a qualquer título, independentemente de ser ou não a fonte pagadora instituição autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil, às aplicações financeiras de renda fixa:

"Art. 65. O rendimento· produzido por aplicação financeira de renda fixa, auferido por qualquer beneficiário, inclusive pessoa jurídica isenta, a partir de 10 de janeiro de 1995, sujeita-se à incidência do imposto de renda na fonte à

alíquota de dez por cento.

(00')

§ 40 O disposto neste artigo aplica-se também:

(00')

c) aos rendimentos auferidos pela entrega de recursos a pes­soa jurídica, sob qualquer forma e a qualquer título, inde­pendentemente de ser ou não a fonte pagadora instituição autorizada a funcionar pelo Banco Central do Brasil."

Assim, para fins da legislação do IRFonte, todas as operações

de entrega de recursos a pessoa jurídica, sob qualquer forma e a

qualquer título que possuam uma remuneração pré-determinada,

são equiparadas às aplicações de renda ftxa e, portanto, tributadas

pelas mesmas regras a que estas estão sujeitas.

Os rendimentos periódicos produzidos por tais aplicações, bem

como qualquer remuneração adicional aos rendimentos preftxados,

serão submetidos à incidência do IRFonte por ocasião de seu paga­mento ou crédito.

Em relação ao cálculo deste tributo, de acordo com o previsto

no artigo 1°, da Lei 11.033, de 21 de dezembro de 2004, a partir de

1° de janeiro de 2005, as alíquotas do IRFonte incidentes sobre os

rendimentos de aplicações ftnanceiras de renda ftxa variam em ftm­

ção do tempo de resgate das aplicações, ou seja:

(i) 22,5%, em aplicações com prazo de até 180 dias;

(ii) 20%, em aplicações com prazo de 181 dias até 360 dias;

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(iü) 17,5%, em aplicações com prazo de 361 dias até 720 dias' e (iv) 15%, em aplicações com prazo acima de 720 dias. ' Assim, investimentos em aplicações financeiras de renda fixa

resgatados em até 180 dias terão seus rendimentos tributados pelo IRFonte à alíquota de 22,5%, por outro lado, no caso de resgate com prazos acima de 720 dias, os rendimentos serão tributados pelo IRFonte à alíquota de 15%.

A alteração promovida pela referida lei beneficiou os investi­dores que optam por aplicações com prazos mais extensos, majorando as alíquotas deste imposto para investidores que aplicam em opera­ções financeiras de curto prazo.

1.2. APLICAÇÕES FINANCEIRAS DE RENDA VARIAvEL

Em relação ao conceito de renda variável, também não há de­finição legal expressa para a referida locução. Uma aplicação finan­ceira será de considerada de renda variável quando não se puder prever nem o rendimento a ser auferido, e nem sequer se haverá rendimento.

Muitas são as aplicações financeiras de renda variável que, ao contrário de oferecer um rendimento, acabam por reduzir o valor principal aplicado.

Não obstante, a legi ,lação tributária - desde o advento da Lei nO 8.981, de 20 de janeiro de 1995 - optou por tratar algumas ope­rações como "aplicações financeiras de renda variáve!', tais como operações realizadas na b)lsa de valores, de mercadorias, de futuros e assemelhados, commodities, entre outros.

Referida delimitação ficou mais expressiva na Lei riO 11.033, de 21 de dezembro de 2004, que estabeleceu de forma específica a tributação de ganhos líquidos auferidos em operações realizadas em bolsas de valores, de mercadorias, de futuros, e assemelhadas, inclu­sive day trade, nos mercados de opções, contratos a termo, contratos relativos a ouro e ativos financeiros, operações realizadas no merca­do de balcão, com intermediação, tendo por objeto os valores mobi-

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

liários e demais ativos mencionados e operações realizadas em mer­cados de realização futura fora da bolsa de valores.

As operações realizadas em bolsas de valores à vista são aquelas em que ocorre a compra ou venda de ações para a liquidação imedi­ata. Nestes casos, o ganho líquido será constituído pela diferença positiva entre o valor de alienação do ativo e o seu custo de aquisi­ção, calculado pela média ponderada dos custos unitários.

Por sua vez, as bolsas de mercadorias, como o próprio nome já diz, são as que negociam mercadorias (commodities), tais como café, açúcar, algodão, etc. As negociações são realizadas nos mercados à

vista e de futuros. Os contratos negociados nos mercados futuros possuem data

futura para a liquidação de lotes padrão de ações, não havendo, en­tretanto, valor pré-fIxado, este dependerá da defInição do próprio mercado no momento da liquidação. Nos mercados futuros de bol­sa há o mecanismo denominado "ajuste diário", por meio do qual a cada dia é verifIcado se o preço futuro estipulado para a data de liquidação demonstra-se superior ou inferior ao preço futuro verifI­cado no dia anterior.

Day trades são defInidas como operações em que há a compra e venda de ações para a liquidação imediata, por um mesmo inves­tidor, no mesmo dia.

Nas operações nos mercados de opções, as ações não são dire­tamente negociadas, tratando-se essencialmente de operações en­volvendo contratos derivativos. Eles se valem de um determinado ativo - denominado pelos profIssionais do mercado fInanceiro de "ativo-objeto" - para estabelecer um direito de comprar ou vender determinado "ativo-objeto" em data futura e uma obrigação, no sen­tido inverso.

Já os contratos a termo são os que estabelecem uma obrigação e um direito líquido e certo, em data futura predeterminada, de ven­da ou compra de determinado ativo-objeto, por um preço preestabelecido.

E por fIm, as operações realizadas em mercado de balcão são as transacionadas por telefone ou outros meios eletrônicos entre ins-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

tituições financeiras, não havendo um local específico para ne­gociação.

Com relação à tributação pelo imposto de renda, tais aplica­ções financeiras de renda variável, estão sujeitas, corno regra geral, à incidência à alíquota de 15%, devendo este valor ser recolhido pelo próprio investidor ("auto-recolhimento"). A base de cálculo deste imposto deve incluir todos os ganhos líquidos auferidos a cada mês pelo investidor.

Ademais, mesmo havendo o "auto-recolhimento", corno for­ma de controle dos montantes transacionados, foi instituída a in­cidência do IRFonte à alíquota de 0,005%, devendo ser recolhido ao Tesouro Nacional até o 3° dia útil da semana subseqüente à

data da retenção, sobre os seguintes valores: (i) nos mercados de futuro, a sorna algébrica dos ajustes diá­

rios, se positiva, apurada por ocasião do encerramento da posição, antecipadamente ou no seu vencimento;

(ii) nos mercados de opções, o resultado, se positivo, da sorna algébrica dos prêmios pagos e recebidos no mesmo dia;

(iii) nos contratos a termo, (a) quando houver previsão de entrega do ativo objeto na data do seu vencimento, a diferença, se positiva, entre o preço a termo e o preço à vista na data da liquida­ção, ou (b) com liquidação exclusivamente financeira, o valor da

liquidação prevista no contrato; (iv) nos mercados à vista, o valor da alienação, nas operações

com ações, ouro ativo financeiro e outros valores mobiliários neles

negociados. A lei determina qUl tal montante do imposto retido na fonte

poderá ser deduzido do imposto sobre ganhos líquidos apurados no mês ou poderá ser compensado com o imposto incidente sobre

ganhos líquidos apurados nos meses subseqüentes. Além disto, caso após as deduções anteriores houver saldo

de imposto retido ou compensado com o imposto devido sobre o ganho de capital na alienação de ações, o IRFonte poderá ser com­

pensado nas declarações de ajuste anual.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

Nas operações em que o valor apurado seja igualou inferior a RS 1,00 (um real), há a dispensa na retenção do imposto.

A responsabilidade pela retenção do imposto de renda à alíquota de 0,005% será da instituição intermediadora que receber diretamente a ordem do investidor, a bolsa que registrou as opera­ções ou a entidade responsável pela liquidação e compensação das operações.

Referida retenção não é aplicável nas operações de exercício de opções, nas operações realizadas no mercado de balcão, com intermediação, e nas operações realizadas em mercados de liqui­dação futura, fora de bolsa.

Com relação às operações de day trade, a alíquota do imposto de renda aplicável é de 20% e os rendimentos auferidos nestas ope­rações sujeitam-se ao IRFonte à alíquota de 1%, também compensável com o imposto de renda devido.

Importante notarmos que a legislação regulou a transferên­cia de titularidade de ações negociadas fora de bolsa, sem intermediação, prevendo que a entidade encarregada de seu regis­tro (companhia emissora das ações, instituição autorizada pela Comissão de Valores Mobiliários ou entidade responsável pela li­quidação e compensação de operações realizadas em bolsa ou mer­cado de balcão) deverá exigir o Documento de Arrecadação de Receitas Federais ("DARF") que comprove o pagamento do im­posto de renda sobre o ganho de capital incidente na alienação ou declaração do alienante sobre a inexistência de imposto devido. Caso tal procedimento não seja observado, a entidade ficará sujei­ta a uma multa de 30% do valor do imposto devido.

1.3. ISENÇÕES PARA PESSOAS FlslCAS

A legislação, a fim de incentivar a utilização de instrumentos financeiros, determinou a isenção do imposto de renda para as pessoas físicas em alguns casos específicos.

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

Assim, as remunerações produzidas por letras hipotecárias, cer­tificados de recebíveis imobiliários e letras de crédito imobiliário são isentos do imposto de renda (na fonte e na declaração de ajuste anual das pessoas físicas). Tal isenção não é aplicável no caso de apuração de ganho de capital em razão destes instrumentos finan­ceiros.

Com relação às operações efetuadas com ações, no merca­do à vista de bolsa de valores ou com ouro e ativo financeiro se , o total das alienações realizadas no mês não exceder R$ 20.000,00, os ganhos líquidos auferidos pela pessoa física também serão isentos do imposto de renda.

II. FUNDOS DE INVESTIMENTOS

A nova legislação relativa à tributação do mercado financei­ro estabeleceu regras mais específicas quanto aos fundos de in­

vestimento. Os fundos de investimento são instrumentos jurídicos desti­

nados à constituição de condomínios para a captação e adminis­tração de recursos de seus investidores participantes, regulamen­tados e autorizados ao seu funcionamento pela Comissão de Valo­

res Mobiliários ("CVM'). Os fundos podem funcionar como um condomínio aberto,

não havendo limite máx mo de participantes, administrado com a finalidade de aplicar os ré cursos investidos no mercado e maximizar o retorno ao quotista. Em outros casos, os fundos podem repre­sentar um condomínio fechado, não permitindo que o investidor efetue o saque a qualquer momento, devendo a aplicação ser

mantida por um determinado prazo. Tendo em vista sua vasta aplicação, este instituto passou a ser

estruturado para atender tipos de investidores participantes com

as mais diversas finalidades.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

A nova legislação sobre tributação de mercado financeiro alterou a regulamentação sobre alguns dos tipos de fundos de investimentos existentes, estabelecendo diversas características, a fim de determinar regras mais claras e específicas de tributação para cada tipo de fundo, tendo dividido os fundos de investi­mento como de renda variável, de longo prazo e de curto prazo. Entretanto, como será verificado adiante, além destes, outros ti­pos de fundos de investimentos continuam existindo e possuem regulamentação e tributação específica.

Para cada tipo de fundo de investimentos há incidência de alíquotas distintas de IRFonte, mais uma vez privilegiando os investimentos de maior duração.

A base de cálculo do imposto de renda incidente sobre os rendimentos auferidos por meio dos fundos de investimentos é a diferença positiva entre o valor da quota apurado semestralmen­te, no resgate da aplicação ou outro período de incidência do imposto estabelecido em lei e o valor da quota na data do inves­timento ou no final do período de incidência anterior.

Há a possibilidade das perdas apuradas no resgate de quo­tas de fundo de investimento serem compensadas com os rendi­mentos auferidos em resgates ou incidências posteriores, no mes­mo ou em outro fundo de investimento administrado pela mes­ma pessoa jurídica, desde que os fundos sejam sujeitos à mesma alíquota do imposto de renda. Para tal procedimento, a institui­ção administradora do investimento deverá manter sistema de controle e registro em meio magnético que permita a identifica­ção, em relação a cada quotista, dos valores compensáveis.

Além disto, os investidores que transferirem seus recursos de um fundo para outro em razão de alterações na legislação ou em razão de reorganizações (incorporação, fusão ou cisão) de fundos ou de instituições autorizadas a funcionar pelo Banco

Central do Brasil, não serão obrigados a resgatar suas quotas do fundo de investimento.

Nestes casos, o patrimônio do fundo incorporado, cindido ou fundido deverá ser transferido, ao mesmo tempo, para o fun-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

do sucessor, não podendo haver qualquer disponibilidade de re­cursos para o quotista, nem transferência de titularidade das quo­tas e a composição da carteira do novo fundo não poderá ensejar aplicação de regime de tributação que preveja alíquotas inferio­res à do fundo de investimento extinto.

Nos casos de transferência de fundos de investimento as perdas havidas pelo quotista em resgates anteriores de quota; do fundo extinto podem ser alocadas para o mesmo quotista, no novo fundo, desde que administrado pela mesma instituição fi­nanceira ou por outra sob o mesmo controle acionário.

Em relação ao imposto de renda, será considerado, quando for o caso, o valor de aquisição registrado no fundo extinto ou o valor por este apurado na última data de incidência do imposto.

11.1. FUNDOS DE INVESTIMENTO DE LONGO PRAZO

Os fundos de investimento que possuam carteira de títulos

com prazo médio superior a 365 dias são classificados como fun­

dos de investimento de longo prazo. O cálculo do prazo médio deverá ser realizado levando-se em

consideração apenas os títulos e operações de renda fixa, tais como depósitos à vista, operações compromissadas, lastre adas em títu­los, títulos públicos federais e privados, operações conjugadas rea­lizadas nos mercados de opções de compra e de venda em bolsas de valores, de mercadorias e de futuros (box), no mercado a termo nas bolsas de valores, d(' mercadorias e de futuros, em operações

de venda coberta e sem ajustes diários, e no mercado de balcão e quotas de outros fundos de investimento de curto ou longo prazo.

De acordo com o previsto na Lei 11.033, de 21 de dezembro de 2004, o imposto sobre a renda incidente sobre os rendimentos

auferidos por qualquer beneficiário de fundo de investimento de longo prazo, inclusive pessoa jurídica isenta, será retido na fonte,

às seguintes alíquotas, variáveis em função do tempo de resgate

das aplicações:

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDlCA

(i) 22,5%, em aplicações com prazo de até 180 dias; (ii) 20%, em aplicações com prazo de 181 dias até 360 dias; (üi) 17,5%, em aplicações com prazo de 361 dias até 720 dias; e (iv) 15%, em aplicações com prazo acima de 720 dias. Desta forma, assim como nas aplicações financeiras de renda

fixa, os investimentos mantidos por prazo maior estarão sujeitos a alíquotas de IRFonte menores.

A incidência do IRFonte ocorrerá, como regra geral, no últi­mo dia útil dos meses de maio e novembro de cada ano, à alíquota de 15% ou no resgate das quotas, se ocorrido em data anterior.

Em havendo tributação no último dia útil dos meses de maio e novembro de cada ano, no momento do resgate das quotas será aplicada alíquota complementar do IRFonte ao tempo da aplica­ção mantida no fundo de investimento.

Ou seja, semestralmente os rendimentos do fundo de inves­timento serão tributados pelo IRFonte à alíquota de 15% e no momento de resgate das quotas haverá a incidência do imposto à alíquota complementar em função do tempo da aplicação, caso esta seja resgatada em até 720 dias.

No caso do investimento permanecer aplicado por mais de 720 dias, não haverá que se falar em alíquota complementar no resgate das quotas do fundo.

Além disso, no caso do fundo de investimento possuir perío­do de carência de até 90 dias, o IRFonte incidirá na data em que se completar cada período de carência para resgate de quotas com rendimento ou no resgate de quotas, se ocorrido em outra data.

11.2. FUNDOS DE INVESTIMENTO DE CURTO PRAZO

Por outro lado, fundos de investimento de curto prazo são aqueles formados por títulos com prazo médio igualou inferior a 365 dias.

Da mesma forma que os fundos de longo prazo, o cálculo do prazo médio deverá ser realizado levando-se em consideração ape-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

nas os títulos e operações de renda fIxa, tais como depósitos à vis­ta, operações compro missadas, lastre adas em títulos, títulos públi­cos federais e privados, operações conjugadas realizadas nos mer­cados de opções de compra e de venda em bolsas de valores, de mercadorias e de futuros (box), no mercado, a termo, nas bolsas de valores, de mercadorias e de futuros, em operações de venda co­berta e sem ajustes diários, e no mercado de balcão e quotas de outros fundos de investimento de curto ou longo prazo.

Os rendimentos auferidos em decorrência de tais investimen­tos sujeitam-se à incidência do IRFonte, por ocasião do resgate, às seguintes alíquotas:

I - 22,5%, em aplicações com prazo de até 180 dias; e II - 20%, em aplicações com prazo acima de 180 dias. Da mesma forma que os fundos de investimento de longo

prazo, os rendimentos dos fundos de curto prazo serão tributados semestralmente, como regra geral, no último dia útil dos meses de maio e novembro de cada ano, sujeitando-se à alíquota de 20%.

No resgate das quotas do fundo de investimentos será aplica­da alíquota complementar do IRFonte de 2,5%, caso o resgate ocor­ra no prazo de até 180 dias.

11.3. FUNDOS DE INVESTIMENTO DE RENDA VARIÁVEL

Os fundos de investimento em renda variável são entendidos como aqueles cuja carte ra seja composta por, no mínimo, 67% de ações negociadas nos m ~rcados à vista de bolsa de valores ou enti­

dades assemelhadas. Além disso, os recibos de subscrição de ações, os certifIca­

dos de depósito de ações, os Brazilian Depositary Receipts (BDR), as quotas dos fundos de ações e as quotas dos fundos de índice de ações negociadas em bolsa de valores ou mercado de balcão or­

ganizado são equiparadas às ações. A tributação pelo imposto de renda dos rendimentos das aplicações

em tais fundos ocorre apenas no resgate das quotas, à alíquota de 15%.

319

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

11.4. OUTROS FUNDOS DE INVESTIMENTO

Como exemplos de outros tipos de fundos de investimento, podem ser mencionados os fundos de investimento imobiliário, os fundos de investimento em direitos creditórios e os fundos de par­ticipação em empresas emergentes, os quais apresentam caracte­rísticas peculiares.

Como definição, fundo de investimento imobiliário é a jun­ção de recursos, captados por meio do mercado mobiliário com a finalidade de aplicação em empreendimentos imobiliários. Estes fundos são constituídos sob a forma de condomínio fechado, em que o resgate de quotas não é permitido.

O principal objetivo destes fundos é auferir rendimentos por meio da locação, arrendamento ou alienação das unidades do empreendimento adquirido pelo próprio fundo, sendo comum a locação de escritórios, shopping centers e pontos comerciais em geral.

Nos fundos de investimento imobiliário, existe a obrigatoriedade de distribuição, aos quotistas, de no mínimo 95% dos lucros auferidos, apurados segundo o regime de caixa, com base em balanço ou balancete semestral encerrado em 30 de ju­nho e 31 de dezembro de cada ano.

Os rendimentos auferidos por fundos de investimento imo­biliário submetem-se à tributação pelo IRFonte à alíquota de 20%, incidentes na distribuição dos lucros e na alienação das quotas do fundo.

A carteira do fundo de investimento imobiliário será tributável pelo IRFonte, porém compensável com o imposto devido na dis­tribuição dos lucros.

No caso de investimento de recursos em empreendimento imobiliário que tenha como incorporador, construtor ou sócio, quotista que possua, isoladamente ou em conjunto com pessoa a ele ligada, mais de 25% das quotas do fundo, o fundo de investi­mento imobiliário será equiparado à pessoa jurídica.

320

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

Já o fundo de investimento em direitos creditórios tem como principal característica a necessidade de ter, no mínimo, 50% do seu patrimônio líquido constituído por direitos creditórios que são definidos amplamente como todos os créditos (e títulos represen­tativos desses créditos) originários de operações nos segmentos financeiro, comercial, industrial, imobiliário, de hipotecas, de ar­rendamento mercantil e de prestação de serviços, bem como direi­tos e títulos representativos de créditos de natureza diversa, assim reconhecidos pela CVM.

Estes fundos de investimento em direitos creditórios, dife­rentemente dos imobiliários, para fins de tributação, são equipara­dos aos fundos de investimento em renda fixa e serão tributáveis pelo IRFonte regressivo mencionado anteriormente, aplicável aos fundos de curto ou longo prazo, dependendo do prazo dos títulos.

Além disto, cabe-nos mencionar os fundos de participação em empresas, também denominados de fundo de private equity, que possuem em sua carteira ações não negociadas em bolsa ou mercado de balcão, estando em mãos de acionistas individuais. Estes fundos investem em empresas emergentes que acredita-se terem bom potencial de crescimento e qualidade de gestão, sendo que o investimento do fundo varia geralmente de três a oito anos. Estes fundos, para fins tributários, são equiparados também aos fundos de investimento em renda flXa e serão tributáveis pelo IRFonte regressivo, aplicáveis aos fundos de curto ou longo prazo.

III. OUTRO~i INSTRUMENTOS FINANCEIROS

Além disto, como já mencionado anteriormente, a legislação

equiparou, para fins tributários diversas operações e instrumentos

a aplicações financeiras de renda fixa. Temos como exemplo o certificado de recebíveis imobiliários

- CRI, que são títulos de créditos nominativos, de livre negocia­ção, lastre adas em créditos imobiliários e que constituem promes-

321

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

sa de pagamento em dinheiro. Tais instrumentos somente podem ser emitidos por companhias securitizadoras.

O CRI recebe o mesmo tratamento das aplicações financeiras de renda fixa, contudo, a legislação determinou que os rendimentos destes títulos pagos às pessoas físicas são isentos do imposto de renda.

Além disto, são também tributadas como aplicações finan­ceiras de renda fixa, todas as operações conjugadas que permitam a obtenção de rendimentos predeterminados, tais como nos mer­cados de opções de compra e de venda em bolsa de valores, de mercadorias e de futuros (box), no mercado a termo em operações de venda coberta e sem ajustes diários e no mercado de balcão nas operações de mútuo.

As operações de ouro e ativo financeiro, no caso de mútuo ou compra vinculada à revenda, também são tributadas pelas mesmas regras aplicáveis às aplicações financeiras de renda fixa.

Por fim, podemos citar as operações de swap, que são contra­tos de troca envolvendo commodities, moedas ou ativos financeiros. A troca é feita para mudar datas de vencimento, indexador ou os títulos que estão na carteira do investidor.

Ainda que tais operações em nada se assemelhem às opera­ções de renda fixa, possuindo características extremamente parti­culares, o legislador entendeu por bem equipará-las para fins tri­butários. Assim, os rendimentos auferidos em operações de swap estão sujeitos à incidência do IRFonte regressivo.

322

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'. ,:~"

Juros sobre o Capital Próprio

SILVÉRIO DAS NEVES

Advogado em São Paulo Graduado em Con 'abilidade e Administração de Empresas pela Uni­

versidade Mackenzie Especialista em Contabilidade e Imposto de Renda

Ex-auditor Fiscal do Tesouro Nacional

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

JUROS SOBRE O CAPITAL PRÓPRIO

I. OBJETlVO DA REMUNERAÇÃO DO CAPITAL PRÓPRIO

Os sócios ou acionistas que investirem recursos em sua ativida­de empresarial têm direito à remuneração sobre o valor investido, a título de juros sobre o capital próprio, que serão calculados sobre o valor do patrimônio líquido, de forma similar à remuneração que terceiros (instituições financeiras, bancárias e outras) recebem quan­do financiam recursos às empresas. A sistemática do registro e da dedução juros sobre o capital próprio é semelhante à dos juros pagos pelas cooperativas a seus associados31l

II. DEDUTlBILlDADE NA ApURAÇÃO DO IRPJ E DA CSLL

Para fatos geradores ocorridos a partir de iode janeiro de 1996, observado o regime da competência312 , a empresa tributada com base no lucro reaP13 , poderá deduzir, para fins de determinação da base de cálculo do imposto de renda das pessoas jurídicas (IRPJ) e da contri­

buição social sobre o lucro líquido (CSLL), o valor dos juros pagos ou creditados individualmente ao titular, sócios ou acionistas, como for-

311 Juros de até 12% ao ano sobre capital integralizado (Lei n° 4.506, de 1964, art. 49, parágrafo único, e Lei n° 5.764, de 1971, art. 24, § 3°, consolidados no artigo n° 348 do Regulamento do Imposto de Renda de 1999 - RIR/99 - aprovado pelo Decreto n° 3.000, de 26-03-1999, republicado em 17-06-1999).

312 Quando as despesas e receitas são incluídas na apuração do resultado do exercício no período em que ocorrerem, sempre simultaneamente quando se correlacionarem, independentemente de recebimento ou pagamento (Artigo 9° da Resolução n° 774, de 16-12-1994, do Conselho Federal de Contabilidade).

313 Representa o resultado líquido do período de apuração, ajustado por adições, exclu­sões ou compensações prescritas ou autorizadas pela legislação tributária (artigo n° 247 do RIR/99).

324

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

ma de remuneração do capital próprio. O valor dos juros a ser deduzi­do será calculado sobre as contas do patrimônio líquido e limitado à variação pro rata dia da Taxa de Juros de Longo Prazo - TJLP314

A dedução dos juros, pagos ou creditados, fica condicionada à

existência de lucros, computados antes da dedução dos juros, ou de lucros acumulados e reservas de lucros de períodos de apuração315

anteriores e, não poderá exceder a 50% (cinqüenta por cento) do maior dos seguintes valores:

1°) lucro líquido do período de apuração316 antes da sua dedu­ção; ou

2°) somatório de lucros acumulados e reservas de lucros de pe­ríodos de apuração anteriores.

CASO PRÁTICO - OBSERVE OS DADOS ABAIXO- PERÍODO DE APURAÇÃO

ANUAL ENCERRADO EM 31-12-2005

ELEMENTOS VALORES RS

Lucro Líquido do periodo antes da dedução dos juros 18.400.000,00

Lucros Acumulados e reservas de Lucros de períodos anteriores 22.600.000,00

O valor médio da TJLP no ano-calendário de 2005 foi de 9,75%.

o Patrimônio Líquido da empresa no Balanço Patrimonial an­

terior, levantado em 31-12-2004, somava a importância total de RS 1.333.333.334,00. Sabendo-se que este valor não foi alterado du­

rante o ano-calendário oe 2005 e que a empresa não possuía saldos

não realizados nas cont:.s de reserva de reavaliação e reserva especial de correção monetária, (I montante máximo que poderá ser distribu­

ído a título de juros sobre o capital próprio em 2005, corresponderá

314 Instituída pela Lei n° 9.365, de 16-12-1996. 315 O período de apuração poderá ser trimestral - regra ou anual opção, caso a

empresa efetue o recolhimento mensal dos tributos calculados por estimativa - (ar­

tigos 220 e 221 do RIR/99). 316 Após a dedução da CSLL e antes da dedução da provisão para o imposto de renda

(artigo 29 da Instrução Normativa SRF nO 93, de 24-12-1997).

325

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

a RS 13.000.000,00 (9,75% x RS 1.333.333.334,00). Porém, para fins de apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL o limite para de dedução dos juros será de RS 11.600.000,00, ou seja, 50% de RS 22.600.000,00 (maior dos dois valores apresentados no quadro retro); caso a empresa venha a efetuar o crédito dos juros em valor superior ao mencionado o excesso deverá ser adicionado à base de cálculo do IRPJ e da CSLU17 para fins de apuração dos tributos devidos. A administração da sociedade decidiu distribuir, a título de juros sobre o capital próprio, o valor de RS 13.000.000,00, dessa forma, ela de­verá adicionar à base de cálculo dos mencionados tributos à impor­tância de RS 1.400.000,00 (RS 13.000.000,00 - RS 11.600.000,00).

318 III. PATRIMÔNIO LíQUIDO

Para fins de cálculo da remuneração sobre o capital próprio, não será considerado, salvo se adicionado ao resultado líquido para a determinação do lucro real e da base de cálculo da CSLL, o valor:

a) da reserva de reavaliação319 de bens ou direitos da pessoa jurídica;

b) da reserva especial de correção monetária do ativo perma­nente (Lei nO 8.200, de 1991, artigo 2°, §§ 4° e 5° e Decreto nO 332, de 1991, artigos 45 e 46, consolidados no artigo 460 do RIR/99); e

c) reserva de reavaliação de bens imóveis e de patentes, capita­lizada nos termos dos artigos 436 e 437 do RIR/99.

Na Declaração de Informações da Pessoa Jurídica de 2005 (DIPJ de 2005) a adição deverá constar na linha 12 da Ficha 09-A - Demonstração do Lucro Real, e na linha 12 da Ficha n° 17 - Cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.

318 Sobre as contas do patrimônio líquido, consultar os artigos n° 182 e 193 a 200 da Lei nO 6.404, de 15-12-1976 (Lei das Sociedades por Ações).

319 Sobre a realização da reavaliação de bens consultar o artigo n° 435 do RIR/99.

326

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

A Decisão de Consulta nO 95, de 2000, da tOa Região Fiscal­D~termina que para efeito de cálculo dos juros sobre o capital pró­pno não deve ser computado, como integrante do patrimônio líqui­do, o lucro do próprio período de apuração.

IV. IMPOSTO DE RENDA NA FONTE

o valor dos juros pagos ou creditados, a título de remunera­ção do capital próprio, estará sujeito à incidência do imposto de renda na fonte, à alíquota de 15% (quinze por cento), na data do pagamento ou crédito.

O imposto de renda retido na fonte será considerado: a) antecipação do devido na declaração de rendimentos, no

caso de beneficiário pessoa jurídica tributada com base no lucro real, presumido ou arbitrado;

b) tributação definitiva, nos demais caso, inclusive se o beneficiário for pessoa física.

No caso de beneficiário pessoa jurídica tributada com base no lucro real, o imposto poderá ainda ser compensado com o reti­do, por ocasião do pagamento ou crédito de juros, a título de re­muneração de capital próprio, a seu titular, sócios ou acionistas.

No exemplo em tela, o valor dos juros pagos ou creditados estará sujeito à incidência do imposto de renda retido na fonte, cujo montante será de R$ 1.950.000,00 (15% sobre R$ 13.000.000,00). O valor correspondente deverá ser recolhido em DARp20 próprio, segundo a data de ocorrência dos fatos gerado­

res, ou sep, para: a) fatos geradores ocorridos até 31-12-2005: o recolhimento

deverá ser efetuado até o terceiro dia útil da semana subseqüente

ao da ocorrência do fato gerador;

320 DARF - Documento de Arrecadação de Receitas Federais - código de arrecadação 5706.

327

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

b) fatos geradores ocorridos a partir de 01-01-2006: o reco­lhimento deverá ser efetuado até o terceiro dia útil subseqüente ao decêndio de ocorrência do fato gerador (Lei nO 11.196, de 21-111-2005, artigo nO 70, l, B e artigo 132, IV, B).

Notas: la) O valor dos rendimentos sobre o capital próprio recebidos

por pessoa jurídica, domiciliada em país com tributação favorecida (pa­raísos fiscais), se sujeita à incidência do imposto na fonte à alíquota de 25% (lN SRF nO 252, de 03-12-2002, art. 13, § 1°);

2a) Estão isentos do imposto de renda os juros recebidos pelos fundos de investimentos, clubes de investimento, carteiras administra­das ou qualquer outra forma de investimento associativo ou coletivo (Lei nO 9.532, de 1997, artigo 28, § 10, b, e artigo 33);

3a) A parcela dos juros sobre o capital próprio, recebida por pessoa jurídica imune, não estará sujeita à retenção do imposto de renda na fonte (lN SRF nO 12, de 10-02-1999, artigo 3°).

Observe, ainda, as seguintes soluções de consultas tributárias:

I') Fica dispensada da retenção do Imposto de Renda na Fonte incidente sobre os pagamentos efetuados, a

título de juros sobre o capital próprio, a entidades fechadas de previdência privada, optantes pelo re~me

especial de tributação instituído pela MP nO 2.222, de 2001 (Solução da 7' RF nO 17/03).

2') Os juros pagos por cooperativas a seus associados, pessoas físicas, como remuneração do capital social,

sofrerão tributação exclusiva na fonte, na data do pagamento ou crédito, não podendo, no entanto, ser

compensados na Declaração de Ajuste anual (Decisão da 6' RF nO 168/00 e Solução da I' RF nO 99/01).

3') Os juros pagos ou creditados, a título de remuneração do capital próprio, a sócio residente no Japão,

estão sujeitos à tributação na fonte à a1íquota de 12,5% (Solução de Divergência Cosit nO 16/01).

328

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

V. CRÉDITO DOS JUROS

Considera-se creditado, individualizadamente, o valor dos ju­ros sobre o capital próprio, quando a despesa for registrada, na escri­turação contábil da empresa, em contrapartida a conta ou subconta de seu passivo exigível, representativa de direito de crédito do sócio ou acionista da sociedade ou do titular da empresa individual. Ob­serve, a seguir, o registro contábil dos juros.

Contabilização: a) do valor dos Juros sobre o Capital Próprio em 31-12-2005 Despesa de Juros sobre o Capital Próprio 321 (Resultado)

a Remuneração do Capital Próprio a Pagar (Passivo Circulante)

13.000.000,00 (*)

(*) Adicionar RS 1.400.000,00 na base de cálculo do IRPJ e da

CSLL.

b) do valor do Imposto de Renda na Fonte em 31-12-2005 Remuneração do Capital Próprio a Pagar (Passivo Circulante)

a IRRF a Recolher (Passivo Circulante PC)

1.950.000,00 (**) (**) 15% sobre RS 13.000.000,00.

c) por ocasião do pasamento dos juros Remuneração do Capi­

tal Próprio a Pagar (PC) a Bancos conta Movimento 11.050.000,00

Note que os beneficiários dos juros receberão o valor líquido cor­

respondente a R$11.050.000,OO (RS 13.000.000,00 - RS 1. 950.000,00).

321 Para fins de dedutibilidade na determinação do lucro real. os juros pagos ou credita­dos, ainda que imputados aos dividendos, deverão ser registrados em contrapartida de despesas financeiras (lN SRF n° 1 I. de 21-02-1996, artigo n° 30, §).

329

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIOICA

VI. INTEGRALlZAÇÃO DE AUMENTO DE CAPITAL

A utilização pelo beneficiário do valor creditado, líquido do imposto de renda na fonte, para integralização de capital na em­presa, não prejudica o direito à dedutibilidade da despesa, tanto para efeito do lucro real quanto da base de cálculo da contribuição social sobre o lucro líquido322 Observe, adiante, o registro contábil da capitalização do valor líquido dos juros sobre o capital próprio.

Capitalização do valor liquido dos juros Remuneração sobre o Capital Próprio a Pagar (PC) a Capital Social (Patrimônio Líquido = PL) 11.050.000,00

VII. IMPUTAÇÃO AO VALOR DOS DIVIDENDOS

Segundo dispõe o artigo nO 9°, § 7° da Lei nO 9.249, de 26-12-1995, o valor dos juros pagos ou creditados pela pessoa jurídi­ca, a título de remuneração do capital próprio, poderá ser imputa­do ao valor dos dividendos de que trata o artigo nO 202, da Lei nO 6.404, de 15-12-1976 (com redação dada pelo artigo 2°, da Lei nO 10.303, de 2001), sem prejuízo da incidência do imposto de renda na fonte.

VII.1. COMPANHIAS ABERTAS

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM), através da Deli­beração CVM nO 207, de 1996, estabeleceu que as companhias abertas devem registrar o valor liquido dos juros sobre o capital próprio, diretamente à conta de Lucros Acumulados, sem afetar o

322 Conforme dispõe o § único do artigo l° da lN SRF nO 41, de 22-04-1998 e o § l° do arl. 29 da lN SRF n° II, de 21-02-1999.

330

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

resultado do exercício e apenas o imposto de renda na fonte sobre o valor da remuneração é que será reconhecido como despesa.

Na mencionada Deliberação, a CVM orienta que, caso a em­presa contabilize os juros como despesa para atender às disposi­ções tributárias, deverá proceder à reversão desses valores na sua escrituração de forma que o resultado do exercício não seja afeta­do por aquele lançamento.

Assim, entendo que a contabilização, para atender as normas da Secretaria da Receita Federal e da CVM, deveria ser efetuada da seguinte forma:

Contabilização: 1 o) Na apropriação dos juros Juros sobre o Capital Próprio (Despesa Financeira) a Remuneração do Capital Próprio a Pagar (PC)

13.000.000,00

2°) Apropriação do IRRF sobre os rendimentos Remuneração de Capital Próprio a Pagar (PC) a Imposto de Renda na Fonte a Recolher (PC)

1.950.000,00

3°) Pela reversão ou imputação a dividendos Lucros Acumulados (PL) a Reversão da Remuneração de Capital Próprio a Pagar (*)

11.050.000,00

(*) Conta de Resultado. A reversão ou imputação ao valor dos dividendos (3° lançamento) foi efetuada pelo líquido, para con­siderar o valor do IRF como despesa, a fim de atender a disposição da Deliberação CVM nO 207, 1996. Este valor poderá ser excluído para fms de apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL (por­que foi considerado na apuração do resultado do exercíci~ um va­lor já tributado, pertencente ao patrimônio líquido). Rela.tlva~~n­te à matéria em tela, veja adiante a decisão da consulta tnbutana e

o acórdão do Conselho de Contribuintes.

331

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURIDICA

DECISÃO DE CONSULTA DA 7' REGIÃO FISCAL N° 68. DE 1998:

Os juros pagos 011 creditadu!' individllali7;"damcntc a [itular, ~ciol'. acionistas, na forrna

preconiz.,d:l no artigo 9u da Lei 9.249. de 1995, a titulo de rcrnunc;raçiio de c\rital

próprio, que n50 tenham sido computados na apuraç;io do lucro liquido do cxcn:ício. poderã.o

ser cx,.:luídos par:l fins de determinação do lucro rcal.

ACORDÀO N° 101-93.976/02 DO 1° CONSELHO DE CONTRIBUINTES

REGISTRO CONTÁBIL (EX. 98) - Deve ser reconhecida a dcdutibilidadc dm juros sobre

o c:.tpital próprio. quando apur.lJo de acordo com as normas previstas no artigo 9° da Lei nO

9.249/95, com ;J. (cdação dada pelo artigo 78 da Lei nO 9.430/96. independentemente do

registro cont~íbil ter siJo procedido em conta de rcsultóldu ou diret,lmentc ii conta de lucros

acumulados.

VIII. ENCARGOS SOBRE OS JUROS REMUNERATÓRIOS DO CAPITAL

PRÓPRIO

Os juros e outros encargos pagos ou creditados pela empre­sa a seu titular, sócios ou acionistas, calculados sobre os juros remuneratórios do capital próprio por ela distribuídos, sujeitam­se à incidência do imposto de renda na fonte. A estes juros e encargos, aplicam-se as normas relativas aos rendimentos de apli­cações financeiras de renda fixa, inclusive quanto ao informe de rendimentos a ser fornecido pela pessoa jurídica.

Caso Prático: Suponha que o montante da remuneração do capital próprio a pagar, que correspondia, em 31-12-2005, ao valor líquido de R$ 11.050.000,00, tenha sido efetivamente pago em 31 de janeiro de 2006, acrescido de juros hipotéticos equiva­lentes a RS 276.250,00, ou seja, calculados mediante a aplicação da taxa hipotética de 2,5% sobre R$ 11.050.000,00. Sobre esse acréscimo, haverá a incidência do imposto de renda na fonte à

alíquota de 20%, cujo valor corresponderá a RS 55.250,00, retido por ocasião do pagamento ou crédito e deverá ser recolhido (para fatos geradores ocorridos):

332

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COORDENAÇÁO: PEDRO ANAN JR.

a) (até 31-12-2005): até o terceiro dia útil da semana sub­seqüente ao da ocorrência do fato gerador;

b) (a partir de 01-01-2006): até o último dia útil do 1° (pri­meiro) decêndio do mês subseqüente ao mês de ocorrência do fato gerador (Lei nO 11.196, de 21-11-2005, artigo nO 70, I, D e artigo 132, IV, B).

Contabilização:

1°) Reconhecimento dos juros sobre os juros Juros Passivos (Despesa Financeira) a Remuneração do Capital Próprio a Pagar (PC)

276.250,00

2°) Incidência do IRRF à alíquota de 20% Remuneração de Capital Próprio a Pagar (PC) a IRRF a Recolher (PC) 55.250,00

3°) Pelo pagamento Remuneração de Capital Próprio a Pagar (PC)

a Bancos conta Movimento 11.271.000,00 (*) (*) RS 11.050.000,00 + RS 276.250,00 - RS 55.250,00.

IX. REFLEXOS NOS INVESTIDORES

IX.1. EMPRESA TRIBUTADA PELO LUCRO REAL

o valor da remuneração sobre o capital próprio, ainda que imputado ao valor dos dividendos, auferido por beneficiário pes­soa jurídica submetida ao regime de tributação com base no lucro real, será contabilizado como receita financeira e inte-

333

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

grará a base de cálculo dos tributos (IRPj, CSLL, PIS e COFINS323 ).

IX.2. EMPRESA TRIBUTADA PELO LUCRO PRESUMIDO OU ARBITRADO

o valor recebido a título de remuneração sobre o capital próprio por empresa tributada com base no lucro presumido ou arbitrado será com­putado na base de cálculo dos tributos (IRPj, CSLL, PIS e COFINS324).

IX.3. CONTABILIZAÇÃO DOS JUROS AUFERIDOS

Utilize os dados do item nO 5 para contabilizar o valor dos juros recebidos pela pessoa jurídica investidora, tributada com base no lucro real, que detém 50% das ações representativas do capital social da empresa distribuidora dos mencionados juros.

a) Juros sobre o Capital Próprio auferidos em 31-12-2005 Remuneração do Capital Próprio a Receber (Ativo

Circulante) a Juros Ativos sobre o Capital Próprio (Receita Finan-

ceira) 6.500.000,00 (*) (*) 50% de R$ 13.000.000,00.

323 o Decreto nO 5.442, de 09-05-2005, reduziu a zero as alíquotas do PlS e da COFlNS incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pelas empresas sujeitas à incidência não-cumulativa das referidas contribuições. Porém, a redução em comento, não se aplica ao valor dos juros auferidos sobre o capital próprio. As empresas, sujeitas ii incidência cumulativa das mencionadas contribuições, deverão computar todas as receitas financeiras, inclusive as auferidas com os juros sobre o capital próprio. na base de cálculo das digitadas con tribuições.

324 As empresas, sujeitas à incidência cumulativa das contribuições ao PlS e à COFlNS deverão computar todas as receitas financeiras, inclusive as auferidas com os juros sobre o capital próprio, na base de cálculos das digitadas contribuições.

334

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

b) Imposto de Renda na Fonte sobre os juros auferidos em 31-12-2005

IRRF a Compensar (Ativo Circulante = AC) a Remuneração do Capital Próprio a Receber (AC)

975.000,00 (**)

(**) 50% sobre RS 1.950.000,00 (ou, 15% sobre RS 6.500.000,00).

c) por ocasião do recebimento dos juros Bancos conta Movimento a Remuneração do Capital Próprio a Receber (PC)

5.525.000,00 ( ... ) ( .... ) RS 6.500.000,00 - RS 975.000,00.

x. VANTAGENS E DESVANTAGENS NA DISTRIBUIÇÃO DOS JUROS

X.1. JUROS DISTRIBUíDOS PARA PESSOAS FíSICAS

A empresa, que remunerar seus sócios ou acionistas, pesso­as físicas, com o valor dos juros sobre o capital próprio, terá re­dução em sua carga tributária, comparativamente, com a em­presa que não efetuar tal distribuição. Note que o valor a ser pago a título de imposto de renda na fonte à alíquota de 15%, inciden­te sobre o valor dos jure s, será compensado, com enorme vanta­gem tributária, pela recução no valor dos tributos devidos pela empresa distribuidora, calculados sobre sua margem de lucro (IRPJ e CSLL), em razão do registro dos juros mencionados como despesa financeira.

Caso Prático: utilizando os dados dos itens nO 5, calcule o resultado do exercício (lucro real anual) com e, também, sem a distribuição dos juros sobre o capital próprio.

335

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

DEMONSTRAÇÃO DO RESULTADO DO EXERCÍCIO

Valorcsem RS Elementos

sem os iuros com os iuro.

Lucro antes dos juros, da CSLL e do IRPJ 18.400.000,00 18.400.000,00

(-) Juros sobre o Capital Próprio (0) -0- {11.600.000(0)

(=) Base de Cálculo da CSLL c do IRPJ (oo) 18.400.000,00 6.800.000,00

(-) Contribuição Social sobre o Lucro Liquido (CSLL = 9%) (1.656.000,00) (612.000,00)

(-) Imposto de Renda da PmoaJurídica (IRPJ) {4.576.ººº 00) {1.676.000 !!!ll (=) Lucro Liquido do Exercício (após os tributos) 12.168.000,00 4.512.000,00

(e) Para evif';lr ajustes na base de: cálculo dos tributos, suponha que a emprcs:a distribuiu apen3S o mont.l.ntc dos juros dcdutiveis n3 bas

cllculos dos tributos (IRPJ c CSLL), ou sej" o valor de RS 11.600.000,00.

(00) Supondo inexistência de ajustes.

IRPJ - Cálculos:

Imposto: (15% sohre a Base de Cálculo) 2.760.000,00 1.020.000,00

Adicional [10% x (BC - RS 240.000,(0)] 1.816.000 00 656.000 00 :,.. (=) Imposto e adicional devidos 4.576.000,00 1.676.000,OC

Observe, no quadro adiante, o valor total dos rendimentos dos sócios ou acionistas,

VALOR TOTAL DOS RENDIMENTOS DOS SÓCIOS OU ACIONISTAS

Elementos sem os juros com os juros

Lucro Líquido do Exercício (após os tributos) 12.168.000,00 4.512.000,00

(+) Juros sobre o capital Próprio -0- 11.600.000,00

(=) Subtotal 12.168.000,00 16.112.000,00

(-) IRRF sobre os juros (15% x RS 11.600.000,00) -0- (1.740.000,00)

(=) Rendimento total líquido 12.168,000,00 14.372.000,00

336

Page 339: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

A diferença no rendimento líquido total dos SOCIOS, RS 2.204.000,00 (RS 14.372.000,00 - RS 12.168.000,00), corresponde a redução no valor do imposto de renda das pessoas jurídicas, relativo ao adicional de 10% e, sobre a não-incidência da contribuição social so­bre o lucro líquido, no valor de 9%, ambos sobre o montante da remu­neração sobre o capital próprio contabilizado como despesa financei­ra, assim os RS 2.204.000,00, correspondem a 19% (10% do adicional do IRPJ, mais 9% da CSLL) aplicados sobre o montante de RS 11.600.000,00 (valor relativo aos Juros sobre o Capital Próprio, contabilizado como despesa financeira), observe o cálculo adiante.

Cálculo da Economia Tributária

~ 34% (') sobre RS 11.600.000,00 Ouros sobre o Capital Próprio) 3.944.000,00

~ (-) 15% de IRRF sobre RS 11.600.000,00 Ouros sobre o Capital Próprio) (1.740000,00)

~ (=) Economia Tributária obtida com a distribuição dos Juros 2.204.000,00

~ (') 34% = [25% de IRPJ (sendo 15% da aliquota + 10% do adicional) mais 9% da CSLL].

X.2. JUROS FISTRIBUloos PARA PESSOAS JURIOICAS

Caso as pessoas jurídicas, pagadora e recebedora, estiverem su­

jeitas ao pagamento da CSLL e do adicional do IRPJ, a distribuição

da remuneração do capital próprio será desvantajosa do ponto de vista

tributário porque, na empresa recebedora, o montante recebido, regis­

trado como receita financeira, estará sujeito à tributação das contri­

buições ao PIS e à COFlNS, pelas seguintes alíquotas: a) 7,6% (COFINS) e 1,65% (PIS), caso a empresa recebedora

estiver sujeita ao recolhimento não-cumulativo das mencionadas con­

tribuições; e b) 3% (COFINS) e 0,65% (PIS), caso a empresa recebedora

estiver sujeita ao recolhimento cumulativo das mencionadas contri­

buições. Idêntica conclusão deverá ser obtida caso as empresas, pagadora

e recebedora, não estiverem sujeitas ao adicional do IRPJ.

337

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Se a empresa recebedora não estiver sujeita ao adicional do IRPJ e a pagadora estiver, poderá haver economia tributária, tendo em vista que a empresa recebedora pagará 15% de IRPJ, sobre o valor recebido, enquanto a empresa pagadora deixará de recolher 25% sobre o valor distribuído. Cabe destacar ainda, por perti­nente, que se a pessoa jurídica recebedora estiver sujeita ao reco­lhimento das contribuições ao PIS e à COFINS na sistemática:

a) da não-cumulatividade, o registro do valor recebido como receita financeira provocará o recolhimento de 9,25%325 a título das mencionadas contribuições, sobre o valor recebido, o que poderá anular o possível ganho obtido pela empresa distribuido­ra, com a redução do adicional de 10% sobre o valor distribuído;

b) da cumulatividade, o registro do valor recebido como re­ceita financeira provocará o recolhimento de 3,65%326, a título das mencionadas contribuições, sobre o valor recebido, hipótese em que haverá ganho tributário decorrente da distribuição dos juros sobre o capital próprio.

As conclusões são válidas, desde que o pagamento e/ou re­cebimento dos juros sobre o capital não altere os fatos de uma estar sujeita ao adicional e a outra não. Se a pessoa jurídica paga­dora não estiver sujeita ao adicional e a recebedora estiver, não é conveniente efetuar a distribuição do valor dos juros sobre o ca­pital próprio.

Se a pessoa jurídica pagadora apurar base de cálculo positi­va do IRPJ e da CSLL e a empresa recebedora apurar base de cálculo negativa para os referidos tributos, a distribuição dos ju­ros poderá ser conveniente desde que, o valor absoluto da base de cálculo negativa dos mencionados tributos seja superior ao valor dos juros auferidos.

325 7,6% a título de COFINS e 1,65% a título de PISo 326 3% a título de COFINS e 0,65% a título de PISo

338

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

XI. DEDUÇÃO DOS JUROS NO BAlANçO DE SUSPENSÃO OU REDUÇÃ0327

A empresa, que levantar balanço ou balancete para fins de suspensão ou redução do imposto calculado por estimativa328 , po­derá deduzir o valor dos juros sobre o capital próprio na determi­nação da base de cálculo do lRPJ e da CSLL, observados os requi­sitos da legislação, inclusive no que se refere ao limite de dedutibilidade dos mencionados juros (artigo 29 da lN SRF nO

11, de 21-02-1996).

XII. JUROS DE PERíODOS DE ApURAÇÃO ANTERIORES

Há uma questão que deve ser colocada, pois está sendo bas­

tante discutida entre profissionais da área tributária: poderiam as empresas deduzir no atual período de apuração os juros não-de­duzidos em períodos de apuração anteriores? Antes de responder à questão, será reproduzida de forma literal a ementa da solução de Consulta Tributária nO 63, de 2001, da 6a Região Fiscal:

"Dedução dos juros de períodos anteriores - Sob pena de

infringir o regime de competência previsto na legislação

própria é vedado à ')essoa jurídica computar em um exercí­

cio o montante do~ juros sobre o capital próprio de perío­

dos anteriores."

Assim, entende-se o registro contábil dos juros de períodos de

apuração anteriores como ajustes de períodos anteriores, para aten­

der às intenções dos interessados, ou seja, a dedução do valor dos

327 Levantado para suspender ou reduzir o pagamento mensal dos tributos devidos por

estimativa (artigo n° 230, do RlR/99), 328 Pagamento mensal dos tributos calculados sobre o valor da receita bruta e das de­

mais receitas, rendimentos e ganhos de capital, na forma do artigo n° 222 do RlR/99,

339

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

juros na apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, os envol­vidos na transação (somente pessoas jurídicas ou pessoas físicas e pessoas jurídicas) deverão, além de recolher o valor do IRRF inci­dente sobre a remuneração do capital próprio com os devidos acrés­cimos legais, providenciar a retificação de todas as declarações dos envolvidos no(s) período(s) de apuração anterior(es), tais como: DIRPJ ou DI PJ, DCTF, DIRF e todas as declarações de rendi­mentos dos beneficiários - DIRPJ ou DIPJ ou, ainda, DIRPF, relativas à data-base a que se reportam os juros sobre o capital próprio a serem deduzidos.

Após providenciar todas as correções apontadas, os envolvi­dos terão, ainda, que buscar proteção judicial para seu intento, já que a Secretaria da Receita Federal não deverá homologar tal pro­cedimento, em razão do pronunciamento do órgão, através da Su­perintendência Regional da Receita Federal da 6a Região Fiscal, na ementa da solução de consulta atrás reproduzida.

Cabe, ainda, destacar que a contabilização como "ajustes de períodos de apuração anteriores" somente seria possível do ponto de vista contábil e fiscal se fosse, efetivamente, comprovado que a mencionada contabilização se refere à mudança de critérios contábeis ou à retificação de erro, imputado a determinado exer­cício anterior e que não possa ser atribuído a fatos subseqüentes, ocasionados pela omissão ou erro nos lançamentos de receitas e/ ou despesas. A falta de registro dos juros, no período próprio, não será interpretada pelo fisco como erro por falta do registro da des­pesa, mas como opção da pessoa jurídica em não contabilizar tal fato, no período de apuração a que teria direito.

XIII. DEVER DE INFORMAR OS VALORES CREDITADOS

o valor dos juros sobre o capital próprio, pago ou creditado, deverá ser informado ao beneficiário:

340

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

a) pessoa física, anualmente, na Linha 02 do ~adro 5 do In­forme de Rendimentos Financeiros a que se refere o Anexo Único da lN SRF na 288, de 24-01-2003, art. 10;

b) pessoa jurídica, até o dia 10 do mês subseqüente ao do cré­dito ou pagamento, por meio do Comprovante de Pagamento ou Crédito a Pessoa Jurídica de Juros sobre o Capital Próprio a que se refere o Anexo Único à lN SRF na 41, de 22-04-1998, art. 20, II.

Notas: 1 a) O valor líquido dos juros sobre o capital próprio (rendi­

mento menos imposto de renda retido na fonte) deverá constar na declaração de rendimentos da pessoa física como:

a) rendimento sujeito à tributação exclusiva na fonte; e b) crédito junto à pessoa jurídica distribuidora (informado

na declaração de bens e direitos), quando corresponder ao valor creditado e ainda não recebido pelo beneficiário ao final do ano­

calendário correspondente.

XXIV. CASO PRÁTICO

XXIV1. Dados da empresa SDN Comércio de Peças para Automóveis

Ltcla: Saldo do Patrimônio Líquido no Balanço Patrimonial levantado

em 31-12-2004 - exercíci0 anterior: ............................ R$ 10.600.000,00; Saldo não realizado da Reserva de Reavaliação no Balanço

Patrimonial levantado err 31-12-2004: ......................... R$ 600.000,00; Alterações ocorridas no Patrimônio Líquido no ano-calen­

dário de 2005: • Distribuição de lucros não provisionados em 01-05-2005:

R$ 800.000,00; • Aumento de capital social, em dinheiro, efetuado pelos só-

cios em 20-09-2005 .................................................... R$ 1.400.000,00. - Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) para o ano-calendário

de 2005:

341

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

-A TJLP mensal, para cada um dos meses do ano-calendá­rio, foi de 0,8125%.

- A empresa apurou lucro real anual no ano-calendário de 2005, ou seja, optou pelo pagamento mensal dos tributos (IRPJ e CSLL) calculados por estimativa.

XXIV.2. Pede-se cálculo e contabilização do valor dos juros sobre o capital próprio, relativo ao ano-calendário de 2005, a ser pago pela empresa SDN aos seus sócios, todos residentes e domiciliados no Brasil.

XXIY.3. Cálculo e contabilização dos juros sobre o capital

próprio: Patrimônio Líquido durante o ano-calendário de 2005: Base de Cálculo inicial dos juros RS 10.000.000,00 (RS

10.600.000,00 - RS 600.000,00). A partir de 01-05-2005 RS 9.200.000,00 = RS 10.000.000,00

RS 800.000,00. A partir de 20-09-2005 RS 10.600.000,00 = RS 9.200.000,00

+ RS 1.400.000,00.

SDN Comércio de Peças pal1 Automóveis Ltda

Cálculo dos Juros sobre o Capital Próprio - ano-calendário de 2005.

Meses Descrição Valores (em RS):

Parciais Totais

Jan aAbr RS 10.000.000,00 x 3,1502% 315.010,00

Mai aAgo RS 9.200.000,00 x 3,1502% 289.818,40

Setembro RS 9.200.000,00 x 0,51827% 47.680,84

RS 10.600.000,00 x 0,2588% 27.432,80 75.113,64

Outa Dez RS 10.600.000,00 x 2,3535% 268.710,00

Valor bruto total apurado em 31-12-2005 948.662,04

(-) IRRF sobre o valor dos juros (15% x RS 960.916,66) 142.299,31

(=) Valor liquido disponível para os sócios 806.362,73

342

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

Contabilização em 31-12-2005: 10) Valor dos juros Juros sobre o Capital Próprio (Despesas Financeiras) a Remuneração do Capital Próprio a Pagar (PC) 960.916,66 20 ) Pelo IRRF sobre o valor dos juros Remuneração do Capital Próprio a Pagar (PC) a IRRF a Recolher (PC) 144.137,50

(PC) = Passivo Circulante. Resultado (Despesas Financeiras).

Notas:

la) O valor médio da Taxa de Juros de Longo Prazo relativo ao ano-calendário de 2005, foi de 9,75%.

2a) O valor mensal utilizado no exemplo foi o divulgado pela Secretaria da Receita Federal para os meses do ano-calendário de 2005 e corresponde ao valor de 0,8125%, ou seja, (9,75% : 12 meses);

3a ) A aplicação da TJLP sobre o montante do patrimônio líquido representa o limite do pagamento ou crédito dos juros so­bre o capital próprio. Não existe, entretanto, qualquer empecilho para a estipulação de valor inferior, levando-se em conta o limite dedutível na base de cálculo dos (IRPJ e da CSLL), ou, até o limi­te da disponibilidade financeira da pessoa jurídica.

XXIV.4. JUROS PRO RATA - UTILIZANDO A TAXA EXPONENCIAL

Não houve edição de qualquer ato legal ou normativo pela Secretaria da Receita Federal esclarecendo se o cálculo da taxa pro rata seria efetuado de forma exponencial ou linear, porém, através do Anexo à Circular nO 2.722, de 1996, o Banco Central do Brasil, estabeleceu condições para a remessa dos juros sobre o capital pró­prio da empresa para o titular, sócios ou acionistas residentes ou domiciliados no exterior. No anexo em tela consta uma demons­tração de cálculo sugerindo a adoção do critério exponencial as-

343

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

sim, se utilizado o critério sugerido pelo BACEN no anexo da refe­rida circular o cálculo dos juros sobre o capital próprio do exemplo anterior seria calculado da seguinte forma:

a) Pela capitalização diária: (1,0975)11360 = 1,0002585 ou 0,0002585 ou 0,02585% Assim, utilizando a capitalização diária o cálculo para 10, 20 e

30 dias, a serem utilizados no exemplo, teríamos: 10 dias = 1,002588 ou 0,002588 ou 0,2588%;

- 20 dias = 1,0051827 ou 0,0051827 ou 0,51827%; - 30 dias = 1,007783 ou 0,007783 ou 0,7783%; - 90 dias = 1,023535 ou 0,023535 ou 2,3535%

120 dias = 1,031502 ou 0,031502 ou 3,1502%

SDN Comércio de P~ para Automóveis Ltda

Cálculo dos Juros sobre o Capital Próprio - ano-calendário de 2005.

Meses Descrição Valores (em RS):

Parciais Totais

Jan aAbr RS 10.000.000,00 x 0,8125% x 4 325.000,00

Mai aA~o RS 9.200.000,00 x 0,8125% x 4 299.000,00

Setembro RS 9.200.000,00 x (0,8125%:30x20) 49.833,33

RS 10.600.000,00 x (O,8125%:3OxI0) 28.708,33 78.541,66

Outa Dez RS 10.600.000,00 x (0,8125% x 3) 258375,00

Valor bruto total apurado em 31-12-2005 960.916,66

(-) IRRF sobre o valor dos juros (15% x RS 960.916,66) 144.137,50

(=) Valor líquido disponível para os sócios 816.779,16

Nota: Observe que o cálculo pela convenção exponencial tem um valor de juros sobre o capital próprio de RS 948.662,04, portan­to, menor que o valor calculado sobre a convenção linear (exposta no subitem anterior) de RS 960.916,66.

344

Page 347: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

.~

Regras Ge Despesas

PEDRO ANANJR.

Advogado em São Paulo

Especialista em Direito Empresarial pela PUClSP MBA Contro//er pela FEAlUSP

Vice-prc ridente da Diretoria Jurídica da ANEFAC

Frofessor de Especialização da APET

THAÍ5 ABREU DE AzEVEDO SILVA

Advogada em São Paulo Pós-graduanda em Direito Tributário pela PUClSP

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

REGRAS GERAIS DA DEDUTIBILlDADE DE DESPESAS

I. INTRODUÇÃO

Para um exame acurado do tema concernente à dedutibilidade de despesas para efeitos da apuração do lucro real, imprescindível se faz a análise do critério material do imposto incidente sobre a renda, previsto no artigo 153, inciso III da Constituição Federal.

O Texto Constitucional, a despeito de não trazer o conceito do que seja renda e tampouco definir proventos de qualquer na­tureza, delineia tais termos, à luz dos princípios da capacidade contributiva, da universalidade e da progressividade, de tal sorte que a expressão "renda e proventos de qualquer natureza" deve ser entendida como um ganho ou riqueza nova, para efetiva ma­nifestação do primeiro princípio acima citado.

O conceito de renda é traçado pelo Código Tributário de Nacional, que em seu artigo 43, assim dispõe:

"Art.43. O imposto, de competência da União, sobre a ren­da e proventos de qualquer natureza, tem como fato gera­dor a aquisição de disponibilidade econômica ou jurídica:

I de renda, assim entendido o produto do capital, do trabalho ou da combinação de ambos;

II dos proventos de qualquer natureza, assim entendi­dos os acréscimos patrimoniais não compreendidos no inciso anterior."

Nesse sentido, denota-se que a materialidade do tributo em comento consiste no acréscimo patrimonial experimentado pela pessoa física ou jurídica, assim entendido quando houver incor­poração de riqueza nova ao patrimônio existente, descontados,

346

Page 349: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

logicamente os gastos necessariamente expendidos para obten­ção de tal riqueza, pois somente valores líquidos acrescem o patrimônio.

Não se pode olvidar que a base de cálculo do tributo é o instituto que permite quantificar a dimensão econômica da hi­pótese de incidência do gravame, o qual no caso do imposto de renda, deve refletir o acréscimo patrimonial, excluídas as despe­sas que foram necessariamente realizadas na aquisição de rendas ou proventos. 329

Diante desse contexto jurídico, verificaremos quais são as despesas passíveis de serem excluídas da base de cálculo do im­posto sobre a renda, de forma a apurar o efetivo ganho percebido pelas pessoas jurídicas.

II. DA DEDUTlBILlDADE DAS DESPESAS

As regras gerais relativas à dedutibilidade de despesas estão consolidadas no artigo 299 do Regulamento do Imposto de Ren­da, aprovado pelo Decreto nO 3.000, de 1999, que assim prescreve:

"Art. 299. São operacionais as despesas não computadas nos custos, necessárias à atividade da empresa e à manutenção da respectiva fonte F rodutora (Lei nO 4.506, de 1964, art. 47)

329 Nessa esteira. vale transcrever a lição de José Luis Bulhões Pedreira. que ao tratar sobre a composição da base de cálculo do imposto de renda. assim dispôs: "o acrésci­mo patrimonial que constitui rel1da tributável é formado pela diferença entre as re­ceitas e os custos necessários para ganhá-Ias. e é inconstitucio/wl a lei a-) que define como base de cálculo a receita brut<l, ou porcelltagenr dessa receita, ou b-) que pres­creve a determil1ação do lucro real computando receitas porém vedando a dedução de custos lIecessários para ga/d/á-Ias, se a lei ordil1ária veda a deduçiio de custos neassários. o tributo não incide apuJas sobre a renda. mas sobre relida e cap'.tal. pois parte da receita bruta correspol1de aos custos necessários é reposição do cap'tal, e não renda. (Imposto de Renda - Lucro da Pessoa Jurídica - Compensação de

Prejuízos. Revista de Direito Administrativo n.O 207. p.401)

347

Page 350: Anan Jr., Pedro - Imposto de Renda Pessoa Jurídica - Teoria e Prática - 2006

IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

§ 1 ° São necessárias as despesas pagas ou incorridas para realização das transações ou operações exigidas pela ativi­dade da empresa (Lei nO 4.506, de 1964, art. 47, §1°).

§2° As despesas operacionais admitidas são usuais ou nor­mais no tipo de transações, operações ou atividades de em­presa (Lei nO 4.506, de 1964, art. 47, §2°).

§3° O disposto nesse artigo aplica-se também às gratifica­

ções pagas pelos empregados, seja qual for a designação.

Da análise do dispositivo acima transcrito, infere-se que para que uma despesa seja considerada como dedutível, ela deverá, cumu­lativamente, (i) ser usual e normal, face às atividade desenvolvidas pela empresa que a suportou; (ii) se não paga, ao menos deve ter sido incorrida e, por fim, (iii) ser necessária à atividade da em­presa e à manutenção da respectiva fonte produtora. Ademais, depreende-se que os custos não se confundem com as despesas, porquanto essas consistem em todos os gastos não computados nos custos, essenciais à atividade da empresa.

Com intuito de esclarecer os conceitos de despesa necessá­ria, usual e normal, foi exarado, pela Secretaria da Receita Fede­ral, o Parecer Normativo nO 32/81, do qual extraímos os trechos a seguir transcritos:

"4. Segundo o conceito legal transcrito, o gasto é ne­cessário quando essencial a qualquer transação ou operação eXIgida pela exploração das atividades, prin­cipais ou acessórias, que estejam vinculadas com as fontes produtoras de rendimentos.

5. Por outro lado, despesa normal é aquela que se verifica comumente no tipo de operação ou transa­ção efetuada e que, na realização do negócio, se apresenta de forma usual, costumeira ou ordinária. O requisito de usualidade deve ser interpretado na acepção de habitual na espécie de negócio."

348

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COORDENAÇAO: PEDRO ANAN JR.

Verifica-se, pois, que despesa necessária é aquela indispensá­vel para realização de quaisquer dos negócios exigidos pela ativi­dade que constitui o objeto da pessoa jurídica, enquanto a nor­mal ou usual é a despesa costumeiramente utilizada na consecu­ção dessas atividades, de tal sorte que apenas as despesas estra­nhas às atividades da empresa é que poderão ser consideradas como indedutíveis.

E tanto é assim que a própria norma inserta no artigo 299 do RlR/99 não especifica quais gastos seriam avaliados como necessários, mencionando tão-somente os critérios de apuração dessas despesas, conferindo, por conseguinte, ao contribuinte as diretrizes de identificação da natureza operacional da despesa, a qual deverá sempre ser comprovada por documento hábil e idô­neo.

Dessa forma, podemos concluir que a classificação da des­pesa em dedutível ou não é subjetiva, e depende tão-somente da atividade/objeto do contribuinte. O Fisco não pode generalizar tal classificação, sob pena de elevar indevidamente a carga tribu­tária que recai sobre o sujeito passivo.

Entretanto, com o advento da Lei n.O 9.249, de 26 de dezem­bro de 1995, algumas despesas passaram a ser consideradas como indedutíveis para efeito de apuração do lucro real, consoante reza

o artigo 13, in verbis:

"Art. 13. Para eftiI o de apuração do lucro real e da base de cál­

culo da contribuiçã ) social sobre o lucro líquido, são vedadas as seguintes deduções, independentemente do disposto no art. 47

da Lei nO 4.506, de 30 de novembro de 1964:

I - de qualquer provisão, exceto as constituídas para o paga­mento de férias de empregados e de décimo terceiro salário, a de que trata o art. 43 da Lei nO 8.981, de 20 de janeiro de 1995, com as alterações da Lei nO 9.065, de 20 de junho de 1995, e as provisões técnicas das companhias de seguro e de capitalização, bem como das entidades de previdência privada, cuja constituição é exigida pela legislação especial

a elas aplicável;

349

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

II - das contra prestações de arrendamento mercantil e do aluguel de bens móveis ou imóveis, exceto quando relacio­nados intrinsecamente com a produção ou comercialização dos bens e serviços;

III - de despesas de depreciação, amortização, manutenção, reparo, conservação, impostos, taxas, seguros e quaisquer outros gastos com bens móveis ou imóveis, exceto se in­trinsecamente relacionados com a produção ou comercialização dos bens e serviços;

IV - das despesas com alimentação de sócios, acionistas e

administradores;

V - das contribuições não compulsórias, exceto as destina­das a custear seguros e planos de saúde, e benefícios com­plementares assemelhados aos da previdência social, instituídos em favor dos empregados e dirigentes da pessoa jurídica;

VI - das doações, exceto as referidas no § 2°;

VII - das despesas com brindes."

Conforme se observa, a dedubitibilidade das despesas res­tou atrelada ao novo termo trazido pela Lei nO 9.249/95, de modo que a partir de 1996 para que uma despesa possa ser abatida da base de cálculo do Imposto de Renda, ela deve estar intrinseca­mente relacionada à produção ou comercialização de bens e ser­viços do contribuinte.

De acordo com a definição proposta por DE PLÁCIDO E SILVA, in "Vocabulário Jurídico, Ed. Forense, 15a Edição", in­trínseco "quer exprimir o que vem ligado à coisa, mostrando-se ele­mento que lhe é essencial, indispensável ou lhe é inerente. E deve vir por dentro ou contido nela.

Nota-se, assim, que a despeito da intenção do legislador em criar mais um óbice à dedutibilidade das despesas, o termo in­trinsecamente somente ratificou as disposições contidas no arti­go 299 do Regulamento do Imposto de Renda, o que demonstra que a análise do artigo 13 da Lei nO 9.249/95 não pode ser pres-

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN JR.

cindida do exame do referido artigo 299, pOiS a ambos se complementam.

Importa destacar, ainda, que a vedação relativa à dedução das despesas com a alimentação de sócios, administradores e aci­onistas, assim como com a distribuição de brindes é inconcebí­vel, porquanto vai contra as regras gerais da dedutibilidade. Se o legislador quis limitar a dedução dos dispêndios, que têm natu­reza de mera liberalidade, não foi feliz na redação do texto legal.

Isso porque, não faz sentido algum restringir a dedução dos gastos incorridos pelos sócios, administradores ou acionistas quando promovem almoços ou jantares para seus clientes, como forma de divulgar e promover sua atividade ou as despesas com a fabricação de brindes que possuem o logo da empresa, tais como, bonés, camisetas, chaveiros, e assim por diante.

A título de exemplo, imaginemos uma empresa que tem como objeto social a comercialização de automóveis, e a fim de incrementar suas vendas, ela distribui brindes com o logotipo de sua marca. Não obstante a despesa não ser usual e normal à ati­vidade da empresa, não se pode admitir que o gasto despendido na fabricação dos referidos brindes não seja deduzido, posto que

é necessário para a promoção das vendas. Nesse sentido, caso a despesa esteja revestida dos requisitos

da necessidade e normalidade à atividade da empresa, ela não poderá restar configurada como indedutível, consoante o enten­

dimento dos Tribunais Administrativos:

"D ESPESAS COM VIAGENS - Somente são aceitas como dedutíveis as despesas com viagens comprovadamente ne­cessárias e vinculadas à atividade da empresa.

DESPESAS COM BRINDES - As despesas com a aqui­sição de brindes, só são admitidas como operacionais, dedutíveis, quando correspondam a objetos de diminuto ou nenhum valor comercial, e sejam correlatos com a ati­vidade desenvolvida pela empresa, além de obedecer aos limites estabelecidos pela legislação.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

DESPESAS COM CONTRlBUIÇÕES E DOAÇÕES As despesas admissíveis como dedutíveis devem ser

àquelas necessárias ao desenvolvimento das atividades da empresa, as realizadas por mera liberalidade não devem ser consideradas.

Recurso parcialmente provido." (Recurso Voluntário nO 127.556, ~inta Câmara do Primeiro Conselho de Con­tribuintes, Relator: Nilton Pess, Data da Sessão 19/06/ 2002). Grifou-se.

"IRP] CUSTOS E DESPESAS OPERACIONAIS DEDUTIBILIDADE - São documentos hábeis para com­provar os custos e as despesas operacionais as notas fiscais, faturas/duplicatas e recibos, desde que indiquem as partes, as operações realizadas e respectivos valores, de modo a se poder aferir a necessidade e a normalidade dos dispêndios.

Cabível a glosa quando deixarem de ser comprovadas as ope­

rações.

GASTOS COM A PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DEDUTIBILIDADE Consideram-se dedutíveis os gastos com prestação de serviços quando amparados em documentação hábil em que estejam nitidamente iden­tificados os beneficiários dos respectivos pagamentos, a espécie e o local dos serviços, sem que o fisco envide qualquer esforço no sentido de comprovar a inexistência dos serviços prestados.

DESPESAS COM A REPOSIÇÃO DE PEÇAS EM BENS DE PROPRIEDADE DE TERCEIROS Constituem despesas operacionais dedutíveis os gastos

relacionados com manutenção e reparos em veículos ar­rendados de terceiros com o objetivo de mantê-los em estado de conservação e uso.

GLOSA DE DESPESAS REGISTRADAS EM DUPLICIDADE - Legítima glosa de valores registrados em duplicidade a débito de contas de resultado.

DESPESAS OPERACIONAIS - DEDUTIBILIDADE - Legítima a glosa de despesas operacionais registradas a

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COORDENAÇAo: PEDRO ANAN JR.

título de conservação e reparos, quando na realidade re­ferem-se à aquisição de materiais utilizados na reformai e ou ampliação de bens do ativo permanente, nos termos do artigo 193 do RIR/80.

DESPESAS COM BRINDES - Têmasuadedutibilidade assegurada na determinação do lucro real, quando se apre­

sentarem em parâmetros compatíveis com níveis usuais de dispêndios para tal finalidade,

DESPESAS INCOMPROVADAS - INDEDUTIBILIDADE

- Para se comprovar uma despesa, de modo a torná-Ia dedutivel,

face à legislação do imposto de renda, não basta comprovar

que ela foi assumida e que houve o desembolso. É indispen­

sável, principalmente, comprovar que o disPêndio corresponde

à contrapartida de algo recebido e que, por isso mesmo, torna

o pagamento devido." (Recurso Voluntário nO 101.307,

Sétima Câmara do Primeiro Conselho de Contribuin­

tes, Relator: Paulo Roberto Cortez, Data da Sessão 121

05/99). Grifou-se.

"DESPESAS DE VIAGENS DE DlRETORES OU SÓ­

CIOS GERENTES - DEDUTIBILIDADE - As despe­

sas de viagens de diretores ou sócios gerentes são dedutíveis

como custo ou despesa operacional desde que razoáveis, com­

provadas com documentação hábil e intrinsecamente liga­

das à atividade da empresa e à manutenção da respectiva

fonte produtora. Dispositivos Legais: RIR/1999, ar/s. 299,

302 e 923." (Processo de Consulta nO 227101. Órgão:

SRRF I 8a. Re ~ião Fiscal. Publicação no D.O.U.:

24.10.2001).Grifou-se

Forçoso concluir, portanto, que a noção de necessidade da despesa é de extrema relevância jurídica para apuração do lucro real e somente quem pode aferir se tal despesa é ou não relacio­nada com a atividade operacional da empresa é o próprio con­

tribuinte do imposto.

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IMPOSTO OE RENDA PESSOA JURlolCA

III. CONCLUSÃO

Em vista do exposto, manifestamos nosso entendimento no sen­tido de que se a despesa é necessária, usual ou normal à operação da empresa, ela deve ser deduzida, independentemente da previsão em contrário, em lei ordinária, pois é vedado ao legislador infraconstitucional restringir o conceito de renda, de tal sorte que se a despesa é necessária para a percepção do rendimento, deve ser ela dedutível.

354

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t , I

,~h ... -ir.1U ii:.,

IRP J e o Lançamento Tributári . Controvertido: Autonomia e Imparcialidade na Discussão

Administrativa

V VILFRIDO AUGUSTO MARQUES

Advogado em Brasília

Membro do Conselho de Contribuintes

LEONARDO MENDONÇA MARQUES

Advogado em Brasília Pós-graduado em Direito Tributário pelo IBET

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

IRPJ E O LANÇAMENTO TRIBUTÁRIO CONTROVERTI­DO: AUTONOMIA E IMPARCIALIDADE NA DIscussÃO

ADMINISTRATIVA

Há cerca de uma década e meia, vemos no Brasil a intensi­ficação da atuação da fiscalização tributária federal por sobre as pessoas jurídicas que aqui estejam instaladas ou que aqui aufiram riquezas. Essa intensificação se deu por adição de técnicas e ins­trumentos de fiscalização, pela capacitação dos auditores, pelo aumento do número destes servidores e também por modifica­ções legislativas.

A caminhada em direção ao maior atendimento à norma tributária é de interesse geral, fortalecendo o Estado de Direito, o livre exercício da atividade econômica e os demais objetivos perseguidos pela tributação na forma da Constituição Federal.

Porém, não é incomum que haja desvios nessa busca de pro­teção da arrecadação. E contra os vícios que, por vezes, maculam os lançamentos tributários, pode valer-se o contribuinte da impugnação do ato do Estado pela via administrativa.

Como é sabido, na forma preconizada pelo Decreto nO 70.235/72, que regulamenta o processo administrativo tributá­

rio federal, a insurgência oposta pelo contribuinte tem um jul­

gamento em la instância, realizado nas Delegacias de Julga­mento da Receita Federal. As turmas são compostas de delega­

dos da Receita com a função específica de julgar as lides admi­nistrativas.

Havendo recurso da decisão da DRJ, seguirá o mesmo para algum dos Conselhos de Contribuintes. Ali, a composição repar­tida entre representantes do fisco e dos contribuintes, fornece am­biente propício à tomada de decisões imparciais e equânimes, sub­

sidiadas pela especialização de cada Conselho e de cada uma das Câmaras, em determinados tributos ou classes de contribuintes. Atua como fator de isonomia processual, um longo histórico de

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

evolução das normas internas e de construção jurisprudencial, que foram se aperfeiçoando com as décadas de funcionamento do órgão.

Ocorre que, há algum tempo, atos por vezes motivados eminen­temente por interesses arrecadatórios, vêm atuando no sentido de re­tirar a autonomia dos Conselhos, tentando, com isso, reforçar as pers­pectivas de referendo dos autos de infração.

Os Conselhos sobreviveram até mesmo a projetos de lei tenden­tes à sua extinção. Por vezes, apesar de não pleitear a extinção do órgão julgador, tenta-se amarrar de tal forma o julgamento da defesa administrativa, que equivaleria mesmo à sua abolição.

E a autonomia do órgão de julgamento é fundamental para o alcance de justiça tributária. Sem a autonomia administrativa e pro­cessual, todas as decisões restam marcadas pelo peso do órgão de arre­cadação.

Atualmente os Conselhos de Contribuintes encontram-se den­tro da estrutura administrativa do Ministério da Fazenda. E dentro do Ministério, foram equivocadamente submetidos à ingerência da Secretaria da Receita Federal, por Portaria ministerial.

A delegação dos Conselhos para a Receita Federal, por Por­taria, contraria o Decreto presidencial que estabelece a estrutura do Ministério (Decreto nO 4.643 de 24 de março de 2003), e que posiciona os Conselhos e a Secretaria da Receita em ramos diver­sos do organograma, sem instituir hierarquia entre os mesmos.

Com a delegação de competência, o órgão de arrecadação passou a intervir na Corte de julgamento tributário, sendo lógica e inegável a tendência, já percebida nos atos da Secretaria, de

encerrar a autonomia do Conselho. Dessa forma, merece atenção o fato de que os Conselhos

vêm sendo objeto de medidas tendentes a engessar sua função judicante, o que culminará com o afastamento da justiça fiscal que ali se pratica, deixando o contribuinte sem instrumentos há­beis para se defender contra autuações fiscais descabidas, o que certamente levará também à estagnação do Judiciário com a de­

manda irresolúvel que assim surgirá.

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURIDICA

Merece destaque a tramitação na Câmara dos Deputados, da PEC 578, que dispõe sobre a criação da Justiça Administrati­va Fiscal no âmbito de todos os entes da Federação, sendo autor da proposta o Dep. Moreira Ferreira (PFL). A PEC está atual­mente na Comissão de Constituição e Justiça, relator o Dep.José Eduardo Çardozo (PT-SP).

Recentemente, alguns episódios refletem a continuidade do processo de tentativa de enfraquecimento da autonomia dos Conselhos.

Por exemplo, o caso da intimação da Procuradoria da Fa­zenda Nacional em relação aos acórdãos do Primeiro Conselho de Contribuintes e Câmara Superior de Recursos Fiscais, por meio de publicação no Diário Oficial da União:

O ex-Presidente daquele tribunal administrativo, fundamen­tou-se no parágrafo 2° do artigo 44 do Regimento Interno dos Conselhos de Contribuintes, cuja redação é a seguinte:

"Das disposições gerais

Art. 44. Atuarão junto aos Conselhos, em defesa dos interesses da Fazenda Nacional, os Procuradores credenciados pela Pro­curadoria-Geral da Fazenda Nacional.

§ 1 ° O credenciamento far-se-á em oficio do Procurador-geral da Fazenda Nacional ao Presidente do respectivo Conselho.

§2°. Sob pena de nulidade, os Procuradores da Fazenda Na­cional credenciados serão intimados dos despachos relati­vos aos embargos e à admissibilidade de recurso especial e dos acórdãos contrários ao interesse da Fazenda Nacional."

Vale ressaltar, que a redação atual do §2° supra, foi conferida pela Portaria MF n° 103, de 23/04/02.

A redação anterior Gá revogada) era a seguinte:

"§2° Sob pena de nulidade, os Procuradores da Fazenda Nacional serão intimados pessoalmente das decisões

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COORDENAÇÃO: PEDRO ANAN lR.

interlocutórias e das decisões contrárias aos interesses da Fazenda Nacional."

Ou seja, a exigência normativa de que a intimação seja pesso­al foi suprimida em 2002, inexistindo atualmente restrições a ou­tros meios de intimação, desde que não sejam contrários à lei.

Assim, as intimações promovidas foram juridicamente irretocáveis, tendo surtido seus efeitos: os Procuradores da Fazenda Nacional foram cientificados das decisões proferidas nos processos listados no D.O.U

Porém, foi publicada a Portaria n° 1, de 8 de março de 2004. Nela, a presidência subseqüente da Câmara Superior de Recursos Fis­cais "tornou sem efeito" a intimação da procuradoria ali mencionada.

Ocorre que não haveria como tornar sem efeito o ato jurídico lícito, acabado, perfeito, que inequivocamente surtiu seus efeitos per­tinentes. Se o ato fosse nulo, ou anulável, por vício a ele inerente, poderia em tese, haver sua revogação.

A Medida Provisória nO 232, de 30/12/204, pretendeu mitigar a atuação dos Conselhos de Contribuintes. Famosa por pretender aumen­tar o ônus tributário, e que trouxe, na mesma linha ideológica, tentativa de restringir o direito de defesa do contribuinte.

Como é sabido, a norma buscava vedar o acesso à via recursal, em situações em que o recun o aos Conselhos se revela exatamente como a única oportunidade de obtenção de análise desvinculada da lide

estabelecida. Felizmente, a socie. iade reagiu em tempo, e a medida foi dispen­

sada. No Congresso Nacional, na imprensa e nas representações das classes empresariais, o ataque contra o Conselho de Contribuinte foi largamente enfrentado. É esse enfrentamento, essa defesa da institui­ção e de suas prerrogativas, que devem ser levados adiante.

Contemporâneo à vitória contra a MP 232, veio outra medida de desconstrução da defesa dos contribuintes.

A Secretaria da Receita Federal arquitetou alteração da com­posição do órgão, com deslocamento de conselheiros, mudanças de competências e desmembramento de Turma da Câmara Supe-

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

perior de Recursos Fiscais. Com isso, e não por acaso, várias maté­rias que haviam se consolidado em favor dos contribuintes (PNUD, fiscalização pela CPMF, p. ex.), sofreram revés contrário à juris­prudência antes firmada.

Mais recentemente, a Medida Provisória nO 252, de 15 de junho de 2005, em seu artigo 68330 , trouxe previsão de instalação de "turmas especiais" nos Conselhos, com competência para jul­gar matérias e valores especificados pelo Ministro da Fazenda. Sendo evidente, a percepção largamente manifestada pela dou­trina foi a de que se estava criando "turmas de exceção", cuja composição especialmente designada poderia servir de instru­mento de desconstrução de orientações jurisprudenciais firma­das nas Câmaras em favor dos contribuintes.

Por fim, ressaltamos afguns pontos do Regimento Interno dos Conselhos, que funcionam em desfavor do direito de defesa do contribuinte.

O Recurso Especial, que pode ser interposto contra o acórdão da Câmara, para análise pela Câmara Superior de Recursos fis­cais, tem duas faces: uma que se apresenta ao contribuinte, outra que se expõe à Fazenda Pública.

É que a admissibilidade do recurso interposto pelo contri­buinte depende de demonstração de que há divergência de en­tendimentos entre Câmaras dos Conselhos. Então, trata-se de recurso oportunizado ao contribuinte apenas para a resolução de divergência jurisprudencial, ou seja, volta-se para a uniformiza­ção da jurisprudência.

330 "Arl. 68. O Ministro de Estado da Fazenda poderá criar. nos Conselhos de Contribuin­tes do Ministério da Fazenda. Turmas Especiais. por prazo determinado. com competên­cia para julgamento dos processos que especificar em função da matéria e do valor. § 1 n As Turmas de que trata o caput serão paritárias. compostas por quatro mem­bros. sendo um conselheiro Presidente de Câmara. representante da Fazenda. e três conselheiros com mandato pro tempore. designados entre os conselheiros suplentes. § 2" O Ministro de Estado da Fazenda disciplinará o disposto neste artigo. inclusive quanto à definição da matéria e do valor a que se refere o caput e ao funcionamento das Turmas Especiais."

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COORDENAçAO: PEDRO ANAN JR.

À Procuradoria da Fazenda é entregue a oportunidade de interpor recurso especial na hipótese de divergência entre acórdãos, mas também em caso de "decisão não unânime de Câmara, quan­do for contrária à lei ou à evidência da prova" (artigo 32,1). Ou seja, o recurso especial concedido para a União é, antes de um instrumento de uniformização de jurisprudência, um verdadeiro recurso de revisão, um apelo para instância superior.

Também os embargos de declaração foram de certa forma mitigados em relação ao que já existira na norma regimental. A redação dada pela Portaria MF nO 103, de 23/04/2002, ao §2° do artigo 27 (que versa sobre os embargos), foi a seguinte:

"Art.27

§2°. O despacho do Presidente, após a audiência do Relator ou de Conselheiro designado, na impossibilidade daquele, se necessária, será definitivo se declarar improcedentes as alegações suscitadas, sendo submetido à deliberação da

Cãmara em caso contrário."

A inclusão da expressão "se necessária" (única alteração promo­vida no dispositivo supra) tornou facultativa ao Presidente da Câmara a submissão dos embargos ao Relator do acórdão embargado. E o Presidente é sempre, por força do regimento, um representante da

Receita. Ainda outra alteraç io do regimento merece destaque, qual seja,

a introdução do artigo 22-A, que vedou a manifestação acerca de inconstitucionalidade de norma. Vedação esta que justamente veio contrariar o entendimento de diversos julgadores administrativos, apoiados por grande parte da doutrina, no sentido do cabimento de tal manifestação, sob pena de afronta à própria Constituição.

Os entendimentos manifestados em jurisprudência de um órgão julgador, devem ser superados, se for o caso, pela argumentação, pela reflexão, e não por sua proibição, por norma vinda de fonte

representante de apenas um dos lados da lide.

361

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IMPOSTO DE RENDA PESSOA JURlolCA

Assim, o que versamos acima são considerações que preten­dem suscitar o debate acerca da amplitude de defesa das empresas e demais pessoas jurídicas que optem pela impugnação adminis­trativa dos atos administrativo-tributários federais. Antes de as­pectos econômico-financeiros, cabe ao jurista a atenção sobre a compatibilidade das regras processuais e institucionais do proces­so administrativo, perante o ordenamento jurídico. Destruir é ge­ralmente menos trabalhoso que construir; no processo adminis­trativo tributário, há que se resguardar o que já foi erigido em prol do devido processo legal, com muito custo.

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